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ÍNDICE
Editorial 3
o Mundo Divinizado 8
Associação PALAS ATHENA
centro de estudos filosóficos
(sucessora da Nova Acrópote) A ciência médica no Antigo Egito 14
EDITORES
Assim Deus falou aos homens 17
Assoçlação PALAS ATHENA do Brasil
Lia Dlskln
Basílio Pawlowlçz
Primo Aug.,.to Gerbe",
Aristocracia e Democracia 23
DIRETOR RESPONSÁVEL
o reino da alegria está em ti 26
Primo Augusto Gerbe",
CHEFE DE REDACÃO
ZlIdo TraJano de Luçena _
PRODUÇAO E DIAGRAMAÇAO Os quadrados mágicos 28
Equipe Thot
CORRESPOND~NCIA
Seçretarla de Editoriais
Conhecimento e aprendizado 30
CORRESPONDENTES
Santos (SP): Elba Lúç/a NOllello História: Politica Experimental 33
Monte/ro Lobato (SP): Mara NOllello
Porto Alegre (RS): Mlgue/ânge/o Gragnanl -
Maria Estela Luças
Belo Hor/zont. (MG): Dallld Cohen - Luçy Página dos leitores 35
Blumental
Rio de Janeiro (RJ). ZIIdo TraJano de Lu_na
Humor 36
FOTOllTO CAPA
Po/yçrom
COMPOSiÇÃO .
Caminho Editorial LIda. Não publicamos matérias redacionais pagas! Permitida reprodução. citando origem. Os números atrasados
IMPRESSÃO são vendidos ao preço que consta na capa (atua!)/ Assinatura anual: Cr$ 720.00 - cheque em nome da
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--- ~bltlllill~~llmlillllilllilllllllllillil~illllillllillmmllllllllllll~1II1I11111II1I1I1II11II1l1I111I11 Registro no DCDP do Dapartamanto de Policia Federal. sob n' 1.586 P 209/73.
o HOl\1EM NECESSITOU E
NECESSITARÁ SEMPRE DEIXAR
MARCAS SIGNIFICA 1lVAS NA
I-llSTÓRIA
Basilio Pawlowicz
o Anel de Nibelun~, de WafPeI
A Valquíria
Aparece uma cabana construída no ele. Proscritos e perseguidos por onde vamos,
tronco de um vigoroso fresno, o Fresno da temos vivido fugindo e separados no bosque te-
Vida, a Árvore do Mundo, cujas raízes nebroso durante longos anos, sob as eternas
proeminentes saem do solo enquanto que notas do triste motivo do Welsungo, somos in-
sua copa perde-se no infinito. Cravada no capazes de inspirar em ninguém o divino senti-
tronco, até a bainha, destaca-se uma es- mento de Compaixão e de Amor ...
pada, a Espada do Conhecimento Intuitivo. Antes de terminar esta frase havia che-
À direita, dentro da cabana, arde a lareira e gado Hunding, o brutal caçador, filho do
à esquerda vê-se a escadinha de uma habita- cão vil e marido à força da raptada Siglinda,
ção interior. Sigmundo, ou Sigismundo, o fi- aquela Irmã de Sigmundo, cuja perda cho-
lho de Wotan e de Erda, abre violentamente rava e que, como ele, havia caído nas mãos
a porta, penetra na cabana e, vencido por dos cruéis inimigos de sua raça.
aquele supremo esforço, cai junto ao fogo - A Norna, que a ti deu tal destino ao nasce-
da lareira. Anoitece. A desordem nas vesti- res, pouco te amava. O homem que hoje te alo-
mentas do guerreiro revela que vem, depois jas não pode saudar-te alegre, diz o cruel Hun-
de um combate e de uma fuga, através do ding a Sigmundo. Conheço tua raça feroz,
bosque. Siglinda, com uma tocha na mão, para ela nada há de sagrado. Odiada por to-
chega e o vê deitado, sobre um monte de dos, eu também a odeio. Por esta noite respei-
peles, acreditando primeiramente que é seu tarei as sagradas leis da hospitalidade; porém,
marido Hunding de regresso de suas caças. amanhã, ao apontar-se o dia te atacarei, vin-
Surpresa, fala com o desconhecido e dá-lhe gando com teu sangue o sangue vertido pelos
de beber algo que o faz voltar de seu des- meus ...
maio, Siglinda prepara para seu marido uma
- Meus membros estão solidamente unidos, porção narcotizante, e, quando saem para o
diz o guerreiro, recordando aquele símbolo quarto volta-se para Sigmundo fixando um
dos despedaçados membros de Baco, Osíris olhar de paixão, com o qual pretende tam-
e tantos outros da lenda universal. Não sei bém dar a entender que se fixe na espada do
quem sou; quisera sabe-to: a tempestade e a conhecimento intuitivo, que há muito está
desgraça me jogaram no bosque tenebroso, na cravada na Árvore da Vida, ali colocada
selva misteriosa e cruel da vida, cujo caminho pelo hercúleo Wotan quando, disfarçado de
Ignoro. Para onde eu vou, acompanha-me a viajante, se apresentou no dia do forçado
desgraça e o sofrimento. Wehwalt, "o que se casamento de Siglinda. Sigmundo fica triste
agita na dor" foi o triste nome que adotei. Po- e .só.naquelas crescentes trevas da cabana i-
deria, entretanto, chamar-me Friedmundo, o mrruga,
boca de paz, antítese do nome Sigmundo que - Estou sem armas, em casa inimiga! -
levo; porém, apesar de minhas dores eternas, murmura o herói. Meu pai, o grande Welso
eu sou Frohwalt, o que se agita na pura volup- (sobrenome do Lobo ou de Wotan) me pro
tuosidade dos deuses. Sou, enfim, o filho do meteu que, quando me atacasse a suprema an-
Lobo, o Welsungo, o protótipo daforça e da in- gústia, encontraria uma espada... O amor
dependência rebelde, aquele que desde a ori- mais invencivel me domina! Welso, Welso,
gem dos tempos foi consagrado ao grande Wel- onde está tua espada?
sungo Odin, ou Wotan, o Soberano do Wa- Pronunciadas estas palavras, o fogo,
lha lia , quando quis viver independente e livre. como que respondendo aos seus clamores,
Os Neidingen, "os filhos do cão" que sempre faz brilhar a poderosa arma. Enquanto isso,
adulam, os filhos da Inveja, por fim, vendo que Siglinda aparece cautelosa e lhe dá a enten-
o Lobo era meu pai, incendiaram nossa cova, der por sinais que se ponha a salvo ou que
podaram o carvalho que nos servia de lar, ma- tente arrancar a espada para salvá-Ia deste
taram minha mãe, roubaram minha família e cruel destino. Ao mesmo tempo conta ao
me separaram de meu pai quando caçava com herói, entre frases de recíproco e santo
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amor, como um estrangeiro deixou cravada
aquela espada, sem que ninguém houvesse
conseguido retirá-Ia. O amor entre eles já
floresceu. Sigmundo consegue sem esforços
retirar a espada. Lançam-se um nos braços
do outro, e misteriosamente aparece a fada
Primavera, que bendiz a união e os arrasta
enlaçados para o bosque, sob os raios dá lua
cheia, melancólica protetora de todos
quanto se amam... Reconhecem-se não
como irmãos de sangue, mas como irmãos
infelizes do espírito, aquele espírito rebelde
e gigante de Welso.
Wotan, armado de todas as armas, apa-
rece entre as abruptas montanhas no se-
gundo ato das Valquírias. A sua frente; galo-
pando pelos ares, a valquíria Brunhilda, a
principal e mais amada daquelas terríveis
guerreiras filhas de Wotan e de Erda.
As valquírias eram as filhas dos mais ar- da Vontade Livre, emancipada das travas
dorosos desejos de Wotan, encarregadas de daqui de baixo pelo Conhecimento Intui-
despertar o heroísmo no peito dos homens, tivo.
tornando-os dignos de morrer em combate Fricka, a guardiã do Himeneu (casa-
e, assim, ser levados até o Walhalla em lu- mento), ainda que este não seja por amor, e
gar de ver-se submergidos na Hella, a man- sim por engano, ou por força, como o de Si-
são das sombras, ou limbo da vaidade, onde glinda e Hunding, aproxima-se de seu es-
vão parar os mortais vulgares. Esta Hella é, poso para exigir-lhe, em nome do Himeneu,
nas lendas nórdicas, o frio inverno, a man- Que proteja Hundin~abandone o Wel-
são obscura, mas não o inferno da mentali- sungo, que, em seu adultério e incesto, vio-
dade católica-romana. Simplesmente um lu- lou todas as leis divinas e humanas. O deus
gar inferior ou mundo da vulgaridade, onde resiste em vão alegando que não pode exis-
ficam aqueles que não se destacaram em tir lei alguma contra as sagradas leis do
suas vidas por nenhuma ação heróica nem Amor, nem juramento algum válido que no
altruísta, bem distinto do que era o Wa- Amor não se fundamente. Fricka, furiosa
lhalla (Campos Elíseis dos gregos), onde como a Juno grega contra o nascimento de
eram carregadas em triunfo, pelas val- Hércules, Começa a maldizer a raça Wel-
quírias guerreiras, as almas dos heróis mor- sung, símbolo da suprema ignonímia de um
tos nos campos de batalha de uma vida de deus que, percorrendo os bosques como os
abnegação e de saçrifícios, para ali ser lobos, sob o nome de Welso, depois de ha-
transformados em esplêndidas aves e visto- ver forçado a Orvala Erda, ou a Natureza, e
sas borboletas. A Hella, enfim, faz parte dos tirando dela as guerreiras valquíiras, chegou
Sapta-loka, ou Sete Lugares inferiores de à baixeza inaudita de procriar "um casal hu-
Ilusão, um dos quais, o mais inferior, infer- mano", esse deus busca em sua Mente
nal por certo, era a nossa Terra para os in- transcendida nada menos que um Homem,
dostãos. um Herói que seja capaz de criar uma Or-
O pai Wotan ordena à sua valquíria Bru- dem desconhecida e que, sem a proteção di-
nhilda que baixe para proteger Sigmundo, o vina, saiba redimir-se de suas leis e cumpra
Welsungo, na luta que travará com Hun- assim seu destino, destino necessário para
ding, e ela, alegre, parte rapidamente pelos salvar os deuses, porém que nenhum deles
ares, lançando seu grito de guerra costu- podia realizar. Semelhante Desejado dos
meiro. Subitamente a -alegria da valquíria é Tempos, não é outro senão aquele divino
interrompida, e, aterrada, se detém um mo- Prometeu-Sigfrido: o "filho amado de um
mento vendo a chegada de Fricka, a inexo- pai inimigo". Fricka é o símbolo da negra
rável esposa do deus, protetora de toda a reação, oposta sempre como inerte lastro a
vulgaridade hipócrita e de todos os homens todas as exaltações dos Movimentos reden-
que se conformam com a defeituosíssima Or- tores: o mundo do Mal, em suma, contra as
dem estabelecida, essa Ordem reinante, ascensionais energias do Bem, e com o
onde o gênio, O heroismo e demais altas vir- Bem, no entanto, desposado, pela lei dos
tudes não podem nunca ser compreendidas contrários; o mundo da. Mentira contra a
em sua excelsa grandeza, e que representa, Verdade; o da Rotina, contra a mágica Ima-
portanto, a grosseira moral consuetudinária, ginação Criadora, a mais misteriosa das fa-
plena de rotinas, contrária a toda iniciativa culdades da Mente.
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Wotan, em meio à dor, sacrifica - como guido sua bravura e nossa tarefa consistia em
Abrão - seu próprio filho, com base nas leis sustentá-Ias nos combates, exaltando seu vigor
que ele mesmo criou. Esse é o glorioso sím- pela rudeza da luta, para que assim eu pudesse
bolo do pai sacrificador e do filho sacrifi- reunir no Walhalla as mais intrépidas multi-
cado, que é base de todas as teogonias, in- dões armadas, capazes de lutar. Porque, tem
clusive do Cristianismo; e o pai, fiel a esta de saber ainda ... que se o nibelungo conse-
Ordem estabelecida, vê-se obrigado, pela guir o anel, nossa ruína é segura. Hoje o anel
Inércia dessa mesma ordem, a retirar a pro- está sob acustádia dó gigante Fafner e eu não
teção de sobre o Amado de sua alma, posso retirá-lo por causa dos pactos firmados.
deixando-o abandonado em seu destino: o Somente 'um, o Eleito, um herói sem meu in-
destino do sacrifício que redime, como se fluxo, com a única ajuda de suas próprias ar-
tudo quanto existe de negro e de maldito mas, poderia conseguir o único objeto de meu
neste baixo mundo houvesse de ser lavado, Desejo. Como descobrir esse amigo-inimigo
não com o sangue das veias, mas com este capaz de lutar a meu favor contra minha pró-
outro sangue da dor moral e da imolação da pria divindade? Como criaria um Ser Livre,
Mente no aras do Amor, que é Sabedoria. que sem minha aprovação mereceria minha
Wotan retira a proteção de seu filho e gratidão e meus amores por sua rebeldia?
deixa em liberdade a valquíria, para que Quem, não sendo eu, realizará espontanea-
faça aquilo que sua Vontade determine. mente o ideal de meu exclusivo desejo? Do-
Fricka se retira satisfeita e Wotan cai triste- lorsa angústia! Asco profundo de encontrar
mente sobre uma roca, absordo em suas lú- sempre reproduzida minha imagem por onde
gubres reflexões. Brunhilda joga-se a seus quer que haja algo criado! ...
pés; Wotan narra-lhe, então, seu grande se- Brunhilda fica estupefata ante a ordem
gredo: que recebe de lutar contra o Welsungo, pro-
Que ninguém jamais saiba o terrivel segredo tegendo o repugnanteHunding, e trata, em
que vou contar-lhe. Quando comecei a perder a vão, de resistir à força da vontade paterna.
atração pelo Amor, minha alma audaz ambi- Entretanto, os felizes Sigmundo e Siglinda
cionou o Poder. Com ferocidade impetuosa, haviam subido pelo barranco e esta, com o
soube conquistar o universo e sujeitar com leis coração amargurado pelo perigo que corre
rodas as Potências do Mal ... Tão-só o astuto seu amado na luta contra o injurioso Hun-
Loge, sob a forma de uma chama errante, es- ding, cai desmaiada; Sigmundo coioca-a so-
capou de minha tirania porém, ainda sendo bre uma pedra. A valquíria, aparecendo
onipotente, aspirei amar unicamente umfi- misteriosamente, diz a Sigmundo que a olhe
lho das Trevas, um débil nibelungo, Alberico, face a face, porque logo deverá segui-Ia ao
que maldisse o Amor, soube desligar-se de tão Walhalla, onde se encontram os maiores
supremo vínculo, conquistando o Ouro do guerreiros que sucumbiram. O intrépido he-
Reno e com ele um poder incomensurável ... rói se nega a acompanhá-Ia se não puder
O anel que forjara caiu em minhas mãos, levar consigo Siglinda, coisa que é impossí-
manchando-as; porém, em vez de devolver. o vel, porque as mulheres não podem gozar
ouro às ondas sagradas, paguei com ele a cons- dos triunfos celestes, reservados aos heróis.
trução do Wa tha lia de onde domino o mundo.
r Siglinda deve ainda respirar a aura da terra
Aquela para quem o passado ou o porvir não pelo que tem de revelar depois. Em vão
tem segredos, Erda, a sublime, a sábia, fez tenta a valquíria vencer sua resistência,
com que me desfizesse do anel, profetizando- dizendo-lhe que, segundo a lei, aquele que a
me uma ruína definitiva ... quis saber de tudo, observasse face a face teria forçosamente
mas ela se retirou, desaparecendo. Perdi então de morrer. O' herói se prepara para a luta
toda a serenidade e, ansioso por saber de tudo, confiando em sua espada Nothunga ex-
Deus baixou do Céu até as entranhas da traída do Fresno da Vida, e confiante em
Terra ... Encantada pelos veios do Amor, tur- seu próp.rio esforço deixa Siglinda sob a
bada no orgulho de sua ciência, a Vala me res- proteção da insensível deusa, a qual, como
pondeu por fim ... Foi minha! E assim a mais todas as imortais, não conhecia o senti-
sábia das sibilas do mundo foi sua Mãe, a mento de piedade para com o débil, e de
terra, e a de seus oito irmãos. Eu mesmo os compaixão para com o abatido... Aos
criei com a esperança de evitar os perigos que poucos o coração da valquíria começa a
a Vala me havia predito... o vergonhoso perceber e sentir este sentimento humano
Ocaso dos Deuses. Para que na hora da luta o de piedade redentora e impede que o herói
inimigo nos encontrasse fortes, encarreguei vo- mate a sua amada para que não sobreviva ao
cês, as valquirias, de engendrar e fomentar o seu infortúnio. A valquíria, tendo já trans-
heroismo de nossos antigos escravos, os ho- formado em humano o seu coração, resolve
mens, o heroísmo da Humanidade toda, redu- desobedecer ao Pai e ampara com sua
zida por nosso despotismo a inclinar a cabeça égide, o Welsungo.
às nossas determinações ... Havíamos extin- Hunding aparece com seus cachorros e
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os dois se chocam em furiosa luta, entre os que por si só é o mais elevado dos heróis, a
fulgores da tempestade que desencadeia. A Heroína. Mas as insensíveis valquírias se
batalha fica por um momento indecisa, por- negam a protegê-Ia, temerosas do furor pa-
que Brunh ilda protege Sigmundo dos gol- terno. Brurihilda, mais sublime que nunca
pes mortais de Hunding. Quando Hunding pelo mero fato de ser já compassiva, com-
está por cair pelo ardor invencível de Sig- partilhando as dores com a pobre Humani-
mundo e de sua Nothunga (a espada), apa- dade, leva amorosamente a Mãe para a ca-
rece Wotan, de improviso, entre os comba- verna de Fafner, segura de que ali Wotan
tentes: com sua lança invencível, faz saltar não lançaria sua fúria. Serena e compassiva,
em dois pedaços a espada do Welsungo, e o com a certeza do dever cumprido, vai ao
herói, assim desarmado, cai por fim sob o encontro de seu indignado pai, não armada
golpe mortal de Hunding, enquanto a val- de lança, mas com uma arma mais pode-
quíria recolhe os pedaços da espada e, mon- rosa: o invencível vigor da Consciência mo-
tando no cavalo com a infeliz Siglinda, vai ral e humanizada, que opõe a Égide do De-
para o Walhalla. Hunding, por sua vez, cai ver Cumprido às brutalidades da força.física
morto ante a simples presença de Wotan, e às estreitezas de uma moral rotineira sem
que lhe ordena ir prostrar-se na Hela ante emotividade real: este é o tema da Justifica-
Fricka. Em pleno horror da tempestade, o ção que todo o herói humano, ainda que su-
deus supremo que acaba de sacrificar, con- cumba, lança à face dos deuses ou forças
tra sua vontade, seu próprio filho, lança ve- que o tiranizam.
lozmente o cavalo em perseguição à sua fi- Brunhilda sabe qual é o castigo que deverá
lha, para castigá-Ia pela inaudita rebeldia. sofrer pela desobediência a seu pai Wotan:
Na ladeira direita da montanha há um perderá a condição de valquíria,
bosque de pinheiros e, à esquerda, a en- transformando-se numa vulgar mortal. No
trada de uma gruta onde o monstro Fafner fundo, Wotan não está tão feliz, pois Bru-
dorme sobre seu tesouro. As divinas val- nhilda teria realizado seu desejo oculto, mas
quírias chegam à sua mansão excelsa le- novamente sucumbe em virtude de suas
vando na garupa dos cavalos as almas dos próprias leis.
guerreiros que acabam de morrer comba- Antes porém do terrível julgamento de
tendo pelo Ideal em qualquer de suas for- Brunhilda, esta havia feito a profecia de
mas. Só falta Brunhilda, que chega, por-fim, que o filho de Siglinda se chamaria Sig-
trazendo em seu cavalo a carga mais santa frido, o Redentor, e lhe seria entregue,
de uma mulher que vai ser mãe, porém, ao c.omo dote, os dois pedaços da espada glo-
mesmo tempo, a carga mais odiosa e repul- nosa.
siva para a insensível crueldade daquelas
guerreiras virgens.
- B runhilda pede o auxílio de suas irmâs,
par encontrar um local para a pobre Mãe, ~ Emilio Moufarrige
Teilhard de Chardin
8 THOT
Em abril de 1926, com quase 45 anos de muito ( ... ) nada de esotérico e um estrito ml-
idad~, o padre Pierre Teilhard de Chardin, s. j. - nimo de filosofia expliciteds: um tratado, sim-
tende-a expressão-de seu pensamento drastica- ples na forma e, quanto posslvel, ortodoxo e
mente limitada por seus superiores eclesiásti- desprovido de pretensões sistemáticas, sobre a
cos, que o levaram também a renunciar ao ma- "vida interior" ( ... l: breve tratado de esplritue-
gistério, ao apostolado e à vIda intelectual de- /idade ( ... ) essêncie do que tenho pregado du-
Paris - retoma à "Missão Paleontológica Fran- rante os meus retiros, isto é, o método de "divi-
cesa" em Tientsin, na China, onde estivera um nizar tudo"; breve 'Tratado de vida espiritual':
ano e meio antes, em estágio cientffico e expe- (cf. cartas de 7, 12 e 31/11/1926).
dições paleontológicas. Acontece, porém, que, ao registrar perspecti-
Mesmo sob o terrfvel impacto de tal revira- vas que na verdade constitufam as soluções de
volta numa carreira de sacerdote e pesquisador seus próprios conflitos pessoais, Teilhard es-
que já se patenteava como das mais brilhantes, tava, de fato, exprimindo o que vem a ser, fun-
ele procura dolorosamente a fórmula que de- damentalmente, o conflito do homem contem-
verá assumir sua fidelidade existencial. Com au- porâneo: por que, como e para que agir?
têntico espfrito de obediêncier cultivado desde a Nessas três indagações está contida toda a
infância, conclui que a Igreja e a Companhia de Problemática da Ação, decorrente ela mesma
Jesus são seu ponto de inserção no mundo, não da Problemática da Visão.
obstante os conselhos de muitos no sentido de Com efeíto, a Ciência e a Técnica nos permiti-
convencê-Io a deixar até mesmo o sacerdócio ram ampliações tão desmesuradas de nossa
em função de uma total liberdade de pensa- ótica sobre o Universo circundante,que fomos
mento e expressão. obrigados a reformular nossas mais caras con-
Sem saber, talvez, então, que ssa espécie de cepções acerca do Real e de nosso lugar e valor
exflio camuflado e restrições de tal ordem pesa- exato dentro dele. Nosso antigo e ingênuo an-
riam sobre ele até o final de seus dias, Teilhard tropocentrismo encontrou-se ainda de tal modo
procura empenhar-se animadamente em suas abalado, que entramos em verdadeira crise cul-
pesquisas e, em novembro daquele ano, apro- tural, isto é, tivemos de reavaliar, julgar e sope-
veitando um tempo disponfvel entre uma expe- sar nossas tradicionais maneiras de ser, pensar,
dição e outra, põe-se a ordenar e registrar idéias sentir e agir. (
que se esboçavam em seu espírito havia já al- Essa crise atingiu profundamente nossa con-
gum tempo. Lenta e definitivamente, tais idéias fiança na vida, e os nossos "hurnanisrnos", por
tinham amadurecido no ritmo de seu desenvol- assim dizer, des-humanizaram-se, reduzindo-se
vimento interior e ao calor de suas múltiplas vi- nossa existência a um "estar-af-Iançado", por
vências como homem de ciência e de fé. acaso, sem razão, num absurdo fundamental,
Elas diziam respeito ao sentido maior do ou, então, a uma historicidade direcionada a
nosso estar no Mundo: a construção de uma serviço de melhores dias, de um Super-Homem.
obra para sempre, o próprio Mundo, levado a de uma Super-Raça ou de uma Super-
uma ptenitude que o torne digno ser incorpo- Civilização.
rado na Perfeição Divina: ou, i1ilversamente con- Evidentemente não faltaram os cultos aos
siderando, realizado até uma consumação que o instrumentos de nossa nova visão: o Cientismo
torneaoto a ser a Transparência de Oeus. e o Tecnicismo elevaram-se como deflaqrado-:
Por vastas e majestosas que possam parecer res e solucionadores -detodos os nossos proble-
- e, de fato, são - tais proposições, elas não mas.
dão origem a um tratado filosófico ou teológico, Mundo super-dimensionado, Homem definiti-
pelo menos na intenção do autor. Pelo con- vamente sub-dimensionado ou historicamente
trário, constituem, segundo ele, apenas um tes- procurando se super-dimensionar . - -
temunho psicológico pessoal acerca de sua vida Qual a posição reativa de Teilhard - homem,
ou vlsão Interlor, traduzindo-se numa postura cidadão do Mundo - diante desse quadro?
prática diante da realidade. 'lúcido perante a Ciência e a Técnica, ele se
Ele mesmo descreve-sua motivâção imediata: dimensiona para o Universo através de um
( ... ) e como começasse a me sentir vazio de Sentido da Terra (descobrindo-se solidário é) es-
ocupeções. decidi elaborar, à maneira de livro trutura planetária que levou a Humanidade a
quase d~ piedade, essas formas de espirituell- constituir em torno da Terra uma verdadeira es-
dade ( ... l. Levam por titulo O Meio Divino. fera de pensamento, a Noofesra) reforçado e
Nsds de novo, portanto, a não ser o esforço embasado por um Sentido Cósmico
para expressar meus pontos de vista como ati- ~escobrindo-se em contato e Intima ligação
tude prática, ecesstvet a todos, com a menor com todo o Universo, de forma a apreender-lhe
spar'ncia posslvel de pretensões sistemáticas" a unidade de fundo por sob a multiplicidade a-
(et. carta de 8/11/1926), e, em várias oportuni- parente).
dades, reafirma e explicita o seu projeto de es- Coerente para com o Homem, ele se dimen-
crever um siona enquanto tal,' desenvolvendo um Sentido
livro lfIedede (.; .), espécie de doutrina Humano, isto é, uma tomada de consciência da
BscéticB ou mlstlca que eu vivo e prego de há Humanidade como totalidade tangfvel e con-
THOT 9
ereta, capaz de tomar nas mãos a sua própria Matéria"/1.950).
evolução e de construir o seu próprio Futuro. Eis porque pode o Cristão amar ao Homem e
"Evidentemente, tais Sentidos, manifestando- ao Mondo: ambos estão impregnados daPre-
se primeiro como sensações e/ou sentimentos sença Divina. Deus é o seu ambiente, sua at-
intuitivos, merecem toda uma elaboração inte- mosfera, sua' condição básica dê vida e existên-
lectual - através de reflexões, meditações e es- cia, o seu meio por excelência. Todo o Real é
critos - que Ihes confere o estatuto de fiéis pa- um só imenso "Meio Divino".
rAmetros para uma auto-avaliação do Homem e Ninguém precisa temer o Mundo. Todos po-
para uma avaliação do Universo, avaliações es- dem amâr o Mundo, e o Cristão mais do que
sas que resultam em síntese de todo o Real. ninguém. Realizar o Homem e o Mundo, cons-
Este não é senão vasto processo evolutivo de truir a Terra é co-criar. criar com Deus, colabo-
unificação do Múltiplo, onde o Homem se en- rar na Sua Obra de Criação Que" aos nossos
contra em lugar de destaque, dadas a sua com- olhos, prossegue através aa EvoluçJo; ~, em'úl-
plexidade material e sua consciência espiritual: tima, instância, trabalhar com Deus para a COn-
não mais o centro geométrico e jurldlco de um sumação do Corpo Mfstico de Cristo.
Universo estático, como no Velho Antropocen-' Assim o Cristão é bem o homem entusiasta,
trismo de Posição, mas ponto culminante ou fle- progressivo, otimista e de "coração ardente"
cha da Evolução. que, equilibrada mente, descobre que, na suá
Nessa concepção de uma Evolução Cósmica encarnação e historicidade, santidade é tam-
e de um Néo-Antropocentrismo de Movimento, bém sanidade e esta exige presença, testernu-
pode o Homem, portanto, encontrar uma sarda nho e, sobretudo, fidelidade.
mais coerente para a sua razão, fecunda para a A fidelidade existencial do Cristão emerge,
sua ação e digna para a sua situação. pois, de sua visão e alimenta-se de sua eção
Entretanto, como se resolve a mesma ques- (que pode ser, até mesmo além de conquista,
tão "Mundo vs. Homem" para aqueles que renúncia e desapego, ultrapassagem das coisas
crêem? Para aqueles que divisam uma trans- e das pessoas) ou então de sua p8ixão, isto é, de
cendência para além da História, uma dimensão suas passividades que ocorrem quando ele se
absoluta acima de toda a relatividade, um Deus esvazia para que Deus o preencha, quando ele
para além do Mundo e do Homem? se diminui para que o 'Cristo nele cresça, quando
Qual será a resposta do cristão, em particular, ele morre para que a Vida eterna se manifeste,
à tríplice indagação do "porq~e, como e para
que agir"?
Avesso ao materialismo grosseiro pela pró-
pria essência de sua fé, inconformável ao mate-
rialismo filosófico (para o qual a religião é alie-
nante) pela própria essência de sua esperança,
como realizará ele a essência de sua caridade,
senão desencarnando-se, isto é, deixando de
participar normalmente da fé e da esperança
humanas, desinteressando-se dos progressos
terrenos e da evolução universal. vivendo a sua
espiritual idade num outro nlveí que não o hu-
mano, terreno ou cósmico e evadindo-se para
I,Im outro plano, para um reino que não seja
deste mundo?
Teilhard encontra outr.a salda. Completando e
coroando os Sentimentos Cósmico e Humano, é
preciso que se desenvolva um Sentido Cristão,
aquele que nos põe em contato comas energias
espirituais irradiantes do Cristo, Filho do Ho-
mem, Filho de Deus Vivo, o próorio Deus encar-
nado Que, tendo criado o Homem e o Mundo,
amou-os tanto que deles quis se revestir, neles
quis se manifestar historicamente, através deles
trarisparece progressivamente e com eles será
Plenitude eternamente .
. O,Cósmico e o Crlstico. portanto, em conjun-
ção através do Humano devem levar-nos a
( ... ) procurar uma via rumo ao Céu (não me-
diana, mas sintética) em que todo o dinamismo
c/8 M8téri8, e de Csrne pesse 8 G.~nese do
Espirito. ( ... ) atingir o Céu pela construção da
Terrs. Cristiticer 8 Matéria. (Cf. "O Coração da
10 tHOT
Tanto quanto todos os homens e até mais que valem não somente pela intenção com que
que eles, o Cristão é. alguém que oromove o se realizam, mas também por seu resultado efe-
Real, divinizando o Mundo e consumando o Ho- tivo, uma vez que, por mínimos que sejam,
mem. 0 seu Cristianismo constitui um ,autêntico constituem todos micro-estruturações do Real,
Super-Humanismo, de virtudes operantes: uma e, por isso mesmo, cooperações na consumação
fé que çonsagra, uma esperança expectante que do Mundo em Deus. Através de nossos atos e fa-
invoca, uma fidelidade-caridade que unifica e tos, o Mundo evolui e se sintetiza para nós e nós
une, em comum união, em comunhão universal, próprios evoluímos e nos sintetizamos para
em comunhão dos santos. Deus. Assim, pela ação, entramos em autêntica
Eis como Teilhard resolve pessoalmente a "comum união" de tudo com tudo, e, na perfei-
problemática da Ação, e, ao fazê-to. está, de ção que buscamos em cada ato, tanto santifica-
fato, através de sua obra, apresentando algo mos qualquer esforço humano como humaniza-
mals que o mero relato de uma experiência psi- mos o esforço tipicamente cristão.
cológica particular, está nos oferecendo um mo- Não nos esqueçamos, contudo, de que cada
delo ou paracrqrna personalizado de uma expe- ato ou fato, num percurso evolutivo, deve ter
riência cultural universal. sempre o significado de um marco a atingir e a
O seu 'Tratado de Vida Interior", pode, por- ultrapassar. Agir e fazer, portanto; mas evoluti-
tanto, vir a se constituir no grande livro de espi- vamente, superativamente, desapegadamente.
ritualidade do século XX, como o foram em suas E não éà renúncia do "já conquistado" que
épocas, a "Imitação de Cristo", os "Exercícios nos convida insistentemente o "a conquistar"?
Espirituais" ou a "Introdução à Vida Devota". Nesse processo de auto-realização, constru-
E como tal deve ser lido. No mesmo espírito ção, posse, conquista e desapego, ampliam-se
em que o autor o escreveu: os nossos ideais. E de tal forma, que súbito dá-
lentamente, tranqüilamente, vivendo-o se a conversão, manifestando a outra dimensão
e meditando-o como uma oração: suavemente pulsante de nossa existência, a das
como uma prece". (Cf. cartas citadas passividades.
anteriormente). Aqui trata-se de divinizar também o que não
Adentrando por essa intimidade orante, en- fazemos, o que antes é feito em nós, aquilo que
contramos, de partida, a orientação das refle- em nós depende de energias infinitamente su-
xões que ela contém: a obra é dedicada "para periores a nós. De um lado, as passividades de
aqueles que amam o mundo" ... logo identifi- crescimento, pelas quais recebemos aquelas
cados como "os inquietos de dentro e de fora", energias e as integramos ao nosso ser a fim de
isto é, aqueles que não conseguem conciliar ('I aumentá-Ia e crescer; de outro, as passividades
seu "ideal religioso humano" e o seu "ideal reli- de diminuição, pelas quais aquelas energias nos
gioso cristão", por recearem falsear-se ou destroem, esvaziando-nos de nós para que - se
diminuir-se, desencarnando-se ou alienando-se, consentirmos - o mais .Perfeito em nós ·tome
para ingressar no caminho evangélico, abrindo lugar.
mão de suas inatas, naturais e instintivas atra- Em ambas é preciso apreender a presença di-
ções pela Terra. vina. Nas primeiras, talvez não seja tão .difícil
Sim, cada homem tem a sua própria vocação, fazê-lo, Não é comum identificarmos o. alento
um chamamento ou apelo interior para a sua de um Absoluto em todo grandioso que nos do-
plena auto-realização, desabrochar de todas as mina, arrebata e exalta, mesmo temerosos
suas potencialidades. Mas essa vocação pes- diante do Desconhecido ameaçador? Afinal.
soal não é senão expressão fragmentária, his- ainda que confusamente, é a vida que chega a
tórica, empírica e situacion'al da profunda voca- nós em tudo e através de tudo o que pode nos
ção humana universal, global, eterna, neces- fazer crescer ...
sária e permanente: a vocação de criar o seu Mas, como apreender a presença divina nas
Mundo, de co-crlar com Deus o Universo e de, passividades que nos parecem fontes e ocasião
por fim, unir-se harmoniosamente, sem em de diminuição? Como pode Deus' estar presente
nada se perder, à totalidade do Todo em Pleni- nos obstáculos, nas ameaças, nos perigos, nas
tude. agressões, incidentes, acldentes. dores, cho-
Sua existência é o seu campo de provas. É ques, mutilações, defeitos, deformações, infe-
nos limites de sua duração que ele deve encon- rioridades, enfermidades, envelhecimentos,
trar e percorrer o caminho que o fará "ir se fa- degenerescências e mortes? E, no entanto, Ele aí
zendo", que o conduzirá a essa estruturação pode. estar se o quisermos. Pela força de nossa
contínua e evolutiva de sua realidade, que o le- fé. E de um modo, por assim dizer, tipicamente
vará enfim à Grande Síntese. divino: primeiro, lutando conosco contra o Mal;
A experiência nos revela essa existência em seguida, aproveitando nossas inevitáveis
dividindo-se em dupla pulsação: atividade e derrotas para o triunfo do Mundo; em todo caso,
passividade, agir e padecer, fazer e sofrer. transfigurando, convertendo, transmutando
Para aquele que tem por meta alcançar o Divino Morte em Vida, Mal em Bem, Imperfeição em
em si, trata-se então de tudo divinizar. Perfeição; e, em última instância, unindo-nos a
Primeiro as atividades, atos e fatos (feitos) Si em comunhão.
THOT 11
Nessa perspectiva, a Sua Vontade só é atin- Centro com o foco histórico que constitui a
gida, a cada instante, no extremo limite de mi- Epifsnis, a ma iifestacâo do contato humano-
nha própria expansão, no ponto de que minha divino na pessc I de Jesus Cristo. Todo o eixo
atividade orientada para o ser-mais, por si só, tradicional pelo :.I ai o Cristianismo se expandiu
nada mais pode e então, sem deixar de ser fiel, desde então não foi senão progressiva irradia-
rende-se, entregando-se confiante a uma neces- ção daquele Centro que vai invadindo o Cosmo
sária superação da aniquilação máxima, "super- inteiro em crescente Diafania, transparência de
ação" que é comunhão de resignação. sua onipresença.
Para quem consegue assim dimensionar a Esse anunciar-se, evidenciar-se, mostrar-se,
sua existência,· o Real, todo o Real e o Real revelar-se, transparecer enfim, patenteia que o
todo, torna-se de fato um magno ambiente de Meio Divino é o próprio Verbo de Deus encar-
ser e existir, o clima propício à realização de sua nado, Jesus Cristo, impregnando, para ,;ós,o
vocação pessoal e humana, o meio que já é Universo de sua onipresença em vista da consti-
transparência da Grande Síntese, o Meio Di- tuição final de um Todo - união, comunhão de
vino, no qual "vivimus, movemus et sumus" ... toda a Criação como o Incriado, síntese do Múl-
Imenso como o Mundo, ele pode se concen- tiplo no Um - que é Repleção Quantitativa e
trar e precisar-se no encanto e cordialidade das Plenitude Qualitativa: o Pleroma.
pessoas humanas. O Pleroma ... Misteriosa realidade que va-
Amplo e inumerável como as criaturas que mos estabelecendo, um pouco a cada instante,
sustenta e super-anima, ele guarda, ao mesmo ao longo de todo o espaço-tempo, através de
tempo', a transcedência que lhe permite nossas consaqrações (e para toda a Matéria se
conduzi-Ias, todas, sem confusão, à sua pessoal estende "Isto é Meu Corpo"), de nossas comu-
Unidade. nhões (a Perfeição entrando no Homem), de
Próximo e tangível - pois em tudo e todos, nossas vidas (a Perfeição imprimindo-se no
por tudo e todos, nos toca e pressiona - afasta- Mundo), de nossas mortes (o· Mundo liberando
se sempre mais como um valor- o Espírito para Deus).'
horizonte,atraindo-nos para o centro comum de Assim o Meio Divino, esse "Reino de Deus"
toda a plenitude. que está dentro de nós mesmos, surge em cada
E todos esses atributos decorrem exatamente mente e coração humano como um sentido
de ser ele, o próprio Deus, ponto último de con- (não necessariamente sentimento) de totali-
vergência de todas as realidades, um Centro, dade: a percepção da onipresença divina.
pelo qual, com o qual e no qual tudo se toca, Prolonga-se por nossa pureza (busca dessa pre-
reune-se e se consuma, diferenciando-se. sença acima de tudo), por nossa fé (que a partir
É Imediata e imposltíva a indefinição desse daí opera a sobre-animação do Universo), por
12 THOT
nossa difelidade (lealdade a um Deus que é para com uma esperança totalmente humana, ou até
nós o eterno Descobrimento e o eterno Cresci- apresentando-se como um prolongamento har-
mento). monioso de plena realização deste Mundo.
Há' um ponto privilegiado, ponto único em Olhemos à nossa volta. O que se passa ao
que pode nascer para cada homem, a cada mo- nosso redor neste momento? Desordens so-
mento, o Meio Divino. Mas esse ponto não é ciais, conflitos, agitações, inquietude na massa
um lugar fixo no Universo. É antes um centro dos povos. A Humanidade atravessa visivel-
móvel que devemos seguir como os Magos se- mente uma grande crise de crescimento.
guiram sua estrela. Obscuramente consciente da imensidade do
Seja qual for nossa vocação pessoal, se se- Mundo, da grandeza do Espírito e do valor sa-
guida com aquelas virtudes de pureza, fé e fide- grado de toda a Verdade a ser conquistada, ela
lidade, levar-nos-à sempre para mais alto. E percebe o que lhe falta e conhece o seu próprio
esse mais alto é a Perfeição. poder. Por isso avança mais entusiástica e vio-
Desejos maiores sobrepondo-se a desejos lenta do que nunca em direção ao Futuro.
menores, renúncias prevalecendo sobre satisfa- Cabe ao cristão incorporar-se resolutamente
ções, mortes consumando vidas - assim vamos nessa imensa corrente e evidenciaraosdemais
todos atingindo, mais ou menos depressa, um homens que a Plenitude esperada por todos é
plano de menor egoísmo, um plano de maior bem o Cristo que ele mesmo espera e anuncia.
união, um plano em que tudo o que ainda não é Aquele que era, que é e que vem.
O Um passa a ser, não rejeitado ou evitado, mas Uma multidão imensa constrói e investiga.
assimilado e transposto. Nos laboratórios, nos escritórios, nos desertos,
Nessa evolução chegamos ao plano máximo nas ruas, nas fábricas, no fundo dos mares e na
da Caridade. infinitude do espaço, nas cidades e nos campos,
Definitivamente unificado no Pleroma, o no enorme cadinho social, os homens multipli-
Meio Divino deve começar a se unificar desde já cam seus labores penosamente.
em nossas existências e essa unificação só é Tudo quanto neles efervesce de arte, ,ciência,
possível quando as nossas existências, elas pró- técnica e pensamento tem um sentido maior: o
prias, começam a se unir entre si. Eis a nossa de precipitar aquela Vinda gloriosa.
"tensão de comunhão" impelindo-nos à consu- Ao Trabalho e à Pesquisa empreendidos,
mação definitiva de nosso ser no encontro com resta-nos então acrescentar apenas um sentido
o próximo, e, através dele, no encontro com de profundo respeito e reverência perante o
Deus. Sagrado que se evidencia a cada instante e em
Nenhuma dessas idéias foge às grandes ver- cada lugar, um sentido de Adoração.
dades do Cristianismo mais tradicional - o do Tais, em linhas rápidas, e gerais, as perspecti-
Batismo, da Cruz e da Eucaristia - simples- vas teilhárdianas expressas em "O Meio Di-
mente elas o arrancam de um Cosmo estático e vino", uma obra quase impossível de resumir
pronto, para projetá-lo numa Cósmogênese, isto sem, de algum modo, desfigurar na grandeza de
é, num Cosmo dinâmico que ainda se faz. Em sua lógica e precisão, na verdade forte de suas
outras palavras, dão-nos' o Cristianismo que proposições, na beleza de sua atmosfera íntima
assimilou o sentido da evolução, o sentido do e, sobretudo, na santidade ousada de seu es-
humano e do Pere-Adlente. forço para descobrir, reinstalar e revelar o Sa-
É para este último que estarnos finalmente grado em nossas vidas.
nos direcionando. E os cristãos, por esperança, Nenhum artigo, comentário ou estudo pode-
mais até que todos os outros homens, ria, portanto, pretender jamais dispensar uma
Um fim do Mundo, uma saída ou êxtase cós- leitura direta do texto 'que em breve será edi-
mico, o rompimento do véu fenomênico e a ma- tado em português.
nifestação plena do Ser, a ultrapassagem ex- Foi com essa certeza que desenvolvemos es-
trema do natural e a evidência absoluta do so- tas considerações. Esperamos que o leitor, en-
brenatural, o triunfo do Um sobre o Múltiplo, a tusiasta. e otimista por temperamento humano,
consumacão do Corpo Místico, a Comunhão e tão carente de vida interior como a grande
dos Sant~s, o Cristo em glória, a face de Deus, a maioria de nossos contemporâneos, encontre
Parusia - eis o que todos, consciente ou in- aqui e na leitura urgente da obra do Pe. Teilhard,
conscientemente, esperamos. um incentivo real parta a consecução de suas
Mas essa espera deve ser ansiosa, coletiva, vocações maiores pessoal, humana e cristã,
atuante, pois é a acumulação de nossos desejos com fidelidade existencial permanente.
que fará por fim eclodir o Grande Dia.
A chama da esperança não pode, pois, se ex-
tinguir nunca. Antes cabe-nos reavivá-Iacuste o
que custar. E, para fazê-Ia, atualmente, não há
senão um meio: humanizá-Ia. José Luiz Archanjo, Ph.D.
'Ninguém espera o Céu, senão na Terra. São Paulo, 1.9 de maio de 1981
A esperança expectante do divino precisa 1.9 Centenário do Nascimento de
encarnar-se. ldentlflcando-se de alqurn modo Pierre Teilhard de Chardin, s.j.
THOT13
A Ciência Médica
no Antigo Egito
ASSIM
DEUS FALOU
AOS HOMENS
~~
~
------------------------------------- -------------------------------------
- Mario Ferreira dos Santos -
Aristocracia
e Democracia Jorge L Garcia Venturini
(dezembro/7 4)
Devido a alternativas semânticas sofridas privilégios hereditários e inalteráveis, não
no transcurso do tempo, estes vocábulos pa- importando quais sejam os verdadeiros va-
receram ter significados opostos. A partici- lores éticos ou a efetiva capacidade para go-
pação de todos na coisa pública foi denomi- vernar, é certo que a democracia (e a repú-
nada democracia (embora, como forma de blica) lhe são contrárias. Mas ocorre que
governo, o nome correto fosse república), e, aristocracia significa também e fundamen-
como tal, se confrontava com a participa- talmente "o governo dos melhores" (áristos
ção de apenas uns poucos, o que se denomi- significa, em grego, o melhor), e neste sen-
nava· aristocracia ou, também, oligarquia, tido a democracia não tem por que opor-se
termos estes que se usam indistintamente, o à aristocracia - a menos que se deseje algo
que tampouco é correto. A democracia - que não se deveria desejar, ou seja, o go-
em linguagem superficial e convencional - verno dos piores. Não obstante, a incúria na
costuma assim representar o contrário da linguagem, que nos faz dizer às vezes o que
aristocracia. Isto porém, requer uma maior não queremos dizer, tem-nos levado com
atenção, já que por trás de um falseamento muita freqüência a associar aristocracia
semântico se esconde sempre um falsea- com oligarquia, que não é o governo dos
mento conceptual e entram em jogo princí- melhores mas o de uns poucos (e, segundo
pios fundamentais. seu tradicional sentido, o governo "egoísta"
Se por aristocracia entendemos uma desses poucos), fazendo confrontarem-se
classe social que por sua linhagem democracia e aristocracia, no elevado sen-
encontra-se investida de numerosos privilé- tido deste termo.
gios, entre eles o de governar, sendo estes E como a linguagem nos condiciona e
THOT 23
mesmo nos determina - como diriam os es- ressa destacar aqui é que um homem do sé-
truturalistas, "eu não sou falado" -, em não culo XVIII, um porta-voz da revolução, um
poucas consciências democracias passou a antimonarquista e anti-aristocrático (no
significar ou a implicar a mediocridade, a sentido da aristocracia classista e heredi-
mediania (a chamada mediocraciay, ou dire- tária) haja insistido no vocábulo aristocracia
tamente a possibilidade de atingirem o po- para designar a forma ideal de governo.
der os menos aptos, os inferiores, até os in- Em nosso século temos o caso não já de
capazes e os piores. Há, casos em que já não um pensador mas de um político ativo, que
se trata de aristocracia nem de democracia, constitui um verdadeiro modelo do que
mas abertamente de kakistocracia (1). queremos dizer. Trata-se de Winston Chur-
*** chill, o maior dos democratas e o maior dos
Em nossos dias todos se autodenominam aristocratas. Seu sentido democrático foi
democráticos, quase não havendo quem se realmente excepcional. Ninguém defendeu
diga aristocrático; este termo pode chegar a com tanta lucidez e decisão a democracia,
ser quase um insulto. E isto é muito grave. como forma de governo e como forma de
Porque ao socairo dos termos mal emprega- vida. A ninguém deve tanto a democracia.
dos, veio-se perdendo o sentido do melhor, Teve até o gesto de não aceitar como prê-
deslocado paulatinamente pelo confor- mio (coisa que não fizeram seus colegas, in-
mismo ante o medíocre e até, de fato, pela clusive trabalhistas) um título de nobreza,
aceitação do pior. E o mais triste é que isto conformando-se com o de sir, porque do
se faça em nome da democracia. contrário não poderia continuar freqüen-
A democracia (preferentemente e-m seu tando a Câmara dos Comuns, seu templo,
verdadeiro significado de forma de vida, sua trincheira. Ele era antes de mais nada
mas também no sentido de forma de. go- um child of the House oI Commons, como
verno) poderá funcionar efetivamente e re- tantas vezes se autoqualificava em seus bri-
alizar os elevados propósitos que lhe são lhantes discursos. Não obstante, nunca dei-
atribuídos pelos que nos chamamos demo- xou de ser lord, que já o era por sua linha-
cráticos; somente quando. não se oponha à gem: um senhor do espírito, em seus gestos,
aristocracia, mas se complemente -e se im- em suas palavras, em seus hábitos e em seu
pregne por ela. Por ser democráticos, .ha-: talento, cabal personificação da velha areté
veríamos de não aspirar ao governo dos me- homéricae cavalheiresca.
lhores? Em nome da democracia, havería-
mos de aplaudir o governo dos piores?
E perceba-se uma coisa. Que isto de "go- ***
verno dos piores" não são meras palavras.
Há casos na história em que diversas cir- Perigosa tendência de nosso tempo de
cunstâncias fazem possível a tomada do po- mediocrizar, de igualar pelo mais baixo, de
der por aqueles que são rigorosamente os afastar os melhores, de aplaudir os piores,
piores, tanto por seus turvos antecedentes de seguir a linha do menor esforço, de
quanto por sua frágil moral, por sua ausente susbstituir a qualidade pela quantidade. A
capacidade e outros rasgos afins. verdadeira democracia nada tem a ver com
*** essas módicas aspirações. Não pode ser
O ideal aristocrático está presente na me- processo para baixo, mera gravitação, mas
lhor tradição ocidental. Já na epopéia ho- esforço para cima, ideal de perfeição. E isto
mérica o conceito de areté (da mesma raiz é válido tanto para a consciência individual
que áristos) é o atributo próprio e indecliná- quanto para a coletiva, que interagem entre
vel da nobreza. Areté é o valor, o talento, a si. Dizia muito bem Platão que "a qualidade
honra, a virtude, a capacidade, o senhorio. dapolis não depende dos carvalhos nem das
Nos filósofos clássicos e nos tempos médios rochas, mas sim da condição de cada um
sempre se afirma a necessidade do "go- dos cidadãos que a integram".
verno dos melhores", embora jamais tenha O cristianismo e o liberalismo, cada um
sido fácil conseguir a fórmula para realizá- em seu momento, foram grandes promoto-
10. O próprio Rousseau, inte'rgentemente, res sociais, pois quebraram estruturas ex-
assinala como a melhor forma de governo cessivamente rígidas e fizeram com que os
não a democracia (que ele entende no sen- de baixo pudessem chegar em cima. Em tal
tido de exercício direto do poder pela multi- sentido, foram dois grandes processos de-
dão), mas sim a aristocracia eletiva, conven- mocráticos. Mas nenhum de seus teóricos
cido de que do sufrágio surgiriam os melho- advogou pela mediocridade nem renunciou
res, embora reconhecesse que o procedi- ao "governo dos melhores". Só o populismo
mento pode falhar. Porém o que nos inte- atual, que não é democrático, e sim totali-
(1) Kakistoí: os piores; quer dizer, então, "governo dos piores". Achamos que
seria ilustrativa a divulgação d~stc vocábulo. em vista das circunstâncias que a-
tário, abjura o ideal aristocrático e entro-
travessamos. niza os inferiores. Que lástima!
24.THOT
pacidade de confundir as coisas), e em defi-
Acerca da "Kakistocracia" nitivo, diríamos, quase inocente.
Pelo contrário, kákistos, em grego, é o su-
perlativo de kakós, que significa "mau", e
também "sórdido", "sujo", "vil", "inca-
paz", "perverso", "nocivo", "funesto" e
outras coisas semelhantes. Logo, se kakós
(marçoI75) significa mau, kákistos, superlativo, significa
No artigo anterior procuramos reivindi- o pior. Plural de kákitos e kakistoi, ou seja, os
car o termo e o conceito de aristocracia, tão piores. Daí que se nos ocorreu kakistocracia:
menosprezado em nossa época. Ali apre- governo dos piores.
sentamos as razões históricas e conceptuais Parece-nos que surgem claras as diferen-
que mostram que a democracia - para ser ças entre o "chanta" e o kákistos. Há vários
autêntica, e não mera palavra oca ou sim- matizes, mas há sobretudo um aspecto mo-
ples mecanismo eleitoral que proclama o ral; o "chanta" pode ser - e freqüente-
triunfo da metade mais um - longe de opor- mente o é - inocente; o kákistos, no sentido
se à aristocracia devia completar-se e empregado, é absolutamente responsável e
impregnar-se de seu espírito, quer dizer, inculpável. Além disso, é o pior.
longe de abjurar do governo dos melhores O significado profundo e real de
(aristocracia) devia a ele aspirar, sob o risco kakistocracia só se apreende em contraposi-
de deixar de ser democracia. Também ad- ção com aristocracia. Ademais, se se designa
vertimos que pareceria existir uma tendên- ao "governo dos melhores" como
cia geral (de toda ordem, e não apenas em aristocracia, e inclusive circula outro termo
questão de governos) a buscar ou de mais recente gestação - mediocracia -,
conformar-se com os piores. Daí, afirmáva- por que não cunhar um vocábulo que desig-
mos ainda, resulta que às vezes tem acesso nasse não já aos medíocres, mas decidida-
ao poder um conjunto de indivíduos que mente aos piores? Ou será que os piores não
por seus turvos antecedentes, por sua frágil têm acesso aos governos? Ignoramos que
moral, por sua ausente capacidade e outros haja alguma lei - escrita pelo menos - que
rasgos afins, conformam "o governo dos o impeça. E se essa lei existe, já foi, de fato,
piores", e então se nos ocorreu propor, para violada.
denominá-lo, o termo "kakistocracia". Quando um grupo ou um povo cede em
Posteriormente, e não sem satisfação, seu afã de promover os melhores, entra in-
percebemos que o termo encontrou eco em defectivelmente em um tobogã, e, passando
distintos colaboradores desta página (2) e pelos medíocres, termina com os piores.
em outras publicações e meios. Ocorre que Não estamos aqui questionando formas de
as palavras nascem e se impõem quando há governo ou modos de eleger governantes.
coisas a, designar. Se o termo em questão Este é outro tema que talvez abordemos em
provocou eco, foi simplesmente porque se outra oportunidade. Trata-se fundamental-
carecia de sua presença. E precisamente mente de um espírito, de uma inspiração, de
por tudo isto desejamos fazer mais algumas uma exigência profunda da consciência in-
considerações a respeito. dividual e coletiva. Trata-se de tender para
Já nos foi dito e temos lido que baixo - mera gravitação - ou de tender
kakistocracia é sinônimo, ou seria o mesmo para cima - afã de perfeição. Trata-se de
que chantocracia, vocábulo formado não exigir e exigir-se menos ou de exigir e
sem certa arbitrariedade a partir de uma ex- exigir-se mais. Trata-se, enfim, de ser reba-
pressão da gíria portenha (chanta) e de uma nho ou de sentir-se e atuar como pessoa hu-
desinência grega (kratia). Sem tirar toda va- mana. Porque a kakistocracia não é apenas
lidez deste termo, devemos assinalar que um atentado contra a ética - já de por si in-
não existe tal sinonímia, pelo menos com finitamente grave - mas também contra a
referência ao sentido que quisemos dar a estética, uma falta de bom gosto.
"kakistocracia". O chanta é essencialmente
um ebaucador, um embusteiro, um maledi-
cente, alguém que fala muito sem dizer
nada; a rigor, um trapalhão, conforme des- Extraído de "l» Prensa", Buenos Aíres - Argentina
igna O· dicionário àquele "que não faz o que
diz" e "ao que faz mal alguma coisa". O
chanta, na gíria portenha, designa, pois, um
personagem nada recomendável mas não
demasiado prejudicial (a não ser por sua ca-
THOT 25
o Reino da Alegria está em Ti
Todos procuramos a felicidade. Por que É célebre o caso de William Pitt, o pro-
tão poucos de nós a encontram? motor da coalização contra Napoleão.
Diz uma cantiga alemã: Quando soube da vitória de Napoleão em
Ando sozinho, sempre sonhador. Austerlitz, morreu na hora. A raiva o ma-
E meu suspiro pergunta: "Para onde?" tou.
A voz dos espíritos me responde: Felizmente, não morremos todos de raiva
"Onde não estás está a felicidade. " como o terrível Pitt. Mas quantos de nós,
Essa cantiga melancólica retrata a atitude seja qual for nossa profissão, cultura, renda,
da maioria dos homens na sua procura da posição social, procuramos aumentar nos-
felicidade: procuram-na onde não está, em sas posses e nossos sucessos, pensando en-
bens exteriores, e esquecem de procurá-Ia contrar neles a felicidade - enquanto deixa-
onde está: nas suas próprias almas. mos a inveja, o ódio, o medo, a concorrên-
Há alguns anos atrás, o cientista Elmer cia feroz, o egoísmo e tantos outros senti-
Gates fez experiências sensacionais para mentos destruidores fecharem a porta à feli-
pôr em evidência a relação entre nossa feli- cidade.
cidade e nossas emoções. Recolhia em tu- O Dr. Bouchar cita o caso de deputados,
bos o hálito de homens sãos em diferentes ministros, políticos, que tinham entrado nas
estados psicológicos e tratava-o com iodeto assembléias perfeitamente sadios e que ,
de rodopsina. E eis o que descobriu: se a após discussões tempestuosas,. apresenta-
pessoa cujo hálito foi recolhido achava-se vam albumina ou açúcar na urina.
na ocasião 'num estado sereno, não se verifi- "Ninguém é feliz do exterior se não o for,
cava no tubo precipitação alguma. Se estava primeiro do interior", afirma Fulton J.
com raiva, havia um precipitado acasta- Sheen. Quem pode discordar dele?
nhado. Se estava triste, o precipitado era Na realidade, os pesquisadores já obser-
cinzento. Se sentia remorsos, o precipitado varam que, entre os mendigos, existe a
era rosado. mesma proporção de homens felizes e infe-
Esses precipitados eram então inoculados lizes do que entre os abastados. Mesmo nos
em homens e animais, e todos ficavam afe- hospitais, nas cadeias - quando os sofri-
tados em diversos graus, dependendo do mentos e as privações não são aniquilantes
precipitado usado. - existe a mesma proporção de homens feli-
"Minhas experiências provam, concluía o zes e infelizes do que na vida normal. Onde
cientista, que os sentimentos negativos pro- está o segredo? Na alma de cada um.
duzem no organismo compostos perigosos, Mesmo o amor, a exaltação patriótica, a
alguns dos quais são extremamente tóxi- luta por uma causa, um lucro inesperado, os
cos." quais enchem O· coração de júbilo, têm
Como um homem rico irá, pois, encon- efeito passageiro se a pessoa não viver num
trar a felicidade nas suas riquezas se, ao clima habitual de felicidade.
acumulá-Ias, deixa a avareza, a ganância, a
ansiedade, a desosnestidade, a cobiça ***********
envenenarem-lhe o organismo? Será possível definir as condições da feli-
Como um político irá encontrar a felici- cidade e conquistá-Ia pouco a pouco? Defi-
dade nos seus sucessos se é possuído pelo nições das mais penetrantes continuam a
ódio, o fanatismo, a ambição desmedida, a ser dadas pelos pensadores desde o tempo
preocupação de destruir os outros, O medo de Confúcio. Mas os homens realmente ra-
do futuro? cionais para aproveitá-Ias têm sido sempre
26 THOT
raros. A maioria dos homens, não tendo en- 4. A vida é feita de alegrias e de sofrimen-
contrado à felicidade onde a procuravam, tos, como o ano é feito de inverno e de prima-
não se dão conta de que erraram o caminho vera, como a terra produz árvores frutíferas
e passam a acusar o destino, como se a feli- e plantas daninhas. Nenhum ser vivo, desde
cidade dependesse simplesmente da sorte e o vermículo até o homem, escapa a seu qui-
como se a encontrássemos por acaso, sem nnão de sofrimentos. Compreendendo-o, ti-
mérito pessoal, como encontramos um ramos às derrotas o poder de nos desanimar
trevo de quatro folhas. e sabemos que há sempre novas vitórias à
Um sábio oriental comparou a felicidade nossa espera.
a um templo sustentado por sete pilares. O 5. Vive na expectativa do bem, e o bem virá
templo está dentro de nós, e os pilares são a ti. Vive na expectativa da desgraça, e a des-
hábitos de pensar e sentir que podemos ad- graça virá a ti. Por seus pensamentos predo-
quirir. São eles que criam esse clima habi- minantes, o homem é o arquiteto de seu
tual de felicidade que faz a diferença entre destino. Sêneca disse há séculos: "O ho-
um homem e outro. mem é o que pensa."
Eis como o sábio os definiu: 6. A felicidade é feita, numa grande propor-
L Conhece-te e aceita-te tal como és, ção, de serenidade. E a serenidade nasce da
procurando tirar o máximo dos dons que a compreensão, da tolerância, da maturiade,
natureza depositou em ti. Se nasceste um da aceitação do que não podemos mudar,
musgo, não estragues tua vida procurando da nossa capacidade de resolver os proble-
ser um cedro. Mas sê o melhor musgo que mas e de harmonizar-nos com os outros e
se possa encontrar. com o universo.
2. Determina um objetivo para tua existência 7. Cultiva a elevação da alma. Muitas má-
e põe tuas energias a serviço desses obiettvos. goas nossas resultam de nossa própria pe-
"A maioria dos meus pacientes não pade- quenez quando odiamos, invejamos, cobi-
cem de doença alguma, anrrna o Dr. Heh- çamos. A ciência moderna confirma a velha
mann, mas são vítimas do vazio e da indefi- sabedoria da índia: Sê altruísta, tem amigos,
nição de suas vidas." ama os outros, e quem aproveitará será
3. Não te deixe atormentar por receios hi- mais tu do que os outros.
potéticos. Goza plenamente a horapresente Essas verdades foram enunciadas milê-
e confia no futuro. Muitos homens vivem nios atrás e repetidas por centenas de filóso-
temendo desgraças que nunca materiali- fos dos tempos. E ninguém as renega. Só
zam: acidentes, pobreza, insucessos, doen- falta quem as ponha em prática.
ças, agressões, ou deixam o medo da morte
entristecer-lhes os dias (para descobrir, no
momento da morte, que ela é tão natural
quanto a vida). M ansour Challita
THOT 27
Os
•
COS
Quem possa, corrija; por etras (sem se evar em conta o va or nu-
Quem saiba, complete; mérico das letras), ocultando assim um
texto que pode ser reconstruído desde que
Todos, porém, dêem gra se conheça a ordem numérica; do con-
ças ao Senhor. trário, permanecerão indecifradas palavras
de poder ou nomes invocatórios de divinda-
des.
Atanásio Kircher em sua "Polygraphia
Os chamados quadrados mágicos são co- Nova e Universalis" (Roma, 1.663), nos dá
nhecidos pelos matemáticos como mera cu- um claro exemplo. .
riosidade. Derivam das originalíssimas com-
binações de números que, colocados em 4 14, 15 1 ta p àn Haec
suas divisões, resultam sempre na mesma ci-
fra quando somados na vertical, na horizon- 9 7 6 12 ra ma am ri
tal ou em diagonal.
De acordo com a sua complexidade, são 51110 8 sci cra sa io
classificados em: mágicos, semi-mágicos e
quase-mágicos, ou, respectivamente. simples, 16 2 3 13 dan SI gra a
diabólicos e sem i-diabólicos. Sabendo que
são usados desde a mais remota antigüidade ordenando as letras seguindo os numerais
(existem autores que lhes remontam a ori- do quadrado, obtemos:
gem há mais de 6.000 anos a.C.), tentaremos Haec - si - gra - ta - sei - am - ma - io
demonstrar que seu uso tinha finalidades - ra - sa - cra - ri- a - p - an - dano
mágicas, cabalísticas e de nítido caráter que significa:
gnóstico. "Se sei estas coisas gratas, farei maiores
O número de casas de um dos lados do oferendas" .
quadrado denomina-se modulo, e a soma Este quadrado de 16 casas corresponde a
dos números colocados em cada coluna, li- Júpiter e os números que o caracterizam
nha ou diagonal chama-se constante ou são: -
número planetário. 4 = número de divisões de cada lado
O número dos elementos dos quadrados 16 = número total de divisões .
mágicos é igual ao módulo elevado ao qua- 34 = sorria dos números' de cada linha,
drado e corresponde à seqüência dos núme- coluna ou diagonal
ros naturais (por exemplo, do 1 ao 9; do 1 ao . 136 = soma de todos os números.
16; do 1 ao 25, etc.). Estes módulos Este quadrado pode ser visto-no famoso
(3,4,5,6,7,8 e 9) correspondem aos chama- quadro de Albrecht ,-' Durer, chamado
dos "planetas astrológicos", que são: Sa- "Melancolia". Substituindo cada um desses
turno, Júpiter, Marte, Sol, Vênus, Mercúrio números por letras hebraicas, com seu valor
-e Lua. A cada quadrado mágico corres- cabalístico, obtemos por correspondência
ponde um ou dois signos .zodiacais que são em nosso alfabeto:
lugares de exaltação e queda atribuídos a 4 = abba
cada planeta. Além 'disso, cada quadrado 16 =?
oculta nomes de divindades, sinais cripto- 34 = lamed y daleth = estanho
gráficos e figuras' enigmáticas, como se 136 = Iohphiel ou Hismael, que são os no-
pode ver nos exemplares conservados em mes correspondentes à
diferentes museus do mundo. - "Inteligência" e ao "Demônio" de Júpi-
O simbolismo dos quadrados mágicos não ter.
pode ser interpretado unicamente pelo ca- Ainda faltaria, porém, encontrar o glifo
ráter numérico, de vez que existem muitos ou signo de invocação: No quadrado.corres-
deles em que os números são substituídos pondente a Saturno podemos encontrar um
28 THOT
Os quadrados mágicos gravados em me-
exemplo iíustrativo: mili]9 . tal, com seus glifos de poder e palavras sa-
3 5 7. gradas, transformariam ditos metais em ver-
.8 1 6 dadeiros talismãs, que atuariam como ver-
Aqui os números chaves, segundo o mé- dadeiras máquinas montadas para atingir
todo que utilizamos para Júpiter, são os se- um efeito determinado. Todos os talismãs
guintes: estudados que não possuem imagens grava-
3 = Ab das no reverso do quadrado, são de origem
9 = Hod caba\ística (facilmente explicável, pois os
15 = lah seguidores da Lei de Moisés não podem re-
45 = Agiel ou Zaziel, que são os nomes presentar imagens, para não cair na icono-
correspondentes à "Inteligência" e clastia). Ao contrário, quando têm imagens
ao "Demônio" de Saturno. são reconhecíveis porque apresentam ca-
Os glifos são obtidos mediante um tra- racterísticas dos deuses greco-romanos.
çado em que se segue a ordem dos números Para os gnósticos, a criação de um ícone
dentro do quadrado, tal como podemos ver - imagem - é um ato da mesma ordem da
Criação do Universo. Mediante a contem-
neste desenho:
plação das imagens dos deuses chega-s~ ao
Signo ou glifo 4 9 2 ~ germe da representação mental, e dali se
de invocação 3 5 7 volta ao Grande Vazio. Por esta razão, os
de Saturno 8 1 6 gravadores de talismãs os imprimiam me-
Adolpho Agippa dá ainda dois glifos para diante todo um ritual, que constava de
a "Inteligência" e o "Demônio" de Sa- cinco passos fundamentais. Todos os deta-
lhes podem ser encontrados, ainda hoje, em
turno os quais por seus diagramas indicam
tamb6m uma relação numérica: "Os Tratados", obra medieval que fala so-
bre o uso de imagens cultuais, sendo suma-
mente minuciosa quantos aos atributos, co-
res atitudes, etc. Esses cinco passos são:
( Deve-se animar (dar hálito vital). para
Inteligência de Demônio de que a imagem "viva";
Saturno Saturno 2. Abertura dos "olhos", lugar por onde a
Assim, cada tipo de quadrado mágico imagem gravada emite energias;
tem um glifo e uma palavra de pcder para 3. Submergir a imagem, ou seja, o ta-
invocar ou canalizar as correspondentes lismã, em azeites e perfumes sagrados;
energias planetárias através de seus servido- 4. Dar de "comer" e "beber", para que a
res dévicos. E tanto Agrippa quanto Para- alma retida no talismã possa desenvolver-
celso e Kircher relembram a importância de se'
que estes quadrados mágicos sejam confec- 5. Rodeá-Ia de flores e agitar luzes diante
cionados levando-se em conta a relação dela.
existente entre o planeta e o metal, esco- Vemos assim que, em outras épocas, o
lhendo os dias de exaltação planetária para homem acreditava, justificava, procurava o
canalizar o máximo caudal de energia. contato com outra realidade mais sutil e va-
A ciência sabe que desde os mais remotos lorizava esse contato como algo fundamen-
rincões do espaço nos chegam radiações di- tal da existência humana. O que precisamos
versas quanto a freqüências, longitudes de determinar é se todos esses símbolos, essas
onda, etc., emitidas pelos astros e regiões imagens, essas crenças perderam o seu va-
desconhecidas. A grande maioria das radia- lor, ou se foi o homem de hoje que perdeu a
ções atravessa as coisas e retorna ao espaço capacidade de perceber esse valor. Em nos-
inter-planetário, seguindo seu curso infati- sos tempos, em que a Eucaristia foi redu-
gavelmente; algumas dessas emissões, no zida a um simples pedaço de pão, e a filoso-
entanto, são retidas e absorvidas pelos obje- fia das religiões, a um elegante adorno da
tos. educação, carecendo de toda utilidade vi-
Cada metal, referindo-nos a nosso caso, tal, podemos afirmar que ainda não morreu
por sua peculiar característica ou disposi- o instinto sagrado em cada homem e que o
ção atômica, atua como uma rede que estudo sério e profundo dos quadrados má-
"aprisiona" unicamente aquilo que está em gicos, dos talismãs, da iconografia e do
relação com essa mesma estrutura atômica. mundo sutil que os contém, pode alimentar
Assim, podemos dizer: que cada metal atua esse instinto, robustecendo a ponte que une
como um tamis diferente e possui a energia os anjos e os homens.
que retém. As observações sobre o efeito
Kirlian demonstram que os seres fotografa-
dos têm mais energia quando o planeta re-
gente está exaltado. Basílio Pawlowicz
THOT 29
Conhecimento . '
e Aprendizado
"Alguém faz nascer uma, idéia, um se- forma de percepção que se acumula, que
gundo assiste ao seu batismo, um terceiro não se condiciona nem se deixa aprisionar'
faz filhos com ela, um quarto visita-a no seu para fins práticos. A frase de Georg Lich-
leito de morte e um quinto enterra-a para tenberg pode ajudar alguma coisa nessa ca-
sempre". Georg Lichtenberg, escritor, e minhada, porque através dela vemos um
pensador alemão do século XVIII, sabia do pouco da engrenagem do que pode ser des-
que estava.falando. Suas observações sobre ignado como "mente ordinária" - o filtro
os mecanismos que regem a mente humana através do qual pretendemos conhecer o
foram reduzidos a uma coletânea de aforis- mundo e a nós mesmos.
mos, mas sua influência chegou até Freud, Uma idéia nasce como resultado de uma
passando por Nietzsche. Milhares de ou- experiência. Pouco antes que se cristalize
tros, como ele, descobriram uma espécie de em memória, em conclusão, a experiência é
paixão secreta no conhecimento profundo e um fato, alguma coisa que simplesmente
intuitivo do espírito do homem, pela via acontece. É a partir de um julgamento que a
acessível da abordagem da própria mente. experiência se fixa, sendo batizada como
Esse desbravamento, que é fonte de boa ou má, agradável ou desagradável. Com
imensa energia, não pode ser identificado - o veredictum, temos uma opinião firmada e
e aqueles homens descobriram isso de al- passamos a agir em decorrência dessa opi-
gum modo - com o aprendizado comum nião. Se a experiência é agradável, registra-
que leva ao conhecimento de técnicas, pro- mos essa conclusão e alimentamos a von-
cessos2., desenvolvimentos e sistemas. A tade de repetir o prazer proporcionado pelo
construção de uma casa, a confecção de fato. Se é desagradável, empreendemos um
uma roupa, o preparo de uma refeição, exi- processo - mais ou menos sutil - de fuga ou
gem abordagens diversas de conhecimentos de esquecimento. Essa é a gestação de uma
necessários, adquiridos progressivamente, idéia, tomada a palavra como feixe de con-
com o uso adequado do espaço e do tempo, clusões e concepção a respeito de alguma
bem como o auxílio da acumulação. A me- coisa. A idéia é levada conosco, guardada
mória é uma alavanca preciosa no cumpri- na memória para utilização posterior, para
mento dessas tarefas essenciais, ajudada pe- fins de defesa e/ou de auto-afirmação. Essa
las habilidades que nascem com o homem e experiência "capsular" é uma aberração, na
por ele são' desenvolvidas em graus variá- medida em que transportamos um ersatz do
veis. A aquisição dessas técnicas - como o real para usá-Io num momento novo e origi-
demonstra Daniel Defoe no Robinson Cru- nal - um agora qualquer - como uma espé-
soe - é determinada pela necessidade, po- cie de arma. Toda inadequação produz so-
•
dendo desenvolver-se em qualquer etapa da frimento, pelas contradições que traz em
vida, até mesmo em circunstâncias descritas seu corpo. ,
como adversas, desde que haja um drive A seguir, como lembra Lichtemberg, assisti-
para isso. Esse estímulo pode ser um sentido mos ao batismo da idéia que criamos - ou
de ordem interior que sobrevém quando se que alguém mais criou, tanto faz. Pensamos
faz contato com aquela outra forma de co- através de palavras, num mundo em que to-
nhecimento a que se aludiu antes, mas ge- das as coisas têm nome e designação pró-
ralmente resulta de necessidade de certeza, pria. O batismo consiste em identificar a ex-
de medo ou de tendência a acumular valo- periência ou a idéia, com uma palavra ou
res, materiais ou intelectuais. expressão. Esse rótulo não teria importân-
Em que consiste aquele conhecimento cia se não funcionasse depois como um sím-
que produz energia e não tem qualquer fi- bolo identificador, 'capaz de suscitar: rea-
nalidade prática? Toda aproximação discur- ções e emoções logo que ouvido ou lido.
siva do assunto é inútil e cansativa. A me- Assim como o grito "fogo!" pode provocar
lhor maneira de ver em que consiste essa medo e pânico, os símbolos das idéias 'des-
"descoberta" é caminhar na sua direção de encadeiam disposições, apetites, decisões -
maneira negativa - vendo o que ela não é. ou conduzem a outras idéias já experimen-
Pelo conhecimento das idéias comuns, dos tadas e devidamente arquivadas na me-
conceitos, das conclusões, pela familiariza- mória: O material desse imenso arquivo -
ção com sua genealogia, chegaremos àquela nisso consiste seu perigo - nunca é reexa-
30 THOT
minado. A simples sugestão para reavaliá-lo mos olhos faz parte da montagem. Não po-
produz efeitos como irritação, apatia quase demos ter uma percepção direta e cons-
hipnótica, amnésia específica ou enfraque- ciente dessa máquina em funcionamento,
cimento da atenção. O batismo é uma uma vez que nossa consciência é uma peça
forma de consagração, além de um modo de na engrenagem. Sair fora é impossível,
apropriação. Uma vez designada com um como se sabe. De que modo, então, ver
símbolo, estamos em condições de utilizar a como funciona tudo isso?
idéia à nossa maneira. Se conseguimos ver como somos prisio-
Essa matriz produz herdeiros, na forma neiros, entendemos o que é a liberdade. Se
de adaptações de crenças, modelagens de percebemos n. que significa uma idéia, e de
convicções, fusão de certezas. Esses filhos que maneira ela substitui a objetividade, sa-
são também batizados e colocados de ma- bemos o que é viver sem idéias. Quando
neira tal que possam ser usados pela mente consideramos um absurdo viver sem idéias,
que não sabe viver sem essas armas. Ideolo- podemos ver o grande desamparo em que
gias, dogmas, concepções gerais ou simples- ficamos sem elas, sem esse preenchimento a
mente milhões de pequenas escoras que que nos acostumamos - não somente nós,
sustentam nossa auto-imagem no cotidiano, individualmente, mas nós seres humanos,
formam um arsenal que usamos com natu- há dezenas de séculos. Parece que um
ralidade aparente, ao abrigo de toda ver- abismo começa a se abrir aos nossos pés,
dade, inconscientes da armadura em que diante da perspectiva de existir sem concei-
nos deixamos apertar. Em meio a essa tor- tos, julgamentos, conclusões, idéias feitas,
rente de artificialismo, temos mas não preferências e aversões previamente conhe-
somos, parecemos vibrantes mas estamos cidas. A sensação de estranheza a respeito é
mortos. As idéias e seus rebentos são substi- relativamente comum, mas nós a afastamos
tutivos para a vida e para o mundo, po- depressa e logo nos acomodamos nos len-
voando nossos sentidos de ilusões de movi- çóis quentes do hábito, na rotina mental.
mento e cor, transmitindo a impressão de Surgem as explicações, a racionalização a
que continuamos no tempo, de que somos todo vapor, os rótulos tranqüilizadores.
alguém. A compreensão profunda de alguma
Um outro homem - ou um outro mo- coisa pode ser feita "pelo ~esso", isto é,
mento do mesmo homem - visita a idéia em pelo percebimento do que não é essa coisa,
seu leito de morte, para continuar a analo- pela fuga a ela, pelas falsificações de que é
gia de Lichtenberg. Agora ele tornou-se crí- vítima. É vendo o nascimento e a morte de
tico daquilo que já usou muito, e suas espe- uma idéia que sabemos o que pode ser um
ranças voltam-se para uma concepção que certo vazio criativo que é constantemente
está germinando em algum canto escuro de escondido com as idéias, as palavras, as.opi-
sua mente. A idéia agonizando ainda é reti- niões - e que não tem nome porque nunca
rada do arsenal para ser. brandida contra foi batizado, nem pode ser usado para fins
uma ou outra realidade que possa incomo- práticos. Essa abordagem negativa não é
dar, mas não mais acalenta seu usuário, uma experiência que se pode materializar
nem explica ou consola da morte, por numa idéia, numa teoria, num conceito,
exemplo. Um dia a idéia (e todas as suas embora possa ser difamada já à distância,
teias), é enterrada sem mais considerações, acusada de mística, subjetiva e confusa. O
enquanto uma outra maior - ou mil outras que é um modo de designar para não conhe-
pequenas - reina triunfante. Esse processo cer, à maneira do aveztruz que mergulha a
inteiro, nascimento, vida e morte, é imper- cabeça na areia para evitar o leão.
ceptível aos nossos olhos porque esses mes-
Luiz Cartas Lisboa
,,,oi( o( Para receber uma assinatura anual da revista cultural THOT (seis nú-
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--.1
=::::!J I
A História: porrtica Experimental
A Política é como a Física. Não há senão gem casual e arbitrária". (3) E tal "Espírito
uma boa: a experimental. do Povo" se manifestava sobretudo através
"La Politique est comme Ia Physique, il de sua arte popular, de sua religiosidade,
n'y en a qu'une de bonne: l'experimentale." de seus usos, costumes e tradições que de-
A afirmação é de Joseph De Maistre. Mas, veriam se espelhar no sistema legal, para
poder-se-ía perguntar, onde está o campo que não se produzisse a dicotomia entre o
de experiência da Política? Responde-nos o "país real" e o "país legal".
mesmo autor: "L'Histore est Ia politique ex- Tratava-se, evidentemente, de uma rea-
perirnentale" (1), a História é a política ex- ção ao pretenso universalismo das idéias de
perimental. 1789. Ironicamente dizia De Maistre: "Il
Vale dizer: não há instituições políticas n'y a point d'homme dans le monde. J'ai vu
que correspondam aos anseios dos povos des Français, des Italiens, des Russes etc. Je
que vivem sob sua tutela senão as consagra- sais même, grâce a Montesquieu, qu'on
das pela História; o contrário também é peut être Persan. Mais, quant a l'homme je
verdade: as instituições que colidem com as déclare de ne l'avoir recontre de ma vie. S'il
legítimas aspirações nacionais mostram, existe, c'est bien a mon insu." (4) * (Não há
historicamente, os frutos nefastos que ne- Homem no mundo. Vi franceses, italianos,
nhuma argúcia de argumentação conse- russos, etc. Sei mesmo, graças a Montes-
guirá ocultar, quieu, que existiu Persas. Mas quanto ao
O que hoje nos parece o óbvio não era homem declaro nunca tê-lo encontrado em
tão evidente aos teóricos da Política no final minha vida. Se ele existe, é sem que eu
do século XVIII. Como se sabe, este foi ca- saiba). Realmente o "homem" sem carac-
racterizado como o século do racionalismo terísticas nacionais, regionais próprias não
e do abstracionismo em matéria filosófica existe. É fruto de uma abstração. O que
que, de Descartes a Condorcet e Rousseau, existe é o homem "in concreto", com sua
construíram uma concepção do homem em língua, sua nacionalidade, sua tradição cul-
abstrato, vivendo em uma sociedade tam- tural própria. Pois bem, em nome de pre-
bém concebida em abstrato, que resultou tensas "características" do "Homem" se sa-
na teoria do "contrato social", dos direitos . crificaram as reais e evidentes característi-
do Homem e do Cidadão", pilares da Revo- cas dos povos e das nações, rumo à socie-
lução Francesa de 1789 que destruiu a orga- dade padronizada e massificada em que vi-
nicidade do Antigo Regime, baseada na pu- vemos cada dia mais imersos.
jança dos corpos intermediários, É lógico que as características nacionais
substituindo-a pela ficção da "soberania po- sendo preteridas, não tinham sentido algum
pular" e pelo exagero da representação ex- os grupos sociais. O "Homem" abstrato é o
clusivamente partidária.(2) indivíduo, isolado, que não se liga a outros
Decorridos quase duzentos anos de expe- indivíduos organicamente, apenas se justa-
riência democrática somente partidária, o põe mecanicamente. Substituiu-se uma so-
desencanto é geral e dá novas potencialida- ciedade de povos diferenciados com vida
des às posições extremistas, totalitárias, própria por uma multidão amorfa ou.massa,
anti-democráticas, terminando por extin- como já constatava Pio XII, no crepúsculo
guir os próprios partidos. da Igreja Romana pré-conciliar.(5)
, O ilogismo de um "povo soberano de si No Brasil, o grande representante da Es-
mesmo", de uma "vontade geral" que é cola Histórica do Direito foi, em pleno sé-
simplesmente a vontade de uma minoria im- culo dezenove, José de Alencar, o célebre
posta habilmente a uma massa de manobra romancista da nacionalidade, já que estrei-
política, que hoje não dá quem desconheça, tos são .os laços entre Romantismo literário
foi com visão de águia detectado por Joseph e Historicismo Jurídico-Político. Em Portu-
De Maistre já no inícioído século XIX. Con- gual, talvez, seu maior expoente foi Alexan-
temporaneamente, a partir do criticismo dre Herculano, nos "Portugalia e Monu-
Kantiano, com Fichte, Schelling e Savigny, menta Historica". Na Itália, seu intérprete
nos Estados Alemães, desenvolvia-se a Teo- foi Alessandro Manzorn, na luta pela Unifi-
ria do "Volksgeist, "Espírito do Povo,", isto cação da península. Na Espanha, não ha-
é, a teoria do Direito e do Estado com base que falar em nomes, mas em todo um movi-
nas aspirações e na psicologia do povo: "As mento de idéias, o "Carlismo".
manifestações do Direito não têm existên- Hoje estas teses antigas são retomadas
cia isolada: são apenas forças e atividades pela moderna Antropologia, desde um
particulares de um mesmo povo, insepara- Lévi-Strauss e um Herskovitz, até as posi-
velmente unidas por natureza e que só à ções dos "Novos Filósofos" como Glucks-
nossa reflexão aparecem como isoladas. O mann, Hannah Arendt ou Alain de Benoist.
que as constitui num todo é a convicção ge- (6). E dentro da própria pesquisa histórica,
ral do povo, o sentimento de sua necessi- o sentido de "atualidade" da História, vem
dade interna e que exclui toda idéia de ori- sendo difundido por um Lucien Febvre, um
THOT 33
•
Marc Bloch e Fernand Braudel sempre nem com o computador. Por outro lado, a
mostraram a correlação entre a História e técnica divorciada de tais valores (entre
as outras ciências do homem, com ~rande tantos outros da Cristandade medieval) pro-
repercussão na Faculdade de História da duz antes instrumentos de aniquilamento e
Universidade de São Paulo.(7) aviltamento do ser humano, como triste-
Respostas a algumas objeções: mente se vê nas guerras modernas que se
I ) A Escola Histórica não. leva, invitavel- travam em função muitas vezes de ideologias
mente, a um 'retorno a uma estrutura social que pretendem tomar o lu~ar da fé católica"
medieval? Não foi esta uma era de confor- com seus dogmas indiscutíveis, seus pontífi-
mismo? cese até requinte de caricatura - seus "san-
Il) O tradicionalismo inerente aos autores tos" cujas imagens se veneram em atos "li-
historicistas não leva a uma idéia de retor- túrgicos" de massa. (9)
nos, que não existem na História? 111)Quanto à derradeira objeção, responde-
111) Nada houve de benéfico no Século mos que o século XVIII, benéfico por suas
XVIII? E as conquistas do homem e do ci- conquistas no campo científico experimen-
dadão são tão desprezíveis? tal das ciências exatas, não teve a mesma
Respondemos dizendo: metodologia nas ciências humanas: foi o sé-
I) A esta objeção se responde facilmente: a) culo das grandes concepções teóricas de um
a Escola Histórica, embora tendo afinida- Rousseau, dos sarcarmos demolidores de
des com o Romantismo literário, embora um Voltaire, destoando apenas o bom senso
reconhecendo na época medieval valores de um Montesquieu, um verdadeiro precur-
perdidos pelo século atual (como a fé, o sor da Escola Histórica em seu Espirito das
espírito de confraria e comunidade profis- Leis. Quanto às declarações de direitos, pe-
sional, o cavalheirismo, a fidelidade a pala- caram pOr considerar apenas o serhumano
vra dada, o convívio com a natureza) não isolado, por desconhecer, que não há cida-
foi uma apologia da estrutura medieval, dão sem a Cidade, e que osinteresses da co-
pois o historicismo é exatamente o con- munidade devem levar muitos ao sacrifício
trário da fixação de formas definitivas, o das satisfações individuais. O bem. comum
que foi mais próprio do século XVIII, ao passa a ser letra morta, substituído pela
tentar criar modelos eternos de comporta- "volonté générale" de uma minoria,
mento, de legislação, perdendo o senso his- caindo-se no voluntarismo jurídico, no cen-
tórico; b) sobre a Idade Média, desde o fi- tralismo estatal, sacrificando-se os Direitos
nal do século passado, historiadores como dos Grupos: os Direitos da Família, do Mu-
Funck-Brentano, Leopold Génicot, Régine nicípio. da Universidade, da Corporacão
Pernoud, Marc Bloch desfizeram com pes- Algo se con'l,uistou, mas o preço pago foi
quisas sérias a famosa "legenda negra" dos muito alto, tao elevado que deu ensejo ao
mille ans, pas un bain", criada muito a pro- exagero oposto: o aniquilamento do indiví-
pósito pelos detentores do poder e do en- duo (antes protegido pelos corpos interme-
sino depois da Revolução burguesa de 89. diários) nos sistemas totalitários, governa-
Além disso, homens do século XX, nós só dos por tecnocratas. Nada há de mais
entenderemos o espírito da época medieval oposto à idéia de democracia.( 10)
(corno de qualquer que pensemos estudar), Notas:(1) Essa; sur te Príncipe Génénueur des Constínuions Polítíques" E. Vitte,
se renunciarmos a uma visão evolucionista Lyon, 1924, pago 6 2' ed. (2) J .P. Galvão de Sousa Iniciação à Teoria do Estado.
Rev. dos Trib. S.Paulo, 1976. p. 82·90.
dogmática e procurarmos entender "his- (3) Alexandre Correia - Concepção Histórica do Direito e do Estado. Separata da
Revista da PUC de S. Paulo. Vol. 37, Fase. 71·72, 1970.
tória da mentalidade" (expressão forjada (4) J, De Maistre - Considérations sur Ia France. E. Yine, Lyon, 1924, pago 74. (5)
por Lucien Febvre) do homem do século Radiomensagem de Natal de 1944. Atti e Discorsi di Pio XII, vol. VI. Ed. Paoline.
Roma, 1944, pago 168. (6) Sobre José de Alencar vide o artigo de Salviano San-
Xll, XIII. A satisfação com a própria situa- tiago "Liderança e Hierarquia em Alencar" in Suplemento Cultural do Estado de
S.Paulo. de ~8/12/77. Sobre Herculanc-vide O art. de Gama Caeiro "Romântico
ção, a honra de pertencer a uma estirpe de ou Liberal" in Supl. Cult. do Est. de S. Paulo, de 1819%77.A respeito da Escola
Histórica na Itália, leia-Sê nosso art. "Contardo Ferrini" in Hora Presente, Ano
fabricantes de vinho, ou de violino, por VII, n.' 19. S. Paulo, 1975. pago 8798 bem como o volume Alessandro Manzoni:.
exemplo, se perdeu inteiramente numa so- Vida e Obra, publicado pelo MEC, em 1974. O Carlismo teve seu grande divulga-
dor hodierno no saudoso Prof Francisco Elias de Tejada. Podem-se consultar as.
ciedade competitiva da igualdade formal e Altas das Primeiras Jornadas Brasileiras de Direito Ntural: O Estado de Direito.
Conf, "EI Estado de Derecho eo el Pensamiento Germénlco y en Ia Tradici6n de
desigualdade real.(8) Ias Espanas. Ed. Rev. dos Tribunais, São Paulo. 1980. pago /77·191 .. Quanto à reto-
mada da visão histórica na Política. em geral. por pane de autores não trodícíonalís-
H) Quanto à segunda objeção, não procede, tas, consulte-se. "Um Mundo que Respeite a Vida" emrv. de Claude Lêví-Strauss.
pois, se quisermos ver no tradicionalismo da publ. na revista Visão de 5/5/1980. Hannah Arendt - Entre os Passado e o Futuro.
Ed, Perpsctiva, São Paulo, 1972, 2' ed. Pago 43 e segs. pago 69 e segs. e de certo
Escola Histórica de De Maistre e Savigny modo todo o livro. Sobre os DOVOS filósofos leia-se com proveito o artigo de
Alaio de Benoist .. La Nouvelle Vague des Vieux Reacs" in Figaro Magazw.
apenas um retorno de fórmulas arcaicas, Paris, Dezembro de 1980, pago 82·S3. (7). Femand Braudel=- "L'Historie et Ies
Autres Sciences de l'Homme" in Êcrits SUT l'Histoire. Flammarioo, Paris, 1969,
deturpamos o sentido de "tradição", que, pago 39-235. V. Tb. "Historie et Temps Presam" ibid. pags. 239·314. (estes artigos
como o demonstra a orgem latina, longe de acham-se publicados tb. na Revista d e-História, da FFLCH da ÚSP). (8) V. a res-
peito nosso artigo "A Crise da Civilização Ocidental" in Thot. n.' 21. S.Paulo,
ser mero fixismo mumificado de museu, de- 1980 pags. 33-41. (9) V. sobre o Iradicionalismo nosso estudo Joseph D. Mais". e
a Tradição in Hora Presente n.t I S, Ano VI, 1974, pags. 175'a 184. (10) A respeito
nota idéia de transmissão ("trader.e") de consulte-se José Pedro Galvão de Souza - Direito Natural, Deireito Positivo e E$-
todo de Direitp, Ed. Rev. dos Tribunais. S.Paulo, 1977, pago 116 e segs, e pago 143
valores de geração em geração. Mas se algo e sego Para uma !1pção mais clara do processo h~s~rico que conduziu da socie-
deve se .cornpreender, ainda que com sen- dade orgânica Antiga e Medieval à SOCiedade mecânica (na term_o!Qgiade we-
ber), veja-se nosso estudo no livro Din4mica da HistOria.-tditora )'alas Athena.
tido preciso, como um "retorno", só nos pa- São Paulo, 1981, onde os fatos históricos são analisados de moco circunstan-
ciado, para demonstrar nossa tese.
rece válido em termos de valores que inde-
pendem de época. O cavalheirismo e a fé vi- Claudio De Cicco
vida do homem medieval não são incom-
Palestra realizada na Universidade Estadual "Júlio de Mesquita Filho" campus
patíveis com o foguete inter-planetário, de Francaia.convite do Instituto de História e Serviço Social em 18/5/81.
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PÁGINA DOS LEITORES
CURSO LIVRE
INTRODUÇÃO AO
PENSAMENTO
FILOSÓFICO •