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O Preso Aidético

De quantos males afligem de presente a Humanidade, nenhum


disputa primazia à terrível Aids, que arrebata ao indivíduo aquilo que
tem em maior preço: a vida. Mensageira da morte, sobre todos exerce
implacável sua jurisdição. Poderosos e desvalidos, celebridades e
obscuros, bons e maus: ninguém está seguro contra os efeitos de sua
formidável tirania.
Uma casta de pessoas, contudo, existe que merece, por mui
particulares circunstâncias, especial atenção dos espíritos bem
formados, notadamente dos constituídos em dignidade. Compõe-se
daqueles que, havendo decaído (ainda mal!) de seu estado de liberdade,
foram por isso excluídos do convívio social. Esses (os encarcerados)
inspiraram sempre alguns acentos de compaixão no peito dos
homens livres: ou porque — carecedores do sumo bem da liberdade
— a própria vida lhes não devera parecer digna dos cuidados que lhe
reservamos, ou porque, postos em regime de segregação, não lhes
houveram de esquecer jamais aquelas pungentes palavras com que o
divino Dante acrescentou o suplício dos réprobos: “Não há dor, que
maior seja, do que lembrar o tempo feliz nos dias da desgraça”(1).
Se a pena de prisão, ao aviso dos sujeitos eminentes em ciências
e letras, é já um mal, “porque inútil como método penal e como fator de
recuperação”(2), com maioria de razão o será quando associada a castigo
corporal ainda mais aflitivo, como é a insidiosa enfermidade que
subjuga os portadores do vírus HIV, quebrantando-lhes as energias e
fazendo que, pelo comum, de humanos só conservem a figura.
Desses tais é forçoso que se amerceie a Justiça; mantê-los em
calabouço, onde aguardem com resignação estoica o sopro frio da
morte, não seria só rigor excessivo, que fora também desmarcada
impiedade. A mesma legislação penitenciária é a que, nesses casos,
ministra aos desgraçados os derradeiros lenitivos, com facultar-lhes o
recolhimento à própria residência (cf. art. 117, nº II, da Lei de Execução
Penal).
2

Portanto, uma vez que lhe tenha chegado à notícia que certo
preso se ache em adiantado (não terminal somente) estágio da atroz
moléstia, dê o Juiz, com a maior brevidade que couber no possível, as
providências necessárias para removê-lo ao pé de seus familiares. É
que, havendo-se declarado impotente a Medicina para conjurar o mal,
fora de preceito que o Estado (que mais se conhece por ente sem
entranhas) relaxasse o preso aos desvelos de sua família, a qual,
unicamente, lhe poderia acudir com o remédio que serve de atenuar
ao mesmo tempo os achaques do corpo e os da alma: o amor.
Tanto que diagnosticada a doença gravíssima, a direção
do presídio, firme em parecer médico oficial, comunicá-la-ia
espontaneamente ao Juiz de Direito corregedor. Este, com o arbítrio
do varão prudente, e sem fazer caso nem cabedal da pena imposta
ao recluso, enviá-lo-ia aos seus, num preito sublime à piedade,
considerando apenas no grande alcance do benefício (acaso o último),
cuja concessão não encontra as regras do bom-senso nem faz rosto a
seu amplo poder discricionário.
Mais que aconselhável, seria verdadeira obra de misericórdia
isso de o Magistrado, para melhor aferir as condições físicas do
enfermo, proceder a uma inspeção ocular e, de seguida, num generoso
impulso de consciência reta, sensível sempre às tragédias humanas,
transferi-lo para o domicílio, onde familiares o pudessem assistir até o
doloroso momento em que ao curto dia de sua vida sucedesse a noite
eterna.
Ato será esse que não desacreditará o Judiciário nem
recomendará mal o Juiz; bem ao revés, concordará com aquilo do
desafortunado Humberto de Campos: “A Justiça tem na mão uma espada,
quando devia ter, no lugar desta, um coração”(3).

Notas

(1) Inferno, canto V; trad. Joaquim Pinto de Campos.


3

(2) Evandro Lins e Silva, A Defesa tem a Palavra, 1980, p. 265. Outro
tanto in Revista Forense: “A repressão pela expiação no cárcere não traz
cura. Amontoa desespero sobre desespero” (vol. 155, p. 414).
(3) Sombras que Sofrem, 1954, p. 12.

Carlos Biasotti
Desembargador aposentado do TJSP e ex-presidente da Acrimesp

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