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JAN/FEV/MAR -1993- VERÃO . N!!203 Cr$ 20.000,00

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Estimados Fratres e Sorores:

Este número de O ROSACRUZ é especialmente dedicado à Tra-


dicional Ordem Maitinista. Para alguns de vocês será talvez um pri-
meiro contato e uma descoberta das atividades, dos objetivos e da
filosofia do rnartinismo, ao longo de sua história nos tempos moder-
nos.

A Tradicional Ordem Martinista é uma Ordem iniciática cujas ati-


vidades se desenrolam sob a égide da AMORC. Somente os rosacru-
zes têm acesso a seus ensinamentos e a parte mais importante dos
mesmos é transmitida em locais denominados "Heptadas".

Uma ponta do véu vai ser aqui erguida. Como Soberano Grande
Mestre da TOM, faço votos de que a leitura desta revista lhes per-
mita apreender melhor o espírito do martinismo, despertando talvez
o desejo de se afl.liarem a essa nobre Fraternidade. Aqueles que são
Membros do Primeiro Grau de Templo ou de qualquer Grau s~bse­

qüente podem se afl.liar à Tradicional Ordem Martinista.

Christian Bemard
Soberano Grande Mestre
o
ROSACRUZ
Publicação Trimestral da
ORDEM ROSACRUZ
AMOR C

A revista O Rosacruz é a versao brasileira


da revista americana Rosicrucian Diges4 que
possui versc5es em outros pafses: Crux Rosae,
na Alemanha, E/ Rosacruz, na Jurisdiçao de
lrngua espanhola, Rose+Croix, na França.
Rodhostayrika Analekta, na Gnkia, De Rooz,
na Holanda, Ricerca Rosacroce, na llália, Ba·
rajujl, no Japão, Rosenkotset, na Suácia e par-
ses nórdicos.
O MARTINISMO
JAN/FEV/MAR -1993 HISTÓRIA DE UMA ORDEM TRADICIONAL

C. REBISSE........... -·-··--··-···-·-·············-····-···-··--··-·········-··--·-··················-··2
Todos os Direitos de Publicação e Re-
produção reservados à Grande Lo;a da
Jurisdição d.e Lfngua Portuguesa da O MARTINISMO
AMORC -Caixa Postal 307 -80001-970-
Curitiba -Paraná. Proibida a reprodu ção UMA SENDA CARD(ACA
parcial ou total por qualquer melo.
(POR UM MARTINISTA) ····································--····-············································ 1O
DIRETOR
Charles Vega Parucker
O FILÓSOFO DESCONHECIDO
EDITOR L·C. DE SAINT·MARTIN
Zanei R. Barcellos
S. e Z. COSZCZVNSKI••••••• - •••••••••••.-...................................................................... 14

Impresso na
GRANDE LOJA DA PIERRE·AUGUSTIN CHABOSEAU,
JURISDIÇÃO DE LÍNGUA
PORTUGUESA UM SERVIDOR INCÓGNITO

C. REBISSE..........................-·-·-·-····--··--··-···-·--··--·-·-·····-···-····-·-···-······ 23
ASSINATURA
1 ANO -Cr$ 75.000,00
2 ANOS -Cr$ 140.000,00 INICIAÇÃO M(STICA

As declaraç6es feitas nesta publicação não RALPH M. LEWIS .................................................................................................... 31


sAo expressAo oficial da OrganizaçAo ou de
seus dirigentes, salvo indicação explrcita neste
sentido.
O NOVO HOMEM
PREFÁCIO DO UVRO DE L-C. DE SAINT·MARTIN .............................................. 36
PROPÓSITO DA ORDEM
ROSACRu~·

COMO DEVEMOS BUSCAR AQUILO QUE PERDEMOS


A Ordem Rosacruz, existindo em todos
os parses civilizados, é constHukla por um JACOB BOEHME...............................................................................-.................... 39
grupo fraternal, nlio-secblrlo, de homens e
mulheres devotados A lnvestlgaçlo, estu-
do e aplicação pnltlca das leia naturais e
espirituais. Seu· propósito é capacitar a to-
doa o viver em harmonia com as forças
c6smlcas criativas e construtivas para al-
cançar sellde, felicidade e paz. A Ordem
é Internacionalmente conhecida como
"AMORC" (uma abrevlaçio)eaA.M.O.R.C.,
no Brasil e nos demais pafaes, constHul a
llnlca forma de atividades rosacruzes unifi-
cadas em um a6 organismo. A A.M.O.R.C.
nto vende seus ensinamentos. Oferece-os,
gratuitamente, aos seus Membros ativos,
juntamente com muitos outros beneficios.
l
O MARTINISMO
História de uma Ordem Tradicional

..,

O Dr. Gérard Encausse, ou Papus Pierre-Augustin Chaboseau

----------------------------------------------------------Ch~tianReb~se

Em que fundamentos pode- reintegração mediante a práti-


riam os martinistas se apoiar ca da teurgia. Esta ciência esta-
para erigir seu Templo e quais va fundamentada num cerimo-
Em 1889, inaugurava-se em foram os artesãos dessa recons- nial de grande complexidade e
Paris a quarta Exposição Univer- trução? Foi do encontro de Gé- visava ao que Martines de Pas-
sal, a exposição do centenário rard Encausse (Papus) e Augus- qually chamava de reconciliação
da Revolução de 1789. Foi a gran- tin Chaboseau, ambos detento- do menor, do homem, com a
de exposição em que triunfou res de uma iniciação transmiti- Divindade. Essa teurgia assenta-
a "fada eletricidade". O ponto da a partir de Louis-Claude de va sobre o relacionamento do
alto da exposição foi a inaugura- Saint-Martin (1743-1803), que homem com as hierarquias angé-
ção da Torre Eiffel, gigantesco nasceu a Ordem Martinista. licas. Segundo Pasqually, os an-
monumento metálico que logo jos eram o único apoio de que
se tornaria o símbolo do mate- o homem dispunha após sua
rialismo triunfante, da tecnolo- " queda", para obter sua recon-
gia e da indústria. Seria ele a ciliação com a Divindade. Ao
encarnação de uma nova Torre Louis-Claude de Saint-Martin contrário do que se pensa geral-
de Babel? Uma nova Maison era discípulo de Martines de mente, o martinismo não é uma
Dieu, do alto da qual o homem Pasqually. Este havia criado, extensão exata da Ordem dos
estaria arriscado a uma terrível por volta de 1754, a Ordem dos Elus-Cohen e , com mais razão
queda? .. . Na mesma época o E/us-Cohen. Martines de Pas- ainda, Martines de Pasqually ab-
martinismo se reorganizava e qually propunha a seus discípu- solutame nte não deve ser consi-
publicava a revista A Iniciação. los que trabalhassem por sua derado o fundador da Ordem
2 O ROSACRUZ -JAN!FEV/MAR -1993
Martinista. Em 1772, antes mes- segundo Saint-Martin, o cora- por uma linhagem diferente.
mo de ter concluído a organiza- ção do ser humano. Ele deseja- Examinemos brevemente essas
ção de sua Ordem, Pasqually va entrar no coração da Divinda- linhagens.
partiu para Santo Domingo. de e fazer a Divindade entrar em
Não regressou dessa viagem e seu coração e é neste sentido
faleceu em 1774. Com o desapa- que a senda preconizada por
recimento de Pasqually, alguns Saint-Martin é chamada de sen-
discípulos continuaram a difun- da cardfaca. A evolução da atitu- Louis-Cmude de Saint-Martin
dir seus ensinamentos, dando- de de Saint-Martin é devida em faleceu a 13 de outubro de
lhes uma tonalidade particular. grande parte a sua descoberta 1803. Tinha iniciado Jean Antoi-
Dentre esses discípulos, dois da obra de Jacob Boehme. Diz ne Chaptal, um químico a quem
se distinguiram: Jean-Baptiste ele em seu diário: É ao meu pri- se deve a descoberta de certos
~illermoz e Louis-Cmude de meiro mestre que devo os primei- processos de fabricação do alú-
Saint-Martin. ros passos na senda espiritua~ men e da tintura do algodão,
mas é ao segundo que devo os bem como o processo de vinifi-
Jean-Baptiste Willermoz, ardo- passos mais significativos que já cação denominado "chaptaliza-
roso adepto da franco-maço- dei. Saint-Martin enriqueceu as ção". Chaptal teve vários filhos,
naria e da teurgia, estabeleceu idéias de seu primeiro mestre dentre os quais uma filha que
relação com a Estrita Obser- e as de seu segundo mestre, pa- se tornou por casamento Mada-
vancia Templária alemã. Em ra assim construir um sistema me Delaage. Esta teve um filho,
1782, na assembléia dessa Or- pessoal, e transmitiu uma inicia- Henri Delaage, autor de muitos
dem em ~ilhelmsbad, J .-B. ~il­ ção a alguns discípulos escolhi- livros sobre a história da inicia-
lermoz fez com que os ensina- dos. (1) ção antiga. Henri Delaage foi
mentos de Martines de Pasqually iniciado por alguém cujo nome
fossem incorporados aos graus Lembremo-nos também de não chegou até nós, provavel-
elevados dessa Ordem, os graus que Louis-Cmude de Saint-Mar- mente seu pai ou sua mãe, pos-
de Professo e Grande Professo. tin não é, ele próprio, o cria- to que quando seu avô (Delaa-
Mas não transmitiu àquem Or- dor de uma associação com o ge) faleceu Henri tinha apenas
dem as práticas teúrgicas dos nome de Ordem Martinista. Sa- 7 anos e era portanto jovem de-
Elus-Cohen. No transcorrer da- be-se, por outro lado, que mais para receber essa iniciação.
quem assembléia, a Estrita Ob- ele reuniu em tor.no de si Henri Delaage transmitiu essa
servância foi reformada sob a um grupo a que certas car- iniciação a Gérard Encausse,
denominação de Cavaleiros Ben- tas de seus amigos (por volta em 1882.
feitores da Cidade Santa ("Che- de 1795) se referem com o no-
valiers Bienfaisants de m Cité me de Circulo Intimo, Socieda- Em meados de 1803, Louis-
Sainte"). de dos lntimos. Balzac, em "O Cmude de Saint-Martin morava
Urio do Vale", dá testemunho na casa de seu amigo o abade
Quanto a Louis-Cmude de da existência de grupos de discí- de Noue, am Aulnay. Ele tinha
Saint-Martin, abandonou a fran- pulos de Saint-Martin: Amiga in- iniciado o abade muito antes
co-maçonaria. E renunciou à tima da Duquesa de Bourbon, de sua morte. Esse clérigo, ho-
teurgia, a senda externa, em Madame de Verneuil fazia parte mem livre e de cultura enciclo-
proveito da senda interna. Na de uma sociedade sagrada cuja pédica, iniciou o advogado An-
realidade considerava a teur- alma era o Sr. Saint-Martin, nas- toine-Louis Marie Hennequin.
gia perigosa e a evocação ange- cido em Touraine e cognomina- Este iniciou Hyacinthe Joseph-
lical pouco segura quando pas- do o Filósofo Desconhecido. Os Alexandre Tilabaud de La.touche,
sa pem via externa. Pode-se mes- disctpulos desse filósofo pratica- mais conhecido pelo nome de
mo pôr na boca de Saint-Martin vam as virtudes aconselhadas pelas escritor, Henri de La.touche,
a seguinte fala de Angelus elevadas especulações do iluminis- que iniciou Honoré de Balzac
Silesius em seu poema Querubí- mo místico. (2) A iniciação trans- e Adolphe Desbarolles, Conde
nico: Afastai-vos Serafins, eis que mitida por Louis-Claude de de Authencourt, a quem se de-
não podeis me reconfortar! Afas- Saint-Martin se perpetuou até ve um famoso tratado de quiro-
tlli-vos Anjos, com tudo aqui- o começo do novo século por mancia. Este último iniciou a
lo que se possa ver ao redor de diferentes linhagens. No final sobrinha de Henri de La.touche,
vós; lanço-me sozinho no mar in- do século XIX, dois homens Amélie Nouêl de La.touche, Mar-
criado da Divindade pura. A fer- eram depositários dessa inicia- quesa de Boisse-Mortemart, que
ramenta e o cadinho dessa mis- ção: o Dr. Gérard Encausse e iniciou seu sobrinho Augustin
teriosa comunhão devem ser, Augustin Chaboseau, cada qual Chaboseau, em 1886. (3)
O ROSACRUZ -JAN/FEV/MM -1993 3
seus estudos mas em pouco tem- pus, a tradição ocidental pode-
po teve de fazer o serviço mili- ria continuar a transmitir sua
tar e foi somente a 7 de julho chama de iniciado para inicia-
de 1892 que defendeu com su- do, no silêncio e de modo incóg-
Foi do encontro desses dois cesso sua tese de medicina. Não nito. Com efeito, segundo Pa.-
" descendentes" de Louis-Clau- obstante, que atividade! Já fim- pus e Stanislas de Guaita, cer-
de de Saint-Martin, Augustin dara a Escola Hermética, organi- tos ocultistas tentavam deslocar
Chaboseau e Pa.pus, que nasceu zara a Ordem Martinista, criara o eixo de gravitação do esoteris-
uma Ordem iniciática com o no- as revistas A Iniciação e O Véu mo para fora de Paris, sua ter-
me de Ordem Martinista. Pa.pus de lsis, e escrevera o Tratado ra escolhida: Foi também decidi-
e Chaboseau eram estudantes Elementar de C~ncias Ocultas do em Alto Nfvel (referência mis-
de medicina. Um amigo comum, (aos 23 anos) e O Tarô dos Bo- teriosa a PapusJ que um movi-
P. Gaêtan Leymarie, diretor da êmios (aos 24 anos) . Seus cola- mento de difusão deveria ser em-
Revista Espfrita, sabendo do inte- boradores, à exceção de F. CH. preendido para selecionar verda-
resse de ambos pelo esoteris- Barlet, não tinham muito mais deiros iniciados capazes de adap-
mo, encarregou-se de providen- idade do que ele. Desde 1887, tar a tradição ocidental ao sécu-
ciar seu encontro. Os dois estu- o interesse de Pa.pus pelo esote- lo que estava por começar. O ob-
dantes de medicina logo se tor- rismo foi devido às obras de jetivo era preservar a perenida-
naram amigos e não tardaram Louis Lucas, químico, alquimis- de dessa tradição e fazer oposi-
em se darem conta de que eram ta e hermetista. Apaixonado pe- ção à trama destinada a levar
ambos depositários de uma ini- lo ocultismo, ele estudou os li- os buscadores sinceros a um im·
ciação que remontava a Louis- vros de Eliphas Levi. Entrou passe. O martinismo foi o cadi-
Claude de Saint-Martin. Em em contato com o dirigente da nho dessa transmutação. Pa.pus
revista teosófica afastou-se da Sociedade Teosófi-
":"\iiU~"' G :·. O Lótus Vermelho, ca em 1890 e desde então o
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·..· Félix Gaboriau e martinismo se organizou de ma-
~: ~ conheceu Barlet neira mais precisa. As iniciações
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~ ~~...... (Aibert Faucheux),
um ocultista erudi-
rnartinistas tornaram-se mais
numerosas e no ano seguinte,

.... to . A partir de
1887, aderiu à So-
em julho de 1891, a Ordem
Martinista foi dotada de um Con-
ciedade Teosófica, selho Supremo composto de
fundada alguns 21 membros. (4) Procedeu-se à
anos antes (em eleição do Grande Mestre da
S ::: L ::: A ::: du Phil ... Inc ... N ::: V ::: M ::: 1875) por Mada· Ordem e Pa.pus foi escolhido.
me Blavatsky e o Graças a seus talentos e com a
Sfmbolo da Ordem Martinista
Coronel Olcott. ajuda material de Lucian Mau-
1888 eles combinaram o que chel (Chamuel) , a Ordem se ex-
haviam recebido e decidiram pandiu rapidamente. Foram cria-
transmitir a iniciação de que das as primeiras Lojas martinis-
eram depositários a alguns bus- tas e Paris contou com quatro:
cadores da verdade. Para isso A Esfinge, dirigida por Papus,
criaram uma Ordem iniciática Em pouco tempo Papus pas- onde se faziam os estudos ge-
e lhe deram o nome ·de Ordem sou a sentir certa dissonância rais; Hermanubis, dirigida por
Martinista. É a partir dessa épo- com a Sociedade Teosófica. Es- Sédir, onde se estudavam a mís-
ca que se pode realmente falar ta organização tinha uma con- tica e a tradição orientais; Velle-
numa Ordem Martinista. (Em cepção muito orientalista e bu- da, dirigida por Victor-Emite
seguida veremos como o nome dística do esoterismo, chegan- Michelet, que se dedicava ao es-
da Ordem se modificou pela do mesmo a minimizar ou até tudo do simbolismo; Sphinge,
adição de diversos qualificati- suprimir toda perspectiva de reservada às adaptações artísti-
vos, Tradicional, Sinárquica, um esoterismo realmente oci- cas. Formaram-se grupos marti-
etc.) . Embora a Ordem ainda dental. Esta atitude, pretenden- nistas em várias cidades france-
não tivesse nenhuma estrutura, do uma superioridade absoluta sas e no estrangeiro. A Ordem
o número de iniciados aumen- da tradição oriental, escandaliza- Martinista também se expandiu
tou rapidamente. Foi então que va Papus. Mas um outro perigo, bastante em países estrangeiros:
Pa.pus criou a revista A Inicia- mais grave, desenhava-se no ho- Bélgica, Alemanha, Inglaterra,
ção. Ele ainda não terminara rizonte. Sem ele, segundo Pa.- Espanha, Itália, Egito, Tunísia,
4 O ROSACRUZ -JANIFEV/MAR -1993
Estados Unidos, Argentina, Gua- nos adormecida. Foi retomada
temala e Colômbia. O núme- sem sucesso por Papus até a Pri-
ro de A Iniciação de abril de meira Guerra Mundial de 1914.
1898 informava que em 1897
havia 40 Lojas no mundo e que Assim como os martinistas Com o intuito de expandir o
esse número passara a 113 em formaram um círculo exterior, iluminismo, os martinistas não
1898. o Grupo Independente de Estudos tinham hesitado em buscar alian-
Esotéricos, criaram também um ça com outras sociedades iniciá-
círculo interior, a Ordem Caba- ticas. Assim, em 1908, Papus ti-
lfstica da Rose-Croix. No dia 5 nhao.rganizado uma grande con-
de julho de 1892, a Ordem Mar- venção espiritualista internacio-
tinista e a Ordem Cabal.istica nal em Paris, manifestação que
Os martinistas queriam reno- da Rose+Croix se uniram me- não reuniu menos de trinta or-
var o esoterismo ocidental, mas diante um tratado. Para Stanis- ganizações iniciáticas. O secretá-
não havia em parte alguma da las de Guaita, o martinismo e a rio desse grande empreendimen-
França um local onde se pudes- Rose+ Croix constituem duas for- to foi Victor Blanchard, um mar-
sem estudar as ciências herméti- ças complementares, em todo o tinista que retomou essa idéia
cas. Papus refletiu sobre o assun- alcance cient!fico do termo (5). um pouco mais tarde para orga-
to e concluiu: Já existem faculda- Esta Ordem tinha sido renova- nizar a F.U.D.O.S.I. Infelizmen-
des onde se podem aprender as da em 1889 por Stanislas de te, em suas numerosas alianças,
cilncias materialistas, por que não Guaita e}osephin Péladan. A afi. Papus por vezes deixou-se arre-
pode haver uma onde se possam liação à Ordem Tornou-se rigo- batar pelo ardor de seus colabo-
aprender as ci2ncias esotéricas? rosamente reservada aos marti- radores, como foi o caso da Igre-
Os martinistas formaram então nistas S./. que tivessem este ja Gn6stica. Esta igreja tinha si-
um grupo que organizava cur- grau desde pelo menos três do fundada por Jules Doisnel
sos e conferências a fim de reve- anos e segundo condições espe- por volta de 1889, após uma
lar aos buscadores os valores ciais. O número de membros experiência espírita. Diz-se com
do esoterismo ocidental. Este deveria estar limitado a 144, freqüência que a Igreja Gnósti·
grupo foi o núcleo do qual fo. mas parece que esse número ca tornou-se a igreja oficial dos
ram selecionados os futuros nunca foi alcançado. A Ordem martinistas. Na realidade, a im-
martinistas. Tornou-se o círcu- Cabal.istica da Rose+ Cro.ix tinha portância dessa aliança foi exa-
lo exterior da Ordem Martinis- a função de complementar a for- gerada por certos pseudo-suces.
ta e recebeu o nome de Escola mação dos S.l. Dividia-se em sores de Papus. Embora se ligas-
Superior Livre das Cimcias Her- três graus de estudos que confe- se a numerosas organizações,
méticas. Mais tarde passou a ser riam diplomas de bacharel em como Os Iluminados, Os Babis-
denominado Grupo Independen- Cabala, licenciado em Cabala e tas, O Rito Escoc2s ou Minfis-
te de Estudos Esotéricos e, de- doutor em Cabala. Após a mor- Misrafm, a Ordem Martinista
pois,EscolaHermética eFaculda- te de Stanislas de Guaita, em nunca deixou de preservar sua
de das Ci2ncias Herméticas. 1897, cerca de 8 anos depois independência. Nessa época era
da fundação da Ordem, Barlet comum alguém pertencer a vá-
Os cursos eram numerosos foi designado para sua direção rias organizações iniciá.ticas ao
e os assuntos estudados iam mas nunca chegou a exercer o mesmo tempo; muitos abusaram
da Cabala à Alquimia e ao Tarô, cargo e a Ordem Cabalistica da disso e alguns foram contamina-
passando pela história da fi1oso- Rose+Cro.ix ficou mais ou me- dos por uma terrível doença
fia hermética, perfazendo cerca que atacava os "pseudo-inicia-
de uma dúzia de cursos por dos", a "cordonite". Papus e a
mês. Os professores mais assi- maior parte dos dirigentes mar-
duos eram Papus, Sédir, Victor- t:infitas tinham assumido respon-
Emite Michelet, Barlet, Augustin sabilidades importantes na fran-
Chaboseau, Sisera. Uma seção co-maçonaria egipcia do rito
especial estudava as Ciências de Mênfis.Misraim. Comparados
Orientais, sob a direção de Au- com os 97 graus desse rito, os
gustin Chaboseau. Outra, sob poucos graus do martinismo pa-
a direção de F. Jollivet-Castellot, reciam bem pobres! Certos mar-
dedicava-se à Alquimia. Este gru- tinistas, ofuscados pelos titulos
po recebeu o nome de Socieda- Sfmbolo da Ordem Cabalfstica mirabolantes dos graus de Mên-
de Alquúnica da França. da Rose+ Croir fis.Misraün, nem mesmo se de-
O ROSACRUZ- JAH/FEVIMAR -1883 5
ram ao trabalho de estudar desse período de transição que por Victor Blanchard. Um pou-
seus ensinamentos; muitos mer- é freqüentemente confuso e cu- co mais tacW. recebeu ele de
gulharam numa espécie de sin- jas pistas alguns historiadores Blanchard um documento de
cretismo iniciático e esqueceram têm prazer em baralhar. A pri- nomeação como Grande Inspe-
o objetivo da iniciação, seus fun- meira de que falaremos é a que tor para as três Américas, co-
damentos, para se perderem se formou sob a direção de Je- mo Soberano Legado Grande
em suas formas. an Bricaud. Este a.finnava que Mestre para os Estados Unidos
Teder tinha sucedido a Papus da América do Norte e autoriza-
e, em seu leito de morte, tinha ção para fundar em San Jose o
nomeado a ele, Bricaud, seu su- Templo Louis-Claude de Saint-
cessor. Apresentou aos martinis- Martin. (Ralph M. Lewis também
Pode-se dizer que, com a Pri- tas parisienses um documento foi mais tarde iniciado nessa
meira Guerra Mundial, a Ordem que atestava sua nomeação pa- Ordem, em setembro de 1936).
caiu em dormência. Cada qual ra a direção da Ordem. Nenhum Voltaremos a falar dessa Ordem
se engajou para defender a pá- membro levou a sério esse docu- Martinista Sinárquica.
tria e Papus se transferiu volun- mento, que Bricaud provavel-
tariamente para o front. Foi mé- mente tinha escrito ele mesmo,
dico-chefe, com o posto de capi- e ninguém concordou em reco-
tão. Tinha como sagrado o de- nhecê-lo (8). Não obstante for-
ver para com sua pátria. Augus- mou em Lyon um pequeno gru-
tin Chaboseau, reformado, alis- po sob sua autoridade e trans-
tou-se nos gabinetes ministeriais formou o martinismo, " maçoni-
de Aristide Briand, de início na zando" ousadamente a Ordem
justiça e depois na Presidência e restringindo o acesso à mes-
do Conselho. Papus faleceu an- ma unicamente aos homens que
tes do fim da guerra, a 25 de fossem maçons e titulares do
outubro de 1916. Após a guer- 189 Grau. Esse grupo criou um
ra, os membros do Conselho tipo de martinismo que não ti-
Supremo estavam dispersos e nha muito a ver com o que ha-
não houve eleição de um novo via sido criado por Papus e Au-
Grande Mestre. Sem Papus o gustin Chaboseau. Além disso,
martinismo está morto -dizJolli- Jean Bricaud reivindicou abusi-
vet Castellot (6). Mas vários vamente uma afiliação Elu.Co-
martinistas tentaram assumir a hen. Robert Ambelain mostrOu
direção da Ordem. Modificaram que esta pretensão não tinha O Dr. Harvey Spencer Lewis
tanto a natureza do martinis- nenhum fundamento (9). O mo-
mo que muitos martinistas pre- vimento de Bricaud ficou restri- Em paris formaram-se vários
feriram não se associar a esses to a Lyon (10). grupos independentes mas não
projetos e ficar independentes. houve realmente um Conselho
Um segundo movimento se
Supremo reconhecido com<,> tal
formou sob a direção de Victor
Blanchard. Este havia sido Mes- pelos martinistas em geral. Na
verdade, a maior parte dos mar-
tre da Loja Melquisedec, de Paris,
Vários grupos martinistas nas- tinistas, em lugar de se lançarem
e foi reconhecido por uma par-
ceram nessa época mas a maior em conflitos de sucessão, prefe-
te dos martinistas parisienses
parte dessas organizações teve riram continuar a trabalhar dis-
que se agruparam em torno de-
existência efêmera ; compu- cretamente e permanecer isola-
nham-se apenas de alguns gru- le. No dia 11 de novembro de
dos.
pos, todos independentes. Quan- 1920, o Jornal Oficial anuncia-
va a constituição de sua Ordem
do um martinista russo interpe-
lou então a Barlet, que era o sob a denominação de União
chefe da Ordem na França, es-
Geral dos Martinistas e dos Sinar-
te último respondeu com um quistas ou Ordem Martinista Si-
sorriso: O martinismo é um clrcu- nárquica. *Em 1934, H . Spencer A situação parecia sem saída.
Lewis foi iniciado nessa Ordem
lo cuja circunferencia está em to- Em 193l,Jean Chaboseau suge-
da parte e o centro em parte algu- • N.T.: Sinarquia designa uma auto- riu a seu pai que reunisse os re-
ma. .• (7) . Vejamos brevemen- ridade exercida por um grupo de manescentes do Conselho Su-
te quais foram as organizações pessoas. premo de 1891 para readquirir
6 O ROSACRUZ - JANJFEV/MAR -1993
o domínio da situação e restabe- gui-lo das inúmeras organiza- Grande Mestre Substituto des-
lecer a Ordem Martinista sobre ções pseudomartinistas então sa Ordem. Victor Blanchard Au-
suas bases verdadeiras. Os úni- existentes, acrescentaram à de- torizou Harvey Spencer Lewis
cos sobreviventes, fora Augustin nominação da Ordem o qualifi- a fundar lojas da Ordem Marti-
Chaboseau, eram Victor-Emile cativo Tradicional. Com isto os nista Sinárquica nos Estados
Michelet e Chamuel. remanescentes do Conselho Su- Unidos, mas não teve condição
premo de 1891 reivindicaram de outorgar, tanto a Spencer
Não devemos esquecer que a perenidade da Ordem fundada Lewis quanto a Emile Dantinne,
Augustin Chaboseau fora co-fun- por eles com Papus (12). Edouard Bartholet e outros, os
dador do martinismo em 1889 O martinismo readquiriu for- documentos necessários. Por
e tinha recebido sua iniciação ça e vigor. Procedeu-se à eleição prudência, H . Spencer Lewis
por linhagem direta de sua tia, do Grande Mestre e, conforme preferiu aguardar diretrizes pre-
Amélie de Boisse-Mortemart. a Tradição, o membro mais anti- cisas a se lançar em aventura.
Victor-Emile Michelet tinha si- go foi eleito para o cargo: Au- Os martinistas das demais juris-
do membro importante da Uni- gustin Chaboseau. Este, a partir
versidade Hermética e Mestre de abril de 1932, preferiu dei-
da Loja Velleda; quanto a Cha- xar esta função para Victor-Emi-
muel, tinha sido o organizador te Michelet. Embora ativa, a Or-
material da Ordem; foi uma de- dem permaneceu relativamen-
pendência de sua livraria que te discreta sob sua direção. Com
abrigou as primeiras atividades a morte de Michelet, a 12 de ja-
da Ordem. Outros martinistas neiro de 1938, Augustin Chabo-
se uniram a eles: o De. Octave seau tomou-se novamente Gran-
Béliard, o De. Robert Chapelain, de Mestre da Tradicional Ordem
Pierre Levy, Ihamar Strouvea, Martinista.
Gustave Tautain, além de Philip- Sfmbolo da F.U.D.O.S.L
pe Encausse, filho de Papus. Es-
te último freqüentou durante dições assumiram a mesma atitu-
algum tempo a Tradicional Or- de. Com Efeito, as atividades
dem Martinista e depois se afas- da Ordem Martinista Sinárqui-
tou. Nessa época suas pr~pa­ Em Bruxelas, em agosto de ca se limitavam à transmissão
ções pareciam estar voltadas pa- 1934, ocorreram as primeiras das iniciações aos vários graus
ra outra coisa. O livro que dedi- reuniões da F.U.D.O .S.I. (13). martinistas e a Ordem realmen-
cou a seu pai, no ano seguinte, Diversas Ordens lniciáticas se te não existia. De Jato, na épo-
parece testemunhar essa posi- reuniram em assembléia nes- ca não existia Loja martinista
ção (11). No dia 24 de julho sa ocasião, para combinarem em Paris e era no templo da Fra-
de 1931, os martinistas, reuni- seus esforços. Victor Blanchard ternidade dos Polares que Victor
dos em torno de Augustin Cha- esperava reconstituir graças à Blanchard outorgava suas inicia-
boseau, decidiram despertar o F.U.D .O .S.I. a unidade mundial ções.
martinismo em seu aspecto au- do martinismo sob sua direção.
têntico e tradicional. Para distin- No CTntanto, muitos martinistas O tempo não resolveu a situa-
estavam ausentes. A Tra- ção e, cinco anos mais tarde,
didonal Ordem Martinis- as coisas não tinham progredi-
ta não foi representada do. Diante dessa situação, em
e parece que nem foi 1939 a F.U .D.O.S.I. resolveu sub-
convidada. Quanto a Je- trair a Victor Blanchard a con-
an Bricaud, sem dúvida fiança que nele havia sido depo-
acreditando que seu títu- sitada. Geocges lagreze enmti-
lo seria contestado, pre- zou à F.U.D.O.S.I. que um mar-
feriu se abster. A 9 de tinista sobre cuja existência Vic-
agosto, durante uma reu- tor Blanchard, fosse deliberada-
nião martinista, Victor mente, fosse por negligência,
Blanchard foi reconheci- nada havia dito, era perfeitamen-
do como Soberano Gran- te qualificado para dirigir a Or-
de Mestre pelos martinis- dem. Esse martinista, Augustin
tas presentes (14). Geor- Chaboseau, antigo colaborador
Yictor-Emile Michelet ges lagreze tornou-se de Papus e último remanesceo-
OROBACRUZ-JAH/FEV/MAR -1993 7
te do Conselho Supremo de ves conseqüências, visto que martinistas fizeram tudo para
1891, era legalmente o único muitos martinistas perderiam a lhe complicar a tarefa e, farto
que tinha o direito de dirigir vida nos campos de batalha ou de conflitos, ele preferiu desati-
o destino do martinismo. Uma de concentração. Pouco tempo var a Ordem. Os martinistas bel-
delegação foi então enviada após o começo das hostilidades, gas, sob a direção
para fazer contato com Augustin no dia 14 de agosto de 1940, o de Sâr Renatus (René Rasart),
Chaboseau. Este, após exami- jornal oficial publicou um decre- tentaram continuar o traba-
nar a situação, aceitou a incum- to do governo de Vichy proibin- lho da Ordem sob o nome
bência de dirigir o martinismo. do na França todas as organiza- de Ordem Martinísta Universal.
No transcorrer de uma reunião ções secretas. A maior parte dos Victor Blanchard aprovou esta
especial da F.U.D.O.S.I., os mar- responsáveis por essas organiza- decisão, mas o falec.imento de
tinistas presentes decidiram co- ções foi então aprisionada. A René Rosart, em outubro de
locar-se sob a autoridade do Tradicional Ordem Martinista 1948, refreou o desenvolvimen-
Grande Mestre da Tradicional entrou oficialmente em dormên- to da Ordem Martinista Univer-
Ordem Martinista. Assim, em ju- cia na França, mas na realida- sal. O Irmão Heb Ailghim Si (o
lho de 1939, esta Ordem ingres- de o verdadeiro trabalho não Dr. E. Bertholet) sucedeu aRe-
sou na F.U.D.O.S.I., visto que cessou e as Lojas Atlumor e Bro· né Rosa.rt, mas deixou extinguir-
tinha estado ausente da mes- céliande permaneceram secreta- se uma Ordem que nem chegou
ma até então, ao passo que a mente ativas. Augustin Chabose- a desenvolver atividades. O Dr.
Ordem Martinista Sinárquica au, refugiado na Bretanha, não Bertholet faleceu no dia 13 de
havia sido abandonada por seus foi muito incomodado, mas o maio de 1965, sem ter nomea-
membros, que tinham se uni- Dr. Béliard teve alguns aborreci- do um sucessor.
do à TOM. mentos com aGes-
tapo. Georges Lagr-
Augustin Chaboseau, que aca- eze foi obrigado a
bara de assumir a direção do se esconder na
martinismo, substituiu também Normandia, depois
Victor Blanchard na função de em Angers e, a des-
Imperator da F.U.D.O.S.I. Tor- peito das buscas
nou-se assim membro do triân- incessantes em sua
gulo diretor dessa organiza- casa, manteve-se
ção, composto de três Imperato- em contato com
res: Augustin Chaboseau, Sâr Ralph M. Lewis
Hyeronymus e Ralph M. Lewis por intermédio de
(que sucedera a seu pai, faleci- Jeanne Guesdon.
do a 2 de agosto de 1939). Al-
guns dias mais tarde, uma car- Com o término V~etor Blancluud e Rent Rosart
ta do Conselho Supremo Inter- da guerra, em
nacional da Tradicional Ordem 1945, restavam apenas alguns A despeito de tudo isso, a
Martinista confirmou a nomea· sobreviventes. Sob a direção Tradicional Ordem Martinista
ção de Ralph M. Lewis como de Augustin Chaboseau, a Tradi- não sofrera prejuízo nos Es-
Grande Mestre Regional para cional Ordem Martinista foi ofi- tados Unidos e trabalhava mo-
os Estados Unidos e membro cialmente reativada. Mas ele fale- destamente, aguardando que
do Conselho Supremo Interna- ceu a 2 de janeiro de 1946 e as coisas se acalmassem na
cional. Georges Lagreze a 16 de abril, Europa. Ralph M. Lewis con-
em Angers. Com eles a Ordem servou seu título de Grande
na França perdeu colaborado- Mestre Regional. Cerca de dez
res essenciais. Jean Chaboseau anos mais tarde, quando a
foi eleito para suceder a seu Tradicional Ordem Martinis-
A Tradição martinista foi no- pai. Ele era um martinista de ta foi novamente implantada
vamente implantada do outro valor mas não tinha senso de na França e em outros países
lado do Oceano Atlântico. Não organização. Não conseguiu re- a partir dos Estados Unidos,
foi sem tempo, pois, alguns me- organizar a Ordem na França. Ralph M. Lewis recebeu o tí-
ses mais tarde, os martinistas Os membros do Conselho Su- tulo de Soberano Grande Mes-
europeus enfrentariam uma no- premo lhe subtraíram pouco a tre. Dirigiu a Ordem duran-
va prova, a Segunda Guerra pouco a confiança e o demitiram. te 48 anos, ou seja, até sua
Mundial. Esta última teria gra- Cabe acrescentar que certos transição no dia 12 de janeiro
8 O ROSACRl/Z - JANIFEV/MAR -1993
Conselho Supremo de 1891 e ta. Neste particular ver Le Martinis-
sessenta anos após a criação me, de Roben Amadou, edição l'Asc-
da Tradicional Ordem Martinis- êse 1979, Capítulo IV. Por enquan-
ta, ele deseja ao mesmo tempo to nenhum elemento permite che-
gar a um julgamento definitivo em
recentralizar a Ordem em seus
qualquer sentido.
valores e suas práticas tradicio-
nais e adaptá-la ao mundo mo- (2) O Lfrio do Vale, Honoré de Bal-
derno. Sob sua direção, portan- zac, Nelson 1957, pág. 64.
to, a Ordem está vivendo um (3) Sobre as circunsdncias desta
renascimento. iniciação, ver o artigo: Pierre-Augus-
tin Chaboseau, Um Servidor Incógni-
Cem anos após a Revolução to, nesta revista.
Francesa, os martinistas, sob a (4) Esta criação foi anunciada em
direção de Papus, tinham deseja- A lnicÍIZfão: nP 10, julho de 1981,
do contribuir para a espiritualiza- pág. 83, 84; nP 11, agosto de 1891,
ção de sua época. Com a espe- pág. 182, e n9 12, setembro .de
rança de participar nessa gran- 1891, pág. 277.
. de missão eles tinham propaga- (5) Ensaios de CiJncias Malditas, I,
Georges Lagreze no Umbral do Misttrio, G. Carré, Pa-
do no mundo os Servidores Incóg-
nitos, a fim de que a Obra pudes- ris 1890, pág. 158.
de 1987. Foi sucedido por Gary
se ser cumprida. As dificuldades (6) Ensaio de Sfntese das CiJncú:ls
Stewart e depois, em abril de Ocultas, F.Jolivet Castelot, E. Nourry,
da época eram fortes: as amea-
1990, Christian Bernard foi elei- Paris 1928, pág. 189.
to para a direção da Ordem. ças que pairavam sobre o esote-
rismo ocidental e a conjuntura (7) e (8) Tutti Gli Uomini Del Marti-
da civilização industrial, além nismo, Gastone Ventura, Editrice
do advento do "reinado da quan- Atanor, Roma 1978, pág. 52.
tidade". Nossa época apresenta (9) Le Martinisme, Roben Amadou,
Como se pode constatar, a muitas semelhanças com aque- Niclaus, Paris 1946, pág. 151-155.
Ordem Martinista, apesar das le período e podemos constatar (10) Jean Bricaud teve sucessores
adversidades, sempre conseguiu que, embora a França tenha já de quem é impossível falar aqui
transmitir sua luz ao longo do comemorado o bicentenário da por falta de espaço. Para maior in-
Revolução Francesa, ainda há formação a este respeito, ver nos-
tempo. Embora existam atual- so estudo a ser publicado, O Marti-
mente diversos ramos do marti- muito que fazer. Victor Hugo
nismo, Sua História e Sua Fflosofia,
nismo, é a TOM que conta com dizia: A revolução muda tudo,
de Christian Rebisse.
o maior número de membros, menos o coração dos homens. Co-
mo na época do ressurgimento (11) Papus, Sua Vula, Sua Obra, Phi-
empenhando-se em manter a lippe Encausse, edição Pythagore,
luz que os Mestres do passado do martinismo, o homem corre
hoje o perigo do progresso e
J!aris 1932. Jean Reyor, .e m V4u de
lhe confiaram. Há alguns anos Isis, de dezembro de 1932, pág.
o Soberano Grande Mestre da não é por acaso que organiza- 793, 794, foi o primeiro a assinalar
Ordem, O Irmão Christian Ber- ções iniciáticas como a Tradicio- este aspecto do filho de Papus: Pa-
nard, trabalha pacientemente nal Ordem Martinista também rece que se deixou sistematicamente
para a reorganização da Ordem. estão há alguns anos ativas, pois de lado tudo o que pode verdadeira-
Cem anos após a criação do elas ensinam que não é no nos- mente ter sido interessante na carrei-
so ~rior que se deve produzir ra tão ativa desse espantoso
uma revolução e sim no coração Papus. .. nenhuma palavra sobre a
de cada um de nós; é isso que constituição e a vida dessa Ordem
Martinista de que Papus foi a força
os martinistas denominam a "Sen-
propulsora. • . Philippe Encausse
da Cardfaca ". corrigiu esse defeito nas edições
NOTAS: subseqüentes dessa obra.
(12) Le Martinisme, Roben Ambe-
(1)- Nem todos os historiadores do lain, Niclaus, Paris 1946, pág. 174.
martinismo estão de acordo quan-
to a este ponto. Alguns consideram (13) F.U.D.O.S.I. é a abreviatura
que Saint-Martin não transmitiu ini- de F4diration Universelle Des Ordres
ciação no sentido em que se enten- et Sociét4s Jnitiatiques.
de isso habitualmente. Segundo (14) Este evento foi anunciado no
ek:s é Papus que deve ser considera- número de agosto-setembro de
Christian Bernarri do o criador da Iniciação Martinis- 1934, da revista Adonhiram, pág. 6.

~_MHIZ -.J.ANJFEV/MAR -1993 9


O MARTINISMO
Uma Senda Cardíaca

--------- ---------------------Por um S.I.


signa o sistema teosófico com-
posto por Louis-Claude de Saint-
Martin e exposto em suas obras.
Quem são os martinistas? Pa- Martinista é a pessoa que re- Se as teorias de Saint-Martin
ra alguns, são os discípulos de cebe esse sistema a fim de estu- são próximas às de Martines
lDuis-Claude de Saint-Martin, dá-lo e praticá-lo (4). A este de Pasqually, a diferença entre
para outros, de Martines de significado geral acrescentam- o martinismo de um e de outro
Pasqually. A polissemia do ter- se numerosas variantes, pois, se reduz em grande parte à ma-
mo Martinista, acarretada pela indiretamente, os martinistas neira de encarar a prática da es-
homonimia de Saint-Martin com são também herdeiros espiri- piritualidade. Com efeito, para
Martines, é causa de muito tuais de Martines de Pasqually. Martines, é pela teurgia que o
mal-entendido. Sébastien Mer- Com efeito, Saint-Martin foi homem deve trabalhar sua as-
cier (1) diz que esta seita deriva discípulo de Pasqually e foi ini- censão para o Divino. Para ele
seu nome de seu lfder, autor do ciado na Ordem dos Elus-Cohen. trata-se do único método de
livro intitulado "Dos E"os e da Embora tenha depois se des- que o homem dispõe desde sua
Verdade '~ ou seja, Saint-Martin. viado, conservou a essência das queda do Éden. Essa teoria, a
Joseph de Maistre indica que teorias de seu primeiro Mes- que a etimologia atribui o signi-
os martinistas derivam seu no- tre. Pode-se dizer, aliás, que ficado de "obra divina" ou "ope-
me de um certo Martino Pasqua- a profundeza das grandes li- ração divina", consiste num con-
lis (2) . O antigo bispo de Blois, nhas da filosofia de Pasqually junto complexo de práticas ri-
M. Grégoire, hesita: Mas quem é indispensável à boa compreen- tualísticas, visando obter pro-
é o fundador dessa seita? Pos- são da mensagem de Saint- gressivamente a união com a
to que pode-se escolher en- Martin. Por volta de 1889 sur- Divindade por intermédio dos
tre Saint-Martin e Martinez, pe- giu uma Ordem denominada anjos. Quanto a Saint-Martin,
lo qual aquele foi iniciado aos Ordem Martinista. A partir des- considera essas práticas ultra-
mistérios teúrgicos. . . (3) . sa época, o termo " Martinistas" passadas e perigosas. Acha que
Robert Amaciou empenhou-se designa mais particularmente desde a vinda do Cristo, o "Ex-
em expor todos os significa- os membros dessa Ordem e piador' ', abriu-se uma porta e
dos que podem ser dados ao seus descendentes posteriores o ser humano tem agora aces-
termo " Martinista". Para ele ao fim da Primeira Guerra Mun- so direto ao reino divino, sem
seu primeiro significado de- dial. usar agentes intermediários. Ele
10 O ROSACRUZ - JAN/FEV/MAR -1993
prefere a evocação à invocação. bre. Seu Templo interior está O Desejo é a raiz da eternida-
Sua prática é uma ascese inte- em ruínas. de (8),pois Deus é um eterno de-
rior e , para ele, é no centro sejo e uma eterna vontade de es-
do ser, no coração do homem, Homem, lembra-te um instan- tar manifesto, para que sua magia
que a união deve se realizar. te do teu julgamento. De bom gra- ou a doce impressão de sua exis-
O interior tudo ensina e tudo do quero por um momento te escu- tência se propague e se estenda a
abrange, confia ele a seu amigo sar de desconheceres ainda o su- tudo o que seja suscetfvel de rece-
Kirchberger, que lhe pede con- blime destino que deverias cum- bê-la e senti-la. O homem deve
selho quanto à prática da espiri- prir no universo; mas pelo menos então viver também desse desejo
tualidade (5) . não te deverias tambbn cegar ao e dessa vontade e lhe cabe nutrir
papel insignificante que nele cum- em si mesmo tais sublimes afei-
pres durante o curto intervalo que ções; eis que em Deus o desejo é
perco"es desde o berço até o teu sempre vontade, ao passo que no
túmulo. Lança um olhar sobre o homem o desejo raramente chega
Os martinistas se questionam que te ocupa durante esse trajeto. ao seu termo completo, sem o
quanto à capacidade atual do Podes mesmo crer que foi para qual nada se realiza. E é graças
ser humano para realizar essa um destino tão vazio que foste do- a esse poder dado ao homem, de
união. Se o homem, como indi- tado de faculdades e propriedades levar seu desejo ao cardter de von-
ca a Bíblia, foi criado à imagem tão importantes? (7) . Como recu- tade, que ele devia realmente ser
de Deus, como se explica sua perar o estado paradisíaco em uma imagem de Deus (9).
miserável situação atual? Estará que o ser humano era ao mes-
o homem ainda em condição mo tempo um Pensamento, uma A senda martinista é uma sen-
de se realizar? Esta questão le- Palavra e uma Ação de Deus? da da Vontade: entre o Desti-
va os martinistas a estudar a his- Aí está toda a busca martinista, no, as forças que dirigem cega-
tória do ser humano, desde sua a busca da Reintegração. Se o mente o mundo inferior e a Pro-
emanação da Imensidão Divina homem perdeu seu poder origi- vidência Divina, é preciso então
a sua situação atual. Para eles nal, não obstante conserva o escolher. Para o martinista, tor-
o homem não pode chegar a co- germe do mesmo e só depen- nar-se um Homem de Desejo é
nhecer sua natureza fundamen- de de sua vontade cultivá-lo pa- empreender a reconstrução de
tal sem estudar as relações natu- ra fazê-lo frutificar. seu Templo interior. Para edifi-
rais entre Deus, o ser humano car esse Templo eterno, o mar-
e o universo. O universo e o ser tinista se apóia em dois pilares:
humano formam um todo, duas a iniciação e o ensinamento
progressões que estão ligadas martinistas. Por esses dois pila-
entre si, que se desenvolvem O homem sente perfeitamen- res ele adquire a Força e a Sabe-
juntas, de modo que o último te que se encontra em estado doria de que necessitará para
termo do conhecimento do ho- de privação e nada neste plano fazer nascer em si mesmo a Be-
mem o conduziria ao último ter- consegue satisfazê-lo. Aquilo leza, o terceiro pilar que marca-
mo do conhecimento da nature- que ele deseja fundamentalmen- rá com seu selo a consecução
za. Mas se o homem quer com- te não pertence a este mundo da reconstrução de seu Templo
preender sua verdadeira nature- e é por isto que ele se engana interior. A iniciação marca o co-
za, é para Deus que deve voltar sem cessar, impelido por um meço de seu grande trabalho,
o seu olhar, pois, não podemos imenso impulso de fazer tudo pois é o momento em que ele
ler senão no próprio Deus nem voltar a si mesmo, como para recebe o germe de luz que cons-
nos compreender senão em Seu reencontrar a faculdade que lhe titui o fundamento de sua obra.
próprio esplendor. . . (6). Se o permitia, outrora, tudo possuir, Cabe-lhe em seguida trabalhar
homem não é mais capaz de al- dominar e compreender. No di- para atualizar e tomar radiante
cançar esse conhecimento, isto zer de Saint-Martin: Nada é essa luz. A iniciação martinista
se deve a que cometeu o erro mais comum que o impulso e tem lugar no interior de um
de se tornar vazio de Deus, pa- maís raro que o desejo. De fato, Templo ou Heptada. Constitui
ra se perder no mundo das apa- aquele que toma consciê ncia um momento privilegiado, o en-
rências, no mundo temporal. da origem dessa nostalgia, des- contro de um Homem de Dese-
Tomou-se adormecido para o sa lembrança fu~ de uma gran- jo com o seu Iniciador. Essa ini-
mundo espiritual. Seu corpo deza perdida, aquele que aspi- ciação só pode ocorrer com a
de luz, outrora armadura impe- ra a reencontrar sua pureza ori- presença simultânea daquele
netrável, transformou-se numa ginal, é um Homem de Desejo. que a outorga e daquele que a
veste de carne, corruptível e po- Seu desejo é o desejo de Deus. recebe.
O ROSACRUZ- JANJFEV/MAR -1993 11
Mas não basta receber a cha- da Tradição, como a Cabala, ção, pelo retorno ao centro do
ma; é preciso também conser- que permite um estudo mais ser, ao coração. O coração é o
vá-la, o que é mais dificil. Para profundo do Velho Testamen- órgão e o local onde se realizam
os martinistas as iniciações hu- to; a ciência dos números, que todas as nossas faculdades e on-
manas, embora sejam um preli- constitui um tema privilegiado de elas manifestam sua açdo; e
minar indispensável, são apenas para os martinistas; a angelolo- como essas faculdades pertencem
"representativas" de uma outra gia, os ciclos da humanidade, a todos os reinos que nos consti-
transformação. Só se tornam efe- o simbolismo dos sonhos, etc. tuem, o corpóreo, o espiritual e o
tivas quando recebemos a inicia- Em seus trabalhos, os martinis- divino. . . O coração é o ponto
çiJo centraL Trata-se da iniciação tas não empregam nem teurgia de encontro e a e:rpressdo cond-
pela qual podemos entrar no cora- nem magia; seguem o ideal do nua da alma e do esp{rito (17).
ção de Deus e fazer o coração de Filósofo Desconhecido: Condu- O fato de o ser se voltar para
Deus entrar em nós para a{ fazer zir o espfrito do homem por uma o seu centro, essa contemplação
um casamento indissolúvel. .. via natural às coisas sobrenatu- interior, é a verdadeira prece,
NiJo há outro mistério para che- rais que lhe pertencem de direito que impregna nossa alma desse
garmos a esta santa iniciação que mas de que ele perdeu totalmente encanto sagrado, dessa magia di-
não o de mergulharmos cada vez a noção, seja por sua degradaçi1o, vina que constitui a vida secreta
mais nas profundezas do nosso seja pela falsa orientação de seus de todos os seres (18).
ser e de não esmorecermos, para instrutores (13) . Para isso é inú-
que não venhamos a da{ retirar til acumular um saber intelec-
a vivificadora raiz; com isso todos tual, pois, para progredir na sen-
os frutos que devemos gerar, segun- da da reintegração, não é a cabe-
do nossa espécie, serão produzi- ça que é preciso empenhar e sim O trabalho do Homem de
dos naturalmente em nós e fora o coração. Em seu trabalho, o Desejo provoca uma transforma-
de nós (10). É aí que se encon- martinista utiliza dois livros sim- ção interior, um "crescimento
tra essa iniciação central pela bólicos: o Livro da Natureza e espiritual" que traz uma pro-
qual a lenta germinação da co- o Livro do Homem. A natureza messa de renascimento interior.
roa (11) no centro do ser huma- é a verdadeira fonte de abundtJn- O Velho Homem deve ceder lu-
no dele faz o seu próprio rei. cia para o nosso estado atuaL .. gar a um Novo Homem. O ter·
O termo Iniciar adquire então ela é com efeito o ponto de reu- mo renascimento não é usado
todo o seu sentido, como o ter- nião de todas as virtudes cria- aqui de maneira simbólica; es-
mo que em sua etimologia latina das. . . Assim, todas essas virtu- sa transformação não se limita
significa reapro:rimar, unir à ori- des Divinas, ordenadas pelo gran- a um mero efeito parcial e concen-
gem, com o vocábulo initium sig- de princ{pio para cooperar na re- trado num único ponto do nosso
nificando tanto origem como co- abilitação dos homens, estão sem- ser interior; ela se propaga por to-
meço. . . nada mais análogo à pre presentes em torno de nós das as áreas que nos constituem
situação e à esperança do homem (14). A Sabedoria Divina seme- e nelas ressuscita a vida a cada
do que a fonte de onde descem ou os símbolos de suas virtudes passo; parece dar nomes ativos a
essas iniciações e do que o objeti- ao nosso redor, a fim de nos le- todas as substtJncias espiritu(lis,
vo que elas devem se ter propos- var a colhê-los, e a natureza cons- celestes, elementares, reunidas
to por toda parte, que é o de anu- titui para o iniciado um imen- em nós (19) . Para alcançarmos
lar a distancia entre a luz e o ho- so repositório de conhecimen- essa regeneração, devemos fa.
mem; ou de aproximá-lo de seu to. O segundo livro confiado à zer renascer em nós a virgem
Princ{pio, restabelecendo-o no meditação do martinista é o Li- eterna, a Sofia. Essa virgem po-
mesmo estado em que se encontra- vro do Homem. Este é para ele de nascer em nós se reanima-
va no começo (12). o livro mais essencial, pois o mos esse corpo glorioso submer-
homem é o único livro escrito pe- so em nossa matéria, nosso invólu-
O ensinamento constitui pa- la mão de Deus (15). É nele que cro puro e primitivo (20), que é
ra o martinista o alimento com estão escritas todas as leis do o corpo virginal que preside
que ele vai fazer crescer o ger- universo e todas as verdades im- ao nascimento do novo homem,
me recebido quando de sua ini- portantes e fundamentais [existen- ou seja, ao nascimento do Cris-
ciação. A base do ensinamento tes] em todos os homens an- to em nós. Louis-Claude de
martinista consiste nos escritos tes de existirem em qualquer li- Saint-Martin descreve esse pro-
de Louis-Claude de Saint-Martin vro (16). É antes de tudo em cesso como uma imitação inte-
e de Martines de Pasqually. Os si mesmo que o homem deve rior do Cristo. A cristologia de
ensinamentos martinistas abor- buscar a luz. A leitura do livro Saint-Martin é a pedra angular
dam também os grandes temas do Homem se faz por introspec- de seu sistema. .. (21).
12 O ROSACRUZ -JAN/FEV/MAR -1983
lidade a centeOza da Luz aprisiona- rão de Liebstorf, Paris, Dentu 1862,
da no caos da natureza e à bus- cana XL, pág. 118.
ca da qual o Filósofo se consagra (6) Ecce Homo, Louis-Ciaude de
"sob o manto" -essa centelha Saint-Martin, Paul Derain, Paris
Esse novo homem, uma vez emanada do Sol, da Estrela dos 1959,pág. 17
(T) O Ministlrio do Homem-Espfrito,
nascido, passa por todos os está- Sábios, que brilha para o vidente Louis-Ciaude de Saint-Martin, Mig-
gios da evolução até alcançar e se mantém invis{vel aos olhos neret, paris 1802.lnuodução, pág. X.
sua plena maturidade. Tendo- do mundo (23). (8) Obras Póstumas, Volume 11,
se tornado Homem-Esp!rito, Louis-Ciaude de Saint-Martin,
jx>derá cumprir seu ministé- Letourmy, Tours 1807, pág. 408.
rio. Nessa missão, cumprirá (9) O Ministirio do Homem-Es-
aquilo que era seu destino pfrito, obra citada, pág. 153.
primitivo: ser o intermediá- (10) Correspondéncia de Louis-
rio ativo entre Deus e o uni- Ciaude de Sainl-Martin e Kirc-
verso. A comunicação será hberger. . . obra citada, cana
restabelecida entre o que ex, pág. 322.
(11) Sainl-Martin, o Filósofo
está em cima e o que está Desconhecido, M. Matter, Diffu-
embaixo e a Terra poderá sion Rosicrucienne, Paris 1992,
encontrar o sabá ou shab- cap. xxvm, pág. 376.
bath. O homem poderá par- (12) A Tábua Natura~ Louis-
ticipar na reintegração do Ciaude de Saint-Martin, Edim-
Todo no Um e se tornará bourg 1782, segunda parte,
novamente o Templo de pág. 235.
Deus. Homens de paz, ho- (13) Meu Retrato Histórico e Fi-
mens de desejo, eis o esplen- losófico, Louis-Ciaude de Saint-
Martin, Julliard 1961, n9 1135,
dor do Templo em que um pág. 442.
dia tereis o direito de entrar. (14)A TábuaNatura~ obra cita-
Tal privilégio não vos deve da, Cap. 22, pág. 230 e Cap.
causar espanto, tanto quanto 19, pág. 166.
o fato de que aqui embaixo (15) O Ministério do Homem-
podeis começar a construí-lo Espfrilo, obra citada, pág. 26.
e podeis mesmo orná-lo em (16) O Crocodilo, Louis-Ciau-
todos os instantes de vossa de de Saint-Martin, Ubrairie
vida. . . Lembrai-vos de que, du Cercle Social, Paris An VII,
segundo o ensinamento dos pág. 86.
sábios, as coisas que estlJo (17) Do Espfrito das Coisas,
em cima slJo semelhantes às Louis-Ciaude de Saint-Martin,
que estão embaixo; e deveis Laran, Paris An VIII, Vol. 11, pág.
conceber que vós mesmos po- 93.
deis concorrer para essa seme- (18) Obras Póstumas, obra cita-
lhança, fazendo com que as da, pág. 403.
coisas que estão embaixo se- (19) O Novo Homem, Louis-
jam como as que estão em O Eremita Ciaude de Saint-Martin, Diffu-
cima (22). Mas antes de chegar sion Rosicrucienne, Paris 1992, pág.
a esse ministério, o homem de NOTAS: 34.
desejo, tal como o Eremita do (20) O Ministirio do Homem-Espfrilo,
obra citada, pág. 276 e 439.
tarô, precisa percorrer um cami- (1) Tábua de Paris, Sébastien Mer-
nho pedregoso. Envolto em seu cier, Amsterdam 1783, pág. 233. (21) Sainl-Martin, o Exdntrico, em
longo manto, leva ele uma lan- (2) Quatro Capftulos /nédiJos sobre Prese!tfa de Louis-Ciaude de Saint-
a Rússia, Joseph de Maistre, Paris Martin, palestra na Universidade
terna acesa. O estudo a que ele de Tours, Robert Amadou, l'autre
se propõe é justamente indicado 1859, pág. 94.
(3) História das Seitas Religiosas, M. Rive, Tours 1986, pág. 164.
pela luz velada que leva em todas (22) A Tábua Natur~ obra citada,
Grégoíre, Paris 1828, Volume 11,
as suas peregrinações, no périplo pág. 217. ns> 22, pág. 227 e 229.
que efetua através do conhecimen- (4) Martinismo, Documenton9 4 Edi- (23) O Tar6, Tentativa de Interpreta-
to. Como o iogue, ele se retira pa- Repro 1979, pág. 2. ção Segundo os Princ(pios do Henne-
ra a solidão, levando consigo a (5) Correspondlncia de Louis-Clau- tismo, Jean Chaboseau, Niclaus, Pa-
Luz. A lanterna simboliza na rea- de de Sainl-Martin e Kirchberger, Ba- ris 1946, pág. 58. ll.

O ROSACRUZ - JN/4/FEV/MAR - 1993 13


o
~

FILOSOFO
DESCONHECIDO

Louis-Claude de
Saint-Martin

- - - - - -- - - - - - -- - - - - - - - - S tanislas e Zofja Coszczynski •

Na grande família das nações, do. Em certos casos de parti- Cabe aqui uma citação dos
a despeito das diferenças de ra- cular proximidade espiritual, a Evangelhos: Busca e encontrarás;
ça, nacionalidade e língua, há ligação entre eles toma-se tão pede e te será dado. Quem quer
certa tendência, da parte de ho- estreita que mesmo aquilo que que deseje ardentemente, que
mens espiritualmente evoluídos, se chama de morte deixa de ser busque com perseverança e fer-
de atraírem uns aos outros; ho- um obstáculo. vor alcançar o Ideal Divino, com
mens cujas almas têm natureza toda a força de sua alma, com
semelhante, que buscam a ple- Uma familia espiritual unida certeza terá auxilio e apoio.
nitude de sua humanidade e não existe num dado momento
que, não podendo alcançá-la so- na carne, mas cada um de seus Em verdade, aquele que é co-
mente no p lano fisico, perse- membros descobre, cedo ou tar- rajoso conquista o Reino dos
guem essa busca nas regiões su- de, os traços dessa família e os Céus superando a oposição dos
periores em que seu ardente beneficios que dela provêm, pe- instintos da natureza, rejeita~
desejo os conduz ao próprio los tesouros espirituais secretos do todo compromisso e tenden-
santuário do Deus Vivo. Esses acumulados pelos predecesso- do sempre a se elevar ao Reino
pioneiros se reconhecem uns res. Cada qual em seu caminho da Luz e da Liberdade. Louis-
aos outros em função de sinais particular de desenvolvimento Claude de Saint-Martin era um
visíveis e invisíveis e demons- tende para o conhecimento do cavaleiro assim, empenhado na
tram um grau de desenvolvimen- seu próprio Eu; cada qual se es- busca da luz. Foi reconhecido
to e renascimento em espírito força para despertar o transcen- como um dos maiores místicos
real e definitivamente alcança~ dente, a imagem eterna nele en- da França, mas a obra de sua
raizada, a fim de tornar percep- vida não se limitou às coisas
• Oficiais da Grande Loja da Polô- tível e compreensível o texto que escreveu. Toda a sua exis-
nia em 1947. do Divino pensamento nele de- tência foi dedicada à idéia de
Anigo publicado em "Rosicrucian positado e de alcançar a mais um grande renascimento da hu-
Digest" de dezembro 1947tjaneiro plena e pura manifestação do manidade e ele desencadeou
1948 (1) mesmo. um eco profundo, não somen-
14 O ROSACRUZ -.JAN/FEV/MAR - 1993
te na França mas também no trar no próprio seio da Divinda- rio do sentimento de busca de
Oeste e no Leste da Europa. Ve- de e, com a luz do conhecimen- urna resposta e a doçura de seu
mos traços de sua influência to, iluminar todos os aspectos refinamento. Entre ele e seu
nas obras criativas de nossos da vida. Tinha descoberto o se- pai havia certa falta de compre-
poetas proféticos, marcadamen- gredo da felicidade na Terra, o ensão, de modo que já nos pri-
te nas de Adam Mickiewicz. equilíbrio perfeito entre a lei e meiros anos de atividade de
o dever, a harmonia entre os Saint-Martin os conflitos foram
Para poder compreender ideais professados e a vida coti- inevitáveis. Pouco se sabe quan-
Saint-Martin é preciso se apro- diana. Considerava que a coexis- to a seus irmãos, mas parece
fundar em sua obra, examinar tência entre povos diferentes também que não havia harmo-
sua vasta correspondência, estu- deveria ser baseada na fraterni- nia em suas relações. A tristeza
dar sua biografia (publicada por dade capaz de levar à igualda- oprimiu o coração de Saint-Mar-
Papus, Matter, Franckeoutros), de espiritual de todos e à liber- tin em sua juventude, mas sua
apresentada por muitos autores dade que é a expressão natural reação demonstrou mais força
e críticos, por vezes de manei- dos princípios de fraternidade. que fraqueza.
ra parcial e errônea.
A doutrina de Saint-Martin é cla- Nos bastidores de urna infân-
Um observador perspicaz não ra e simples. Sua verdade pode cia não muito feliz, cresceu em
teria nenhuma dificuldade pa- ser facilmente percebida por to- sua alma a ardente aspiração a
ra descobrir o verdadeiro Saint- do homem de boa vontade, por- urna vida superior; a falta de
Martin, para descobrir urna irna- que este místico francês primei- amor no ambiente familiar o in-
. gem não deformada deste gran- ro adquiriu o conhecimento das duziu a buscar o amor de Deus.
de místico. Seu Eu real passou leis divinas e depois fOrmulou As cartas de Saint-Martin mos-
por diversas fases de desenvolvi- sua doutrina em confOrmidade tram a que ponto ele tentou
mento; discípulo e adepto da com essas leis. Mediante suas conscienciosamente cumprir
ciência esotérica de Martines obras, ele desejava difundir a seus deveres para com seu pai,
de Pasqually, que era um huma- luz do conhecimento que lhe mesmo ao preço de um grande
nista, teurgo e místico, pode- fora revelada; no entanto, o hor- sacrificio, criando assim um obs-
mos perceber os níveis da esca- ror a um possível abuso da par- táculo para os planos que ele
la em que ele se elevou pelos te de pessoas não preparadas tinha para seu próprio futuro.
próprios títulos de suas sucessi- ou de má vontade - e isso de Quando saiu da escola, seu pai
vas obras: O Homem de Desejo, maneira persistente - fez com quis que ele estudasse Direito
O Novo Homem, O Ministério que usasse o véu dos símbolos e Saint-Martin obedeceu. Mas
do Homem-Espfrito. esotéricos quando abordava as logo se convenceu da impossibi-
verdades destinadas aos inicia- lidade de continuar nessa dire-
Os traços principais do cará- dos. A obra de sua vida imortali- ção. As complexidades do Direi-
ter de Saint-Martin eram urna zou seu nome, não somente to e sua relatividade contlitavam
atividade viril, vigorosa e, tam- em seu próprio país mas por to- com a trama do seu caráter. Ele
bém, urna sensibilidade fina e do o mundo, eis que o raio de estava em busca de um outro
feminina e um refinamento na- luz que tem por origem a pró- tipo de Direito, de um outro ti-
to. Sua atitude intrépida e inaba- pria fonte da luz universal bri- po de lei. Nessa época de sua
lável, quando ele defendia os lha irresistivelmente para toda vida não podia ver claramente
ideais que professava, sustenta- a hUmanidade. qual seria seu caminho, visto
dos virtualmente por seu mo- que ainda lhe faltava o poder
do de vida, fazia com que ele da vontade consciente. Disso
muitas vezes parecesse duro, decorreu o seu segundo erro:
mesmo para com seus amigos, o serviço militar. Este também
mas ele próprio era o primeiro Saint-Martin nasceu em Arn- não durou muito tempo, mas,
a sofrer isso. Era preciso quç boise, a 18 de janeiro de 1743. nesse ponto de sua vida, algu-
certa ternura jorrasse de seu co- Pouco se conhece de sua infân- ma coisa começava a se cristali-
ração e procurasse aliviar a pe- cia. Sua mãe faleceu quando ele zar no seio do seu ser - urna
na que ele não podia deixar de era ainda muito jovem e esta porta parecia se abrir para o jar-
infligir aos outros. perda deve ter tido urna profun- dim encantado em que deveria
da influência na maneira corno começar sua missão. Saint-Mar-
O misticismo de Saint-Martin foi formada sua pe rsonalidade. tin conheceu o Sr. De Granvil-
não era abstrato e alienado da Da{ sua extrema sensibilidade, le, um oficial corno ele, e o Sr.
vida. Ele se esfOrçava para pene- o desenvolvimento extraordiná- De Balzac, ambos discípulos
O ROSACRUZ- JAH/FEV/MAR -1993 15
de Martines de Pasqually. Pou- grande inteligência. Ela o inspi-
co a pouco seu relacionamen- rou a ler as obras de Jacob
to foi se estreitando. Saint-Mar- Boehme. Os anos anteriores
tin foi acolhido no círculo inter- de sua vida foram apenas uma Tendo lido atentamente os
no de Martines de Pasqually. preparação, pois agora sua al- documentos disponíveis, propo-
Foi iniciado e tornou-se para ma desabrochava como uma mo-nos agora a apresentar com
Pasqually um discípulo predile- flor. A luz do conhecimento es- mais precisão as fases do desen-
to e seu secretário. piritual jorrava das obras de volvimento de Saint-Martin. Sua
Boehme no eu interior de alma procurava se manifestar
Saint-Martin deixou o exérci- Saint-Martin, agora preparado, na vida exterior, de maneira cor~
to e passou a se dedicar inteira- e davam uma inesperada sedu- respondente a suas aspirações
mente à sua obra. A idéia da ção a sua missão. Ele sentia e seus desejos, que ainda eram
Reintegração da Humanidade, uma nova plenitude, uma li- vagos. Seu encontro com Gran-
proposta por Pasqually, atraía-o berdade quanto à constrangedo- ville e Balzac modificou toda a
fortemente. Com lealdade e gran- ra influência do mundo exterior, sua vida. Ele pareceu receber
de fervor, começou a executar que se tornou a pactir de então uma diretriz clara quanto à orien-
todas as ordens de seu mestre, apenas um campo propício a tação futura de sua vida. Des-
estudando sua teoria, submeten- uma ação frutífera. Ele foi pou- de sua juventude, estava sem-
do-se às práticas recomendadas pado pela Revolução Francesa. pre pronto para uma submissão
e às práticas teúrgicas. Como iniciado de alto grau, po- ardorosa ao imperativo interior.
dia perceber facilmente o signi- Sua natureza exterior nunca se
ficado de eventos terríveis, mas, opôs a isso, que parece ter si-
embora sentisse compaixão pe- do como uma antevisão de sua
la onda de sofrimento que as- própria missão, que exigia are-
solava a França, nunca tentou núncia, o holocausto de sua na-
A vida de Saint-Martin tomou evitar as decisões do destino tureza inferior, o contrário im-
um novo rumo quando ele co- como fizeram outros iniciados, plicando o sacriticio do serviço
nheceu oAgente Incógnito. Trata- segundo Cazoue, místico e ho- à verdade, da modéstia e da hu-
va-se de um ser pertencente aos mem digno e de alta moralida- mildade.
planos superiores, que imprimiu de com quem ele mantinha es-
seu selo na Loja da Lyon e ins- treita relação. Quando a mor- Mactines de Pasqually foi o
pirou especialmente a Saint- te projetou sua sombra sobre primeiro instrutor de Saint-Mar-
Martin. Nesse momento sua in- Paris, ceillmdo vítimas de al- tin. A idéia fundamental de sua
dividualidade começou a se cris- ta linhagem, Saint-Martin sen- doutrina da reintegração do ho-
talizar, tornando-o cada vez tiu-se seguro na cidade, ao mes- mem -ou seja, de seu retomo
mais interessado no trabalho mo tempo que ajudava aqueles ao estado primevo que ele tinha
coletivo junto às Lojas e em no- que tinham necessidade, sem antes de mergulhar no mundo
vos contatos pessoais como, receio por sua própria vida, que material dos fenômenos - exta-
por exemplo, com a Sociedade tinha colocado nas mãos de siava Saint-Martin. Maravilhado
Mesmérica e com os numero- Deus. Quando foi forçado a dei- com a grandiosidade e a ·bele-
sos ocultistas de sua época -in- xar Paris, foi para Amboise, on- za da verdade, ele se devotou
gleses, italianos, poloneses e de ficou quase até o seu pró- voluntariamente a todos os estu-
russos. prio fim. Faleceu a 13 de outu- dos e todas as práticas que se
bro de 1803. Os discípulos de faziam necessários. Na escola
A amizade das mulheres de- Saint-Martin afirmam que os úl- de Martines em Lyon, o cami-
sempenhou um papel importan- timos momentos de sua vida fo- nho que conduzia ao iluminis-
te na vida de Saint-Martin; elas ram extáticos. A luz o envolveu mo levava à prática da " magia
tinham um caráter cheio de viva- e transfigurou. Ele já tinha vivi- cerimonial''. O objetivo final era
cidade e entusiasmo. Assim acon- do num outro plano e provou a união com Deus. Martines de
teceu com a Duquesa de Bouc- que a morte de um místico e Pasqually fundou uma assem-
bon, Madame de Bry, Madame de um iniciado é isenta do me- bléia em Lyon sob o nome de
de Saint-Dicher, Madame de Po- do do desconhecido. Para uma Elus-Cohen. Nessa época as ques-
lomieu, Madame de Brissac e alma liberada, a morte permite tões esotéricas, ou aquilo que
outras. Madame de Boecklin te- que se desfaça das limitações é chamado de magia, desperta-
ve um papel significativo na vi- da matéria; é um retorno do va grande interesse. Sob a dire-
da de Saint-Mactin, graças a sua exílio, uma reunião com o Pai ção de Willecmoz, que Saint-
elevada espiritualidade e a sua Celestial. Martin conheceu então, a Loja
16 O ROSACRUZ - JANIFEV/MAR -1993
de Lyon se expandiu. A doutri- em tudo o que fazia, estar o A vida exterior do Filósofo
na mágica e teúcgica de Martines mais perto possível da verdade, Desconhecido foi uma trama vi-
de Pasqually parecia a mais apro- usou o pseudônimo de Filóso- va, na qual o fio de sua vida in-
priada para Willermoz. Difundir fo Desconhecido. Dado seu teor terior bordou a tela e, para que
o lluminismo na França era sua insólito, essa obra inspirada sus- essa vida fosse perfeita, ele sa-
missão e ele apreciava o traba- citou muita discussão, principal- bia usar o menor acontecimen-
lho em grupo. Os objetivos co- mente entre os Illuminati. A te- to, feliz ou infeliz, e nele sem-
muns atraíram imediatamente se do livro é a de que pelo co- pre encontrava um ensinamen-
um para o outro -esses dois nhecimento de sua própria natu- to oculto. Saint-Martin desco-
discípulos eminentes de Martinês reza o homem pode alcançar o briu o grande valor do silêncio,
-mas logo apareceram suas dife- conhecimento de seu Criador condição absolutamente neces-
renças de caráter e de constitui- e de toda a Criação, bem como sária para se assegurar a inspira-
ção psíquica. Eles se separaram das leis fundamentais doUniver- ção. Não era o silêncio um man-
quanto a questões de métodos so, das quais se encontra refle- to protegendo o mundo invisí-
visando ao objetivo final. Willer- xo na lei feita pelo homem. Sob vel da profanação? Não obstan-
moz preferia a via mental que essa luz foi mostrada a impor- te, a escola do silêncio era difí-
exigia desenvolvimento intelec- tância do livre-arbítrio, essa ap- cil para um místico do seu tem-
tual e encontrava expressão na tidão fundamental do ser huma- peramento, ruja alma desejava
magia cerimonial, ao passo que no que, quando mal empregá- acima de tudo projetar a luz
Saint-Martin preferia a via do da, leva à queda e, quando usa- nas trevas da ignorância. Um
coração e encontrava sua expres- da para o bem, leva-o à liberta- dogma seco só podia formar
são na teurgia pura. Considera- ção e à ressurreição no espíri- um obstáculo à torrente criado-
va a magia indesejável porque to. O Agente Incógnito estava ati- ra de sua vida interior -o silên-
exacerbava o poder da vontade vo na Loja de Lyon e foram fei- cio não podia encerrar como
individual, que levava freqüente- tas cópias do seu ensinamento. por trás de grades a sua ativida-
mente à vaidade e provocava, Saint-Martin assimilou com avi- de, mas serviu para ele avaliar
se não a queda, pelo menos pas- dez esses ensinamentos e, à me- o ouro espiritual antes de pas-
sos em falso na senda do renas- dida que o tempo passava, rece- sá-lo a seu discípulo.
cimento. Ao contrário, a teurgia beu uma revelação que desejou
que Saint-Martin conhecia de- compartilhar com os membros
senvolvia uma humildade sem- da Loja de Lyon. Surpreso e
pre crescente, graças ao estreita- exaltado pela luz de seu próprio
mento da ligação com Deus pe- conhecimento, ele esperava a
la prece e a súplica. Humilda- mesma reação da parte de seus "Aos dezoito anos eu
de e simplicidade, estes dois tra- irmãos. Como foi grande e dolo- disse, em meio às
ços predominantes do caráter rosa sua decepção quando se
de Saint-Martin, tomavam detes- defrontou com uma reação fria confusões filosóficas
táveis para ele a pompa e o as- e cheia de suspeita da assem-
pecto cheio de esplendor exibi- bléia dos membros! Essa expe- que os livros me
dos pelas Lojas. Ele buscava riência foi terrível, pois ele se ofereciam: há um Deus,
uma expressão simples e direta deu conta da tremenda respon-
das experiências da alma. Dese- sabilidade de desvendar verda- eu sou uma alma, e
java acima de tudo ver e demons- des elevadas àqueles que não
trar a essência preciosa revela- estão preparados para elas. Foi nada mais é necessário
da pela comunhão com os Pode- um golpe que, através dele, atin- para ser sábio; foi sobre
res Superiores. Um importante giu o Grande Mediador e foi
ponto de referência do desen- dos mais penosos. Depois dis- esta base que a seguir
volvimento dê Saint-Martin, co- so, Saint-Martin se tomou de
mo já foi mencionado, foi seu grande reserva; passou a temer
foi erigido todo o meu
contato com o que! foi chama- a divulgação de um conhecimen- edifício.''
do de Agente Incógnito, cujos en- to· mais elevado. Aí temos a ex-
sinamentos, transmitidos por plicação de certa obscuridade
"comunicação", causaram nele que vela a luz contida em sua
uma profunda impressão: Foi obra. Aparentemente, ele ado-
L.-C. de Saint-Martin
nessa época que ele escreveu tou a máxima pitagórica: O Ho-
seu primeiro livro: Dos Ertós e mem só tem uma boca e dois ou-
da Verdade. Sempre tentando, vidos.
O"ROSACRUZ -JAN/FEV/MM -1993 17
Veio em seguida o livro de seus ensinamentos que tratam trou a solução categórica de to-
Saint-Martin, Tdbua Natural das de todos os problemas relativos dos os problemas, ao nível do
Relações Que Existem Entre Deus, às condições de desenvolvimen- mais alto escalão capaz de con-
o Homem e o NaturaL O homem to dos indivíduos, das socieda- duzir à união com Deus, o Pai.
foi privado de suas aptidões e des e das nações. Foi a época Para o jovem Saint-Martin,jacob
seus meios superiores por ter de sua infatigável atividade, de Boehme não foi um instrutor
mergulhado na matéria tão pro- seus numerosos contatos em no sentido em que Martines
fundamente que nisso perdeu seu próprio país e no estrangei- de Pasqually o fora, mas sua im-
a consciência de sua natureza ro. Ele encontrava tempo para portância foi maior, pois Saint·
original, que tinha antes dessa uma vasta correspondência e Martin estava então bem prepa-
queda e que era um reflexo da compartilhava com outros o fru. rado para receber uma nova re-
imagem de Deus. Assim ficou o to de seu conhecimento. A in- velação por intermédio dejacob
homem sujeito às leis que regem fluência de Saint-Martin e a difu. Boehme. Uma nova luz inun-
o mundo fisico. Com essa que- são de seus ensinamentos na dou sua alma, foi assimilada
da o homem se afastou do qua- França, na Inglaterra e na Rús- e acelerou o processo inte-
dro de seus próprios direitos e sia, datam de 1785. É o que riorde transformação. Encontra-
deixou de ser um elo entre mostram suas· cartas na obra mos · um eco de suas expe-
Deus e a natureza. Ele tem as de Longinov, Novikoff e os marti- riências nas cartas a seu amigo
aptidões psíquicas que podem nistas russos. íntimo o barão de llebistorf
subordinar os sentidos e as for- (Kirchberger) . jacob Boehme
ças da natureza, desde que se Quando ele estava em Lon- era um místico pela graça de
torne independente, que se li· dres, encontrou William Law, Deus. A revelação, a descida da
berte da influência dos sentidos, o místico, e o Sr. Belz, famoso luz, o arrebatamento da alma -
sem falar na possibilidade que clarividente. Esse encontro foi inúmeras expressões podem
ele tem de fazê-los servi-lo pa- muito importante. Tornou-se descrever o choque da alma su-
ra expandir o campo de seu co- amigo de Zinovieff e do Prínci- bitamente desperta.
nhecimento. O homem -e isso pe Galitzine, que introduziu o
é uma regra no que lhe concer- martinismo na Rússia. Se o mar- Vemos os diferentes modos
ne - tem a faculdade de perce- tinismo foi criticado e persegui- da Iluminação quando o ''vaso
ber a lei, a unidade, a ordem, do, isto foi apenas o resultado escolhido" é preparado parare-
a sabedoria, a justiça e o poder, da ignontncia quanto à essência cebê-la. Na obra de Saint-Martin,
a um grau superior. Esforçan- e aos objetivos dessa doutrina, O Homem de Desejo, vemos
do-se nesse sentido por sua pró- bem como de falhas humanas a nova semente produzida pe-
pria vontade, pode ele retomar de martinistas ocasionais, natu- la assimilação da dou trina de
à fonte do conhecimento que rezas fracas e imaturas, incons- Boehme. Essa obra lembra um
ainda existe em si; pode restau- tantes quanto aos elevados pa- dos salmos que exprime o ar-
rar a unidade que foi o come- drões morais exigidos pelos en- dor da alma para com Deus e
ço de tudo. O renascimento do sinamentos de Saint-Martin. deplora a queda do homem,
homem tornou-se possível pe- seus erros e pecados, sua ceguei-
lo sacrificio do Salvador e, ago- A difusão dos ensinamentos ra e sua ingratidão.
ra, todo ser humano pode to- de Saint-Martin foi acompanha-
mar parte na obra de restaura- da de sucesso social pessoal, Sublinhando a origem divi-
ção da ordem antiga e retornar mas a cálida simpatia, as amiza- na do homem, Saint-Martin viu
às leis antigas que estão a servi- des sinceras suscitadas ao conta- a possibilidade de um retomo
ço de todas as criaturas. to com sua atraente personalida- do mesmo a seu estado prime-
de, não eram um obstáculo pa- vo, em que ele está em confor-
Saint-Martin era um adversá- ra sua vida interior. Numa apli- midade com a lei de Deus. Mas
rio resoluto da lliosofqt atéia e cação pessoal de seus ensina- só abandonando a via do peca-
materialista que grassa.Ja por to- mentos, seu ser foi tão purifica- do e seguindo os ensinamentos
da a Europa. Nesse período, po- do que sua paz interior não po- do Redentor Jesus Cristo, o Fi-
de-se constatar a amplitude da dia ter sido posta em perigo. lho de Deus, que desceu das al-
riqueza individual do Filósofo Sua alma, ávida de mais luz, re- turas de Seu· trono celestial por
Desconhecido. Ele reuniu o co- cebeu-a numa proporção supe- amor a toda a humanidade, é
nhecimento adquirido do mun- rior e assimilou-a em prol da que o homem é digno de ado-
do invisível com o da inteligên- posteridade. Ele atingiu seu apo- rar e, pelo amor e imitando-O,
cia e os dois combinados con- geu quando conheceu as obras é que ele pode alcançar a Salva-
correram para a totalidade de de jacob Boehme. Nelas encon- ção.
18 O ROSACRUZ -JAN/FEV/MAR - 1993
Em seu livro O Novo Homem, sim liberá~la dos entraves co~
publicado no mesmo ano, o au~ trangedores da natureza grossei~
tor trata do pensamento como ra. É a volta do filho pródigo
"Salomão disse ter um órgão de renascimento que ao Pai, sempre cheia de carida~
visto tudo abaixo do permite penetrar no mais pro-- de e perdão. Isso é alcançar a
fundo do ser humano e desco-- unidade perfeita com Ele: o Pai
Sol. Eu poderia citar brir a verdade eterna de sua na~ e eu somos um.
alguém que não tureza. A alma do homem é
um pensamento de Deus. O de~ Cada alma tem seu próprio
mentiria ao dizer ter ver do homem é erguer o véu espelho que reflete a Verdade
visto algo mais, ou seja, que encobre o texto sagrado e Única; cada alma tem um pr~
depois fazer o máximo para am~ ma e um arco--íris que lhe dá
aquilo que está acima pliar esse texto e tomá~lo mani~ suas cores e é por isso que as
do Sol, e esse alguém Cesto ao longo de toda a sua vi~ obras de Saint~Martin não são
está bem longe de se da. Em sua obra, Do Espúito iguais às de Boehme. As mis~
das Coisas, Saint~Martin decla~ sões desses dois homens na vi~
vangloriar disso." ra que o homem, criado à ima~ da eram também diferentes, em~
gem e à semelhança de Deus, hora fluíssem da mesma fonte -
pode penetrar no seio do Ser da mesma necessidade de servir
L.-C. de Saint-Martin que está oculto por toda a Cria~ à humanidade abrindo um no--
ção e que, graças a sua clara vi~ vo caminho para o seu progre~
são interior, ele é capaz de ver so. Saint~Martin elogiava muito
e reconhecer as verdades de as obras de Boehme, apesar de
Deus depositadas na Natureza. muitas vezes considerá~las caóti~
Quem sairá vencedor nesse A luz interior é um refletor que cas e confusas. Queria oferecê-
combate? Aquele que não se ilumina todas as formas. Da in~ las a seus compatriotas e tradu~
preocupa em ser reconhecido tensidade da luz depende o ziu os livros mais importantes
pelos homens nem em que es~ grau de iluminação e discerni~ de Boehme: A Aurora Nascente,
teS se lembrem dele, mas que menta de que necessita o ho-- os Três Princípios da Essência
dedica todos os seus esforços a mem renascido em espirito e Divina, Quarenta Questões Sobre
não ser apagado da memória que lê o livro aberto da Vida. a Alma.
de Deus. Se não tivesse sido pe~
la vinda de um homem que pô- O livro de Saint~Martin, O Após a morte do Filósofo D~
de dizer, eu não sou deste mun~ Ministério do Homem~Esp{rito, conhecido, foram publicados
do, qual teria sido o destino da completa todas as indicações certos escritos curtos de sua au-
posteridade humana? A humani~ precedentes, apresentando um toria, dentre os quais citamos
dade teria mergulhado em tre~ objetivo que não é diferente, Pensamentos Escolhidos, numero--
vas e ter~~ia separado para sem~ qual seja o da ascensão de uma sos !ragmentos éticos e filosófi-
pre do reino do Pai. Mas se alta montanha. O homem a esca~ cos, poesias incluindo O Cemité-
muitas pessoas se desviam do la impelido por uma necessida~ rio de Amboise, Estrofe sobre a
amor, pode ele renunciar a elas? de interior e no antegozo da vi~ Origem e o Destino do Homem,
tória, que traz a liberdade após além de meditações e preces.
Em sua obra posterior, Ecce tribulações e sofrimentos. Uma
Homo, Saint~Martin adverte con~ liberdade que, neste caso, é si~ Saint-martin se interessava
tra o perigo de buscar a excita~ nônima das maiores bênçãos pela ciência dos Números. É ver-
ção das emoções, das experiên~ que podem ser alcançadas na dade que sua obra Dos Números
cias mágicas de baixo nível, das Terra. Há um raio radical e úni~ ficou inacabada, mas contém
premonições, dos diversos fenô- co para descobrirmos e irradiar~ muitas indicações importantes
menos que não passam de ex~ mos a moralidade e a bondade que não poderiam ser encontra-
pressões de estados psico--fisi~ e esse raio é o pleno desenvol~ das em outra parte. Ele analisou
cos anormais do ser humano. vimento de nossa essência inte~ os números de um ponto de~
Esse caminho conduz a humani~ rior imanente. O mais alto sacri~ ta metafisico e místico. Nos nú-
dade a trevas desconhecidas e ficio para salvar a humanidade meros encontrou uma confirma~
temíveis; leva a uma queda ain~ já foi oferecido; cabe agora ao ção da queda e do renascimen~
da maior, ao passo que a salva~ homem oferecer em um sacrifi~ to do homem. O número não
ção só pode ser alcançada por cio voluntário a sua própria na~ é considerado como um signo
um renascimento consciente. tureza inferior, crucificá~la, e ~ morto e sim como a expressão
O ROSACRUZ - JAH/FEV/MAR -111113 111
do Verbo Criador. Cada núme- Afirmava que a estrutura social
ro indica certa idéia e atua so- não pode ser durável, não~
bre vários planos. Tudo é expres- de satisfu.zer à maioria e ter
são da unidade que emana do um caráter elevado se não está
seio da Divindade. O amor e o baseada num conhecimento per- A doutrina de Saint-Martin
sacrificio est iveram na base do feito da organização psico-tisi- se difundiu largamente no mun-
ato da Criação. O pecado origi- ca do homem; se não correspon- do sob a forma de uma Ordem
nal e a queda do homem, seu de às leis divinas nele refletidas. iniciática que recebeu o nome
desregramento e sua imersão Todo legislador deve ter um c~ de Ordem Mattinista. Saint-Mar-
na matéria devem ser resgata- nhecimento profundo da nature- tin defendia a iniciação indivi-
dos pelo sacrifício e o amor do za interior do ser humano e sua dual. Cada Membro era criteri~
criador; só isto pode realizar o conduta deve ser moral; deve samente escolhido e lhe era da-
retorno à Unidade. encontrar uma ordem social da a oportunidade de um conta-
que exprima conhecimento, jus- to estreito e familiar. O Inicia-
tiça e poder. Todas as tentativas dor, então, dava-lhe as indica-
de persistir sobre valores transi- ções e os ensinamentos de que
tórios ou errôneos só podem ele mais precisava e que não
As cartas e a atividade de conduzir a desastre, qualquer ultrapassavam a sua compree n-
Saint-Mattin explicam sua rela- que seja a duração dessas tenta- são. O caminho era mais longo
ção com a Revolução Francesa, tivas. do que o de trabalhar com to-
a qual permaneceu obscura pa- do um grupo, mas era mais se-
ra muitos críticos, pois só podia Em sua obra, O Crocodilo, guro, visto que a doutrina pu-
ser compreendida por aqueles Saint-Martin descreve a manei- ra permanecia inalterada, per-
que haviam recebido a Ilumina- ra como o mal se insinua nas manecia com os membros da
ção e pelos místicos. Por trás coisas sagradas e com que perfi- Ordem e assim ganhava força e
de todos os fenômenos que se dia ele destila seu veneno para expressão.
passam no plano tisico, há o fil- destruir aqueles que são cegos
me do plano astral. Enquanto e insensíveis. Mas o mal dispõe Nem todos os colégios dessa
este não se torna manifesto no de um tempo limitado e pode Ordem seguiram a linha reco-
mundo visivel, há possibilidade ser fu.cilmente reconhecido por mendada por Saint-Mattin e o
de mudanças, de desviar o cur- sinais discerníveis; não pode ilu- resultado foi deplorável. Já dis-
so das coisas pelo sacrifício e dir aqueles que têm a visão da semos que, segundo Saint-Mar-
pelo apelo à misericórdia Divi- consciência, que observam e são tin, o homem é a chave de ~
na. Conhecemos a história sim- cavaleiros de nobres desígnios. dos os mistérios do Universo,
bólica dos dez homens "justos" Quanto maior for o exército reu- a imagem de toda a verdade.
que poderiam ter salvo Soda- nido sob a bandeira do bem, Seu corpo representa a imagem
ma da destruição. Os filmes as- mais rapidamente virá a vitória de todo o mundo visivel e está
trais não estão todos revelados, sobre as fileiras cerradas e desle- ligado a este último. O homem
digamos, porque podem ser ais do mal, que irão se enfraque- pode alcançar toda a verdade
modificados por fu.tores superi~ cendo. A relação de Saint-Martin pelo conhecimento de sua pró-
res no mundo invisivel e tam- com a Revolução Francesa de- pria natureza mediante todas
bém pelo homem na Terra. Mas pendia de seu tipo de ·conheci- as aptidões que ele tem -fisicas,
uma vez que o filme fu.tal este- mento - e que outro homem intelectuais e espirituais. Deve
ja revelado, nenhum poder hu- possuía tal visão interior das compreender profundamente a
mano poderá sustar o curso coisas, espiritualmente? ligação que existe entre sua cons-
dos acontecimentos. Saint-Mar- ciência e seu livre-arbítrio.
tin não apenas acreditava mas Ele compreendia o que esta- Saint-Mattin trata disso em sua
sabia que, se a Providência per- va em curso e trabalhava com Nova Revelação. Certas caracte-
mite uma vez a percepção de diligência no campo do misti- rísticas sublinham as semelhan-
um filme contendo uma infelici- cismo. Fazia também o má- ças entre o homem e seu Cria-
dade indizivel para as pessoas, ximo para resolver o proble- dor. São o poder criador e o li-
a Redenção, se não é voluntária, ma de uma organização social vre-arbítrio sem limite. Mesmo
deve ser imposta. Ele via a Rev~ que fosse justa e mais feliz. A que essas características não se-
lução Francesa como uma ima- influência da Revolução France- jam mais que r eflexos nebul~
gem e um estopim do Juízo Fi- sa é evidente na obra de Saint- sos de Deus, podem trabalhar
nal que se abaterá sobre a Ter- Martin e não podia ter sido dife- em perfeita consonância com
ra efetuan~se gradativamente. rente. as leis - levam a Ele e conduzem
20 O ROSACAUZ -JAN/FEV/MAR -1993
o homem à fonte da bem-aventu- isso assim: A relação entre a cir- bre uma igualdade falsa não tem
rança. As mesmas características, cunferência e seu raio, expressa alicerces duráveis, porque então
se são mal empregadas, rompem em matemática pela letra pi é sem- a fraternidade é imposta, em lu-
a união natural com Deus e sub- pre constante. Que o contorno de gar de ser uma condição volun-
metem o homem a poderes de um cúculo seja de um milúnetro tária. Analogamente, e conjunta-
cum nível inferior. O homem de comprimento ou de um bilhão mente com isso, uma distribui-
tem como poder a capacidade de léguas, essa relação não variil ção das tarefas efetuadas dessa
de reparar um mal feito, se to- e pode-se afirmar, por conseguin- maneira nem sempre concilia
das as suas aptidões são volta- te, que todas as circunferências justiça e caridade; é completa-
das para este fim. guardam entre si essa igualdade mente diferente quando o al-
de consonâncitJ (2). A mesma truísmo e a solidariedade são a
Saint-Martin fala da Unidade coisa vale para o ser humano: base da fraternidade .
como de uma causa primeira, a circunferência é seu direito;
uma essência íntima e sempre a lei é o limite que ele não po- A liberdade é para cada ser
vívida de que tudo emana. Assim, de transgredir; e o raio, ou me- o efeito que segue a observân-
todo ser, por afastado que este- lhor a superfície descrita ou co- cia rigorosa dos limites determi-
ja do ce ntro, ou qualquer que berta pelo giro de seu raio ao nados pela lei. Uma pessoa que
seja o nível de evolução em que redor do centro é o campo do transgride a lei perde proporcio-
se encontre, está ligado à cau- seu dever. À medida que as cir- nalmente sua liberdade. Para
sa primeira e faz parte da Unida- cunferê ncias aumentam, os cír- ser livre, o indivíduo deve con-
de, de maneira semelhante ao culos também aumentam; à me- servar conscienciosamente o
raio de Sol que, qualquer que dida que os direitos do homem equilíbrio entre seus direitos e
seja o afastamento devido ao aumentam, seus deveres aumen- seus deveres; e se ele quer am-
seu deslocamento através do tam proporcionalmente. pliar o campo de seus direitos,
espaço infinito, está sempre liga- deve reconhecer os deveres adi-
do ao Sol pelas ondas vibrató- No Universo em que a lei é cionais que isso necessariamen-
rias. A luz central de que ema- a Unidade na Pluralidade, cada te vai lhe trazer.
nam todos os sóis, embora fa- coisa assenta sobre a ordem e
ça parte de todo o sistema de a harmonia. Para que estas exis- Em suma, diríamos que a feli-
sóis e raios, guarda sua indepen- tam, é necessário que cada coi- cidade da humanidade consiste
dência e é diferente da luz artifi- sa esteja em seu lugar, em har- na união de todos os membros
cial. Deus é tudo, mas tudo não monia perfeita com todos os se- de sua grande família. Essa união
é Deus. A doutrina de Saint-Mar- res e todas as coisas. O ser hu- só pode se realizar através da
tin se aplica a toda a humanida- mano, como indivíduo, está en- fraternidade, que cria igualda-
de. Ele desejava a união dos se- tre os mais felizes quando man- de pelo equilibrio estável dos
res humanos em nome do amor tém um equiltbrio perfeito en- direitos e dos deveres, assegu-
e considerava a fraternidade co- tre direitos e deveres. É nesse rando ao mesmo tempo a liber-
mo a base da vida social. É um equilíbrio que está baseada a dade, a segurança e a preserva-
erro tomar a igualdade das pes- igualdade: quanto mais direitos, ção da coletividade.
soas como base. Saint-Martin mais deveres; quanto menos di-
considerava que a igualdade é reitos, menos deveres. Como
uma constante matemática, uma base da igualdade, deve haver
expressão de ordem e harmonia. a fraternidade, sem a qual have-
A fraternidade é o fator que re- ria ódio e ciúme entre o forte Em função de tudo o que foi
gula as relações entre os ho- e o fraco, o rico e o pobre. So- dito percebe-se que Saint-Martin
mens e que liga justiça e carida- mente a fraternidade pode unir era um profundo pensador cris-
de, força e fraqueza. a família humana nos laços da tão, que desejava abrir um ca-
comunidade. Numa família amo- minho para as idéias e empre-
O mal, a exploração e a tira- rosa e idealmente unida, cada gá-las para a elaboração da es-
nia não podem persistir à luz membro encontra seu lugar se- trutura social. Segundo ele, o
do amor fraterno . De uma fra- gundo a força de suas aptidões amor do Cristo deve ter o direi-
ternidade assim concebida deri- e cada qual deseja suportar vo- to de reger a vida do ser huma-
va um senso justo e adequado luntariamente o número de de- no. A Ordem Martinista é tam-
da igualdade que assenta sobre veres correspondente, bem co- bém uma Ordem cristã e compe-
a consonância entre os direitos mo gozar os direitos que incon- te a cada um de seus membros
e os deveres. Sair, em seu En- testavelmente lhe pertencem. empenhar-se em seu próprio
saio sobre Saint-Ma.rtin, explica O edificio social construído so- desenvolvimento interior, pas-
O ROSACRUZ -JAH!FEV/MAR -11193 21
sando por fases de renascimen- cional Ordem Martinista. e a ao mais profundo do nosso ser,
to cada vez mais profundas até AMORC eram afiliados à organi- sem jamais nos determos em
o ponto culminante do nasci- zação internacional conhecida nossos esforços enquanto não
mento de Deus nele próprio. como FUDOSI (Fédération Uni- tenhamos atingido o objeti-
Seu dever, como membro da verselle des Ordres et Sociétés vo, a profundeza em que ve-
Ordem, é servir a toda a huma- Initiatiques) . remos a vivificadora raiz; a par-
nidade sem poupar esforços, tir de então, de maneira natu-
sem levar em conta a intensida- Para todos os martinistas que ral, daremos um fruto corres-
de dos mesmos nem o sacrificio reverenciam a memória de seu pondente à nossa natureza, as-
que isso venha a impor. O mar- amado Mestre, o Filósofo Desco- sim como os frutos das árvores
tinismo foi assim o anúncio da nhecido, uma última exortação desta Terra, sustentadas por vá-
aproxünação da Era do Cristo está contida em seu testamen- rias raízes, mediante as quais
Cósmico, que se revelará univer- to:A única iniciação que recomen- os sucos vitais não cessam de
salmente na alma dos homens, do, a busca mais ardorosa de mi- se elevar.
nesse grande processo de trans- nha alma, é aquela pela qual po-
formação. demos penetrar o coração de NOTAS:
Deus e induzir este coração divi-
Em seu sublime trabalho, o no a penetrar o nosso. Assim se (1) Talvez os leitores notem algu-
martinismo se une à Antiga e tomará perfeito o matrim6nio in- mas imprecisões quanto à biografia
Mística Ordem Rosae Crucis, dissolúvel que fará de nós o irmão, constante neste artigo, mas elas rião
AMORC, cuja influência ilumina- o c6njuge do nosso Divino Salva- prejudicam a compreensão da obra
de L-C. de Saint-Mactin.
doca sobre a humanidade vem dor.
se exercendo há séculos e que (2) Louis-Ciaude de Sainl-Martin, in-
terpretação da verdadeira doutrina e
é como a fonte eterna de luz Não há outro caminho para de sua aplicação da sociologia, por
jorrando com vistas ao renasci- alcançarmos essa Iniciação sa- Sair (Edouard-Auguste Chauvet),
mento da humanidade. A Tradi- grada que não o de descermos Ed. Lessard, Nantes 1905, pág. 34. li

O Silêncio
Não terás outra morada além do teu coração, É a flor do fogo: o silencio é o vaso,
Pois na Terra, onde somos peregrinos, O silencio é o vaso onde bebes a beleza.
Ninguém construirá morada permanente: Tu que passas aqu~ com certeza mas sacudido
Não terás outra morada além do teu coração. Entre tua vida real e tua vida aparente,
Tua vida rea~ tenebrosa e veemente
Então, ao redor dele, na atmosfera ardente,
Como a paixão, o trovão e a morte,
Que dele nasce, que o envolve e que aspira
Cobre com um véu de sombra e noite o tesouro
Todos os raios vindos das coisas que deseja,
Dessa vida interior, que escolhe
Evoca o silencio e o divino silencio;
Entre tuas almas a melhor e mais pura,
A forma que reveste a primeira hipóstase Para que nada atente para seu mistério intenso,
Te levará nas quatro asas do êxtase. E que sua força virgem, integral, se aplique
, A vida interior é feita de silencio. A edificar a arte em que as mãos do süencio
É o palácio que tem por base o süencio. Venham a tecer o manto de tua alegria.

Victor-Emile Michelet
(1861 - 1938)

O ROSACRUZ -.JANIFEV/MAR -1993


PIERRE-AUGUSTIN
CHABOSEAU (1868 1946)
Um Servidor Incógnito

P.-A. Chaboseau em 1942

--------------------------------------------------------ChristianReb~se

Quando se evoca a Ordem ignorado pelos biógrafos (2) . Chaboseau nos permitiu redi-
Martinista, um nome logo vem No entanto, neste Servidor In- gir esta biografia. A essên-
à mente, o de Pa.pus. É muitas cógnito oculta-se uma persona- cia das informações contidas
vezes esquecido que esse movi- lidade de múltiplos talentos. neste artigo foi extraída de
mento espiritualista reuniu per- Se é verdade que Papus foi o um pequeno caderno intitu-
sonalidades brilhantes, sem as organizador do martinismo mo- lado In Memoriam Augustin
quais essa Ordem provavelmen- demo, é muitas vezes esqueci- Chaboseau, que Madame Ro-
te não teria tido o êxito que co- do que ele teve um associado, salie Louise Chaboseau tinha
nhecemos. Se certos colaborado- Augustin Chaboseau, e que es- preparado pouco após a mor-
res de Papus, como Stanislas te deve ser visto como co-funda- te de seu marido (3) . Usare-
de Guaita, F.- Ch. Baclet (Albert dor da Ordem Martinista. É en- mos também um conjunto de
Faucheux), Sédir (Yvon Leloup) , tão tempo de conhecermos me- notas manuscritas que o pró-
são bem conhecidos, outros, co- lhor essa personalidade atraen- prio Augustin Chaboseau ha-
mo Victor-Emile Michelet e Au- te, tarito por sua contribuição via criteciosamente selecio-
gustin Chaboseau, permanece- para a perenidade de um marti- nado em pequenos maços e
ram incógnitos. Victor-Emite nismo tradicional como por sua que destinavam-se a compor
Michelet ficou mais conhecido qualidade de humanista. seu jornal sob o título Meu
depois que Richard E. Knowles Livro de Bordo, Sessenta Anos
lhe dedicou um livro (1) . Quan- A descoberta recente dos ar- de Navegação Literária e Po-
. to a Augustin Chaboseau, foi quivos da família de Augustin l{tica.

~ ROSACRUZ- JANIFEV/MAR -1993 23


Chaboseau (1835 - 1898), pai Liceu, minha mãe tinha começa-
de Augustin, era militar e sua do minha iniciação ao inglês, meu
carreira exigia freqüentes mu- pai tinha feito o mesmo quanto
Pierre-Augustin Chaboseau danças de residência. Essas via- ao alemão e me haviam confia-
nasceu em Versailles, a 17 de gens nunca prejudicaram os es- do a um bacharel recém-formado
junho de 1868. Seu nome duplo tudos do jovem. Cabe acrescen- para que me ensinasse aquilo que,
dá uma indicação de suas ori- tar que o jovem Augustin logo em matéria de latim, correspondes-
gens. Ele herdou o primeiro, manifestou uma aptidão fora se ao programa da oitava série.
Pierre, à seqüência de uma lon- do comum para o estudo. O tra- Excelente preparação, mas insufi-
ga tradição familiar em vigor balho do liceu não podia saciar ciente para explicar o fato de que,
desde o século treze. Com efei- seu apetite intelectual. Ele "de- · quando entrei na sétima série, fui
to, por volta de 1220, o duque varava" todos os livros das bi- o melhor aluno de latim e alemão
Pierre I ( 4) teria um dia para- bliotecas escolares e aqueles e, quando passei para a sexta sé-
do numa estalagem e teria servi- que parentes e amigos coloca- rie, o melhor em grego, e tudo is-
do de padrinho para o primogê- vam à sua disposição. so sem o menor esforço. E assim
nito de um ancestral da família fo~ no transcorrer dos cinco ou
Chaboseau. Segundo a tradição, seis anos seguintes, quanto a italia-
desde então, na família, o filho no, provençal, catalão, espanho~
mais velho de cada geração rece- português, além do flamengo e
be o nome de Pierre. A família Aos catorze anos ele já tinha do holandês. Quando vim para
Chaboseau (por vezes nomea- lido completamente a Bíblia. Pau, bastaram-me algumas sema-
da Chaboseau de la Chabossi- Essa leitura teve tal impacto so- nas para me familiarizar com o
ere) tem raízes na nobreza da bre o jovem adolescente que bearnês e depois, naturalmente, o
França, de modo que Pierre-Au- foi o ponto de partida daquilo gascão. Após o estudo secundário,
gustin poderia ter acrescenta- que seria por toda sua vida uma mergulhei até o pescoço no sans-
do ao seu nome os seguintes tí- preocupação maior: ler, estudar crito. Um russo me ensinou seu
tulos: Marquês de la Chaboissi- e comparar os textos sagrados idioma em alguns meses e, em
ere e de Langlermine, Conde de todas as religiões. Ele dedi- conseqaência, não tardei em tradu-
de Kercabus, Kerpoisson, de la cou as férias de Páscoa do ano zir tudo o que queria do polonês
Moriniere, Trévenégat, la Bélini- seguinte à leitura do Alcorão. e do sérvio (6). Posteriormente
ere, la Pommeraye; Barão de la Ao entrar no Liceu de Mans, leu ele aprendeu o bretão, o espe-
Borde, L'Atrie, le Poreau, Rive- e releu o d icionário de ciências ranto, ao mesmo tempo que lia
doux. Os Chaboseau eram tam- illosó.ficas de Adolphe Frank, o sânscrito e o pâli.
bém Senhores de la Fuye, Pro- com o cuidado de fazer muitas
cé, Bodouet, la Guionniere, la anotações. Depois foi o dicioná- A esse dom para idiomas con-
Tillerolle, Saint-André, Kerlain, rio de literaturas escritas sob a vém acrescentar o que herdara
Kefressou, Kernachanan, terras direção de Vapereau que rete- de seu pai, a música. Desde os
nobres do Poitou, de Vendée, ve sua atenção. Disse ele em seis anos de idade estudou pia-
de Maine e Loire, Mayenne, Sar- seu jornal: o que aprendi graças no e por toda a vida conservou
the, de Bretagne, Loire inferior, a Frank e Vapereau, durante este uma paixão pela música e o can-
llle e Vilaine, Orne e Côtes du ano escolar de 1882 - 1883, é a to. A mudança de seu pai para
Nord (5) . Durante a Revolução base do que chamo de minha eru- uma outra Guarnição propiciou
Francesa, o portador desses títu- dição. encontros que lhe abriram no-
los queimou-os no "altar da ra- vos campos de pesquisa. A des-
zão" e foi arruinado. No ano seguinte ele "mergu- peito dessa mudança, seu pai
lhou" na Imitação de Cristo. Era queria que Augustin terminas-
Augustin nunca usou o no- o alunoAugustin Chaboseau su- se o ano escolar no Liceu de
me Pierre para assinar suas perdotado? Dificil dizer, mas, Mans, de modo que confiou seu
obras, fossem poéticas, literá- em todo caso, tinha aptidões fo- filho a seu amigo Jean Labrous-
rias, científicas ou históricas. ra do comum para certas maté- se, que, como o Sr. Chaboseau,
Só usava o nome Augustin. Es- rias. Os franceses concebem que era um oficial. Os Labrousse
te segundo nome lhe foi dado se pode ter uma vocação irresistl- eram espíritas convictos e esta-
por sua mãe, Elisa-Célestine vel para a música, o desenho, a vam muito ligados a Pierre-Gae-
(1847- 1920), em memória de pintura. .. Mas ninguém jamais tan Leymarie, redator-chefe e
seu pai, Antoine-Augustin Lepa- admitiu para o poliglotismo uma diretor da Revista Espúita. Esse
ge, a quem ela dedicava um ver- predestinação análoga. No entan- encontro abriu o espírito do jo-
dadeiro culto. Auguste-Marie to. . . Antes que eu entrasse no vem para os "mundos invisí-
24 O ROSACRUZ - JAN/FEV!MAR -1993
veis" e nele depositou "o pri· Em 1889, Pierre-Gaetan Ley- uma longa série que o levou a
meiro germe das preocupações marie organizou o primeiro con- colaborar com muitos periódi-
místicas" (7) . gresso espírita internacional cos e revistas. Para fazer o cur-
em solo francês. Não era ape- so de medicina, foi preciso dei·
nas um homem dedicado e sen- xar a família e morar em Paris.
sível, mas também desinteressa- A vida parisiense lhe abriu no-
do e modesto. Influenciou mui- vos horiZontes. Em Paris tinha
tas personalidades (10) . Faleceu acabado de ser inaugurado um
Aqui é necessário dedicarmos em 1901 e seu túmulo em Pere- novo museu, dedicado ao estu-
algum tempo a Pierre-Gaetan Lachaise tem a seguinte inscri- do das religiões e das civiliza-
Leymarie (1817 - 1901). Ele ção: Mo"er é deixar a sombra pa- ções orientais. Com efeito, Emi-
foi um dos mais ardorosos dis- ra entrar na luz. Os Labrousse fa. te Guimet acabara de trazer pa-
cípulos de Allan Ka.rdec, o fim· lavam bastante de Leymarie a ra a cidade uma coleção magní-
dador do espiritismo. Leymarie seu jovem amigo Au gustin, mas fica de objetos de culto, livros
era um espírito muito ativo foi um pouco mais tarde, em sagrados do Oriente, além de
e também um humanista, de Paris, que ele o encontrou. Pier- uma rica biblioteca (11) . Augus-
modo que oferecia as colu- re-Gaetan Leymarie teve profun- tin logo se tornou um visitante
nas de sua revista a todos aque- da influência sobre Augustin assíduo do museu, a tal ponto
les que defendiam uma cau- Chaboseau. Como ele, Augustin que Léon Milloué, curador e bi-
sa espiritualista ou de nature- se apaixonou pela educação e bliotecário, empregou-o como
za essencialmente humanitária dedicou muito do seu tempo à adjunto. Foi desse período que
ou moral (8) . Foi um militante Liga para o Ensino; como ele, nasceu sua grande paixão pelo
pela paz e um dos pioneiros lutou pelos direitos da mu- budismo.
da emancipação da mulher. lher; como ele, não se conten-
Leymarie logo compreendeu tou com belas teorias elabora-
que seus contemporâneos não das à sombra dos salões confor-
estavam absolutamente prepa- táveis dos intelectuais, mas inte-
rados para apreender as no- ressou-se em primeiro lugar pe- Seus pais, preocupados com
vas ciências psíquicas. Perce- la prática. o fato de deixarem o jovem estu-
bia também que muito esforço dante sozinho em Paris, tinham
era necessário para desenvol- lhe recomendado que visitasse
ver a cultura geral dos fran- uma de suas parentes, a marque-
ceses. Com esse objetivo cola- sa Amélie de Boisse-Mortemart.
borou, na companhia de sua Voltemos a Augustin Chabo- Era uma mulher cheia de graça
esposa, com seu amigo Jean seau. Aos dezoito anos teve de e finura. Estava viúva fazia al-
Macé, para a fundação da Liga enfrentar o dificil problema da guns anos e, arruinada por seu
para o Ensino (9). orientação. Tinha várias voca- marido, vivia de dar aulas de
ções, a literatura o piano, de canto e de aquarela
atraía muito e a mú- a uma clientela do bairro de
sica também o ten- Ternes. Artista de múltiplos
tava. Finalmente, dons, escrevia também artigos
decidiu-se pela me- para diversas revistas. Desde seu
dicina. Seu talento encontro, uma grande colabora-
para escrever foi ção se estabeleceu entre Amélie
no entanto muito e o jovem Augustin, de imedia-
útil para financiar to no campo literário (em seu
seus estudos. A par- próprio nome, ela fez publicar
tir de agosto de um artigo escrito por Augustin
1886, publicou uma na revista A Arte e a Moda, em
nove la, O Vigário março de 1891) . Mas foram
de Bosda"os, no Es- suas afinidades místicas que
tafeta. Encorajado mais os aproximaram. Amé lie
por seu primeiro su- se interessava muito pelo espiri-
cesso, publicou um tismo. Era m!stica, ultram!stica.
segundo trabalho, Nenhuma ciincia oculta tinha se-
Lucrece, no mesmo gredo para ela. É verdade que nes-
Pierre-Gal!tan Leymarie mês. Assim começou te particular ela tinha sido injluen-
O ROSACRUZ - JAN/fEV/MAR -1993 25
cwda por Adolphe Desbarolles Assim nasceu uma grande Oriente e sua situação junto ao
(13). O que mais a apaixonava amizade. Suas longas discussões Museu Guimet permite que se do-
era o martinismo (14). O jovem sobre o esoterismo e a mística cumente facilmente (17). Augus-
Augustin conhecia o espiritis- revelou que ambos eram marti- tin pôs mãos à obra e, não se
mo, mas ignorava completamen- nistas. Decidiram então implan- contentando com as traduções
te o martinismo e Amélie resol- tar uma Ordem Martinista, pa- dos textos sagrados, aprendeu
veu educá-lo a este respeito. Ela ra transmitir sua iniciação. É sânscrito e trabalhou diretamen-
me emprestou os livros de E/me neste sentido que devemos con- te com os textos antigos. A par-
Caro, Jacques Matter, Adolphe siderar Augustin Chaboseau co- tir de 1890, Augustin apresen-
Franck (15). Depois os livros do mo co-fundador da Ordem Mar- tou seu manuscrito a Papus e
próprio Saint-Martin. Em segui- tinista. juntos eles o levaram ao editor
da não hesitou em me iniciar, tal Carré, que publicou o livro em
como havia sido iniciada por Adol- Papus e Augustin Chaboseau
1891. Papus criou no Grupo In-
reuniram alguns amigos, Stanis-
phe Desbarolles, discfpulo direto dependente de Estudos Esotéri-
las de Guaita, Lucien Chamuel,
de Henri de Latouche (16). cos uma seção dedicada ao estu-
V.-Ch. Barlet, Maurice Barres,Jo-
do das ciências orientais, a car-
Assim, em 1886, Augustin séphin Péladan, Victor-Emile Mi- go de Augustin Chaboseau.
Chaboseau tornou-se S.I. e pas- chelet, além de outros, e assim
nasceu a Ordem Martinista, por
sou a fazer parte de uma linha- Em 1891, quando Papus pu-
volta de 1890. Papus era um or-
gem de iniciados martinistas blicou seu Tratado Metódico de
que remontava a Louis-Claude ganizador. Para assegurar o êxi-
Ciência Oculta (edição Carré),
de Saint-Martin. Todavia, o mar- to do empreendimento, criou to-
naturalmente pediu a Augustin
tinismo não estava estruturado, da uma estrutura, abrangendo Chaboseau que preparasse, em
livraria, sala de conferências e
organizado e não se podia pro- anexo a seu livro, um glossário
priamente falar em Ordem Marti- revistas. Augustin colaborou pa-
dos principais termos da ciência
nista. Foi mais uma vez um en- ra a revista A Iniciação (de 1889
oculta oriental. Esse apêndice
a 1891) e depois Papus lhe con-
contro providencial que veio foi igualmente publicado à par-
mudar essa situação. fiou o cargo de redator-chefe te, numa pequena brochura.
da revista O Véu de Ísis. Tomou- Durante os primeiros anos do
se também secretário de redação
martinismo, Augustin Chabose-
de Psyché, revista de que Victor- au foi, juntamente com Stanis-
Emile Michelet foi redator-che-
las de Guaita e Chamuel, um
Fazia algum tempo, com efei- fe. Em 1889 teve lugar em Paris dos mais valiosos colaboradores
to, que Jean Labrousse se insta- um congresso espírita internacio-
de Papus. Em 1891, os martinis-
lara em Paris e foi muito natu-
nal, cuja crônica foi publicada tas decidiram dar uma estrutu-
ral que encontrasse Augustin por Gaêtan Leymarie em 1890. ra mais precisa à Ordem Marti-
Chaboseau e o apresentasse a Neste livro constam relatórios
nista e, no número de agosto
seu amigo Gaêtan Leymarie. Es- de Augustin Chaboseau sobre
desse ano da revista A Inicw-
te o pôs em contato com os cír- memórias alemãs, holandesas e
ção, anunciaram uma novidade,
culos místicos e esotéricos pari- italianas.
a criação de um Conselho Su-
sienses e lhe ofereceu um espa- Mas tudo isso não impediu premo composto de 21 mem-
ço na Revista Espfrita. A 15 de Augustin Chaboseau de conti- bros que, de então em diante,
dezembro de 1889, Augustin nuar seus estudos de medicina. dirigiria a Ordem. Augustin C.ha-
publicou uma crônica sobre os Entretanto, no momento de fa- boseau foi membro desse conse-
Ofícios Budistas na Exposição zer sua tese de medicina, ele lho e recebeu o número 6 nes-
Universal de Paris, naquela revis- se encheu de escrúpulos. A idéia se grupo de 21 pessoas. Em ju-
ta. Em Paris ele fez amizade com de ter em suas mãos a vida dos lho de 1892, a revista La Plu-
muitas personalidades: os ir- outros o assustou. Resolveu en- me ofereceu a seus leitores um
mãos Cros, Villiers de 1'Isle-A- tão abandonar a medicina e se número especial sobre a Magia.
dam, que se tornou um seu dedicar totalmente à literatura. Augustin colaborou com um ar-
amigo íntimo, Emile Bourdelle, Papus o encorajou neste senti- tigo intitulado La Chaine. De-
etc. Aconselhado por Leymarie, do e, conhecendo sua paixão pois, no fim do mesmo ano, foi
apresentou-se no Hospital da pela filosofia budista, estimu- nomeado por Stanislas de Guai-
Caridade e aí conheceu Gérard lou-o a escrever um livro sobre ta membro da Câmara de Dire-
Encausse, jovem interno que já este assunto, dizendo-lhe: Você ção da Ordem Cabalfstica da Ro-
começava a publicar obras com conhece a fundo as religiões, as sa-Cruz. Esta era uma Ordem in-
o pseudônimo de Papus. filosofias e as artes do Extremo terna da Ordem Martinista.
O ROSACRUZ- J~FEV/MAR -1993
do da política. A partir de então uma feminista muito ativa, que
suas preocupações mudaram e colaborava para a revista La
ele passou a se questionar quan- Fronde sob o pseudônimo de
Augustin Chaboseau era um to aos povos do Leste, os sér- Blanche Galien. Tinha consegui-
homem prático que adorava li- vios, tchecos, poloneses, e o do forçar sua entrada na facul-
dar com a realidade, de modo problema dos hindus e dos zu- dade de medicina. Aluna do Ins-
que o trabalho especulativo nas lus. Foi também essa época que tituto Pasteur, tornou-se a pri-
Lojas não o encantou por mui- viu seus trabalhos de tradução meira mulher farmacêutica da
to tempo. Ele não cessou de pre- se ampliarem. Por exemplo, do França.
ferir o altru!smo ao estudo especu- russo, La Demande en Marriage
lativo. É inúti~ vão e egofstico, ("O Pedido em Casamento") , Augustin Chaboseau tinha a
dizia ele, o conhecimento que não de A. Tchekhov; do inglês, La rara faculdade de conseguir de-
se pode aplicar imediatamente pa- Ville Eternelle ("A Cidade Eter- senvolver simultaneamente ati-
ra o bem dos outros (19). Assim, na"), de Hall Caine (21). vidades muito diferentes. Suas
a partir de 1893, deixou de par- atividades foram tão numerosas
ticipar nas reuniões de Lojas pa- Augustin participou também que, quando se estuda sua bio-
ra difundir as idéias emancipa- nos trabalhos da Liga dos Direi- grafia, custa crer que ele tenha
das através da pena e da pala- tos do Homem e teve parte ati- podido enfrentar todas elas.
vra. Pediu licença do Conselho va na constituição das universi- Sua paixão pela organização
Supremo da Ordem Martinista, dades populares. Entre 1898 e do trabalho o levou a colaborar
para agir. Por respeito, Papus 1907, fez mais de trezentas pa- com a Bolsa do Trabalho, on-
guardou o seu lugar e seu car- lestras. Já tinha 34 anos e ain- de deu cursos de legislação tra-
go nunca foi ocupado por um da era solteiro, não tendo en- balhista. Aplicou igualmente pa-
outro membro. contrado, ao que parece, uma ra este órgão seu dom dos idio-
companheira à sua altura. Foi mas, como tradutor e intérpre-
Durante todos esses anos, no quadro de suas atividades te em doze línguas vivas. Tudo
Augustin multiplicou seus conta- junto ã universidade popular isso não o impediu de encon-
tos. Por ocasião dos jantares do XIV distrito de Paris que ele trar tempo para traduzir ALe-
da Revista Moderna, tinha conhe- encontrou aquela que se torna- gislação Trabalhista nos Estados
cido muitas personalidades das ria sua esposa a 17 de dezem- Unidos, de W . F. Willoughty
artes e da política. Foi a partir bro de 1902, Rosalie Louise Na- (23) , e completar esse trabalho
desse período que produziu o pias. Essa jovem era descenden- com notas e uma introdução
maior número de novelas e arti- te de um fourierista e de uma em que enfatizou o progresso
gos diversos em revistas e jor- pupila de Maria Deraisme. Era desse país em relação à França.
nais (20). A lista dessas publi- Sempre sensível à emancipa-
cações é tão longa que só po- ção da mulher, traduziu A
demos citar algumas: La Fa- Regulamentação do Trabalho
mille, l'Aurore, l'Action, La das Mulheres e das Crianças
Petite République, Le Cour- nos Estados Unidos (24) , além
rier du Sair, Le Figaro, le Ma- de um Guia Prático de Legisla-
tin, le Parisien, etc. Ele usou çilo Trabalhista (25) e redigiu
muitos pseudônimos: Pierre um Manual de Legislação Tra-
Thorcy, Penndok, Pendoker, balhista, que se tornou um
Arc'Hoaz, le Chat Botté, Can- clássico. Seus estudos do uni-
diani, Henri Olivier, etc. verso trabalhista o levaram a
se preocupar com a deserção
do campo e ele escreveu so-
bre este tema A Deserção do
Campo.
Sua colaboração para La
Petite RépublÚjue teve uma in-
fluência importante em sua
vida. Foi aí que conheceu Be-
noit Malan, Fourniere e to- Porvoltade 1900,Augustin
dos os líderes do movimen- Chaboseau abandonou seus
to socialista da época. Foi com artigos literários nos periódi-
eles que entrou para o mun- Maria Deraisme cos e se dedicou às revistas
O ROSACRUZ -.JAH/FEV/MAR -1993 27
científicas. Colaborou para Re- ra do XIII distrito. Logo se con- também escritor. Era martinis-
vista de Paris, Revista Cient!jica, venceu de que aquele trabalho ta e foi o iniciador de Adolphe
Revista Geral das Ci2ncias, etc. rotineiro absolutamente não Desbarolles. A paixão de Augus-
Seu estudo sobre a constituição correspondia à sua competência tin pela proteção da natureza
de 1875, sob o título de Realiza- e de que podia ser mais provei- é conhecida sobretudo graças
ções Democrdticas, angariou pa- tosamente empregado. Foi o a seu papel na proteção do Par-
ra ele as honras da tribuna da momento para ele retomar con- que de Sceaux. O proprietário
Câmara de Deputados. Termi- tato com seu velho amigo Aristi- desse parque não tinha mais re-
nou um Estudo Histórico sobre de Briand, que se tornou Minis- cursos para manter aquele espa-
os Constituintes de 1848, que foi tro da Justiça. Briand deferiu ço e, em 1923, tinha se decidi-
publicado pelo empenho da So- seu requerimento e, a partir do a vendê-lo em várias presta-
ciedade para a História da Revo- de setembro, engajou-o como ções. Graças à Sociedade para
lução de 1848 -sob a presidên- seu secretário particular. Quan- a Proteção das Paisagens da Fran-
cia de G. Renard (26). Depois do foi nomeado Presidente do ça e com o apoio de diveJ;Sas
foi Alexandre Léva'is quem lhe Conselho e Ministro dos negó- personalidades, Chaboseau con-
confiou a redação de A História cios Estrangeiros, conservouAu- seguiu evitar a destruição daque-
dos Partidos Socialistas na Fran- gustin Chaboseau a seu serviço. le magnífico espaço verde, fazen-
ça -de Babeuf à Comuna, 1911 Durante essa colaboração, que do o Departamento do Sena
(27) . durou até 1917 (30), Chabose- comprar a propriedade em ju-
au representou o ministro em lho de 1923. Augustin Chabo-
Suas atividades políticas se diversas ocasiões oficiais. No seau havia proposto, desde o
multiplicaram. Após seu insuces- transcorrer desse período ele mês de julho, que fosse implan-
so nas eleições municipais de cumpriu missões sigilosas jun- tado no castelo de Sceaux um
1908 (28) ele se tornou, para to a políticos dos Bálcãs. Anga- museu histórico arqueológico
1911, o secretário do deputa- riou assim a amizade de vários da Ile de France. O projeto foi
do Pierre Goujon. Augustin Cha- chefes de Estado: o Presidente adotado em dezembro de 1930
boseau era um amante da natu- Pachitch e o Rei Alexandre da e Jean Robiquet assumiu a dire-
reza; era um " ecologista" por Iugosl<l.via (31) . Esteve também ção desse museu. Augustin Cha-
antecipação. Juntamente com muito ligado ao ministro pleni- boseau tornou-se seu adjunto
seu amigo Anselme Changeur, potenciário da Sérvia em Paris, e conservou esse cargo até a de-
participou na Sociedade para a Milenko R. Vesnitch. Este admi- claração da guerra em 1939.
Proteção das Paisagens da Fran- rava os poemas sérvios que Au-
ça, em 1913. Aliás, a sede social gustin Chaboseau tinha traduzi-
da associação passou a ser em do (32). O governo sérvio pediu-
sua residência, à rua Jenner, lhe que escrevesse uma obra
em Paris. Foi membro do Comi- de História: Os Sérvios, Croatas
tê Diretor dessa Associação em e Eslovenos. Na Iugoslávia os Desde o fim da guerra de
1919 e publicou, de 1913 a dois volumes dessa obra torna- 1914 -1918, Augustin Chabose-
1934, em Figaro, o Tempo e o ram-se livros escolares para as au freqüentava bastante o Gran-
Boletim da Sociedade para a classes de francês. E lhe valeram de Oriente da França e o Direito
Proteção das Paisagens da Fran- o título de Comandante da Or- Humano, com o qual mantinha
ça, artigos sobre a proteção da dem de Saint-Sava; a condecora- relação fazia muitos anos. Fez
natureza (2 9). ção lhe foi outorgada pelo Prín- inúmeras conferências no Direi-
cipe Regente Alexandre, no dia to Humano e participou de
1 de dezembro de 1919 (33) . suas atividades até 1937. Pode-
Dentre suas numerosas relações, se perguntar por que Augustin
que não podemos citar comple- Chaboseau preferiu freqüentar
tamente aqui, assinalamos sua as Lojas maçônicas a freqüentar
A Primeira Guerra Mundial amizade com Roland Bonaparte. as martinistas. É preciso enten-
eclodiu em 1914. Augustin Cha- der que a situação tinha muda-
boseau era um homem apaixo- Alguns anos após a guerra, do muito desde o fim da guer-
nadamente engajado nos assun- de 1922 a 1929, Chaboseau co- ra. Com efeito, Papus havia mor-
tos do seu país e não suportaria laborou para Mercure de France rido antes do fim da Primeira
ser reformado por motivo de sa- e destacamos aqui seu artigo Guerra Mundial, a 25 de outu-
úde. Queria defender seu país. Latouche reabüitado. Henri de bro de 1916. Desde esta data a
Ofereceu-se então para traba- I.atouche (1785 -1851), primei- Ordem Martinista estava em
lhar gratuitamente na prefeitu- ro editor de Henri Chénier, e~ dormência, pois a guerra tinha
28 O ROSACRUZ - JAN/FEV/MAR -1993
dispersado os membros do Con- conseguia apesar de tudo reto- da idéia que tinha do ser huma-
selho Supremo, tornando-se as- mar seu trabalho de tempos a no.
sim impossível a eleição de um tempos. No Natal de 1939, Au-
novo Grande Mestre (34). Não gustin, Jean e Georges Lagreze, Num documento conjunto
obstante, vários martinistas ten- estavam reunidos e trabalhavam da Tradicional Ordem Martinis-
taram desde então assumir a na organização da Tradicional ta e da Ordem Cabalística da
direção da Ordem. Cada qual Ordem Martinista, que, a des- Rosa-Cruz, a C/Jmara de Direção
tinha deformado o martinismo peito da guerra, funcionava clan- da Ordem Cabalfstica da Rosa-
de um modo que escandaliza- destinamente. Eles enviaram Cruz, o Conselho Supremo da Tra-
va Augustin Chaboseau. Farto na ocasião uma prazerosa car- dicional Ordem Martínista e o
de constatar os inúmeros des- ta a Ralph M. Lewis. Antes do Grupo Martínista Brocéliande in-
vios do martinismo de Lyon e fim da guerra, forçado pelos ocu- formam a partida para as Esferas
de Paris, reuniu ele novamente pantes, Augustin voltou para Pa- Superiores do Irmão Pierre Augus-
os últimos remanescentes do ris. Algum tempo antes do fim tin Chaboseau, no dia 2 de janeiro
Conselho Supremo de 1891 e da guerra o exército alemão ir- de 1946, aos 78 anos.
restaurou a Ordem em 1931. rompeu em sua casa e se apode-
Procedeu-se à eleição do Gran- rou de sua biblioteca. Os solda- NOTAS:
de Mestre e Augustin foi desig- dos alemães precisaram de um
nado para o cargo, mas deixou-o caminhão para levar os livros, (1) Vu:tor Emile Michelet, Poete Eso-
pata Victor-Emile Michelet. Com tal era a quantidade de volumes. tlrique, Richard Knowles, Veio, Paris
a morte de Michelet, em julho Felizmente, prevenido a tempo, 1954.
de 1938, Augustin assumiu a Augustin Chaboseu conseguiu (2) Uma pequena notícia biográfi-
função de Grande Mestre. Assim destruir os documentos que tes- ca deve no entanto ser assinalada:
Vida e Mistério dos Rosacruzes, de
restaurada a Ordem, os martinis- temunhavam suas atividades ini-
Jean-Claude Frere, Maison Mame,
tas acrescentaram o qualificati- ciáticas. Paris 1973, a qual, a despeito de
vo Tradicional à sua denomina- quaisquer erros, está bem documen-
ção, para distingui-lo dos dife- Até suas últimas semanas, sua tada.
rentes movimentos não ortodo- atividade intelectual foi intensa; (3) A isso convém acrescentar uma
xos. Com esse gesto os martinis- quinze dias antes de sua morte, quantidade considerável de docu-
tas reivindicavam a perenidade redigiu notaspara uma obra poste- mentos c: correspondências com
da Ordem fundada por Papus com rior, trabalhou num poema em numerosas personalidades, bem co-
eles. . . declarando-se os únicos doze cantos sobre o Buda -infeliz- mo documentos de seu filho, Jean
qualificados para manifestar essa mente interrompido no sétimo can- Chaboseau. Agradecemos calorosa-
mente a Madamc: M.C. o fato de
regularidade (36). A Tradicional to - e escreveu duas mensagens nos ter confiado esses preciosos do-
Ordem Martinista permaneceu para futuras reuniões martinistas. cumentos.
discreta até seu ingresso na FU- A 2 de janeiro de 1946, ele partiu (4) Pierrc: I, dito Maucler, por ter
DOSI, em fins de 1939. A partir calma e serenamente, seu pobre renunciado à vida religiosa, era fi.
desta data, Augustin Chabose- corpo tendo se tomado fraco de- llio de Yolande de Courcy e de Ro-
au tornou-se um dos três 1m pe· mais para permitir ao espfrito ha- bert 11, conde de Dreux e do Per-
ratores da FUDOSI (36). bitá-lo. che. Seu avô fora um certo Robert
I, primogênito dos quatro filhos
A guerra de 1939-1945 viria Assim termina este retrato de I..ouis .VI, "le Gros", cujo tc:rcd-
ro filho foca I..ouis VII, "lc: Jeune",
infelizmente contrariar os proje- de Augustin Chaboseau. Ainda
pai de Philippe-Auguste. Pierre I foi
tos dos martinistas. Esta "estra- haveria muito a dizer, seja so-
armado cavaleiro pelo rei da Fran-
nha guerra" afetou profundamente bre suas realizações literárias - ça c:m 1209. Ver História da Breta-
Augustin Chaboseau; ele tinha fu· por exemplo sua colaboração nha Antes do Stculo XIII, Augustin
gido da capital com seus filhos e pata a grande enciclopédia La- Chaboseau, pág. 218 e 152, edição
procurado refúgio na sua querida rousse -políticas e iniciáticas. La Bourse aus Idées, Paris 1926.
Bretanha (37). Concluiu em O essencial aqui foi levar à des- (5) In Memoriam, Augustin Chabo-
Saint-Servan (perto de Saint-Ma- coberta de um ilustre martinis- seau, R. I..ouise Chaboseau, pág. 1
lo) o segundo e o terceiro volu- ta que, tendo sido nutrido pela e notícia de Augustin Chaboseau
mes de A História da Bretanha. doutrina de amor e caridade do sobre a origem da família Chaboseau.
Seu filho Jean estava no front martinismo, pelos estudos sociais (6)MeuLivrode Bordo. .. pág. 3 c: 4.
e fui Jeanne Guesdon quem o transcendentes da Rosa-Cruz e (J) In Memoriam. •• pág. 5.
substituiu como secretária admi- de Saint-Yves d'Alveydre, empe- (8) Ver Os PioMiros do Espirilismo
nistrativa para as relações com nhou-se por toda a sua vida na França, Documentos para a For-
o estrangeiro. Jean Chaboseau em pôr em prática a mais eleva- mação de um Livro de Ouro das Ciin-

O ROSACRUZ - JAH/FEV/MAR -1993 29


das Psicológicas, Paris 1906, pág. Mortemart, não foi apenas uma ini- dente do Conselho e 17 vezes Mi-
104. ciação à leitura de Saint-Martin. nistro dos Negócios Estrangeiros.
(9) Jean Macé fundou a Liga France- (17) In Memoriam. .. pág. 10. Assinou o acordo de Locarno, em
sa para o Ensino, em 1886, a fim (18) Ensaios de Filosofia Búdica, 1925. Foi também um dos promoto-
de favorecer a difusão da instrução Carré, Paris 1891, livro reeditado res da Sociedade das Nações, que
nas classes populares. A partir de em 1946 pela Livraria Astra. em 1946 tomou-se a ONU. Em
1967, essa instituição adotou o no- 1926, recebeu o Prêmio Nobel da
(19) In Memoriam. .. pág. 14. Paz.
me de Liga de Ensino e da Educaçtlo
(20) Em 1921 ele reuniu numa (31) Ver VIda e Mistérios dos Rosa-
Pennanente. obra, La Halte à l'Ombre, as nume- cruzes, jean-Claude Freres, Maison
(10) René Caillet, fundador de A rosas peças em versos que havia Mame, Paris 1973, pág. 134.
Estrela, em que participou Augustin dispersado por numerosos jornais
Chaboseau, após ter sido um positi- e revistas. Maison Françaisc: d'Art (32) Os Sérvios e sua Epopéia Nado-
na~ Bossard, Paris 1919, publicado
vista e néantista, foi convertido ao et d'Edition, 1921.
espiritismo por Leymarie, em 1870. com prefácio de M. R. Vesnitch.
(21) Um Pedido em Casamento, bro- (33) In Memoriam. .. Pág. 21.
(11) Este museu foi fundado por E. chura, Paris Delamain et Boutelle-
Guimet (1836 -1918), industrial e au, 1922. A Cidade Eterna, editada (34) Com [a Morte] de Papus, o
arqueólogo, ao retomar da missão primeiro como folheto em l'Action, Martinismo Estd Morto, jollivet Cas-
que lhe havia confiado o Ministério depois pela Maison des Publications tellot, Ensaio de Sfntese das Citncias
da Instrução Pública, para ir estu- Linéraires et Poétiques, em 1911. Ocultas, E. Nourry,Paris 1928, pág.
dar no local as religiões do Extre- 189.
(22) Maria Deraisme, feminista des- (35) O Martinismo, RobertAmbelain,
mo Oriente. O museu foi instalado de o começo desse movimento, es-
primeiro em Lyon, perto do Parque Niclaus, Paris 1946, pág. 174.
teve também, juntamente com Ge-
da cabeça de Ouro e foi inaugura- orges Martin, na origem da criação (36) No que conceme à história
do por Jules Fcrry a 30 de setem- da primeira maçonaria mista, o Di- do martinismo, ver o artigo, O Mar-
bro de 1879. E. Guimet o transferiu reito Humano, em 1893. Sua irmã, dnismo, História de uma Ordem
em 1884 para Paris, Praça d'Iéna, Mme. Anna Feresse-Deraisme foi Tradicional, nesta revista.
a fim de tomá-lo mais acessível aos testemunha do casamento de Loui- (37) In Memoriam. . . pág. 25.
pesquisadores. A partir de 1945 ele se e Augustin. (38) Idem, pág. 25.
passou a ser o departamento das
artes asiáticas do Museu do Louvre. (23) Editado por Giard et Briere, (39) Idem, pág. 14. li
em Paris, 1903.
(12) Amélie, nascida Nouel de La-
touche, era sobrinha do poeta Hen- (24) Editado por E. Cornely, em
ri de Latouche. 1907 e 1908.
(13) Meu Livro de Bordo... pág. (25) Publicado por Giard et Briere
87. Augustin Chaboseau informa em Paris, 1910.
que A. Desbarolles não apenas ini- (26) Brochura, Paris, E. Cornely,
''Só há duas coisas
ciou Amélie ao martinismo, mas en-
sin~u-lhe certas técnicas de pintu-
1911. incompreensíveis: uma
ra. E preciso lembrar que Adolphe (27) Paris, Marc Riviere, 1911.
Desbarolles, antes de se dedicar to- (28) Foi candidato do Partido Socia-
é o amor perseverante
talmente à quiromancia, era um pin- lista (S.F.I.O.), para o 135' distrito de Deus pelos homens,
tor talentoso. (Sobre este ponto, de Paris, bairro Salpêtriere.
ver o Dicionário Histórico e Racicr (29) Por ocasião do segundo con- a despeito da
nal dos Püúores, de Adolphe Siret, gresso internacional pela proteção
Bruxelas 1883, Volu~e I. pág. 270.) i~gratidão deles;
da natureza, que se realizou em Pa-
(14) Meu Livro de Bordo. . . pág. 88.
(15) Ensaio sobre a VIda e a Doutri-
ris de 30 de junho a 4 de julho de a outra é a
1931 - congresso aberto por um
na de SainJ-Martin, o Filósofo Desco- discurso do Presidente da Repúbli- ingratidão dos homens,
nhecido, E. Caro, Paris Hachete ca Francesa, Albert Lebrun -Augus-
1852; Saint-Martin, o Filósofo Desco- tin Chaboseau fez uma exposição a despeito de Seu
nhecido,). Maner, Paris 1862;A Filo- sobre Os Parques Nacionais nos Esta-
sofia Mfstica na França do Século dos Unidos. Os trabalhos desse con- amor perseverante
XVIII, Saint-Martin e seu Mestre Mar- gresso foram publicados em 1932,
tines de Pasqually, A. Franck, Paris pela Sociedade de Edição Geográfi-
por eles."
1866. ca, Marítima e Colonial, com o tex-
(16) Meu Livro de Bordo. . . pág. to de A. Chaboseau, pág. 391.
88. Esta última informação é mui- (30) Aristide Briand (1862 -1932). L.-C. de Saint-Martin
to importante, pois esclarece que Após a guerra, passou a ser partidá-
a iniciação recebida por Augustin rio de uma poütica de reconciliação
Chaboseau, de Amélie de Boisse- com a Alemanha. Foi 11 ve:zes Presi-

30 O ROSACRUZ -JANIFEV/MAR -1983


-
INICIAÇAO
MÍSTICA
---------------------------------------------------~phM~ell ~s

Jll era noite quando afinal pa- Mademoiselle Guesdon, que era inúmeros serviços à AMORC da
ramos na grande metrópole de então Grande Secretária da América e a seus oficiais.
Bruxelas, cidade de mais de se- AMORC na França, significava
tecentos mil habitantes. Fica- conhecer uma mulher extrema- Falando um inglês perfeito e
mos contentes em saber que mente inteligente e altamente com voz doce e aveludada, ela
nosso hotel estava a apenas al- eficiente, com uma grande expe- nos informou que Hieronymus,
guns passos da estação ferroviá- riência administrativa. Além de o Imperator rosacruz da Euro-
ria; de fato estava situa- pa, só estaria presente
do na mesma praça pavi- naquela noite no concla-
mentada em frente à esta- ve secreto da FUDOSI, a
ção. Antes, várias vezes grande federação das Or-
grupos consideráveis de dens arcanas e místicas
rosacruzes vindos da Amé- de todo o mundo. Deve-
rica e de diversas partes ria partir cedo na manhã
da Europa haviam se reu- do dia seguinte, para
nido nesse hotel para as- uma outra cidade da Bél-
sistir a grandes conclaves gica. De fato ele estivera
em Bruxelas. Os rosacru- em conferência um dia
zes eram conhecidos da antes da nossa chegada
gerência como um gru- e estava esperando por
po de hóspedes harmoni- nós NAQUELE MOMEN-
zado e ordeiro, de mo- TO. Lamentamos que ti-
do que sua hospitalida- véssemos sido causa de
de era correspondente- atraso, mas Mademoisel-
mente positiva. Nosso le Guesdon apressou-se
grupo recebeu aparta- a nos assegurar que nos-
mentos contíguos que ti- so horário tinha sido cor-
nham sido ocupados pe- reto, mas que assuntos
lo grupo do Imperator repentinos e inesperados
apenas dois anos antes. tinham tornado necesário
Ralph Maxwell Lewis, lmperator da AMORC de que Hieronymus partis-
Eu estava atrasado pa- 1939 a 1987. Foi iniciado ao marlinismo em 1936 e, se mais cedo do que pre-
ra um encontro importan- quando de sua transição em 1987, era Soberano vira.
te e ainda não tinha cons- Grande Mestre da Tradicional Ordem Marlinista.
ciência de até que pon- Este texto l um excerto do primeiro capftulo de seu Como tínhamos então
to ele era importante. Te- livro "O Passado tem Muito a Revelar". de sair imediatamente,
lefonei para Mademoiselle Gues- sua firmeza e sua capacidade não havia tempo para prepara-
• don. Ela estava hospedada no para realizar o que às vezes pa- ção. Mrs. Lewis e eu informa-
mesmo hotel. Tinha vindo de recia impossível, ela era fina, mos aos outros membros do
Paris para algum conclave e pa- amável e muito atenciosa. Anos grupo aonde estávamos indo e
ra gentilmente me servir como de estreita ligação com o mun- fomos ao encontro de Mademoi-
intérprete oficial. Ela pediu entu- do comercial não haviam dimi- selle Guesdon na esquina do
siasticamente que Mrs. Lewis e múdo seu discernimento místi- hotel. Nervosamente fizemos si-
eu a encontrássemos na Recep- co nem a tendência filosófica nal para um táxi e, em minha
ção logo em seguida. Encontrar do seu pensamento. Ela prestou excitação, eu gritei para o moto-
O ROSACRUZ - JAN/FEV/MAR -1993 · 31
rista em inglês, o que foi diverti- das sinetas de bondes elétricos que eu não falasse, pois uma
do para os clientes que estavam altos, estreitos e curtos, que ba- cordial recepcionista se aproxi-
no café naquele começo de noi- lançavam de um lado para ou- mava de nós, com um grande
te. Para eles estávamos agindo tro enquanto passavam ruidosa- avental colorido. Essa recepcio-
bem à maneira americana, sem- mente. nista estava prestes a nos rece-
pre com pressa. Achamos que ber como clientes, indicando-
a velocidade com que percorre- De repê nte Mademoiselle nos uma mesa no salão em
mos a vida é a causa de nossas Guesdon bateu forte na divisão que várias mesas já estavam
realizações e que estas são os de vidro que nos separava do ocupadas, mas Mademoiselle
objetivos que valem a nossa exis- motorista. Freando o carro, ele Guesdon deteve-a rapidame n-
tência. perguntou em francês o que ela te e, de um modo que não
queria. Depois de muita gesticu- atraiu atenção, disse-lhe algo
Nossos amigos belgas dão lação da parte do motorista, ele num sussurro que não pude
de ombros e admitem que os foi afinal convencido de que ouvir.
americanos realizam coisas estu- não estava seguindo na direção
pendas, mas "serão essas coisas certa, de modo que fez a volta A recepcionista olhou inten-
a verdadeira finalidade da vida"? para seguir numa direção que cionalmente para nós um ins-
"Será que elas trazem aos ame- me pareceu que tínhamos acaba- tante e d e pois fez um sinal de
ricanos mais felicidade e satisfa- do de seguir. Eu não sabia o cabeça na direção de uma pe-
ção do que o tranqüilo desfru- que esperar, mas fiquei surpre- quena porta no extremo opos-
te de cada hora da vida que os so quando o nosso táxi parou to do salão. Nós a seguimos
belgas geralmente aproveitam"? num bairro residencial e comer- em fila. Ao chegarmos à porta,
Falando rapidamente em fran- cial. Hesitei em sair do carro. ela fez uma mesura, voltou-se
cês para o robusto motorista " Descemos aqui?" - perguntei. e nos deixou. Mademoiselle
de táxi, que não parecia lá mui- "Sim" -respondeu Mademoisel- Guesdon voltou-se para nós e
to confortável espremido no es- le Guesdon, sorrindo ante a disse: " Aguardem aqui, por fa-
paço muito limitado entre o vo- minha perplexidade. vor; eu já volto" . Os clientes,
lante e o assento de espaldar que comiam tranqüilamente à
vertical, Medemoiselle Guesdon Caminhamos cerca de uma maneira própria do país, não
deu-lhe o endereço do nosso quadra, passando por muitas lo- prestaram atenção a nós, pelo
destino. jinhas atraentes. Mademoiselle que nos sentimos gratos, pois
Guesdon parou em frente a nossa fisionomia devia estar re-
Quanto a exatamente aonde uma delas e olhou para a entra- velando nossa tensão emocio-
estávamos indo e ao que iria da da mesma. Eu me aproximei nal.
ocorrer, eu ainda estava comple- e olhei para a grande vitrina
tamente no escuro. Arrisquei que havia nessa entrada. Nela Pareceu um século, mas na
perguntar a Mademoiselle Gues- viam-se travessas de bolos e gran- realidade passaram-se apenas
don mas, percebendo que ela des recipientes verdes com sala- três minutos até que Mademoi-
se mantinha reservada, não in- das que pareciam deliciosas. selle Guesdon voltou. " Quei-
sisti. Esta atitude só serviu pa- Olhei para o grande letreiro ram me acompanhar" - disse
ra estimular minha imaginação no vidro, mais acima. Era um ela solenemente. Assim fizemos
e reforçar meu entusiasmo. Não restaurante para pessoas que e entramos num vestibulo pe-
falamos mais. Mrs. Lewis e eu preferiam comida vegetariana e queno e escuro. Ao que lembro
ficamos em " suspense " , cada frutas. "Por que será que esta- ele fazia uma curva, pois não
qual com seus próprio s pensa- mos parando aqui?" - pensei. pude ver o outro extremo até
mentos. Cruzamos grandes pra- Voltei-me e olhei para Made- que de repente me vi numa câ-
ças ladeadas por imponentes moiselle Guesdon. Ela fez sinal mara oblonga. Ela tinha uns dez
construções de pedra com tor- para entrarmos. " Estranho" - metros de comprimento e cer-
reões e altos portões de ferro. pensei. Ela estivera ansiosa pa- ca de cinco metros de largura.
Caminhando ritmadamente dian- ra chegarmos ao nosso destino Se a memória não me falha, ti-
te deles havia sentinelas unifor- - estivera mesmo com pressa - nha piso de madeira e teto bai-
mizadas com fuzis de baioneta e agora íamos jantar antes de xo de gesso. Estava iluminada
calada. Pude apenas conjeturar continuarmos. Ela aparentemen- por velas situadas no outro ex-
que estavam guardando edill- te percebeu minha confusão e tremo. Sombras dançavam ao
cios públicos. A solene dignida- me esclareceu. ':Já chegamos" nosso redor, nas paredes, a
de daquela cena era às vezes -disse. "O conclave" -comece i cada oscilação das chamas das
quebrada pelo timbre metálico a dizer, mas ela fez sinal para velas, reforçando a atmosfera
32 O ROSACRUZ - JANIFEV/MAR - 1893
enigmática da ocasião. Nossos devia ter pelo menos sessenta Ele era um dos três lmperatores
olhos se fixaram nas coisas que anos - era admiravelmente jo- Rosacruzes do mundo, dentre
as velas iluminavam. Havia uma vem, de tom rosado. De onde os quais contava-se o De. H.
mesa longa em forma deU, com eu estava, não pude perceber Spencer Lewis, na nossa jurisdi-
a abertura voltada para nós. a cor de seus olhos. Para mim ção. Eu não estava amedronta-
Na realidade ela era formada eles pareciam duas jóias radian- do pela circunstância e sim to-
de uma série de pequenas me- • tes, cintilantes; pontos de luz mado de uma forte onda de hu-
sas justapostas e cobertas com talvez os descrevessem melhor. mildade. Ocorreu-me um agu-
toalhas de um branco bem vi- do senso de devoção para com
vo, em contraste com a luz ama- Lentamente, Mademoiselle a Ordem a que tenho o privilé-
relada das velas. Guesdon nos guiou pela ala cen- gio de servir. Senti em minha
tral da mesa em U, diretamen- consciência o lampejo de uma
Ao longo do lado externo te para ele. A cerca de apenas vívida imagem de minhas obriga-
dessa mesa estava sentado um um metrO dele, parou. Devagar ções e meus deveres, bem co-
grupo de homens de aspecto im- e com um tom de voz tranqüi- mo o pensamento das muitas
pressionante. Nenhum deles es- lo, dirigiu-se a ele em francês. pessoas que me haviam precedi-
tava comendo, embora evidente- Estava me apresentando. De- do e que tinham possibilitado
mente o tivessem feito. Todos pois ele falou. Não me lembro isso que hoje consideramos tão
olharam diretamente para nós. de suas palavras; aliás, ao que sagrado.
Suas fisionomias não demonstra- recordo agora, não me lembro
vam nenhuma expressão, mas de ter ouvido quaisquer pala- Fomos então conduzidos aos
não eram frias e duras. Ali, de vras, mas parecia que estava ou- nossos lugares à mesa. Depois,
pé e parcialmente em sombras, vindo uma voz que chamava cada um dos homens passou
sentimo-nos como se fôssemos de uma grande distância, indis- por nós e foi apresentado. Pas-
aparições que estivessem sen- tinta mas melodiosa, calmante, samos a comer, tàmintos co-
do examinadas por um grupo algo como um cântico. Eu pare- mo estávamos e deliciosa que
de pesquisadores de fenômenos cia compreender interiormente era a comida. De certo modo
psíquicos. Adiantei-me e depois o que estava sendo dito, mais pensamos que tomar tempo pa-
parei hesitando. Como se isso do que o percebia objetivamen- ra comer numa ocasião tão aus-
tivesse sido um sinal, todos se te. Ele estava me cumprimentan- piciosa como aquela não pas-
levantaram ao mesmo tempo e do e, depois, sorriu e estendeu sava de uma coisa protàna, em-
ficaram eretos e imóveis, espe- a mão em sinal de boas-vindas. bora fosse apropriado. Alguns
rando. Esperando por que, eu Quando sorriu, todo o seu ros- momentos mais tarde, todos se
não sabia. to se iluminou com um belo es- levantaram ao som de um ma-
plendor. Percebi então o que lho de madeira e silenciosa-
Mais uma vez Mademoiselle era que os grandes pintores ha- mente saíram da sala. Eu esta-
Guesdon nos socorreu. Em voz viam tentado captar na tela quan- va prestes a sair também quan-
baixa, disse: " Deixem que eu do tinham desejado fazer com do um jovem de uns trinta e
os apresente". Eu estava fascina- que seus assuntos ou modelos três ou trinta e quatro anos de
do com um dos homens ali pre- -santos, místicos e grandes filó- idade, magro, vigoroso, de tes-
sentes. Ele estava de pé na cur- sofos da antiguidade -pareces- ta alta e características fisionô-
va da mesa em U, exatamente sem irradiar a luz esotérica que micas de um homem que era
no centro. Eu tinha tentado des- vinha de seu interior. Mas isso clacamente um dedicado estu-
viar meu olhar dele. Não queria é uma coisa que os componen- dante da vida mental, adiantou-
cometer a descortesia de fitá-lo, tes químicos de tintas e pigmen- se e disse em inglês: "Por favor,
mas como se estivesse sendo tos nunca poderão retratar: Na espere com Mademoiselle Gues-
magneticamente atraído, tomei verdade, é mais sentida do que don. O Frater será chamado de-
consciência de que voltava nova- vista. pois". [...]
mente o olhar para seus olhos.
• Ele teria atraído a atenção em
qualquer lugar. Era alto, impo-
Aquele homem à minha fren-
te era o Imperator para a Euro-
Alguns instantes mais tarde,
um Frater entrou pela grande
nente, bem vestido de um mo- pa, conhecido somente por seu porta que dava acesso à sala pa-
do conservador. Tinha uma bar- nome simbólico, Hieronymus. * ra a qual todos os demais ti-
ba bem aparada e branca, que • Isso aconteceu tres anos antes nham se encaminhado. Falou
lhe dava um ar distinto sem ser da iniciação maior ou transição do rapidamente em francês para a
extravagante. Sua pele, para Dr. H. Spencer Lewis. Hieronymus nossa intérprete e guia e voltou
um homem da sua idade - ele também já passou pela tcansição. para a sala. Mais uma vez Soror
O ROSACRUZ -JN4/FEV/MAR -1tt3 33
Guesdon pediu que a seguísse- eu comparecemos a uma reu- uma daquelas noites que indu-
mos. E aquela noite se tornou nião de uma Comissão especial zem um estado melancólico.
inesquecível em nossa vida. de Convenção da FUDOSI, num Os reflexos dos lampadários de
local não muito distante da ca- rua de forma estranha pro-
Cruzamos o umbral e fica- sa do oficial, para discussão de jetavam grotescos padrões de
mos no interior da sala por qua- questões importantes de organi- luz no pavimento escorregadio.
se uma hora, embora não tivés- zação. Ninguém falava. Cada qual des-
semos consciência do tempo. frutava o valor do seu silêncio.
O que se passou ali deve perma- Vários dias tinham se passa- Para mim era uma aventura in-
necer selado em meu coração do desde nossa chegada a Bru- trigante. Algumas das ruas por
e minha mente. Só posso trans- xelas, e aquela noite seria bas- que passávamos eram tão estrei-
mitir minhas experiências ~que­ tante movimentada, naquela ci- tas que as sombras das casas
les que estão preparados para dade tão ativa. Mrs. Lewis, o Fra- de ambos os lados intensifica-
recebê-las e, como eu mesmo, ter Brower, que nos acompanha- vam a escuridão, de modo que
eles nunca saberão quando se- ra da América e eu, seríamos ad- parecíamos estar percorrendo
rão considerados preparados mitidos na Ordem dos M.· .. , desfiladeiros profundos. As ruas
até que tenham sido convida- uma das mais antigas Ordens davam tantas voltas que nenhum
dos a receber esse conhecimen- arcanas da Europa. Durante sé- dos extremos era visível e isto
to na ocasião e no local apro- culos ela fora contemporânea aumentava o realismo da impres-
priados. da Ordem Rosacruz, como um são.
grupo para treinamento prelimi-
nar e preparação para os estu- Eu não podia deixar de pen-
O dia seguinte foi extraordi- dos dos Graus superiores da sar na saga dos neófitos de no-
nariamente ativo para mim, sem Ordem Rosacruz, perpetuando sa amada Ordem, os quais, na
tempo para turismo e passeios. muitos nobres ideais e tradi- Idade Média, buscando a Luz
Havia muita coisa a .tàzer. Tive ções. No seu quadro de mem- como nós, esqueiravam-se de
um encontro marcado com um bros, contara com muitos ho- seus lares na calada da noite -
oficial da FUDOSI, para o qual mens cultos de toda a Europa, de uma noite como aquela -e,
Mademoiselle Guesdon me le- cujos nomes marcaram sua his- puxando mais o capuz de seu
vou. Nessa reunião, importan- tória. manto de modo a ocultarem
tes documentos relativos ao pro- parcialmente seu rosto, avança-
gresso e ~ expansão da AMORC Frater Brower, que nunca es- vam rapidamente nas sombras
na América foram assinados e tivera no estrangeiro nem havia como seres de um outro mun-
selados. Comunicações oficiais tido o prazer e privilégio de co- do, procurando outros que de-
do Imperator da AMORC na nhecer dignitários dessas augus- veriam encontrá-los na sombra
América foram entregues pesso- tas Ordens de Luz, estava num profunda da entrada de algu-
almente u devidas autoridades, elevado estado de expectativa ma casa. Juntos, deviam eles en-
para a consideração de oficiais e entusiasmo. Para ele as horas trar secretamente e de maneira
da FUDOSI. Os planos e proble- do dia passavam muito devagar sigilosa real.izar um conclave
mas recíprocos da Ordem Rosa· enquanto ele aguardava a noi- da nossa Ordem, temendo ou-
cruz da Jurisdição Internacional te, quando deveríamos nos diri- vir a qualquer momento o arrom-
e da Ordem na Europa foram gir ao local de nossa iniciação. bar da porta e ver em seu meio
discutidos e trocaram-se idéias Fora-nos recomendado que nos oficiais da Igreja e do Estado,
construtivas. Pela primeira vez vestíssemos de maneira formal que os prenderiam por terem
escutei a frase: "E à América para a ocasião; vestimo-nos bas- ousado transcender, em seus
compete preservar isso para futu- tante antes da hora e ficamos estudos e pensamentos, os limi-
ras gerações". Achei isso estra- esperando com muita impaciên- tes prescritos das leis eclesiásti-
nho, mas deixei passar sem maio- cia, na recepção do hotel, por cas e do Estado relativas ao co-
res questões. Mademoiselle Guesdon, que, nhecimento aceitável. Embora
como sempre, foi perfeitamen- eu não corresse esse perigo, ex-
Mais tarde, Mrs. Lewis, Soror te pontual. citava-me a idéia do perigo que
Guesdon e eu fomos convida· eles tinham corrido para adqui-
dos a almoçar na casa daquele Estava escuro e chovia quan- rir aquilo que nós da jurisdição
oficial. Desfrutamos um delicio- do partimos num táxi barulhen- da América e de jurisdições alia-
so almoço, num ambiente mui- to para o nosso destino. Para das desfrutamos tão livremente
to agradável. Imediatamente de- uma cidade tão grande, as ruas e u vezes sem ter consciência
pois, Mademoiselle Guesdon e estavam bastante desertas. Era disso.
34 O ROSACRUZ -JANIFEV/MAR -1993
atmosfera amigável, cálida, de
luz e bom ânimo.
''A sabedoria conduz o homem por graus
insensíveis, a fim de não assustá-lo com a logo à nossa frente estava
um Frater, alto, bem proporcio-
imensidade da tarefa que ele deve cumprir. nado, usando uma veste bran-
Ela começa também dizendo ao homem que ca esvoaçante e uma máscara
negra que ocultava todo o seu
ele deve servir de órgão e canal para toda a rosto, exceto uma pequena por-
Divindade, se quer que seu anjo desfrute a paz ção de sua testa além de sua
boca e seu queixo. Ele só disse
das felicidades Divinas." uma palavra: " Entrem". Assim
fizemos. Entramos em fila e nos
L.-C. de Saint-Martin encostamos à parede do vestíbu-
lo. Ele fechou a porta, aferrolhan-
do-a; voltando-se em ângulos
retos, subiu lentamente a lon-
ga escadaria e o seguimos com
Após termos rodado uns dez para alcançar essa porta, tive- os olhos. Novamente o silêncio
minutos, paramos de repente mos de descer dois ou três de- voltou a reinar. Parecia inade-
numa pequena colina. Descen- graus. Para mim ela parecera quado falar. Ninguém parecia
do do táxi de modo a evitar as uma entrada de serviço ou en- querer destruir suas impressões
poças de lama, ficamos de pé tregas. Ficamos atrás dela, aper- com palavras.
na calçada em frente a uma cons- tando o casaco ao redor do cor-
trução de pedra que se parecia po. Ainda estava chovendo e
Alguns instantes depois esse
com a imagem mental que a gen- nos sentíamos desgraçadamen-
Frater voltou e, sorrindo e falan-
te forma das descrições de ca- te desconfortáveis. Não se via
do inglês, pediu-nos que o acom-
sas nas novelas francesas, com nem uma só alma na rua. Esta- panhássemos. Mademoiselle
arquitetura dos séculos dezes- va extremamente escuro, por-
Guesdon o seguiu à nossa fren-
seis e dezessete. Nosso prédio que só havia um lampadário fra-
te. O Frater com veste seguiu
era exótico, intrigante -o telha- co em cada extremidade da qua-
atrás de nós. Subimos o lance
do em ponta aguda, as águas- dra. Ela bateu à porta três vezes.
de degraus até um outro vestíbu-
furtadas, os degraus desgasta- Lembrei-me da batida simbóli-
lo idêntico ao de baixo exceto
dos levando à entrada principal ca de um de nossos rituais. pelo fato de que nesse outro
e o pequeno portal à esquerda,
havia duas portas. Esperamos
abaixo, com sua pesada porta
Aguardamos um instante que do lado de fora. Nosso Frater
de madeira e pequenas janelas
me pareceu bastante longo. Nin- abriu uma delas o suficiente pa-
com grades.
guém f.üava. Ela não experimen- ra entrar na câmara, de modo
tou bater de novo. Finalmente, que não pudemos ver seu inte-
Supondo que aquele era o lo- ouvi o deslizar de um ferrolho; rior e não sabíamos o que espe-
cal onde devíamos entrar, por- a porta devia ser pesada e pou- rar. Ele voltou pouco depois,
que parecia ter uma atmosfera co usada, pois abriu-se lenta- trazendo três grandes lenços
de mistério e sigilo, adiantei- mente, como se a pessoa que a de seda branca. Pediu-nos que
me aos outros subindo os de- estava abrindo tivesse de ta.zer tirássemos nossos casacos e cha-
graus para as grandes portas esforço para isso. A porta ran- péus e fomos vendados; cada
que estavam .fechadas e das geu. Olhamos então para o inte- um de nós foi então condUZi-
quais através de pequenos vi- rior. Havia um pequeno vestíbu- do pela porta aberta para a câ-
dros em sua parte superior, pro- lo, bem iluminado por um estra- mara de iniciação. As vendas
jetava-se uma luz suave. Made- nho dispositivo elétrico que pen- não foram retiradas até que ti-
moiselle Guesdon me fez voltar. dia do teto alto e projetava um véssemos vivido experiências
Chegando onde ela estava, per- padrão esquisito no piso. À di- que fizeram parecer que vivêra-
guntei: "Não é este o lugar"? reita da entrada diante da qual mos séculos e viajáramos para
"Sim", disse ela, "mas não a en- nos encontrávamos havia uma outros mundos. E assim trans-
trada". Então ela se voltou e a escadaria ascendente de que correu minha primeira iniciação
seguimos. Ela se aproximou da só se via um lance. O vestíbulo à Ordem dos M. .. Mais tarde
pequena porta à esquerda. Aliás, era acolhedor. Irradiava uma eu passaria por outras. Â
O ROSACRUZ- JANJFEV/MAR -1893 35
O NOVO
HOMEM

Prefácio da reedição, pela Diffusion Rosicruciene, do livro "O Novo Homem ·~


de Louis-Claude de Saint-Martin, composta a partir de um exemplar da edição original
existente na biblioteca do Chateou d'Omonville, sede da Grande Loja da Jurisdição de
Lfngua Francesa.

A reedição deste livro consti- afastou da Ordem dos Elus-Co- Em Londres, visitou os Templos
tui um evento importante para hen. A via exterior, da teurgia, da Nova Jerusalém, mas julgou
todos aqueles que se interessam que Martines de Pasqually preco- duramente essa senda, por achar
pelo pensamento de Saint-Mar- nizava aos Elus--Cohen, pareceu- que ela não levava longe. Uma
tin, especialmente os rnartinis- lhe inútil e perigosa. Ele seguia decepção o aguarda também
tas. Foi em Paris, por intermé- essa senda ou via, das manifesta- em Strasbourg. Aí ele constata
dio dos diretores da imprensa ções sensíveis, desde 1768. Mas o sucesso daqueles que s6 se in-
do Círculo Social, durante o ela não o havia seduzido total- teressam pelo espetacular, pro-
ano N da liberdade (1795 - mente, já que suas tendências fessores de ci.encias ocultas, aos
1796), que este livro teve sua naturais o impeliam para a sen- quais o vulgo ignorante dá indis-
primeira edição. da interior, do coração. Saint- criminadamente o nome de ilumi-
Martin preferiu seguir, lJ. parte nados (3). Foi ainda em Stras-
Louis-Claude de Saint-Martin de Martines, o caminho do expia- bourg que ele conheceu as obras
(17 43 - 1803) escreveu esta dor (1). · daquele que se tornaria seu se-
obra em Strasbourg, em 1790. gundo Mestre, }acob Boehme
Este livro, assim corno o que ele A fim de se preparar, viajou (1575 -1724).
publicou em 1790, "O Homem para a Inglaterra, a Itália e a Ale-
de Desejo", sublinha a nova manha, para estudar o homem e Na velha cidade imperial do
orientação de Saint-Martin. Com a natureza e comparar o depoi- Reno, que se tornara francesa,
efeito, a partir de 1775, ele se mento dos outros com o seu (2). encontrou também o cavaleiro
36 O ROSACRUZ - JAN/FEV/MAR -1993
Silverhielm, antigo capelão do tual, pela qual o Homem de De- seguindo nisto seu primeiro
rei da Suécia e sobrinho de Swe- sejo fará nascer nele próprio Mestre, Martines de Pasqually,
denborg. Esse cavaleiro pensou um Novo Homem. como para marcar uma distân-
em converter Saint-Martin a seu cia em relação à personalidade
mestre Swedenborg. É totalmen- Saint-Martin mostra o que é histórica de Jesus e sublinhar
te improvável que tenha conse- essa cura por que deve passar assim seu aspecto intemporal.
guido realizar seu objetivo, pois o homem temporal para reen-
Saint-Martin, em seu livro "Ho- contrar o estado de pureza que Para o nosso autor, o Cristo
mem de Desejo", parece reserva- tinha no início de sua emanação: é o novo Adão, aquele que abriu
do quanto às teorias do viden- Pois o nascimento desse filho espi- novamente o caminho que des-
te sueco: Mil provas, em suas ritual no homem não é outra coi- de a queda do pai da humanida-
obras, que ele muitas vezes valori- sa senão o desenvolvimento e a de estivera fechado. O Expiador
zou muito! Mil provas em que ele manifestação daquilo que era o não apenas reabriu a porta mas
muitas vezes foi fonemente enga- homem primordial (6). Nenhu- mostrou o caminho. Diz Saint-
nado! Mil provas em que ele só ma necessidade de teurgia, de Martin: Se o homem está mono
percebeu o meio da obra e não adesão a um culto exterior, pa- em todas as suas faculdades, não
conheceu nem seu começo nem ra essa regeneração. O cadinho há um só movimento do seu ser
seu fim! (4 ). dessa transmutação está situa- que possa ser feito sem que nele
do no interior do ser humano - se pronuncie !sta frase: "Lázaro,
Aconselhado pelo sobrinho é o seu coração. A senda pro- levanta-te"! E no ser humano que
de Swedenborg, Saint-Martin posta por Saint-Martin é uma o Expiador profere continuamen-
escreveu "O Novo Homem". via cardíaca. te esta palavra (7).
Ne5ta obra, o Filósofo Desco-
nhecido não desenvolve gran- Essa transformação se faz A senda que Saint-Martin des-
des teorias sobre os números, por etapas e segue um proces- creve em seu livro é a da imita-
o livro do homem ou a origem so cujo esquema nos foi forneci- ção do Cristo. Mas que não ha-
dos idiomas, como fez em seus do pela senda do Expiador. O ja equívoco, pois o Filósofo Des-
dois primeiros livros -"Dos Er- "Expiador" é o Cristo. Saint- conhecido não advoga a adesão
ros e da Verdade", 1775; "ATá- Martin prefere usar esse termo, a um culto exterior, visto que
bua Natural", 1782. "O Novo
Homem", segundo]. Gence, é
mais uma exonação do que um
ensinamento (5). "Meu Deus, bem sei que sois a vida e que não
A idéia central é de que Deus sou digno de que vos aproximeis de mim, que
não exige mais que fazer uma não passo de nódoa, miséria e iniqüidade. Bem
aliança com o homem, mas
quer que seja somente com o sei que tendes uma palavra viva mas que as
homem, sem mistura com tudo espessas trevas de minha matéria impedem
aquilo que não seja fixo e eter-
no como Ele. O homem de- que a façais escutar aos ouvidos de minha
ve então trabalhar para supri- alma. Fazei não obstante descer em mim uma
mir todas as impurezas que obs-
truem essa misteriosa porta pe- abundância bastante grande dessa palavra,
la qual a eterna Palavra da Divin- para que seu peso possa contrabalançar a
dade deseja entrar para se unir
a ele. O homem deve passar
massa do vazio em que está absorvido todo o
por um processo de cura, a fim meu ser, e que no dia do vosso juízo universal
de conseguir uma recuperação esse peso e essa abundância de vossa palavra
e, para isso, dispõe de um "re-
médio real" que pode ajudá-lo possam me soerguer do abismo e permitir que
a se desembaraçar de seu velho eu me eleve a vossa santa morada ... "
homem e sair da torrente da ini-
qüidade. Aquele que se empe-
nha nessa tarefa é o Homem
L.-C. de Saint-Martin
de Desejo. Essa purificação é
uma verdadeira gravidez espiri-
O ROSACRUZ - JAN/FEV/MAR - 1993 37
essa adoração para fora impe- É nesse templo imperecível para restabelecer em si mesmo
de a imitação de atuar nas pro- que o homem deve manter seu a Jerusalém Celestial e aí cons-
fundezas da alma, de transfor- fogo sagrado; a chama, uma vez truir pacientemente seu santuá-
mar esta última numa totalidade acesa pelo batismo do espírito, rio inteterior, onde Deus esteja
co"espondente ao exemplo ideal deve ser cuidada com desvelo. satisfeito em ser honrado. O Fi-
(8). Com efeito, o Filósofo Desco- lósofo Desconhecido conclui
nhecido indica que o coração esse mangnifico tratado afirma-
As etapas da vida do Expia- tem duas portas; uma inferior, do que todas essas maravilhas
dor, a anunciação pelo anjo, o pela qual ele pode dar ao inimi- se encontram ainda hoje em
nascimento, a apresentação no go acesso à luz elementar e, a dia no coração do Novo Homem,
templo, o batismo, o sacrificio outra, superior, pela qual po- eis que a{ têm existido desde a ori-
do cordeiro, a ressurreição, a de ele dar ao Anjo que é seu gem (13).
ascensão, são sinais para aque- guia, seu amigo fiel, acesso à
le que sabe contemplar para luz divina. O texto de Saint-Mar- NOTAS:
além da simples história. A vi- tin ensina ao leitor com que vi-
da do Expiador fornece um ar- gilância o novo homem deve (1) O AIUÚICio do Novo Homem,
quétipo cujo sentido está inscri- progredir, visto que seu ser exte- Octave Béliard, Mesure NP 4, 15
to na eternidade. Essa imitação rior está situado entre dois pila- de outubro de 1936, pág. 99-
permitirá ao coração tornar-se res que procuram, cada qual 126.
o espelho da Divindade e, por de per si, atraí-lo; e é na frontei-
(2) e (5) Not(cia Biogrdfica sobre
analogia, a Divindade se torna- ra desses dois mundos que de-
Louis-Claude de Saint-Martin ou o
rá um espelho para o Novo Ho- vem se manifestar a Sabedoria,
Filósofo Desconhecido, }. B. M.2
mem. Essa transformação deve a Força e a Magnificência dos ha-
Gence, Paris Migneret 1824, pág.
se operar nas profundezas do bitantes do reino ( 11 ).
8e21.
ser: Por todo o tempo em que a
religiiJo não tem sido mais que Essa tarefa seria para ele me- (3) O Ministério do Homem-Espfrito,
crença e forma exterior, e que a nos perigosa se ele tivesse con- L-C. de Saint-Martin, Paris Migne-
função religiosa não tem sido uma servado a veste que envolvia o ret 1802, pág. 252.
experiência da alma de cada um, primeiro homem, porque então
nada essencial tem se produzido. ele poderia irradiar o esplendor (4) O Homem de Desejo, L.-C. de
Resta ainda compreender que o Saint-Martin, Lyon Sulpice Grabit
de sua luz celeste pelas quatro re-
mysterium magnum (mistério 1790, NP 184, pág. 268.
giões do mundo (12). Hoje o ser
maior) não é apenas uma realida- humano deve vestir o manto (6) O Novo Homem, L.-C. de Saint-
de em si mesmo mos está também da prudência, símbolo dessa ves- Martin, N!? 45.
e acima de tudo enraizado na al- te primordial, para realizar sua
ma humana (9). obra de regeneração. (T) Idem, N!? 15.

(8) Psicologia da Alquimia, C.G.


Para o Filósofo Desconheci- O processo dessa regenera- Jung, Buchet/Chastel, Patis 1970,
do, o Deus único escolheu pa- ção, embora se desenvolva no pág. 9.
ra Si mesmo um santuário úni- coração do ser humano, não é
co: o coração do ser humano. por isso menos universal. Com (9) Idem, pág. 16.
Eis o templo onde este deve efeito, se o Novo Homem é o (10) O Novo Homem, L.-C. de Saint-
adorá-Lo; os templos exteriores único que pode receber em to- Martin, NP 46.
não passam de avenidas desse da a sua medida as águas divi- (11) Idem NP 33.
templo invisível. É nas profunde- nas, vai empregá-las para essa
zas do próprio ser humano que vegetação universal que desde (12) Idem N!? 66.
se encontra a base fundamental antes dos séculos era o objeto (13) Idem N!? 70. !l.
do templo. O homem deve talhar de sua t:fstência.
e polir pelo espúito a pedra funda- I
mental do seu templo(10). Nesse Para qhegar a esse objetivo,
templo ele encontrará as sete Louis-Claude de Saint-Martin
fontes sacramentais que fertiliza- nos indica o caminho que deve
rão todas as regiões do seu ser. seguir esse Novo Homem para
São as sete colunas produzidas tornar-se novamente o quaterná-
por essa pedir inata em nós e rio ativo que era na origem de
sobre a qual o Expiador disse sua emanação. O homem deve
que desejava fundar sua igreja. trabalhar sem esmorecimento
38 O ROSACRUZ -JAN/FEV/MAR -1993
COMO DEVEMOS
BUSCAR AQUILO
QUE PERDEMOS

Cap!tulo VII do livro de Jacob Boehme, "Da Vuta Trina do Homem, Segundo o Mistério
dos Três Princ!pios da Manifestação Divina".
Edição de 1682, traduzida do alemão em 1793 pelo "Füósofo Desconhecido".

1. A nós é particularmente im- nos prometam montanhas terei progredido em nenhu-


posto, a nós outros homens de ouro para que desejemos ma dessas circunstâncias.
neste mundo, buscarmos tão-somente segui-los e fazê-
4. Quando se lança u ma pedra
novamente aquilo que per- los brilhar.
na água e depois se a retira,
demos. Agora, se queremos
ela continua a ser uma pe-
encontrar, não precisamos 3. E quando eu tiver por toda
dra dura e conserva sua for-
buscar fora de nós mes- a minha vida assistido e es- ma; mas se ela é jogada no
mos. cutado sermões, e ouvido fogo, então adquire uma no-
sempre cantos e raciocínios
va forma em si mesma.
2. Não temos necessidade de sobre o céu e sobre o novo
aduladores nem de malaba- renascimento, e tiver sido 5. Assim acontece contigo, ser
ristas que nos encorajem e entregue a mim mesmo, não humano, mesmo que corras
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à igreja e desejes ser visto de Deus e não tem uma Deus e te evolar para
como um ministro do Cris- grande dose de intelectua- Deus, pedindo-lhe que os
to; isto não é absolutamen- lidade; isso porque ele não esqueça e que te ilumine
te suficiente. Entregue a se guia por esta via, mas do Seu espírito.
ti mesmo, és como eras an- simplesmente vai com o
tes. pobre publicano ao tem- 12. Não há necessidade de dis-
plo do Cristo, ao passo cutir muito, mas apenas
6. Também não é absoluta- que o erudito coloca pri- de ser firme; pois o céu
mente suficiente que meiro adiante de si mes- deve se fender e o infer-
aprendas todos os livros mo uma academia e exami- no estremecer, e isto tam-
de memória, e quando pas- na preliminarmente com bém acontece. Lá deves lan-
sares os dias e os anos a que espírito deverá entrar çar todos os teus pensa-
ler todas as escrituras, e no templo do Cristo; con- mentos com a tua razão,
quando souberes a Bíblia sulta antes de tudo a opi- e tudo aquilo que se apre-
de memória, não serás me- nião dos homens. Queres sente a ti em teu caminho,
lhor perante Deus do que então buscar Deus com es- a fim de que não desejes
um tratador de porcos, sa ou aquela opinião? Um deixá-lo (a Deus), sob pe-
que durante todo esse tem- tem a opinião do Papa, ou- na de que ele não te aben-
po tratou de porcos, e do tro a de Lutero, um tercei- çoe, como a Jacó, que as-
que um pobre prisioneiro ro a de Calvino, um quar- sim combateu com Deus
das trevas, que durante to- to a de Schwenckfelds, e toda a noite. Mesmo que
do esse tempo não viu a assim por diante. As opi- a consciência diga não,
luz do dia. niões não têm fim. Deus não quer nada de ti.
(Dize): Quero ser teu; não
7 . De nada te serve tagarelar, 9. Assim a pobre alma perma- te deixarei quando me es-
mesmo que saibas falar nece em dúvida fora do tenderem no túmulo. Que
muito de Deus, se desde- templo do Cristo; bate à minha vontade seja tua,
nhas a simplicidade, co- porta, busca e cada vez eu quero aquilo que quei-
mo o fazem os hipócritas mais duvida de que seja ras, Senhor; e mesmo quan-
sobre a besta do Anticris- esse o verdadeiro caminho. do os demônios te cerquem
to, que obstruem a luz e digam, pára, uma vez
àqueles que enxergam, co- 10. Ó tu, alma errante em Ba- chega, é preciso que digas:
mo isto aconteceu neste bel, que fazes? Afasta-te Não, meu pensamento e
caso. Aqui se aplica o que de todas as opiniões, seja minha vontade não se se-
disse o Cristo: a menos qual for o nome que elas pararão de Deus, devem
que vos convertais e que tenham neste mundo. To- permanecer eternamente
vos torneis como crianças, das elas não passam de em Deus; seu amor é maior
não vereis eternamente o um combate da razão. do que todos os meus pe-
reino dos céus. Deveis ser cados. Se vós, diabo e mun-
gerados de novo, se que- 11. Não se encontra o novo do, tendes o corpo mortal
reis ver o reino de Deus. renascimento nem a nobre como prisioneiro, eu te-
Eis a verdadeira meta. pedra no combate, nem nho meu Salvador e meu
em nenhuma sabedoria Regenerador em minha al-
8. A arte e a eloqüência de da razão; deves abandonar ma; ele me dará um cor-
nada servem aqui e não tudo o que é deste mun- po celestial que durará eter-
precisas de livros nem de do, por mais brilhante que namente.
destrezas; nisso um pastor seja, e entrar em ti mes-
de carneiros é tão sábio mo; não fazer outra coisa 13. Assim, experimenta somen-
quanto um doutor e às ve- que reunir num monte te isso e encontrarás mara-
zes muito mais. Pois ele teus pecados, com que es- vilhas; logo receberás em
se lança antes por sua pró- tás envenenado, e lançá- ti um que te ajudará a lu-
pria razão na misericórdia los na misericórdia de tar, a combater e a orar;
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e mesmo quando não pos- vare da tentação e também uma árvore em seu tempo,
sas dizer muitas palavras, ao desprezo no deserto des- com belos frutos.
não é nisso que a coisa con- te mundo; se não o supor-
siste, desde que possas tão- tas, nada consegues. Se ar- 16. E se tiveres tombado e per-
somente dizer a palavra sim- rancares o ramo, farás co- dido a bela coroa, não de-
ples do publicano : ah, mo Adão e tornarás a coi- sesperes; busca, bate à por-
Deus, tende piedade de sa mais dificil que na pri- ta, retorna e faze como an-
mim, pobre pecador. Mas meira vez, mas ele cresce- tes, e verás com que espíri-
quando a tua vontade, com rá no jardim de rosas, a to essa mão escreveu. Rece-
toda a tua razão e teus pen- despeito do velho Adão. berás em seguida uma árvo-
samentos forem deposita- Pois houve um tempo mui- re em lugar de um ramo e
dos em Deus, não te sepa- to depois de Adão, até a dirás: será que meu ramo
res Dele, mesmo quando humanidade do Cristo, em se tornou uma árvore du-
a alma deva se separar do que a árvore de pérolas se rante o meu sono? Reconhe-
corpo; então tu possuirás insinuou secretamente por cerás então de imediato a
Deus, cruzarás a morte, o baixo do véu de Moisés, e pedra dos illósofos. Atenta
inferno e o céu, e entrarás no entanto ele tornou-se bem para isto. A
no templo do Cristo a des-
peito de todos os demô-
nios. A U:a de Deus não te
poderá deter, por maior e
mais poderosa que ela se-
ja em ti; e quando o cor-
po e a alma queimem na
cólera e estejam no meio
do infe rno entre todos os
demônios. Podes no entan-
to sair de lá e entrar no tem-
plo do Cristo, onde recebe-
rás a coroa de p érolas alia-
da à nobre e digna pedra,
a pedra angular dos illóso-
fos.

14. Mas sabe que o reino do


céu está semeado em ti e
é pequeno como um grão
de mostarda. Rece berás
uma bem grande jóia da co-
roa angelical, mas tem cui-
dado, não a coloques sobre
o velho Adão, ou te aconte-
cerá o que aconteceu a
Adão. Guarda o que tens.
O sofrimento da necessida-
de é um mau hóspede.

15. De um pequeno ramo vem


afinal uma árvore , se ele é
plantado em campo fértil.
Diversos ventos frios e ru-
des vão se lançar impetuo-
samente contra o ramo e
até que ele cresça e se tor-
ne uma árvore, há de vaci-
lar. Deves ser exposto à á r-
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