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O SIMBOLISMO DO CENTRO

Adrian Snodgrass

Texto extraído do livro "The Symbolism of the Stupa" de Adrian


Snodgrass, arquiteto e professor da Universidade de Sidney,
Austrália.1

1. O centro geométrico2
A cosmogenia se expressa simbolicamente como uma expansão ou radiação em seis
direções desde um ponto central. A cruz tridimensional, com seus braços irradiando-se
desde um centro comum, é o símbolo universalmente recorrente deste processo de
evolução cosmogenética. Os braços são as coordenadas de nosso mundo sensível e
indicam como o espaço se descola na existência a partir de um ponto central e, por
analogia, como o tempo evolui desde a pontualidade. O centro da cruz, no qual seus seis
braços se juntam, simboliza o Princípio que gera o universo; é o ponto de origem de
todas as coisas, adimensional e atemporal, é o Principio da extensão e a duração. Ao
estar mais além de toda limitação espacial e temporal, não obstante gera a integridade
da manifestação espaço-temporal. Os braços da cruz dependem do centro e se irradiam
desde este não poderiam existir sem o centro. E igualmente a totalidade da manifestação
universal depende do seu Principio - e é irradiada por este - e nada seria com a carência
dele.
1
Traduzido ao espanhol por Héctor V. Morel e ao português por Elder de L. Madruga
2
As obras de René Guénon brindam percepções indispensáveis para compreender o simbolismo do
centro, e o que segue se apoio substancialmente em sua análise. Ver especialmente Guénon, 1959,
capítulo 7 e outras passagens; 1062, capítulo 8 e outras passagens. Os conceitos apresentados por
Guénon se desenvolvem nos escritos de Coomaraswramy e Eliade: ver Coomaraswamy, 1977, 1, páginas
454 e seguintes, e 2, páginas 221 e seguintes; Eliade, 1957, em diversas passagens; 1958, páginas 143 e
sguintes; 1959, páginas 12 e seguintes; 1969, páginas 49 e seguintes; 1961, páginas 27 e seguintes e 73 e
seguintes. Ver também Chevalier e Gheerbrant, 1973, 1, páginas 299 e seguintes, entrada
correspondente: Centro; Cirlot, 1962, páginas 39 e seguintes; Whetley, 1971, páginas 428 e seguintes.
O conceito da gênese do espaço como expansão e radiação a partir de um ponto se
reflete na linguagem. A palavra sânscrita nâbhi, "o eixo de uma roda" e também o
"centro" ou o "umbigo", deriva da raiz nabh, "expandir". Com referencia ao corpo
humano, o umbigo corresponde ao espaço3, e no Rig Veda se fala frequentemente do
cosmos como "expandindo" desde um umbigo ctônico4. Nos Vedas o espaço se pode
designar com a palavra dish, que literalmente é "ponto cardinal" ou "direção".5

As seis direções da extensão espacial - para frente, para trás, esquerda, direita, para
cima, para baixo - e as três divisões do tempo - passado, presente e futuro - se acham
contidas na momentaneidade não dimensional do centro. Todos os fenômenos, todos os
seres, e todos os acontecimentos do espaço e do tempo estão contidos ali, em uma "parte
nenhuma" atemporal que é o aqui e agora.

Devido a que o ponto central geométrico não tem forma, dimensão nem direção, é um
símbolo adequado da Unidade primordial6, do Princípio da manifestação. A radiação
dos mundos desde o centro é uma realização, uma introdução na existência, dos
aspectos virtuais que dominam dentro da Unidade7. É um processo que vai da Unidade à
multiplicidade, do Uno imperecível à pluralidade perecível8.

É uma desintegração e uma divisão do Uno em muitos; ativando-se, o Uno esparge e


dispersa sua luz na opacidade, e aí "descansa em uma vacilante refração que parece
distinta dela mesma".9

Do mesmo modo que a Unidade produz todos os números sem ser modificada ou
afetada em sua essência pela produção deles, de maneira semelhante o ponto central
produz todas as coisas e, no entanto, permanece inalterado. Assim, os textos
brahmânicos podem dizer que "Isso (Brahman) chegou a ser o todo"10 e, ainda,
acrescentam que "Um Fogo se multiplica ao iluminar, e apenas um Sol esta presente em
um e em todos, e um só Amanhecer ilumina a este Todo"11 e "Ele faz com que sua
forma única seja múltipla"12. De forma parecida, o Buda, que é a personificação do
ponto da Unidade, diz: "Sendo uno, me converto em muitos, e sendo muitos me
converto em um".13

3
Maitri Upanishad VI.6.
4
Coomaraswamuy, 1977, 2, página 222.
5
Mus, 1935, página 139
6
Ou seja, uma unidade mais metafísica que aritmética; esta última representa a Unidade por
correspondência analógica no nível da quantidade. Ver Guénon, 1946, página 28; 1957, capítulo 5; 1962,
página 84.
7
Guénon, 1958, páginas 20 e seguintes; Eliade, 1957a, página 44.
8
Edgerton, 1924, página 20; e Wu, 1963, página 44.
9
Tucci, 1961, página 57.
10
Briadâranyaka Upanishad I.4.10.
11
Rig Veda VIII.58.2.
12
Maitri Upanishad VI.26.
13
Sanyutta Nikâya II.212.
A geometria expressa isto com a figura que se traça na demarcação ritual do local da
stupa14. O solo em que é traçada é o Solo do Vazio ou Não-Ser, matematicamente: o
Zero. O centro é a Unidade, o número primeiro e primitivo, o Uno; e, como o círculo
pode ter apenas um centro, incomensurável. A circunferência, composta por pontos
indefinidos, representa os números da multiplicidade; e o quadrado expressa a procissão
da Unidade ao encontro da quadratura15, que abreviadamente tipifica a fragmentação do
Uno.

*
* *
O centro em outro significado. É não apenas o ponto de origem do qual emanam todas
as coisas, senão também o ponto de seu retorno último. Há dois possíveis sentidos do
movimento ao longo dos raios que juntam os pontos na circunferência do círculo com
seu centro: a primeira, do centro à circunferência, e a segunda da circunferência de volta
ao centro. Estas fases complementares do movimento, centrífugo e centrípeto,
comparáveis com as da respiração e da atividade do coração, dão a imagem da sucessiva
manifestação e reabsorção das existências. Desde o centro como núcleo procedem as
tendências cósmicas de emergência e divergência, de expansão e emanação: o Uno
produz o múltiplo, o mais interno avança ao externo, o imanifesto se manifesta e o
eterno se desenvolve para exteriorizar os ciclos do tempo. Na fase complementar, as
forças cósmicas de reintegração e convergência, de concentração e conjunção, tendem a
voltar ao centro: a multiplicidade retorna à unidade, o esterno se internaliza totalmente,
a manifestação se oculta e o tempo se absorve no ponto estático do atemporal.

Este conceito da manifestação desde o centro e do retorno a este forma uma das bases
mais fundamentais do simbolismo arquitetônico. Se os seres dependem inteiramente do
Princípio em tudo o que eles são, então, todos devem aspirar, consciente ou
inconscientemente, a retornar a ele, e esta tendência centrípeta se traduz em formas
construídas por meio da orientação ritual, a qual dirige a construção em direção a um
centro, em direção a uma imagem terrestre e sensível do verdadeiro Centro do Mundo.
Na orientação do stupa se vê, pois, como uma encarnação do empenho do homem por
rememorar os passos de seu devenir, de volta pelos raios da Roda da Existência em
direção a seu eixo central. O stupa, como toda outra forma de arquitetura tradicional,
materializa o propósito mais fundamental do homem: o de um retorno a seu próprio
centro verdadeiro.

*
* *

14
N.T.: O Stupa (ou ainda Estupa) é um tipo de monumento ou parte de um templo, construído em forma
de torre, geralmente cônica, circundada por uma abóboda e, por vezes, com um ou vários chanttras
(toldos e lona). Originalmente era um monumento funerário de pedra, semi-esférico, com cúpula, mirante
e balaustrada. Com o advento do Budismo, evoluiu para uma representação arquitetônica do cosmo.
15
Guénon, 1962, capítulo 14 ("La Tetraktys et le carré de quatre"), trata sobre o quaternário como número
da manifestação universal. Ver também Kramrisch, 1946, página 123, n. 84.
Ao estar equidistante de todos os pontos na circunferência, o centro divide cada
diâmetro em duas partes iguais. É o ponto no qual os extremos, ou tendências
contrarias, representadas na circunferência por pontos contrapostos, se reconciliam e
juntam em perfeito equilíbrio. O centro é o lugar no que todos os contrários se unificam
e todas as oposições se resolvem16. O nascimento dos mundos é gênese de oposições e
criação de uma dialética cósmica de contrários e fatores irreconciliáveis. A cruz com
braços que se expandem desde um ponto comum de origem em direções contrárias -
norte em frente ao sul, leste em frente ao oeste, e nadir em oposição ao zênite - é a
formulação arquetípica desta implementação de contrários. É, em resumo, a influência
cósmica e recíproca de ações opostas e interações antitéticas e antipódicas e a
polaridade de energias contraditórias. O ponto central é o lugar do nascimento das
oposições; é também o lugar de sua reconciliação, de sua união em uma coincidentia
oppositorum. Todas as oposições se combinam no centro em uma fusão coincidente e
concorrente. Desde um ponto de vista, o casamento dos contrários é um equilíbrio de
fatores complementares, subsistindo em um equilíbrio harmonioso de compensação
mútua. Segundo este critério, o centro é uma morada de tranquilidade, é o locus
paradisíaco na qual as antinomias se transcendem e as dualidades inerentes da existência
se resumem em uma concordância não dual, e é o lugar no que todo mal e sofrimento, e
todas as angústias e inquietudes originadas no conflitivo choque de contrários,
desaparecem dentro da paz perfeita e repousam em sua fusão central. Contudo, visto
desde outra posição, é um foco de intensidade dinâmica, em lugar na qual todas as
energias e forças se concentram, e no que todas as oposições inerentes ao cosmos
coexistem em um estado de predominante virtualidade.

2. O Sol como Centro


A orientação do plano do stupa é determinada pela referencia aos movimentos do sol; o
plano é um diagrama geométrico do ciclo solar; seus eixos se localizam nas sucessivas
posições do curso do Sol. Isto tem um significado que é mais que meramente
astronômico e expressa o simbolismo do Sol metafísico, que é origem e centro dos
mundos.

Tanto nas tradições brahmânicas como nas budistas, o Sol é o símbolo do Princípio
supremo, o Centro transcendente do universo. O Sol é, nos textos brahmânicos, a
Inteligência Cósmica, e a luz que ele irradia é o Conhecimento intelectual17; é a morada
de Brahman e Purusha, e a sede de Manu, o legislador cíclico. Os raios do Sol
distribuem os mundos, dão vida a todas as coisas e vitalizam a todos os seres: "Oh Sol,
Tú sozinho geraste o mundo"18. O Sol é a Pessoa do sacrifício, quem "há de se derramar
em torrentes de Leste a Oeste"19. Se divide para encher os mundos20 e contudo

16
Guénon, 1958, página 38; 1962, página 88; Chevalier e Gheerbrant, 1973, 1, página 299.
17
Ghevalier e Gheerbrant, 1973, 4, página 216, entrada correspondente: Soleil.
18
Atharva Veda XIII.2.3.
19
Rig Veda X.90.5.
20
Maitri Upanishad VI.26.
permanece indiviso e integro entre as coisas divididas21, "pois enquanto é isso (o Sol)
naquele mundo, ele é uno, e enquanto está aqui na Terra numerosamente dividido entre
os seres vivos, ele é múltiplo!" Mediante esta múltipla divisão de si mesmo, a luz do Sol
é progenitora, "pois a descendência é verdadeiramente toda a luz"22. Os raios do Sol são
seus filhos, e todos os seres vivos tem filiação Solar; e os Iluminados sabem que "os
justos são raios dele (do Sol) que neles arde"23: os justos são raios solares e verdadeiros
filhos do Sol.24

O simbolismo é tanto budista como brahmânico. A literatura budista contem um


conjunto de relatos nos que o Buda futuro tem a forma de um animal ou ave de ouro que
diariamente salta e voa para a copa de uma árvore25. Estas lendas se referem à ascensão
do dourado Sol à parte superior do eixo do mundo. O nascimento do Buda se compara
com o trivial nascer do Sol que ilumina o mundo inteiro26. O Buda é, nos textos pális27,
"o parente do Sol" (pali: adhicca-bandhu); e também o "Olho do Mundo"
(páli:chakkhumâ-loke)28, o qual evoca a recorrente identificação brahmânica do Sol e do
Olho Cósmico, que "contempla tudo" e que "tudo vê"29: toda a circunferência da roda
cósmica é visível desde seu centro solar; o Buda, como o Sol, vê simultaneamente todas
as coisas.

A identidade do Buda e do Sol é explícita no Vajrayâna. Ao Tathâgata supremo o


denominam de "Grande Sol" (Magâvairocana; japonés: Dainichi), o Olho supremo de
todos os Budas e Bodhisattvas, quem "não tem centro nem circunferência, e nunca
aumenta ou diminui"30. Ele é a Fonte Solar da Realização, ao que todos retornam. O
Grande Sol, Mahâvairocana, se encontra em cima da Montanha do Mundo - Meru -, de
onde revela eternamente o Dharma irradiando desde seu Corpo fulgurante a Diamantina
Mandala do Mundo.

Não há que se confundir o Grande Sol, que é o Sol metafísico, com o sol físico de nossa
experiência cotidiana. "Enquanto a luz do sol físico se divide, brilhando de dia mas não
de noite, a luz do Sol da Sabedoria brilha esplendorosamente em todo lugar e tempo, e
por todo lugar no Mundo do Dharma. Na verdade, o Grande Sol não pode ser
comparado ao sol físico, salvo por analogia; o sol físico está sujeito às limitações da
causalidade, enquanto que o Grande Sol é integralmente transcendente. Em

21
Bhagarad Gita XIII.16 e XVIII.20.
22
Shatapatha Brâhmana VIII.7.1.16; e TS VIII.1.1.1.
23
Shatapatha Brâmana 1.9.3.10; e Rig Veda I.109.7.
24
Jaiminîya Upanishad Brâhmana 11.9.10.
25
Ver Przyluski, 1930, páginas 457 e seguinte; 1929, páginas 311 e seguintes; Bosch, 1961, página 144.
26
Buddhacarita, I.28. A respeito do simbolismo solar na lenda do Buda, ver Rowland, 1938, e Soper,
1949.
27
N.T.: Os "textos pális" chamam ao fim das paixões, dos desejos, do erro; é a cessação da dor, seu
desaparecimento.
28
Sutta Nipáta I.599 e III.9.6.; Digha Nikâya II.158.
29
MKDJT, página 1522, entrada correspondente: Dainichi Nyarai, citando ao Kongôchókigetsu.
30
MKDJT, página 1522, entrada correspondente: Dainichi Nyorai, citando ao Kongôchókigetsu.
consequência o Grande Sol é chamado Mahâvairocana"31. O Sol Celestial "não surgirá
nem se porá mais após elevar-se ao zênite, se não que estará apenas no Centro. Daí o
texto: 'Aí não se pôs nem saiu jamais...'. Nem sai nem se põe; de uma vez e para sempre
permanece no céu para quem conhece a doutrina de Brahma". O sol perceptível é a
mera semelhança do Sol Celestial; se move, e mediante seu movimento marca os ritmos
do tempo; mas o Sol imperceptível está estacionário e fixo em um Presente eterno, no
instante pontual e Prístino, a partir do qual o tempo evolui. O Sol metafísico está além
do tempo e permanece eternamente imóvel; dentro do Sol, o nunc fluens é eternamente
o nunc stans, e o tempo está congelado no puntual.

*
* *
O ponto central do plano da stupa se identifica com o Sol, com o Centro do cosmos,
situado no umbigo do universo por cima da Montanha do Mundo. Desde o ponto de
vista terrestre, o Sol está por cima do Universo, no "olho" da abóboda celestial; mas em
verdade o Sol esta situado no Centro do universo total. Visto desde o ceio da Roda do
Mundo, o Sol no eixo se acha no zênite do raio do círculo, que é por sua vez um raio
solar e o eixo do universo; mas visto com o Olho Solar e desde a posição do próprio
Sol, sua localização é central.32

O Sol é homólogo aos outros símbolos do Centro: é "a única lótus do zênite"33; é a placa
circular do teto (kannikâ-mandalam)34 e o olho da cúpula, na que o teto converge como
os raios do sol ou os raios de uma roda35; é o eixo da roda da carruagem, a única
abertura do Céu, envolvido pelos raios luminosos, que ha de ser percorrido antes que o
mundo possa ser visto claramente36. É também o axis mundi, pois centro e raio, desde o
Olho do Sol, são coincidentes. De maneira que o Sol é a Coluna que separa os
mundos37, e a Arvore da Luz38. O sol é, em muitas tradições, um símbolo do Princípio
ou da Lei que governa o mundo, e representa, por analogia, ao rei como a encarnação da
Lei dentro do império39. E também na tradição budista, o Sol é o símbolo do Buda
soberano, a perfeição do Dharma Cósmico, e por analogia, o emblema do rei-
chakravartin.

O Sol estacionário está no topo do eixo do mundo. Descansa nos ramos mais altos da
Árvore Cósmica e é o mesmo Sol que permanece imóvel sobre a árvore quando o
menino Siddhartha, o Buda que viria a ser, empreendeu a primeira meditação (dhyâna).
Brilha desde o topo da Montanha do Mundo: é o "Sol único que nunca abandona o

31
Idem, citando al Shubhâkarasimha, 1.
32
Ver Coomaraswamy, 1977, 1, página 420, n.11.
33
Brihadâranyaka Upanishad VI.36.
34
Rig Veda I.146.4.
35
Coomaraswamy, 1977, 1, página 440.
36
îshâ Upanishad 15, 16; Jaiminîya Upanishad Brâhmana I.3.5.; I.111.33; Chândogya Upanishad
VIII.6.1.; etcétera.
37
Rig Veda VI.86.1.; VIII.4.1.10;X.121.1; Jaiminîya Upanishad Brâhmana I.10.9.
38
Coomaraswamy, 1977,1,página 387.
39
Chevalier e Gheerbrant, 1973, 4, página 217, entrada correspondente: Soleil.
Monte Meru"40, e Meru é "a sustentação do Sol"41. A cabeça da Coluna do Sol que se
estende desde o centro da abóboda celeste até o umbigo da Terra42, é o onipresente e
onisciente Espírito do Sol, cujo beijo dota de vida e existência a todas as coisas43. O
simbolismo é expresso com frequência na iconografia budista pelo recorrente
movimento da Roda (chacra), sustentada por uma coluna: a Roda se identifica com o
Sol e, situada na parte superior da coluna, é por sua vez a Roda do Dharma e o Sol do
Buda imóvel no topo do mundo.

O Vikramacharita, livro de histórias budistas, nos conta que em cima de uma alta
montanha há um lago de cujo centro se eleva gradualmente uma coluna de ouro que
suporta um tronco dourado. "Desde o amanhecer até o meio dia, a coluna ascende até
que chega ao disco solar e, depois dele, se funde pouco a pouco até que, ao pôr do sol,
toca novamente a água. Isto se sucede dia após dia". O relato continua com a descrição
de como o chakravartin Vidramaditya ("O Sol do Heroismo"), sentado neste trono, se
eleva com ele até o Sol, e logo volta a descer com ele para entrar no mundo subterrâneo,
em que um brilhante e áureo posto sacrificial (yûpa) se encontra sobre um altar de ouro.
Junto ao posto esta Prabha ("Esplendor") , a Mãe do Mundo e a amada do Sol. Sentado
em seu trono, novamente o rei sai à superfície do lago no momento em que o sol se
eleva. Desta maneira, o chakravartin e o trono seguem a ascensão do sol ao zênite e em
seguida até seu noturno descenso aos mundos subterrâneos44. A este respeito, há que se
assinalar que a Grande Deusa é assimilada ao eixo cósmico que separa os mundos e
sustenta a Sûrya, o Deus Sol45.

O trono do chakravartin, sustentado no topo da Coluna, é uma variação do tema do


palácio do chadravartin que "descansa sobre uma só coluna" (ekastambha-prâsâda46):
"Se eu erigisse um palácio sobre uma só coluna, seria o primeiro entre todos os reis",
disse um monarca nos Jâtakas, e o Culavansa conta como o rei cingalês
Parakkamabâgu acabava de construir esse palácio: "Elevando-se desde um makara,
surgiu no alto como se ferido e aberta a terra. Seu quarto era um áureo aposento situado
sobre uma coluna de ouro, magnífico como uma dourada cova para este leão entre os
reis..." Por sua vez, isto se relaciona com o simbolismo de uma cidade sustentada por
uma coluna, tipificada por Dvâravâti, a cidade do chakravartin, a qual, ante a
aproximação de inimigos e a um grito do demônio que a guardava, se elevava no espaço
como se fosse uma ilha no meio do mar, retornando à situação habitual quando todo o
perigo houvesse passado.47

40
Aitareya Brâhmana XIV.6.44, Com.
41
Kramrisch, 1946, página 355, citando a Lâmina de Hansot, 757A.D., (Broche), Ep.Ind.,XII,203.
42
Aitareya Brâhmana V.28.1;II.1.
43
Shatapatha Brâmana VII.3.2.12-13.
44
Um simbolismo similar aparece no Chakkavarti-síhanâda-suttanta (SBB 4,26) mas aí o movimento da
coluna segue à vida do chakravartin em sua ascensão e declínio. Em outra parte, a coluna se eleva e cai de
acordo com a extensão do kalpa (ver Auboyer, 1949, página 79).
45
Combaz, 1935, página 114.
46
Jâtaka 121 e 454; Auboyer, 1949, página 80, n.3, página 117, n.6 e página 128.
47
Jâtaka 454.
Estas lendas - que associam ao Sol sustentado por uma coluna, ao chadravartin e a seu
trono, e a seu palácio e cidade - se referem em última instância ao Buda, que é o
Chadravartin supremo, o Rei Solar que mora no topo do universo.

Como se mostrará mais pormenorizadamente no que segue, o simbolismo


macrocósmico do Sol situado no zênite da Montanha cósmica, no topo da Árvore ou na
parte superior da Coluna, tem um equivalente microcósmico. No ser individual, o Sol
"de mil raios" é sinônimo do sahasrâra, a lótus de mil pétalas situada no "buraco, oco
ou sutura do vértice" (brahmarandhra) da coroa e no topo da merudanda, que é
homóloga ao raio solar e ao eixo microcósmico.48

Tudo o que implica este simbolismo do Sol fixo e estacionário no topo do axis mundi -
da Coluna, da Montanha ou da Árvore - resultará patente quando com posterioridade
examinemos as imagens da Porta do Sol.

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