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Edgard Leite

Prof. Dr. Adjunto de História da Antiguidade Oriental


Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Caderno de Documentos
para uso no curso de
História da Antiguidade Oriental
pág. 2

Sumário

1. A epopéia de Gilgamesh. 3

2. O Código de Hamurábi (cerca de 1780 a.e.c) 6

3. Alguns textos do antigo Egito. 11


3. 1. Trechos do Papiro Leiden 344 (escrito em torno de 1306-1186 a.C. , referindo-se a
acontecimentos passados em torno de 1991-1786 a.C.). 11
3. 2. Fragmentos dos “Textos dos Sarcófagos” (Tratam-se de encantamentos inscritos nos
sarcófagos e coletados por egiptólogos; foram redigidos em torno de 2040-1640 a.C.). 12
3. 3. Trechos do Papiro Lansing (escrito em torno de 1186-1070 a.C.; trata-se de uma cópia
feita por um estudante-escriba, como exercício). 12
3. 4. A descrição da mumificação por Heródoto (século V a.C.). 13

4. Textos do cristianismo primitivo. 14


4. 1. Trechos de “O “Pastor” de Hermas”. 14
4. 2. Carta de São Clemente às Virgens (século II) 15

5. Fragmentos de textos gnósticos. 15


5.1 Trechos do “Evangelho de Tomé”. 15
5.2 Trecho do “Fragmento gnóstico de Oxyrhynchus”. 16
5.3. Trechos do “Evangelho segundo Felipe”. 16
5.4 Trechos do “Discurso verdadeiro contra os cristãos” do filósofo neo-platônico Celso,
escrito entre 161 e 211. 16

6. Textos védicos. 18
6.1. Hino da Criação (Nasadya) ( Rig Veda, 10.129). 18
6.2. Purusha-Sukta, ou o Hino do Homem. (Rig Veda, 10.90). 18
6.3.Trechos do Brhadaranyaka Upanishad. 19

7. Texto budista. 19
7.1. Trechos do Agganna Sutta. 19
pág. 3

1. A epopéia de Gilgamesh.

Gilgamesh

O texto a seguir é um resumo. Entre aspas faço citações do texto original. Fragmentos desta
“epopéia” eram reproduzidos na Mesopotâmia desde o III milênio a.C., e a versão mais comple-
ta vem do século VII a.C., da biblioteca de Assurbanipal, rei da Assiria. Utilizei aqui a tradução
de Sandars, publicada em português pela Martins Fontes.

A epopéia de Gilgamesh (fragmento do Dilúvio)

“Proclamarei ao mundo os feitos de Gilgamesh. Eis o homem para quem todas as coisas eram
conhecidas; eis o rei que percorreu as nações do mundo. Ele era sábio, ele viu coisas misterio-
sas e conheceu segredos. Ele nos trouxe uma história dos dias que antecederam o dilúvio. Partiu
numa longa jornada, cansou-se, exauriu-se em trabalhos e, ao retornar, descansou e gravou na
pedra toda a sua história.
Quando os deuses criaram Gilgamesh, deram-lhe um corpo perfeito. Shamash, o glorioso sol,
dotou-o de grande beleza; Adad, o rei da tempestade, deu-lhe coragem; os grandes deuses tor-
naram sua beleza perfeita, superior à de todos os outros seres, terrível como um enorme touro
selvagem. (...) Gilgamesh correu o mundo, mas até chegar a Uruk, não encontrou quem pudesse
opor-se à força de seus braços. Entretanto, os homens de Uruk murmuravam em suas casas:
“Gilgamesh toca o sinal de alarme para se divertir; sua arrogância, de dia ou de noite, não co-
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nhece limites. Não há pai a quem tenha sobrado um filho, pois Gilgamesh os leva todos, até
mesmo as crianças; e, no entanto, um rei deveria ser um pastor para seu povo. Sua luxúria não
poupa uma só virgem para seu amado; nem a filha do guerreiro nem a mulher do nobre; no en-
tanto, é este o pastor da cidade, sábio, belo e resoluto”.
Os deuses escutaram o lamento do povo. (...) Depois de Anu ter escutado seu lamento, os deu-
ses gritaram para Aruru, a deusa da criação, “Vós o fizestes, oh, Aruru, criai agora outro igual,
que seja tão parecido com ele quanto seu próprio reflexo; que seja seu segundo eu, coração
tempestuoso com coração tempestuoso. Que eles se enfrentem e deixem Uruk em paz. A deusa
então concebeu em sua mente uma imagem cuja essência era a mesma de Anu, o deus do fir-
mamento. Ela mergulhou as mãos na água e tomou um pedaço de barro; ela o deixou cair na
selva, e assim foi criado o nobre Enkidu. (...) Ele tinha o corpo coberto por pelos emaranhados,
como os de Samuqan, o deus do gado. Ele era inocente a respeito do homem e nada conhecia do
cultivo da terra. Enkidu comia grama nas colinas junto com as gazelas e rondava os poços de
água com os animais da floresta; junto com os rebanhos de animais de caça, ele se alegrava com
a água. (...) Um caçador partiu para Uruk e se dirigiu a Gilgamesh, dizendo: “Um homem dife-
rente de todos os outros anda vagueando por nossos pastos; ele tem a força de uma estrela do
céu e tenho medo de aproximar-me dele...” (...) Gilgamesh disse: “Caçador, volta, leva contigo
uma prostituta, uma filha do prazer. “No poço ela se desnudará; ao vê-la acenando, ele a tomará
em seus braços e os animas da selva certamente passarão a repudiá-lo” (...)
Por dois dias o caçador e a prostituta ficaram esperando, mas no terceiro dia eles chegaram;
chegaram para beber água e Enkidu estava entre eles (...). O caçador disse à prostituta: “Lá esta
ele. Agora, mulher, desnuda teus seios, não tenha vergonha; anda, acolhe teu amor.(...)” (...) Ela
não teve pudores em tomá-lo em seus braços, ela se despiu e acolheu de bom grado o corpo
ávido de Enkidu. Ele se deitou sobre ela murmurando palavras de amor e ela lhe ensinou as
artes da mulher. Por seis dias e sete noites eles ali ficaram deitados, pois Enkidu se esquecera
de seu lar nas colinas; depois de satisfeito, porém, ele voltou para os animais selvagens. Mas
agora, ao vê-lo, as gazelas punham-se em disparada; as criaturas agrestes fugiam quando delas
se aproximava. Enkidu queria segui-las, mas seu corpo parecia estar preso por uma corda, seus
joelhos fraquejavam quando tentava correr, ele perdera sua rapidez e agilidade. (...) Enkidu
perdera sua força, pois agora tinha o conhecimento dentro de si e os pensamentos do homem
ocupavam seu coração. Então ele voltou-se e sentou-se ao pé da mulher (...) “Vamos mulher,
leva-me a esse templo sagrado, à casa de Anu e de Ishtar, ao lugar onde Gilgamesh domina e
governa seu povo. Eu audazmente o desafiarei (...)” Ela disse: “Vamos, e deixa que ele te veja o
rosto (...) Gilgamesh saberá de tua chegada através dos sonhos” (...)”
A seguir, na epopéia, são narrados os sonhos de Gilgamesh e a interpretação dada a eles, ou
seja, eles anunciavam a próxima chegada de Enkidu. Esta se dá quando Gilgamesh, para revolta
da cidade, ia exercer mais uma vez o seu direito à primeira noite, “primeiro o rei, depois o ma-
rido”. Enkidu invade Uruk e posiciona-se à porta do quarto onde a noiva esperava o rei. Gilga-
mesh e Enkidu se engalfinham “como touros”. Gilgamesh, no entanto, após destruir paredes e
portas, consegue submeter Enkidu. Apesar da vitória, a fúria de Gilgamesh desaparece e ambos
se tornam amigos. O conflito desperta Gilgamesh para o significado da vida e ambos conversam
longamente sobre o assunto:
“Gilgamesh continuou: “E que homem pode chegar ao céu? Somente os deuses vivem eterna-
mente na companhia do glorioso Shamash; nós, homens, temos os nossos dias contados. Nossos
trabalhos e empreendimentos são como um sopro de vento “”.
A seguir ambos, para realizar atos heróicos, partiram para enfrentar o gigante Humbaba, que é
morto. Gilgamesh recusa, então, uma proposta de casamento da deusa Ishtar que, tomada de
uma “implacável cólera”, pediu o touro do céu para punir Uruk e Gilgamesh. Anu concede a ela
o monstro, que foi conduzido pelo cabresto até Uruk. “Quando eles chegaram aos portões da
cidade, o touro dirigiu-se ao rio. Ele bufou uma vez e a terra abriu-se em fendas, engolindo a
vida de cem homens. Ele bufou uma segunda e mais fendas se abriram, levando a vida de du-
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zentos homens”. Enkidu e Gilgamesh atacaram o animal e o mataram, arrancando o seu coração
e oferecendo-o a Shamash. Os deuses, reunidos, decidem, no entanto, que em função da morte
de Humbaba e do touro do céu um dos dois, Enkidu ou Gilgamesh deveria morrer. Tirando-se a
sorte, cabe a Enkidu morrer. Este caiu doente, e agonizou até a morte. Gilgamesh então se a-
tormenta “por sete dias e sete noite ele chorou por Enkidu, até que os vermes tomaram-lhe o
corpo. Somente então Gilgamesh entregou Enkidu à terra, pois os Anunnaki, os juízes do mun-
do inferior, o haviam capturado.”
Continua o texto: “Gilgamesh chorou amargamente por seu amigo Enkidu. (...) Em sua tristeza,
ele gritou: “Como posso descansar, como posso ficar em paz? O desespero se instalou em meu
coração. Isso que meu irmão é agora o mesmo serei eu quando morrer. Por medo da morte farei
o possível para encontrar Utnapishtim, a quem chamam o longínquo, pois ele se juntou à as-
sembléia dos deuses”. Gilgamesh então correu o mundo selvagem; vagou pelos campos e pastos
numa jornada em busca de Utnapishtim, “a quem os deuses acolheram após o dilúvio e instala-
ram na terra de Dilmum, no jardim do sol; e somente a ele, entre todos os homens, os deuses
concederam a vida eterna.”.
(...) Finalmente Gilgamesh chegou a Mashu, as grandes montanhas que guardam o nascer e o
pôr do sol e sobre as quais ele havia ouvido muitas histórias. Seus picos são gêmeos e da altura
das muralhas do céu; suas encostas descem até o mundo inferior. Os Escorpiões vigiam suas
entradas. Eles são metade homem e metade dragão; sua fama inspira terror, seu olhar é mortal
aos homens e o brilho tremeluzente que deles emana varre as montanhas que guardam o nascer
do sol. (...)” Gilgamesh então pede autorização para, em nome de Enkidu, encontrar Utnapish-
tim e o segredo da vida eterna. “O homem escorpião abriu a boca e disse, falando a Gilgamesh:
“Nenhum homem nascido de mulher fez o que tu pedes, nenhum mortal jamais entrou na mon-
tanha. Ela se estende por doze léguas de escuridão; não há luz em seu interior e o coração se
sente oprimido pelas trevas (...)”. Gilgamesh implora que lhe seja permitido atravessá-la e o
homem escorpião afinal aceita: “Vai Gilgamesh, permitirei que atravesses a montanha de Ma-
shu e as elevadas cordilheiras; que teus pés te levem ao destino em segurança. O portão da
montanha está aberto”. Atravessando o túnel. Gilgamesh atinge o jardim dos deuses. “Por todos
os lados cresciam arbustos carregados de pedras preciosas”. Encontra então, numa praia, Siduri,
uma habitante do jardim. Gilgamesh se aproxima, mas ela se assusta, já que o herói tinha uma
aparência transtornada, pois tinha “o desespero no coração”. Ela tenta esquivar-se dele, mas ele
se identifica como Gilgamesh, que matou Humbaba e o touro do céu. Ela desconfia, já que tem
“as faces tão encovadas e o rosto tão abatido”. Mas Gilgamesh confirma: “E por que meu rosto
não haveria de estar encovado e abatido? Trago o desespero em meu coração; meu rosto lembra
o de alguém que chega de uma longa jornada e foi queimado pelo calor e pelo frio. Meu amigo,
meu irmão mais novo (...) Enkidu, a quem tanto amava, a morte o alcançou. Chorei por ele du-
rante sete dias e sete noites até um verme cair de seu nariz. Por causa do meu irmão tenho medo
da morte; por causa dele, vagueio pelas matas e não consigo descansar”. (...)
“Ela respondeu: “Gilgamesh, aonde te diriges, não acharás a vida eterna que buscas. Quando os
deuses criaram a humanidade, destinaram-lhe a morte, mantendo a vida eterna em suas próprias
mãos, Assim, Gilgamesh, que teu ventre esteja cheio, dia e noite goza a vida de todos os modos
possíveis. Cada dia trata de obter prazeres, dança e brinca dia e noite, usa roupas limpas, man-
tém tua cabeça lavada, banha-te com água, ama a criança que te segura a mão, e faze tua mulher
feliz com teu abraço, pois isto também é o destino do homem”. Gilgamesh, no entanto, insiste
em procurar Utnapishtim e encontra afinal um barqueiro, que aceita cruzar com ele o oceano
para o local onde estava Utnapishtim. Afinal, após muitas dificuldades, Gilgamesh chega aos
pés do “longínquo” e pede “Oh pai, Utnapishtim, tu que te juntaste à assembléia dos deuses,
desejo fazer-te algumas perguntas sobre os vivos e mortos: como encontrar a vida que estou
buscando?”
“Utnapishtim disse: “Não existe permanência. Acaso construimos uma casa para que fique de
pé para sempre, ou selamos um contrato para que valha por toda a eternidade? Acaso os irmãos
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que dividem uma herança esperam mante-la eternamente, ou o período de cheia do rio dura para
sempre? (...) Desde os dias antigos, não existe permanência. Como são parecidos os adormeci-
dos e os mortos, eles são como um retrato da morte. O que existe entre o servo e o senhor de-
pois de ambos terem cumprido seus destinos?” Utnapishtim conta então a Gilgamesh a história
do dilúvio, perpetrado pelos deuses, e do barco que ele Utnapishtim construiu para conduzir as
sementes das criaturas vivas. O dilúvio durou uma semana. O barco afinal encalhou e no sétimo
dia “eu soltei uma pomba e deixei que fosse”, mas ela retornou. Depois uma andorinha, que
também retornou, então um corvo que não retornou. Assim, por ter salvo a existência da huma-
nidade, Utnapishtim recebera a imortalidade dos deuses. “Quanto a ti, Gilgamesh, quem irá
reunir os deuses por tua causa, de maneira a poderes encontrar a vida que está buscando?”
Gilgamesh então, entristecido, adormeceu. Antes de iniciar a volta, no entanto, Utnapishtim
decide, apiedado, contar-lhe um segredo: “eu te revelarei um segredo, é um mistério dos deuses
que estou te revelando. Existe uma planta que cresce sob as águas; ela tem um espinho que
espeta como o de uma rosa. Ela vai ferir tuas mãos, mas, se conseguires pegá-la, terás então em
teu poder aquilo que restaura ao homem sua juventude perdida”.
Entusiasmado, Gilgamesh amarrou pedras aos seus pés e deixou que elas os arrastassem para o
fundo do canal mais profundo. “Lá ele encontrou a planta que crescia sob a água. Embora ela o
espetasse, Gilgamesh tomou-a nas mãos. Ele então cortou as pesadas pedras presas a seus pés e
as águas o carregaram, atirando-o à margem (...) “Eu a levarei a Uruk das poderosas muralhas.
Lá eu darei a planta aos anciãos para que a comam (...) E finalmente, eu mesmo a comerei e
recuperarei minha juventude perdida”. No entanto, no caminho de volta, Gilgamesh parou nu-
ma fonte para banhar-se; “nas profundezas do poço havia uma serpente e a serpente sentiu o
doce cheiro que emanava da flor. Ela saiu da água e a arrebatou; e imediatamente trocou de
pele e voltou para o fundo do poço. Gilgamesh então sentou-se e chorou. (...)”. Afinal ele retor-
na a Uruk, onde morre, após alguns anos. “(...) O destino decretado por Enlil da montanha, o
pai dos deuses, foi cumprido. (...) O destino se cumpriu; como uma gazela apanhada num laço,
como um peixe fisgado, ele jaz estirado sobre a cama. O desumano Namtar pesa sobre ele (...)
Oh Gilgamesh, senhor de Kullab, grande é a tua glória.”

2. O Código de Hamurábi (cerca de 1780 a.e.c)

Quando Anu o Sublime, Rei dos Anunaki, e Bel, o senhor dos céus e da terra, que decretaram o
destino da terra, assinalaram a Marduk, o todo-poderoso filho de Ea, deus de tudo o que é direi-
to, o domínio sobre a humanidade, fazendo dele grande entre os Igigi, eles chamaram a Babilô-
nia por seu nome ilustre, fizeram-na grande na terra, e fundaram nela um reino perene, cujas
fundações são tão sólidas quanto às do céu e da terra. Então, Anu e Bel chamaram por meu
nome, Hamurabi, o príncipe exaltado, que temia a deus, para trazer a justiça na terra, destruir os
maus e criminosos, para que os fortes não ferissem os fracos; para que eu dominasse os povos
das cabeças escuras e trouxesse esclarecimento à terra, para assegurar o bem-estar da humani-
dade. Hamurabi, o príncipe de Bel sou eu, chamado por Bel sou eu, fazedor e promovedor de
riquezas, que favorece Nipur e Dur-ilu, sublime patrono do E-kur; que restabeleceu Eridu e
purificou a adoração do E-apsu; que conquistou os quatro quadrantes do mundo, que fez grande
o nome da Babilônia, que alegrou o coração de Marduk, seu deus a quem diariamente presta
suas devoções no templo; (...) o claro, o Sábio, que ampliou os campos de Dilbat, que colheu as
colheitas por Urash; o poderoso, o senhor a quem o cetro e a coroa foram destinados, e que se
cobre com os trajes da realeza; (...) o príncipe puro, cuja prece é aceita por Adad; (...) o prínci-
pe sublime que faz a face de Nini brilhar; que apresentou refeições sagradas à divindade de
Ninazu, (...) o pastor dos oprimidos e dos escravos; (...); que reconhece o direito, que governa
pela lei, que devolveu à cidade de Assur seu deus protetor; que deixou o nome de Ishtar de Ní-
nive permanecer em E-mish-mish; o Sublime, que reverentemente se curva frente aos grandes
deuses; sucessor de Sumula-il; o poderoso filho de Sin-muballit; o escudo real da Eternidade; o
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poderoso monarca, o sol da Babilônia, cujos raios lançam luz sobre a terra da Suméria e Acá-
dia; o rei, obedecido pelos quatro quadrantes do mundo; Adorado de Nini sou eu. Quando Mar-
duk concedeu-me o poder de governar sobre os homens, para dar proteção de direito à terra, eu
o fiz de forma justa e correta... e trouxe o bem-estar aos oprimidos.

Código de Leis:

1. Se alguém difamar alguém, e não puder provar, então que aquele que difamou deve ser con-
denado à morte.
2. Se alguém fizer uma acusação, e o acusado for ao rio e pular neste rio, se ele afundar (isto é,
for culpado), seu acusador deverá tomar posse de sua casa. Se ele escapar sem ferimentos, o
acusado não será culpado, e então aquele que fez a acusação deverá ser condenado à morte,
enquanto que aquele que pulou no rio deve tomar posse da casa que pertencia a seu acusador.
3. Se alguém trouxer uma acusação de um crime frente aos anciãos, mas não trouxer provas, se
for pena capital, este alguém deverá ser condenado à morte. (...)
5. Um juiz deve julgar um caso, alcançar um veredicto e apresentá-lo por escrito. Se erro poste-
rior aparecer na decisão do juiz, e tal juiz for culpado, então ele deverá pagar doze vezes a pena
que ele mesmo instituiu para o caso, sendo publicamente destituído de sua posição de juiz, e
jamais sentar-se novamente para efetuar julgamentos.
6. Se alguém roubar a propriedade de um templo ou corte, ele deve ser condenado à morte, e
também aquele que receber o produto do roubo do ladrão deve ser igualmente condenado à
morte. (...)
9. Se alguém perder algo e encontrar este objeto na posse de outro: se a pessoa em cuja posse
estiver o objeto disser “um mercador vendeu isto para mim, eu paguei por este objeto na frente
de testemunhas" e se o proprietário disser "eu trarei testemunhas para que conheçam minha
propriedade", então o comprador deverá trazer o mercador de quem comprou o objeto e as tes-
temunhas que o viram fazer isto, e o proprietário deverá trazer testemunhas que possam identi-
ficar sua propriedade. O juiz deve examinar os testemunhos dos dois lados, inclusive o das tes-
temunhas. Se o mercador for considerado pelas provas um ladrão, ele deverá ser condenado à
morte. O dono do artigo perdido recebe então sua propriedade e aquele que a comprou recebe o
dinheiro pago por ela das posses do mercador. (...)
12. Se as testemunhas não estiverem disponíveis, então o juiz deve estabelecer um limite, que
expire em seis meses. Se suas testemunhas não aparecerem dentro de seis meses, o juiz estará
agindo de má fé e deverá pagar a multa do caso pendente. (...)
16. Se alguém receber em sua casa um escravo fugitivo da corte, homem ou mulher, e não vier à
proclamação pública na casa do governante local ou de um homem livre, o mestre da casa deve
condenado à morte.
17. Se alguém encontrar um escravo ou escrava fugitivos em terra aberta e devolve-los a seus
mestres, o mestre dos escravos deverá pagar a este alguém dois shekels de prata.
18. Se o escravo não der o nome de seu mestre, aquele que o encontrou deve trazê-lo ao palá-
cio; uma investigação posterior deve ser feita, e o escravo devolvido a seu mestre.
19. Se este alguém mantiver os escravos em sua casa, e eles forem pegos lá, ele deverá ser con-
denado à morte.
20. Se o escravo que ele capturou fugir dele, então ele deve jurar aos proprietários do escravo, e
ficar livre de qualquer culpa.
21. Se alguém arrombar uma casa, ele deverá ser condenado à morte na frente do local do ar-
rombamento.
22. Se estiver cometendo um roubo e for pego em flagrante, então ele deverá ser condenado à
morte.
23. Se o ladrão não for pego, então aquele que foi roubado deve jurar a quantia de sua perda;
então a comunidade deve compensá-lo pelos bens roubados. (...)
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25. Se acontecer um incêndio numa casa, e aqueles que vierem acudir para apagar o fogo estica-
rem o olho para a propriedade do dono da casa e tomarem a propriedade deste, essas pessoas
devem ser atiradas ao mesmo fogo que queima a casa. (...)
53. Se alguém for preguiçoso demais para manter sua barragem em condições adequadas, não
fazendo a manutenção desta: caso a barragem se rompa e todos os campos forem alagados, en-
tão aquele que ocasionou tal problema deverá ser vendido por dinheiro, e o dinheiro deve subs-
tituir os cereais que ele prejudicou com seu desleixo. (...)
108. Se uma dona de taverna não aceitar grãos de acordo com o peso bruto em pagamento por
bebida, mas aceitar dinheiro, e o preço da bebida for menor em dinheiro do que em grãos, ela
deverá ser condenada e atirada na água para se afogar.(...)
117. Se alguém não cumprir a demanda por um débito, e tiver de se vender, ou à sua esposa, seu
filho e filha por dinheiro ou tiver de dá-los para trabalhos forçados: eles deverão trabalhar por
três anos na casa de quem os comprou, ou na casa do proprietário, mas no quarto ano eles deve-
rão ser libertados. (...)
128. Se um homem tomar uma mulher como esposa, mas não tiver relações com ela, esta mu-
lher não será esposa dele.
129. Se a esposa de alguém for surpreendida em flagrante com outro homem, ambos devem ser
amarrados e jogados dentro da água, mas o marido pode perdoar a sua esposa, assim como o rei
perdoa a seus escravos.
130. Se um homem violar a esposa (prometida ou esposa-criança) de outro homem, ele deverá
ser condenado à morte, mas a esposa estará isenta de qualquer culpa.
132. Se o "dedo for apontado" para a esposa de um homem, mas ela não for pega dormindo com
outro homem, ela deve pular no rio por seu marido.
133. Se um homem for tomado como prisioneiro de guerra, e houver sustento em sua casa, mas
mesmo assim sua esposa deixar a casa por outra, esta mulher deverá ser judicialmente condena-
da e atirada na água.
134. Se um homem for feito prisioneiro de guerra e não houver quem sustente sua esposa, ela
deverá ir para outra casa, e a mulher estará isenta de toda e qualquer culpa.
135. Se um homem for feito prisioneiro de guerra e não houver quem sustente sua esposa, ela
deverá ir para outra casa e criar seus filhos. Se mais tarde o marido retornar e voltar à casa,
então a esposa deverá retornar ao marido, assim como as crianças devem seguir seu pai.
136. Se fugir de sua casa, então sua esposa deve ir para outra casa. Se este homem voltar e de-
sejar ter sua esposa de volta, a esposa não precisa retornar a seu marido.
137. Se um homem quiser se separar de uma mulher ou esposa que lhe deu filhos, então ele
deve dar de volta o dote de sua esposa e parte do usufruto do campo, jardim e casa, para que ela
possa criar os filhos. Quando ela tiver criado os filhos, uma parte do que foi dado aos filhos
deve ser dada a ela, e esta parte deve ser igual a de um filho. A esposa poderá então se casar
com quem quiser.
141. Se a esposa de um homem, que vive em sua casa, desejar partir e tentar arruinar a casa
deste homem, negligenciando-o, esta mulher deverá ser condenada. Se seu marido oferecer-lhe
a liberdade, ela poderá partir, mas ele poderá nada lhe dar em troca. Se o marido não quiser dar
a liberdade a esta mulher, esta deverá permanecer como criada na casa de seu marido.
142. Se uma mulher brigar com seu marido e disser "Você não é compatível comigo", as razões
do desagrado dela para com ele devem ser apresentadas. Caso ela não tiver culpa alguma e não
houver erro de conduta no seu comportamento, ela deverá ser eximida de qualquer culpa. Se o
marido for negligente, a mulher será eximida de qualquer culpa, e o dote desta mulher deverá
ser devolvido, podendo ela voltar para casa de seu pai.
143. Se deixar seu marido e arruinar a casa, negligenciando seu marido, esta mulher deverá ser
jogada na água.
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144. Se um homem tomar uma esposa e esta der ao seu marido uma criada, e esta tiver filhos
dele, mas este homem desejar tomar outra esposa, isto não deverá ser permitido, e que ele não
possa tomar uma segunda esposa.
145. Se um homem tomar uma esposa e esta não lhe der filhos, e a esposa não quiser que o
marido tenha outra mulher, se ele trouxer uma segunda esposa para a casa, a segunda esposa
não deve ter o mesmo nível de igualdade do que a primeira.
146. Se um homem tomar uma esposa e ela der a este homem uma criada que tiver filhos deste
homem, então a criada assume posição de igualdade com a esposa. Porque a criada deu filhos a
seu patrão, ele não pode vendê-la por dinheiro, mas ele pode mantê-la como escrava, entre os
criados da casa.
147. Se ela não tiver dado filhos a este homem, então sua patroa poderá vendê-la por dinheiro.
148. Se um homem tomar uma esposa, e ela adoecer, se ele então desejar tomar uma segunda
esposa, ele não deverá abandonar sua primeira esposa que foi atacada por uma doença, devendo
mantê-la em casa e sustentá-la na casa que construiu para ela enquanto esta mulher viver.
149. Se esta mulher não desejar permanecer na casa de seu marido, então ele deve compensá-la
pelo dote que ela trouxe consigo da casa de seu pai, e então ela poderá ir-se embora.
150. Se um homem der à sua esposa um campo, jardim e casa e um dote, e se após a morte des-
te homem os filhos nada exigirem, então a mãe pode deixar os bens para os filhos que preferir,
não precisando deixar nada para os irmãos do falecido.
151. Se uma mulher que viveu na casa de um homem fizer um acordo com seu marido que ne-
nhum credor pode prendê-la e ter um documento atestando este fato, se tal homem incorrer em
dívida, o credor não poderá culpar a mulher por tal fato. E se a mulher, antes de entrar na casa
deste homem, tiver contraído uma dívida, seu credor não pode prender o marido por tal fato.
152. Se após a mulher entrar na casa deste homem, ambos contraírem uma dívida, ambos de-
vem pagar ao mercador.
153. Se a esposa de um homem tiver matado por outro homem a esposa dele, os dois deverão
ser condenados à morte.
154. Se um homem for culpado de incesto com sua filha, ele deverá ser exilado.
155. Se um homem prometer uma donzela a seu filho e seu filho tiver relações com ela, mas o
pai também tiver relações com a moça, então o pai deve ser preso e atirado na água para se
afogar.
156. Se um homem prometer uma donzela a seu filho, sem que seu filho a conheça, e se ele a
deflorar, ele deverá pagar a ela ½ mina em outro, e compensá-la pelo que fez à casa do pai dela.
Ela poderá casar com o homem de seu coração.
157. Se alguém for culpado de incesto com sua mãe, ambos deverão ser queimados.
158. Se um filho for surpreendido por seu pai com a esposa de seu chefe, ele deverá ser expulso
da casa de seu pai.
159. Se alguém trouxer uma amante para dentro da casa de seu sogro, e, tendo pago o preço de
compra, disser para o sogro "Não quero mais sua filha", o pai da moça deverá ficar com todos
os bens que este alguém tenha trazido consigo.
195. Se um filho bater em seu pai, ele terá suas mãos cortadas.
196. Se um homem arrancar o olho de outro homem, o olho do primeiro deverá ser arrancado.
197. Se um homem quebrar o osso de outro homem, o primeiro terá também seu osso quebrado.
(...)
199. Se ele arrancar o olho do escravo de outro, ou quebrar o osso do escravo de outro, ele deve
pagar metade do valor do escravo.
200. Se um homem quebrar o dente de um seu igual, o dente deste homem também deverá ser
quebrado.
206. Se durante uma briga um homem ferir outro, então o primeiro deve jurar que "Eu não o
feri de propósito" e pagar o médico para aquele a quem machucou.
pág. 10

207. Se o homem morrer deste ferimento, aquele que o feriu deve proferir o mesmo juramento,
e se o falecido tiver sido um homem livre, deverá pagar ½ mina de ouro em dinheiro.
208. Se ele era um ex-escravo, ele deverá pagar 1/3 de uma mina.
209. Se um homem bater numa mulher livre e ela perder o filho que estiver esperando, ele deve-
rá pagar dez shekels pela perda dela. (...)
215. Se um médico fizer uma grande incisão com uma faca de operações e curar o paciente, ou
se ele abrir um tumor (em cima do olho) com uma faca de operações, e salvar o olho, o médico
deverá receber dez shekels em dinheiro.
216. Se o paciente for um liberto, ele receberá cinco shekels.
217. Se ele for o escravo de alguém, seu proprietário deve dar ao médico dois shekels.
218. Se um médico fizer uma larga incisão com uma faca de operações e matar o paciente, ou
abrir um tumor com uma faca de operações e cortar o olho, suas mãos deverão ser cortadas.
219. Se um médico fizer uma larga incisão no escravo de um homem livre, e matá-lo, ele deverá
substituir o escravo por outro.(...)
221. Se um médico curar um osso quebrado ou uma parte maleável do corpo humano, o pacien-
te deverá pagar ao médico cinco shekels em dinheiro.(...)
228. Se um construtor construir uma casa para outro e completá-la, ele deverá receber dois she-
kels em dinheiro por cada sar de superfície.
229 Se um construtor construir uma casa para outro, e não a fizer bem feita, e se a casa cair e
matar seu dono, então o construtor deverá ser condenado à morte.
230. Se morrer o filho do dono da casa, o filho do construtor deverá ser condenado à morte.
231. Se morrer o escravo do proprietário, o construtor deverá pagar por este escravo ao dono da
casa.
232. Se perecerem mercadorias, o construtor deverá compensar o proprietário pelo que foi arru-
inado, pois ele não construiu a casa de forma adequada, devendo reerguer a casa às suas pró-
prias custas.(...)
Epílogo das leis de justiça que Hamurabi, o rei sábio, estabeleceu. Uma lei de direito, estatuto
piedoso ele ensinou à terra. Hamurabi, o rei protetor sou eu. Não me eximi dos homens, quando
Bel me concedeu tal tarefa, com o poder que Marduk a mim concedeu, não fui negligente, mas
fiz deste um instrumento da paz. Expus todas as grandes dificuldades, fazendo a luz brilhar
sobre elas (...) Minhas palavras são tidas em alta conta; não há sabedoria que à minha se com-
pare. Pelo comando de Shamash, o grande juiz do céu e da terra, que a retidão se espalhe por
sobre a terra; por ordem de Marduk, meu senhor, que a destruição não toque meu monumento.
(...) Se um futuro monarca prestar atenção às minhas palavras, agora escritas, se ele não anular
minhas leis, nem corromper minhas palavras, nem mudar meu monumento, então que Shamash
aumente o reinado deste rei, assim como Ele fez de mim o rei da retidão, para que este monarca
reine com justiça sobre seus súditos. Se este governante não tiver em alta conta minhas pala-
vras, aquelas que escrevi, se ele desprezar as minhas maldições e não temer a cólera de Deus, se
ele destruir a lei que me foi dada, corromper minhas palavras, alterar meu monumento, apagar
meu nome, escrever seu nome no lugar do meu, ou não prestando atenção às maldições fazer
com que outro execute todas estas ações, este homem, não importa que seja rei ou governante,
sacerdote um leigo, não importa o que seja, que o grande Deus Anu, o pai dos deuses, que or-
denou que eu governasse, retire deste homem a glória da realeza, que Ele quebre o cetro deste
rei, e amaldiçoe seu destino. (...) Que Bel o amaldiçoe com as maldições poderosas de sua boca,
maldições estas que não podem ser alteradas.
pág. 11

O código de Hamurabi. No topo, representação do código sendo dado ao rei pelo deus Marduk.

3. Alguns textos do antigo Egito.

3. 1. Trechos do Papiro Leiden 344 (escrito em torno de 1306-1186 a.C. , referindo-se a


acontecimentos passados em torno de 1991-1786 a.C.).

“Os porteiros dizem: “-Vamos saquear!”... O aguadeiro recusa-se a carregar sua carga... os que
capturaram pássaros formaram-se em linha de combate. Os habitantes do Delta usam escudos...
Um homem vê seu filho como inimigo... o homem virtuoso anda de luto devido ao que aconte-
ceu no país... as tribos do deserto tornaram-se egípcias por toda a parte... em verdade os saque-
adores estão por toda parte, e o servidor leva o que acha. Em verdade, o Nilo inunda, mas nin-
guém toma o arado. Todos dizem: “-Não sabemos o que vai acontecer pelo país”.... Em verdade
homens pobres se tornaram donos de riquezas, e aquele que não podia fazer sandálias para si é
agora um possuidor de fortuna... Em verdade os nobres estão angustiados, enquanto o homem
pobre está cheio de alegria. Cada cidade diz: “-Acabemos com os poderosos entre nós!”. ... Em
verdade, escritórios públicos são abertos e seus inventários retirados; o servo tornou-se um
dono de servos. Em verdade escribas são mortos e seus escritos retirados. Ai de mim por causa
da miséria desta época! Em verdade, os escritos dos escribas do cadastro são destruídos e o
cereal do Egito é propriedade comum. Em verdade as leis do tribunal são jogadas fora, em ver-
dade os homens as pisoteiam nos lugares públicos, e homens pobres as destroem nas ruas....
Vede, coisas foram feitas que há muito não aconteciam; o rei foi deposto pela turba... Vede,
aconteceu que o país foi privado da realeza por alguns homens sem lei....”
pág. 12

3. 2. Fragmentos dos “Textos dos Sarcófagos” (Tratam-se de encantamentos inscritos nos


sarcófagos e coletados por egiptólogos; foram redigidos em torno de 2040-1640 a.C.).

Encantamento 472: Encantamento para fazer com que as shabtis trabalhem para seu dono no
reino dos mortos. Vede-o, ó deuses, espíritos e mortos que estais no céu e na terra, ele tomou
posse de sua força e de seu poder, ele tomou posse para si de seus tronos, ele veio para gover-
nar entre os rebanhos (de homens) que foram feitos para N (o nome do morto) de acordo com a
ordem dos deuses. Se N for escolhido para a remoção de um dique e para a nivelação de um
distrito de irrigação para irrigar as terras ribeirinhas e para remover novos campos para o mo-
narca reinante, vós direis a qualquer mensageiro que vier buscar N, no lugar dele: “-Vede, aqui
estou!”. Tomai então vossas picaretas, vossas enxadas, vossas varas e vossas cestas em vossas
mãos, exatamente como qualquer jovem faz para seu senhor. Ó shabtis feitas para N, se N for
escolhido para sua tarefa, ou se uma obrigação lhe for imposta como trabalhador, vós direis: “-
Aqui estamos!” Se N for escolhido para ser capataz daqueles que trabalham revolvendo novos
campos, plantando as terras ribeirinhas ou transportando areia que estava no leste para oeste e
vice-versa, vós direis quanto a isto: “-Aqui estamos!”.

3. 3. Trechos do Papiro Lansing (escrito em torno de 1186-1070 a.C.; trata-se de uma có-
pia feita por um estudante-escriba, como exercício).

Deixa-me também expor-te a situação do camponês, essa outra rude ocupação. Chega a inunda-
ção e o molha... ele cuida de seu equipamento. De dia ele talha seus instrumentos agrícolas; de
noite ele fabrica corda. Mesmo a sua hora da sesta ele gasta no trabalho agrícola. Ele se equipa
para ir ao campo como se fosse um guerreiro. O campo ressecado está diante dele; ele vai bus-
car sua junta de bois. Depois de ter procurado o pastor por muitos dias, ele obtém a junta e vol-
ta com ela. Ele se dirige a um lugar determinado no campo. Ao chegar a aurora, ele quer come-
çar e não encontra naquele lugar a junta. Passa três dias procurando-a; acha-a no pântano. Não
acha peles nos animais: os chacais os devoraram. Ele vai, com sua roupa na mão, implorar para
si uma junta de bois. Quando ele chega ao seu campo, encontra-o fendido, pelo calor. Leva
tempo cultivando, e a serpente o persegue. Ele esgota a semente atirando-a ao chão. Não vê
sequer uma folha verde. Ele ara e semeia três vezes com grão emprestado. Sua mulher procurou
os comerciantes e nada achou para trocar. Agora o escriba desembarca na margem. Ele mede a
colheita. Auxiliares estão atrás dele com varas, e núbios com porretes. Um deles lhe diz: “-
Entrega o cereal!” “-Não há!”. Ele é surrado sem piedade. Ele é amarrado, jogado ao poço, com
a cabeça debaixo da água. Sua mulher é atada em sua presença. Seus filhos estão em grilhões.
Seus vizinhos os abandonam e foge. Ao terminar tudo, não há cereal. Se tens algum juízo, sê
um escriba. Se aprendeste acerca do camponês, não quererás sem como ele. Toma nota disto!
pág. 13

O escriba sentado (cerca de 2563 – 2423 a.c.)

3. 4. A descrição da mumificação por Heródoto (século V a.C.).

Livro I, capítulo 85: Eis aqui o seu (dos egípcios) luto e as suas cerimônias fúnebres: na família
que perde um homem de alguma importância, todas as mulheres da casa cobrem de barro sua
cabeça ou mesmo o rosto; a seguir, deixam o cadáver em casa e percorrem a cidade correndo,
golpeando o próprio peito, com o seio nu, a roupa enrolada, retida por um cinto; todas as suas
familiares de juntam a elas. Os homens se golpeiam e se lamentam por sua vez, de maneira
semelhante. Feito isto, o corpo é levado para que o embalsamem. Capítulo 86: Existem pessoas
especialmente encarregadas desse trabalho, sendo sua profissão. Quando um cadáver é-lhes
trazido, eles mostram a seus clientes modelos de corpos preparados, feitos de madeira e pinta-
dos com grande minúcia e exatidão. O modelo mais cuidado representa, dizem, aquele cujo
nome seria sacrilégio pronunciar em se tratando de semelhante assunto (Osiris). Mostram em
seguida o segundo modelo, menos caro e menos cuidado, depois o terceiro, o menos caro de
todo. Pedem, então, que os clientes escolham o processo de embalsamamento que deverá apli-
car-se ao seu morto. A família combina o preço e se retira. Os embalsamadores, sozinhos em
suas oficinas, procedem assim, se se tratar do processo mais cuidado: antes de mais nada, utili-
zando um gancho de ferro, retiram o cérebro pelas narinas; uma parte dele é extraída assim, o
resto, mediante a injeção de certas drogas no crânio. Depois com uma lâmina cortante de pedra
da Etiópia (uma faca de obsidiana), fazem uma incisão de um lado do ventre, assim retirando
todas as vísceras, limpam a cavidade abdominal e a purificam com vinho de palmeira (de tâma-
ras), em seguida com substâncias aromáticas pulverizadas. O passo seguinte consiste em reche-
ar o ventre com mirra pura em pó, canela e todas as substâncias odoríferas que conhecem, com
exceção do incenso, antes de cosê-lo. O corpo é então salgado, cobrindo-o de natrão durante
setenta dias, tempo que não deve ser ultrapassado. Passados estes dias, lavam o corpo e o enro-
lam inteiro em tiras cortadas num tecido muito fino de linho, embebidas da goma de que os
egípcios se servem em lugar de cola (trata-se de goma fabricada com a resina da acácia). Os
parentes então recebem o corpo de volta e o depositam num cofre de madeira feito especial-
mente, talhado na forma humana; e então, conservam cuidadosamente tal cofre numa câmara
funerária, onde o instalam de pé, encostado numa parede. Capítulo 87: O anterior é o processo
mais caro. Para quem pedir o embalsamamento de custo médio, não querendo gastar demais, eis
como se procede: os embalsamadores enchem seringas com um azeite extraído do cedro e tal
líquido é injetado no ventre do morto, sem cortá-lo nem retirar as vísceras; tendo injetado o
pág. 14

líquido em questão pelo ânus, tratando de impedir que saia (ou seja, arrolhando o ânus), salgam
o corpo durante o tempo necessário. No último dia, deixam sair do ventre o azeite ali introduzi-
do: tal líquido tem tal força que dissolve os intestinos e as vísceras, trazendo-os consigo. Por
sua parte, o natrão dissolve as carnes, restando do cadáver unicamente a pele e os ossos. Por
fim, os embalsamadores devolvem o corpo, sem consagrar-lhe mais cuidados. Capítulo 88: Eis
aqui o terceiro método de embalsamamento, para os mais pobres: os intestinos são limpos com
o extrato de uma planta, o corpo é salgado durante os setenta dias prescritos, depois o devolvem
e os parentes o levam. Capítulo 89: As mulheres das pessoas importantes não são, ao morrer,
entregues imediatamente para embalsamar, nem as mulheres muito belas ou de grande reputa-
ção; espera-se o tempo de dois ou três dias antes de confiá-las aos embalsamadores. Isto, para
evitar que abusem do cadáver; pois um deles, segundo se conta, foi surpreendido enquanto abu-
sava do corpo de uma mulher recém falecida e denunciado por um colega.

Anúbis, pesando a alma do falecido.

4. Textos do cristianismo primitivo.

4. 1. Trechos de “O “Pastor” de Hermas”.

Quinta visão. Estando em oração na minha casa e sentado sobre a cama, entrou um homem com
um aspecto glorioso, com roupa de pastor, vestido com uma pele branca, uma bolsa pendurada
às costas e um cajado na mão. Saudou-me e eu lhe devolvi a saudação. 2. Sentou-se então ao
meu lado e me disse: “Fui enviado pelo anjo santíssimo para estar contigo todo o resto dos dias
da sua vida”. E suspeitei que me estava tentando e assim lhe disse: “Porém tu, quem és?” (...) E
ele me disse: (...) “Pois eu sou o Pastor a quem foste entregue” (...) “Escuta agora”, me disse, “
sobre a Fé. Dois anjos existem em cada homem: um é o da justiça, o outro é o da maldade (...)
O anjo da justiça é delicado, e pudico, e manso e tranqüilo.. Assim, quando subir ao seu cora-
ção este anjo, imediatamente se porá a falar contigo sobre a justiça, a castidade, a santidade,
sobre toda obra justa e sobre toda virtude gloriosa. Quando estas coisas subirem ao seu coração,
entende que o anjo da justiça está contigo. (...) Observe também as obras do anjo da maldade.
Acima de tudo este anjo é impaciente, amargo e insensato e suas obras más, que derrubam os
servos de Deus.(...)”. (in BUENO, Daniel Ruiz (ed.): Padres apostólicos. Madrid, B.A.C., 1985.
pp.937-1092)
pág. 15

4. 2. Carta de São Clemente às Virgens (século II)

“Deseja ser virgem. Mas já pensou de quanto trabalho e dor é feita a verdadeira virgindade,
aquela que assiste se forma perseverante diante de Deus todo tempo e não se aparta dele e está
solícita de como pode agradá-lo com corpo e espírito casto? Já pensou em quanta glória está
contida na virgindade e por isso age assim? Já pensou, eu pergunto, e entende o que quer fazer?
Já pensou sobre o sublime ofício da santa virgindade? Compreendeu, e por isso escolhe, em
fortaleza de espírito, a descer legitimamente a este estado e lutar nele para ser coroado com
coroa de luz e ser levado triunfante pela Jerusalém celeste? Se tudo isso deseja, vença o corpo,
vença os prazeres da carne, vença o mundo no espírito de Deus, vença estas coisas vãs do sécu-
lo presente, que passam, se desfazem e corrompem e acabam; vença o dragão, vença o leão,
vença a serpente, vença a satanás por meio de Jesus Cristo, que há de te fortalecer pela audição
de suas palavras e pela divina Eucaristia. Toma sua cruz e segue aquele que lhe limpou (...)
Compreende agora, e percebe quão honrosa coisa é a virgindade? Compreende quão grande,
quão excelente seja a glória da virgindade?”(in: BUENO, Daniel Ruiz (ed.): Padres Apostólicos
Madrid, Biblioteca de Autores Cristianos, 1985. p.273).

5. Fragmentos de textos gnósticos.

5.1 Trechos do “Evangelho de Tomé”.

“Eis as palavras secretas ditas por Jesus, o Vivente, escritas por Judas Tomé. 1. E ele disse:
“Aquele que encontrar a interpretação destas palavras não provará a morte”. (Jo 8,51,52) 2.
Jesus disse: “Aquele que procura não deixe de procurar até encontrar; quando encontrar, ele se
perturbará; depois de se perturbar, ficará maravilhado e reinará sobre o Todo”. (Mt 7,7-8) 3.
Jesus disse: “Se aqueles que vos guiam dizem: ‘Eis, o Reino está no céu’, então os pássaros do
céu vos ultrapassarão; se eles vos dizem que está no mar, então os peixes vos ultrapassarão.
Pois bem, o Reino está em vosso interior, mas também está em vosso exterior. Quando vós vos
conhecerdes, então sereis conhecidos e sabereis que sois filhos do Pai Vivente. Mas se vós não
vos conheceis, então estareis na pobreza e sereis a própria pobreza”. (Lc 17,21) (...) 5. Jesus
disse: “Conhece aquele que está diante de ti e aquele que se te ocultava te será revelado, pois
não há nada de oculto que não se manifeste”. (Mc 4,22) (...) 10. Jesus disse: “Eu lancei um fogo
sobre o mundo e eis que eu o guardo até que o mundo queime”. (Lc 12,49) (...) 13. Jesus disse
aos seus discípulos: “Comparem-me: digam-me a quem me assemelho”. Simão Pedro disse-lhe:
“Tu te assemelhas a anjo justo” . Mateus lhe disse: “Tu te assemelhas a filósofo prudente”.
Tomé lhe disse: “Mestre, minha boca não aceitará de modo algum dizer a quem te assemelhas”.
Disse-lhe Jesus: “Eu não sou teu Mestre, porque tu bebeste, tu te embriagaste na fonte borbu-
lhante que eu fiz brotar”. E, pegando-o, se retira e lhe diz três palavras. Ora, quando Tomé vol-
tou para junto de seus companheiros, eles lhe perguntaram: “O que te disse Jesus”? E Tomé
respondeu: “Se eu vos disser uma só das palavras que ele me disse, vós pegareis pedras e as
lançareis sobre mim e fogo brotará das pedras e vos queimará.” (Mt 16, 13-16). (...) 20. Os dis-
cípulos disseram a Jesus: “Dize-nos a que se assemelha o Reino dos céus”. Ele lhes disse. “Ele
se assemelha a um grão de mostarda, a menor de todas as sementes. Mas, quando cai em terra
cultivada, dá grande ramo e torna-se refúgio para os pássaros do céu. (Mt 13, 31-32) (...) 22.
Jesus viu umas crianças que estavam sendo amamentadas e disse a seus discípulos: “Essas cri-
anças que estão sendo amamentadas se parecem com aqueles que entram no Reino”. Eles lhe
disseram: “Podemos nós, fazendo-nos pequenos, entrar no Reino?” Jesus disse: “Quando fordes
capazes de fazer de duas coisas uma, e de configurar o interior com o exterior, e o exterior com
o interior, e o de cima com o de baixo, e de reduzir à unidade o masculino e o feminino, de
maneira que o macho deixe de ser macho, e a fêmea deixe de ser fêmea, quando fizerdes olhos
em lugar de um olho e uma mão em lugar de uma mão e um pé em lugar de um pé e uma ima-
pág. 16

gem em lugar de uma imagem, então poderão entrar no Reino”. (Mt 18, 1-3) (...) 29. Jesus dis-
se: “É maravilha que a carne tenha vindo à existência por causa do espírito; e maravilha das
maravilhas que o espírito tenha vindo à existência por causa do corpo. Mas eu me maravilho
muito mais disto: como é que essa grande riqueza pode habitar nesta pobreza? (...) 77. Jesus
disse: “Eu sou a luz que está sobre todos eles. Eu sou o Todo: o Todo saiu de mim e o Todo
chegou até mim. Se rachardes a madeira, eu estarei lá; se erguerdes a pedra, lá me encontra-
reis”. (Jo 8, 12)”

5.2 Trecho do “Fragmento gnóstico de Oxyrhynchus”.

“Os discípulos: “Como, pois, vamos encontrar a Fé?” Disse o Salvador: “Passando da escuri-
dão à luz das visões; e esta emanação da inteligência os fará ver como se pode encontrar a fé
clara do Pai que não teve pai. O que tiver ouvidos para ouvir que ouça. O Senhor de tudo não é
o Pai, mas o Progenitor. Pois o Pai é o princípio somente das coisas futuras, mas o pai Dele é
Deus, o progenitor de todas as coisas desde sua origem em diante...” (in OTERO, Aurélio de
Santos (ed.): Los evangelios apócrifos. Madrid, B.A.C., 1988. Pp.79)

5.3. Trechos do “Evangelho segundo Felipe”.

“10. A luz e as trevas, a vida e a morte, os da direita e os da esquerda são irmãos entre si, sendo
impossível separar uns dos outros. Por isso, nem os bons são bons, nem os maus são maus, nem
a vida é vida, nem a morte.. Assim, que cada um virá a dissolver-se em sua própria origem des-
de o princípio; porém os que estão acima do mundo são indissolúveis e eternos (...)
71.Enquanto Eva estava dentro de Adão não existia a morte, mas quando se separou dele veio a
morte. Quanto esta retorne e ele a aceite, deixará de existir a morte” (in OTERO, Aurélio de
Santos (ed.): Los evangelios apócrifos. Madrid, B.A.C., 1988. pp.715-747).

5.4 Trechos do “Discurso verdadeiro contra os cristãos” do filósofo neo-platônico Celso,


escrito entre 161 e 211.

“1. Existe uma raça nova de homens nascidos ontem, sem pátria nem tradições, associados
entre si contra todas as instituições religiosas e civis, perseguidos pela justiça, universalmente
cobertos de infâmia, porém autoglorificando-se na sua comum execração: são os cristãos. En-
quanto as sociedades autorizadas e organizações tradicionais se reúnem abertamente e à luz do
dia, eles mantêm reuniões secretas e ilícitas para ensinar e praticar suas doutrinas. Se unem
entre si por um compromisso mais sagrado do que um juramento e assim permanecem agrega-
dos para conspirar com mais segurança contra as leis e assim resistir mais facilmente aos peri-
gos e aos suplícios que os ameaçam.
2. Sua doutrina tem uma origem bárbara. Não é que pensemos em colocar isso como uma falta
ou delito: os bárbaros, certamente, são capazes de inventar dogmas; porém a sabedoria bárbara
vale pouco em si mesma, se não a corrige, depura e culmina o logos ou a razão grega, da qual
Roma se sente herdeira (...)
14. [O nascimento de Cristo, suas ações e sua vida] não são próprias de um Deus, mas de um
homem odiado pelos deuses (...)
39. Escutem aos seus doutores: “Os sábios repudiam os nossos ensinamentos, ensoberbados e
impedidos como estão por sua própria sabedoria”. Que homem, em são juízo, pode deixar-se
captar por doutrina tão ridícula? Basta contemplar a multidão que a abraça para depreciá-la. Os
mestres dos cristãos não buscam nem encontram discípulos, senão entre homens sem inteligên-
cia e de espírito obtuso. (...) Não se diria que estão ébrios aqueles que, entre si, acusam as pes-
pág. 17

soas sóbrias de estarem ébrias, ou míopes aqueles que querem persuadir outros míopes que
aqueles que vêem na verdade não vêem nada? (...)
50. O mundo visível não foi ordenado para o homem. Todas as coisas nascem e perecem para o
bem comum do todo, por uma incessante transformação dos elementos. Sendo o mundo cons-
tante a soma de males, não há motivo para que Deus intervenha para corrigir sua obra. Não é
certo que o que pareça um mal o seja efetivamente, porque não sabemos se não é útil, ou se é
bem para alguma outra pessoa, ou bem ao conjunto do cosmos.
51. Para quem conhece essa ordem universal (...), haverá algo mais divertido que as concepções
antropomórficas dos judeus e dos cristãos, que atribuem a Deus seus sentimentos, e a lingua-
gem cheia de inventivas de um homem irascível? E haverá algo mais ridículo que ver efetiva-
mente um homem irritado com os judeus, desejando exterminá-los a todos, grandes e pequenos,
queimar suas cidades, reduzindo-as a nada, apenas como resultado de sua ira? (...)
52. É pueril fazer o homem o centro da criação. Deus, segundo parece, não criou o trovão os
relâmpagos e a chuva, e , ainda que ele fosse o autor, não se poderia dizer que com a criação da
chuva Deus favoreceu mais o sustento do homem que o das plantas, árvores ou ervas e espi-
nhos; e se se pretende que todas essas produções da terra crescem para o homem, por que antes
para o homem que para os animais selvagens e privados de razão? (...)
58. Outra de suas extravagâncias consiste em crer que depois de Deus ter acendido um fogo,
como um cozinheiro, todos os vivos serão queimados e que só eles pemanecerão; só eles quer
dizer não somente os que então vivam, no dia do juízo final, mas também todos os de sua raça
mortos há muito tempo, que serão vistos surgir da terra com a mesma carne que outrora tive-
ram. Eles tem uma esperança digna de vermes. Que alma humana, pois, ia desejar entrar em um
corpo putrefato? (...) Haverá algum corpo que, depois de haver entrado em decomposição, pos-
sa volta ao seu primitivo estado? (...) dizem que a Deus tudo é possível. Porém Deus não pode
fazer nada vergonhoso nem querer nada contrário à natureza (...) Porque Deus é a razão das
coisas, o logos do cosmo e não pode operar contra a razão, como não pode também operar con-
tra si mesmo.(...)
115. Suponha que os ordenem jurar pelo Chefe do Império. Não há nenhum mal em fazer tal
coisa (...) Se procurais minar este princípio, o príncipe vos castigará, e terá razão; é que se to-
dos fizessem como vós, nada impediria que o Imperador ficasse solitário e abandonado e o
mundo inteiro se tornaria presa dos bárbaros mais selvagens e grosseiros. Não existiria em bre-
ve nenhum sinal de vossa formosa religião e o mesmo aconteceria com a glória da verdadeira
sabedoria entre os homens (...).
117. Não se pode tolerar ouvi-los dizer: “Se os imperadores que hoje reinam, depois de deixa-
rem-se persuadir por nós, afundarem no seu próprio desastre, seduziremos inclusive a seus
vencedores. Se estes caírem, igualmente, nos faremos ouvir por seus sucessores, até que todos
se tenham entregado a nós e sejam igualmente exterminados pelos inimigos”. Sem dúvida, é o
que não deixaria de suceder, a menos que um poder mais esclarecido e mais previdente possa
destruir-vos a todos de cima a baixo, antes de perecer por vossa culpa. Se fosse possível que
todos os povos que habitam Europa, Ásia e África, tanto gregos como bárbaros, até os confins
do mundo, fossem unidos pela comunidade de uma mesma fé, talvez uma tentativa do estilo da
vossa tivesse probabilidades de êxito; porém isso é pura quimera, dada a diversidade das popu-
lações e de seus costumes. Quem coloca em sua mente semelhante desígnio mostra por isso
mesmo que é cego. Apoiais o Imperador com todas as vossas forças, compartilhais com ele a
defesa do direito, combateis por ele, se assim exigirem as circunstâncias, ajudais no controle de
seus exércitos! Por ele, cessais de fugir aos deveres civis e de impugnar o serviço militar, to-
mais vossa parte nas funções públicas, se for preciso, para a salvação das leis e da causa da
piedade (pietas)!”.
pág. 18

6. Textos védicos.

6.1. Hino da Criação (Nasadya) ( Rig Veda, 10.129).

1. Não existia não existência ou existência então. Não existia terra ou céu. O que se movia?
Onde? Existia água, nas profundezas insondáveis?
2. Não existia morte ou imortalidade então. Não existia nenhum sinal da noite ou do dia. O que
existia respirava, sem ar, através do seu próprio movimento. Não existia nada além disto.
3. No princípio a escuridão estava oculta pela escuridão. Não existia nenhum sinal que a distin-
guisse. Tudo era água. Mas a força viva que estava contida no vazio, esta surgia através do ca-
lor.
4. No princípio o desejo veio sobre o Uno. Isto foi a primeira essência da mente. [De fato,]
eruditos procurando com sabedoria em seus corações, encontram a base da existência na não
existência.
5. O seu cordão estava estendido através. O que existia abaixo? O que existia acima? Lá esta-
vam os semeadores, lá estavam os poderes. Lá havia um impulso abaixo, lá havia exalação aci-
ma.
6. Quem de fato sabe? Quem pode aqui declarar de onde e por meio de que ocorreu a Criação?
Os deuses vieram depois da criação do universo; quem poderá, portanto, saber de onde isto
surgiu?
7 De onde esta Criação surgiu- talvez ela tenha se formado sozinha, talvez não- aquele ser que
olha para isto, no alto céu, somente ele sabe, ou talvez ele não saiba?

6.2. Purusha-Sukta, ou o Hino do Homem. (Rig Veda, 10.90).

1. O Homem (purusha) tem mil cabeças, mil olhos, mil pés. Ele se mistura com a terra em todos
os lugares e se estende além dela.
2. Este é o Homem que é tudo isto, tudo que foi, tudo que é. Ele é o senhor da imortalidade,
quando cresce em tudo através dos alimentos.
3. Esta é a sua grandeza, e o Homem é ainda mais do que isto. Todas as criaturas são a quarta
parte dele; três quartos é o que é imortal no céu.
4. Com três quartos o homem ascendeu; uma quarta parte dele permaneceu aqui. A partir desta
Ele estendeu-se em todas as direções, dentro daquilo que come e daquilo que não come.
5. Dele, Viraj [o princípio feminino criador] nasceu e de Viraj veio o Homem. Quando Ele nas-
ceu estendeu-se além a terra, atrás e antes.
6. Quando os deuses executaram o sacrifício, com o Homem como oferenda, a primavera foi a
manteiga purificada, o verão o combustível, o outono a oblação.
7. Eles ungiram o Homem, o sacrifício nascido no princípio, sobre a relva sagrada. Com ele os
deuses, os Sadhias e os eruditos sacrificaram.
8. Deste sacrifício [isto é, o Homem, purusha] no qual tudo foi oferecido, a gordura derretida
foi coletada, e Ele a tornou nestas criaturas que vivem no ar, na floresta e nas aldeias.
9. Deste sacrifício, no qual tudo foi oferecido, os versos e os cantos nasceram [os Vedas], a
métrica e as fórmulas também nasceram.
10. Cavalos nasceram deste sacrifício, e todos estes outros animais que possuem duas carreiras
de dentes. Vacas dele nasceram e dele também as cabras e os carneiros nasceram.
11. Quando dividiram o Homem [Purusha], em quantas partes eles o fizeram? Como chamaram
sua boca, seus dois braços, suas coxas e pés?
12. Sua boca tornou-se os Bramanes; de seus braços foram feitos os Kshatrias [guerreiros].
Suas coxas tornaram-se os Vaishyas [camponeses] e de seus pés nasceram os Sudras [servos].
13. A lua nasceu de sua mente; de seus olhos o sol. Indra e Agni surgiram de sua boca e de seu
ar vital surgiu o vento.
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14. De seu umbigo surgiu o espaço intermédio. De sua cabeça o céu expandiu-se, de seus dois
pés veio a terra e as quatro direções do céu de seus ouvidos. Então eles [os deuses] colocaram
os mundos em ordem.
15. Lá havia sete varas unidas para ele e três vezes sete lenhos combustíveis, quando os deuses,
realizando o sacrifício, ataram o Homem como criatura sacrificial.
16. Com o sacrifício os deuses sacrificaram ao sacrifício. Estas foram as primeiras leis rituais
[dharma]. (apud The Rig Veda, an anthology (selected and translated by Wendy Doniger O’
Flaherty). London, Penguin Books, 1981).

6.3.Trechos do Brhadaranyaka Upanishad.

“O mundo além do céu, Gautama, é um fogo sacrificial. O sol é o seu combustível, os raios do
sol sua fumaça, o dia sua chama, a lua seu carvão, as estrelas suas faíscas. Neste fogo os
deuses fazem uma oferenda de fé e desta oblação nasceu o rei Soma.
A nuvem de chuva, Gautama, é um fogo sacrificial. O vento é o seu combustível, a neblina sua
fumaça, o relâmpago sua chama, o trovão seu carvão e o ribombar do trovão suas faíscas. Neste
fogo os deuses fazem uma oferenda do rei Soma, e desta oblação nasce a chuva.
A terra, Gautama, é um fogo sacrificial. O ano é o seu combustível, o espaço sua fumaça, a
noite sua chama, as quatro direções seu carvão, as quatro direções intermediárias suas faíscas.
Neste fogo os deuses fazem uma oferenda de chuva, e desta oblação surge a comida.
O homem, Gautama, é um fogo sacrificial. A fala é o seu combustível, a respiração sua fumaça,
a língua sua chama, os olhos seu carvão, os ouvidos suas faíscas. Neste fogo os deuses fazem
uma oferenda de comida e desta oblação nasce o semem.
A mulher, Gautama, é um fogo sacrificial. A vagina é o seu combustível, o encanto sua fumaça,
seu útero sua chama, a penetração o seu carvão, e o orgasmo suas faíscas. Neste fogo os deuses
fazem um oferecimento de semem e desta oblação nasce um embrião”. (apud O’Flaherty,
Wendy Doniger: Textual sources for the study of hinduism. Chicago, 1990, p.36.)

7. Texto budista.

7.1. Trechos do Agganna Sutta.

“Isto eu escutei: o Mestre estava certa vez em Savatthi, no parque leste, na mansão da mãe de
Mighara (...) ao anoitecer, o Mestre, tendo se levantado de suas meditações, saiu da casa e foi
andar ao ar livre (...) Vendo isto, Vasettha disse a Bharadja: “Vamos, aproximemo-nos do
Mestre e talvez tenhamos a boa fortuna de escutá-lo sobre matérias de doutrina” (...) Então o
Mestre disse a Vasettha: “Você, Vasettha, brâmane por nascimento e família, veio de uma famí-
lia brâmane e de sua casa para uma vida sem lar. Por acaso os brâmanes se envergonharam de
você e falam mal de você por isso?” “Sim(...)” “O que eles dizem Vasettha?” “Que a varna
brâmane é a melhor (...) eles dizem que somente um brâmane possui uma compleição bonita
(...) somente os brâmanes possuem sangue puro (...) somente os brâmanes são filhos genuínos
de Brahma, nascidos de sua boca (...) Como puderam vocês (dizem eles para nós) renunciarem
a um alto nível social e se tornarem de classe baixa, juntamente com os ascetas de cabeça ras-
pada, os de pele escura e os mal nascidos?” “Bem Vasettha, os brâmanes certamente esquece-
ram o passado quando dizem este tipo de coisas (...)
Naquele tempo tudo se tornara apenas água (...) depois de um longo período, a terra com seu
sabor surgiu sobre as águas (...). Então, um daqueles seres, [que se alimentavam de felicidade,
auto-iluminados] disse: “O que nós temos aqui?” e provou a saborosa terra com seu dedo. Pro-
vando ele ficou encantado com o sabor e desejou entrar nela. Outros seres, seguindo seu exem-
plo, provaram a terra com seus dedos (....). Então eles começaram a deliciar-se na saborosa
terra, agarrando pedaços dela com suas mãos. E fazendo isto a auto-iluminação desses seres
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desapareceu (...) estes seres então (...) continuaram nesse caminho por muito tempo (...) e na
medida em que comiam, seus corpos tornaram-se sólidos e vários de elementos atrativos torna-
ram-se manifestos. Alguns seres eram bem favorecidos, outros mal. Esses que eram bem favo-
recidos desprezavam esses que eram mal favorecidos, pensando: “Nós somos mais atrativos que
eles, eles são menos favorecidos que nós”. E então, pretensiosos por conta de sua beleza, eles se
tornaram vaidosos e a terra saborosa desapareceu (...) “O sabor desapareceu, o sabor desapare-
ceu” eles disseram. Então eles começaram a se alimentar dos brotos surgidos do solo (...) seus
corpos se tornaram mais sólidos e as suas diferenças tornaram-se mais evidentes (...) “Nós so-
mos mais atrativos que eles, eles são menos favorecidos que nós”. [insistiram] (...) Então esses
brotos [também] desapareceram (...) do solo surgiram então (...) coisas parecidas com bambus
(...) seus corpos tornaram-se ainda mais sólidos e a diferença entre eles se acentuou: os bambus
então desapareceram (...) então apareceu o arroz (...) no lugar em que, ao entardecer, eles colhi-
am e carregavam o arroz para a ceia, na manhã seguinte ele estava novamente crescido (...)
então seus corpos se tornaram mais sólidos e as diferenças mais pronunciadas. Em alguns surgi-
ram as características de fêmea, em outros, de macho (...). Então Vasettha, algo ocorreu a al-
guém mais preguiçoso: ‘Por que eu preciso colher o arroz para a ceia e depois para o desjejum?
Por que não junto suficiente arroz para ceia e desjejum juntos?’ Então ele juntou o arroz para as
duas refeições. Então alguns outros chegaram a ele e disseram: “Vamos colher arroz!” “Não e
necessário”, ele disse “eu tenho o suficiente para a ceia e o desjejum” (...) Então eles o segui-
ram e estocaram arroz para quatro e depois oito dias (...) o grão então parou de crescer (...)
Então alguns desses, lamentando o que ocorrera, disseram “maus costumes apareceram entre
nós. No passado éramos auto-iluminados (...) mas porque costumes imorais tornaram-se mani-
festos entre nós, o pó abafou o grão claro e ele não cresce mais (...) vamos dividir os campos de
arroz com cercas entre cada campo”. Então eles dividiram os campos de arroz e colocaram cer-
cas em torno deles. Então alguém, Vasettha, invadiu outra propriedade e fez uso dela (...) então
eles foram àquele dentre eles que era o mais belo, o mais estimado, o mais atrativo e disseram a
ele: “Nós queremos que você seja o que se indignará com todo aquele que mereça ser objeto de
indignação; que censure todo aquele que mereça ser objeto de indignação; que censure todo
aquele que mereça ser censurado (...) e nós lhe daremos uma certa percentagem de nosso ar-
roz”. Ele consentiu e então eles lhe deram uma certa percentagem de seu arroz. (...) esta foi a
origem desse círculo social de nobres (...) suas origens veio desses que eram iguais a eles e não
de outra “( apud LING, Trevor (transl.): Early Indian Buddhist Dialogues. London, Every-
man’s, 1993).

Buddha, representado pela árvore da iluminação.

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