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Edições Progresso Moscovo

L.LEBEDÍNSKAIA

. COMO
ESTUDAR
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LUÇÃO"
M aterial didáctico e m etodologico

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Edições Progresso, 1983


Impresso na URSS

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AO LEITOR

Se você, estimado leitor, não é presidente nem lider de ne­


nhum partido político pode parecer-lhe que as questões relativas
ao Estado e à Revolução são demasiado elevadas e mesmo dis­
tantes para que se ocupe delas. Mas em realidade não é assim.
Nenhum de nós se limita a viver num determinado Estado,
mas sente constantemente em si próprio o funcionamento favorá­
vel ou traumatizante de seu aparelho de Estado com todos os
seus parafusos, engrenagens, correias de transmissão e prensas.
«Os funcionários públicos respeitáveis empenhados nas difíceis ques­
tões, digamos, da organização da economia, os empregados de
escritório que arquivam nas pastas as cópias dos projectos dispen­
diosos; os procuradores inflexíveis ao serviço da Constituição
(Lei Fundamental) do país, os policieis chamados a manter a
ordem pública e a segurança; os soldados que intervém sob a
bandeira nacional — estas e muitas outras pessoas são os execu-
tantes da política do Estado què regula a vida sociaJ no interesse
de certas classes, ou seja, no interesse de grandes grupos de
pessoas.
Todos nós, se não quisermos viver retirado — e mesmo aque­
les que gostam de ter uma vida solitária em breve deixarão de
encontrar ermos no nosso planeta — , contactamos com represen­
tantes de diferentes classes da sociedade que se encontra em
desenvolvimento, em luta e, em muitos países, numa fase de
transformações revolucionárias baseadas nos princípios da igual­
dade e justiça social. Entretanto, as questões da revolução são,
acima de tudo, as questões da reorganização do Estado.
Se você não é indiferente às idéias e às preocupações dos
melhores espíritos do mundo relativas à eleminação da opressão
social, nacional e racial e à remodelação justa da sociedade no ,
interesse das massas trabalhadoras, deve pegar no livro de Vla-

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dímir Ilitch Lénine, O E stado e a R evolução, e analisá-lo con-
nosco. *
Para isto o presente itrabalho ser-lhe-á útil. O seu objectivo
e destino é familiarizar o leitor com as teses teóricas da doutrina
marxista-leninista sobre o Estado e a revolução socialista, além
de fornecer pontos de referên cia adequados à situação contem­
porânea para estudo desta obra genial de Lénine. O opúsculo
que oferecemos ao leitor contém material metodológico que se
destina a facilitar o estudo da teoria do comunismo científico
e mostrar em que base e com o os seus fundadores a criaram,
bem como o que há de mais valioso na obra de V. I. Lénine
para a prática revolucionária contemporânea.
É de destacar que o presente maiterial didáctico pode ser
útil para o estudo municioso do objecto do comunismo cientí­
fico não só nas aulas com o apoio do professor como também —
o que ainda é mais importante — na aprendizagem individual
dos fundamentos desta ciência.
A tarefa da autora deste opúsculo foi chamar a atenção do
leitor para os postulados mais importantes e fundamentais da
obra leninista, pode-se até dizer, obrigatórios para os revolucio­
nários de todos os países. Isto refere-se principalmente à tese
básica do livro de V. I. Lénine, o binômio «revolução socialista —
Estado». A autora aborda esta questão de um modo multilate-
ral, relacionando-a com acontecimentos históricos do passado e
do presente. A nosso ver, tal método de apresentação do mate­
rial contribui para uma assimilação mais profunda e eficaz do
mesmo.
O carácter científico coerente e a ligação com a vida de hoje
e com as necessidades da luta revolucionária contemporânea,
constituem a base metodológica sugerida pela autora deste opús­
culo para o estudo da obra leninista.
Ao mesmo tempo, é de sublinhar que o opúsculo não é mais
que material didáctico que deve facilitar o estudo da obra de
V. I. Lénine e, por isso, nem todas as ideias do guia da revo­
lução socialista são nele reflectidas. Portanto, o leitor terá de
compreendê-las e assimilá-las individualmente. Ao ler alguns
capítulos do livro de V . I. Lénine, você certificar-se-á de que
os problemas abordados pelo seu autor são acessíveis à compreen­
são, embora, contudo, bastante difíceis. O último põe-se em re­
levo quando se trata da necessidade de aliar os postulados teó­
ricos gerais à situação política concreta. Aliar a teoria à prática
é o mais difícil, mas necessário e valioso. E é precisamente por
isso que convém tomar a leitura do livro, estudá-lo e procurar
a aplicação das ideias descobertas para si próprio à vida real.
A estrutura do opúsculo corresponde em linhas gerais à da
obra leninista. A leitura da obra e do opúsculo pode ser feita
de várias maneiras: *
— ler o livro de V. I. Lénine e depois a apostila;
— ler o material didáctico e depois a obra;
— lê-los paralelamente, capítulo a capítulo.
Ao nosso ver, a última variante é a mais eficiente, pois deste
modo é mais fácil para o leitor confrontar as ideias de
V. I. Lénine com os problemas de hoje.
É difícil supor que o leitor conseguirá imediatamente dominar
o pensamento leninista em toda a sua profundidade e abordar
todas as questões examinadas no livro. Por isso, é recomendável
rever amiúde o material lido. Em função do carácter profundo,
vital e multiforme da teoria marxista-leninista, acabará por des-
eobrir algo novo para si.
Se achar necessário e indispensável tirar apontamentos para
compreender melhor o texto, é recomendável prestar a sua atenção
às palavras em itálico. Elas foram destacadas no intuito de
chamar a atenção do leitor para as teses mais importantes que
a autora achou conveniente assinalar.
Sem dúvida, seria ainda melhor se, antes de proceder à lei­
tura da obra de Lénine e do opúsculo presente, o leitor estu­
dasse as questões mais importantes que nela se abordam em
manuais do comunismo científico. Em todo caso, esta leitura
pressupõe um certo nível de conhecimentos políticos e do pen­
samento teórico por parte do leitor.
Contudo, como já foi dito, o presente material pode ser
utilizado de uma forma autodidáctica. O importante é que o
leitor tenha interesse pelos problemas políticos da actualidade
e pelas obras de V. I. Lénine.
A propósito, a autora destas linhas é de opinião que seria
preferível adoptar neste caso a seqüência seguinte: primeiro ler
a obra para formar a sua própria ideia (se for errada ou diver­
gente, pode ser corrigida mais tarde, mas de todas as maneiras
será uma ideia pessoal do leitor!) acerca do livro, depois —
os comentários que para o leitor podem ser aceitáveis ou dis-

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cutíveis e, só depois, o manual que sistematizará os seus conhe-
cimentçs. Aliás, esta questão pode ser resolvida de acordo com
as suas habilidades e a sua preparação geral.
A meta mais importante que deve ser atingida com o estudo
da obra de V. I. Lénine é enraizar em si próprio uma profunda
convicção ideológica e dominar todos os ensinamentos verda­
deiros do marxismo-leninismo. Na conferência Sobre o Estado
V. I. Lénine disse, dirigindo-se ao auditório: «Só quando tiver-
des aprendido a orientar-vos por vós próprios nesta questão po-
dereis considerar-vos suficientemente firmes lias vossas convic­
ções e podereis defendê-las com suficiente êxito perante quem
quer que seja e em qualquer momento»1.
A capacidade de pensar de modo criador é adquirida em
resultado de um enorme trabalho individual. O estudo deste
opúsculo deverá igualmente contribuir para criar em si esta ap­
tidão. Daí pode-se dizer que o material didáctico presente é
um auxiliar no sentido mais vasto da palavra.

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas em Três Tom os, Edições «Avante!»


(Lisboa) — «Progresso» (Moscovo), 1977, t. 3, p. 177.
POSIÇÃO LENINISTA

Quando o homem toma a seu cargo uma tarefa de ampli­


tude social, levantam-se sempre duas questões: a quem ele quer
ajudar a melhorar a situação social, por um lado, e contra quem
está apontada a solução da tarefa pretendida e os interesses de
quem restringe, por outro.
Em qualquer sociedade dividida em classes opostas umas às
outras, a resolução das tarefas de uma classe é levada à prática
sempre em detrimento das outras classes e, nas revoluções, atra­
vés da sua liquidação. Assim acontece em qualquer sociedade
onde não dominam os princípios das relações justas entre ho-
mens-trabalhadores, homens-irmãos de todas as nacionalidades,
mas sim os princípios de obtenção de benefícios materiais e
políticos por grupos de pessoas, por classes que exploram o
trabalho alheio e restringem pela violência os direitos de outras
classes, de outras nacionalidades.
Nas vésperas da Grande .Revolução Socialista de Outubro
de 1917 na Rússia, V. I. Lénine, fundador do Partido Comu­
nista e do Estado Soviético, colocou a tarefa de esclarecer as
massas trabalhadoras indignadas com a monstruosa opressão
imperialista e abaladas com os horrores da guerra mundial,
as massas arrastadas pelo ímpeto revolucionário que ergueram
em luta pela transformação radical da sociedade sobre «aquilo
que terão que fazer num futuro próximo para a sua libertação
do jugo do capital.»1. Cumpriu este objectivo ao escrever o livro
O Estado e a R evolu ção, cujo subtítulo diz claramente que se
destina aos trabalhadores explorados arrastados pelo espírito re­
volucionário: «A Doutrina do Marxismo sobre o Estado e as
Tarefas do Proletariado na Revolução».

1 V. I t Lénine, Obras Escolhidas, t. 2, p. 224.

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V. I. Lénine declara abertamente que se trata da necessidade
da destruição revolucionária do regime social então existente,
da tomada do poder de Estado pela classe operária em aliança
com o campesinato trabalhador e da luta pela libertação das
massas trabalhadoras da influência da burguesia em geral e,
sobretudo, da burguesia imperialista, pois esta com apoio do
Estado explora tanto os operários dos seus países evoluídos, como
também muitos outros povos do mundo economicamente menos
desenvolvidos que dela dependem.
Deste modo, ao abrir o livro, já na primeira página se torna
visível quais os interesses defende o seu autor, para quem desti­
na o seu livro e quem ajuda a compreender a estrutura do me­
canismo de Estado da opressão social e de classe. É à classe
operária, ao proletariado, que o autor tenta esclarecer, no campo
teórico, prático e político, a questão de que m aneira a revo­
lução socialista pode assegurar a passagem do poder de Estado
para as mãos da classe operária, das massas camponesas, de to­
dos os trabalhadores e de que tipo será o novo Estado, o Estado
dos trabalhadores.
Torna-se também claro um outro aspecto: o autor pronun­
cia-se contra os capitalistas e as suas alianças organizadas à
escala nacional e internacional. Condena o capitalismo monopo­
lista de Estado, as guerras imperialistas, a política de partilha
e repartilha do saque praticada pelas chamadas grandes potên­
cias do mundo capitalista que exploram os povos dependentes.
Na sua análise científica V. I. Lénine parte dos postulados
teóricos descobertos por Karl Marx e Friedrioh Engels, funda­
dores de comunismo científico em relação à essência do Estado
e da revolução socialista, às tarefas desta revolução no período
histórico em que a opressão dos trabalhadores se torna tão in­
suportável que os compele a levantar-se em luta aberta pelo
derrube do Estado burguês.
Aliás, a luta pela afirmação dos verdadeiros princípios não
deturpados do marxismo na consciência das amplas massas
trabalhadoras e pela sua correcta compreensão de modo que pu­
dessem levar a revolução socialista a uma vitória completa,
exigiu de V. I. Lénine um combate intransigente às deturpa­
ções sociais-reformistas, sociais-chauvinistas e anarquistas da
doutrina marxista do Estado e da revolução socialista.
Como se sabe, os ideólogos burgueses e os oportunistas ten­

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taram sempre e continuam a tentar inculcar na consciência das
massas revolucionárias a ideia da transformação pacífica do ca­
pitalismo em socialismo mediante a adaptação do Estado bur­
guês para estes fins.
Quanto aos anarquistas, estes continuam até hoje a negar
totalmente qualquer Estado inclusive o conceito da necessidade
histórica do Estado em que *o poder político se encontra nas
mãos de operários e de todo o povo trabalhador.
No essencial, as duas tendências, embora partindo de posi­
ções contrárias, afirmam, deturpando a realidade, que o Estado
nada tem a ver com as relações que existem entre classes reci­
procamente opostas e não é produto da luta entre elas nem
o seu instrumento. Consideram que o Estado pode ser «abolido»
sem ser substituído por algum sistema de organização política
da sociedade real, ou utilizado como uma forma neutra do ponto
de vista de classe.
V. I. Lénine deixou clara a diferença de princípios entre
o marxismo e o oportunismo. O seu livro é um brilhante exem­
plo da luta contra as falsificações burguesas do problema da
opressão de classe e do problema de Estado e da revolução.
É uma lição clara do combate aos preconceitos oportunistas em
torno do Estado, de como se deve criticar as ilusões utópicas e
relativas à «paz entre as classes» vigentes até agora.
O Estado e a R evolu ção é uma obra célebre da esfera cria­
tiva do marxismo. Pela primeira vez foi exposta de modo tão
claro e sistematizado a doutrina de Marx e Engels sobre o Es­
tado, desenvolvidos os seus elementos principais em relação às
condições existentes na época do imperialismo e das revoluções
proletárias, enunciados os métodos e as soluções da questão da
tomada do poder de Estado e do seu usufruto pelas massas tra­
balhadoras e, em primeiro lugar, pela classe operária.
A obra ajudou os revolucionários da Rússia dirigidos pelo
partido leninista a obter uma vitória de ressonância universal
e histórica em Outubro de 1917 e a construir a sociedade socia­
lista. Ajudou os comunistas dos países socialistas a levar avante
revoluções socialistas vitoriosas.
Esta obra, relacionada como está com a nossa actualidade,
ajuda também os nossos contemporâneos — revolucionários de
todos os países e continentes — a adaptar a teoria de Marx-
-Engels-Léninej nos seus traços fundamentais e principais postu­

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lados que já adquiriram a força da lei objectiva, às condições
históricas concretas existentes em cada país, à luta pela edifi­
cação da sociedade socialista e comunista.

QUANDO E COMO V. I. LÉNINE


ESCREVEU A SUA OBRA ,

A teoria do marxismo-leninismo é o produto da prática da


luta revolucionária. Como já foi dito, o livro de V. I. Lénine resul­
tou também da necessidade prática de restabelecer a verdadeira
doutrina de Marx e Engels sobre a atitude do proletariado face ao
Estado, maculada e conspurcada pelos oportunistas, com vista a
adaptá-la às condições da Rússia revolucionária de 1917 e armar
a classe operária e os trabalhadores russos que ergueram em luta,
com a teoria marxista.
Isso passou-se num período em qu e toda a Europa se encon­
trava em efervescência com a guerra mundial e se desmoronava
o regime0 monárquico da «prisão para os povos», a Rússia impe­
rialista. A Rússia estava prenhe de revolução.
Numa biblioteca sossegada de Zurique, na Suíça, para onde
V. I. Lénine se viu obrigado a emigrar pelas perseguições do regi­
me tsarista, estudava as obras de Marx e Engels referentes às
questões do Estado. Com uma caligrafia miudinha e compacta
tomava apontam entos n o seu fam oso cadern o azul que tinha escri­
to na capa «Marxismo sobre o Estado».
Além das citações, ora breves ora extensas, das obras de Marx
e Engels e das suas próprias observações e generalizações,
V. I. Lénine completava as suas anotações com extractos dos livros
e artigos dos principais «teóricos» do oportunismo do movimento
operário internacional de então — K . Kautsky, E. Bernstein e
outros.
A crítica às suas concepções errôneas e às falcificações confe­
riu ao trabalho de Lénine um carácter marcadamente polêmico.
O livro de V. I. Lénine mostrou mais uma vez que o marxismo
como ciência se desenvolve no contexto de uma luta inflexível
contra todas as manifestações da sua deturpação consciente, a
confusão e as tentativas de ajustar a teoria revolucionária do pro­
letariado às concepções burguesas sobre o desenvolvimento da
sociedade, limitadas do ponto de vista de classe.
É possível que as longas e numerosas citações que contém o

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livro O E stado e a R evolu ção dificultem em certa medida a sua
leitura. O autor foi muito franco em reconhecer, com um certo
remordimento mesmo nas primeiras páginas, que as longas cita­
ções tornam exposição da matéria pesada e não contribuem, se­
gundo ele próprio, para a popularização do texto.
No entanto, isto foi feito de modo consciente a fim de dar
ao leitor a possibilidade de formar a sua própria concepção sobre
a teoria do Estado de Marx e Engels e provar com clareza e do­
cumentos em que consistia a substância das deturpações em torno
dela cometidas pelos representantes do oportunismo, então bas­
tante influentes, no movimento operário.
Ao fazer um enorme trabalho preparatório e de investigação
científica em Janeiro-Fevereiro de 1917 em Zurique, V. I. Lénine
viu-se forçado a interrompê-lo para se deslocar à Rússia que se
encontrava em plena revolução que conduzira ao derrube do
regime absojutista.
Aclamado com entusiasmo pelos milhares de operários, sol­
dados e marinheiros de Petrogrado (actualmente Leninegrado),
V . I. Lénine encabeçou a actividade revolucionária das massas.
Apelou à luta das massas pela vitória da revolução socialista e
traçou a linha do partido comunista para a transformação da
revolução democrático-burguesa em revolução socialista.
Convém sublinhar que na escala histórica universal o pro­
cesso de preparação de todos os elementos indispensáveis para
a revolução socialista na Rússia verifioou-se em prazos históricos
extraordinariamente curtos. No país devastado pela guerra e dila­
cerado pelas contradições de classe e "nacionais, a salva de ca­
nhão do lendário cruzador «Aurora» anunciou, em Outubro de
1917, o nascimento dum Estado socialista.
Naqueles meses tempestuosos, desde Fevereiro até Outubro,
no laboratório do pensamento leninista foram ponderados e com­
provados na prática os postulados teóricos fundamentais do mar­
xismo. V. I. Lénine formulou as palavras de ordem e as tarefas de
luta correctas, orientando-se perfeitamente na situação caleidos-
copicamente versátil e prevendo o curso de acontecimentos imi­
nentes. V . I. Lénine dirigiu as acções do partido comunista que
organizava e preparava o proletariado para a conquista do poder
de Estado.
No início de Julho, o Governo Provisório burguês que tomara
posse do poder em Fevereiro de 1917, passou às repressões. tCo-

U
meçaram as detenções maciças de operários. Em 7 de Julho, foi
emitida uma ordem especial sobre a detenção de V. I. Lénine.
Durante várias semanas, V. I. Lénine asilou-se a 20 km de Petro-
grado à beira do lago Razliv. Depois, nos finais de Agosto, quando
chegou o frio, mudou para Helsingfors (actualmente Helsínquia),
onde permaneceu cerca de três semanas.
Naquele período, apesar das condições da clandestinidade,
V. I. Lénine dirigia pessoalmente a preparação do Partido e do
proletariado para a insurreição armada que na situação que se
produziu, era o único caminho possível para a tomada do poder
de Estado pela classe operária. E foi justamente naquele periódo
que escreveu o livro O E stado e a R evolução.
Segundo o projecto inicial do autor, o livro devia compor-se
de sete capítulos. No entanto, não conseguiu escrever o último,
o sétimo, capítulo com o título de «A experiência das revoluções
russas de 1905 e 1917». No posfácio à primeira edição lemos o
seguinte: «. . .Não tive tempo para escrever uma única linha deste
capítulo: «impediu-me» a crise política, a vespera da Revolução
de Outubro de 1917. Só nós podemos alegrar com tal «impedi­
mento».1
Gomo um navio veloz, a Revolução Socialista de Outubro
avançou vitoriosa pelo tempestuoso mar da história, deixando
para trás as ruínas de estruturas sociais caducas e arrastando os
povos para o futuro comunista.
Neste movimento, a bússola precisa que permite aos revo­
lucionários verificar o rumo, sair das tempestades e contornar
os recifes é a doutrina do marxismo-leninismo na qual uma das
questões-chave é a questão do Estado.

A ALMA REVOLUCIONARIA DO MARXISMO


(COMO V. I. LÉNINE RESTABELECEU
A TESE DE MARX E ENGELS SOBRE
A ESSÊNCIA DE CLASSE DO ESTADO)

O marxismo-leninismo como ciência da transformação revolu­


cionária do mundo no interesse dos trabalhadores é bastante
acessível às massas de qualquer país que desejam compreender
as leis de desenvolvimento social contemporâneo e dirigi-lo con­

1 V . I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 305.


scientemente rumo ao progresso e justiça social, para que possam
dominá-lo. Contudo, a clareza e a acessibilidade desta grande
doutrina não têm nada em comum com o primitivismo, a eclécti-
ca ou a acentuação de um só aspecto do problema, desprezando
os outros.
O marxismo-leninismo está organicamente ligado à análise
dialéotica de qualquer fenômeno social, isto e, a análise objectiva,
multilateral, que considera as condições e a dinâmica do desen­
volvimento, bem como a luta dos contrários que fazem parte
deste fenômeno.
É esta característica do marxismo-leninismo que se põe em
relevo no que diz respeito à essência do Estado e do seu desen­
volvimento histórico.
J á no primeiro capítulo, V. I. Lénine reabilita a verdade desco­
berta por Marx e Engels, dizendo: «O Estado é o produto e a
manifestação do caracter inconciliável das contradições da clas­
se»1. Este postulado que figura como título do piarágrafo e desen­
volvido mediante análise pormenorizada, é o mais importante e
essencial na doutrina do marxismo sobre o papel histórico e o
significado do Estado.
V. I.«Lénine invoca antes do mais a famosa obra de F. Engels
A Origem da Fam ília, da P ropriedade Privada e do Estado
(1884), em que o autor fez análise histórica da questão de­
bruçando-se sobre as causas do surgimento do Estado, indagando
a sua essência e mostrando o trajecto futuro de seu desenvolvi­
mento. O leitor interessado na análise das formas sociais anterio­
res ao regime burguês tirará, sem dúvida, muito proveito e ser-
4he-á útil a leitura do referido livro de F. Engels, onde este exa­
minou a questão do Estado através do prisma dos interesses da
classe operária e de todos os trabalhadores pela realização da
revolução socialista e conseqüente edificação da sociedade comu­
nista sem classes. Isto não passou despercebido a V. I. Lénine que
em seguida deu a entender que este aspecto da questão também
era importante para ele, pois ajudava os leitores oriundos das
massas trabalhadoras, os leitores com espírito revolucionário a
compreender com profundidade a essência do Estado burguês
contemporâneo.

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 226. *

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Aliás, prosseguindo o nosso exame da obra leninista e acom­
panhando £ lógica do seu pensamento e do texto, falaremos nas
causas das relações especificadas no próprio título do primeiro
capítulo, entre o Estado e a sociedade de classe em geral, e entre
o Estado e a sociedade burguesa em particular.
Com base nos numerosos factos históricos fica irrefutavelmente
provado que, nos diferentes povos do mundo, o Estado surge em
determinada etapa do desenvolvimento da sociedade como resulta­
do e produto natural e lógico deste desenvolvimento.
Todos nós, estimado leitor, somos testemunhas e contemporâ­
neos do facto de em resultado da luta revolucionária de libertação
nacional, os povos do antigo mundo colonial terem formado nos
últimos três decênios sobre as ruínas dos impérios coloniais, mais
de 100 Estados novos. As bandeiras destes Estados soberanos
desfraldam-se orgulhosamente em frente da sede das Nações Uni­
das como símbolo de igualdade e independência dos povos que se
libertam.
No entanto, regressemos a um período histórico um pouco
mais distante, quando os Estados não se formavam do mesmo
modo como hoje — das chamas das revoluções e guerras de liber­
tação nacional (ainda que as guerras deste tipo desempenhas­
sem também um papel importante neste processo histórico) — ,
mas sim em resultado de guerras entre classes opostas dentro da
mesma sociedade.
O Estado representa um fenômeno social temporário no ce­
nário histórico. Por exemplo, o regkne comunitário primitivo não
conheceu o Estado. Este surgiu como resultado da di­
visão social do trabalho, do aparecimento da proprie­
dade privada e da divisão da sociedade em classes.
Ao se dividir em classes antagônicas, algumas das quais se
assenhoraram dos meios de produção (terra, instrumentos de
trabalho, etc.) e prosperaram à custa da exploração das outras
classes sem posses, a sociedade gerou uma força que aparente­
mente se sobrepõe a ela. O Estado representa o poder político da
classe dominante com vista à estabilização do seu domínio eco­
nômico e social.
V. I. Lénine destacou clara e dialeoticamemte os dois aspeotos
da questão do surgimento e dos objectivos a que destina o Esta­
do: «O Estado surge precisamente onde, quando e na medida
em que as contradições de classe objectivamente não podem

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ser conciliadas. E inversamente: a existência do Estado prova que
as contradições de classe são inconciliáveis»1.
Invocando os factos históricos irrefutáveis colhidos por Marx
e Engels, as suas conclusões e generalizações, V. I. Lénine prova
de modo convincente que o Estado é o órgão de dominação das
classes exploradoras poderosas sobre as exploradas e sem posses.
São precisamente as classes exploradoras que criam o Estado
para oprimir as outras alegadamente «com base na lei» e no qua­
dro da «ordem» extensiva a todos «indiscriminadamente» que é
chamada a reprimir e abafar, na medida do possível, os confron­
tos de classe abertos e agudos.
Por toda a parte, onde a sociedade se dividiu em classes anta­
gônicas quanto aos seus interesses econômicos e onde se trava
uma luta de classes, surge o Estado.
Aqui não vamos especificar a organização da vida humana
numa comunidadp, onde existe uma determinada igualdade na
distribuição dos produtos do trabalho social e, por conseguinte,
os interesses econômicos dos membros da comuna, não dividida
em classes antagônicas, são em geral convergentes.
• As comunidades deste tipo, embora espalhadas por zonas
rurais do continente africano, tendem a desinitegrar-se, caindo
cada vez mais em declínio.
Isto acontece por dois motivos. Primeiro, devido à estagnação
econômica, política e cultural, à falta de dinamismo e perspectiva
na organização da vida interna da comunidade e ao nível do
desenvolvimento dos meios de trabalho e da produção profunda­
mente distante da civilização do mundo contemporâneo. Segundo,
devido à irupção dinâmica da civilização mundial na estrutura
comunitária e tradicional de vida. Inicialmente foi o resultado
da penetração dos elementos do capitalismo nos impérios colo­
niais.
Para os trabalhadores dos países em vias de desenvolvimento
os êxitos dos países do socialismo vitorioso têm um grande papel
aliciador e as relações políticas, econômicas e culturais com estes
têm uma importância de destaque na sua iniciação na civilização
socialista.
No seu livro, V. I. Lénine chama a atenção do leitor prin­
cipalmente para Estado burguês. Isto é natural porque os Estados

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 226.

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burgueses, apesax da diversidade dos seus tipos e estruturas, con­
tinuam* a ser numericamente dominantes, inclusive entre muitos
países que se libertaram do colonialismo. É justamente contra
os Estados burgueses que legalizaram, através dos órgãos do poder
político e à escala nacional, o sistema de domínio de classe do
capital sobre os trabalhadores da cidade e do campo, que se desti­
na a revolução socialista.
Se fosse possível conciliar as classes, uma das quais relativamen­
te pouco numerosa, que se assenhora injustamente dos produtos do
trabalho da outra, oprimindo e humilhando milhares e milhões
de pessoas, o Estado não teria sido necessário. Mas não é difícil
compreender que é impossível conciliar estas classes e chegar a
uma harmonia pela qual uma classe se resignaria voluntária e
pacificamente com a sua condição de ser pilhada por outra. E
daqui resulta a necessidade de Estado. Daqui resulta também o
carácter de classe do Estado. Daqui, a necessidade das massas
revolucionárias que lutam contra a injustiça de classe e contra
o regime burguês, definirem a sua atitude face aõ Estado e, de­
pois, concretizarem-na.
Levando o leitor a compreender a necessidade de derrubar
0 aparelho de Estado burguês pela via revolucionária, V. I. Lé-
nine depurou a «alma viva» do marxismo das inúmeras deturpa­
ções, do lixo verbal e das profanações tendenciosas.
Depois de Marx e Engels, reafirmou postulado .pelo qual
«cada revolução, ao destruir o aparelho de Estado, mostra-nos
uma luta de classes descoberta»1 e provou que a libertação das
classes exploradas é inconcebível sem a destruição revolucionária
e violenta do aparelho de Estado montado pela classe dominante.
V. I. Lénine viu-se obrigado a acabar o livro rapidamente, ten­
do em conta as necessidades práticas da revolução iminente na
Rússia de 1917. É o que explica as suas numerosas referências
bastante agudas a respeito dos oportunistas no movimento operá­
rio russo de então que nos momentos críticos da revolução demo­
crática russa, quando se punha no plano prático a questão da
atitude face ao Estado, escorregavam sempre para a teoria da
«conciliação» das classes mediante o Estado.
Todavia, Lénine não foi apenas o dirigente do proletariado
russo: o seu pensamento operava com categorias do desenvolvi­
mento social universal, do processo revolucionário mundial.
1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 228.

!6
No livro, deu uma característica ponderada e precisa da
sua época: a transformação do capitalismo monopolista em capi­
talismo monopolista de Estado acelerada pela guerra imperia­
lista; como resultado disso, a opressão crescente dos trabalha­
dores em todos os países capitalistas por parte dos seus respecti­
vos Estados estreitamente fundidos com as uniões capitalistas;
a escravização e a exploração do» povos coloniais e dependentes
por parte das chamadas grandes potências imperialistas1.
Ao mesmo tempo, condenou 05 oportunistas do movimento
operário internacional que deturpavam a doutrina marxista sobre
o Estado. Estigmatizou-os porque, enoobrindo-se com uma fra­
seologia socialista, acabaram por identificar-se de facto com os
interesses da «sua» própria burguesia nacional, do «seu» próprio
Estado burguês responsável pela guerra de rapina, pelo direito
de escravizar e explorar os outros povos. Deste modo, ao pro­
nunciar-se contra o Etado burguês e, sobretudo, imperialista e
ao defender o marxismo dos atentados do oportunismo inter­
nacional, V. I. Lénine defendia os povos das colônias e dos países
dependentes.
Finalmente, Lénine previa e pressentia o incremento da re­
volução mufidial e, encontrando-se ligado a esta por múltiplos
laços, queria que, tanto a classe operária russa como a internacio­
nal e todos os trabalhadores conscientes compreendessem a sua
missão nesta revolução — necessidade de tomar à força o poder
de Estado.

QUAIS ELEMENTOS DA MÁQUINA DE ESTADO?

Baseando-se em Engels e fazendo questão de restabelecer


o postulado marxista sobre a essência e as formas reais da existên­
cia e do funcionamento do Estado dividido em classes, Lénine
especificou as suas duas características: a divisão dos cidadãos de
acordo com o critério administrativo e territorial dentro de um
país e, sobretudo, a instituição de um poder público espeoial, o
qual não coincide com a população e se lhe opõe como uma força
armada.
V. I. Lénine intitula o segundo parágrafo do primeiro capí­
tulo «Destacamentos Especiais de Homens Armados, Prisões, etc.».
São estes os instrumentos da força, do poder de Estado nascidos
* Ver: V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 223.
2—1672 17
da sociedade precisamente na etapa em que esta se divide em
classes inconciliavelmente hostis e, para evitar a luta armada
entre estas, foram criados, de acordo com a vontade de classe que
possui o poder, destacamentos especiais de homens: o exército
permanente, a polícia, o funcionalismo, etc.
O aparelho de funcionários públicos do poder supremo e local
(de acordo com a divisão administrativa e territorial), o tribunal,
o exército, a polícia, a prisão e as instituições de coacção, tudo isto,
tomado em conjunto, opõe-se à população, sob a forma do Estado
na sociedade dividida em classes antagônicas.
Para a maior parte dos europeus — e isto não passa desper­
cebido a V . I. Lénine — , a existência destes elementos do aparelho
de Estado já parece tão natural, tão habitual e até mesmo sagra­
da que até hoje se mantêm cativos dos falsos pretextos dos acti-
vistas burgueses e oportunistas que tentam adormecer a consciên­
cia das massas com falas mansas e discursos de aparência cientí­
fica, sobre a necessidade eterna da existência do Estado e da
«conciliação» das classes dentro deste mesmo.
E estas objecções e ataques tornam-se ainda mais requintados
e vis, quando os marxistas-leninistas definem com toda a clareza
as tarefas das classes oprimidas \em que se encluem a destrui­
ção por via revolucionária do Estado burguês existente
e a criação de um a nova organização d e E stado, ao serviço dos
próprios trabalhadores e não das classes opressoras.
No contexto da luta de classes aberta, cada revolução social
de grande envergadura põe, com evidência e convicção perante
as massas, no plano prático das acções concretas esta questão fun­
dam ental— a questão das relações especiais entre as forças arma­
das estatais, a polícia, o exército, etc., por um lado, e a «orga­
nização armada espontânea da população», por outro.
Citando os fundadores do comunismo científico e invocando
como prova exemplos da história de diferentes povos, V. I. Lénine
sublinha que a força do Estado que cumpre a vontade das classes
e dos grupos dominantes na sociedade consiste, em primeiro lugar,
nestes «destacamentos especiais de homens armados». Mas, ape­
sar de toda a sua importância, não são a única força da qual o
Estado dispõe. Aliás, este tema será abordado mais adiante.
Em paralelo com a agudização da luta de classes e das contra­
dições dentro do Estado e à medida que os Estados com fronteiras
comuns se tornam maiores e mais populosos reforça-se cada vez

18
mais um poder público afastado das massas, multiplicando por
muitas vezes os modos e os mecanismos da sua actuação sobre a
população do seu próprio país e de outros países, contra os quais
lança as forças armadas disponíveis.
V. I. Lénine deu ênfase à previsão científica de F. Engels que
há cem anos atrás, quando a passagem para o imperialismo
(omnipotêneia dos maiores bancos e trusts, grandiosa política
colonial etc.) ainda estava no seu* início, escreveu [que «a luta
de classes e a concorrência de conquistas fizeram subir o poder
público a um plano em que ele ameaça devorar toda a sociedade
e mesmo o Estado. . .»\
A importância do papel que desempenhou o Estado burguês
na conquista de outros povos e territórios torna-se evidente pelo
faoto de que precisamente no início da segunda década do século
X X , quando o capitalismo já se encontra em plena fase imperia^
lista, o mundo ficou partilhado entre uma série das maiores potên­
cias. Esta partilha de rapina foi possível devido à intervenção do
exército, à forca do capital e nos interesses deste último.
O Esitado e a guerra é um tema especial, bastante extenso
„e complexo. Mas, apesar da sua amplitude, convém sublinhar
aqui o vigor da conclusão leninista pela qual foi precisamente
o poder de Estado rapace da burguesia imperialista que, ao
«devorar» todas as forças da sociedade e ao colocá-las ao serviço
dos interesses das classes exploradoras, levou à concorrência na
extensão das «suas» colônias e nas esferas de influência até tal
ponto que o mundo, já altamente internacionalizado no sentido
econômico e político, foi submerso por uma catástrofe militar
— deflagrou a guerra mundial.
Munidos de potente material bélico, os exércitos dos Estados
imperialistas contemporâneos estão ao serviço das classes domi­
nantes. Ao longo deste século estes exércitos já por duas vezes
intervieram em guerras mundiais. São incontáveis vezes que foram
lançados para as guerras locais injustas em quase todos os con­
tinentes do nosso planeta. Estes exércitos, paralelamente ao apa­
relho interno ramificado de repressão nos próprios países capita­
listas, são o instrumento da burguesia monopolista para conter
os movimentos revolucionários das massas populares e reprimir
rovoluções.

' V. I. í/nine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 229.


Aliás, os exércitos são os operários, camponeses e empregados
fardados, chamados pelo Estado a prestar serviço militar e com­
pelidos muitas vezes a defender os interesses egoístas da classe
capitalista a que são alheios.
É por isso que o trabalho dos revolucionários para esclare­
cimento do verdadeiro papel do exército junto dos soldados nos
Estados capitalistas é tão importante para o desfecho da luta
revolucionária tanto nos seus próprios países como nos países para
onde estas tropas são enviadas.
Foi por essa razão que os comunistas da Rússia, dirigidos
por V. I. Lénine, se empenharam no esclarecimento da consciên­
cia dos soldados e marinheiros que desempenharam um grande
papel para a vitória na Revolução de Outubro.
A atitude do exército, apesar de toda a heterogeneidade da
sua composição social e de classe, face à revolução muitas vezes
é determinante para o desfecho da mesma. Mais ainda, as forças
progressistas e patrióticas no seio do exército podem até ser capa­
zes de organizar por si próprias uma insurreição revolucionária
caso no país ter amadurecido a crise política.
Um exem plo evidente dista foi a recente experiência da
Revolução de Abril de 1974 em Portugal, onde o «Movimento
dos Capitães», aliado às forças democráticas do país e aos comu­
nistas, capitalizou o descontentamento profundo dos soldados
em redação às guerras coloniais para derrubar o sistema fascista
podre e proceder à renovação revolucionária do país em bases
democráticas,
A política de Estado capitalista no interesse dos monopó­
lios conduziu muitas vezes a guerras e crises nacionais que puse­
ram em relevo — e de modo particularmente agudo — as contra­
dições de classe. Apesar de todos os desastres que as guerras impe­
rialistas trazem às massas, num determinado contexto propiciam
o surgimento da revolução. Por exemplo, V . I. Lénine escreveu
que a revolução na Rússia, cuja primeira etapa de desenvolvi­
mento estava a terminar quando foi escrito o livro (inícios de
Agosto de 1917) «só pode ser compreendida como um dos elos
na cadeia das revoluções proletárias socialistas provocadas pela
guerra imperialista»1.
O marxismo-leninismo examina diaiecticamente o problema

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 224.

20
da guerra e da revolução. As guerras imperialistas provocam
o protesto das massas trabalhadoras contra o seu carácter de
rapina e pilhagem. As forças revolucionárias progressistas con­
cebem o papel histórico destas guerras como fenômenos
que põem a nú essência de classe e antipopular do capitalismo
monopolista de Estado. Nos países imersos na guerra com eçam
a amadurecer as condições para revolução socialista. A ne­
cessidade da organização revolucionária das massas a fim de
proceder com êxito à transformação do Estado explorador em
Estado dos operários, das massas camponesas e de todos os tra­
balhadores, impõe ao partido marxista-leninisita a tarefa de escla­
recer às massas a estratégia e a táctica da revolução socialista.
Actualmente, em paralelo com o exército e a polícia que
existem já tradicionalmente, nos países capitalistas evoluídos tam-
-se constituído uma rede bastante ramificada de diferentes insti­
tuições do aparelho repressivo, cujas funções tendem a se ampliar.
H oje em dia, a missão deste aparelho, além de reprimir e preve­
nir as acções das massas contra as classes governantes, consiste em
influenciar das mais diversas maneiras a consciência das pessoas
e afastá-las da luta de classes.
V. I. Lénine chama a atenção para uma força do Estado
capitalista que se sobrepõe à sociedade, o funcionalismo.
A fase imperialista do desenvolvimento do Estado burguês
caracteriza-se pela combinação orgânica, pela fusão do poder
do capital e do poder de Estado, assim como pela plena subordi­
nação do Estado e de todas as suas instituições aos interesses da
classe dominante e economicamente mais potente, a burguesia
monopolista, e aos interesses da obtenção do lucro capitalista.
Para que o Estado possa efectuar esta função, é imprescindí­
vel uma legião de funcionários que exerce directamente o poder
de Estado.
Debruçando-se sobre o problema dos funcionários públicos,
V. I. Lénine invoca F. Engels, salientando a diferença entre o livre
respeito voluntário das pessoas pelos órgãos do poder que vigorou
na sociedade gentílica, por um lado, e o conjunto de leis especiais
acerca da imunidade e «autoridade» dos funcionários que lhes
facilitam a possibilidade de serem instrumento executivo ao servi­
ço do sistema contemporâneo de Estado que garante a omnipotên-
fia da riqueza.
D que põe os funcionários acima da sociedade? •

21
Debruçando-se sobre a sua situação privilegiada no Estado
burguês, V. I. Lénine definiu este problema como fundamental.
Os privilégios «legalizados» dos funcionários de Estado, da
burocracia, tal como os do exército permanente, da polícia e do
tribunal resultam do domínio, não só no campo econômico, mas
também político, da classe exploradora.
A existência duma máquina de Estado bem organizada e
adaptada a servir os interesses de classe dos exploradores faz
desta última uma classe dominante no campo político, oferecen-
do-lhe novos meios, mecanismos e possibilidades de reprimir e
explorar as massas oprimidas.
Ao concluirmos que a máquina de Estado burguês não é
mais que uma máquina militar e burocrática, cujas peças são os
militares, polícias e funcionários da administração pública, pode­
mos passar para a questão do papel deste Estado em relação à
classe oprimida.

UM PEQUENO PARÁGRAFO SOBRE


UM GRANDE PROBLEMA
* (V. I. LÉNINE SOBRE O ESTADO
NAS CONDIÇÕES DO EQUILÍBRIO DINÂMICO
DAS CLASSES EM LUTA)

Na história de alguns Estados, escreveu V. I. Lénine no tercei­


ro parágrafo, existem períodos relativamente curtos em que as clas­
ses em luta alcançavam um equilíbrio temporário das forças. Os
motivos desta situação podem ser diversificados. Ora, pode-se
verificar o afrouxamento das posições da classe dominante re­
sultante de derrotas na guerra com os Estados vizinhos. Ora,
em resultado de uma actividade social crescente e reforço da
organização das classes oprimidas.
Aliás, em todo caso — se as classes exploradas ainda não pos­
suem força suficiente para a vitória da revolução — , produz-se uma
situação temporária em que nenhuma das classes opostas em
luta tem a superioridade incondicional sobre o seu adversário,
a qual indica clara e definitivamente a quem serve neste período
histórico do Estado o mecanismo do poder público.
Citando F. Engels, V. I. Lénine nomeia fenômenos deste gê­
nero na história da França e Alemanha, qualificando-os como
uma espécie de excepção, porque nestes períodos se cria uma

22
ilusão, uma aparência de que o poder de Estado, tendo alcan­
çado uma certa autonomia face às classes em luta, se torna um
mediador entre elas.
Aqui vamos lembrar um antigo ditado: as excepções con­
firmam as regras. E no nosso caso, a atenção de V. I. Lénine
para o problema do Estado nas condições do equilíbrio temporá­
rio das forças armar-nos-á com a óptica indispensável para ana­
lisar dois postulados teóricos e práticos de suma importância.
Um deles é teórico e vem especificado no próprio título do
parágrafo «O Estado — Instrilmento de Exploração da Classe
Oprimida». O outro ajuda os revolucionários a elaborarem uma
táctica acertada em relação às formas republicanas existentes
do Estado burguês e decorre da análise do mecanismo estatal
da república burguesa, que de modo mais requintado oculta
os objectivos de classe deste mecanismo.
Diga-se „de passagem que o problema do equilíbrio tempo­
rário das forças foi um problema palpitante para a Rússia mes­
mo antes de Lénine terminar o seu livro, quando os democratas
pequeno-burgueses, que dirigiam os Sovietes de então, eram já
impotentes, e a burguesia não era ainda suficientemente forte,
facto que produziu no país o fenômeno conhecido como duali­
dade de poderes.
Para o leitor contemporâneo que procura encontrar solu­
ções apropriadas para os problemas actuais da transformação
revolucionária da sociedade burguesa, são especialmente valio­
sas as observações de V. I. Lénine a respeito da essência de classe
e do funcionamento do Estado burguês republicano que aspira­
va ao papel de uma instituição independente e «acima das
olasses».
Ora, a república! Esta forma de organização de Estado tem
actualmente a maior divulgação no mundo. Aliás, vamos ver
como V. I. Lénine põe a nu a verdadeira essência de classe da
república burguesa.
Com base nas observações de F. Engels relativamente à repú­
blica democrática burguesa, V. I. Lénine prova progressivamente
nos capítulos seguintes que, no capitalismo, a forma republicana
do poder público é uma forma que assegura a possibilidade duma
exploração dissimulada e «indirecta» e, por conseguinte, parti­
cularmente segura e requintada das massas exploradas por parte
do capital. ,

23
V. I. Lénine frisa que F. Engels aponitou dois métodos por
meio dos quais os capitalistas defendem e põem em prática o
seu poder com ajuda do Estado: primeira, a corrupção directa
dos funcionários e segundo, a aliança entre o Governo e a Bolsa.
Ambos os métodos desenvolveram-se no contexto do imperia­
lismo e graças ao capitalismo monopolista de Estado, até se *
tornarem numa «arte extraordinária».
O mais importante, assinala aqui V. I. Lénine, é que no con­
texto do Estado burguês na sua forma republicana democrá­
tica, o poder do capital sente-se mais seguro e estável em com­
paração com as demais formas políticas, porque não depende
de determinados defeitos do mecanismo político, de determi­
nadas pessoas, instituições ou partidos burgueses.
«A república democrática — escreveu V. I. Lénine a este pro­
pósito — é o melhor invólucro político possível para o capita­
lismo. . -»1.
No parágrafo em questão, V. I. Lénine não_ recorre às vastas
fundamentações económico-políticas desta tese. Todavia, toda a
análise marxista-leninista da essência de classe da sociedade ca­
pitalista leva-nos a esta conclusão. Enfim, o capitalismo repre­
senta um sistema de relações sociais, em que um assalariado po­
liticamente livre entra em contacto com um capitalista politi­
camente livre. Aparentemente, ambos não dependem um de
outro, embora, no essencial, nem o capitalista — como capita­
lista que extrai lucro do capital e se apropria da parte não paga
do trabalho do assalariado — pode viver sem operário, nem o
operário pode subsistir, na sociedade burguesa, sem capitalista,
sem vender a este mesmo a sua mão-de-obra.
A forma da república democrática na organização de Esta­
do é a mais apropriada para esta independência externa e apa­
rente das duas classes antagônicas que se situam nos paios opos­
tos da sociedade burguesa. Só a revolução socialista é capaz de
romper as algemas da escravidão assalariada e separar estas
classes uma da outra.
Sem dúvida que a referida forma da organização de Estado
é historicamente mais progressista, por exemplo, em comparação
com a monarquia, e contém vários elementos que podem ser
aproveitados pelas forças revolucionárias para o fortalecimento

1 V . I. Lénine, Obras Escolhidas, t. 2, p. 231,

24
das posições dos trabalhadores, as acções de classe com vista
ao melhoramento substancial da sua situação. A experiência
rica da classe operária dos países capitalistas evoluídos colhida
neste século, confirma de modo evidente e irrefutável esta ideia.
Todavia, a república democrática, sendo apenas uma forma,
não altera a essência do sistema social, do sistema de explora­
ção de uma classe por outra.» Por muito profunda que seja a
democratização da vida política no quadro da república bur­
guesa e não obstante as forma$ historicamente progressistas de
que se possa revestir, o que se mantém invariável é o sistema
de opressão de classe que pode ser liquidado através da revolu­
ção social que põe no centro dos interesses públicos e do desen­
volvimento social a classe dos trabalhadores, que é a classe ope­
rária.
No parágrafo citado, V. I. Lénine chama atenção especial pa­
ra a tese de” F. Engels de que, na sociedade burguesa, mesmo o
sufrágio universal não é mais que o instrumento de domínio da
burguesia.
Citando F. Engels, o autor estipula que este direito é barô­
metro da maturidade política da classe operária. O proletariado
e todos os trabalhadores devem utilizar o mais plenamente pos­
sível todas as possibilidades de luta legal pelos seus interesses de
classe que lhes oferece o sufrágio universal e o sistema eleitoral
em geral. V. I. Lénine mostra-se intransigente em relação aos
oportunistas em todos os países que incutem no povo essa falsa
ideia de que o sufrágio universal poderia revelar a vontade da
maior parte das massas trabalhadoras e assegurar a sua concre­
tização.
Um só facto, simples e evidente, confirma a justeza dos fun­
dadores do marxismo-leninismo. Em vários países, o sufrágio
universal existe já há mais de cem anos, mas em nenhum destes
pôde garantir e defender efectivamente os interesses dos traba­
lhadores.
V. I. Lénine dirige a sua crítica iracunda contra os «teóricos»
oportunistas dos partidos socialistas que, na sua propaganda,
elogiavam o sufrágio universal, deturpavam o marxismo e incul-
cavam ao povo uma mentira notória a este respeito a fim de
afastá-lo da luta revolucionária pelo derrubamento do jugo do
capital.
Hoje em dia, o que é característico dos verdadeiros marxistas-

25
-leninistas é o seu espírito intransigente em relação às deturpa­
ções do marxismo na questão do sufrágio universal. Refutam as
ilusões dos oportunistas e reformistas de todos os carizes sobre a
possibilidade de transformar, só através do sufrágio universal,
o Estado burguês existente em socialista, evitando uma revolu­
ção violenta.

VICISSITUDES DO ESTADO
APÓS A REVOLUÇÃO SOCIALISTA

K . Marx, F. Engels e V. I. Lénine, baseando-se nas leis de de­


senvolvimento social profundamente estudados por eles, predis­
seram e fundamentaram teoricamente a viragem revolucionária
da Humanidade para a organização comunista de Estado que
se verifica diante dos nossos olhos.
O com unism o representa um a organização da sociedade em
que o desenvolvimento livre de cada indivíduo se tornará uma
condição indispensável do desenvolvimento livre de todos, em
que a produção será organizada com base na associação livre e
igual dos produtores e em que desaparecerão as classes e, com
elas, se extinguirá o mecanismo social de opressão de classe, o
Estado.
Voltando à análise do problema d e Estado em termos histó­
ricos empreendida por F. Engels, V. I. Lénine sublinha que o
Estado não é uma categoria eterna. Surgiu no momento em que
a sociedade se dividiu em classes opostas uma a outra, tornando
patente a necessidade objectiva do Estado. Mas, quando a pró­
pria existência das classes passou a ser um entrave para o desen­
volvimento da produção social e o progresso histórico, chega o
tempo de obliteração inevitável das classes no ardor das trans­
formações de revolução socialista, cujo objeotivo final é criar
uma associação livre de trabalhadores livres. Esta associação já
não tem a necessidade do Estado e este, tal como as classes, ten­
de necessariamente a extinguir-se, passando a ser «um objecto a
expôr nos museus de História».
V. I. Lénine reproduz uma passagem de F. Engels a respeito
desta concepção, chamando a atenção especial do leitor para a
envergadura e a profundidade do processo revolucionário his­
tórico universal mostradas pelo grande companheiro de K . Marx.
Ao mesmo tempo, V . I. Lénine critica severamente os «adep­

26
tos» do marxismo que tentavam vestir a toga do marxismo às
suas concepções reformistas do Estado.
Os reformistas sempre tentaram e continuam a tentax pro­
pagar a teoria da possibilidade do desenvolvimento lento e
gradativo através das reformas, sem abalos e revoluções. Fazem
questão de alimentar as massas com as ilusões da superação pa­
cífica das contradições antagônicas de classe, faloificando con­
cepção marxista sobre o futuro do Estado burguês.
De modo tão categórico como ç faziam anarquistas quando
declaravam que a prosperidade e a igualdade universais sobrevi­
riam logo após a «abolição» do Estado, os reformistas proclamam
que o bem-estar e a igualdade chegariam gradativamente, com
novas e novas reformas implantadas graças à aotividade concilia­
dora do Estado burguês que, com o passar do tempo, desapare­
ceria, «se extinguiria», ao resolver sucessivamente todas as con­
tradições.
V . I. Lénine mostra-nos como os reformistas parasitam no
marxismo, deturpando-o e atribuindo postulados característicos de
um período histórico a outro, radicalmente diferente. E mais,
pretende-se atingir deste modo dois objectivos. Primeiro, da análise
da questão do Estado suprime-se, como que subtilmente e a pre­
texto de ser desnecessária, a questão fundamental da revolução
socialista. Segundo, sem este âmago, esteio, eixo, o marxismo não
passa de uma corrente oportunista no pensamento socialista.
Já na vida de V . I. Lénine, as palavras de F. Engels sobre a
«extinção» do Estado serviram de arma para aqueles elemen­
tos burgueses e oportunistas que se disfarçavam de marxistas com
o fito de ganhar os trabalhadores para o seu lado. Até ago­
ra os que procuram confundir a consciência de classe das massas
populares recorrem à falsificação do marxismo.
É por isso que a análise leninista do problema teórica relati­
vamente à «extinção» do Estado e à revolução violenta é tão
importante para elaborar concepções correctas sobre as tarefas
da luta de classes em relação ao Estado, à revolução socialista e
ao porvir do Estado.
Ao invocar o insigne raciocínio de F . Engels aduzido no seu
livro Anti-Dühring (1876) sobre a interligação entre a revo­
lução socialista e o Estado, V. I. Lénine na sua minuciosa aná­
lise dá destaque a cinco pontos teóricos fundamentais referentes
ao problema da «extinção» do Estado. ’

27
No prim eiro ponto, V. I. Lénine presta a atenção à questão
principal, fundamental da revolução socialista, a conquista do
poder político e de Estado que a classe operária utilizará, antes
de mais, para transformar os meios de produção em propriedade
social.
V. I. Lénine mostra as profundas mudanças revolucionárias
relacionadas com este acto histórico violento: a classe operária,
ao tomar posse do poder de Estado, deixa de ser uma classe opri­
mida e explorada. Gomo dizia F. Engels a este propósito, o pro­
letariado «suprime-se a si próprio como proletariado», suprime
os antagonismos de classe.1
Com efeito, se a revolução põe termo à burguesia e a todas
as classes exploradoras, suprime-se a necessidade social de con­
servar o Estado que cultive as condições de repressão dos traba­
lhadores anteriorm en te explorados, os cidadãos do antigo Estado
burguês.
Todavia, a classe operária, ao tomar posse do poder em fun­
ção da revolução socialista p or ela realizada, enfrenta muitas
tarefas que pode e deve resolver st5 com ajuda do mecanismo
estatal do poder público antes de concluir a edificação da orga­
nização comunista tanto na escala nacional como internacional.
Por isso V. I. Lénine, comentando e completando as ideias
de F.Engels sobre a revolução socialista, precisa e frisa a impor­
tância de ver a d iferen ça das vicissitudes históricas dos Estados
radicalmente diferentes: o E stado burguês suprime-se e destrói-
-se p or via violenta m ediante a revolução proletária, ao passo
que o Estado proletário que surge inevitavelmente sobre as m i­
nas do precedente, «se extingue» progressivam ente com passar do
tem po, depois de resolver as tarefas destrutivas e construtivas de
importância histórica, ou citando propriamente F. Engels, «vai
adormecendo'».
O que é característico dos oportunistas e dos falsificadores
da doutrina marxista-leninista sobre o Estado, que esvaziam o
seu conteúdo revolucionário, é confundirem as etapas históricas
de princípios deferentes, ultrapassarem a época da revolução
socialista e desprezarem a diferença qualitativa na natureza de
classe do Estado antes e depois desta revolução.
Perscrutando e desenvolvendo a tese de F. Engels, V. I. Lénine

* V . I. Lénine, Obras Escolhidas, t. 2, p. 232.

28
dedica o segundo ponto da sua análise ao problema que diz
respeito à relação entre a revolução socialista e a função prin­
cipal do Estado como «força especial para a repressão».
Quem reprime quem com ajuda desta «força especial», antes
e depois da revolução socialista?
Antes da revolução socialista, o Estado é um instrumento
nas mãos da burguesia e dos latifundiários ou seja, de um punha­
do de ricos para reprimir os operários e todos os trabalhadores.
Após a revolução socialista, o Estado é um instrumento nas
mãos da classe de operários e trabalhadores para reprimir a bur­
guesia e outros opressores. V. I. Lénine define este Estado como a
ditadura do proletariado, como o domínio político da classe ope­
rária, acrescentando ainda que uma tal substituição de uma
força de repressão de classe por outra não pode de maneira
nenhuma ter lugar sob a forma de uma «extinção» tranqüila.
Aqui V. I. •Lénine vincula directamente o problema do Estado
com o da revolução da classe operária e de todos os trabalhadores.
Demonstra de que maneira esta revolução altera radicalmente
o conteúdo e a orientação de classe do Estado, destrói o Estado
burguês e edifica sobre as suas ruínas o poder da classe operária,
cujo objectivo é reprimir o poder do capital e liquidar qualquer
desigualdade social.
No terceiro pon to da análise da concepção marxista acerca
do Estado, V. I. Lénine indaga em linhas gerais uma das mais
importantes características do novo Estado socialista que surge
após a revolução: o seu carácter verdadeiramente democrático.
Aqui sublinha o fundamental: a revolução socialista inaugura a
época em que o Estado se torna o representante autêntico de toda
a sociedade e perde progressivam ente, uma após outra, as fun­
ções repressivas. A forma política dum Estado deste tipo é a mais
plena, inconcebível nas condições do domínio da burguesia, de­
mocracia. No futuro comunista, quando desaparacerá também o
Estado socialista, obliterar-se-á a democracia que é o Estado
socialista propriamente dito. Virá a ser substituída pela associa­
ção de homens livres, dentro da qual, em vez do governo das
relações sociais, vigorará o sistema de disposição racional das coi­
sas e da gerência dos processos de produção, pois já se trata da
era de igualdade social completa.
A citação de F. Engels referida por V. I. Lénine contém uma
profunda e brilhante ideia: «O primeiro acto em que o Estado

29
surge realmente como representante de toda a sociedade — a
tomadâ de posse dos meios de produção em nome da sociedade —
é, ao mesmo tempo, o seu último acto autônomo como Estado»1.
Este acto é a revolução socialista. Assim, só a abordagem,
panorâmica do processo histórico de desenvolvimento da socie­
dade humana possibilitou aos clássicos do marxismo-leninismo a
perscrutar o futuro e mostrar a perspectiva do progresso e da «ex­
tinção» do Estado, uma vez resolvidas as tarefas da revolução
socialista.
O quarto pon to da análise leninista refere-se à palavra de
ordem do Partido Social Democrata da Alemanha nos anos 70
do século passado sobre o chamado «Estado livre do povo». Foi
uma palavra de ordem, então bastante divulgada, pelo partido
em oposição ao governo que continlha, segundo V. I. Lénine, «uma
alusão legal» à república democrática. Naquela altura, F. Engels,
por razões de matiz propagandística, estava pronto a «justificar»
esta palavra de ordem, apesar de esta última embelezar a demo­
cracia burguesa e apresentá-la como supostamente popular.
Nós já analisámos a atitude dos fundadores do comunismo
científico face à república democrático-burguesa, dizendo que, pa­
ra a burguesia, é a forma mais conveniente de organização estatal
da sociedade. V. I. Lénine, por sua vez, concentrou a sua atenção
no outro aspecto, mais concretamente: no capitalismo, a república
deste tipo é também a melhor forma de Estado para os operários,
pois, ainda que não liquide a servidão assalariada, este sistema
de Estado oferece em comparação com os outros sistemas, maio­
res possibilidades de utilizar as formas legais de organização da
classe operária e dos trabalhadores na preparação da revolução
socialista.
É só por isso e só em certas circunstâncias históricas que os
comunistas dão apoio, por motivo da ordem histórica e concreta,
à palavra de ordem da república democrática.
O último, o quinto, ponto da análise leninista do problema da
«extinção» do Estado introduz-nos na questão central da teoria de
comunismo científico — o problema de revolução socialista pro­
priamente dita que por via violenta, e não por qualquer outra,
destrói o Estado burguês, substituindo-o pelo proletário.
V. I. Lénine pergunta: como é possível aliar o elogio, até o

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 233.

30
panegírico da revolução socialista violenta, feito por F. Engels, à
sua tese referente à «extinção» do Estado? E respondendo a esta
pergunta, dá ao leitor uma lição da análise dialéctica, mostrando
como é possível compreender profunda e integralmente os pro­
cessos de desenvolvimento social.
V. I. Lénine opera com o raciocínio de F. Engels sobre o sig­
nificado histórico da revolução violenta, no qual aparece uma
comparação metafórica, retirada de O Capital (1843-1883) de
K . Marx, da violência com «a parteira de toda a velha sociedade
que anda grávida com uma nova»1. A violência é o instrumento
com o qual se realiza o progresso histórico e o desenvolvimento
da sociedade e se destroem as formas politicamente velhas e
fósseis. Esta é a dialéctica da vida.
Cada revolução vitoriosa que abala à força as instituições
políticas velhas, dinamiza a consciência social e inculca no povo
trabalhador confiança nas suas próprias forças criadoras.
V. I. Lénine dedica uma atenção especial à necessidade de
educar constante e sistematicamente as massas no espírito revo­
lucionário e de esclarecer-lhes a inevitabilidade e a necessidade
históricas da revolução violenta. Refere-se para o leitor as nume­
rosas obr^s de K . Marx e F. Engels, nas quais esta ideia vem fun­
damentada e oposta às posições oportunistas dos reformistas.
Concluindo o primeiro capítulo, V . I. Lénine expõe de maneira
concisa a essência da questão. «A substituição do Estado burguês
pelo proletário — escreveu — é impossível sem revolução vio­
lenta. A supressão do Estado proletário, isto é a supressão de todo
o Estado, é impossível a não' ser pela via da «extinção»2.
Deste modo, o primeiro capítulo da obra leninista introduz-nos
nos postulados teóricos gerais da doutrina marxista-leninista sobre
o Estado e a revolução. Resumindo, o conteúdo deste capítulo
permite-nos compreender a necessidade de:
— primeiro, a óptica de classe na análise do problema em ques­
tão;
— segundo, a óptica histórica ampla e panorâmica;
— terceiro, a óptica dialéctica, isto é, a que examina processo em
questão à luz da interligação entre as suas forças principais e
da luta dos contrários;

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 235.


1 Ibidem., p. 236.

31
— quartoj ser intransigente e irreconciliável em relação às con­
cepções oportunistas e anarquistas e às deturpações da doutrina
marxista-leninista.
Uma vez armados com estes conhecimentos teóricos, vamos
prosseguir, seguindo o autor, a nossa análise da experiência con­
creta das revoluções feita por K . Marx e F. Engels e aprofundada
pelo génio do seu eminente continuador.

EM QUE CONSISTE O PAPEL REVOLUCIONÁRIO


DO PROLETARIADO NA HISTÓRIA?

No segundo capítulo, V. I. Lénine examina, na ordem crono­


lógica e de acordo com a experiência concreta da luta revolu­
cionária do século X I X e as generalizações teóricas de K . Marx
e F. Engels, o desenvolvimento dos postulados principais da sua
doutrina da revolução socialista e do Estado. Desenvolvendo estes
postulados, V. I. Lénine enriquece-os com conclusões suas prove­
nientes da análise da experiência da luta revolucionária no pe­
ríodo histórico posterior e confirma g.ssim o carácter imorredouro
e imperecível do marxismo.
O I I capítulo dedicado à experiência das revoluções demo-
crático-burguesas na Europa Ocidental no período de 1848 a
1851, consta de três parágrafos, cujos títulos especificam as etapas
do desenvolvimento da revolução e as etapas correspondentes ao
desenvolvimento da doutrina de K . M arx sobre a revolução e o
Estado.
Todavia, é de notar que o pensamento leninista não se limita
a acompanhar o curso dos acontecimentos de modo automático.
V. I. Lénine aprofunda no plano teórico o problema da força re­
volucionária principal oposta ao Estado burguês — o proleta­
riado. A análise do problema começa de forma mais geral e pros­
segue através da análise histórica das tarefas que se foram colo­
cando perante o proletariado revolucionário de acordo com as
modificações do Estado burguês e o desenrolar das revoluções
burguesas. V. I. Lénine termina a sua análise provando de modo
irrefutável a inevitabilidade da instauração de poder político re­
volucionário da classe operária, quer dizer, acentua claramente
o problema fundamental de toda a teoria marxista-leninista, o
problema da ditadura do proletariado.
J á pertencem à história as greves dos tecelões da cidade france-

32
sa de Lion e as batalhas dos operários nas barricadas das cidades
alemãs nos meados do século passado. No entanto, continuam a
ser vivas e revolucionárias as conclusões teóricas de K. M arx e
F. Engels resultantes da análise destas acções organizadas da clas­
se operária que pela primeira vez, embora no quadro das revolu­
ções democráticas burguesas, declarou o seu direito à remodela­
ção da organização social e profetizou a sua missão histórica.
V. I. Lénine retira das primeiras obras do marxismo maduro
— da M iséria da F ilosofia de K . Marx e do M anifesto do Partido
Comunista escrito em co-autoria com F. Engels, ambas criadas
em 1847, precisamente nas vésperas das revoluções democráticas
burguesas — as teses gerais sobre o objectivo final da revolução
socialista, as tarefas imediatas do Estado da classe operária gera­
do por ela, os motivos que permitem à classe operária, e só a ela,
solucionar as tarefas históricas que se colocam perante a sociedade
em geral e o destino do partido proletário.
Descrevendo em linhas mais gerais a associação comunista,
que em virtude dos esforços revolucionários da classe operária
e dos trabalhadores virá a substituir a sociedade burguesa,
K . Marx esboça o panorama da futura extinção do
Estado em geral. Mostra o objectivo final e a perspectiva da
revolução socialista — a supressão total das classes e dos seus anta­
gonismos, o definhamento progressivo do poder político no futuro
enquanto manifestação formal do antagonismo das classes.
Falando da revolução socialista operária, K . M arx e F. Engels,
no trecho do M anifesto do Parti/lo Com unista citado por Lénine
nas páginas da sua obra, frisam que os seus primeiros passos
serão a instauração do domínio político da classe operária, a sua
transformação em classe governante e a conquista da democracia
para os trabalhadores.
O proletariado organizado em Estado como classe dominante,
utiliza a sua posição para:
— primeiro, ir arrancando todo o capital das mãos da burgue­
sia;
— segundo, centralizar todos os meios de produção à escala
do país;
— terceiro, assegurar o desenvolvimento mais rápido possível
das forças produtivas.
Deste modo, o poder político serve para resolver antes de
mais nada, os problemas econômicos que determinam em última •

| 3—1672 33
instância a carácter e a essência de todas as relações sociais.
V. I. Lépine qualifica es-te postulado como uma das ideias mais
insignes e importantes do marxismo na questão do Estado por
explicar o conceito da ditadura do proletariado como poder da
classe operária.
V. I. Lénine sublinha as seguintes palavras: «O Estado, isto é,
o proletariado organizado com o classe dom inante»1 e acrescen­
ta que esta definição do Estado resultante da própria essência
da revolução socialista e da missão histórica do proletariado,
é absolutamente inconciliável com o reformismo, porque destrói
as ilusões oportunistas sobre a transformação «pacífica» e não
revolucionária do capitalismo em socialismo.
A crítica leninista aos pseudo-socialistas que tentam substi­
tuir a luta de classes por ilusões sobre a conciliação e a convenção
das classes, bem como às utopias pequeno-burguesas sobre a pos­
sibilidade da subordinação voluntária de um punhado de capi­
talistas à maioria ajuda até agora a desmascarar a traição dos
oportunistas no movimento operário. Os oportunistas, como antes,
procuram os meios para inculcar às massas a ideia do suposto ca­
rácter de estar «acima das classes», do Estado burguês. E, como
antes, tentam esvaziar a teoria do comunismo científico do seu
conteúdo revolucionário e afastar a classe operária explorada da
luta pelo poder político.
E, como antes, no contexto da confrontação contemporânea
das duas ideologias de classe à escala mundial, impõe-se a neces­
sidade de desmascarar os subterfúgios oportunistas, levando a
análise da luta de classes na sociedade burguesa até à conclusão
revolucionária sobre o imperativo do poder político da classe
operária organizado à escala do Estado.
Porque é que K . Marx, F. Engels e V. I. Lénine, nos seus ra­
ciocínios relativamente à necessidade do indispensável da existên­
cia do Estado para os trabalhadores oprimirem as classes explo­
radoras na revolução socialista, põem no primeiro plano a classe
operária? Porque é que a consideram a única classe intransigen­
temente revolucionária capaz de dirigir este processo de opressão,
aglutinando em seu torno todos os trabalhadores na luta contra
a resistência desesperada dos capitalistas até à liquidação de toda
a exploração? Porque é que é justamente a classe operária que

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 238.

34
pode representar, mediante acções decisivas e de modo coerente,
os interesses da maioria esmagadora do povo?
As respostas a todas estas perguntas podem ser encontradas
no livro de Lénine.
No capitalismo, de acordo com as leis objectivas do desen­
volvimento econômico da sociedade, o proletariado, diferentemen­
te de outras classes e camadas qpostas ao grande capital em
crescimento contínuo torna-se a única classe, cujas condições
econômicas de vida a preparam para esta missão histórica e lhe
dão a força para o derrube revolucionário da burguesia e dos
latifundiários. O papel econômico da classe operária na grande
produção é tal que é a própria burguesia, embora contra sua von­
tade, que mediante a centralização e concentração da produção,
citando aqui V. I. Lénine, «agrupa, une, organiza o proletaria­
do»1.
Não obstante a opressão do capital e a sua força com. que
esmaga o campesinato e as camadas pequeno-burguesas serem às
vezes superiores à exploração do proletariado, esta pressão só
os fracciona, pulveriza e provoca a sua desunião. Arruínam-se
‘individualmente ou em massa, no entanto não se mostram aptos
para a luta independente e vitoriosa pela sua libertação social.
Só a classe operária, ao tomar consciência do seu lugar na
sociedade e o seu papel histórico de libertador de todos os tra­
balhadores da exploração e desigualdade social, é capaz de der­
rubar a burguesia. Ao se transformar em classe dominante, repri­
me a resistência inevitável das classes derrubadas e organiza todos
os trabalhadores para a edificação da economia socialista e remo­
delação justa da sociedade.
Ao examinar o papel social e histórico da classe operária,
V. I. Lénine passa a seguir para o problema do papel do partido
da classe operária armado com a teoria do marxismo. Mostra a
oposição radical entre o marxismo e o oportunismo no que se
refere à educação dos dirigentes da classe operária. Educando
o partido operário, o marxismo educa uma vanguarda do proleta­
riado, capaz de conduzir todo o povo pelo caminho revolucionário
rumo ao socialismo e à organização justa da vida social sem a bur­
guesia, sem os exploradores. Em contrapartida, o oportunismo
tem influência no partido operário entre representantes dos traba­

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 239.

s* 35
lhadores mais bem pagos, que se desligam das massas trabalhado­
ras, ocupam posições relativamente privilegiadas, são alimentados
pela burguesia e, enfim, traem os interesses da sua classe.
A falta de unidade necessária no seio do movimento operá­
rio contemporâneo em muitos países capitalistas, reflecte-se ne­
gativamente na situação dos operários e trabalhadores e é expli­
cada consideravelmente pela longevidade do oportunismo, contra
o qual devem lutar os marxistas-leninistas.

A CONCLUSÃO PRINCIPAL DA DOUTRINA


MARXISTA SOBRE O ESTADO

J á esclarecemos que os Estados burgueses representam uma


máquina aperfeiçoada para organizar a vida da sociedade no in­
teresse da repressão e exploração da maioria da população por
parte da classe capitalista. Esta máquina representa, antes de
mais, o poder parlamentar que lhe assegura a máxima concentra­
ção, e o poder executivo materializado na organização burocráti-
co-militar: o exército regular, o» aparelho repressivo ramificado
e uma enorme hoste de funcionários. K . Marx qualificou todo
este m ecanism o burocrático-militar como um «terrível corpo de
parasitas» no organismo da sociedade.
Seguindo a história do desenvolvimento do Estado burguês
até à época da transformação do capitalismo monop'olista em ca­
pitalismo monopolista de Estado, V. I. Lénine prova que todas
as transformações da máquina de Estado burguês resultantes das
revoluções burguesas só levavam ao aperfeiçoamento e fortaleci­
mento do aparelho militar e do funcionalismo, aliás do aparelho
repressivo contra o proletariado e todos os trabalhadores.
V. I. Lénine realça que cada revolução democrático-burguesa
acaba por fazer apenas redistribuição dos lugares burocráticos
entre os diferentes partidos burgueses e pequeno-burgueses e,
através desta «renovação» do aparelho do poder executivo, as
camadas superiores da pequena burguesia são atraídas para o
lado do grande capital. Como resultado, toda a sociedade burgue­
sa manifesta uma hostilidade irredutível em relação às classes
oprimidas, sobretudo, ao proletariado. O proletariado, por sua
vez, chega a compreender a necessidade de destruir e suprimir
por via revolucionária a máquina de Estado burguês, que lhe é
hostil no sentido de classe.

36
A conclusão de que o objectivo da classe operária na revolução
socialista não é o aperfeiçoamento da máquina do Estado burguês,
mas a sua dem olição, a sua destruição, segundo V . I. Lénine, é
a conclusão mais importante da doutrina marxista sobre o Estado.
«Esta conclusão — diz V. I. Lénine — é o principal, o funda­
mental na doutrina do marxismo sobre o Estado»1.
No I I capítulo do livro, V. I.» Lénine, apoiando-se no raciocí­
nio de K . Marx e na sua própria análise da história subsequente,
põe a questão: por quê substituir a máquina destruída de Estado
burguês? E responde: pelo Estado proletário. Destaca sem equí­
vocos que à doutrina sobre o Estado proletário que há-de substi­
tuir o aparelho destruído do poder político burguês, cabe de facto
um lugar central no marxismo.
Cita um famoso extracto da carta de K . M arx ao seu com­
panheiro de luta Weydemeyer, onde, primeiro, exprime a dife­
rença fundamental e radical entre o marxismo e a ciência dos pen­
sadores progressistas burgueses de então e, segundo, lapidarmente,
em várias linhas, expõe a essência da doutrina sobre o Estado.
Seguindo V. I. Lénine, cumpre-nos citar as palavras de
K . M arx: «O que fiz de novo foi, 1.°, demonstrar que a existên­
cia das classes está meramente ligada a fases históricas determi­
nadas do desenvolvimento da produção.. . ; 2 °, que a luta de clas­
ses conduz necessariamente à ditadura do proletariado; 3.°, que
esta mesma ditadura constitui apenas a transição para a abolição
de todas as classes e para uma sociedade sem classes.. .»2.
Segundo a definição de V* I. Lénine, só é marxista aquele que
alarga o reconhecimento da luta de classes até ao reconhecimento
da necessidade de instaurar o poder político do proletariado, até
ao reconhecimento da sua ditadura que, mediante a revolução
socialista, substitui violentemente a ditadura da burguesia3.
Ao destacar a enorme variedade das formas dos Estados
burgueses que já existiram e possiveilmente existirão ainda,
V. I. Lénine sublinha que todos eles sem excepção representam
no essencial uma ditadura, isto é, uma máquina social do poder
da burguesia.
Lançando o seu olhar para o futuro, V . I. Lénine prevê

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 240.


2 V . I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 244.
a V er: V . I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, pp. 244-245.

37
que, «a transição do capitalismo para o comunismo não pode
naturalmente deixar de dar uma en orm e abundância e variedade
de formas políticas, mas a sua essência será necessariamente
uma só: a ditadura do proletariado», isto é o domínio político'
da classe operária que exprime os interesses das massas tra­
balhadoras1.
A transição do capitalismo para o comunismo representa
uma época histórica sem precedentes no desenvolvimento da
Humanidade e exige que o Estado que derruba a burguesia e
suprime completamente a sua resistência, seja democrático de
uma maneira nova, quer dizer, assegure a mais plena democracia
para os operários e trabalhadores, e ditatorial de uma maneira
nova, o que significa levar a repressão em relação à burguesia
até ao fim, até ao seu desaparecimento como classe.
O conceito da «ditadura» da classe operária revolucioná­
ria, com que opera amplamente a literatura marxista-leninista,
não embebe de modo algum o conteúdo misantrópico ou a essên­
cia anti-humana e antidemocrática, o que gostariam de lhe
atribuir os inimigos desta grande doutrina.
Ào contrário, é necessário que na análise desta obra, assim
como de todas as demais obras de V. I. Lénine, os leitores
prestem a atenção especial àquela parte da vasta característica
da ditadura do proletariado que realça o facto de ser a de­
mocracia para a maioria e que a função principal desta ditadu­
ra, por outras palavras, o poder da classe operária em aliança
com as massas camponesas e ourtras camadas consiste em criar
as condições de uma organização social mais humana e da
associação livre dos trabalhadores criadores, livres e iguais.
Os críticos e falsificadores do marxismo-leninismo, procuran­
do suscitar nas massas um repulso, embora que meramente emo­
cional, contra esta doutrina, especulam sobre as associações ne­
gativas deste conceito na consciência comum da população dos
países capitalistas com os regimes ditatoriais, totalitários e até
mesmo fascistas para predispor os trabalhadores do mundo ca­
pitalista contra a revolução socialista que instaura a ditadura
— isto é, o poder da classe operária — , contra os países do socia­
lismo vitorioso.
A prática da luta recolucionária e a divulgação em todo

1 Ver: V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 245.

38
o mundo da verdade sobre o socialismo real e as suas vantagens
permite combater com êxito estas invectivas mistificadoras dos
anti-comunistas. Milhões de pessoas convencem-se na prática
da justeza das palavras leninistas que dizem que «a ditadura de
um a só classe é necessária não só para qualquer sociedade de
classes em geral, não só para o p roletariado que derrubou a bur­
guesia, mas também para a totalidade do período histórico que
separa o capitalismo da «sociedade sem classes», do comunis­
mo»1.

A PRATICA REVOLUCIONÁRIA
NUTRE A TEORIA REVOLUCIONÁRIA

O terceiro capítulo da obra leninista talvez abunde, mais


do que todas as páginas anteriores, em material histórico concre­
to: contém a análise da Comuna de Paris de 1871, os razoamen-
tos sobre as revoluções democrático-burguesas de 1905 e 1917 na
Rússia e a crítica aos oportunistas no movimento operário.
Operando invariavelmente com o método histórico objeoti-
vo de estudo, V. I. Lénine examina no referido capítulo os pro­
blemas principais acentuados e desenvolvidos de modo funda­
mental por K . Marx durante a análise da experiência da primei­
ra revolução proletária na história da Humanidade que procla­
mou a Comuna de Paris.
No capítulo seguinte, IV , o autor perscruta o desenvolvi­
mento da teoria marxista do Estado e da revolução empreendido
por F. Engels com base na consideração da experiência revolu­
cionária posterior.
Contudo, tal como os capítulos precedentes, este texto le-
ninista é tão abundante em raciocínios próprios, generalizações
teóricas e conclusões concretas importantes para acções revolucio­
nárias práticas na revolução iminente, que só um cego não veria,
por um lado, a unidade orgânica da doutrina de K . M arx e
F. Engels e da doutrina de V. I. Lénine que compõem de modo
indivisível a teoria marxista-leninista integral, e por outro, o con­
tributo personalizado valioso já não do discípulo de K . M arx e
F. Engeils, mas do seu continuador genial para o desenvolvi­
mento criador da teoria.

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 245.

39
O mérito histórico particular de V . I. Lénine foi depurar as
concepções autênticas de K . Marx das ideias falsificadoras que
saíram das penas dos numerosos e então bastante conhecidos
oportunistas e reformistas no movimento operário. O espírito po­
lêmico do livro de Lénine torna-se particularmente evidente no
I I I capítulo. O leitor encontrará aqui um brilhante exemplo da
óptica de princípios em relação às posições antimarxistas e anti­
comunistas sobre o problema central da revolução social, o pro­
blema do poder e do Estado.
V . I. Lénine prova irrefutavelmente ao leitor que a teoria
de desenvolvimento social de K . M arx está estreitamente vin­
culada com a prática do movimento revolucionário. K . Marx de-
diicou-se à analise da experiência, corroboração, precisação e a
revisão de certos pontos da sua teoria de acordo com o desenvol­
vimento do progresso revolucionário.
V . I. Lénine, tal como K . Marx, toma como exemplo a Comu­
na de Paris para mostrar-nos qual deve ser a atitude para com o
movimento revolucionário de massas, mesmo que não alcance o
seu objectivo concreto. Em plena unanimidade com K . Marx, vê
neste movimento uma experiência histórica de grande importância,
muito mais valiosa que meras teorizações, bem como um passo
em frente na prática do desenvolvimento do processo revolucio­
nário mundial.
Ao começar pelo exame da lição principal da Comuna no
que concerne à atitude do proletariado revolucionário face ao
Estado, V. I. Lénine fixa novamente a atenção no imperativo de
demolir a máquina burocrática e militar de Estado e não se li­
mitar simplesmente à sua conquista.
Nas páginas do livro que se seguem na análise concreta dos
problemas da direcção da sociedade encontraremos as palavras de
V . I. Lénine sobre «. . .um mecanismo de elevado equipamento
técnico, liberto do «parasita», as de K . Marx sobre a necessidade
de «amputar os órgãos meramente repressivos do velho poder
governamental» e outras expressões leninistas, como «amputar
o parasita»1.
T al como na época de V. I. Lénine, há quem tente destacar
processos meramente técnicos de organização racional das coisas
no contexto da sua centralização completa no capitalismo mono­

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, pp. 256 e 258.

40
polista de Estado, por exemplo, o funcionamento dos correios.
Assim procura-se camuflar o caracter de classe do mecanismo de
Estado burguês hostil aos trabalhadores. Gomo dantes fixa-se
portanto um determinado objectivo de classe: apresentar como
desnecessária a ideia de liquidar completamente «o pântano la­
macento e sangrento, . . ., das instituições burocrático-militares,
que tudo subjugam, que tudo esmagam»1. Foi assim que
V. I. Lénine caracterizou metaforicamente o mecanismo do Esta­
do burguês.
No que respeita à organização racional de toda a economia
nacional, V. I. Lénine sublinhou que o objectivo imediato da re­
volução socialista é fazer com que seja organizada como os cor­
reios, estabelecendo para os técnicos, contabilistas e outros funcio­
nários um vencimento que não exceda um salário do operário e
sob o controlo e a direcção da classe dominante no país, a clas­
se operária.
Ao mesmo tempo frisou que, no imperialismo, «o mecanismo
de gestão social» já está pronto. Liberto da necessidade de servir
os monopólios capitalistas, o «mecanismo de elevado equipamento
técnico» destes monopólios pode servir perfeitamente os trabalha­
dores do Estado socialista2.
Para o leitor contemporâneo, sobretudo nos países com po­
pulação principalmente camponesa, é de grande valor a análise
leninista da revolução popular incluída no I I I capítulo. O autor
prova que o marxismo não pode ser reduzido à antítese simples
e primitivista: revolução burguesa e revolução proletária.
Numa secção relativamente pequena consagrada ao problema
de revolução popular, encontramos dois pontos extremamente im­
portantes. Primeiro, sobre a participação das massas populares,
isto é, das classes exploradas na revolução democrática burguesa,
que devido a este facto pode transformar-se em revolução socialis­
ta. Segundo, a ideia claramente expressa sobre o aliado principal
da classe operária, o campesinato trabalhador.
V. I. Lénine mostra que, face à pressão da máquina buro-
crático-militar do Estado burguês, o proletariado se une com a
maioria das massas camponesas e, daí, a sua tarefa comum ser a
destruição desta máquina. Prova também que sem aliança dos cam­
poneses e da classe operária não se pode conceber nem uma demo­
1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 248.
2 V . I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, pp. 255 e 256. '

41
cracia verdadeira, nem as transformações socialistas que con­
duzem à sociedade sem classes.
Tanto K. Marx, em que V. I. Lénine se apoiou quando desen­
volvia esta tese geral, como o próprio V. I. Lénine não se engana­
vam com respeito à natureza dúplice da figura do camponês que,
por um lado, é proprietário, mas por outro, é trabalhador. É
esta circunstância que eles tiveram sempre presente na análise de '
cada caso concreto.
No contexto da referida questão teórica geral, a aliança vo­
luntária da classe operária e do campesinato trabalhador foi e
continua a ser um dos problemas centrais da doutrina do mar­
xismo-leninismo sobre a destruição revolucionária do Estado bur­
guês, da doutrina do socialismo.
V. I. Lénine chama especialmente a atenção do leitor para fac­
to de que maneira K . Marx procurou e encontrou na prática da
luta revolucionária e na experiência concreta da Comuna de Pa­
ris a resposta à questão relativa ao modo de como levar a cabo a
tarefa principal, já definida no campo teórico,- da revolução so­
cialista — destruir a máquina de Estado burguês e substituí-la
p o r um a nova, adequada ao período qualitativamente diferente
na história da sociedade, o período do domínio político da classe
operária.
Por quê e como o proletariado revolucionário substitui a
«excrescência parasitária» no corpo da sociedade — eis o que
interessou prioritariamente V. I. Lénine na análise das concepções
de K. Marx sobre o problema do Estado.
Partindo da experiência da luta revolucionária das massas
que desembocou na fulgurante Comuna de Paris, K . Marx tirou
lições de importância histórica universal sobre a organização do
Estado da classe operária que realiza plena e coerentemente a
democracia conquistada na efervescência da revolução.
À luz da análise de K . Marx, V. I. Lénine examina os mais
importantes decretos da Comuna e estuda como as tarefas defini­
das neles foram incluídas posteriormente nos programas dos
partidos políticos da Europa Ocidental. Mostra que as mesmas
tarefas figuraram em outras condições, sobretudo, no período das
revoluções russas de 1905 e 1917. V. I. Lénine depura da vulga­
rização e deturpações oportunistas a primeira forma histórica do
Estado proletário descrita por K. Marx, a forma descoberta pelos
com m unards de Paris «que assaltavam o céu» em 1871.

42
Com base na análise das obras de K . Marx, V. I. Lénine presta
uma atenção especial aos decretos postos em prática pela Comuna,
dando-lhes a sua classificação.
Coloca no primeiro plano o problema da transformação revo­
lucionária da democracia burguesa em socialisita. Neste contexto,
dá-se destaque aos decretos que diziam respeito à supressão do
exército permanente do Estado burguês e à sua substituição pelo
povo armado. Este decreto foi o primeiro da Comuna de Paris.
A história das revoluções socialistas vitoriosas do nosso século
repetiu várias vezes esta acção, "confirmando assim o seu significa­
do transcendente. A supressão do exército da autocracia russa e a
constituição no decorrer da guerra civil do Exército Vermelho
dos operários e camponeses foi um dos primeiros actos do Poder
soviético gerado pela Grande Revolução de Outubro na Rússia.
Todas as revoluções socialistas vitoriosas ulteriores, como é sobeja­
mente sabido, respeitaram as palavras proféticas de V. I. Lénine
que rezam: «Uma revolução vale algo, quando sabe defender-se»1.
Outro acto da Comuna de Paris que teve ressonância histó­
rica universal, foi a supressão do parlamentarismo burguês. «A
Comuna — escrevia M arx — devia ser não um corpo parlamen­
tar mas um corpo de trabalho, executivo e legislativo ao mesmo
tem po.. .»2
V . I. Lénine submeteu a uma crítica demolidora o parlamen­
tarismo burguês, pondo a nu todos os seus «vícios»: mostrou a
degeneração da liberdade de palavra e dos debates nos parla­
mentos burgueses em mero engano, pois os próprios parlamen­
tares não trabalham, não executam as leis adaptadas por eles
próprios e não são directamente responsáveis perante os seus elei­
tores.
Na sua obra, V. I. Lénine continuou e completou as referên­
cias críticas de K . Marx ao parlamentarismo burguês feitas ainda
em 1871 como as suas próprias, apontando-as conjtra os oportunis­
tas que apareceram mais tarde e se pronunciaram em defesa
deste parlamentarismo.
O autor chama a atenção para a atitude dialéctica de Marx
face ao problema do parlamentarismo burguês, sublinhado que
na falta de situação revolucionária, os comunistas devem saber

1 V. I. Lénine. Obras Completas, t. 37, p. 122, 5» ed. em russo.


2 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 252.

43
«utilizar mesmo a «pocigla» do parlamentarismo burguês»1, não
se deixando aos estados de espírito anarquistas, para a propagan­
da das suas ideias.
A revolução socialista põe termo ao parlamentarismo bur-'
guês. Isto não significa, sem dúvida, que se suprimem as insti­
tuições representativas e todo o sistema eleitoral. Pois, não. Po­
rém, o sufrágio universal, a partir daí, põe-se ao serviço do povo,
os seus representantes eleitos por via verdadeiramente demo­
crática podem ser amovidos de acordo com vontade do povo e
o vencimento dos funcionários públicos mais responsáveis está em
harmonia com o salário dos operários altamente qualificados.
As medidas do gênero V. I. Lénine qualifica de modo se­
guinte: «estas medidas democráticas simples e «compreensíveis por
si mesmas».. . servem.. . de ponte que conduz do capitalismo
para o socialismo»2.
Mas como é prudente V . I. Lénine nas suas comparações! Ao
usar a comparação com a «ponte», explica logo que as medidas
mencionadas relativamente à organização puramente política de
Estado só adquirem todo o seu sentido quando se trata da trans­
formação da propriedade privada capitalista em propriedade so­
cial, quer dizer, quando se trata da transformação econômica ra­
dical que determina a essência da revolução socialista.
Por isso o leitor já não pode alimentar as ilusões de que seria
possível construir esta «ponte» no quadro estreito das institui­
ções políticas representativas da sociedade burguesa, sem revolu­
ção violenta, sem expropriação da propriedade privada.
V. I. Lénine faz menção de uma outra circunstância extre­
mamente importante, quando se refere ao sentido da democratiza-
cão das instituições políticas, que é a atitude do campesinato
trabalhador. Dá a entender que apenas um número ínfimo de
camponeses se transforma nos Estados burgueses em burgueses
abastados ou em funcionários privilegiados, ao passo que a enorme
maioria do campesinato pronuncia-se pelo derrubamento do go­
verno burguês, sendo aliado da classe operária na revolução so­
cialista.
Segundo V. I. Lénine, um dos actos mais notáveis da Comuna
de Paris foi ter abolido todas as regalias materiais dos funcio-

1 Ver: V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 253.


1 V . I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, pp. 251-252.

44
nários. Foi uma medida que demonstrou com. maior evidência
para os operários e camponeses a viragem revolucionária no exer­
cício do poder. Para as massas, patenteia-se aqui a diferença
de princípios entre a democracia burguesa e socialista, entre o
Estado burguês e socialista.
O governo «barato», segundo a qualificação que V. I. Lénine
lhe atribuiu, prova de modo elucidativo e evidente à população
que é composto dos trabalhadores e trabalha nos seus interesses.
Mostra também que os numerosds funcionários que cumprem as
funções de registo, de inscrição e de controlo, etc., recebendo o
salário normal do operário, são, de facto, também trabalhadores.
J á há mais de 60 anos que na União Soviética se desenvolve
com êxito um sistema verdadeiramente democrático da organiza­
ção política da sociedade assente nos princípios do marxismo-
-leninismo. J 4 há mais de 60 anos que o socialismo real demonstra
aqui as suas vantagens em relação ao capitalismo, as vantagens em
atrair todo o povo para a direcção da sociedade e o Estado. O
desenvolvimento e a ampliação da democracia socialista reflecti-
ram-se na substituição consecutiva da Lei Fundamental da U RSS,
a sua Constituição.
Sendo a terceira na ordem cronológica, a vigente Consti­
tuição da U R S S adoptada em 1977, na véspera do sexagésimo
aniversário da Grande Revolução de Outubro, representa, desde
a discussão do seu projecto por todo o povo até ao conteúdo dela
que reflecte o seu carácter verdadeiramente democrático, o triun­
fo do povo trabalhador do País Soviético, o triunfo das ideias
leninistas sobre a essência autenticamente democrática do primeiro
Estado socialista no mundo.
Na véspera da Revolução de Outubro, V . I. Lénine escreveu
que os bolcheviques não alimentam ilusões a respeito da supres­
são do funcionalismo de uma só vez, em todo o lado e total.
Qualificando como sumamente instrutivo o método científico de
K . Marx que não inventa uma sociedade «nova», mas estuda o
processo do seu nascimento a partir da velha e examina as for­
mas de passagem da sociedade velha para a nova, procurando
tirar lições da experiência prática da Comuna de Paris,
V . I. Lénine orientou os revolucionários russos para acções reais,
dizendo que «não somos utopistas»1.

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 255.

45
E aqui segue uma definição clara da tarefa prioritária do
poder revolucionário iminente: os operários organizam a grande
produção com base naquilo que foi criado pelo capitalismo, uti-
lisando a experiência operária e observando a disciplina rigoro­
síssima apoiada pelo poder do Estado proletário, e transformam
os funcionários públicos em simples executantes deste poder amo-
viveis, responsáveis e modestamente pagos.
«Eis p or onde p od em os e devem os com eçar na realização da
revolução proletária»1, escreve V. I. Lénine. Eis por onde começa
também o definhamento progressivo, historicamente bastante lon­
go, do aparelho de Estado como tal e daquelas funções de fisca­
lização e contabilidade que inicialmente vão simplificando-se e
perdendo o seu cariz antagônico de classe e, com o passar do tem­
po, passam a ser executadas por todos, por turnos, tornando-se
depois um hábito geral e, por conseguinte, deixando de ser fun­
ções especiais de uma categoria especial de indivíduos.
Isto acontecerá no futuro, quando o problema da extinção
do Estado analisado pelos fundadores do comunismo científico
dentro de um contexto histórico vasto, estiver na ordem do dia
da Humanidade que, ao fim e ao cabo, resolverá os seus pro­
blemas agudos de desigualdade e da luta de classes, os problemas
relacionados com a prevenção das guerras devastadoras e os pro­
blemas da remodelação socialista à escala universal.
Ao se debruçar sobre a análise dos decretos da- Comuna de
Paris empreendida por K . Marx, V. I. Lénine dá destaque à
quesitão referente à organização da unidade da nação, à qual
dedica no seu livro um parágrafo inteiro.
Ao depurar as concepções marxistas sobre o centralísmo e
federalismo depois da revolução socialista das deturpações cras­
sas dos oportunistas que atribuíram grosseiramente a K . M arx o
ponto de vista absolutamente contrário, característico dos anar­
quistas pequeno-burgueses, V . I. Lénine frisa que K . Marx é,
antes de mais, centralista.
V. I. Lénine escreve que na revolução socialista a classe
operária apoiada pelo campesinato pobre deve destruir a máquina
do Estado burguês e tomar nas mãos o poder de Estado, unin­
do a acção de todas as comunas voluntariam ente organizadas
para a luta contra o capital e para restituir a toda a nação, a

1 V . I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 255.

46
toda a sociedade a propriedade privada dos caminhos-de-ferro,
das fábricas e da terra. V. I. Lénine designa esta reivindicação
revolucionária avançada por K . M arx com base na análise da
experiência da Comuna de Paris como centralismo proletário e
consequentemente democrático1.
Este centralismo distingue a organização socialista de Estado
da burgesia sobretudo pelo facto de se estabelecer com toda a
liberdade. V. I. Lénine dizia que não vinha sequer à ideia dos
falsificadores oportunistas do marxismo que é possível um cen­
tralismo voluntário, pois a história de todas as sociedades anta­
gônicas só conheceu a unificação coerciva e violenta das terras
em Estados centralizados.
Antes da época das revoluções socialistas, o centralismo dos
Estados burgueses era imposto e mantido pela força militar e
aparelho burocrático.
V. I. Lénine salienta uma vez mais que «Marx emprega inten­
cionalmente a expressão «organizar a unidade da nação» para con­
trapor o centralismo consciente, democrático, proletário, ao bur­
guês, militar, burocrático»2. A unidade da nação não é sujeita
à destruição, antes pelo contrário, à organização pela Constituição
Comunal — esta foi a afirmação de K . Marx completamente de­
turpada pelos oportunistas e restituída por V. I. Lénine na vés­
pera da Revolução de Outubro.
Deste modo, a revolução socialista, ao destruir a máquina de
Estado burguês, não abole de modo algum o poder central, mas
afirma-o como princípio de, unificação voluntária de todos os ter­
ritórios e províncias do país, de todas as forças sãs da sociedade,
como meio de resolver mediante esforços comuns as tarefas
árduas e multiformes da supressão das classes expropriadas e da
construção da nova vida.
Voltando mais uma vez a este importante postulado teórico
da doutrina marxista-leninista, pode-se dizer com toda a cer­
teza que sem a sua realização, o Estado soviético não poderia
encontrar forças suficientes para reprimir a contra-revolução
encarniçada interna e externa e, mais tarde, para derrotar o fascis­
mo, para reconstruir a economia nacional afectada duas vezes pe­
las guerras mundiais e para edificar o socialismo desenvolvido.

’ V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 255.


2 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 258.

47
Acrescentemos aqui que, considerando a questão da unidade
da nação no socialismo, V. I. Lénine, seguindo a ideia de K . Marx,
atribui ao conceito de «nação» o sentido de «povo», isto é, o
conjunto de habitantes de um país. Visto que a Co­
muna de Paris foi a obra do proletariado revolucionário
de França, país bastante homogêneo no sentido nacional,
estes conceitos em muitas obras de K . Marx e F. Engels que .
tratavam os assuntos da França e Alemanha, eram sinoními-
cos. O termo de «nação» não tinha para eles um matiz semântico
especial que lhe corresponde quando se tratava das características
que distinguem grandes grupos de pessoas que falam línguas dife­
rentes, têm histórias diferentes, formações econômicas diferentes
e assim por diante.
Num outro contexto, quando se trata dos caminhos para a
solução da questão nacional propriamente dita, isto é, da supe­
ração do jugo nacional e da discriminação, bem como concre­
tização da igualdade social e política de diferentes nacionali­
dades, V. I. Lénine não admite a identidade dos conceitos de
«nação» e de «povo». Por exemplo, quando sé tratava do povo
soviético com a sua estrutura multinacional, V . I. Léninie e os
seus seguidores evitavam o uso’da palavra «nação» como sinô­
nimo.
Analisando o problema do poder centralizado no Estado após
a revolução socialista, é necessário ter em conta mais uma circuns­
tância. Seguindo a ideia de K. Marx, V. I. Lénine .sempre acen­
tuou as vantagens de um Estado unificado e unitário da classe
operária relativamente a outras formas que pode assumir. No
entanto, nem K . M arx nem V . I. Lénine não excluíram que,
em determinadas condições e contextos históricos e para deter­
minadas nações e nacionalidades, a organização federada pode
sem a forma mais racional do ponto de vista das perspectivas ime­
diatas e longínquas da revolução socialista. É sabido que actual-
mente na U R SS, juntamente com as repúblicas socialistas prin­
cipalmente homogêneas quanto à sua composição nacional, desen­
volve-se com prosperidade a República Socialista Federativa
Soviética da Rússia. Outro exemplo, a República Socialista Fe­
derativa da Jugoslávia que tem forma federada de organização
de Estado.
Deste modo, a experiência histórica das revoluções socialistas
atestou o carácter dialéctico e flexível da doutrina marxista-le-

48
ninista nesta questão, demonstrando que para os comunistas, o
problema prioritário da revolução socialista é a transformação da
propriedade privada em social mediante o poder da classe ope­
rária que estabelece o seu domínio político e econômico. No que
respeita às formas possíveis deste poder, podem ser muito varia­
das.
Pois, a primeira forma política do Estado proletário tão minu­
ciosamente perscrutada por K * Marx, F. Engels e V. I. Lénine,
foi a Comuna de Paris, cuja causa foi continuada com êxito em
muitos países em épocas históricas posteriores.

COMO F. ENGELS COMPLEMENTOU K. MARX

No IV capítulo V. I. Lénine mostra como F. Engels, que vi­


veu ainda mais 12 anos apôs a morte do seu amigo e compa­
nheiro de luta pela grande causa da libertação dos trabalhadores,
interpretou e completou as conclusões de K . Marx referentes à
experiência da Comuna de Paris e defendeu a doutrina marxista
na luta contra as palavras de ordem anarquistas e oportunistas
sobre o Estado.
No entanto, aqui, o texto leninista não é uma simples re­
produção' das concepções de K . Marx e F. Engels depuradas das
falsificações. Como nos outros capítulos do livro, encontramos
aqui ideias que mantêm a sua actualidade até hoje, nas quais
o autor desenvolve em profundidade as perspectivas do Estado
socialista e da futura organização comunista apenas esboçadas
pelos seus precursores.
No IV capítulo, V. I. Lénine centra a sua atenção na forma
como F. Engels manifestou o conteúdo concreto do poder de Esta­
do instaurado pela classe operária revolucionária.
D á à primeira parte do capítulo o título «O problema da
habitação», pois F. Engels debruçou-se sobre esta questão em
várias obras, analisando as perspectivas concretas das transfor­
mações socialistas nesite campo.
F. Engels dá relevo à diferença que existe entre as posições do
marxismo e as dos ideólogos pequeno-burgueses em relação a esta
questão. Segundo F. Engels, os trabalhadores, enquanto proprie­
tários colectivos, apoderam-se de todos os instrumentos de traba­
lho, das habitações, da terra, etc. Em contrapartida, os teóricos
pequeno-burgueses propunham que cada camponês ou operário
«resgatasse» a habitação, a parcela e insitrumenitos de trabalho.
Neste aspecto é sumamente importante compreender a dife­
rença entre o marxismo e o socialismo pequeno-burguês relati­
vamente à atitude dos trabalhadores para com a propriedade
expropriada ou «resgatada» dos capitalistas e latifundiários du­
rante a revolução.
O que parece muito de grande interesse, à primeira vista,
isto é, arrebatar no decorrer da revolução a propriedade do grande
capital e entregá-la em benefício pessoal de cada trabalhador,
pelo que se pronunciam hoje em dia muitos ideólogos das massas
camponesas nos países que se libertam, leva ao fim e ao cabo ao
ressurgimento do capitalismo sob outras formas. Pior ainda, pois
estas medidas destroem as vantagens que oferece a produção de
grande envergadura já montada pelo grande capital, assim como
muitas conquistas da revolução popular, pois neste caso a unidade
de acções cede lugar à dispersão, à desarticulação dos esforços.
Não é por acaso que as medidas concretas esboçadas por
F. Engels e apoiadas por V. I. Lénine tenham sido levadas a efeito
durante transformações sócio-económieas no campo e na cidade
a seguir à tomada do poder pela classe operária e pelos seus alia­
dos nos países socialistas onde os trabalhadores se apoderaram
de todos os instrumentos de trabalho no decorrer da revolução.
É importante salientar que, no seu livro, V . I. Lénine faz
menção do postulado de F. Engels, embora em linhas gerais e
sem especificar formas concretas, no que diz respeito à mais
importante meta da revolução socialista, ou seja, a superação
da contradição entre o campo e a cidade.
V. I. Lénine aduz enunciados preciosos de F. Engels em que
este afirma que durante o período transitório o Estado da classe
operária, ao abolir a propriedade privada da terra e ao expro-
priar a grande propriedade habitacional deverá cobrar em benefí­
cio da sociedade a renda da terra e das habitações concedidas para
o usufruto individual ou familiar. Esta medida transitória que se
extinguirá ao longo de um período histórico, cedendo o seu lugar
ao usufruto a título gratuito, exige, afinal, determinadas formas
de aotividade de Estado, tais como o controlo público, a cobrança
das rendas, a regulamentação na distribuição, etc.
É natural que estas funções dos órgãos de Estado não pressu­
ponham nenhuma situação privilegiada para os funcionários que
as executam. São realizadas sob o controlo da classe operária

50
durante todo o período da existência do Estado que não pode
ser abolido «de hoje para amanhã» como o gostariam os
anarquistas. O Estado extingue-se progressivamente na medida em
que os homens da nova sociedade socialista se habituam a res­
peitar e cumprir livre e conscientemente as normas democráti­
cas e geralmente aceites da vida social e as do usufruto dos bens
sociais.
A segunda parte do capítulo V. I. Lénine dedicou à polêmica
entre K . Marx e F. Engels, por um lado, e os anarquistas, por
outro. Nesta polêmica dá destaque, antes de tudo, ao problema
da organização da repressão da resistência da burguesia e de
outras classes exploradoras durante a revolução socialista, isto
é, do problema do Estado socialista. Este Estado, sublinha mais
uma vez V. I. Lénine, surge no período transitório desde a con­
quista do poder pela classe operária até à afirmação completa das
bases do socialismo na sociedade sob a forma da ditadura como
órgão do poder autoritário do proletariado dominante.
Rejeitando qualquer Estado, qualquer poder e qualquer auto­
ridade e, por conseguinte, a necessidade da subordinação a esta
autoridade, os anarquistas privam a classe operária e todos os
trabalhadores da arma de luta contra as classes exploradoras que
por sua vez já a possuem.
A força pela qual no capitalismo a minoria se impõe à maio­
ria só pode ser substituída por uma outra. É impossível quebrar
a resisitência da burguesia com um só golpe e num só dia e instau­
rar logo uma igualdade social universal que não precise de um
poder organizado, do Estado. K . Marx, F. Engels e V. I. Lénine
repeliram decididamente esta ideia utópica dos anarquistas que
confundia a consciência das massas e as deixava desarmadas.
Ao provar que as concepções dos anarquistas sobre a revo­
lução são bastante confusas e não revolucionárias, F. Engels,
rebatendo-os, serve-se do exemplo da experiência da Comuna
de Paris. Põe claramente uma questão: deveria por ventura a
Comuna utilizar mais poder revolucionário de Estado do que o
tinha feito? O seu fracasso não se teria devido em parte à falta
de rigorosidade em relação à burguesia derrubada? A resposta a
estas perguntas só pode ser afirmativa.
V. I. Lénine deu uma elevada apreciação ao estudo concreto
da experiência da Comuna de Paris feito por F. Engels que pro­
vara de modo elucidativo a inconsistência absoluta do anarquis-
4* 51
mOj que não reconhecia nem o Estado nem a revolução. Com
efeito, a revolução exige que seja assumida uma atitude que tome
em consideração todas as condições do seu surgimento e desen­
volvimento, que sejam formuladas tarefas específicas no que res­
peita à violência, ao poder e ao Estado, o que os anarquistas não
querem fazer.
Das ideias de K . Marx referentes a este problema e citadas
no livro de V. I. Lénine torna-se claro que, se a luta política
da classe operária adquire formas revolucionárias, a mais impor­
tante tarefa desta classe consiste em estabelecer a sua ditadura
em substituição da da burguesia e não render as armas e «abolir»
o Estado como o gostariam os anarquistas, ou por não compreen­
derem a essência da revolução, ou por quererem traí-la de modo
consciente. K. Marx nunca deixou de realçar o carácter tran­
sitório e historicamente limitado da ditadura do proletariado.
Escreveu a este propósito: « .. .os operários dão ao Estado uma
forma revolucionária e transitória». Desenvolvendo esta ideia,
V. I. Lénine diz: «O proletariado só necessita do Estado durante
algum tempo»1.
Um argumento irrefutável que atesta a inconsistência da pa­
lavra de ordem anarquista da «abolição imediata do Estado» é
o facto de ser impossível abolir o Estado político antes de supri­
mir as relações sociais que o geram, sendo para o efeito necessários
a força, a organização e o tempo.
Nos primeiros capítulos do seu livro V. I. Lénine prestou
bastante atenção ao problema de como a revolução socialista
violenta cumpre a sua grande tarefa criadora em relação às mas­
sas trabalhadoras, reeducando-as, elevando a sua consciência so­
cial, inculcando-lhes o sentimento da sua identidade e organi­
zando-as à escala nacional. Tudo isto é acelerado muitas vezes pe­
lo bom funcionamento do poder de Estado da classe operária
vitoriosa dirigida pelo partido maxista-leninista.
No IV capítulo encontramos também a análise de uma outra
função, da função destruidora que compete à revolução violenta
(e é por isso que tem esta característica!) à luz do poder de
Estado da classe operária.
As palavras de F. Engels citadas por V. I. Lénine que dizem
que «uma revolução é . . . um acto pelo qual uma parte da popu­

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, pp. 262, 263.

52
lação impõe a sua vontade à outra parte. . .»* e os numerosos
enunciados de autoria de K . Marx e do próprio V. I. Lénine
não deixam a mínima dúvida de que os fundadores da teoria ver­
dadeiramente científica da revolução socialista estavam conscien­
tes de que esta revolução não era um processo idílico pacífico
e «mutuamente aceitável» de transmissão do poder de uma classe
para ouitra. Uma revolução é a*luta implacável que exige tempo
e a maior tensão das forças antes de que as vitórias dos traba­
lhadores em todos os campos da vida social abram caminhos
para a extinção progressiva das classes e do Estado socialista,
imprescindível nas primeiras etapas, bem como para a criação
de uma sociedade socialmente homogênea, sem classes.
O leitor contemporâneo que pense que a afirmação do socia­
lismo é uma obra rápida e relativamente simples está tão longe
da verdade como os ideólogos pequeno-burgueses e anarquizantes
dos tempos de° K . Marx e V. I. Lénine.
A vida mostra que, apesar da situação internacional radical­
mente diferente em função das vitórias da Grande Revolução de
Outubro e das revoluções socialistas posteriores, a luta pelo
socialismo em cada país exige todo um período histórico e uma
enorme tensão das forças da classe operária e dos trabalhadores
para reprimir as classes exploradoras, educar as massas e lançar
a base social, econômica e material da nova sociedade.
Na terceira parte do IV capítulo, V. I. Lénine menciona uma
célebre carta de F. Engels propositadamente esquecida pelos opor­
tunistas ao seu companheiro de luta Bebei na qual procura mo­
strar como os fundadores do comunismo científico procuraram
0 termo mais adequado para caracterizar o Estado qualitativa­
mente novo que aparece como resultado da revolução socialista.
Ao realçar que a classe operária vitoriosa necessitará durante
algum tempo do Estado para reprimir os seus inimigos, F. Engels
escreve que, quando esta tarefa for resolvida, o Estado deixará
de existir como órgão repressivo, permanecendo uma organização
social mais correspondente ao termo francês «comuna» ou alemão
«comunidade».
Mesmo a história fugaz da Comuna de Paris deu a F. Engels
a possibilidade de declarar que a Comuna «já não era um Estado
no sentido próprio»2. Comentando esta citação, V. I. Lénine mos­
1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 264. t
’ V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 265.

53
tra que a Comuna, ao contrário dos Estados que existiram
enteriormente, não reprimiu a maioria da população, mas a mi­
noria exploradora, derrubou o aparelho de Estado burguês e
não se serviu dos destacamentos especiais de homens armadps cria­
dos pelas classes exploradoras, mas armou todo o povo para
esmagar a resistência ao novo poder.
Assim, analisando as funções criadoras e destruidoras da 're­
volução socialista, os fundadores do marxismo-leninismo desta­
caram o seu objectivo principal do ponto de vista do progresso
histórico geral: criar uma sociedade sem classes em que os in­
teresses de cada um se conjugam harmoniosamente com os de
toda a sociedade.
São de grande importância para a orientação correcta dos
revolucionários nos problemas do desenvolvimento social os enun­
ciados de F. Engels reabilitados por V. I. Lénine das deturpa­
ções oportunistas nos quais, ao estudar as modificações do ca­
pitalismo, se auguram em certa medida as tarefas da luta revo­
lucionária na época do imperialismo.
Entre os problemas da organização de Estado abordados por
F. Engels quando criticou as concepções oportunistas da social-
-democracia de então, V. I. Lénine deu destaque ao problema
da apreciação teórica do imperialismo e da transformação do
capitalismo de concorrência livre em capitalismo monopolista de
Estado.
Actualmente, nos países capitalistas desenvolvidos não fal­
tam ideólogos e reformistas burgueses que afirmam que um
capitalismo como este não é mais que «o socialismo de Estado».
J á na época de V. I. Lénine havia bastantes teses de concepções
reformistas deste gênero. Hoje, proliferaram ainda mais. Por
isso, na luta pela consciência política dos trabalhadores dos'paí­
ses capitalistas e em vias de desenvolvimento e na luta pela
continuação da divulgação da ideologia marxista-leninista à es­
cala mundial, reveste-se de enorme importância a crítica às
concepções do gênero, quer se trate da teoria da «convergên­
cia», quer do «capitalismo do povo», ou do «socialismo demo­
crático», etc.
V. I. Lénine dá a entender que por muito planificada que
seja a regulação da produção praticada pelos monopólios nacio­
nais e mesmo multinacionais no imperialismo, esta não pode
trazer efeitos comparáveis com os da planificação completa. Daí

-54
a intervenção do Estado capitalista não ser capaz de eliminar
as causas sociais e econômicas das crises da superprodução, do
aproveitamento parcial crônico das capacidades da produção
das empresas e do desemprego gerados pelo sistema da explora­
ção de classe dos trabalhadores pelo capital.
Além disso, V. I. Lénine vê nesta centralização gigantesca
da produção e do capital e na fusão da máquina de Estado bur­
guês com o mecanismo econômico monopolista mais uma prova de
que o socialismo que há-de vir em resultado da revolução da
classe operária, está «próximo», «imediato» e «acessível».
Esta revolução expropria a produção monopolista socializada
em escala gigantesca e transforma-a da propriedade dos magna­
tas do capital em propriedade de toda a sociedade.
No que respeita à organização de Estado sob diversas for­
mas de república burguesa divulgadas amplamente no imperialis­
mo, V. I. Lénine revalorizou as teses sumamente valiosas de F. En­
gels relativas à república. Sublinha que Engels repete com es­
pecial relevo e desenvolve a ideia fundamental que passa co­
mo um fio vermelho através de todas as obras de Marx de que
«a república democrática é a via de acesso mais próxima para
a ditadura do proletariado»1.
Segundo V. I. Lénine esta república ainda não suprime nem
o domínio do capital e a exploração de classe, nem a luta de
classe que conduz inevitavelmente à revolução socialista. No
entanto, contribui para o desenrolar e o agudizar desta luta,
para o aprofundamento da contraposição entre as classes e cria
condições mais favoráveis para a educação política das massas.
A república mostra que existe a possibilidade de satisfazer in­
teresses vitais das massas trabalhadoras, ainda que nenhum Es­
tado capitalista o possa fazer plenamente.
A república democrática burguesa leva as massas à compreen­
são de que a única possibilidade de satisfazer os seus interesses
o mais plenamente possível é instaurar o poder da classe ope­
rária e assegurar a direcção das massas populares por esta.
É de notar que V . I. Lénine, ao escrever o livro no período
de desenvolvimento da Rússia no caminho democrático burguês,
quando se ponderava o problema da tomada do poder de Estado
pelo proletariado por via «pacífica» ou armada, examinou minu­

1 V. I. Lénine, Obras Escolhidas, t. 2, pp. 269, 270.

55
ciosamente estudos de F. Engels sobre os caminhos da revolução
no^ países com república ou «com uma muito grande liberdade».
Neste aspecto V. I. Lénine acentuou em especial que F. Engels
admitia, sendo suficientemente cuidadoso, a possibilidade do «de­
senvolvimento pacífico para o socialismo», reconhecendo que noí
países referidos «se pode conceber» um desenvolvimento deste
tipo1.
Não se deve considerar que os fundadores do marxismo-leni-
nismo faziam nas suas dissertações teóricas a contraposição en­
tre o desenvolvimento pacífico para o socialismo e o carácter
violento da revolução socialista. Para eles, o desenvolvimento
pacífico sempre era o mais desejável, pois permitia poupar mui­
tas vidas humanas. Contudo, apesar do seu carácter proble­
mático, era sempre considerado como uma forma da revolu­
ção violenta, uma forma que, em determinadas condições favo­
ráveis para a classe operária, mas muito raras, tornava pos­
sível evitar o derrame de sangue durante a tomada do poder.
Ao dedicar um capítulo especial aos complementos de F. En­
gels para a análise da Comuna de Paris feita por K . Marx,
V. I. Lénine volta a abordar a questão nacional quando examina
as vantagens do Estado democrático centralizado relativamente
à federação. Diz a este propósito que em Marx e Engels não
se encontra em lado nenhum «nem sombra de tendência para
eludir a questão nacional»2. Preferindo em princípio uma repú­
blica socialista única e indivisível e criticando o atraso histó­
rico dos Estados pequenos, reconhecem que uma república fe­
derativa é «um passo em frente» quando ajuda a resolver a questão
nacional e, assim, fazer avançar a causa do socialismo.
Actualmente, quando a rádio, televisão e imprensa falam
diariamente na luta do povo irlandês pela sua independência
nacional, mantêm o seu vigor as palavras de F. Engels sobre a
Inglaterra e que V . I. Lénine reproduz, nas quais se diz que, na­
quele país, apesar das condições geográficas, a história de mui­
tos séculos e a língua serem comuns, a questão nacional can-
dente permite supor que a forma da república federada seria
«um passo em frente» relativamente à organização existente.
Todavia, o livro de Lénine contém diversas declarações de

1 Ver: V . I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 269,


1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 271,

58
que, para o proletariado, seria preferível uma república demo­
crática centralizada e unitária. V. I. Lénine dá uma defini­
ção ao centralismo democrático, da qual se torna claro que este
último não tem nada a ver com o centralismo burocrático. O
centralismo democrático pressupõe uma auto-administração lo­
cal dos territórios livremente reunidos tão ampla que exclui to­
talmente todo o «comando» vindo de cima e qualquer forma de
burocratismo. *
Em seguida V. I. Lénine debruça-se sobre o problema do de-
mocratismo no Estado socialista, indaga este tema com base no
prefácio de F. Engels à obra de K . M arx A G uerra Civil em
F rança (1871), declarando-o como a «última palavra» do marxis­
mo sobre o Estado. Efectivamente foi a «última palavra» ate
que o próprio Lénine não prosseguisse o exame deste tema.
Dirigindo-se de novo aos ensinamentos da Comuna de Paris,
V. I. Lénine invoca o parecer de F. Engels de que a classe ope­
rária que tomou o poder em Paris, devia, por um lado, supri­
mir totalmente a velha máquina de opressão de Estado para não
perder o domínio conquistado em resultado da revolução e, por
outro, prevenir-se do ressurgimento da burocracia personalizada
pelos seus próprios deputados e funcionários.
V. I. Lénine enunciou claramente esta tarefa dúplice da
ditadura do proletariado na questão relativa à prevenção da
degeneração burguesa. Invocando F. Engels, V. I. Lénine dá a
entender que uma vez que o poder da classe operária instaura­
do mediante a revolução — a ditadura do proletariado — re­
presenta uma forma d e Estado, embora transitória, é real o pe­
rigo de os «servidores da sociedade», os funcionários, se transfor­
marem em senhores desta sociedade, o que acontecia inevitavel­
mente depois das revoluções sociais nos Estados precedentes.
Sem receio de ser repetitório, V . I. Lénine chama de novo
a atenção do leitor para a necessidade de procurar formas con­
cretas de desenvolvimento que excluam toda a possibilidade de
arrivismo e, por conseguinte, desaparece aquele «trampolim» do
qual se pode saltar de um cargo «honorífico», ainda que não
lucrativo, de funcionário de Estado para lugares altamente lu­
crativos na indústria, etc.
Tais «saltos» são muito freqüentes nos Estados burgueses
mais democráticos, mas são absolutamente inadmissíveis no so­
cialista.

57
Tanto V. I. Lénine como F. Engels admiraram as medidas
tomadas pela Comuna de Paris no sentido de prevenir subidas ver­
tiginosas. F. Engels especificou-as como «dois meios infalíveis».
Primeiro, nomear para cargos na administração, no tribunal e
na instrução pública pessoas eleitas por sufrágio universal que,
no caso da sua incompetência, podem ser revogadas pelos pró­
prios eleitores. Segundo, estabelecer para os funcionários de Es­
tado, mesmo dos escalões superiores, um vencimento que não
exceda o salário dos operários.
À luz da análise leninista coube-nos também mencionar aqui
estes decretos da Comuna de Paris, atendendo à importância
extraordinária das medidas concretas, evidentes para as mas­
sas e sujeitas ao seu controlo com vista à instauração de uma
democracia conseqüente que, segundo V. I. Lénine, «por um
lado, se transform a em socialismo, e, por outro lad o ,.. . re­
clam a o socialismo»1.
Esta ideia de Lénine tem um profundo sentido dialéctico.
Diga-se de passagem que V . I. Lénine regozijava-se bastante,
quando descobria nos enunciados de K . M arx e F. Engels «a dia-
léctica da história viva»2.
Em que consiste esta dialéctica?
Em primeiro lugar, revela-se na ligação orgânica entre as
medidas meramente políticas próprias de uma organização so­
cial consequentemente democrática (por exempilo, as eleições ge­
rais para preencher cargos-chave no aparelho de Estado) e as
medidas puramente econômicas que asseguram a democracia (por
exemplo, os vencimentos da ordem do salário médio do operá­
rio).
Aqui a dialéctica patenteia-se também no facto de estas me­
didas, que se tomam como conjunto único, serem inconcebí­
veis e impossíveis sob o capitalismo e significarem o funciona­
mento do sistema da direcção da sociedade nos princípios so­
cialistas., isto é, o socialismo. A sua concretização exige que as
funções da administração pública se transformem em operações
simples de registo e controlo acessíveis à maioria da popula­
ção. Isto significa que para a realização eficaz destas medidas é
necessário ilustrar e instruir a população de país de modo que

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 275.


2 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 275.

58
pelo seu nível de consciência social e preparação possa com­
preender e efectuar as tarefas do socialismo.
A dialéctica da análise leninista das medidas referidas e,
por conseguinte, das próprias medidas revela-se em que estas
determinam o princípio da organização do Estado e, ao mesmo
tempo, são as vias que conduzem à extinção e ao desaparecimento
progressivo da organização do Estado como tal.
Assim, V. I. Lénine poucos meses antes da Revolução de Ou­
tubro na Rússia utilizou ao máximo “a experiência histórica con­
creta de desenvolvimento da democracia socialista em França
no século passado para nortear o proletariado russo e o campe­
sinato trabalhador no caminho da procura e comprovação prá­
tica dos mais diversos métodos e formas de desenvolvimento da
democracia «.até ao fim ». A articulação das medidas políticas e
econômicas pode levar ao fim e ao cabo ao desaparecimento ou,
segundo a expressão de F. Engels, à «superação» do Estado socia­
lista e, consequentemente, da própria democracia.
A parte final do IV capítulo trata mormente o problema
da «superação» da democracia. V. I. Lénine adverte que o erro
mais comum é pensar que a democracia não passa além do re­
conhecimento do princípio da subordinação da minoria à maio­
ria. Entende aqui por democracia o Estado que reconhece este
princípio, isto é, a organização para a subordinação sistemática
de uns a outros.
Os comunistas são de opinião que o socialismo irá transforman-
do-se progressivamente em comunismo e ao fim e ao cabo ex­
tinguir-se-á a necessidade desta subordinação, pois as pessoas ha-
bituar-se-ão a respeitar as normas de convivência sociais sem coer-
ção e subordinação.
Quando F. Engels dizia que ao fim e ao cabo aparecerão
homens capazes de tirar para o monturo toda a «tralha do Es­
tado», teve em mente precisamente este hábito, cuja formação
exige um período histórico bastante prolongado, talvez, a vida de
várias gerações. Entre esta «tralha» encontrar-se-á também o sis­
tema do Estado democrático, pelo qual lutam hoje os revolu­
cionários e que no porvir comunista será prescindível.
Esta é a dialéctica da história viva; esta é a dialéctica da
doutrina marxista-leninista sobre o Estado.
Todavia, antes de que se forme nas pessoas o hábito de vi­
ver sem que uns rqprimam outros e para formar este hábito,

59
é preciso concretizar de modo organizado — isto é, através do
Estado — uma série de medidas econômicas bem ponderadas,
multilaterais e cientificamente fundamentadas.
O V capítulo V. I. Lénine dedicou à análise das bases eco-*
nómicas da extinção do Estado.
Mas, antes de submetê-lo a um exame, temos que abordar
uma questão que V. I. Lénine colocou como de passagem, sem lhe
dedicar um capítulo ou uma parte especial — a questão do parti­
do comunista.
A ideia da direcção das massas revolucionárias e, em pri­
meiro lugar, da classe operária pelo partido marxista está na
base de toda a obra leninista. É por isso que o livro foi es­
crito precisamente para armar a vanguarda progressista da clas­
se operária e todos os trabalhadores conscientes com a compreen­
são das tarefas de classe na revolução socialista iminente.
Seria em vão procurar nas páginas do livro uma análise
mais ou menos minuciosa das questões relativas à organização
do partido, à sua estrutura, etc., questões estas que, apesar de
terem muita importância revolucionária prática, V. I. Lénine
deixou de propósito em sombra.
No entanto, o autor não pode deixar de fazer alguma re­
ferência especial ao partido. Ao mencionar o enunciado de F. En­
gels sobre a imprecisão, do ponto de vista científico, da deno­
minação «social-democrata» em relação ao partido com pro­
grama comunista, V. I. Lénine fala do partido bolchevique e
opta pelo nome que, devido a uma circunstância ocasional, o
partido criado por ele ostentava, o partido dos bolcheviques. Este
nome apareceu pela primeira vez em 1903, quando no seu Con­
gresso de Bruxelas-Londres o Partido Operário Social-Democra-
ta da Rússia se dividiu e os partidários conseqüentes de V. I. Lé­
nine que obtiveram a maioria (em russo, «bolchinstvó»— N. do
T r.), constituíram um partido proletário de novo tipo chamado
a partir daí «bolchevique».
Fazendo lembrar as palavras de F. Engels que dizia que
para ele e K . M arx o mais importante não era o nome do partido,
mas sim a direcção acertada em que se desenvolvia, V. I. Lénine
refere mais ou menos o mesmo em relação ao partido bolche­
vique. Mas enfim não de todo!
Primeiro, explica com toda a razão que a palavra «bolche­
vique» que soa um pouco estranho mesmo na língua russa, tor­

60
nou-se honrosa entre todo o povo da Rússia em resultado das
perseguições por parte da democracia pequeno-burguesa «revolu­
cionária» em Julho-Agosto de 1917, cujo alvo foi o partido
bolchevique que defendia consequentemente as suas posições re­
volucionárias.
Segundo, V. I. Lénine sublinha que naqueles meses o par­
tido deu um grande passo histórico no seu desenvolvimento.
Por isso, não havia motivos sérios para alterar bem pouco antes
da revolução o nome do único partido consequentemente re­
volucionário no país que ganhou um grande prestígio entre o
povo. V. I. Lénine propôs uma espécie de «compromisso»: de­
signar o partido por comunista, conservando entre parênteses «dos
bolcheviques».
É sabido que o partido permaneceu com este nome durante
muitos anos e só desde 1952 se passou a chamar Partido Comu­
nista da União Soviética.
No seu livro V . I. Lénine não disse muitas coisas sobre
o próprio partido. Mais tarde, em outros livros e artigos apre­
sentou uma análise profunda do papel histórico do partido co­
munista na preparação e realização da revolução socialista e
na edificação do socialismo, assim como de todos os aspec­
tos e princípios fundamentais da actividade do partido e das
perspectivas da sua evolução.
Da nossa parte cumpre-nos salientar que uma das mais im­
portantes lições da Comuna de Paris sobre a qual K . Marx
e F. Engels escreveram e falaram frequentemente, foi uma con­
clusão certa e categórica: para a realização sucedida e o desen­
volvimento da revolução socialista é imprescindível um partido
revolucionário da classe operária armado com a concepção cien­
tífica do mundo desta classe, bem organizado e que saiba orga­
nizar as massas para acções revolucionárias.
Ainda que já nos meados do século passado K . Marx e F. En­
gels declarassem a necessidade de um partido deste tipo, após a
derrota da Comuna de Paris este imperativo tornou-se ainda mais
patente e premente.
V. I. Lénine conhecia perfeitamente as concepções de Marx
e Engels sobre o partido proletário e punha-as em prática já
em novas condições e tendo em conta as particularidades do
seu próprio país. Visto que o capítulo sobre as revoluções de­
mocráticas burguesas na Rússia não saiu da sua pena, tertios

61
à nossa disposição «apenas» uma análise leninista da plataforma
teórica e ideológica do partido que proclamou como o seu ob-
jectivo a luta pelo comunismo.
Resta portanto falar da importância desta análise para a
actividade do partido e para a evolução correcta do processa
revolucionário dirigido por este. Constatamos apenas que sem
conhecimento teórico das leis da revolução os seus realizado­
res estão condenados a ser vítimas e, a maior parte das vezes,
a sofrer derrotas.
Ao fazermos este pequeno mas importante desvio ao próprio
texto leninista, voltamos novamente às páginas do livro que nos
apresentam um panorama cientificamente fundamentado do de­
senvolvimento histórico rumo ao comunismo através da revolu­
ção socialista.

A PASSAGEM DO CAPITALISMO PARA


O COMUNISMO

Assim, estimado leitor, já estamos no V capítulo da obra


leninista. Ao nosso ver, apesar da enorme abundância de ideias
que impregna todo o texto do livro, este capítulo, mais que
outros, contém brilhantes provas da singularidade do pensamento
teórico leninista.
Neste capítulo o que é particularmente sensível é que a
revolução socialista já era iminente e que abriria uma nova
era na vida da Humanidade. A teoria científica que V. I. Lénine
desenvolve neste capítulo, baseada no vigor dos seus conhecimen­
tos políticos e na sua intuição política, apresenta-se aqui cheia
de plenitude e de força de convicção.
O autor intitulou este capítulo «As bases econômicas da
extinção do Estado». Só um verdadeiro cientista poderia chamar
assim este capítulo. Na sua investigação histórica e materialista
do desenvolvimento social V . I. Lénine procura e encontra as
origens das mudanças futuras e deduz as leis gerais das trans­
formações vindouras. Indaga as perspectivas cientificamente fun­
damentadas da instituição da nova formação sócio-económica e
leva o leitor à compreensão das tarefas imediatas da luta re­
volucionária pelos ideais comunistas.
Este capítulo contém importantes postulados sobre a evo­
lução política, social e econômica da sociedade desde a revi­

62
ravolta revolucionária que destrói o sistema capitalista das re­
lações até à fase em que se realiza plenamente o princípio co­
munista.
Não foi por acaso que V. I. Lénine destacou a unidade e
a interligação entre as medidas econômicas e políticas que per­
mitem prevenir o restabelecimento do capitalismo e afirmar os
princípios do socialismo na vida social e econômica. E, por isso,
dirige-se de novo à experiência tia Comuna de Paris.
O marxismo-leninismo como doutrina materialista e não utó­
pica parte de que são as relações entre pessoas na produção
que determinam a face da sociedade e a etapa do seu desenvol­
vimento histórico. O aspecto social e econômico mais importante
deste problema é a retribuição do trabalho.
No capitalismo, é precisamente o trabalho não retribuído
que constitui a fonte da mais-valia, a fonte dos lucros da bur­
guesia. E por isso a tarefa mais importante da revolução socia­
lista é suprimir as relações sociais que permitem à burguesia
explorar os operários, isto é, apropriar-se de produtos do trabalho
não remunerado de outras pessoas, enriquecer-se em virtude dis­
so e, ainda mais, dominar, pondo ao serviço da sua classe todo
o mecanismo de Estado.
Depois' de ter considerado o princípio da retribuição do tra­
balho dos funcionários do aparelho de Estado na sociedade so­
cialista que, em articulação com o princípio das eleições gerais
para os cargos mais responsáveis nos órgãos de soberania,
torna eficiente o combate ao burocratismo, V. I. Lénine passa
para a consideração dos princípios gerais da retribuição do tra­
balho em diversas fases de desenvolvimento da nova formação
social e econômica.
Por muito importantes que sejam o factor político e alguns
outros factores respeitantes às relações humanas, o factor domi­
nante na sociedade foi e continua a ser o econômico. E a pró­
pria história dá numerosas provas disso.
Se lermos atentamente o texto do V capítulo da obra leni­
nista, veremos que por detrás dos raciocínios sobre a democracia,
o futuro do sistema estatal e muitas outras questões, transparece
a questão dos princípios econômicos nas relações humanas. Este
problema às vezes forma o fundo, o fundamento para a análise
das instituições políticas e outras da nova estrutura social.
Graças a provas leninistas irrefutáveis, o leitor já está pre-.

63
parado para compreender o desenvolvimento social através do pris­
ma materialista. Portanto, não é de estranhar que o panorama da
transição revolucionária do capitalismo para o comunismo que
V. I. Lénine mostra, apresenta-se sob um título um pouco aca­
dêmico mas destituído de matizes utópicos.
Lembremos a propósito que a obra fundamental de toda a
vida de K . Marx na qual se demonstrou com vigor científico o
advento inevitável do comunismo, se intitula O Capital, a pa­
lavra que põe em relevo a essência antagônica do mecanismo
social e econômico das relações sociais sob o capitalismo que
predetermina a supressão revolucionária deste regime e o sur­
gimento sobre as suas ruínas de uma sociedade comunista justa.
Quando V. I. Lénine estuda a questão marxista das bases
econômicas «do desenvolvimento futuro do comunismo futuro»,
inicia a sua análise, concentrando a atenção nas errôneas inter­
pretações das concepções de K . Marx e F. Engels sobre as per­
spectivas do Estado sob o novo regime social. Acentua mais uma
vez o desenvolvimento histórico prolongado e duradouro que é
imprescindível para que os trabalhadores que realizam a revolu­
ção socialista possam afirmar completamente os nobres princí­
pios comunistas em todas as esferas da vida social.
V . I. Lénine demonstra que a teoria de K . Marx é virada prio­
ritária e principalmente para o capitalismo, sendo focalizada na
análise multiforme da sociedade burguesa em desenvolvimento:
desde o seu surgimento até à sua destruição inevitável; É natural
que, ao predizer cientificamente a revolução socialista confirma­
da na prática pela Comuna de Paris, K . M arx lance o seu olhar
para o futuro que se seguirá após a supressão do capitalismo.
Esta é a lógica do pensamento de K . M arx virada para o
futuro comunista e destacada por V . I. Lénine. Baseando-se nas
leis do desenvolvimento da sociedade burguesa, chega a definir
os princípios mais gerais da futura organização social sem es­
pecificar as suas formas concretas.
O comunismo decorre historicamente do capitalismo e nasce
sob a influência da força social que o capitalismo gerou — da
classe operária revolucionária que é consciente de que, em fun­
ção de ser o produtor principal da riqueza social, lhe cabe o
direito histórico de determinar as leis da vida social.
Na época em que K . Marx viveu, nos países mais evoluídos,
o capitalismo já tinha adquirido contornos bastante nítidos pa-

64
ra, não obstante as formas de Estado variadas e diversificadas,
poder determinar as suas características mais gerais e substan­
ciais. Uma destas características gerais descobertas por K . Marx
e destacadas por V. I. Lénine é a utilização do Estado pela classe
exploradora para oprimir as massas trabalhadoras exploradas e
manter em condições inais ou menos estáveis o funcionamento da
sociedade burguesa. ►
K . Marx opõe a natureza do Estado seu contemporâneo ao
futuro «em que, segundo ele, a su a ja iz de hoje, a sociedade bur­
guesa, terá morrido»1.
Mas esta «raiz» não morre logo. A sociedade burguesa em
que as relações de exploração estão presentes em todas as cé­
lulas e cuja ideologia se infiltra e inculca na consciência das
pessoas, já por estas razões (e em realidade por muitas outras
ainda) não pode desaparecer num belo dia da face da terra,
cedendo o seu lugar à sociedade socialista.
Em resultado da crise das contradições antagônicas de clas­
se, na sociedade capitalista efectuar-se-á inevitavelmente a re­
volução. Mas, o que acontecerá com pessoas vivas, os membros
desta sociedade? Trata-se dos operários, a classe que o próprio
capitalismo gerou como a sua principal força produtiva e que se
tornará, citando K . Marx, o «coveiro» do capitalismo; trata-se
dos camponeses explorados pelos latifundiários e pelo grande
capital; trata-se da intelectualidade que em todos os países ca­
pitalistas aumentou em número devido ao desenvolvimento im­
petuoso da ciência e técnica; trata-se enfim dos representantes
da burguesia que embora não sendo numericamente muitos, se
viram forçados a subordinar-se à força que expropria a sua pro­
priedade; trata-se também de muitas outras camadas da popu­
lação.
Esta enorme massa de pessoas tão diferentes quanto à sua
posição social e econômica, à sua educação e ao nível cultural
que é posta pela revolução em estado de actividade política,
não pode transformar-se rapidamente numa sociedade homogê­
nea em que as pessoas possuam o nível de educação mais ou me­
nos igual e se dirijam por normas morais iguais para todos. Nem
é possível pôr rapidamente em ordem a esfera material a téc­
nica da sociedade para que corresponda completamente ao ideal

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 279.

5 -1 6 7 2 65
comunista. Eis porque V. I. Lénine afirma clara e categoricamente
que todá a teoria de desenvolvimento, toda a ciência estipula
que «historicamente tem de haver, indubitavelmente, um está­
dio particular ou uma etapa particular de transição do capitalis­
mo para o comunismo»1.
O conteúdo dos processos multifacetados do desenvolvimento
da sociedade em geral e as inúmeras modificações das classes e
das pessoas individualmente consideradas durante esta transição
é imensamente rico quanto à substância e às formas. V. I. L é­
nine retira das investigações de Marx sobre esta questão só aque­
la parte que se refere ao Estado. Reabilita o enunciado de Marx
que diz que ao período de transformação revolucionária do ca­
pitalismo em comunismo corresponde um período de transição
política e que esta transformação só é viável nas condições do
funcionamento do Estado, cuja essência há-de ser a ditadura
revolucionária da classe operária.
É justamente esta «vizinhança» histórica imediata das duas
formações sociais radicalmente diferentes (uma, capitalista que
assenta na exploração de uma classe por outra, do homem pelo
homem e, outra, comunista que assenta na associação voluntá­
ria dos trabalhadores livres e iguais) que determina a necessi­
dade do funcionamento temporário do Estado em que os tra­
balhadores devem realizar a sua ditadura e aplicar medidas de
violência em relação a todos aqueles que não querem, aceitar os
princípios comunistas na conduta e nas relações com outras pes­
soas ou com toda a sociedade.
O período de transição é determinado pelo papel que desem­
penha a classe operária na sociedade capitalista evoluída e pelo
carácter inconciliável das contradições entre esta e a burguesia.
Com efeito, o grande capital concentra cada vez mais a clas­
se operária em grandes empresas que às vezes têm suas filiais
no estrangeiro. Em função do progresso técnico e científico, esta
classe possui o nível mais elevado de conhecimentos técnicos
e qualificação. Esta classe participa nas eleições gerais e na vida
política dos Estados burgueses republicanos. Esta classe toma cada
vez mais consciência da sua posição real: é o produtor da riqueza
social, mas ao mesmo tempo (devido às relações sociais domi­
nantes) é explorada pela classe burguesa.

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 280.

66
O crescimento da identidade de classe do proletariado na so­
ciedade burguesa, para o qual contribuiu e continua a con­
tribuir a divulgação das ideias do marxismo-leninismo nas mas­
sas, faz dele a força mais revolucionária e avançada da socie­
dade. E a partir daí torna-se mais coeso e organizado não só
em virtude dos factores externos, isto é, do imperativo da grande
produção capitalista, como tambéjji sob a acção dos factores in­
ternos, isto é, das suas próprias necessidades. Organiza-se como
classe, agrupando inicialmente operários por sectores industriais
e, depois, em sindicatos nacionais e internacionais. Organiza-se
como classe cuja vanguarda forma os seus próprios partidos po­
líticos.
É a própria lógica da história das sociedades burguesas — as
crises arruinadoras, o desemprego crônico, a carestia da vida
para os operários e todos os trabalhadores, o crescimento ver­
tiginoso dos lucros capitalistas, a militarização e as guerras cada
vez mais assoladoras que o imperialismo gera que convencem a
classe operária da necessidade de suprimir os capitalistas como
classe, destruir a máquina de Estado burguês e instaurar revo-
lucionariamentel uma nova ordem social ao serviço do proleta­
riado.
Esta seqüência do desenvolvimento da sociedade burguesa
foi irrefutavelmente provada pelo génio de K . Marx, F. Engels e
V. I. Lénine e confirmada definitivamente por todo o curso de
acontecimentos, pelas revoluções socialistas iniciadas com a Gran­
de Revolução de Outubro em 1917 na Rússia e pelo surgimen­
to do sistema socialista mundial e um numeroso grupo de países
de opção socialista.
V. I. Lénine expõe em forma sinóptica os pontos básicos
do comunismo científico sobre a inevitabilidade da transição
revolucionária para o comunismo e a necessidade objectiva do
Estado da classe operária.
Em seguida, passa a examinar as características principais
e determinantes deste Estado, a começar pela sua atitude face
à democracia. Nesta análise, primeiro, compara a democracia
no quadro da ditadura da burguesia e aquela que se estabelece
e desenvolve sob a ditadura do proletariado; segundo, caracte­
riza duas funções da ditadura da classe operária — criadora
e destruidora— , abordando através do prisma destas funções
as particularidades principais da democracia socialista.

67
V. I. Lénine demonstra que na sociedade capitalista mesmo
o democratismo mais evoluído continua a ser no essencial um
democratismo para a minoria, os detentores da riqueza e as
classes exploradoras, afastando praticamente a maioria da po-’
pulação da participação na vida política.
Todo o mecanismo da democracia burguesa é preparado e
funciona do modo que a cada passo se vejam as limitações do
democratismo. Trata-se aqui das limitações nos censos eleito­
rais e dos obstáculos que se põem para não admitir comícios
e manifestações dos operários, assim como da organização ca­
pitalista da imprensa diária, rádio e televisão. Tomados no con­
junto, constituem a barreira que a classe burguesa dominante
cria com fim de afastar as massas populares da participação
activa no exercício da democracia.
V. I. Lénine cita mais de uma vez K . Marx que desmascarou
o mecanismo da democracia burguesa sob a forma de parlamenta­
rismo burguês. A essência desta democracia consiste em que
uma vez de tantos em tantos anos as classes oprimidas são
autorizadas a decidir através de eleições «democráticas» gerais
qual precisamente dos representantes da classe opressora e do­
minante as vai representar no parlamento.
V . I. Lénine qualificou este enunciado revelador de K . Marx
como magnífico, acrescentando que nos países capitalistas os
assuntos realmente importantes e que cabem ao parlamento são
decididos nos bastidores, nas comissões e em outros órgãos de
trabalho» do Estado burguês, resumindo-se o papel do parla­
mento a ser exposto à atenção do público que presencia um es­
pectáculo político sobre a suposta representação popular.
A democracia burguesa é inteiramente hipócrita e falsa. O
desenvolvimento da democracia na sociedade burguesa não pode
ser pacífico e desembaraçado sempre pela linha ascendente até
à sua «expressão plena e universal» como o tentam apresentar
os políticos burgueses e oportunistas no movimento operário.
O verdadeiro progresso da democracia só é possível gra­
ças a acções revolucionárias da classe operária organizada, só
graças à revolução socialista e à ditadura do proletariado.
Ao estabelecer o seu poder por via revolucionária, a classe
operária não pode ampliar mecanicamente a democracia, alar-
gando-a a todos os membros da sociedade. Ampliando o demo­
cratismo a uma escala inédita, ganhando para a gestão da eco-

68
nomia nacional todas as forças sãs da sociedade e constituindo
novas instituições políticas que põem em prática novas normas
das relações sociais, a classe operária impõe uma série de ex-
cepções às liberdades em relação aos opressores, exploradores e
parasitas.
A ditadura da classe operária aplica em relação a eles a
coerção econômica, arrebatando-lhes a propriedade de fábricas,
prédios, terras, privando-os em vários países da sua represen­
tação política e esmagando as suas acções armadas em caso de
resistência. E esta opressão é feita naturalmente por via armada.
Em suma, a ditadura da classe operária é a liberdade para
todos os trabalhadores e, ao mesmo tempo nenhuma liberdade
para exploradores. Tal é a democracia do período de transição
do capitalismo para o comunismo.
Para libertar a Humanidade da escravidão assalariada, é
preciso esmagar à força a resistência daqueles que impõem esta
escravidão nos seus interesses. E isto só é possível com apoio do
Estado que liberta a classe operária e as massas trabalhadoras.
Só na sociedade comunista quando desaparecerem completa­
mente as classes em conseqüência da extinção das diferenças
entre grandes grupos de pessoas pela sua relação diante dos
meios sociais de produção, será viável realizar uma democra­
cia efectivamente plena e sem excepções.
Simultânea e identicamente com este processo realiza-se o
processo de extinção do Estadp. Este inicia-se já nas primeiras
fases de desenvolvimento da sociedade socialista. As pessoas li­
vram-se da exploração capitalista e vão habituando-se pouco
a pouco a observar as normas simples e vetustas de respeito
mútuo e as relações de camaradagem. O respeito por estas nor­
mas adquire cada vez mais um carácter voluntário, sem apli­
cação da violência e, ao fim e ao cabo, o aparelho da violência,
o Estado, acaba por deixar de ser necessário.
Sem trocar a terminologia de Marx e Engels, V. I. Lénine
também qualifica este processo progressivo que termina com a
formação do hábito de viver à maneira comunista, como «extin­
ção» ou «adormecimento» do Estado, achando convenientes estes
termos por reflectirem a evolução histórica natural baseada nas
leis objectivas vigentes na sociedade.
É verdade que o carácter objectivo desta evolução não ig- ’
nora senão pressupõe o aumento do factor subjectivo, quer di­

69
zer, o'desejo profundamente consciencializado e por isso acen­
tuado das pessoas de fazer aproximar o porvir comunista. As
condições materiais de vida sob o regime da propriedade so­
cial dos meios de produção, a elevação do nível cultural das
massas trabalhadoras e o desenvolvimento da consciência social
norteado pelo partido comunista, tudo isto, tomado em con­
junto, constitui, segundo V. I. Lénine, a base do processo «es­
pontâneo» da «extinção» do Estado.
V. I. Lénine mostra-nos três definições qualitativas da de­
mocracia e três definições qualitativas do Estado que se suce­
dem no processo do desenvolvimento histórico da sociedade, a
começar pelo estádio capitalista.
Com respeito à democracia estas definições qualitativas da
sua substância histórica social são as seguintes:
— sob o capitalismo, a democracia (leia-se a igualdade) é
limitada, falsa e é só para os ricos;
— sob a ditadura do proletariado, produto da revolução socia­
lista, a democracia torna-se pela primeira vez a democracia
para o povo, para a maioria, raprimindo ao mesmo tempo os
exploradores, a minoria;
— no comunismo, a democracia já é tão completa, plena e
vasta que, por assim dizer, deixa de ter limites visíveis e desapa­
rece deste modo por si própria.
Quanto ao Estado, estas definições apresentam-se como se­
guintes:
— no capitalismo, o Estado na sua expressão plena e brutal
apresenta-se como uma máquina especial que serve para oprimir
uma classe por outra e, mais ainda, a maioria pela minoria;
— sob a ditadura do proletariado, o Estado ainda é indispensá­
vel como instrumento repressivo contra os exploradores, mas desta
vez a repressão da minoria pela maioria. J á se trata do Estado
transitório, pois a sociedade prescinde de uma máquina gigan­
tesca para reprimir os exploradores com o seu desaparecimento;
a democracia neste período histórico abrange a maioria esma­
gadora da população;
— sob o comunismo, o Estado torna-se inútil, pois na socie­
dade deixam de existir classes ou consideráveis grupos de pes­
soas que devem ser reprimidos.
Com a supressão total e definitiva da exploração e penú­
ria das massas, deixará de haver protestos e conflitos sociais que

70
imprimem a necessidade do Estado. É uma realidade que os
homens não são anjos e até alguns podem cometer actos anti-
-sociais, mas não haverá motivo algum para o Estado continuar
com fim de rectifícá-los, pois o meio que os rodeia cumprirá
esta tarefa.
Ao sublinhar que o quadro geral da evolução futura da
Humanidade não é utópico, V* I. Lénine passa a examinar a
questão das fases (degraus, etapas) inferior e superior da socieda­
de comunista.

AS BASES ECONÔMICAS DA SOCIEDADE


SOB O SOCIALISMO

V. I. Lénine abre a descrição da organização econômica da


sociedade que surge sobre as ruínas do regime burguês destruí­
do pela revolução socialista, com a reprodução dos cálculos rea­
listas de K . Marx de com o se distribui nesta sociedade o pro­
duto social criado por todos os trabalhadores.
K. Marx não tem nenhuma intenção de enganar as pessoas
com promessas utópicas primitivas de que todo o produto do tra­
balho passará imediatamente para a disposição do trabalhador.
Sob o socialismo que, segundo K . Marx, representa a primeira
fase — e portanto a inferior — da sociedade comunista, a vida
econômica organiza-se de modo a que uma parte da riqueza
criada pelos trablhadores passe imediatamente à disposição deles
para o seu consumo pessoal. Entretanto, a outra parte desta
riqueza passa a construir fundos sociais de produção e consumo
individual. Os fundos sociais são os recursos destinados à amplia­
ção da produção, à amortização do equipamento e das máquinas,
ao fundo de reserva, etc., assim como as verbas destinadas à
organização da administração, à construção de escolas e insti­
tutos, hospitais e casas para velhos e assim por diante.
Desde o início o marxismo orienta todos para que apre­
ciem sensata e objectivamente as condições e as necessidades do
desenvolvimento econômico da sociedade socialista. A condição
capital deste desenvolvimento é a propriedade social dos meios
de produção que deixaram de ser a propriedade de um punhado
de pessoas.
A sociedade retribui o trabalho de cada um de acordo com
a quantidade de produtos fabricados, descontando apenas utna

71
quantia que fica nos fundos sociais. V. I. Lénine sublinha que
no socialismo cada um recebe uma parte do produto social equi­
valente à sua parte de trabalho social (salvos os descontos acima
referidos).
Será justo isto?
Os fundadores do marxismo-leninismo frisam que este sistema
de distribuição dos bens de consumo segundo o trabalho indivi­
dual ainda não pretende à igualdade social completa. Esta igual­
dade só será viável quando a sociedade puder criar condições em
que cada um possa trabalhar segundo as suas capacidades e re­
ceber segundo as suas necessidades.
Aliás, mesmo uma reviravolta tão radical como é a revolu­
ção socialista, não é capaz de afirmar imediatamente este prin­
cípio superior de justiça social.
K. Marx, F. Engels e V. I. Lénine apenas esboçam o desen­
volvim ento da sociedade após a revolução, baseando-se na aná­
lise da sua fase inicial. Visto que a sociedade socialista nasce,
decorre da capitalista, tem ainda vestígios da sociedade velha
nos princípios econômicos e morais e na consciência das pes­
soas.
A supressão do capitalismo pela via revolucionária não cria
de imediato as premissas econômicas para que as pessoas tra­
balhem para o bem da sociedade sem quaisquer normas jurí­
dicas. E esta norma determinante é a norma de realização igual
de trabalho na distribuição do produto social. O Estado socialista
é chamado a velar pelo cumprimento desta norma.
Ora, sob o socialismo ao Estado competem funções impor­
tantes e socialmente necessárias, tais como a protecção da pro­
priedade social dos meios de produção que previne a exploração
do homem pelo homem e a protecção do princípio de igualdade
na distribuição dos produtos segundo o trabalho.
Todavia, esta igualdade, como já foi dito, não é de todo
justa. Porquê?
Porque o direito a salário igual por trabalho igual que o
socialismo proclama não leva em conta o facto de as pessoas
não serem iguais pelos seus dons naturais, em função do seu
estado civil, da diferença entre o trabalho manual e intelectual e
por muitos outros motivos. K . Marx, F. Engels e V. I. Lénine
como homens de visão realista não puderam desconsiderar a
desigualdade necessária e inevitável das pessoas que convém ter

72
em conta quando se trata da distribuição dos bens materiais
entre os elementos trabalhadores da sociedade.
Porém, a sociedade socialista tomada em sua forma original,
tal como esta nasce «depois de longas dores de parto» das en­
tranhas do capitalismo, ainda não pode ter em conta estas di­
ferenças. E por isso, ainda não é capaz de eliminar esta im­
perfeição no sistema de distribuição dos produtos de trabalho
de acordo com o princípio de igualdade do trabalho. Só o
comunismo é capaz de efectuá-lo. •

A PASSAGEM PARA A FASE SUPERIOR DO COMUNISMO

A quarta parte do V capítulo V. I. Lénine dedicou especial­


mente à fase superior da sociedade comunista. Contudo, um lei­
tor atento descobrirá de imediato que esta parte, a par da
característica gêral da segunda fase, do comunismo, contém uma
análise minuciosa da sociedade socialista. Dir-se-ia que o autor
não se podia abster de explicar uma vez mais ao leitor com que
com eça o desenvolvimento comunista, como organizá-lo, o que
é que se exige na próxima etapa, na primeira fase a seguir a
revolução socialista, das pessoas que entram nas condições —
até à data sem precedentes — da vida social, as condições que
as próprias pessoas hão-de determinar.
V. I. Lénine detém-se mais de uma vez nas medidas que a-
plica o poder revolucionário com fim de fixar princípios socia­
listas na vida econômica e nos-métodos com que os trabalhado­
res e todo o povo realizam o controlo sobre a sua observância.
Primeiro, são questões referentes à política econômica propria­
mente dita. Segundo, são questões referentes à democracia so­
cialista que, no aspecto político, assegura a mais plena reali­
zação dos princípios e leis econômicas.
No entanto, mesmo a materialização multilateral e ideal dos
princípios socialistas não é ainda o objectivo final dos comu­
nistas. É apenas um degrau histórico necessário para livrar a
sociedade da ignomínia da exploração burguesa, das tradições e
vestígios do capitalismo, das suas reminiscências no novo siste­
ma de organização da vida humana com fim a seguir em frente.
Até onde avançará a sociedade socialista? Que característi­
cas irá adquirindo com a transformação em sociedade comunista
propriamente dita? Que ideais do comunismo atraem os lu-

73
tadores pela justiça social a partir do momento em que se
transforma de utopia em ciência, em doutrina revolucionária
viva, que é o marxismo-leninismo?
Invocando K. Marx, V. I. Lénine proporciona respostas mais -
gerais a estas perguntas. As suas respostas não contêm nem re­
comendações concretas, nem descrição pormenorizada das for­
mas possíveis, nem os prazos de advento da segunda fase do
comunismo. Supõe-se que é a própria vida que dará respostas
a todas estas perguntas.
Mas mesmo assim pode-se perceber em princípio a panorâ­
mica do futuro comunista. O princípio econômico fundamental do
comunismo estipula: «De cada um segundo as suas capacidades,
a cada um segundo as suas necessidades!»1. O princípio social
fundamental da associação comunista das pessoas estabelece: «O
livre desenvolvimento de cada um é a condição para o livre
desenvolvimento de todos»2.
Para atingir a etapa histórica em que todos os princípios
enunciados se concretizarão, são indispensáveis as "condições se­
guintes formuladas por V. I. Lénine.
Primeira, todas as forças produtivas e fontes de riqueza so­
cial desenvolvem-se em escala gigantesca. No comunismo, com
base na tecnologia avançada e na implantação das inúmeras des­
cobertas científicas, os meios de produção já socializados na re­
volução socialista utilizam-se pelos trabalhadores qualificados e
bem organizados para a produção de uma enorme quantidade
dos mais diversos bens materiais e espirituais.
Segunda, as pessoas são desenvolvidas multifacetadamente,
os seus dons naturais e talento revelam-se de modo mais pleno,
harmonioso e articulado com os interesses de toda a sociedade.
Em resultado o trabalho deixa de ser o único meio para viver,
transformando-se em «primeira necessidade vital» para cada ho­
mem, tornando-se altamente produtivo.
Terceira, deixa de existir a subordinação escravizadora do
homem à divisão social do trabalho, em particular, a divi­
são do trabalho em manual e intelectual. Quando o homem pode
escolher livremente uma profissão útil e o mais plenamente

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 287.


2 K. Marx, F. Engels. M anifesto do Partido Comunista, p. 85; Edições
«Progresso», 1978.

74
possível adequada às suas necessidades espirituais e capacida­
des físicas, não pode existir um abismo entre o trabalho ma­
nual e intelectual. L á já não pode haver desigualdade no sen­
tido social da palavra.
Pois, quando for lançada uma poderosa base técnica e ma­
terial da produção social, quando desaparecer qualquer desigual­
dade social e econômica entre a» pessoas e quando todos apren­
derem a administrar a produção social, chegará o tal «reino da
liberdade» comunista em que já não caberá nenhum aparelho
de repressão, nenhum Estado.
Quando V. I. Lénine apresenta a perspectiva comunista do
desenvolvimento social, sublinha constantemente o longo per­
curso temporal deste processo histórico. Com grande dose de
sarcasmo estigmatiza a todos aqueles que, ou por simples igno­
rância ou por interesse próprio, atribuem aos seus partidários as
promessas demagógicas de que na sociedade comunista será pos­
sível receber sem controlo algum qualquer quantidade de car­
ros, pianos, etc. Ao contrário, chama a atenção do leitor para
necessidade de atravessar uma fase histórica de desenvolvimen­
to em que o Estado socialista realiza um rigoroso registo e con­
trolo social sobre a medida do trabalho e a medida de con­
sumo, em que a ditadura da classe operária reeduca pessoas,
modelando nelas a atitude comunista para consigo próprio e pa­
ra com o seu trabalho, assim como a atitude comunista nas re­
lações entre pessoas.
A ditadura da classe operária cria condições de vida e tra­
balho nas quais as pessoas vão perdendo o hábito de se verem
como rivais, avançando para o primeiro plano objectivos e
princípios comuns para todos. O princípio econômico fundamen­
tal do socialismo é a igualdade de retribuição de acordo com
o trabalho realizado. O homem livra-se progressivamente da men­
talidade pequeno-burguesa: «contribuir menos possível, apanhar
o mais possível». Também não exige da sociedade o impossível,
pois, por um lado é consciente de que a riqueza social tem os
seus limites e, por outro, criam-se nele próprio necessidades racio­
nais inerentes à personalidade desenvolvida.
Mas este processo da reeducação não pode começar e pro­
gredir espontaneamente na sociedade que acaba de nascer das
entranhas do capitalismo, na sociedade ainda contaminada e
corrupta pela civilização burguesa. Por isso, V. I. Lénine com

75
o seu discernimento sensato característico de um profundo rea­
lista declara: «Registo e controlo — eis o principal, o que é ne­
cessário para a organização, para o funcionamento regular da
prim eira fase da sociedade comunista»1.
A maioria do povo realiza o controlo dos capitalistas trans­
formados em empregados e reeduca os intelectuais que con­
servam os hábitos burgueses e de grandes senhores, bem como
os operários e camponeses aos quais o capitalismo contaminou
com atitudes burguesas e mercantis para com a vida.
O poder da classe operária e a sua ditadura são imprescin­
díveis a fim de garantir e assegurar o carácter universal e
popular do controlo.
A sociedade não pode prescindir esta etapa histórica com
a sua rigorosa disciplina e o controlo geral sobre a distribuição
do produto social. Nem pode evitá-la, proclamando-se de ime­
diato completamente comunista, de modo igual que um rapaz
principiante na vida não pode proclamar que é homem maduro
e experiente sem correr o risco de parecer ridículo.
Detendo-se na necessidade das duas fases do desenvolvimento
comunista (o socialismo e o comunismo propriamente dito),
V. I. Lénine faz uma explicação científica das suas semelhanças
e diferenças qualitativas.
A semelhança — sobretudo, na esfera econômica — consiste
em que os meios de produção já não são da propriedade-privada,
mas social que exclui absolutamente a exploração do homem
pelo homem, de uma classe por outra. Neste aspecto, a palavra
«comunismo» já é aplicável para a primeira fase sem que seja
o comunismo completo e economicamente maduro. Mais ainda,
durante algum período o socialismo conserva elementos substan­
ciais do direito burguês, por exemplo: a distribuição do produ­
to segundo o trabalho e não segundo as necessidades. E mesmo
o Estado ao se tornar dos operários, camponeses e todos os
trabalhadores que suprimiram a exploração do homem pelo ho­
mem, ainda contém oertas reminiscências do sistema estatal bur­
guês na medida em que defende e põe em prática o princípio
de distribuição acima referido.
Daí que V. I. Lénine defina a diferença entre o socialismo
e o comunismo propriamente dito como a diferença entre «os

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 290.

76
dois degraus vizinhos da maturidade econômica do comunismo».
Põe a nu toda a falsidade da concepção vulgar dos políti­
cos burgueses que apresentam o socialismo como um regime so­
cial estagnado, cristalizado, dado de uma vez para sempre e
inventado pelos inimigos do mundo burguês. O autor diz a este
propósito. «. . .apenas com o socialismo começa um movimento de
avanço rápido, verdadeiro, efectivamente de massas, com a par­
ticipação da m aioria e depois de toda a população, em todos
os domínios da vida social e individual»1.
A rica experiência histórica de diferentes países, em que as
revoluções socialistas liquidaram o sistema capitalista de escravi­
dão assalariada, demonstrou com toda a evidência a justeza des­
tas palavras de Lénine.
O avanço do socialismo opera-se em todas as esferas da
vida, apesar das enormes dificuldades e a despeito da resistên­
cia da reacçao interna e externa. Este avanço já tem vitórias
tão colossais que toda a época contemporânea da Humanidade
inaugurada pela Grande Revolução Socialista de Outubro, se
tornou a época de transição do capitalismo para o comunismo
à escala mundial.

QUEM NÃO PODE SER CONSIDERADO MARXISTA

«Só é marxista aquele que alarga o reconhecimento da luta


de classes até ao reconhecimento da ditadura do p ro leta ria d o .. .
É nesta pedra de toque que é preciso experimentar a compreen­
são e o reconhecimento efectivos do marxismo»2, escreve V. I. Lé­
nine no segundo capítulo do seu livro.
No último, V I, capítulo, coloca a quesitão de saber quem, dos
que se pronunciam em favor do socialismo, pode ser considerado
marxista. O capítulo é intitulado «A vulgarização do marxismo
pelos oportunistas», porque se os anarquistas se opõem aberta­
mente ao marxismo, negando-o de facto, os oportunistas na sua
maioria mascaram-se de marxistas, falsificando-o. Operam com
palavras e frases de Marx, retirando ao mesmo tempo da sua
doutrina o conteúdo revolucionário. Vulgarizam o marxismo,
adaptando-o à psicologia de um pequeno burguês pusilânime

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 290.


3 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, pp. 244-245.

77
que, embora descontente com a ordem burguesa, está pronto a
jogar «ao socialismo» mas não a lutar por este.
Já * pertencem ao passado os nomes dos oportunistas ampla­
mente conhecidos nos fins do século X I X e inícios do X X —
Bernstein, Kautsky e alguns outros — que para V. I. Lénine de­
ram o exemplo de como as pessoas que se tinham declarado como
lutadores pelo socialismo, se mostraram de facto como traido­
res da causa socialista. Porém, as lições tiradas da análise con­
creta dos seus enunciados até agora têm um valor transcendente.
Da nossa parte cabe-nos compreendê-las como pontos de re­
ferência certos que nos permitirão distinguir um marxista-le-
ninista verdadeiro de um oportunista ou anarquista que conscien­
temente ou por simples ignorância falsificam a concepção cien­
tífica do mundo da classe operária.
O principal ponto de referência já foi referido antes, ou
seja, o reconhecimento da ditadura do proletariado. Esta fór­
mula revolucionária exprime a atitude do homem face à revo­
lução socialista e ao Estado, em torno do qual se trava princi­
palmente a luta de classes nesta revolução.
Os oportunistas, por serem pusilânimes, por não quererem
romper totalmente com a burguesia e não acreditarem de facto
na revolução socialista e nas suas capacidades criadoras, experi­
mentam um medo mortal perante esta reviravolta social e daí
procuram todos os meios para evitá-la e desviar dela as massas.
Em contrapartida, os anarquistas guiando-se pela táctica de
desespero, cativados pelo ímpeto fugaz e longe de compreenderem
as leis e condições das transformações sociais maciças, exortam
constantemente a acções revolucionárias imediatas sem avançar
um programa científico mais ou menos fundamentado das acções
políticas e econômicas subsequentes.
Portanto, os oportunistas entibiam e corrompem as massas;
os anarquistas provocam-nas para acções irreflectidas cujo pre­
ço são torrentes de sangue e a desilusão das massas. E no es­
sencial tanto estes como aqueles enganam o povo. Tanto estes
como aqueles servem de facto o interesse das classes explorado­
ras.
Em que pontos se revelam divergências de princípio entre o
marxismo, por um lado, e o oportunismo e anarquismo, por
outro?
V. I. Lénine inicia a analisar este conjunto de posições pelo

78
problema de primeira ordem — a atitude face ao Estado. Nas pá­
ginas anteriores da obra, quando se debruçou sobre o problema
do Estado, fez uma análise crítica das falsificações do marxis­
mo pelos oportunistas e anarquistas. No entanto, até agora o
seu tema principal foi restabelecer e desenvolver a própria dou­
trina de K . Marx e F. Engels sobre o Estado e a revolução. Os
discernimentos críticos, não obstante a sua pontaria e clareza,
vinham, por assim dizer, secundando o texto principal, sendo
apenas um complemento da análise desenvolvida dos postula­
dos fundamentais do marxismo.
Acrescentemos ainda que este «complemento» se incorporou
tão organicamente no texto leninista, conferindo-lhe a integridade,
agudeza de espírito e actualidade, que sem este o livro presu­
mivelmente já não nos pudesse maravilhar com a profunda con­
vicção do autor na justeza do marxismo e o carácter elucidativo
das argumentações contra os falsificadores desta doutrina. Este
«complemento» exala a efervescência da luta das classes incon­
ciliáveis em confrontação nas vésperas da batalha decisiva e
de morte em Outubro de 1917 na Rússia.
Seja como for, V. I. Lénine achou necessário dedicar um
capítulo especial às divergências ideológicas entre o marxismo
e outras correntes socialistas. Lembremos a propósito que no iní­
cio do V capítulo quando analisou a Crítica do Program a de
G otha escrita por K . M arx em 1875, fez uma observação in­
teressante e bastante delicada de que a parte polêmica daquela
obra notável deixou na sombra a sua parte afirmativa. É evi­
dente que V. I. Lénine não queria que a parte polêmica do seu
próprio livro dificultasse, ainda que minimamente, a compreen­
são dos leitores das teses fundamentais do marxismo sobre o Es­
tado e a revolução. Por isso, achou conveniente separar a po­
lêmica, dedicando-lhe um capítulo especial.
Os argumentos contra os que deturpam o marxismo apresen­
tados no capítulo final ampliam as concepções sobre o conteúdo
positivo da doutrina de tal modo que, a par da crítica, o lei­
tor possa complementar substancialmente os seus conhecimentos
sobre a essência dos problemas em questão. Além disso, este ca­
pítulo sistematiza-os de facto.
Ora, o primeiro e o mais importante ponto deturpado pelos
vulgarizadores e cuidadosamente restabelecido por V. I. Léninp
refere-se ao Estado.

79
O marxismo ensina que a atitude da revolução socialista para
com o Estado determina a sua essência e o seu conteúdo. V. I. L é­
nine diz». «A revolução consiste em que o proletariado d e s t r o i
o «aparelho administrativo» e t o d o o aparelho de Estado, sub­
stituindo-o por um novo, construído pelos operários armados»1.
A classe operária, juntamente com os seus aliados, — o campesi­
nato trabalhador e a intelectualidade progressista — destrói a
velha máquina de Estado e passa a dirigir a sociedade com
ajuda do novo aparelho, a ditadura do proletariado.
O marxismo exige que a classe operária se prepara para a
revolução socialista ainda sob o captalismo, utilizando, a par
de outras formas de luta, o Estado burguês existente e todas
as possibilidades da democracia burguesa com fim de consolidar
as forças e ganhar posições cada vez mais firmes.
O marxismo põe como objectivo final a supressão total do
Estado, mas adverte que esta meta só será viável quando a re­
volução socialista suprimir as classes. O marxismo postula que
a supressão futura, «a extinção», «o adormecimento» do Estado
é o resultado ulterior da instrauração do socialismo.
Qual é a posição dos anarquistas nesta questão?
O anarquismo postula que o Estado existente como fonte
de todas as injustiças e desgraças sociais deve ser suprimido
imediata e totalmente, de hoje para amanhã, daqui para a frente,
não sendo substituído por nenhum outro.
O anarquismo pronuncia-se pela destruição da máquina de
Estado sem fazer a mínima ideia de pelo que será substituída
e como a classe operária vitoriosa utilizará o poder revolucioná­
rio.
Os anarquistas negam a ditadura do proletariado porque
consideram impossível a utilização do poder de Estado pela clas­
se operária revolucionária.
O anarquismo exclui qualquer possibilidade de utilizar o
Estado burguês e a democracia burguesa com fim da prepara­
ção da classe operária e de todos os trabalhadores para a revo­
lução socialista.
Eis em linhas gerais a posição dos anarquistas na questão
relativa ao Estado.
Ora, qual é a atitude dos oportunistas face ao Estado?

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 300.

80
O oportunismo no movimento operário proclama como o seu
objectivo a remodelação socialista da sociedade, esquivando-se
por todos os meios à questão que diz respeito à necessidade e
à inevitabilidade da revolução socialista violenta. Mais ainda,
procura contornar a própria questão do Estado, preferindo pe-
rorar sobre o socialismo e o poder dos operários em geral, si­
lenciando aquilo que constitui enfim a tarefa principal das mas­
sas revolucionárias em relação ao Estado burguês. Declarando-se
estarem em oposição ao governo existente, os oportunistas ne­
gam o próprio conceito da revolução socialista. «A revolução
desaparecei — exclama sarcasticamente V. I. Lénine. — Isto
é exactamente o que exigem os oportunistas»1.
O oportunismo nega a necessidade de destruir a máquina
de Estado burguês, partindo de que a classe operária poderia
conquistar o poder mesmo sem suprimi-la. Mais ainda, admite
uma tal utilização do parlamentarismo burguês que conduziria
à conquista do poder pela classe operária mediante a obtenção de
uma simples maioria parlamentar que, segundo os oportunistas,
poderia «exercer influência» sobre o governo que «vá ao encon­
tro do proletariado». Nesta interpretação (tal como em outra
fraseologia em voga), só não cabe lugar à ditadura da classe
operária.
No seio do oportunismo contemporâneo existem as mais di­
versas tendências representadas por diferentes concepções teó­
ricas. Algumas delas, por exemplo, as tecnocráticas, fundamen-
tam-se em que o desenvolvimento impetuoso da ciência e técni­
ca modernas colocou a intelectualidade técnica na primeira linha
do progresso social e, por conseguinte, o proletariado teria per­
dido completamente o seu papel revolucionário e motriz. Outros
avançam a concepção do pluralismo do poder político que, se­
gundo eles, poderia ser executado em comum por representantes
das classes diametralmente opostas e contrárias.
O que une todas estas concepções é a negação, aberta ou
dissimulada, da ditadura da classe operária, daquela mesma clas­
se que hoje, mais do que antes, cria de facto a parte esmaga­
dora da riqueza social, tanto nos países socialistas como capita­
listas. A classe operária com as suas acções organizadas contra
o domínio do capitalismo monopolista de Estado e a reacção

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 300.

6-1 6 7 2 81
demonstra a sua força e elevada consciência de classe; da sua
posição firme depende ao fim e ao cabo a prevenção de uma
nova guerra mundial, a conservação da paz no nosso planeta
inquieto.
No que respeita ao Estado burguês, os oportunistas tanto
no tempo de V. I. Lénine como agora demonstram a sua «ve­
neração supersticiosa» em relação a este e consideram-no tão lon-
gevo e vitalmente necessário para a organização social que nem
sequer admitem uma só palavra sobre a sua destruição, liquida­
ção e supressão. O que eles admitem no máximo é falar sobre
o «aperfeiçoamento ulterior» de alguns dos seus elementos. Como
é natural, ofuscam a questão no interesse de que classe se deve
realizar este «aperfeiçoamento».
Para justificar as suas posições conciliadoras burguesas, os
oportunistas avançam teses que, ou deturpam a teoria marxista,
ou não correspondem à realidade actual. V. I. Lénine critica-os
profundamente em torno destas teses. Quais são concretamente?
Os oportunistas não vêem ou ofuscam intencionalmente a di­
ferença de princípio entre a democracia burguesa e socialista.
Alargam as concepções limitadas do ponto de vista de clas­
se sobre o parlamentarismo burguês e o sistema burocrático do
funcionalismo no Estado burguês até à sociedade socialista. Con­
sideram que sociedade contemporânea, qualquer que esta seja,
não pode em muitas esferas da sua vida prescindir da organi­
zação burocrática. Enquadram neste conceito e dentro deste
«baralham» tanto a disciplina rigorosa e execução cabal exigidas
pela técnica de trabalho nas empresas altamente mecanizadas
da grande indústria, o funcionamento impecável da rede fer­
roviária, dos correios e outros elementos à escala nacional, como
também o próprio aparelho burocrático do funcionalismo bur­
guês, transplantando-o de acordo com os seus esquemas especu­
lativos oportunistas para o «socialismo».
V. I. Lénine deu provas irrefutáveis da inconsistência com­
pleta deste discernimento. Deinarca uma vez mais o parlamenta­
rismo burguês e o sistema da democracia socialista em relação
à camada de funcionários de Estado.
Se o parlamentarismo burguês combina a democracia capi­
talista, isto é, a democracia não para o povo, com o burocratismo
da máquina de Estado burguês virada contra o povo, o democra-
tismo da ditadura da classe operária implantada logo após a

82
conquista do poder político pressupõe medidas obrigatórias com
vista a prevenir todo o burocratismo. Depois de demolir o velho
aparelho burocrático de Estado burguês, os operários substituem-
-no pelo novo aparelho de funcionários públicos formado pelos
próprios trabalhadores. Tomam-se medidas com fim de prevenir a
degeneração destes novos funcionários públicos em «burocratas».
V. I. Lénine enuncia de nõvo estas medidas que já foram
pormenorizadas no contexto da análise da Comuna de Paris:
1 ) não só a elegibilidade mas também a amovibilidade em qual­
quer momento; 2 ) os vencimentos ao nível do operário médio;
3) a passagem imediata para o exercício universal das funções de
registo e controlo efectivo que impede o próprio surgimento dos
«burocratas».
Quanto ao aspecto meramente externo, por assim dizer, o
invólucro representativo da organização estatal (ministérios por
sectores de actividade, comissões de especialistas, etc.) que os
oportunistas procuram identificar com a própria essência (o
sentido de classe) do Estado, é natural que o Estado socialista
possa aceitá-lo e o aceita. Contudo, o assunto não se reduz
a isto.
A essência da questão é que a revolução socialista destrói
completamente o mecanismo de classe de máquina de Estado.
Como observou V. I. Lénine a este respeito, pela sua forma os
ministérios e as comissões de especialistas podem funcionar per­
feitamente em favor do Estado da ditadura da classe operária.
Cabe-nos acrescentar aqui, partindo da experiência da União
Soviética, que estas podem funcionar também em favor do Es­
tado de todo o povo, em que a ditadura do proletariado já
tinha transitado para esta forma de Estado.
Os oportunistas especulam sobre o facto de que nos países
capitalistas, o burocratismo (tal como muitos outros vícios e
doenças do regime social) contaminou em certa medida os fun­
cionários das organizações políticas e sindicais da própria classe
operária. A história do movimento operário e sindical conhece
efectivamente bastantes factos de as condições capitalistas, que
corrompem a consciência das pessoas, gerarem nos funcionários
mesmo das organizações proletárias a tendência para se transfor­
mar em burocratas, quer dizer, em indivíduos privilegiados, dis­
tantes das massas e como que postos acima delas.
V . I. Lénine explica esta tendência no capitalismo pelo ca-
6* 83
rácter deformado da própria democracia burguesa e pela escra-
vização da classe operária pelos capitalistas. Destaca que en­
quanto a burguesia tem as rédeas do poder nas suas mãos, é
inevitável uma certa «burocratização» mesmo dos funcionárids
proletários. Aliás, a existência deste fenômeno não implica de
modo algum a inevitabilidade do burocratismo sob o socialismo,
ao contrário, exige um controlo particularmente rigoroso por parte
do povo trabalhador vitorioso na revolução socialista a fim de
prevenir reincidências.
Em seguida V. I. Lénine passa abordar o problema muito
interessante da chamada democracia «primitiva». Pronuncia-se
resolutamente contra a concepção oportunista do «democratismo
doutrinário», cujo fundador foi Bernstein. Os oportunistas que
compartilham o seu ponto de vista, gostam ridicularizar a exi­
gência de estabelecer para funcionários de altos escalões de ór­
gãos de soberania um ordenado a nível do salário médio dos
operários — o que os marxistas consideram como uma das me­
didas obrigatórias para ampliar a democracia e conjurar o bu­
rocratismo no socialismo — , dizendo que esta não passa além da
reivindicação da democracia «primitiva», ingênua. No entanto,
nesta exigência não há nada de ridículo e ainda menos de
ingênuo.
V . I. Lénine apresenta a argumentação seguinte: primeiro, no
socialismo, muito da democracia «primitiva» reviverá necessa­
riamente por um certo período de tempo, pois pela primeira vez
na história a massa da população é elevada até à participação au­
tônoma não só nas eleições universais, «mas também na admi­
nistração quotidiana». Sem certo «retorno» à democracia «pri­
mitiva» é impossível ganhar inicialmente a maioria e depois
toda a população para a execução das funções de Estado.
No socialismo, todos devem aprender a dirigir por turnos
as relações entre pessoas, com vista a habituar-se a viver sem
a administração em geral. Ê natural que aqui se trate da ad­
ministração daquela esfera de relações humanas que concerne
exclusivamente às questões da igualdade social e de modo algum
da gestão dos processos puramente tecnológicos em empresas,
de comando da rede ferroviária, da administração dos processos
de ensino em escolas e assim por diante.
O segundo aspecto que V. I. Lénine destacou em relação
com o ressurgimento da democracia «primitiva» no socialismo,

84
acentua a ideia de que esta democracia, ao reviver com base
na grande produção e na cultura capitalista, já não se apre­
senta sob a forma conservadora e inerte que lhe era inerente
nos tempos primitivos.
O capitalismo desenvolveu grandes empresas industriais e agrí­
colas, construiu caminhos-de-ferro, abriu linhas aéreas regulares
entre grandes cidades, pôs em funcionamento o correio, telégrafo
e telefone, etc. Em resultado muitas funções de registo, controlo
e contabilidade executadas pelos -funcionários públicos simplifi­
caram-se de modo a serem acessíveis a todas as pessoas alfa­
betizadas.
No socialismo, por este trabalho pode-se pagar tanto quanto
ganha habitualmente um operário qualquer. Deste modo, os
funcionários de Estado incumbidos destas funções perdem a sua
posição privilegiada, por assim dizer, a posição dos «chefes». E
isto é um grande passo em frente no desenvolvimento da democra­
cia socialista. Só as pessoas limitadas pela visão burguesa podem
ridicularizar este passo sério.
Resta mais uma questão que não é tanto um ponto polêmico
com os oportunistas quanto a demonstração dos procedimentos
que utilizam para falsificar o marxismo. Trata-se das vantagens
do Estado centralizado do qual já se falou num dos capítulos an­
teriores do livro.
V. I. Lénine desmascara Bernstein que ao ter grosseiramente
falsificado as palavras de K . Marx, atribuiu fraudulentamente
ao marxismo a congruência do seu conceito de federação com
o da corrente pequeno-burguesa do proudhonismo. Também cri­
tica Kautsky por fazer uma contraposição entre as palavras de
K . Marx sobre a necessidade da «centralização da força nas
mãos do poder de Estado» relativas às vantagens do Estado cen­
tralizado do proletariado, e as palavras, também de Marx, so­
bre a necessidade de destruir a máquina de Estado, «esquecendo-
-se» de que neste caso já se trata unicamente do Estado bur­
guês.
Desde o nascimento do marxismo como concepção científica
do mundo da classe operária, os ideólogos burgueses, oportu­
nistas e anarquistas procuraram e continuam a procurar detur­
par de modo irreconhecível o conteúdo real desta doutrina.
V . I. Lénine deu-nos um exemplo de como é preciso lutar
pela pureza do marxismo, de como explicar às massas as tarefas

85
da luta revolucionária, evitando erros oportunistas, anarquistas
e de radicalismo de esquerda.
Nas últimas páginas do seu livro, V. I. Lénine cita de novp
K. Marx, dizendo que ele «ensina-nos uma audácia sem limites
na destruição de toda a velha máquina de Estado, e ao mesmo
tempo ensina a colocar a questão de uma forma concreta»1:
ensina-nos a procurar e encontrar métodos práticos da criação de
uma nova máquina de Estado, a proletária, logo a seguir à con­
quista do poder pela classe operária, os métodos que ajudam
a ampliar a democracia socialista e a extirpar completamente
o burocratismo.
As palavras de Lénine sobre as medidas «praticamente ur­
gentes» e «imediatamente possíveis» da edificação do Estado so­
cialista escritas poucas semanas antes da Revolução de Outubro
na Rússia não demoraram muito tempo no papel. Os primeiros
decretos do Poder Soviético adoptados no I I Congresso dos So­
vietes de toda a Rússia em 7 de Novembro de 1917, inaugu­
raram a marcha triunfal do leninismo por toda a terra que en­
volve milhões de pessoas do nosso planeta na transformação
revolucionária e real da vida de acordo com os princípios socialis­
tas.

A LAIA DA CONCLUSÃO

Assim, acabamos de virar a última página do livro de V. I. L é­


nine. Acabamos de ler as palavras que dizem que a relação das
revoluções democrático-burguesas russas de 1905 e de Fevereiro
de 1917 diante do Estado é um tema muito vasto que merece
estudos especiais e volumes inteiros.
Hoje em dia, podemos falar tanto sobre a experiência da
Grande Revolução de Outubro na questão de destruição da velha
máquina de Estado como sobre a edificação do socialismo e a
experiência das revoluções socialistas nos países da Europa do
Leste, da Ásia e da América Latina. A isto soma-se a experiên­
cia dos povos e Estados africanos e asiáticos que se envere­
daram pelo caminho revolucionário da criação das premissas e
seguidamente da construção das bases do socialismo após a sua
libertação nacional. Esta experiência foi gerada pela prática da

‘ V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 2, p. 302.

86
luta e das transformações socialistas revolucionárias que envol­
vem actualmente largos milhões de habitantes do planeta.
A história viva da Humanidade e dos Estados confirma in-
declinavelmente a justeza de todos os postulados de princípio
expostos no livro de V. I. Lénine sobre a atitude da revolução
perante o Estado e ao mesma tempo põe perante os partidos
comunistas, operários e revolucionário-democráticos de todo o
mundo novos problemas que se podem resolver com êxito obser­
vada a condição de aplicação criadora da doutrina marxista-leni-
nista às circunstâncias concretas da luta e da criação revolu­
cionária.
E ao contrário, o desprezo da teoria assente na riquíssima
experiência de já numerosas revoluções socialistas e democráti­
cas e no estudo das leis do desenvolvimento social do mundo
contemporâneo confere a muitos problemas da luta revolucionária
um carácter insolúvel, leva a becos sem saída, fracassos graves
e vítimas humanas inúteis.
A contribuição de V. I. Lénine para o desenvolvimento da
teoria da revolução socialista e a direcção prática da luta das
massas populares pelo socialismo, bem como as vitórias de res­
sonância histórica e universal obtidas em resultado da aplicação
desta teoria no contexto político do século X X , são tão grandes
que os marxistas contemporâneos a designaram por leninista.
O Partido Comunista da União Soviética e os partidos mar-
xistas-leninistas irmãos desenvolvem de modo criador a teoria
leninista da revolução socialista, cuja questão central foi e con­
tinua a ser o problema do Estado, da conquista do poder polí­
tico pela classe operária e da sua utilização com vista à afirma­
ção dos princípios da justiça social, dos princípios do comu­
nismo.
Os documentos do movimento comunista internacional ela­
boram em profundidade os problemas do processo revolucioná­
rio mundial em relação à prática da edificação de Estado nos
países da comunidade socialista mundial onde o poder político da
classe operária, do campesinato trabalhador e de todos os tra­
balhadores é utilizado para fortalecer as bases do socialismo e
desenvolvê-lo rumo ao comunismo. Estudam-se escrupulosamente
os problemas da luta da classe operária nos países capitalistas e ,em
vias de desenvolvimento, assim como as tendências da evolução

87
das revoluções de libertação nacional no sentido que permite
criar premissas e seguidamente uma base firme para socialismo em
todos os continentes do planeta.
A Grande Revolução de Outubro materializou as ideias le-
ninistas sobre a edificação do Estado socialista. V. I. Lénine
foi o dirigente da República dos Sovietes que tinha nascido
na seqüência da revolução. Analisando e dirigindo a edifica­
ção do jovem Estado socialista, V. I. Lénine desenvolveu incan­
savelmente a doutrina marxista sobre a ditadura da classe ope­
rária, enriquecendo-a com novas conclusões. Nas obras pos­
teriores a O Estado e a R evolu ção encontramos toda uma série
de definições da ditadura do proletariado que caracterizam a sua
essência sob diferentes pontos de vista, em diferentes condições e
etapas.
V. I. Lénine aborda a ditadura do proletariado em dois as­
pectos: ( 1 ) como domínio de classe instaurado temporariamente
devido à luta de classes aguda e à guerra civil e ( 2 ) como uma
determinada forma do exercício do poder.
V. I. Lénine frisa que o aspecto principal e universal da
ditadura do proletariado é o seu domínio político e a direc­
ção política sobre todos os trabalhadores visando a transforma­
ção revolucionária do capitalismo em socialismo.
Atribui uma atenção excepcionalmente grande à explicação
do conteúdo social e de classe da ditadura do proletariado. Nes­
te aspecto sublinha constantemente que dada a posição domi­
nante e dirigente da classe operária na sociedade, o poder po­
lítico desta classe se baseia na aliança entre ela e as massas tra­
balhadoras não proletárias e sem esta é inconcebível o funcio­
namento normal deste poder. A particularidade desta aliança
consiste em ser uma união de classe no interesse do socialismo, a
união contra o poder do capital e para a sua erradicação to­
tal.
No exercício do seu poder, a classe operária exprime os in­
teresses essenciais do campesinato trabalhador, da pequena bur­
guesia urbana, da intelectualidade e dos funcionários públicos,
ganhando-os para a administração dos assuntos públicos em qua­
lidade de simples trabalhadores e cortando ao mesmo tempo os
seus instintos de proprietários pequeno-burgueses. Deste modo, a
classe operária traduz os interesses vitais da maioria esmagadora
da população e assegura no contexto do seu domínio político

88
a mais plena democracia adequada ao período de transição na
vida da sociedade.
Nos países com uma população predominantemente campone­
sa, o poder da classe operária apoia-se sobretudo na sua aliança
com as massas de trabalhadores camponeses.
Precisando as tarefas da ditadura do proletariado de acordo
com cada etapa de desenvolvimento»'do socialismo real, V. I. Lé­
nine nas suas obras posteriores confinava os limites históricos da
ditadura do proletariado ao período de transição do capitalismo
para o socialismo. Os documentos do PCU S reflectem as etapas
posteriores de desenvolvimento da sociedade soviética, destacan­
do que com a vitória completa do socialismo e a sua consolida­
ção, a direcção política da classe operária perdeu o seu carácter
de domínio, o carácter da ditadura. Ao mesmo tempo, com a
liquidação da propriedade privada e a edificação do socialismo
na U R SS, o campesinato perdeu a sua natureza pequeno-bur-
guesa, transformando-se em socialista. No país nasceu uma nume­
rosa camada da intelectualidade socialista.
Contudo, não se pode dizer que a sociedade socialista de­
senvolvida contemporânea é uma sociedade sem poder político:
nela mantém-se ainda em vigor a necessidade de controlo da
medida do trabalho e consumo da qual falou V. I. Lénine, e a
necessidade de manter a ordem legal social; vigora também outro
aspecto sumamente importante da actividade do Estado, as ta­
refas no campo da política externa.
Nestas condições, a ditadura do proletariado transforma-se
em sistema do poder de todo o povo que se exerce sob a direc­
ção da classe operária e o Estado da ditadura do proletariado
converte-se em Estado de todo o povo.
Analisando o mecanismo de exercício do poder da classe
operária, V. I. Lénine nas suas obras posteriores, muitas das
quais tratam problemas da organização da vida econômica na
jovem República dos Sovietes, mostrou de que se compõe con-
cretamente este sistema do poder. Por sua iniciativa e sob o
seu controlo foram criadas e começaram a funcionar instituições
e organismos principais de Estado, através dos quais a classe ope­
rária realiza a direcção da vida social.
Nesta direcção, o papel primordial compete à vanguarda
política da classe operária, isto é, ao seu partido marxista-le­
ninista. Numa das suas últimas obras, V. I. Lénine sublinhou que ’

89
«só o partido político da classe operária, isto é, o Partido Comu­
nista, está em condições de agrupar, educar e organizar a van­
guarda do proletariado e de toda a massa trabalhadora, a única
que está em condições de se opor às inevitáveis vacilações
pequeno-burguesas desta massa, às inevitáveis tradições e
recaídas da estreiteza profissionalista ou dos preconceitos pro-
fissionalistas.. . Sem isto a ditadura do proletariado é irrealizá-
vel»1.
Ao partido na sociedade socialista compete exprimir cienti­
ficamente os interesses vitais da classe operária e dos seus alia­
dos, formular com base neles objectivos a longo prazo, colocar
tarefas concretas com vista a assegurar o funcionamento coorde­
nado de todos os componentes da organização da sociedade, es­
clarecer à população a essência da sua política, mobilizar e edu­
car as massas no espírito dos ideais comunistas. Amplia-se cons­
tantemente o papel dirigente do partido que arraiga a concepção
científica do mundo da classe mais avançada na consciência so­
cial. Mas ao mesmo tempo o partido não se identifica de modo
algum com o organismo de Estado.
Tais são as características mais 'gerais da ditadura do pro­
letariado. No que respeita a este conceito como forma deter­
minada de poder, a tese leninista sobre a diversidade destas for­
mas tem sido elucidativamente confirmada.
Actualmente já existem bastantes formas políticas do exer­
cício da ditadura do proletariado. Entre elas: a Comuna de Pa­
ris, o primeiro, embora de curta duração, poder da classe ope­
rária na história, o País dos Sovietes que abre o caminho do so­
cialismo para a Humanidade, a democracia popular nos países
da Europa do Leste e as formas peculiares da organização de
Estado nos países socialistas da Ásia e em Cuba. Cada uma des­
tas formas tem as suas características singulares de Estado que
correspondem às condições específicas de cada país socialista.
As diferenças concernem às medidas iniciais concretas do no­
vo poder revolucionário em relação a representantes remanescen­
tes dos grupos exploradores da população durante o período de
transição para o socialismo no campo do sufrágio, às questões de uni
ou pluripartidarismo (sempre reconhecendo obrigatoriamente em
todos os países o papel dirigente do partido marxista-leninista), ao

1 V. I. Lénine. Obras Escolhidas, t. 3, p. 490.

90
funcionamento do mecanismo propriamente dito das instituições
de Estado (trata-se de um sistema único e totalmente novo em
alguns países ou de um sistema que combina certas formas
de organização política precedente, pré-revolucionária com no­
vas, em outros).
As diferentes formas da ditadura do proletariado não se re­
lacionam apenas com as particularidades históricas gerais do
país como também com a forma concreta (pacífica ou não)
da conquista do poder pela classe operária.
São particularmente interessantes e sumamente complexos os
problemas de luta pelo socialismo nos jovens países que se li­
bertaram do colonialismo e procederam à edificação de Estados
novos. Em muitos países deste tipo, os processos de formação do
mecanismo estatal do poder nacional independente das ex-me­
trópoles e as tendências que conduzem à criação das premissas
reais e depois das bases do socialismo são convergentes no plano
histórico.
Nos seus trabalhos V. I. Lénine fundamentou à profundidade
as possibilidades da passagem para o socialismo evitando o ca­
pitalismo sempre que se trate dos povos do antigo mundo co­
lonial. Estas possibilidades são determinadas pelos factores in­
terno e externo de desenvolvimento, nomeadamente a consoli­
dação das posições internacionais dos países do socialismo e a
ampliação das suas relações com os países que se libertaram onde
se assiste ao ascenso constante do movimento revolucionário das
vastas massas populares.
O X X V I Congresso do PCUS (1981) formulou as direc­
ções principais de desenvolvimento de Estados de opção socia­
lista.
A estas referem-se:
— a supressão gradativa das posições dos monopólios impe­
rialistas, da grande burguesia e dos senhores feudais locais, as­
sim como a limitação do capital estrangeiro;
— a garantia das posições-chave do Estado popular na econo­
mia, a passagem para o desenvolvimento planificado das forças
produtivas e o incentivo ao movimento cooperativista no campo;
— a elevação do papel das massas trabalhadoras na vida social
e o fortalecimento progressivo do aparelho de Estado com qua­
dros nacionais fiéis ao povo;
— o carácter anti-imperialista da política externa;

91
— o fortalecimento dos partidos revolucionários que expri­
mem interesses das vastas massas trabalhadoras.
Quando se trata dos Estados democráticos nacionais, a par­
ticularidade da política de opção socialista expressa-se no facto
de se realizar no contexto da ditadura revolucionária e democrá­
tica do povo e não do proletariado. É que na maioria dos países
asiáticos e africanos o proletariado é ainda pouco numeroso,
encontrando-se em processo de organização.
Porém, a orientação para o reforço do papel da classe operá­
ria na vida social, para o desenvolvimento da sua identidade de
classe é a condição imprescindível para criar premissas do socialis­
mo. Só um partido revolucionário armado com o conhecimento
dos fundamentos do marxismo-leninismo é capaz de proporcionar
esta condição.
A obra de V. I. Lénine O E stado e a R evolução oferece estes
conhecimentos. Por isso, quando você, estimado leitor, enfrentar
uma situação política complexa e duvidar a certeza das decisões
que toma, leia uma vez mais este livro, pois ele ajudá-lo-á a
encontrar pontos de referência de classe correctos e reforçará
a sua confiança na inevitabilidade da» vitória do socialismo.
Índice

Ao l e i t o r ................................................................................................3
Posição leninista.................................................................................... 7
Quando e como V. I. Lénine escreveu a sua o b ra....................... 10
A alma revolucionária do marxismo (Gomo V. I. Lénine restabe­
leceu a tese de Marx e Engels sobre a essência de classedo Estado) 12
Quais elementos da máquina de Estado?........................................17
Um pequeno parágrafo sobre um grande problema (V. I. Lénine
sobre o Estado nas condições do equilíbrio dinâmico das classes
em l u t a ) ..............................................................................................22
Vicissitudes do Estado após a revolução socialista........................26
Em que consiste o papel revolucionário do proletariado nahistória? 32
A conclusão principal da doutrina marxista sobre o Estado . . . 36
A prática revolucionária nutre a teoria revolucionária.................39
Como F. Engels complementou K. M a r x ...................................49
A passagem do capitalismo para o comunismo..............................62
As bases econômicas da sociedade sob o socialismo.........................71
A passagem para a fase superior do comunismo.............................73
Quem não pode ser considerado marxista?................................... 77
 laia da conclusão..............................................................................86
AO L E IT O R

Os Editores ficar-lhe-ão muito agradecidos se


nos der a conhecer a sua opinião acerca da
tradução do presente tomo, assim como acerca
da sua apresentação e impressão. Agradecer-
-lhe-emos também qualquer outra sugestão.
Endereço:
Edições Progresso
Zúbovski bulevar, 17
Moscovo
URSS
EDIÇÕES «PROGRESSO»

Bases Metodológicas e a Metodolo­


gia do Estudo da Filosofia.
Esta obra é um compêndio metodo­
lógico em que se explicam as questões
program áticas do materialismo dia-
léctico e histórico; também são dadas
recomendações metodológicas sobre
como as estudar independentemente e,
antes de mais, como estudar de modo
criador as obras dos clássicos do m ar­
xismo-leninismo.
EDIÇÕES „PROGRESSO”

Conselhos Metodológicos para o


Estudo da Economia Política.
Os autores deste livro, doutores em
Ciências Econômicas, professores ca-
tedráticos, chamam a atenção dos lei­
tores para o melhor modo de estudar
as obras dos clássicos do marxismo-
-leninismo, dão explicações pormeno­
rizadas sobre a aprendizagem de cada
tema. Indica-se o lugar que este tema
ocupa na economia política, o seu
conteúdo principal, incluem-se per­
guntas de autocontrolo e tarefas p rá ­
ticas. Os autores prestam especial
atenção à problemática dos países em
vias de desenvolvimento. Este com­
pêndio contribui para o trabalho cria­
dor no campo dos estudos de econo­
mia política.
s
Como
Estudar
VI.I<“RIIW

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