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SEXUALIDADE DESVIANTE DE MARIA: UM CASO DE PERVERSÃO

FEMININA
Joice Cordeiro Dos Santos1, Giseli Monteiro Gagliotto2

Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) E-mail: giseligagliotto@ig.com.br

RESUMO: O presente estudo de caso visa explicar os desvios sexuais de Maria como dimensão de seu
psiquismo. Os atendimentos realizados totalizaram quarenta sessões, norteadas pelos princípios éticos da
psicologia e conduzidas através da técnica de psicoterapia de orientação psicanalítica. Para embasar tal
análise, apresenta-se a concepção psicanalítica sobre o desenvolvimento psicossexual, a partir de Freud,
acerca da perversão presente em sua obra como também, outros autores psicanalíticos contemporâneos.
Aborda-se o desenvolvimento da estrutura de personalidade perversa na visão do autor Jean Bergeret.
Desenvolve-se conceitos como: complexo de Castração, complexo de Édipo e pulsão sexual para esclarecer
os desvios sexuais da paciente. Maria revela ter desejos sexuais sadomasoquistas; diz que o sexo tem de ser
sujo e nada bonito; sua pulsão sexual não está submissa à primazia genital, mas sim às formas parciais de
obter prazer. Observou-se uma relação de simbiose da mãe para com a paciente, com exclusão do pai,
aspectos estes que levaram a pulsão sexual de Maria a fixar-se nas fases pré genitais do desenvolvimento
psicossexual. Conclui-se, que os desvios sexuais da paciente representam uma fixação na fase anal sádica,
resultando numa inibição do seu desenvolvimento psicossexual, deixando uma marca do infantilismo no seu
psiquismo.

Palavras-chave: Sexualidade, Desenvolvimento Psicossexual, Perversão, Psicanálise.

1 INTRODUÇÃO

Nos Três Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade, Freud compara a perversão a uma parada
no desenvolvimento da pulsão sexual. Para ele, a disposição à perversão é como a disposição geral,
original, da pulsão sexual, a qual só se torna normal devido a modificações orgânicas e a inibições
psíquicas sucedidas ao logo de seu desenvolvimento. Portanto, cada desvio da vida sexual, nos
parece desde o momento em que se fixou, como resultado de uma inibição do desenvolvimento,
como uma marca do infantilismo. Assim, a pulsão sexual se decompõe, na infância, em pulsões
parciais, que encontram sua fonte numa zona erógena determinada, as quais funcionam de uma
maneira anárquica e auto-erótica até a puberdade (CHASSEGUET-SMIRGEL, 1991).

1
Psicóloga Clínica. Membro do LABGEDUS-Laboratório e Grupo de Pesquisa Educação e Sexualidade-UNIOESTE-
Francisco Beltrão-PR. Psicóloga do GAPAC- Grupo de Atendimento Psicológico aos Acadêmicos- UNIOESTE-
Francisco Beltrão-PR. E-mail: joicepsicoterapeuta@gmail.com
2
Pedagoga, Psicóloga e Doutora em Educação pela Faculdade de Educação da Unicamp – SP. Professora Adjunta Nível
C do Departamento de Pedagogia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE – Campus de Francisco
Beltrão – PR. Pesquisadora e Líder do LABGEDUS- Laboratório e Grupo de Pesquisa Educação e Sexualidade
UNIOESTE-Francisco Beltrão-PR. Coordenadora do GAPAC- Grupo de Atendimento Psicológico aos Acadêmicos-
UNIOESTE- Francisco Beltrão-PR. E-mail: giseligagliotto@ig.com.br

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Freud (2002) descreve as organizações pré-genitais da libido, as pulsões parciais se
integrando sob a primazia de zona erógenas sucessivas (oral, anal, fálica). E somente na puberdade,
depois de ter passado pelo período de latência, que a pulsão sexual se organizará sob a primazia
genital. Quando esta primazia for alcançada, as pulsões parciais conhecerão os seguintes destinos:
serão utilizadas no prazer preliminar, serão recalcadas, sublimadas ou entrarão na formação do
caráter. Existe perversão, quando as pulsões parciais não atingem o estágio onde se subordinam à
primazia genital. Sendo assim, o adulto perverso continua nas suas satisfações aparentemente
anacrônicas que, pode-se dizer banalmente, não são mais para a sua idade.
Esse trabalho refere-se a um caso clínico de perversão feminina. O objetivo está em explicar
os desvios sexuais da paciente como dimensão de seu psiquismo. Maria, sexo feminino, solteira, 22
anos de idade procurou por ajuda psicológica com o intuito de solucionar os sintomas de crises de
ansiedade, ataques de pânico e raiva. Contudo no decorrer do processo psicoterápico, sintomas
perversos foram surgindo como exibicionismo, voyeurismo, o gosto por fetiche, desejos sexuais
sadomasoquistas com uso de fezes, urina e sangue de menstruação. Falava que quanto mais sujo
fosse o sexo, mais prazerosa era a relação; insistia em afirmar que se tivesse algo de errado nisso,
não gostaria de tratar, pois isso lhe proporcionava prazer.
Diante deste quadro, seria adequado tratar esses sintomas como algo abomináveis, que
deveriam ser reprimidos e punidos, dispensando a paciente do tratamento ou levar em consideração
a sua organização psíquica e o seu legitimo direito de expressão? Dispensá-la do tratamento,
implicaria na destituição da atitude de analista em benefício de seus sistemas de valores, suas
preferências sexuais, opiniões políticas e convicções teóricas. Como analista, coube unicamente o
fascínio diante da observação de como a relação da paciente com seus objetos se estendia ao
conjunto de sua vida psíquica, de suas atitudes morais, religiosas, éticas, estéticas, ideológicas, até
mesmo de sua concepção de mundo.
Nesse sentido, Chasseguet-Smirgel (1991) acrescenta que a terapia não é o fim derradeiro da
atividade do psicanalista. Ela constitui-se como o melhor meio para ascender ao conhecimento dos
processos psíquicos humanos. Freud sempre insistiu nos laços que une a pesquisa e a terapia em
psicanálise; escreveu que o único objeto da psicanálise reside no estudo dos processos mentais dos
seres humanos e é somente nos seres humanos que eles podem ser estudados
Assim, esta experiência clínica, se justifica, pelo fato de possibilitar o vislumbre de um caso
clássico de perversão feminina, visto que na clínica psicanalítica, dificilmente o perverso procura
por atendimento, como foi o caso da paciente em questão. Desta forma, o processo psicoterápico

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proporcionou, através do uso da teoria e da técnica psicanalítica, que a estrutura de personalidade
perversa fosse revelada, compreendendo a partir desta, os comportamentos sexuais desviantes da
paciente.
Ademais, a psicoterapia, além de proporcionar à paciente o alivio dos seus sintomas, tornou-
se também um campo de pesquisa teórico clínico, através do qual pôde-se ampliar a visão acerca da
sexualidade, compreendendo Freud, quando diz que a sexualidade é aberrante por si só, ao romper o
vínculo entre a reprodução da espécie e o prazer sexual, como também seu postulado da sexualidade
infantil como constituinte do aparato psíquico.
Os atendimentos foram realizados semanalmente, com duração de aproximadamente
cinquenta minutos totalizando quarenta sessões, norteadas pelos princípios éticos da psicologia e
conduzidas através da técnica de psicoterapia de orientação psicanalítica. Na sequência, aborda-se o
desenvolvimento psicossexual e a perversão, a análise e a discussão do caso e para finalizar a
conclusão obtida do caso em questão.

2 O DESENVOLVIMENTO PSICOSSEXUAL E A PERVERSÃO

A sexualidade humana constitui-se o âmago da teoria psicanalítica. Freud ao investigar as


pacientes histéricas, descobriu que a grande maioria dos desejos e pensamentos reprimidos,
referiam-se a conflitos de ordem sexual, situados nos primeiros anos de vida do indivíduo, ou seja,
na infância estavam experiências traumáticas, reprimidas, que caracterizava os sintomas atuais das
pacientes. Constata que tais experiências da vida infantil, deixam marcas profundas na estruturação
da personalidade. Tais descobertas, levaram Freud a colocar, a sexualidade no centro da vida
psíquica, e a desenvolver um dos conceitos mais importantes da teoria da psicanalítica: a
sexualidade infantil; cujo suas afirmações tiveram profundas repercussões na sociedade da época
pela concepção vigente de infância “inocente”. Para a Psicanálise a sexualidade:

[...] não designa apenas as atividades e o prazer que dependem do funcionamento


do aparelho genital, mas toda uma série de excitações e de atividades presentes
desde a infância que proporcionam um prazer irredutível à satisfação de uma
necessidade fisiológica fundamental (respiração, fome, função de excreção, etc.), e
que se encontram a título de componentes na chamada forma normal do amor
sexual (LAPLANCHE e PONTALIS, 2000, p. 476).

Nos Três Ensaios Sobre a Teoria da Sexualidade, Freud escreveu que as necessidades
sexuais, são representadas pela pulsão sexual. Tomou como exemplo a pulsão de nutrição, que é a

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fome, para designar a pulsão sexual de libido. Essa pulsão sexual libidinal, existe desde o princípio
da vida, porém ela tem que percorrer um logo caminho até atingir seu objetivo final que é a união
sexual. Assim, Freud introduz dois termos, objeto sexual, que é a pessoa da qual parte a atração
sexual e o alvo sexual que é a ação à qual a pulsão é impelida. Ele afirma que há inúmeros desvios
em relação a ambos, objeto sexual e alvo sexual, cuja a relação desses com a normalidade exige
uma investigação detalhada (FREUD, 2002).
Ao falar dos desvios em relação ao alvo sexual, Freud (2002) expõe que é considerado como
alvo a união dos genitais no ato designado como coito, que leva à descarga da tensão sexual e à
extinção temporária da pulsão sexual. Contudo, ele enfatiza que até no ato sexual mais normal são
reconhecíveis indícios daquilo, que, se desenvolvido plenamente, levaria as aberrações descritas
como perversões. Citou as atividades preliminares, como o beijo, ligadas ao prazer que intensificam
a excitação que deve durar até que se alcance o alvo sexual definitivo. Estão aí pois, os aspectos que
possibilitam ligar as perversões à vida sexual normal. No entanto, as perversões são transgressões
anatômicas quanto a região do corpo destinadas a união sexual, ou ainda, demoras nas relações
intermediárias com o objeto sexual, as quais normalmente seriam percorridas com rapidez rumo ao
alvo sexual final.
Freud ao escrever acerca da sexualidade infantil, destaca a importância dos primeiros anos
de vida da criança para a origem de certos fenômenos importantes dependentes da vida sexual,
desde então, ele não deixou de trazer o fator infantil da sexualidade para o primeiro plano. Ele
destaca com grande ênfase, que a sexualidade nasce paralelamente a uma função vital, biológica; no
entanto, é uma atividade que se estende para além de uma necessidade vital, diferenciando-a. Nesse
sentido encontra-se a atividade de manar do bebê como gênese da sexualidade, Num primeiro
momento a sucção, compreendida como reflexo, biologicamente herdado, tem como objetivo saciar
a fome, contudo, vinculado a esse prazer de saciar a fome, encontra-se um prazer paralelo, ou seja,
o prazer sexual. Esse prazer se vincula à atividade de sucção e a transforma numa atividade sexual.
O prazer em si, nasce da excitação do contato da boca do bebê (sua erógena por excelência) com o
seio materno

Está claro, além disso, que o ato da criança que chucha é determinado pela busca
de um prazer já vivenciado e agora relembrado. No caso mais simples, portanto, a
satisfação é encontrada mediante a sucção rítmica de alguma parte da pele ou da
mucosa. É fácil adivinhar também em que ocasiões a criança teve as primeiras
experiências desse prazer que agora se esforça por renovar. A primeira e mais vital
das atividades da criança – mamar no seio materno (ou em seus substitutos) – há de
tê-la familiarizado com esse prazer. Diríamos que os lábios da criança

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comportaram-se como uma zona erógena, e a estimulação pelo fluxo cálido de leite
foi sem dúvida a origem da sensação prazerosa. A princípio, a satisfação da zona
erógena deve ter-se associado com a necessidade de alimento. A atividade sexual
apoia-se primeiramente numa das funções que servem à preservação da vida, e só
depois torna-se independente delas (FREUD, 2002: 59-60).

Laplanche e Pontalis (2001), definem a zona erógena como qualquer região do cutâneo-
mucoso, apta de se tornar sede de uma excitação do tipo sexual. De maneira mais especifica, certas
regiões são funcionalmente sedes dessas excitações: zona oral, anal, uretro-genital e mamilo.
Lembrando que para Freud, a palavra sexual não significa genital e o qualitativo de genital só se
aplica a certas manifestações da sexualidade, as mais tardias e complexas do desenvolvimento do
indivíduo. Mas o hedonismo da criança, a “busca de prazer” (significado da palavra sexual para
Freud), desperta externamente cedo (DOLTO, 1971).
A autora supracitada colabora ao afirmar que as pulsões sexuais libidinais, estão sujeitas a
repetição. O prazer obtido com a excitação ritimada de uma qualquer zona corporal deve ser
qualificado como sexual, mesmo quando não visa a união de dois gametas. Portanto, o princípio da
pulsão sexual que visa, na infância a excitação das zonas erógenas, não difere daquele, que mais
adiante, estará vinculado à vida genital do adulto. Assim, a sucção do recém-nascido (fora das
mamadas), sucede a sucção do polegar, da ponta do lápis, do cigarro, e o beijo, ato hedonista, ao
qual não se pode negar o qualitativo de erótico. Com efeito, o critério afetivo, constitui-se como o
melhor critério para o desenvolvimento humano, isto é, o comportamento do indivíduo em relação
aos seus objetos de amor.
Nesse sentido, Rappaport (1981) escreve que a libido é a energia afetiva original que sofrerá
progressivas organizações durante o desenvolvimento, cada uma delas suportadas por uma
organização biológica emergente no período. Uma fase de desenvolvimento psicossexual, se define
como a organização da libido em torno de uma área erógena, dando uma fantasia básica e uma
modalidade de relação objeto. A primeira etapa da organização da libido, recebe o nome de fase
oral (0 a 1 ano) a boca se constitui como a zona erógena que de maneira primaz experimenta a
libido oral e suas gratificações, como é no ato da amamentação. A finalidade da libido oral, além da
gratificação pulsional, também visa a incorporação, a qual está a serviço da identificação. É através
da boca que se dá a intermediação do mundo interno com o externo (ZIMERMAN, 1999).
Na fase anal (1 a 3 anos) o ânus passa a ser a zona erógena. O controle esfincteriano
representa um modelo de como se processa o controle motor geral. O valor da matéria fecal adquire
a significação de uma troca entre a criança e o mundo exterior. Na fase anal expulsiva a criança
pode proporcionar ao mesmo tempo um prazer autoerótico e de um presente para os pais, quando

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também pode representar uma manifestação sádico-anal. Na fase anal retentiva, a mucosa anal pode
ser prazerosamente estimulada tanto pela expulsão como para a retenção das fezes, surgem
sentimentos ambivalentes (ZIMERMAN, 1999).
Na fase fálica (3 a 6 anos), o prazer origina-se predominantemente pela excitação das
mucosas genitais. A tarefa básica consiste em organizar os modelos de relação entre o homem e a
mulher. Há uma curiosidade natural da criança em relação as diferenças dos sexos. A criança
imagina o que se passa no quarto fechado dos pais (cena primária) fica muito excitada e usa o
recurso da repressão. Neste período ocorre o Complexo de Édipo, definido como o conjunto de
desejos amorosos e hostis que a criança experimenta com relação aos seus pais. Considerado núcleo
central na estruturação da personalidade neurótica (ZIMERMAN, 1999).
Por volta dos seis anos de idade, a criança entra no período de latência; ocorre a repressão
da sexualidade infantil e se estrutura um reforço de aquisição do ego, ocasionando a sublimação das
pulsões, por meio de atividades normais (sociais, estudar, praticar esportes, etc.) para crianças dessa
idade, período que consolida a formação do caráter. Na sequência, com a puberdade e a
adolescência, ocorre a maturação fisiológica do aparelho sexual, trata-se de um período de
transformação, portanto de crise. Pode-se dizer, que além das transformações na anatomia e
fisiologia corporal, as transformações também são de natureza psicológica, muito especialmente o
da busca de uma identidade individual, grupal e social. Por fim, atingir a fase genital corresponde
alcançar o pleno desenvolvimento do adulto normal, em que as adaptações biológicas e psicológicas
foram realizadas e o indivíduo é capaz de amar num sentido genital amplo, de definir um vínculo
significativo e duradouro. O prazer oriundo de sua capacidade orgástica é o componente
fundamental de sua capacidade de amar (RAPPAPORT, 1981).
As etapas evolutivas do desenvolvimento psicossexual da criança não são estanques, elas
se transformam, superpõem e interagem permanentemente entre si. Os diferentes momentos
evolutivos deixam impressos no psiquismo aquilo que Freud denominou de pontos de fixação, que
ocorre devido a exagerada gratificação ou frustração de uma determinada “zona erógena”. Os afetos
primitivos sofrem sucessivas transformações psíquicas, que ficam presentes ou representados no
inconsciente, em direção aos quais qualquer sujeito pode fazer um movimento de regressão
(ZIMERMAN, 1999).
Para Freud (2002), a disposição à perversão é como a disposição geral, original, da pulsão
sexual, a qual só se torna normal devido a modificações orgânicas e a inibições psíquicas sucedidas
ao logo de seu desenvolvimento. Cada desvio da vida sexual, nos parece desde o momento em que

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se fixou, como resultado de uma inibição do desenvolvimento, como uma marca do infantilismo.
Como visto, é somente na puberdade, depois de ter passado pelo período de latência, que a pulsão
sexual se organizará sob a primazia genital. Quando esta primazia for alcançada, as pulsões parciais
conhecerão os seguintes destinos: serão utilizadas no prazer preliminar, serão recalcadas,
sublimadas ou entrarão na formação do caráter. Existe perversão, quando as pulsões parciais não
atingem o estágio onde se subordinam à primazia genital. Deste modo, o adulto perverso continua
nas suas satisfações aparentemente anacrônicas que, pode-se dizer banalmente, não são mais para a
sua idade.

4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DO CASO

Destaca-se que o manejo técnico na transferência foi o ponto chave para compreender o
dinamismo psíquico da paciente e a revelação da perversão. Por fenômeno transferencial Zimernan
(1999) conceitua como o conjunto de todas as formas pelas quais o paciente vivência com a pessoa
do analista, na experiência emocional da relação analítica, todas as representações que ele tem do
seu próprio self, as relações objetais que habitam o seu psiquismo, como também, os conteúdos que
estão organizados como fantasias inconscientes, com as respectivas distorções, de maneira a
permitir interpretações do analista, as quais possibilitem a integração do presente com o passado, o
imaginário com o real e o inconsciente com o consciente.
Sendo assim, a partir da 23ª sessão, Maria começa a trazer consigo um copo de café para
tomar durante o atendimento, repetindo o mesmo comportamento na sessão posterior. Na sessão
seguinte traz um copo de café e um X-tudo para comer durante o atendimento. Em momento algum
pediu licença à terapeuta para comer. Comportou-se como se tivesse liberdade para tal, anulando a
presença da terapeuta.
Quanto a esses fenômenos que acontecem no campo analítico Zimernan (1999) escreve que
em relação ao setting, o ataque ao enquadre se dá mais contra os lugares e papeis que
respectivamente, devem caber ao paciente e ao analista e que o paciente perverso procura subvertê-
los. Portanto, é útil que o analista se pergunte, qual é o papel que o paciente está querendo colocar
nele.
Assim, a terapeuta interpretou que a paciente estava transferindo a ela o papel da mãe que
nunca havia lhe frustrado. Posicionou-se então, colocando limites à paciente quanto às regras do
contrato terapêutico acordado, entre elas, no início do tratamento. Maria não havia faltado à
nenhuma sessão, no entanto após ser frustrada pela terapeuta quanto à possibilidade de não poder

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mais lanchar durante os atendimentos, faltou à sessão posterior e tentou perverter os horários das
sessões seguintes. Ao comparecer exigiu que a terapeuta dessas explicações quanto aos limites
anteriormente colocados a ela. Maria falou que não via problema algum em lanchar dentro do
consultório e se fosse possível gostaria de continuar com essa atitude, até porque se tinha feito isso,
fora a terapeuta que havia lhe dado liberdade para isso. Tais atitudes da paciente denotam uma
recusa em relação à castração, visto que transfere a responsabilidade de seus atos à terapeuta
culpabilizando-a. Ademais, mesmo após terem sido mantidas as regras quanto ao enquadre
terapêutico, Maria insistia em lanchar durante as sessões. Tal atitude demonstra um modo dual de
relação com o objeto, evidenciando a falta de elaboração do complexo de Édipo.
Nesse sentido, Millot (2001) destaca que o complexo de Édipo consiste na superação da
relação dual da criança com a sua mãe e no acesso à ordem simbólica, para tal requer-se a
existência de um terceiro na relação que introduza e garanta essa ordem. A função paterna está
incumbida de garantir esta ordem, visto que o pai constitui, para criança, a referência a uma lei que
vale para todos. Lei que se impõe à mesma na medida em que é reconhecida pela mãe. A não
introdução em uma ordem que ultrapassa e põe fim à relação dual entre o filho e a mãe, resulta em
uma relação dual abandonada ao capricho e à desmura.
Portanto, é imprescindível que a criança passe por esse processo de castração, visto que ao
nascer, se encontra numa relação de plenitude com a mãe (figura que corresponde aos cuidados
necessários e estabelece com a criança o vínculo primário). Para Freud, existe a necessidade de
construção e fortalecimento deste vínculo afetivo inicial para o bom desenvolvimento psicológico
da criança. No entanto, não tarda a advertir que essa relação de plenitude, na qual a criança é tudo
para a mãe e a mãe é tudo para ela deva ter um limite. É necessário que exista um terceiro elemento,
o pai que chame atenção da mãe para fora dessa situação harmônica e de completude. A
importância disso está em proporcionar à criança uma independência emocional que garante a
qualidade de suas relações sexuais e sociais futuras (GAGLIOTTO, et al 2012).
Lacan enfatiza a função paterna porque opera a castração que lança o sujeito no mundo
simbólico e na relação objetal. Entretanto, essa função passa, necessariamente, pela figura materna
que necessita aceitar a lei imposta pelo pai (tabu do incesto). A ruptura que a função paterna
executa nem sempre virá do pai real ou de outra figura masculina, mas de tudo o que separa o
desejo da mãe, liberando a criança como ser desejante, ou como sujeito psíquico. Qualquer
atividade que a mãe desempenhe com prazer que desfoque sua atenção da criança pode cumprir
uma função do pai (GAGLIOTTO, et al 2012).

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No caso de Maria, essa relação de plenitude se mantinha. Durante a sessão realizada com
seus pais, a mãe se mostrou simbiótica, narcisista, engrandecia a filha, usando-a como uma mera
extensão sua, impedindo o pai de entrar nesta relação. Toda vez que a terapeuta se dirigia ao pai, no
intuito de dar voz a ele sobre os comportamentos da filha, a mãe cortava-o, desfazendo suas
colocações. A mãe afirmava que mesmo quando Maria chegasse aos 50 anos de idade, iria
continuar tratando-a como se fosse aquele bebê indefeso de quando nasceu. Segundo Chasseguet-
Smirgel (1991) a sedução da mãe é um dos motivos que pode desencorajar o desenvolvimento da
criança, ao anular o seu desejo de tornar-se grande, provocando assim, um estaqueamento da libido
e sua paralisação em um momento do tempo.
Os aspectos como a gravidez não desejada, idade avançada, nascimento prematuro e sem
esperança de vida, bem como, a presença de um pai rígido e religioso, contribuíram para uma
relação simbiótica entre mãe e filha, com exclusão do pai. Fatores estes que podem ter impedido a
resolução do complexo de Édipo, levando a paciente a manter uma relação dual com seus objetos.
Tanto que a sensação vivenciada pela terapeuta no momento que cumpre a função do pai, colocando
Maria frente à castração é de estar diante de uma criança de três anos.
De acordo com Dolto (1971) castração significa, na linguagem corrente, destruição das
glândulas genitais, supressão das necessidades sexuais e do comportamento concomitante. No
entanto, para Freud, o termo sexual não alude, exclusivamente, às manifestações relacionadas com
o ato genital da procriação e sim, engloba tudo o que diz respeito à busca do prazer. Logo, castração
no sentido psicanalítico, significa frustrações das possibilidades de busca de prazer. Assim, o
manejo na transferência colocou a paciente frente à possibilidade de perder suas formas de obter
prazer, o que a levou a uma tentativa de provar que a castração não existe. Maria passou a sustentar
um discurso de que seus desejos sexuais são, para as pessoas ditas normais, um tanto quanto
estranhos. Disse não ter revelado à terapeuta, anteriormente, por medo de que esta achasse uma
razão científica que provasse que seus desejos sexuais eram errados. Enfatizava, em sua fala, que se
tivesse algo de errado na sua forma de vivenciar a sua sexualidade, não gostaria de tratá-lo em
terapia, pois para ela, o tratamento colocaria em risco as suas formas de sentir prazer. Expunha que
seu namorado, com o qual mantinha um relacionamento poligâmico, não lhe proporcionava todo o
prazer. Relatava sentir muito prazer quando haviam pessoas lhe observando ao fazer suas
necessidades fisiológicas; para ela não haveria necessidade de portas e chaves nos banheiros. Falava
não saber porque as pessoas têm tanto nojo do sangue da menstruação, sendo este tão inofensivo,
pois para ela era prazeroso tomar banho e ver este sangue escorrer por entre as suas pernas; usar o

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sangue para escrever nas paredes do banheiro. Revelava, ainda um desejo de ser admirada e, para
tal, exibia fotos sensuais suas em grupos de redes sociais.
Seguia dizendo que estava se relacionando, virtualmente, com uma pessoa, a qual tem lhe
proporcionado todo prazer, visto que ela tem feito propostas estranhas a essa pessoa, a qual aceita e
rebate com uma proposta mais estranha ainda. Maria contava que esse tipo de conversa deixava sua
libido em alta, lhe proporcionando todo o prazer. Dentre essas propostas estranhas, estava a compra
de lingerie para ser usada no dia do encontro programado por eles, tal qual um fetiche. Não tomar
banho uns quatro dias antes do encontro. Ser amarrada, enquanto essa pessoa a dominava fazendo
tudo o que não lhe agradava. Em seguida, trocavam de papéis. Fazia parte do acordo entre eles que
Maria ficaria de joelhos enquanto essa pessoa urinava sobre seu corpo, como forma de humilhação.
Em outra ocasião, relatou estar ela e mais alguns colegas numa roda de conversas, quando um
menino compartilha suas experiências sexuais ocorridas na noite anterior. Maria o interrompe para
dizer que também sentiu prazer com ele naquela manhã, no momento em que estava defecando.
Disse que enquanto seu cocô passava pelo orifício anal, pensou nele e teve orgasmo, uma vez que
seu cocô equivalia ao pênis do menino.
A partir destes relatos e outras situações transferenciais, vivenciadas no setting terapêutico,
observou-se que a pulsão sexual da paciente continuava sendo parcial, isto é; sua busca de prazer
não estava submetida à primazia genital e sim, às suas formas parciais, mais precisamente, ligada à
zona erógena anal, que mantinha Maria fixada na fase sádico anal do desenvolvimento
psicossexual. Nesse sentido, Chasseguet-Smirgel (1991) afirma que a abolição de todas as
diferenças de sexos e gerações é próprio da fase sádico anal. Portanto, de início a criança obtém
satisfação no próprio corpo e, por isso não enfrenta a situação de frustração que a instauração do
princípio da realidade cria. Mais adiante, quando surgirem os processos que consistem em encontrar
um objeto, haverá uma longa interrupção, em decorrência do período de latência, que retardará o
desenvolvimento da sexualidade até a puberdade. A autora emite a hipótese de que o futuro
perverso transpõe essa ausência de frustração do domínio do autoerotismo (em que a satisfação é
realmente possível) para o domínio objetal, mais precisamente, para a situação edipiana, na qual a
satisfação é ilusória. Esta ilusão é mantida, desprezando a verdade sexual, a de complementariedade
dos sexos dos pais, fato este que pôde ser observado quando a paciente equivale suas fezes ao pênis
do menino.
Para Freud, a aquisição do princípio da realidade, em matéria sexual, está vinculada de
modo implícito ao reconhecimento do coito genital, das prerrogativas paternas e da dimensão

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genital da sexualidade, inacessível à criança antes da puberdade. Assim, o processo de substituição
de uma satisfação auto erótica imediata ligada ao objeto sexual, graças à fantasia que é o meio
neurótico de evitar o adiamento, nos parece ser substituído, no perverso, pela regressão que
consegue conduzir ao domínio sádico-anal, processo que não apenas permite evitar o adiamento da
satisfação, como abolir a própria noção de adiamento, enquanto a dimensão genital da
psicossexualidade desaparece. Desta forma, a redução dos objetos mais singulares, num magma
indiferenciado (análogo ao bolo fecal), expressa a própria essência do sadismo. Tudo se passa como
se a equação pênis = filho = fezes fosse tomada ao pé da letra, reduzindo o pênis às fezes (pênis
genital ao pênis anal) e permitindo evitar o confronto com o medo da castração (CHASSEGUET-
SMIRGEL, 1991).
Desse modo, a paciente apresentou características de personalidade que se enquadram numa
organização limítrofe, direcionada para o ordenamento perverso. Ao falar de organização limítrofe,
Bergeret (1991) ensina que o ego superou sem frustração nem fixação, suficientemente, grandes no
momento em que as relações iniciais e precoces muito más com a mãe poderiam ter levado a uma
pré organização do tipo psicótica. O ego continua seu caminho sem empecilho rumo ao édipo que
subitamente, é antecipado. Por isso, essa situação relacional triangular e genital não pode ser
abordada em condição normal. O édipo antecipado é vivenciado como uma frustração intensa,
como um risco de perda do objeto, cujo o autor denominou de trauma psíquico precoce, o qual
desempenhará o papel de primeiro desorganizador da evolução do indivíduo. Tal bloqueio
evolutivo, da maturidade afetiva do ego, no momento em que ainda não está sexualmente
diferenciado, constitui o tronco comum dos estados limítrofes. Dele partem ordenamentos, quer em
direção à estrutura neurótica, quer rumo à estrutura psicótica, conduzindo a soluções muito mais
estáveis e duradouras.
Dentre esses encontra-se o ordenamento perverso que é resultante de um longo caminho
para o protogenital, sob o abrigo e a excitação parental, geralmente, materna, que leva aos poucos o
indivíduo a bancar o genital sem tê-lo. Nessa organização, a angústia depressiva encontra-se evitada
devido ao êxito de uma negação que incide apenas sobre uma parte muito focalizada do real, o sexo
da mulher. Esse objeto parcial não deve existir ao mesmo tempo que o objeto fálico, cuja falta
corresponde encontrar-se intensa e completamente superinvestido no registro narcisista.

5 CONCLUSÃO

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Conclui-se que os desvios sexuais da paciente representam uma fixação na fase anal sádica,
que resultam numa inibição do seu desenvolvimento psicossexual; que representa a marca do
infantilismo no seu psiquismo.
Assim sendo, sua organização psíquica funciona com base em um ideal de ego, narcisista,
maternal e fálico. Como ela não conseguia reparar, de maneira conveniente, seu narcisismo, nem
encontrar um objeto total e elaborar processos secundários de maneira eficaz, recorre a satisfações
bastante incompletas, com objetos parciais e zonas erógenas parciais. Pelos mesmos motivos não
deixa de obedecer aos impulsos, de forma imediata e sem amanhã, sendo regida pelos processos
primários. Maria idealiza a sexualidade pré-genital, as zonas erógenas, tais como elas,
primitivamente, lhe foram apresentadas, com os objetos parciais e, à mercê do recurso defensivo da
recusa (denegação). Apresenta uma compulsão a idealizar, com a pretensão de impor às outras
pessoas suas ilusões. O uso excessivo deste mecanismo de recusa prejudica o emprego de uma
repressão útil, o que afeta a elaboração edípica, o que resulta num borramento dos limites e das
limitações, o que, por sua vez, determina um não reconhecimento das diferenças relativas ao sexo,
gerações, capacidades, ocupações de lugares, hierarquia e obediência às leis.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS

BERGERET, J. Personalidade Normal e Patológica. 2ª Ed.: Porto Alegre, 1991.

CHASSEGUET-SMIRGEL, J. Ética e Estética da Perversão. Porto alegre: Arte Médica, 1991.

DOLTO, F. Psicanálise e Pediatria. 4ª Ed.: Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1971.

FREUD, S. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Tradução de Paulo Dias Corrêa. Rio de
Janeiro: Imago, 2002.

GAGLIOTTO, G. M.; BERTÉ, R.; LUZ, E. da; OLIVEIRA, G. C. de. Psicanálise e Educação ou
Psicanálise de Encontro à Educação? Considerações psicanalíticas sobre a sexualidade, a
afetividade e o desejo de aprender. Revista de Educação Educere et Educare, Cascavel- PR, v.7,
n°14, p.109-125, jul. /dez, 2012.

MILLOT, C. Freud Antipedagogo. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

RAPPAPORT, C. R. Psicologia do desenvolvimento. SÃO PAULO: E.P.U., 1981.

ZIMERMAN, D. E. Fundamentos Psicanalíticos: teoria, técnica e clínica. Porto Alegre: Artmed,


1999.

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