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UNIVERSALISMO E RELATIVISMO EM DIREITOS HUMANOS: PREMISSAS

PARA UM DIÁLOGO INTERCULTURAL

Gabriel Utida de Miranda

INTRODUÇÃO

É sabido que não existe consenso quanto aos conceitos, concepções e


fundamentos dos direitos humanos, mas, diferente do que pode aparentar num primeiro
momento, essas diferenças estão longe de consideradas como problema, mas a
possibilidade efetiva de fortalecimento dos direitos humanos e de resolução de conflitos.
Assim como os direitos, de modo geral, os conceitos e interpretações dos direitos
humanos não devem ser limitados, mas amplificados de maneira que possibilite uma
dinamização do seu processo de aprimoramento e evolução.
O debate entre universalismo e relativismo em direitos humanos representa bem
o dissenso, e como essa discussão evoluiu passando a trazer alternativas para a sua
superação ou aprimoramento.

1. A visão complexa como alternativa de superação às visões universalista e


“localista” de direitos humanos

O conflito entre os paradigmas universalistas e relativistas ocupam há muito


tempo o debate científico, tanto que, muitos teóricos buscam alternativas para
compreender e assimilar estas concepções para o mundo contemporâneo.
Sobre este debate, cumpre ressaltar a reflexão do jurista Joaquín Herrera Flores
que afirma que atualmente o mundo se alinha em duas visões, que propõem duas
racionalidades, e, consequentemente duas práticas.
A primeira visão, abstrata, vazia de conteúdo, que é baseada nas circunstâncias
reais das pessoas e centrada na concepção ocidental do direito e do valor da identidade.
A segunda visão “localista”, na qual impera “o nosso” com respeito ao dos outros, parte
da ideia particular de cultura e do valor da diferença (FLORES In WOLKMER, 2004, p.
364-365).
VISÃO RACIONALIDADE PRÁTICAS
Abstrata Jurídico/Formal Universalistas
Localista Material/Cultural Particulares

As duas visões, abstrata/universalista e localista, têm razões para serem


defendidas, mas o problema surge quando uma dessas visões passa a ser defendida apenas
pelo seu próprio lado, considerando-se superior a outra, como o direito acima do cultural,
ou vice-versa. Assim, é preciso construir uma cultura dos direitos fundada na
universalidade das garantias e ao respeito pelo diferente, e, para tanto, resta necessário
assumir a visão complexa dos direitos humanos (FLORES In WOLKMER, 2004, p. 365).

VISÃO RACIONALIDADE PRÁTICA


Complexa De resistência Intelectual

Com a visão complexa, deve-se superar o debate entre o universalismo dos


direitos e a particularidades das culturas, que consideram produtos de visões reducionistas
da realidade, pois ambas se situam num centro, a partir de onde passa a interpretar todo o
restante. Pois, segundo Flores (In WOLKMER, 2004, p. 366): “Toda centralização
implica automatização. Sempre haverá algo que não esteja submetido à lei da gravidade
dominante e que deve ficar marginalizado da análise e da prática”.
Desse modo, a visão complexa se propõe em situar a partir da periferia, sendo
que centro há somente um, enquanto periferias, existem várias. Para tanto, deve-se
abandonar a concepção de estar no entorno, no sentido de estar afastado, um afastado que
precisa ser dominado pelo centro. É preciso apropriar-se do entorno, pois não se está no
entorno, se é entorno, ou seja, é preciso ver-se onde se está situado no mundo.
Conforme Flores:
Ver o mundo a partir do pretenso centro, supõe entender a realidade
material como algo inerte, passivo, algo a que se necessita dar forma
desde uma inteligência alheia a ela. Ver o mundo a partir da periferia,
implica entendermo-nos como conjuntos de relações que nos atam,
tanto interna como externamente, a tudo e a todos os demais. A solidão
do centro supõe a dominação e a violência. A pluralidade das periferias
supõe o diálogo, a convivência (FLORES in WOLKMER, 2004, 367).
O que no presente texto chamamos de universal, Flores chama de visão abstrata.
E o que trata de relativismo, Flores refere como visão localista. Ambas concepções, ao
seu ver, levam à aceitação de discursos reduzidos. A primeira, pela falta de
existencialismo e contextos; e a segunda, pelo excesso de contexto, de uma forma que
acaba excluindo outras concepções que não compõem os mesmos valores presentes na
maioria das culturas periféricas (FLORES in WOLKMER, 2004, p. 368).
É o que entende o filósofo da libertação Enrique Dussel, ao analisar a realidade
de exclusão do povo latino-americano dentro da perspectiva comunitária de comunicação
periférica, também sustenta que a exclusão é um ponto de partida, e não de chegada, sendo
que a partir do reconhecimento do discurso das vítimas é possível despertar a consciência
crítica ética, inaugurando uma racionalidade de reconhecimento do outro (DUSSEL,
1995, p. 60).
Para o teólogo e economista Franz Hinkelammert:
O reconhecimento entre sujeitos que se reconhecem mutuamente como
sujeitos naturais e necessitados não é apenas o reconhecimento da vida.
Um reconhecimento da vida pressupõe a constituição da realidade
objetiva pelo reconhecimento entre sujeitos. Este reconhecimento
implica que a vida natural, do mesmo modo que a vida humana como
ser natural, mas também a realidade objetiva da natureza, constitui-se
pelo reconhecimento entre sujeitos. Tampouco, porém, é o
reconhecimento da espécie humana como objeto é uma abstração que
simplesmente arrasa o reconhecimento entre os sujeitos. Trata-se do
reconhecimento do outro numa relação de seres naturais e necessitados.
Este reconhecimento não pode incluir ninguém. Neste sentido é
universal, sem constituir nenhum universalismo abstrato. [...] O
reconhecimento mútuo entre sujeitos desemboca numa opção por
alguns sujeitos, isto é, na opção por aqueles cuja vida está mais
diretamente ameaçada. O critério de verdade é a vida e a morte [...] cujo
centro se encontra a vítima. Trata-se de um ser para a vida, não para a
morte. O critério de verdade é a vítima. (HINKELAMMERT, 1996, p.
48-49, tradução nossa).

A visão complexa assume as realidades das periferias e também as vozes que


nelas estão presentes, trazendo uma maior participação, concreta, das periferias, mas
como ponto de partida.

2. Crítica aos direitos humanos e direitos humanos como instrumento contra-


hegemônico

Outra crítica importante à visão universalista/abstrata é a redução da prática


social dos direitos à luta política tão somente, dentro do campo arbitrário da norma. Trata-
se de uma visão liberal, que coaduna com a lógica do mercado, que por sua vez, a
exemplo, necessita de uma ordem jurídica garantidora dos direitos de propriedade.
Neste sentido, para o Nobel da Paz, Adolfo Pérez Esquivel, a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, por exemplo, é a “conquista suprema do liberalismo”,
por meio de um consenso universal de abstração do homem concreto, oculto em suas
condições materiais de desigualdade, transformado em sujeito de direitos universais, mas
não de forma efetiva. Assim, as declarações universais de direitos humanos acabam
colocadas na categoria de ideologias legitimadoras de sistemas políticos injustos
(ALDUNATE, 1991, p. 196-197).
Assim, Perez Esquivel afirma que:
Diante da perspectiva clássica dos direitos humanos é possível e
necessário levantar uma nova alternativa ética cujo fundamento não é o
racionalismo liberal mas a compreensão do desenvolvimento histórico
como processo ou constante de libertação dos povos (ESQUIVEL,
1986, p. 435-440 apud ALDUNATE, 1991, p. 197).

Tal ordem jurídica liberal acaba excluindo do debate questões como relações de
poder, diversidade e desigualdades, que, sabidamente vão de encontro com a concepção
do universalismo liberal.
Como dito, com as experiências totalitárias, especialmente no século XX,
passou-se a valorizar cada vez mais o regime democrático e as declarações de direitos
humanos universais. No entanto, numa crítica, o jurista Lucas Bertolucci Barbosa de
Lima sustenta que o Estado Democrático de direito contemporâneo é a única forma
política que permite a existência velada dos espaços de exceção, sendo que os sujeitos
destes Estados sofrem as mais variadas formas de violência, que, na maioria das vezes,
não são vistas como exceções atinentes da própria democracia, mas como rupturas
momentâneas do regime democrático (LIMA, 2017, p. 96).
Denota-se que os direitos humanos são repassados aos cidadãos de forma restrita
e mitigada, nos quais jamais se realizarão plenamente.
Assim, Lima (2017, p. 97) afirma que:
As democracias, por sua vez, necessitam do humanitarismo como uma
espécie de fetiche para que possam manter as desigualdades e o sistema
de poder. Os direitos humanos – enquanto invólucro de uma exaltação
de humanidade e de uma aceitação desse invólucro de uma aceitação
desse invólucro como se fosse realmente universal – são a secularização
da vida eterna cristã nos atuais Estados democráticos: a eterna
sacralização da vida.
Ainda na crítica à concepção universalista de direitos humanos, o filósofo Slavoj
Žižek, numa interpretação marxista, concebe que os direitos humanos são uma falsa
universalidade ideológica, que esconde e legitima o imperialismo, as intervenções
militares e o neocolonialismo ocidental. Sob a óptica marxista, a concepção ideológica
de direitos humanos é burguesa, direito de homens brancos ricos que livremente exploram
trabalhadores e mulheres, e exercem dominação política (ŽIŽEK, 2010, p. 11-29).
Neste cenário têm surgido muitas vozes que defendem a “volta ao local”,
entretanto, acaba neutralizado ante à pluralidade de interpretações, e o fato do localismo
sistematizar o seu próprio fim, fechando-se sobre si mesmo. A resistência à tendência
universalista de sobrepor-se às diferenças impondo uma forma de ver o mundo, faz com
que o localismo reforce ainda mais a diferença radical, que, no fim, acaba defendendo a
mesma visão abstrata de mundo.
É o que Flores sintetiza em “[...] separação entre nós e eles, o desapreço pelo
outro, a ignorância sobre o que nos faz idênticos e a relação com os outros, a
contaminação da alteridade” (FLORES in WOLKMER, 2004, p. 372-373).
Flores defende a racionalidade de resistência conduzida por um universalismo
de contrastes, de entrecruzamentos e mesclas:
Um universalismo impuro que propõe a inter-relação e não a
superposição. Um universalismo que não aceita a visão microscópica
que parte de nós mesmos, no universalismo de partida ou de retas
paralelas. [...] Necessitamos de uma racionalidade sem lar, descentrada
e exilada do convencional e dominante. O problema não radica na
preocupação pela forma, mas no formalismo. O problema não reside na
luta pela identidade, mas no essencialismo do étnico ou da diferença.
Ambas as tendências outorgam estabilidade ontológica e fixam-se a
algo que não é mais que uma, “outra”, construção humana (FLORES in
WOLKMER, 2004, p. 377).

Assim, propõe-se uma prática intercultural, partindo do pressuposto que toda


prática cultural é um sistema de superposições entrelaçadas que conduz até a prática dos
direitos, imergindo-se em seus contextos, vinculando-os nos espaços e às alternativas de
luta, com estreita conexão com outras culturas, vidas e ações.
A possibilidade intercultural conduz a uma prática social nômade que não
busque os fins, mas a versatilidade intelectual, para uma prática social híbrida e
antissistêmica, criadora e recriadora de mundos. Desse modo, entende-se que os direitos
humanos não são meras declarações, nem expressões de uma cultura específica. Direitos
humanos são instrumentos discursivos, expressivos e normativos que buscam inserir os
seres humanos no circuito de reprodução e manutenção da vida, com intuito de
possibilitar a luta e a reivindicação (FLORES in WOLKMER, 2006, p. 378-382).
Neste sentido, Adolfo Perez Esquivel afirma que,
[...] a Declaração Universal dos Direitos Humanos não é um
denominador comum mínimo para fundar um contrato mas um
horizonte da convivência humana, um meta da qual o sujeito não é só
mais um indivíduo mas o povo e os povos organizados. Propor os
direitos humanos como horizonte significa que o fundamento moral da
convivência é deslocado. Já não se trata daquilo que está antes e que é
preciso defender, mas daquilo que está depois e que há de construir.
(ESQUIVEL, 1986, p. 435-440 apud ALDUNATE, 1991, p. 197).

Para Boaventura Santos (1997, p. 21), o debate sobre universalismo e relativismo


cultural deve ser superado, por se tratar de uma discussão falsa que reduz o potencial
emancipatório dos direitos humanos.
Para ele, os direitos humanos podem ser concebidos como globalização contra-
hegemônica frente à concepção universal atual dos direitos humanos, que tende a operar
como localismo globalizado, numa globalização de cima para baixo, ocasionando o
choque de civilizações. Assim, para que os direitos humanos possam operar “de baixo
para cima”, deve-se tratar tais direitos como multiculturais, de forma que o
multiculturalismo seja a pré-condição para uma relação equilibrada e fortalecida entre a
competência global e a legitimidade local reciprocamente, que, no entendimento de
Boaventura Santos, constituem como atributos de uma política contra-hegemônica de
direitos humanos na atualidade (SANTOS, 1997, p. 18-19).
Contra-hegemônica porque os objetivos políticos da luta pelos direitos humanos
ao redor do mundo são frequentemente anticapitalistas, seja explícita ou implicitamente.
Além disso, ao longo do tempo, os discursos e práticas anti-hegemônicas de direitos
humanos passaram a se desenvolver por meio de diálogos interculturais, ou seja, adotando
um projeto cosmopolita, fundados também nas concepções não exclusivamente
ocidentais (SANTOS, 1997, p. 20-21).
Atualmente, com a crise dos meios tradicionais de representação política, aliada
a ineficácia das estruturas judiciárias e estatais para a resolução de conflitos, urge a busca
por alternativas que promovam o reconhecimento das diferenças com maior identidade,
autonomia e identidade. Trata-se de uma nova forma de relação entre Estado e Sociedade,
na qual a sociedade induz as decisões.
Neste cenário, o jurista Antônio Carlos Wolkmer (2013, p. 47) defende o
pluralismo jurídico comprometido com a alteridade e com a diversidade cultural, servindo
como instrumento contra-hegêmonico de radicalização participação comunitária, e,
consequentemente, de afirmação dos direitos humanos.
Segundo o próprio Wolkmer (2001, p. 222), o pluralismo jurídico
pode consistir na globalidade do Direito de uma sociedade,
possibilidade não muito frequente, ou tão-somente num único ou em
alguns ramos do Direito, hipótese mais comum. Pode-se ainda
consignar que sua intenção não está em negar ou minimizar o Direito
estatal, mas em reconhecer que este é apenas uma das muitas formas
jurídicas que podem existir na sociedade. [...] A pluralidade envolve a
coexistência de ordens jurídicas distintas que define ou não relações
entre si.

Com a defesa do pluralismo, logo, faz-se necessária a discussão da possibilidade


de uma nova ordem jurídica, cuja legitimação está fundada no reconhecimento na
satisfação das necessidades básicas e na ação participativa dos sujeitos.
Wolkmer (2013, p. 43) entende que o reconhecimento de outra cultura jurídica,
forjada pelo pluralismo comunitário participativo e pela legitimidade estabelecida por
meio de práticas internalizadas de sujeitos sociais, possibilita a evolução na redefinição e
afirmação dos direitos humanos, na perspectiva da interculturalidade. Tal
interculturalidade compreendida como “filosofia crítico-cultural, como horizonte de
diálogo equitativo”, na qual nenhuma cultura se sobrepõe à outra, mas possibilite a
constitutivamente a relação fecunda umas com as outras.
Para o filósofo Ricardo Salas Astrain, a interculturalidade “alude a um tipo de
sociedade emergente, em que as comunidades étnicas, os grupos sociais se reconhecem
em suas diferenças e buscam sua mútua compreensão e valorização, ‘o que se efetiva
através de’ instâncias dialogais” (SALAS ASTRAIN In SIDEKUM, 2003, p. 327 apud
WOLKMER, 2013, p. 44).
Assim, em suma, uma nova concepção de direitos humanos poderá ser definida
pelo pluralismo jurídicos comunitário-participativo fundamento num diálogo
intercultural.

3. A dignidade da pessoa humana como promoção dos direitos humanos: premissas


para um diálogo intercultural

Para um diálogo intercultural, Boaventura Santos defende, num primeiro


momento a já mencionada superação do debate “universalismo x relativismo”. Para ele:
Todas as culturas são relativas, mas o relativismo cultural enquanto
atitude filosófica é incorrecto. Todas as culturas aspiram a
preocupações e valores universais, mas o universalismo cultural,
enquanto atitude filosófica, é incorrecto. Contra o universalismo, há que
se propor diálogos interculturais sobre preocupações isomórficas.
Contra o relativismo, há que se desenvolver critérios políticos para
distinguir política progressista de política conservadora, capacitação e
desarme, emancipação de regulação (SANTOS, 1997, p. 21).

Numa segunda premissa assimilar que todas as culturas possuem concepções


próprias de dignidade humana, mas nem todas a entendem como direitos humanos. Logo,
resta importante identificar preocupações ou preocupações semelhantes entre diferentes
culturas. Já na terceira premissa entende-se que todas as culturas têm problemas e por
isso são incompletas em suas concepções sobre a dignidade humana. Tal incompletude
advém justamente da existência de uma pluralidade de culturas, e aumentando esta
percepção é crucial para o fundamento de uma concepção multicultural de direitos
humanos (SANTOS, 1997, p. 21-22).
Na concepção de que todas as culturas têm diferentes entendimentos de
dignidade humana, e que umas são mais amplas de que outras, é que reside a quarta
premissa, sendo que se deve ponderar e definir qual entendimento tem um círculo de
reciprocidade mais amplo (SANTOS, 1997, p. 22). A quinta premissa, por fim, é de que
todas as culturas tendem a distribuir as pessoas e grupos sociais entre dois princípios
competitivos de pertença hierárquica:
Um – o princípio da igualdade – opera através de hierarquias entre
unidade homogéneas (a hierarquia de estratos sócio-económicos; a
hierarquia cidadão/estrangeiro). O outro – o princípio da diferença –
opera através da hierarquia entre identidades e diferenças consideradas
únicas (a hierarquia entre etnias ou raças, entre sexos, entre religiões,
entre orientações sexuais). Os dois princípios não se sobrepõem
necessariamente e, por esse motivo, nem todas as igualdades são
idênticas e nem todas as diferenças são desiguais (SANTOS, 1997, p.
22).

Tais premissas de diálogo intercultural sobre a dignidade humana podem


possibilitar uma concepção comunitária de direitos humanos que não recorra a
universalismos, mas se organiza em rede de referências de sentidos locais igualmente
inteligíveis entre si.
CONCLUSÃO

Como visto, o debate gerado entre os paradigmas “universalismo” e


“relativismo” em direitos humanos desencadeou o surgimento de novas concepções que
ajudam a compreender a dinâmica complexa dos direitos humanos no mundo
contemporâneo.
Num primeiro momento, destacou-se a reflexão trazida pelo jurista Joaquín
Herrera Flores provoca um novo olhar sobre a discussão, ao evidenciar as duas formas de
visão, a abstrata que demanda de uma prática universalista, e a localista, que denota uma
prática particular dos direitos humanos. Sendo que as referidas formas de visão acabam
se restringindo a uma disputa dicotômica. Dessa forma, resta imprescindível assimilar
uma visão que permita a construção de direitos fundados na universalidade das garantias
e no respeito às diferenças, uma visão que saia do centro, da lógica de dominantes e
dominados.
A visão proposta, é a visão complexa, dotada de uma racionalidade de
resistência, que demanda uma prática intelectual. Para tanto, é preciso adotar tal visão a
partir das periferias que compõem o entorno do centro. É o que defende também o filósofo
da libertação Enrique Dussel, ao afirmar que a exclusão é o ponto de partida para o
despertar de uma consciência crítica que inicie uma racionalidade de reconhecimento do
outro.
Importante também salientar a crítica à concepção universalista liberal dos
direitos humanos, restrito à ordem jurídica estabelecida, que atende à lógica do mercado.
Para o Adolfo Pérez Esquivel, por exemplo, a Declaração Universal dos Direitos
Humanos trata-se de uma conquista do liberalismo, colocada na mesma categoria de
ideologias que legitimam regimes políticos injustos. Ante às experiências totalitárias, a
valorização do Estado democrático de direitos e as declarações de direitos humanos
universais acabam escondendo e legitimando diversas formas de violência, que muitas
vezes são vistas como exceções ou rupturas momentâneas do regime democrático.
Diante disso, há quem defenda a volta ao localismo, mas no fim, tanto o
localismo como o universalismo numa concepção dualista, acabam contaminado a
alteridade, e, por fim, os fazendo idênticos. Neste cenário, o jurista Joaquín Herrera Flores
propõe o exercício da racionalidade de resistência fundada num universalismo de
contrastes, baseada na prática intercultural, entendendo que os direitos humanos são
meios discursivos, expressivos e normativos que buscam inserir todos os seres humanos
no sistema de reprodução e manutenção da vida.
Já para o jurista Boaventura Santos, o debate sobre universalismo e relativismo
deve ser superado, por entender que se trata de uma discussão que reduz a possibilidade
emancipatória dos direitos humanos. Os direitos humanos podem ser considerados como
globalização contra-hegemônica, e para que possam operar “de baixo pra cima”, devem
ser tratados como direitos multiculturais. Os direitos humanos são contra-hegemônicos
pois suas manifestações ao redor do mundo são anti-capitalistas, e atualmente passaram
a se estabelecer por meio de diálogos interculturais, não mais exclusivamente ocidentais.
Neste cenário, o pluralismo jurídico se apresenta como forma de afirmação dos
direitos humanos, um pluralismo comunitário participativo que reconheça outras culturas
jurídicas e estabeleçam uma relação de intercâmbio umas com as outros, num diálogo
intercultural. Assim, volta-se aos ensinamentos de Boaventura Santos, que apresenta
premissas para o estabelecimento de um diálogo intercultural baseado na dignidade da
pessoa humana, que varia de cultura para cultura, partindo da superação do debate entre
universalismo e relativismo, assimilando as diferentes concepções de dignidade humana
e assumindo uma noção de incompletude, e assim buscar o meio de entendimento tem o
potencial de reciprocidade mais amplo, e por fim, compreender que as culturas tendem a
distribuir seus sujeitos entre os princípios da igualdade e da diferença.
Logo, assimilando tais premissas possibilita a concepção comunitária dos
direitos humanos, que se relacionam em rede, dialogando entre si, mesmo diferentes, mas
compartilhando seus anseios em comum.
REFERÊNCIAS

ALDUNATE, José (coord.). Tomo III - Direitos humanos, direitos dos pobres, série V,
desafios da vida na sociedade. Editora Vozes: São Paulo, 1991.

DUSSEL, Enrique. Filosofia da libertação: crítica à ideologia da exclusão. Paulus: São


Paulo, 1995.

FLORES, Joaquín Herrera. Direitos humanos, interculturalidade e racionalidade de


resistência. In WOLKMER, A.C (org.). Direitos humanos e filosofia jurídica na
América Latina. Editora Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2004.

HINKELAMMERT, Franz. El mapa del emperador: determinismo, caos, sujeto.


Editorial DEI: San José, Costa Riaca, 1996.

LIMA, Lucas Bertolucci Barbosa de. Assinatura de um sujeito qualquer: dispositivo,


campo e potência em Giogio Agamben. Porto Alegre, RS: Editora Fi, 2017.

SALAS ASTRAIN, Ricardo. Ética intercultural e pensamento latino americano. In


SIDEKUM, Antônio. Alteridade e multiculturalismo, Ijuí: Unijuí, 2003.

SANTOS, Boaventura. Para uma concepção multicultural de direitos humanos.


Revista Crítica de Ciências Sociais nº 48, junho de 1997.

WOLKMER, Antônio Carlos. Pluralismo jurídico: fundamentos de uma nova cultura


no direito. 3. ed. São Paulo: Alfa-Omega, 2001.

___; VERAS NETO, Francisco Q.; LIXA, Ivone M. (orgs.). Pluralismo jurídico: os
novos caminhos da contemporaneidade – 2. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2013.

ŽIŽEK, Slavoj. Contra os direitos humanos. In: Dossiê: direitos humanos – diversos
olhares. Mediações, Londrina, v. 15, n.1, p. 11-29, 2010.

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