Sei sulla pagina 1di 3

a tirania das crianças

TIRANIA DAS CRIANÇAS

A tirania das crianças não nasce de “geração espontânea” mas é o resultado de um


processo gradual e subtil estruturado pela cedência sistemática e permissividade de
certos pais, cansados e culpados por não estarem suficientemente com os filhos.

Ana Vieira de Castro

Depois de séculos em que ninguém punha em causa o abandono e negligência infantil a


criança foi mudando de estatuto e ganhou direitos amplamente reconhecidos graças ao
desenvolvimento progressivo da psicologia infantil acompanhado de uma tomada
gradual de consciência das sociedades ocidentais. No decorrer de todo esse longo
processo que culminou nos anos sessenta, Françoise Dolto, psiquiatra e psicanalista
francesa, declarou-a finalmente “pessoa” com direito a merecer a atenção, o carinho e o
respeito do adulto protector. As grandes transformações ocorridas entretanto fizeram o
seu caminho e a relação pais-filhos alterou-se profundamente. Outrora inexistentes, os
manuais de psicologia passaram a equacionar o bem-estar das crianças em novos
moldes apontando caminhos e soluções para o alcançar, enquanto os pais atenciosos e
muito mais preocupados com os seus filhos, passaram a cuidar que nada lhes faltasse.
Foi assim que neste novo contexto, algures no caminho, a criança submissa, obediente e
disciplinada dos tempos antigos transformou-se primeiro em “rainha”, no centro de
todas as atenções, e depois em tirana, exigente, mimada e autoritária. Dentro da família,
em cada vez maior número de casos o seu poder real aumentou de tal forma que os pais
desesperados e exaustos, admitindo terem perdido terreno em termos de autoridade
passaram a acorrer aos consultórios dos psicólogos e pedopsiquiatras na esperança de
perceber de que forma o seu bebé encantador se transformou num pequeno déspota, um
monstro birrento e exigente. E perguntam como podem lidar com esta realidade
avassaladora.

Os porquês da tirania. Cada vez mais frequente, o despotismo das crianças, que em
geral “se regista com mais frequência no caso dos filhos únicos”, alerta Maria Lavínia
da Franca, psiquiatra e pedopsiquiatra, apanha os pais de surpresa. É que eles não têm a
mais pequena ideia “do processo que levou a este estado das coisas”. Na verdade o dito
processo é gradual e subtil, não lhe faltando razões para que se instale e se desenvolva
perigosamente, como esclarece Maria Lavínia Franca. Tem sobretudo a ver com dois
factores que são já “um clássico” na história da relação parental: a falta de tempo que os
pais têm para estar com os filhos e a culpa enorme que isso lhes traz. Graças a esta
mistura explosiva a criança vê, desde a mais tenra idade, todos os seus desejos e
vontades serem imediatamente atendidos por pais culpados, infinitamente solícitos e
pacientes, que a procuram compensar a todo o custo. O que começa logo desde o
nascimento: “quando o bebé chora os pais acorrem, embalam, levam para a sua cama,
dão o biberon, porque ele não pode chorar cinco minutos”. Quando já é mais crescido, e
os pais chegam a casa depois de um dia esgotante de trabalho, stressados e exaustos,
“evitam automaticamente os conflitos” com ele, autoritário, reivindicativo e prepotente.
Ao sentimento de culpa e ao impulso de compensação junta-se também o desejo de
descansarem, gozando a liberdade do pouco do tempo que ainda lhes resta. Querem pô-
lo rapidamente na cama sem perderem muito tempo a resolver problemas. Desistem,
portanto, de o fazer “no aqui e agora”, cedendo e permitindo que as suas exigências se
cumpram, muitas vezes imediatamente. E assim ela vai crescendo alegremente num
mundo irreal, na ignorância do que é a frustração. Quando chega ao mundo real, em que
“juntamente com as coisas boas, toda a gente tem frustrações”, o embate é violento.

Aprender a frustração. Ensinar os nossos filhos a lidarem com o facto de lhes ser
negadas todas as suas exigências passa por nós, pais, aprendermos, logo na primeira
fase da vida dos bebés, a não aceder aos seus mais ínfimos desejos. “Não sou apologista
de deixar um bebé chorar muito tempo”, diz a pedopsiquiatra, mas apenas alguns
minutos, o suficiente para que “tente consolar-se a si próprio”. E os bebés têm essa
capacidade de se consolarem em doses progressivas, à medida que se vão
desenvolvendo, através das várias etapas de crescimento. “Mas se os pais não lhe
deixam fazer essa experimentação depois é muito mais difícil fazê-lo, porque não sabem
entreter-se a si próprios”. Podendo parecer irrelevante, a verdade é que “pouco a pouco
vão sendo criadas condições para que a criança não assuma a sua frustração”. O que se
agrava pela vida fora, começando pela vida escolar, em que obrigatoriamente terá de a
desenvolver. Terá que se sentar e manter quieto numa secretária, de obedecer á
professora, de fazer trabalho na escola e em casa. Quando em casa tem um significativo
estatuto de poder “a adaptação à primeira classe é muito difícil”. Por outro lado, as
crianças que não sabem distrair-se nem brincar sozinhas, na falta de computadores e
televisão têm tendência a sentirem-se facilmente entediadas e a “pendurarem-se” nos
adultos, exigindo-lhes atenção constante e a resolução de todos os seus problemas. A
criança tirana apodera-se de todo o espaço familiar, decide o tempo livre dos pais, é ela
que comenda as operações sem tolerar oposição.

Permissividade e auto-estima. Gerado por um excesso de permissividade e cedência


sistemática aos caprichos mais extravagantes, o sintoma da tirania infantil tem graves
consequências na auto-estima da criança e do adolescente a médio e a longo prazo. Fora
de casa, terreno que dominam na perfeição, mostram-se profundamente inseguras.
Muitas vezes tentam deslocar o modelo de autoridade e prepotência a que estão
habituados para a escola ou para o seu meio de amigos, mas sem sucesso. Por outro
lado, quando “na dualidade de pai-criança esta acaba sempre por levar a sua avante” é
transmitida uma imagem de fragilidade parental que ela vai interiorizando à custa da sua
própria auto-confiança, carente de solidez e estrutura. À insegurança junta-se também
uma baixa auto-estima. Isto, porque sendo crianças normalmente inteligentes e lúcidas
têm a perfeita consciência de que estão a fazer coisas que não deviam fazer, a pisar o
risco e a abusar da paciência dos pais, o que lhes confere sentimentos de culpa e
negatividade acerca de si próprias. E se os pais discutem entre si por sua causa,
mostrando desacordo sobre as medidas a tomar face à suas exigências desmesuradas, o
facto de “se sentirem objecto da disputa ou de desamor entre os pais agrava a sua
culpabilidade e torna-as profundamente ansiosas”. As consequências que decorrem de
todo este processo expressam-se em insatisfação permanente e em birras intoleráveis
normalmente a partir dos três anos. Mas é mais tarde que elas se agravam. Um
adolescente com baixa auto-estima, “sem o sentimento de que a frustração faz parte da
vida real”, e que cresceu sem regras e limites, “fundamentais para a sua organização
interna” acaba por vir a correr sérios riscos, eventualmente experimentando a
delinquência nas mais diversas formas. Podemos tentar evitar tudo isto mudando
lentamente de estratégias, o mais cedo possível, estabelecendo e aplicando regras e
limites, treinando a firmeza sem medo de frustrar sem excessos mas também sem
dramas nem culpabilidades.

Destaques:

A criança vê, desde a mais tenra idade, todos os seus desejos e vontades serem
imediatamente atendidos por pais culpados, infinitamente solícitos e pacientes, que a
procuram compensar a todo o custo.

O facto de se sentirem objecto da disputa ou de desamor entre os pais agrava a sua


culpabilidade e torna-as profundamente ansiosas.

Livro aconselhado: “Da Criança-rei à Criança Tirana”, de Didier Pleux, da Sinais de


Fogo.

Potrebbero piacerti anche