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ESPAÇO TUTELAR E OLHAR PANÓPTICO:


MECANISMO DE CONTROLE SOCIAL DAS RELAÇÕES INTRAFAMILIARES?

RESUMO
O trabalho analisa o espaço do Conselho Tutelar (CT) a luz do conceito panóptico de Michel
Foucault. Parte do princípio de que o trabalho reflexivo do teórico possibilita análises
elucidativas a respeito deste espaço, traçando linhas sobre a existência do mesmo como
Política Pública para configurar ou reconfigurar a sociabilidade intrafamiliar de crianças,
adolescentes e pais. Utilizou-se a observação direta para a obtenção da análise. Situando o
Conselho Tutelar como um micropoder do Estado, estando circunscrito na vida das famílias
ditas “anormais”. Assim, o CT se reveste de prerrogativas constitucionais, ou de uma moral
instituída pelo Estado para agenciar vidas, corpos e indivíduos a luz da jurisdição do Estatuto
da Criança e do Adolescente (ECA/90). Constatando, pois, como sendo um mecanismo
panóptico que está, com frequência, gerindo a vida dos indivíduos que, em sua grande
maioria, vivem em situação de vulnerabilidade social.
PALAVRAS-CHAVE: Conselho Tutelar; Olhar Panóptico; Criança; Adolescente; Família.

TUTORING SPACE AND PANOPTIC LOOK:


MECHANISM OF SOCIAL CONTROL OF INTRA-FAMILY RELATIONS?

SUMMARY
The work analyzes the space of the Tutelary Council (CT) in light of the panoptic concept of
Michel Foucault. It starts from the principle that the reflective work of the theorist makes
possible explanatory analyzes about this space, drawing lines on the existence of the same as
Public Policy to configure or reconfigure the intrafamiliar sociability of children, adolescents
and parents. The direct observation was used to obtain the analysis. Placing the Tutelary
Council as a micropower of the State, being circumscribed in the life of the so-called
"abnormal" families. Thus, the TC has constitutional prerogatives, or a morality instituted by
the State to organize lives, bodies and individuals under the jurisdiction of the Statute of the
Child and Adolescent (ECA/90). Therefore, it is seen as a panoptic mechanism that is often
managing the lives of individuals who, for the most part, live in situations of social
vulnerability.
KEY WORDS: Guardianship Council; Panoptic Look; Kid; Adolescent; Family.

INTRODUÇÃO

Os Conselhos Tutelares (CTs) foram criados a partir da implantação do Estatuto


da Criança e do Adolescente (ECA) na década de 1990. Fruto de muitas lutas sociais, o
ECA/90, como Política Pública voltada para o segmento infanto-juvenil é um instrumento que
busca horizontalizar direitos as crianças e adolescentes 1 que até então se viam sob o julgo dos
ditames adultocêntricos (PRIORE, 2007, p. 84). Agora esses Sujeitos de Direitos passam a ter
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A concepção de criança e adolescente é algo recente na historia. Foi um ganho constitucional, tendo em vista
que anteriormente esses indivíduos eram vistos como seres “menores” na hierarquia social. Daí vem o termo que
até então se utilizava, isto é, o “menor”, ou “o de menor”, como era conferida a concepção para esses sujeitos.
Quem traz um olhar aguçado sobre a história da representação social da criança ao longo da historia brasileira é a
professora Ângela Alencar Araripe Pinheiro (UFC) na obra “Criança e Adolescente no Brasil: por que o abismo
entre a lei a realidade?”.
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um lugar social diferenciado (PINHEIRO, 2006, p. 36) nas instituições públicas do Estado, na
sociedade civil e na Família.

Para a concretização desse novo cenário conferido a criança e ao adolescente, foi


necessário à criação de um órgão que buscasse proteger os direitos e deveres dessa nova
representação social (MOSCOVICI, 1978, p. 25). Logo, criaram-se os CTs que tem a função
de promover e garantir esses direitos e deveres. E para colocar isso na prática esse órgão
utiliza-se de inúmeros instrumentos de atuação no cotidiano infanto-juvenil.

Mas para poder efetivar a promoção e a garantia de direitos, o CT ganhou


características as quais são pertinentes para a atuação tutelar. Entre estas características temos
a autonomia administrativa de atuação, que significa, entre outras coisas, não depender da
autorização de ninguém - nem do Prefeito, Vereador e Juiz - para pôr em prática aquilo que
lhe é atributivo e nem ser interrompido por qualquer ente externo que venha prejudicar sua
ação tutelar: artigos 136, 95, 101 (I a VII) e 129 (I a VII) do ECA/90.

Dessa forma, essa instituição criada pelo Estado passa a estar presente no seio
intrafamiliar procurando remediar as feridas sociais advinda de uma sociabilidade tida como
sendo “anormal”. Por sociabilidade “anormal” entendemos como sendo práticas que colocam
em xeque a condição peculiar de desenvolvimento da criança e do adolescente, no caso
tratado aqui, pelos próprios pais.

Assim, o CT se reveste de uma moral social instituída e circunscrita dentro de


uma órbita jurídica através do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA/90) para poder
transitar pelos diversos espaços onde se encontram esse segmento da sociedade. Encontrado
alguma disjunção social intrafamiliar, o CT passa a estar próximo das famílias em desordem
(referência à obra da Elisabeth Roudinesco), procurando, com outras instituições/órgãos,
sanar a patologia existente no seio intrafamiliar.

Essa reflexão só foi possível porque estivemos exercendo a função de conselheiro


tutelar do Conselho Tutelar do Município de Horizonte por cerca de quase seis anos 2. Foi
utilizada a observação direta das ações dos conselheiros tutelares em prática de atuação
2
As informações que são analisadas parte da vivência que tivemos do cargo que exercemos na condição de
conselheiro tutelar do município de Horizonte no Estado do Ceará (CE), estando próximo de vários colegas
conselheiros que através de entrevistas repassaram informações de como procediam nas suas ações cotidianas, os
entraves diários e a relação que se estabeleceu com a família ditas em “desordem”. Estivemos como fala o autor
português Machado Pais (2006), com o olhar comprometido com os direitos infanto-juvenis e o olhar
intrometido, escavando os pormenores das ações com vistas ao entendimento da totalidade que ora se espraiava
aos meus olhos.
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tutelar. O apanhado empírico-metodológico, e agora com o entrelaçamento teórico advindo


das leituras do filósofo Michel Foucault, em especial as obras Vigiar e Punir e Microfísica do
Poder possibilitaram refletir sobre as redes e conectivos desse espaço que se configura tão
rizomático. Nesse sentido, o apanhado analítico se debruçará da seguinte maneira: 1) Como o
Conselho Tutelar se manifesta como sendo um mecanismo panóptico do Estado no
agenciamento da vida dos indivíduos? 2) O que possibilita ao Conselho Tutelar ser o que ele
é, um órgão de proteção, prevenção e, principalmente, de fiscalização da vida de crianças,
adolescentes e também dos pais desses sujeitos? E por fim, 3) Como o Conselho Tutelar
coloca em prática os mecanismos de agenciamento de corpos e vidas a fim de reconfigurar a
sociabilidade tida como “anormal”? Portanto, que mecanismos de ações são evocados para
remediar as “doenças” sociais intrafamiliares que estão fora do espaço-campo da legalidade?

Não procurando encontrar pistas conclusivas, mas sim, que possibilite, ainda
mais, a reflexão sobre esse espaço, o espaço tutelar, é que esse trabalho se mostra pertinente
tendo em vista os poucos trabalhos existentes. Além disso, no primeiro domingo de outubro
deste ano (2019), ocorrerá a primeira eleição unificada a função de conselheiro tutelar em
todo o país. Dito isso, anteriormente, as eleições se davam de maneira específicas em cada
município/cidade do país.

MÁQUINA DE PODER: O conselho tutelar como olhar panóptico

Nessa esteira rolante em que o Estado dispõe de inúmeros mecanismos de


controle, dos corpos e da vida social dos indivíduos, imaginem mais um órgão com essas
premissas, porém bastante específicas. Específicas porque agora ela possui sua singularidade
galgada em determinada camada social: crianças e adolescentes.

Após a formulação e implantação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),


na década de 1990, e com o respectivo advento do surgimento órgão/Conselho Tutelar, esses
Sujeitos com Direitos passam a estarem sob o olhar vigilante desse órgão. E mais do que isso,
o olhar vigilante não fica atrelado especificamente no órgão. Ele é mais disperso, estando
atrelado em cada indivíduo que conviva próximo desses sujeitos e nos próprios sujeitos.

Exemplificamos a afirmação acima ao relatar que qualquer pessoa pode ser


delatada ao órgão/Conselho Tutelar por qualquer indivíduo. O CT desperta essa constante
vigília nas relações que se dão com crianças e adolescentes no seio intrafamiliar. Age,
portanto, com princípios de dispositivo panóptico. Ele, como já mencionado anteriormente,
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está em todos os lugares/espaços, em cada indivíduo, em cada olhar, vigiando os corpos,


identificando-os e classificando-os. Com frequência, aliás, na existência do CT, induzindo no
indivíduo um “estado consciente e permanente de visibilidade que assegura o funcionamento
automático” (p. 195). Afirma Foucault (2014):

O Panóptico de Bentham é figura arquitetal dessa composição. O princípio é


conhecido: na periferia uma construção em anel; no centro, uma torre: esta é vazada
de largas janelas que se abrem sobre a face interna do anel; a construção periférica é
dividida em celas, cada uma atravessando toda a espessura da construção; elas tem
duas janelas, uma para o interior, correspondendo às janelas da torre ; outra, que dá
para o exterior, permite que a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta não colocar
um vigia na torre central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um
condenado, um operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz, pode-se perceber da
torre, recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas
celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator está
sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O dispositivo
panóptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem parar e reconhecer
imediatamente (p.194).

Assim, intervêm na vida dos sujeitos com o poder de vigilância, mesmo que não
estando próximo, presente fisicamente, mas a partir de um sentimento de vigilância espraiado.
Pode ser a própria mãe que denuncia o filho ou filha; pode ser um familiar que denuncia à
mãe e o filho, o vizinho, a professora, a agente comunitária de saúde que, uma vez mensal em
sua atividade profissional adentrou a casa e percebeu algo que estava em não conformidade
com os ditames instituídos socialmente. Por ditames instituídos socialmente, ressoa sobre as
regras sociais que são criadas a partir de uma moral coletiva que é configurada em um
conjunto de leis sociais. Leis sociais essas que irão reger como a vida dos indivíduos devem
se portar.

Como mencionado acima, o dispositivo da delação ou denúncia evoca uma


persistente forma de controle de governo dos indivíduos. Foucault (1992) abordou esse tema,
por exemplo, no texto “A vida dos homens infames” (ver referência). O anonimato remete a
lembrança ás “lettres de cachet” que eram cartas que denunciavam os pequenos dramas
familiares, isto é, os conflitos da intimidade (FOUCAULT, 1992). Na atualidade, vemos que
os denunciantes são pessoas que estão bem próximas da família. E isso vem demonstrar que a
família na atualidade está a todo o momento sendo vigiada. Qualquer tipo de ilegalidade em
suas práticas cotidianas está passível pelo poder da punição. O poder de denunciar o pai e a
mãe, entre outras coisas, mostra como o poder está em todos os lugares, “bem ao lado”. Esse
poder da denuncia vem materializar o que Foucault (1992) afirma sobre a destituição do poder
única e exclusivamente do Estado. Na obra Microfísica do Poder, o filósofo vai expor que o
poder da denúncia através da fala está presente em todo e qualquer cidadão. Dessa forma,
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inaugura-se um novo lugar, que tem por finalidades múltiplas e ao mesmo tempo objetividade
em sanar a patologia da infância e da adolescência desregulada ou “anormal” no seio
intrafamiliar.

Ao perceber que determinado padrão social não está sendo colocado em prática e
o que se vê, portanto, é a transgressão do mesmo, qualquer sujeito está apto a levar
determinada situação aos olhos dos agentes sociais do CT.

Ao mesmo tempo e como parte dessa mesma confirmação, afirmamos que o CT


está em cada indivíduo que possui o conhecimento da sua existência. Falamos do
conhecimento da sua existência porque grande parte da sociedade não letrada ainda
desconhece a existência desse mecanismo de participação, defesa e, no caso aqui trabalhado,
como instância de vigilância da sociabilidade da vida dos indivíduos. Além disto, o CT está
em cada indivíduo que, além de conhecer sua existência, deve saber como proceder até chegar
a ele. E para isso, é necessário ter conhecimento das atribuições do órgão. Uma vez que ao
assumir as vestes de conhecedor do imbróglio social de transgressão, o sujeito passa a ser
integrante ou porta voz das futuras ações que ocorram no caso delatado. Ele passa a ser um
agente social de ampliação do olhar panóptico das relações intrafamiliares que são tidas como
“anormais”.

Na relação entre conselheiro e delator, quer seja por telefone, e-mail ou presente
no ambiente tutelar, faz-se, na oportunidade, anotação do telefone do delatário, endereço e
situação familiar. Pergunta-se qual o grau de relação do sujeito-delator para com os sujeitos
que estão tendo suas vidas intrafamiliares narradas para os tutores sociais do Estado. Inscreve
e institucionaliza o indivíduo e sua vida. A vida social do delator , como se vê, também é
atravessada por questionamentos que são, a partir do olhar do Estado e da instituição órgão
tutelar, necessárias para realizar uma radiografia social do contexto e das tramas sociais que
por lá chegam.

PORTA ABERTA PARA A AÇÃO TUTELAR: Relações “anormais”

A concepção social de criança e adolescente como sujeito de direitos, como já


pontuado anteriormente, é algo recente na historiografia brasileira (PINHEIRO, 2006). A
partir do momento que fincou-se essa representação com dispositivos constitucionais e
normais a serem engendradas na sociabilidade, por exemplo, familiar, na sociedade e no
Estado, conforme está circunscrito no ECA/90, tudo o que estiver fora desse universo é
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considerado “anormal”, “desviante”, “desregulado” e que, portanto, deve ser trabalhado por
agentes sociais do Estado para transpor essa barreira daquilo que é “normal” e “anormal”.

Antes dessa concepção social que evoca ações de cunho protetivo, promoção e
vigilância, requerendo dos três entes (família, sociedade e Estado) ações que busquem
arranjar um lugar social compatível com as premissas sócio-cultural-psicológica desses
sujeitos, tudo o que é gerido e envolvia esses indivíduos não era passível de punição, ou
então, velavam-se as ações colocadas em prática pelos adultos para com os, à época,
“menores”.

Esses sujeitos tiveram sua representação social modificado ou longo do tempo.


Conforme o interesse em jogo, ou seja, conforme o contexto social na qual essas
representações foram gestadas, nas palavras de Ângela Pinheiro (2006) a criança foi
configurada de diversas maneiras.

Para o entendimento de como se gesta uma representação social, Pinheiro (2006:


35-40) a partir de Therrien e Muscovic (1998:31-34), vai ressaltar que as representações
sociais são construções simbólicas ou construções mentais, e que por isso se fazem
instrumentos de apreensão da realidade.
Para o entendimento das representações que configuraram a concepção da criança
ao longo do tempo, fez-se necessário, na concepção de Pinheiro (2006), percorrer a historia
social brasileira “para identificar os contextos sócios-históricos em que se deram a
emergência e a institucionalização das representações sociais da criança” (p.23).
Dessa forma, ainda segundo Pinheiro (2006), a criança brasileira possuiu três
concepções principais ao longo da historia brasileira. A primeira se refere a ela como sendo
objeto de proteção social. Diferentemente da criança que possui um valor secundário na
família, como pontua Costa (1989), nesse momento a criança passa a ser protegida desde seus
primeiros anos de vida. Um dos fatores importantes para florescimento dessa concepção é o
trabalho das Igrejas Católicas e da atividade filantrópica, que, com seus valores centrais,
como o são o “amor ao próximo” e a “compaixão”, procuram centraliza-lo no trata da criança.
No final do século XIX e nos primórdios do século XX, ainda na fala de Pinheiro
(2006: 55), o Estado passa a querer investir no desenvolvimento da criança. O contexto sócio-
histórico demonstrar que o Estado tem por objetivo a ideia de “criar filhos para a nação”.

A criança, antes manipulada pela religião e pela propriedade


familiar, ver-se-á, no século XIX, novamente utilizada como
instrumento do poder. Desta feita, porém, contra os pais e a favor
do Estado. (COSTA, 1999, p. 175)
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Nesse momento a família que até então possuía o monopólio da criação da


criança, passa a dividir “ônus e bônus” com o Estado. Assim, a criança que ora se desenvolve
nesse contexto, ao invés de servir aos interesses da família, passa a ditar as regras impostas
pelo Estado.
A partir desse olhar, a criança é tida como objeto de controle e disciplinamento
social. Elas são disciplinadas pelo Estado através da ação dos higienistas, da escolarização e
profissionalização. O objetivo de tal intento é que os mesmos não procedem a executar atos
de delinquência, e a família, nesse momento, cabe o exercício da prática das atividades
advindas do Estado.
Entre as décadas de 1930 a 1940, a partir do crescimento do número de crianças
na marginalização advindo da não inserção ao sistema vigente, tem-se o grande número de
crianças na rua e marginalizadas como sendo caso de policia. Utilizou-se de práticas
corretivas no uso de coerção para com as chamadas “delinquências”.
A família que possuía um filho “delinquente” costumava leva-lo para casas de
internatos. Foi nesse momento que se deu a criação do Código de Menores (1927). O objetivo
do mesmo era “incluir hábitos de trabalho e educa-los profissionalmente os pequenos
mendigos, vadios, viciados e abandonados” (PINHEIRO, in: OSTERNE, 1995, p.02).
Mas foi só a partir da década de 1970, que a criança passa a possuir atributos de
sujeito que possui direitos. A “infância sem família”, na representação das crianças
abandonadas, mendigos, vadios e viciados, na concepção de Postman (2008), começa a exigir
um aparato jurídico que responda aos novos tempos. Surgem, portanto, a Declaração dos
Diretos da Criação (1959) e a Convenção Internacional dos Direitos da Criança de 1989, as
quais são pontuadas como sendo os pilares de uma nova era para a criança e para o
adolescente.
O dispositivo constitucional denominado de ECA (Lei 8069/90), entre outras
coisas, visa regulamentar aquilo que já tinha sido escrito no artigo 227 da Constituição
brasileira de 1988; ele tem por base a proteção na íntegra da criança e do adolescente,
ressalvando e criando aparatos jurídicos e normativos para regulamentar e reconfigurar o
universo desse que hoje são tidos como sendo sujeitos.
Antes do ECA, o chamado Códigos de Menores, que até então prevalecia na
sociedade brasileira punindo os ditos menores, ou seja, aqueles que viviam em situação de
vulnerabilidade social e que por isso adentrava a esferas de situações dita como sendo
irregular, vem contrastar com o novo Estatuto, uma vez que este busca horizontalizar direitos
a todas as crianças. Como consta no Estatuto:
“[...] estabelece direitos a serem garantidos para todas as crianças:
direitos relativos à sobrevivência, ao desenvolvimento pessoal e
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social e à integridade física, psicológica e moral, criando


instrumentos de garantia para cumprimento destes direitos, tais
como os Conselhos de Direitos e os Conselhos Tutelares
(ECA/90)”.

Dessa forma, o Estado, a sociedade e a família, devem, entre outras coisas,


dispensar um novo olhar em termos de conteúdo, método e gestão no que diz respeito a
sociedade de convivência com esses sujeitos. Muitas práticas que anteriormente eram
colocadas em relevo, hoje são consideradas abusivas e que rasgam o Estatuto. Assim, nada
mais coerente com essa nova visão do que procurar colocar em pratica um reordenamento das
praticas cotidianas, pois a lei é categoricamente explicita no que se refere a isso.
Mas para que tudo isso seja colocado em prática, creditou-se necessitar de
dispositivos governamentais para que isso prevalecesse. Logo, temos os Conselhos Tutelares,
como mecanismo de controle social das relações intrafamiliares; esses sujeitos passaram a ter
fundamental importância nessa nova roupagem que a sociedade civil, o Estado e a Família
devem ter oriundo desse novo dispositivo constitucional. Esse Conselho tem a função de
fiscalizar e gerir novas formas de sociabilidade quando ocorrem (des)funções nas relações que
envolvem criança e adolescente.

O TRABALHO DOS AGENTES SOCIAIS: Mecanismo de controle intrafamiliar

Nesse momento empreendemos o foco que é chave mestre no delineamento desse


apanhado analítico, que é todo o processo de reconfiguração em que crianças, adolescentes e
familiares passam a estar na esteira rolando do Conselho Tutelar. Assim, poderemos fazer um
mapeamento do trabalho desenvolvido pelos agentes sociais tutelares para remediar situações
de violações de direitos acontecidos no seio intrafamiliar. Além de procurarem controlar
relações díspares, institucionalizam a família a regras e normas de convivência que visam à
prática de uma sociabilidade dita “saudável”.

O que se busca através do trabalho dos agentes sociais, afirma Heloíza Szymanky
(1992) em sua obra Trabalhando com as famílias, onde a família pensada, esta que está de
acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA/90) deve ser colocado em prática a
todo custo em detrimento da família vivida, esta cheio de abusos, falhas e “anormalidades” no
convívio da solidariedade familiar.

Na contemporaneidade, a família assume posturas para tentar sobreviver diante da


realidade mutante que a cerca. Têm-se um confronto entre a família pensada, representante do
modelo burguês idealizado e a família vivida, inserida no cotidiano real. Szymanski (1992)
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vai dizer que a família pensada representa o controle do grupo social, pressionando a adoção
de um modelo padrão ideal.

A família pensada, a qual denominamos de ideal, que existe ao nível das


representações familiares, é constituída pela ideia que se tem da família com todos os laços de
solidariedade harmônico, onde o pai é chefe maior e a mãe a provedora dos mimos maternos.
Portanto, representa o que é certo, equilibrado, desejável e socialmente aceitável.

Dentro dessa visão, ou seja, da existência e a necessidade de uma família pensada


é que os agentes sociais colocam em prática suas ferramentas de trabalho. Diante dos
inúmeros problemas intrafamiliares que acontecem nos lares sociais, os técnicos do social
(DONZOLET, 2001) que, nesse caso, se referem aos conselheiros tutelares do Conselho
Tutelar (CT) são convocados a adentrar a esfera familiar com todo seu aparato técnico, com
encaminhamentos, relatórios sociais, investigações sociais, busca ativa, relatórios de
evolução, entrevistas, oficinas de recomposição familiar, atividades educativas, e uma gama
de ações que visam reparar e redirecionar as práticas da solidariedade familiar.

Como embasamento e norte da atuação tutelar, temos o Estatuto da Criança e do


Adolescente (ECA/90) que configura-se como sendo um regulamento, como outros existentes
na atualidade, que busca forjar uma sociabilidade inscrito dentro do meio jurídico, e que,
portanto, possui sua base legal dentro do imaginário coletivo daquilo que é aceito
socialmente. Por outro lado, tudo o que está fora desse regulamento faz parte daquilo que não
deve ser aceitável, que é “anormal”, “desregulado”, e que, por isso, deve ser agenciado tendo
em vista que pode corromper aqueles que estão trilhando a linha da “normalidade” social.

Temos como primazia da atuação tutelar, situações onde crianças e adolescentes


estejam em eminente risco da sua proteção integral3. Assim, o CT deve agir com todas as
armas que dispõem configurando-se numa espécie de “policiamento espacial especial”
infanto-juvenil, buscando encerrar ou banir qualquer tipo de situação que coloque em risco a
situação psíquica, física e moral desses sujeitos.

Assim, quando se declara uma violação por parte dos próprios pais ou familiares
que tem a função de garantir uma sociabilidade saudável a criança e ao adolescente, entra em
3
A teoria de proteção integral, que está subscrito no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA/90), que foi
consagrada na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e da Organização das Nações Unidas
(1989) e na Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959) parte da compreensão de que as normas que
cuidam de crianças e de adolescentes devem concebê-los como cidadãos plenos, porém sujeitos à proteção
prioritária nas Políticas Públicas do Estado, tendo em vista que são pessoas em desenvolvimento físico,
psicológico e moral.
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cena uma série de ações de tutela: retirada do sujeito do seio intrafamiliar violador; busca por
espaço de acolhimento que garanta os princípios razoáveis de uma sociabilidade saudável;
correção dos atos praticados pelos transgressores através de um aparato estatal, através de
órgãos instituídos como Centro Especializado da Assistência Social (CREAS), Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS), entre outros dispositivos que possuem, assim como o CT, seus
específicos estatutos de atuação e regulamentação das disfunções sociais.

Se for necessário retirar as crianças e os adolescentes da casa onde ocorreu a


violação de direitos, tal se fará de modo que os mesmos tenham garantida a preservação da
sua identidade. Em outras palavras, conforme pontua o regulamento instituído, isto é, o
ECA/90, a ação tutelar deve ser feita de modo a preservar a moral dos indivíduos envolvidos
nos conflitos intrafamiliares. Em tempo, todos os indivíduos, inclusive os adultos sujeitos-
violadores devem ter preservado o anonimato4, tendo em vista que a exposição deste recai
diretamente na identificação daqueles. Assim, busca-se realizar as incursões tutelares em
turnos de modo que se evite qualquer encontro com indivíduos que esteja fora do espaço-
campo conflitual. Só circulam, portanto, os intendentes, os pares familiares que estiveram
envolvidos no caso, bem como outros que serão recrutados, a depender da situação, a estarem
sendo co-partícipe dos desdobramentos e fissuras residuais.

A partir desse momento entra em cena todo o aparato técnico-burocrático de


inspeção. São recrutados agentes sociais de diversos órgãos, a saber: CRAS, CREAS, CAPS,
CAPS-AD e demais instituições que visam sanar as patologias encontradas no seio
intrafamiliar. Que passam, agora, a estarem alerta em toda parte, como afirma Michel
Foucault (2014) “um corpo de milícia considerável, comandado por bons oficiais e gente de
bem” (p. 190).

O regulamento (ECA/90) fala de um sistemático acompanhamento do caso, dos


indivíduos, da sociabilidade corriqueira que estes passam a desempenhar a partir da
intervenção do CT. Contudo a realidade é bem diferente daquilo que está instituído através
dos documentos oficiais. Com a crescente demanda, essa vigília torna-se quase sempre

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Para a garantia do desenvolvimento físico, psíquico e moral é necessário preservar o anonimato das crianças e
dos adolescentes envolvidos em algum conflito que transgrida seu desenvolvimento. O Art. 17 do Estatuto da
Criança e do Adolescente é taxativo: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física,
psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da
autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais”. Em desacordo com essa prerrogativa
qualquer indivíduo, físico ou jurídico pode ser punido pela ação com pena de 4 a 8 anos. Sendo também,
proibido a veiculação, distribuição e venda de fotografias e vídeos de crianças e adolescentes em cenas de sexo
explícito entre outros tipos de exposição.
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impossível de acontecer. O aumento da quantidade de casos de desvios sociais intrafamiliares


envolvendo crianças e adolescentes demanda um aparato maior, ou seja, mais agentes sociais,
equipamentos, instituições e dispêndio de tempo para remediar as “anormalidades”. Com o
crescente número populacional, bem como a situação contextual socioeconômico nada
favorável para as camadas menos favorecidas, impulsionam famílias a estarem na esteira
rolante do CT. Assim, torna-se inviável para os agentes sociais estarem, todos os dias, com o
aporte de que dispõem, intendendo visitas a casa de que está encarregado, bem como verificar
se os indivíduos estão cumprindo as tarefas que foram orquestradas pelas instituições
responsáveis para remediar a solidariedade familiar; assim como, se as crianças ou os
adolescentes possuem queixas mesmo após a intervenção ou o trabalho tutelar.

Mesmo com essas dificuldades, a “fiscalização dos atos” acontecem, apesar que,
de maneira não ideal inscrito no regulamento. Esse olhar vigilante se apoia num sistema de
registro permanente, ou deveria se apoiar, dado as dificuldades já descritas. São relatórios
situacionais dos conselheiros tutelares, que depois são repassados para outros técnicos do
social como assistentes sociais, psicólogos e pedagogos. A partir daí os relatórios sobre a vida
dos indivíduos são repassados para dentro do espaço jurídico, ou seja, enviado para o
Ministério Público (MP) para que possa dar “parecer final” sobre o curso da vida dos sujeitos
envolvidos nas tramas familiares.

Ainda sobre os registros, é preciso dizer que neles irão conter o nome dos sujeitos
envolvidos, a idade, o sexo, a condição social na qual vivem, as relações de parentescos, os
hábitos diários, a escolaridade, a raça/cor, as relações objetivas de trabalho, lazer e até as
vontades e sonhos. Todo esse aporte descritivo estará presente em todos os espaços/órgãos
que estarão responsáveis por reconfigurar a solidariedade familiar. É uma espécie de registro
da patologia social familiar, onde cada órgão tem a finalidade de sanar essa doença. Contudo,
cada instituição/órgão possui sua específica função no desenvolvimento da reabilitação desse
“corpo social doente”.

Nesse sentido temos uma espécie de modelo compacto de agenciamento da


sociabilidade dos indivíduos. Feito esse primeiro apanhado radiográfico da vida dos sujeitos,
sua sociabilidade e seus corpos passam a estarem dentro de um modelo compacto de
dispositivo disciplinar. Na medida em que o regulamento (ECA/90) passa a ser a tônica das
relações cotidianas, que até então não “existia” (por não terem conhecimento da existência do
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mesmo, entre outros atributos5) na vida desses sujeitos, busca-se desfazer todas as
“confusões” ou “anormalidades” no seio intrafamiliar.

Contra a “desordem” levanta-se um discurso de poder emanado pelas instituições


tutelares. É um discurso político jurídico que foi concebido socialmente, e através dele e com
ele busca-se penetrar a vida dos indivíduos nos mais capilares modo-de-ser. Modos-de-ser que
assim pode ser definido: não à práticas que transgridem a condição peculiar de
desenvolvimento da criança e do adolescente, mas sim, a penetração do regulamento
(ECA/90) “até nos mais finos detalhes da existência e por meio de uma hierarquia completa
que realize o funcionamento capilar do poder” (p. 192).

Busca-se, portanto, um lugar para a criança ou adolescente, assim como para os


pais no seio social. É como se os mesmos, a partir das suas práticas em não conformidade
com o regulamento, estivesse fora, para além da linha que margeia a normalidade, sobrando,
portanto, aquilo que é “anormal”. Busca-se, assim, um lugar, um corpo, um nome, uma
condição social, um lugar de existência que até então “não existia”.

O trabalho dos agentes sociais tem essa função, de encontrar um registro


“verdadeiro”, uma identidade “verdadeira”, um corpo “verdadeiro”, uma sociabilidade
necessária para que crianças e adolescentes sejam, verdadeiramente, Sujeitos com Direitos.
Sob esse aspecto utilizam-se, como já descrito acima, de inúmeros aparatos técnico-
burocrático fincado pelo Estado para que esses sujeitos saiam do espaço-campo da
“anormalidade” e venham a estar no espaço-campo da “normalidade” constituída por uma
moral ou solidariedade familiar aceita socialmente.

Em tempo, se é verdade que os sujeitos diagnosticados como sendo “desviantes”


por estarem dentro do espaço-campo da “anormalidade”, por terem uma sociabilidade
intrafamiliar em desacordo com os códigos e símbolos sociais instituídos como sendo o
“normal”, essa condição suscita, no cotidiano, um olhar excludente para esses indivíduos a
ponto do Estado intervir através de ações socioassistenciais. Todavia, essas ações, em nível de
ação tutelar, pode, perfeitamente, ser entendida dentro de uma visão de manutenção das
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É de conhecimento estatístico que a grande maioria das famílias que adentram o espaço tutelar são famílias que
possuem um rendimento socioeconômico baixo. Além disso, muitos pais que violam os direitos de crianças e
adolescentes possuem escolaridade abaixo da média nacional. Geralmente são sujeitos que sequer terminaram a
primeira fase dos estudos. Por primeira fase dos estudos, diz respeito as primeiras séries iniciais. Indagados
muitas vezes se tinham conhecimento da existência do CT, responderam que já ouviram falar, mas que pouco
conhecem do que realmente se trata. Essa afirmação era bem mais presente na década de 90. Atualmente isso
vem mudando, contudo ainda temos pessoas que desconhecem as atribuições e as prerrogativas basilares do
ECA/90.
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funções do corpo-sociedade. Em outras palavras, numa visão durkheimiana, é como se esse


organismo ou unidade social – família – estivesse numa situação de anomia social6, e que por
isso, deve, a todo custo, ser remediado.

A partir do momento que se identifica os sujeitos “desviantes”, inscreve-se uma


divisão binária na sociedade. Isto é, os que são “normais”, aqueles sujeitos que seguem a
cartilha do imaginário coletivo que foi instituído socialmente, no caso, o ECA/90, e os
“anormais”, que vivenciou ou vivenciam práticas que vão de encontro com as regras basilares
de convivência da solidariedade familiar.

Oriunda dessa situação onde se instaura uma divisão, o trabalho social do CT


passa a estar relacionado diretamente a esses dois segmentos: uma organização aprofundada
das vigilâncias e dos controles, uma intensificação e ramificação de poder. Para os
“desviantes”, uma ação mais enérgica com o objetivo de reconfigurar os desvios. Já para o
outro segmento, por sua vez, busca-se a preservação e manutenção do modo de convivência a
fim de que não saiam da órbita normalizadora/ou normalizante.

Os sujeitos “desviantes” são vistos pela sociedade a partir de “práticas de


rejeição”. Ao adentrarem o espaço do Conselho Tutelar, o estigma advindo da prática
“desviante” aos olhos da população passa a ser corriqueiro. Todos que passam por esse espaço
são considerados sujeitos que necessitam de um “policiamento tático meticuloso”, onde as
diferenciações estão associadas aos desvios cometidos. Por exemplo, os sujeitos envolvidos
em caso de abuso sexual passam a serem pintados em cena, no caso da figura do abusador, de
estuprador, já a vítima, por sua vez, a abusada/estuprada. Ambos passam, mesmo por
conotações diferenciadas, a serem inscritos através de signos oriundos das práticas tidas como
sendo “desviantes”.

E a partir daí se faz as maneiras-modos de exercer o poder sobre os homens a


partir do controle das suas relações cotidianas. O mundo dos “desviantes” passa a ser marcada
por vários dispositivos de agenciamentos: o olhar de todos, a vigilância, a documentação, o
registro e as incursões “in loco” nas suas casas pelos tutores sociais. No fundo, o que se quer

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Quem trabalhou esse termo foi Émile Durkheim, onde considera a sociedade como que um corpo biológico que
possui suas específicas funções formando um todo harmônico. Quando determinado órgão desse corpo-
sociedade não está em conformidade com as leis sociais, diz-se que o mesmo encontra-se em estado de anomia
social. É o que pode ser considerado com as famílias que não estão em desacordo com o regulamento (ECA/90),
que o transgride e coloca em xeque o desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes. E que por isso, e
partir disso, essas famílias devem ser integradas ao corpo social normal, ou para o espaço-campo da normalidade
social.
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dizer com isso é que os indivíduos encontram-se governados, em perfeito estado de


manutenção pelo Estado. As relações intrafamiliares tidas como “anormais” é o desenho do
nascimento de um dispositivo que traz a tona o exercício do poder disciplinar.

Podemos inferir, portanto, que a visualização do Estado na sociedade pode ser


delineada a partir do momento que se concebe a existência de anomias sociais. É como se a
concretude de sua existência só fosse possível a partir da necessidade do funcionamento dos
seus dispositivos: regulamento, por exemplo, o ECA/90, instituições estatais como o
Conselho Tutelar, os agentes sociais como os conselheiros tutelares e as táticas e estratégias a
partir dos programas e políticas públicas disponibilizados para específicos setores da
sociedade, isto é, o trabalho social delineado por todo esse aparato técnico-burocrático
disponibilizado pelo Estado.

Nesse sentido, pode-se, com relativa facilidade, perceber que mesmo sendo
diferentes esquemas de conceber o que é “normal” e “anormal” através dos dispositivos de
agenciamentos e configurações ou (re)configurações, não deixam de ser, todavia, compatíveis.
A busca pela preservação daquilo que é tido como sendo “normal” também disponibiliza um
grande esforço de instrumentos, táticas e técnicas de outro âmbito, com outras instituições,
mas não menos diferentes do que aqueles. Podemos citar como exemplo, instituições de
ensino, que visam mapear ações sintomáticas denominados de pedagógicas de um Estado
atentando as funções da sociedade; são instituições de lazer, que trabalham o corpo e a mente
conforme as prerrogativas que requerem mais ainda essa sintonia com o contexto
mercadológico; são programas governamentais de convivência que visam sempre projetar
recortes finos de disciplina no cotidiano das relações dos indivíduos.

À guisa de respostas, vejam, assim, que tudo isso está inscrito dentro do trânsito
do mecanismo de controle da vida dos indivíduos. Percebendo que há diferenciação do modo
de agir conforme aqueles que se encontram na zona da “anormalidade” e aqueles que são
tidos como sendo “normais”. Contudo, ambos estão à deriva de vários dispositivos de
controle, de agenciamento dos corpos, da identidade, da vida e da sociabilidade cotidiana
pelos organismos estatais, neste caso, representado pelo órgão/instituição Conselho Tutelar,
pelos agentes sociais, os conselheiros tutelares e suas ações tutelares na vida intrafamiliar.

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