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PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA A DISTÂNCIA

Portal Educação

CURSO DE
FUNDAMENTOS SOBRE A
PSICANÁLISE LACANIANA

Aluno: EaD - Educação a Distância Portal Educação

AN02FREV001/REV 4.0

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CURSO DE
FUNDAMENTOS SOBRE A
PSICANÁLISE LACANIANA

MÓDULO IV

Atenção: O material deste módulo está disponível apenas como parâmetro de estudos para
este Programa de Educação Continuada. É proibida qualquer forma de comercialização ou
distribuição do mesmo sem a autorização expressa do Portal Educação. Os créditos do
conteúdo aqui contido são dados aos seus respectivos autores descritos nas Referências
Bibliográficas.

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MÓDULO IV

9 COMPLEXO DE ÉDIPO

9.1 ÉDIPO NA ENCRUZILHADA

FIGURA 27 - ÉDIPO E A ESFINGE

FONTE: Literatura em Foco.

Um dia Édipo vai consultar o Oráculo, que lhe prenuncia o desfecho


trágico de sua vida: mataria seu pai e casaria com sua mãe. Assustado com
semelhante profecia decide fugir para proteger aqueles que pensa serem seus
pais. De repente, encontra em uma encruzilhada um homem arredio que
atravessa seu caminho. Então, Édipo resolve matá-lo. No entanto, este homem
é Laio, seu pai biológico, do qual Édipo desconhece sua existência.
Édipo chega a Tebas, em um momento em que a cidade está sendo
aterrorizada pela Esfinge. Ela lança seu enigma: o sujeito que conseguir
decifrá-lo poderá seguir seu caminho tranquilamente, enquanto aquele que não
tiver êxito terá somente um destino: a morte.

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Édipo aceita o desafio da Esfinge. Ele consegue resolver o problema,
então a Esfinge se lança ao penhasco. Em recompensa, Édipo recebe Jocasta,
a rainha viúva em matrimônio (sua mãe biológica), no qual tem dois filhos:
Polinice e Etéocles e duas filhas: Ismênia e Antígona.
Uma peste arrasa a cidade de Tebas como punição pela morte do rei
Laio. Édipo se vê obrigado a procurar o assassino do rei. Quando descobre
que é o assassino do próprio pai, e que sua mãe é sua esposa. Ele se cega e a
rainha (Jocasta) se suicida.

9.2 O COMPLEXO DE ÉDIPO FREUDIANO

FIGURA 28 – ÉDIPO E JOCASTA

FONTE: Olympians BR.

A tragédia Édipo Rei é a fonte principal da qual se vale Freud para


descrever o complexo de Édipo. O complexo trata-se de um conjunto de ideias
que giram em torno do incesto, do parricídio, do amor e do ódio da criança em
relação aos pais. O Complexo de Édipo freudiano trata-se fundamentalmente
de uma fantasia e de uma representação mental, princípio pelo qual o
psiquismo se relaciona com os objetos externos.

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Conforme Laplanche e Bertrand Pontalis (2008, p. 3), o complexo de
Édipo pode ser conceituado como:

Um conjunto de desejos amorosos e hostis que a criança sente


em relação aos pais. O complexo apresenta-se como na história
de Édipo Rei: desejo da morte do rival (pai) e desejo pela
personagem do sexo oposto (mãe). De modo inverso: amor pelo
pai e ódio ciumento pela mãe. Na realidade, essas duas formas
encontram-se em graus diversos na chamada forma completa do
complexo de Édipo.

O significado do termo complexo de Édipo é simbólico. Freud cria este


termo com intuito de ressaltar o incesto, a rivalidade e as emoções. É
importante destacar que Freud faz uma comparação entre o mito de Édipo e a
relação da criança com sua mãe, mas não em nível incestuoso, erótico e
ambivalência de emoções em relação ao pai.

9.3 O IDEAL DE EGO

Freud (1923, 9-46-47) destaca que:

O ideal de ego tem a missão de reprimir o complexo de Édipo; em


verdade, é a esse evento revolucionário que ele deve a sua
existência. É claro que a repressão do complexo de Édipo não é
tarefa fácil. O pai é percebido como obstáculo a uma realização dos
desejos edipianos, de maneira que o ego infantil fortifica-se para
execução da repressão, erguendo esse mesmo obstáculo dentro de
si mesmo.

O ideal de ego representaria a identificação positiva em relação aos


pais. É o processo pelo qual a criança incorpora qualidades boas e reais dos
pais e da sociedade. O complexo de Édipo cria uma situação ambivalente de
amor e ódio em relação aos genitores. É obvio que não é uma tarefa fácil
reprimir aspectos ligados aos sentimentos de uma criança, pois os conflitos
internos ainda não são reconhecidos por ela.
No entendimento freudiano, não há uma distinção entre o ideal de ego
e superego. Como vimos no módulo I, o ideal de ego se assemelha ao

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superego no que tange à moralidade. No entanto, o superego tem uma função
de repreensão, enquanto o ideal de ego aspira à realização de ideais.

9.4 O SUPEREGO COMO HERDEIRO DO COMPLEXO DE ÉDIPO

Freud (1923, apud Moreira, 2004, p. 224) ressalta que o superego é


herdeiro do complexo de Édipo. “O superego é o resultado do processo
identificatório com a lei, da qual o pai é o representante”. A partir do declínio do
complexo de Édipo é que ocorre a formação do superego, ou seja, a
internalização das regras, normas e valores.
Romper a fantasia de um amor com a mãe para o menino lhe garante
uma formação da moral e uma identificação com seus pais. A troca é muito
válida, afinal é a partir da formação do superego que os valores morais dos
pais também são incorporados nesse processo. “O superego, contudo, não é
simplesmente um resíduo das primitivas escolhas objetais do id, ele também
representa uma formação reativa energética contra essas escolhas”. (FREUD,
1923-1925, p. 47).

9.5 TOTEM E TABU

Totem e tabu representam um momento crucial na teoria do complexo


de Édipo. Freud (1974) inicia em totem e tabu seus inscritos sobre o horror ao
incesto. A lei é uma forte caraterística dentro de um sistema totêmico contra as
relações sexuais entre pessoas do mesmo totem.
O autor enfatiza sobre a proibição do incesto e o horror: “Em quase
todos os lugares em que encontramos totens deparamos também com uma lei
contra as relações sexuais entre pessoas do mesmo totem e,
consequentemente, contra o casamento”.

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Ainda em totem e tabu, Freud (1974) fortalece sua tese sobre o
complexo de Édipo e introduz a discussão no campo antropológico. “O retorno
do totemismo na infância segue à discussão sobre a origem da exogamia e sua
relação com o totem”. (MOREIRA, 2004, p. 222).
A respeito do tema, Moreira (2004, p. 221) destaca:

O totem é geralmente um animal que demarca os limites, deveres e


direitos do grupo e entre os grupos, e será a partir do totemismo que
surgirá a exogamia. O tabu é proveniente do totem e expressa o
sagrado, o proibido. A organização totêmica impõe a lei a que todos
devem ser submeter. Nesse sentido, podemos acalentar a hipótese
de que o totem é similar ao pai edípico, pois ambos representam e
promulgam a lei de proibição do incesto e são os representantes do
autoabstrato.

O totem é um objeto de culto e de adoração. É qualquer animal que é


idolatrado em cultos e que demarca posições no grupo e entre os grupos. A
partir do totem surge a exogamia que representa o casamento entre grupos
diferentes. O tabu representa qualquer comportamento inaceitável, pois vai
contra as leis e os valores morais do grupo.
Segundo o entendimento da referida autora, o totem é similar ao pai
edípico, pois demarca posições, limita e estabelece a lei. Ambos anunciam a
proibição ao incesto. Quanto à proibição do incesto, Lacan (1998, p. 187) diz
que:

Ninguém jamais pensou em colocar no primeiro plano do complexo


de castração o fato de que o pai efetivamente promulga a lei da
proibição do incesto. As pessoas às vezes até o dizem, mas o pai
nunca o articula, por assim dizer, na condição de legislador ex
cathedra. Ele faz obstáculo entre a mãe e o filho, ele é o portador da
lei, mas em direito, uma vez que, no fato, ele intervém de outro modo.

É importante ressaltar que o pai intervém na relação entre mãe-filho e


estabelece sua posição na família. Segundo o entendimento de Lacan (1998, p.
187), “o pai é portador da lei, mas em direito”. No entanto, o que se percebe é
um pai dotado de autoridade e que interfere na relação mãe-filho de uma forma
incoerente.

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9.6 A CASTRAÇÃO E O COMPLEXO DE ÉDIPO

A castração representa o declínio do Édipo no menino, na menina


promove a sua possibilidade de entrada no drama edípico. “Enquanto nos
meninos o complexo de Édipo é destituído pelo complexo de castração, nas
meninas ele faz possível e é introduzido por meio do complexo de castração”.
(FREUD, 1974. p. 318).
Segundo o entendimento freudiano, não existe uma força que
possibilite o efetivo declínio do complexo de Édipo na menina. O superego é o
resultado final. Há uma estruturação frágil no que tange à moralidade. “Estando
assim excluído, na menina, o temor da castração, cai também um motivo
poderoso para o estabelecimento de um superego”. (FREUD, 1974, p. 223). A
castração tem um papel fundamental. A primazia do falo em períodos
anteriores ao complexo de Édipo permite a ambos (menino e menina)
temerem, neste momento de castração.
Pellegrino (1987, p. 2) faz referência ao problema da relação do ser
humano com a lei:

Não há dúvidas de que a lei, para ser respeitada, precisa ser temida.
Neste sentido, para a resolução do Édipo, é necessário o temor à
castração, segundo a concepção freudiana. Uma lei que não seja
temida – que não tenha potência de interdição e punição – é uma lei
fajuta. No entanto, o temor à lei, sendo necessário, é absolutamente
insuficiente para fundar a relação do ser humano com a lei.

O Édipo na menina é construído a partir da transformação do objeto


libidinal da mãe para o pai. A menina só entra no complexo de Édipo no
momento que ama o pai e desiste desse amor – complexo de Electra. A partir
da castração, a menina busca o ideal do ego (eu), ou seja, o outro-narcísico
demarcado pela castração.

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9.7 A CASTRAÇÃO COMO UMA OPERAÇÃO SIMBÓLICA

Em relação à castração, Costa (2005, p. 3) ressalta:

A castração é um dos conceitos fundamentais da teoria psicanalítica,


tendo sido introduzida por Freud ligada à noção da lei primordial, à
interdição do incesto e à estrutura do Édipo, sendo um elemento de
articulação essencial de toda a evolução da sexualidade.

Lacan (1999) define a castração como uma operação simbólica sobre


um objeto imaginário, o falo, efetuado por um agente, o pai real. A falta do
significando no processo de castração é uma falta simbólica, na medida em
que ela remete à interdição do incesto, que é a referência simbólica por
excelência.
Segundo o entendimento de Lacan (1999), o falo vai funcionar no
complexo de castração como dádiva ou como dom que o pai pode outorgar ou
não à criança para uma investidura futura do sujeito, ou seja, que lhe seja
permitido ter um falo. Aí está o que é efetivamente realizado pela fase de
declínio do Édipo – ele, realmente, carrega o título de posse no bolso.

Lacan articula a presença do pai à lei e a presença da mãe ao lugar


do Outro, ou seja, a mãe na teoria lacaniana ocupa no real o lugar do
Outro primordial, o Outro real da demanda, para onde se dirigirá a
demanda a partir das necessidades. Se a lei do pai intervém, instala-
se a dialética da demanda e do desejo no lugar do Outro. (COSTA,
2005, p. 9).

Na teoria da sexualidade infantil, a castração refere-se a uma


curiosidade da criança em relação aos genitais. A criança não consegue fazer
a distinção entre os órgãos genitais. Para o menino é inconcebível que falte o
falo na menina. O menino percebe que o pai é possuidor do falo. E esta
presença do pai ameaça a sua relação com a mãe. Quando o menino não
consegue competir com o pai, então ele renuncia. Deixa de ser um rival e
passar a amá-lo, ou seja, um amor ainda imaturo.

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9.8 O COMPLEXO DE ÉDIPO LACANIANO

FIGURA 29 - LACAN

FONTE: Revista Escola.

Lacan (1998), ao abordar o conflito edipiano acaba modificando certos


conceitos da estrutura psicanalítica freudiana. Para ele, o conflito edipiano não
deve ser reduzido à sua dimensão imaginária, às fantasias de incesto,
parricídio e castração, mas deve ser compreendido como uma função
estruturante do desenvolvimento.
O autor distingue a fantasia edípica imaginária do processo
estruturante simbólico. Ele vincula o complexo de Édipo ao problema de
identidade pessoal. Além disso, faz referência a três momentos da situação
edípica. Vejamos:

a. Primeiro momento: a criança busca poder satisfazer o desejo da


mãe, quer dizer o objeto de desejo da mãe.
b. Segundo momento: a mediação paterna intervém sob a forma de
privação. Lacan nos diz que “o pai é aquele que priva a mãe desse
objeto fálico”. O pai aparece como o rival e como uma ameaça à

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criança. Ela começa a perceber que a própria mãe está submetida
às leis impostas pelo pai. Dessa forma, ela deixa de competir com o
próprio pai.
c. Terceiro momento: há um declínio do complexo de Édipo, trazendo
consigo o fim da rivalidade fálica com o pai em torno da mãe. A
principal caraterística dessa fase reside na simbolização da lei.
Neste sentido, abre o leque de identificações. No caso do menino, há
uma renúncia do falo (significante). Logo, para obtê-lo passa a se identificar
com o pai. A sua identificação irá assumir uma posição ambivalente. “Esse
processo ocorre também nas meninas, sendo investidas as figuras de desejo e
de identificação”. (BOCK; TEXEIRA, 2001, p. 98).
Entretanto, é importante salientar que a identificação com o pai ou com
a mãe determinará o desfecho da situação edípica e, consequentemente, a
escolha do pai ou da mãe como objetos de desejo. O tipo de escolha do objeto
dependerá da opção identificatória efetiva no declínio do Édipo.

9.9 O COMPLEXO DE ÉDIPO E A METÁFORA PATERNA

Lacan (apud Costa, 2005, p. 9) faz referência ao complexo de Édipo:

Lacan se refere ao complexo de Édipo sob a forma de metáfora


paterna, que vai dar uma solução à tríade imaginária mãe-criança-
falo, na qual o desejo da mãe tem um papel fundamental. A metáfora
paterna inscreve a impossibilidade de completude de todo ser
humano e possibilita a sua inscrição enquanto sujeito do desejo.
Lacan usa o termo “complexo”, fazendo operar como antecedente do
conceito de estrutura.

No entendimento lacaniano, o pai aparece como terceiro elemento na


relação entre a mãe e a criança, mas concebe o Édipo fora do ideal
paternalista, sem levar em conta essas tradições, diferenciando a função
paterna das exigências matrimoniais. A primeira função da imago é a interdição
da mãe e a instauração da lei.

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Ao mesmo tempo em que a lei reprova, ela dá lugar ao desejo. Nesse
sentido, não há lei sem desejo. A partir daí, a conciliação e a mediação entre a
lei e o desejo definem o verdadeiro lugar do pai, definem também o verdadeiro
sentido da função de limite, que geralmente lhe é atribuída. Segundo o
entendimento lacaniano, a função do pai modifica-se para função simbólica. A
interpretação do complexo de Édipo não se dá por meio de uma referência
patriarcal, mas em função de um sistema familiar.

10 PERSPECTIVA SOBRE A NOÇÃO DE SUBJETIVIDADE

10.1 O SUJEITO FREUDIANO

Em relação à lei paterna, Rey (2000, p. 48) menciona que:

A psicanálise freudiana, através do complexo de Édipo, apresenta


a autoridade do pai, o que é fonte de impulso contraditório de
submissão e resistência à figura do pai, que conduzem a uma
dolorosa divisão do sujeito, divisão esta que determina um impulso
compulsivo à preservação no centro do inconsciente.

O autor destaca que o sujeito freudiano expressa-se essencialmente


por meio de tendências que, definidas na primeira infância, a partir do sentido
universal do conflito entre a figura paterna e as tendências autênticas da
criança, condiciona os processos de subjetivação posteriores nos quais a
capacidade generativa do sujeito é nula.
Roudinesco (2000, p. 69) têm uma opinião diferente quanto ao lugar do
sujeito freudiano. Nesse sentido, ressalta que: “O sujeito freudiano é um sujeito
livre, dotado de razão, cuja razão vacila dentro de si mesma. É de sua falha e
de seus atos, e não de sua consciência alienada, que pode surgir o horizonte
de sua própria cura”.
Rey (2000) faz sérias críticas à obra freudiana. Para ele, o sujeito não
pode ser visto como tendo uma capacidade consciente alienada, aparecendo

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somente nas fissuras, nas falhas, ou na cadeia infinita dos jogos de significante
e significado. Para ele, Freud não compreende a psique como sentido
subjetivo, como demonstra na sua teoria sobre os mecanismos psíquicos
universais, independentes da história e dos contextos culturais em que vive o
sujeito.
Rey (2000, p. 49) enfatiza que se trata de “um sujeito construído dentro
da perspectiva subjetiva”. Mas antes de conhecer este sujeito, vamos entender
a proposta de Fernando Rey (2000) sobre a subjetividade: “O desenvolvimento
da subjetividade não responde a uma simples preferência teórica, mas sim à
tentativa de reconceituar o fenômeno psíquico em uma ontologia própria,
específica do tipo de organização e processos que o caracterizam”. Rey
desconstrói o sentido dado pela abordagem psicanalítica sobre o sujeito
freudiano.
Dessa forma, ele propõe um sujeito construído por configurações
subjetivas que não conscientiza. Ao mesmo tempo está produzindo de forma
consciente um conjunto de projeções, reflexões e representações, com
capacidade de subjetivação, as quais são fontes de significados e sentidos
cujas consequências em termos do desenvolvimento de sua subjetividade
estão mais além de suas intenções e de sua consciência, mas que passam a
ser agentes importantes do desenvolvimento e da transformação produzidos
desde sua atividade consciente.
Elliot (1992, p. 238) menciona que:

O complexo de Édipo não deve forcar-se como um processo que


conduz a uma introjeção uniforme e repressiva da lei. O complexo de
Édipo irrefutavelmente instaura a lei inconsciente da sociedade
humana, um foco intersubjetivo que também enfatiza que ele
representa uma crucial interação socioafetiva desde a qual se
desenvolvem a autonomia e a individuação. Sobre esta visão, o pai,
no complexo de Édipo, pode ser tanto um companheiro na
compreensão emocional e afetiva, como um modelo que é
repressivamente internalizado.

Conforme a posição do autor, o complexo de Édipo é uma instância


ligada às leis sociais. É o domínio das relações intersubjetivas no qual o sujeito
é portador. O autor discorda que o pai seja detentor de limites e regras. Para

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ele, a figura do pai simboliza um modelo social para o sujeito. Em relação à
interpretação de Elliot, Rey (2000, p. 51) menciona que:

Essa interpretação de Elliot, que abre as possibilidades de


subjetividade da figura paterna, conduziria a compreender essa
relação em seu verdadeiro caráter subjetivo, ou seja, como fonte
de inúmeras alternativas de sentido subjetivo e significação que
dependeriam da qualidade da relação interpessoal com os pais, o
que nos levaria a um complexo de Édipo histórico, socialmente
constituído, que não é a forma em que Freud nos apresenta esta
categoria.

A representação da figura paterna tem um sentido decisivo na


formação e na constituição moral e emocional do sujeito. A qualidade na
relação familiar é o que vai determinar a posição do sujeito na sociedade. A
produção de sentido se dá por meio da internalização das emoções
vivenciadas pelo sujeito.

10.2 O SUJEITO LACANIANO

Em relação ao sujeito lacaniano, Rey (2000, p. 38) diz que:

O sujeito lacaniano está completamente subjugado à linguagem, que


é a base de todas as suas formas de organização pessoal e social.
Porém, não é só o imaginário que ameaça a ordem da linguagem,
mas também a definição do real, que Lacan determina como o que
reside tanto à imagem especular, como se fosse a superfície de um
espelho, como aos processos de simbolização.

Segundo o referido autor, a separação da ontologia da psique se dá


por meio da linguagem. A criança busca superar as consequências da falta,
mas este processo de simbolização nunca pode satisfazer, pois a falta está no
centro da construção do sujeito. Lacan rompe com a ênfase de Freud orientada
ao estudo de instâncias constitutivas da psique, as quais Freud apresentava
muito comprometidas com o determinismo biológico de natureza intrapsíquica,
que é eliminado por Lacan, não somente no que tem de biológico, mas também
ao desconsiderar a psique como constituição ontológica diferenciada.

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Neste sentido, Lacan apresenta a subjetividade somente por meio dos
processos de linguagem, desenvolvendo uma concepção ontológica do desejo
como falta, que não considera sua constituição como dimensão subjetiva,
ficando totalmente aprisionado na organização da linguagem. Como o próprio
Lacan assinala ao referir-se à ordem simbólica, esta não pode ser concebida
como constituída pelo homem senão como constituído a ele. (LACAN, 1996).
Esta proposta o coloca dentro de uma compreensão estruturalista da
linguagem.
Ibañez (1994, p. 68) discorda de Lacan no que se refere ao sujeito. Ele
descreve: “O sujeito é efeito, não causa da ordem simbólica preexistente para
os indivíduos: quando nascem têm já preparados, para cada um, o seu lugar,
no conjunto das relações sociais”. O sujeito não pode ser entendido dentro de
uma visão determinista, como mencionada por Ibañes. O sujeito vai se
constituindo a partir do meio e das relações sociais. Ele não nasce preparado
para isso. É infundável reduzir os comportamentos do sujeito na percepção do
“efeito”.
Rey (2000, p. 46-47) faz várias considerações sobre o aporte de Lacan
para o desenvolvimento da subjetividade. Vejamos:

1. Considero que a obra de Lacan representa uma distorção ao


caminho inicial empreendido por Freud, que foi muito bem
aproveitado para avançar nas construções do tema da subjetividade.
2. Lacan teve o mérito de ter atualizado o pensamento psicanalítico
com os demais avanços da linguística de sua época, e de ter
avançado na compreensão do lugar do simbólico nos processos
psíquicos, assim como na compreensão do papel simbólico no nível
social. Neste sentido, Lacan inaugura zonas de sentido que não
estavam contidas no pensamento freudiano, entre outras coisas pelo
compromisso histórico daquele.
3. A obra de Lacan inaugura um momento particular dentro das
ciências sociais que, em minha opinião, teve um extraordinário
significado no desenvolvimento do tema do discurso, e no lugar
central que o discurso foi alcançado na compreensão dos processos
sociais. Sem dúvida, como afirmei acima, a obra de Lacan atravessa
todo o pensamento filosófico francês e é, no meu ponto de vista, um
antecedente importante de algumas construções do pensamento pós-
estruturalista.
4. Outra contribuição de Lacan nessa direção foi a eliminação do
sujeito, ou melhor, a total submersão deste às estruturas da
linguagem, o qual, com rápidos deslocamentos, leva à sua eliminação
em termos de discurso.
5. Lacan concebe um corpo teórico hermético e com frequência
extravagante, que para ser usado, precisa ser compartilhado, com o

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qual perde capacidade de circulação interdisciplinar, assim como
possibilidades de circulação intradisciplinar.

As explanações de Rey sintetizam as contribuições de Lacan para o


tema subjetividade, bem como o conhecimento sobre a constituição do sujeito.
A obra de Lacan é considerada a mais complexa de todas as referências
psicanalíticas. No entanto, Rey consegue interpretá-la de maneira
extraordinária e descontruir conforme sua teoria da subjetividade.

10.3 O SUJEITO HISTÓRICO-SOCIAL

O sujeito histórico-social e a subjetividade são temas que não se


separam. No entanto, as diversas concepções tornam possível construir a
subjetividade. Rey (2000, p. 35) ressalta que:

Freud concebe o indivíduo enquanto sujeito em sua esfera biológica,


resultando a construção de uma subjetividade reducionista, que
isenta o caráter social de participar desta construção. A subjetividade
não se restringe a um determinado conceito e, por este motivo,
consegue descrever situações e traduzir os sentimentos e emoções
que fazem parte de todo sujeito. Em busca de ampliar o entendimento
deste conceito foi que a subjetividade social surgiu com grande
contribuição.

Para Rey (2000), a identidade social de cada sujeito reflete um pouco


de sua história pessoal. A subjetividade social traz uma grande contribuição no
processo de construção do sujeito. Cada momento passa a ser único e deve
ser relido de maneira bastante específica, compreendendo que a subjetividade
tem suas caraterísticas próprias, peculiares. A visão de sujeito histórico social
traz consigo a compreensão de fatores incluídos em diversos momentos. O
sujeito ao se perceber em um determinado espaço social se detém de
condições que o favoreça.
As explicações do referido autor, enfatizam que o sujeito se faz a partir
do social, do grupo em que convive e de sua história pessoal. A produção de
sentido faz parte do “ser social”. Segundo Roudinesco e Plon (1998), o sujeito

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se expressa por meio do simbólico, elemento do outro (traços da cultura, de
sua história, de ideologias) e do outro (traços do inconsciente, significantes),
que constituem sua subjetividade.
Segundo Rey (2000), o sujeito em sua processualidade reflexiva
intervém como momento constituinte de si mesmo e dos espaços sociais em
que atua, a partir dos quais pode afetar outros espaços sociais. O sujeito
representa um momento de subjetivação dentro dos espaços sociais em que
atua e, simultaneamente, é constituído dentro desses espaços na própria
processualidade que caracteriza sua ação dentro deles, a qual está sempre
comprometida direta ou indiretamente com inúmeros sistemas de relação.
A atuação do sujeito é vista como um processo. O sujeito tem a
capacidade de interagir com diversos sistemas sociais e, consequentemente,
suas ações podem interferir nas relações humanas e no meio. Rey (2000), ao
mencionar o sujeito como representante de um espaço social de subjetividade,
traz uma reflexão bastante peculiar – a entrada do sujeito na produção de
sentido.
É importante considerar que a produção de sentido e subjetivação em
espaços sociais pode preceder de uma formação simbólica, que Lacan destaca
em toda sua obra. Os elementos da linguagem se configuram como uma
dimensão simbólica, na qual as produções de sentido e as experiências do
sujeito têm um papel fundamental na construção das relações sociais.
Rey (2000, p. 229) destaca que:

O contato do sujeito com a realidade não se expressa somente no


nível simbólico, mas no nível das emoções, que estão
relacionadas com registros de sentido dentro dos quais a
dimensão simbólica deixa de ter um caráter externo ao indivíduo e
se integra dentro de um registro diferente, o dos sentidos
subjetivos. Nesse campo a realidade aparece mais além dos
significados que mediam a relação dela com o sujeito.

É fato que o sujeito não se expressa somente no nível simbólico, mas


no nível das emoções, porém, Rey não vai além dessas configurações. Não faz
menção às configurações de autenticidade e percepção do sujeito diante da
produção de sentido. Rey não menciona como a dimensão simbólica deixa de
ter um caráter externo e se integra dentro de um registro diferente.

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Orlandi (2000, p. 63) é uma adepta à obra de Lacan. Assim, ela escreve:
“O sujeito que não sofre os efeitos simbólicos não submete à língua e à
história, ou seja, ele não se constitui”. Todavia, para Orlandi, a submissão
simbólica do sujeito é condição necessária na produção de sentido e nas
relações da língua, história e de ideologia.

10.4 A PRODUÇÃO DE SENTIDOS

Pêcheux (1995, p. 157) ressalta o sujeito como “fruto do desejo


inconsciente, preso na busca infindável de sua realização, de sua completude.
Instância criada no conflito entre consciente e inconsciente, ele não é livre”. Ao
mencionar o sujeito que não é livre, Pêcheux (1995) desafia a teoria das
produções de sentido, de subjetividade e independência do sujeito enquanto
ser social.
Segundo Rey (2000), a visão da subjetividade está apoiada na força no
conceito de sentido subjetivo. O sentido exprime as diferentes formas da
realidade em complexas unidades simbólico-emocionais. O que se espera em
toda forma de apreensão racional. A subjetividade representa uma construção
teórica de valor ontológico, ao passo que é um conceito orientado para gerar
visibilidade sobre as formas da realidade que o conceito delimita.
O que dá significado à vida do indivíduo são as possíveis conquistas.
Para que as conquistas tenham significando, elas precisam estar atreladas ao
desejo, à vontade. O que tem sentido para um sujeito, para outros não têm. A
produção de sentido é algo interno, ou seja, depende da história singular de
cada sujeito.
A produção de sentido não pode ser compreendida no senso comum. É
equivocado pensar que o sentido ou significado devem ser colocados nas
pessoas. Isso não é possível, pois não temos condições de criar necessidades
nos outros, a não ser a partir dos conteúdos internos e subjetivos de cada um.
Dessa forma, a produção de sentido pode ser entendida como uma evidência
das emoções, das vontades e das ações.

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11 NARCISISMO

11.1 O DESENLACE TRÁGICO DE NARCISO

FIGURA 30 - NARCISO

FONTE: Cultura Mix.

Narciso (Nárkissos), apesar de não ser uma palavra grega, contém o


elemento narke, que em grego significa entorpecimento, torpor. Ele nasceu
possuidor de uma beleza excepcional. É filho da ninfa Liríope e do rio Cefiso.
Liríope vai procurar Tirésias, um adivinho capaz de ver o futuro que profetizou
sobre o seu filho. Narciso viverá enquanto não se deparar com sua própria
imagem.
Conta a história que Narciso era um belo rapaz que despertava nas
ninfas desejos incontroláveis, mas preferia viver isolado em seu mundo. Dizia
que não havia uma ninfa que jugasse merecedora do seu amor. Até que um dia
a ninfa Eco surge em cena. No entanto, Narciso desiste também do seu amor.
Ela se sente abandonada e evita ter contato com os outros, vive isolada.
Devido o seu imenso sofrimento, seu corpo vai enfraquecendo até falecer.

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Durante um passeio, Narciso encontra um riacho onde se abaixa para
beber água. Fascinado pelo reflexo, supõe ver outro ser, mas logo reconhece
sua própria face. Deslumbrado por si mesmo, coloca os braços na água para
abraçá-lo e beijá-lo. Aflito por esse desejo impossível se esquece de tudo e seu
corpo vai enfraquecendo, até morrer. Afrodite, sensibilizada pela sua situação,
transforma-o em uma flor.

11.2 O AMOR A PARTIR DO NARCISISMO

FIGURA 31

FONTE: Banco de imagens da Office Microsoft, 2012.

Amar o próximo como si mesmo significa respeitar a singularidade de cada um e é o


valor das diferenças que enriquece o mundo. (BAUMAN, 2004, p. 101).

Lacan (1964, p. 176) refere-se à formação do amor a partir do


narcisismo, ressalta a função do amor como uma energia advinda do desejo.
Ele diz: “é isto que será para nós o mais enriquecedor, no que concerne ao que
devemos conceber da função do amor – a saber, de sua estrutura
fundamentalmente narcísica”. É pela satisfação narcísica que o sujeito
empreende esta troca, como nos diz Freud, em uma busca de velar o que
golpeia o narcisismo. Ser amado representa uma tentativa de mediação entre o

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narcisismo e a castração, já que por se ver amável aos olhos do Outro, o
sujeito também pode se esquivar daquilo que lhe falta.
É essa a imagem que Freud nos dá do enamoramento: “O que ama
sacrifica, por assim dizer, um fragmento de seu narcisismo e só pode restituir
mediante a troca de ser amado”. (FREUD, 1980, p. 75). A referência ao texto
freudiano encontra-se ainda afinada com a análise lacaniana efetivada no
seminário 8: “A transferência que destaca a metáfora do amor existente na
transferência, pela qual a visão narcísica se impõe na situação analítica”.
(LACAN, 1992, p. 123).
O termo escolhido na teoria lacaniana para caracterizar a transferência
é a metáfora, que, por sua vez, indica a formação do inconsciente. Neste
sentido, o amor de que se trata na transferência é concebido a partir de uma
tentativa de realização da falta, em uma formação sintomática em relação à
castração.

11.3 O NARCISISMO PATOLÓGICO

No drama, Narciso despedaça corações, mas não é capaz de ver o


efeito que sua beleza tem sobre as ninfas. Ele só pensa em si próprio. É
incapaz de se identificar com as outras personagens do drama. Este drama
enfatiza um olhar diante das patologias. A estrutura perversa, como vimos no
módulo III, refere-se a uma patologia grave, em que o sujeito narcísico é
incapaz de amar o outro, a não ser a si próprio – amor egoísta. A ausência de
afetividade, egoísmo, narcisismo, exibicionismo, são traços frequentes do
perverso.
O desenlace trágico de Narciso refere-se a uma reflexão sobre
enamoramento pela sua própria imagem e não pelo outro, como no caso da
ninfa Eco. Tal desespero o leva à morte. Ele ama a si próprio e se enfraquece,
Eco ama ao outro e também se enfraquece. O que há de comum nos dois
casos? “O amor”, só que um amor em excesso, egoísta e patológico. Narciso

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não se junta à ninfa Eco, fica impossibilitado de amar o outro. Ele cria um
mundo para si, pensa que não precisa do outro. O narcísico é único e todo
poderoso. O sujeito narcísico é considerado onipotente em pensamento e
palavras. Exalta a sua própria imagem, não deixa de investir parte da sua libido
no eu.
É importante destacar que um dos sintomas principais da perversão é o
“the best”, que corresponde “ao melhor”, “ao todo poderoso” caraterístico do
desenlace trágico de Narciso. O sujeito narcísico é aquele que dá amor de
forma irrestrita. Só deseja ser idolatrado e admirado. Cria na sua mente um
mundo idealizado que não corresponde ao mundo real. Não pode receber nada
que vem de fora, a não ser elogios.
Narciso é considerado um deus do amor próprio, interessado apenas
em satisfazer a sua vaidade. No drama, chega à destruição por causa do seu
excesso de vaidade e exibicionismo, e enfraquece até a morte. Não consegue
lidar com a frustração e com seus próprios sentimentos. Onde está o núcleo da
tragédia narcísica? Na patologia perversa.
A ausência de sentimento e a transcendência condena Narciso à
solidão e à destruição própria. Como vimos no módulo III sobre a estrutura
perversa, é notável que a tragédia se assemelhe a uma patologia grave, “o
sujeito narcísico” vive isolado em seu mundo, não consegue se relacionar
efetivamente com ninguém, não sente culpa e nem remorso. O sujeito narcísico
tem traços marcantes, como a ausência de sentimentos e valores sociais.
O sujeito que possui um grau elevado de exibicionismo e vaidade tem
uma probabilidade maior de ser “um narcísico”, mas isso não quer dizer que ele
tenha sintomas de perversão ou outro tipo de patologia. Para ser considerada
uma patologia o sujeito deve apresentar um conjunto de sintomas. Todos nós
em certo grau somos narcísicos, mas não em nível patológico.
A Psicanálise lacaniana acredita na possibilidade de cura da perversão.
O analista lacaniano vai trabalhar justamente o narcisismo do sujeito. Ele
procura fazer com que este não olhe só para si, mas para outras pessoas. A
sua satisfação também deve ser a satisfação do outro.

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11.4 CONCEITO DE NARCISISMO

Em relação ao conceito de narcisismo, Freud destaca (1911, p. 14):

O conceito de narcisismo vem da descrição clínica, indica a


conduta em que indivíduo trata o seu próprio corpo como se este
fosse o de um objeto sexual. O narcisismo tem o significado de
uma perversão que absorve toda a vida sexual da pessoa, e está
sujeito às mesmas expectativas com que abandonamos o estudo
das perversões em geral.

Luciano Elias (1995) define o narcisismo como um processo pelo qual


o sujeito assume a imagem do seu corpo próprio como sua e se identifica com
ela (eu sou essa imagem). Implica o reconhecimento do eu a partir do corpo
próprio investido pelo outro.

11.5 O NARCISISMO FREUDIANO

As primeiras menções de Freud sobre o termo “narcisismo” se


encontram no artigo “Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade”. Os conflitos
psíquicos podem ser caraterizados pela oposição entre as forças das pulsões
sexuais e o eu. Neste sentido, o eu é investido como objeto libidinal.
“No trabalho sobre Leonardo da Vinci (1910), Freud faz referência ao
narcisismo, relacionando este termo com a opção pelo objeto homossexual.
Assim, o menino se identifica com a mãe e busca posteriormente parceiros que
representam o seu duplo”. (DRUBSCKY, 2008, p. 2). É no estudo sobre
Schreber que Freud reforma o conceito de narcisismo. Por sua vez, este
conceito ganha sua devida proporção, a de protagonista na cena da terapia
pulsional. O narcisismo deixa de ser equivalente ao autoerotismo e passa a
ocupar um lugar fundamental na história libidinal do sujeito, entre o
autoerotismo e o amor objetal:

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Investigações recentes chamaram nossa atenção para um estádio na
história evolutiva da libido, que se cruza com o caminho que vai do
autoerotismo ao amor objetal. Este estádio foi designado como
narcisismo. Consiste no momento do desenvolvimento do indivíduo
em que ele reúne suas pulsões sexuais de atividades autoerótica,
para ganhar um objeto de amor. Toma a si próprio e seu próprio
corpo antes de passar para a escolha de um objeto que seja outra
pessoa. (FREUD, 1911, p. 56).

Em “Totem e Tabu”, Freud (1974, p. 20) afirma que “o narcisismo não é


uma fase evolutiva, um estágio passageiro na história libidinal do sujeito, mas
uma estrutura permanente que continua a existir apesar das reestruturações
libidinais posteriores”. Em relação à introdução do narcisismo, Drubscky (2008,
p. 3) lembra que:

Em 1914, Freud apresenta seu importante artigo “Sobre o narcisismo:


uma introdução”, em que introduz o narcisismo como um conceito e
amplia o que havia dito até então, admite a existência simultânea de
uma libido do eu e uma libido do objeto. Essa concepção faz com que
se mude a forma de entender o conflito psíquico, uma vez que o eu já
é mais neutro diante dos investimentos.

“A partir da conceituação do narcisismo, este passa a ser também


objeto de investimento libidinal. Assim, a dinâmica do conflito psíquico se
complica, uma vez que os polos de tensão já não funcionam mais em
oposição”. (DRUBSCKY, 2008, p. 4).
Segundo o entendimento de Rinaldi (1996), o princípio moral é visto
como uma instância de socialização e identificação. O narcisismo se origina da
constituição do princípio moral ou mesmo de traços comuns. A hostilidade
também faz parte desse processo e pode ser notada nos grupos sociais. O
autor ainda salienta o narcisismo das pequenas diferenças e que se dá por
oposição aos outros. O que remete à discussão, no campo da ética, das
possibilidades e da solidariedade.

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11.6 NARCISISMO PRIMÁRIO E SECUNDÁRIO

De acordo com Laplanche e Pontalis (2008), o narcisismo primário


designa um estado precoce em que a criança investe toda a sua libido em si
mesma. “Já o narcisismo secundário se define como o investimento da imagem
do eu, sendo essa constituída pelas identificações do eu com as imagens dos
objetos”. (LE POULICHET, 1997, p. 2). Apesar da noção de narcisismo
secundário ser proveniente das esquizofrenias, Freud não se limitou aos casos
de psicose, pelo contrário, estendeu a sua percepção a todos os neuróticos.
Dessa maneira, o narcisismo secundário pode ser entendido como um retorno
ao “eu” e aos “objetos”.
É importante considerar que tanto o narcisismo primário quanto o
secundário causaram problemas na composição dos termos freudianos, não só
pela ênfase na libido, mas também pelos modos de investimento.

1.7 O NARCISISMO LACANIANO

Lacan (1996) faz pouca referência ao mito de Narciso, porém suas


analogias trazem conceitos mais aceitáveis para explicar o processo de
identificação e constituição do eu. “Dessa forma, segundo a teorização de
Lacan sobre o estágio do espelho, o eu encontra sua constituição na mesma
operação que lhe condena a uma condição de alienação, ele é formado na
experiência especular pela identificação de uma imagem exterior e
discordante”. (LACAN, 1966, p. 2).
O estádio do espelho traz a reflexão sobre como o sujeito se relaciona
com os outros e com objetos externos. A imagem do outro provoca no sujeito
uma reconhecimento. A partir desta simbologia narcísica, o sujeito cria uma
identidade. Em relação à fase do espelho, o reconhecimento do corpo implica a
perda da ilusão de onipotência sentida pela criança. A flexibilidade possibilita o

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reconhecimento a partir do outro. A criança, ao se reconhecer no espelho,
restringe-se a esta possibilidade, pois a imagem fica preservada em seu
interior.
No momento em que o reconhecimento no espelho acontece, o sujeito
se envolve com sua imagem, busca por si mesmo algo se perde. No entanto, o
que se perde é justamente a capacidade de completar-se como objeto. No mito
de Narciso, ele reconhece sua imagem refletida nas águas, se vê no imenso
espelho, mas se perde no seu egoísmo, na sua onipotência, se afasta do
mundo e não se completa enquanto sujeito.
Nas palavras de Lacan (1966, p. 113):

O primeiro efeito que aparece da imago do sujeito é um efeito de


alienação. É no outro que o sujeito se identifica e mesmo se
experimenta de início. Essa relação erótica em que o indivíduo
humano se fixa a uma imagem que o aliena em si mesmo, eis aí a
energia e eis aí a forma onde tem origem esta organização passional
que ele chamará de seu eu.

No entendimento lacaniano, a constituição do “eu”, do “outro” e da


“realidade” se produz no mesmo nível de alienação. Quando o sujeito não
consegue identificar-se com o outro, é provável que ele desenvolva uma
alienação patológica e uma clivagem do eu. Nesse sentido, é muito importante
a imagem do outro para a criança. É assim que a criança se assemelha, se
identifica e torna possível o seu desenvolvimento afetivo.

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12 UMA PERCEPÇÃO LACANIANA SOBRE AS VICISSITUDES DO AMOR

FIGURA 32

FONTE: Banco de imagens da Office Microsoft, 2012.

Lacan (1959) passa a privilegiar o próprio objeto ao invés do


significante que o marca. O amor na vertente do objeto “a” diz respeito à falta
de representação do desejo. No mito de Don Juan, Lacan apresenta a utopia
de que todas as mulheres são possíveis para amar, não importando a marca
que portem.
Como diz Lacan (1985, p. 19): “Vocês não veem que o essencial no
mito feminino de Don Juan é que ele as tem uma a uma?”. Conforme as
opiniões de Maia e Caldas (2011), qualquer marca serviria para despertar a
compulsão ao amor, já que seria o próprio objeto, entendido como objeto causa
de desejo, o fator desencadeante.
Não se trata mais de substituição de objetos amados, já que o objeto
não é substituível. Como é fácil perceber, Lacan está se valendo de uma lógica
contrária àquela da marca significante, de modo que o amor é agora pensado
como algo que poderia tamponar a perda originária que gerou a própria
capacidade de o sujeito desejar.
Isso quer dizer que o desejo de ser Um, no amor, decorre da busca do
objeto perdido, que na realidade nunca existiu. “Portanto, o amor é impotente,

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ainda que seja recíproco, porque ignora que é apenas o desejo de Um o que
nos conduz ao impossível de estabelecer a relação dos (...) dois sexos”.
(LACAN, 1985, p. 14). Temos então, por um lado, a impotência do amor para
fazer Um, ou para fazer existir a relação sexual; por lado, temos “a suplência
do amor” à relação sexual que não existe. Nessa perspectiva, Lacan deixa
claro que o amor não tampona o furo constituinte do desejo, onde se aloja o
objeto “a”, causa de desejo, pois o objeto “a” nada mais é, a partir de então, do
que um semblante de ser. O objeto “a” parece apenas fornecer “o suposto do
ser”. (LACAN, 1985).
Para Lacan, o amor se dirige a um semblante, pois o semblante se
apresenta onde não existe a relação sexual. Ao tomar como referência o objeto
“a” como semblante, ele faz a distinção de semblante e ser. Essa percepção
implica em uma discussão relativa ao registo da antologia que se encontra
numa doutrina que define o objeto antes de uma experiência.
A antologia trabalha com um marco intuitivo e conceitual da
objetividade, das determinações gerais do ser. No entanto, Lacan enfatiza que
a linguagem é um campo mais rico de recursos do que simplesmente aquele
no qual se inscreve, no curso dos tempos, o discurso filosófico.
Lacan discorre sobre o objeto “a” como um semblante, depois
esclarece que a linguagem é sempre lateral ao seu efeito de significado. Nesta
visão, o amor visa o outro em seu ser, “isto é, aquilo que, na linguagem, mais
escapa – o ser que, por um pouco mais ia ser ou o ser que, justamente por ser,
fez surpresa”. (LACAN, 1985, p. 44).
Nesses termos, Caldas (2008, p. 12) nos fornece uma clara definição
para o semblante: o semblante é “até onde se pode ir com o jogo significante
em direção ao real e ao seu gozo”.

FIM DO MÓDULO IV

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