Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
net/publication/300069632
CITATIONS READS
0 106
2 authors, including:
SEE PROFILE
Some of the authors of this publication are also working on these related projects:
All content following this page was uploaded by Carlos Riadigos Mosquera on 09 April 2016.
Resumo:
O presente trabalho pretende refletir sobre a relação entre os saberes envolvidos num
conselho administrativo de uma residência estudantil mantida por uma Universidade pública
federal, de forma a entender limites e possibilidades de sua estrutura na garantia de melhores
condições de permanência do estudante na graduação. Dialogando com as contribuições de
Boaventura de Sousa Santos sobre relação entre justiça social e justiça cognitiva, a partir dos
registros desses encontros, das perspectivas dos integrantes do conselho expressas em suas
narrativas e dos movimentos cotidianos dos moradores da residência pelo direito de
colocarem suas demandas, objetivamos compreender caminhos que possam potencializar uma
relação ecológica entre os saberes dos diferentes sujeitos inseridos nos processos de decisões
coletivas na residência.
Palavras chave: Justiça cognitiva, Justiça social, representatividade, moradia estudantil, saberes
As realidades que encerra a expressão “Justiça Social” são tão numerosas, plurais, e
variáveis que faz com que esta seja uma história com muitas possíveis leituras. O apelido que
leva a expressão, “social”, faz com que o nome, “justiça” tenha que estar inexoravelmente
relacionado com tudo aquilo que afete aos seres humanos, e também aos não humanos
(Nussbaum, 2006). São tantas as circunstâncias por volta da justiça social que o seu estudo e
cuidado prometem ir constantemente caminhando juntos com os seres humanos ao longo do
seu devir, como uma tarefa em permanente melhora, reforma e manutenção. Nessa labor de
permanente construção e melhora a educação ocupa uns dos pilares mais importantes para o
avanço e desenvolvimento de noções mais inclusivas, respeitosas e justas com todos os seres
humanos e o seu entorno.
A pesares da sua relativa juventude, a Justiça Social já desfruta de uma importância
crucial como marco de referência nas interações humanas. Se bem é certo que as injustiças
são permanentes, também o é que nunca antes os Direitos Humanos foram um marco
regulador tão influente na Justiça Social e à hora de elaborar Constituições ou fazer de guia
do comportamento humano.
John Rawls (2002) apontou que para que haja um acordo sobre os princípios de justiça
deve haver acordo sobre as pautas de investigação pública e os critérios para decidir que tipo
de informação e conhecimento é relevante, o que está muito na linha do que Boaventura de
Sousa Santos aborda com sua Ecologia de Saberes, a qual se baseia no reconhecimento da
pluralidade de conhecimentos heterogêneos (Pág. 53) e é uma das principais propostas de
justiça cognitiva. Segundo Boaventura, a Ecologia de Saberes é um conjunto de práticas que
promovem uma nova convivência ativa de saberes com o suposto de que todos eles, incluindo
o saber científico, podem ser enriquecido com esse diálogo (2010, pág. 144). Esta tem uma
importância decisiva em o pensamento Pós-Abissal, que é o que racha com as formas
ocidentais modernas de pensamento e ação (2010, pág. 53). É pensar sobre o lado do abismo
tradicionalmente dominado pela gente desse lado; é aprender com o Sul, com a epistemologia
do Sul. Esse pensamento é aquele que tem que superar o abismo de conhecimentos gerado
pelo confronto da ciência moderna como paradigma de conhecimento dominante, com muitos
outros tais como a filosofia ou os saberes “populares”; toda essa separação conforma o
Pensamento Abisal, que é aquele que dá à Ciência Moderna o monopólio de saber o que é
verdadeiro ou falso mediante as Canonizacões, que é como Boaventura se refere àquelas
“verdades”, que estão assentadas e parecem impossíveis de modificar; os saberes ocidentais,
modernos e pós-modernos. Outra forma que tem o Pensamento Abissal de criar abismo é a
separação do legal, alegal e ilegal (2010, pág. 34), seguindo os critérios de quem tiver no
poder.
As diferenças entre os saberes são a desculpa do Pensamento Abissal para negar a
ecologia de saberes, mas Boaventura argumenta que através da tradução se torna possível
identificar preocupações comuns, aproximações e também contradições. É o suporte sobre o
qual as realidades invisibilizadas, excluídas e deslegitimadas dialogam entre elas, pra criar a
Epistemologia do Sul que Boaventura chama Cosmopolitismo subalterno (2010, pág. 41), este
consiste num conjunto de redes, iniciativas, organizações e movimentos que lutam contra a
exclusão econômica, social, política e cultural.
O conhecimento dominante nomeia os outros conhecimentos como conhecimentos
locais, etnociências ou superstições... Portanto, as pessoas dividem-se entre as especialistas e
as leigas, ou o que é o mesmo, quem possui os saberes cientificistas face quem possui os não
especializados, os da cidadania “normal”, os quais estão a ser marginados e desprestigiados.
As formas de conhecimento invisibilizadas são os populares, os leigos, plebeus, indígenas,
entre outros (pág. 34), os quais para o pensamento moderno não são “conhecimento” senão
crenças, opiniões ou magia.
Resumo dos pontos mais importantes das atas dos conselhos em relação a justiça social e
cognitiva
- Existência dos problemas... que por diversas vezes foram denunciados pelos próprios
moradores, direção ou representantes discentes da Residência Estudantil...
- … a instalação pelo Magnífico Reitor B atribuíram status oficial às atividades do Conselho
- Profa. C, Coordenadora do Sistema de Alimentação
- Solicitaram ao presidente, prof. A, que intercedesse junto à futura Pró-Reitora de Graduação,
profa. D, para que, no caso de uma eventual mudança administrativa, o corpo discente (ou sua
representação) fosse ouvido...
- Alguns alunos também se mostraram ansiosos e temerosos... O prof. A deixou claro que o
próprio Regimento da Residência Estudantil, em seu Art. 21, estabelece...
- Entretanto o prof. A salientou que a Residência Estudantil se destina, exclusivamente, a
estudantes da Universidade... Lembrou também aos alunos que tem representação diversificada...
- … Nesse sentido, o(a) Diretor(a)/Administrador(a) estará sujeito(a) às diretrizes apontadas e
aprovadas pelo Colegiado, que será o elo entre a Residência Estudantil e a Administração
Central
- O professor A também se dispôs... para apresentar ao corpo discente as propostas de
estruturação da Superintendência de Políticas Estudantis e, obviamente, ouvir dos alunos as
demandas que ultrapassem as questões específicas da Residência Estudantil.
- Incluir em suas reuniões alguns convidados fixos, com voz e sem voto, sendo eles: um
representante discente do Grupo de Trabalho (GT) de Assistência Estudantil do CEG/
SuperEst; um representante da Divisão de Saúde do Estudante (DISAE); um representante
discente do Conselho de Ensino e Graduação (CEG); um representante da União Nacional
dos Estudantes (UNE)
- O Prof. A pediu a (aluno) uma lista de todos os funcionários da Residência Estudantil...
- O Prof. A afirmou a marcação de uma reunião com (aluna), (aluna) e Diretor da EEFD
- (Aluna) falou sobre uma horta que os moradores da Residência irão preparar e pediu
colaboração com materiais.
- (Aluna) leu um extenso documento, assinado pela Assembléia dos Moradores da Residência
… O Prof. A pediu que o documento fosse encaminhado à Ouvidoria da Universidade.
- O Prof. A informou ao Conselho que a Profa. F está deixando em função de não ser mais
conselheira do CEG
- O Prof. A reuniu-se com o Diretor G e a Procuradoria da Universidade para uma conversa
sobre agregados, irregulares, quartos trancados etc.
- O Prof. A explicitou sua intenção de reivindicar 6 (seis) bolsas estudantis à PBPD...
- O Prof. A diz que, de acordo com o Regimento, cabe ao Diretor encaminhar registros de
ocorrências para a abertura de processos de sanções e penalidades quando necessário.
- Prof. A deu informes sobre o Decreto Nº que dispõe sobre a utilização de transporte oficial
que não pode ser utilizado de forma regular para atendimento aos alunos. Afirmou que,
mesmo assim, ele como gestor concorda e autoriza...
- Diante desta informação a professora H solicitou o registro em ata... para atendimento a
servidores e alunos no que se refere ao transporte em caso de situações de saúde
- Prof. A falou da questão da relação dos estudantes representantes. Falou também das
reuniões marcadas com ele, ou com os diretores, a pedido dos alunos representantes...
- Prof. A informou que o momento é de pedir bolsistas para atuar como monitor e,
respondendo à (aluna), quanto as necessidades de pessoal, que o (aluno) precisa passar esta
informação para a Superintendência o que não foi feito na última reunião de diretores.
- (Aluno) informou sobre os problemas em relação à falsificação de assinaturas... Prof. A
solicitou ao Prof. I levar a questão... Os alunos informaram que isto não resolve o
problema... informando que os alunos voluntários continuam sendo a melhor alternativa.
− Tomando a palavra o Magnífico Reitor deu as boas vindas aos membros (1º Registro)
− A partir dessas considerações, foi dada a palavra a todos os membros, para que
fizessem suas 66 apresentações e considerações (1º Registro)
Em terceiro lugar, a frequência nas atas das figuras que ocupam lugares com poder é
maior que as das não “importantes”. Em um resumo realizado das atas, em o que se
recolheram a maior parte das ocasiões às quais se fazia referência às pessoas participantes, se
contabilizaram 48 aparecimentos de pessoas com cargos de direção, enquanto teve 43 sem
cargos. Além disso, é necessário ter em conta que a maioria das pessoas afetadas sobre o
debate são estudantes, pelo que talvez fosse desejável uma representação conforme isto.
Em quarto lugar, adiante das figuras importantes sempre costuma ir um título
acompanhando o nome, tal como “Magnífico Reitor”, “Professor”, etc. O alunado é nomeado
por seus nomes de pilha ou de forma genérica (aluno, morador, etc.):
Em quinto lugar, as figuras com mais poder são nomeadas individualmente enquanto
as que têm menos, como coletivo:
Conclusões
A proposta de dimensionar limites e possibilidades da atuação deste conselho para
uma ecologia de saberes, não nos permite perder de vista as condições impostas por órgãos
fiscalizadores de uma instituição pública. Desta forma, seria possível pensar a autogestão da
residência como alternativa de gestão democrática sem considerar os pressupostos jurídicos
implicados na gestão governamental do erário público? Boaventura nos aponta a clivagem
entre o Estado inimigo ou aliado potencial como algo a ser superado, a aprendemos que “a
desregulação é uma regulação social como qualquer outra, e, portanto, um campo político
onde se deve agir para isso” (Santos, 2005a p. 94). Também ainda não é possível dimensionar
o quanto o morador ou um grupo destes está interessado em assumir responsabilidades de
organização e consequente administração do espaço, pois uma das críticas feitas à
organização da assembleia dos moradores é a estimativa de atuação inferior à 10 % do total
de moradores nas reuniões.
Mas como desconsiderar o legado de organização política dos moradores numa
assembléia que foi se estendendo por anos a fio com inúmeras conquistas para o coletivo? As
reflexões dos moradores sobre o espaço em que vivem está expressa em diversos trabalhos de
conclusão de curso. Além disso, a mobilização dos moradores para iniciativas para além da
gestão oficializada que denotam apropriação do espaço e capacidade de gestão coletiva está
expressa em espaços que são absolutamente autogestionados, tal como o acesso à internet nas
dependências dos prédios, organizado exclusivamente em esquemas de voluntariado.
Entendemos que o potencial das contribuições de diferentes segmentos da
Universidade envolvidos na manutenção e melhoria das condições de moradia universitária
são interessantes do ponto de vista da pluralidade, mas que não garantem uma “democracia
enquanto uma obra de arte político-cotidiana que exige atuar no saber de que ninguém é dono
da verdade e que o outro é tão legítimo quanto qualquer um” (Maturana, 1999 p. 95). Os
saberes tecidos no viver cotidiano da residência estudantil não podem estar expressos num
conselho cujo os representantes em sua maioria não vivenciam o espaço, portanto, um
movimento interessante para a valorização deste saber seria a agregamento dos sujeitos do
conselho à Assembleia dos moradores da residência estudantil. Do contrário, a presença de
moradores no conselho poderia ser entendida apenas como um instrumento para referendar as
decisões intransigentes de quem entende saber o que é melhor para um outro subestimado na
sua capacidade de discutir soluções para questões inerentes à sua própria condição de
morador.
BIBLIOGRAFIA