Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
1 INTRODUÇÃO
1
Mestranda em Cultura e Sociedade - Pós-Cultura – UFBA/CAPES. Licenciada em Língua Portuguesa e
Literaturas - UNEB, pesquisadora de Migração e Literaturas - Grupos de Estudos: Ecus – UFBA, do
Núcleo de Estudos Lexicais/ NEL-UNEB e do Grupo Cartografia dos Direitos Humanos dos Migrantes –
UNB. E-mail: dare.rose@gmail.com.
Recôncavo, o trabalho na estiva do porto, o boxe, a prostituição, o roubo e a atuação no
circo relatam a busca por um lugar de um homem negro.
A obra Amadiana, segundo Adonias Filho (1961), é uma vibrante transposição
literária de cenários e do povo que expressa, tanto na linguagem quanto no conteúdo da
nossa personalidade nacional, uma singular sensibilidade de representação da Bahia,
fato que popularizou a obra e as seus principais cenários. A perspectiva estética
imanente a significação objetiva da obra está imbricada aos fatores econômicos, sociais
e culturais da época, a visão de mundo que traduzem os fatos sociais (GOLDMAN:
1979) de uma escrita comprometida com o materialismo dialético, percepção de
mundo na qual Amado nos apresenta, em Jubiabá, uma ressonância engajada da
perspectiva marxista de crítica ao processo capitalista de inserção dos trabalhadores nos
processos econômico de produção do capital.
A literatura de ênfase social, dos anos de 1930 e 1940, com o enfoque
ideológico afetou determinantemente a atividade artística amadiana. Engajada, sua obra
é marcada profundamente pela denúncia das mazelas nacionais e pela consciência
catastrófica do subdesenvolvimento. Rastreia os valores e os ideais da luta de cunho
internacional dos trabalhadores e oprimidos, acaba dando ação, voz aos sujeitos negros,
marginalizados ou não, uma contribuição expressiva para a cultura baiana e a
representação do Brasil diversificado, de nação multicultural. Ele agrega e lidera um
conjunto de artistas e intelectuais que solidificam a mística da Bahia mágica em uma
fase posterior de sua obra, Jubiabá foi essencial para a sua credibilidade e incursão pelo
universo afro-baiano, publicado em 1935, as novas discussões que levantou sobre a
identidade nacional corroborou para a eleição do autor em 1961 como imortal da
Academia Brasileira de Letras. Distintamente de José de Alencar, o patrono da cadeira
que ocupou, a 23, Amado insere o negro no imaginário de nosso nacionalismo.
Nelson Pereira dos Santos, cineasta que tem a sua obra baseada em adaptações
literárias, adaptou, dirigiu e produziu em 1983 Jubiabá, uma releitura focada na
percepção do diretor sobre a identidade de Baldo, de seus laços sociais, dos percalços
que a personagem enfrenta na reconstrução de seus laços parentais, na busca pela sua
cidadania. Quadros marcados por representações culturais de música, dança, capoeira,
Candomblé, Igreja Católica focados sob o lado agressivo do racismo – a violência
psicológica e física como controle dos novos meios de produção econômica, da luta pela
supremacia dos atores sociais, pela voz e espaço das manifestações socioculturais das
identidades das classes produtivas.
Considerando que a obra de Jorge Amado está baseada em três etapas,
refletimos sobre a primeira fase, uma etapa engajada na qual a temática político-social
coloca-nos as discussões da opressão à classe trabalhadora, as rupturas do capitalismo
contra as manifestações culturais dos negros em primeiro plano, uma nova
contextualização literária do cenário baiano. O romance Jubiabá que está inserido nesta
fase nos revela perante a tragédia do percurso do protagonista, sem um juízo de valor
maniqueísta, a beleza oportuna das representações simbólicas da comunidade afro-
brasileira, uma discussão atemporal e oportuna na contemporaneidade sobre as culturas
e identidades que emergem ao pertencimento da baianidade. Uma inserção simbólica
das culturas negras que amplia os paradigmas identitários da Bahia, um conceito
redesenhado que troca os valores até então proscritos, valoração que adquiri um
compartilhamento no imaginário nacional e internacional sobre a diversidade cultural do
Brasil. Entre os diálogos da cultura europeia com as culturas negras, tem um discurso
comprometido com as causas sociais na qual as línguas faladas pelos povos negros
pontuam a voz de novos atores sociais, efeitos que servem de inspiração para vários
autores africanos recorrentes na Lusofônia. O romance social brasileiro da década de 30
capitaneado por Jorge Amado exerce na construção destas literaturas nacionais
africanas uma relação interativa para a construção de suas identidades narrativas, a base
de estéticas de autenticidade para a construção de obras instrumentalizadas na
mobilização e crítica sociopolítica como vozes das reais culturas nacionais que
intertextualizam a literatura com o cinema pós-colonial. Em Angola Assis Júnior, Castro
Soromenho, Óscar Ribas, José Luandino Vieira, Pepetela e Agualusa usam as línguas
locais como contraponto para alinhar estes elementos na busca pelo nacionalismo
literário durante a revolução pela Independência. Na prosa de ficção o uso da língua
Crioula durante a modernidade literária em Cabo Verde é aliada a temática social de
autores como Baltazar Lopes, Manuel Ferreira, um continuísmo da temática nacionalista
do sujeito lírico da poética de Amilcar Cabral. Abdulai Sila que apresenta a literatura de
Guiné-Bissau para o mundo contaminado por essa nova percepção literária. Mia Couto,
em Moçambique, alia o simbólico com o mítico na reflexão do contexto social em sua
obra. Por toda África portuguesa floresceu a pista da nova construção ficcional
germinada em Jubiabá, ecos que também ecoaram na literatura africana francófona.
2 CINEMA E LITERATURA
3 CULTURA E IDENTIDADE
O elenco conta com alguns dos grandes ícones da dramaturgia brasileira: Grande
Otelo, Ruth de Souza, Zezé Mota, atores negros que ficaram invisíveis na divulgação
da ficha técnica, uma concepção do plano de mídia da película que foca um público
interessado em uma trágica estória de amor em um local paradisíaco, o que dilui a
representação do herói da trama protagonizado por Grande Otelo. Na capa da primeira
edição do livro o Pai Jubiabá esta em primeiro plano de uma foto que ao fundo tem dois
meninos negros e o Pelourinho no Centro Histórico de Salvador, sínteses visuais
coerentes com o discurso narrativo de baianidade da trama literária, já no cartaz e flyer
da propaganda do filme temos duas versões: dois meninos em primeiro plano em um
fundo com uma natureza não marcada e outra com uma foto metaforizando uma peneira
de jogo circulada pela conta de Sàngó com Baldo adolescente realizando um brinde
com Lindinalva adulta ao centro.
Nos anos iniciais de sua carreira, 1935, Amado publica um romance em que um
negro é o primeiro grande protagonista, algo extremamente significativo à época, pelo
ineditismo do enfoque das questões étnicas e de classe no Brasil. O viés da luta política
e social da étnica negra num Brasil eugenista, que tenta firmar-se em uma sociedade
europeizada é o dilema do contingente negro. Excluído após a “libertação”; alijado das
forças produtivas respeitáveis e da distribuição geográfica de uma cidade que tentava
marginalizá-los para a configuração moderna. Antônio Balduíno, nascido no morro do
Capa-Negro, em Salvador, é o protagonista do romance Jubiabá. O anti-herói em sua
trajetória pela sua identidade pessoal e coletiva é marcado no ABC principalmente pelas
ações de quando vivia nas ruas, ainda criança, cometendo pequenos delitos, agregado na
casa de um comendador, malandro, boxeador, trabalhador nas plantações de fumo,
artista de circo e estivador. O filme faz uma trajetória cronologicamente linear, sobre a
vida do protagonista Baldo e coloca o Pai Jubiabá como alguém que alimenta-se
culturalmente da literatura escrita eurocêntrica. Apagando os acervos da literatura oral
africana e afro-brasileira, esquecendo os mecanismos de produção de saberes que
alimentam as comunidades negras, as constantes imagens de Pai Jubiabá lendo são um
paradoxo com a temática recorrente na obra literária, a representação de um pai de santo
que muito lê fica deslocada quando o que o legitima enquanto autoridade religiosa e
civil não são os conhecimentos que provêm do letramento pedagógico. O livro enfatiza
a busca pela afirmação identitária e auto-estima através de capítulos que narram a busca
de Baldo pelo seu lugar.
A vitória de Baldo na luta de box sobre o europeu, narrada no primeiro capítulo,
desvela que os sentimentos do protagonista seriam narrados sem máscaras durante a
trama. O mito do Lobsomem e a explicação da origem do nome da comunidade Capa-
Negro (AMADO: p.23) ilustram a importância da literatura oral na construção e
manutenção da memória coletiva. A rendeira branca e os estivadores que moravam no
Morro reiteram a condição de compartilhamento da exclusão social que o proletários
sofreram, a discussão de classe sobrepõe-se a do racismo: “Negro ainda é escravo e
branco também – atalhou um homem magro que trabalhava no cais. – Todo pobre é
ainda escravo. Escravidão ainda não acabou. Os negros, os mulatos, os brancos
baixaram a cabeça” (AMADO: p.24) quando o romance fala dos meios de produção de
capital. A persistência de baldo em não aceitar o lugar social destinado ao negro, às
restrições quanto à afetividade, religião, cultura o colocam associando a etnia branca
como objeto de desejo e ódio, elemento restritivo e acessível à transposição de sua
realidade. Ao mesmo tempo em que ambiciona uma mulher branca ele não é aceito
pelos brancos enquanto um ser humano em condições de igualdade, a todo o momento o
racismo tenta lembrá-lo que ele tem que seguir a trilha dos outros meninos do Morro.
Considerando, pela significação semiótica, a estrutura narrativa do filme gera
uma escala de conquistas e ilusões coladas ao discurso na qual a relação entre o
procedimento sintático do foco narrativo e aos efeitos produzidos pela imanência
fatorial de organização narrativo-discursivo-textual, quanto à variação sociocultural e
histórica nos apresentam paixões complexas, modalidades que se organizam em uma
configuração patêmica e desenvolvem percursos com uma variação tensiva. (BARROS,
2005, p. 95). Os pontos de tensões do filme representam basicamente à busca da
sobrevivência, a saída do Morro, a saída da casa do comendador, a vida na rua; a vida
de boxer, no canavial, no circo, na estiva, momentos nos quais a proteção de Sàngó é
representada pelo colar ritual que recebe de Pai Jubiabá quando sai do Morro. Um
percurso no qual as paixões complexas relegam um estado de anseio, decepção,
confiança, segurança decorrente do querer ser de Baldo a não ter rancor o de alma cita
o rancor que faz pressupor a presença de um estado de espera e de confiança, um estado
de decepção, um estado de falta ou de insegurança e aflição, um estado de malevolência
e, no fim, culminando com o rancor.
O mito da continuidade; a vida como um eixo que alimenta e circula a vida,
metáforas de espaço - rodas de samba, de candomblé, Box. Mostram a mítica africana
que a vitória não esta agregada à temporalidade, mas sim a circularidade ou retorno da
nossa harmonia com o cosmos. É um contraponto dialético aos anseios de coisificação
da modernização que aporta em Salvador.
Ao substituir os valores estigmatizados por uma forma de vida
qualitativamente consequente, a consciência transformada do anti-herói Balduíno,
enfim, encontra um caminho. Das coisas que o negro Balduíno gostava não contava o
conformismo. Desde a infância, Balduíno não aceitava o legado aos negros pobres,
procurou ser um trabalhador assalariado, apagou a herança escrava do final do século
XIX; foi morar nas ruas, viver de esmolas, sacralizar Jubiabá, líder espiritual. A
musicalidade esta no cotidiano, o ABC são livretos de histórias heróicas, as epopeias
urbanas. Balduíno traça sua saga para converter-se de anti-herói em herói. Como boxeur
vence os lutadores locais e o campeão do Rio de Janeiro mas problemas sentimentais
quebram a sua invencibilidade, Balduíno fica extremamente triste e resolve sair da
cidade de Salvador e se fixar no interior do estado. Frustrado passeia pelos portos do
Recôncavo, aprecia a voz da mulher de seu companheiro e conta com a terna companhia
de seu antigo amigo, o Gordo, lá Baldo reconhece outra forma de escravidão nas
lavouras de fumo. Enquanto os grandes industriais e agricultores, donos das plantações
e das fazendas de fumo consumiam champanhes caros, andavam em carros luxuosos e
moravam em mansões, os trabalhadores viviam com um salário de indigno ao menos
para prover a comida em casa.
Os conflitos étnicos atualizam a historia nacional, o negro tenta recuperar a
verdade histórica que possa consolidá-lo com dignidade no contexto individual e
coletivo em nossa nacionalidade, A História recontada de Zumbi dos Palmares tem um
objetivo ideológico, são mecanismos de interposição para compreender o passado de
opressão e investir na construção de um futuro com base num saber estruturado em
pressupostos políticos inovadores, já que a tradição reavaliada alimenta o imaginário de
desconstrução da leitura racista que contamina as produções culturais. Que alimenta o
fôlego para transpor as adversidades, a tentativa de somente ser como somos e não ter
que assumir na essência os valores capitalistas: resistir as alegorias da modernidade.
É preciso, então, ultrapassar a mentalidade servil e alcançar uma consciência
esclarecida do sistema social vigente. Como saldo final, a trajetória ascendente do
protagonista culmina com a aquisição da consciência de classe, identificada na união de
todos os trabalhadores em prol de uma sociedade mais justa. O negro Balduíno articula
triunfantemente a formação de uma consciência social. Encontra no materialismo
histórico o fundamento ideológico para a sua práxis política, por meio de uma adesão
franca à causa do espoliado e coloca, segundo Paulo Sérgio Rouanet (1990) a memória
e a experiência como elementos preservadores de suas raízes e identidade.
Seu percurso, consagrado com a vitória total do movimento grevista,
demonstra os caminhos e os descaminhos de uma consciência social à deriva, em busca
de alternativa, que finalmente encontra a sua rota. Os objetos símbolos e papéis-
símbolos, segundo Nicolau Sevcenko (2003) era destinado aos agraciados, os
respaldados por papéis ou títulos, que possuíam uma existência superior para a graça de
mandar não estava acessível ao universo negro. Daí o seu alicerce representativo, de
um escopo entre existencial e histórico, foi concretizado por meio da greve vitoriosa. A
significação da forma preliminar, a transformação e a união de esforços de todos os
espoliados em favor de outro modelo social já vislumbrado utopicamente.
Amado argumenta que “negro ainda é escravo e branco também – atalhou um
homem magro que trabalhava no cais – todo pobre é ainda escravo. Escravidão não se
acabou” (p.46) para igualar a luta de classes a étnica, equívoco que a esquerda brasileira
usou, tal ferozmente quanto a direita, para apagar e diluir os avanços da luta étnica na
modernidade. Para aqueles teóricos que acreditam que as identidades modernas estão
entrando em colapso, o argumento se desenvolve da seguinte forma um tipo diferente de
mudança estrutural está transformando as sociedades modernas, está fragmentando as
paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade que no
passado nos tinham fornecido sólidas localizações como indivíduos sociais. (HALL,
2001). “Balduíno disse à dos Reis: - Agora não sou mais malandro....sou jogador de
boxe.... vou ser campeão....Depois vou para o Rio, para a América do Norte”
(AMADO:p.115). Transformações que tentam a mudança das nossas identidades
pessoais, abalando a ideia que temos de nós próprios como sujeitos integrados.
O "hibridismo" e o sincretismo — a fusão entre diferentes tradições culturais —
são uma poderosa fonte criativa, produzindo novas formas de cultura, mais apropriadas
à modernidade tardia que às velhas e contestadas identidades do passado. (HALL,
2003). Outras, entretanto, argumentam que o hibridismo, com a indeterminação, a
"dupla consciência" e o relativismo que implica, também tem seus custos e perigos.
De acordo com essas "metanarrativas" da modernidade, os apegos irracionais ao
local e ao particular, à tradição e às raízes, aos mitos nacionais e às "comunidades
imaginadas", seriam gradualmente substituídos por identidades mais racionais e
universalistas. Crioulização, mestiçagem, fusão são definições que ainda não respondem
ao complexo imbricamento da reinvindicações da identidade ética como o
pertencimento nacional. Salvador continua na ponta destas exemplificações, quando
falamos de Brasil.
Jubiabá é um retrato da sociedade brasileira que esta frente aos antagonismos da
modernidade: “não estou dizendo máquina não vale nada. O cavalo fogoso nunca
encrencou. Vocês já viram um cavalo encrencar?..(AMADO: p.223) desvela um
caldeirão de significados. Enfoca as relações raciais a partir da distinção de olhares de
duas experiências sócio-culturais distintas. A obra prima pelo ineditismo do
protagonismo dos anti heróis negros, retrata o mundo africano e afro—brasileiro em
seus cenários e marcas linguísticas. Antecede a imagem literária de Zumbi dos
Palmares como herói nacional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
AMADO, Jorge. Jubiabá. 18. ed. São Paulo. Livraria Martins, 1969.
BARROS, Diana luz Pessoa de. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática, 2005.
BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar. Trad. Carlos F. Móises et
all, São Paulo: Cia das Letras, 1986.
COELHO, Teixeira. A cultura e seu contrário. São Paulo: Ed. Iluminuras Ltda. 2008.
CANCLINI, Néstor. Culturas Híbridas: estratégia para entrar e sair da
modernidade. Trad. Heloísa P. Cintrão ET all. 4. ed. São Paulo: Ed.USP, 2008.
FILHO, ADONIAS. Jorge Amado 30 anos de literatura. BNB, MINC, Rio de Janeiro,
1961..