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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

INTERDISCIPLINARIDADE: Didática, Prática de Ensino e Direitos Humanos?

Ivani Catarina Arantes Fazenda (PUCSP)


jfazenda@uol.com.br

RESUMO: O presente artigo objetivou discutir sócio historicamente os


termos Interdisciplinaridade, Prática de Ensino, Didática, Direitos
Humanos partindo da polissemia que os envolve, buscando em alguns de
seus pesquisadores aspectos contidos na diversidade cultural que envolvem
definições múltiplas, conceitos variados e resultados aferidos a partir das
configurações assumidas quando tratamos da questão formação de
professores seja na Didática e ou na Prática de Ensino.

Se definirmos interdisciplinaridade como junção de disciplinas, cabe pensar


currículo apenas na formatação de sua grade. Porém se definirmos interdisciplinaridade
como atitude de ousadia e busca frente ao conhecimento, cabe pensar aspectos que
envolvem a cultura do lugar onde se formam professores, seu aspecto Humano!!!!!.
Assim, na medida em que ampliamos a análise do campo conceitual da
Interdisciplinaridade surge à possibilidade de explicitação de seu espectro
epistemológico, ontologico e praxeológico. Somente então, torna-se possível falar sobre
o professor e sua formação, e dessa forma no que se refere às disciplinas e currículos.
Reportamo-nos à questão: como a Interdisciplinaridade se define quando a
intenção é formar professores?
Servindo-nos, por exemplo, de uma definição clássica produzida em 1970 pelo
CERI – Centro para Pesquisa e Inovação do Ensino, onde Interdisciplinaridade é
definida como interação existente entre duas ou mais disciplinas, verificamos que tal
definição pode nos encaminhar da simples comunicação das idéias até a integração
mútua dos conceitos chaves da epistemologia, da terminologia, do procedimento, dos
dados e da organização da pesquisa e do ensino relacionando-os. Tal definição como se
pode constatar é muito ampla, portanto não é suficiente nem para fundamentar práticas
interdisciplinares e nem para pensar-se uma formação humana de professores.

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Podemos nesse caso proceder a uma decodificação na forma de conceber a


interdisciplinaridade. Fourez (in LENOIR, REY, FAZENDA, 2001) apresenta-nos duas
ordens distintas, porém complementares, de compreender uma formação interdisciplinar
de professores, uma ordenação cientifica e uma ordenação social onde o caráter humano
se evidencia.
A científica nos conduziria à construção do que denominaríamos saberes
interdisciplinares. A organização de tais saberes teria como alicerce o cerne do
conhecimento científico do ato de formar professores, tais que a estruturação
hierárquica das disciplinas, sua organização e dinâmica, a interação dos artefatos que as
compõem, sua mobilidade conceitual, a comunicação dos saberes nas seqüências a
serem organizadas. Essa proposição conduziria à busca da cientificidade disciplinar e
com ela o surgimento de novas motivações epistemológicas, de novas fronteiras
existenciais. Por isso, entendemos o seguinte: cada disciplina precisa ser analisada não
apenas no lugar que ocupa ou ocuparia na grade, mas, nos saberes que contemplam, nos
conceitos enunciados e no movimento que esses saberes engendram, próprios de seu
lócus de cientificidade. Essa cientificidade, então originada das disciplinas ganha status
de interdisciplina no momento em que obriga o professor a rever suas práticas e a
redescobrir seus talentos, no momento em que ao movimento da disciplina seu próprio
movimento for incorporado ao mundo.
A segunda, então denominada ordenação social, busca o desdobramento dos
saberes científicos interdisciplinares às exigências sociais, políticas e econômicas. Tal
concepção coloca em questão toda a separação entre a construção das ciências e a
solicitação das sociedades. No limite, diríamos mais, que esta ordenação tenta captar
toda complexidade que constitui o real e a necessidade de levar em conta as interações
que dele são constitutivas. Estuda métodos de análise do mundo, em função das
finalidades sociais, enfatiza os impasses vividos pelas disciplinas cientificas em suas
impossibilidades de sozinhas enfrentarem problemáticas complexas.
No referente à primeira ordenação, científica, diríamos com Lenoir (in LENOIR,
REY, FAZENDA, 2001) o seguinte: a cientificidade aqui revelada estaria em
conformidade com a forma de pensar de uma cultura eminentemente francófona na qual
o saber se legitima pela beleza da capacidade de abstração – um saber/saber.
Ainda apropriando-nos dos escritos de Yves Lenoir aqui citado, diríamos que a
segunda classe de ordenação, social, se aproximaria mais de uma cultura de língua

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inglesa na qual o sentido da prática, do para que serve, impõe-se como forma de
inserção cultural essencial e básica – saber fazer.
Duas culturas diferentes, duas formas diferenciadas de conceber conhecimento e
organizar seus currículos de formação de professores.
Porém Yves Lenoir aponta para o surgimento de uma terceira cultura legitimada
como a do saber ser. Refere-se a uma forma brasileira de formar professores. Sua
conclusão fundamenta-se na análise de estudos e pesquisas sobre Interdisciplinaridade
na formação de professores produzidos no Brasil. Sem abdicar das duas anteriores, um
denominador comum: a busca de um saber ser interdisciplinar. Essa busca explicita-se
na inclusão da experiência docente em seu sentido, intencionalidade e funcionalidade
diferenciando o contexto científico do profissional e do prático (LENOIR, REY,
FAZENDA 2001).
Abarcar a questão da experiência docente nessa tríplice dimensão: do sentido, da
intencionalidade e da funcionalidade, requer cuidados de diferentes ordens (FAZENDA
2003), cuidados nas pré-suposições teóricas investigando os saberes que referenciaram a
formação de determinado professor, cuidados ao relacionar esses saberes ao espaço e
tempo vivido pelo professor, cuidados no investigar os conceitos por ele apreendidos
que direcionaram suas ações e finalmente cuidado em verificar se existe uma coerência
entre o que diz e o que faz.
Para melhor compreendermos o significado dessa ordenação brasileira que
poderíamos denominar interacional, precisaríamos adentrar em aspectos teórico/práticos
apenas emergentes nas pesquisas sobre Interdisciplinaridade e em outros um pouco mais
aprofundados na produção brasileira. Estamos nos referindo a questões como: estética
do ato de apreender, espaço do apreender, intuição no ato de apreender, design do
projetar, tempo de apreender, importância simbólica do apreender. Todas elas
evidentemente referentes a uma Didática e Prática fundadas nos Direitos Humanos.
Abstraindo-se implicações de natureza mítica do conceito de interdisciplinaridade
ou de outra perspectiva qualquer que apenas fixe a mesma às questões relativas à
unidade do saber (FAZENDA, 2003) enfatizamos a posição de Morin (1990) ao
vincular o uso da palavra interdisciplinaridade à expansão da pesquisa científica
(FAZENDA, 2003) o que a institucionaliza no século XX, porém forjada no século
XVII quando a ciência adquire progressivamente formas diversas de interpretação da
natureza em suas relações sócio-culturais, portanto adquirindo visões e esquemas de

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interpretação do mundo que se diferenciam se levarmos em conta a história da


humanidade (FAZENDA, 2003).
Assim, reafirmando o que anteriormente dissemos em estudos anteriores
(FAZENDA, 2013) o debate inicia-se na universidade com a necessidade de inclusão
inexorável do ser humano na organização dos estudos, porém gradativamente amplia-se
a um segundo patamar de preocupações: o das diferentes esferas da sociedade
necessitadas de rever as exigências dos diferentes tipos de sociedades capitalistas onde o
cotidiano das atividades profissionais se deslocam para situações complexas para as
quais as disciplinas convencionais não se encontram adequadamente preparadas.
Navegar entre dois polos: da pesquisa de sínteses conceituais dinâmicas e audazes
e a construção de formas de intervenção diferenciadas constituem-se objeto de pesquisa
há quase vinte anos, entre muitos pesquisadores da área (FAZENDA, 2013).
A inquietação dos pesquisadores que à interdisciplinaridade se dedicam
convergem desde o inicio da década de 60 e ampliam-se cada vez mais na compreensão
dos paradoxos advindos da necessidade da busca de sentidos existenciais e ou
intelectuais (PINEAU, 2002). Essa busca de sentido exige respeito a critérios de
funcionalidade necessários sem que com eles quebremos os princípios básicos de
humanidade no seu mais amplo significado, dos Direitos Humanos a serem assim
legitimados.
O conceito de interdisciplinaridade como ensaiamos em todos nossos escritos
desde 1979 e agora aprofundamos encontra-se diretamente ligado ao conceito de
disciplina, onde a interpenetração ocorre sem a destruição básica às ciências conferidos.
Não se pode de forma alguma negar a evolução do conhecimento ignorando sua
história. Nesse sentido é impossível pensarmos em Direitos Humanos sem considerar a
evolução histórico crítica das disciplinas Didática e Prática de Ensino.
Assim se tratamos de interdisciplinaridade na Educação, não podemos permanecer
apenas na prática empírica, ou nas pressuposições didáticas convencionais, mas é
imperioso que se proceda uma análise detalhada dos porquês dessa prática/didática
histórica e culturalmente contextualizadas.
Caminhando nesse raciocínio falar de interdisciplinaridade escolar, curricular,
pedagógica ou didática ou prática requer uma profunda imersão nos conceitos de escola,
currículo. A historicidade desses conceitos, entretanto, requer igualmente uma profunda
pesquisa nas potencialidades e talentos dos saberes requeridos ou a requerer de quem as
estiver praticando ou pesquisando (FAZENDA, 2003).

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Interdisciplinaridade escolar não pode confundir-se com interdisciplinaridade


cientifica (FAZENDA, 2013).
Na interdisciplinaridade escolar a perspectiva é educativa, assim os saberes
escolares procedem de uma estruturação diferente dos pertencentes aos saberes
constitutivos das ciências.
Na interdisciplinaridade escolar as noções, finalidades habilidades e técnicas
visam favorecer, sobretudo, o processo de aprendizagem respeitando os saberes dos
alunos e sua integração.
Cabe-nos também mais uma vez reafirmar a diferença existente entre integração e
interdisciplinaridade (FAZENDA, 2013) ao pensarmos em Didática, Prática de Ensino e
Direitos Humanos.
Apesar dos conceitos serem indissociáveis eles são distintos: uma integração
requer atributos de ordem externa, melhor dizendo da ordem das condições existentes e
possíveis, diferindo de uma integração interna ou interação, da ordem das finalidades e
sobretudo entre as pessoas. Com isso retomamos novamente a necessidade de condições
humanas diferenciadas no processo de interação que faça que saberes de professores
numa harmonia desejada se integrem aos saberes dos alunos melhor dizendo dos
Direitos Humanos. Isso requer um outro tipo de profissional com novas características,
ainda sendo pesquisadas..
Em todos esses anos dedicados ao estudo e à pesquisa sobre interdisciplinaridade
o que mais nos conforta é perceber que ao orientarmos nossas pesquisas para a gênese
das definições mais comuns utilizadas na Educação, necessariamente verificamos uma
gradativa mudança na compreensão dos pesquisadores por nós iniciados. Essa
compreensão que acreditamos nascer do cuidado na potencialidade do estudo de
conceitos tem conduzido nossos pesquisadores à aquisição de um olhar divergente e
paradoxalmente convergente á historia do conceito e sua representação sócio-cultural
aliando-se, sobretudo, às diferentes perspectivas de produção (FAZENDA, 2014).
Estamos constatando em nossas pesquisas brasileiras como o estudo de definições
preliminares podem aos poucos adquirir uma tridimensionalidade ou a potência de
conduzir o pesquisador a enxergar alem das mesmas e dos conceitos por meio delas
produzidos, como dissemos em textos anteriores, cada vez na apreensão de sentido de
Direitos Humanos.
A pesquisa interdisciplinar somente torna-se possível onde várias disciplinas se
reúnem a partir de um mesmo objeto, porém, é necessário criar-se uma situação

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problema no sentido de Freire (1981), onde a ideia de projeto nasça da consciência


comum, da fé dos investigadores no reconhecimento da complexidade do mesmo e na
disponibilidade destes em redefinir o projeto a cada dúvida ou a cada resposta
encontrada.
Nesse caso, convergir não ao sentido de uma resposta final, mas à pesquisa do
sentido da pergunta inicialmente enunciada, emoldurada pela duvida maior: Qual o
sentido humano de educar interdisciplinarmente?
A interdisciplinaridade na formação profissional requer competências relativas às
formas de intervenção solicitadas e às condições que concorrerem ao seu melhor
exercício. Neste caso, o desenvolvimento das competências necessárias requerem a
conjugação de diferentes saberes disciplinares sejam de ordem prática e/ou didática.
Entenda-se por saberes disciplinares: saberes da experiência, saberes técnicos e saberes
teóricos interagindo dinamicamente sem nenhuma linearidade ou hierarquização que
subjugue os profissionais participantes.
A formação interdisciplinar de professores, na realidade deveria ser vista de um
ponto de vista circundisciplinar, tal como temos discutido com Yves Lenoir, aonde a
ciência da educação fundamentada num conjunto de princípios, de conceitos, de
métodos e de fins convergem para um plano meta-científico. Tratamos nesse caso do
que poderíamos chamar interação envolvente sintetizante e dinâmica, uma estrutura
dialética, não linear e não hierarquizada, aonde o ato profissional de diferentes saberes
construídos pelos professores não se reduzem apenas a saberes disciplinares.
Começamos aqui a tratar de um assunto novo, recentemente pesquisado denominado
intervenção educativa onde mais importante que o produto seja o processo que se inicia
e permanece na manutenção dos Direitos Humanos.
A circundisciplinaridade não exclui a necessidade de uma formação disciplinar,
indispensável no processo de teorização das práticas, mas como denomina Bárbara
Freitag em 1995 o desenvolvimento de um corpo sintético de conhecimentos
debruçando-se sobre um sistema teórico, visando uma síntese explicativa, pré-ditiva e
compreensiva (Didática). Trata-se assim o ato educativo escolar numa dimensão
complexa e interligada de diferentes componentes e de diferentes regulamentações. Sua
transmissão apenas parte de um conteúdo disciplinar pré-determinado, porém amplia-se
numa dimensão planetária de mundo{Pratica} onde os estudos encontram-se sempre
numa dimensão de esboços inacabados de um design de projeto que se altera em seu
desenvolvimento ao tocar o Humano.

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Há quarenta anos, quando iniciamos nossas pesquisas em Interdisciplinaridade, os


escritos e pesquisas sobre teoria, prática, didática e pesquisa interdisciplinares eram
incipientes. Hoje mais do que ontem, a questão dos direitos humanos nelas melhor se
clarifica.
Essa questão apenas esboçada naquela época volta ao debate intensivamente.
O renascimento ao que tudo indica ocorre ao final de 2012 onde a CAPES
conclama todas as universidades brasileiras a apresentarem os resultados da
formalização ocorrida dez anos antes na qual a interligação de saberes é requerida.
Acreditamos que o ritmo empreendido de 2012 a 2014 não apenas nos mobilizará
ao futuro, pois o presente já se apresenta pródigo em projetos, dúvidas, perguntas...
intensamente, sem desprezar a história de todos os EDUCADORES que a essa
empreitada se aventuraram.
O reconhecimento do papel do aluno mais recolhido e do professor mais tímido
começam a sair do ostracismo!!! Outros certamente se animarão a ser, saber e intervir
interdisciplinarmente, pesquisando a história, reconhecendo nela as hipóteses da
inovação!!!!!
O olhar interdisciplinar sustentado pela intervenção educativa nos convida de fato,
a questionar a prática profissional dentro de uma perspectiva multirrefencial. Esta
afirmação, defendida por René Lourau em 1993, René Barbier em1997, Maurice
Maubant em 2010, constitui um essencial ponto de partida para a pesquisa estudada por
eles, e nos encoraja a identificar as teorias e os modelos, propondo-se a uma devolutiva
inteligível da prática educativa interdisciplinar tendo a Didática como escopo.
Primeiramente, lembramos que o desenvolvimento desta função e desta posição
do docente-formador interdisciplinar é acompanhado de um recurso manifestado na
análise das práticas.
Mas esta análise, tal qual se pratica hoje dentro de um certo número de
organismos universitários de formação profissional, não permite jamais que se
identifique o eixo fundador da prática docente, destarte algumas críticas de
pesquisadores mais conservadores o que nos incita a um cuidado maior com o escopo
de uma produção teórica consistente da própria prática.
Os dispositivos de análise e seus princípios carregam sobre as práticas dos
docentes de hoje, algo ‘além’ que são extremamente variadas, e estão longe de um
consenso, ainda menos de uma compreensão teórica convencional.ou única, pelo fato de
serem Humanas.

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O que nossas pesquisas constatam é a existência de um quadro teórico e


conceitual frequentemente pouco estabilizado, e até mesmo separado das ações próprias
dos docentes que as colocam num lugar isolado na organização dos currículos das
universidades. Quando as mesmas aparecem em geral encontram-se envoltas numa
ordem rigidamente prescritiva onde a questão do Direito aparece como ordem a ser
cumprida.
Estratégias próprias de como identificar os saberes profissionais, de como
compreender a essência dos processos de construção e de elaboração destes saberes, de
analisar a compreensão dos sentidos dentro de um agir profissional são questões
relevantes tratadas com detalhes na íntegra das pesquisas que nos propusemos orientar
em todos esses anos. Com os devidos cuidados poderiam constituir-se plataformas de
acesso a um processo de formação visando à profissionalização interdisciplinar dos
futuros cidadãos.
Esquecidos os saberes eruditos, esquecida a questão dos fundamentos
epistemológicos dos saberes docentes, infelizmente o que parece apenas contar hoje é a
capacidade dos estudantes em se adaptarem ás realidades do mercado de trabalho a
partir de uma formação prioritariamente prática, proposta pelas universidades, uma
garantia de fazer apenas de penetrar no ofício, sem a capacidade de recria-lo. Total
anulação ao direito humano de Criar.
Rever a questão dos Direitos Humanos na Educação requer a superação de pelo
menos duas condições: a primeira é a de incentivar a identificação, a leitura e a
compreensão daquilo que se funda numa prática cotidiana.
Esta primeira condição necessita, antes de tudo, um retorno ás origens dos saberes
profissionais essencialmente iniciados e postos que se abrirão para um futuro prático
melhor dizendo: História. Para além deste retorno as fontes do saber profissional,
convêm, também, poder acompanhar os futuros profissionais dentro de uma atividade
delicada e arriscada de leitura e compreensão da sua prática já vivenciada, bem como de
suas potencialidades latentes ou pulsantes.
A análise deste ato que se funda na historia da atividade profissional coloca como
indagantes, as representações habituais que deixariam entender que por camuflagem
e/ou por mimetismo pode-se aprender a agir profissionalmente.
Só uma caminhada reflexiva e crítica levando um olhar ao mesmo tempo
introspectivo e retroativo, mas, interativo no sentido profundo de sua ambigüidade

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permitiria o efetivo exercício da interdisciplinaridade, onde prática e didática se


interligariam.
A segunda condição é a permissão da formação universitária em garantir uma
formação realmente profissionalizante, onde se invista na questão da atitude de mediar
sem abortar.
Assim, só o exercício da auto percepção, do pesquisador sobre sua formação
anterior torna possível à função de mediação entre presente e futuro.
A interdisciplinaridade não pode confundir o sentido de uma formação
profissional, àquela que ajuda um novato a conceber e a construir o ato profissional com
o dispositivo de formação se apoiando principalmente sobre uma aposta em estágio
baseado na ilusão de uma indispensável sinergia entre teoria e prática como um vetor de
profissionalização.
O desafio que a formação interdisciplinar neste momento adquire é a de
incrementar nos próximos anos, sua capacidade de identificar os diferentes tipos de
saberes em jogo no ato de ensinar, tomando-os como incompletos e sempre
insuficientes.
É neste ato de perene incompletude que a potencialidade do vir a ser se
constituirá.
Enfim, o mesmo ato de inventar um dispositivo pedagógico que invada este
ensinamento didático desta atualização dos saberes profissionais, da compreensão de
sua organização em sistemas organizadores de intervenção educativa inovadora
dependerá o sucesso dos dispositivos de formação dos docentes.
A função subversiva e polêmica da pesquisa interdisciplinar em educação,
pressuporá o sentido de uma formação profissional dos docentes, em educação
deliberadamente subversiva e polêmica. Porque esta é a única direção que pode oferecer
a garantia de evitar as interpretações subentendidas, a hegemonia de uma doxa
pedagógica, o discurso complacente, organizando a felicidade por decreto, como dizia
Olivier Reboul em1992. E, sem dúvida, favorecendo este encontro, esta confrontação
construtiva entre os diferentes quadros teóricos e conceituais que se propõem ler e
compreender a prática de ensino que a formação profissional poderá retornar em todo
seu poder de mudança social.

Ao ser convidada para escrever este texto para o XVII Endipe cumpre-me neste
momento pedir demissão do papel a mim confiado, abrindo meu olhar para certas

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considerações que então ficaram adormecidas, guiando o leitor para um nível de


realidade a ele não efetivamente pertencente, refiro-me, ao Endipe nascido em 1985
resultante de dois encontros paralelos: o de Didática e o de Prática de Ensino.
Naquele momento, o projeto do III ENPE (Encontro acional de Prática de Ensino)
desenvolveu-se tendo a Interdisciplinaridade como base - acredito que a escolha do
tema e o desafio de efetivá-lo foi motivo para despertar o desejo de reais encontros entre
as disciplinas: Didática e Prática de Ensino- consolidando-se no compromisso assumido
de continuar o encontro iniciado.
Mais uma vez recorro a memória perguntando-me: de que forma o conhecimento,
das intuições propostas pelos sujeitos integrantes daquele momento poderiam contribuir
para a consciência da existência de um projeto maior de Humanidade, onde a pesquisa
constitua-se forma de realização de ENCONTROS autênticos, onde Razão e Afeição
possam ser ao mesmo tempo conjugados?
A potencialidade de descobrir novas situações, elaborar novos projetos, passar a
limpo os contos e os sonhos, revelar os talentos escondidos, reconhecer o que é próprio
de cada um, diferenciar o que é nosso ou do outro, e talvez sonhando com um terceiro a
ser gestado se encontram nas entrelinhas do acontecido em cada um dos ENDIPES.
De que saberes tratam a Didática?
Qual a ética subjacente aos fazeres da Prática?
O que pretendem construir?
Seriam novos espaços para uma Educação Planetária?
Realizariam assim, uma exegese de saberes profissionais, científicos e pessoais?
A que limites a serem explorados tais saberes nos conduziriam, nós, participantes
de todos os ENDIPES?
Como ordenar o que se constitui prioritário, quando o todo converge?
Tratam de que forma as intervenções concluídas, as ainda em construção, as
apenas esboçadas?
Como alocam os diversos olhares sem perder os detalhes que singularizam as
posições, tornando-as diversas?
Como tratam das emergências de diferentes ordens quando anseiam por um
produto que possa alavancar o compromisso de uma EDUCAÇÃO para uma
Humanidade disciplinarmente estruturada, onde a Pesquisa ainda está por avançar?
Por último uma pergunta a mais:

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Como se serviram nestes ENDIPES da metáfora da Interligação de Saberes


surgida nas entrelinhas destes encontros?
Como a tarefa proposta subliminar de organizar desorganizando, torna-a
referência para futuros estudos?
Como encontrar neles, poços de captura e deslizar pontos de fuga desejantes ao,
constituírem-se Grupo de Educadores que se articula buscando o Encontro, emprestando
aqui as palavras de J. Gauthier em 2004.
Nomear cada um dos atributos pesquisados nestes anos vividos seria tarefa
inglória, pois cada palavra cumpriu da melhor forma seu papel essencial, onde cada
gesto foi contemplado pela simples alegria de trilhar o compromisso assumido, porém
uma importante revelação a ser pronunciada- o encontro entre o presente, o passado e o
futuro buscado pelos autores/pesquisadores que constituíram o ENDIPE deveu-se á sua
força guerreira, contagiando não apenas a mim, na honra de leitora inicial, como
atendendo o chamado de colegas/pesquisadores de outras partes do mundo ao lado dos
quais humildemente ouso colocar-me.

REFERÊNCIAS.

LENOIR, REY, FAZENDA. Les fondements de L´interdisciplinarité dans la


formation à L´enseignement. Canadá: Éditions du CRP/UNESCO, 2001.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes Fazenda (Org). Interdisciplinaridade: pensar.


pesquisar e intervir. São Paulo: Cortêz, 2014.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes. Integração e Interdisciplinaridade no ensino


brasileiro: efetividade ou ideologia. São Paulo: Edições Loyola, 2013.

FAZENDA, Ivani Catarina Arantes Fazenda. Interdisciplinaridade: qual o sentido?


São Paulo: Editora Paulus, 2003.

FOUREZ, G. Fondements épistemologiques pour L´interdisciplinarité, in LENOIR,


REY, FAZENDA. Les fondements de L´interdisciplinarité dans la formation à
L´enseignement. Canadá: Éditions du CRP/UNESCO, 2001.

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FREIRE, Paulo. Ideologia e educação: reflexões sobre a não neutralidade da educação.


Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.

MORIN, Edgard. Introduction à la pensée complexe. Paris: ESF, 1990.

PINEAU, G. Les Histoires de Vie. Paris: PUF, 2002.

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Didática transdisciplinar como expressão de uma


fenomenologia complexa
Maria Cândida Moraes
Brasília, UCB/DF.
2014
Resumo

Neste ensaio se reconhece a didática transdisciplinar com expressão de uma fenomenologia complexa, produto
de uma tessitura dialógica, complexa e autoeco-organizadora entre sujeito e objeto, que emerge em outro nível
de materialidade diferente daquele que lhe deu origem. O conhecimento transdisciplinar emergente no ato
didático é tecido nas fronteiras disciplinares, na intersubjetividade dialógica, nos meandros das pluralidades de
percepções e significados emergentes, a partir de uma dinâmica complexa. Para tanto, é necessário a
complexificação do ato didático, superando a fragmentação e o reducionismo dos processos de ensino e
aprendizagem, trabalhando, simultaneamente, os diferentes elementos estruturantes, a partir de uma
racionalidade aberta nutrida pelos operadores cognitivos do pensar complexo.

Palavras-chave: didática transdisciplinar, complexidade e transdisciplinaridade.

Introdução
Como trabalhar esta relação? É possível pensar a didática a partir da
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transdisciplinaridade? Como ela se materializa na prática pedagógica? O que ela traz de
diferente em relação aos processos de ensino e aprendizagem? Não seria o ato didático um
fenômeno de natureza complexa e transdisciplinar? Como se manifesta a mediação didática
sob o olhar da complexidade e da transdisciplinaridade? Inúmeras são as questões que
emergem e que exigem de nós um esforço intelectual e um cuidado para melhor explicação e
compreensão desse fenômeno.
Conceitualmente, a complexidade e a transdisciplinaridade vêm sendo trabalhadas a
partir de diferentes enfoques teórico-epistemológicos, o que requer, de imediato, um
posicionamento claro a respeito do enfoque adotado. Mas, antes é preciso esclarecer, dentre
as definições e compreensões existentes, qual o conceito de didática que melhor coaduna-se
com as explicações ontológicas e epistemológicas da complexidade e qual o conceito de
transdisciplinaridade mais compatível com as perspectivas teóricas professadas. É possível
compreender a didática como expressão de uma fenomenologia complexa e transdisciplinar?
Em relação às implicações educacionais, qual a vantagem de se tentar ampliar as
perspectivas teóricas e epistemológicas da didática? Que novos horizontes educacionais tais
perspectivas nos oferecem?

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Didática: definindo conceitos e explicitando compreensões


Desde Comenius, com sua “arte de ensinar tudo a todos”, inúmeras são as definições
propostas a respeito da palavra DIDÁTICA, o que de certa forma aumenta também a
sua imprecisão. Etimologicamente, esta palavra vem do grego: didaktiké, didátikos, do
verbo “didasko”, que significa instruir, ensinar, expor com clareza. Didaktikos é aquele
que está apto para a docência (Mallart, 2001). Para Escudero (1980), citado por Mallart
(2001), a didática está mais relacionada aos processos de ensino e de aprendizagem. Ele
a define como “a ciência que tem por objeto a organização e orientação de situações
de ensino-aprendizagem, de caráter instrutivo, tendente à formação do individuo em
estreita dependência de sua educação integral” (Mallart, 2001:30). Nota-se, nesta
definição, o caráter instrutivo ou formalizado da palavra didática.
Para Joan Mallart (2001:30), "é a ciência da educação que estuda e intervêm no
processo de ensino-aprendizagem visando conseguir a formação intelectual do
educando”. S. de la Torre, por sua vez, entende a didática “como uma disciplina
pedagógica reflexiva e prática que orienta a ação formativa (2012:29). Para ele, “a
Didática, como qualquer disciplina que aspira a um tipo de conhecimento específico,
busca compreender e, na medida do possível, explicar o processo formativo" (2012:29). 2
Para tanto, “a Didática elabora teorias explicativas de ensino, seja a partir de uma
reflexão filosófica ou a partir da prática” (Torre, 2012:29). É uma disciplina que
constrói o saber mediante a práxis, a ação de seus agentes, tanto dentro como fora da
sala de aula, tendo como seu objeto os processos de ensino-aprendizagem, os processos
de formação e como finalidade última - o desenvolvimento humano.
No Brasil, em especial, a partir de 1982, após a organização do Seminário na
PUC/SP, intitulado, “A Didática em questão”, e mais precisamente durante a década de
90 e o início deste século, os estudos e as discussões a respeito da didática vêm sendo
cada vez mais aquecidos por diversos olhares (Oliveira, 1992; Candau, 1993; Veiga,
1989; Libâneo, 2006, 2012) e que, de certa forma, convergem em relação ao conceito e
no que se refere à perspectiva teórica que fundamenta o tema. Entre outros aspectos,
para D´Ávila (2012), tal aquecimento vem sendo especialmente motivado pela
precariedade da formação pedagógica dos docentes universitários.
Em grande parte dos trabalhos desses autores, denota-se um enfoque pautado na
didática histórico-crítica, que procura superar os formalismos próprios dos enfoques
tradicionalistas, escolanovistas e tecnicista, bem como as dicotomias presentes nas
dualidades escola/sociedade, teoria/prática, forma/conteúdo, professor/aluno. Em geral,

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

a quase totalidade dos autores advoga por uma didática crítica, socialmente
comprometida, voltada para a compreensão e análise da realidade social na qual a escola
está incluída, pautada, portanto, na dialética, na visão do aluno como ser concreto,
historicamente situado, contextualizado, bem como na percepção do ensino como
difusor de conhecimento e oportunidade de reelaboração crítica, sendo o professor o
mediador entre alunos e conteúdos ministrados. É uma Didática preocupada em superar
aquele pedagogismo ingênuo que não leva em conta os determinantes sociais do
fenômeno educacional, em direção a uma proposta verdadeiramente comprometida com
a democratização da escola e a construção do saber a serviço dos interesses das classes
populares. A escola é, aqui, concebida como instância difusora de conteúdos ligados às
realidades sociais, imbuída em seu papel de colaboradora no processo de transformação
da sociedade.
Um dos mais dignos e renomados expoentes brasileiros do pensamento didático
atual, José Carlos Libâneo (2012) reconhece a Didática como sendo, simultaneamente,
uma ciência profissional do professor, uma disciplina pedagógica, bem como um campo
de investigação e de exercício profissional. Corroborando com os demais autores,
observa que sua especificidade epistemológica é o estudo da atividade de ensino- 3
aprendizagem em situações pedagógicas contextualizadas, a partir de um processo que
assegure a unidade entre o aprender e o ensinar, para que o aluno possa apropriar-se dos
produtos da cultura, da ciência e da arte. Desse modo, o ensino deve ser dirigido para a
apropriação de conhecimento e sua aplicação prática, visando o desenvolvimento das
capacidades intelectuais do aluno e de sua personalidade global. Para ele (2012), a
didática articularia a lógica dos saberes a ensinar (dimensão epistemológica) e a lógica
dos modos de aprender (dimensão psicopedagógica), por onde se requer sua
dependência das epistemologias das disciplinas e, portanto, da relação
conteúdos/metodologias. Ao mesmo tempo, a Didática interliga essas dimensões às
práticas socioculturais, formando, assim a base da organização social do ensino voltada
para o desenvolvimento humano.
Neste sentido, na tentativa de explicitar o quadro teórico revelador de sua
compreensão a respeito da Didática, Libâneo (2012) esclarece que os elementos
integrantes do triângulo didático (conteúdo/professor/aluno), constitutivo das condições
de ensino-aprendizagem, se articulam com os demais elementos socioculturais,
linguísticos, éticos, estéticos, comunicacionais e midiáticos na operacionalização do ato

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

didático. Observa também que é preciso evitar o reducionismo didático e a


fragmentação entre os conceitos de ensino/aprendizagem.
Resumidamente, podemos, então, afirmar que, como ciência descritivo-explicativa,
a didática possui uma dimensão teórica e outra prática, relacionada à elaboração de
propostas de ação, duas dimensões complementares e que não deveriam apresentar-se
separadamente. Como proposta de ação, a didática procura regular os processos de
ensino-aprendizagem, a partir de processos realistas, factíveis e adaptados a cada
situação e ao contexto sociocultural. É a partir dessas dimensões que pretendemos tecer
algumas considerações.

Alguns problemas cruciais da Didática


Fundamentado em estudo realizado em 2011, em cursos de formação de professores
de séries iniciais (pedagogia), Libâneo (2012) observa que, nas ementas dessa
disciplina, o foco é predominantemente no ensino em detrimento da aprendizagem,
prevalecendo assim, o trabalho com os elementos do plano de ensino. Descuida-se,
portanto, das relações entre o ensino e a aprendizagem, ou seja, da mediação da
aprendizagem em relação aos conteúdos. Para ele (2012), existiria uma tendência de se
deixar de lado a aprendizagem e os processos de desenvolvimento humano para serem
4
trabalhados por outras disciplinas, como a psicologia educacional, fragmentando, assim,
as relações ocorrentes entre o ensino e a aprendizagem.
Esse mesmo autor nos revela que, no pensamento didático atual, existe uma
tentativa de se priorizar a socialização do pensamento pedagógico em detrimento dos
processos de aprendizagem do aluno, ignorando-se, assim, a interdependência de tais
processos em relação ao contexto social e cultural do aluno. Outro aspecto destacado
por Libâneo (2012), a partir da análise de documentos oficiais de políticas curriculares,
é a presença muito frequente da centralidade em relação aos interesses e necessidades
do aluno em detrimento dos processos de construção do conhecimento e da
aprendizagem. Logicamente, sabemos que o atendimento às necessidades do aluno é
fundamental, mas esta não deve acontecer em prejuízo aos aspectos cognitivos.
Outro aspecto muito criticado por esse autor e considerado por ele um problema
didático crucial é a separação conteúdo/método da ciência versus metodologia do ensino
(Libâneo, 2012). Tal problema é muito frequente nos cursos de licenciatura para as
séries iniciais (pedagogia) e nos cursos das séries subsequentes. Os primeiros enfatizam
o metodológico sem referências aos conteúdos e o segundo dá maior ênfase aos

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

conteúdos em detrimento do metodológico. De certa forma, todos esses aspectos


criticados nos revelam a falta de clareza epistemológica por parte dos docentes, o que,
por sua vez, acarreta uma série de problemas metodológicos.
Assim, fica mais fácil perceber nessas explicações e conceitos que, em todas essas
definições e compreensões a respeito da Didática, vários elementos estruturantes se
repetem, tais como: ensino, aprendizagem, instrução, contexto sociocultural, mediação,
formação, o que, de certa forma, representam os elementos em torno dos quais a
didática, dependendo do enfoque epistemológico adotado, desenvolve suas práticas.
É oportuno também observar que em vários textos explicativos sobre estratégias
didáticas, bem como em algumas ementas de cursos de pedagogia obtidas na internet,
observamos que, por razões intrínsecas à própria natureza da palavra didática, a maioria
está sendo trabalhada destacando um determinado estruturante. Em grande parte desses
textos, encontramos um certo formalismo estrutural, um formalismo lógico, onde nem o
sujeito e nem os conteúdos ou o contexto social são os elementos estruturantes da ação
pedagógica, mas, sim, a organização lógica dos conteúdos a partir de princípios
universais e lógicos que regem o processo instrucional. É a Didática Tradicional
centrada nos conteúdos. Há textos que reforçam o formalismo subjetivista, centrado nas 5
atividades do aluno, pautado mais na sequência de competências e habilidades a serem
aprendidas, ao invés de priorizar os conteúdos e o contexto. É o caso da Didática
Escolanovista centrada nos métodos e técnicas e voltada para as atividades
desenvolvidas pelo sujeito aprendente.
Por outro lado, existem também aqueles que se preocupam mais com os conteúdos
ou com a racionalidade predominante no formalismo técnico objetivista, ou então,
aqueles textos didáticos de natureza tecnicista que privilegiam a técnica em detrimento
das demais dimensões, tendo como preocupação fundamental a eficiência e a eficácia
dos processos educacionais desenvolvidos.
Na contramão desses enfoques, predominantemente divorciados do social e do
cultural, encontra-se a Didática Histórico-Crítica, voltada para as questões sociais, com
ênfase na dimensão sociopolítica das práticas pedagógicas. Segundo Oliveira (1992),
esta perspectiva teórica procura superar o formalismo próprio dos outros enfoques e as
velhas dicotomias (escola/sociedade, teoria/prática; forma/conteúdo), oferecendo uma
didática mais comprometida com a realidade social. A partir dessa perspectiva teórica,
procura-se articular a didática pensada com a didática vivida, tendo como ponto de
partida os problemas reais do cotidiano do aluno.

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

Em um artigo relativamente recente, Saturnino de la Torre (2012), catedrático


emérito de Didática da Universidade de Barcelona, reconhece que a Didática do
presente continua presa ao paradigma positivista no que se refere à investigação e no
paradigma crítico e interpretativo no que se refere aos processos formativos, em geral e
à formação docente, em particular. Esse autor destaca que:
“o conhecimento científico de maior impacto (física, biologia, neurociências...) avança,
abrindo novos horizontes, mas a investigação pedagógica e didática não se desliga de
uma tradição fortemente influenciada pelo paradigma positivista e a metodologia
empírico-analítica” (2012:31). Para ele, é preciso promover a mudança de paradigma
educacional (...) em direção à era da consciência (2012:32).

Por sua vez, Batalloso (2010) observa que:


“necessitamos, pois, descontruir a didática com o fim, não de analisá-la, nem de
decompô-la em elementos, mas de observá-la em sua complexidade, chegando a
descobrir que talvez a melhor didática seja a que não se decreta, a que não está escrita,
a que não está dita, porque, em realidade, se algo nos pode oferecer, é a partir das
emergências reflexivas do presente de um processo vivo de comunicação humana, no
qual estão integrados e inseparavelmente ligados todos e cada um dos elementos do
processo de ensino-aprendizagem” (2010:67).

Assim, acreditamos que, hoje, um dos grandes desafios dos educadores é superar
todo e qualquer reducionismo presente nessas diferentes abordagens e caminhar em
direção a uma mudança paradigmática significativa nesta área. Neste sentido,
6
concordamos com Vera Candau (1993) que, há mais de 20 anos, já destacava a
necessidade de que o método didático possa ter diferentes estruturantes e que o mais
importante seja a capacidade de articular, de otimizar uma dinâmica operacional entre
eles e não excluindo qualquer que seja. Para Candau (1993), o grande desafio docente
estaria na superação do formalismo, do reducionismo e na necessária ênfase que deve
ser dada ao RELACIONAL, à articulação e ao diálogo entre esses elementos. Estaria
também na necessidade de se construir ecossistemas educacionais diversificados, de
multiplicar o seu lócus, de se assumir diferentes espaços, favorecendo a pluralidade de
tempos e linguagens, já que a educação não pode continuar sendo enquadrada por uma
lógica unidimensional ou aprisionada por determinado paradigma. Neste sentido, toda
rigidez, seja pedagógica, institucional, ou mesmo de natureza pessoal, precisa ser
seriamente questionada a partir de novos referenciais. Questionada a favor da
flexibilidade, da dinâmica processual, da necessidade enriquecedora das diferentes
leituras de um mesmo fenômeno, bem como a favor da pluralidade de formas de
expressão e possibilidades de construção do conhecimento.

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

Desta forma, novas perguntas surgem: Até que ponto é possível superar qualquer
visão dicotômica e dualista da Didática a partir de uma perspectiva teórica pautada na
complexidade das relações e na atitude transdisciplinar? Como trabalhar os diferentes
estruturantes didáticos e construir um ambiente de aprendizagem agradável, rico em
elementos significativos e desafiadores, capaz de resgatar a alegria e o prazer em
aprender? Essas preocupações e constatações levam-nos, ainda, a outras perguntas:
como criar ambientes de aprendizagem, digitais e/ou presenciais, que superem todo e
qualquer formalismo didático ou visão dicotômica a partir desses princípios? Como
criar ecossistemas educacionais, ou seja, diferentes espaços cognitivo/emocionais para a
construção de identidades e o desenvolvimento de práticas culturais e sociais, tendo a
complexidade como um dos fundamentos importantes? Será possível reinventar a escola
a partir de uma nova didática iluminada pela complexidade e pela transdisciplinaridade?
O que um ato didático, pautado nestas teorias, traz de diferente em relação ao
conhecimento e aos processos de ensino e de aprendizagem? Até que ponto a mediação
pedagógica iluminada pelos operadores cognitivos para um pensar complexo
potencializa tais processos?
7
Conceituando complexidade e transdisciplinaridade
A complexidade pode ser compreendida como um princípio regulador do pensamento
e da ação, capaz de articular relações, conexões, interações e que nos ajuda a organizar o
pensamento para melhor compreender a realidade, a ver os objetos relacionalmente,
inseridos em seus respectivos contextos e dependentes deles. Com ela, Morin nos ajuda a
tentar religar, no domínio do pensamento e da ação, o que já se encontra, direta ou
indiretamente, ligado na natureza, na organização do mundo material. Desta forma, a
complexidade não perde de vista a realidade dos fenômenos, não separa a subjetividade da
objetividade e não exclui o espírito humano, o sujeito, a cultura e a sociedade (Morin, 1996).
Fundamentado no Pensamento Complexo de Edgar Morin (1995) é possível perceber
que a chave da complexidade está em compreender a união da simplificação e da
complexidade, em entender os interjogos existentes entre análise e síntese, sujeito e objeto,
indivíduo e contexto, educador e educando, percebendo a complementaridade dos processos
envolvidos. Isto porque todo fenômeno complexo é constituído por um conjunto de objetos
inter-relacionados por interações lineares e não lineares.
A complexidade pauta-se também pela indeterminação, pela imprevisibilidade
entranhada no tecido do universo, pela diversidade constitutiva do real, pelas emergências

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00951
Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

presentes em todas as dimensões da vida, pela incerteza como expressão das múltiplas
potencialidades do real e como condição do existir humano. Incerteza, como condição
ontológica e epistemológica presente nas relações sujeito/meio, sujeito/objeto,
indivíduo/sociedade/natureza.
Em sua dimensão organizacional, a complexidade nos revela que a realidade é
multidimensional em sua natureza complexa, interdependente, mutável, entrelaçada e
nutrida pelos fluxos que acontecem no ambiente e a partir do que cada um faz. É contínua e
descontínua, indeterminada em sua dinâmica operacional que se manifesta dependendo do
contexto, das situações vividas e das circunstâncias criadas.
Em sua dimensão lógica, ou seja, em sua dialógica1, a complexidade nos oferece uma
outra perspectiva teórica que nos ajuda a avançar no processo de produção de conhecimento.
Assim, para se construir um conhecimento transdisciplinar, capaz de transcender as
fronteiras disciplinares, é preciso trabalhar a partir desta outra lógica, já não mais dualista,
no sentido de transcender o nível de realidade primordial para que o conhecimento possa
emergir em outro nível, superando contradições e ambivalências. Cada nível de realidade
requer um conjunto de leis para sua explicação. Essas leis se rompem na passagem de um
nível a outro. Se não rompessem, o conhecimento ficaria restrito a um mesmo nível de 8
realidade ou de materialidade do objeto.
Por outro lado, o conceito de níveis de realidade pode também ser aplicado aos
campos ou às áreas do conhecimento, segundo Nicolescu (2002). Desta forma, podemos
entender melhor a aplicação desses conceitos reconhecendo os diferentes níveis presentes no
ato didático, no caso os processos de ensino e aprendizagem. Nesta relação, o ensino pode
ser considerado como pertencente a um nível de realidade e a aprendizagem a outro. A
passagem de um a outro implica mudanças de conceitos, pressupostos, leis etc. O que
funciona na explicação de um, não funciona para o outro.
Assim, unindo os diferentes níveis de realidade está a complexidade, considerada uma
propriedade sistêmica organizacional de caráter universal e que nos permite melhor
compreender o acoplamento estrutural ocorrente entre os diferentes níveis. Tal acoplamento
energético, material ou informacional pode acontecer tanto em um mesmo nível de
materialidade, como entre diferentes níveis. É o que acontece nos processos de ensino
aprendizagem ao se constituírem como unidade processual de natureza complexa. Para
melhor compreensão desta dinâmica operacional, utilizamos, assim, a complexidade, a partir

1
Segundo Morin, a dialógica é “a unidade complexa entre duas lógicas, entidades ou instancias complementares,
concorrentes ou antagônicas que se nutrem, se completam, mas também se opõem e se combatem” (Morin, 1997).

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

dos operadores cognitivos propostos por Edgar Morin (1997). Qual é o papel de tais
operadores? Esses operadores nos ajudam a pensar de maneira complexa, a reorganizar o
pensamento, a partir de uma dinâmica dialógica, recursiva, autoeco-organizadora. Para
tanto, usamos a epistemologia da complexidade, a lógica da complexidade e nos apoiamos
nesses operadores cognitivos. Quais seriam eles? Dentre outros, destacamos os princípios
dialógico, recursivo, hologramático e autoeco-organizador. Assim, a complexidade, nutrida
por tais operadores, constitui um dos eixos da transdisciplinaridade, segundo Basarab
Nicolescu (2002).
Em relação à transdisciplinaridade, dependendo do enfoque trabalhado, ela é
compreendida de determinada maneira. A grande maioria dos artigos ou ensaios
acadêmicos trabalha a transdisciplinaridade em nível de conteúdos disciplinares, integrando-
os, a partir de diferentes dimensões da realidade ou domínios linguísticos e apresentando, ao
final, um texto inspirado nas diversas disciplinas, mas que não se enquadra em nenhuma
delas. Entretanto, apoiados em Nicolescu (2002), foi possível ampliar o conceito de
transdisciplinaridade a partir de um mecanismo operacional envolvendo a compreensão de
três dimensões - nível de realidade, nível de percepção e lógica do terceiro incluído. Tais
dimensões nos ajudam a compreender determinados fenômenos relacionados ao 9
conhecimento e à aprendizagem, bem como a ressignificar nossas práticas educacionais, a
ampliar as competências docentes, indo além da instrumentalização pedagógica necessária,
em direção ao desenvolvimento e evolução da consciência humana.
Mas, o que é a transdisciplinaridade? Como ela se apresenta em relação ao
conhecimento? Nicolescu, em todas as suas obras, artigos e ensaios reconhece a
transdisciplinaridade como metodologia e ratifica a definição, por ele, construída:
Transdisciplinaridade é aquilo que transcende as disciplinas, que está entre, através e além
das disciplinas (Nicolescu, 1999:33). Transcende o que aí está ao romper com a lógica
binária, tradicional, dualista, colonizadora do modo de pensar ocidental e que interpreta os
fenômenos baseada na dicotomia dos polos binários, reforçando, assim, a estrutura dual do
ensino. Mas, o que é que está além das disciplinas? Além das disciplinas, dos objetos do
conhecimento, dos níveis de realidade ou de materialidade do objeto, está o ser humano em
toda sua multidimensionalidade. Para esse autor, está o sujeito que se encontra além do
campo disciplinar. “A transcendência imanente a transdisciplinaridade é a transcendência
do sujeito” (Nicolescu, 2014: 56), com o que também concorda Patrick Paul (2009).
Para Nicolescu, esta definição implica o uso de uma epistemologia e de uma
metodologia estruturada a partir da articulação competente desses três pilares:

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

Complexidade, níveis de realidade e a lógica do terceiro incluído (Nicolescu, 2002).


Complexidade como fator constitutivo do real, encontra-se presente na organização das
estruturas complexas que caracterizam e articulam os diferentes níveis de realidade ou de
materialidade dos objetos. Entende-se por lógica ternária, ou lógica do terceiro termo
incluído, aquela que admite a possibilidade da inclusão de um terceiro dinamismo energético
ou informacional, fruto de outra modalidade de interação ou de explicação da realidade a
partir do A e do não A e que, na lógica clássica, tradicional, estão separados. Para o axioma
do terceiro incluído, existiria um terceiro termo T que é, ao mesmo tempo, A e não A.
Assim, a lógica ternária formalizaria a dinâmica operacional dos opostos, ao articular,
dialogicamente, os diferentes enfoques sobre determinado fenômeno. É o caso, por exemplo,
da onda e da partícula que se materializam como quantum, sendo este o terceiro dinamismo
energético possível a ser considerado. Em relação aos processos de ensino e aprendizagem,
não existiria sempre uma terceira, ou quarta, possibilidade de interação entre essas duas
polaridades, ou ainda outra estratégia didática ainda não explorada?
Isto significa que o conhecimento transdisciplinar é produto de uma tessitura
complexa, dialógica e autoeco-organizadora entre sujeito e objeto, que emerge em um outro
nível de materialidade diferente daquele que lhe deu origem. No ato didático, ele é tecido 10
nos interstícios, nas tramas fronteiriças dos processos de ensino e aprendizagem, na
intersubjetividade dialógica, nos meandros da pluralidade de percepções e significados
emergentes, a partir de uma dinâmica complexa presente nos fenômenos, eventos e
processos ocorrentes. Para tanto, não se opera aqui no nível da fragmentação da realidade,
privilegiando, por exemplo, apenas os conteúdos disciplinares, mas na unidade do que é
diverso, na unidade aberta do conhecimento. É, portanto, um conhecimento que é produto de
interações ocorrentes entre os níveis de realidade representativos do objeto e os níveis de
percepção do sujeito. É um conhecimento que estabelece a ponte entre o mundo exterior do
objeto e o mundo interior do sujeito e a constrói a partir de uma dinâmica que envolve a
articulação do que acontece nos níveis de realidade dos objetos e nos níveis de percepção
dos sujeitos.
A partir desta compreensão, todo conhecimento transdisciplinar vai além do horizonte
conhecido, implicando travessia de fronteiras, mestiçagem, criação permanente, aceitação do
diferente e renovação das formas aparentemente acabadas de conhecimento. Pela
transdisciplinaridade, articulamos os opostos e os transcendemos, criamos algo novo que
pode surgir a partir de um insight, de um instante de luz na consciência, de processos
intersubjetivos em sinergia, onde algo acontece envolvendo as diferentes dimensões

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

humanas. Ao trabalhar a partir da multidimensionalidade humana, o conhecimento de


natureza transdisciplinar reconhece a importância das emoções, dos sentimentos e afetos nos
processos de construção do conhecimento e na aprendizagem, bem como a voz da intuição
ao colocá-la em diálogo com a razão e com as emoções subjacentes.
Assim, todo conhecimento de natureza transdisciplinar enagido de uma mediação
didática procura explorar aquilo que circula entre os diferentes níveis disciplinares e de
percepção dos sujeitos, atento, inclusive, àquilo que se encontra na ordem implicada,
dobrada, escondida dentro de cada um de nós e que se materializa a partir do diálogo
intuição/razão, conhecimento noturno/diurno (Paul, 2009) etc.

A unidade complexa do ato didático


Como então trabalhar os elementos estruturantes do ato didático a partir da
complexidade e da transdisciplinaridade? Que outras compreensões este arcabouço
teórico difere de algumas explicações consolidadas na área? Iniciemos este diálogo a
partir da própria definição de Libâneo (2012:44) ao reconhecer que
“a didática tem como especificidade epistemológica o processo
instrucional (processo de ensino-aprendizagem) que orienta e
assegura a unidade entre o aprender e o ensinar na relação com o
11
saber, em situações contextualizadas, nas quais o aluno é orientado
para o desenvolvimento de sua autonomia, no sentido de apropriar-se
dos produtos da experiência humana na cultura e na ciência, visando
o desenvolvimento humano”.

Um dos aspectos a ser comentado está relacionado à palavra unidade e ao


reconhecimento das dinâmicas de ensino e aprendizagem como constituídas por um
único processo, uma unidade integradora. De acordo com o Dicionário Houaiss (2009),
unidade “é a qualidade ou estado de ser um ou único, a qualidade de ser uno, de não
poder ser dividido”. Será mesmo que os processos de ensino e de aprendizagem
constituem uma unidade? Mas, que tipo de unidade? É possível reconhecer a unidade
processual entre o ensino e a aprendizagem à margem da natureza biológica do sujeito
complexo? A palavra unidade nos revela a existência de algo inseparável em sua
dinâmica operacional. Mas, até que ponto é possível compreender a existência de uma
complexidade ou pluralidade afeita ao que é uno? Existiria uma causalidade linear e um
determinismo na dinâmica operacional integrada entre o ensinar e o aprender? Talvez
esteja aqui um dos pontos a serem explicitados.

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

Neste sentido, Vera Candau, em 1993, já nos avisava que talvez fosse preciso
entender que “a unidade é assegurada pela relação simultânea e recíproca de
autonomia e dependência de uma em relação à outra” (...). Nela, os dois polos se
contrapõem e se negam constituindo uma unidade (1993:54). Vasquez, citado também
por Candau (1993:56), já na década de 70, reconhecia e anunciava a complexidade
presente nas relações teoria e prática, observando que esta “não é direta e nem imediata,
fazendo-se através de um processo complexo, no qual algumas vezes se passa da
prática para a teoria e outras destas à prática”.
Pois bem, se partirmos do fato de que a aprendizagem é um processo de natureza
complexa, que traz consigo incertezas, emergências, diálogos com o imprevisto e o
inesperado, frutos de múltiplas interações emergentes, envolvendo os mais diferentes
componentes físico-químicos, biológicos, neurológicos, afetivos etc., presentes na
complexidade da organização humana, a partir do seu acoplamento estrutural com o
mundo sociocultural, então fica mais fácil perceber que não existe uma equivalência
automática entre os processos de ensino e de aprendizagem. Amparados nas teorias
biológicas de Maturana e Varela (1995; 1997), entendemos que são dois processos
complexos de naturezas distintas que, embora envolvam implicações mútuas, coerências
operacionais e processos em codeterminação, entretanto, no ato didático temos dois
protagonistas diferentes, com seus respectivos determinismos estruturais. Isto porque,
segundo Maturana (1997:71),
12
“o sistema vivente é estruturalmente determinado e como tal, nada
externo a ele pode especificar o que passa com ele; de fato para a
operação do sistema vivo não existe interior ou exterior e é impossível
fazer uma representação do que um observador vê como exterior a ele”.

Para Maturana, as interações instrutivas não existem. O organismo não reage a


estímulos ambientais por meio de uma cadeia linear de causa e efeito. Qualquer ação
física ou mental envolve interações entre o indivíduo e o meio ambiente e este somente
seleciona as mudanças estruturais do organismo, mas não as especifica. Segundo
Maturana e Varela (1995), o que acontece externamente influencia, mas, não determina
a direção da mudança estrutural que o organismo realizará em seu domínio
organizacional e existencial.
Isto indica que nem sempre um bom ensino produz uma aprendizagem
equivalente, demonstrando-nos que não existe uma correspondência direta, biunívoca,
entre uma boa didática e um bom resultado discente. Biologicamente falando, não existe
esta aparente obviedade, ou seja, que um bom ensino produza uma aprendizagem
equivalente. Isto porque não podemos predizer, com certeza, o que vai se passar nas
estruturas cognitivas de um sistema vivo. Assim, o fato de, no ato didático, o docente

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

selecionar e utilizar diversos procedimentos, métodos ou estratégias visando a


aprendizagem do aluno, nem sempre o planejamento didático se materializa como o
esperado. Mallart (2001:40) concorda com esta observação ao afirmar que nem sempre
é possivel assegurar que o grau de efetividade do ensino seja a causa da aprendizagem,
com o qual concordamos.
Retomando o questionamento anterior sobre a palavra unidade, acreditamos que
a complexidade fenomenológica exige de nossa parte que acrescentemos à palavra
unidade, no que se refere ao ensino e à aprendizagem, sua dinâmica operacional de
natureza complexa, resgatando–se, assim, a unidade complexa das relações e o caráter
multidimensional do sujeito e da realidade educativa. Desta forma, reconhecemos que a
aprendizagem é uma atividade humana extremamente complexa, nas quais as dimensões
cognitivas, psicomotoras, psicossociais e culturais se mesclam em uma dinâmica
processual nutrida por uma realidade histórica e sociocultural, que alimenta os demais
elementos estruturantes do processo. Entendemos que os processos de ensino-
aprendizagem constituem não um mesmo e único processo, mas uma unidade multipla
complexa, a partir de interações ocorrentes e processos emergentes. Neste sentido,
concordamos com Edgar Morin ao observar que “há não apenas diversidade no uno, 13
mas também relatividade no uno, relacionalidade, alteridade, incertezas,
ambiguidades, dualidades, cisões, complementaridade, antagonimos” (2005:183).
Assim, para melhor compreensão das relações pedagógicas que se materializam
no ato didático, é importante ajustar alguns pressupostos das teorias construtivista e
interacionista às novas teorias biológicas que envolvem a autoeco-organização do vivo,
bem como às recentes descobertas da neurociência, para que possamos melhor
compreender a biopsicosociogênese do conhecimento humano (Moraes, 2008).

Por uma Didática Transdisciplinar iluminada pela complexidade fenomenológica


Como passar de uma Didática tradicional, positivista, para uma Didática
transdisciplinar iluminada por uma epistemologia complexa? O que ela traz de diferente
em relação aos processos de ensino e aprendizagem? Vários são os aspectos a serem
repensados na mediação do ato didático construído a partir da perspectiva teórica da
complexidade e da transdisciplinaridade. Comentemos, pois, alguns deles.

Primeiramente, essa passagem requer a complexificação do pensamento


pedagógico, todavia aprisionado em suas gaiolas epistemológicas e disciplinares, nas

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Didática e Prática de Ensino: diálogos sobre a Escola, a Formação de Professores e a Sociedade

rotinas pedagógicas e didáticas que necessitam ser desconstruidas, pois sua insistente
permanência continua dificultando a materialização da responsabilidade social da
educação e o alcance de sua missão transcendental voltada para o desenvolvimento
humano. A complexificação do pensamento pedagógico, a partir do uso de outra lógica,
exige que trabalhemos, simultaneamente, tanto a vertente do ensino como a da
aprendizagem, a partir de uma ontologia complexa que melhor explique a complexidade
da condição humana, inserida numa realidade biopsicofísica de natureza
multidimensional, constituida por diferentes níveis de materialidade que coexistem em
sua dinâmica operacional.
Isto porque não podemos continuar fragmentando a realidade, o ser, o conhecer
e o aprender e, consequentemente, os processos de mediação didática. A fragmentação
de tais processos tem provocado dor e sofrimento no aluno, comprometido seu processo
de desenvolvimento integral e dificultado seu acoplamento estrutural ao contexto
sociocultural em que vive.

Uma educação que reconheça a complexidade da condição humana é aquela que


trabalha para além dos conteúdos disciplinares desprovidos de conhecimento
psicológico, sociopolitico, cultural e espiritual e vai ao reencontro do sujeito, já não
14
mais esquecido pela ciência pedagógica ou abandonado em seus questionamentos,
curiosidades, motivações e interesses.
Desta forma, a transdisciplinaridade, amparada numa ontologia complexa,
resgata a subjetividade humana tecida na articulação do individual com o sociocultural,
não mais se referindo apenas aos aspectos psicológicos e nem à subjetividade
individual, compreensão predominante no senso comum. Isto porque, a partir deste
arcabouço teórico, entendemos que as subjetividades individuais e coletivas
(intersubjetividade) constituem-se mutuamente, como configurações de sentidos e de
significados que vão sendo construídas mediante múltiplos elementos, processos e
condições, onde a relevância de uma não pode ser compreendida fora de suas relações
com a outra. Isto nos leva a ponderar que, no ato didático, a dimensão subjetiva se
refere tanto à subjetividade do aluno como também à do professor e dos demais agentes
do processo educacional.
A complexificação do ato didático requer que superemos o reducionismo, a
fragmentação, o determinismo, a causalidade linear e o formalismo técnico e didático, e
repensemos os métodos empregados a partir de uma dinâmica operacional de natureza

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complexa envolvendo os diferentes estruturantes. Com isto, entendemos que, na


estruturação do método didático, é preciso articular, com competência e sabedoria, tanto
os conteúdos específicos de cada área do conhecimento, as necessidades e os interesses
dos alunos, quanto às demandas do contexto sociocultural. Articular, criticamente,
conteúdos, estratégias, sujeitos e contextos, teoria e prática docente, superando todo e
qualquer reducionismo e visão dicotômica dos processos de ensino e de aprendizagem.
De certo modo, era o que Vera Candau, há mais de 20 anos, nos sinalizava em seu livro
Rumo a uma Nova Didática, publicado em 1993.
Articular todos esses elementos requer atenção especial às interações e inter-
relações emergentes entre todos os estruturantes do ato didático, sabendo, de antemão,
que toda e qualquer ação, seja ela docente ou discente, é sempre uma ação ecologizada
(Morin, 2000; 1997), fruto de interretroações de natureza complexa que fazem com que
a ação empreendida, ao entrar no jogo das interações ocorrentes, escape do controle de
seu autor. É o que muitas vezes acontece numa sala de aula, seja ela presencial ou
virtual. Apesar de um planejamento meticuloso, detalhado e da intencionalidade
docente, algo acaba interferindo e escapando do controle, provocando bifurcações de
rota e mudanças no percurso planejado, a partir de processos autoeco-organizadores 15
emergentes envolvendo todos os elementos.
A compreensão e o reconhecimento de tais fenômenos, ou seja, da existência de
processos autoeco-organizadores emergentes e transcendentes, de bifurcações e
instabilidades processuais, de trajetórias divergentes, a partir dos quais novas formas de
ordem e de estruturas podem surgir, é algo muito importante, pois coloca em questão
teorias cientificamente equivocadas, mas que ainda ocupam espaços importantes no
cotidiano escolar. Sabemos que qualquer ação humana, de um modo ou de outro,
repercute, energética, material ou informacionalmente, nos demais elementos
constitutivos da rede, provocando reações e emergências não previstas.
Neste sentido, concordamos com Vera Candau (1993), sobre a importância de se
criar espaços educacionais como ecossistemas educacionais diversificados, como
cenários vivos promotores de condições para que se materialize uma verdadeira rede de
aprendizagem integrada de natureza transdisciplinar.
Uma educação que trabalhe a multidimensionalidade da condição humana
certamente deverá também reconhecer e privilegiar a multirreferencialidade, já que
todo processo educativo está sujeito às diferentes interpretações, à pluralidade de
enfoques e olhares, pelo simples fato de ser um campo de confluência de várias

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ciências. A ação educacional afeta e é afetada por relações que acontecem envolvendo
diferentes compreensões pertinentes aos diferentes níveis de realidade, ou seja, relações
que integram o meio físico, cultural, social, politico e econômico, dentre outros. Assim,
o ato didático e o currículo precisam ser trabalhados a partir de uma epistemologia
pluralista que privilegie múltiplos olhares e compreensões, atenta, portanto, à
multirreferencialidade, já que tais processos não são alimentados apenas por conteúdos
disciplinares, mas também por processos inter e transdisciplinares, por conteúdos,
saberes e informações provenientes de nossas relações com tudo aquilo que nos rodeia e
que refletem as condições e os mecanismos culturais e sociohistóricos envolvidos. Isto
requer, no ato didático, atenção especial às pluralidades de miradas e interpretações
acrescidas da necessidade de expressá-las mediante o uso de linguagens plurais.
Consequentemente, uma didática transdisciplinar, nutrida pela lógica da
complexidade, implica o uso de métodos que trabalhem a inteireza humana a partir da
pluralidade de linguagens que permitam escutas e olhares mais sensíveis, assentados
em conhecimentos transversais e multirreferenciais que se revelam ao compartilhar
objetos, temas e projetos que favoreçam a compreensão da complexidade do real.
Por outro lado, o operar na sensibilidade e na racionalidade aberta também nos 16
adverte sobre a importância da didática trabalhar a partir do conceito de aprendizagem
integrada (Moraes e Torre, 2004), compreendida como fenômeno biológico que
envolve todas as dimensões do ser, em total integração com o fazer, o viver e o
conviver. Tal compreensão requer maior atenção à qualidade das emoções e dos
sentimentos presentes nos ambientes educativos, sabendo que elas interferem no clima
da sala de aula e, consequentemente, na construção das estruturas do pensamento a
partir de ações corporificadas e enraizadas no ambiente.
Outro aspecto fundamental é que a Didática transdisciplinar não nega o
conhecimento disciplinar ou interdisciplinar. Pelo contrário, ela se alimenta de todos
eles para que, no ato didático, possa ser trabalhado aquilo que está entre, através e além
das disciplinas, como observado por Nicolescu (2002). Para tanto, é preciso conhecer
profundamente o objeto do conhecimento, explorar o conhecimento disciplinar, para
que o objeto transdisciplinar se manifeste além das fronteiras disciplinares e se
materialize mediante ampliação dos níveis de percepção e de consciência do sujeito.
Assim, é preciso trabalhar a partir de uma racionalidade aberta, como desejada
por Edgar Morin. Uma racionalidade que acolha as intuições, as emergências, os
imprevistos e o inesperado, a partir do uso de novas ferramentas intelectuais que

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facilitem o pensar complexo sobre o ato didático. Daí a importância dos operadores
cognitivos, propostos por Edgar Morin (1995), pautados na dialógica, na auto-
organização, na recursividade processual, na reintegração do sujeito e na ecologia da
ação, entre outros aspectos importantes. São esses operadores que nos ajudam a
perceber relações e vínculos, a estabelecer ligações intersubjetivas, facilitando a
compreensão da dinâmica operacional que se manifesta nas estratégias propostas.
Uma Didática Transdisciplinar favorece o pensamento da religação, aquele
pensamento que religa os acontecimentos, processos e fenômenos, que reconhece as
contradições e dialoga com elas, que valoriza o conhecimento científico em diálogo
com a sabedoria humana e com as histórias de vida de cada ser aprendente, que
reconhece e respeita as diferentes tradições culturais, bem como a indissociabilidade da
unidade/diversidade e do indivíduo/contexto.
Uma didática transdisciplinar valoriza os processos de formação integral, ou
seja, processos em suas múltiplas dimensões – Autoformadora, heteroformadora e
ecoformadora. Processos de natureza tripolar e multicausal, como observado por Gaston
Pineau (2003), em que cada uma dessas dimensões pode prevalecer em determinados
momentos existenciais da vida do aprendiz, das condições e oportunidades recebidas, 17
mas todas elas integram o movimento transdisciplinar ato pedagógico. Em outras
palavras, este enfoque tripolar se manifesta a partir das relações do indivíduo consigo
mesmo, com o outro e com os instrumentos técnicos, pedagógicos e socioculturais
presentes no processo. De um modo geral, sabemos que o ato didático valoriza,
prioritariamente, as dimensões hétero e ecoformadoras, em detrimento da dimensão
autoformadora e dos processos de autoconhecimento que elas favorecem.
A complexidade e a transdisciplinaridade nos solicitam que prestemos maior
atenção aos processos de autoformação, ao autoconhecimento, às transformações
interiores do sujeito aprendente, àquilo que está além das disciplinas, nas palavras de
Nicolescu (2002). O cuidado e a atenção com esta dimensão formadora ajudam a revelar
a sensibilidade, o imaginário, a experiência mais íntima, a melhorar a autoestima e a
confiança em si. Isto é fundamental para o desenvolvimento humano e a evolução da
consciência.
A Didática Transdisciplinar também valoriza a formação experiencial, definida
por Gastón Pineau, apud Paul (2009), como uma formação por contato direto, mas
refletido, sobre as experiências vividas. Ela permite a apropriação pelo sujeito de suas

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vivências, de suas histórias de vida, bem como a gestação de diversas outras


aprendizagens resultantes das experiências percebidas (Paul, 2009).
Uma Didática Transdisciplinar trabalha o ensino e a aprendizagem a partir de
uma dinâmica sincrônica e diacrônica, autoeco-organizadora, articulando os diferentes
estruturantes da mediação pedagógica. Isto porque todo sistema autoeco-organizador,
assim como tudo que envolve o ser humano, implica conjunção, divergências, como
também convergências de dinâmicas sincrônicas e diacrônicas, mediante articulação
competente das dimensões presentes no ato didático.
Apoiados em Varela e seus colaboradores (1997), entendemos que a mediação
didática deveria ser trabalhada como “ação perceptivamente guiada”, isto é, como
ação que se desenvolve, a cada instante, a partir do que acontece nas estruturas sensório-
motores dos sujeitos implicados, a partir das percepções e capacidades que vão sendo
construídas, descontruídas e reconstruídas a cada instante, de acordo com o que flui no
ambiente de aprendizagem. Assim, no ato didático, os saberes docentes e discentes,
embora dependentes das estruturas internas dos sujeitos implicados, não estão separados
do que acontece no ambiente e do sabor de cada experiência vivida, pois os elementos
estruturantes estão acoplados em termos de energia, matéria e informação e interagem a 18
todo o momento.
Maturana e Varela (1995) nos ajudam a perceber que existiria, entre docente e
discente um processo de coderiva estrutural e natural, não sendo, portanto, um processo
de natureza fechada e pré-determinada. Muitas vezes, em nosso planejamento didático,
estabelecemos um roteiro de ações, ou atividades de aprendizagem, mediante o
estabelecimento de uma série de pré-requisitos a serem observados e que, na prática,
acabam se revelando inúteis. A mediação didática estaria, assim, muito mais próxima de
um fluir em uma rede de configurações autoeco-organizadoras, do que de um processo
de ajustes a uma realidade educacional previamente determinada ou fixa.

Concluindo provisoriamente
Todavia, há muito a ser explorado sobre esta temática. Apenas iniciamos o
diálogo com aqueles que desejam continuá-lo. Entretanto, um dos aspectos que mais
dificulta a renovação de nossas atividades didáticas é a insuficiência de bases teóricas
científicas presentes na formação dos profissionais de educação, associada à dificuldade
de repensar o nosso próprio pensar. Cada ano que passa, percebe-se que a formação
docente vai ficando mais empobrecida, criando, assim, uma série de impedimentos e

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dificuldades para se trabalhar as questões de natureza filosófica e epistemológica nas


práticas pedagógicas, no sentido de garantir que a complexidade e a
transdisciplinaridade se convertam en propostas concretas de ação e de intervenção no
sistema educativo. Isto dificulta qualquer pretensão de Reforma do Pensamento
Educacional, como propugnado por Edgar Morin e se transforma em uma grande
barreira para se repensar a mudança de paradigma educacional (Moraes, 1997).
Acreditamos que é preciso rever os marcos científicos da produção do
conhecimento escolar e do conhecimento acadêmico, bem como os fundamentos
pedagógicos das práticas docentes, no sentido de incorporar a complexidade, a
multicausalidade, a multirreferencialidade, as emergências, a interdisciplinaridade e a
transdisciplinaridade. Para tanto, será necessário enfrentar diferentes tipos de
resistências que permeiam o pensamento hegemômico de nossas instâncias
universitárias. Resistências a algumas das ideias-guia que fundamentam uma possível
reforma do pensamento educacional. Entre essas ideias e possíveis resistências a serem
superadas, destacamos:
 A dificuldade em distinguir a lógica que comanda o modo de organizar o
currículo e os processos de ensino e aprendizagem, no sentido de superar 19
a lógica clássica que favorece a dualidade estrutural do ensino e a
justaposição de disciplinas curriculares;
 A invisibilidade do paradigma da fragmentação no indivíduo
inconsciente de sua presença;
 A superação da dualidade estrutural que exige o repensar do próprio
pensar, a construção coletiva, a ressignificação de conceitos e a ecologia
crítica dos saberes;
 A dificuldade em perceber a correspondência entre erros ontológicos,
epistemológicos e metodológicos e o fio condutor que os une;
 O não reconhecimento da importância do conflito nos processos de
mediação pedagógica e do diálogo crítico, frutos de uma lógica ternária
que busca uma terceira possibilidade ainda não materializada;
 A dificuldade em perceber a importância dos conhecimentos
interdisciplinar e transdisciplinar nos processos de mediação pedagógica
e suas implicações para o desenvolvimento humano;
 O não reconhecimento da complementaridade presente na dialogia entre
dois polos aparentemente antagônicos e a dificuldade para compreender
que é na complexidade da organização aparentemente desorganizada que
também se dão processos cognitivo-emocionais significativos.

Referências

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