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Resenhas

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Transdisciplinaridade e fragmentação do conhecimento


Carlos Alberto Pereira Silva – UESB

NICOLESCU, Basarab. O manifesto da transdisciplinaridade. Tradução de Lúcia Pereira de Souza. São


Paulo: TRIOM, 1999. 153p.

O manifesto da transdisciplinaridade, escrito por da espécie humana, porque “na era da razão triun-
Basarab Nicolescu, completa 10 anos de existência fante o irracional é mais atuante que nunca” (p. 11).
e continua sendo uma obra de referência no que diz Coerentemente, ele imputa o potencial de destrui-
respeito aos malefícios produzidos pela fragmen- ção material, biológica e espiritual dos humanos ao
tação do conhecimento e as tragédias geradas pela triunfo de uma tecnociência que só tem obedecido à
“tecnociência”. lógica da eficácia pela eficácia. Entretanto, esperan-
Detentor de uma refinada sensibilidade frente çoso, como todo grande humanista, Nicolescu pro-
aos múltiplos desafios existentes na contemporanei- põe o enfrentamento da trágica autodestruição com
dade, o físico romeno Basarab Nicolescu, fundador a propagação de novos valores capazes de possibili-
e presidente do Centro Internacional de Pesquisas tarem a gestação do autonascimento da humanidade.
Transdisciplinares (CIRET), relaciona o surgimento Avaliando “a grandeza e a decadência do cien-
do termo transdisciplinaridade aos trabalhos dos in- tificismo” (p. 14), Nicolescu critica os postulados da
telectuais Jean Piaget, Edgar Morin e Eric Jantsch ciência moderna por estarem assentados na busca da
que, na segunda metade do século passado, aposta- separação do indivíduo da realidade observada. Es-
ram na possibilidade da transgressão das fronteiras ses postulados, traduzidos na existência de leis uni-
impostas pelas disciplinas acadêmicas. versais de caráter matemático, na descoberta das leis
Refletindo sobre a necessidade de urgentes pela experiência e na perfeita reprodução dos dados
mudanças epistemológicas e societais no mundo experimentais, segundo ele, precisam ser superados.
atual, por considerar que “amanhã poderá ser tarde Como também, precisam ser superadas, o que não
demais” (p. 10), o autor desse oportuno manifesto significa de maneira alguma a sua negação, as noções
avalia inicialmente o significado de duas importan- de continuidade, causalidade local, determinismo e
tes revoluções que aconteceram no século XX: a re- objetividade, fundamentos da prepotente ideologia
volução quântica e a revolução informática. Para ele, cientificista triunfante no século XIX.
a revolução quântica, infelizmente, ficou limitada a O manifesto da transdisciplinaridade, ao estabele-
uma elite de cientistas, enquanto que a revolução cer uma profunda crítica ao processo de fragmen-
informática, que deveria resultar na liberação do tação do conhecimento, sugere abordagens alicer-
tempo e na partilha do conhecimento, transformou- çadas na compreensão das múltiplas dimensões da
se num ícone do mundo mercantilizado. realidade. Assim, ao projetar uma nova concepção
Identificando as aceleradas transformações do mundo e da vida, a transdisciplinaridade procura
ocorridas na esfera do conhecimento científico, Ni- transgredir as falsas dualidades entre “sujeito/obje-
colescu reconhece a existência de uma situação pa- to, subjetividade/objetividade, matéria/consciência,
radoxal ao constatar a possibilidade de autodestruição natureza/divino, simplicidade/complexidade, redu-

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cionismo/holismo, diversidade/unidade”, com o re- advém da nociva separação entre o espaço exterior e
conhecimento da existência de complexas pluralida- espaço interior do ser humano. Esta triste realidade,
des no mundo da vida (p. 57). portanto, nos impõe a tarefa do cultivo da fraterni-
Em relação à natureza, O manifesto da transdis- dade como caminho de ajuda ao outro para que ele
ciplinaridade anuncia que a mesma foi tratada pelo possa encontrar o seu lugar no mundo.
pensamento mecanicista não como um organismo, Na sua radical crítica ao conceito de massa, lar-
mas como uma máquina que poderia ser desmon- gamente utilizado nas ciências humanas e sociais, o
tada e, ao mesmo tempo, controlada. A conseqüên- autor evidencia que esse conceito tende a negar a
cia lógica desta visão é a morte da natureza. Numa individualidade e a heterogeneidade dos seres hu-
perspectiva transdisciplinar, a natureza é vista como manos. Na sua exposição, ele afirma que a exaltação
um ente vivo e essa natureza viva é a matriz do au- desse conceito abstrato contribuiu para o triunfo das
tonascimento do homem. nefastas experiências do nazismo e do stalinismo.
O autor desse importante manifesto procura Criticando, também, a noção de indivíduo propa-
reiterar a idéia de que a evolução individual e a evo- gada pelo liberalismo, Nicolescu aponta que o indi-
lução social são condicionadas mutuamente, pois o víduo consumidor, esboçada pela sociedade liberal,
ser humano alimenta o ser da humanidade e o ser não é o equivalente a uma pessoa, ente maior que
da humanidade alimenta o ser do homem. Assim deveria estar no centro de qualquer sociedade dita
sendo, “uma evolução social é impensável sem a civilizada.
evolução individual” (p. 75). Ultrapassando a com- No balanço da relação entre ciência e cultu-
preensão proposta pela razão cartesiana, assentada ra há no manifesto a explicitação da existência de
numa objetividade racionalizadora, a perspectiva uma ruptura entre ambas, patrocinada pelo triun-
transdisciplinar propõe ainda um diálogo enrique- fo da tecnociência. Para o autor, a fragmentação
cedor entre ciência e imaginário visto que “o real é dos saberes foi tão intensa que até entre as ciências
uma dobra do imaginário e o imaginário é uma do- acontece uma distinção entre as ciências exatas e as
bra do real” (p. 73). ciências humanas. Como se a primeira não tivesse
Ao abordar o processo de informatização em relação com o humano e a segunda fosse totalmen-
curso, o livro destaca que o computador, não se tor- te marcada pela inexatidão. Além disso, a separação
nando um fim em si mesmo, pode promover uma entre cultura científica e cultura humanística gerou
liberação sem precedentes das pressões da vida coti- o mito da separação entre Ocidente e Oriente. Se-
diana, transformando-se numa positiva máquina de gundo ele, essa separação derivada da visão reducio-
liberação do tempo. Isto poderá ser possível com a nista da ciência moderna é uma separação artificial,
construção de uma nova convivência entre os huma- porque “em cada ser humano estão reunidos, po-
nos baseada na afetividade, pois “sem a afetividade, tencialmente, o Oriente da sabedoria e o Ocidente
a efetividade dos computadores se transforma num da ciência, o Oriente da afetividade e o Ocidente da
caminho seco, morto e perigoso” (p. 92). Não tendo efetividade” (p. 105).
um valor de mercado valor de mercado a afetivida- Conforme consta no manifesto, “rigor, abertura
de acaba ignorada, esquecida e desprezada, o que e tolerância” (p. 121) são importantes componentes
prolonga no desprezo do próprio ser humano, hoje, constitutivos da transdisciplinaridade. O rigor tra-
transformado em mais um objeto mercadológico. duz-se na constante busca da compreensão de todos
Crítico dos falseamentos empreendidos no os dados presentes em uma situação e na argumen-
mundo midiático, Nicolescu destaca que na atuali- tação baseada no conhecimento vivo interior e ex-
dade a máscara tem sido mais importante do que o teriormente. A abertura transdisciplinar comporta
rosto. Para ele, essa característica do viver moderno, a aceitação do imprevisível e do desconhecido. Essa

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abertura implica na recusa dos dogmas e dos siste- de dar conta da totalidade de tudo o que existe. Esse
mas fechados de pensamento e referencia-se no eter- desvio pode ser traduzido na seguinte sentença: “o
no questionamento e na procura de respostas aceitas ser humano pode se divertir saltando de um galho
como temporárias. A tolerância resulta na constata- do conhecimento para outro, mas não pode encon-
ção da existência de idéias e verdades contrárias aos trar nenhuma ponte ligando um modo de conheci-
princípios fundamentais da transdisplinaridade. mento a outro” (p. 115).
No âmbito da educação a contribuição das Outra possibilidade de desvio relaciona-se com
idéias contidas no Manifesto da transdisciplinaridade a busca de absorção da transdisciplinaridade por
é fundamental por potencializar os quatro pilares ideologias extremistas, de esquerda ou de direita,
do novo tipo de educação proposto pela UNES- que procuram preencher o vazio ideológico exis-
CO, através do Relatório Delors. Para Nicolescu, tente com a busca de novas roupagens para velhas
“Aprender a conhecer” significa, especialmente, es- propostas. Também se coloca como risco uma pos-
tabelecer pontes entre os diversos saberes para que o sível apropriação por parte de tendências irraciona-
conhecimento adquira importância na vida cotidia- lizas, expressas nos esoterismos baratos, crescentes
na. “Aprender a fazer” é, sobretudo, o aprendizado em nossas sociedades. Finalmente, há uma possibili-
da criatividade capaz de transpor os limites da espe- dade da perspectiva transdisciplinar transformar-se
cialização excessiva. “Aprender a conviver” deve sig- no seu contrário pela mercantilização praticada por
nificar o respeito pelas normas que regem as relações agentes sociais que perseguem uma nova legitimi-
entre os seres que compõem uma coletividade. Po- dade para os seus projetos de dominação.
rém, essas normas, antes de tudo, precisam ser com- Além de reconhecer a possibilidade de desvios,
preendidas, partilhadas e validadas pela experiência O manifesto da transdisciplinaridade possui, entre ou-
interior de cada ser. “Aprender a ser” é um contínuo tras tantas qualidades, a virtude maior de contribuir
aprendizado que se realiza na mútua disposição de para o alargamento da compreensão da multiface-
aprender e ensinar por parte de educadores e edu- tada realidade do tempo presente. Nessa complexa
candos. Sedimentando a união dos quatros pilares, realidade, estão colocadas duas grandes opções para
a ética, a estética, a sensibilidade e o cuidado com o todos nós: continuar a reprodução do atual padrão
corpo assumem singular importância na educação civilizatório, baseado na competição individualista,
transdisciplinar por descortinarem um novo tipo de na exclusão social e na destruição da natureza ou
inteligência capaz de contribuir para a religação en- descortinar uma nova vivência que seja capaz de ge-
tre razão e emoção porque “somente assim a socie- rar maior harmonia e menor agressividade entre os
dade do século XXI poderá conciliar efetividade e humanos, os outros seres vivos e a biosfera.
afetividade” (p. 138). Enfim, caso optemos pelo percurso das incertas
Inserida num contexto recortado por uma mul- e bifurcadas veredas que poderão nos conduzir ao
tidimensional crise planetária, a transdisciplinarida- possível autonascimento da humanidade, teremos a
de, no entanto, corre o risco de sofrer desvios em saudável companhia desse ousado manifesto, escrito
razão de possíveis apropriações dos seus postulados por um cientista que projeta a transdisciplinaridade
por parte de segmentos sociais não comprometidos não como o caminho mas como uma “voz onde res-
com a sua verdadeira perspectiva. Como salienta soam as potencialidades do ser” (p. 142).
Nicolescu, um primeiro desvio pode estar vinculado
à sua apropriação por parte do neo-cientificismo. O
neo-cientificismo já não nega mais o diálogo entre
a ciência e os outros campos do conhecimento mas
não renuncia a visão de que a ciência continua capaz

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