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da Mulher Privada
de Liberdade
Carmem Regina Delziovo
Caroline Schweitzer de Oliveira
Luciana Oliveira de Jesus
Elza Berger Salema Coelho
Florianópolis | SC
UFSC
2019
GOVERNO FEDERAL ASSESSORIA PEDAGÓGICA
Presidente da República Márcia Regina Luz
Ministro da Saúde
Diretora do Departamento de Gestão da Educação na Saúde (DEGES) AUTORIA DO MÓDULO
Coordenador Geral de Ações Estratégicas em Educação na Saúde Carmem Regina Delziovo
Caroline Schweitzer de Oliveira
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Luciana Oliveira de Jesus
Reitor: Ubaldo Cesar Balthazar Elza Berger Salema Coelho
Vice-Reitora: Alacoque Lorenzini Erdmann
Pró-Reitora de Pós-graduação: Cristiane Derani REVISÃO DE CONTEÚDO
Pró-Reitor de Pesquisa: Sebastião Roberto Soares Igor de Oliveira Claber Siqueira
Pró-Reitor de Extensão: Rogério Cid Bastos Francisco Job Neto
EQUIPE EXECUTIVA
Carolina Carvalho Bolsoni
Dalvan de Campos
Deise Warmling
Eurizon de Oliveira Neto
Gisélida Vieira
Maráh Silva Guzmann
Sheila Rubia Lindner
Atenção à Saúde
da Mulher Privada
de Liberdade
Florianópolis | SC
UFSC
2019
Catalogação elaborada na Fonte
CDU: 340
Bem-vindo ao módulo de Atenção à Saúde da Mulher Privada Deste modo, é de fundamental importância que se priorize o
de Liberdade! Convidamos você, profissional de saúde, a refletir pleno acesso dessas mulheres ao sistema público de saúde, de
sobre como suas ações podem contribuir para garantir o direito modo que seja garantida não só a atenção integral à saúde, mas
de acesso à atenção à saúde às mulheres que perderam tempo- uma assistência de qualidade, que respeite as questões de gê-
rariamente a liberdade de ir e vir. nero e as demais condições de vulnerabilidade em que se encon-
tram. Para que possam contribuir na ampliação do acesso das
A atenção integral à saúde das mulheres nesta condição exige o mulheres privadas de liberdade, os profissionais de saúde que
incremento de políticas públicas voltadas ao cuidado, tendo em atendem no sistema prisional precisam conhecer os direitos de-
vista que o confinamento propicia e agrava muitas doenças. las e os recursos existentes no Sistema Único de Saúde (SUS).
Ser mulher e estar privada de liberdade amplia a condição de Vamos juntos enfrentar este desafio!
vulnerabilidade, em especial às gestantes, às puérperas e aos
seus recém-nascidos. Esses momentos “delicados” do ciclo vital Carmem Regina Delziovo
podem ser afetados diante das estruturas inadequadas dos es- Caroline Schweitzer de Oliveira
tabelecimentos penais, da dificuldade de acesso aos serviços de Luciana Oliveira de Jesus
saúde e do afastamento quanto à rede de apoio. Elza Berger Salema Coelho
| 5
Objetivo do módulo
| 6
Unidade 1
Vulnerabilidades no
sistema prisional e atenção
à saúde da mulher
mulheres no sistema prisional A maior parte dos estabelecimentos penais do sistema carcerá-
rio no Brasil foi projetado para o publico masculino. Somente 7%
As desigualdades sociais, econômicas e culturais se revelam de destinam-se ao publico feminino e 16% são mistos, com celas
maneira diferenciada no processo de adoecer e morrer das po- femininas no estabelecimento masculino (BRASIL, 2017a).
pulações e de cada pessoa em particular. De acordo com os indi-
cadores de saúde, as populações expostas a condições precárias Essa realidade não está preconizada na legislação brasileira. Quan-
de vida estão mais vulneráveis e vivem menos. do se refere à custódia das mulheres nos estabelecimentos penais,
a Lei de Execução Penal, no artigo 82, § 1.º, diz que “a mulher e
Levando em consideração as históricas desigualdades de poder o maior de sessenta anos, separadamente, serão recolhidos em
entre homens e mulheres, existe um forte impacto nas condições estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal”.
| Figura 2 – Estimativa do número de estabelecimentos penais que abrigam tan- Devemos lembrar o estigma da delinquência que a passagem
to mulheres quanto homens. pela prisão confere, bem como o resultado ainda maior quanto
Fonte: adaptado de BRASIL (2017a) à precarização existencial das pessoas ao saírem dos estabele-
cimentos penais. Neste sentido, devem ser realizadas ações que
respeitem os direitos sociais de saúde, educação e trabalho, de
modo que sejam fortalecidas as potencialidades dessas mulhe-
Veja mais dados a respeito dos presídios brasileiros em: <http:// res, a fim de que contribuam para melhorar suas oportunidades
www.cnj.jus.br/inspecao_penal/mapa.php>. quando reconquistarem a liberdade.
7,5%
5% 6,3%
Deixamos aqui um questionamento para você profissional de
saúde: É possível desenvolver práticas terapêuticas em saúde
mental dentro do sistema prisional?
0%
Mulheres Homens
atenção integral à saúde da mulher nas, residentes em áreas urbanas e rurais, residentes em
locais de difícil acesso, em situação de risco, em situação
de prisão, de orientação homossexual, com deficiência,
Buscando atender à complexidade e às especificidades da saúde dentre outras).
das mulheres, a criação da Política de Atenção Integral à Saúde
da Mulher (PNAISM) é resultado das reivindicações dos movi- • Considerar que a atenção integral à saúde da mulher refe-
mentos de mulheres e dos grupos feministas. re-se ao conjunto de ações de promoção, proteção, assis-
tência e recuperação da saúde executadas nos diferentes
Essa política parte da percepção ampliada de ser mulher, de seu níveis de atenção à saúde.
contexto de vida e do momento em que apresenta determinada
demanda, assim como de sua singularidade e de suas condições • Basear as práticas em saúde nos princípios da humaniza-
como sujeito capaz e responsável por suas escolhas. Tal pers- ção, compreendidos como atitudes e comportamentos do
pectiva requer profissionais de saúde capazes de estabelecer profissional de saúde que contribuam para reforçar o cará-
relações com as mulheres de maneira singular, respeitando as ter da atenção à saúde como direito, que melhorem o grau
diferenças, seja por razões econômicas, culturais, religiosas, ra- de informação das mulheres em relação ao seu corpo e suas
ciais ou de diferentes orientações sexuais. condições de saúde, ampliando sua capacidade de fazer es-
colhas adequadas ao seu contexto e momento de vida.
Desta forma, as práticas de saúde deverão nortear-se pelos
princípios da humanização, compreendidos como atitudes e A ampliação da atenção à saúde das mulheres privadas de li-
comportamentos que contribuem para reforçar a atenção à saú- berdade, de acordo com os princípios e diretrizes do SUS, apon-
de como um direito, dando maior grau de informação em relação ta diferentes perspectivas de integralidade, representando um
ao corpo e às condições de saúde, a fim de ampliar a capacidade passo importante a ser dado pelo Estado e pela sociedade (SÁ
de fazer escolhas adequadas ao próprio contexto e momento de e SILVA, 2009).
vida (BRASIL, 2004).
Em 2014 a Secretaria de Política para as Mulheres, em conjun-
Essa política estabelece algumas diretrizes, como as listadas a to com o Ministério da Justiça, publicou a Política Nacional de
seguir. Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e
Egressas do Sistema Prisional (PNAMPE). Em consonância com a
• Atingir as mulheres em todos os ciclos de vida, resguarda- PNAISM, essa política tem o objetivo de reformular as práticas e
das as especificidades das diferentes faixas etárias e dos garantir os direitos das mulheres privadas de liberdade no Brasil.
• Atraso em procurar o serviço (não identificação Quanto à qualidade dos serviços oferecidos no Brasil, menos de
da necessidade de procura ao serviço). 50% dos nascimentos no país têm boas práticas durante o tra-
• Atraso em chegar ao serviço (dificuldade de balho de parto – segundo dados da pesquisa Nascer no Brasil,
acesso). publicada em 2014 pela Fundação Osvaldo Cruz após estudo que
• Atraso no início dos cuidados (falta de condições envolveu entrevistas com 23.894 brasileiras que tiveram seus
no serviço para diagnóstico e tratamento). partos hospitalares.
• exame rotineiro da placenta e das membranas ovulares. Entre mulheres privadas de liberdade, usando
razões de segurança, a indicação de cesárea é Rede de atenção à
Apesar de existir a orientação da OMS desde 1996, e apesar generalizada e sequer o tempo de observação saúde
das evidências científicas que apontam para a necessidade de hospitalar é obedecido. A rede de atenção à saúde
mudança no modelo de atenção obstétrica e neonatal, persistem está definida na Portaria de
práticas consideradas desnecessárias e até prejudiciais. Nascer Diante da situação em que se encontra a aten- Consolidação nº 3/GM/MS
de 2017, Capítulo I, como
no Brasil tem sido uma experiência com muitas intervenções ção a pré-natal, trabalho de parto e parto, o conjunto de ações e ser-
técnicas. O país tem sido destaque mundial pelo número alto de Ministério da Saúde publicou uma portaria nor- viços de saúde articulados
partos cirúrgicos. matizando a linha de cuidado voltada a esse em níveis de complexidade
crescente, com a finalidade
eixo temático. Essa linha de cuidado é preco-
de garantir a integralida-
nizada como rede de atenção à saúde obs- de da assistência à saúde
tétrica e neonatal, sendo conhecida como Rede (BRASIL, 2017b).
Cegonha.
Incisão na pele
e no útero
2.2.1 Rede Cegonha
Entre as iniciativas governamentais que merecem destaque
está, sem dúvidas, a Rede Cegonha. Concebida como política
pública de saúde para mulheres e crianças, prevê a atenção à
saúde no pré-natal, parto e puerpério, além de acompanhamen-
to pediátrico durante os primeiros 24 meses da criança. Hoje,
quase todos os municípios brasileiros aderiram à Rede Cegonha.
Útero
A Rede Cegonha, regulamentada no Brasil pela Portaria Portaria
| Figura 8 – Parto cirúrgico. de Consolidação nº 3/GM/MS de 2017, Anexo II, tem quatro
Fonte: adaptado de Wikimedia Commons/Blausen.com (2019) componentes: pré-natal, parto e nascimento, puerpério e aten-
Puerpério e atenção integral à A organização dessa rede de atenção parte do Região de saúde
Transporte sanitário
saúde da criança diagnóstico das necessidades da população da Conjunto de municípios
Regulação área de abrangência da região de saúde. organizado de acordo
com o Decreto 7.508/11,
Sistema logístico que reestrutura a confor-
Não existem dados fiáveis, mas se estima que,
midade dos territórios no
apesar de haver parto hospitalar, há maior pro- SUS, regulamentando a
porção de morte materna entre mulheres pri- Lei 8.080/1990. Por defi-
| Figura 9 – Componentes da Rede Cegonha. vadas de liberdade. Por isso, é fundamental nição, a região de saúde é
o espaço geográfico contí-
Fonte: do autor (2019) realizar um correto diagnóstico da situação da nuo constituído por agru-
atenção obstétrica prisional no Estado. pamentos de municípios
A exemplo do que ocorre com as equipes de atenção básica de limítrofes, delimitado com
base em identidades cultu-
um modo geral, competem às equipes de atenção básica prisio- A partir deste diagnóstico se propõe um plano
rais, econômicas e sociais e
nal os componentes pré-natal, puerpério e atenção integral à de ação que inclua os quatro componentes da de redes de comunicação e
saúde da criança. Nos outros componentes, apesar de não ser a Rede Cegonha no sistema prisional. Esse plano infraestrutura de transpor-
executora, a Atenção Básica Prisional precisa estar perfeitamen- deverá ser apresentado à instância gestora da tes compartilhados, com a
finalidade de integrar a or-
te vinculada e construindo junto, porque a população privada de região de saúde, a Comissão Intergestora Re-
ganização, o planejamento
liberdade também é população do território de referência para gional (CIR), que é composta pelos secretários e a execução de ações e
atenção hospitalar e especializada. municipais de saúde e pelos representantes da serviços de saúde.
Garantir os recursos humanos, físicos, materiais e Respeitar o direito do (a) parceiro (a) de ser cuidado
Iniciar o pré-natal na AtençãoàPrimária
técnicos necessários à Saúde antes
atenção pré-natal. (fazer consultas, exames e ter acesso a informações)
da 12.ª semana de gestação (captação precoce). antes, Garantir
durante oe acesso
depois àdaunidade de “pré-natal
gestação: referência especializada,
do (a)
caso seja
parceiro (a)”. necessário.
Receber a Declaração de Nascimento. Quanto à mulher, é importante saber que no final da gravidez e
semanas após o nascimento a maioria delas entra em um estado
Permanecer junto à mãe em alojamento conjunto. especial de sensibilidade exacerbada. A gravidez e o parto são
eventos estressantes para a mulher e atuam, muitas vezes, como
Contar com atenção integral à saúde no SUS, com acesso às ações e fatores desencadeantes de sofrimento mental (BRASIL, 2009).
aos serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde.
O diagnóstico de psicose e outros tipos de sofrimento mental na
Ser protegidos, enquanto estiverem no ambiente prisional, de
puérpera representa a possibilidade da realização de interven-
qualquer tipo de negligência, discriminação, exploração, violência,
ções multidisciplinares tão logo os sintomas sejam detectados.
crueldade e opressão, por ação ou omissão do Estado, da sociedade
Da mesma maneira, o diagnóstico precoce de sinais e sintomas
e da família.
de infecção puerperal e de mastite ou fissura nos mamilos é im-
portante para o início do tratamento.
| Figura 13 – Direitos das crianças recém-nascidas. Está preconizado pela Rede Cegonha, dentro da política de aten-
Fonte: adaptado pelo autor de (BRASIL, 1990). ção obstétrica e neonatal, que a equipe de saúde acompanhe a
mulher e o recém-nascido, especialmente na primeira semana
Ressaltamos que, na Atenção Básica, o acesso aos serviços de de pós-parto, procurando conhecer, em contato com a materni-
saúde nas ações de imunização e o acompanhamento do cres-
Portanto, é direito subjetivo de toda pessoa decidir sobre o nú- Viver plenamente a sexualidade, sem medo, vergonha, culpa nem
mero de filhos e os intervalos entre seus nascimentos, bem falsas crenças.
como ter acesso aos meios necessários para o exercício livre de
sua autonomia reprodutiva, sem sofrer discriminação, coerção, Viver a sexualidade independentemente de estado civil, idade ou
violência ou restrição de qualquer natureza (VENTURA, 2009). condição física.
A atenção em saúde sexual e em saúde reprodutiva é uma das Expressar livremente sua orientação sexual – heterossexualidade,
áreas de atuação prioritárias da Atenção Básica à saúde. Deve ser homossexualidade, bissexualidade.
ofertada observando-se como princípio o respeito aos direitos se-
Ter relação sexual independentemente da reprodução.
xuais e aos direitos reprodutivos.
Praticar sexo seguro para prevenção de gravidez e de doenças
sexualmente transmissíveis (DST) e de Aids.
Os direitos reprodutivos incluem o direito de as pessoas decidi-
rem, de modo livre e responsável, se querem ou não ter filhos, Contar com serviços de saúde que garantam privacidade, sigilo e um
quantos filhos desejam ter e em que momento de suas vidas, atendimento de qualidade, sem discriminação.
bem como o direito de acesso a informações, meios, métodos e
técnicas para ter ou não filhos e o direito de exercer a sexualida- Dispor de informação e educação sexual e reprodutiva.
de e a reprodução livre de discriminação, imposição e violência.
| Figura 14 – Direitos sexuais.
Fonte: do autor (2019)
III. fomento à participação das organizações da sociedade civil IX. fomento à identificação e ao monitoramento da condição
no controle social dessa política, bem como nos diversos de presas provisórias, com a implementação de medidas
planos, programas, projetos e atividades dela decorrentes; que priorizem seu atendimento jurídico e sua tramitação
processual;
IV. humanização das condições do cumprimento da pena,
garantindo o direito a saúde, educação, alimentação, tra- X. fomento ao desenvolvimento de ações que visem à assis-
balho e segurança, proteção à maternidade e à infância, tência às pré-egressas e egressas do sistema prisional, por
além de lazer, esportes, assistência jurídica, atendimento meio de divulgação e orientação ao acesso às políticas pú-
psicossocial e demais direitos humanos; blicas de proteção social, trabalho e renda (BRASIL, 2014).
V. fomento à adoção de normas e procedimentos adequados Essas diretrizes partem de uma noção ampliada de saúde pro-
às especificidades das mulheres no que tange a gênero, posta pelo SUS. Ressalta-se que, quando se trata de sistema
idade, etnia, cor ou raça, sexualidade, orientação sexual, prisional, as ações são desenvolvidas principalmente pela equi-
nacionalidade, escolaridade, maternidade, religiosidade, pe de atenção básica prisional. Além disso, são essencialmente
deficiências física e mental e outros aspectos relevantes; intersetoriais, visando à melhoria da vida das mulheres mesmo
diante das dificuldades enfrentadas pelo encarceramento.
Quanto à discriminação e ao acesso aos serviços de saúde, o Com relação às mulheres negras, a Política Nacional de Saúde
relatório publicado pela Rede Feminista de Saúde em 2006 in- Integral da População Negra reconhece o racismo, as desigual-
forma que, com relação às mulheres que procuram atendimento dades étnico-raciais e o racismo institucional como determinan-
de saúde, cerca de 40% não revelam sua orientação sexual. tes sociais das condições de saúde, com vistas à promoção da
Entre as mulheres que revelam, 28% referem maior rapidez do equidade em saúde. Tem como objetivo geral promover a saúde
O SUS tem o compromisso de contribuir para a implementação A violência é marca antes e ao longo do encarceramento. Se-
dessas políticas nesse âmbito, contribuindo para a diminuição gundo Soares e Igenfritz (2002), a trajetória de vida das presas
das iniquidades, abordando as necessidades e as vulnerabilida- se confunde com as histórias de violência.
des das mulheres. É preciso estar atento às particularidades de
gênero e orientação sexual, assim como de etnia, raça e cor das As autoras afirmam que existe uma relação entre a vitimização
mulheres, procurando proporcionar acesso à saúde de maneira e a entrada no sistema prisional. Mais de 95% das mulheres
integral, com equidade e qualidade (BRASIL, 2014b). que estão no sistema prisional sofreram violência na infância/
adolescência, no casamento ou nas mãos da polícia; 75% foram
vítimas em pelo menos duas dessas ocasiões; 35% foram víti-
mas nas três ocasiões.
No campo da saúde, as inequidades implicam desvantagens so-
ciais que afetam de maneira sistemática a saúde de determinados
Também a prática de violência institucional, realizada por agen-
grupos em situação de desvantagem em relação a outros. Portan-
tes do Estado contra as mulheres encarceradas, é frequente-
to, violam os direitos (SANTOS; BERMUDEZ, 2012).
mente relatada por organizações da sociedade civil. Imposições
de castigos e humilhações contra as mulheres encarceradas são
frequentes. A tortura psicológica é amplamente utilizada, por
meio da ameaça de violência e morte ou por constrangimento
3.4 Violência contra a mulher e o sexual, notadamente em unidades que têm população mista ou
Superlotação
Fatores Falta de
Fatores estruturais. estruturais higiene
| Figura 16 – Violência institucional. O desafio para nós, profissionais de saúde, é desenvolver estra-
Fonte: do autor (2019) tégias de atenção coletivas e participativas, visando ao enfren-
tamento das situações de violência em lugares que frequente-
Fatores estruturais, neste caso, seriam os dispostos na figura mente são insalubres e essencialmente violentos. Vale lembrar
adiante. que essa é uma ação intersetorial que pressupõe abordagens
individuais e coletivas, estimulando competências e habilidades
para a construção de espaços mais saudáveis.
transmissíveis e AIDS A terapia antirretroviral está indicada para toda gestante infec-
tada pelo HIV, independentemente de critérios clínicos e imuno-
De acordo com estimativa do Programa Conjunto das Nações lógicos, e não deverá ser suspensa após o parto, independente-
Unidas sobre HIV e Aids (UNAIDS), a prevalência da Aids entre mente do nível de LT-CD4+ no momento do início do tratamento
pessoas privadas de liberdade é mais alta que entre a população (BRASIL, 2018).
geral. As condições de confinamento, de assistência inadequada
e a falta de perspectivas são fatores que aumentam a vulnera-
bilidade dessas pessoas ao HIV/Aids e a outras doenças sexual-
mente transmissíveis.
HIV
Lembramos que estas, bem como a tuberculose, são importan- • Exames (laboratoriais, de
tes comorbidades. Elas têm uma evolução diferenciada nos in- Diagnóstico imagem e outros)
divíduos com HIV/Aids. Portanto, sua identificação precoce con- • Biópsia
tribui para a minimização de danos por acesso ao tratamento.
• Cirurgia
Tratamento • Quimioterapia
3.6 Câncer de colo uterino e câncer de • Radioterapia
mama
Cuidados • Controle dos sintomas e alívio
paliativos da dor; suporte espiritual;
O trabalho desenvolvido pelas equipes de Atenção Básica é fun- apoio ao cuidador
damental para a prevenção de doenças, o diagnóstico precoce e
o acompanhamento das mulheres. Não deve ser diferente para
as equipes de saúde nas prisões. Assim, entre as ações desen- | Figura 19 – Linha de cuidado no câncer.
volvidas na rotina dessas equipes, destacam-se aquelas rela- Fonte: BRASIL (2013)
cionadas ao controle dos cânceres do colo de útero e de mama.
A organização da linha de cuidado envolve intervenções na pro-
A Linha de Cuidado do Câncer tem a finalidade de assegurar à moção da saúde, na prevenção, no tratamento, na reabilitação e
mulher o acesso humanizado e integral às ações e aos serviços nos cuidados paliativos, englobando diferentes pontos de aten-
qualificados, estabelecendo o “percurso assistencial” com o ob- ção à saúde, com o objetivo de alcançar bons resultados clínicos.
jetivo de organizar o fluxo dos indivíduos, de acordo com suas
necessidades, como pode ser visualizado na figura a seguir. Considerando a alta incidência e a mortalidade relacionadas ao
câncer de útero e ao câncer de mama, é responsabilidade dos
O sistema de saúde e seus profissionais têm um papel relevante DA SILVA, E. F.; LUZ, A. M. H.; CECCHETTO, F. H. Maternidade
e estratégico na identificação (no diagnóstico), na abordagem, atrás das grades. Enfermagem em Foco, Brasília, v. 2, n. 1,
na prevenção e no tratamento dos agravos resultantes das di- p. 33-37, 2011.
versas formas de discriminação e violência presentes no sistema
prisional. Uma abordagem acolhedora e atenta dos profissionais
pode encorajar a pessoa assistida a revelar sua situação e buscar
seus direitos à saúde e à segurança, coibindo novas violações.
As particularidades da situação da mulher privada de liberda- Lembramos que você, nesta unidade, teve a oportunidade de co-
de, somadas às dificuldades enfrentadas com o nascimento ou nhecer um pouco dos direitos de atenção à saúde das mulheres
a permanência de um filho dentro de penitenciárias, foram o em situação prisional, com base nas diretrizes do Sistema Único
ponto de partida para a abordagem do contexto vivenciado pela de Saúde (SUS) e de outras políticas de inclusão social do Brasil.
população de mulheres no sistema prisional brasileiro. Você também foi movido a entender como esses direitos podem
ser efetivados dentro do contexto do trabalho em saúde no sis-
Entendemos que a equipe de saúde tem papel fundamental na tema prisional e na articulação com os demais serviços da rede.
implementação das políticas públicas que contemplam as particu-
laridades do sexo feminino na perspectiva do respeito à dignidade Assim, contamos com você e sua equipe na efetivação da uni-
humana. Fica o desafio de você e sua equipe construírem pro- versalização do SUS na atenção à saúde das mulheres privadas
postas adequadas a sua realidade local, as quais proporcionem de liberdade, com qualidade e equidade!
atenção integral à saúde das mulheres privadas de liberdade.
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Caroline Schweitzer de Oliveira
Minicurrículo dos
Graduada em Enfermagem pela Universidade Federal de Santa
autores Catarina (2003). Especialista em Educação Sexual pela Univer-
sidade do Estado de Santa Catarina (2005), Especialista em De-
senvolvimento Gerencial de UBS do SUS (2008) e Especialista
em Saúde Pública pela Escola de Saúde Pública Professor Os-
valdo de Oliveira Maciel (2010). Mestre em Saúde Coletiva pela
UFSC. Atua na Secretaria Municipal de Saúde de Florianópo-
lis. Tem experiência em politicas públicas, saúde das mulheres,
atenção as pessoas em situação de violências.
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Elza Berger Salema Coelho
Graduada em Enfermagem pela Universidade Federal de San-
ta Catarina (1977) e doutora em Filosofia da Enfermagem pela
Universidade Federal de Santa Catarina (2000). Atualmente é
Professora Associada 4 da Universidade Federal de Santa Catari-
na, Coordenadora do Curso de Atenção a Homens e Mulheres em
Situação de Violência, Coordenadora do Curso Mais Médicos em
parceria com o Ministério da Saúde e professora do Programa de
Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Universidade Federal de
Santa Catarina. Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com
ênfase em Saúde Coletiva, atuando principalmente nos seguin-
tes temas: violência, violência por parceiros íntimos, violência
contra gestante e violência contra o idoso.
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