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Direito das Obrigações

Aula 1

Neste semestre começa a ser estudada a parte especial do Direito Civil, esta que é a mais extensa
disciplina do curso de Direito, com sete períodos, um da parte geral, já visto, e seis da parte especial.
Além de disciplina mais extensa, peço licença aos colegas professores para afirmar que o Direito Civil
é também a matéria mais importante do curso jurídico por duas grandes razões:

Primeiro porque o Direito em si, como ciência, passou a ser estudado através do Direito Civil. Foi a
evolução do Direito Civil que levou à Teoria Geral do Direito e à Introdução ao Estudo do Direito.

Segundo porque o Direito Civil é o direito de nós todos, de João, José, de Maria e de cada cidadão.
Explico: o Direito Tributário e Administrativo é o direito do governo, o Direito Penal é o direito do
bandido, o Direito Comercial é o direito do empresário, o Direito Processual é mais processo do que
direito, o Direito do Trabalho é o direito do trabalhador, e de qualquer modo, o Direito do Trabalho
é filho do Direito Civil. Igualmente o Direito do Consumidor, é filho também do Direito Civil. O
próprio Direito Comercial teve muitas de suas normas incorporadas pelo Código Civil de 2002.
Finalmente, o Direito Constitucional tem mais princípios gerais do que normas de aplicação direta.

Já as atividades do nosso cotidiano são todas reguladas pelo Direito Civil. Nós todos hoje, para
estarmos aqui agora, já celebramos alguma relação civil, até porque nós todos temos nome, família
e domicílio. E usamos um transporte para chegar de casa até a universidade. E somos proprietários
de nossas roupas e objetos pessoais. E falamos no telefone e compramos um chiclete antes de
entrar na sala de aula. Quer dizer, alguém pode viver décadas e nunca se enquadrar no Código
Penal, Processual ou na CLT, mas com certeza nossas vidas passam pelo Código Civil. O que vocês
acham? Reflitam!

Tudo isso aumenta a responsabilidade do professor de Direito Civil, que deve ser capaz de estimular
os alunos a conhecer e gostar da disciplina, sempre fazendo-os refletir sobre as controvérsias
jurídicas, o subjetivismo do Direito e a razoabilidade na aplicação da lei (exs: arts. 402; § 1º do 1.210;
1.229; pú do 944).

Além de disciplina mais extensa e mais importante do curso, o Direito Civil hoje predomina sozinho
no Direito Privado. Vocês sabem que as normas jurídicas têm duas grandes divisões conforme
estudado na Teoria Geral do Direito: o Direito Público e o Direito Privado. É Direito Público o Direito
Constitucional, Administrativo, Processual, Penal e Tributário. Já o Direito Civil, Comercial e do
Trabalho integram o Direito Privado, mas só o Direito Civil é privado por excelência. Isto porque o
Direito Comercial tem se aproximado do Direito Público neste séc. XXI de mundo globalizado e
mercados internacionais como a União Européia, o Mercosul – Mercado Comum do Sul, a Nafta da
América do Norte, a Alca – Área de Livre Comércio das Américas, etc. Cada vez mais as nações
participam e se integram em blocos econômicos, aproximando o Direito Comercial do Direito
Público. Igualmente o Direito do Trabalho, um filho do Direito Civil, aproxima-se do Direito Público
na medida em que o Estado interfere nas relações empregatícias para proteger e tornar
indisponíveis direitos dos trabalhadores. Tenho um artigo no meu site chamado “A importância do
Direito Privado apesar da publicização do Direito” onde afirmo inclusive que o Direito do Trabalho é
Direito Público, confiram! A publicização é justamente este avanço do Direito Público sobre o Direito
Privado, com o Estado sufocando nossas atividades, atrofiando a economia, controlando nossa
rotina, cobrando multas e impostos, porém fornecendo pouco em troca... O que vocês acham?
Bem, voltando ao cível, hoje vocês começam o estudo da parte especial do Direito Civil, e durante
seis semestres serão estudados os quatro grandes temas cíveis: obrigações, reais, família e
sucessões. No Direito das Obrigações vocês vão conhecer as normas que tratam das relações das
pessoas entre si, é por isso que o Direito das Obrigações é também conhecido como Direito Pessoal.
As obrigações entre as pessoas se originam de vários modos, especialmente do contrato.

Já no Direito Real serão estudadas as normas que tratam das relações das pessoas com os bens,
sendo também chamado de Direito das Coisas. Existem vários direitos reais (art. 1.225) e o principal
deles é a propriedade.

Então ao longo da nossa vida, eu, vocês, João, José e Maria nos relacionamos com várias pessoas,
através dos contratos, e nos apropriamos de vários bens, adquirindo propriedade, para a formação
de umpatrimônio. Este é o sentido da vida: estudar e trabalhar para ficar rico! O Direito Civil é o
direito dos ricos! Perdoem-me os espiritualistas, mas dinheiro é muito importante na nossa vida,
especialmente na nossa velhice quando estamos mais vulneráveis. Pois bem, todo esse patrimônio
que nós juntamos na nossa vida será transferido a nossos herdeiros após nossa morte. Desta
transmissão de bens cuida o Direito das Sucessões.

O Direito das Obrigações, o Direito das Coisas e o Direito das Sucessões integram a
chamadaautonomia privada, ou seja, é o campo do Direito Civil onde os particulares se relacionam
entre si, com grande liberdade, na celebração de contratos e na apropriação de bens que lhes
interessam, para a formação de um patrimônio que será transferido aos familiares após a morte. Se
no Direito Público só se pode fazer o que a lei permite, no Direito Civil pode-se fazer tudo o que a lei
não proíbe, ou seja, a liberdade aqui é bem maior.

Dos quatro ramos do Direito Civil, só o Direito de Família sobra deste raciocínio. Sem dúvida o
Direito de Família pertence ao Direito Civil, afinal trata das relações entre familiares, e nada é tão
íntimo e privado quanto a família de cada um de nós. Além disso, tais familiares, via de regra, são os
herdeiros do patrimônio adquirido na nossa vida. Mas no Direito de Família as questões econômicas
não predominam tanto quanto no resto do Direito Civil, afinal o que alimenta a família é o amor, é a
sensibilidade, é a amizade e não o dinheiro. Em suma, o Direito de Família integra o Direito Civil, mas
não integra a autonomia privada.

Concentrando-nos no Direito das Obrigações, objeto dos próximos dois semestres,


podemosconceituá-lo como a disciplina que trata das relações harmônicas entre as pessoas para a
satisfação dos seus interesses individuais. Digo “relações harmônicas” porque a sociedade exige
harmonia, sob pena de conflito e caos social. Digo “satisfação de interesses” porque uma pessoa não
consegue produzir sozinha tudo que precisa para viver, e por impulso precisa se relacionar com
outra para obter bens de seu interesse. As relações obrigacionais acontecem a todo instante e são o
suporte econômico da sociedade moderna de consumo, especialmente através do contrato de
compra e venda.

Quanto mais a gente compra, aluga, troca, empresta, etc., mais dinheiro circula na economia, mais
as lojas vendem, mais as fábricas produzem, mais os empresários lucram, mais empregos são
gerados e mais impostos são arrecadados.Todos ganham! Mas para gastar é preciso ter dinheiro, e
para isso é preciso trabalhar, e para isso é preciso estudar. Estudem pois!

Aula 02 - Direito Civil 2 - Unicap - Obrigação

OBRIGAÇÃO
Na primeira aula conceituamos o Direito das Obrigações e o situamos dentro do Direito Civil,
bem como situamos o Direito Civil dentro do ordenamento jurídico. Vamos hoje tratar da obrigação.

Conceito:

Todos temos obrigações na nossa vida, seja para com o país (ex: serviço militar, votar nas eleições,
pagar impostos) seja para com a família (1.566). Mas a obrigação que nos interessa neste curso é a
obrigação civil. Num conceito mais simples, a obrigação é o direito do credor contra o devedor. Num
conceito mais completo, a obrigação é um vínculo jurídico transitório em virtude do qual uma
pessoa fica sujeita a satisfazer uma prestação econômica em proveito de outra. Expliquemos:

- vínculo jurídico: o vínculo é o motor da obrigação e precisa interessar ao Direito; um vínculo


apenas moral (ex: ser educado, ser gentil, dar “bom dia”) ou religioso (ex: ir a missa todo Domingo)
não tem relevância jurídica;

- transitório: a obrigação é efêmera, tem vida curta (ex: uma compra e venda de balcão dura
segundos), podendo até ser duradoura (ex: alugar uma casa por um ano), mas não dura para
sempre. Inclusive um direito de crédito se extingue quando é exercido (ex: José bate no carro de
Maria, quando Maria cobra o prejuízo e José paga, a obrigação se extingue). Já os Direitos Reais são
permanentes, e quanto mais exercidos mais se fortalecem (ex: a propriedade sobre uma fazenda
passa por gerações de pai para filho, e quanto mais a fazenda for usada mais cumprirá sua função
social, ficando livre de invasões e desapropriação). Há outras diferenças dos Direitos Reais para os
Direitos Obrigacionais que serão abordadas em Civil 4.

- prestação: é o objeto da obrigação e se trata de uma conduta ou omissão humana, ou seja,


sempre é dar uma coisa, fazer um serviço ou se abster de alguma conduta. Dar, fazer e não-fazer,
estas três são as espécies de obrigação, voltaremos a elas abaixo.

- econômica: toda obrigação precisa ter um valor econômico para viabilizar a responsabilidade
patrimonial do inadimplente se não for espontaneamente cumprida. Em outras palavras, se uma
dívida não for paga no vencimento o credor mune-se de uma pretensão e a dívida se transforma em
responsabilidadepatrimonial. Que pretensão é esta de que se arma, de que se mune o credor? É a
pretensão a executar o devedor para atacar/tomar seus bens através do Juiz (391, 942). E se o
devedor/inadimplente não tiver bens? Então não há nada a fazer pois, como dito, a responsabilidade
é patrimonial e não pessoal. Ao credor só resta espernear, é o chamado na brincadeira “jus
sperniandi”. Realmente já se foi o tempo em que o devedor poderia ser preso, escravizado,
esquartejado e morto por dívidas, pois isto hoje atenta contra a dignidade humana. Os únicos casos
atuais de prisão por dívida são no contrato de depósito, que veremos em Civil 3 (652), e na pensão
alimentícia, assunto de Direito de Família.

Elementos da obrigação: são três:

a) duplo sujeito: o Direito das Obrigações trata das relações entre pessoas, então toda
obrigação tem dois sujeitos, um ativo, chamado credor, e um passivo, chamado devedor. Não existe
relação obrigacional com apenas um sujeito (381). Pode haver num dos pólos mais de um credor e
mais de um devedor (257). Numa relação simples, sabe-se exatamente qual das partes é a credora e
qual é a devedora (ex: José bate no carro de Maria, então José é devedor e Maria é credora), mas
numa relação complexa ambos os sujeitos são simultaneamente credores e devedores (ex: contrato
de compra e venda, onde o comprador deve o dinheiro e é credor da coisa, e o vendedor deve a
coisa e é credor do dinheiro). Tais obrigações complexas são também chamadas de sinalagmáticas.
Os sujeitos precisam ser bem identificados para que o devedor saiba a quem prestar, e o credor
saiba de quem receber. Excepcionalmente o devedor pode ser desconhecido (ex: qualquer pessoa
que adquira imóvel hipotecado responde pela dívida, apesar de não ter originariamente assumido a
obrigação; 303, mais detalhes em Civil 5) e o credor também pode ser desconhecido (ex: o credor
faleceu ou desapareceu, deve então o devedor pagar na Justiça para se livrar da obrigação, 334;
outro ex: 855).

b) vínculo jurídico: o vínculo liga os sujeitos ao objeto da obrigação. O vínculo é a força motriz da
relação obrigacional. O vínculo seria qualquer acontecimento relevante para o direito capaz de fazer
nascer uma obrigação (ex: um acidente de trânsito gera um ato ilícito, um acordo de vontades
produz um contrato, etc).

c) objeto: atenção com o objeto! O objeto da obrigação não é uma coisa, mas um fato humano/uma
conduta ou omissão do devedor chamada prestação. A prestação possui três espécies: dar, fazer, ou
não-fazer. Na obrigação de dar o objeto da prestação é uma coisa (ex: dar dinheiro, dar uma TV),
mas o objeto da obrigação é a ação de entregar a coisa, não a coisa em si. Na obrigação de fazer o
objeto da prestação é um serviço (ex: o cantor realiza um show, o advogado redige uma petição, o
professor ministra uma aula). Finalmente, na obrigação de não-fazer, o objeto da prestação é uma
omissão/abstenção (ex: o químico da fábrica de perfume é demitido e se obriga a não revelar a
fórmula do perfume).

Como o objeto da obrigação é a prestação, mesmo na obrigação de dar o credor não tem poder
sobre a coisa, mas sim sobre a prestação (ex: compro uma geladeira e a loja promete me entregar
em casa, mas a loja não cumpre, não posso por isso invadir a loja e pegar a geladeira à força, devo
sim exigir perdas e danos, 389 – trata-se da responsabilidade patrimonial do devedor, como dito
acima).

As obrigações de dar e de fazer são positivas, e a de não-fazer é a chamada obrigação negativa.

O objeto da obrigação para ser válido precisa ser lícito (ex: comprar drogas, contratar o serviço de
um “pistoleiro”, etc), possível (ex: viagem no tempo, procurar um anel no mar, encontrar um
dinossauro vivo), determinável (a coisa devida precisa ser identificada, 243) e ter valor econômico
para viabilizar o ataque ao patrimônio do devedor em caso de inadimplemento (947). Acrescentem
“valor econômico” ao art. 104, II, do CC.

Aula 03 - Direito Civil 2 - Unicap - Fonte das Obrigações

O Direito se origina dos fatos = ex facto iur oritur. As fontes do Direito são a lei, a
jurisprudência, a doutrina e os costumes, conforme estudado em Introdução ao Direito. No caso das
obrigações, quais suas fontes? De onde se originam as obrigações? Ressalto que há muitas
obrigações que interessam a outras áreas jurídicas e que têm por fonte a lei, ex: obrigação de
alimentar os parentes necessitados, assunto de Direito de Família (1.696); obrigação de votar,
assunto de Direito Eleitoral; obrigação de pagar impostos, assunto de Direito Tributário; obrigação
dos homens de prestar serviço militar, etc.

Mas e as obrigações patrimoniais privadas? Como surgem as relações concretas entre particulares
tendo por objeto determinada prestação? São três as fontes segundo o Código Civil, vejamos:

1 – Contratos: esta é a principal e maior fonte de obrigação. Através dos contratos as partes
assumem obrigações (ex: compra e venda, onde o comprador se obriga a pagar o preço e o
vendedor se obriga a entregar a coisa). No próximo semestre serão estudados com detalhes os
inúmeros contratos (ex: locação, doação, empréstimo, seguro, transporte, mandato, fiança, etc).
2 – Atos unilaterais: segundo nosso Código, são os quatro capítulos entre os arts. 854 e 886,
com destaque para a promessa de recompensa (ex: perdi meu cachorro e pago cem a quem
encontrá-lo, obrigando-me perante qualquer pessoa que cumpra a tarefa). Não temos aqui um
contrato, mas um ato unilateral gerador de obrigação, como será visto no próximo semestre.

3 – Atos ilícitos: já estudados no semestre passado, revisem o art. 186 (ex: João bate no carro
de Maria e se obriga a reparar os prejuízos). O estudo dos atos ilícitos deve ser aprofundado na
importante disciplina Responsabilidade Civil (927).

ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO

São três, duas positivas (dar e fazer) e uma negativa (obrigação de não-fazer).

1 – obrigação de dar: conduta humana que tem por objeto uma coisa, subdividindo-se em
três: obrigação de dar coisa certa, obrigação de restituir e obrigação de dar coisa incerta.

1.1 – obrigação de dar coisa certa: vínculo jurídico pelo qual o devedor se compromete a
entregar ao credor determinado bem móvel ou imóvel, perfeitamente individualizado.

Tal obrigação é regulada pelo Código Civil a partir do art. 233, salvo acordo entre as partes, ou seja,
se as partes não ajustarem de modo diferente, vão prevalecer as disposições legais. Na autonomia
privada, como dito na aula 1, a liberdade das partes é grande, e o Código Civil serve mais para
completar a vontade das partes caso haja omissão no ajuste entre elas. Diz-se por isso que a maioria
das normas de direito privado são supletivas, enquanto a maioria das normas de direito público são
imperativas = obrigatórias.

O que vai caracterizar a obrigação de dar coisa certa é porque o objeto da prestação é coisa
única e preciosa, ex: a raquete de Guga, o capacete de Ayrton Senna, a camisa dez de Pelé, etc.
(235). O devedor obrigado a dar coisa certa não pode dar coisa diferente, ainda que mais valiosa,
salvo acordo com o credor (313 – mais uma norma supletiva).

Se o devedor recebe o preço e se recusa a entregar a coisa, o credor não pode tomá-la,
resolvendo-se o litígio em perdas e danos (389). A obrigação não geral direito real ( = sobre a coisa),
mas apenas direito pessoal ( = sobre a conduta). Excepcionalmente, admite-se efeito real caso a
coisa continue na posse do devedor (ex: A combina vender a B o capacete de Ayrton Senna, B paga
mas depois A recebe uma oferta melhor e termina vendendo o capacete a C; B não pode tomar o
capacete de C, mas caso estivesse ainda com A poderia fazê-lo através do Juiz; esta é a interpretação
do art. 475 do CC que vocês estudarão em Civil 3). Então o 389 é a regra e o 475 (execução forçada
do contrato) é a exceção.

E se a obrigação não gera direito real, o que vai gerar? Resposta: a tradição para as coisas
móveis e o registro para as coisas imóveis. Tradição e registro são assuntos de Direitos Reais mas
que já devo adiantar. Tradição é a entrega efetiva da coisa móvel (1226 e 1267), então quando
compro uma geladeira, pago a vista e aguardo em casa sua chegada, só serei dono da coisa quando
recebê-la. Ao contrário, se compro um celular a prazo e saio com ele da loja, o aparelho já será meu
embora não tenha pago o preço (237). Eventual perda/roubo da geladeira/celular trará prejuízo para
o dono, seja ele a loja ou o consumidor, a depender do momento da tradição. É a confirmação do
brocardo romano res perit domino (= a coisa perece para o dono), seja o comprador ou o vendedor,
até a tradição (492). Se o devedor danificar a coisa antes da tradição, terá que indenizar o
comprador por perdas e danos (239).
Por sua vez, o registro é a inscrição da propriedade imobiliária no Cartório de Imóveis, de modo que
o dono do apartamento não é quem mora nele, não é quem pagou o preço ou quem tem as chaves.
O dono da coisa imóvel é aquele cujo nome está registrado no Cartório de Imóveis (1245 e § 1º).
Mais detalhes sobre tradição e registro em Civil 4.

1.2 – obrigação de restituir: é também chamada de obrigação de devolver. Difere da obrigação de


dar, pois nesta a coisa pertence ao devedor até a tradição, enquanto na obrigação de restituir a
coisa pertence ao credor, apenas sua posse é que foi transferida ao devedor. Posse e propriedade
são conceitos que serão estudados em Direitos Reais, mas dá para entender que quando se aluga
um filme, a locadora continua sendo proprietária do filme, é apenas a posse que se transfere ao
cliente. Então na locação o cliente/devedor tem a obrigação de restituir o bem ao locador após o
prazo acertado (569, IV). Como se vê, na obrigação de restituir a prestação consiste em devolver
uma coisa cuja propriedade já era do credor antes do surgimento da obrigação. Igualmente se eu
empresto um carro a meu vizinho, eu continuo dono/proprietário do carro, apenas a posse é que é
transferida, ficando o vizinho com a obrigação de devolver o veículo após o uso. Locação e
empréstimo são exemplos de obrigação de restituir, ficando a coisa em poder do devedor, mas
mantendo o credor direito real de propriedade sobre ela. Como a coisa é do credor, seu extravio
antes da devolução trará prejuízo ao próprio credor (240), enquanto na obrigação de dar o extravio
antes da tradição traz prejuízo ao devedor. Em ambos os casos, sempre prevalece a máximares perit
domino. Mas é preciso cuidado para evitar fraudes (238, ex: alugo um carro que depois é furtado, o
prejuízo será da loja, por isso é prudente a locadora sempre fazer seguro). Outro exemplo de
obrigação de restituir está no art. 1.233, então se “achado não é roubado”, também não pode ser
apropriado, devendo quem encontrar agir conforme o p.ú. do mesmo artigo.

Próxima aula: 1.3 - obrigação de dar coisa incerta.

Aula 04 - Direito Civil 2 - Unicap - Espécies de Obrigação

1 – obrigação de dar

1.1 – obrigação de dar coisa certa

1.2 – obrigação de restituir (já vistas na aula passada)

1.3 – obrigação de dar coisa incerta: nesta espécie de obrigação a coisa não é única, singular,
exclusiva e preciosa como na obrigação de dar coisa certa, mas sim é uma coisa genérica
determinável pelo gênero e pela quantidade (243). Ao invés de uma coisa determinada/certa, temos
aqui uma coisa determinável/incerta (ex: cem sacos de café; dez cabeças de gado, um carro popular,
etc). Tal coisa incerta, indicada apenas pelo gênero e pela quantidade no início da relação
obrigacional, vem a se tornar determinada por escolha no momento do pagamento. Ressalto que
coisa “incerta” não é “qualquer coisa”, mas coisa sujeita a determinação futura. Então se João deve
cem laranjas a José, estas frutas precisam ser escolhidas no momento do pagamento para serem
entregues ao credor.

Esta escolha chama-se juridicamente de concentração. Conceito: processo de escolha da coisa


devida, de média qualidade, feita via de regra pelo devedor (244). A concentração implica também
em separação, pesagem, medição, contagem e expedição da coisa, conforme o caso. As partes
podem combinar que a escolha será feita pelo credor, ou por um terceiro, tratando-se este artigo
244 de uma norma supletiva, que apenas completa a vontade das partes em caso de omissão no
contrato entre elas.
Após a concentração a coisa incerta se torna certa (245). Antes da concentração a coisa devida não
se perde pois genus nunquam perit (o gênero nunca perece). Se João deve cem laranjas a José não
pode deixar de cumprir a obrigação alegando que as laranjas se estragaram, pois cem laranjas são
cem laranjas, e se a plantação de João se perdeu ele pode comprar as frutas em outra fazenda (246).

Todavia, após a concentração, caso as laranjas se percam (ex: incêndio no armazém) a obrigação se
extingue, voltando as partes ao estado anterior, devolvendo-se eventual preço pago, sem se exigir
perdas e danos (234, 389, 402). Pela importância da concentração, o credor deve ser cientificado
quando o devedor for realizá-la, até para que o credor fiscalize a qualidade média da coisa a ser
escolhida.

2 – obrigação de fazer: conduta humana que tem por objeto um serviço. Conceito: espécie de
obrigação positiva pela qual o devedor se compromete a praticar algum serviço lícito em benefício
do credor. Enquanto na obrigação de dar o objeto da prestação é uma coisa, na obrigação de fazer o
objeto da prestação é um serviço (ex: professor ministrar uma aula, advogado redigir uma petição,
cantor fazer um show, pedreiro construir um muro, médico realizar uma consulta, etc.). E se eu
quero comprar um quadro e encomendo a um artista, a obrigação será de fazer ou de dar? Se o
quadro já estiver pronto a obrigação será de dar, se ainda for confeccionar o quadro a obrigação
será de fazer.

A obrigação de fazer tem duas espécies:

2.1 – fungível: quando o serviço puder ser prestado por uma terceira pessoa, diferente do
devedor, ou seja, quando o devedor for facilmente substituível, sem prejuízo para o credor, a
obrigação é fungível (ex: pedreiro, eletricista, mecânico, caso não possam fazer o serviço e mandem
um substituto, a princípio para o credor não há problema). As obrigações de dar são sempre
fungíveis pois visam a uma coisa, não importa quem seja o devedor (304).

2.2 – infungível: ao credor só interessa que o devedor, pelas suas qualidades pessoais, faça o
serviço (ex: médico e advogado são profissionais de estrita confiança dos pacientes e clientes).
Chama-se esta espécie de obrigação de personalíssima ou intuitu personae ( = em razão da pessoa).
São as circunstâncias do caso e a vontade do credor que tornarão a obrigação de fazer fungível ou
não.

Em caso de inexecução da obrigação de fazer o credor só pode exigir perdas e danos (247).
Viola a dignidade humana constranger o devedor a fazer o serviço por ordem judicial, de modo que
na obrigação de fazer não se pode exigir a execução forçada como na obrigação de dar coisa certa
(art. 475 – sublinhemexigir-lhe o cumprimento). Imaginem um cantor se recusar a subir no palco,
não é razoável o Juiz mandar a polícia para forçá-lo a trabalhar “manu militari”, o coerente é o
credor do show exigir perdas e danos (389). Ninguém pode ser diretamente coagido a praticar o ato
a que se obrigara. Assim, a execução “in natura” do art. 475 do CC deve ser substituída por perdas e
danos quando for impossível (ex: a coisa devida não está mais com o devedor) ou quando causar
constrangimento físico ao devedor (ex: obrigação de fazer).

Se ocorrer recusa do devedor de executar obrigação fungível, o credor pode pedir a um


terceiro para fazer o serviço, às custas do devedor (249). Havendo urgência, o credor pode agir sem
ordem judicial, num autêntico caso de realização de Justiça pelas próprias mãos (pú do 249, ex:
consertar o telhado de casa ameaçando cair).

Mas se tal recusa decorre de um caso fortuito (ex: o cantor gripou e perdeu a voz), extingue-
se a obrigação (248).
Aula 05 - Direito Civil 2 - Unicap - Espécies de Obrigação (continuação)

ESPÉCIES DE OBRIGAÇÃO (continuação)

1 – Obrigação de dar

2 – Obrigação de fazer (já vistas)

3 – Obrigação de não-fazer: trata-se de uma obrigação negativa cujo objeto da prestação é uma
omissão ou abstenção. Os romanos chamavam de obrigação ad non faciendum. Conceito: vínculo
jurídico pelo qual o devedor se compromete a se abster de fazer certo ato, que poderia livremente
praticar, se não tivesse se obrigado em benefício do credor. O devedor vai ter que sofrer, tolerar ou
se abster de algum ato em benefício do credor. Exemplos: o engenheiro químico que se obriga a não
revelar a fórmula do perfume da fábrica onde trabalha; o condômino que se obriga a não criar
cachorro no apartamento onde reside; o professor que se obriga a não dar aula em outra faculdade;
o comerciante que se obriga a não fazer concorrência a outro, etc. Pode haver limite temporal para
a obrigação (1.147).

Como na autonomia privada a liberdade é grande, as obrigações negativas podem ser bem
variadas, mas obrigações imorais e anti-sociais, ou que sacrifiquem a liberdade das pessoas, são
proibidas, ex: obrigação de não se casar, de não trabalhar, de não ter religião, etc. Tudo é uma
questão de bom senso, ou de razoabilidade. Gosto muito da expressão “razoável”, é uma expressão
muito ligada ao Direito, inclusive tem um artigo no site sobre a razoabilidade na aplicação da lei,
confiram!

A violação da obrigação negativa se resolve em perdas e danos, então se o engenheiro


divulgar a fórmula do perfume terá que indenizar a fábrica. Mas se for viável, o credor poderá exigir
o desfazimento pelo devedor (ex: José se obriga a não subir o muro para não tirar a ventilação do
seu vizinho João, caso José aumente o muro, João poderá exigir a demolição, 251). No caso do
perfume não há como desfazer a revelação do segredo, então uma indenização por perdas e danos é
a solução (389).

Neste exemplo do muro, se José se mudar, o novo morador terá que respeitar a obrigação?
Não, pois quem celebrou o contrato não foi ele. Mas se João, ao invés de um simples contrato de
obrigação negativa, fizer com José uma servidão predial, todos os futuros proprietários da casa não
poderão aumentar o muro (1.378). Servidão predial é assunto de Civil 5, e por se tratar de um direito
real, já se percebe sua maior força em relação a um direito obrigacional. Enquanto uma obrigação
vincula pessoas (João a José), uma servidão predial vincula uma pessoa a uma coisa, então a
segurança para o credor é bem maior. Mais detalhes em Civil 5 (vide no site aulas 8 e 9 de Direitos
Reais na Coisa Alheia).

Ainda tratando do exemplo do muro, e se a Prefeitura obrigar José a aumentar o muro por
uma questão de estética ou urbanismo? José terá que obedecer e João nada poderá fazer, pois o
Direito Público predomina sobre o Direito Privado (250 – é o chamado “Fato do Príncipe”, em alusão
aos monarcas que governavam os países na Europa medieval).

CLASSIFICAÇÃO ou MODALIDADES DE OBRIGAÇÕES

Vistas as espécies, vamos passar as próximas aulas tratando das modalidades de obrigações.
São várias modalidades, mas que sempre irão corresponder a uma das três espécies de dar, fazer ou
não-fazer. A primeira modalidade é:
1 – Obrigação Natural: a obrigação civil produz todos os efeitos jurídicos, mas a obrigação natural
não, pois corresponde a uma obrigação moral. Há autores que a chamam de obrigação degenerada.
São exemplos: obrigação de dar gorjeta, obrigação de pagar dívida prescrita (205), obrigação de
pagar dívida de jogo (814), etc.

A obrigação natural não pode ser exigida pelo credor, e o devedor só vai pagar se quiser, bem
diferente da obrigação civil. Vocês sabem que se uma dívida não for paga no vencimento o direito do
credor mune-se de uma pretensão, e a dívida se transforma em responsabilidade patrimonial. Mas
tratando-se de obrigação natural, o credor não terá a pretensão para executar o devedor e tomar
seus bens (189). A dívida natural existe, mas não pode ser judicialmente cobrada, não podendo o
credor recorrer à Justiça.

Conceito: obrigação natural é aquela a cuja execução não pode o devedor ser constrangido,
mas cujo cumprimento voluntário é pagamento verdadeiro.

Por que a obrigação natural interessa ao Direito se corresponde a uma obrigação moral?
Porque a obrigação natural, mesmo sendo moral, possui um efeito jurídico: soluti retentio ou
retenção do pagamento.

Mesmo tratando-se de uma obrigação moral, o pagamento de obrigação natural é pagamento


verdadeiro e o credor pode retê-lo. Então se João paga dívida prescrita e depois se arrepende não
pode pedir o dinheiro de volta, pois o credor tem direito à retenção do pagamento (882). Como diz
a doutrina, “a obrigação natural não se afirma senão quando morre”, ou seja, é com o pagamento e
sua extinção que a obrigação natural vai existir para o direito, ensejando ao credor a soluti retentio.

Mas não se confunda obrigação natural com obrigação inexistente: se João paga dívida
inexistente o credor não pode ficar com o dinheiro, e João terá direito à repetitio indebiti ( =
devolução do indébito; em direito “repetir” significa “devolver”, e “indébito” é o que não é devido).
Então quem efetua pagamento indevido pode exigir a devolução do dinheiro ( = repetitio indebiti)
para que outrem não enriqueça sem motivo. O credor de obrigação natural tem direito à soluti
retentio, mas quem recebe dívida inexistente não (ex: pago a meu credor João da Silva, mas por
engano faço o depósito na conta de outro João da Silva, que terá que devolver o dinheiro, 876). Na
obrigação natural não cabe a repetitio indebiti, pois o credor dispõe da soluti retentio. Falaremos
mais de enriquecimento sem causa e pagamento indevido na aula 12.

Em suma, a obrigação natural não se cumpre por bondade ou liberalidade ou doação, mas por
um dever moral, e a moral influencia o Direito, tanto que a lei lhe atribui o efeito jurídico da soluti
retentio.

Falando de doação, vocês verão em Civil 3 que o donatário deve ser grato ao doador, então se
João doa um carro a Maria, Maria lhe deve gratidão pelo resto da vida, não podendo agredi-lo ou
ofendê-lo sob pena de perder a doação (557). Mas se por trás dessa doação existe uma obrigação
natural, tal doação não se revoga por ingratidão (564, III; ex: João deve dinheiro a Maria mas a dívida
prescreveu, porém mesmo assim João resolveu pagar e doou uma jóia a Maria; pois bem, caso Maria
venha no futuro a agredir João, tal doação não se extinguirá já que não foi feita por liberalidade, mas
sim em cumprimento de obrigação natural).

Finalizando, gostaria de transcrever a valiosa opinião de Washington de Barros Monteiro


sobre a raridade da obrigação natural e a absurda proteção que a lei dá ao devedor no nosso
ordenamento:
- numa época em que a noção do prazo tende a desaparecer, substituída pelo espírito de
moratória e pela esperança da revisão; em que o devedor conhece a arte de não pagar as dívidas e
em que aquele que paga com exatidão no dia devido não passa de um ingênuo, que não tem direito
a nada; em que as leis se enchem de piedade pelos devedores e em que as vias judiciárias se
mostram imprescindíveis como imposição ao devedor civil, aparece como verdadeiro anacronismo a
obrigação natural, suscetível de pagamento voluntário, apesar de desprovida de ação (vide Direito
das Obrigações, 1ª parte, Ed. Saraiva, 32ª edição, pág. 215).

Aula 06 - Direito Civil 2 - Unicap - Classificação ou Modalidades de Obrigações

CLASSIFICAÇÃO ou MODALIDADES DE OBRIGAÇÕES

1 – Obrigação Natural (já vista)

2 – Obrigação Alternativa

A obrigação simples só possui um objeto, mas a obrigação alternativa tem por objeto duas ou mais
prestações, mas apenas uma será cumprida como pagamento. É muito comum na prática, até para
facilitar e estimular os negócios (ex: vendo esta casa por vinte mil ou troco por terreno na praia;
outro ex: um artista bate no seu carro e se compromete a fazer um show na sua casa ou a pagar o
conserto; mais um ex: o comerciante que se obriga com outro a não lhe fazer concorrência, ou então
a lhe pagar certa quantia; exemplo da lei: art. 1701, outro exemplo da lei, art 442).

Características da obrigação alternativa:

a) nasce com objeto composto, ou seja, duas ou mais possibilidades de prestação;

b) o adimplemento de qualquer das prestações resulta no cumprimento da obrigação, o que


aumenta a chance de satisfação do credor, sem ter que se partir para as perdas e danos, caso
qualquer das prestações venha a perecer. Como o credor aceitou mais de uma prestação como
pagamento, qualquer delas vai satisfazer o credor (253 e 256); a exoneração do devedor se dá
mediante a realização de uma única prestação.

c) o devedor pode optar por qualquer das prestações, cabendo o direito de escolha, de regra, ao
próprio devedor (252); mas o contrato pode prever que a escolha será feita pelo credor, por um
terceiro, ou por sorteio (817); essa escolha chama-se de concentração, semelhante a da obrigação
de dar coisa incerta; ressalto todavia que não se confunde a obrigação alternativa com a de dar coisa
incerta; nesta o objeto é único, embora indeterminado até a concentração; já na obrigação
alternativa há pelo menos dois objetos;

d) se o devedor, ignorando que a obrigação era alternativa, fizer o pagamento, pode repeti-lo
para exercer a opção. É um caso raro de retratação da concentração, e cabe ao devedor a prova de
que não sabia da possibilidade de escolha (877).

e) nas obrigações periódicas admite-se o jus variandi, ou seja, pode-se mudar a opção a cada
período (§ 2o do art. 252). A doutrina critica essa mudança de prestação porque gera instabilidade
para o credor.

3 - Obrigação Facultativa

É parecida, é uma prima pobre, mas não se confunde com a obrigação alternativa. É também
muito rara, tanto que nosso Código não reservou para ela um capítulo próprio. Sua fonte está mais
na lei do que no contrato, conforme exemplos que veremos abaixo. Ou seja, há casos específicos na
lei que contemplam obrigações facultativas, porque as partes dificilmente contratam prevendo uma
obrigação facultativa.

Conceito: é aquela cujo objeto da prestação é único, mas confere ao devedor o direito
excepcional de substitui-lo por outro.

Exemplo: art. 1234, assunto de Civil 4, então quem encontra coisa perdida deve restitui-la ao dono, e
o dono fica obrigado a recompensar quem encontrou; mas o dono pode, ao invés de pagar a
recompensa, abandonar a coisa, e aí quem encontrou poderá ficar com ela; pagar a recompensa é a
prestação principal do devedor, já abandonar a coisa é prestação acessória do seu dono. O
abandono da coisa não é obrigação, mas faculdade do seu dono. Ao invés de pagar a recompensa,
tem o devedor a faculdade de dar a coisa ao credor.

Outro exemplo: art. 1382, assunto de Civil 5, então imaginem que da Fazenda A sai um aqueduto
para a Fazenda B, levando água, com a obrigação, ajustada em contrato, de que o dono da Fazenda
A deverá conservar a obra. Pois bem, ao invés de manter o aqueduto, tem o dono da Fazenda A a
obrigação facultativa de abandonar suas terras para o dono da Fazenda B. Ao invés de conservar o
aqueduto, o devedor tem a faculdade de abandonar suas terras, dando-as ao vizinho.

Ao nascer a obrigação o objeto é único, mas para facilitar o pagamento, o devedor tem a
excepcional faculdade de se liberar mediante prestação diferente. É vantajosa assim para o
devedor.

Na obrigação facultativa, ao contrário da alternativa, o credor nunca tem a opção e só pode exigir a
prestação principal, pois a prestação devida é única e só o devedor pode optar pela prestação
facultativa.

Ressalto que a impossibilidade de cumprimento da prestação principal extingue a obrigação,


resolvendo-se em perdas e danos, não se aplicando o art. 253, pois, como já dito, a prestação
acessória não é obrigação, mas faculdade do devedor. Então quem encontrar coisa perdida e não
receber a recompensa, não poderá exigir o abandono da coisa, mas sim deverá processar o devedor
pelo valor da recompensa.

Aula 07 - Direito Civil 2 - Unicap - Classificação ou Modalidades de Obrigações (continuação)

4 – Obrigação divisível e indivisível

Em geral, numa obrigação existe apenas um credor e um devedor. Mas caso existam na mesma
relação vários devedores ou vários credores, o razoável é que cada devedor pague apenas parte da
dívida, e que cada credor tenha direito apenas a parte da prestação. Essa regra sofre exceção nos
casos deindivisibilidade, que veremos hoje, e de solidariedade, na próxima aula. Tanto na
indivisibilidade como na solidariedade, embora concorram várias pessoas, cada credor pode
reclamar a prestação por inteiro, e cada devedor responde também pelo todo (259 e 264).
Comecemos pela divisibilidade e indivisibilidade:

Obrigação divisível é aquela cuja prestação pode ser parcialmente cumprida sem prejuízo de
sua qualidade e de seu valor (ex: uma dívida de cem reais pode ser paga em duas metades; um curso
de Direito Civil pode ser ministrado em várias aulas). Mas a depender do acordo entre as partes, o
devedor deve pagar de uma vez só, mesmo que a prestação seja divisível (314).

Já na obrigação indivisível a prestação só pode ser cumprida por inteiro (ex: quem deve um cavalo
não pode dar o animal em partes, 258; mas se tal cavalo perecer e a dívida se converter em pecúnia,
deixa de ser indivisível, 263).
Como dito, a indivisibilidade vai despertar interesse prático quando houver mais de um credor
ou mais de um devedor.

- pluralidade de devedores: imaginem que um pai morre e deixa dívidas, seus filhos irão pagar estas
dívidas dentro dos limites da herança recebida do pai (1792, 1997). Então o credor do pai terá mais
de um filho para cobrar esta dívida. Se a prestação for divisível, cada filho responde pela parte
correspondente a sua herança, e a insolvência de um deles não aumentará a quota dos demais
(257). Mas se a prestação for indivisível, cada filho responde pela dívida toda, e aquele que pagar ao
credor, cobrará o quinhão correspondente de cada irmão (259 e pú – veremos sub-rogação em
breve). A relação obrigacional antes era do credor com os filhos do pai morto, agora é do irmão
pagador contra os outros irmãos.

- e se a pluralidade for de credores? Sendo divisível a prestação, cada credor só pode exigir
sua parte (257). Mas sendo indivisível aplica-se o 260, pelo que o devedor deverá pagar a todos os
credores juntos, para que um não engane os outros. Ou então o devedor deverá pagar àquele credor
que prestar uma garantia ( = caução) de que repassará o pagamento aos outros (ex: João deve um
carro a três pessoas, mas não encontra os três para pagar, assim, para se livrar logo daquela
obrigação, paga ao credor que ofereceu uma fiança; se este credor não repassar o carro aos demais
credores, o fiador poderá ser processado pelos prejudicados; fiança é assunto de Civil 3). Se o
devedor pagar sem as cautelas do art. 260, terá que pagar de novo àquele credor que,
eventualmente, venha a ser lesado pelo credor que recebeu todo o pagamento, afinal quem paga
mal paga duas vezes, concordam? Diz-se por isso que o pagamento integral da dívida a um só dos
vários credores pode não desobrigar o devedor com relação aos demais concredores. Mas pagando
o devedor corretamente, caberá aos credores buscar sua parte com o credor que recebeu tudo
(261). Tratando-se de coisa indivisível (ex: carro, barco, casa), poderão os credores usar a coisa em
condomínio, ou então vendê-la e dividir o dinheiro (1320).

Espécies de indivisibilidade: a) física: a prestação é indivisível pela sua própria natureza, pois
sua divisão alteraria sua substância ou prejudicaria seu uso (ex: obrigação de dar um cavalo,
obrigação de restituir o imóvel locado, etc); b) econômica: o objeto da prestação fisicamente
poderia ser dividido, mas perderia valor (ex: obrigação de dar um diamante, art. 87); c) legal: é a lei
que proíbe a divisão (ex: a lei 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano,
determina no art. 4º, II, que os lotes nos loteamentos terão no mínimo 125 metros quadrados, então
um lote deste tamanho não pode ser dividido em dois); d) convencional: é o acordo entre as partes
que torna a prestação indivisível (art. 88, ex: dois devedores se obrigam a pagar juntos certa quantia
em dinheiro, o que vai favorecer o credor que poderá exigir tudo de qualquer deles, 258 in fine, e
259).

Percebe-se que qualquer das três espécies de obrigação (dar, fazer e não-fazer) pode ser
divisível ou indivisível (ex: dar dinheiro é divisível, mas dar um cavalo é indivisível; pintar um quadro
é obrigação de fazer indivisível, mas plantar cem árvores é divisível; não revelar segredo é indivisível,
mas não pescar e não caçar na fazenda do vizinho é divisível).

Aula 08 - Direito Civil 2 - Unicap - Classificação ou Modalidades de Obrigações (continuação)

5 – Obrigações solidárias

Como visto na aula passada, quando numa obrigação indivisível concorrem vários devedores,
todos estão obrigados pela dívida toda, como se existisse uma solidariedade entre eles (259). Assim,
se várias pessoas devem coisa indivisível, a obrigação é também solidária. Mas pode haver obrigação
solidária mesmo de coisa divisível devida por várias pessoas.
Conceito legal: há solidariedade quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou
mais de um devedor, cada um com direito ou com responsabilidade pela dívida toda, como se fosse
o único (264).

As obrigações solidárias e indivisíveis têm conseqüências práticas semelhantes, mas são


obrigações diferentes, vejamos:

- a obrigação indivisível é impossível pagar por partes, pois resulta da natureza da prestação
(ex: cavalo, lote urbano, diamante, barco, fazer um quadro, etc). Já a obrigação solidária até poderia
ser paga por partes, mas por força de contrato não pode, tratando-se de uma garantia para
favorecer o credor. Na solidariedade cada devedor deve tudo, na indivisibilidade cada devedor só
deve uma parte, mas tem que pagar tudo diante da natureza da prestação. Pelas suas características
a solidariedade não se presume, decorre de contrato ou da lei (265). Exemplo de solidariedade
decorrente de lei é a patroa que responde pelos danos causados a terceiros por sua empregada
doméstica (932, III, 942 e pú).

- pode haver obrigação solidária de coisa divisível (ex: dinheiro), de modo que todos os
devedores vão responder integralmente pela dívida, mesmo sendo coisa divisível. Tal solidariedade
nas coisas divisíveis serve para reforçar o vínculo e facilitar a cobrança pelo credor.

- o devedor a vários credores de coisa indivisível precisa pagar a todos os credores juntos
(260, I), mas o devedor a vários credores solidários se desobriga pagando a qualquer deles (269).

- se a coisa devida em obrigação solidária perece, converte-se em perdas e danos, torna-se


divisível, mas permanece a solidariedade (271 e 279). Se a coisa devida em obrigação indivisível
perece, converte-se em perdas e danos e os co-devedores deixam de ser responsáveis pelo todo
(263).

- o devedor de obrigação solidária que paga sozinho a dívida ao credor, vai cobrar dos demais
co-devedores a quota de cada um, sem solidariedade que não se presume (265 e 283). Então A, B e
C devem solidariamente dinheiro a D. Se A pagar a dívida toda ao credor, A vai cobrar a quota de B e
C sem solidariedade entre B e C.

Elementos da obrigação solidária: a) multiplicidade de credores ou de devedores, ou ainda, de


uns e de outros; b) unidade de prestação; c) co-responsabilidade dos interessados.

5.1 - Solidariedade ativa

Configura-se pela presença de vários credores, chamados concredores, todos com o mesmo direito
de exigir integralmente a dívida ao devedor comum (267).

A solidariedade ativa é rara porque na sua principal característica está sua principal inconveniência
(269). Assim, o devedor não precisa pagar a todos os concredores juntos, como na obrigação
indivisível (260, I). Pagando apenas a um dos credores solidários, mesmo sem autorização dos
demais, o devedor se desobriga, e se este credor for desonesto ou incompetente, e reter ou perder
a quota dos demais, os concredores nada poderão reclamar do devedor, terão sim que reclamar
daquele que embolsou o pagamento.

Mas caso algum dos concredores já esteja executando judicialmente o devedor, o pagamento
deverá ser feito ao mesmo (268), o que se chama de prevenção, ficando tal credor prevento para
receber o pagamento com prioridade em nome de todos os concredores.
Outro inconveniente é que se um dos credores perdoar a dívida, o devedor fica liberado, e os demais
concredores terão que exigir sua parte daquele que perdoou (272).

Como se vê, na solidariedade ativa cada credor fica sujeito à honestidade dos outros concredores.
Por estes inconvenientes a solidariedade ativa é rara, afinal não interessa ao credor.

5.2 – Solidariedade passsiva

Esta é comum e importante, devendo ser estimulada já que protege o crédito, reforça o vínculo,
facilita a cobrança e aumenta a chance de pagamento, pois o credor terá várias pessoas para cobrar
a dívida toda.

E quanto mais se protege o credor, mais as pessoas emprestam dinheiro, e com mais dinheiro os
consumidores se equipam, as lojas vendem, as fábricas produzem, os patrões lucram, geram
empregos e o governo arrecada tributos. Como se sabe: proteger o crédito é estimular o
desenvolvimento sócio-econômico. Entendo até que, por isso mesmo, para proteger o crédito, a
solidariedade passiva, não a ativa, deveria ser presumida. Violando o art. 265, o art. 829
acertadamente faz presumir a solidariedade passiva conforme será visto em fiança.

Conceito: ocorre a solidariedade passiva quando mais de um devedor, chamado coobrigado, com
seu patrimônio (391), se obriga ao pagamento da dívida toda (275).

Assim, havendo três devedores solidários, o credor terá três pessoas para processar e exigir
pagamento integral, mesmo que a obrigação seja divisível. O credor escolhe se quer processar um
ou todos os devedores (pú do 275). Aquele devedor que pagar integralmente a dívida, terá direito
de regresso contra os demais coobrigados (283).

Na solidariedade passiva não se aplica o benefício de divisão e nem o benefício de ordem. O que é
isso?

Pelo benefício de divisão o devedor pode exigir a citação de todos os coobrigados no processo para
juntos se defenderem. Isto é ruim para o credor porque atrasa o processo, por isso a solidariedade
passiva não concede tal benefício aos co-devedores.

Pelo benefício de ordem, o coobrigado tem o direito de ver executado primeiro os bens do devedor
principal (ex: fiança, 827). Mas o fiador pode renunciar ao benefício de ordem e se equiparar ao
devedor solidário (828, II). O avalista nunca tem benefício de ordem, sempre é devedor solidário,
por isso se algum amigo lhe pedir para ser avalista não aceite, mas se ele insistir seja seu fiador com
benefício de ordem, mas jamais fiador-solidário ou avalista.

Fiança e aval são exemplos de solidariedade passiva decorrente de acordo de vontades. Então a
Universidade quando financia o curso de um estudante, geralmente exige um fiador ou um avalista
(897), de modo que se o devedor não pagar a dívida no vencimento, o credor irá processar o
devedor, o fiador ou o avalista. Fiança será estudada em Civil 3 e aval em Direito Empresarial.

Exemplos de solidariedade passiva decorrente da lei estão na responsabilidade civil (932), no


comodato (585) e na gestão de negócios (pú do 867).

Aula 09 - Direito Civil 2 - Unicap - Modalidades de obrigações (continuação)

6 - Obrigações líquidas e ilíquidas


Líquida é a obrigação certa e determinada, ou seja, certa quanto à sua existência e determinada
quanto à sua qualidade, quantidade, natureza e objeto. Em outras palavras, obrigação líquida é
aquele cuja existência é certa e cujo valor é conhecido.

Vocês sabem que se uma dívida não for paga no vencimento o credor mune-se de uma
pretensão e a dívida se transforma em responsabilidade patrimonial. Esta pretensão consiste no
poder de executar o devedor para tomar seus bens através do Juiz e satisfazer o credor. Pois bem, a
ação de execução só é possível quando a obrigação é líquida.

Sendo a obrigação ilíquida e não havendo acordo entre as partes, precisa ser apurada pelo Juiz
em processo de liquidação para poder ser executada, afinal não se pode executar obrigação ilíquida
(947).

Inclusive entendo que o Juiz deve sempre proferir sentenças líquidas para evitar mais demoras
ao credor. Exemplo: o Juiz condena João a indenizar Maria porque João matou o pai dela, devendo o
Juiz dizer logo o valor da indenização, e não deixar isso para uma fase posterior do processo, 946. E
de quanto é essa indenização por morte? A lei responde no art. 948. Assim, um crime interessa ao
Direito Penal para a punição com a prisão do infrator, e também interessa ao Direito Civil para a
punição ao bolso do infrator. A punição civil é mais rápida e não depende de Delegado e nem de
Promotor, dispensando parte do burocrático aparelho estatal. Mas se o infrator não tiver bens, só
haverá punição penal, pois liberdade todos têm para perder. Mais detalhes na importante disciplina
Responsabilidade Civil.

7 – Obrigação principal e acessória

Principal é a obrigação autônoma, ou seja, tem vida própria, já a obrigação acessória depende
da principal, agregando-se a ela. Então uma compra e venda, um empréstimo e uma locação são
contratos que geram obrigações autônomas. Por outro lado, a fiança, a hipoteca e o penhor
produzem obrigações acessórias que vão se agregar a uma obrigação principal, por exemplo, como a
locação.

Então quem aluga uma casa celebra um contrato principal de locação e pode exigir um contrato
acessório de fiança para garantir o pagamento do aluguel na hipótese de inadimplência do inquilino.
A locação existe sem a fiança, mas o contrário não. Inclusive, sendo nula a locação, nula será a
fiança, mas o inverso não (art. 184, 2ª parte).

8 – Obrigação cumulativa ou conjuntiva

Caracteriza-se pela pluralidade de prestações (ex: troco uma casa por um carro e uma lancha).
Não se trata de obrigação alternativa (carro OU lancha), mas obrigação cumulativa (carro E lancha).
Na obrigação cumulativa todas as prestações interessam ao credor, na alternativa apenas uma delas.
Na cumulativa, muitas prestações estão na obrigação e muitas no pagamento. Já na alternativa,
muitas prestações estão na obrigação e apenas uma no pagamento. Exemplo legal de obrigação
cumulativa é o contrato de empreitada onde o engenheiro pode fazer o serviço E dar os materiais
para a construção de uma casa (610).

9 – Obrigação pura

É a obrigação simples, ou seja, é toda aquela cuja eficácia não está subordinada a qualquer das
três modalidades dos negócios jurídicos: a condição, o termo (ou prazo) e o encargo (ou modo, ou
ônus). Estas modalidades vocês conhecem de Civil 1, vamos exemplificar:
- obrigação condicional: subordina a obrigação a evento futuro e incerto (ex: o alfaiate compra
tecido da fábrica e combina só pagar o preço se vender as roupas; vender as roupas não é uma
certeza, pode ou não acontecer, 121, 876) Condições absurdas são proibidas (ex: alugo minha casa a
você, mas você não pode entrar nela, isso é o que a lei chama de “privar de todo efeito o negócio
jurídico”, no art. 122).

- obrigação a termo: subordina a obrigação a evento futuro e certo (ex: pagarei o tecido em
trinta dias; trinta dias são o prazo e o prazo é um evento certo, só depende do inexorável passar do
tempo, 132).

- obrigação modal: o modo (ou encargo, ou ônus) é imposto ao beneficiário de uma liberalidade
como uma doação ou herança. Então pode-se doar uma fazenda com o ônus de construir uma
escola para as crianças carentes da região (553, 136). Ou pode-se deixar uma herança para um
sobrinho com o ônus de mandar rezar mensalmente uma missa para o falecido. O encargo precisa
ser pequeno para não caracterizar uma contraprestação (ex: dou um carro a meu vizinho com o
ônus de levar meus filhos e eu para a escola e o trabalho diariamente; ora, isso não é doação, mas
contratação de um motorista). Se o encargo for de interesse público (ex: construir uma escola), o
Promotor de Justiça fiscalizará sua execução (pú do 553, este é um dos poucos casos de participação
do Ministério Público no direito patrimonial, afinal o Ministério é público e o Direito Civil é privado.
Se o encargo for absurdo (ex: mandar rezar missa todo dia para o falecido) o Juiz pode interferir na
obrigação privada para modificá-la.

Então obrigação simples é aquela que não for condicional, a termo ou modal.

Aula 10 - Direito Civil 2 - Unicap - Modalidades de Obrigações (continuação)

10ª e última modalidade de obrigação: Obrigação Real

Trata-se de uma obrigação propter rem ( = em razão da coisa). Não decorre de um contrato,
mas da propriedade sobre um bem. Quem adquire certo bem, adquire automaticamente essa
obrigação real, decorrente da coisa (real = res = coisa). O adquirente do bem vai se tornar devedor,
mesmo sem querer, em decorrência de sua condição de dono desse bem.

Exemplo: 1.345, a lei determina que quem compra um apartamento com dívida de
condomínio assume esta obrigação, embora tenha sido o dono anterior que não pagou a taxa. A
obrigação está vinculada à coisa, por isso chama-se obrigação real (res = coisa). Esta vinculação da
obrigação à coisa, qualquer que seja seu dono, deriva da sequela, que é uma característica dos
Direitos Reais. Sequela é uma palavra que se origina do verbo seguir, então a obrigação segue a
coisa, não importa quem seja seu dono. O proprietário da coisa assume a obrigação
automaticamente, apenas pelo fato de ter sucedido o dono-devedor anterior na propriedade da
coisa.

É também chamada de obrigação mista porque apresenta características de Direito das Coisas ( =
Direito Real) e de Direito das Obrigações ( = Direito Pessoal). O Direito Real e o Direito das
Obrigações formam o Direito Patrimonial Privado (vide aula 1), sendo natural que algumas vezes eles
se interpenetrem.

Conceito: obrigação real corresponde ao vínculo jurídico que se origina da lei com
característica dos Direitos Reais e transmissão automática ao novo proprietário da coisa.

Observação sobre o conceito: a OR se origina apenas da lei, e não do contrato. Os contratos


podem ser inventados pelas partes, são numerus apertus (425), mas os direitos reais não, só a lei
pode criá-los, sendo numerus clausus (1225), por isso as obrigações reais originam-se sempre da lei.
Originando-se da lei, a OR é irrecusável, não podendo o devedor deixar de assumi-la.

Outra observação: o devedor da obrigação real varia caso a coisa mude de dono, então se a
coisa é vendida, o novo dono se tornará o devedor. Quem se torna titular do direito real ( =
propriedade), torna-se devedor de eventual obrigação real sobre o bem apropriado.

Mais exemplos de OR: art. 1297 (quem compra uma fazenda tem a obrigação de fazer a cerca,
embora a cerca tenha caído na época do dono anterior), art. 1383 (quem compra imóvel com
servidão predial tem a obrigação de manter a servidão, por isso observem sempre o registro do
imóvel antes de fazer a compra, para não comprar barato um terreno e depois, por exemplo,
descobrir que nele não se pode construir para não tirar a vista do edifício de trás; este exemplo
corresponde a uma servidão predial de vista, assunto de Civil 5).

Em suma, a obrigação propriamente dita vincula uma pessoa (credor) a outra pessoa
(devedor), já a obrigação real está vinculada a uma coisa, e quem for proprietário dessa coisa será o
devedor.

CLÁUSULA PENAL

Concluído o estudo das dez modalidades de obrigações, vamos encerrar a primeira unidade
deste semestre tratando da cláusula penal (CP).

Conceito: CP é a cláusula acessória a um contrato pelo qual as partes fixam previamente o


valor das perdas e danos que por acaso se verifiquem em conseqüência da inexecução culposa da
obrigação (408, ex: um promotor de eventos contrata um cantor para fazer um show, e já fixa no
contrato que, se o artista desistir, terá que pagar uma indenização de cem mil).

A cláusula penal é acessória, não é obrigatória, então se a dívida não for paga no vencimento (
= se o cantor não fizer o show), e não existir cláusula penal no contrato, é o Juiz quem irá fixar a
indenização devida pelo cantor, tornando a obrigação líquida (vide aula 9), para só depois
possibilitar o ataque pelo credor (o promotor de eventos) ao patrimônio do cantor.

Essa é a grande vantagem da cláusula penal: pré-fixar as perdas e danos, economizando


tempo, eliminando recursos processuais ao dispensar o Juiz de calcular o valor previsto no art. 402
do CC.

Outra vantagem da CP é a de intimidar o devedor, ou seja, ele já fica sabendo que terá uma pena se
não cumprir a obrigação. É verdade que a lei prevê automaticamente uma punição ao devedor
(389), mas a CP reitera essa sanção.

Quando uso no conceito a expressão inexecução “culposa”, refiro-me à culpa em sentido


amplo (lato sensu), que corresponde ao dolo (inexecução voluntária) e à culpa stricto sensu (em
sentido restrito = imprudência e negligência). Então se o cantor não fez o show porque não quis
(dolo) ou porque bebeu demais e perdeu a voz (imprudência), terá que pagar a CP. Mas se o cantor
não fez o show porque pegou uma gripe, trata-se de um caso fortuito que isenta de
responsabilidade (393 e pú).

Se a obrigação for cumprida pelo devedor, a cláusula penal se extingue; se a obrigação


principal for nula, a cláusula penal também o será, afinal, como cláusula acessória, segue o destino
da principal (184, in fine).
A CP geralmente reverte em favor do credor, mas o contrato pode prever que será paga a
terceiros (ex: se o cantor não fizer o show, pagará cem mil ao Hospital do Câncer). A CP geralmente
é pactuada em dinheiro, mas pode corresponder a obrigação de dar outra coisa, ou a fazer, ou não-
fazer algum serviço, com ampla liberdade para as partes.

Espécies: a) CP compensatória: aplica-se em caso de inexecução (= inadimplemento) da


obrigação pelo devedor (410, então o credor poderá optar pela obrigação principal ou pela cláusula
penal, semelhante a uma obrigação alternativa); b) CP moratória: aplica-se em caso de atraso (=
retardo, mora) do devedor no cumprimento da obrigação, pelo que o devedor pagará a multa pelo
atraso e cumprirá a obrigação, 411 (ex: multa de 10% em caso de atraso no pagamento de aluguel,
416). Ambas as espécies estão previstas no art. 409.

Se a cláusula penal compensatória tiver um valor muito alto, o Juiz deverá reduzi-la (412,
413). Mas é justo o Estado-Juiz se imiscuir nos contratos privados, alterando aquilo que foi
estabelecido livremente pelos particulares? Reflitam! O velho CC, no art. 924, que corresponde a
esse 413, usava o verbo “poderá”, enquanto o novo CC usa o verbo “deverá”, como consequência da
publicização do Direito e a proteção maior que o Estado dá hoje aos devedores. Critico a
publicização num artigo no site sobre a importância do Direito Privado e os riscos da intervenção
estatal na autonomia dos cidadãos, atrofiando a economia e trazendo insegurança jurídica.
Confiram!

Fim da 1ª parte do curso de Direito das Obrigações.

Aula 11 - EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

Uma obrigação é um fenômeno jurídico que ocorre a todo momento, que nasce e se extingue
a todo instante. Enquanto estamos aqui conversando, existem inúmeras obrigações, contratos, atos
ilícitos, etc., sendo realizados/ocorrendo lá fora na rua. Vocês hoje, por exemplo, celebraram algum
contrato, assumiram alguma obrigação, compraram alguma coisa, tomaram algo emprestado,
usaram o telefone? Acredito que sim, então vocês hoje fizeram acontecer uma obrigação jurídica.

Veremos nesta 2ª unidade do curso de Direito Civil 2 os vários modos pelos quais as
obrigações se extinguem, e o primeiro e principal desses modos é o pagamento.

1 - Pagamento: é a principal forma de extinção das obrigações. O pagamento é muito comum


e ocorre com grande frequência na sociedade, pois toda obrigação nasce para ser satisfeita. A
imensa maioria das obrigações são cumpridas/pagas, de modo que o devedor fica liberado. Só uma
minoria das obrigações é que não são satisfeitas, pelo que o devedor poderá ser judicialmente
processado pelo credor.

Conceito: num conceito mais simples, pagamento é a morte natural da obrigação, ou a


realização real da obrigação, mas nem sempre em dinheiro (ex: A paga a B para pintar um quadro,
de modo que a obrigação de B será fazer o quadro, o pagamento de B será realizar o serviço). O leigo
tende a achar que todo pagamento é em dinheiro, mas nem sempre, pois em linguagem jurídica
pagar é executar a obrigação, seja essa obrigação de dar uma coisa, de fazer um serviço ou de se
abster de alguma conduta (não-fazer).

Num conceito mais completo, pagamento é o ato jurídico formal, unilateral, que corresponde
à execução voluntária e exata por parte do devedor da prestação devida ao credor, no tempo, modo
e lugarprevistos no título constitutivo. Vamos comentar este conceito:
- formal: o pagamento é formal pois a prova do pagamento é o recibo; tal recibo em direito é
chamado de quitação, e deve atender às formalidade do art. 320. Muitas vezes, em pequenos
contratos, nós não pedimos recibo pra não perder tempo, é um hábito que nós temos e vocês
sabem que o costume é também uma fonte do direito. Falaremos mais da quitação adiante.

- unilateral: pois é de iniciativa do devedor, que é o sujeito passivo da obrigação.

- voluntário e exato: lembrem-se sempre disso, pagamento é voluntário e exato; se o devedor


só paga após ser judicialmente executado, tecnicamente isto não é pagamento pois foi feito sob
intervenção judicial, ao penhorar/tomar bens do devedor; além de voluntário, o pagamento deve
ser exato, então se A deve cinquenta a B e paga com um livro, tecnicamente isto não foi pagamento.
De qualquer modo, em ambos os casos, mesmo pagando sob força judicial, ou pagando coisa
diferente da devida, se o credor aceitou e se satisfez, isto é o que importa. Mas tecnicamente, em
linguagem jurídica, pagamento é aquele voluntário e exato.

- prestação: é o objeto da obrigação, e vocês já sabem que tal prestação é uma conduta
humana, pode ser um dar, um fazer ou um omitir-se (não-fazer). Pagar é cumprir esta prestação.

- tempo, modo e lugar: o pagamento precisa atender a estas regras previstas no contrato na
lei ou na sentença que fez nascer a obrigação, respeitando a data, o lugar e a maneira de pagar.

Regras do pagamento: 1) satisfação voluntária e rigorosa da prestação (dar uma coisa, fazer um
serviço, ou abster-se de uma conduta) porque o pagamento é exato; 2) o credor não pode ser
obrigado a receber prestação diferente, ainda que mais valiosa (art. 313); o credor pode aceitar
receber prestação diferente, mas não pode ser forçado a aceitar (356); 3) o credor não pode ser
obrigado a receber por partes uma dívida que deve ser paga por inteiro (314); esta regra tem duas
exceções, no art. 962, que dispõe sobre o concurso de credores, assunto do final do semestre, e no
art. 1.997, que dispõe sobre pagamento pelos herdeiros de dívida do falecido, assunto de Civil 7.

Quem deve pagar? O devedor, mas nada impede que um terceiro pague, afinal o credor quer
receber. Se o devedor quer impedir que um terceiro pague sua dívida deve se antecipar e pagar logo
ao credor. Em geral para o credor não importa quem seja o solvens, quem esteja pagando. Solvens é
o pagador, seja ele o devedor ou não, e o accipiens é quem recebe o pagamento, seja ele o credor
ou não. Se a obrigação for personalíssima (ex: A contrata o cantor B para fazer um show), o solvens
só pode ser o devedor. Mas se a obrigação não for personalíssima, o credor vai aceitar o pagamento
de qualquer pessoa. Para evitar especulações ou constrangimentos, a lei trata diferente o terceiro
que paga por interesse jurídico do terceiro que paga sem interesse jurídico, apenas por pena ou para
humilhar. Assim, o terceiro que paga com interesse jurídico (ex: fiador, avalista, herdeiro) vai se sub-
rogar nos direitos do credor (349, veremos sub-rogação em breve). O terceiro que paga sem
interesse jurídico (ex: o pai, o inimigo, etc) vai poder cobrar do devedor original, mas sem eventuais
privilégios ou vantagens (ex: hipoteca, penhor, 305). Em suma, o terceiro interessado tem
reembolso e sub-rogação nos eventuais privilégios, já o terceiro juridicamente desinteressado só
tem direito ao reembolso.

A quem se deve pagar? Ao credor, ou a seu representante, sob pena do pagamento ser feito
outra vez, pois quem paga mal paga duas vezes (308). Se o credor é menor ou louco, pague a seu pai
ou curador, sob pena de anulabilidade (310). Credor putativo: é aquele que parece o credor mas não
o é (ex: A deve a B, mas B morre e deixa um testamento nomeando C seu herdeiro, então A paga a C,
mas depois o Juiz anula o testamento, A não vai precisar pagar novamente pois pagou a um credor
putativo; C é que vai ter que devolver o dinheiro ao verdadeiro herdeiro de B, 309). Idem no caso do
311, pois se considera um representante do credor aquele que está com o recibo, embora depois se
prove que tal accipiens furtou o recibo do credor; neste caso o devedor não vai pagar outra vez, o
credor deverá buscar o pagamento do accipiens falso.

Como se prova o pagamento? Já dissemos, com o recibo/quitação. Quitação vem do latim


“quietare”, que significa aquietar, acalmar, tranqüilizar. Quitação é o documento escrito em que o
credor reconhece ter recebido o pagamento e exonera o devedor da obrigação. A quitação tem
vários requisitos no art. 320, mas em muitos casos da vida prática a quitação é informal/verbal e
decorre dos costumes (ex: compra e venda em banca de revista/bombom). Se o credor não quiser
fazer a quitação, o devedor poderá não pagar (319). Mas pagar não é só uma obrigação do devedor,
pagar é também um direito, pois o devedor tem o direito de ficar livre das suas obrigações, é até um
alívio para muita gente pagar seus débitos. Assim, o devedor pode consignar/depositar o pagamento
se o credor não quiser dar a quitação, e o Juiz fará a quitação no lugar do credor. Veremos em breve
pagamento em consignação. Espécies de quitação: 1) pela entrega do recibo, é a mais comum; 2)
pela devolução do título de crédito (324), assunto que vocês vão estudar em Direito
Empresarial/Comercial.

Ônus da prova: quem deve provar que houve pagamento? Se a obrigação é positiva, ou seja, de dar
e de fazer, o ônus da prova é do devedor, assim se você é devedor, guarde bem seu recibo. Se a
obrigação é negativa o ônus da prova é do credor, cabe ao credor provar que o devedor descumpriu
o dever de abstenção, pois não é razoável exigir que o devedor prove que se omitiu, e mais fácil
exigir que o credor prove que o devedor deixou de se omitir, fazendo o que não podia,
descumprindo aquela obrigação negativa.

Próxima aula: lugar e tempo do pagamento. Enriquecimento sem causa e pagamento indevido.

Aula 12 - Direito Civil 2 - Unicap - Modos de Extinção das Obrigações

MODOS DE EXTINÇÃO DAS OBRIGAÇÕES

1 – PAGAMENTO (continuação)

Lugar: onde o pagamento deve ser feito? No local de livre escolha das partes, afinal no Direito Civil
predomina a autonomia da vontade (art. 78). Se o contrato/sentença for omisso, o lugar do
pagamento será no domicílio do devedor (327 e pú). Tratando-se de imóvel, o local da coisa
determina o lugar do pagamento (328). A doutrina classifica as dívidas em quesível (querable) e
portável (portable): nesta, cabe ao devedor ir pagar no domicílio do credor, sob pena de juros e
multa ( = mora, assunto do final do semestre, 395). Já na dívida querable cabe ao credor ir exigir o
pagamento no domicílio do devedor, a iniciativa é do credor, sob pena de mora do credor (394, 400,
bom, veremos mora mais adiante).

Tempo: quando deve ser feito o pagamento? No vencimento previsto no título, e se não houver
vencimento é porque o credor pode exigir o pagamento imediatamente. É a chamada satisfação
imediata do art. 331. Mas deve-se sempre tolerar um prazo moral, que é aquele prazo razoável, do
bom-senso, para dar ao devedor um tempo mínimo de se organizar, sacar o dinheiro no banco,
esperar a mercadoria chegar do exterior, etc. O vencimento é uma data que favorece o devedor,
então o devedor pode pagar antes do vencimento, mas o credor só pode exigir a partir do
vencimento, sob as penas do 939. A lei todavia permite, excepcionalmente, cobrança antes do
vencimento caso o devedor esteja em dificuldade financeira, nos casos do art. 333.

Enriquecimento sem causa e pagamento indevido:


Enriquecer sem causa é enriquecer repentinamente sem motivo justo, sem trabalhar, sem herdar.
Uma das hipóteses de enriquecimento sem causa é através do pagamento indevido, por isso estes
dois assuntos devem ser estudados em conjunto.

Ocorre pagamento indevido quando o devedor paga a alguém que não é o credor, ou seja,
oaccipiens não é o credor, e o devedor agiu por engano. Quem recebe pagamento indevido
enriquece sem causa (ex: A deve a José da Silva, mas paga a outro José da Silva, homônimo do
verdadeiro credor; A efetuou pagamento indevido e vai ter que pagar de novo ao verdadeiro credor,
pois quem paga mal paga duas vezes; A obviamente vai exigir o dinheiro de volta do outro José da
Silva que enriqueceu sem causa, mas o verdadeiro credor não precisa esperar, ele não tem nada a
ver com isso).

Ocorre enriquecimento sem causa quando alguém aufere um aumento patrimonial, em prejuízo de
outrém, sem justa causa. Há outros casos de enriquecimento sem causa além das hipóteses de
pagamento indevido, ex: 578, 1255, pú do 1817, etc. Estudaremos esses exemplos oportunamente,
ao longo do extenso curso de Direito Civil.

Dois efeitos do pagamento indevido:

1 – aquele que enriqueceu sem causa fica obrigado a devolver o indevidamente auferido, não só por
uma questão moral (= direito natural), mas também por uma questão de ordem civil (876, 884) e
tributária, afinal como explicar à Receita Federal um súbito aumento de patrimônio? O objetivo
dessa devolução é reequilibrar os patrimônios do devedor e do falso credor, alterados sem
fundamento jurídico, sem causa justa.

2 – se o falso credor não quiser voluntariamente devolver o pagamento, surge o segundo


efeito que é o direito do devedor de propor ação de repetição do indébito (repetitio indebiti) contra
tal accipiens. Esta ação tem este nome pois, em linguagem jurídica, “repetir” significa “devolver” e
“indébito” é aquilo que não é devido. Então a ação é para o falso credor devolver aquilo que não lhe
era devido. Tal ação prescreve em três anos (206, § 3º, IV).

Também se aplicam as regras do pagamento indevido quando se paga mais do que se deve.
Porém não cabe a repetição quando o “solvens” agiu por liberalidade (ex: doação, 877) ou em
cumprimento de obrigação natural (ex: gorjeta, dívida de jogo, dívida prescrita, 882, 814) ou quando
o “solvens” deu alguma coisa para obter fim ilícito, afinal ninguém pode se beneficiar da própria
torpeza (ex: pagou ao pistoleiro errado para cometer um homicídio, não cabe devolução, 883).

E se o objeto do pagamento indevido já tiver sido alienado pelo falso credor a um terceiro?
Bem, se tal objeto era coisa móvel, tal alienação vale por uma questão de segurança das relações
jurídicas e porque em geral os móveis são menos valiosos do que os imóveis. De qualquer modo o
falso credor vai responder pelo equivalente em dinheiro.

Mas se o objeto do pagamento indevido for um imóvel que o falso credor já tenha alienado a
um terceiro, tal alienação só valerá se feita onerosamente (venda sim, doação não) e o terceiro
estiver de boa-fé. Caso contrário o solvens poderá perseguir o imóvel e recuperá-lo do terceiro
(879).

Aula 13 - Direito Civil 2 - Unicap - Modos de Extinção das Obrigações (continuação)

1 – Pagamento (já visto)

2 - IMPUTAÇÃO DE PAGAMENTO: o normal é entre duas pessoas haver apenas uma obrigação, mas
pode acontecer de alguém ter mais de uma dívida com o mesmo credor. Assim, se A deve a B cem
reais decorrentes de um empréstimo e outros cem reais decorrentes de um ato ilícito (ex: A bateu
no carro de B), quando A vai pagar apenas uma destas dívidas precisa dizer a B qual está quitando.
Imputar o pagamento é determinar em qual dívida o pagamento está incidindo. Num conceito mais
técnico, imputação de pagamento é a operação pela qual o devedor de mais de uma dívida vencida
da mesma natureza a um só credor, indica qual das dívidas está pagando por ser tal pagamento
inferior ao total das dívidas (352). É preciso que haja mais de uma dívida, todas vencidas, da mesma
natureza (ex: obrigação de dar dinheiro) e o pagamento ser menor do que a soma das dívidas. Cabe
ao devedor fazer a imputação, dizer qual dívida está quitando, e o devedor deve ser orientado por
seu advogado para quitar logo a dívida de juro maior e a dívida com garantia (ex: hipoteca, penhor,
fiança, porque aí o devedor libera a coisa dada em garantia/odevedor libera o fiador). Se o devedor
não imputar, o credor poderá fazê-lo (353), devendo o credor ser orientado por seu advogado para
pedir a quitação na dívida de juro menor e na dívida quirografária ( =dívida sem garantia).
Lembrem-se que pelo art. 314 o credor não está obrigado a receber pagamento parcial, mas na
prática pode ser melhor o credor aceitar alguma coisa e depois brigar pelo restante. Se o devedor e
o credor não fizerem a imputação, a lei fará na dívida de maior valor, conforme art. 355 (
=imputação legal).

3 – PAGAMENTO POR CONSIGNAÇÃO

Este é o terceiro dos modos de extinção das obrigações que nós estamos estudando. É através da
consignação que o devedor vai exercer o seu direito de pagar, afinal já dissemos que pagar não é só
um dever, é um direito também, concordam? Imaginem que o locador morreu e o inquilino
desconhece seu herdeiro, deve então consignar o aluguel para evitar a mora e o despejo. Consignar
onde? Em Juízo, e o Juiz vai procurar o sucessor do credor. A parte operacional da consignação em
pagamento vocês vão estudar em processo civil, mas conhecendo o direito, o processo fica fácil de
aprender (335, III – credor desconhecido). Outro exemplo, imaginem que alguém morre e deixa a
mulher como beneficiária do seguro de vida, só que o falecido tinha uma esposa e uma
companheira, então a seguradora vai pagar a qual das duas? Paga em Juízo, numa conta a disposição
do Juiz, o Juiz dá uma sentença à seguradora, que servirá de quitação, enquanto as duas mulheres
seguem no processo disputando o dinheiro (793, 335, IV). É prudente a seguradora fazer isso até
para não correr risco de pagar à mulher errada e efetuar pagamento indevido.

Conceito: pagamento por consignação consiste no depósito judicial da coisa devida, realizada pelo
devedor nas hipóteses do art. 335 do CC. Este artigo é taxativo (= exaustivo), não é exemplificativo,
de modo que não há outras possibilidades de consignação. Outro detalhe importante: só existe
consignação nas obrigações de dar, pois não se pode depositar um serviço (obrigação de fazer) ou
uma omissão (obrigação de não-fazer), mas apenas coisas, em geral dinheiro. Admite-se também
depósito de imóveis, gado, colheita, etc (341), e o Juiz vai ter que arranjar um depositário para
cuidar dessas coisas até o credor aparecer (343). Quando o depósito é de pecúnia (dinheiro) coloca-
se em banco oficial: Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal, em conta à disposição do Juiz.

Percebam que na ação de consignação o autor é o devedor, o credor é o réu e a quitação vem com a
sentença. A sentença dirá se a consignação equivale ao pagamento, se o devedor teve razão ao
consignar e se a obrigação está extinta. Excepcionalmente admite-se o credor como autor da ação
quando mais de uma pessoa se diz credor, então qualquer deles pede ao devedor que consigne o
pagamento, enquanto os credores discutem em Juízo (345).

Em algumas consignações o credor está certo de não querer receber pois o devedor quer pagar
menos do que deve, e vocês sabem que o credor não está obrigado a receber por partes. Então o
devedor consigna com base no inc. I do 335, alegando que o credor se recusa a receber, mas existe
uma “justa causa” para isso no 314. Isso acontece na prática quando o devedor usa o cheque
especial, atrasa o cartão de crédito, etc. e depois quer pagar sem incluir os juros contratados. Ora,
quando o devedor precisou de crédito o banco emprestou, então na hora de pagar é preciso cumprir
o contrato, concordam?

No Código de Processo existe uma consignação extra-judicial, para dívidas em dinheiro, que podem
ser feitas diretamente no banco, sem precisar de advogado ou Juiz. Vocês verão isso lá em Processo
Civil.

Efeitos do pagamento por consignação: 1) liberatório: libera/exonera o devedor da obrigação; 2)


extintivo: a consignação extingue a obrigação (334).

Aula 14 - Direito Civil 2 - Unicap - Pagamento por sub-rogação

4 – Pagamento por sub-rogação

Sub-rogar é substituir o credor, de modo que o pagamento por sub-rogação assemelha-se à


cessão de crédito por se tratar da substituição da pessoa do credor (348; veremos cessão de crédito
mais adiante).

Conceito: ocorre a sub-rogação quando a dívida de alguém é paga por um terceiro que
adquire o crédito e satisfaz o credor, mas não extingue a dívida e nem libera o devedor, que passa a
dever a esse terceiro. Ex: A deve cem a B, mas C resolve pagar essa dívida, então B vai se satisfazer e
A vai passar a dever a C. Via de regra não há prejuízo para o devedor que passa a dever a outrem.

Como vocês já sabem, a lei permite que qualquer pessoa pague a dívida dos outros, então se o
devedor quer evitar isso, deve se antecipar e cumprir logo suas obrigações. O terceiro que paga essa
dívida pode ou não ter interesse jurídico, vimos isso algumas aulas atrás, lembram?

Se o terceiro solvens tem interesse jurídico vai se sub-rogar nos direitos do credor primitivo, ou seja,
vai adquirir todas as eventuais vantagens, privilégios, garantias e preferências do credor primitivo,
além de,é óbvio, exigir o reembolso. Ex: A deve cem a B com uma garantia de fiança ou hipoteca; se
C pagar essa dívida terá direito a cobrar os cem de A, mas só terá direito à garantia da fiança ou da
hipoteca caso C possua interesse jurídico (346, III). Veremos fiança e hipoteca, respectivamente, em
Civil 3 e Civil 5. Caso C não possua interesse jurídico só terá direito ao reembolso (305). A lei trata
diferente para evitar especulações e constrangimentos, depois revisem a aula 11.

Efeitos da sub-rogação: 1) satisfativo em relação ao credor primitivo. O credor primitivo vai se


satisfazer com o pagamento feito pelo terceiro, mas a obrigação permanece para o devedor; a sub-
rogação não extingue a dívida; 2) translativo: o novo credor vai receber todas as vantagens e direitos
do credor primitivo, desde que o pagamento tenha sido feito por sub-rogação (349).

Espécies de sub-rogação: 1) legal: decorrente da lei, nas hipóteses do art. 346; a lei determina
independente da vontade das partes; 2) convencional: depende de acordo escrito entre as partes,
quando o terceiro solvens faz acordo com o credor primitivo e fica com o direito de sub-rogação
mesmo sem interesse jurídico e mesmo sem a anuência do devedor. Através de acordo escrito se
transferem todas as vantagens do credor primitivo para o solvens, igual a uma cessão de crédito
(347 e 348).

5 – Dação em pagamento
É dar alguma coisa em pagamento, diferente da coisa devida. Os romanos chamavam de datio
insolutum. Dação vem assim do verbo dar. Por favor, não é “da ação” em pagamento, mas “dação”
mesmo, do verbo dar.

Conceito: é o acordo liberatório em que o credor concorda em receber do devedor prestação diversa
da ajustada (356). Não pode haver imposição do devedor em pagar algo diferente do devido (313),
afinal quem deve dinheiro só paga com um objeto se o credor aceitar. Ex: devo dinheiro e pago com
uma TV, um livro, uma casa, etc.

Requisitos da dação: 1) consentimento, concordância, anuência do credor; 2) prestação diversa da


ajustada, então não se trata de obrigação alternativa, pois nesta a obrigação nasce com duas opções
de pagamento; na dação é só depois que as partes trocam o objeto do pagamento.

Efeitos da dação: 1) satisfatório em relação ao credor, mesmo recebendo outra coisa, pois o credor
pode preferir receber coisa diversa do que receber com atraso ou nada receber; 2) liberatório em
relação ao devedor, pois a dívida se extingue e o devedor se exonera da obrigação. Estes dois
efeitos são os mesmos do pagamento natural.

Evicção: imaginem que A deve 100 e paga com um objeto furtado, que não era dele, então o
verdadeiro dono vai exigir a devolução da coisa e a obrigação vai renascer (359). Ser “evicto” é ser
afastado da coisa recebida em pagamento. Ocorre a evicção quando alguém perde a propriedade da
coisa em virtude de decisão judicial que reconhece a outrem direito anterior sobre essa coisa.
Veremos evicção em Civil 3.

6 - Novação

Ocorre quando as partes criam uma nova obrigação, substituindo e extinguindo a anterior. A
novação é criada pelas partes e não imposta pela lei. Obrigação nula não pode ser novada, mas
obrigação anulável sim (art 367 CC). A nova obrigação precisa ter as partes ou o objeto diferenciado
(art 360). Se nada muda na nova obrigação, a novação apenas reforça a obrigação anterior, sem
alterá-la (art 361 - animus novandi). A novação, de regra, não permite discussão sobre as condições
da dívida antiga, mas a jurisprudência admite conforme sumula 286 do STJ. Uma alteração pequena
na obrigação também não implica em novação (ex: desconto no preço, dispensa de hipoteca,
prorrogação do vencimento). Tem pouca importância atual, pois o mercado prefere utilizar a cessão
de crédito e a dação em pagamento, afinal na novação o credor não recebe nada. Para o devedor a
novação pode ser boa, afinal os juros e a execução judicial da dívida antiga podem ser extintos com a
nova avença.

Aula 15 - Direito Civil 2 - Unicap - Modos de Extinção das Obrigações (continuação)

7 – COMPENSAÇÃO: é um modo de extinção das obrigações que deve ser estimulado pois
representa a lei do menor esforço, por uma questão de lógica e de simplicidade.

Conceito: a compensação extingue as obrigações do mesmo gênero das pessoas que são,
reciprocamente, credoras e devedoras entre si, até onde as dívidas se compensem. Ex: A deve cem a
B decorrente de um empréstimo e B deve cem a A porque bateu no carro de A, então um não vai
cobrar do outro, a compensação vai extinguir as duas obrigações mediante um pagamento fictício
(art. 368). A compensação exige pluralidade de obrigações, não existindo compensação numa
obrigação única, como uma compra e venda, onde o comprador deve o preço e o vendedor deve a
coisa. A compensação pode ser parcial caso a outra dívida seja inferior, o que vai representar mais
uma exceção ao art. 314, afinal a compensação deve ser estimulada.
Espécies: a) compensação legal: ocorre por força da lei, mesmo que uma das partes se oponha,
sempre que as dívidas forem líquidas ( = valor certo), vencidas e homogêneas (= mesma espécie e
qualidade, 369); b) compensação judicial: determinada pelo Juiz no caso concreto, ao entender que
deve haver compensação por uma questão de economia processual, por uma questão de
praticidade, dando o Juiz seus motivos/fundamentos na sentença; c) compensação convencional:
decorre do acordo de vontades, decorre da transação entre as partes, e no direito civil a liberdade
das partes é grande, as partes podem dispor de seus bens com ampla liberdade, é a chamada
autonomia privada. Dívidas de qualquer tipo podem ser compensadas, sejam ilíquidas, heterogenias
ou não vencidas, ninguém tem nada a ver com isso, nem Promotor, nem Juiz, nem Delegado, afinal
cada um sabe o que faz com seu patrimônio. Mas, repito, depende de acordo, não pode haver
imposição de uma parte sobre outra.

Vedações: algumas obrigações, pela sua natureza, não podem ser compensadas, pois elas fogem ao
direito patrimonial privado. São aquelas obrigações de caráter alimentar e tributário. Então se meu
filho bate com meu carro eu não posso deixar de sustentá-lo (ex: deixar de pagar a faculdade alguns
meses) para compensar o prejuízo, afinal os alimentos são indispensáveis por uma questão de
sobrevivência. Idem se meu carro cai num buraco na rua, eu não posso deixar de pagar imposto de
renda para compensar com o governo o prejuízo pela não conservação das ruas, afinal o interesse
público do governo em receber tributos é maior do que o interesse particular do cidadão que teve
seu carro avariado. Por isso já foi revogado o art. 374 do novo CC.

Efeitos da compensação: os mesmos do pagamento: extingue a obrigação, satisfaz o credor e libera


o devedor.

8 – CONFUSÃO: esta confusão aqui, do direito das obrigações, é diferente da confusão dos direitos
reais, do art. 1272, que corresponde à mistura de líquidos, e que estudaremos em Civil 4. A confusão
que nos interessa hoje é mais um modo de extinção das obrigações semelhante ao pagamento por
impossibilidade lógica de permanecer o vínculo. Art 381, ex: A é inquilino de seu pai B, mas o pai
morre e A herda o apartamento, extinguindo a obrigação de pagar aluguel face à confusão, pois B
vai reunir as qualidades de credor e devedor, afinal ninguém pode ser devedor ou credor de si
mesmo. A confusão exige identidade de pessoas e de patrimônios, de modo que o dono de uma
pessoa jurídica pode dever a sua empresa, e vice-versa.

9 – REMISSÃO: escreve-se com dois “s”, ao contrário de remição, instituto da execução contra
devedor que vocês vão estudar em processo civil. A remissão (com dois “s”) é o popular perdão da
dívida. Conceito: remissão é a liberação do devedor pela autoridade do credor que,
voluntariamente, dispensa o crédito, perdoa o débito e extingue a obrigação (385). Mas como pagar
é um direito do devedor, se ele não aceitar a remissão deve consignar o pagamento. Mas em geral a
remissão é aceita e se assemelha a uma doação.

Espécies de remissão: pode ser total ou parcial (parte da dívida ou dispensa dos juros); pode ser
expressa (por escrito) ou tácita (ex: devolução do título de crédito); pode ser gratuita (mais comum)
ou onerosa (nesta remissão o credor perdoa a dívida mas pede algo em troca, o que se assemelha a
uma transação, veremos transação em breve).

Ressalto que remissão é gesto nobre de pessoas solventes, ou seja, quem está em dificuldades
financeiras não pode perdoar seus devedores, afinal estará prejudicando seus próprios credores
(385, in fine). Assim se A é insolvente (tem muitos credores) não pode perdoar seus devedores para
não caracterizar uma fraude contra seus credores, como prevê o art. 158. Trata-se inclusive de uma
presunção absoluta de fraude a remissão de dívida feita pelo insolvente, como vocês estudaram no
semestre passado.

Aula 16 - Direito Civil 2 - Unicap - Modos de Extinção das Obrigações (continuação)

10 – TRANSAÇÃO

Trata-se na verdade de um contrato, o Código Civil trata como contrato, mas para alguns
autores a transação é modo de extinção das obrigações. Eu entendo que é um contrato, mas no
próximo semestre vocês terão muito assunto para estudar, pois Civil 3 é a cadeira mais extensa do
curso de Direito Civil. Assim, vamos logo conhecer aqui a transação que corresponde a um acordo, a
uma conciliação para extinguir a obrigação. O Juiz inclusive deve incentivar a transação entre as
partes, conforme art. 125, IV, do Código de Processo. Conforme ditado popular, “é melhor acordo
ruim do que briga boa”. Vocês conhecem a expressão “intransigente”? Pois intransigente é aquele
que não faz transação, que não faz concessões.

Conceito da doutrina: transação é a solução contratual da lide; conceito da lei: transação é o


contrato pelo qual as partes terminam ou previnem um litígio mediante concessões mútuas, art.
840. É essencial que na transação existam concessões mútuas, ou seja, cada uma das partes perde e
ganha um pouco. As concessões podem ser desproporcionais, ou seja, uma parte pode se quiser
perder mais do que a outra, mas as concessões têm que ser mútuas. Se uma das partes perde tudo e
esta parte é o credor existe remissão da dívida (vide item 9), mas não transação. Igualmente, se o
devedor perde tudo existe pagamento, mas não transação.

É curioso que se uma das cláusulas do contrato de transação for nula, o contrato todo será anulado,
pois a nulidade de uma cláusula quebra esse equilíbrio das concessões que as partes buscaram
(848). Diz-se que a transação é por isso indivisível.

Aplicação: a transação não se aplica a todas as obrigações, mas apenas às obrigações de caráter
patrimonial privado (841), que são justamente estas obrigações que nós encontramos aqui no
Direito Civil. Todavia, tolera-se transação em outras áreas, como no Direito de Família, quando as
partes transacionam sobre pensão alimentícia; ou no Direito do Trabalho quando as partes
transacionam sobre salários atrasados; ou no Direito Penal quando o Ministério Público transaciona
com o réu, e o réu reconhece a culpa em troca de uma pena menor; ou no Direito Administrativo
quando o Governo transaciona com o contribuinte para receber impostos. Enfim, a transação é
típica do Direito Civil, mas pelas suas vantagens admite-se cada vez mais em outras áreas.

Falando de Direito Penal, devo dizer que a transação civil sobre fato que constitui crime não
extingue a ação penal. Ex: se A agride B e quebra seu braço, vai responder penalmente por lesão
corporal e civilmente pelos danos causados a B com tratamento médico, tempo que ficou sem
trabalhar, danos morais se for o caso, etc. Se A e B fazem uma transação civil, não impede o
Promotor de continuar processando A criminalmente para receber uma pena de prisão (846). Vocês
verão em responsabilidade civil a relação entre a Justiça Penal e a Civil quando um mesmo fato
interessa a ambas (935).

Espécies: a) preventiva: visa evitar uma ação judicial, ou seja, as partes fazem um acordo antes de
submeter a lide ao Judiciário; pode ser feita por instrumento particular, ou seja, por contrato escrito
e assinado pelas partes, testemunhas e advogados, se houver; b) terminativa ou judicial: é a
transação feita na Justiça, após iniciado o processo, quando o acordo é homologado pelo Juiz.
Vamos encontrar estas duas espécies no art. 842.
A vantagem da transação judicial é que ela não pode ser mais discutida, pois foi feita perante o Juiz,
tornando-se coisa julgada. Já a transação preventiva, embora também segura, sempre pode ser
questionada em Juízo, alegando uma das partes que foi coagida, que se enganou, etc. (849) Eu
repudio a banalização destes argumentos pois já disse a vocês que a transação é um contrato, e
contrato é para ser cumprido por uma questão de segurança na sociedade. País nenhum se
desenvolveu sem respeitar dois institutos de Direito Civil: contratos e propriedade.

Efeito: a transação extingue a obrigação decorrente daquela controvérsia entre as partes.

11 – ARBITRAGEM

Nosso CC chama a arbitragem de compromisso e existe uma lei específica sobre arbitragem
de nº 9.307/96, conhecida como Lei Marco Maciel, pela influência deste político pernambucano na
sua aprovação. Trata-se de um tema moderno e maravilhoso para uma monografia de final de curso.

Conceito: arbitragem é o acordo pela qual as partes, por não chegarem à transação,
concordam em ter sua lide submetida à decisão de um árbitro, de um “juiz particular”, afastando tal
lide da Justiça Estatal. Através da arbitragem as partes pedem a um terceiro que aprecie a lide, e tal
decisão deverá ser cumprida pelas partes, como se fosse uma sentença judicial. Ressalto que na
transação, através de mediação, as partes escolhem a solução da lide, enquanto na arbitragem as
partes escolhem o árbitro, mas não escolhem a decisão.

Esta lei 9.307 foi alvo de muitas controvérsias, até que o Supremo, em 2002, julgou sua
constitucionalidade, e desde então a arbitragem vem crescendo em todo o país e contribuindo para
desafogar a Justiça.

Vantagens da arbitragem:

a) celeridade: maior rapidez na solução da lide, tendo em vista a conhecida sobrecarga do Judiciário
e os entraves da legislação processual;

b) custo menor: quando se ganha tempo também se ganha dinheiro;

c) sigilo: o processo arbitral não é público como o processo judicial, onde as decisões são divulgadas
na internet e no Diário Oficial, provocando desgaste emocional;

d) escolha do árbitro: não se pode escolher o Juiz, pois depende sempre das regras de competência
e da distribuição no Fórum, porém se pode escolher o árbitro, que deve ser uma pessoa idônea,
preparada, conhecida das partes, especialista na área do litígio (ex: engenheiro, médico, contador);
isto é uma questão crucial pois o Juiz não entende de medicina, engenharia, contabilidade, etc, e
precisa sempre nomear um perito para lhe ajudar a julgar processos nestas áreas;

e) impossibilidade de recurso: a decisão do árbitro é irrecorrível, e se a parte sucumbente não


cumpri-la, a parte vencedora vai executá-la perante o Juiz; só aqui é que o Juiz entra, para executar a
decisão arbitral com a força do Estado, caso o sucumbente voluntariamente não acate; já na Justiça
Estatal existem inúmeros recursos (cerca de trinta), graus de jurisdição (cerca de oito), entraves
burocráticos e formalidades desnecessárias previstas no arcaico Código de Processo Civil; f) paz
social: a solução rápida da arbitragem traz paz social e elimina as incertezas entre particulares que
atrapalhem a realização de negócios e a circulação de dinheiro na sociedade;

g) alivia a Justiça: a utilização da arbitragem deixa o Judiciário com mais tempo para agir nas
questões onde a presença do Estado é indispensável, como nas questões penais, administrativas e
tributárias.
Desvantagens da arbitragem: ela só faz sentido para casos sofisticados e de valor elevado; é
preciso pagar os honorários do árbitro e as despesas do Tribunal; tem que ser conduzida por árbitros
com conhecimento e tribunais com estrutura para fazer perícias e produzir provas; caso contrário a
solução será injusta com o agravante que não cabe apelação.

Aplicação da arbitragem: no Direito Internacional, na solução de divergências obrigacionais


entre empresas multinacionais, ou na solução de disputas entre países soberanos (ex: dúvidas sobre
a fronteira entre dois países); no Direito Civil em matéria patrimonial (852, ex: direito de vizinhança,
contratos, direito da informática, direito autoral, responsabilidade civil, etc). Na Espanha inclusive,
conforme publicado no Jornal do Magistrado da AMB, edição de outubro de 2003, funciona uma
corte arbitral com mais de mil anos, na cidade de Valencia. É um tribunal privado que julga
problemas com o uso de água entre os agricultores numa região árida, e os árbitros são os próprios
agricultores.

Espécies: a) cláusula compromissória (853): as partes celebram um contrato e dispõem numa


cláusula que, se houver algum litígio futuro entre elas, a lide será submetida à arbitragem e não à
Justiça; esta cláusula é mera precaução; b) compromisso arbitral (851): já existe litígio entre as
partes e elas resolvem submeter a questão a um árbitro e não a um Juiz para solucionar a
controvérsia.

Atualmente já há vários escritórios de advocacia especialistas em arbitragem. Alguns Juízes


são contra a arbitragem por achar que vão perder poder, mas eu discordo, acho que é pura vaidade
destes colegas, e nós devemos aceitar tudo que venha para desafogar a Justiça e beneficiar a
população, estimulando mais negócios e comércio. Depois acessem www.iccwbo.org e
www.ccbc.org.br e leiam a lei 9.307/96.

Aula 17 - Direito Civil 2 - Unicap - Do Inadimplemento das Obrigações

Concluímos os modos de extinção das obrigações, vamos agora avançar para a mora e o
inadimplemento das obrigações. A regra é toda obrigação ser cumprida, é todo contrato ser
cumprido, afinal o contrato faz lei entre as partes, e como diziam os romanos “pacta sunt servanda”.

Porém, excepcionalmente, as obrigações podem não ser cumpridas por culpa do devedor ou
por culpa do credor ou por algum acidente ( = caso fortuito ou de força maior).

A culpa do devedor pode ensejar a mora ou o inadimplemento. A mora é o atraso no


pagamento enquanto o inadimplemento é a falta de pagamento. Curioso é que a mora pode
também ser do credor, ou seja, o credor pode se negar a aceitar o pagamento (ex: A deve milho a B,
mas B se recusa a aceitar alegando que os grãos estão estragados). Vejamos primeiro a mora e seus
efeitos, e na próxima aula inadimplemento:

MORA: é o atraso no pagamento ou no recebimento, tanto por culpa do devedor (mora solvendi)
como por culpa do credor (mora accipiendi). Se ambos tiverem culpa não haverá mora, pois as
moras recíprocas se anulam. Conceito: mora é a impontualidade culposa do devedor no pagamento
ou do credor no recebimento (394). Se o devedor atrasa sem culpa (ex: por causa de um acidente,
uma greve, uma cheia, um caso fortuito ou de força maior) não haverá mora (396). Mas a mora do
credor independe de culpa e o devedor nesse caso deve consignar o pagamento. Assim não
importam os motivos da mora do credor, o devedor precisa exercer seu dever e seu direito de pagar
através da consignação (335 , I – observem que tal inciso usa a expressão “se o credor não puder”,
não importando assim os motivos pelos quais o credor não pôde ir buscar o pagamento, mesmo que
sejam decorrentes de um caso fortuito). A mora do credor é mais rara.
Efeitos da mora do credor: o credor que não quiser ou não for receber o pagamento conforme
acertado sujeita-se a quatro efeitos: 1) o credor em mora libera o devedor da responsabilidade pela
conservação da coisa (ex: A deve um cavalo a B que ficou de ir buscá-lo na fazenda de A; a mora de B
não responsabiliza A caso o cavalo venha a morrer mordido por uma cobra após o vencimento; § 2º
do 492); 2) o credor em mora deve ressarcir o devedor com as despesas pela conservação da coisa
(no exemplo do cavalo, B deve pagar as despesas de A com ração e medicamento desde o
vencimento); 3) obriga o credor a pagar um preço mais alto pela coisa se a cotação subir; este efeito
se aplica a coisas que têm preço na bolsa de valores, como ações, açúcar, café, soja, etc. No art. 400
do CC vamos encontrar estes três efeitos; 4) último efeito: o credor em mora não pode cobrar juros
do devedor desse período, afinal foi do credor a culpa pela atraso no pagamento.

Mora do devedor: a mora solvendi pode se equiparar ao inadimplemento e o credor exigir então
perdas e danos (389). Ex: A compra docinhos para o casamento da filha, mas a comida atrasa e
chega depois da festa, é evidente que esta mora corresponde a um inadimplemento (pú do 395). Se
o atraso foi por culpa da doceira, além de devolver o dinheiro, vai ter que pagar as perdas e danos
do 389. Mas se o atraso foi por causa de uma enchente que derrubou a ponte, a doceira só terá que
devolver o dinheiro, sem os acréscimos das perdas e danos. Se eu atraso o pagamento do
condomínio eu estou em mora e vou pagar a multa, mas é evidente que esta mora não corresponde
a um inadimplemento pois interessa ao condomínio receber o pagamento atrasado. (veremos mais
perdas e danos em breve)

Pressupostos da mora do devedor: 1) crédito vencido (397); 2) culpa do devedor: esta é a culpa lato
sensu (= em sentido amplo) que corresponde ao dolo e à culpa stricto sensu (= em sentido restrito),
que se divide em imprudência e negligência, como vocês estudaram em ato ilícito no semestre
passado; se não há qualquer culpa, mas caso fortuito ou de força maior não existe mora do devedor
(393, 396); 3) possibilidade de cumprimento tardio da obrigação com utilidade para o credor, caso
contrário teremos inadimplemento e não mora (pú do 395).

Efeitos da mora do devedor: 1) o devedor responde pelos prejuízos causados, mais multa, juros, etc
(395); 2) o devedor em mora responde pelo caso fortuito ou de força maior ocorridos durante o
atraso (399, ex: A deve um cavalo campeão a B, mas A entrou em mora para levar o cavalo para B,
então vem uma cheia e mata o cavalo, A irá responder por perdas e danos, salvo se conseguir provar
que a cheia também atingiu a fazenda de B e que o cavalo morreria do mesmo jeito se estivesse lá;
se a cheia chegasse antes do vencimento A também não iria responder perante B pela morte do
cavalo pois se tratou de um caso fortuito ou de força maior).

Purgação da mora: purgar significa emendar, reparar, remediar; purgar a mora é consertar/sanar as
consequências da mora, tanto para o devedor como para o credor, conforme art. 401. Em caso de
inadimplemento do devedor não se purga mais a mora, resolvendo-se em perdas e danos. A mora
do devedor pode também ser purgada se o credor perdoar/remir/dispensar as perdas e danos do
395.

JUROS LEGAIS: um dos efeitos da mora do devedor é o pagamento de juros ao credor (395),
principalmente nas obrigações de dar dinheiro ( = pecuniárias). Conceito de juro: é a remuneração
que o credor exige por emprestar dinheiro ao devedor. Juro é igual a rendimento, é igual a fruto
civil.

Os frutos em direito podem ser civis, naturais ou industriais. Os frutos civis são os juros e os
rendimentos; os frutos naturais são as frutas das árvores e as crias dos animais; os frutos industriais
são, por exemplo, os carros produzidos por uma fábrica de automóveis. Não confundam frutos com
produtos, pois estes se esgotam (ex: uma pedreira, uma mina de ouro, um poço de petróleo),
enquanto os frutos se renovam. Bom, vocês já estudaram frutos e produtos lá em Civil 1 (art. 95).

Voltando aos juros, estes são livres, conforme art. 406, sendo fixados pelas partes no contrato ou
pelo mercado financeiro. Depois de assinado o contrato, não adianta dizer que os juros são altos,
pois contrato é para ser cumprido. Se as partes não fixarem os juros, estes serão de um por cento ao
mês, conforme art. 406 do CC combinado com o art. 161, § 1º do Código Tributário Nacional, pois
este é o juro devido no pagamento de impostos.

Realmente, os juros devem ser livres, fixados pelas partes ou pelo mercado. Não pode a lei querer
limitar os juros, como acreditam alguns populistas, pois o Direito não manda na Economia. Caso as
leis jurídicas fossem superiores às leis econômicas, bastaria um decreto/uma lei acabando com a
inflação, acabando com o desemprego, acabando com a recessão, etc., para resolver todos nossos
problemas. Mas não é assim que o mundo moderno funciona, precisamos ser realistas e não
demagógicos, por isso é que o art. 192, § 3º da CF, que limitava os juros em 12% ao ano, foi
revogado em maio de 2003 sem nunca ter efetivamente sido aplicado, apesar de vigorado por
quinze anos, desde 1988.

Se quiserem saber mais sobre juros, especialmente porque eles são tão altos em nosso país,
consultem um texto com este título que está no nosso e-mail.

Aula 18 - Direito Civil 2 - Unicap - Inadimplemento

Inadimplemento é o não pagamento/cumprimento da obrigação, enquanto a mora é o atraso


do devedor no pagamento ou do credor no recebimento; inadimplemento é só do devedor, mora
pode ser de ambas as partes (aula 17).

Efeito do inadimplemento: responsabilizar o devedor por perdas e danos, se este


inadimplemento for culposo (389). Se o inadimplemento não for culposo o devedor está isento das
perdas e danos, mas é ônus do devedor provar o caso fortuito ou de força maior.

O caso fortuito ou de força maior está conceituado no pú do 393; o fato precisa ser
superveniente/futuro e imprevisível para justificá-lo. É um problema (ex: cheia, seca, greve, doença,
roubo) que o devedor não contribuiu para sua ocorrência e nem poderia evitar. O fato do príncipe é
também um caso fortuito (ex: A deve cigarro a B, porém vem uma lei proibindo o fumo no país,
então a obrigação se extingue face à ilicitude do objeto; chama-se fato do príncipe em alusão ao
Estado, pois antigamente os governantes eram monarcas).

Espécies de inadimplemento: culposo e fortuito.

a) culposo: é a culpa lato sensu, em sentido amplo, que envolve o dolo (intenção), e a culpa
em sentido restrito: negligência e imprudência. É o inadimplemento culposo que vai gerar
responsabilidade patrimonial por perdas e danos (391), sobre os bens do devedor, afinal não existe
prisão por dívida, salvo no depósito (veremos em Civil 3) e na pensão alimentícia (veremos em Civil
6). Assim, se o inadimplente não possui bens, ao credor só resta lamentar, é o chamado na
brincadeira de jus sperniandi. O inadimplemento culposo vai corresponder ao não cumprimento da
obrigação de forma intencional (dolo) ou culposa (culpa stricto sensu = negligência e imprudência).
Viola o devedor sua obrigação de cumprir a prestação e deverá arcar com perdas e danos. Todavia,
em alguns contratos, a depender da prestação, ao invés de perdas e danos, o devedor poderá ser
obrigado pelo Juiz a cumprir o contrato (art 475 – veremos isso em Civil 3, mas quem estiver curioso
pode ver no nosso e-mail um comentário a esse artigo 475).
PERDAS E DANOS: o que são estas perdas e danos devidas pelo inadimplente ao credor? Não
se trata de um enriquecimento do credor (403), mas sim de uma compensação financeira pelos
danos sofridos pelo credor, sejam danos materiais, sejam danos morais.

Os danos materiais correspondem aos lucros cessantes e ao dano emergente. Dano


emergente é aquilo que o credor efetivamente perdeu e lucro cessante é aquilo que o credor
razoavelmente deixou de lucrar (402). Ex: A bate seu carro num táxi, terá então que indenizar o
taxista pelo dano emergente (farol quebrado, lataria amassada, pintura arranhada, etc – damnum
emergens) e pelo lucro cessante (os dias que o taxista ficará sem trabalhar enquanto o carro é
consertado – lucrum cessans).

O dano emergente é o desfalque sofrido pelo patrimônio da vítima, é a diferença entre o que
a vítima tinha antes e depois do ato ilícito; lucro cessante é a perda de um lucro esperado, e não um
lucro presumido ou eventual (403).

Mas o dano pode também ser moral (186), que é o dano que atinge a honra da pessoa (art.
20), que provoca sofrimento, abalo psicológico, perda do sono da vítima, etc. O dano moral ofende
os direitos da personalidade da pessoa, ou seja, os atributos físicos (o corpo, a vida), psíquicos
(sofrimento) e morais (honra, nome, intimidade, imagem) da pessoa. Enfim, o dano moral é uma
coisa séria, não é qualquer aborrecimento do cotidiano. O dano moral se desenvolveu muito em
nosso Direito na última década, mas não pode ser banalizado para não ser desmoralizado, assim eu
repudio condutas de cidadãos que, atrás de lucro fácil, pleiteiam danos morais porque ficaram
presos na porta giratória de um banco, ou porque o celular deixou de funcionar, ou porque o carro
quebrou na esquina, etc. Repito: dano moral se justifica especialmente quando atinge o equilíbrio
emocional da vítima, é a dor, angústia, desgosto, aflição espiritual e humilhação (ex: alguém que
perde uma perna ou um filho num acidente).

O dano é muito importante, é mais importante do que a culpa, assim não se fala em
indenização por inadimplemento se não houve dano. Veremos logo abaixo, e vocês verão também
em Responsabilidade Civil que existe até responsabilidade sem culpa, mas desde que exista dano,
material ou moral (pú do 927).

b) inadimplemento fortuito: o devedor não paga diante de um caso fortuito ou de força


maior, ficando assim, de regra, livre de indenizar o credor (393). A obrigação vai se extinguir, as
partes retornam ao estado anterior, mas sem indenização do 389. Porém, há casos de
responsabilidade sem culpa que veremos logo aqui em Civil 2, desde que haja dano:

- se o devedor está em mora, ele responde pelo caso fortuito (399); vimos isto na aula
passada, é um dos efeitos da mora solvendi, lembram? Só não responde se provar que a coisa iria
perecer também nas mãos do credor.

- o devedor pode expressamente se responsabilizar pelo caso fortuito; isto é comum nos
contratos internacionais, então quando se exporta açúcar, carne, soja, etc., o devedor se obriga a
mandar o produto, ou pagar as perdas e danos, mesmo que haja uma greve, uma seca, etc. O
comprador insere no contrato uma cláusula onde o devedor assume a obrigação mesmo diante de
um caso fortuito, afinal o comprador está muito distante para verificar a seriedade destes
transtornos. (vide 393, in fine). Obs: nas relações de consumo a loja/supermercado não pode se
isentar do furto do carro no seu estacionamento, apesar de ser um caso fortuito e apesar das placas
que eles colocam, diante do art. 51, IV, do Código do Consumidor; é por isso que os shoppings
cobram pelo estacionamento, porque eles têm seguro contra furto/roubo do seu carro; a lei dá com
uma mão e o mercado tira com a outra, é o que eu digo a vocês, o direito não manda na economia.
Não deixem de estudar RESPONSABILIDADE CIVIL oportunamente, é um assunto próximo de
inadimplemento das obrigações, mas merece um livro próprio. Eu já escrevi pouca coisa sobre RC no
nosso e-mail, depois dêem uma lida, mas não deixem de cursar esta disciplina caso seja oferecida
como eletiva.

Aula 19 - Direito Civil 2 - Unicap - Transmissão das Obrigações

Cessão de Crédito e Assunção de Débito

1 – Cessão de crédito: é a venda de um direito de crédito; é a transferência ativa da obrigação que o


credor faz a outrem de seus direitos; corresponde à sucessão ativa da relação obrigacional.

Em direito a sucessão pode ocorrer inter vivos ou mortis causa. A sucessão mortis causa nós
vamos estudar em Civil 7, que é a herança. A cessão de crédito corresponde à sucessão entre vivos
no direito obrigacional. A cessão de crédito também não se confunde com a cessão de contrato que
é a cessão de direitos e deveres daquela relação jurídica, e não apenas de um crédito.

Quando estudamos pagamento por sub-rogação vimos que a cessão de crédito é uma de suas
espécies (348), mas na sub-rogação a dívida mantem o valor, já a cessão de crédito pode envolver
valores diversos tendo em vista a liberdade entre as partes (ex: A deve cem a B para pagar daqui a
seis meses, C então se oferece para adquirir este crédito contra A por oitenta pagando a B a vista; C
age na esperança de ter um lucro ao receber os cem de A no futuro; isto acontece no comércio no
desconto de cheques “pré-datados”).

Conceito: cessão de crédito é o negócio jurídico onde o credor de uma obrigação, chamado
cedente, transfere a um terceiro, chamado cessionário, sua posição ativa na relação obrigacional,
independentemente da autorização do devedor, que se chama cedido.

Tal transferência pode ser onerosa ou gratuita, ou seja, o terceiro pode comprar o crédito ou
simplesmente ganhá-lo (= doação) do cedente.

Anuência do devedor: como já disse, a cessão é a venda do crédito, afinal o cedido continua
devendo a mesma coisa, só muda o seu credor. O cessionário ( = novo credor) perante o
cedido/devedor fica na mesma posição do cedente ( = credor velho). A cessão dispensa a anuência
do devedor que não pode impedi-la, salvo se o devedor se antecipar e pagar logo sua dívida ao
credor primitivo. Todavia, o cedido ( = devedor) deve ser notificado da cessão, não para autorizá-la,
mas para pagar ao cessionário ( = novo credor, 290).

Justificativa: a cessão de crédito se justifica/se fundamenta para estimular a circulação de


riquezas, através da troca de títulos de crédito (ex: cheques, duplicatas, notas promissórias, títulos
que vocês vão estudar em Direito Comercial/Empresarial). Além do exemplo acima do desconto de
cheques “pré-datados”, a cessão de crédito é muito comum entre bancos e até a nível internacional
do Governo Federal, em defesa da moeda e da disciplina cambial.

Forma da cessão: não exige formalidade entre o novo e o velho credor, pode até ser verbal,
mas para ter efeito contra terceiros deve ser feita por escrito (288). A escritura pública é aquela do
art. 215, feita em Cartório de Notas. O contrato particular é feito por qualquer advogado.

Que créditos podem ser objeto de cessão? Todos, salvo os créditos alimentícios (ex: pensão,
salário), afinal tais créditos são inalienáveis e personalíssimos, estando ligados à sobrevivência das
pessoas. A lei proíbe também a cessão de alguns créditos como o crédito penhorado (298 – vocês
vão estudar penhora em processo civil) e o crédito do órfão pelo tutor (1749, III – tutela é assunto de
Civil 6). O devedor pode também impedir a cessão desde que esteja expresso no contrato celebrado
com o credor primitivo, caso contrário, como já disse, caso queira impedir a cessão o devedor terá
que se antecipar e pagar logo. Vide art. 286.

Espécies de cessão: 1) convencional: é a mais comum, e decorre do acordo de vontades como


se fosse uma venda (onerosa) ou doação (gratuita) de alguma coisa, só que esta coisa é um crédito;
2) legal: imposta pela lei (ex: nosso conhecido 346; no 287 também é imposto pela lei a cessão dos
acessórios da dívida como garantias, multas e juros); 3) judicial: determinada pelo Juiz no caso
concreto, explicando os motivos na sentença para resolver litígio entre as partes.

A cessão pode também ser “pro soluto” ou “pro solvendo”; na pro soluto o cedente responde
pela existência e legalidade do crédito, mas não responde pela solvência do devedor (ex: A cede um
crédito a B e precisa garantir que esta dívida existe, não é ilícita, mas não garante que o
devedor/cedido C vai pagar a dívida, trata-se de um risco que B assume). Na cessão pro solvendo o
cedente responde também pela solvência do devedor, então se C não pagar a dívida (ex: o cheque
não tinha fundos), o cessionário poderá executar o cedente. Mas primeiro deve o cessionário cobrar
do cedido para depois cobrar do cedente.

Quando a cessão é onerosa, o cedente sempre responde pro soluto, idem se a cessão foi
gratuita e o cedente agiu de má-fé (ex: dar a terceiro um cheque sabidamente falsificado gera
responsabilidade do cedente, mas se o cedente não sabia da ilegalidade não responde nem pro
soluto, afinal foi doação mesmo - 295); mas o cedente só responde pro solvendo se estiver expresso
no contrato de cessão (296).

2 – Assunção de dívida: é a transferência passiva da obrigação, enquanto a cessão é a transferência


ativa. A assunção é rara e só ocorre se o credor expressamente concordar, afinal para o devedor faz
pouca diferença trocar o credor ( = cessão de crédito), mas para o credor faz muita diferença trocar
o devedor, pois o novo devedor pode ser insolvente, irresponsável, etc. (299 e 391). E mesmo que o
novo devedor seja mais rico, o credor pode também se opor, afinal mais dinheiro não significa mais
caráter, e muitos devedores ricos usam os infindáveis recursos da lei processual para não pagar suas
dívidas. Ressalto que o silêncio do credor na troca do devedor implica em recusa, afinal em direito
nem sempre quem cala consente (pú do 299). Na assunção o novo devedor assume a dívida como se
fosse própria, ao contrário da fiança onde o fiador responde por dívida alheia (veremos fiança em
Civil 3).

Conceito: contrato onde um terceiro assume a posição do devedor, responsabilizando-se pela


dívida e pela obrigação que permanece íntegra, com autorização expressa do credor.

Observação: ao contrário do pú do 299, nós percebemos que “quem cala consente” no art.
303; trata-se de uma aceitação tácita do credor para a troca do devedor, afinal na hipoteca a
garantia é a coisa (assunto de Civil 5).

Aula 20 - Direito Civil 2 - Unicap - Liquidação das Obrigações

Obrigação líquida é aquela certa quanto a sua existência e determinada quando a seu objeto. Ou
seja, a obrigação líquida existe e tem valor preciso. A obrigação ilíquida é o contrário, é aquela que
não pode ser expressa por uma cifra e que necessita de prévia apuração. Já falamos disso na aula 9,
mas vamos aprofundar hoje.

Qual a importância desta distinção entre obrigação líquida e ilíquida? Ora, se uma dívida não for
paga no vencimento o direito do credor mune-se (arma-se) de uma pretensão e a dívida se
transforma em responsabilidade patrimonial. Vocês já devem ter memorizado esta frase repetida
desde o começo do semestre. Pois bem, se o devedor não pagar ele não será preso, mas ele terá
seus bens tomados pelo juiz e vendidos para satisfazer o credor. Para tomar os bens do devedor, o
juiz precisa saber quanto é devido, ou seja, a obrigação precisa ser líquida.

Igualmente o art 407 do CC: só com a liquidação = fixação do valor pecuniário, é que se podem
cobrar juros do devedor. Na compensação, já estudada, só se extingue a obrigação entre dívidas
líquidas (369). A imputação de pagamento, também já estudada, exige obrigações líquidas (352).

Outra observação importante: o ideal para o credor é exigir o cumprimento forçado do contrato
como autoriza o art 475 do CC, artigo que será explicado no próximo semestre (vide aula 7 de
Contratos). Mas se esta execução “in natura” não for possível, o jeito é converter a obrigação em
perdas e danos substituindo-se a prestação por dinheiro, com a liquidação da dívida (947).

Dito tudo isso, como fazer a liquidação da obrigação, fixando-se o valor pecuniário da prestação?

Espécies de liquidação:

1 – convencional: decorre da transação (aula 16 deste semestre), ou seja, as partes chegam a um


acordo quanto ao valor pecuniário da obrigação que será executada.

2 – legal: a lei traz os parâmetros/limites para a liquidação da obrigação. Então se A mata B, quanto
a família de B vai pedir de indenização a A? Resposta no art. 948. Vocês verão em responsabilidade
civil que os crimes têm repercussão no cível, então enquanto o Promotor processa o réu na Vara
Criminal para que o Juiz lhe aplique uma pena de prisão, o advogado da vítima (ou seus familiares)
também processa o réu na Vara Cível para que o Juiz tome seus bens como indenização. Depois
leiam os arts. 949 a 954 que trazem casos de liquidação legal no cível para condutas criminosas.

3 – judicial: esta liquidação é feita pelo Juiz sempre que as partes não chegam a um acordo e sempre
que a lei não traz parâmetros. Para a liquidação judicial o juiz pode pedir a ajuda de peritos técnicos
na área do litígio (ex: engenharia, medicina, contabilidade, química, etc.) O Juiz só não pode é deixar
de julgar alegando omissão da lei, então em vários casos de indenização o Juiz fixa o valor da dívida,
dando seus motivos e quem achar ruim que recorra. É por isso que encontramos sentenças muito
variadas pois o Juiz tem muito poder e cada cabeça é um mundo.

Preferências e Privilégios Creditórios

É o "concurso de credores" do antigo Código Civil.

Bom, vocês já sabem que salvo os casos do depósito (assunto de Contratos) e dos alimentos
(assunto de Dir. de Família), não existe prisão por dívida, de modo que o credor precisa atacar o
patrimônio do devedor para se satisfazer. E mesmo que a lei autorize a prisão, não haverá satisfação
do credor, pois a dívida permanecerá sem pagamento. Então o que o credor deseja/precisa é de
receber o dinheiro, sob pena de execução. E se o devedor não tem bens? Ao credor só resta ter
raiva, na brincadeira é o “jus sperniandi” (391, 942).

E se o devedor tem bens, porém possui mais dívidas do que bens, o que fazer? Resposta:
aplicar as regras do concurso de credores. Se o devedor tem muitos bens, pode pagar suas dívidas,
ou não tem bem nenhum não se aplica o concurso de credores. Mas sempre que o passivo do
devedor for superior a seu ativo, é preciso dividir seu bens com os credores.

Esta é a chamada falência da pessoa física, ou insolvência. Prefiram o termo insolvência, pois
falência é indicado para as empresas, conforme vocês verão em Direito Comercial/Empresarial.
Então insolvente é a pessoa física que possui mais dívidas do que bens para satisfazer todas
elas, pelo que deverá ser instaurado o concurso de credores com a declaração de insolvência, para a
correta divisão dos bens entre os credores (955).

Efeito do concurso de credores: rateio dos bens do devedor entre os credores. Como se dá
esse rateio? Se todos os credores forem iguais, ou seja, sem nenhuma
vantagem/privilégio/preferência entre eles, o rateio é proporcional ao crédito de cada um (957,
962).

Mas se existem créditos quirografários ( = crédito simples, sem qualquer vantagem) ao lado
de créditos preferenciais, os preferenciais receberão primeiro. De regra, todo crédito é
quirografário, então se A me empresta cem reais, este crédito de regra é quirografário. Se B bate no
meu carro, este crédito também será quirografário.

Que créditos são preferenciais? São aqueles com vantagem concedida pela lei a certos
credores para terem prioridade sobre os concorrentes no recebimento do crédito. A ordem de
preferência estabelecida pela lei é a seguinte:

1 – créditos alimentícios: salários, créditos trabalhistas, pensão alimentícia, etc. Os


empregados e dependentes do devedor insolvente recebem em primeiríssimo lugar.

2 – créditos tributários: satisfeitos os créditos alimentícios, devem ser pagas as dívidas


tributárias do insolvente, ou seja, os impostos e taxas devidos pelo insolvente; satisfeito o poder
público, sobrando dinheiro, pagam-se os credores do terceiro grupo:

3 – créditos com garantia real, são aqueles créditos com hipoteca, penhor, anticrese e
alienação fiduciária. Veremos tais direitos reais de garantia em Civil 5 (958). Observem que os
primeiros credores de direito privado estão aqui, em terceiro lugar, pois os credores supra são de
direito público.

4 – créditos com privilégio especial: são aqueles credores do art. 964.

5 – créditos com privilégio geral: são aqueles credores do art. 965.

6 – finalmente, os créditos quirografários (961 – o crédito “simples” a que se refere este


artigo é o crédito quirografário).

Observações importantes: a) os créditos preferenciais com prioridade recebem integralmente


antes de outros créditos preferenciais, então só se passa para o grupo seguinte após satisfação
integral do anterior; b) só após satisfação integral dos créditos preferenciais (1 a 5) é que se faz o
rateio proporcional entre os quirografários. Digo rateio proporcional porque se os quirografários
também receberem na íntegra não haveria necessidade de ter sido instaurado o concurso de
credores. Assim os quirografários sempre recebem parcialmente; c) a Lei de Falências no. 11.101/05,
alterou esta ordem para as empresas, então agora os credores com garantia real recebem com
prioridade sobre os créditos tributários em caso de falência de uma empresa. Mais detalhes vocês
terão em Direito Comercial.

Final do curso, obrigado pela companhia, boas provas!

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