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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
EDUCAÇÃO
CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES EM
PSICOLOGIA
Salvador
2007
MARIA ROSALIA DE AZEVEDO CORREIA
CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES EM
PSICOLOGIA
Salvador
2007
C em Psicologia
7
255 fls.
MARIA ROSALIA DE AZEVEDO CORREIA
CONSTRUÇÃO DE IDENTIDADES EM
PSICOLOGIA
Hannah Arendt
RESUMO
The issue of identity constitutes today in a relevant theme for Social and
Human Sciences, considering that the diversified and plural contemporary world
denies the existence of fixed and hegemonic identities and admits the coexistence of
plural identities developed in the social processes of identification and difference.
The purpose of this thesis is to study the construction of professional identities in
Psychology, with students of a particular Psychology undergraduate course, taking
as reference the curricular academic experience and considering Psychology as a
feminine profession. There is an interest in following the tracks through which these
students adopt some discourses and subject positions which state them as
psychologists. The research begins with the summary and analysis of a
questionnaire answered by students at the moment when they enter the Course,
regarding the understanding they start to develop about Psychology and being a
psychologist, and through the process of focal groups and document analysis. An
attempt is made to follow the tracks through which the students ressignify their
concepts about Psychology, and that which makes them feel they are psychologists.
A multi-referenced theoretical approach is used, anchoring the research in
knowledge from Social Psychology, Gender Studies, Philosophy and the curricular
theories, among others. The research data reveal that these students enter the
Course idealizing pursuing Clinical Psychology, a field which is performed through
private practice, which is a reproduction of the medical model of clinical consultation,
and this does not change much throughout the Course. Thre is, however, a
ressignification in understanding of the professional, when, at the end of the Course,
students understand psychologists as listening professionals, whom, through a
careful, ethical and theorethically based listening approach, provide help to those
who seek them. They understand that the construction of these identities during the
course happens through a process, and that some of the curricular practices such as
the Internships and the undergraduate research project, among others, contribute a
lot to that. They also underline the importance of personal psychotherapy as an
essential tool for their professional education. Despite the introduction of innovative
practices, the course curriculum still reveals itself as fragmented and technicist. In
conclusion there is a need to restructure the curriculum, besides changing
Psychology from a feminine profession, as it is observed that there is an unintentional
gender issue in the curriculum. Since gender is a way of understanding the world,
and considering Psychology as a feminine professional, it is also a way to understand
the profession. A recomendation is made to change Psychology from a feminine
profession, desconstucting the view of women as delicate, sensitive and fragile which
impregnates the profession, blocking a renovation of practices to attend the demands
of the contemporary world. It is considered that the great challenges to be confronted
in the development of Psychologists are: to change the profession from its feminine
bias, to go beyond a stereotyped and reducionist view of the profession, and to invest
in the restructuring of the curriculum to make it less fragmented.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
GRÁFICOS
QUADROS
TABELAS
INTRODUÇÃO 14
1 TECENDO AS IDENTIDADES 40
1.1 FALANDO DE IDENTIDADES 40
1.1.1 Entendendo as identidades pela historicidade 41
1.1.2 Algumas concepções contemporâneas de identidade 43
1.1.3 Identidades em movimento 46
1.1.4 Identidades simbólicas e discursivas 49
1.2 IDENTIDADES DE GÊNERO 52
1.2.1 Buscando compreender o conceito de Gênero 52
1.2.2 Vivência do feminino 54
1.2.3 Vivência do masculino 62
1.3 IDENTIDADES PROFISSIONAIS 67
REFLEXÕES 226
REFERÊNCIAS 232
APÊNDICES 247
ANEXOS 250
14
INTRODUÇÃO
1
Publicado originalmente em inglês como: SCOTT, Joan. Gender: a useful category of historical
analysis. In: _____ Gender and the politics of history, New York: Columbia University Press, 1998.
p. 28-52. No Brasil, teve três versões publicadas em 1990, 1991 e 1995.
20
Os sentidos precisam estar afiados para que sejamos capazes de ver, ouvir,
sentir as múltiplas formas de constituição dos sujeitos implicados na
21
2
De acordo com Neuza Guareschi, Michel Bruschi e Patrícia Medeiros (2003, p. 35), a
interdisciplinaridade e o rompimento da fronteira das disciplinas faz com que a metodologia adotada
pelos Estudos Culturais possa ser diversificada e até ambígua: “Definida como uma bricolage, o
que influencia escolha das práticas de pesquisa são as questões que são feitas, e estas dependem
de seu contexto.”
24
Essa questão já havia sido abordada por Michel Foucault (1999), quando de
sua conversa com Gilles Deleuze, ao falarem a respeito da separação teoria-prática.
Em resposta a uma provocação de Foucault sobre a participação na política,
Deleuze responde:
[...] um sujeito constituído no gênero, sem dúvida, mas não apenas pela
diferença sexual, e sim por meio de códigos lingüísticos e representações
culturais; um sujeito “engendrado” não só nas experiências de relações de
sexo, mas também mas de raça e classe; um sujeito, portanto, múltiplo em
vez de único, e contraditório em vez de simplesmente dividido.
3
Ciampa defende a idéia de identidade como metamorfose, afirmando, numa perspectiva do
materialismo histórico-dialético, que há uma identidade pressuposta que é continuamente re-posta
por meio da consciência e da atividade (CIAMPA, 1987, 1994).
4
Psicóloga brasileira que, dentre outros, liderou o movimento de reestruturação da Psicologia
brasileira, aderindo às fundamentações marxistas para compreensão de fenômenos psicológicos.
(LANE,1994, 1981).
5
Jacob Levy Moreno, psiquiatra romeno, é autor das teorias que fundamentam o Psicodrama. Para
ele, o ser humano é de natureza social e constitui-se numa intersubjetividade partilhada por seus
pares nas múltiplas relações que vivencia, mediante os papéis que desempenha. Criou a Teoria
dos Papéis (MORENO, 1978).
32
6
Sendo 4 alunas no primeiro grupo e 5 no segundo; um do sexo masculino e quatro do feminino; 7
estudantes no terceiro grupo, dentre eles um homem, 6 no quarto, contando com um do sexo
masculino; e 5 no quinto grupo, sendo todas mulheres.
34
7
Método criado pelo psiquiatra Jacob Levy Moreno, utilizado nas ciências sociais e humanas em
pesquisa social e no diagnóstico. Permite o esclarecimento de relações intergrupais e seus valores
compartilhados a partir da participação ativa de seus componentes (MORENO, 1978).
35
A condensação dos dados passou por alguns momentos específicos que, por
força dos próprios achados na fala dos sujeitos, provocou constantemente uma nova
articulação com a teoria. É possível descrevê-la em momentos:
1 TECENDO AS IDENTIDADES
[...] no nosso século tanto nas ciências sociais quanto nas ciências físicas e
naturais a valorização da autonomia, da subjetividade, emergirá como eixo
de um novo paradigma, integrando-se à imagem do objeto da ciência. Uma
nova forma de se representar a relação entre sujeito e objeto, bem como
entre indivíduo, natureza e sociedade, desenvolve-se como parte de
transformações históricas de uma nova condição pós-moderna que segundo
Lyotard, se delineia desde o final do séc. XIX.
O sujeito pós-moderno não tem mais uma identidade essencial, mas várias
identidades, (trans)formadas continuamente em relação ao modo como é
representado ou interpelado pelos sistemas culturais ao redor, podendo ser
contraditórias ou não resolvidas.
Sabemos que as identidades culturais8 não são rígidas nem, muito menos
imutáveis. São resultados sempre transitórios e fugazes de processos de
identificação. Mesmo as identidades aparentemente mais sólidas, como a
de mulher, homem, país africano, país latino-americano ou país europeu,
escondem negociações de sentido, jogos de polissemia, choques de
temporalidades em constante processo de transformação, responsáveis em
última instância pela sucessão de configurações hermenêuticas que de
época para época dão corpo e vida a tais identidades. Identidades são,
pois, identificações em curso. (SANTOS, 1996, p. 135).
8
Entende-se que identidade cultural é o termo utilizado pelos teóricos que situam o estudo das
identidades na perspectiva contemporânea para marcar que as identidades são sempre construídas
no processo cultural.
47
9
Antonio da Costa Ciampa, psicólogo brasileiro que, em 1987, publicou sua tese de doutoramento
defendida na PUC-SP sob o título A estória de Severino e a história da Severina, um ensaio em
Psicologia Social, na qual propõe a tese da Identidade como metamorfose, como morte-vida. Seu
estudo contribuiu de maneira decisiva para dar visibilidade a essa temática nas pesquisas na área
da Psicologia, influenciando uma geração subseqüente que, adepta da Psicologia Social Crítica,
estuda o tema.
10
Atividade e Consciência – dois conceitos propostos por Karl Marx e Friedrich Engels (1980). A
atividade é definida como o contínuo trabalho dos seres humanos para produzirem suas formas de
sobrevivência. Consciência é a capacidade de simbolizar e representar essas ações, num
movimento dialético que as torna interdependentes. Consoante os autores: “Não é a consciência
que determina a vida, mas a vida que determina a consciência.” (MARX; ENGELS, 1980 p. 307).
48
Essa concepção aceita que as identidades não são nunca unificadas, que
elas são na modernidade tardia, cada vez mais fragmentadas e fraturadas;
que elas não são, nunca, singulares mas multiplamente construídas ao
longo de discursos, práticas e posições que podem se cruzar ou ser
antagônicas. As identidades estão sujeitas a uma historicização radical,
estando constantemente em processo de mudança e transformação.
A posição teórica que esta tese sustenta nega que exista qualquer fator único
como determinante das identidades, inclusive a de gênero, contrapondo-se ao
determinismo biológico que considerava a diferença anatômica dos sexos como
força motriz legítima para as diferenças entre os homens e as mulheres.
Uma das primeiras questões assumidas pelos Estudos Feministas consistiu
exatamente em desconstruir essa concepção biologicista e remeter as questões
relacionadas à vivência do masculino e do feminino à esfera do simbólico, ao plano
das representações que configuraram a área temática de Gênero e levaram a
pesquisadora Joan Scott (1993, p.13) a afirmar que gênero “[...] é um elemento
constitutivo das relações sociais [...] e uma forma primeira de significar as relações
de poder.”
Partilha dessa idéia a pesquisadora Bila Sorj (1992, p.15), quando afirma:
54
publicação, no Brasil, do texto de Joan Scott (1993) Gênero: uma Categoria Útil para
Análise Histórica que provocou os avanços mais significativos nos estudos e
pesquisas. Essa autora assim define gênero:
Minha definição de gênero tem duas partes e várias subpartes. Elas são
ligadas entre si, mas deveriam ser analiticamente distintas. O núcleo
essencial da definição baseia-se na conexão integral entre duas
proposições: o gênero é um elemento constitutivo de relações sociais
baseado nas diferenças percebidas entre os sexos, e o gênero é uma forma
primeira de significar as relações de poder. (SCOTT, 1993, p.14).
Antes de fazer essa proposição, Joan Scott (1993) tece uma crítica detalhada
a estudos de gênero empreendidos até então, afirmando que estes posicionavam-se
como reducionistas, a-críticos e a-históricos e, portanto, legitimadores do paradigma
hegemônico que preconiza a supremacia masculina fundada na diferença anatômica
dos sexos como causalidade única para explicar a hierarquia entre os seres
humanos. Esta pode parecer uma conclusão simplista para a complexidade do texto
de Scott (1993) que avalia, dentre outros, os esforços das teorias feministas de
estudarem a hierarquia de gênero, partindo da teoria do patriarcado, de articulações
com a teoria marxista e/ou com a psicanálise.
O texto de Joan Scott (1993, p.13), entretanto, representa um avanço na
explicação do papel e do lugar da mulher na sociedade, pois sua definição provoca a
possibilidade de considerar gênero como categoria analítica, ou seja, “[...] como
meio de falar de sistema de relações sociais ou entre os sexos.” Joan Scott (1993, p.
14) afirma:
A meu ver é significativo que o uso da palavra gênero tenha emergido num
momento de grande efervescência epistemológica entre pesquisadores em
ciências sociais, efervescência que em certos casos toma a forma de uma
evolução dos paradigmas científicos em direção a paradigmas literários (da
ênfase colocada sobre a causa em direção a para à ênfase colocada sobre
o sentido, misturando os gêneros da pesquisa segundo a formulação do
antropólogo Clifford Geertz). Em outros casos, essa evolução toma a forma
de debate teórico entre aqueles que afirmam a transparência dos fatos e
aqueles que insistem sobre a idéia de que qualquer realidade é interpretada
ou construída: entre aqueles que defendem e aqueles que colocam em
questão a idéia de que o “homem” é o senhor racional do seu próprio
destino.
“por que” para “como”. O “como” exclui a relação linear de causa e efeito e permite
uma articulação, de maior ou menor complexidade, de múltiplas causalidades
provisórias na busca de compreensão do sentido. Nessa perspectiva, é possível
problematizar questões do feminino com outras como raça, classe, etnia, sexo,
religião, geração, dentre outras, com aspectos micro-sociais que singularizam
grupos e definem identidades, desvendando a intrincada rede simbólica que modela
e configura as relações sócio-afetivo-econômicas entre os seres humanos.
Pesquisadoras interessadas em estudar Gênero introduzem questionamentos
outros, a exemplo de Teresa de Lauretis (1994, p. 208), cujo texto publicado
originalmente em 198711 e, portanto, contemporâneo ao de Joan Scott (1993), cuja
primeira publicação data de 1989, questiona o conceito de diferença sexual,
advogando que existe um “potencial epistemológico” nos escritos feministas da
década de 1980 que podem visualizar:
[...] um sujeito construído no gênero, sem dúvida, mas não apenas pela
diferença sexual, e sim por meio de códigos lingüísticos e representações
culturais; um sujeito “engendrado” não só na experiência de relações de
sexo, mas também nas de raça e classe: um sujeito, portanto, múltiplo em
vez de único, e contraditório em vez de simplesmente dividido.
11
Este texto de Tereza de Lauretis foi publicado originalmente com o título The tecnology of gender,
na obra Tecnologies of gender, cujo editor é Indiana University Press, em 1987. No Brasil, foi
publicado no livro organizado por Heloísa Buarque de Hollanda (1994).
58
[...] não existe nenhuma realidade social para uma dada sociedade, fora do
seu sistema particular de sexo-gênero [...] é um movimento a partir do
espaço representado por/em representação, por/em um discurso, por/em
um sistema de sexo-gênero, para o espaço não representado, mas implícito
(não visto) neles.
Seria conveniente situar o processo hoje vivido pelos homens para além do
que se passa entre eles e as mulheres, mas não necessariamente a partir
da relação entre ambos. A relação do homem com o trabalho é complexa,
como também o é com seus amigos e filhos.
[...] O projeto que se apresenta para um homem busca, em nível individual,
integrar o que ele pensa com o que sente e faz, e que, a partir de suas
vivências, possa encontrar formas mais suaves de individualizar-se.
Coletivamente, os homens têm procurado, mediante a organização de
grupos de discussão, avaliar questões referentes à sexualidade, violência,
65
Não podemos nos contentar em dizer que o poder tem necessidade de tal
ou tal descoberta, desta ou daquela forma de saber, mas quem exerce o
poder cria objetos de saber, os faz emergir, acumula informações e as
utiliza [...] O exercício do poder cria perpetuamente saber e, inversamente, o
saber acarreta efeitos do poder [...] Não é possível que o poder se exerça
sem saber, não é possível que o saber não engendre o poder.
E é esse jogo que preside as relações sociais dentre elas às relações entre os
sexos. Ari José Sartori (2001), em pesquisa realizada sobre a participação feminina
no universo sindical, pôde perceber uma relativização dos tipos de masculinidade
acima citadas, na prática de operários. Conclui que elas podem coexistir em um
mesmo indivíduo em diferentes situações de sua vida. Mesmo que a masculinidade
hegemônica seja considerada um padrão idealizado para todos os homens, há
aqueles que criam alternativas em suas relações cotidianas. Existem homens que
não são homofóbicos ou que incorporaram os apelos que as novas posições sociais
das mulheres impõem e, por conseguinte, podem adotar comportamentos próximos
de masculinidades subalternas que convivem com seus posicionamentos de
masculinidade hegemônica numa apropriação particular.
O homem, categoria naturalizada através dos tempos, ou os homens, visto
que são múltiplos e plurais, assistem suas privilegiadas posições tradicionais sendo
questionadas. No dizer de Robert Connell (1995), isso ocorre em função das novas
configurações sociais proporcionadas pela oposição das mulheres aos referenciais
patriarcais, das relações de produção que reordenam novas formas de inserção das
mulheres no mundo do trabalho e da flexibilização da sexualidade representada
pelas alternativas lésbicas e gays.
67
Em uma sociedade marcada por uma divisão sexista, tributária de uma lógica
de dominação patriarcal, as profissões consideradas femininas são aquelas nas
quais se deseja e espera que a mulher possa exercê-la, aproveitando seus “dotes
naturais femininos” derivados de suas funções maternas.
Assim como a identidade de gênero começa a se construir desde o
nascimento, quando se constata as características sexuais externas de meninos e
meninas, as identidades profissionais também têm sua raiz na infância, quando, de
acordo com os padrões de sociabilidade androcêntrico, as crianças recebem
tratamento diferenciado e aprendem as normas e valores da sociedade com relação
à vida coletiva de seu grupo e da sociedade da qual fazem parte.
É no cotidiano das relações familiares e, posteriormente, nos demais grupos
de socialização como escola, igreja, vizinhança, amigos, dentre outros, que as
crianças interagem e reproduzem a divisão sexual das relações sociais. Neles
aprendem desde as diferenças na distribuição das atribuições dos afazeres
domésticos até a forma como lidar com emoções e sentimentos por meio do uso de
brinquedos e modalidades diferentes de brincadeiras de meninos e meninas. Os
meninos podem desenvolver brincadeiras em que a violência, a agressividade, a
competitividade e até a transgressão são tolerados e até estimulados enquanto o
recato, a docilidade, a calma e a delicadeza são exigidos das meninas.
No decorrer do desenvolvimento, as mulheres são direcionadas pela vivência
social a cultivar os “dotes femininos”, que se direcionam para os cuidados com o lar,
o casamento e a criação de filhos.
Guacira Louro (1997, p. 96), ao falar do magistério como profissão feminina,
defende:
[...] seria necessário saber até onde se exerce o poder, através de que
revezamentos e até que instâncias, freqüentemente ínfimas, de controle, de
vigilância, de proibições, de coerções. Onde há poder, ele se exerce.
Ninguém é, propriamente falando, seu titular; e, no entanto, ele sempre se
exerce em determinada direção, com uns de um lado e outros do outro; não
se sabe ao certo quem o detém; mas se sabe quem não o possui.
12
Fazem parte deste grupo ocupacional, além dos Psicólogos, Assistentes Sociais, Biólogos,
profissionais de Educação Física, Enfermeiros, Farmacêuticos, Fisioterapeutas, Fonoaudiólogos,
Médicos, Médicos Veterinários, Nutricionistas, Odontólogos e Terapeutas Ocupacionais.
13
Consultório privado para atendimento psicoterapêutico individual para pessoas com problemas
pessoais.
73
disputa dos saberes e as ideologias subjacentes que estão inscritas nessas relações
de poder.
nos elementos da dimensão subjetiva dos seres humanos, que passou a ser
estudado no plano biológico, valorizando-se o sistema nervoso e o cérebro,
provocou um conflito no seio da psicologia. Luis Figueiredo (1991, p. 22) assim se
refere a esse momento:
sob a forma de manuais para uso didático, eram elaborados pelos docentes ou
confeccionados como trabalhos de conclusão de curso denominados “teses de
doutorado” (BUETTNER, 1990). De acordo com esta autora, os textos oriundos da
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro ocupavam-se das ligações da Psicologia
com a Neurologia e a Psiquiatria, enquanto as teses da Bahia orientavam-se para a
pesquisa da aplicação social da Psicologia, contemplando as áreas da Criminologia,
Psicologia Forense e Higiene Mental.
Observe-se que no próprio movimento de constituição do saber considerado
como saber psicológico havia uma variedade de discursos que coexistiam
simultaneamente e configuravam diferentes identidades, disputadas pelos poderes
oriundos de campos disciplinares distintos, produzidos em diferentes regiões
demográficas, embora abrigados em Cursos de Medicina.
Como este período tem uma duração aproximada de cem anos, nele ocorreu
uma série de acontecimentos que consolidaram a psicologia como uma prática
profissional no interior de três campos distintos: a medicina, que caracterizava a
clínica psicológica; a educação; e as instituições de trabalho.
Com relação à medicina, de acordo com Mitsuko Antunes (1997), além das
teses acima referidas, há a criação do Laboratório de Psicologia no Hospital
Nacional de Alienados, a criação da Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro,
ambos no Rio de Janeiro; o reconhecimento da Psicologia como ciência afim da
Psiquiatria pela Liga Brasileira de Higiene Mental; a realização de Jornadas
Brasileiras e Seminários Brasileiros de Psicologia; a edição de revistas; a criação de
gabinetes de Psicologia junto a clínicas psiquiátricas; além da formação de grupos
de estudos em Psicologia Aplicada, compostos por médicos, educadores e
engenheiros, dentre outras iniciativas não relacionadas. Projetos semelhantes não
se restringiram apenas ao Rio de Janeiro, mas estenderam-se a outros estados
brasileiros.
Mitsuko Antunes (1997, p. 35), ao analisar o contexto da produção dessas
idéias psicológicas no Brasil do séc. XIX, assegura que estas buscavam
14
Segundo Glória Buettner (1990) o Pedagogium era uma espécie de academia e museu pedagógico
com uma produção voltada para as aplicações psicológicas na educação sem o compromisso com
a prática médica.
15
Material produzido para subsidiar o ensino de determinada matéria.
85
16
Considera-se Currículo Mínimo um elenco de matérias determinadas pelo MEC, as quais todos os
cursos superiores do país deveriam seguir. Significa o mínimo de matérias obrigatórias para o
funcionamento de determinado curso. A elas subordinadas, foram criadas as disciplinas de cada
curso.
89
17
Pedagogia, Sociologia, História, Letras e as Licenciaturas, cursos com quatro anos de duração.
90
O início dos anos 1960, no Brasil, foi efervescente no que se refere ao debate
político, ideológico e cultural. Intelectuais e políticos de diversos matizes, sejam
conservadores, liberais, nacionalistas, socialistas e comunistas, expunham seus
projetos e podiam defender suas idéias. Havia, porém, um movimento conservador
que pretendia elevar o país à categoria de moderno e desenvolvido, estabelecendo
parcerias externas de subalternidade e mantendo determinadas posições de
privilégio, ao qual as forças consideradas progressistas impunham-se como
empecilho. Os embates daí advindos, num contexto complexo, em que essas forças
se confrontavam historicamente, foram o pano de fundo para o golpe militar de 1964.
Era, pois, uma nova sociedade que se queria construir, calcada no ideário
liberal, sendo necessário para esse empreendimento a construção de um
“homem novo”; é nesse contexto que novos conhecimentos e práticas se
faziam necessárias, tendo sido a Educação um de seus principais
instrumentos e a Psicologia uma das principais ciências de base para essa
realização.
18
Taylorista como aplicação dos conceitos da Administração Científica como preconizada por
Frederick Taylor em seu livro Primer of scientific management. New York: D. Van Nostrand, 1920.
93
qualquer conhecimento e este será impresso em sua vida pela ação externa daquele
que detém o conhecimento e tem a função de transmiti-lo.
Tomaz Silva (1999) esclarece que Franklin Bobbit, autor do livro The
curriculum19, publicado em 1918, propunha que as escolas funcionassem como as
empresas comerciais e industriais, especificando prévia e precisamente os
resultados desejados e estabelecendo formas de controle e mensuração para se
assegurar do atingimento desses resultados. O currículo, nessa perspectiva,
configurava-se como uma questão de organização. Este modelo de currículo, no
dizer de Tomaz Silva (1999), seria consolidado definitivamente com a publicação do
livro de Ralph Tyler20, em 1949, no qual os estudos sobre currículo centravam-se em
torno das idéias de organização e desenvolvimento, mantendo a ênfase na questão
técnica.
A esse respeito, Roberto Macedo (2002, p.69, grifos do autor) assim se
manifesta:
É verdade que, embora a visão técnica tenha se tornado cada vez mais
hegemônica, na época, educadores outros como John Dewey, em 1902, defendiam
uma concepção de currículo diferente. Segundo Tomaz Silva (1999, p. 23), ele
considerava que “[...] a educação não era tanto uma preparação para a vida
ocupacional adulta, como um local de vivência e prática direta de princípios
democráticos”. Nesse entendimento, está implícita, na construção curricular, a
valorização das experiências e dos interesses dos educandos.
A despeito de John Dewey, em 1902, ou seja, muito antes de Bobbit, ter
publicado seu livro The Child and the curriculum com orientação divergente da citada
anteriormente, a concepção mecanicista conseguiu maior adesão e visibilidade
naquele momento, nos estudos sobre a educação.
19
“Livro considerado o marco no estabelecimento do currículo como um campo especializado de
estudos” (SILVA, 1999, p. 22).
20
O livro, na versão original americana, foi publicado com o título Basic Principles of Curriculum and
Instruction. No Brasil, há uma tradução publicada pela Globo Editora de Porto Alegre, em 1974,
sob o título Princípios Básicos de Currículo e Ensino (SILVA, 1999).
94
21
John Calvin (1509-1564), um dos principais reformadores protestantes do século XVI (GOODSON,
1995).
95
22
Entre eles, Jamil Cury, Neidson Rodrigues, Moacir Gadotti, Bárbara Freitag, dentre outros.
98
profissional com seu contexto, assim como com aqueles aos quais prestava
serviços. Falando do Currículo Oculto, os valores que perpassavam a formação
colocavam os profissionais no modelo clínico de atendimento a pessoas com
problemas, supervalorizando o atendimento clínico, privado, dual, reparador. Era a
visão tradicional da Psicologia, em que os alunos eram instrumentalizados apenas
para esse mister, conforme discute-se ao longo deste trabalho. Era uma perspectiva
de reprodução de um modelo de forma a-crítica, em que a produção de novos
conhecimentos era minimizada, sendo isso comprovado pela inexistência de
atividades de pesquisa, que não eram estimuladas.
23
Análise complexa no sentido que Edgar Morin (2001) atribui ao termo complexo, ou seja, de que é
possível entender os fenômenos humanos a partir dos diferentes elementos que o constituem,
considerando-os como inseparáveis e interdependentes. Morin (2001) entende que a complexidade
representa a união entre a unidade e a multiplicidade.
102
24
Demerval Saviani, Maria Helena Souza Pato, Maria do Carmo Guedes, Teresa Maria Pires de
Azevedo Serio, Isaías Pessotti, Paulo Roberto Martins Maldos, Ana Mercês Bahia Bock e Sigmar
Malvezzi.
104
matéria da revista, Paulo Maldós (1984, p.31) argumenta que, como resultado de
uma política educacional comprometida com os interesses “burgueses” da
sociedade, “[...] é limitado ao estudante de psicologia a possibilidade de experienciar
a realidade social brasileira, a cultura das grandes maiorias [...]” Isto restringe o
aprendizado ao debate teórico realizado em sala de aula. O autor prossegue,
afirmando que distanciados da realidade brasileira e mantendo-se da mesma forma
como foram criados em 1962, os currículos dos Cursos de Psicologia privilegiavam
uma formação para a área clínica, restrita ao atendimento em consultório individual
privado.
A psicóloga Tereza Sério refere-se às articulações que se fazem entre prática
social e prática educativa, defendendo que os currículos estanques e
compartimentalizados refletiam as práticas sociais dominantes na sociedade.
Sigmar Malvezzi (1984, p. 31) corrobora esse entendimento, quando diz: “[...] o
sintoma de que a escola está absolutamente alienada é o fato dela ter um currículo
rígido que não tenha espaço para cursos optativos.”
Fica evidente, nesses posicionamentos, o quanto os currículos dos Cursos de
Psicologia direcionaram a formação para a construção de identidades profissionais
identificadas com pressupostos tradicionais de ação reparadora a males atribuídos a
sujeitos individuais. Nessa perspectiva, atrela seus interesses àqueles que
trabalham para a manutenção do status quo da sociedade, sem compromisso com
sua transformação, posto que não questionam os determinantes sociais de
problemas psicológicos.
Dentre outros argumentos e análises, torna-se importante destacar o
posicionamento de Maria Helena Patto (1984, p. 33) neste debate, que vislumbra
uma possibilidade criativa para o psicólogo, quando afirma: “[...] queremos
transformar o psicólogo num cientista do humano e não um técnico em Psicologia.”
A autora destaca a emergência do potencial transformador do profissional da
psicologia, quando lhes for possível compreender as relações de força e poder que
regem as relações sociais e desenvolver métodos de intervenção por meio dos quais
possa lidar com essas dimensões. Isso significa, segundo a autora citada, incorporar
uma literatura crítica à formação que privilegie as dimensões sociais, políticas,
econômicas, ou seja, históricas da constituição dos seres humanos e da sociedade.
No ano seguinte, a mesma revista, mais uma vez discutindo a formação,
mediante o artigo de Silke Weber (1985), responsabiliza o Currículo Mínimo por
105
25
Isaías Pessotti, Jairo Eduardo Borges de Andrade e João Cláudio Todorov.
26
Essa pesquisadora, em 1975, realizou um estudo, pioneiro no Brasil, sobre a Psicologia como
profissão, o qual, provavelmente, inspirou outras iniciativas de peso que se sucederam, inclusive de
âmbito nacional.
106
qual a psicóloga esclarece que, embora muitos esforços tivessem sido feitos para
modificar o Currículo Mínimo, ao longo dos anos, ele mantinha-se como havia sido
originalmente concebido, mesmo porque as proposições pretendidas não
contribuíam para uma melhora qualitativa da proposta original. Posiciona-se
considerando como o maior problema da formação a realização dos estágios,
porquanto utilizam pacientes como instrumento de aprendizagem, e levanta
questões éticas relativas ao assunto. Questiona ainda a redução do atendimento
psicológico à clínica privada individualizada e às práticas tradicionais da psicologia,
propondo aproximações mais amplas com a esfera social, e critica o modelo de
pesquisa norte-americano transplantado para o Brasil no início da formação do
curso.
A despeito de José Medeiros (1989) argumentar sobre algumas propostas de
modificação curriculares esboçadas desde 1977, nas quais havia preocupações com
exclusão ou inclusão de disciplinas, alteração de nomenclatura, inclusão e exclusão
de pré-requisitos, remanejamento de disciplinas dentro do currículo, dentre outros
assuntos, percebe-se que a formação em psicologia esteve cristalizada, mantendo-
se praticamente inalterada desde então.
Os cursos de Psicologia, conforme se discute ao longo deste capítulo,
instalou currículos articulados a interesses políticos de classes dominantes, assim
como veiculou um saber ascético e despolitizado, trabalhando com uma concepção
de homem abstrato e de fenômenos psicológicos como intrapsíquicos e universais
(BOCK, 1999). Além do mais oferecem todas as condições para a estruturação de
uma profissão feminina, nos moldes estipulados por uma sociedade regida sob a
égide patriarcal, sem nenhum posicionamento crítico sobre a questão.
Nessa perspectiva, as teorias psicológicas tributárias do pensamento
iluminista que aderiram ao modelo de ciência natural para obter foro de ciência no
final do século XIX, foram apropriadas pelos psicólogos de uma forma psicologista,
qual seja a de que o mundo subjetivo dos seres humanos tem uma vida própria,
descolada de outras instâncias da vida, e explicam-se por si só.
A escola, como instância privilegiada na construção de identidades, tem uma
dupla função: construir valores e conhecimentos. No curso superior, na formação
profissional, esses objetivos escolares são supervalorizados, pois se referem à
construção de um projeto de vida no qual são construídos sentidos sobre os modos
de pensar, sentir e vivenciar uma profissão. E isso acontece mediante um jogo
107
27
O Fórum de Entidades Nacionais da Psicologia é formado pelas instituições listadas a seguir. À
época do encaminhamento da nova proposta de Diretrizes Curriculares, porém, nem todas já
faziam parte do Fórum. Associação Brasileira de Ensino de Psicologia (ABEP); Associação
Brasileira de Orientadores Profissionais (ABOP); Associação Brasileira de Psicologia Jurídica
(ABPJ); Associação Brasileira de Neuropsicologia (ABRANEP); Associação Brasileira de Psicologia
Escolar e Educacional (ABRAPEE); Associação Brasileira de Psicologia Social (ABRAPSO);
Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP); Associação
Brasileira de Rorschach (ASBRo); Conselho Federal de Psicologia (CFP); Conselho Nacional de
Entidades Estudantis de Psicologia (CONEP); Federação Nacional dos Psicólogos (FENAPSI);
Instituto Brasileiro de Avaliação Psicológica (IBAP); Sociedade Brasileira de Psicologia do
Desenvolvimento (SBPD); Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar (SBPH); Sociedade
Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho (SBPOT); Sociedade Brasileira de Psicologia
Política (SBPP); Sociedade Brasileira de Psicologia e Acupuntura (SOBRAPA).
28
Fundamentos Epistemológicos e Históricos, Fundamentos teórico-metodológicos, Procedimentos
para a investigação científica e a prática profissional, Fenômenos e processos psicológicos,
Interfaces com campos afins do conhecimento e Práticas profissionais (BRASIL, 2006 c).
110
29
Na elaboração deste capítulo, foram consultados os seguintes documentos da FBDC/EBMSP:
Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) e o Projeto Pedagógico do Curso de Psicologia.
113
e fatores nos quais está inserido o ser humano. Fala-se das condições materiais,
sociais, econômicas, biológicas, afetivas, psicológicas e, inclusive, das dimensões
política e jurídicas que regem a sociedade e circunscrevem a vida dos seres
humanos, delimitando a existência de condições objetivas e subjetivas nas questões
relacionadas à saúde e à doença.
A Resolução de n. 218, de 06 de março de 1997, do Conselho Nacional de
Saúde, órgão que integra o Ministério da Saúde, inclui a Psicologia no rol das
“profissões de saúde de nível superior”. Com este ato, legitima uma ambivalência no
trato dessa profissão pelos órgãos governamentais, haja vista que o Ministério da
Educação (MEC), por meio do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais “Anísio Teixeira” (INEP), inclui a Psicologia no elenco das ciências
humanas. Esses aspectos denunciam as contradições características da Psicologia
na delimitação de seu campo de estudos, tributárias da cisão entre os saberes das
humanidades, próprios da filosofia, e a adoção dos saber das ciências da saúde,
para obter fórum de ciência, em finais do século XIX.
O Curso de Psicologia sediado em uma instituição de saúde, rompe com o
lócus tradicional em que se dá essa formação no Brasil, ou seja, em Faculdades de
Filosofia ou de Ciências Humanas. Esse fato, por si só, confere singularidades a
este curso, no que tange à construção de sua identidade assim como de seus
estudantes.
O Curso teve seu funcionamento aprovado em 1998, porém foi implantado no
vestibular de dezembro de 1999 e iniciou sua primeira turma em março de 2000. A
admissão do aluno é feita mediante processo seletivo vestibular, com dois ingressos
anuais de 50 alunos por semestre, e, havendo vagas remanescentes, por meio de
processo seletivo de transferência seguindo calendário semestral da instituição.
A despeito da proliferação de novos cursos autorizados pelo Ministério da
Educação desde a Reforma Universitária, em 1968, este curso é o quarto a iniciar-se
na Bahia, que tinha, até então, nesta área, uma trajetória singular.
O primeiro Curso de Psicologia da Bahia30 foi criado em 1968 e integrou-se à
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia como
resultado de uma série de fatores que confluíram para seu funcionamento. O
30
Os dados referentes a este assunto foram retirados de um artigo de circulação interna produzido
por alunos do Curso de Psicologia da FBDC/EBMSP, intitulado A criação do primeiro curso de
Psicologia da Bahia que integra a pesquisa Educadores e educadoras de Psicologia da Bahia:
Gênero e moralidade em questão, realizada sob a coordenação da profa. Dra. Elizete Silva Passos.
115
Proposta curricular original (C.M.) até Nova proposta curricular com Nova proposta curricular
o 8º semestre; adaptações, ou seja, com um conforme anexo C
Modificações na proposta de novo rearranjo curricular onde
Estágios (Est. Básicos I, II e III ao as disciplinas introduzidas
longo do curso e Est. Específico no foram incorporadas ao longo
9º e 10º semestres); dos semestres e
Introdução da disciplina “Diagnóstico integralizadas até o 5º
e Intervenções em Psicologia” no 8º semestre.
semestre;
Introdução das ênfases curriculares
com Estágios Específicos (9º e 10º);
Introdução de Trabalho de Conclusão
de Curso
porquanto exigiam que, para cursá-las, o aluno houvesse sido aprovado em todas as
anteriores, e ato contínuo, transformava-se em pré-requisito para todas as
subseqüentes (ver Estrutura Curricular no Anexo B).
A respeito dos estágios supervisionados, realizados no último ano, a proposta
do Currículo Mínimo exigia que, em cada semestre (9º e 10º), o aluno freqüentasse
três estágios diferentes, o que significava que, em um ano, depois de uma formação
com peso teórico, fragmentada e descontextualizada, o aluno percorresse seis
campos de estágio distintos, numa adesão a concepção de prática como aplicação
da teoria e numa fragmentação que não permitia ao estudante sequer compreender
o que seria a atuação do psicólogo em contextos de prática, empobrecendo
sobremaneira a leitura da realidade e as articulações teoria-prática.
As discussões que se sucederam desde a implantação da primeira turma
sobre a viabilização do Curso numa perspectiva menos tradicional foram a base que
permitiu, num esforço coletivo, que modificações fossem introduzidas e
consideradas na elaboração de um novo Projeto Pedagógico para o Curso. A
despeito do reconhecimento de que o fato de estar sediado em uma instituição de
saúde determina aspectos da formação dos profissionais da psicologia na
construção de suas identidades, na perspectiva da formação do profissional
generalista, na reformulação do currículo, foram introduzidas modificações
referentes a:
Como definiu duas ênfases, seguindo as orientações das DCN, quais sejam,
Práticas de Psicologia em Saúde e Práticas de Psicologia em Trabalho e
Organizações, considera, com relação à primeira, que “[...] o foco desta ênfase será
o ser humano e a saúde nas dimensões preventiva, curativa e reabilitadora, com
múltiplas possibilidades de configuração e intervenção.” (FBDC, 2003, p.7). E
agrupou em torno dessa ênfase tanto o trabalho do psicólogo junto a instituições de
saúde quanto ao trabalho clínico que se caracteriza pelo atendimento de consultório.
122
O discurso como prática social, como propõe Foucault (1999 e 2001b), não
pode ser entendido separadamente das práticas não discursivas. Interpela os
sujeitos a ocuparem determinadas posições sociais, com base na identificação com
determinados discursos que vão dizer exatamente o que se é e o que não se é ou
não quer ser, em dado momento. Por meio da análise desses discursos, é possível
compreender como determinadas identidades foram forjadas e abre-se a
possibilidade de construir novas identidades, mediante narrativas diferentes, plurais,
e contra hegemônicas.
131
31
Para Morin (2001, p. 89): “Complexo é o que é tecido junto.”
132
deles informam que os pais (44,3% pai e 45,6% mãe) possuem nível superior de
educação; 20% colocam a profissão do pai como empresário, sem especificar nível
de instrução, enquanto apenas 9,9% referem-se à mãe como dona de casa.
mais de 10 salários
18 72,00% 75 59,52%
mínimos
ainda como Cursos, cuja presença feminina constitui-se menos de 20% do total de
alunos, o Curso de Engenharia Civil (16%), Física (15%) e Agronomia (18%).
Esses dados apontam para a forma como as sociedades ocidentais têm
produzido desigualdades fundadas nas diferenças, em especial na de gênero,
oriundas do modelo de razão moderna que produz a separação entre sujeito e
objeto, público e privado, cultura e natureza, razão e emoção, objetivo e subjetivo,
dentre outras dicotomias, estabelecendo uma relação de hierarquia e submissão do
segundo elemento ao primeiro.
Seguindo esta lógica, numa sociedade regida por uma ordem patriarcal32, as
profissões ditas masculinas priorizam o desenvolvimento do raciocínio lógico, do
pensamento abstrato, guiadas pela razão e pela força que poderão dar ao homem
as possibilidades de realizar conquistas, de exercer posições de mando e poder, tal
como se espera do homem ocidental, enquanto para as mulheres estão destinadas
as profissões que se identificam com seus “dotes naturais”. São, portanto,
“apropriadas” para elas, aquelas profissões que proporcionam a continuidade do lar,
preferencialmente exercidas em ambiente fechado, onde são necessárias
qualidades “inerentes” à maternidade e ao cuidado com o lar e com os outros,
incluindo, como o outro de maior peso, os filhos.
No caso do Curso de Psicologia da UFBA, no período de 1974 a 1994, a
pesquisa de Elizete Passos (1997) revela que 18% dos alunos matriculados eram do
sexo masculino, enquanto 82% eram do sexo feminino. Esses dados permitem
afirmar que a Psicologia é uma profissão marcada pelo estigma de Gênero.
Considera-se que a Educação promovida por agências de formação,
quaisquer que sejam, não possuem, em si, atributos que possam qualificá-las como
masculino ou feminino, ou como veiculadoras de um saber superior ou inferior. As
profissões consideradas masculinas ou femininas estão impregnadas da construção
histórico-social do ser homem e do ser mulher em determinada sociedade, exibindo
a marca de Gênero.
32
Patriarcado – teoria social que postula uma forma de hierarquia social, em que os homens são os
detentores do poder e as mulheres estão a eles subordinadas, numa relação em que a autoridade
social é exercida por meio dos papéis de pai e de marido.
138
O Questionário (Anexo A), aplicado aos alunos, no primeiro dia de aula, não
foi intencionalmente elaborado para coletar dados para esta pesquisa singular.
Pretendia conhecer o entendimento demonstrado pelos alunos sobre a Psicologia e
a profissão, uma vez que estavam se candidatando à profissão de psicólogo e
ingressavam em um curso superior de Psicologia. Havia também o interesse inicial
de registrar os motivos referentes à escolha profissional e à expectativa futura de
atuação, dados que deveriam compor um banco de informações sobre o Curso, para
posterior análise.
Não respondeu
Outros
Cura
Ouve
Cuida
Resolve
Ajuda e entende
0,00% 5,00% 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00 45,00 50,00
% % % % % % % % %
Fem. Masc.
E isto quer dizer que este modelo estereotipado, de fato, povoa o imaginário
social da profissão e é alimentado pelos posicionamentos dos próprios psicólogos.
Branco (1998) concorda com esse pensamento, acrescentando que a referência do
consultório é tão importante para a construção da identidade do psicólogo que,
quando não trabalha no consultório, ele tem dificuldade na construção de suas
identificações como profissional.
142
Outros
Não respondeu
Pesquisa / estuda
Cuida
Ajuda-se
Ajuda
Fem. Masc.
Outras áreas
Ong´s
Escolas
Empresas / Organizações
Consultório
Clínicas
Hospitais
Fem. Masc.
pacientes terão acolhida para seus segredos e sofrimentos mais intensos, com
possibilidade de resolutividade. Considere-se ainda que é o trabalho no consultório
que dá à Psicologia o status de profissão liberal e isto tem um impacto muito positivo
na sociedade, conferindo prestígio social aos profissionais.
As respostas dos alunos e alunas sobre o ser psicólogo evidenciam certa
fantasia sobre o suposto “psicólogo clínico”. Indica provavelmente que deve estar
sendo representado, tal como era exercido no início da profissão, nos idos de 1970,
conforme definem Rosemary Achcar e Antonio Bastos (1994), quando explicitam o
modelo hegemônico que caracteriza a atuação do psicólogo no Brasil. Segundo os
autores, há o predomínio das atividades clínicas, marcadas pela atuação em
consultório particular, com dedicação parcial de tempo, no exercício psicoterapêutico,
preferencialmente dirigido à clientela adulta e de classe média.
Ana Bock (1999), entretanto, ao discorrer sobre a história da Psicologia no
Brasil, assegura que a partir da década de 1980, nos meios psicológicos brasileiros,
já havia uma tentativa de reinventar o psicológico. Refere-se a um questionamento
deflagrado pelas entidades representativas da psicologia para discutir a função
social da psicologia e da profissão, redefinindo seu lugar na sociedade
contemporânea. Nesse particular, Eliane Moura (1999) adverte sobre a necessidade
de se redefinir o modelo de atuação de psicólogos, a fim de ultrapassar os limites
restritos do consultório. Isso também levou João Ferreira Neto (2004, p.163) a falar
sobre um modelo estereotipado de profissional ou seja: “[...] um modelo de prática
liberal autônoma, individual, voltada para as classes médias e altas em consultórios
particulares.” E assegura este mesmo autor que, nos dias de hoje, a clínica
psicológica vem sendo redefinida com base nas novas práticas profissionais e
propõe que ela seja pensada não mais como área de atuação, mas como uma
atitude, como ethos.
Quanto ao objeto de trabalho de psicólogos, os estudantes que responderam
ao questionário posicionaram-se, em torno de 50% para ambos os sexos,
explicitando que psicólogos trabalham com pessoas, incluindo pessoas que
necessitam de ajuda, seguindo-se, em ordem decrescente, trabalho com a mente
humana, com o comportamento, com as relações, dentre outras respostas.
É no item referente às qualidades pessoais que o psicólogo deve possuir,
entretanto, que se revela, com maior intensidade, o peso da profissão feminina. Nas
respostas dadas pelos estudantes, pode-se verificar que há diversos aspectos
147
Simpatia
Sinceridade
Responsabilidade
Vontade de ajudar
Inteligência
Saber falar
Ser ético
Competência
Ser observador
Calma
Equilíbrio
Imparcialidade
Sensibilidade
Compreensão
Paciência
Fem. Masc.
Não respondeu
Outros
Está em dúvida
Desejo de ajudar-se
0,00% 5,00% 10,00% 15,00% 20,00% 25,00% 30,00% 35,00% 40,00% 45,00%
Fem. Masc.
[...] sou encantada em relação ao ser humano, seu comportamento, seus problemas
da subjetividade e ajudar as pessoas em relação a isso, é o que eu quero.
[...] porque percebi que tinha vocação para ouvir pessoas, ajudar em seus
problemas, dividir suas alegrias e dúvidas e auxiliar no que puder para que as
pessoas as quais ouço tenham um bem-estar.
Não respondeu
Outros
Esportes
Jurídica
Área social
Pesquisa
Educação
Organizações
Hospital / Saúde
Clínica e * ....
Clínica
Fem. Masc.
33
Refere-se a dados dos alunos nos quais escolhem trabalhar em outro campo de atuação
juntamente com a Clínica e esse dado será melhor explorado no quadro seguinte
152
Clínica e Ensino
Clínica e Grupo
Clínica e PNEE
Clínica e Organização
Clínica e Hospital
0,00% 10,00% 20,00% 30,00% 40,00% 50,00% 60,00% 70,00% 80,00% 90,00%
Fem. Masc.
atual patamar do desenvolvimento científico, uma nova ruptura, desta vez com esse
conhecimento legitimado pela modernidade. Considera que, enquanto a primeira
ruptura foi imprescindível para a construção das ciências, a segunda incorpora o
senso comum como base para o desenvolvimento da própria ciência, criando uma
nova relação da ciência com o senso comum, na qual é possível pensar em novas
formas de conhecimento.
A escola, como espaço multicultural, no qual coexistem grupos distintos, com
múltiplos discursos e formas de expressão, não pode e não deve desconsiderar
essas novas possibilidades de conhecimento. Assim sendo, pode valorizar o senso
comum, entendido como aquele adquirido como herança social que permite a
organização da vida cotidiana, e cumprir sua função social, ao fazer a mediação
desse saber com aqueles considerados científicos em seus múltiplos
posicionamentos e leituras disciplinares, utilizando-se de diversificadas linguagens,
que proporcionem leituras multi, inter e transdisciplinares da realidade.
Os alunos do Curso de Psicologia que se estuda, como referido
anteriormente, ao ingressarem no curso, o faziam com base em uma imagem social
da profissão, coerente com aquela que é veiculada pelo senso comum, e
esboçavam entendimento sobre fenômenos psicológicos e atuação profissional
coerentes com esta imagem que, socialmente, a prática profissional do coletivo de
psicólogos oferece à comunidade.
Havia, nas respostas que esboçaram, quase um consenso de que a
Psicologia é uma ciência que estuda o comportamento humano, a psique, as
relações humanas, a alma ou a mente. De maneira geral, uma diversidade de
objetos de estudo apareceu nas respostas dos alunos ao questionário, porém, a
maioria deles definiu-se por apenas um aspecto.
Como já abordado, a Psicologia configura-se como um mosaico, constituído
de concepções filosóficas e epistemológicas distintas, que formata orientações
teóricas diversificadas e desdobra-se em possibilidades de atuação profissional
diversas, tanto no que se refere a campos de trabalho como ao tipo de intervenção
que produz.
A vivência curricular expõe o aluno a essa diversidade e multiplicidade que
desconhecia ao ingressar no curso. Isso provoca algumas reações peculiares, como
é o caso de uma estudante do 4º grupo, que assim se manifesta:
159
Aluna: Eu, quando entrei na faculdade, eu vim muito por essa fantasia, não sabia o
que era a psicologia. Eu vim muito por essa questão de buscar, da fantasia da
profissão, sabe, da idealização [...]
Aluna: [...] eu achava lindo ser psicóloga [...] eu achava, sabe, tanto que primeiro,
antes de entrar, tinha que ter uma pasta, tinha que me arrumar de tal forma, criava
tudo [muitos risos] foi no 1º semestre, antes de entrar na faculdade [...]
Aluna: Era [...] tinha que ter uma pastinha [...] só faltava um óculos.
Aluna: Não sei [...] tinha aquela da clínica [...] tinha aquela formalidade, sabe.
[...] tem momentos tipo sala de aula, eu me sinto bem aluna [...] tem alguns
momentos que eu me sinto nada [...] nada, mas tem momentos que já tem uma
posição mais clara das coisas.
[...] a cada semestre eu me sinto mais psicóloga [...] no segundo, eu sentia, quando
chegou no terceiro eu percebi que agora eu sou e no segundo eu não era, quando
cheguei no quarto, eu percebi que agora eu sou e no terceiro não era, sabe?
[...] eu acho que isso assim se estendeu pra outras áreas da minha vida. Assim, o
olhar passou a ser outro, a forma de atuar no mundo, ela se modifica, na medida em
que você não só assimila os conteúdos, mas você passa a viver, você não tem como
estudar os conteúdos da psicologia, fazer os estágios e não se identificar com isso.
Desde o primeiro dia que eu entrei aqui que eu mudei. Mudei com relação ao papel
mesmo de psicólogo que vai sendo construído desde o primeiro dia que a gente
entra aqui!
É o que eu disse, eu não sou a mesma pessoa, mesmo, ninguém é a mesma pessoa
depois de passar por um curso de Psicologia.
A questão que eu acho comigo, é que eu não me vejo ainda como psicóloga por
medo, medo do que eu vou falar... assim... será que o que eu estou falando [...]
porque primeiro, não sei se vocês percebem, todo mundo do nosso [...] tudo que a
gente fala, as palavras que a gente fala se modificaram, ou seja, a gente começa a
falar em processual. É isso! É assim: a nossa linguagem se modificou! A minha, no
caso, quando eu era do primeiro semestre pra agora. A forma como a gente fala! É
esse medo que eu tenho, entendeu? Esse medo de quando a gente acha normal
falar dessa forma! Porque a gente tá aqui na Faculdade, a gente ouve os professores
falando assim e, às vezes, qualquer coisa que a gente vê na rua, a gente, ah, deve
ser porque a pessoa tem isso ou isso. Eu tenho muito medo disso, por isso que eu
não me acho psicóloga [...]
Na inquietação desta estudante, sobre a qual fala com certa dificuldade, fica
evidente o discurso da Psicologia que lhe interpela e o quanto lhe dá medo assumi-
lo como seu. Quantos discursos estão concorrendo neste embate particular desta
aluna? Aqueles próprios da diversidade da Psicologia? Aqueles que diferenciam a
Psicologia de outras profissões? Aquele que fala da profissão feminina? Outros que
não temos, nesse momento, como identificar? É nesta arena que se debatem os
saberes-poderes aos quais se refere Michel Foucault (1999, 2001b).
De maneira geral, a vivência no Curso de Psicologia, mesmo do ponto de
vista da aquisição de conhecimentos, é impregnada por uma carga de afetividade,
tendo em vista que estuda fenômenos humanos que afetam a todos em maior ou
menor intensidade. O efeito dessa interferência em cada um, é verbalizado pelos
depoentes em momentos diferentes, como referem duas alunas do grupo 4, em
momentos distintos:
[...] eu acho que também não é um mar de rosas não [...] acho que o estudante de
psicologia é o acadêmico que mais passa pela crise acadêmica. Eu mesma, no 3º
semestre, passei uma crise terrível, crise de tudo, crise existencial, uma crise
profissional, eu não sabia se era isso mesmo que eu queria. Eu queria abandonar o
curso, porque ainda estava vendo muita teoria, não tava vendo nada do que eu
queria. Então, acho que o aluno que mais passa isso é o estudante de psicologia,
165
porque ele começa a se dar conta de várias coisas e começa a dar de cara com
várias questões dele mesmo e aí ele passa por isso. Acho que não é esse mar de
rosas todo que a gente tá falando não [...]
Aluna 2: Isso fica bem claro nas discussões com os namorados [...] [risos] é muito
interessante diálogo com namorado, assim, tem horas que [...]
Aluna 3: [...] dá pra perceber coisas assim claras, meu Deus! Ele tá falando isso e
não percebe! [risos].
Aluna 2: Ontem foi engraçado porque eu estava discutindo com o meu noivo [...] e aí,
no meio do diálogo, no meio da minha fala, ele parou e me perguntou que palavra
era aquela que eu tinha dito! Mas foi uma coisa assim [...] foi hilário, porque a gente
tava naquele clima, chateada, falando, falando, e [...] chega a ser engraçado [...]
Aluna 4: Isso não vale! Isso é pergunta de analista! [risos] [A aluna refere-se ao fato
de que seu namorado também é estudante de psicologia].
Aluna 3: Aí já é perigo! Porque ele entende os termos que você fala [...]
34
Para a palavra jargão, o Michaelis (1998) apresenta cinco significados. O primeiro fala de
linguagem ininteligível, sem sentido; o segundo, de línguas ou dialetos exóticos que não se
entendem; o terceiro, língua ou dialeto híbrido, oriundo de uma mistura de línguas, tal como uma
língua franca; o quarto refere-se à fraseologia peculiar a qualquer classe, profissão; e a quinta a
calão, gíria. Neste trabalho, utiliza-se como sinônimo de linguagem peculiar a um grupo
profissional.
167
[...] eu me sinto psicóloga quando eu saio daqui da Bahiana, quando vou pra um
Fórum, um congresso, um Seminário [...] chego lá e fico à vontade. Chego até a
discutir algumas vezes [...] só tinha eu de aluna [...] eu fui bem recebida, eles me
trataram como outra psicóloga [...]
Ao ser acolhida por seus pares, esta aluna sente-se nomeada por seus
interlocutores, confirmando o que ensina Bader Sawaia (2001) quando afirma que a
Identidade é uma categoria que classifica os iguais, os diferentes, os estranhos e os
exóticos.
No momento em que eu marco com o meu paciente, que eu atendo o meu paciente,
aí eu me sinto psicóloga. (Aluna do 3º grupo).
Eu diria que talvez o passo diferencial que contribuiu para que hoje eu pudesse tá
aqui dizendo, sou psicólogo, foi do 8º semestre pra cá, quando a gente começa a
atender as pessoas. (Aluno do 5º. Grupo).
Observe-se que não se tratava de enfermo, pois não havia uma “queixa” a ser
investigada, nem existia nenhum tipo de intervenção conseqüente à própria
entrevista, mas a aluna referiu-se à pessoa que entrevistou para fazer a história de
vida como paciente.
Há que se considerar, porém, neste caso, a cultura médica que permeia a
instituição de ensino na qual o Curso está inserido, conforme discutiu-se em capítulo
precedente, e também a própria estruturação do Posto de Saúde onde este Projeto
de Saúde da Família é totalmente assumido por professores e alunos de todos os
Cursos da instituição, numa atividade conjunta. Além do mais, a história de vida
deve compor o prontuário das famílias dos pacientes no arquivo do Posto.
A introdução de Estágios Básicos e Estágios Específicos no Curso de
Psicologia, seguindo orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN),
rompe com esta dicotomia de prática como aplicação da teoria e partilha a idéia de
que a teoria e a prática só assumem significado quando relacionadas e quando
podem revelar-se uma na outra, instalando uma postura permanente de ação-
reflexão-ação, na construção de novas práticas geradoras de novos
posicionamentos teóricos e vice-versa.
O Projeto Pedagógico do Curso (FBDC, 2003, p. 20), no que concerne aos
Estágios, assim define esta atividade curricular: “[...] orientada, na qual o aluno
exercita habilidades na construção de competência para a prática profissional,
constitui-se em atividade privilegiada, dentre as outras, do currículo para a
construção do papel de psicólogo.” Nesse documento, enfatiza-se que o Estágio
Básico é estruturado para possibilitar ao aluno desenvolver competências básicas e
gerais do exercício profissional do psicólogo. Estas devem ser realizadas em
espaços diversificados, sob a supervisão presencial do professor orientador, em três
semestres consecutivos, do 5º ao 7º, com 54 horas/aula em cada um deles, o que
perfaz a carga horária total de 162 horas. Os alunos são subdivididos em grupos de
170
Eu lembro que quando a gente fez o estágio – eu falei pra profa. X antes de começar
o estágio – eu ficava muito aflita..., será que eu já tenho condições, será que eu já
171
sei de teoria, alguma coisa, o suficiente para estar lá? Está atendendo uma pessoa!
Porque eu achava que eu ia ficar assim: a pessoa falando e eu: tá, porque isso!
Porque aquilo! Porque o Édipo! [...] E aí depois que eu fiz o estágio é que eu fui
perceber que eu já sabia, eu não tinha percebido que eu já sabia de algumas coisas,
o quanto a gente já tinha de bagagem de todas as matérias, todos os estágios, que
já estavam [...] não precisava ficar decorando, nem lembrando, já estava ali, na hora
[...]
Nunca esqueço quando eu fui para o hospital, meu estágio, já agora de conclusão.
Fui eu e X e a gente caiu de pára-quedas na UTI. No primeiro dia que a gente
chegou, morreu um paciente na frente da gente. E eu tava lá, eu e ela assim, as
duas grudadas, desesperadamente! E agora, o que é que a gente faz?
[...] a gente estava selecionando pessoal [...] aí teve um dia que a psicóloga não foi
[...] o pessoal da portaria [informava], você vai e fala com a psicóloga ali naquela
sala. Aí o pessoal abria a porta e, quem tava lá atrás da mesa? Eu! Eu era a
psicóloga, sabe?
[...] eu não me sinto psicóloga. Não me sinto, acho que tá faltando muito! Tô me
sentindo um pouco perdida. Não sei o que eu vou fazer depois que eu me formar,
não tenho nada garantido. Eu tenho a maior paixão por clínica, pela psicanálise, mas
não sei como vai ser de imediato [...] quando eu me formar, eu não sei o que vai
acontecer! Assim, a formação, a supervisão, precisa de análise, mas eu não me vejo
ainda trabalhando.
Aluna 1: Eu acho que a minha mudança foi o estágio que eu fiz, que eu nem
conhecia tanto [...] eu tinha muito o diferencial em saúde, não é que eu odiasse, mas
eu sabia que eu não queria aquilo. O que aparecia mais era a clínica. Então eu já
gostava de clínica de carteirinha, entendeu, porque eu não gostava tanto de hospital
e de saúde e aí quando a gente foi fazer um trabalho com a profa. X, que a gente fez
aquela disciplina, e que a gente foi a campo [...] aí eu comecei a gostar; aí, eu disse:
Olha, legal esse negócio de empresa, de descobrir como é o RH. Aí eu comecei [...]
deixa a clínica um pouquinho, deixa eu ver como é isso [...] aí eu comecei, aos
poucos, a questão do contato mesmo, de você conhecer.
Aluna 2: Eu, pelo menos, estou muito feliz de ter conseguido passar, eu acho, pelos
estágios, porque tive oportunidade de estagiar em hospital aqui pela faculdade, em
clínica, agora, e educação e RH fora da faculdade. Então eu posso dizer que eu vi
muita coisa, passei por várias áreas, e foi mudando justamente na prática, o meu
pensamento de fazer clínica ou mudar para educação [...] eu fiquei um ano e dois
meses na escola, aí eu disse já deu aqui [...] surgiu à oportunidade de RH e eu falei,
não, eu vou conhecer, eu só vou poder saber se é isso, experimentando. Como eu já
tinha ido para o hospital e eu disse não. A única experiência realmente que valeu de
hospital foi pra eu dizer que não, eu não quero trabalhar em hospital! Mas precisou
eu ir para saber disso. Talvez se eu nunca tivesse, eu ia falar: ah, meu Deus, será
hospital? E ia ficar esse grilo. Então é muito diferente quando você estuda uma coisa
ou ouve falar de uma coisa e quando você vai experimentar.
Aluna: [...] quando eu entrei aqui, no primeiro dia de aula, me perguntaram: Porque
você acha que você veio fazer psicologia? [...] E eu, porque eu sou muito amiga [...]
alguma coisa do tipo, eu observo muito as pessoas, não sei o que, alguma coisa, eu
não lembro mais minha resposta, mas foi alguma coisa nesse sentido. E, hoje, eu
174
percebo assim [...] é um acolher, mas não é um acolher de [...] não é um acolher de
amigo, é um acolher totalmente diferente. Como X falou, você não se envolve, você
ajuda, você trabalha com aquela pessoa, mas você não se envolve. Isso eu tô
ganhando muito aqui na clínica. Eu lembro que no primeiro estágio, do Pau da Lima
[...] teve um problema que a mulher era toda triste [...] aí a gente queria ajudar a
mulher de qualquer forma. E aí eu me coloquei hoje! Se eu fosse para o mesmo
lugar, com a mesma mulher, eu seria completamente diferente. Seria outra reação,
entendeu? [...] Eu lembro que eu e X, a gente quase chora na hora! A gente
querendo botar a mulher no colo! E hoje, seria outra postura! E hoje, seria totalmente
diferente! Seria de acolher também, mas acolher de uma outra forma e de um outro
sentido [...]
Aluna: Sem tentar resolver. Ajudando para que ela resolvesse. No caso, se fosse um
problema de ordem emocional, e ela se implicasse pra resolver, mas não como a
gente estava querendo fazer antes.
[vou] falar do Estágio Básico em Educação Especial, que eu acho uma das idéias
mais brilhantes da grade curricular [...] Lidar com o sujeito especial! Isso pra mim é
de uma riqueza imensa! Nesses 4 anos que eu dou a disciplina, a transformação do
aluno de psicologia, quando chega na instituição de Educação Especial, onde ele se
confronta [...] e poder perceber aquelas pessoas, que são pessoas que, apesar de
diferentes, têm habilidades, têm competências, que merecem [...] Então, eu fico
encantada, realmente, em ver os alunos, a reação dos alunos diante [...] no início
dos estágios eles dizem, professora eu vim porque não tinha mais estágio pra mim
no GACC, não tinha mais não sei aonde, e aí só tinha esse. E eu vim de qualquer
jeito, mas eu morro de medo, não suporto lidar com isso! E você vê a transformação
do discurso, a aproximação, um novo olhar para estas pessoas, entende, e isso pra
mim foi um ganho muito bom, porque é um lugar onde o psicólogo precisa estar, foi
relegado muito tempo, na história; o deficiente sempre esteve à margem,
completamente sem qualificação [...] E os alunos de psicologia eles também estão
entendendo que ali é um lugar de trabalho muito grande, muito promissor [...] a
minha contribuição é essa, o olhar do futuro psicólogo para a diferença [...]
175
O fato de que a gente, a maioria acaba indo fazer terapia, apesar disso não ser uma
exigência legal, mas a gente faz porque precisa [...]
Sabe, a primeira vez que eu entrei em contato comigo, com as minhas coisas, foi na
disciplina X, que a gente fez o Wartegg35 [...] tinha coisas que eu não queria ouvir
naquele momento [...] aí a professora [...] me falou uma coisa que eu fiquei assim,
isso não é verdade! isso não é verdade! E aí, foi quando começou a mobilizar as
coisas [...] fui fazer terapia no meio do curso [...] quando chegou na aula da profa. X
de Psicoterápicas [...]
35
Teste psicológico de personalidade.
178
fazem parte de situações por eles imaginadas, temidas, desejadas. É importante não
perder de vista que o enquadre educacional, a sala de aula, é muito diferente do
contexto terapêutico e não é prudente e nem ético confundi-los. A forma como os
conteúdos teórico-práticos são significados pelos alunos, entretanto, é da esfera da
subjetividade de cada um. Está em jogo a história de vida, os projetos para futuro, a
estrutura de personalidade, as situações traumáticas vivenciadas, as crenças, os
valores, os contextos que o envolveram, enfim todo o arcabouço que permite ao
sujeito diferenciar-se e reconhecer-se como único.
Ressaltando a importância da psicoterapia no processo de construção da
identidade, uma aluna do 4º grupo expressa:
[...] o curso de Psicologia em si, pra mim, fez uma diferença, pra minha pessoa, pra
minha construção. Ele tem uma importância fantástica! Eu não sei até que ponto, às
vezes eu me pergunto: Pôxa, será que eu tô fazendo psicologia pros outros ou pra
mim mesma? Porque essa questão que X falou da terapia, como ajuda! Como ajuda
a você unir. Fazer a terapia com o curso de psicologia que a gente faz, tem me
completado assim, cada vez mais. Tem me ajudado a lidar com questões de uma
forma completamente diferente. Tem me ajudado muito, mas aí, ao mesmo tempo
que eu me pergunto isso, eu fico com medo. Será que eu estou preparada pra
atender o outro ou estou me preparando pra mim mesma? As vezes, eu fico meio
com medo dessa pergunta. Mas eu acho que, no fundo, no fundo, ser psicólogo
começa aí! É você se conhecer, é você se perceber, é você saber lidar primeiro com
os seus problemas. Eu acho que só aí a gente vai conseguir ser psicóloga! Quando
você souber lidar com os seus próprios problemas, aí é que você está preparada pra
lidar com os problemas dos outros.
Quando você tem contato com pessoas fora, instituição, contato com a dor do outro,
muito tempo, assim, respeitar de fato [...] numa posição de profissional, de
sensibilidade [...] vai te demandando uma terapia, um conhecimento maior sobre
você, um trabalho individual fora da faculdade. E aí eu acho que esse trabalho, a
terapia, esses estágios fora, até extracurricular mesmo, vai te dando uma postura
frente à vida e frente ao curso de maneira mais madura.
outros! Porque a gente fica [...] os outros é que são pra fazer psicoterapia, a gente
não! Mas com a gente, como é bom!
É tudo muito sutil, é tudo que você não vê, é tudo que a você não pega, é tudo que
você não controla [...] A pessoa só tá ali com sua fala, com sua atitude, e você, de
alguma forma, age [...] há a ajuda [...]
Outro tópico ventilado pelos alunos sobre os aspectos relevantes que os faz
sentir-se ou não psicólogos/psicólogas, refere-se à elaboração do trabalho
monográfico de conclusão de curso. Este trabalho é uma exigência recente, feita a
alunos de Psicologia em geral, com base nas Diretrizes Curriculares Nacionais, pois
não havia a tradição, na Psicologia, da realização desse trabalho final e nem de sua
apresentação pública. Dos alunos, era exigido apenas que apresentassem o
relatório do estágio profissionalizante. Pode-se perceber, portanto que essa
dicotomia teoria-prática perpassa a formação de psicólogos.
Na perspectiva do Currículo Mínimo, as disciplinas teóricas eram trabalhadas
nos quatro primeiros anos e o último era dedicado ao estágio, atividade em que se
aplicariam os conhecimentos adquiridos. Os alunos que optassem por fazer apenas
o bacharelado, estavam inclusive liberados do 5º ano. A conclusão de sua formação
se daria quando da conclusão das disciplinas do 4º ano.
Silke Weber (1985), ao discutir o Currículo Mínimo definido para os cursos de
Psicologia, ressalta que nele não há nenhuma preocupação com a pesquisa nem em
nível de disciplinas, nem de estágios. E revela que havia, naquela época, um
181
Aluna 1 - No estágio [...] aqui na Clínica, aqui no Serviço de Psicologia, cruzou com
o momento da monografia [...] tive a maior dedicação! [...] É agora, sabe, é hora de
concluir meu curso! De ser, tipo assim, documento atestando que eu sou psicóloga,
sabe? Então, concluir aquele trabalho, nossa, foi muito gostoso! E trouxe uma
responsabilidade muito grande [...] Então eu acho que foram duas coisas que me
fizeram ter um amadurecimento, uma responsabilidade, um compromisso com as
pessoas que eu tô atendendo. O tema que eu tava abordando ali, um bocado de
reflexões sobre aquilo. De todo o percurso da faculdade, escrever, eu acho que
retomou muita coisa no processo de ser psicóloga [...]
[...] algumas coisas daqui, a gente ainda está em construção, espaço de pesquisa.
Espaço de TCC! É pesadíssimo de acontecer! Muito pesado! Muito puxado! A gente
ainda está em construção, em um semestre! Às vezes, você necessita trabalhar mais
com esse aluno, necessita ficar melhor. Quando se aproxima do TCC, a vida do
aluno, a gente precisa estar com ele, precisa de 3, 4 encontros por semana! Tem
coisas ainda e essas coisas são todas coisas árduas [...]
A despeito das dificuldades e de ser uma iniciativa muito nova para todos os
envolvidos, a avaliação que o coletivo — professores e alunos — faz desse processo
é de que a realização do trabalho de conclusão dá uma qualidade maior à formação.
Como são privilegiados temas de interesses dos alunos, em decorrência de seu
próprio projeto de pesquisa cursado anteriormente, acredita-se que estimule a
184
Educação 5 3 1 2 1 12 9,23%
Educação 2 1 1 2 2 8 6,15%
Especial
Trabalho e 3 2 1 7 3 16 12,31%
Organizações
Saúde 7 5 4 16 4 36 27,69%
Clínica 6 9 6 7 7 35 26,92%
Aluna 2 – Eu acho importante essa questão da escuta, mas tem um outro aspecto
também que é fundamental quando se escuta que é a questão da ética. O que você
vai fazer com a escuta? [...] o que é que você vai fazer com isso? [...] você vai induzir
ele? você vai desconstruir? você vai abrir ou fechar portas? Eu acho que essa
questão da ética a gente tem que ter muito cuidado com o nosso olhar e o olhar do
paciente, pra gente não impregnar o paciente com a nossa visão [...] é uma coisa
que eu procuro sempre, quando eu coloco alguma coisa nos atendimentos clínicos.
Eu pergunto: eu acho que, eu percebo ou eu vejo ou eu acho que dá pra fazer assim.
você quer? você acha? você concorda? Não, se você não concordar tudo bem.
Então, deixar também o paciente livre para [...] ele tá ali diante de você, ele tá
pedindo ajuda por algum motivo. Isso aqui tem alguns aspectos que naquele
momento ele não quer mexer e você deve respeitar, eu acho isso fundamental!
36
Carl Rogers, psicólogo americano, é considerado um teórico de peso na perspectiva humanista da
psicologia, que desenvolve a abordagem centrada na pessoa.
187
Aluna 1: Tem que ser ética. Tem que ser uma pessoa acima de tudo ética.
Engraçado que a gente deu Ética duas vezes37, na cabeça da gente: é pra quê dar
Ética? não sei o quê ..Tem que ter, tem que ter, isso daí é fundamental! A questão
da ética, uma pessoa que não tenha isso bem forte na sua personalidade [...] vai ser
difícil [...]
Aluna 2: Tem que ter respeito mesmo pelo que está fazendo, parece que é uma
coisa simples, né?
37
Como este grupo iniciou o curso no Projeto Pedagógico original, elaborado sob a orientação do
Currículo Mínimo, havia uma disciplina no 2º semestre intitulada Ética e outra no 6º nomeada Ética
Profissional.
188
Aluna 1: Uma coisa que eu acho também que o psicólogo tem que ter é
responsabilidade. Não pode ser de forma alguma uma pessoa assim irresponsável
quer dizer [...]
Aluna 1: Assumir, exatamente! Não é que não possa ser irresponsável com outras
coisas, mas a partir daquele momento que está exercendo o papel de psicólogo tem
que ser uma pessoa responsável [...] Você perguntou se era ter paciente, no caso,
para ser psicólogo. Não é ter paciente não, porque como X e X disseram é ser
responsável pelo outro. Entendeu? Não é ter o paciente, que faz a seleção ou o
laudo, ou a orientação na escola, ou o que seja. É você ser responsável pelo outro, e
é isso que marca [...]
Essas colocações exibem, mais uma vez, o status e o peso que essas alunas
atribuem à psicologia como profissão feminina, embora não estejam se dando conta
disso, tendo em vista que esse aspecto tem sido uma questão pouco problematizada
no âmbito da Psicologia. Esse cuidado que assume o caráter de responsabilidade
pelo outro, dedicando-se a ele, tornando-o o centro do processo, é exatamente a
proposta de Joan Tronto (1997) sobre o “cuidar de”, que se contrapõe ao “cuidado
com”, que se realiza em uma ótica mais geral de cuidado com a sociedade e se
configura como um tipo de cuidado considerado masculino, que se preocupa com os
outros e com aspectos da realidade, mas o faz sem o envolvimento pessoal.
Essas colocações remetem ao que propõe João Ferreira Neto (2004), quando
sugere que a clínica na psicologia é um ethos, uma atitude diante das situações
profissionais. A Psicologia é uma profissão que lida com a subjetividade dos seres
humanos e em quaisquer lugares em que seja exercida, em maior ou menor escala,
depara-se e precisa manejar informações a respeito da intimidade de seus usuários.
Surge, portanto, uma questão fundamental a ser enfrentada: o sigilo profissional.
Este tema é abordado no Código de Ética Profissional dos Psicólogos (CFP,
2006b, p.13), em seu artigo 9º: “É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a
fim de proteger, por meio de confidencialidade, a intimidade das pessoas, grupos ou
organizações a que tenha acesso no exercício profissional.”
A questão da quebra do sigilo é tratada no artigo 10º, que autoriza essa
quebra em casos previstos em lei, devendo o psicólogo ou a psicóloga tomar esta
decisão na “busca de menor prejuízo”. O parágrafo único deste artigo orienta que
essa quebra deva se restringir a “[...] informações estritamente necessárias.” (CFP,
2006b, p. 13).
189
que a ação dos alunos interfere nos espaços onde estão situados e gera nos alunos
reflexões sobre suas atribuições profissionais e embasamento teórico. A idéia é que
existem espaços que são quase “ambientes naturais” de se fazer psicologia, dada à
natureza da instituição e das práticas que lá se desenvolve. É o caso do
atendimento a pacientes psicóticos.
Os alunos das duas primeiras turmas38 do Curso de Psicologia tiveram a
experiência singular de freqüentar a disciplina de Psicopatologia no Hospital Juliano
Moreira, que funciona nos moldes de um Hospital Psiquiátrico tradicional. Sobre o
impacto de viver a experiência nesse hospital psiquiátrico, relata uma aluna do 2º
Grupo Focal:
[...] uma coisa que me marcou muito, assim, foi a disciplina de Saúde Mental [...]
você ter que ir até o Juliano [...] eu me senti muito pequena quando eu fui até lá e ele
[o professor] me fez refletir assim sobre essa prática [...]
[...] aquela experiência me colocou assim em contato com uma realidade crua, sem
maquiagem [...] ali eu perdi medos [...] foi pra mim uma experiência muito marcante,
foi como seu eu tirasse vendas pra muitas coisas; eu perdi frescuras, ali, eu posso
dizer [...] foi muito forte! Eu não iria assim de livre e espontânea vontade pro Juliano,
mas, assim, pela proposta, eu aceitei e encarei [...] puxa vida, eu mudei a partir
daquilo [...] eu mudei [...]
38
Nas turmas subseqüentes, essa forma de trabalho foi repensada e modificada, sendo transferida
para um Centro de Atenção Psicossocial, com visitas ao Hospital Juliano Moreira e ao Hospital de
Custódia e Tratamento.
191
O Juliano, foi ótimo, foi o ouro [...] O Juliano foi o melhor de experiência mesmo, o
Juliano foi tudo! Eu acordava mal pra ir pra lá. Eu acordava muito mal. Eu disse: meu
Deus do céu, se eu surtasse agora [...] eu não surto nunca mais.
Eu gostava de ir pra lá, mas eu tinha medo, e hoje eu não tenho mais [...]
Outra diz:
Eu não tinha medo não, me perturbava! Foi uma coisa assim, de eu imaginar que o
limite entre a sanidade e a loucura é um limite tão estreito [...] é isso que ficou na
minha cabeça, é isso que eu pensava [...]
Na minha opinião [...] o que faz a gente se sentir psicólogo é exatamente o diploma,
o título [...]
Aluna 1 – As pessoas falam [...] psicólogo ele conversa né? como se fosse um amigo
[...] [risos].
Aluna 3 – É tipo assim, quando você, antes de você entrar na faculdade, escuta
dizerem para você é, você devia fazer psicologia, você gosta de conversar, ouvir as
pessoas [...]
haja vista que lhe confere o estatuto de profissional liberal, como já discutido
anteriormente, ainda que se trate de uma profissão feminina.
Currículo Mínimo, foram oferecidas vagas para Estágio na área da Educação, pois
aquele projeto assegurava Estágio nas três áreas tradicionais da Psicologia e
revelou-se como pouco atrativa para os alunos, em virtude, inclusive, do pouco
investimento que o Curso fez nesta área.
Com a reformulação do Curso, à luz das DCN, isso foi modificado, ficando
apenas as duas ênfases citadas: “Saúde” e “Trabalho e Organizações” O PPC,
entretanto, considera que a ênfase de saúde corresponde às áreas de clínica,
hospitalar e ambulatório.
Na Tabela 4 pode-se verificar a oferta e a escolha de vagas em Estágio
Específico nas seis turmas que até o momento da pesquisa chegaram ao 9º
semestre e, portanto, fizeram sua opção pelo citado estágio.
ESTÁGIO
Área Temática Semestres Total %
4.1 4.2 5.1 5.2 6.1 6.2
Psicanálise 6 3 7 5 4 2 27 11,20%
Terapia Cognitiva 7 7 5 8 4 4 35 14,52%
Comportamental
Psicologia Analítica 2 2 5 4 7 4 24 9,96%
Gestalt Terapia 7 3 4 7 4 5 30 12,45%
Psicanálise Infantil 7 7 4 3 3 24 9,96%
Saúde 2 5 4 10 2 15 38 15,77%
Trabalho e 10 8 5 11 11 9 54 22,41%
Organizações
Educação 5 4 9 3,73%
Total 39 39 37 49 35 42 241 100,00%
Aos poucos, mesmo sem a gente perceber, a gente vai aprendendo durante o curso,
assim, a olhar o humano, a olhar o ser humano [...] até a se interessar por isso! Eu
acho que é o principal! Então essa coisa de observar, de ouvir, eu acho que é
principalmente estar interessado, de ter curiosidade, de ter interesse em ouvir, de ter
paciência em ouvir. E isso vai surgindo sem que a gente perceba, dentro das
matérias que a gente deu na faculdade, dentro dos livros de filosofia, dentro de
qualquer coisa. Assim, quem não captou isso, não conseguiu apreender isso na
faculdade, acho que não é um bom psicólogo.
[...] eu acho que a escuta é diferente. Que diferença é essa, ainda eu não tenho
certeza, mas eu acho que é uma questão de não ter o julgamento, de não ter o não
julgamento; não necessariamente significa que você tá lá apático, neutro, ele não tá
falando pra uma parede, mas é uma disponibilidade pra escutar a pessoa [...]
Nós fomos visitar uma amiga em comum que tava doente. Essa amiga tava falando
de questões da vida dela, pessoais e tudo e depois [...] a colocação que ela fez:
pôxa, você tá, já tá tão diferente, você tá psicóloga! As suas colocações, até a sua
forma de se reservar, você tá diferente!
que trava, mesmo sem haver uma intencionalidade previamente definida, como diz
um professor:
O autor caracteriza a escuta sensível, portanto, como aquela que não julga,
que é empática, que se assemelha mais a uma arte que a uma ciência e oferece
uma abertura holística para conectar-se com a totalidade do outro. Do ponto de vista
de René Barbier (1998), é uma escuta que deve ser usada por pesquisadores, por
educadores, psicólogos, terapeutas, por todos aqueles que desejam entender o
outro do ponto de vista que este outro coloca e revela, tentando compreender seu
universo afetivo e cognitivo, que se faz presente pelas idéias, valores, símbolos,
atitudes e comportamentos.
A aprendizagem da escuta diferenciada e qualificada, como ferramenta de
trabalho no Curso de Psicologia, entretanto, está condicionada ao aporte teórico que
cada linha de pensamento preconiza. Apóia-se em uma determinada concepção de
sujeito, de mundo e de Psicologia, com seus posicionamentos filosóficos e
epistemológicos peculiares.
Uma experiência com a aprendizagem da escuta em uma situação de Estágio
Básico é relatada por uma aluna do grupo 4, considerando uma pontuação da
professora:
[...] estou adorando este momento! é muito bom conversar! porque eu acho que é
também um pouco o que a professora falou; a gente está proporcionando pra eles o
que alguns profissionais da área da saúde não têm condições de proporcionar que é
essa escuta [...]
É tão engraçado! Eu lembro que quando a gente sentava antes para conversar, em
barzinho, com os amigos, antes de fazer psicologia, eu ouvia já, porque sempre eu
gostei de ouvir, tal, e ficava criando minhas hipóteses. Mas era uma coisa... eu
achava minhas coisas e ficava pra mim. Quando eu comecei a estudar, comecei a
ver assim, Freud principalmente, a gente começou a ter conhecimento aqui. Primeiro
que a gente estudou foi Freud, depois foi Skinner também, né? Quando eu comecei
a me dar conta, eu digo: oh rapaz, eu ouvi isso em algum lugar que eu li. Aí começou
[...] Ah, ó pra isso! Chiii! Eu vi [nome da profa.] falando aquilo naquele dia. Olha,
[nome da profa.] falou também de uma coisa assim! Aí eu comecei a ver que tinha
um instrumento, que tinha a teoria que poderia servir pra eu tá [...] Aquilo dali me deu
um poder que eu disse, pôxa vida, o poder do psicólogo! Aquela, a fantasia assim
202
que todo mundo tem, psicólogo vai ficar observando, analisando. Mas tem um pouco
disso mesmo, a gente nunca olha de uma forma [...]
Sabemos que as identidades culturais39 não são rígidas nem, muito menos
imutáveis. São resultados sempre transitórios e fugazes de processos de
identificação. Mesmo as identidades aparentemente mais sólidas, como a
de mulher, homem, país africano, país latino-americano ou país europeu,
escondem negociações de sentido, jogos de polissemia, choques de
temporalidades em constante processo de transformação, responsáveis em
última instância pela sucessão de configurações hermenêuticas que de
época para época dão corpo e vida a tais identidades. Identidades são,
pois, identificações em curso.
39
Este terno é utilizado pelos teóricos que situam o estudo das identidades na perspectiva
contemporânea, para marcar que as identidades são sempre construídas no processo cultural.
Cada um fez desse curso o seu curso.
206
6 CONFIGURANDO GÊNERO
40
Sistema que congrega todos os Conselhos Regionais de Psicologia (CRP) do Brasil, delimitados
por critério geográfico.
207
Não obstante a história não ser uma linearidade sucessiva de fatos, mas
acontecimentos que se precipitam em função de diferentes configurações de forças
em determinado tempo/espaço, dentre elas econômicas, sociais, culturais,
familiares, geográficas, Mitsuko Antunes (1998) considera que a difusão das práticas
da psicologia na educação, especialmente nas Escolas Normais, pode ter sido uma
das raízes da Psicologia como profissão feminina. Segundo a autora:
É possível dizer que essas escolas foram uma das principais portas para a
penetração da Psicologia científica no país e para a definição do perfil dos
profissionais que se tornariam especialistas em Psicologia, além de, no caso
da Escola Normal de São Paulo, ter sido ela uma das mais importantes
bases para que a psicologia se tornasse mais tarde disciplina universitária.
(ANTUNES, 1998, p. 86).
208
Outros fatores também podem ser evocados como mobilizadores, para que as
mulheres sintam-se atraídas pela Psicologia. Um deles, conforme se discutiu
anteriormente, situa a profissão na fronteira entre o cuidar e o curar, como se pode
constatar em levantamento realizado por pesquisas, a exemplo das realizadas por
Mauro Magalhães et al (2001) e Waldir Bettoi e Lívia Simão (2000), cujas
proposições colocam a profissão de Psicólogo num terreno de disputa, em que estão
em jogo os poderes de quem cura em oposição às tarefas de quem cuida, conforme
também discute Elizete Passos (1997). Ademais se revela de uma forma
contraditória, pois, como profissão feminina, tem as atribuições de cuidar dos outros,
tal como propõe o ideário patriarcal; e como profissão liberal, dá uma relativa
independência às mulheres, de poderem exercer seu trabalho com autonomia e
independência, sem submeter-se a outros profissionais e/ou a regimes de trabalho
que não lhes sejam convenientes.
Os estudantes e as estudantes deste curso que estudamos e que
participaram dos Grupos Focais, indagados sobre a presença maciça de mulheres
no curso e na profissão, apontam que a Psicologia é uma profissão feminina por
questões culturais, como se pode verificar no depoimento de uma estudante do 3º
grupo:
Eu acho que tem uma construção histórica e social a respeito disso, de que o
homem, na sociedade patriarcal, ela cria a mulher pra ser esse, ser mais acolhedora,
essa pessoa de que é ela que ouve, é ela que acolhe, ela é que é sensível [...]
Aluna1: [...] a gente viu que essa coisa do cuidar é uma coisa muito materna mesmo.
Feminina! Terapeuta quer dizer aquele que cuida e isso remete muito ao feminino.
As mulheres geralmente são aquelas que cuidam dos filhos, dos pais idosos [...]
Aluna 2: Isso vai de cultura! No oriente, o masculino, o homem, ele tem o saber e
cuida! Tanto que quando as pessoas têm doença eles procuram os chamados
xamãs. É um homem que conhece a natureza e sabe entre aspas o problema e a
cura. Então eles têm isso! Aqui no ocidente já é mais essa questão mesmo [...]
[...] porque as profissões, elas tem isso, estão associadas a estereótipos. Por
exemplo, caminhoneiro só era homem! Então, agora, você encontra mulher dirigindo
ônibus e você se assusta, ainda se choca quando vê uma mulher dirigindo ônibus. E
X [refere-se à colega] falou um pouco: a psicologia tem essa coisa de cuidar, de
ouvir pacientemente. Dentro dessa proposta da coisa clínica, o estereótipo do
psicólogo é a psicologia clínica mesmo! Eu acho que essa coisa do cuidado, do
ouvir, do acolher... Isso, historicamente, são funções que foram atribuídas às
mulheres. As mulheres que foram preparadas pra cuidar das crianças, dos doentes,
dos idosos, dos malucos, pra ouvir, pra acolher, pra ser paciente. Isso já tá que meio
no inconsciente coletivo da cultura, do mundo. E as mulheres vão, e fazem, se
identificam com isso também [...]
O discurso deste aluno passa a idéia de que tudo é natural. É assim mesmo,
sempre foi assim. Neste sentido, reproduzem-se as determinações sociais de uma
forma pré-estabelecida e a-crítica. Acontece que se estuda a construção de
identidades profissionais de um grupo de alunos e alunas singular, de uma profissão
feminina e sabe-se que o currículo é um espaço de poder. Como tal, engendra uma
disputa entre os conteúdos e discursos disseminados pela escola. Verifica-se,
portanto, nesse grupo em particular, que os discursos naturalizam a hierarquia de
gênero ou esse aspecto sequer é problematizado.
Trata-se de um curso que conta com 33 professoras/psicólogas que lidam
com os saberes-poderes que esta profissão confere no rol das profissões femininas
e liberais, reproduzindo a-criticamente a condição social desigual de gênero.
Entende-se, portanto, que se o currículo constrói identidades por meio do discurso,
também desconstrói e refaz identidades, demarcando fronteiras simbólicas, dentre
elas as de gênero.
É importante registrar, inclusive, que este tema até recentemente não era
valorizado entre os pares da Psicologia, sendo uma perspectiva, de fato,
naturalizada entre esses profissionais. Recentemente, o Jornal do Federal41. em sua
edição de maio deste ano de 2006, publicou uma breve matéria intitulada Psicologia
41
Jornal de publicação trimestral do Conselho Federal de Psicologia, postado a domicílio para
psicólogos brasileiros e disponível on-line.
211
usa batom (CFP, 2005), numa clara referência à generificação da profissão. Esta
Instituição também patrocinou uma Mesa Redonda, o II Congresso Brasileiro
Psicologia, Ciência e Profissão, realizado em São Paulo, entre 5 e 9 de setembro de
2006, cujo tema foi a Psicologia como profissão feminina. Este assunto, até então,
não vinha sendo abordado pela Psicologia, sendo tratado por iniciativas isoladas,
sem uma repercussão nacional que imprimisse mais vigor às discussões.
No mundo do trabalho, existem profissões que são preferencialmente
escolhidas por mulheres e outras por homens. Essas escolhas encobrem a
assimetria de gênero, posto que apresentam as habilidades e conhecimentos
necessários ao desempenho profissional como qualidades ou fraquezas inerentes a
cada sexo. Reproduzem a hierarquia de gênero, veiculando valores, status e direitos
que têm como objetivo perpetuar uma posição de dominação, porquanto sabe-se
que qualquer um ou uma, homem ou mulher, pode desempenhar, a priori, os
mesmos trabalhos. Os critérios de escolha/seleção/eliminação podem ser
condicionados às oportunidades e preferências das mais diversas ordens.
Ana Castro e Oswaldo Yamamoto (1998), ao comentarem sobre a psicologia
como profissão feminina, recorrem a Martins (1981), para esclarecer que diversas
carreiras consideradas femininas concentram-se nas áreas das Ciências Humanas e
das Letras, em virtude do pouco investimento que requerem e da grande expansão
na oferta desses cursos superiores na rede privada. Insinuam que esse fato
oportuniza maior facilidade para o acesso das mulheres ou que esta artimanha
facilita-lhes esse acesso. Os autores baseiam-se em Celso Ferretti (1976), para
afirmar que as carreiras masculinas oferecem maior prestígio e remuneração em
relação às carreiras femininas. Além disso, ancorados neste último autor, expõem,
com relação às expectativas dos aspirantes às mais diversas carreiras, em uma
avaliação sobre suas próprias possibilidades, que as mulheres demonstram
expectativas mais baixas que os homens, o que, do ponto de vista deles, concorrem
para a configuração de carreiras femininas.
Observa-se que o texto acima carece de uma argumentação mais elaborada
sobre gênero, já que não lança mão de argumentos que abordem a questão
relacional de gênero, posto que, enquanto categoria analítica, deve dar conta de
compreender a trama das relações sociais subjacentes a um determinado grupo em
um tempo/espaço específico. Há, no texto, uma visão estereotipada da existência de
certa feminilidade na mulher, que teme a aproximação dos desafios intelectuais,
212
Aluna 1: Os homens... é difícil optarem por profissões que tem menos poder [...] Por
isso eu acho o número de mulheres é maior... [na psicologia]
213
Aluno: Tem que ser médico, tem de ser engenheiro, advogado, administrador [...]
[...] aí ele dizia assim: nesse momento eu não posso ser fraco. O fraco que ele queria
dizer é: eu não posso demonstrar que eu estou sentindo dor, eu não posso
demonstrar que estou fazendo isso, não posso demonstrar dessa forma, dessa e
dessa. E isso me marcava muito, ele falava isso e demonstrava força e
demonstrava... e aí minha mãe era completamente o oposto, era aquela pessoa que
você podia ver ela sofrendo, quer dizer, eu pude ver [...]
Assim como não se pode falar de uma mulher única também não se deve
pensar na existência de um homem universal, mas de homens múltiplos e plurais,
singularizados pelas circunstâncias que são determinantes de sua constituição como
sujeitos. Nessa perspectiva, pode-se falar de identidades masculinas. Tal como as
identidades femininas, as masculinas estão inscritas nas teias discursivas que
produzem os seres humanos e correspondem às posições-de-sujeito que cada um
assume e se identifica interpelado pela gama de discursos que circulam o tecido
social. Além do mais, submetido à performatividade, como proposto por Judith Butler
(2001, 2003), o discurso forja o sujeito, operando para estabelecer as formas de
pensar, sentir e agir adequadas para homens e mulheres. E o discurso dos homens
diz que não é permitido chorar, ser fraco, ter dúvidas etc., porque essas são
expressões femininas e o homem é diferente e superior, portanto, não pode sentir
como a mulher.
A psicologia, enquanto profissão, entretanto, é identificada como profissão
feminina, para a qual os atributos considerados femininos são indispensáveis no
desempenho profissional, como é o caso da sensibilidade. A respeito dos atributos
de um psicólogo/psicóloga no exercício profissional, diz uma aluna do 2º grupo:
[...] quando você vê um homem com essas características [...] um homem intuitivo, é
considerado um homem com a característica feminina de intuição como se a intuição
fosse somente de mulher [...]
[...] é uma atrofia mesmo, na educação dos homens, a sensibilidade. O homem não
pode nem chorar, quanto mais permitir que o outro chore na frente dele! Então,
assim, é muito delicado um homem se colocar no lugar de ouvir, não julgar, não ser
o homem o que vai comandar, entendeu? Permitir que o outro se expresse. A pessoa
tem que quebrar muitas verdades dentro dele [...]
Aluna 1: É como se diz: são os alternativos. São os caras alternativos! A gente vê até
pelos professores da gente que são psicólogos. A gente vê que não são homens
comuns! Por exemplo [...] [cita nome de alguns professores].
Aluna 2: Um homem como aquele cara machão! X não é comum [...] Um homem
machão geralmente vai pra área de exatas, ele fala muito em pegar mulher, sabe,
em casar, carro, acho que é uma coisa bem machista mesmo. Já os homens [...] os
psicólogos, e eu falo do meu terapeuta porque é homem, são realmente alternativos,
como disse X são diferentes.
Os homens são mais críticos, alternativos, estão buscando soluções novas para os
problemas que a sociedade oferece quanto a questão das relações humanas. Estão
tentando não seguir o padrão, não ser machão. Acredito também que o próprio
desenvolvimento do feminismo mesmo tá contribuindo pra isso! As mulheres também
não estão mais aceitando esses homens machões, não colaboradores [...].
Este aluno fala de si, fala da forma como subjetivou sua masculinidade. É
importante não perder de vista que empreendende-se um estudo sobre construção
de identidades profissionais e que esta, do ponto de vista que se defende, efetiva-se
na forma como se assumem determinados discursos que falam de cada um, assim
como daqueles pelos quais se é falado.
Além da masculinidade hegemônica, Ari José Sartori (2001) fala de uma
masculinidade subordinada, considerando-a aquela que está relacionada aos
homens sensíveis, tal como aqueles descritos pelos alunos e alunas que participam
desta pesquisa.
Aluna: [...] acho que tem uma coisa de uma vontade de ajudar o outro, de querer
fazer algo pra que o outro consiga melhorar. Eu não sei, não sei se a palavra é bem
essa — ajudar — mas tem um sentimento de que eu gostaria de fazer algo para
ajudar aquela pessoa que está sofrendo [...]
Aluno: Essa vontade é o que me leva a estudar psicologia! Isso que leva muita gente!
No primeiro dia de aula, quando pergunta: por que psicologia? Ah, porque tenho
vontade de ajudar as pessoas, porque eu gosto de cuidar das pessoas, porque gosto
de ouvir. Acho que isso são características pessoais que encaixa um pouco nos
requisitos necessários a profissão [...]
[...] então, eu posso falar por mim, enquanto homem, da seguinte questão: eu
acredito, por exemplo, que eu vim fazer esse curso pelo desejo, pelo interesse,
principalmente, pra conhecer mais essa possibilidade do ser humano, pra avançar
mais nessa questão, nessa condição de aprender mais sobre o ser humano, saber
mais quem é ele. Passava uma coisa de ser a respeito dele [...]
Ser psicólogo, pra mim, primeiro me envolve e vai me envolver o tempo todo em
transformação. Já mudei tanto por causa da Psicologia, que eu digo: meu Deus do
céu! [...] tanta melhoria, não é? [...] tão mais bacana [...] me sinto tão mais maluco,
222
me sinto tão mais legal. A Psicologia pra mim é isso, sabe? A Psicologia, quando ela
chega, ela chega batendo na porta e querendo passar [...]
Hoje eu digo, meu Deus, eu poderia ter feito outra coisa, eu podia estar com minha
vida mais estruturada, eu podia ter um emprego num escritório que eu entrasse,
trabalhasse 8 horas, tudo certinho, tudo sem questionamento. E a psicologia já
mexeu tanto na minha vida e continua mexendo de uma maneira tão maluca por que
já é sem controle. Eu acho que hoje, mesmo que eu parasse de atuar como
psicólogo, ela não sairia da minha vida. [...] Eu já não me permito mais determinadas
coisas sem uma reflexão muito profunda. E isso é muito cruel, às vezes, com a gente
mesmo! Porque tudo o que a gente quer, às vezes, é agir como um humano
qualquer, no sentido de que, uma pessoa que simplesmente age e não reflete, não
pensa no que está fazendo, e toca a vida. Mas isso, nunca acontece assim. A gente
está sempre se perguntando, se colocando questões, não é?
Eu achava que era a profissão mais sedutora que existia na face da terra. Só gênio
deve ser psicólogo! Que coisa maravilhosa é a natureza humana! Estudar isso!
223
Estudantes de Psicologia? Não sei se são mais valorizados, mas são valorizados.
Bastante. Por que são raros.
Aluna 1: Eu acho que é uma coisa que as pessoas discriminam [...] o homem vir a
fazer a psicologia [...]
Aluna 2 : O homem acolhendo a questão do ouvir, do ser mais sensível etc., é boiola!
Homem que vai mais pra essa linha do pensar, a sociedade coloca [...]
Essa coisa da gente ter essa idéia de que na psicologia é necessário ter essa
sensibilidade e que pro homem isso não está posto ainda, bem, então ele vai. Vamos
dizer que ele é muito sensível e que tá fazendo psicologia porque é uma pessoa
altamente sensível. Então isso já dá margem a pensar dele outras coisas. Então eu
acho que tem uma reserva por parte dos homens, talvez também em fazer
psicologia, entendeu?
REFLEXÕES
REFERÊNCIAS
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APÊNDICES
248
APÊNDICE A
Quais os momentos do curso que contribuiram para afirmar isso (que é psicóloga)?
Por que você acha que a Psicologia é uma profissão que atrai tanto as mulheres?
Quais são as qualidades pessoais e profissionais que o psicólogo precisa ter para
exercer a profissão?
APÊNDICE B
Data:
Assinatura do docente
Assinatura da pesquisadora
250
ANEXOS
251
Este questionário faz parte de uma pesquisa que pretende levantar aspectos relacionados com a
representação social da Psicologia e do psicólogo do ponto de vista dos alunos que estão ingressando
no curso da FDC Pretende também investigar motivos referentes à escolha profissional e a expectativa
de atuação futura.
Esperamos que você se sinta inteiramente à vontade para expressar suas opiniões, pois essas
respostas fazem parte de um banco de dados sobre o curso, serão registradas em computador e
analisadas em conjunto.
QUESTIONÁRIO
Dados demográficos
1. Sexo M _________ F _______ Idade ________ anos
2. Possui outra graduação em nível de 3º grau? Sim ________ Não __________
3. Renda familiar: até 2 SM _____ de 2 a 5 SM _____ de 5 a 10 SM acima de 10 SM _____
4. Profissão do pai ___________________ Profissão da mãe____________________
5. Há psicólogo na sua família? Sim _________ Não_____________
Questões:
1. O que é Psicologia?
EBP 102 EBP 202 EBP 302 EBP 402 EBP 502 EBP 602 EBP 703 EBP 803 EBP 903 EBP 002
Fisiologia Básica Psico. do Desenv. Psicologia Social II Estatística Aplicada à Estágio Básico I Pesquisa em Psico. do Trab. e das Teorias e Técnicas Saúde Coletiva Tópicos Especiais em
72h - 03 Humano I 54h - 03 Psicologia 54h - 02 Psicologia I Organizações II Psicoterápicas II Psicologia
72h - 04
54h - 03 72h - 03 72h - 03 72h - 03 72h - 04 72h - 04
EBP 103 EBP 204 EBP 303 EBP 403 EBP 503 EBP 603 EBP 707 EBP 804 EBP 904 EBP 003
Fundamentos de Neurociências e Psico. do Desenv. Grupos e Fenômenos Avaliação Psicológica I Avaliação Psicológica II Teorias e Técnicas Teorias e Técnicas Interv. em Contextos de Neuropsicolgia
Sociologia Comportamento Humano II Grupais Psicoterápicas I Psicoterápicas III Trabalho e Organizações I
72h - 03 72h - 03 72h - 03
54h - 03 72h - 04 72h - 03 72h - 03 72h - 04 72h - 04 72h - 03
EBP 104 EBP 205 EBP 304 EBP 404 EBP 504 EBP 604 EBP 711 EBP 805 EBP 905 EBP 005
Genética Aplicada à História Cont. da Processos Psico. do Desenv. Medidas em Avaliação Psicológica III Pesquisa em Trabalho Final Intervenções em Interv. em Contextos de
Psicologia Psicologia Psicológicos Básicos Humano III Psicologia Psicologia II Orientado Trabalho e Organizações II
72h - 03 Contextos de Saúde
54h - 03 54h - 03 72h - 03 54h - 03 72h - 03 72h - 03 36h - 02 72h - 03 72h - 03
EBP 105 EBP 206 EBP 305 EBP 405 EBP 505 EBP 605 EBP 712
Informática e Seminários “Etologia” Seminários -“História da Psicologia e Metodologia da Psico. do Trab. e das Sem-“Avaliação Func.
Psicologia Psicologia no Brasil” Educação Pesquisa Organizações I do Comportamento”
36h - 02
72h - 03 36h - 02 72h - 03 72h - 03 72h - 03 36h - 02
EBP 106 EBP 207 EBP 306 EBP 406 EBP 506 EBP 606 EBP 713
Introd. à Met. Psicologia Social I Teorias da Seminários -“Sexualidade Seminários Psicologia e Saúde Ética e Práticas
Científica Aprendizagem e Gênero” “Psicofarmacologia” Profissionais
72h - 04 72h - 03
54h - 02 72h - 03 36h - 02 36h - 02 72h - 03
EBP 107 EBP 212 EBP 307 EBP 407 EBP 507 EBP 607
Introdução à Análise Experimental Teoria Psicanalítica Teorias Humanistas e Psicologia e Seminários “Introd. ao
Psicologia do Comportamento I Fenomenológicas Comunidade Pensamento de Jung”
72h - 04
72h - 04 54h - 03 54h - 03 72h - 03 36h - 02
Fisiologia Básica EBP 102 Sem Pré-Requisitos Psicologia do Desenvolvimento Humano I EBP 202 EBP 107 Psicologia Social II EBP 302 EBP 207
Fundamentos de Sociologia EBP 103 Sem Pré-Requisitos Neurociências e Comportamento EBP 204 Sem Pré-Requisitos Psicologia do Desenvolvimento Humano II EBP 303 EBP 202
Genética Aplicada à Psicologia EBP 104 Sem Pré-Requisitos História Contemporânea da Psicologia EBP 205 EBP 101 Processos Psicológicos Básicos EBP 304 EBP 107
Informática e Psicologia EBP 105 Sem Pré-Requisitos Seminários – “Etologia” EBP 206 EBP 107 Seminários – “História da Psicologia no Brasil” EBP 305 EBP 205
Introdução à Metodologia Científica EBP 106 Sem Pré-Requisitos Psicologia Social I EBP 207 EBP 107 Teorias da Aprendizagem EBP 306 EBP 107
Introdução à Psicologia EBP 107 Sem Pré-Requisitos Análise Experimental do Comportamento I EBP 212 EBP 107 Teoria Psicanalítica EBP 307 EBP 107
Seminários-“Psicologia, Ciência e Profissão” EBP 108 Sem Pré-Requisitos Personalidade EBP 213 EBP 107
Grupos e Fenômenos Grupais EBP 403 EBP 302 Avaliação Psicológica I EBP 503 Sem Pré-Requisitos Avaliação Psicológica II EBP 603 EBP 503 / EBP 504
Psicologia do Desenvolvimento Humano III EBP 404 EBP 303 Medidas em Psicologia EBP 504 Sem Pré-Requisitos Avaliação Psicológica III EBP 604 EBP 503 / EBP 504
Psicologia e Educação EBP 405 Sem Pré-Requisitos Metodologia da Pesquisa EBP 505 EBP 106 Psicologia do Trabalho e das Organizações I EBP 605 Sem Pré-Requisitos
Seminários-“Sexualidade e Gênero” EBP 406 Sem Pré-Requisitos Seminários-“Psicofarmacologia” EBP 506 Co-Requisito EBP 501 Psicologia e Saúde EBP 606 Sem Pré-Requisitos
Teorias Humanistas e Fenomenológicas EBP 407 EBP 107 Psicologia e Comunidade EBP 507 EBP 302 Seminários – “Introdução ao Pensamento de Jung” EBP 607 Sem Pré-Requisitos
Psicologia do Trabalho e das Organizações II EBP 703 EBP 605 Teorias e Técnicas Psicoterápicas II EBP 803 Sem Pré-Requisitos Saúde Coletiva EBP 903 Sem Pré-Requisitos
Teorias e Técnicas Psicoterápicas I EBP 707 Co-Requisito EBP 713 Teorias e Técnicas Psicoterápicas III EBP 804 EBP 407 DISCIPLINAS POR ENFÂSE:
Pesquisa em Psicologia II EBP 711 EBP 602 Trabalho Final Orientado EBP 805 Sem Pré-Requisitos Intervenções em Contextos de Trabalho e Organizações I EBP 904 OPTATIVA
Seminários-“Avaliação Funcional do Comportamento” EBP 712 Sem Pré-Requisitos Intervenções em Contextos de Saúde EBP 905 OPTATIVA