Sei sulla pagina 1di 5

6/3/2019 Folha Online - Brasil 500

 
Fascismo e revisionismo
   
GUIDO RODRÍGUEZ ALCALÁ 
especial para a Folha   
   
Em 1957, o historiador paraguaio Benjamín
Velilla pronunciou uma conferência em Assunção
em que discretamente criticava a capacidade
militar de Francisco Solano López. Não faltavam Leia mais:
razões a Velilla: nomeado general aos 18 anos
por seu pai, o presidente do Paraguai, López se ­Novas lições do
  autonomeou marechal quando o sucedeu de Paraguai
 
­A didática
forma dinástica e, ao estourar a guerra da conspiratória
Tríplice Aliança (1864­1870), era a pessoa  
­Brasileiros, uni­
menos indicada para conduzir um exército. Mas, vos 
 
­Imagens em
sem que fossem ouvidos seus argumentos,
desordem
Velilla foi preso ao terminar sua conferência e em  
­A construção de
seguida desterrado por decisão do general um mito
Alfredo Stroessner, dono do país entre 1954 e  
­A chave dos
1989. cofres britânicos
­Fascismo e  
   
revisionismo
Aquela foi uma expressão prática do chamado ­A batalha  
revisionismo histórico paraguaio, que republicana
transformou em questão de Estado o culto a  
­Cronologia dos
conflitos
certas figuras históricas consideradas "heróis da  
­A pressa do
pátria" e que se constituiu em um ingrediente ditador
básico da ideologia política de Stroessner, que
tomava como agravo pessoal as críticas a seus
predecessores.
   
O revisionismo histórico é um produto tardio.
Teria sido inaceitável na época do fim da guerra
da Tríplice Aliança, quando os López eram tão
odiados no Paraguai como os Trujillo ou os
Somoza em seus domínios. Os testemunhos da
época, escritos por paraguaios que tinham
pertencido aos círculos do governo (Juan
Centurión, Silvestre Aveiro, Isidoro Resquín,
Fidel Maíz), incriminam López. Seus autores
tentam se justificar, negando responsabilidade
pessoal nas atrocidades do ditador (execuções
em massa, campos de concentração etc.).
https://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/histpar_7.htm 1/5
6/3/2019 Folha Online - Brasil 500

 
No Paraguai, a história foi escrita pelos vencidos,
e de forma bastante desfavorável a López.
Muitas décadas após, os revisionistas
paraguaios, que não tinham feito a guerra,
reivindicariam o tirano, alegando que a história
tinha sido escrita pelos vencedores (como os
revisionistas alemães de hoje), para
desqualificar, dessa forma, qualquer evidência
contrária a suas preferências particulares.
   
O revisionismo paraguaio conseguiu
reconhecimento oficial em 1936. No dia 17 de
fevereiro de 1936, um golpe militar levou à
presidência o coronel Rafael Franco, herói da
guerra com a Bolívia (1932­1935). O exército
vitorioso se sentiu chamado a se converter em
árbitro político e o foi durante os 60 anos
posteriores.
   
Dias depois do golpe, Franco declarou a um
jornal de Assunção: "Não é nova em mim a
admiração pela Alemanha e pelo brilhante
caudilho de sua revolução, o senhor Hitler, um
dos valores morais mais puros do pós­guerra"
("Patria", 1º/3/36). E poucos dias depois (10 de
março), seu Decreto 152 identificou a revolução
de fevereiro com a fascista: "A Revolução
Libertadora no Paraguai se reveste da mesma
índole das transformações totalitárias da Europa
contemporânea, no sentido de que a Revolução
Libertadora e o Estado já são uma mesma coisa".
   
No entanto, Franco não foi um simples fascista:
com ele chegaram ao governo várias tendências
políticas (amálgama similar ao operado nos
partidos de Juan Domingo Perón e Getúlio
Vargas). Um de seus ministros, Bernardino
Caballero, propôs recriar no Paraguai uma versão
nacional­socialista dos nibelungos: uma
mitologia em que o marechal López seria Sigfried
e Franco, Hitler. Caballero era nazista, enquanto
seu colega, o ministro Anselmo Jover Peralta, era
marxista.
   
À parte as discrepâncias, aquele governo
oficializou o culto aos heróis. Uma de suas
primeiras medidas foi ditar um decreto para
absolver retroativamente o marechal López das
acusações que lhe tinham sido feitas por seus
https://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/histpar_7.htm 2/5
6/3/2019 Folha Online - Brasil 500

contemporâneos no século passado. Também
terminou a construção do Panteão Nacional dos
Heróis, para trasladar ao monumento as cinzas
do marechal, milagrosamente resgatadas de um
túmulo anônimo 66 anos depois. Nos atos de
reivindicação (palavra­chave do revisionismo),
esteve presente Juan O'Leary, pontífice
revisionista, que aproveitou a oportunidade para
declarar Franco sucessor do marechal López,
título honorífico que depois outorgaria a outros
presidentes, inclusive a Stroessner, que chegou
ao poder como solução bonapartista para um
país ainda convulsionado por causa da revolução
de 1947.
   
A revolução foi uma reação justificada contra a
ditadura de Higinio Morínigo (1940­1948),
devoto de Hitler e de López. Morínigo a reprimiu
com as armas enviadas por Perón e o apoio do
Partido Colorado, que se mantém no governo
desde então, ainda que não sem sobressaltos.
   
Entre junho de 1948 e novembro de 1949,
ocuparam a presidência cinco colorados,
inclusive Natalício González, discípulo dileto de
O'Leary. González, admirador de Charles
Maurras e ocasional agente publicitário de Juan
Vicente Gómez e Benito Mussolini, enriqueceu a
doutrina do mestre com certo indigenismo
racista então em voga. Em um artigo intitulado
"Raízes Guaraníticas de 'A Tempestade' de
Shakespeare", acusou o dramaturgo inglês de ter
plagiado os índios guaranis. Sua práxis política
não foi menos temível: com o lema "dentro de
um ano não haverá um só colorado pobre",
ajudou a criar as condições que, a longo prazo,
facilitaram o surgimento de um Stroessner.
   
Aqueles que queriam agradar este último
insistiam em seu parentesco moral com os
ditadores do século 19 (Francia e os dois López).
Num texto publicado em "El País" com o título de
"Uma Carta ao Presidente" (21/5/1959), O'Leary
recomenda "reverenciar o Pai, o Filho e o Espírito
Santo de nossa trindade patriótica: o doutor
Francia, o Patriarca de nosso progresso (Carlos
López) e o mártir de Cerro Corá (López filho)". E
acrescenta, dirigindo­se a Stroessner: "O senhor
continue sendo, como já o é, o seguidor da obra
construtiva dos três grandes que forjaram a
https://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/histpar_7.htm 3/5
6/3/2019 Folha Online - Brasil 500

nacionalidade". (Retribuição de favores: no dia 2
de março de 1955, O'Leary descerrou, numa
praça central de Assunção, o monumento que
havia sido a ele erguido por Stroessner, e que
ainda existe.)
   
A identificação de Stroessner com "os três
grandes" foi moeda corrente da propaganda
oficial. Para comprová­lo, basta consultar as
edições de "El País", "Patria" e "La Voz del
Coloradismo" (programa de rádio) dos "dias
pátrios" celebrados com grande pompa: 3 de
novembro (aniversário de Stroessner); 24 de
julho (aniversário de López); 1º de março (morte
de López). Last but not least: em 1958, "El País"
iniciou uma campanha em favor do revisionismo,
onde se destacam o editorial de 12 de setembro
("Sobre o Revisionismo") e profusa informação
sobre a visita dos revisionistas argentinos Atilio
García Mellid e José María Rosa, cordialmente
recebidos pelo governo.
   
A ideologia revisionista exerceu poderosa
influência sobre o escritor Augusto Roa Bastos,
como o prova seu artigo publicado no jornal
oficialista de Assunção, "La Unión", no dia 7 de
agosto de 1953: "Nosso Marechal de Ferro
(López) foi um homem autenticamente
providencial... continua presidindo a vida
nacional junto com outros homens de nossa
história autenticamente providenciais como ele e
continua reencarnando­se em seus descendentes
espirituais mais meritórios".
   
Para Roa Bastos, Stroessner e Perón eram
reencarnações de seu herói e por isso lhes
dedicou o poema "Eternamente Irmãos",
publicado em "El País" de 20/8/1955:
"Stroessner e Perón selam seu abraço/ com a
emoção criadora dos homens/ que vencem o
destino/ e agem na história a golpes de
verdades/ vivas como o hino dos homens. (...) O
Marechal de Ferro os recebe/ com suas mãos de
povo e de bandeira/ e lá em Cerro Corá,/ seu
pedestal de pedra pulsa vivo/ como o eterno
coração do Paraguai" (1).
   
O espírito revisionista não se limitou a conquistar
certas elites políticas e literárias. Por intermédio
de uma insistente propaganda, saturou a vida
https://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/histpar_7.htm 4/5
6/3/2019 Folha Online - Brasil 500

cotidiana de uma maneira difícil de compreender
para quem não haja vivido sob a ditadura de
Stroessner. Os nomes das ruas e das praças, os
monumentos e os cartazes, os programas de
rádio e de televisão, o cinema subvencionado
pelo governo, os bilhetes de loteria, os produtos
e empresas comerciais de nomes patrióticos (por
exemplo, "Cerro Corá", "Primeiro de Março")
transformaram o passado em presente. Essa
fixação no século 19 significou também a
ausência da pesquisa histórica científica. Coisa
compreensível: o revisionismo de Stroessner
nem era histórico nem revisava nada; se limitava
a repetir os estereótipos de uma ideologia
fascistóide.
   
Morto o cão, acabou a raiva. Com a queda de
Stroessner, arrefeceu o fervor revisionista. Agora
se pode e se deve escrever a história.

Nota: 1. Uma consequência do poema foi o Decreto
10.152, de 27 de janeiro de 1955, por meio do qual
Stroessner atribuía "ao senhor Augusto Roa Bastos a
missão de estudar na Europa os modernos métodos e
meios de difusão e extensão cultural e de propaganda".
 
Guido Rodríguez Alcalá é jornalista paraguaio; trabalha no
"ABC" (Assunção). Publicou "Caballero" (Ed. Tchê!, Porto
Alegre), sobre a guerra da Tríplice Aliança, entre outros.
Tradução de Ricardo de Azevedo.  

Leia mais: A batalha republicana
   

https://www1.folha.uol.com.br/fol/brasil500/histpar_7.htm 5/5

Potrebbero piacerti anche