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1. Resumo
Os próximos versos do primeiro quarteto parecem nos oferecer uma chave para o
enigma: o poeta quer que esta madrugada seja celebrada (podemos entender,
“poetizada”, “cantada” e, portanto, eternizada) sempre que houver – saudade! A
saudade é, portanto, o elemento que constitui aquela madrugada em algo que merece
ser eternizada – é por isso que o poeta a canta. No primeiro quarteto temos, portanto, o
tema ou motivo do poema (uma madrugada específica), o objetivo pelo qual foi
composto (celebrar e eternizar tal madrugada) e o elemento que faz a madrugada
merecedora de ser eternizada (a saudade).
Se as sentenças e propósitos do primeiro quarteto nos parecem relativamente claros, o
segundo nos apresenta uma implacável complexidade de ideias e sintaxe. A primeira
grande dificuldade consiste em perceber que o pronome que inicia o quarteto,
acompanhado do advérbio “só”, só encontrará o término da oração a que se refere no
terceiro verso: a oração subordinada adverbial temporal “(…) quando amena e
marchetada saía,” acompanhada de sua irmã reduzida de gerúndio “dando ao mundo
claridade” se intercalam entre o sujeito “Ela só” e o predicado que se inicia com “viu
apartar-se(…)” e se conclui com o final do quarteto. A madrugada, portanto, é a única
testemunha de um fenômeno melancólico: uma vontade se separa de outra – podemos
entender, dois amantes se separam. Essa vontade, no entanto, nos diz a adjetiva
restritiva que conclui o quarteto, “nunca poderá ver-se apartada”. O amor que foi
interrompido pela separação dos amantes se eterniza na memória.
No primeiro terceto, mais uma referência à madrugada, com a mesma estrutura “ela
só”, querendo dizer, “somente ela” viu as lágrimas se derramando dos olhos de ambos
os amantes e se juntando em um grande e largo rio, que pode ser um rio metafórico,
composto pelas lágrimas de tantos amantes que se separaram em tantas outras
madrugadas, ou mesmo um rio concreto, aquele sobre o qual parte o navio em que se
encontra o poeta, dando adeus à sua amada em terra firme. No segundo terceto, que
conclui o poema, mais uma referência sensorial: a madrugada ouviu palavras
magoadas, que arrefecem o ardor do fogo e dão repouso a almas que sofrem.
Podemos, com isso, arriscar uma resposta à pergunta inicial: a madrugada é triste por
presenciar o sofrimento de amantes que se separam, mas leda por permitir que esse
mesmo sofrimento possa ser significado e cantado; cheia da mágoa da separação, mas
também da piedade por aqueles que, separando-se de seus amores, poderão encontrar
nos versos um repouso para sua dor, que é compreendida, compartilhada e, por fim,
como queria o poeta – celebrada!
2. Exercícios
1. No que toca ao conteúdo do poema, o que podemos dizer sobre sua divisão em
estrofes:
a. O tratamento do assunto acompanha perfeitamente a divisão do soneto
em quartetos e tercetos: nos quartetos, temos referências aos
sentimentos pessoais do poeta; nos tercetos, temos referências aos
sentimentos que são atribuídos à madrugada.
b. Não há uma divisão lógica aparente; todo o poema é composto de
sensações contraditórias que se misturam ao longo das estrofes sem que
haja uma relação visível entre elas.
c. No primeiro quarteto, o poeta introduz seu tema e a razão por que quer
vê-lo tratado em um poema; no segundo quarteto e nos tercetos, há
propriamente o “cantar”.
d. O primeiro quarteto traz o ponto de vista e os sentimentos do poeta; o
segundo quarteto, os de sua amada; os tercetos apresentam uma
reflexão sobre ambos.
e. Os quartetos apresentam uma descrição da madrugada, os tercetos
trazem reflexões sobre seu significado.
2. Ainda sobre a divisão estrófica, lembramos que, no soneto que se inicia com
“Transforma-se o amador na coisa amada”, o “mas” que abre o primeiro terceto
marca uma relação de contradição entre o que foi dito nos quartetos e o que será
dito nos tercetos. Que tipo de relação vemos entre o que vai dito nos quartetos e
nos tercetos do soneto aqui analisado?
a. Também de contradição, já que os tercetos apresentam uma lição
otimista, contrastando com o desespero apresentado nos quartetos.
b. De conclusão: é nos tercetos que o poeta explica por que disse, ao longo
dos dois quartetos, que quer que a madrugada seja sempre celebrada.
c. De continuidade: no primeiro quarteto, vemos o poeta enunciar o
objetivo do poema; no segundo quarteto e nos dois tercetos, o vemos
descrever em primeira pessoa seus próprios sentimentos relativos ao
que ocorreu naquela madrugada.
d. De continuidade e sequência, o segundo quarteto e os dois tercetos
apresentam sequencialmente uma série de situações que são
presenciadas pela madrugada, como reforça a repetição do pronome
“ela” no início dos versos que abrem cada uma dessas estrofes e que se
referem à “triste e leda madrugada” que abre a primeira estrofe.
e. De generalização: os quartetos se atêm a um episódio específico em que
se separam dois amantes; o que se diz nos tercetos é algo que se refere a
todos os amantes que se separam.
3. O verso “Viu apartar-se de uma outra vontade” tem uma sintaxe
particularmente complexa. Como podemos analisá-lo sintaticamente?
a. A dificuldade se deve ao fato de que o sujeito do verbo “apartar” está
oculto; devemos subentender, depois de “apartar-se” a presença do
sintagma [o amante], ou seja, a madrugada “viu [o amante] apartar-se
de uma outra vontade”, entenda-se, a vontade da amada de quem se
despede.
b. As expressões “de uma” e “outra” são sintagmas diferentes, com funções
sintáticas diferentes, a saber, objeto indireto (“de uma”) e sujeito
(“outra”); a oração desdobrada em ordem direta ficaria: “Viu outra
vontade apartar-se de uma.”
c. Há um desvio da sintaxe tradicional bastante incomum aí: o pronome “-
se” funciona como objeto direto e o sintagma “de uma outra vontade”
funciona como objeto indireto, ambos complementando o verbo
“apartar”; no entanto, não há sujeito para o mesmo verbo.
d. Trata-se de uma oração na voz passiva sintética (ou pronominal), tendo
o sintagma “uma outra vontade” como sujeito da oração e o pronome “-
se” como partícula apassivadora.
e. Não há sujeito nessa oração porque o verbo “apartar” é impessoal, ou
seja, jamais vem regido por um sujeito.
4. Qual a importância do sentimento de “saudade” para a dinâmica interna do
poema?
a. Como vimos, o poeta quer que a madrugada referida seja celebrada ao
longo dos tempos. A saudade é o sentimento que o motiva a desejar tal
celebração, ou seja, é devido à saudade que aquela madrugada toma uma
importância que deve ser eternizada.
b. O poeta declara, no primeiro quarteto, que escreveu o poema
inteiramente inspirado pela saudade que sente de sua amada.
c. A saudade é um dos sentimentos que surgem no poema, assim como a
mágoa, a piedade, a tristeza e a alegria, e não tem nenhuma importância
especial.
d. A importância se dá pelo fato do sentimento de saudade ser atribuído à
madrugada, ou seja, a madrugada sente saudades do amor que ela viu
nos dois amantes que se separavam.
e. “Saudade” é uma palavra que só existe na língua portuguesa; por isso,
sempre que aparece em um poema de língua portuguesa, adquire uma
importância singular.