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Síntese da obra de BOBBIO, Norberto.

A Teoria das Formas de Governo;


tradução Sérgio Bath. - Brasília: UnB, 1980.

Uma Discussão Célebre

“(...) na discussão referida por Heródoto, na sua História (Livro III, pag. 80-82),
entre três persas- Otanes, Megabises e Dario - sobre a melhor forma de
governo a adotar no seu país depois da morte de Cambises.”

“(...) A passagem é verdadeiramente exemplar porque, como veremos, cada


uma das três personagens defende uma das três formas de governo que
poderíamos denominar de “clássicas” - não só porque foram transmitidas pelos
autores clássicos mas também porque se tornaram categorias da reflexão
política de todos os tempos (razão porque são clássicas mas igualmente
modernas). Essas três formas são: o governo de muitos, de poucos e de um
só, ou seja, “democracia”, “aristocracia” e “monarquia”.”

“Otanes propôs entregar o poder (...): ‘minha opinião é que nenhum de nós
deve ser feito monarca’ (...). De que forma poderia não ser irregular o governo
monárquico se o monarca pode fazer o que quiser(...).”

"O governo do povo, porém, merece o mais belo dos nomes, ‘isotomia’; não faz
nada do que caracteriza o comportamento do monarca. Os cargos públicos são
distribuídos pela sorte; os magistrados precisam prestar contas do exercício do
poder; todas as decisões estão sujeitas a voto popular."

“Megabises, contudo, aconselhou a confiança no governo oligárquico:


subscrevo o que disse Otanes em defesa da abolição da monarquia; quanto à
atribuição do poder ao povo, contudo, seu conselho não é o mais sábio. A
massa inepta é obtusa e prepotente; nisto nada se lhe compara. De nenhuma
forma se deve tolerar que, para escapar da prepotência de um tirano, se caia
sob a da plebe desatinada. Tudo o que faz, o tirano faz conscientemente; mas
o povo não tem sequer a possibilidade de saber o que faz.”
“(...) quanto a nós, entregaríamos o poder a um grupo de homens escolhidos
dentre os melhores - e estaríamos entre eles. É natural que as melhores
decisões sejam tomadas pelos que são melhores.”

“Em terceiro lugar, Dario manifestou sua opinião (...). Entre as três formas de
governo, todas elas consideradas no seu estado perfeito, isto é, entre a melhor
democracia, a melhor oligarquia e a melhor monarquia, afirmo que a monarquia
é superior a todas. Nada poderia parecer melhor do que um só homem - o
melhor de todos; com seu discernimento, governaria o povo de modo
irrepreensível; como ninguém mais, saberia manter seus objetivos políticos a
salvo dos adversários.”

“Numa oligarquia, é fácil que nasçam graves conflitos pessoais entre os que
praticam a virtude pelo bem público (...) Por outro lado, quando é o povo que
governa, é impossível não haver corrupção na esfera dos negócios públicos, a
qual não provoca inimizades, mas sim sólidas alianças entre os malfeitores(...),
até que alguém assume a defesa do povo e põe fim às suas tramas, tomando-
lhes o lugar na admiração popular;(...) torna-se monarca.”

O capítulo apresenta uma discussão clássica sobre três teorias


políticas distintas, a democracia, a oligarquia e a monarquia.

Platão

“Em várias das suas obras Platão (428-347 a.C.) fala das diversas
modalidades de constituição.(...) O diálogo de A República é, como todos
sabem, uma descrição da república ideal, que tem por objetivo a realização da
justiça entendida como atribuição a cada um da obrigação que lhe cabe,
de acordo com as próprias aptidões. Consiste na composição harmônica e
ordenada de três categorias de homens – os governantes-filósofos, os
guerreiros e os que se dedicam aos trabalhos produtivos. Trata-se de um
estado que nunca existiu em nenhum lugar.(...)”

“Todos os estados que realmente existem, os estados reais, são


corrompidos – embora de modo desigual. (...)”

Diferentemente do capítulo anterior, onde eram expostos os lados


positivos e negativos dos assuntos, Platão sucede seqüenciais formas más, a
constituição boa não entra na sucessão, apesar de ela existir por si, como
modelo. As quatro consituições corrompidas que Platão examina são a
timocracia, oligarquia, democracia e tirania. A novidade então para o leitor é a
exposição de uma forma de governo que até agora não havia aparecido no
livro, a timocracia, que vem de honra. Seria uma forma introduzida por Platão
para designar a transição entre a consituição ideal e as três formas ruins
tradicionais. O exemplo dado pelo livro de governo timocrático é Esparta, onde
guerreiros eram honrados mais do que sábios.

Como já foi dito, para as representações tradicionais, há apenas um movimento


descendente: a timocracia é a degeneração da aristocracia, pressuposta forma
perfeita e assim se segue a degeneração. A pior forma seria a tirania, com a
qual o processo degenerativo chega ao ponto máximo.

“Cada um desses homens, que representa um tipo de classe dirigente, e


portanto uma forma de governo, é retratado de modo muito eficaz mediante a
descrição da sua paixão dominante: para o timocrático, a ambição, o desejo de
honrarias; para o oligárquico, a fome de riquezas; para o democrático, o desejo
de imoderado de liberdade (que se transforma em licença); para o tirânico, a
violência.(...)”

O autor nesse momento transcreve trechos da obra de Platão que


exemplificam os quatro tipos diferentes de homens. O timocrático, oligárquico,
democrático e tirânico. São diálogos que objetivamente atacam os sistemas de
governo no seu mal evidente.

“(...) a corrupção de um princípio consiste no seu “excesso”. A honra do


homem timocrático se corrompe quando se transforma em ambição imoderada
e ânsia de poder. A riqueza do homem oligárquico, quando se transforma em
avidez, avareza, ostentação despudorada de bens, que leva à inveja e à revolta
dos pobres. A liberdade do homem democrático, quando este passa a ser
licencioso, acreditando que tudo é permitido, que todas as regras podem ser
transgredidas impunemente.O poder tirano, quando se transforma em puro
arbítrio, e violência pela própria violência.”

O autor também transcreve um trecho da obra O Político, um pequeno


diálogo onde um filósofo comenta suas idéias sobre as três formas de governo
que na verdade apresentam-se em cinco.

“No que diz respeito á tipologia de A república, ela é menos original. Sua
única diferença, em comparação com a tipologia que se tornará clássica, a das
seis formas de governo- três boas e três más- é que em O Político a
democracia tem um só nome, o que não quer dizer que, diferentemente das
outras formas de governo, apresente um único modelo.(...)”

“(...) Platão coloca também o problema do confronto entre as várias


formas de governo, para avaliar se são relativamente mais ou menos boas (ou
más); e sustenta a tese de que, se é verdade que a democracia é a pior das
formas boas, é no entanto a melhor das más.(...)”

“Outra coisa a observar, (...) é o critério ou critérios com base nos quais
Platão distingue as formas boas das más.(...) veremos que esses critérios
são, em substância, dois: violência e consenso, legalidade e ilegalidade.
As formas boas são aquelas em que o governo não se baseia na violência, e
sim no consentimento ou na vontade dos cidadãos; onde ele atua de acordo
com leis estabelecidas, e não arbitrariamente.”

Ao fim do capítulo, o leitor percebe que para um melhor entendimento


da visão crítica de Platão sobre as formas de governo seria interessante a
leitura do livro onde ele expôs as suas teorias na íntegra. Entretanto, o resumo
explicativo de Bobbio é de grande ajuda para o esclarecimento rápido das
idéias platônicas sobre o assunto.

Aristóteles

“A teoria clássica das formas de governo é aquela exposta por


Aristóteles (384 – 322a.c.) na Política .” Esta obra está dividida em oito livros,
dedicados à descrição e classificação das formas de governo, origem do
Estado, crítica às teorias políticas precedentes, mudanças das constituições,
estudo das várias formas de democracia e oligarquia e as melhores formas de
governo.

“Um tema a respeito do qual Aristóteles não cessa de chamar a atenção


do leitor é o de que há muitas constituições diferentes(...)” Bobbio então cita um
trecho do sétimo livro de Política em que Aristóteles discorre sobre a teoria das
seis formas de governo. Então ele continua, “Com base no primeiro critério,
as constituições podem ser distinguidas conforme o poder resida numa só
pessoa (monarquia), em poucas pessoas (aristocracia) e em muitas (“politia”).
Com base no segundo [critério], as constituições podem ser boas ou más, com
a conseqüência que às três primeiras formas boas se acrescentam e se
contrapõem às três formas más (a tirania, a oligarquia e a democracia)” O
estranho para o leitor é que Aristóteles utiliza o termo politia para designar o
governo de muitos, mas anteriormente cita que politia significa constituição.
Entende-se então que politia é um termo genérico. Segundo Aristóteles,
constituição “é a estrutura que dá ordem à cidade, determinando o
funcionamento de todos os cargos públicos e, sobretudo, da atividade
soberana”.

A ordem hierárquica aceita por Aristóteles não difere da de Platão em


“O Político”. A axiologia aristotélica segue como: monarquia, aristocracia,
politia, democracia, oligarquia e tirania, em ordem decrescente. Novamente
vemos a democracia ocupando uma posição intermediária (assim como para
Platão), o que sugere que é a mais moderada.

Aristóteles analisa as seis formas de governo. Diz que as formas boas


são aquelas em que os governantes visam o interesse comum, já as más são
aquelas que os governantes visam o interesse próprio.

Bobbio dá uma atenção especial para o chamado despotismo oriental,


que é classificado como um tipo de monarquia, embora tirânico. É legítimo e
aceito pelos bárbaros. E uma vez que é aceita por todos, não pode ser
considerada tirania. Esse acolhimento deve-se ao fato dos orientais bárbaros
serem naturalmente servis.

O próximo enfoque do autor é a “politia”. Uma mistura de democracia e


oligarquia inclinada para a democracia. O que distingue uma forma de governo
de outra nesse caso não seria a quantidade de pessoas, mas sim a qualidade
de vida dos governantes. Quem exerce o poder também é importante para
diferenciar democracia e politia, na primeira os que governam são os pobres e
na última uma miscigenação entre ricos e pobres.

Essa junção de duas formas ruins, é o que faz a politia figurar entre
formas boas. A união dos ricos com os pobres possibilita que os segmentos
sociais discutam interesses e cheguem à decisões equilibradas, atingindo a
esperada paz social.

Aristóteles preocupa-se com o modo de fusão de dois regimes e


designa o assunto de engenharia política. Para isso, ele expõe uma série de
três passos fundamentais necessários para atingir o objetivo de chegar à uma
terceira forma de governo melhor que as outras duas: conciliar procedimentos
que seriam incompatíveis, adotar “meios-termos” entre as disposições
extremas dos dois regimes e recolher-se do melhor sistema legislativo.

“O princípio que inspira esse regime de ‘fusão’ é o da mediação – ideal


de toda a ética aristotélica, fundamentado, como se sabe, no valor
eminentemente positivo do que está no meio, situado entre dois extremos.”
“Em todas as cidades há três grupos: o muito ricos, muito pobres e os
que o ocupam uma posição intermediária. Como admitimos que a medida e a
mediania são a melhor coisa, em todas as circunstâncias, está claro que, em
matéria de riqueza, o meio-termo é a melhor das condições, porque nela é
mais fácil obedecer à razão.” Segundo o princípio da mediania quem melhor
governa é a classe média, pois ela é a que está mais distante do perigo das
revoluções, raramente acontecem conspirações e revoltas entre os cidadãos.

A “politia” é o ponto máximo do texto, pois é onde, no livro, dá início a


mistura de teorias de governo, um governo misto, que procura uma
aproximação da perfeição. A idéia de que o bom governo é a mistura de
diversas formas de governo é um dos grandes temas do pensamento político
ocidental. O livro continua com Políbio, cujo enfoque é sobre este governo
misto.

Políbio

Norberto Bobbio expõe basicamente as três teses de Políbio:

1. É o uso sistemático da teoria das formas de governo. Existem


fundamentalmente seis formas para se governar. Três boas e três más.

O Reino ou monarquia, onde um rei legítimo é aceito voluntariamente. A


Tirania, degenerada, onde um tirano governa com uso de terror e força. A
aristocracia, onde poucos eleitos os melhores dirigem o povo. A oligarquia,
forma degenerada onde os poucos que governam são os mais ricos. A
democracia, onde o governo é popular com tradição de respeito, obediência e
honra. E a última e degenerada oclocracia, onde o governo é da massa inepta.

2. Essas seis formas se sucedem umas às outras de acordo com


determinado ritmo, constituindo assim um ciclo, repetido no tempo. É a
anaciclose. O ciclo acontece da seguinte maneira: Reino > Tirania >
Aristocracia > Oligarquia > Oclocracia > Reino > Tirania... A passagem de uma
forma para outra parece de modo predeterminado, necessária e inderrogável.
Não pode deixar de sofrer este processo de transformação.

3. A tese principal da teoria polibiana das constituições é sem dúvida a de


governo misto. Políbio acredita na existência de uma sétima forma. É a
preferência do autor e se dá por uma constituição mista, uma síntese das três
formas boas de governo. Exemplificada pela constituição romana e pela de
Esparta. Para ele, todas as constituições simples acabam por serem todas
más, uma vez que tornam-se fracas a ponto de degenerarem e serem,
portanto, instáveis, contrariando o princípio que qualifica uma constituição, o
valor supremo da ordem. A teoria dos ciclos demonstra que as formas de
governo simples são instáveis e por isso são más. A presença simultânea dos
três poderes e seu controle recíproco preserva as constituições mistas da
degeneração a que estão sujeitos os governos simples, porque impede os
excessos.
Maquiavel

A primeira grande novidade no trabalho de Maquiavel já aparece nas


primeiras páginas da obra O Príncipe, onde ele diz: “Todos os Estados que
existem e já existiram são e foram sempre repúblicas ou monarquias”. A
república corresponde à democracia ou à aristocracia, a vontade coletiva
presente em uma pessoa jurídica, já a monarquia corresponde ao reino, a
vontade de um soberano, uma pessoa física. Para Maquiavel, a causa de não
haver formas intermediárias é que a falta de estabilidade sempre leva ao
caminho de uma das duas formas citadas, monarquia ou república.

Maquiavel discorre sobre a classificação dos principados (hereditários X


novos). A primeira distinção prevista no livro é a da hereditariedade dos
príncipes, os quais tiveram o poder transmitido com base em uma lei
constitucional de sucessão; e os principados novos, os quais conquistaram o
poder por quem ainda não era um “príncipe”.

Os novos principados são o assunto mais abordado em “O Príncipe”. Ele


distingue as quatro maneiras diferentes como o poder pode ser conquistado.
Pela virtu; fortuna; violência ou consentimento dos cidadãos. Os conquistados
pela virtu são mais duradouros do que os conquistados pela fortuna. Num certo
sentido, todos os príncipes novos são ilegítimos, visto que o poder não lhes foi
concedido e sim conquistado. Apesar disso, é visível a diferença na forma que
se conquistou esse poder. Entretanto, para Maquiavel, este príncipe ilegítimo
que conquista o poder por virtu, por exemplo, não tem conotação negativa e
são celebrados pelo mérito atingido.

Maquiavel parece se contradizer ao apoiar a teoria do governo misto.


Entretanto essa contradição pode ser entendida pelas diferenças entre o
Maquiavel historiador e político e o Maquiavel político, conselheiro de príncipes.
E ela pode ser explicada ao vermos que o importante é a estabilidade, e as
constituições intermediárias são instáveis, enquanto o governo misto seria e
equilibrado e, portanto, estável e duradouro.

Maquiavel comenta em uma de suas frases célebres que a diferença


entre dois príncipes consiste na crueldade bem ou mal empregada do príncipe.
Se for utilizada em benefício da estabilidade, então é bem utilizada. Já a má
utilização leva a um fim miserável. Enfim, os fins justificam os meios.

No livro Discorsi (Discursos sobre as primeiras décadas de Tito Lívio),


percebe-se uma semelhança muito grande com Políbio. Maquiavel, assim
como Políbio, elogia o governo misto, exaltando a constituição da república
romana. O equilibro dos três poderes, uma mistura estável resistente ao tempo.
Adota a tipologia clássica das seis formas de governo, a teoria dos ciclos e a
do governo misto. Entretanto, é possível distinguir as diferenças entre os
autores. Maquiavel também vê as formas simples como desvantajosas por
causa da instabilidade. Contudo, seria improvável a repetição infinita dos ciclos,
haja vista o enfraquecimento progressivo da sociedade, o que possivelmente
acarretaria em dominação estrangeira.
Bodin

Jean Bodin (1530 – 1596) escreveu a obra de teoria política mais ampla e
sistemática desde a “ Política ” de Aristóteles. Há diversas semelhanças entre
as duas obras, incluindo os temas abordados. Entretanto, Bodin apresenta
soluções diversas para os problemas.

Bodin passou para a história das formas de governo como teórico da


soberania. Para ele, a soberania significa o poder absoluto e perpétuo que é
próprio do Estado. Segundo Bodin, “Quem é soberano não deve estar sujeito,
de modo algum, ao comando de outrem; deve poder promulgar leis para seus
súditos, cancelando ou anulando as palavras inúteis dessas leis, substituindo-
as – o que não pode fazer quem está sujeito às leis ou a pessoas que lhe
imponham poder.”

Contudo, poder absoluto não quer dizer poder ilimitado. Essas leis que
regem o soberano são leis naturais e divinas. Outros limites impostos ao
soberano são as leis fundamentais do Estado, as hoje chamadas leis
constitucionais. Assim, o rei fica impossibilitado de se tornar um tirano. De
acordo com este pensamento, percebe-se em Bodin a preocupação com a
esfera pública e privada, nesta última, o soberano só poderá inferir caso tenha
um motivo-confisco legítimo ou para salvação estatal. É, também, o precursor
da divisão entre Estado e Governo.

Bodin acredita na existência de três formas de governo. As clássicas:


monarquia, aristocracia e democracia. Não acredita na forma mista e diz que
não se deve classificar entre formas boas e más porque essa distinção
causaria o surgimento de infinitas formas de governo. Afirma que se reunissem
as três formas de governo clássicas, o resultado não seria um governo misto, e
sim um governo da democracia. O porquê disso é que ou o povo não tem o
poder de legislar (neste caso seria aristocrático), ou este poder está com o
povo, formando um Estado democrático.

Através da sua distinção entre governo e Estado, Bodin afirma que as


três formas clássicas de Estado podem se combinar com as três formas
clássicas de Governo. Monarquia, Aristocracia e Democracia. Cruzando-as,
chegamos a 9 diferentes tipos. “Essa variedade de formas de governo tem
induzido alguns a erro, ‘levando-os a postular formas mistas de Estado’, sem
perceber que o governo de um Estado é coisa bem diferente da sua
administração e do modo de governá-lo”.

Essa distinção entre regime e governo, é útil para compreender a


realidade complexa dos Estados sem recorrer à teoria do governo misto, que
para Bodin, era pura ficção. Também permite compreender o fenômeno das
formas degeneradas, que representam não um vício da soberania em si
mesma, mas do seu exercício. Cada um dos regimes pode assumir três formas
diferentes: real, despótica e tirânica. A real corresponde ao respeito do
governante às leis da natureza e seus súditos; a despótica, o governante
assenhora os próprios súditos pela guerra justa e pelo direito das armas; e a
tirânica, o governante desrespeita as leis da natureza e abusa de seus súditos.
Para ele, a corrupção não afeta o Estado e sim o Governo.

Bodin defende a monarquia despótica justificada pela aquisição de


servos em “guerra justa”, quando um povo é conquistado por outro e tem a
escravidão como castigo ante a morte. Uma crucial diferença com a tirânica é
que a despótica é legítima, já a tirânica não.

Hobbes

“Como Bodin, Hobbes não aceita duas das teses que caracterizaram durante
séculos a teoria das formas de governo: a distinção entre as formas boas e
más e o governo misto.”

“Para Hobbes também, como para Bodin, o poder soberano é absoluto.


Se não fosse absoluto, não seria soberano(...)”

Entretanto, diferentemente do capítulo anterior, Hobbes não vê limites


para o poder do soberano, como as leis naturais e divinas. Ele não nega a
existência, mas afirma que não se trata de leis como as positivas, porque não
são aplicadas com a força de um poder comum. Ou seja, não há nada que o
obrigue a obedecer a essas leis. “O soberano é juiz da conduta de seus
súditos, mas a conduta do soberano é julgada por ele próprio.”. Hobbes nega a
diferenciação entre esfera pública e privada. “O direito de propriedade só existe
no Estado, mediante a tutela estatal; no estado de natureza os indivíduos
teriam um: ius in omnia – um direito sobre todas as coisas, o que quer dizer
que não teriam direito a nada, já que se todos têm direito a tudo, qualquer coisa
pertence ao mesmo tempo a mim e a ti. Só o Estado pode garantir, com sua
força, superior à força conjunta de todos os indivíduos, que o que é meu me
pertença exclusivamente, assegurando assim o sistema de propriedade
individual”.

Para Hobbes não se designam nomes diferentes versões boas e más


de cada governo, porque essas decisões são relativas de acordo com a opinião
que têm os cidadãos a respeito da pessoa dos governantes. Não há critério
objetivo para distinguir o rei do tirano.

Sobre a monarquia despótica, Hobbes instiga a pergunta de como se


diferenciar uma guerra justa de uma injusta? O que determina a justiça de uma
guerra é a vitória, o vitorioso. Esse domínio é alcançado quando o derrotado
declara que em trabalhará às ordens do vencedor em troca de sua vida.

“Por que os indivíduos deixam o estado da natureza e dão vida ao


estado civil com suas vontades concordes? A razão apresentada por Hobbes,
como se sabe, é que sendo o estado da natureza uma situação de guerra de
todos contra todos, nele ninguém tem garantia da própria vida: para salvar a
vida, os indivíduos julgam necessário assim submeter-se a um poder comum
suficiente para impedir o emprego da força particular.(...)”.
“Há quem estime necessária a existência de um poder soberano no
Estado, sustentando, contudo que esse poder se concentrasse nas mãos de
uma só pessoa, ou de uma assembléia, a conseqüência seria, para os demais,
“um Estado de opressão servil”. A fim de evitar esta degradação dos cidadãos
à situação de escravos do poder soberano, pensam que pode haver um Estado
composto das três formas de governo acima descritas, que seja contudo ao
mesmo tempo diferente de cada uma delas. Esta forma de Estado tem o nome
de monarquia mista, aristocracia mista ou democracia mista, segundo a forma
simples que nela predomine(...)”

Hobbes pensa que o poder do soberano não pode ser dividido, a não
ser pela sua destruição. A crítica ao governo misto é ao mesmo tempo uma
crítica à separação dos poderes.

Vico
Assim como Políbio, a teoria de Vico também é cíclica. As principais
categorias que Vico procura abranger são novamente as três formas clássicas
de governo: a aristocracia, a democracia e a monarquia; nessa ordem,
diferentemente da tradicional. Vico, se comparado aos autores passados,
possui visão progressista, do bom para o melhor, diferente de Platão.

“O governo aristocrático se baseia na conservação, sob a tutela da


ordem dos patrícios que o constituiu, sendo máxima essencial da sua política a
de que só a patrícios sejam atribuídos os auspícios, os poderes, a nobreza, os
conúbios, as magistraturas, comandados e sacerdócios... Constituem
condições do governo popular a paridade dos sufrágios, a livre expressão das
sentenças e o acesso igual para todos às honrarias, sem excluir as supremas...
O caráter do reino, ou monarquia, é o domínio por um só, a quem cabe o
arbítrio soberano inteiramente livre sobre todas as coisas”.

A tese de Vico, bastante conhecida, é de que o estado primitivo do


homem foi uma “forma bestial”. Uma ausência total de relações sociais,
completa inexistência de vida comum, inclusive familiar.

Vico distingue três tipos de autoridade, a monástia, econômica e civil. A


primeira fala sobre o homem primitivo, e fica assim caracterizada: “A primeira
autoridade jurídica que o homem teve na solidão pode ser chamada de
monástica ou solitária. Entendo aqui igualmente por solidão os lugares
freqüentados e os desabitados, desde que neles o homem assaltado e
ameaçado não possa recorrer às leis para sua defesa... Devido à sua
autoridade monástica, o homem se torna soberano na solidão(...)”.

Esse estado de natureza descrito por Hobbes é também aquele em que


cada um vive por sua conta, e precisa cuidar da própria defesa, pelo que
termina em uma guerra de todos contra todos. Para Vico, porém, o estado
bestial é histórico, para Hobbes trata-se de uma hipótese racional.
Entre o estado bestial e o estado de república, Vico considera que
houve um estado intermediário, o das famílias. A primeira forma de vida
associativa, que começa assim que o homem percebe um poder divino.

Para Vico, após a autoridade monástica, vem a econômica (fase das


famílias). Definida assim: “... nasceu a autoridade econômica, ou familiar, pela
qual os pais são soberanos em sua família. A liberdade dos filhos depende do
arbítrio dos pais, pelo que estes adquiriram o direito de vender os filhos... Os
pais têm tutela sobre os filhos como sobre sua casa e todas as suas coisas, de
que podem dispor em herança e deixar imperativamente a outrem. A passagem
termina assim: As famílias constituíram, assim, um primeiro e pequeno esboço
dos governos civis”.

“Com a primeira forma de Estado se origina, depois da autoridade


monástica e da econômica, aquela forma mais complexa e completa de
autoridade que Vico denomina de “autoridade civil”. A república aristocrática é
portanto a primeira forma histórica de autoridade civil. Nela, a condição de
desigualdade que justifica o domínio de uma parte sobre outra não é mais a
que separa os ‘patri’dos ‘famuli, mas a que divide os patrícios dos plebeus –
isto é, os que gozam de direitos privados e públicos e os que não têm um
estado jurídico definido.” Então vem a república popular, os fundadores do
Estado, união dos chefes de família.

Segundo Bobbio: “O fim da república popular, e a passagem à terceira


forma de Estado – o principado, ou monarquia – ocorre graças a razões não
diversas das apontadas pelos autores clássicos para explicar a morte natural
de todas as democracias, pela degeneração da liberdade em licenciosidade e
do antagonismo criativo na contenda destrutiva das facções, com guerra civil.
Para Vico o principado surge não contra as liberdades populares, mas para
protegê-las do faccionismo, para defender o povo – poder-se-ia dizer – contra
si mesmo”. Vico defende a monarquia como a evolução da república popular, a
própria república popular protegida contra seus males.

Montesquieu

Montesquieu, assim como Vico, procura a existência de leis gerais que guiam a
formação e o desenvolvimento da sociedade humana. A diferença reside no
fato de que Montesquieu, além do estudo nos estados europeus, também
estuda estados extra-europeus. Também estuda as leis ao longo da história,
entretanto, é sobretudo espacial ou geográfica. Está interessado pela
explicação da variedade das sociedades humanas e seus respectivos
governos, não só no tempo, mas no espaço.

Montesquieu afirma que todos os seres do mundo (inclusive Deus) são


governados por leis. Uma lei é enunciada sempre que há relações necessárias
entre dois seres, de modo que, dado um deles, não pode deixar de existir o
outro. A conseqüência disso tudo é que o mundo não é governado por uma
“cega fatalidade”.
“O mundo da inteligência está bem longe de ser tão bem governado
como o mundo físico”. Com essa frase, Montesquieu quer dizer que o fato de
que o homem se inclina, pela sua própria natureza, a desobedecer às leis
naturais, tem uma conseqüência que distingue nitidamente o mundo físico do
humano: para assegurar o respeito às leis naturais, o homem foram obrigados
a dar-se outras leis (positivas). Montesquieu diz: “De modo geral, a lei é a
razão humana enquanto governa todos os povos da terra; e as leis políticas e
civis de todas as nações não devem ser senão os casos particulares em que se
aplica essa razão humana.” A relação que existe entre lei natural e lei positiva é
como a que existe entre um princípio geral e suas aplicações práticas.

Montesquieu distingue três tipos de leis positivas: as que regulam as


relações entre grupos independentes, as que regulam as relações entre
governantes e as que regulam o relacionamento dos governados entre si.
Constituem, respectivamente, o direito das gentes (internacional), o direito
político (público) e o direito civil.

O objetivo de Montesquieu com sua obra “O Espírito das Leis” é


construir uma teoria geral da sociedade a partir da consideração do maior
número possível de sociedades históricas, é explicar a razão de tantas
sociedades diferentes, com leis positivas diferentes, culturas, ritos, costumes,
se as leis naturais são as mesmas. Os motivos que levam essa variedade de
leis positivas, segundo Montesquieu, são físicos, naturais, econômicos, sociais,
espirituais e/ou religiosos.

As sociedades são classificadas em três tipos de governo: república,


onde o povo detém o poder; monarquia, onde um só é responsável pelo poder,
mas é regido por leis; e o despotismo, onde uma só pessoa governa, sem leis.
Ele inova ao afirmar que o governo está formulado em dois planos. “A diferença
entre a natureza do governo e seu princípio é que a natureza o faz ser o que é,
e o princípio o faz agir. A primeira corresponde a sua estrutura particular; o
segundo, às paixões humanas que o fazem mover-se.”.

Assim como Platão, Montesquieu também tem os princípios que


inspiram cada uma das três formas. Para a Monarquia, a honra. Para a
República, a virtude cívica. Para o Despotismo, o medo.

A virtude para Montesquieu, é o amor da pátria e da igualdade, não


uma virtude moral ou Cristã. Mas política. A mola que impulsiona a República.
Ama-se a pátria como algo que é de todos. A honra entende-se o sentimento
que nos leva a executar uma boa ação exclusivamente pelo desejo de ter ou
manter uma boa reputação. É a mola que impulsiona a Monarquia. O medo do
despotismo é o sentimento humano de medo.

Montesquieu inclina-se para a monarquia. “O governo monárquico


apresenta uma grande vantagem com relação ao despótico. Como sua
natureza exige que o príncipe tenha debaixo de si diversas ordens relativas à
constituição, o Estado é mais resistente, a constituição mais inabalável, a
pessoa dos governantes mais segura.”.
Essa comparação entre despotismo e monarquia apresenta a
monarquia como a forma de governo em que já uma faixa de poderes entre os
súditos e o soberano: os “contrapoderes” que impedem o abuso, pelo monarca,
da sua própria autoridade.

O governo moderado de Montesquieu deriva da dissociação do poder


do soberano e da sua partição com base nas três funções fundamentais do
Estado: a legislativa, a executiva e a judiciária. Funções que devem ser
designadas para três pessoas diferentes. Ele afirma que a liberdade política se
encontra nos governos moderados.

Despotismo

O despotismo aparece pela primeira vez como preocupação com


Aristóteles. Montesquieu, por sua vez, trabalha com ela de uma forma
diferente, separada da monarquia e da república. Não mais como um gênero
da monarquia, como Aristóteles, Bodin e Maquiavel trabalharam. A diferença
entre despotismo e monarquia, para Montesquieu, está na distribuição dos
poderes, que existe nas monarquias, mas não nos regimes despóticos.
Montesquieu usa o conceito de escravidão política. Para ele, nos governos
despóticos a educação precisa ser servil, no estado despótico, as mulheres
não introduzem objetos de luxo, elas mesmas são esses objetos de luxo,
vivendo na condição de extrema escravidão. Por isso, em regimes despóticos,
onde há escravidão política, a escravidão civil é mais tolerável.

Entretanto, a escravidão é apenas um ponto de um conjunto de fatores


que distinguem o sistema despótico, como o clima, a natureza do terreno, a
extensão territorial, a índole dos habitantes, o tipo de leis, a religião, etc.
Montesquieu refere-se ao despotismo oriental, da Ásia, e diz que é onde ele
surge naturalmente.

Nicolas Antoine Boulanger propõe uma interpretação religiosa, teocrática


do despotismo. A origem de todos os males reside na teocracia, que tem
produzido no Oriente os governos despóticos.

Wittfogel faz uma comparação entre as sociedades policêntricas,


caracterizadas por tensão entre a sociedade civil e a instituição estatal e as
sociedades monocêntricas, marcadas pelo predomínio do Estado sobre a
sociedade. Também aborda temas tradicionais como o caráter absoluto e total,
a durabilidade, a sujeição total dos súditos ao soberano, o terror como
instrumento de domínio e o vínculo entre despotismo e teocracia.

Em todos os autores citados por Bobbio, o “despotismo oriental” é visto


como uma categoria negativa. Montesquieu diz “aqueles governos
monstruosos” ao fazer referência ao regime. Contudo, François Quesnay trata
o despotismo oriental de uma forma positiva, o chamado despotismo iluminado.
Diz que o único domínio que os homens devem aceitar é o da natureza. Essas
leis naturais, universais e necessárias que, muitas vezes, o homem não sabe
interpretar. A solução seria, necessariamente um príncipe que, iluminado pelos
sábios, as aplicasse.
As leis positivas impostas pela autoridade soberana, não são nada além de
projeções das leis naturais. Não devem ser leis constitutivas, mas declarativas.
Surge a figura do bom déspota, concentrando o máximo de poder em suas
mãos, ele pode restabelecer a ordem natural subvertida pelas leis positivas
inadequadas.

Dupont de Nemours vai contra Montesquieu ao afirmar que a autoridade


do soberano não deve ser dividida, seu argumento é de que a função da
autoridade é zelar por todos, enquanto cada um se ocupa dos seus próprios
negócios. Por isso, vê como absurda a idéia de várias autoridades. Nemours
defende que a única forma de governo válida é a monarquia hereditária, pois
só ela é genuinamente despótica.

Paul-Pierre Lê Mecier de la Rivière é quem expõe a idéia de bom


déspota de forma mias convicta. Para ele, a melhor forma de governo é “aquela
que não permite que se possa tirar vantagem de governar mal; que, ao
contrário, obriga quem governa a ter no bem governar seu maior interesse”.

“Há um despotismo legal, estabelecido natural e necessariamente com


base na evidência das leis de uma ordem essencial, e um despotismo
arbitrário, produzido pela opinião que se presta a todas as desordens, a todos
os excessos de que a ignorância o torna susceptível”.

Mably afirma que não se pode traçar uma distinção entre o despotismo
legal e despotismo arbitrário, o defeito do despotismo é a concentração do
poder nas mãos de um só. O único remédio para o despotismo é o governo
misto, o qual Montesquieu chamou de governo moderado. Deve existir um
controle recíproco que garanta a estabilidade ao governo e liberdade aos
cidadãos, por isso, a divisão da autoridade.

“Forma-se um governo misto a fim de que ninguém se ocupe com os próprios


interesses; para que todos os membros do Estado, obrigados a ajustar-se aos
interesses alheios, trabalhem para o bem público, a despeito das suas próprias
conveniências”.

Hegel

Encontramos em Vico e Montesquieu, respectivamente, a história e a


geografia para entendermos a concepção histórica das formas de governo.
Hegel faz uma espécie de síntese das duas.

Hegel explica que a história passou por três tipos diversos de bases
geográficas: o altiplano, grandes estepes e planuras na Ásia Central e nações
pastoris; a planície fluvial, regiões de solo fértil que levam à agricultura; e a
zona costeira, onde se desenvolveu uma inclinação para o comércio e novas
condições ao progresso civil e de riquezas.

Como se vê as atividades pastoris, agrícola e comercial representam às


três fases do desenvolvimento da sociedade humana, do ponto de vista
econômico, correspondem também às três regiões distintas do planeta. Além
disso, o fato que as três fases da civilização correspondem a três zonas
distintas da Terra demonstra que a evolução das sociedades não ocorre
apenas em momentos sucessivos do tempo e no mesmo espaço, mas
mediante um deslocamento de área em área. Essa evolução ocorre em uma
direção: para o Ocidente; assim a América é considerada por Hegel como “país
do futuro”.

A influência de Montesquieu sobre Hegel ultrapassa a concepção


geográfica do desenvolvimento histórico. Tem a ver com a própria tipologia das
formas de governo, são elas: o despotismo (oriental), a república (antiga) e a
monarquia (moderna).

Em seu livro “Lições de Filosofia da História”, Hegel afirma: “A história


universal é o processo mediante o qual se dá a educação do homem, que
passa da fase desenfreada da vontade natural à universal, e à liberdade
subjetiva. O Oriente sabia e sabe que um só é livre; o mundo grego e romano,
que alguns são livres; o mundo germânico, que todos são livres. Por isso, a
primeira forma que encontramos na história universal é o ‘despotismo’, a
segunda é a ‘democracia’ e a terceira é a ‘monarquia’”.

Para Hegel, todos os Estados do mundo percorreram as três formas de


governo. Primeiramente, o despotismo, instintivo; a segunda a república,
órgãos democráticos, Estado livre; a terceira, a monarquia, em que o rei
governa uma sociedade articulada em esferas relativamente autônomas. Essa
afirmação parece muito ser uma repetição de Montesquieu, mas existe uma
diferença fundamental: o critério usado para distinguir as três formas. Hegel
não usa mais o “quem e como”, e sim uma forma inovadora, a estrutura da
sociedade em seu conjunto.

“Entende-se que se cada forma de governo é a estrutura política de


uma sociedade bem determinada, cada sociedade possui sua própria
constituição – e não pode ter uma outra”.

“Este é o curso abstrato ‘mas necessário’ do desenvolvimento dos


Estados genuinamente autônomos, de modo que deve nele aparecer, cada
vez, uma constituição determinada que ‘não dependa de escolha’, mas seja ‘a
única adequada, em cada caso, ao espírito do povo’”.

Essa dependência do espírito do povo é o motivo por qual ele ataca


constantemente os iluministas, que acreditam que há uma constituição bela e
perfeita que pode ser imposta a povos diferentes. Hegel rejeita qualquer
discussão sobre a melhor forma de governo.

Pode surpreender o fato de que Hegel divide as diversas épocas


universais em quatro – e não mais em três: o mundo oriental, o helênico, o
mundo romano e o mundo germânico. Ele foi obrigado a isso pela reflexão
sobre a era imperial romana, que não encaixava na divisão antiga.
Por sua concepção dialética, Hegel considerava o movimento histórico
contínuo, e não cíclico. Todas as coisas estavam rigorosamente associadas ao
espaço geográfico e ao tempo histórico, de modo que não podiam repetir-se.
Sobre a quarta era, Hegel diz respeito à época imperial como uma grande
transição entre o fim do mundo antigo e o início do moderno.

Sobre a primeira época, o despotismo, corresponde ao mundo oriental.


Deslocando-se do Oriente para o Ocidente, os Estados despóticos são três: o
despotismo teocrático da China, a aristocracia teocrática da Índia e a
monarquia teocrática da Pérsia. Como se vê, o caráter determinante do regime
despótico é a teocracia.

“Hegel chama o mundo oriental de “era infantil da história”; com isso


quer dizer que na Idade do despotismo o homem ingressa pela primeira vez na
historia (antes do surgimento da primeira forma de Estado não há ainda
história, mas só pré-história). Contudo, embora sendo já um mundo histórico,o
universo do despotismo oriental ainda não apresenta um verdadeiro
desenvolvimento histórico, é um reino”

Antes o homem era natural, fora da história. Hegel afirma que esse
homem pré-histórico é o africano. Em sua obra, antes de citar o mundo ele
dedica algumas páginas à África afirmando que os negros são homens no
estado bruto, na sua total barbárie e, por conseguinte não possuem freios. O
que hoje pareceriam barbáries.

A tarefa que ele se propõe, j á que recusa a discussão de melhor forma


de governo, é entender a razão das formas de governo. Isso não impede que
ele defenda uma forma de Estado: a monarquia constitucional. Entretanto, em
várias oportunidades deixa transparecer que sua preferência pela monarquia
constitucional não se deve pelo motivo de que ela seja a melhor, mas aquele
que corresponde melhor ao “espírito do tempo”.

“Monarquia constitucional, única constituição racional/ Constituição a)


em grandes Estados, b) onde o sistema da sociedade civil já se desenvolveu/
Democracia em pequenos Estados.”. O fato dos Estados Unidos da América
ser um Estado grande e democrático, não era problema, pois, para Hegel, não
constituía uma sociedade civil, sendo um Estado em formação.
A monarquia constitucional seria a forma de excelência do Estado
Moderno.O aperfeiçoamento do Estado em monarquia constitucional é obra do
mundo moderno.

Feita a comparação da monarquia constitucional com as formas


clássicas de divisão das formas de governo, o critério de distinção é a
complexidade da sociedade. As formas clássicas só se adaptam às sociedades
mais simples; enquanto a monarquia constitucional, às mais complexas.

“O caráter distintivo da monarquia constitucional não reside no fato de


que governam um , poucos e muitos, em diferentes níveis, porém no fato, bem
mais substancial de que os poderes fundamentais do Estado estão divididos, e
são exercidos por diversos órgãos”
A Monarquia Constitucional

Este apêndice trata das relações entre Montesquieu e Hegel a respeito


da monarquia constitucional. A constituição monárquica que Hegel e
Montesquieu descrevem são muito diferentes das descritas anteriormente nas
formas clássicas de governo, elas são bem mais complexas e articuladas.
Verificando com uma postura moderna, Hegel e Montesquieu dizem a
monarquia constitucional ser a forma mais adaptada, enquanto as outras são
ineficientes, em vista da falta de articulação das formas clássicas.

A inovação de Hegel em com relação a Montesquieu, é a maneira de


considerar a sociedade moderna e suas articulações. Ele afirma que a vida
social se desenvolveu tanto que acabou se duplicando em dois aspectos que
se tornaram bem diferentes, a sociedade civil e o Estado. Isso significa que a
sociedade civil, de esfera privada, funciona com interesses que são próprios e
possui sistema autônomo devido à sua dependência recíproca e objetiva. Já o
Estado, funciona de modo de unidade política, onde as diferenças sociais são
articuladas e recompostas.

Para Hegel, como vimos, a monarquia constitucional é uma constituição


articulada, pois reflete a sociedade diferenciada, a sociedade moderna da
época. Montesquieu difere no ponto que tange a sociedade civil, que para ele,
não é vista separada do Estado e suas diferenciações também são distintas.

A divisão de classes é outro ponto em que há distinção, para Hegel, é


vertical, baseada em critérios socioeconômicos, já para Montesquieu é
horizontal, buscando a honra. Conclui-se, então, que a desigualdade vem das
particularidades de cada um e não de uma ordem anterior.

“O fato de que Montesquieu reconhece a honra como princípio da


monarquia decorre do fato de que ele tem em mente não a constituição
patriarcal ou antiga, em geral, nem a que se desenvolve com uma constituição
objetiva, ,as a monarquia ‘feudal’, enquanto as relações do seu direito interno
são concretizadas... em privilégios de indivíduos e de corporações.(...)
A idéia de liberdade é outro ponto de diferença entre os autores.
Enquanto para Hegel é levar uma vida universal, o cumprimento das leis, para
Montesquieu, é a ausência de opressão e dos abusos. Entretanto, os dois
percebem que a liberdade é conquistada mediante o Estado e suas leis. Para
Hegel, elas garantem o bem comum e para Montesquieu a garantia dos
privilégios.

Montesquieu pensa que a separação dos poderes é concebida como


um sistema de freios para manter o equilíbrio. Evitando assim que alguma
potência ( especialmente o rei) adquira poder grande suficiente para que
esvazie as prerrogativas e os privilégios de todas as outras. Já Hegel aceita o
princípio de divisão de poderes, tendo como o objetivo a liberdade pública.

“Dentro do modelo hegeliano, o princípio da divisão dos poderes


assume novo significado: não representa um artifício concebido para prevenir
os perigos dos abusos de poder, nem é algo de mecânico ou instrumental, mas
sim de orgânico.”

Os poderes compreendidos pelos dois também diferem: para Hegel, do


príncipe, do governo e legislativo. Já para Montesquieu, executivo, legislativo e
judiciário . O modelo de Hegel não foi o mais aceito. A teoria de Montesquieu
teve maior influência na história.

Marx

Este capítulo trata das concepções políticas no pensamento de Karl


Marx. Esse pensador nunca se preocupou com a distinção das formas
clássicas de governo. Um motivo que explica a falta de interesse de Marx por
isto é o fato de possuir uma concepção negativa do Estado. Pensamento que
contradiz diretamente Hegel, o qual considerava o Estado um momento
positivo na formação do homem, e mais do que isso, o caminho para a
perfeição.

A visão negativa de Marx sobre o Estado baseia-se em dois


argumentos principais, a consideração do Estado como pura e simples
superestrutura que reflete o estado das relações sociais determinadas pela
base econômica e a identificação do Estado como um aparelho de que se
serve a classe dominante manter o seu domínio, motivo pelo qual o fim do
Estado não é um fim nobre, como a justiça, a liberdade ou bem-estar. Por ter
uma concepção negativa do Estado, a diferenciação das formas de governo, a
distinção entre formas boas e más, perde importância, pois todas as formas
são más. O que realmente é importante para Marx, assim como para Engels, é
a relação de domínio entre classes. Nesse sentido, toda forma de governo é
despótica.

Marx identifica uma forma genuína de governo, distinta do Estado


representativo – o chamado bonapartismo. Como para ele, o Estado sempre
será a ditadura da classe mais poderosa, o bonapartismo não é diferente.
Quando classes antagônicas têm praticamente a mesma força, o poder estatal
assume função mediadora entre as classes, adquirindo uma “autonomia”.
Então, a burguesia para manter o seu poder social e econômico renuncia
momentaneamente ao poder político, até que a ordem seja restabelecida. Em
tempos de graves tensões sociais, esse é o único meio que dispõe a classe
dominante para manter intacto seu poder econômico e continuar a exploração
de outras classes. Neste Estado, haveria uma constante disputa entre
burguesia e proletariado. A função do poder estatal seria, portanto, mediar
esses conflitos. O bonapartismo é um modelo de governo em que há uma
inversão de papéis no Estado burguês. A novidade é que o poder executivo
torna-se mais importante que o legislativo.

Para Marx, a essência do Estado é o despotismo. Marx utiliza a palavra


“ditadura” como mesma denominação. Por isto, encontra-se expressões
famosas de Marx, como ditadura da burguesia e ditadura do proletariado. A
última, significa a essência de sua teoria, que resulta da luta de classes e é o
caminho para o comunismo – estágio perfeito e superior da sociedade.
Existe uma divisão da história da sociedade baseada na evolução das
relações de produção. Primeiramente, a sociedade seria escravista; logo em
seguida, feudal; depois, burguesa. Na seqüência, estaria destinada a tornar-se
socialista e, finalmente, comunista. Sempre é bom lembrar que a visão de Marx
cabia à Europa Ocidental, classificava o modo de produção asiático a parte,
sendo ele imutável.

O auge da sociedade seria o comunismo. Ele promete uma sociedade


sem classes, sem Estado, sem poder coator e opressivo, a substituição das leis
pelos costumes, liberdade e igualdade para todos.

“Dos três tipos de Estado que Marx enumera, só o terceiro – o Estado


Representativo – pode ser considerado como uma forma de governo. Os outros
dois – o Estado escravista e feudal - se caracterizam não pela forma de
governo (...) mas pelo tipo de sociedade que refletem, pelo tipo de relações de
produção, que como Estado, pretendem perpetuar.”

Marx foi muito influenciado pela Comuna de Paris, ele rasga elogios e
aponta certos pontos que seriam importantes à melhor forma de governo,
baseando-se no exemplo francês: a supressão dos chamados corpos
separados como o exército e a polícia; a transformação da administração
pública, da “burocracia” em corpos agentes responsáveis e demissíveis, a
serviço do poder popular; extensão do princípio da eletividade e, portanto, da
representação, sempre revogável, a outras funções públicas, como juiz;
eliminação do mandato imperativo, isto é, obrigação de os representantes
seguirem as instruções de seus eleitores sob pena de revogação do mandato e
amplo processo de descentralização, de modo a reduzir o mínimo o poder
central do Estado.

Percebe-se assim, que para Marx, a melhor forma de governo é aquela


que agiliza o processo de extinção do Estado. Essa melhor forma de governo,
a fase de transição, corresponde ao momento de transição, a ditadura do
proletariado.

A Ditadura

Como já visto, na linguagem marxista, ditadura é um sinônimo de


despotismo, tirania. Denomina-se como tal, um governo absoluto, exclusivo,
pessoal, moral e juridicamente condenável. Como exemplo, pode-se citar
ditaduras como o fascismo italiano, nazismo alemão, stalinismo, Pinochet no
Chile e os coronéis gregos.

O emprego de “ditadura” veio da Antiguidade clássica, do mundo


romano. Em Roma, o ditador era nomeado em circustâncias extraordinárias ,
por um dos cônsules, em casos de guerra ou rebelião e detinha poderes
extraordinários. A ditadura romana tinha as seguintes características: a) Estado
de necessidade, no que concerne à legitimação; b) Excepcionalidade dos
poderes, consistindo sobretudo na suspensão das garantias constitucionais
ordinárias; c) Unidade de comando (O ditador é sempre um indivíduo) d)
Caráter temporário da função.

Consegue-se diferenciar assim, ditadura, tirania e despotismo. Houve


em Roma, uma magistratura monocrática, uma vez que a verdadeira tirania
não faz uso da legitimação do poder. Não poderia ser chamada de despotismo,
que apesar de legítimo, não é temporário, pelo contrário. Por isso, o utilizamos
o termo ditadura, como poder legítimo, mas temporário.

A ditadura, portanto, era vista como forma positiva de governo, uma vez
que esse poder era limitado. Maquiavel ressalta ainda que o ditador tinha seu
poder limitado ao executivo, nada podia fazer sobrepondo-se ao Estado, ao
legislativo. Bodin também defende a ditadura, alegando que o ditador não era o
soberano, que na verdade era de quem o escolhia.

Rousseau diz que nem sempre a lei pode prever tudo, e sua suspensão
é justificada em certos casos. Neste momento, a ditadura é necessária para
manter a segurança pública. Rousseau ressalta o caráter temporário da
ditadura – em situações excepcionais – e a limitação do poder ditatorial ao
executivo, com o argumento de que o ditador pode fazer calar as leis, mas não
pode fazê-las falar.

Carl Schmitt chama a ditadura convencional de “comissária”, a que tem


o intuito de suspender a Constituição para defendê-la. Classifica, porém de
“soberana”, a ditadura que tem o intuito de alterar a constituição. Como
exemplo: a Revolução Francesa com a suspensão da Constituição de 1793,
que não voltou a vigorar. A ditadura soberana perde seu caráter monocrático,
como na ditadura jacobina, que foi representada por um comitê. E assim, inicia-
se o conceito marxista de ditadura do proletário ou da burguesia. Pois além de
ser representada inteiramente por uma classe social, o poder dessa ditadura é
de grande extensão, tomando parte do legislador também.

Caso seja feita uma análise do ponto de vista dos autores que defendem
a ditadura clássica, a ditadura soberana deveria ser chamada tirânica, devido
ao seu poder extraconstitucional e constituinte, e não mais constituído. Na
história da ditadura moderna há também o exemplo da Conspiração dos Iguais,
por Babeuf e Buonarroti. Eles pregavam um governo revolucionário de poucas
pessoas, como a ditadura soberana de Schmitt. O objetivo final era um
socialismo igualitário. Para isso, era necessário um período de ditadura para
que fosse estabelecida ordem até a instituição de um governo igualitário.

Ao final, conclui-se que para que se formasse uma nova constituição,


seria necessário um governo reformista ou revolucionário ditatorial.

PARA QUEM TIVER CURIOSIDADE


Napoleão Bonaparte (em francês: Napoléon Bonaparte, nascido Napoleone di
Buonaparte; Ajaccio, 15 de agosto de 1769 — Santa Helena,5 de
maio de 1821). Napoleão nasceu na Córsega, filho de pais com ascendência
da nobreza italiana e foi treinado como oficial de artilharia na França
continental foi um líder político e militar ascendente durante os últimos estágios
da Revolução Francesa.
Em 1799, liderou um golpe de Estado e instalou-se como primeiro cônsul.
Cinco anos depois, o senado francês o proclamou imperador. Adotando o
nome de Napoleão I, foi imperador da França de 18 de maio de 1804 a 6 de
abril de 1814, posição que voltou a ocupar por poucos meses em 1815 (20 de
março a 22 de junho).
Na primeira década do século XIX, o império francês sob comando de
Napoleão se envolveu em uma série de conflitos com todas as grandes
potências europeias, as Guerras Napoleônicas. Após uma sequência de
vitórias, a França garantiu uma posição dominante na Europa continental, e
Napoleão manteve a esfera de influência da França, através da formação de
amplas alianças e a nomeação de amigos e familiares para governar os outros
países europeus como dependentes da França. A Campanha da Rússia em
1812 marcou uma virada na sorte de Napoleão. Napoleão passou os últimos
seis anos de sua vida (1815-1821) confinado pelos britânicos na ilha de Santa
Helena.

Luís Napoleão Bonaparte, Príncipe Francês, Rei da Holanda, (2 de


Setembro de 1778 – 25 de Julho de 1846) era o irmão mais novo de Napoleão
Bonaparte. O começo da sua carreira foi passado no exército e ele serviu
juntamente com Napoleão no Egito. Graças a Napoleão, era um general já aos
25 anos de idade. Napoleão o elegeu rei da Holanda no dia 5 de
Junho de 1806. Napoleão III era seu filho.

Carlos Luís Napoleão Bonaparte (Paris, 20 de abril de 1808 - Chislehurst, 9


de janeiro de1873), também chamado Luís Napoleão, foi o
primeiro presidente - eleito por sufrágio universal masculino em 10 de
dezembro de 1848 com 74,33 % dos votos - e imperador de França, com o
título de Napoleão III. Presidente da França: 20 de dezembro de 1848 a 2 de
dezembro de 1852. Reinado: 2 de dezembro de 1852 a 4 de
setembro de 1870.

PARA QUEM TIVER CURIOSIDADE: A COMUNA DE PARIS


A população francesa já havia enfrentado, após a Revolução Francesa,
uma revolta em Fevereiro de 1848, responsável por destituir o "rei
burguês" Luís Filipe d'Orleans, dando fim à monarquia de Julho e instaurando a
Segunda República Francesa. Entretanto, após um golpe de estado por Luís
Bonaparte, conhecido como "O Outro 18 de Brumário", Bonaparte instaurou
o Segundo Império Francês e proclamou-se Napoleão III. No governo de
Napoleão III, a França envolveu-se em atritos constantes com a Prússia,
relacionados à sucessão espanhola (veja Guerra franco-prussiana). Napoleão
III declarou guerra à Prússia, mas esta venceu facilmente os franceses. O
imperador francês foi feito prisioneiro em Sedan. Com isso, foi proclamada
a Terceira República Francesa legitimando um governo provisório de defesa
nacional para o qual Louis Adolphe Thiers foi eleito presidente.
O Governo Provisório, com sede na prefeitura de Paris, iniciou um processo de
capitulação da França entregando a maior parte de seu exército permanente
bem como suas armas a contragosto da população parisiense. O único
contingente agora armado era a Guarda Nacional, formada em sua maior parte
por operários e alguns membros da pequena burguesia.
Convictos na resistência ao exército estrangeiro, a Guarda Nacional assaltou a
prefeitura e expulsou os membros da assembleia que se instalariam
em Versalhes. A administração pública de Paris agora se encontrava nas mãos
do Comitê Central da Guarda Nacional que manteria conversações com
Versalhes até 18 de março, quando o presidente Thiers mandou desarmar a
Guarda Nacional numa operação sigilosa durante a madrugada daquele dia.
Pegos de surpresa, a população parisiense expulsa o contingente de Thiers
dando início à independência política de Paris frente à Assembleia de
Versalhes culminando com a eleição e a declaração da Comuna em 26 e 28 de
março. Apesar da evidente disposição do povo parisiense em resistir,
a Assembleia de Versalhes acabou assinando a paz com os alemães.
O governo revolucionário foi formado por uma federação de representantes de
bairro (a guarda nacional, uma milícia formada por cidadãos comuns). Uma das
suas primeiras proclamações foi a "abolição do sistema da escravidão do
salário de uma vez por todas". A guarda nacional se misturou aos soldados
franceses, que se amotinaram e massacraram seus comandantes. O governo
oficial, que ainda existia, fugiu, junto com suas tropas leais, e Paris ficou sem
autoridade. O Comitê Central da federação dos bairros ocupou este vácuo, e
se instalou na prefeitura. O comitê era formado por Blanquistas, membros
da Associação Internacional dos Trabalhadores, Proudhonistas e uma
miscelânea de indivíduos não-afiliados politicamente, a maioria trabalhadores
braçais, escritores e artistas.
Eleições foram realizadas, mas obedecendo à lógica da democracia direta em
todos os níveis da administração pública. A polícia foi abolida e substituída pela
guarda nacional. A educação foi secularizada, a previdência social foi instituída,
uma comissão de inquérito sobre o governo anterior foi formada, e se decidiu
por trabalhar no sentido da abolição da escravidão do salário. Noventa
representantes foram eleitos, mas apenas 25 eram trabalhadores e a maioria
foi constituída de pequenos-burgueses. Entretanto, os revolucionários eram
maioria. Em semanas, a recém nomeada Comuna de Paris introduziu mais
reformas do que todos os governos nos dois séculos anteriores combinados.
O governo oficial, instalado em Versalhes e sob o comando de Thiers, fez a
paz com o Império Alemão para que tivesse tempo de esmagar a Comuna de
Paris. Como acordado entre os dois países, a Alemanha libertou prisioneiros de
guerra para compor as forças que o exército francês usaria contra a Comuna.
Esta possuía menos de 15 000 milicianos defendendo a cidade contra o
exército de 100 000 soldados sob o comando de Versalhes.
Assim como durante o período da comuna, em sua queda os revolucionários
destruíram os símbolos do Segundo Império Francês - prédios administrativos
e palácios - e executaram reféns, em sua maioria clérigos, militares e juízes.
Na perspectiva dos communards, derrubar a velha ordem e tudo que com ela
tinha vínculo era preciso para que novas instituições pudessem florescer.
A Comuna é considerada, por grupos políticos revolucionários posteriores
como a primeira experiência moderna de um governo popular.

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