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Carlos Roberto de Oliveira Chagas

O TERMO “RELIGIÃO CRISTÔ, SUAS MUDANÇAS


HISTÓRICAS E IMPLICAÇÕES PARA A COMPREENSÃO
SOTERIOLÓGICA NO CRISTIANISMO

Instituto Metodista Izabela Hendrix – FATE-BH


Belo Horizonte
2008
2

Carlos Roberto de Oliveira Chagas

O TERMO “RELIGIÃO CRISTÔ, SUAS MUDANÇAS


HISTÓRICAS E IMPLICAÇÕES PARA A COMPREENSÃO
SOTERIOLÓGICA NO CRISTIANISMO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como


Exigência parcial para a obtenção do grau de
Bacharel em Teologia no Instituto Metodista Izabela
Hendrix – FATE-BH

Orientador: Prof. Ms. Gilmar Ferreira da Silva

Belo Horizonte
2008
3

A todos que, por amor e em humildade, buscam a Verdade.


4

AGRADECIMENTOS

Àquele que me criou, que me assiste e que me espera no fim da minha caminhada.

Aos meus pais que sempre acreditaram em mim: Não tenho palavras para expressar...

À minha Lady: Talvez juntando a gramática de todas as línguas que existiram, existem e que
ainda existirá, quem sabe conseguirei dizer o quanto és minha vida!!! Te amo.

Aos meus irmãos Samuel e Paulinho por cada vibração.

À minha sogra Enilda pelas orações e carinho de mãe.

Às minhas cunhadas Rosane, Eliane, Cristiane e cunhado Carlos Ramalho e à Alessandra: Já


não mais os considero parentes emprestados, mas irmãos de sangue.

À minha igreja pelo sonho compartilhado.

Aos meus colegas de sala pelas dicas e “empurrãozinhos” e também pelo companheirismo.

Ao Pablo, Valéria e Amiel: Se Deus me deu a luz neste curso, vocês me deram cor.

Ao meu orientador Gilmar pela sapiência emprestada, dedicação e paciência. Valeu brother!!!

A todos os professores deste curso que me formaram um teólogo. Um abraço em lágrimas de


felicidade. A honra é toda de vocês!

Ao Ludgero por um dia ter cruzado meu caminho: Cara, você é de grande valia para mim.
Obrigado por existir.

Ao Ricardo Tavares e família pelo companheirismo: Parte da minha vida foi marcada pela
nossa amizade e com certeza o resto dela também. Agradeço a você por ainda andar ao meu
lado.

Ao Gustavo Lima: Realmente adquiri um ótimo estabelecimento... mas é porque você e seus
pais estão lá.

Ao Flávio Gomes (in memoriam): Nunca te esquecerei.

Ao Ailton: Esta monografia existe porque você me ajudou... tanto pelo empréstimo de seu
Notebook quanto por suas dúvidas. Obrigado.

Ao Fernando e Carla: Vocês são especiais em minha vida.

A todos os meus amigos que, por falta de espaço nesta folha ou por falha na minha memória
RAM não foram citados. Contudo, todos estão em meu coração. Obrigado!

A todos que se preocupam com a paz e com a justiça; que buscam com humildade e
sinceridade a Verdade; aos que cheiram vida: Obrigado. Esta pesquisa é de vocês.
5

“Não sois vós para mim, ó filhos de Israel, como os filhos dos etíopes? Diz o SENHOR. Não
fiz eu subir a Israel da terra do Egito, e de Caftor, os filisteus, e de Quir, os siros?”
(Amós 9:7)
6

RESUMO

O tema maior em que esta pesquisa se encaixa é o da relação entre o termo “religião” e
cristianismo. Especificamente, o objetivo é refletir sobre o termo “religião”, com seus
conceitos adquiridos através dos tempos juntamente com suas adaptações feitas pelas demais
religiões e mais especificamente pelo cristianismo. Nesta pesquisa busca-se traçar brevemente
a história do termo “religião” juntamente com cristianismo, sua história e seu
desenvolvimento e resultados obtidos nessa interação. Percebeu-se que nessa interação o
conceito de religião passou de qualitativo para algo substantivado, fazendo com que a idéia de
religião se tornasse algo diferente de tempos atrás. Refletiu-se sobre o cristianismo e sua
soteriologia mostrando possíveis problemas na teorização da mesma que se deu, em partes,
pela leitura reducionista de se ver como uma religião superior. Ao final da pesquisa conclui-se
que a religião cristã participa veemente da salvação, contudo sua dogmatização do tema é algo
ainda reduzido, pois não chega a uma conclusão plausível. Logo o cristianismo é uma religião
de experiência e resultante das experimentações da fé em Cristo Jesus, que é seu marco
principal e crivo para análise de todas as coisas.

Palavras-chave: Religião, cristianismo, religião cristã, salvação, ser humano, soteriologia,


desenvolvimento histórico, história.
7

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO................................................................................................ 08

2 RELIGIO E SUA TRANSFORMAÇÃO HISTÓRICA................................... 10

2.1 O termo “religio” e suas adaptações históricas.................................................. 10


2.2 O cristianismo como religião ............................................................................ 12
2.3 Dimensão salvadora do termo “religião”........................................................... 16
2.4 Síntese................................................................................................................ 18

3 A RELIGIÃO CRISTÃ E SUA DIMENSÃO SOTERIOLÓGICA


ATRAVÉS DA HISTÓRIA......................................................................................... 20

3.1 O cristianismo em surgimento .......................................................................... 20


3.2 O cristianismo Antigo........................................................................................ 23
3.2.1 Percepções soteriológicas no cristianismo antigo.................................. 25
3.3 O cristianismo da Idade Média.......................................................................... 26
3.3.1 O Escolasticismo: Sua importância para a eclesiologia da época.......... 27
3.3.2 Os pré-reformadores............................................................................... 30
3.3.3 Percepções soteriológicas no cristianismo medieval..............................31
3.4 O cristianismo moderno..................................................................................... 32
3.4.1 A Reforma.............................................................................................. 33
3.4.2 Sobre a Igreja Católica Romana............................................................. 34
3.4.3 Da Reforma para as igrejas protestantes: Características e doutrina..... 37
3.4.4 Percepções soteriológicas no cristianismo moderno.............................. 40
3.5 Síntese................................................................................................................ 41

4 SALVAÇÃO E RELIGIÃO: CONTRIBUIÇÕES PARA O DIÁLOGO


INTER-RELIGIOSO.................................................................................................... 42

4.1 A religião como progresso histórico.................................................................. 42


4.2 A salvação como dimensão divina e humana.................................................... 44
4.3 O elemento principal para a salvação no cristianismo....................................... 46
4.4 A religião cristã: codificação sobre o sagrado................................................... 47
4.5 Síntese................................................................................................................ 49

5 CONCLUSÃO.................................................................................................. 50

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS........................................................................51
8

1- INTRODUÇÃO

O objetivo desta pesquisa é mostrar como que o termo “religião” se transformou


através da história e como que nessa transformação o cristianismo, após usar o mesmo,
participou destas transformações, especialmente na sua compreensão soteriológica.
Por ser um tema amplo, o específico desta pesquisa é de identificar quais mudanças
significativas ocorreram no cristianismo ao se ver como religião e, diante disso, perceber as
implicações benéficas e maléficas que pode ocasionar ao mesmo e como a compreensão sobre
o que seja salvação fica condicionada. Portanto a pesquisa apropriou-se de alguns objetivos
específicos: 1) Apresentar o termo “religião” e suas modificações na história e no ato de sua
apropriação pelo cristianismo; 2) identificar, no decorrer da história do cristianismo, como sua
compreensão enquanto religião sobre salvação se transformou juntamente com o termo
“religião”; 3) apresentar o cristianismo como possibilidade política1 no que tange à sua
compreensão soteriológica.
A metodologia empregada é de pesquisas bibliográficas. Apesar de se pesquisar
especificamente a religião cristã o trabalho optou por não desprezar as demais religiões muito
menos inferiorizar o cristianismo diante das mesmas. Neste trabalho o termo cristianismo diz
respeito a toda comunidade que se identifica com Cristo, já que este é o marco inicial da
religião cristã.
O presente trabalho está estruturado em três capítulos, além da introdução e da
conclusão. No primeiro capítulo o objetivo foi de apresentar como o termo “religião” aparece
no surgimento do cristianismo e, após ser abordado por este, tal capítulo busca apresentar as
mudanças sutis, contudo significativas que ocorreram após esta apropriação. Julga-se como
importante tal averiguação já que o termo “religião” sofreu modificações por influências
externas. Tais modificações fizeram com que o cristianismo se portasse diferentemente
durante sua história.
Portanto no segundo capítulo julgou-se relevante apresentar como que se deu a história
do desenvolvimento cristão durante sua caminhada de fé, dando ênfase à sua soteriologia
desenvolvida no decorrer da história. Isso é de grande valia para perceber que em cada
momento histórico o cristianismo afirmava ter a revelação final sobre o que seja salvação e
como ela se dá. Entretanto sempre novas elaborações surgiam. Lendo o cristianismo com os
“óculos” do termo “religião” que foram apresentados no primeiro capítulo fica mais fácil
1
Entende-se por política como sendo uma habilidade no trato das relações humanas, com vista à obtenção dos
resultados desejados. Para maiores esclarecimentos ver dicionário Aurélio, verbete “política”.
9

perceber que o cristianismo mais participa da salvação do que consegue elaborar teoricamente
sobre ela.
Logo, o quarto capítulo trabalha a possibilidade de o cristianismo ser uma leitura
válida da salvação pelo fato de este experimentar, durante sua trajetória, a própria salvação.
Contudo o mesmo se detém em mostrar que o cristianismo não deve se pautar exclusivamente
em seus dogmas, que são resultados desta experiência, mas se pautar naquele do qual vem o
resultado, a saber, Jesus Cristo de Nazaré. O cristianismo é apresentado como resultado da
dimensão divina e humana da salvação, onde o mesmo é apresentado como progressivo e não
estático.
Interessa a esta pesquisa destacar que não se deve negar a importância das demais
religiões já que as mesmas fazem, com o mesmo intuito, a síntese entre revelação e realidade,
apesar de pressupostos diferentes entre si. Sendo assim o cristianismo é posto em pé de
igualdade podendo ser considerado superior apenas por questão de fé e não existencialmente
falando. Isso é crucial para contribuir para o diálogo inter-religioso. Nenhuma religião é
desprezada, contudo nenhuma religião é afirmada como sendo melhor que outra.
A pesquisa apenas se detém em analisar o cristianismo e sua relação com o termo
“religião”. Deste tempos remotos a humanidade buscou alguma forma de salvação através da
religião. O cristianismo participa desta história com o mesmo objetivo, contudo singular como
as demais religiões. O cristianismo possui diversas faces. Em cada face uma nova leitura
religiosa que não se iguala às demais e nem às anteriores, mas se identificam por certos
elementos que são inatos na sua composição.
10

2- RELIGIO E SUA TRANSFORMAÇÃO HISTÓRICA

O termo “religio” ou “religião” nem sempre possuiu o significado que hoje possui.
Será mostrado neste capítulo, como que se deu o surgimento e a posterior apropriação do
termo pelo cristianismo juntamente com suas elaborações mais sofisticadas para o mesmo.
Desde já é possível considerar que o termo, através da história, obteve grandes modificações e
estas interferiram grandemente na compreensão do mesmo, nunca mais proporcionando a
volta à conceituação que se tinha de início. Tais mudanças foram um processo histórico que
será mostrado a seguir.

2.1- O termo “religio” e suas adaptações históricas

Segundo Smith é equivocado aceitar o termo “religião” como sendo algo que
simplesmente explica a existência de certa instituição religiosa, ou que distingue uma
instituição das demais.2 O termo “religião” é de origem latina e passou por modificações após
sofrer uma transformação da palavra grega avle,gw, podendo ser datado até mesmo antes de
Cristo.3
Lucrécio, filósofo do século I a.C., buscava promover sua própria visão de mundo, e,
ao longo de seu poema de mais de seis mil versos, a palavra “religio”4 nasce denotando a
idéia de um ser celestial; um Ente Supremo. Contudo Cícero, nascido em 188 a.C.,
contemporâneo de Lucrécio, relaciona religião com os deuses gregos, dando à palavra
“religio” novo sentido, todavia se preocupando com uma posição de atitude.5
McGrath salienta que a definição do termo ainda está sendo discutida, entretanto “a
palavra ‘religião’ [...] se refere a ‘crenças e prática que possuem uma referência
sobrenatural’6”. Mas, Antony Giddens não aceita tal definição alegando que a idéia de
“religiões” é algo criado pela mente humana, bem como pode ser um fenômeno social.7 Smith
diz que “Religião [...] significa sujeição voluntária do ser humano a Deus”.8 A dificuldade na
definição se dá pela mutabilidade do termo através da história.9

2
Cf. SMITH, 2006, p.7-13.
3
Dando sentido de: “prestar atenção”; “cuidar de”. Cf. SMITH, 2006, p.187.
4
Apesar de escrita em latim em seus textos, não deixa de apresentar suas características helênicas. É empregada
oito vezes no singular e seis no plural. Cf. SMITH, 2006, p. 32-33.
5
Cf. SMITH, op.cit., p.32-34.
6
Cf. McGRATH, 2005, p.603.
7
Ibidem, p.603.
8
Cf. SMITH, op.cit., p.108.
9
Cf. McGRATH, op.cit., p.304-606.
11

No séc. I d.C. o termo “religio” sofre novas modificações. Nas palavras de Smith: “o
termo ‘religio’, após ter sido adotado pelos cristãos, tornou-se mais multifacetado do que
nunca e adquiriu profundidades bem novas. Mas ele não ganhou nada em clareza”.10 O termo
passou a ser usado em ritos e observâncias. Logo “um desenvolvimento inovador a partir
disso talvez seja o emprego de ‘religio’ para designar também a organização estrutural da
igreja, com seus diferentes níveis eclesiásticos”. O termo, que antes era usado para tratar
questões acerca de envolvimento com o outro ou com algo, que também se inclinava a
explicações sobre a realidade, agora já tem um significado mais amplo. Seu intuito agora é
trazer definição (conceito) e distinção (contraste) deixando para segunda instância a
preocupação com o envolvimento com “o outro”. O ápice da ampliação do sentido do termo
se dá no séc. IV. O termo “religio” passa a designar a organização estrutural da igreja com
seus diferentes níveis eclesiásticos.11
Ainda segundo Smith “pela primeira vez nessa área, aparece a noção extremamente
significativa de que, se é certo adorar a Deus de uma forma, então é errado fazê-lo segundo o
modelo alternativo do vizinho”.12 O termo “religio”, que antes era algo singular que se referia
à externalização dos sentimentos de coração de alguém, agora precisa ser usado no plural para
distingui-lo de outras instituições. Religião passa a ser instituição.13 Nas palavras de Smith:

Disso surgem dois desdobramentos. Um é o plural 'religiões', que é inviável


enquanto pensarmos em algo que acontece no coração das pessoas, como
piedade, obediência, reverência, adoração (nenhuma dessas palavras tem plural).
O plural aparece - ele se torna padrão a partir de meados do século XVII e
comum a partir do século XVIII - quando observamos de fora, abstraímos,
despersonalizamos e reificamos os diferentes sistemas de outras pessoas nos
quais não vemos sentido ou valor e cuja a validade nem sequer cogitamos em
aceitar. Em segundo lugar, há um outro conceito, o de uma ‘religião’ genérica,
para designar como uma entidade externa o sistema total, a soma de todos os
sistemas de crenças ou, simplesmente, a generalização de que existem. Esse é um
conceito formulado e usado primordialmente por pessoas que estão cansadas dos
confrontos ou estão receosos com todo o empreendimento.14

“Religio”, que antes buscava tratar assuntos universais (comum), passa então a tratar
de assuntos específicos e até mesmo diferenciados de grupos (individualidade). O termo é
utilizado para comparação de religiões. Se a partir do séc. IV já se tem modificações do termo
com relação aos grupos diferenciados pela sua cosmovisão, também dentro das religiões se

10
Cf. SMITH, 2006, p.35.
11
Ibidem, p.35.
12
Ibidem, p.36.
13
No sentido de organização de pensamentos.
14
Cf. SMITH, op.cit., p.50.
12

tem o termo “religio” “como um título, atribuído em especial a bispos ou outros clérigos”,15
como no cristianismo. O termo obteve tantas transformações que se chega a afirmar que “não
há evidências no Novo Testamento de que os cristãos primitivos estivessem conscientes de
estar envolvidos em uma nova religião”.16
O termo é trabalhado pelos Pais da Igreja em perspectiva platônica. Nesse contexto o
envolvimento ser humano-Deus, é apresentado nos termos de uma relação mística. Tal época
é considerada a mais “religiosa” da história do cristianismo, contudo, sobre o termo “religião”
não se deu tanta ênfase etimológica.17

2.2- O cristianismo como religião

Para se entender o efeito das transformações na confluência dos termos “religio” e


“cristianismo”, que é posterior àquele, deve-se antes ter em mente a origem do cristianismo.
Sua origem tem base na fé de um povo em Jesus de Nazaré, do qual veio uma nova
interpretação das Leis de Moisés. Mestre da Lei, Jesus passa a ser visto como Profeta, Senhor,
Messias, Filho do Homem e Filho de Deus. Tais títulos são conferidos a ele após serem
presenciados pelo povo milagres vindos de suas ações18 e de sua morte seguida da
ressurreição.19 Posteriormente, elaborações sobre Jesus como “Deus” surgem juntamente com
diversas outras interpretações teológicas sobre sua pessoa. Portanto, é em Jesus, também
chamado “Cristo”, que as bases do Cristianismo são encontradas.20
Antes de ser considerado como “religião”, o cristianismo era apenas uma reunião de
pessoas que confessavam, de diversas formas, sua fé no Cristo chamado Jesus.21 De acordo
com Hans Küng:

Será que alguém ainda se recorda da origem suspeita da palavra ‘cristão’?


Originou-se em Antioquia consoante o testemunho dos Atos dos Apóstolos. Ao
começar a circular na história universal, ‘cristão’ era o termo ofensivo mais do
que honroso epíteto.22

15
Cf. SOUTER apud SMITH, 2006, p.36.
16
Cf. SMITH, 2006, p.64.
17
Ibidem, p.34-41.
18
Cf. VERMES, 1995, p.9-17.
19
Cf. Mt 27.1 – 28.20; Mc 15.1 – 16.20; Lc 23.1 – 24.53; Jo 18.1 – 21.25.
20
Cf. KÜNG, 1976, p.104-105.
21
Ibidem, p. 99-102.
22
Ibidem, p.99. Ver também SMITH, 2006, p.75.
13

Küng destaca que ser cristão não está no fato de pertencer ao cristianismo, mas de
professar a sua fé no Cristo Jesus, e este de Nazaré.23 Nos primeiros séculos o que definia um
cristão era a sua fé no Cristo. O termo “cristão” é que significou o cristianismo e não o vice-
versa.24 Posteriormente e de forma sutil, o que definia quem era cristão ou não era o fato de
pertencer ou não ao cristianismo. O que antes era “religião cristã” passa a ser “cristianismo”
não se referindo mais à qualidade, todavia à instituição; denominação.25
Smith, após averiguar mais de seiscentos títulos de livros impressos em que aparecem
os termos “fé cristã”, “religião cristã” e “cristianismo” constatou que o mesmo acontece com
os termos “religião cristã”, que possui sentido mais pessoal, e “a religião cristã”, com o artigo
definido, que passa a ter conceito impessoal e institucionalizado. Com isso, “conceitos,
terminologia e atenção passam de uma orientação pessoal para um ideal, então para uma
abstração e, finalmente, para uma instituição”.26 A mudança é sutil, porém de grande efeito.
Segundo McGrath a adaptação do termo “religião” no cristianismo, ao seu modo de
ver o mundo, tornou-se viável até mesmo para as elaborações de fé. Ficou mais fácil a
sistematização das idéias quando o cristianismo deixou de ser apenas um movimento.27
Porém, o cristianismo, no decorrer de sua história passou a não observar mais o que antes era
seu ponto de valor: a liberdade do ser humano em Cristo.
A lei Judaica poderia ser utilizada como mecanismo de desumanização. E o
cristianismo era a testemunha de tal fato, até que este mesmo tornou-se escravizador do ser
humano, impondo leis e dogmas que já não mais tratavam do ser humano em relação a Deus e
sim do ser humano em relação ao cristianismo, agora portador exclusivo da salvação vinda de
Deus. Smith esboça algo sobre isto:

Em todo este estudo, pressupomos que é possível entender palavras empregadas


em determinadas situações históricas como expressivas de idéias nas mentes das
pessoas e que essas idéias eventualmente não são caracterizações finais do
universo em que vivemos. Dito em termos teológicos, levamos a sério a
possibilidade de que palavras utilizadas por pessoas não expressem
necessariamente conceitos na mente de Deus. O apelo por uma reavaliação
crítica de conceitos pressupõe que podemos ser as vítimas e podemos nos tornar
os senhores do raciocínio humano. [...] Esses termos representam conceitos na
mente de Deus, possuindo validade e permanência últimas. [...] Os conceitos
humanos mudam, e os dessas pessoas estavam mudando, em parte sob o impacto
de idéias novas, em parte sob o impacto de experiências novas, de coisas novas
que elas viam.28

23
Cf. KÜNG, 1979, p.20-21.
24
Cf. SMITH, 2006, p.75.
25
Ibidem, p.77.
26
Ibidem, p.78.
27
Cf. McGRATH, 2005, p.41-44.
28
Cf. SMITH, op.cit., p.100-101.
14

No Iluminismo a reorganização dos pensamentos de cunho mais racional se tornou


crucial. Dentre esses estudos o estudo filológico tornou um vasto campo para pesquisa.
Durante e depois do Iluminismo a crítica filológica buscou mostrar como os termos mudaram
de seu sentido chamado “original” e como essa mudança poderia modificar também aquele
quem iniciou a mudança. Destaca-se, neste aspecto o trabalho de Nietzsche. Dotado de
espírito crítico contra o cristianismo, ele escreveu a obra O Anticristo, onde através da
filologia e filosofia, ele busca mostrar as mudanças nos termos usado pelo cristianismo, dentre
estes, o próprio termo “cristianismo”.29
O estudo filológico serviu para mostrar que muitas mudanças ocorreram dentro do
cristianismo e na sua forma de pensar “religião”. O que antes era de valor no pensamento
cristão agora já não mais necessita ser. Infere-se que cristianismo, em seu início de história,
valorizava a história de Jesus,30 passando então para o conceito sobre Jesus,31 indo então para
a melhor categorização sobre o que falaram de Jesus Cristo,32 não esquecendo sobre quem faz
ou não parte da Igreja de Cristo,33 chegando à época atual valorizando ou um conjunto de
regras ou preceitos sobre Jesus Cristo e a Igreja,34 ou um conjunto de textos e valores
tradicionais adquiridos através da história.35
Sobre isso Smith diz que com o passar dos tempos a fé dos cristãos em Deus
especificamente não tinha a mesma importância como a fé que os cristãos tinham no
cristianismo. Portanto, quando estes cristãos já não mais encontravam plausibilidade nas suas
relações pessoais com Cristo, eles passaram a se dedicar à religião, e esta no sentido
institucional. Em tempos hodiernos cristãos dizem crer no cristianismo ao invés de dizer que
crêem em Deus e em Cristo; preferem proclamar as doutrinas cristãs em vez de salvação, boa-
nova e redenção encontradas no Evangelho cristão; por fim, praticar o cristianismo em vez do
amor. Além do mais, cristãos contemporâneos já têm em suas mentes que é no cristianismo
36
que se encontra salvação, no lugar que antes era ocupado pela agonia e amor de Deus.
Smith conclui: “Um cristão que leva Deus a sério deve reconhecer certamente que Deus não

29
Cf. NIETZSCHE. In: Os Pensadores. 1999, p.393-396.
30
Cf. At 4.8-12.
31
Diz-se sobre os credos Apostólico, Niceno e Calcedônio. Cf. GRUDEM, 1999, p.996.
32
Fala-se do período escolástico onde grandes teólogos católicos buscavam, filosoficamente, raciocinar sobre a
pessoa de Jesus bem como seus feitos. Cf. McGRATH, 2005, p.79-84.
33
Sobre a definição de “Igreja”. Cf. GRUDEM, 1999, p.1021.
34
Arremetendo o pensamento aos conceitos católicos. Cf. CNBB, 2007, p.38-69.
35
Referindo-se à confissão de fé protestante e sua alegação de que somente as Escrituras possuem total
autoridade.
36
Cf. SMITH, 2006, p.119.
15

se importa em absoluto com o cristianismo. Deus se preocupa com pessoas, não com as
coisas”.37
O cristianismo possui uma noção especifica de salvação. Inicialmente a igreja não se
preocupava com as demais “religiões” porque ainda não tinha nascido a idéia de “religião
enquanto instituição”. Ela se voltava à imitação de Jesus e à preocupação com a busca pelo
outro. Ao se mudar a compreensão do termo religião ficou claro que já não é mais o ser
humano, em sua iniciativa, que se liga em Deus, todavia a instituição religiosa que faz este
trabalho na forma que se compreende hoje.
Outro fator que deve ser analisado é que quando se muda o significado de um termo
como foi o de “religio”, demais termos ligados a este também têm seus significados mudados,
como é o caso do termo “fé”. Nos primórdios da fé cristã, este termo não dependia de uma
ligação com uma instituição, o que conseqüentemente não obrigava esta “fé” a se ligar a um
conjunto de regras para defini-la. Com a valorização da instituição pelo seu adepto é que este
termo não mais se viu livre de regras que agora passam a defini-lo como certo ou errado.38
Portanto, esta “fé” cristã passou a ser, com o passar dos tempos, uma forma de
expressar uma religião ou até mesmo ser uma religião. Sendo assim, dever-se-ia considerar
toda a fé presente no mundo hoje como religiões.
Segundo Smith apenas Mani estava consciente de estar fundando uma religião. Outras
religiões, como no caso dos muçulmanos, acreditam que o próprio Deus a fundou. E não só
esta, mas muitas outras também acreditam estar por uma fundação divina.39 Essa crença de
que Deus fundou pessoalmente uma religião exclui qualquer tentativa de mudança da mesma
pelas mãos humanas. O fato de religiões se comportarem dessa maneira não permite o ser
humano realizar melhorias na mesma que, segundo Smith, pode estar causando males aos seus
adeptos pelo fato de esta não observar as mudanças necessárias na religião, ou por não
observar as mudanças obtidas em sua caminhada que impedem ou deturpam novas
interpretações de fé.40
A mudança deve partir da própria religião quando esta percebe que o mesmo que a
moveu na busca de uma esperança moveu também os demais.41 Küng destaca que:

Cada religião em concreto é uma mistura de fé, superstição e descrença. Mas


poderá um cristão deixar de ver com que empenho e concentração os homens das

37
Cf. SMITH, 2006, p.120.
38
Ibidem, p.164-165.
39
Ibidem, p.102.
40
Ibidem, p.100.
41
Cf. KÜNG, 1976, p.75.
16

religiões universais se puseram incansáveis em busca da verdade e também a


encontraram?42

Segundo Smith a mudança na compreensão de que apenas a fé de alguém ou de algo é


certa deve começar a ser mudado dentro de seu próprio meio de convívio. Se alguém coloca a
sua palavra como sendo a de Deus e esta se corrompe através da história ficará evidente que
não só aquele que criou tal dogma ou regra virou vítima de si mesmo como também trouxe
consigo diversas outras vítimas.43 Portanto, se alguém preza pela vida do próximo, e aqui
entra o cristianismo, esse deve compreender que “o fim da ‘religião’, no sentido clássico de
seu propósito e objetivo, aquilo para o qual aponta e para o qual pode conduzir, é Deus”.44 O
cristianismo não deve deter a palavra de Deus, porém levar seus adeptos à mesma.

2.3- Dimensão salvadora do termo “religião”

Segundo Drewermann religião está muito ligada à salvação. Isso se dá pelo fato de
esta não se perguntar sobre o mundo, mas de tentar localizar para o ser humano lugares de
abrigo, amor, esperança ante a realidade da morte.45 Ele acrescenta que religião nasce após o
ser vivo “sentir a morte como um problema individual”46 e quando este se vê em relação com
a natureza.47 Durante anos, em todo o período moderno e início do contemporâneo, percebeu-
se o quanto a filosofia questionou a religião sobre uma definição sobre Deus, o ser humano,
suas relações, que implicaram várias vezes em conclusões negativas sobre religião e
divindade.48 Contudo a religião não foi abolida, tendo adeptos nas mais diversas instituições.
A religião, desde seus primórdios, teve na sua intenção, livrar o ser humano do medo e
da insegurança que a própria vida lhe oferece.49 É diante dessa ameaça que o ser humano, na
sua vontade de alcançar algo melhor para sua vida, devotando sua confiança em algo ou
alguém que o livre de tal mal. Mas ainda que o ser humano tenha essa vontade e ainda que
faça parte de uma religião, esta não tem o poder de ser sempre boa para si. A religião, quando
elaborada a partir de pensamentos errôneos sobre a realidade e o mundo que cerca esse
indivíduo juntamente com ações inapropriadas para com a natureza, passa a ser ineficiente e

42
Cf. KÜNG, 1976, p.74.
43
Cf. SMITH, 2006, p.100.
44
Ibidem, p.183.
45
Cf. DREWERMANN, 2004, p.28.
46
Ibidem, p.28.
47
Ibidem, p.73.
48
Cf. SAYÃO, 2001, p.36-39.
49
Cf. DREWERMANN, op.cit., p.77-78.
17

até mesmo maléfica em seus propósitos.50 Portanto a religião não só liga o ser humano a Deus
como também ao seu meio de convívio, fortalecendo a passagem bíblica que diz: “ame o
Senhor, o seu Deus, de todo o seu coração, de toda a sua alma, de todo o seu entendimento e
de todas as suas forças. [...] Ame o seu próximo como a si mesmo”.51 A religião deve passar
por uma releitura de si mesma. Essa é a crítica de Drewermann que diz:

Tanto mais, porém volta-se para nós a questão se nós seres humanos queremos
permanecer do jeito que vemos por toda a parte, se podemos existir concordando
com a perspectiva de que também para nós seres humanos não deve haver um
mundo diferente. [...] Precisamos de uma alternativa para a biologia pura e
simples, para nos definir como seres humanos. Aí é que começa a religião, e aí
estaria o sentido da fé criacional dos cristãos.52

Porém Drewermann prefere dar ênfase a apenas uma característica da religião, que é
da interioridade da mesma no indivíduo, que o leva a perceber a realidade e então agir na
mesma de forma coerente. Não é de interesse aqui criticar tal visão, apenas de perceber sua
colocação como algo que mostra a responsabilidade do ser humano na religião. Para ele, Deus
coloca no ser humano essa responsabilidade para que o mesmo seja livre em suas ações,
todavia não fugindo de suas responsabilidades que coadunam com as de Deus. Logo, percebe-
se que não só o ser humano tem sua ação na religião, mas Deus também contribui com sua
parcela na dimensão religiosa.53
É da natureza da religião elaborar teses para o melhor entendimento possível da
realidade que cerca o ser humano. Com isso a religião passa a ter seu papel importante
enquanto instituição para o ser humano e para sua relação com o próximo, com seu meio,
consigo mesmo e com Deus. A instituição religiosa é relevante, não importando aqui sua
confissão de fé. Isto é perceptível tanto na leitura de Smith quanto na de Drewermann, que
tentaram deixar claro em suas pesquisas sobre diversas religiões e com mais afinco o
cristianismo. A religião, por ser uma elaboração histórica, tem por característica a opção de
escolhas durante sua caminhada de fé. Isso vale tanto para as escolhas do indivíduo quanto
para as escolhas da instituição.
A tradição cumulativa que Smith trabalha mostra a importância das elaborações
teológicas nas religiões. O ser humano, quando inserido na realidade de sua religião, promove

50
Cf. DREWERMANN, 2004, p.10-12, 41.
51
Cf. Mc 12.30-31a.
52
Cf. DREWERMANN, op.cit., p.92.
53
Ibidem, p.79.
18

em si uma re-elaboração de sua identidade. O adepto da religião, seja qual for, passa a se ver
como uma nova pessoa, sendo definida e, ao mesmo tempo, definindo a religião.54
No cristianismo não é diferente. Sua forma de ação em determinado período histórico
provoca e sofre mudanças nas características, tanto do participante, quanto da instituição, a
qual é constituída de participantes.55 Küng mostra claramente como foi a mudança de
paradigmas na teologia cristã no auge da 2ª guerra mundial, que era anti-semita e, após
realizada as barbaridades com o povo judeu, a teologia anti-semita é deixada de lado para ser
adotada uma teologia mais inclusiva.56 Este período foi crucial para as mudanças nas
teologias em prática hoje. Isso ajudou na evolução da interpretação bíblica, onde passa a ser
aceito a Bíblia como um compêndio de textos que contam uma história sobre um povo e que
possui uma “revelação progressiva” sobre Deus e sobre suas ações.57
Para se pensar então em uma correta compreensão do desenvolvimento histórico do
cristianismo, e não só deste como das demais religiões, seria de grande relevância uma
observação no desenvolvimento histórico no qual o cristianismo foi submetido. Essa
observação ajudará nas abordagens sobre como entender a religião e seu processo
soteriológico.

2.4- Síntese

Foi abordada neste capítulo a transformação histórica que o termo “religião” sofreu
através da história. O termo, que antes era usado para falar de envolvimento qualitativo com o
“outro” passa a ser usado para designar certa organização estrutural religiosa. O termo passa
então a ter caráter mais substantivado e menos subjetivo. “Religião” passa a designar cargos
eclesiásticos denotando certo grau de importância na organização religiosa.
Nessa nova abordagem do termo “religião” o cristianismo passa a se desenvolver
adotando-o como termo discriminador das demais religiões. Com isso a religião cristã toma
novo enfoque para seu desenvolvimento deixando de lado o termo “Cristo” adotando a
expressão “religião cristão” chegando, por fim, no termo “cristianismo”.
No Iluminismo nasce a crítica ao cristianismo alegando que o mesmo se distanciou de
seu propósito anunciando mais o cristianismo que Cristo. O termo “religião”, no que tange à
salvação, passa a ensinar uma salvação institucionalizada no cristianismo e que o mesmo, por

54
Cf. SMITH, 2006, p.145-149.
55
Cf. KÜNG, 1976, p.142-143.
56
Ibidem, p.143-145.
57
Cf. COOK apud PIERATT, 1994, p.115-124.
19

sofrer transformações na abordagem durante a história, mostra-se aberto às ações do ser


humano e a transformações pelo mesmo. A abordagem do termo ”religião” mostra-se flexível
às ações humanas, tendo então caráter humano e divino.
20

3- A RELIGIÃO CRISTÃ E SUA DIMENSÃO SOTERIOLÓGICA ATRAVÉS DA


HISTÓRIA

O presente capítulo busca apresentar o desenvolvimento do cristianismo enquanto


religião institucionalizada bem como suas percepções soteriológicas em progresso juntamente
com sua história. Apresentar-se-á aqui como o termo religião foi transformado sutilmente
dentro do cristianismo e como que tal mudança mudou consideravelmente a compreensão
soteriológica do cristianismo.
Para isso contar-se-á com a abordagem da história do cristianismo feita por Tillich
uma vez que o mesmo busca expor o desenvolvimento do pensamento cristão acerca de Jesus
Cristo e sua obra. Sendo assim, com essa abordagem de Tillich fica mais fácil trabalhar a
relação entre pensamento cristão com desenvolvimento soteriológico da religião cristã sem se
esquecer do desenvolvimento à parte do termo “religião”.
Apesar de este capítulo buscar toda atenção no desenvolvimento cristão foi optado em
usar os estudos de Gaarder mesmo sabendo que sua obra não abarca somente o cristianismo.
Tal opção se deu porque ele consegue distinguir de forma relevante as diferenças entre as
religiões e entre o próprio cristianismo nas suas subdivisões.
Caminhar-se-á apresentando, por etapas históricas, o desenvolvimento cristão
juntamente com sua percepção soteriológica, mostrando assim sua complexidade crescente a
cada instante histórico.

3.1- O cristianismo em surgimento

O cristianismo surgiu como uma religião a parte do judaísmo. Seguindo a releitura da


Lei que Jesus fez juntamente com uma nova ética pregada no sermão do monte,58 seus
seguidores fizeram com que o cristianismo tomasse um rumo totalmente particular, adotando
seus ritos, dogmas e metodologias nas elaborações das teologias. Logo, para que o
cristianismo surgisse como uma nova realidade este precisou de ferramentas para seu labor
teológico.
Em seu surgimento o cristianismo se utilizou de palavras como “kairos” para trazer
uma nova compreensão sobre o que seja o tempo dos homens (chronos) e o tempo de Deus.
Tais palavras são elaborações helênicas que foram apropriadas por Paulo e seus seguidores

58
Cf. KÜNG, 1976, p.140-146.
21

para dialogar com o espírito da época. Tal termo ajudou a igreja a se expressar juntamente
com sua revelação em Jesus Cristo, que segundo o pensamento cristão que já estava em vigor
na época, o advento “Cristo” era o kairós de Deus.59
Nos anos iniciais da era cristã o Império Romano era o império dominante. Este não se
interessava em religiões especificamente, apenas com a humanidade num todo. O Império
Romano detinha o conhecimento filosófico grego, o qual estava no auge nesta época, fazendo
com que, futuramente a igreja, após ser aceita como religião do Estado, adotasse esse método
de leitura da realidade. A filosofia helênica contava com estóicos, dos quais vinham a
preocupação com a moral e a ataraxia como o ideal do sábio, epicureus, que acreditavam que
o prazer era o bem soberano, neo-pitagóricos, mais voltados à matemática e à geometria
juntamente com as demais ciências de correspondentes numéricos, céticos, dos quais vinha a
crença de que o homem não pode chegar a qualquer conhecimento indubitável, e neo-
platônicos, influenciados por Platão e pela sua teoria das idéias, dos quais visava toda a
meditação filosófica ao conhecimento do Bem, Bem este que era considerado suficiente para
a implantação da justiça e do Estado.60 A fonte do pensamento cristão se encontra aqui. Como
diz Tillich: “O cristianismo primitivo não foi influenciado tanto pela filosofia clássica, mas
pelo pensamento helênico”.61
O ceticismo também contribuiu bastante para o desenvolvimento cristão. Isso se dá
pelo fato do ceticismo não ser, nesta época, escolas totalmente voltadas à filosofia. Possuíam
rituais cúlticos por acreditarem que a sapiência vinha dos deuses. O ceticismo considerava
seus líderes como “grandes mestres” ou até mesmo como salvadores. Tal compreensão fez
com que os seguidores de Jesus creditassem a este as mesmas idéias creditadas aos líderes
céticos da época, mesmo sabendo que Jesus não era um cético.62
Ainda segundo Tillich as tradições platônicas juntamente com o estoicismo também
tiveram papéis importantes. Idéias como da transcendência, do mundo material e do essencial
e da providência influenciaram muito o cristianismo primitivo em suas elaborações de fé.
Ainda na idéia de mundo material e essencial grande influência exerceu Aristóteles no
cristianismo com sua idéia de que o divino é forma sem matéria, perfeito em si mesmo,
atraindo tudo a si em amor. Tais sumas ajudaram o cristianismo em seu desenvolvimento.63 Já

59
Cf. TILLICH, 1967, p.17.
60
Ibidem, p.18-19. Ver também FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Aurélio século XXI: o dicionário
da língua portuguesa. 3.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
61
Ibidem, p.18.
62
Cf. TILLICH, op.cit., 19-21.
63
Ibidem, p.21-22.
22

o estoicismo contribuiu com sua idéia de que todos participam do Logos universal64, portanto
todos são participantes em potência na razão. No quesito salvação, cristianismo e estoicismo
se chocam até hoje porque o cristianismo adotou a idéia da salvação por meio da intervenção
da graça divina enquanto os estóicos adotaram a salvação por meio da sabedoria.65
Devido o judaísmo ter feito a adoção da idéia sobre Deus como sendo um ser mais
transcendental, mais influenciada pelo helenismo e pelo fato da figura do Messias passar a ser
vista como um rei de um paraíso juntamente com o aumento dos nomes dados a Deus bem
como a aceitação do “Espírito de Deus” como figura de elaboração teológica de interação
entre o ser humano e o Deus transcendente a repercussão se dá fortemente no cristianismo em
seu início. Tendo Deus como totalmente transcendente faz com que santos eleitos pelos fiéis
da igreja passem a ser mediadores do povo bem como venerados, mas não adorados. A
teologia inicial do meio cristão passa a ter seus pilares nessas modificações últimas do meio
judaico.66
Apropriações de discurso feitas pelo judaísmo com relação às religiões vizinhas
também serviram para moldar no cristianismo certas características como: participações
místicas divididas em estágios para os iniciantes na religião; rigoroso processo de separação e
preparo para a participação de celebrações de cerimônias evitando assim qualquer tipo de
profanação do culto pré-estabelecido.67
Portanto em seu início o cristianismo passou por duas características metodológicas de
elaboração de fé cristã: a recepção das teologias advindas de meios externos do judaísmo e a
transformação das associações teológicas que culminaram nos textos do NT68. No que tange
às transformações teológicas, na cristologia percebe-se a associação de termos como
“Messias”, que em grego se traduz como Christos69, a Jesus pelos primeiros discípulos
extrapolando em partes a interpretação comum do termo na época70. O termo “Filho do
Homem” que pode ter sido usado pessoalmente por Jesus, diferente do termo Messias que foi
evitado por ele buscando não ser visto como libertador de seu país71, contudo o conceito não
era adequado para Jesus já que o “Filho do Homem” deveria vir em poder e grande glória.
“Filho de Davi” também foi usado, porém extrapolado de seu sentido original por Jesus

64
Considerado por eles como o poder divino. Ver TILLICH, 1967, p.22.
65
Cf. TILLICH, 1967, p.22-23.
66
Ibidem, p.24-26.
67
Ibidem, p.27-28.
68
Lê-se “Novo Testamento”.
69
Cf. GAARDER, 2000, p.155.
70
Cf. TILLICH, op.cit., p.28.
71
Cf. GAARDER, op.cit., p.155.
23

quando ele “disse que o próprio Davi considerava o Messias seu Senhor”.72 Outros títulos
como “Filho de Deus”, “Kyrios”, “mestre” e “Logos” também tiveram suas elaborações
seguidas de aplicações, todavia com limitações e adaptações.73 Tillich está com a razão em
dizer que a “grandeza do Novo Testamento consiste em ter sido capaz de usar palavras,
conceitos e símbolos surgidos na história das religiões, preservando ao mesmo tempo a pessoa
de Jesus interpretada por essas categorias”.74

3.2- O cristianismo Antigo

O desenvolvimento teológico sempre foi não-estático no cristianismo. Isso pode ser


visto no cristianismo antigo onde teologias elaboradas pelos primeiros discípulos passam a ser
relidos pelos pais da igreja trazendo novos conceitos para o mesmo.
Devido à preocupação com o meio pagão, o cristianismo passa a elaborar sistemas de
combate às chamadas heresias de povos não-cristãos, mais conhecidos nesta época como
povos pagãos. Visando a vida das congregações os pais da igreja buscavam elaborar sistemas
de fé que politizassem as mesmas idéias religiosas nas diversas comunidades cristãs que, nem
sempre se encontravam próximas uma das outras. Essas elaborações se desenvolveram e
resistiram até que recebessem o título de católico75 já que englobavam o pensamento de todos.
Aqui começa a se perceber a troca dos antigos legados dos profetas por normas e observações
escritas que são perceptíveis nas cartas chamadas pastorais do NT.76
O desenvolvimento inicial do cristianismo não contava com a definição de quais livros
seriam aceitos no cânon do NT, o que foi decidido ao longo de duzentos anos. A cristologia
também foi uma marca do cristianismo já que isso diferenciava o cristianismo do judaísmo. O
cristianismo enquanto igreja, que vem do termo ekklesia, buscou se configurar ao termo já
que para o judaísmo isso não foi possível porque o termo se referia aos chamados de todos os
povos e não de um apenas. A organização da igreja era entregue ao bispo, que era eleito pela
congregação por critérios definidos que, sendo representante do Espírito de Deus, passava a
determinar o que era ser um cristão em detrimento às demais etnias. Apesar de não ter sido

72
Cf. TILLICH, 1967, p.28.
73
Cf. GAARDER, 2000, p.156-157.
74
Cf. TILLICH, op.cit., p.29.
75
Que significa universal.
76
Cf. TILLICH, op.cit., p.31-32.
24

uma aceitação simples e fácil a sucessão apostólica passou a ser aceita no final da idade antiga
e início da idade média.77
Nesta época o desenvolvimento teológico cristão buscou uma melhor elaboração.
Idéias criacionistas como a de Clemente e sua idéia do Demiurgo78 como sendo aquele que
criou o mundo material, considerado mal, juntamente com todos os elementos que o compõe,
que veio a influenciar não somente a confecção do credo apostólico e posterior o niceno,
como também a idéia de um suposto plano de salvação de Deus, elaborado por Inácio. Ainda
sobre os credos estes vieram para distinguir o cristianismo das demais religiões visando o
não-sincretismo e prevenindo cisões internas entre as comunidades cristãs. Posteriormente os
credos viriam acompanhados de dogmas (doutrinas) visando um ensino mais correto.79
No campo da soteriologia, Inácio busca desenvolvimento falando sobre a “economia
para o novo homem” que professa um pensamento trinitário (Pai, Filho e Espírito Santo)
colocando o judaísmo como uma “direção” ao cristianismo que, tendo Cristo como o novo
homem, dissipa a corrupção do velho homem vencendo este, a morte e caminhando então
para uma cristologia mais avançada.
Já a cristologia trabalha termos como “gnosis”, “sarx”, “soma”, “homoousios”, “zoe”,
dentre outros mostrando que Cristo é athanatos gnósis (imortal) combatendo então o
gnosticismo e o docetismo.80 Estas elaborações não tinham somente o interesse de se abstrair
para conhecer, mas se achegar para vivê-las. Nas palavras de Tillich:

Sem essa participação, a verdade não era possível e o conhecimento seria apenas
abstrato e sem sentido. Era o que queriam dizer quando combinavam
conhecimento e ser. A participação no novo ser era participação na verdade, no
verdadeiro conhecimento.81

Nesta época surgem os apologistas que buscavam defender o cristianismo contra


acusações feitas por uma autoridade ou por um mero acusador. Basicamente duas acusações
contra o cristianismo foram as que mais se destacaram no meio apologético: (1) as crenças
advindas de certos grupos que achavam que o cristianismo se demonstrava como uma ameaça
contra o Império Romano e (2) as acusações de filósofos que diziam que o cristianismo não
passava de superstição misturada a fragmentos filosóficos. Nesse meio apologético se

77
Cf. TILLICH, 1967, p.33.
78
Ibidem, p.34.
79
Cf. GAARDER, 2000, p.164.
80
Cf. TILLICH, op.cit., p.36. Ver também McGRATH, 2005, p.56-57.
81
Ibidem, p.36.
25

destacou grandes nomes e sumas cristãs, contudo tais ataques apenas serviram para o
cristianismo como ajuda ao seu crescimento. Diz-se isso devido a três fatores: (1) O
denominador comum: o cristianismo conseguiu explicar os ataques buscando sentido nos
argumentos tanto para os pagãos, de onde vinha tais ataques, quanto para os cristãos. (2) Os
apologistas aproveitaram a oportunidade para mostrar ao paganismo sua vulnerabilidade. Os
apologistas mostravam os defeitos de suas idéias. E (3) o cristianismo conseguiu o
cumprimento das expectativas pagãs.82

3.2.1- Percepções soteriológicas no cristianismo antigo

No cristianismo antigo se encontra a base de todo o desenvolvimento soteriológico do


cristianismo atual. Sua base é Cristo e sua morte e redenção.83 É nesse período que começam
o desenvolvimento das idéias de monergismo e sinergismo, onde Deus atua sozinho para
salvar o ser humano e onde tanto Deus quanto o ser humano atuam mutuamente para a
salvação respectivamente. Os maiores representantes destas idéias são Agostinho e Pelágio.84
A salvação nesta época se dava pelo arrependimento para com Deus e a fé em Cristo85
Segundo Berkhof:

A fé era usualmente tida como o notável instrumento para o recebimento dos


méritos de Cristo, e com freqüência era reputada de único meio da salvação.
Compreendia-se que a fé consistia de verdadeiro conhecimento de Deus,
confiança nEle e entrega pessoal a Ele, tendo como objeto especial a Jesus Cristo
e o Seu sangue expiatório. Essa fé, e não as obras da lei, era prezada como o
meio de justificação.86

Sobre Pelágio não se tinha a idéia de que a fé anulasse as obras, contanto que as obras
não anulassem a fé. Todavia este afastou muito do ensino bíblico em relação aos demais pais
da igreja.87 Havia o conflito entre a salvação pela fé e a necessidade de justificação pela fé
entre alguns pais da igreja. Não se encontram pensamentos nesta época como elaborações fora
dos textos bíblicos, aliás, repetiam somente o que achavam na Bíblia.88
O arrependimento também era um pré-requisito para a salvação do ser humano. Tal
termo é de difícil conceituação, mas sabe-se que sua manifestação era na forma de atos

82
Cf. TILLICH, 1967, p.37-39.
83
Cf. McGRATH, 2005, p.466.
84
Ibidem, p.59-61.
85
Cf. BERKHOF, 1992, p.183.
86
Ibidem, p.183.
87
Ibidem, p.185.
88
Ibidem, p.184.
26

penitenciais. Esses atos enfatizavam as boas-obras, contudo estas eram obras de abnegação
enfatizando a doação de esmolas, abstinência do matrimônio, entre outros que eram
considerados méritos especiais e coordenados com a fé como meios de garantir o favor
divino.89
É também nos Pais da Igreja que se encontra o leve deslize para o ritualismo. Segundo
Berkhof:

Prevalecia [...] a idéia que o batismo tem o dom de perdoar os pecados passados,
e que o perdão para os pecados cometidos após o batismo pode ser obtido pela
penitência. Além disso, ia ganhando terreno, gradativamente, o pensamento que
as boas obras de alguns, sobretudo os sofrimentos dos mártires, podem servir
para expiar pelos pecados dos outros.90

3.3- O cristianismo da Idade Média

O marco de início da Idade Média se dá com a ascensão do bispo Gregório Magno ao


papado91, onde a igreja passa a ter um desenvolvimento dos chamados “sacramentos”, da
escolástica e de sua hierarquia.92 Para uma melhor compreensão do desenvolvimento do
cristianismo na Idade Média poderia ser dividida a história deste período em 4 momentos: O
período de transição, que data do ano 600 a 1000; a primeira Idade Média, do ano 1000 a
1200; a Alta Idade Média, de 1200 a 1300; e a Idade Média posterior, que vai de 1300 a
1450.93
No período de transição à Idade Média, o cristianismo procurou preservar algumas de
suas características dando margem à assimilação de outros pensamentos.94 Nesse período a
Igreja se encontrava unida com o Estado, tendo a responsabilidade de governar as cidades que
estavam em seu poder através dos bispos.95 Isso contribuiu para a mudança no pensamento
eclesiológico.

89
Cf. BERKHOF, 1992, p.184.
90
Ibidem, p.185.
91
Cf. TILLICH, 1967, p.133.
92
Ibidem, p.134-136.
93
Ibidem, p.133.
94
Ibidem, p.133.
95
Cf. CAIRNS, 2005, p.99-101.
27

3.3.1- O Escolasticismo: Sua importância para a eclesiologia da época

Três movimentos nasceram neste período, os quais ajudaram a igreja em seu


desenvolvimento. No primeiro, o escolasticismo, que tratava da explicação metodológica da
doutrina cristã, ajudou a igreja a se justificar mediante pensamentos que nasciam no
movimento inicial da arte romanesca, que vai ter seu apogeu mais tarde, no segundo período
da Idade Média. O misticismo, que é o segundo movimento, nasceu dentro do escolasticismo,
mas que não abrangia este totalmente já que, segundo Tillich, os místicos “experimentavam
em suas vidas pessoais as coisas de que falavam”.96 E o terceiro, o biblicismo, buscava na
Bíblia fundamentos para o cristianismo prático. Este influenciou na Reforma do século XVI.97
Para o método escolástico a autoridade residia na tradição da igreja vinda dos pais, nos
credos e nos concílios e na Bíblia. Logo percebe-se o deslocamento da autoridade da igreja
para sua história e seu desenvolvimento, o que não era pregado pela igreja primitiva. No
escolasticismo buscava-se a harmonia entre tradição e conduta, já que na tradição se percebia
muitas contradições. Na busca da harmonia nas decisões práticas a escolástica adota a razão,
que no caso é filosófica, como principal parâmetro para isto, deixando a fé, que se apresenta
como mais subjetiva, em segundo plano, criando então o método dialético do “sim e do não”.
Isso mais tarde recebe o título de dogmas.98
Porém a primazia da razão é questionada por um grupo mais platônico, que não
reduzia tanto a fé como o grupo mais aristotélico que teve como seu maior representante da
época Tomás de Aquino.99 Este influenciou (e influencia) até hoje o pensamento católico.
Essas influências platônicas e aristotélicas eram mais percebidas nos meios agostinianos e
dominicanos respectivamente. Este conflito de idéias demonstrou que as idéias platônicas da
época eram mais místicas enquanto que as aristotélicas eram mais racionais e empíricas.100
No decorrer do raciocínio escolástico juntamente com o desenvolvimento hierárquico
da igreja, a razão e a autoridade são separadas. A autoridade não precisava passar pelo crivo
da razão. Nessa concepção a autoridade passa a ser mandatória já que não é mais necessário
compreender para ter que obedecer. Portanto, a compreensão que se tem sobre Deus é que
“sua vontade é irracional e dada”.101 Dessa forma a igreja passa a se abrir para abusos de

96
Cf. TILLICH, 1967, 135.
97
Ibidem, p.134-135.
98
Ibidem, p.136-138.
99
Ibidem, p.136.
100
Ibidem, p.138.
101
Ibidem, p.137.
28

poder em nome da fé. Contudo, “a razão voltou a ser completamente elaborada e se tornou
criativa, na Renascença”.102
Contra os abusos autoritários da igreja um grupo de inconformados surge como
sectários. São os chamados monges; adeptos ao movimento do monasticismo. O
monasticismo foi muito importante para sua época já que foram os monges que produziram
grande parte da teologia da época. Esse sectarismo surgiu por causa da distância entre o que a
igreja fazia e dizia, o que às vezes era contraditório. Estes foram considerados como que
cortados do corpo da igreja.103
Mas essa separação teve características marcantes. Os separatistas englobaram grande
parte de leigos que também não aceitavam a posição da igreja. Uma vez inseridos, os leigos
passaram a ter voz dentro do movimento. Enquanto os leigos buscavam uma leitura da
realidade a igreja buscava sua legitimação o que, às vezes, negava a realidade dos leigos. Foi
assim que adentraram no pensamento teológico da época as superstições populares. Tais
superstições tentavam associar a realidade finita com o divino.104 Portanto objetos, conceitos e
acontecimentos extraordinários como os milagres passam a ser “não apenas como indicadores
do divino, mas como poderes que continham em si o próprio divino”.105 Nas palavras de
Tillich:

A vida diária inteira acha-se dentro das paredes da catedral em forma


consagrada. Quando o povo entrava na catedral, sua vida diária se achava
representada na esfera do sagrado; quando saía da catedral, o povo levava
consigo a consagração aí recebida de volta para a vida diária. Esse é o lado
positivo da superstição. O lado negativo transparece nas formas como essas
coisas eram utilizadas: imagens, esculturas, relíquias e toda a sorte de objetos
sagrados como elementos de religiosidade supersticiosa.106

É no meio dessas superstições populares que nasce o maior envolvimento de demônios


com a realidade da criação. Estes passam a influenciar em toda vida dos cristãos que vivem
nesta época. Havia uma forte crença de que estes demônios possuíam grande poder. Essa
crença não deixou de influenciar os grandes pensadores da época como: Anselmo da

102
Cf. TILLICH, 1967, p.137.
103
Ibidem, p.142.
104
Ibidem, p.144.
105
Ibidem, p.144.
106
Ibidem, p.144.
29

Cantuária em sua forma de conceber a ação demoníaca na criação107, Bernardo de Claraval


que teve uma visão bem mística da criação, da queda e da redenção de Cristo, entre outros.108
Esse envolvimento místico trabalhou muito a visão soteriológica do povo desta época.
Na concepção mística nem sempre a Bíblia ou as teologias propostas no desenvolvimento
escolástico tinham relevância já que muita das vezes o empirismo influenciava mais
fortemente. Segundo Berkhof:

Demoravam-se sobre o que alguém precisa experimentar antes de poder ser


considerado crente verdadeiro, e nisso foram guiados primariamente, não pelo
ensino das Escrituras, e sim pelas experiências daqueles que eram reputados
“carvalhos de retidão”. [...] E antes que os homens realmente possam crer que
são filhos de Deus, precisam ser trazidos para debaixo dos terrores da lei, têm de
atravessar conflitos agonizantes, têm de sentir os reclamos acusadores da
consciência, e têm de contorcer-se nos espasmos de temível antecipação da
condenação eterna.109

Percebe-se que na parte citada de Berkhof fala sobre a consciência. Isso se deve ao
fato de que as teologias da escolástica, apesar de que no movimento místico elas não foram
adotadas efetivamente, influenciaram o pensamento místico. A teologia que trabalha a
consciência é de autoria de Abelardo de Paris.110 As influências externas são o que compõem
algo novo.
Os sacramentos também ajudavam aos fiéis a terem consciência dos atos salvíficos de
Deus. Segundo Gaarder “os sacramentos são os sinais visíveis de que Deus concede sua graça
aos humanos”.111 Os sacramentos eram, talvez, o elemento mais importante da igreja
Medieval.

Os sacramentos representavam a objetividade da graça de Cristo, presente no


poder objetivo da hierarquia. [...] Os sacramentos eram a continuação da
realidade sacramental básica da manifestação de Deus em Cristo. Em cada
sacramento, presentifica-se uma substância de caráter transcendente. [...] É um
sinal visível, sensível, instituído por Deus para ser um remédio no qual sob
formas materiais o poder de Deus age de maneira oculta.112

Os sacramentos reclamavam para si a apropriação de algo material para curar algo


espiritual ocasionado pelo pecado original e pelos pecados de cada um. Eles são necessários à
107
Essa concepção fica clara na obra Cur Deus Homo (Por que Deus se fez Homem?) de sua autoria.
108
Cf. TILLICH, 1967, p.152-170.
109
Cf. BERKHOF, 1992, p.200.
110
Cf. TILLICH, op.cit., p.159-164.
111
Cf. GAARDER, 2000, p.185.
112
Cf. TILLICH, op.cit., p.150-151.
30

salvação para os católicos. É algo bem parecido com a apropriação de objetos pela superstição
popular. O que os diferenciava era o caráter sacro dos sacramentos. Estes eram inúmeros.
Após críticas feitas pelos pré-reformadores e reformadores os sacramentos reduzidos como
sendo os mais importantes foram o batismo e a ceia do Senhor.113 Atualmente a igreja católica
reconhecer apenas sete em sua crença.114

3.3.2- Os pré-reformadores

O período anterior à Reforma, conhecido como período dos pré-reformadores, foi


caracterizado como o período de ascensão dos princípios leigos e a valorização do biblicismo
em detrimento da tradição da igreja. John Wyclif, pré-reformador inglês, foi talvez o grande
ícone desse movimento chegando a influenciar posteriormente os reformadores com suas
idéias. A Reforma detinha todos os princípios da pré-reforma estando à frente somente pela
detenção do princípio de Lutero, nascido da concepção paulina mais conhecida como
“justificação pela graça mediante a fé”. A separação entre os termos Reforma e pré-reforma
está na falta deste princípio fundamental.115
Questões como: o enriquecimento do clero, ligação entre igreja e Estado, o
autoritarismo, as indulgências, o poder de salvação nas mãos da igreja, o papado, entre outros
foram fatores muito questionados pelos pré-reformadores. O nominalismo, que tinha
características realistas como a valorização da essência das coisas, passou a mostrar que a
salvação do ser não se dá na sua obra, mas naquilo que o moveu a fazer tal obra. Logo a
desvalorização dos sacramentos se dá porque mais vale a palavra de Deus que orienta o crente
do que a obra que este faz tentando alcançar efeito.116 Destarte o papa não pode ser o vigário
de Cristo, pois é de Cristo que derivam todos os poderes espirituais. Conclui-se então que o
papa é um homem que erra e, “pela primeira vez, antes das noventa e cinco teses de Lutero,
critica-se o sistema de indulgências”117. O papa erra, segundo os pré-reformadores, em dizer
que é representante de Cristo, ao mesmo tempo que governa este mundo que se opõe a Cristo.
Assim o papa mais parece um anticristo segundo os pré-reformadores.118 Contudo:

113
Cf. TILLICH, 1967, p.150.
114
Cf. GAARDER, 2000, p.173, 185-188.
115
Cf. TILLICH, op.cit., p.189.
116
Ibidem, p.189-190.
117
Ibidem, p.191.
118
Ibidem, p.191-192.
31

A Igreja Romana não podia ser reformada por um mero movimento sectário,
embora radical, como o de Wyclif. Somente um novo princípio, ao lado de uma
nova relação com Deus, teria suficiente poder. Foi o que aconteceu com a
Reforma do século dezesseis.119

3.3.3- Percepções soteriológicas no cristianismo medieval

Foi na Escolástica que o desenvolvimento soteriológico se deu efetivamente. Melhores


definições sobre os termos “graça”, “fé”, “justificação” e “mérito” aconteceram. Neste
período há uma grande variedade de opiniões sobre esses elementos do processo salvatício.
Apesar da igreja se inclinar brandamente ao agostinianismo os escolásticos se inclinavam para
o semi-pelagianismo.120
Sobre o termo “graça” os escolásticos, por serem pelagianos e semi-pelagianos,
buscavam uma relação entre “graça suficiente” e “graça eficiente”, termos agostinianos que
mostram a limitação do ser humano na busca de sua própria salvação. Tal relação levou os
escolásticos a definirem “graça” como “qualidade ou poder sobrenatural insuflado no
homem”121 tendo como objetivo levar o ser humano a voltar-se com fé a Deus. Tal discussão
foi importante para se definir a relação entre graça e livre-arbítrio.122
Sobre a fé os escolásticos fizeram distinção entre fé, que é um afeto espiritual que
produz boas-obras, e fé como forma de conhecimento, que é conformidade com a verdade.
Mas para a época, a fé era algo que concordava com os credos e dogmas. Isso se dava porque
o clero ainda influenciava o estudo dos escolásticos dizendo que é vantajoso “salientar a idéia
que a cega submissão à autoridade da Igreja era a principal característica da fé, e alguns
teólogos chegaram mesmo a encorajar tal noção”.123
Quanto à justificação e mérito os escolásticos salientavam que a justificação se dava
pela infusão da graça santificadora por Deus cabendo ao ser humano se voltar a Deus em
vontade livre mediante a fé e contrição. No caso dos infantes a justificação é obra exclusiva
de Deus, onde este retira o pecado original através da infusão da graça.124
Quanto ao desenvolvimento da justificação do ser humano, este poderia se dar com a
infusão da graça fazendo com que o ser humano troque o livre-arbítrio por Deus e saindo da
influência do pecado, ou no momento em que a graça é infundida a contrição se torna

119
Cf. TILLICH, 1967, p.193.
120
Cf. BERKHOF, 1992, p.190.
121
Ibidem, p.190.
122
Ibidem, p.190-191.
123
Ibidem, p.192.
124
Ibidem, p.192.
32

arrependimento fazendo com que o pecado seja expulso pela graça. Logo, a diferença entre as
duas concepções é que uma a graça de Deus é que inicia o processo de transformação
enquanto na outra o processo de contrição desencadeia a salvação levando o ser humano à
graça divina.125 Mas a justificação plena não era privilégio dos cristãos em geral. Ao se ter
certeza de sua justificação o cristão era obrigado a aumentar essa justificação através de
sofrimentos por causa da religião.126 Aqui as penitências ajudavam.
A doutrina dos méritos caminhava juntamente com a doutrina da justificação. Essa era
pouco combatida pelos escolásticos. Consistia em dar ao cristão certas vantagens ao passo que
este se demonstre um bom realizador de boas-obras. Duas vertentes são encontradas aqui: A
de Tomás de Aquino que alega que o cristão, quando pratica muitas boas-obras, chega a
pertencer exclusivamente (mérito de condignidade) a Cristo diferindo-o dos demais cristãos, e
chegando, quem sabe, a ter direitos sobre o próprio Deus (mérito de congruência). E a de
Duns Scoto que afirmava que boas-obras feitas antes da justificação poderiam conceder uma
graça aumentada.127
A doutrina católica finalmente se posiciona com relação às crianças afirmando que o
pecado original das mesmas é removido com a infusão da graça por ocasião do batismo. Logo
essa penitência passa a ser realidade no meio católico.128

3.4- O cristianismo moderno

Juntamente com a reforma nasce no período moderno o renascimento. Embora o


trabalho não dê ênfase ao mesmo é muito importante dizer que é no renascimento que nascem
as idéias antropocêntricas de fato. E é no renascimento que a reforma encontra suas forças já
que o mesmo pedia a volta à antigüidade, ao que era primevo. O cristianismo moderno, ao
contrário do medieval, já não tem efetivamente Deus como centro de todas as coisas, mas o
ser humano.129 Isso se deu no renascimento e proporcionou uma mudança significativa na
visão sobre o que seja religião e seu poder de intermediação na salvação, como era pregado na
era medieval.

125
Cf. BERKHOF, 1992, p.192.
126
Ibidem, p.192.
127
Ibidem, p.193.
128
Ibidem, p.193.
129
Cf. McGRATH, 2005, p.75-79.
33

3.4.1- A Reforma

A reforma aconteceu no séc.XVI devido às diversas mudanças que a Europa havia


sofrido dentre essas: mudanças geográficas, com as descobertas marítimas dividindo o mundo
em “velho mundo” e “novo mundo”; mudanças políticas, com a formação das nações-estados
que se revoltaram com o domínio de um governo religioso universal e com a organização das
forças militar e civil; mudanças econômicas, devido a descentralização da economia
sustentada pela agricultura passando a ser sustentada pelo dinheiro e pelas redes de comércio;
mudanças sociais, onde já não era mais necessário ser servo da igreja para adquirir ascensão
social quando uma pessoa era pobre, pois a rede de negócios da classe mercantil garantia
status para qualquer um que quisesse e se empenhasse a se destacar nesta área.
As mudanças intelectuais, provocadas pelo Renascimento e, que por sua vez fez com
que humanistas cristãos da época se voltassem às fontes do passado e às línguas originais da
Bíblia. A ênfase renascentista no indivíduo também influenciou a soteriologia protestante. Por
fim, as mudanças religiosas, onde a uniformidade religiosa passa a dar lugar à diversidade
religiosa onde passa a encontrar então uma nova interpretação sobre o que seja autoridade e
justificação, anulando assim, segundo os reformados, a intermediação de um mentor ou
sacerdote.130
A Reforma foi um movimento que buscou mudanças para a igreja católica sem
qualquer rompimento com a mesma para adaptá-la às mudanças ocorridas no mundo. Contudo
forças internas colocaram para fora todos aqueles que não se submetiam às idéias da Igreja. A
Reforma buscava “voltar à pureza original do cristianismo do Novo Testamento”.131 Tal grupo
de excomungados continuou a expressarem suas idéias culminando assim na criação do
protestantismo.132 Gaarder explica que “foi um monge alemão, Martinho Lutero, o maior
responsável por esse conflito teológico. Ele deu forte destaque à fé e à palavra (à Bíblia), como
elementos mais significativos”.133 Mais sobre Martinho Lutero será falado posteriormente.
A igreja católica também se pronunciou diante da Reforma com a sua Contra-
Reforma, onde buscou, após análises do movimento reformado, adequações e esclarecimentos
às suas doutrinas e métodos.134 A divisão causada no cristianismo por esses movimentos,

130
Cf. CAIRNS, 2005, p.221-223.
131
Ibidem, p.224.
132
Ibidem, p.224.
133
Cf. GAARDER, 2000, p.195.
134
Cf. CAIRNS, op.cit., p.224-225. Ver também: TILLICH, 1967, p.195-196.
34

segundo Tillich, foi algo infeliz já que “a Reforma, em vez de se transformar na reforma da
igreja inteira, tornou-se o dogma dos protestantes que eram o grupo protestador”.135
O desenvolvimento histórico “infeliz”, como diz Tillich, da Reforma se deu também
contra a própria Reforma já que esta, quando iniciada, era bem aberta a questionamentos,
contudo, com o passar dos anos ela se tornou, através de seus desdobramentos, bem fechada a
críticas, como é o caso do fundamentalismo norte-americano. Nas palavras de Tillich:

A Reforma, em si, foi muito aberta, mas quando começou a sofrer todos os tipos
de ataques, fechou-se numa estreitíssima ortodoxia protestante, chamada neste
país de “fundamentalismo”, que representa o fechamento da Reforma para
resistir os ataques sofridos.136

Se por um lado a reforma serviu para trabalhar questões não muito bem explicadas
como a apropriação indevida de terras por parte da igreja católica na extensão territorial
européia, a corrupção moral na qual a igreja vivia em seu processo hierárquico e prático e a
não-satisfação do povo com as posições teológicas e filosóficas da igreja,137 por outro a
reforma serviu como uma nova divisão da igreja cristã138, porém com um maior
desenvolvimento da ortodoxia de cada subdivisão.139

3.4.2- Sobre a Igreja Católica Romana140

A Igreja Católica Romana é a maior igreja cristã de todo o mundo. Sua doutrina está
fundada na fidelidade à hierarquia, a qual é composta de papa, bispos e padres exercendo
grande influência na camada inferior conhecida como leigos.141 O papa é o pontífice da igreja,
sucessor de São Pedro e infalível apesar de pecador. Sua função é buscar conformidade entre
a Bíblia e a tradição eclesiástica bem como liderar. Já os bispos e padres, num estilo parecido
ao do papa, são seguidores das pegadas dos apóstolos. Os bispos têm como função ordenar
padres. E os padres, por sua vez, dirigir sua paróquia ou comunidade.142

135
Cf. TILLICH, 1967, p.195.
136
Ibidem, p.196.
137
Cf. CAIRNS, 2005, p.224-229.
138
A igreja cristã já havia sofrido uma divisão mais conhecida como “cisma de 1054”. Ver CAIRNS, op.cit.,
p.167-168.
139
Cf. TILLICH, op.cit., p.196-204, 222-250.
140
Para maiores informações sobre as doutrinas da Igreja Católica Ortodoxa ver GAARDER, 2000, p.191-194.
141
Cf. GAARDER, 2000, p.181-182.
142
Ibidem, p.182-183.
35

Os católicos ensinam que a Igreja tem quatro características que os diferem da igreja
primitiva: Ela é “una”, se referindo como a única e verdadeira igreja, adequadas à mesma fé;
“santa, pois oferece a todos os meios para a santidade através dos sacramentos; “católica”
porque possuem regras universais válidas para todos; e “apostólica” já que é comandada por
pessoas que são sucessoras dos apóstolos.143
O fundamento católico se encontra na Bíblia e na Tradição. A Bíblia é vista à luz da
tradição, todavia a tradição deve ser entendida como desenvolvimento constante do potencial
que existe no Evangelho.144
A salvação professa pelo meio Católico Romano é mais bem entendida quando se
parte do seu raciocínio sobre a humanidade. Segundo a visão Católica o ser humano foi criado
à imagem e semelhança de Deus, tendo uma alma eterna e o livre-arbítrio. Porém, ao pecar
abusando de seu livre-arbítrio, o ser humano não mais conseguiu ser o mesmo, obtendo então
o pecado original.145 Mas a liberdade que o ser humano tinha não lhe foi retirada muito menos
perdida, tão somente enfraquecida.146 O ser humano não perdeu sua capacidade de fazer boas
ações, todavia este não consegue redimir a si mesmo. Por isso Cristo, que é homem, mas que
ao mesmo tempo é Deus, morre na cruz e ressuscita dando a chance ao ser humano de ser
salvo mediante a obediência a Cristo.147
Para a Igreja Católica Romana a salvação vem de uma ação conjunta entre Deus e o
ser humano. De acordo com Gaarder:

Tanto a fé como a salvação pressupõem a graça de Deus. Os sacramentos


transmitem essa graça. Deles os católicos recebem a força para viver de acordo
com a vontade de Deus. Mas a redenção final vem apenas após a morte. Esta
vida terrena é só uma preparação para ela.148

O fato de uma pessoa já estar morta não quer dizer que ela esteja no céu ou no inferno.
Segundo a crença católica o purgatório é o lugar por onde as almas que ainda não estavam
totalmente puras quando deixaram a terra devem passar para serem purificadas antes de irem
para o céu. A origem do purgatório pode ser encontrada na igreja antiga.149
A confissão de Augsburg afirma que o pecado é falta de fé não aceitando a
concupiscência como pecado, ainda que seja esta que leve o ser humano ao pecado. Portanto o
143
Cf. GAARDER, 2000, p.183-184.
144
Ibidem, p.184.
145
Ibidem, p.184.
146
Cf. TILLICH, 1967, p.197.
147
Cf. GAARDER, op.cit., p. 184-185.
148
Ibidem, p.185.
149
Ibidem, p.188.
36

ser humano não pode ser entendido como totalmente corrompido. É aí que entra a maior
liberdade dada ao ser humano pela Igreja Católica em relação aos protestantes já que estes
consideram a concupiscência pecado. O pecado para o católico é a ação contra a lei de Deus.
E pelo fato da igreja católica considerar os pecados como algo de fácil perdão, aqueles que os
confessam ao sacerdote são absolvidos e libertados. Para os protestantes o pecado é separação
de Deus. Não cabe apenas a confissão, mas a conversão completa com uma transformação do
ser e reunião com Deus.150
A Igreja Católica acredita que a justificação parte de ambos os lados: De Deus e do ser
humano, numa ação conjunta onde nenhum dos dois anula as ações do outro. A distinção é
uma característica. Deus entra com sua Graça e benevolência enquanto que o ser humano
entra com o cumprimento dos sacramentos.
Já no meio protestante a justificação se dá por meio da Graça de Deus, e esta só pode
ser mediada pela fé. Contudo muitas interpretações errôneas têm nascido deste ponto. Talvez
por uma influência católica muitos têm entendido que, para ser justificado por Deus basta ter
fé que este, por sua benevolência e compreensão, após convencido desta fé, se move em graça
e perdoa o pecador.151 Contudo o pensamento reformado nega essa concepção. Para os
reformados:

O ato de se voltar para Deus, e de receber sua graça, é sem qualquer


ambigüidade, um ato receptivo, em que Deus nos dá alguma coisa e nós não
fazemos coisa alguma, e a doutrina católica, segundo a qual devemos fazer
alguma coisa para nos preparar para a graça, cooperando com Deus, pois a fé é
reconhecimento intelectual que pode existir ou não.152

Com a Reforma o catolicismo buscou definições mais precisas a respeito de seus


princípios de autoridade. Isso serviu como distinção dos pensamentos de ambos. Para o
catolicismo as Santas Escrituras e a Apócrifa do Antigo Testamento são igualmente Escritura
e têm a mesma autoridade. Lutero não aceitou essa associação já que as Escrituras Apócrifas
possui certos legalismos, o que marcou a Igreja Católica por séculos.153 A Igreja Católica
aceitou somente a Vulgata de São Jerônimo como sendo a única tradução autorizada da Bíblia

150
Cf. GAARDER, 2000, p.198.
151
Cf. TILLICH, 1967, p.198-199.
152
Ibidem, p.199.
153
Ibidem, p.196.
37

rejeitando assim a tradução do NT de Erasmo que tanto influenciou e foi utilizado pelos
reformadores.154
Para a Igreja Católica a Escritura e a Tradição estão no mesmo nível de autoridade. Os
reformados não aceitaram tal posição devido à supervalorização das Escrituras e pelo risco de
permitir que a Tradição influencie na interpretação bíblica.155
Sobre a interpretação da Bíblia o Catolicismo disse que somente a Santa Mãe Igreja
interpreta a Bíblia e mais ninguém. No protestantismo as faculdades de teologia tinham essa
tarefa. O que difere em ambas é o fato do papa poder chegar a uma decisão final enquanto que
no protestantismo as interpretações nem sempre concordavam entre si. A Igreja Católica se
posicionou mais rigidamente aos ataques feitos pelos protestantes ao papa dizendo que o
mesmo jamais poderia ser deposto ou criticado, cabendo a ele o poder final e único na
interpretação bíblica.156

3.4.3- Da Reforma para as igrejas protestantes: Características e doutrina

A Reforma aconteceu em grande parte da Europa. Em cada nação a reforma tomou


seu rumo e características distintas.157 Movimento iniciado pela insatisfação dos sectários e
pelos influenciados pelo poder de Roma culminou no séc.XVI com o conflito teológico de
Martinho Lutero, com a rebeldia do rei Henrique VIII na Inglaterra, com o rompimento
radical com o catolicismo pelos reformadores suíços Calvino e Zwínglio.158 Pode-se dizer que
a Reforma contribuiu para que surgisse duas formas de igrejas protestantes: A igreja luterana
e a igreja reformada, esta que é subdividida em metodistas, estes mais democráticos e nascido
no movimento de reavivamento por John Wesley,159 os batistas, vindos de ramificações dos
anabatistas concentrando-se na Inglaterra e mais tarde se difundindo por todo o mundo,160 e
mais por fim da idade moderna os pentecostais, que no século XIX se manifestaram como um
movimento autônomo dando ênfase a surtos de reavivamento.161
Devido aos movimentos terem suas distinções, o desenvolvimento da Reforma foi algo
amplo. Até mesmo o termo Reforma não possui definição precisa.162 O que se pode dizer é

154
Ibidem, p.196.
155
Cf. TILLICH, 1967, p.196.
156
Ibidem, p.196-197.
157
Cf. CAIRNS, 2005, p.232-255, 266-279.
158
Cf. GAARDER, 2000, p.194-195.
159
Ibidem, p.202.
160
Ibidem, p.203.
161
Ibidem, p.203-204.
162
Cf. CAIRNS, op.cit., p.224.
38

que houve sim um descontentamento de muitos com a posição católica. Dos movimentos
surgiram as igrejas que contribuíram para o desenvolvimento das doutrinas debatidas de início
pelos reformadores. Nestas igrejas encontra-se o pensamento de seus “fundadores”, porém
com mais elaboração teológica. Ênfase maior será dada nas igrejas luteranas por terem sido
fundadas por Lutero, grande nome entre os reformadores, e também nas igrejas reformadas,
estas que por sua vez buscavam, após se subdividirem no protestantismo, uma forma de serem
mais puras.163
De grande significação no meio protestante, a Igreja Luterana. Organizada a partir do
trabalho de Martinho Lutero164, a igreja luterana se vê como uma “assembléia de santos na
qual o evangelho é ensinado de maneira pura e os sacramentos administrados de maneira
correta”.165 Em sua organização se vê como igreja invisível seguindo sacramentos que o
próprio Cristo instituiu (batismo, ceia do Senhor, etc), não aceitando o ministro numa posição
de destaque. O sacerdócio universal é sua marca principal, onde prega que todo cristão é seu
próprio sacerdote.
Na doutrina da “Justificação pela Fé” Lutero afirma que “falta de fé é o verdadeiro
pecado”. Ainda sobre o pecado Lutero afirma que o ser humano é totalmente corrompido por
este não cabendo nem ao mesmo o cumprimento de doutrinas, diferenciando-se então da idéia
de sacramentos e dogmas católicos. Apesar de o ser humano ser corrompido em sua totalidade
não quer dizer que o ser humano não possua algo de bom. Segundo Lutero a fé é o dom de
Deus que serve para mostrar ao ser humano sua queda diante de Deus.166
Para Lutero a fé precede o amor, porque é nela que recebemos a Deus e o amor que
nos une a Ele. Esta é dada por Deus. Sobre o pecado Lutero não o considerava como infração
à liberdade, antes o pecado era uma influência demoníaca. Se a fé liga o ser humano a Deus, o
pecado, por sua vez, liga o ser humano ao demônio. Segundo ele, o ser humano ora é tomado
pela compulsão divina, ora pela demoníaca.
Fé para Lutero era receber a Deus quando este se manifesta, contrastando com a fé
histórica que só reconhece os fatos históricos. A fé, segundo Lutero, deve ser viva e ativa,
produzindo a pessoa e esta produzindo boas-obras. Boas-obras até os divididos de Deus
realizam, contudo o que define o ser humano como humano é a fé e não a aceitação de

163
Cf. GAARDER, 2000, p.200.
164
Cf. CAIRNS, 2005, p.233-235.
165
Cf. GAARDER, op.cit., p.196.
166
Cf. TILLICH, 1967, p.224-225.
39

doutrinas ou a vivência delas. O ser humano só se sente como tal quando aceita o poder de
onde procedeu e para onde vai, e isto se dá por fé.167
Lutero acreditava que o ser humano necessita das Escrituras porque a plenitude do
Espírito ainda não chegou. Contudo era polêmico afirmando que a Escritura, por ser criada
pelo Espírito, deveria dizer somente a respeito de Cristo e sua obra. Com essa afirmação
Lutero negava certos livros da Bíblia como Apocalipse de João, Ester, negando também
algumas autorias confessas pela igreja, dizendo que isso não era essencial para a fé cristã.
Sua abordagem bíblica fez com que o cristianismo tomasse um tom nunca tomado
durante sua história: aceitar o tratamento histórico da literatura bíblica. Com isso
interpretações dos tipos espiritualistas, pneumáticas e alegóricas deixaram de ser destaque nos
sermões da época.168
Enquanto na Alemanha se destacava o nome de Lutero, na Suíça eram Zwínglio e
Calvino. Na França movimentos que seguiam as idéias de Lutero, Zwínglio e Calvino
colocavam em prática os ideais reformados. Foram várias igrejas que surgiram na Reforma,
mas as consideradas mais importantes por Gaarder são a igreja Luterana e a Reformada. Desta
última diversas ramificações são encontradas.169
Ao estudar essas ramificações perceber-se-á quão variadas são as teologias propostas.
Calvino, teólogo da Suíça e principal líder da Reforma em seu país, fundador de uma doutrina
própria designada geralmente pelo termo “calvinismo” buscou, assim como Lutero,
desenvolver uma teologia que divergisse da teologia católica. A Bíblia como autoridade
máxima e única continuou assim como nas igrejas luteranas, todavia suas elaborações
divergiram em alguns pontos.170
Calvino cria que Deus era numinoso: inatingível e fascinante. Esse Deus está muito
além de qualquer tentativa definição de seu ser. Ele é soberano sobre todos.171 Essa soberania
fez com que Calvino entende-se Deus como sendo alguém que dirige o mundo de tal maneira
que este mundo depende dele. Sua idéia aproxima-se do deísmo, porém o melhor termo para
uma definição é panenteísmo, que significa que todas as coisas estão em Deus. Logo, Deus
não deve ser visto como alguém que é indiferente com o mundo, mas em constante
atividade.172

167
Ibidem, p.226.
168
Cf. TILLICH, 1967, p.222-224.
169
Ibidem, p.202-212.
170
Cf. CAIRNS, 2005, p.251.
171
Cf. TILLICH, op.cit., p.240.
172
Ibidem, p.242.
40

Contudo o problema do mal era o que o incomodava. Ainda em seu leito de morte ele
se questionava se não seria Deus o criador do mal. Como resposta Calvino atribuiu o mal
como sendo para a glória de Deus. O mal serve para mostrar a santidade de Deus. Entretanto
essa compreensão teocêntrica foi compreensivelmente atacada.
Os homens maus seguem a vontade de Deus, mas não seus mandamentos. Isso os
tornam culpados de seus erros. Com o mal vem os sofrimentos que servem como modo de
trazer os eleitos a Deus, como modo de Deus demonstrar ao mundo sua santidade ao punir o
mundo deformado e de demonstrar a conseqüência natural do mundo pecaminoso. É daqui
que nasce a doutrina da providência, que não é determinada por Deus, mas causada, que
segundo Tillich serve para dar coragem moral aos homens.173 Portanto a liberdade do ser
humano é finita, dependente de Deus e de onde só terá certeza de que não está ferindo esta
liberdade quem tiver uma vida de alto padrão moral.174 Nas palavras de Tillich “o calvinista
procura se transformar num bom cidadão burguês, segundo as normas da sociedade
industrializada”.175
Sobre o amor em relação à predestinação Calvino é sucinto dizendo que a glória divina
substitui o amor divino. Ele só cita o amor em relação aos eleitos. Portanto segundo seu
raciocínio, se há um inferno, como pode algo que é criado pelo amor divino, ser condenado
eternamente?176

3.4.4- Percepções soteriológicas no cristianismo moderno católico e protestante

No período moderno percebe-se como que o catolicismo não mudou suas idéias
soteriológicas por si só, mas em relação ao protestantismo que se ramifica de si. Na contra-
reforma o catolicismo insiste em dizer que a igreja é a única autorizada a interpretar a Bíblia,
não dando margens a uma ramificação do cristianismo. Isso é a condenação do
protestantismo.
A soteriologia católica ainda continua como na idade média, baseando-se nos
sacramentos. São 7 sacramentos que perduram até hoje. Até então o catolicismo não abriu
mão do Concílio Ecumênico de Florença (1442) que dizia que “fora da igreja não há

173
Cf. TILLICH, 1967, p.242-243.
174
Ibidem, p.245.
175
Ibidem, p.246.
176
Ibidem, p.246.
41

salvação”.177 A igreja única de Cristo, segundo os católicos, ainda é a igreja católica não
havendo nenhuma outra legítima ou legitimada por Cristo.178
O ser humano é totalmente corrompido em suas tentativas de justificação por si só,
necessitando de Deus para levantá-lo de sua situação de queda. Os sacramentos o elevam em
estado de graça que por sua vez o salva.
O ser humano caminha para a sua salvação intermediada pela igreja nos sacramentos
por esta instituído sabendo que o primeiro passo para essa salvação foi dado por Deus em
Cristo. Portanto é importante ao católico atentar aos mandamentos vindos da tradição e de sua
liderança eclesiástica, o papa, já que este é o representante de Cristo na terra.
A Bíblia passa a ser a autoridade máxima do protestante, que alega ser dali que é
possível encontrar a salvação. A tradição cristã fica em segundo plano na soteriologia cristã
protestante servindo apenas de testemunho dos fiéis. O repúdio às imagens de escultura nasce
em países calvinistas179 enquanto que o repúdio às indulgências nasce no meio luterano.180
Pontos de vista arminianos, que pregam que a salvação do ser humano depende de sua
escolha, e calvinistas, que acreditam que a salvação depende exclusivamente de Deus, entram
em choque para discutirem como se dá a salvação do ser humano.181 Mas nunca se nega a
importância da fé na salvação. Essa é a marca do protestantismo: a fé.

3.5- Síntese

Neste capítulo a intenção foi de mostrar como que o cristianismo se desenvolveu


enquanto religião, tendo neste termo a mudança significativa obtida na história, como foi
tratado no capítulo anterior. Começando pela Idade Antiga e chegando até a Moderna, o
percurso realizado neste capítulo serviu para mostrar como que a teologia cristã, com ênfase
na soteriologia, se desenvolveu progressivamente dando respostas à sua época, respostas estas
que nem sempre se coadunaram na história.
Foi visto o desenvolvimento cristão juntamente com suas ramificações sendo que
nestas se encontram as grandes variedades nas formas de se conceber a religião. Esta divisão
interna aconteceu devido às divergências de idéias mostrando que na religião agora se
encontra idéias não-monolíticas, algo novo na história do termo “religião”.

177
Cf. KÜNG, 1976, p.79.
178
Cf. CNBB, 2007, p.161.
179
Cf. TILLICH, 1967, p.240-241. Ver também CAIRNS, 2005, p.244-245.
180
Cf. LUTERO, 2006, p.121-131.
181
Cf. BERKHOF, 1992, p.195-199.
42

4- SALVAÇÃO E RELIGIÃO: CONTRIBUIÇÕES PARA O DIÁLOGO INTER-


RELIGIOSO

Este capítulo apresenta como que a religião cristã buscou, através da história, se
apresentar ao mesmo tempo em que se formava enquanto religião. Apresentar-se-á o
cristianismo como desenvolvimento histórico e como que nesse desenvolvimento o cristão
atuou. Constatar-se-á que o cristianismo é resultado de uma junção da dimensão divina e
humana. Sendo assim, nessa co-relação, será fácil perceber como que o cristianismo é uma
leitura válida de Deus e da realidade, inferindo nesta as percepções que se tem daquele. O
objetivo é mostrar que o cristianismo é uma religião em desenvolvimento, contudo complexa
e coerente. Sendo assim perceber-se-á que o cristianismo, por ser uma religião com a
participação humana, e este, por ser evolutivo em sua leitura da realidade, não tem a resposta
final sobre o que seja a salvação. Todavia isso não quer dizer que o cristianismo não participe
da salvação. Ver-se-á que a salvação é experimentável à medida que se conhece sobre ela.
Para tal compreensão este capítulo buscará unir as informações assimiladas dos
capítulos anteriores mostrando o cristianismo como uma religião que se desenvolve através da
história, passando então para a percepção de que religião é o resultado da participação do ser
humano e de Deus, baseado na teologia de Pannenberg.

4.1- A religião como progresso histórico

A religião, por ser um desenvolvimento histórico, e por ser um


desenvolvimento a partir da junção da compreensão de mundo juntamente com a percepção
do divino, mostra-se como um progresso histórico que vai de encontro a um objetivo final.
Nas palavras de Reis: “O surgimento da religião se dá no ato de se querer viver na busca por
Deus, quer seja numa busca em grupo ou individual, quer seja através dos ensinos de um
grande mestre. O fato é que religião é algo o qual se vive”.182 No cristianismo o objetivo final
é o estabelecimento do reino de Deus e seu domínio para sempre onde o mal, não mais terá
domínio sobre a criação de Deus.183 Diante disso, a busca por se viver tal religião pregada faz
com que o ser humano caminhe em direção ao que Deus quer que, concomitantemente o
cristão também quer.
Os cristãos caminham hoje usando ferramentas que o cristianismo adotou em sua
caminhada histórica. A filosofia é antropocêntrica, o desenvolvimento místico que o
182
Cf. REIS, 1965, p.101.
183
Baseado nos ensinos do apóstolo Paulo em I Co 15. Ver também KÜNG, 1976, p.353-354.
43

cristianismo experimentou através de sua história também teve influência de outras religiões e
hoje o mesmo cristianismo se encontra diante de novas religiões que têm o ser humano como
centro, todavia não com as características das religiões modernas.184 Cria-se um desafio ao
cristianismo: As percepções sobre o divino tornam-se mais e mais diferentes através dos
séculos fazendo com que o cristianismo dialogue com as demais. O diálogo não promoverá
unicidade, como a história já demonstrou, todavia evitará desvios demasiados já que isso não
é de objetivo religioso. Contudo as religiões ainda afirmam que seu desenvolvimento nasceu
do envolvimento com o divino e isso não pode ser negado. Cabe aqui a tentativa de
compreensão de como se dá o desenvolvimento religioso de forma geral a começar do
cristianismo, de forma específica, para que então o diálogo religioso se torne frutífero.
Segundo Gaarder a salvação de algo ou de alguém é algo notório nas religiões. O ser
humano, enquanto mortal, busca sentido em sua vida tentando redimensioná-la conforme sua
visão de mundo ou conforme sua visão de como deve ser o mundo.185 Nesta última a
esperança brota como algo que gera e traz mudanças para quem é esperançoso e isto passa a
fazer parte de sua idéia de salvação. No cristianismo isto é facilmente perceptível já que toda
teologia soteriológica parte da esperança de um mundo vindouro que começa aqui e agora.
Percebe-se então que nas religiões, e mais especificamente no cristianismo, o sonho de
uma possível vitória sobre o mal que aflige alguém ou um grupo de pessoas não é algo que
apenas se espera. Isso se torna imediatamente real para quem o sonha já que este sonho é para
o agora o tornando-se vivencial.186 No cristianismo, a vivência de algo salvífico nasce da
vontade de Deus independente do ser humano já que este não tem o poder de salvar a si
mesmo. Percebe-se que na realidade do cristão Deus interfere com indícios de salvação,
salvação esta que culminará na salvação plena com o Reino de Deus devidamente
estabelecido.187
Portanto, a salvação não é apenas algo futuro. O ser humano que sonha com uma
possível salvação pode encontrá-la até mesmo no presente. O fato de sonhar com uma
salvação mostra que o contato com a mesma aconteceu no imediato, dando a idéia de que é
possível sim vivê-la no agora, entretanto não plenamente. Pannenberg, teólogo alemão do
século XX, pesquisador de grandes filósofos e de pensadores religiosos, professor de

184
Cf. GAARDER, 2000, p.253-262.
185
Ibidem, p.9.10.
186
Cf. DREWERMANN, 2004, p.78.
187
Cf. TILLICH, 1967, p.150-151,185-193; BERKHOF, 1992, p.190-193 e GAARDER, 2000, p.185-188 para
uma visão católica da salvação. Para uma visão protestante ver TILLICH, 1967, p.224-226, 240-246; CAIRNS,
2005, p.244-245 e LUTERO, 2006, p.121-131.
44

literatura, autor de livro como Jesus: God and Man, aborda essa idéia de forma sistemática
mostrando que Deus não é o salvador do porvir, mas do agora. Para ele:

O futuro sozinho é o ponto focal da verdade final. Em conseqüência, todas as


indicações dogmáticas são hipóteses a serem testadas para a coerência com o
outro conhecimento. Isto, reivindica, está do acordo com as Escrituras, que
declaram aquele somente no fim da história está a deidade de Deus aberta para
todos inquestionavelmente, entretanto, que é antecipado no presente.188

A salvação conforme Pannenberg tem a ver com a verdade e esta só se dá com a auto-
revelação de Deus. Mas esta não se dá de forma mística. Para ele a revelação é um processo
histórico e esta pode ser encontrada em todas as religiões.189 Segundo ele, a revelação não
pode ser restringida somente a uma definição de fé apenas, pois se Deus é a verdade final de
todas as religiões, e este é alcançável por todas elas, logo este deve ser um Deus de existência
excedente.190

4.2- A salvação como dimensão divina e humana

Para Pannenberg toda ciência luta para descobrir a verdade final sobre tudo. Segundo
ele a teologia é uma ciência idêntica às demais, pois tem o mesmo objetivo. Contudo, se a
teologia é uma ciência, esta deve se portar como tal aceitando todas as críticas feitas pelas
demais ciências, pois a vontade de descobrir a verdade é a mesma. Pannenberg afirma que a
Teologia é provisional assim como todas as ciências, o que leva a conclusão de que não se
pode embalar em fórmulas as verdades sobre Deus.191
Deus é a verdade final de tudo. E se ele é a verdade final de tudo deve ser aceito o
debate existencial sobre Deus.192 A doutrina da trindade não deve apenas discutir sobre a
essência de Deus. Antes ela deve falar da economia de Deus, já que este se encontra ativo na
história da salvação humana. A revelação plena de Deus e de sua essência virá com a
conclusão do eschaton.193
Com isso Deus não deve ser resumido apenas na ação redentora de Cristo na cruz
tendo apenas a pessoa do Espírito Santo atuando na salvação do ser humano até à escatologia

188
Cf. GRENZ, 1988, p.795. Tradução particular.
189
Ibidem, p.796.
190
Ibidem, p.796.
191
Ibidem, p.795.
192
Ibidem, p.795.
193
Ibidem, p.795.
45

concluída. Isso parece dividir Deus enquanto participante da história da salvação. O Espírito
Santo deveria ser visto também como uma terceira pessoa que compartilhe do amor junto com
o Pai e o Filho.194
A existência de Deus é algo experimental na vida da humanidade durante sua história.
Não se pode definir Deus, apenas experimentá-lo e, a partir dessa experimentação, explicá-lo.
Logo a definição, quando dada por definitiva, reduz Deus a um mero conceito. Para
Pannenberg isso é inaceitável. No entanto, quando se aceita a idéia de que Deus pode ser
experimentado por qualquer pessoa em qualquer lugar abre-se a oportunidade de aceitar que
as demais religiões podem sim ter contatos com esse Deus não-exclusivo. Para Pannenberg
dizer que Deus é exclusivo juntamente com a fé nele é reduzir a teologia. Segundo Stanley
Grenz: “Ele propõe que a humanidade tem certo sentido religioso natural, porque a estrutura
da pessoa humana individual e da vida humana como um todo é invadida pela religião. Isto é
consistente com sua vista que se pode esperar encontrar a marca do criador na criação.” Logo
não cabe ao ser humano mentir para si mesmo sobre quem é Deus em sua forma religiosa de
concebê-lo, já que o ser humano foi criado para ser à imagem e semelhança de Deus. Sendo
assim, Deus impulsionou o ser humano, no ato de sua criação, para dois aspectos cruciais:
para a compreensão do infinito mediante sua intuição e para o eterno esforço religioso em
busca da verdade.195
Sendo assim não se pode negar a importância das demais religiões. Também não cabe
ao cristianismo deixar de sê-lo, já que isso resultaria à negação de sua história da salvação.
Nesta dimensão divina da salvação Deus participa no ato da criação, quando cria o ser
humano com um propósito imutável, mas em liberdade, participa durante a história
orientando-o já que Deus é participante desta história, e no final de tudo quando ele se
revelará plenamente. Daí a importância da evangelização como anunciação do Reino, não
para convencimento e sim como crença. E isso não vale só para o cristianismo.
Como já foi apresentada, a religião é uma tentativa de se alcançar Deus ou algo que
transcende o ser humano. A religião é uma criação do ser humano e não de Deus. É a tentativa
de mudança para algo melhor. A religião é a decodificação do que se aprendeu durante a vida
na busca pela transcendência. Sendo assim, o ser humano tem uma grande importância na
dimensão de salvação, já que não é algo fechado apenas em Deus. Deus e o ser humano
caminham juntos, cada qual com suas responsabilidades.196

194
Cf. GRENZ, 1992, p.307.
195
Cf. GRENZ, 1988, p.795. Tradução particular.
196
Cf. DREWERMANN, 2004, p.77-79 e SMITH, 2006, p.35-50.
46

Para o ser humano fica a responsabilidade de decodificar o que é melhor para si, já que
é algo integrado em sua liberdade. Sabe-se que do ser humano é impossível alcançar a
salvação e que, segundo o cristianismo, a salvação tem a ver com a fé.197 É dessa fé que o ser
humano busca o entendimento para um final melhor. A fé cristã está ligada a Jesus Cristo ser
humano. Em Cristo se encontra a dimensão humana de Deus para a salvação.
Na dimensão humana da salvação é comum encontrar certos parâmetros para vivência
religiosa. Isso é necessário para a justificação da crença no religioso. Isso tem a ver com sua
responsabilidade enquanto ser em liberdade. Não se encontra religião para os animais ditos
irracionais. Somente no meio humano que se encontra e isso é devido ao que Pannenberg
afirmou de ser a marca do divino na criação do ser humano que o orientaria até o seu fim.198
Mas se o cristianismo é o resultado da religiosidade dos crentes em Cristo e se as
religiões também são uma inclinação a Deus, o que cabe ao cristianismo, diante das demais
religiões, é a anunciação do Evangelho no qual se crê, algo comum de se ver no livro de
“Atos dos Apóstolos”. O cristianismo, assim como outras religiões, não tem conclusão que
seja a definitiva na história, o que mostra a necessidade de anunciação para que isso aconteça.
Pois a salvação final, como já disse Pannenberg, se dará de forma inteligível no eschaton.199
A anunciação do Evangelho não é anunciação de teologia sistemática. Segundo Pannenberg a
anunciação do Evangelho é a anunciação do que se vive,200 o que nem sempre quer dizer que
é algo sistematizado, todavia organizado.

4.3- O elemento principal para a salvação no cristianismo

O fato de o cristianismo não possuir uma definição final sobre como se dá a salvação
não quer dizer que este não é autêntico. O cristianismo surgiu dessa falta de compreensão
soteriológica e desde então caminhou para a busca desta. O que de fato fica é que o
cristianismo, nas suas tentativas de explicar como se dá a salvação cristã, partiu sempre do
mesmo ponto, que é da vida e morte de Jesus Cristo. A salvação está ligada nesta pessoa
divina/humana na qual está fundada a fé cristã. Para Hans Küng ser cristão é ter fé em Jesus
Cristo apenas201 para que assim o homem e a mulher se tornem mais humanos.202

197
Até mesmo para os católicos uma vez que os sacramentos são pontos de contatos com o divino que levam os
crentes a Deus por meio da fé.
198
Cf. GRENZ, 1988, p.795.
199
Ibidem, p.795.
200
Ibidem, p.797.
201
Cf. KÜNG, 1976, p.102-103.
202
Ibidem, p.523.
47

A salvação no cristianismo não está na guarda da sistemática, mas naquele que


é o alvo da sistemática, do qual não se consegue definição conclusiva. A salvação cristã tem a
ver com os dois grandes mandamentos bíblicos que Cristo ensinou. O cristianismo não deve
se preocupar se seus fiéis conseguem decorar suas formulações de fé ou algo do tipo. Antes
deve mostrar que o caminho para a salvação é a inclinação a Deus e ao próximo.203
Contudo mesmo no meio dos equívocos que o cristianismo cometeu e comete no
decorrer da história não se pode dizer que a salvação não é vivida e/ou experimentada. Aliás,
a salvação existe por causa disso: da incompetência do humano em viver de acordo com o
objetivo do criador. A salvação vem como aperfeiçoador até mesmo da religião. Pois se esta
fosse perfeita não mais precisaria ser salva. O esforço teológico realizado na história em
entender como se dá a salvação já demonstra o contato que se tem com a salvação. Essa
tentativa é válida já que é a busca natural de toda religião, algo enfatizado por Pannenberg.204

4.4- A religião cristã: codificação sobre o sagrado

Nessa experimentação da salvação percebe-se no cristianismo sua capacidade de


estabelecer diálogo entre realidade e revelação numa espécie de codificação, codificação esta
que é de fácil compreensão para os adeptos da religião. Isso não é característica exclusiva do
cristianismo, mas de todas. Entende-se por codificação como sendo um conjunto de regras
predefinidas do qual mensagens são convertidas, de maneira convencionada, buscando
representação e simbolismo para um grupo específico. Esses códigos são inteligíveis aos seus
adeptos. Toda religião é codificação inteligível do que é experimentável, como expressa
Drewermann:

Nós seres humanos experimentamos o medo [...] não existe escapatória. Para nós
os seres humanos os medos estão codificados no sistema límbico como nos
animais. Até as situações de medo são exatamente iguais. A única coisa que nos
distingui dos animais é o fato de termos ampliado enormemente o nosso leque de
respostas possíveis ao mesmo tempo em que conhecemos o caráter definitivo do
medo. [...] Em termos muito simples, isto significa que a religião precisa ser
pensada e também sentida, caso contrário ela não confere. E a vida humana que
não pensa, nem sente, ou que proíbe sentimentos para seguir ideologias
racionalizadas, destrói em vez de construir.205

203
Cf. KÜNG, 1976, p.354.
204
Cf. GRENZ, 1988, p.795.
205
Cf. DREWERMANN, 2004, p.77-78.
48

Smith, ao usar o termo outsiders, refere-se àqueles que não participam internamente de
uma determinada religião deixando-o então à parte do conhecimento do sagrado que é
específico daquela religião.206 Isso se dá porque o conhecimento na religião é difundido
através de codificação criada na própria religião durante sua leitura entre revelação e
realidade, e onde a decodificação é natural, já que quem conhece os códigos, a saber, o adepto
de tal religião, não sente dificuldades para interpretar.207 No cristianismo isso é visível quando
se cita algo sobre a cristologia, que é uma espécie de codificação, tendo Jesus Cristo como
decodificador. Nenhuma outra pessoa a não ser Jesus Cristo serviria para o cristianismo como
decodificador. Logo a teoria de Smith se faz coerente quando se pensa que para se entender
uma religião é necessário participar da mesma.
Contudo o que se pretende mostrar aqui é que o ocidente deveria dar atenção à outra
realidade, contrária à afirmação de Radhakrishnan que diz que os judeus foram os primeiros a
inventar o mito de que apenas uma religião pode ser verdadeira.208 E até hoje não se pode
dizer que uma religião é certa ou errada em sua forma de ser, mas sim que ela é verdadeira ou
falsa, quando esta não nega a relação entre realidade e revelação no qual o ser humano é
participante e desenvolvedor da religião juntamente com seu Deus que é percebido através da
história.
O que cabe não só aos cristãos, mas a todos os adeptos das demais religiões é serem
sinceros quanto às mudanças dos paradigmas encontrados pelos mesmos após sua releitura
religiosa. Deve-se ter em mente que religião não é um substantivo, mas algo qualitativo e
inato no ser humano. Ser religioso não é ser um adepto, todavia um ser que experimenta do
sagrado e que tenta se expressar diante disso de forma racional e coerente em suas faculdades.
Portanto não cabe ao cristianismo se valer de dogmáticas como fator determinante
para a leitura religiosa válida quando estas negam certas percepções coerentes da realidade e
do transcendente. Sua dogmática deve orientar para que sua identidade não se perca durante o
processo de leitura da realidade. Ser cristão não é se inclinar a qualquer conhecimento. Antes
é reler sua história religiosa a partir de Jesus Cristo, que é seu decodificador, respeitando as
demais leituras religiosas que são, da mesma forma, tentativas de explicações sobre a vida
religiosa do ser humano.

206
Cf. SMITH, 2006, p.55;73.
207
Ibidem, p.8;11;71;169.
208
Ibidem, p.39-40
49

4.5- Síntese

Neste capítulo foi apresentado como que o cristianismo, enquanto religião, buscou se
apresentar ainda que em processo, como uma religião válida. Percebe-se que todas as religiões
têm o mesmo objetivo: Fazer uma leitura da realidade a partir da revelação. O cristianismo,
bem como todas as religiões, mostrou ser capaz de realizar tal leitura a partir de Cristo, e este
como revelação.
Foi apresentado que o cristianismo não possui a fórmula da salvação, todavia
experimenta da mesma. E neste ato de experimentar foi mostrado que o cristianismo é uma
religião histórica porque participa da salvação, humana porque toda sua elaboração é
resultado do labor humano, e divina porque o próprio Deus se dá a revelar.
Por fim este capítulo apresentou que toda religião cria códigos para viver a realidade
imanente. Em específico, o cristianismo possui estes códigos tendo como Cristo seu
decodificador. Logo toda leitura válida para o cristianismo deve passar pelo crivo Cristo.
Contudo concluiu-se que estes códigos não podem ser a suma final para a leitura da realidade
já que assim Cristo seria substituído. Os dogmas são importantes e devem existir sempre, mas
se Deus é participante ativo da história religiosa do cristianismo os mesmos devem estar à
mercê de Cristo; o Cristo do cristianismo.
50

5- CONCLUSÃO

Verificou-se nesta pesquisa que não só o termo “religião” como também o


cristianismo tiveram mudanças significativas em suas composições. Foi visto também que o
cristianismo surgiu em meio diversos grupos religiosos, mas foi somente após a apropriação
do termo “religião” e após a conseqüente modificação do mesmo é que o cristianismo
começou a se ver como a religião única e verdadeira. E não só ela com outras. Isso se deu
pelo fato de o termo “religião” deixar de ser um adjetivo, que é algo qualitativo, para se tornar
algo substantivado, que é mais institucional.
Sendo assim, o objetivo específico desta pesquisa foi de entender como que o
cristianismo atual chegou à formulação de ser a única religião que consegue ler corretamente
a salvação. Não foi intuito da pesquisa questionar se o cristianismo é ou não aquela religião
que entende exclusivamente sobre a salvação. Foi apenas o intuito de compreender como que
o cristianismo passou a se afirmar como religião superior às demais. Isso ficou comprovado
após verificar a abordagem que o cristianismo fez do termo “religião”, as modificações que
este termo sofreu após a apropriação cristã e de como que o cristianismo se portou durante seu
desenvolvimento e aceitação na história.
A partir disso a pesquisa apontou algumas observações necessárias para que um grupo
se defina como “religião”: Respeitar as abordagens alheias do termo “religião”, se vê também
como mais um que busca relacionar realidade com a revelação; se ver na busca mútua de
explicações soteriológicas para a sua realidade de vida; e limitado na tentativa de leitura da
religião alheia bem como do julgamento da mesma.
Conclui-se então que a pesquisa foi válida quando o intuito é de mostrar que toda
religião é importante quando se busca entender a realidade vivenciada, o que não quer dizer
que uma pessoa deva ser adepto de determinada religião e aceitar as demais como primordiais
em sua vida. A religião diz respeito à identidade da pessoa. Seguir todas seria suicídio
existencial. Destacou-se também a importância de se colocar em pé de igualdade quando o
assunto é de se ver como religião. A abordagem do termo foi algo generalizado e as releituras
de si próprio e do termo “religião” também. Logo, ficou claro que toda religião, após
apreendido a realidade, busca codificar essa leitura da realidade com parâmetros típicos para
sua religião. Sendo assim, a compreensão religiosa só é possível para aqueles que fazem parte
de tal religião, já que só assim a decodificação efetiva se dá. Portanto, religião tem a ver com
fé, com o ser humano e com Deus, nesta inter-relação onde a regra maior é a entrega de si
próprio para o ininteligível.
51

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