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In: Em defesa da
sociedade: curso no Collège de France. São Paulo, Editora WMF, 2º ed. 2010,
p. 201 - 221
[2º campo de intervenção] (....) conjunto de fenômenos dos quais uns são
universais e outros acidentais (...) [universais] da velhice, do indivíduo que cai,
em consequência para fora do campo de capacidade, de atividade. E da outra
parte [acidentais], os acidentes, as enfermidades, as anomalias diversas. 205
[TRÊS ELEMENTOS]
[BIOPOLITICA E MORTALIDADE]
Ora, eu creio que a razão por que, de fato, a morte tornou-se assim essa coisa
que se esconde não é numa espécie de deslocamento da angústia (...) está
numa transformação das tecnologias de poder (...) o poder intervém sobretudo
nesse nível para aumentar a vida, para controlar seus acidentes, suas
eventualidades, suas deficiências, daí por diante a morte (...) Isso sobre o que
poder tem domínio não é a morte, é a mortalidade (...) agora a morte vai ser , ao
contrário [do direito soberano], o momento em que o indivíduo escapa a qualquer
poder (...) o poder já não conhece a morte. 208
É, mediante um poder que não é simplesmente proeza científica, mas
efetivamente exercício desse biopoder político que foi introduzido (...) que
consegue [fazer as pessoas viverem] no mesmo momento em elas deveriam,
biologicamente, estar mortas há muito tempo. 209
[DISCIPLINA E REGULAMENTAÇÃO]
Esses dois conjuntos de mecanismos, um disciplinar, o outro regulamentador,
não estão no mesmo nível [mas não se excluem] (...) os mecanismos
disciplinares de poder e os mecanismos regulamentadores de poder (...) são
articulados um com o outro1 (...) pode-se dizer que o elemento que vai circular
entre o disciplinar e o regulamentador (...) é a norma (...) o que pode tanto se
aplicar a um corpo que se quer disciplinar quanto a uma população que se quer
regulamentar. 212 – 213
[BIOPODER E RACISMO]
Nessa tecnologia de poder que tem como objeto e como objetivo a vida (...) como
vai exercer o direito de matar e a função de assassínio (...) como um poder como
este pode matar, se é verdade que se trata essencialmente de aumentar a vida,
de prolongar a sua duração, de multiplicar as suas possibilidade. 214
É aí, creio eu, que intervém o racismo (...) ele existia a muito tempo. Mas eu acho
que funcionava de outro modo (...) o que é o racismo? (...) é o meio de introduzir
1
Para exemplificar temos a cidade operária do século XIX “Quanto mais rápido a cidade crescesse, pior
era em superpopulação. Apesar da reforma sanitária e do pequeno planejamento que ali havia, o
problema da superpopulação talvez tenha crescido nesse período sem que a saúde ou a taxa de
mortalidade tenham melhorado, se é que não pioraram de fato” (Hobsbawm, A era do capital, p. 317)
afinal, nesse domínio da vida de que o poder se incumbiu, um corte: corte entre
o que deve viver e o que deve morrer. 214
[FUNÇÕES DO RACISMO]
[1º função]: fragmentar, fazer censuras no interior desse contínuo biológico a
que se dirige o biopoder. 214
[2º função]:permitir uma relação positiva (...) “se você quer viver, é preciso que o
outro morra” (...) a morte do outro não é simplesmente a minha vida, na medida
em que seria minha segurança pessoal; a morte do outro, a morte da raça ruim,
da raça inferior. 215
Em outras palavras, tirar a vida, o imperativo da morte, só é admissível, no
sistema de biopoder, se tende não à vitória sobre os adversários políticos, mas
a eliminação do perigo biológico e ao fortalecimento (...) o racismo, é a condição
de aceitabilidade de tirar a vida numa sociedade de normalização. 215
[BIOPODER E A BIOLOGIA]
Pode se compreender, primeiro, o vínculo que rapidamente (...) se estabeleceu
entre a teoria biológica do século XIX e o discurso de poder (...) Em outras
palavras, cada vez que houve enfrentamento, condenação à morte, luta, risco de
morte, foi na forma do evolucionismo que se foi forçado, literalmente, a pensa-
los. 216
O racismo, acho eu, assegura a função de morte na economia do biopoder,
segundo o princípio de que a morte dos outros é o fortalecimento biológico da
própria pessoa na medida em que ela é membro de uma raça ou de uma
população, na medida em que se é elemento numa pluralidade unitária e viva. 2
217
2
A sociedade nazista é um exemplo dessa aproximação entre a teoria biológica e o discurso de poder.
Outro aspecto importante é que para o filosofo italiano Agamben o exemplo clássico de biopoder são as
os Estados autoritários do século XX. O filosofo italiano diverge de Foucault ao retomar a biopolítica não
a partir da segunda metade do século XVIII e no início do século XIX, mas a partir do homo sacer presente
no direito romano.