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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

Definição de desviância

Falta de consenso na definição de desviância, conceito que vem da sociologia.

O senso-comum – tende a definir desviância como algo anormal, sendo o anormal


definido em termos de ir contra as normas.

Existem quatro formas de definir desviância:


 Estatística: o CD é um comportamento que se afasta da norma estatística. Por
exemplo, um indivíduo que nunca bebeu álcool é desviante, foge à norma. Esta é
uma visão simplista, não sendo atualmente considerada.
 Absolutista: CD refere-se a uma violação dos valores da sociedade que são
encarados como absolutos, claros e óbvios. Esta definição foi aceita até aos anos
50.
 Normativa: o desvio constitui uma violação das normas. A sanção aplicada
implica uma conformidade com as normas. Aqui a desviância é relativa – pode
ser positiva ou negativa (por exemplo, positiva quando o indivíduo se desvia da
norma, mas este desvio é valorizado).
 Reativa: o CD é aquele que é apelidado como desviante. Os atos são etiquetados
de desviantes apenas por referência à reação social a esses atos. Remete para o
poder de certos grupos, ou seja, a desviância é aplicada pela sociedade, por
grupos de sujeitos específicos com determinado poder. A desviância não é uma
característica intrínseca ao indivíduo; é algo externo, atribuído pela sociedade.
Implica ainda o estereótipo e também separação / exclusão e perda de estatuto
(discriminação)
“O desviante é aquele a quem a etiqueta foi aplicada com sucesso” (H. Becker,
1963)

 Estatística
Perspetivas tradicionais ou positivistas. A desviância é algo inerente
 Absolutista ao sujeito.
 Normativa

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 Reativa – teorias da reação social (etiquetagem/estigmatização; poder de certos


grupos).

Perspetivas tradicionais ou positivistas


 Comportamento que se afasta significativamente das normas e expectativas
partilhadas por uma sociedade

 Há qualquer coisa inerente aos desviantes que os distingue dos não desviantes

Teorias da reação social
o O foco são as normas culturais com base nas quais um comportamento pode ser
apelidado de desviante

o O traço essencial dum CD é externo ao ator e ao ato



Heckert & Heckert (2002)
o Matriz que integra as expectativas normativas com a avaliação coletiva do
desvio
o Os comportamentos podem violar as normas ou ficar aquém das expectativas
normativas e levar a reacções quer negativas, quer positivas

Há autores que consideram que atualmente não faz sentido falar de comportamentos
desviantes
o Sumner (1994): Anunciou a morte da sociologia da desviância

A noção de desvio é uma ferramenta útil na medida em que agrupa, despatologiza e


desproblematiza certos comportamentos.

 Agrupa comportamentos que são alvo da reação social e da sanção penal e de


processos de estigmatização por colocarem em causa a moral

 Despatologiza porque os afasta das grelhas de leitura médico-psiquiátricas

 Desproblematiza por ser um quadro dinâmico que efetua uma relativização


histórica e cultural (Oliveira, 2008)

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Estigma – algo que desvaloriza o indivíduo, que o desqualifica e que o impede de ser
totalmente aceite pela sociedade.

Comportamentos estigmatizados
Noção de estigma – implica cinco etapas
 Etiquetagem
 Estereotipagem – é a imagem preconcebida de determinada pessoa, coisa ou
ação. Categoria favorável ou desfavorável que é partilhada por um grupo social
e que se refere a características pessoais.

 Separação

 Perda de estatuto

 Discriminação – comportamento que se caracteriza pelo tratamento de


indivíduos ou grupos com base no desprezo e na humilhação.

A moral pública como categoria demarcadora das descontinuidades entre norma e


desvio.

A complexidade da explicação científica


 Explicar um fenómeno não é fácil
 O indivíduo é um sistema biopsicossocial complexo

Como é que a ciência tem tentado compreender os comportamentos? - Os vários modos


de conhecimento científico:
 Descrição - descrição do fenómeno pelos seus diferentes traços (positivismo e
empirismo); descrever a aparência visível dos fenómenos; não é a sua essência,
mas sim o que é observado.

Ex.: Estudo feito em Portugal em 1841 por um médico higienista para caracterizar as
prostitutas. As características que ele encontrou foram do género: gordas, sarna, falta de
higiene, religiosas.

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 Explicação – vai para além da descrição tentando ir à essência do fenómeno;


tenta apreender os traços ocultos dos fenómenos, enquadrando a dimensão
temporal.
o Causal – associa-se um determinada causa “A” a um efeito “B”.
Exemplo: o consumo de drogas leva a que se cometa crimes.
o Estrutural – o fenómeno como manifestação visível de estruturas
biológicas, psicológicas e sociais. Ex.: (a) Relacionar o consumo de
drogas à presença dos neurotransmissores cerebrais endorfinas que se
assemelham aos opiáceos; (b) associar o consumo de drogas a um
determinado traço de personalidade; (c) explicar os comportamentos
desviantes através da estrutura social (ex: teoria da anomia de Merton).
o Processual – incluiu a variável tempo nas explicações.
 Interpretação – foca-se no sentido e no significado que o comportamento tem
para os sujeitos, como as pessoas atribuem significados aos fenómenos.

Em resumo…
 Há vários modos de conhecer

 Há várias dimensões a estudar: os fenómenos e os indivíduos são


multidimensionais

 A ciência tem evoluído na direção da complexidade: de descrições e explicações


simples para explicações complexas que articulam diferentes variáveis

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O crime e a delinquência

O crime, a delinquência, o delito e a infração, têm em comum o facto de serem


comportamentos sujeito a aplicação de uma sanção penal. Pode-se ainda distinguir duas
formas de delinquência: que se limita à adolescência; que começa mais cedo do que a
adolescência e vai-se mantendo ao longo do tempo (neste grupo de pessoas identifica-se
uma patologia).
O comportamento antissocial e as perturbações de comportamento não implicam
necessariamente crime. O comportamento antissocial pode estar associado ao
vandalismo, furto ou bullying, e o princípio de ação é prevenir este comportamento. As
perturbações de comportamento carecem de algo patológico. Corresponde a um
comportamento clinicamente significativo que tende a tornar-se resistente com a
passagem do tempo.

A Idade da imputabilidade penal em Portugal é de 16 anos, aplicando-se duas leis aos


menores que refletem a preocupação do próprio Estado em atender às especificidades de
cada faixa etária (crianças, jovens e adolescentes).

1. Lei tutelar educativa – o Estado entende que deve educar os menores para o direito,
criando por exemplo Centros Educativos. Este regime só se aplica a jovens entre 12 e
16 anos, abaixo dessa idade é a lei de proteção de crianças e jovens em perigo.

2. Lei de proteção de crianças e jovens em perigo - Pretende promover direito de


crianças e jovens ao bem-estar quando os pais não o promovem. O Estado intervém no
sentido de protegê-los a partir de comissões formadas por juízes e representantes da
comunidade civil.

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Diferentes abordagens do crime

Perspetivas biológicas
Origem na crença popular de que “o criminoso já nasce assim” - assume-se que este
teria determinados traços físicos que o caracterizariam especificamente e o tornariam
diferente dos outros seres humanos.
No século XVIII, esta crença transformou-se numa hipótese cientificamente estudada -
estudo do carácter e das funções intelectuais do Homem a partir da conformação do
crânio, ou seja, o estudo do tamanho do cérebro .

Cesare Lombroso
Segundo ele, há uma base biológica do crime que pode sermensurável, pelo que
estudava cadáveres para ver se encontrava diferenças entre criminosos e “normais”.
Descobre, um dia, anomalias num crânio que acreditava ser de características de etapas
evolutivas do ser humano (“besta primitiva” de nível inferior no desenvolvimento),
concluindo ter encontrado estado do crime: Crime é degenerescência.

Existiam dois tipos de criminosos derivados das características corporais:


Criminoso nato

 Indivíduo propenso a praticar determinados crimes, e não um doente (que se
podia curar) ou um culpado (que se podia
 Transporta o património genético determinador da criminalidade
 Sinais físicos: nariz torcido, molares salientes, estrabismo; sinais psíquicos:
ausência de sensibilidade moral, manifestações de vaidade (características que se
transmitem geneticamente).
 O criminoso seria um tipo atávico: um indivíduo no qual haveria uma regressão
ao Homem primitivo.

Criminoso ocasional

 “homem normal” que por acaso cometeu crime

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 A sua tendência para crime é resultado da sua organização biológica (como


baixa capacidade cefálica, orelhas largas, testa saliente, tatuagens, caninos
proeminentes…).

A partir deste estudo célebre, cria-se a chamada “antropometria criminal”: método de


identificação dos criminosos obrigatórios no sistema judicial, com mensuração
detalhada de características fisiológicas.

Abordagens no domínio psicológico


Teoria da anomia de R. Merton

O ser humano tende a realizar os objetivos estabelecidos pela sociedade, mas nem todos
o conseguem através de meios culturalmente aceitáveis (i.e., o sucesso económico
permite sucesso social, embora algumas pessoas usem meios não legítimos para tal,
como o roubo).

Anomia: um excesso de investimento no sucesso em detrimento do respeito pelas


normas estabelecidas

O comportamento desviante pode ser visto como um fosso entre as aspirações definidas
culturalmente e os meios estruturados socialmente, sendo que alguns aspetos da
estrutura social podem gerar comportamentos antissociais.
Mais tendência para o desvio nas classes mais desfavorecidas - a pobreza por si só não
explica o crime, mas junto com desvantagens que lhe estão associadas, explica a
desviância. Não se trata só de “falta de oportunidade” ou de uma questão de económica,
isto é, a pobreza por si só não explica o crime.

Teoria do controlo da delinquência de T. Hirschi

 A delinquência é o resultado de um vínculo fraco ou inexistente em relação à


sociedade
 “Porque é que a maioria das pessoas respeita a lei?”

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 É a pressão social que evita o delito e esta pressão não existe se o indivíduo
estiver desvinculado do seu grupo social

Elementos do vínculo social


 Ligação aos grupos mais próximos (mãe, pai, irmãos..) onde o individuo aprende
e interioriza normas
 Internalização das normas e valores
 Respeito pelas expectativas dos outros
 Compromisso com as linhas de ação convencionais (comportamento: é aquele
que é socialmente desejado)
 Envolvimento em atividades convencionais que legitimem o uso do tempo e da
energia
 Crença num sistema de valores comuns (pessoas devem respeitar a lei caso não
o façam, arranjam racionalizações para se sentirem bem com elas próprias).

Teoria da etiquetagem
 No centro desta teoria está a interação entre os indivíduos/grupos e a sociedade
 Um dos passos cruciais no processo de construção de um padrão criminal
estável é a experiência de ser etiquetado como criminoso
 Etiquetagem: consequências importantes para a participação social do indivíduo
e para a sua autoimagem => novo estatuto
 Valor simbólico da etiqueta de desviante

•Hughes (1945): estatutos superiores x subordinados

•Profecia auto-realizável: a pessoa sente-se desviante e passa a comportar-se de acordo


com a imagem que acha que têm dela

•Carreira de desviante

•Conclusão: O comportamento é uma consequência da reação pública à desviância mais


do que uma consequência de uma qualidade inerente ao ato desviante

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Técnicas de neutralização de Sykes e Matza (1957)

 O comportamento antissocial é um tipo de ação aprendida na interação com o


meio
 Esta aprendizagem não é resultado da aquisição de valores e normas desviantes
 Delinquentes estão de acordo com a ordem social dominante e sentem
admiração e respeito por quem respeita a lei -os delinquentes podem, ao longo
das suas carreiras criminais, adotar valores subculturas mas preservam sempre
valores do sistema social dominante, conseguindo estabelecer uma coexistência
entre sistemas de valores opostos.
 Os delinquentes criam condições para que a prática de atos que atentam contra
os valores em que acreditam não de torne dissonante ou penosa para si - como
explicação para o facto aparentemente paradoxal que é a sua delinquência, eles
propõem justificações para os seus próprios atos - racionalizações - a
desaprovação dos seus próprios atos, decorrente das normas internalizadas e
com as quais eles estão em conformidade, é neutralizada para que a sua
autoimagem não fique muito danificada, sendo uma estratégia de anular o ato
delituoso para que deixe de gerar mal-estar.

Chamam a estas justificações do crime (comportamentos desviantes) técnicas de


neutralização e dividem-nas em 5 grandes tipos:
 A negação da responsabilidade: o indivíduo consegue identificar um conjunto
de forças que o empurraram para o crime, sem que a responsabilidade direta
tenha sido sua; considera-se a si próprio mais como agido do que ator o que lhe
permite concretizar o ato sem pôr em causa aquilo em que acredita (exemplo,
indivíduos que dizem estar alcoolizados quando cometeram o crime);
 A negação dos danos: o ato provocou poucos danos na vítima (exemplo, o
homicida afirmar “eu não lhe fiz mal nenhum”).
 A negação da vítima: o indivíduo acredita que o dano que possa ter causado à
vítima não tem significado e até veio reparar uma injustiça prévia (a vítima é
transformada em agressor que merece e justifica tudo a que foi sujeita. Exemplo
– violadores que são violados na prisão)
 A condenação dos condenadores: aqueles que estão a fazer acusações também
têm comportamentos menos éticos. Ele não fez nada que os outros também não

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façam; os que condenam são hipócritas, eles próprios transgressores e só


pretendem prejudicá-lo
 O apelo a lealdades superiores que são mais importantes do que o
cumprimento da lei. A delinquência como um processo de tomada de decisão
entre dois importantes sistemas de valores.

Teorias psicológicas do crime

 Teorias da personalidade criminal


o Centram-se na procura de uma personalidade criminal que é específica
do criminoso
o A personalidade criminal determina a “passagem ao ato” delinquente

 Abordagens construtivistas e fenomenológicas


o Ligada à análise do vivido do criminoso e do seu percurso na
criminalidade; orientadas para a compreensão dos processos
o Procura o sentido que a transgressão tem para o seu autor
o Teorias do “ator social”

Pinatel
 Estudo da passagem ao ato e identificação dos traços psicológicos que lhe estão
subjacentes
 Teoria do nó central
o O criminoso é um ser humano como os outros a única diferença é que
passa ao ato mais facilmente
o Personalidade criminal:
 Nó central: responsável pela passagem ao ato (agressividade,
egocentrismo, labilidade e indiferença afetiva)

 Variantes: responsáveis pelo tipo de ato - vão determinar


diferenças inter-individuais e a perigosidade do indivíduo
(atividade; aptidões físicas e intelectuais; técnicas e necessidades
nutritivas e sexuais orientam as diferentes modalidades de

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execução desse ato mas são neutras em relação à própria


passagem ao ato)

Le Blanc e Fréchette
A personalidade delinquente é adquirida progressivamente e consolidada na
adolescência, sendo que desenvolvem, no fundo, teoria do nó central, mas dando cariz
mais desenvolvimental.

Síndrome da personalidade delinquente


A partir de estudos longitudinais e estudos de avaliação psicológica, introduzem uma
dimensão desenvolvimental na teoria da personalidade criminal/teoria do nó central de
Pinatel, defendendo que:
 A personalidade delinquente é adquirida progressivamente e consolidada na
adolescência
 A personalidade delinquente organiza-se em forma de síndrome, composto por
três elementos:
1. Enraizamento criminal - Traduz o processo de envolvimento criminal progressivo,
englobando 3 processos:
 Ativação - sequência de fases de progressão na delinquência; esta progressão na
atividade delinquente não é aleatória, mas predizível.
 Agravamento (delinquência grave) - o processo desenvolvimental que se
encontra na base da "delinquência grave"; a sequência do aparecimento das
diferentes formas de atividade delinquente é escalada de acordo com a sua
gravidade.
 Desistência (remissão espontânea) - o processo de diminuição espontânea da
atividade criminal em função da duração, variedade, gravidade e frequência da
atividade delinquente.

2. Dissociabilidade perdurável - Traduz o impacto dos fatores criminógenos do meio


sobre o comportamento dos delinquentes. Em cada idade os diferentes elementos do
meio têm um impacto diferencial: família, reação social, meio de vida, pares marginais.

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3. Egocentrismo exacerbado - Integra os fatores de personalidade envolvidos no


desencadeamento e manutenção da conduta delinquente; são os fatores da personalidade
ou traços psicológicos que fazem a mediação do impacto dos fatores do meio sobre o
comportamento dos jovens (e.g. hipossociabilidade, negativismo, insegurança). São
essas fatores que fazem mediação entre personalidade e meio, insegurança,
dissociabilidade e negativismo.

Percursores das abordagens construtivistas

Explicação do crime pelo desenvolvimento cognitivo e moral. O crime é o produto final


de um conjunto específico de características da personalidade e de processos de
pensamento. O crime decorre de distorções cognitivas que promovem um estilo de vida
criminal, sendo que a personalidade é entendida em termos mais amplos.

Yochelson & Samenow

 O crime é o produto final de um conjunto específico de processos de


pensamento e de características de personalidade
 O crime tem sempre uma componente intencional. Não nascemos criminosos
nem fazem de nós criminosos à nossa revelia, tornamo-nos criminosos a partir
de uma sucessão de escolhas feitas desde muito cedo na nossa vida.

Centraram-se na análise dos padrões de pensamento e na sua relação com a conduta


criminosa desses indivíduos
Identificam dois grandes grupos de processos cognitivos considerados “erros de
pensamento” característicos do criminoso”:
 "Padrões" de pensamento criminal: equivalentes a "traços de carácter", não
sendo exclusivos do criminoso encontram nele uma dada organização e
recorrência que não se encontra no não-criminoso (ex. energia, medo, raiva, …)

 "Erros automáticos" de pensamento: são formas de pensamento imediatistas que


facilitam a emergência do ato delituoso; são coerentes e lógicos no quadro

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existencial do criminoso (ex. fraca capacidade de tomar decisões, fazer-se de


vítima, dificuldade em colocar-se no papel do outro, …)

Padrões de comportamento criminal

Estes padrões de pensamento não devem ser considerados causais e determinantes para
a passagem ao ato criminoso, nem específicos; nem podem ser considerados
isoladamente.

•Continuum criminal: pensamento irresponsável <----> pensamento responsável


– Os criminosos extremos, situados no pólo anti-normativo, são os que as autores mais
estudaram e nos quais identificaram os 16 padrões de pensamento criminal e os 16 erros
automáticos de pensamento

Críticas as teorias da personalidade criminal

O conceito de personalidade criminal é:


 É uma construção ingénua do real
 É de um reducionismo inaceitável
 Tem uma conceção estática do indivíduo
 Instrumentos limitados para medir o que pretendem

Abordagem construtivista e fenomenológica

Abordagens fenomenológicas
 No estudo do crime procuram o sentido que a transgressão tem para o seu ator
pela análise do vivido do criminoso e do seu percurso.
 A ação delituosa resulta da interação entre determinados contextos, incluindo
experienciais que levam o sujeito a interpretar a situação de uma dada forma
particular e a agir de acordo com o sentido que lhe atribui.
 O estudo do crime não é o estudo das causas, mas o estudo dos significados, das
lógicas para os processos (ação que toma lugar numa dada temporalidade e num
dado contexto)

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C. Bartol (1988, 1991)

•É necessário estudar as interações complexas entre as dimensões cognitivas,


motivacionais e afetivas e compreender os processos que permitem que os delinquentes
tenham diferentes “versões do real”.

•Rejeita a pré-determinação da personalidade considerando que a delinquência passará


pela deliberação dos indivíduos e, consequentemente, pela intencionalidade associada a
essa ação, pela atribuição de significações próprias e pela construção de um sentido para
a existência transgressiva.

•Os delinquentes como ativos resolutores de problemas (percebem, codificam,


interpretam e tomam decisões com base nos elementos que o meio lhes propicia).

•As atividades delinquentes como comportamentos subjetivamente adaptativos (e não


deficitários ou patológicos) face às situações e histórias de vida dos indivíduos, suas
características desenvolvimentais e circunstâncias que rodeiam a ação.

•A forma como as pessoas adquirem, internalizam e desenvolvem os valores pessoais


tornou-se um ponto central nas investigações sobre a delinquência.

Teoria da análise estratégica – Cusson (1981, 1986)

Inclui-se num conjunto de teorias: Teoria da escolha racional, teoria da análise


estratégica, criminologia do ato, paradigma do ato criminal.
 Partem do princípio de que o criminoso faz escolhas e toma decisões: ele nunca
é totalmente determinado por forças exteriores ao seu controlo, como as
condições biológicas ou sociais.
 A decisão nunca é totalmente racional: as decisões humanas são todas de uma
racionalidade limitada, num continuum que vai da “exclusiva paixão” à
“exclusiva razão”.

Pressupostos fundamentais:
 O crime não é um sintoma de uma personalidade mas um comportamento
complexo e intencional
 O crime é um comportamento orientado para fins

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 Mais importante do que tentar determinar as causas do crime, é perceber os


objetivos e os sentidos destes atos para os seus autores

 A racionalidade do crime nunca é total

 Existe uma "racionalidade subjetiva" que influencia as tomadas de decisão

 A noção de racionalidade remete necessariamente para uma situação pré-


criminal e para a forma como o delinquente a vê e vai interagir com ela

O crime é um comportamento marcado, simultaneamente, pelo conflito (entre


delinquente e vítima, delinquente e lei, delinquente e instâncias de controlo social, entre
diferentes delinquentes) e pela necessidade de gestão estratégica, de negociação e de
influência recíproca, de correlação de forças ou de poder

Assim, a análise estratégica centra-se:


 Nas escolhas que são feitas pelo delinquente e nos objetivos e sentidos que as
orientam;
 No estudo das interações dinâmicas que se estabelecem entre o delinquente e
todos aqueles a quem se opõe

Os objetos de estudo privilegiados são:


 As configurações ou padrões criminais, ou seja, a forma de agir ou o conjunto
estruturado de características de ação, comum a um dado grupo de criminosos
num dado tempo
 A situação pré-criminal, enquanto conjunto de circunstâncias exteriores à
personalidade do criminoso que precedem e rodeiam o seu ato
 As táticas criminais do indivíduo ou grupo, ou seja, a resposta do delinquente à
situação pré-criminal, as sequências de escolhas ou gestos que este implementa
durante a ação criminal, ou ainda, os meios disponíveis para realizar os fins
naquela situação

A “análise estratégica” concebe o delito como um comportamento orientado para


resultados, tendo a sua racionalidade própria feita da ponderação das oportunidades que
se oferecem ao seu autor e da conduta dos seus adversários

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Criminalidade como estilo de vida - Walters (1990, 1998)

Estuda a forma como os indivíduos se envolvem e evoluem numa carreira criminal,


como estabelecem esse estilo de vida e que mecanismos e processos o sustentam
Tem que se ter em conta quatro aspetos fundamentais na avaliação do estilo de vida do
indivíduo:
 As condições: aspetos pessoais e sociais que influenciam a predisposição para a
vida criminal no indivíduo, tais como a vinculação social, a necessidade de
estimulação e busca de sensações e o baixo autoconceito
 A escolha: de um estilo de vida antissocial explica-se porque o sujeito prefere
evitar as responsabilidades, tem muitas dúvidas sobre as vantagens de um
desempenho convencional, é portador de um profundo sentimento de
incompetência e entende que o esforço pela convencionalidade não justifica os
ganhos
 As cognições: distorções cognitivas típicas de um delinquente crónico, que se
combinam entre si para produzir os estilos de vida criminal. Por exemplo: a
auto-desculpabilização (utilizar justificações irrelevantes para os atos
cometidos); o sentimentalismo (aparentar ser “boa pessoa” e ter qualidades); o
super-otimismo (visão irreal dos seus atributos e da capacidade de evitar as
consequências das suas ações desadequadas); a indolência cognitiva (procurar
comportar-se segundo a lei do “mínimo esforço”)

 O comportamento: são os quatro estilos de vida criminal:

 Irresponsabilidade: estilo de comportamento marcado pela falta de


responsabilidade e não cumprimento do que é esperado nas várias áreas de
funcionamento do indivíduo (família, amigos e colegas de trabalho);
verifica-se a quebra de compromissos e expectativas.
 Auto-indulgência: estilo de vida criminal em que os indivíduos demonstram
ser egocêntricos e procuram obter gratificação imediata, daí muitas vezes o
recurso ao uso de estupefacientes ou outras substâncias e aos jogos; os
sujeitos tendem a usar as relações sociais em benefício próprio, para
obtenção de gratificação imediata, sendo a impulsividade uma das suas
principais características.
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 Comportamento Interpessoal Intrusivo: estilo de vida criminal


caracterizado pelo desrespeito pelos direitos dos outros. Neste grupo são
considerados os indivíduos que cometem crimes como os de homicídio,
violação, abuso sexual de menores, muitas vezes de forma violenta; têm um
padrão de comportamento marcado pela agressividade elevada.
 Violação das Regras Sociais: envolve a não aceitação das normas sociais já
que estas não se coadunam com o comportamento adotado pelo sujeito.
Estes indivíduos têm um padrão de comportamento que revela indiferença
perante as normas, leis e regras da sociedade, violando-as ostensivamente ou
servindo-se de subterfúgios e habilidades para as contornar ou manipular,
sempre em seu proveito e com evidentes prejuízos para terceiros.

Em suma
O estilo de vida de um criminoso caracteriza-se pela irresponsabilidade na escola, no
trabalho e em casa, a que se alia uma propensão para o envolvimento em atividades
marcadas pela indiferença, a desinibição, a impulsividade e a auto-desresponsabilização,
tais como o abuso de álcool e drogas, a promiscuidade sexual, o vício do jogo. Este
retrato completa-se com o início precoce na violação de normas, regras e costumes
sociais, para além de ofensas persistentes aos direitos e à dignidade das outras pessoas.
De acordo com a maior ou menor presença de distorções cognitivas e a forma como
estas se “encaixam” irá predominar um estilo de criminal em detrimento de outros ou,
nos casos mais problemáticos, podem coexistir mais do que um senão todos os estilos.

Teorias do ator social

 O indivíduo é encarado como um sujeito que se constrói e dá sentido aos seus


atos
 Conceito de ator social
o O sujeito não é um ser passivo
o É dotado de um ponto de vista próprio
o É ator no quadro social
 Noção de processo
o Ação que toma lugar numa dado tempo e num dado contexto

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Christian Debuyst

O crime deve ser analisado a partir da interação de 3 aspetos fundamentais:

 A posição que o indivíduo ocupa na sociedade, as características do contexto e


as interações que aí desenvolve
 Os processos que daí resultam
 As características da personalidade: possui um ponto de vista próprio, que
depende da posição que ocupa no quadro social e da sua história de vida,
estabelecendo e defendendo a sua identidade pessoal e o sentido da sua
existência e da sua ação.

Em suma…
 Determinismo simples > determinismo multifatorial, interacionista e dinâmico
mas ainda sem lugar para a indeterminação da ação e esquecendo a
complexidade da realidade
 A “personalidade criminal” não se “aplica” a todos os delinquentes
 Estudos diferenciais que não recorrem a esta noção mas que partem do mesmo
pressuposto de que os delinquentes possuem um conjunto de características
deficitárias (e.g. desenvolvimento moral, autoconceito, empatia, competências
sociais, …)
 O estudo da personalidade atribui crescente importância aos fatores sociais e
ecológicos e à sua interação com os processos de mediação realizados pelo
indivíduo (processos cognitivos, emocionais e afetivos) e à construção de
significados.
 Os processos cognitivos passam a ser entendidos como processos de mediação
internos
 Não é claro que existam diferenças de personalidade entre delinquentes e não-
delinquentes.
 A pesquisa atual orienta-se cada vez mais para a compreensão dos processos
complexos pelos quais uma pessoa se implica numa conduta delinquente,
adquire uma identidade criminal e adota, em último recurso, um modo de vida
delinquente (Odriozola, 1991).

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 O conceito central já não é o de causa ou de determinação mas o de processo,


entendido enquanto ação que toma lugar numa dada temporalidade, integrado
num dado contexto; jogo de interação entre diferentes dimensões que se
desenrola no tempo e numa dada história particular, e no âmbito do qual as
ações adquirem o seu sentido.

Modelo desenvolvimental de risco de comportamento antissocial no adolescente


(Coie, 1996)

Comportamento antissocial persistente - Que crianças/adolescentes são estes?

Implicações para a prevenção


 Identificar precocemente as crianças em risco
 Vantagens em programas em idades precoces
 O risco não é uma característica estática de crianças e famílias mas um processo
desenvolvimental

Transposição do modelo para os programas de prevenção:


Crianças
 Promoção de competências académicas, sociais e emocionais

Famílias
 Treino de competências
 Apoio para lidarem com as tensões a que estão sujeitos
 Aprender a apoiar o desenvolvimento das suas crianças na escola
 Encontrar atividades agradáveis para terem com as crianças

Escola
 Equipamento escolar
 Densidade das crianças em risco
 Preparação dos professores
 Ajuda aos professores para lidarem com os alunos mal preparados
 Construção de relações de cooperação com os pais

Conclusão:
 Prevenção baseada nos múltiplos sistemas (criança, família, contexto escolar)
 Dificuldades

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CONSUMO DE DROGAS E TOXICODEPENDÊNCIA

O conceito de droga
Não é fácil definir este conceito devido a vários motivos:
 Existem diferentes substâncias psicoativas
 Com diferentes propriedades farmacológicas
 Diferentes tipos de usos
 Diferentes tipos de consumidores
 Com diferentes expectativas simbólicas – expectativa que o sujeito tem sobre os
efeitos que a substância vai ter.
 Consumindo em diferentes contextos
 Em diferentes momentos históricos e socioculturais

Não é fácil definir porque existem significados diferentes consoante a perspetiva


adotada para analisar e compreender o fenómeno.

Droga = medicamento (receitado); Droga = veneno (provoca morte); Droga = droga de


abuso

Por exemplo, se adotarmos uma perspetiva médica, a droga pode ser vista como um
propriedade curativa. Por outro lado, se adotarmos uma perspetiva jurídica, a droga é
vista como algo ilícito.

Medicina: qualquer substância com potencial para prevenir ou curar doenças ou para
melhorar o bem-estar físico ou psicológico
Farmacologia: qualquer agente químico que altere os processos bioquímicos ou
fisiológicos dos tecidos e organismos

Existe uma lista de drogas ilícitas que foram identificadas. Essa lista é atualizada
consoante o aparecimento de novas substâncias. No contexto da “luta contra a droga”,
droga significa qualquer substância que esteja incluída nas listas de drogas ilícitas.
É vista como uma substância química que afeta as funções orgânicas e psicológicas dos
seres vivos.

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

Segundo Domingo Comas, droga é “Aquilo que uma dada comunidade convencionou
chamar droga e enquanto uma substância não for denominada droga, ela não é, de facto,
droga”. Isto remete para questões culturais - “então o tabaco não é uma droga porque
nós não chamamos droga?”. Quando se diz “ela não é, de facto, droga”, podemos usar o
exemplo dos comprimidos ansiolíticos, os que consomem não são vistos como
toxicodependentes e a própria pessoa não se apercebe que é dependente.

Pharmakon – a droga pode ser vista como um medicamento ou como um veneno,


dependendo da dosagem.

“Só a dose faz o veneno” Paracelso (1493-1541)

Margem de segurança:
 Custo do ganho terapêutico
 Capacidade do organismo se adaptar ao estado de intoxicação (ou tolerância)

Uma droga não é apenas um composto com propriedades farmacológicas. Os seus


efeitos dependem também do que ela representa – expectativas simbólicas.
Os efeitos da droga dependem de três fatores:
 A dose, a apresentação (formas diferentes da mesma substância) e a pureza.
 As condições objetivas de ingestão: depende do sítio - discoteca, laboratório,
café - e a forma - inalado, fumar, comer…. - há compotas, bolos de haxixe, em
que o efeito demora mais a chegar mas é mais intenso e duradouro, não sendo só
inalado. Nos centros de reabilitação, a administração de drogas por parte dos
profissionais a doentes, vai ter efeitos diferentes se fosse o próprio indivíduo a
ingerir a droga sozinho ou em grupo.
 As expectativas do sujeito (simbólica ou eficácia simbólica)

Drogas - diferentes significados/tipos de uso

 Religioso (a droga como forma de comunicar com o divino; há substâncias que


são ingeridas nas cerimónias religiosas)

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 Médico (a droga como sedativo; uso curativo, tem como objetivo curar e aliviar
doenças, morfina, ansiolíticos, analgésicos, aspirina. A metadona é um opiáceo
sintético e tem uso medico, serve um pouco de substituição temporariamente até
uma pessoa deixar de depender fisicamente da droga)
 Lúdico (a droga como uso criativo, festivo, socialmente aceite, como o álcool).
 Ilegal/estigmatizante (a droga ilegal; quando a substância não é permitida,
como por ex. charros)

Uso Abuso
Consumo dentro de certos limites; nem Uso desadaptativo; implica uma
todos os que usam chegam a abuso. deterioração a vários níveis do indivíduo.

As pessoas têm a noção dos perigos e as Não é sinónimo de toxicodependência: há


pessoas são capazes de gerir o uso destas pessoas que usam a droga a vida toda e
substâncias não se tornam toxicodependentes

Toxicodependência – necessidade de consumir para manter um nível de funcionamento


satisfatório. Conotada com uma perda de controlo face à substância. Remete para:
 Dependência física: adaptação física ao funcionamento com a droga (química,
neurotransmissores)
 Dependência psicológica: ânsia e desejo de consumir

O que caracteriza a toxicodependência?


Tolerância – necessidade de aumentar a dose para produzir os mesmos efeitos que a
substância produzia antigamente. A sensibilidade das células alvo sofre adaptações com
a exposição da droga no cérebro (as alterações por vezes originam perda de
sensibilidade, que não ocorre em todas as drogas).

Tolerância cruzada – quando os efeitos de uma droga reduz os efeitos de outra


do mesmo tipo.

Síndrome de abstinência – conjunto de sintomas fisiológicos ou psicológicos que


ocorrem quando o consumo de droga cessa ou diminui drasticamente. É a reação
corporal quando um certo nível não se mantém no seu nível homeostático adaptável, o

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que explica a dificuldade dos toxicodependentes em deixar a droga. Depende do tipo de


droga, da quantidade de droga consumida e das características do indivíduo.
 Sintomas: efeito oposto ao consumo da droga (calma/nervos).

O mito da escalada – o aumento do consumo ao longo do tempo irá provocar um


aumento no tipo de droga (passar de drogas mais leves a mais pesadas) que, por sua vez,
irá provocar um aumento de comportamentos antissociais.

História conceptual da dependência


•Séc. XVIII
–A dependência deriva do produto – há dependência porque existe produto
–Modelo uni-fatorial

•Séc. XIX (e início do séc. XX)


–A dependência resulta da interação entre o produto e o consumidor
–Modelo bi-fatorial

•A partir do séc. XX
–A dependência resulta da interação entre o produto, o indivíduo e o meio
–Modelo multi-fatorial; biopsicossocial

Algumas classificações das drogas


•A primeira: L. Lewin (1924)
•Médica/Farmacológica

 Pela origem (naturais, sintéticas e semi-sintéticas)
 Pela estrutura química
 Pelos mecanismos de acção

 DSM – IV (definiu 11 classes, mas separa substância que tem muito em comum:
álcool, anfetaminas, cafeína, cannabis, cocaína, alucinogénios, inalantes,
nicotina, opiáceos, fenciclidina e sedativos, hipnóticos e ansiolíticos)

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 Lewin - descreve o caso da dependência da morfina, que influenciou muitas


teorias e ainda hoje se utiliza para descrever a dependência, para a entender do
ponto de vista médico - 1ªclassificação científica

Elemento estrutural: efeito principal da substância descritos em termos psicológicos, em


latim
 Euphorica (euforizantes)
 Phantastica (alucinogénios)
 Inebriantia (embriagantes)
 Hypnotica (hipnóticos)
 Excitantia (excitantes)

Morfinismo: relatou o 1º caso de dependência, utilizando pela 1ª vez os conceitos de


dependência, tolerância, síndrome de abstinência, o que abriu portas para modelo
médico e conceito de toxicodependência.

Médica/Farmacológica
 Depressores do SNC (são os que mais relaxam; reduzem a ansiedade e a
insónia.): Álcool, barbitúricos, benzodiazepinas, ópio e opiáceos, colas e
solventes
 Estimulantes do SNC (aceleram processos cerebrais; põem as pessoas alegres):
coca e derivados, anfetaminas, cafeína
 Alucinogénios (alteram percepção e orientação espacial e temporal; distorção
das percepções), aumentam a pressão sanguínea e temperatura): LSD, PCP,
mescalina, MDMA e outras variantes, cannabinóides

Explicação do consumo de drogas e toxicodependência

•Teorias descritivas/nosográficas

•Personalidade prévia ou predisponente

•Abordagem psicanalítica

•Teorias comportamentalistas

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•Teorias cognitivistas

•Abordagem sociológica (ou psicossocial)

Nosografia

•Abordagem clínica

•Toxicodependência é encarada como uma perturbação mental

•Modelo psiquiátrico

Personalidade prévia ou predisponente


 Personalidade toxicofílica – bastava um contacto com a droga para se tornarem
toxicodependentes.
o Surge no seio das abordagens psicodinâmicas
o Conceção estática da personalidade
o Personalidade aditiva: conceito abandonado

 Associação da toxicodependência à personalidade “boderline” (grande


instabilidade emocional, agressividade, dificuldade em estabelecer relações
interpessoais) - Não houve muito consenso
 Perfis psicológicos: Recurso a conceitos como auto-estima, autocontrolo,
assertividade, resistência à frustração,…
 Alguns estudos começaram a demonstrar uma correlação entre alguns traços de
personalidade e o consumo de drogas, sendo eles:
o Procura de sensações (sensation seeking)
o Impulsividade
o Baixa auto-estima
o Alexitimia – incapacidade de exprimir emoções
Críticas
 Não é possível definir uma personalidade-tipo
 Os traços de personalidade por si só são muito limitados nas suas explicações:
não explicam a pluralidade de situações concernentes à relação indivíduo-drogas
– dependerá também de aspetos sociais, culturais, históricos e da mesma relação
do indivíduo com a droga

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 Depende da personalidade mas também do contexto, da droga, da história de


vida, dos significados.

Abordagem psicanalítica
 Modelo mais dinâmico: tem em conta o percurso biográfico, as relações
precoces, o vivido quotidiano, a relação com a família.
 Alguns conceitos consensuais: regressão; identificação; depressão
 Problematização das instâncias parentais
 Não deixa de ser causalista

Teorias comportamentalistas
A toxicodependência é aprendida através de 2 processos básicos: reforço positivo e
reforço negativo. No reforço negativo, por exemplo, os efeitos da ressaca levava a que o
indivíduo voltasse a consumir novamente.

Teorias cognitivistas
Teoria racional emotiva da adição (Ellis e col.)

Crenças irracionais básicas – crenças que os toxicodependentes têm em mente que os


leva a manter o consumo de droga:
1. Degeneração – minimização do problema
2. Expectativas sobre os efeitos – a droga provoca sempre bem-estar, prazer e
excitação…
3. Crença associada à ansiedade desconfortante e tolerância à frustração – a ideia
de deixar de consumir a droga provoca uma ansiedade desconfortante que o indivíduo
considera que não tem de passar.
4. Perceção de baixa auto-estima – sucessivas desintoxicações que não foram bem
sucedidas.
5. Sentimento de culpa, desânimo e desistência

Abordagem psicossocial – as carreiras de consumo da droga


As características e processos do meio agem sobre o indivíduo: direta (pressão dos
pares) ou indiretamente (e.g. quando os processos de socialização são deficitários e não

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dotam o indivíduo de comportamentos como assertividade e comunicação, o que poderá


potenciar o início de consumo de drogas).

 Fatores (não é necessário cumprir todas as condições):


 Indivíduo: curiosidade, tomada de risco, procura de sensações, isolamento, auto
imagem negativa, atitudes positivas face à droga, modelos.
 Família: padrões de comunicação deficitários, pais alcoólicos/toxicod., hiper-
rigidez ou negligência, superproteção ou abandono, atitudes dos pais face às
drogas, origem da família (NSE).
 Pares: pressão, reforço social, procura de modelos.

A carreira constrói-se socialmente pelo processo interativo entre as cognições do


próprio consumidor, à substância e aos seus efeitos e a ação e a reação do seu sistema
social, integração num sentido geral.

Abordam as carreiras sublinhando aspetos:


1. A diversidade dos modos de entrada
 A forma-rutura: a entrada no consumo está relacionada com um acontecimento
biográfico de grande impacto que simboliza uma viragem. Por exemplo, a morte
de um familiar.
 A forma-engrenagem: entrada progressiva na carreira pontuada por uma série de
pequenos acontecimentos mais ou menos distantes no tempo (ex: Insucesso
escolar – abandono escolar – pares – haxixe – roubar – ácidos – prisão –
heroína…)
 A forma ligada à sociabilidade nas cidades: traduz a influência das redes de
sociabilidade. Por exemplo, “se eu não vivesse aqui, nunca consumiria drogas”.

2. A dinâmica dos usos


Salientam 2 mudanças que marcam diferenças nas trajectórias:
 A passagem da cannabis (desinibidor) para a heroína (fator de destruturação):
daqui passa-se de uma gestão do prazer para uma gestão da falta.
 A passagem da heroína fumada para a heroína injectada: implica uma maior
dependência, pode levar ao policonsumo, simbologia negativa associada ao uso
da seringa.

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3. Os mecanismos sociais que contribuem para a instalação das carreiras


 Além dos já referidos, o estilo de vida do consumidor de drogas duras que inclui
uma serie de rotinas para a obtenção de droga
 Os efeitos produzidos pelos organismos de repressão

Não há um percurso-tipo/linear do consumo de droga, mas famílias de carreiras


com características típicas e traços singulares biográficos.

Intervenção
Programas de intervenção orientados para a abstinência
 Objetivo: abstinência total
 Programas de desintoxicação
 Programas de substituição (exemplo, programa da metadona)

Programa de redução de riscos


Redução de riscos e minimização de danos

 Conjunto de medidas cujo objetivo é limitar os efeitos negativos do consumo de


drogas
 “Admite-se” o consumo de drogas para proteger a saúde pública e a saúde do
consumidor – respeita-se o consumo de droga.

Alternativa aos modelos Moral/criminal (vê o consumo de drogas como algo imoral) e
da doença (vê o consumo como uma doença)

Principais características: Pragmatismo (a opção de limitar os danos é mais realista do


que acreditar que os indivíduos vão deixar de consumir completamente), Humanismo
(respeito pela dignidade dos consumidores; aceitação da escolha) e Proximidade
(aproximar os indivíduos do sistema/programas de saúde).

Surgimento na Europa: anos 80, Holanda, Junkiebond; anos 90, reino Unido, Liverpool
(1ª conferência internacional sobre redução de riscos).

Portugal: Programa de troca de seringas, 1999: estratégia nacional de luta contra a


droga, Dec.- Lei nº 183/2001

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Em Portugal foram aplicadas duas propostas:


 Programas de consumo vigiado – salas de consumo assistido.
 Oferta de informação sobre a composição das drogas em contextos de elevado
consumo.

Críticas: deixa de fora o sistema prisional

Contudo, os programas de redução de riscos:


 Promove um fácil acesso aos serviços
 Reduz o estigma associado ao consumo
 Abrange uma variedade de comportamentos de risco associados
 Efeitos do uso da droga num continuum

A PROSTITUIÇÃO E OUTROS TRABALHOS SEXUAIS

Conceito de trabalho sexual


Expressão usada pela 1ª vez por Carol Leigh, 1979 e utilizado pela 1ª vez numa
publicação científica: “Sex work. Writings by women in the sex industry” de Delacoste
& Alexander (1987)

 Serviços, desempenhos ou produtos sexuais comerciais (prostituição,


pornografia, striptease, danças eróticas, chamadas eróticas, …) (Weitzer, 2000)

 Atividade comercial de prestação de serviços em que é desempenhado um


comportamento com um significado sexual ou erótico para quem compra o
serviço ou serviços (Oliveira, 2008)

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 Inclusiva – incluiu uma série de atividades


 Contribui para desestigmatização
Atividade sexual
 Acentua as questões laborais
 Termo proposto e defendido pelos próprios comercial
atores do comércio do sexo
 Não é consensual

Lever e Dolnick (2000) - Propõe outro tipo de divisão dos trabalhadores sexuais, no
que respeita às emoções e ao sexo:
1) Aquelas que vendem só sexo, como as prostitutas de rua
2) Aquelas que vendem serviços sexuais e emocionais, que é o caso das call girls
3) Aquelas que vendem serviços emocionais mas não sexuais, como as alterneiras

Caracterização do trabalho sexual


O trabalho sexual é multiforme, compreende diversos tipos de atores e de práticas e
desenrola-se em múltiplos contextos.

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Duas perspetivas sobre a prostituição

Abolicionista (anti-prostituição)
 A prostituição é uma forma de violência contra as mulheres (vítimas)
 É inaceitável
 Luta pelo fim da prostituição – não aceita que a prostituição seja considerada
como um trabalho.

Pró-prostituição
 A prostituição não é exploradora
 O que a torna abusiva são as condições em que é exercida
 Descriminalização/Legalização – luta pela sua legalização

Definições de prostituição

Corbin (1978)
Para um ato sexual se poder apelidar de prostituição têm que estar presentes quatro
critérios:
 Hábito e notoriedade;
 Venalidade – suscetibilidade de ser subornado ou de vender os seus serviços;
 Ausência de escolha;
 Ausência de prazer ou de qualquer satisfação sensual pela pessoa que se
prostitui.

Henriques (1962)
 A prostituição consiste em todos os atos sexuais, incluindo aqueles que não
compreendem a cópula, habitualmente praticados por indivíduos com outros
indivíduos do seu próprio sexo ou do sexo oposto, por um motivo que não é
sexual.
 Os atos sexuais habitualmente praticados com objetivo de lucro por indivíduos
sós, ou indivíduos com animais ou objetos, que produzam no espetador qualquer
forma de satisfação, podem ser considerados como atos de prostituição.

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McCaghy (1985)
 É uma atividade com significado sexual para quem compra, o que inclui uma
variedade de comportamentos que vão da penetração vaginal até casos em que
quem vende se limita a caminhar em frente de quem compra;
 É uma transação económica, não interessando se quem vende tem ou não outras
formas de rendimento e se o que tem valor económico é moeda ou outro bem;
 Existência de indiferença emocional entre as partes envolvidas, quer dizer que o
comportamento se limita à prestação de um serviço por razões económicas.

Oliveira (2008)
A prostituição é o desempenho comercial de relações sexuais (vaginais, orais, anais ou
masturbatórias), entre outras atividades com conotação sexual.

Modelos de legislação

Proibicionismo
Abolicionismo
Legalização
 Regulamentarismo (ou licenciamento) – existem diferentes formas de regularizar
a prostituição. Prende-se com a questão de ser considerada como profissão ou
não. Esta deverá ser legalizada mas com a intervenção do Estado (por exemplo,
em que local pode ser praticada)

 Despenalização de todos os aspetos relacionados com a prostituição e


redefinição desta atividade como uma profissão

Legalização em Portugal
 Até 1853: legislação avulsa e pré-regulamentarismo
 1853-1962: regulamentarismo
 1963-1982: proibicionismo
 Desde 1983: despenalização

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Diferenças entre prostituição de rua e prostituição de interior

Prostituição de interior

Prostitutas de rua
Mais sujeitas ao estigma social, sendo alvo de agressões verbais e intimações.
1. Autodeterminados (raro, sendo mais frequente nas do interior) – contraria o
estereótipo de prostituta de rua. Estão na atividade por causas próprias, já que
pretendem atingir certos objetivos para aquisição de conforto a longo prazo.
Têm autonomia de decisão e fazem uma boa-gestão da sua vida, tendo uma
autoestima elevada, boa aparência física e menor idade.
2. Hetero-determinados – afastadas da independência.
 Bio-determinados ou toxicodependentes – Mulheres que antes de serem
prostitutas já eram toxicodependentes. Prostituição como forma de obter
dinheiro para a droga, sendo que muitas vezes o fazem também para o
companheiro toxicodependente com quem não tem uma relação típica de
proxetismo, mas sim de sofrimento partilhado por exercer um atividade que não
é do agrado dos dois. Findo o problema da toxicodependência termina o
problema da prostituição
 Determinados por chulo ou organização – sob coação física tem de se manter
no trabalho, sendo a sua autonomia quase nula
 Eto-determinados ou determinados pelo hábito – fazem o que fazem por
força do hábito de se prostituírem durante anos, sendo a única aprendizagem e

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

forma de vida que conhecem, não lhes restando outra possibilidade. Estão na rua
como poderiam estar num sítio qualquer se a sua arte fosse essa. Estão ali
porque precisam de sobreviver, inclusive aos maus tratos, já que costuma ter
uma família para alimentar.

São as próprias trabalhadoras que muitas vezes fazem distinções entre o seu trabalho

Outros atores do trabalho sexual


Tradicionalmente o chulo era o protetor da prostituta, mas hoje é o explorador com fins
lucrativos. É uma atividade criminalizada por lenocínio.

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 Chulos que vivem à custa das mulheres, podendo acontecer que obriguem às
mulheres a entregar um mínimo de dinheiro por noite e agredi-las se isso não
acontece. Podem ter uma rede de exploração
 Chulos com quem a prostituta mantem uma relação afectiva – há uma
componente afetiva para além da componente comercial, na qual se investe
 Chulos gerentes de casas onde se exerce a prostituição – relação
empregado/empregador

Clientes: quem são?


Os clientes não são um grupo homogéneo: as suas características socio-demográficas
abrangem um leque variado que passa por todas as idades, estados civis e grupos
económicos, culturais e sociais.

 São homens “normais”


 Mais homens – associado à ideia de hegemonia o homem mostra a sua
superioridade masculina através de algo tao poderoso como o seu desejo sexual
 Menos mulheres – isso deve-se tanto á ideia de inferioridade oposta à de
hegemonia masculina como à histórica falta de disponibilidade monetária
feminina, ou mesmo às diferenças de estrutura de desejo. No entanto, a procura
por parte de mulheres existe.
 Clientes: ocasionais vs habituais
 Relacionamento com prostitutas é complexo: pode surgir afeto, prazer, amor
 O poder, embora possa ser negociado, é detido maioritariamente pela pessoa que
se prostitui

Clientes: motivações
•Procura de sexo fácil e rápido
•Busca de sexo descomprometido (envolvimento emocional mínimo, sem risco de
rejeição e sem estar preocupado com o seu desempenho)
•Necessidade de variedade sexual
•Desejo de atividades sexuais que não conseguem obter com as companheiras
•Procura da excitação causada pela natureza ilícita do ato
•Crença de que as prostitutas são sexualmente excecionais

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•Dificuldade na obtenção de relacionamento com o sexo oposto


•Gosto pelo sórdido
•Solidão ou procura de intimidade, companhia ou amor
•Satisfação das necessidades sexuais fisiológicas masculinas

Metodologia empregue na investigação de Oliveira (2003)


Etnografia: o investigador no campo de interesse, através…
 Método de bola de neve – adequada para o estudo de questões sensíveis numa
população oculta
 Recurso a informantes-chave – intermediários que estiveram directamente
envolvidos no negocio ou então têm uma situação privilegiada sobre as pessoas
que o realizam

Técnicas de investigação:
 Entrevistas
o As mulheres de trabalho sexual – áreas temáticas de caracterização
demográfica, perceção que têm dos clientes e atitudes face a eles
o Aos intermediários – guião que abordava o mundo do trabalho sexual e
as mulheres que o realizam

 Observações
o Não participante – para a prostituição de interior: sem interação,
frequência de bares enquanto ocorriam as atividades enquanto clientes;
para a prostituição de rua: percursos diurnos e noturnos e analise de
conteúdos de jornais
o Participante – interação próxima com os participantes, mas sem
participar na atividade central e na condição de investigador

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

Teorias explicativas da prostituição

Teoria Socio-psicológica de Benjamin e Masters (1964)


3 tipos de fatores que podem conduzir uma mulher à prostituição:
 fatores predisponentes: elementos do passado da mulher, como a vivência num
lar desfeito, a promiscuidade dos pais ou os traumas responsáveis por certos
tipos de neuroses
 fatores de atração: vantagens comparativas da carreira prostitutiva, como ganhos
elevados, vida mais fácil e mais interessante e expectativas de alguma
gratificação sexual
 fatores precipitantes: pressão económica, persuasão por parte de proxeneta,
desaire amoroso e uma boa oportunidade, ...

As causas da psicologia
 Os primeiros estudos psicológicos procuraram patologias nestas mulheres que
não conseguiam provar de forma clara: a patologia apenas foi demonstrada de
forma convincente em grupos muito específicos de prostitutas, as que tinham
sido sujeitas a um trauma
 O perfil psicológico clássico da prostituta descrevia uma mulher sexualmente
frígida, com uma infância marcada pela privação e o abuso, que era hostil em
relação aos homens e uma lésbica latente ou assumida (Glover, Greenwald,
James, Kemp, …)
 A vitimação na infância
o Aparece em vários estudos (segunda metade do século XX) como um
fator explicativo da prostituição
o As pesquisas iniciais evidenciaram uma proporção relativamente elevada
de vítimas de abuso sexual entre as prostitutas (a maioria destas
investigações foi efetuada com amostras não representativas da
totalidade das prostitutas, por ex., entre mulheres presas, prostitutas de
rua ou utentes de projetos específicos - Vanwesenbeeck, 2001).

Exner Jr., Wylie, Leura e Parrill (1977)


Some psychological characteristics of prostitutes:

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 95 prostitutas (categorias intraprofissionais) x grupo de controlo


 entrevistas, MMPI, WAIS e Roscharch

Concluíram:
 a esmagadora maioria dos casos que investigaram não se relacionava com
qualquer patologia
 as prostitutas das classes mais altas (call girls e de apartamentos) não diferem
significativamente do grupo de controlo

Criticam os estudos que descrevem as prostitutas como psicologicamente desajustadas,


mergulhadas num estado patológico de desamparo e confusão e levando uma vida de
escravatura relativamente a proxenetas

Modelo multidimensional de Cathy Widom (1983)

Fatores presentes no modelo (fatores em interação):


•Predisposições individuais (fatores genéticos e fisiológicos)

•Experiências de socialização (influência subcultural e dos pares; famílias desfeitas,


casos de psicopatologia na família, o abuso infantil e as experiências sexuais precoces)

•Personalidade

•Atitudes, normas e expectativas da sociedade

•Fatores situacionais (condições de vida precárias, toxicodependência., desemprego,


persuasão por proxeneta, …)

•Características socioeconómicas e demográficas

•Resposta da sociedade ao comportamento (nomeadamente a estigmatização)

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

Bartol (1991)
 Rejeita as explicações sociológicas e psicológicas habituais pois acha que são
generalizações enviesadas e subjetivas sobre a mulher prostituta (como, por ex, a
pertença às classes baixas, a aversão aos homens, a frigidez, os distúrbios
emocionais…)
 As prostitutas têm uma grande variedade de motivos para se envolverem na
prostituição; um leque alargado de tipos de personalidade, vários níveis de
educação e enquadramentos familiares e têm diversos percursos de vida. Embora
haja uma forte associação com histórias familiares conflituosas, experiências
sexuais negativas e toxicodependência

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

Sanders (2005)

Há uma interação dinâmica entre as características das histórias pessoais e a


estrutura social; o balanço entre elas é altamente contingente e oferece uma
variedade de oportunidades, espaços de auto-controlo e auto-gestão. O poder,
embora legal e economicamente estruturado, é relacional e negociado.

Ribeiro, Silva, Schouten, Ribeiro & Sacramento (2008)


 “não obstante os constrangimentos estruturais, as redes e facilidades
organizacionais e, no limite, as situações de precariedade socioeconómica e
vulnerabilidade jurídica (…) se apresentarem como condições integradoras e
propiciadoras da prostituição, elas não são as únicas nem são absolutamente
determinantes. (…) para não cair em explicações deterministas, [dever-se-á
revalorizar] a perspetiva dos atores sociais, o seu maior ou menor espaço de
manobra face às estruturas, as conveniências ou vantagens em persistirem nesta
actividade”

 “a via mais adequada para abordar o fenómeno da prostituição consistirá em


assumir uma perspetiva pluricausal e pluridimensional que, sem esquecer ou
menosprezar os diversos níveis de análise, saiba integrá-los e hierarquizá-los de
modo situacional e criativo”

Explicações científicas recentes


Para se compreender um comportamento complexo como é a prostituição, e outros
trabalhos sexuais, devemos recusar determinismos e explicações simplistas e
compreendê-lo tendo em conta a diversidade de trajetórias e experiências, os processos
e os contextos e os sentidos e significações que o indivíduo atribui.
É na articulação entre as contingências estruturais e a capacidade de agência que
podemos explicar o envolvimento no comércio do sexo.

Modelos de intervenção

Modelo abolicionista:
 Resgate das pessoas que se prostituem
Objetivo: acabar com a prostituição > um problema social

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

•Prostitutas são vítimas que devem ser libertadas; pressuposto de que prostitutas
pretendem mudar de vida
• Intervenção: reabilitar as pessoas que se prostituem: apoio à saída/resgate
•Tradicional e maioritariamente assistencialista

Ex. O Ninho
Acolhe temporariamente mulheres prostitutas a quem ensinam competências que
consideram que ajudam à sua reinserção social (centro de atendimento, lar, oficinas,
escola, serviços de apoio psicológico e jurídico)

Modelo de redução de riscos:


 Redução dos riscos associados ao trabalho sexual

Objetivos: melhorar as condições de vida (médico-sanitárias, sociais, psicológicas) e de


trabalho dos TS
 Geralmente associados à prevenção da SIDA e IST
 Maioria na Europa
 Portugal: Porto G, Auto-estima, Espaço Pessoa, …

Apoio às vítimas de tráfico e exploração sexual


Muitos projetos são apenas assistencialistas mas alguns têm outras vertentes
Ex.: BLinN (Holanda)
- Intervém com mulheres vítimas de tráfico e exploração sexual que pedem ajuda
- Encontro às suas necessidades, interesses e capacidades individuais
- Objetivo: capacitação a partir dum conjunto de atividades, devolvendo-lhes o controlo
sobre as suas vidas

Principais áreas de intervenção da redução de riscos associados ao trabalho sexual


•Prevenção do VIH/SIDA e IST
•Promoção da saúde pessoal
•Disponibilização de serviços sociais e de saúde
•Prevenção/tratamento/uso mais seguro de drogas
•Prevenção violência e exploração
•Direitos humanos/civis/emancipação
•Promoção/reforço auto-estima
•Aconselhamento
•Serviços de apoio/informação

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

VITIMOLOGIA

Definição de vitimologia
Wertham propõe a designação “vitimologia”, inicialmente etiológica
 A vítima como uma fonte de estímulo - o ato criminal determinado pela
estrutura de personalidade do criminoso mas também pelo comportamento da
vítima
 Dois conceitos principais em que se apoiavam as explicações vitimológicas:
1. Vítima nata (Von Henting) - Importado da criminologia positivista, a vítima
era determinada pelas tendências autodestrutivas e o criminoso como agente
concretizador dessas tendências
2. Precipitação do crime pela vítima - A atitude da vítima pode desencadear a
motivação criminal e influenciar o decurso do ato criminal, criando-se tipologias
de vítimas de acordo com o seu grau de “propensão” para a vitimação
Ex.: Mendelsohn - vítima completamente inocente é a vítima mais culpada
que o agressor
Noção polémica, sobretudo depois de aplicada à violação. Os defensores desta
noção foram acusados de:
 “Branquear” o comportamento do agressor;
 Ter subjacentes fortes preconceitos sociais;
 Basear-se em pressupostos teóricos insustentáveis

O estudo da vitimização inclui:


 As relações entre as vítimas e os agressores
 As relações entre as vítimas e o sistema de justiça
 As relações entre as vítimas e outros grupos e instituições

Tipos de vitimação

Vitimação direta
 Refere-se às situações em que alguém é diretamente afetado por um delito
 Os danos materiais e físicos são usualmente bastante limitados
 Os danos emocionais são com frequência significativos, mesmo em crimes
pouco graves
As repercussões emocionais dependem de:

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 Características prévias da vítima


 Respostas pós-vitimação (da vítima e da rede de suporte)

As reações mais frequentes à vitimação são: Choque, Angústia, Raiva, Medo


25% das vítimas de qualquer crime apresentam pelo menos um dos sintomas típicos da
perturbação do stress pós-traumático
(exs. revivência do acontecimento, evitamento, isolamento, raiva, amnésia, auto
mutilação, …)

Vitimação secundária
Resulta do contacto da vítima com o sistema de justiça penal quando este frustra as
expectativas da vítima. Acontece devido a:
 Dificuldades operacionais
 Presença de mitos e estereótipos entre os agentes de justiça
 Procedimentos necessários à obtenção da prova em certos crimes

Vitimação indireta (ou vicariante)


 Sobretudo familiares de vítimas de crimes violentos
o Parceiros de mulheres vítimas de violação
o Pais de crianças abusadas sexualmente
o Familiares de vítimas de homicídio
 Impacto análogo embora menos frequente
 Intervenção:
o Aumentar a capacidade de coping
o Aumentar a sua disponibilidade e capacidade de prestar suporte
adequado às vítimas

Teorias da vitimação

Teoria do estilo de vida


 Diferentes estilos de vida causam uma exposição diferencial ao crime
 Estudos demonstram que as pessoas envolvidas em comportamentos desviantes
são mais frequentemente vitimadas
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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 Implicações ao nível da prevenção: ações de prevenção situacional, tais como:


o Diminuir as oportunidades físicas para o crime
o Aumentar o risco de detenção
o Reduzir a atratividade dos alvos

Abordagens feministas
Com as mudanças decorrentes da ênfase colocada na violência familiar, rompem com a
vitimologia tradicional e constroem novas representações da vítima – criança
maltratada, mulher vítima de violência conjugal, mulher vítima de abuso sexual, idoso
maltratado
 Salientou a multidimensionalidade do fenómeno, bem como a impossibilidade
de ser apenas um modelo teórico a explicar todos os tipos de vitimação
 Mostrou a estreita associação entre vitimação e estrutura social
 Tornou claro que a vulnerabilidade não é uma questão meramente
comportamental mas o produto da posição estruturalmente frágil que certos
grupos ocupam na sociedade

Aplicadas à violência sobre as mulheres, defendem que:


 O patriarcado e as desigualdades de género, a par dos processos de dominação e
de controlo a eles associados, não só estão na origem da violência contra as
mulheres, como também são responsáveis pela sua tolerância sociocultural

Realismo de esquerda
 Chama a atenção para a vulnerabilidade estrutural decorrente de fatores
económicos e raciais

 As classes mais desfavorecidas são as mais afetadas pelo crime e aquelas nas
quais o crime tem mais impacto

Vitimologia crítica
 Questionam as definições tradicionais de crime e de vitimação
 Chamam a atenção para outros tipos de crime: crime ecológico, fraude fiscal, …

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 A vitimologia devia desenvolver-se como um campo de estudos reflexivo, que


interrogasse o como e o porquê da vitimologia se ter focado em certas acções e
não noutras - salienta os bens sociais partilhados que são atingidos pelo crime

O caso específico da violência conjugal


 Visibilidade recente
 98%: homens sobre mulheres
 Na Europa: 1 cada 3 mulheres
 Legislação (Portugal)
o Reforma penal de 1982
o Crime público em 2000
 Plano Nacional contra a Violência Doméstica

Conceitos relacionados com a violência conjugal


 Violência: uso intencional da força, coação ou intimidação contra terceiro, ou
qualquer forma de ação intencional que lese a integridade, os direitos e as
necessidades de outrem
 Violência sobre as mulheres (VSM): todo o ato que tenha como resultado o
dano ou sofrimento (físico, sexual ou emocional) da mulher, ou a sua morte,
incluindo a ameaça de tais atos, a coação ou a privação da liberdade; violência
que é exercida sobre a vítima pelo facto de ela ser mulher
 Violência de género: forma como os movimentos feministas têm
conceptualizado a VSM, acentuando as desigualdades entre homens e mulheres
 Violência doméstica (VD): Comportamento violento continuado ou um padrão
de controlo coercivo exercido, direta ou indiretamente, sobre qualquer pessoa
que habite o mesmo agregado familiar (cônjuge, companheiro/a, filho/a,
pai/mãe,…) ou que, mesmo não coabitando, seja companheiro, ex-companheiro
ou familiar
 Violência conjugal (VC): uma das dimensões da VD: violência exercida sobre
cônjuge, companheiro/a, ex-companheiro/a)
 Violência nas relações de intimidade: pretende alargar a noção de VD e, em
particular, de VC a outros relacionamentos íntimos: namoro, casais
homossexuais
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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

Maus tratos conjugais


Padrão de controlo coercivo, envolvendo o exercício de poder e domínio num
relacionamento íntimo (Walker, 1984)

Podem incluir, além da violência física e sexual:


 Coação e ameaças
 Intimidação
 Violência emocional
 Isolamento social
 Minimização e negação da violência
 Instrumentalização dos filhos
 Uso de “privilégios machistas”
 Violência económica

Todos estes comportamentos podem ocorrer em episódios esporádicos ou crónicos,


durante um curto período de tempo ou décadas.

Dois padrões de violência:


1) A violência e a manipulação psicológica tendem a aumentar em intensidade,
frequência e perigosidade com o decorrer do tempo
2) A violência tende a ocorrer num ciclo previsível de 3 estádios:
 Fase de tensão crescente
 Episódio de maus tratos
 Reconciliação (fase de “lua de mel”)

Roda do poder e controlo – modelo de Duluth


 Projeto de intervenção na violência doméstica de Duluth (Minnesota)
 Quadro das interrelações entre violência e outras formas de controlo coercivo

A violência doméstica é vista através da dominação

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

A PSICOLOGIA FORENSE E O PAPEL DO PSICÓLOGO NA ÁREA DA


JUSTIÇA

Conceito de psicologia forense


Não há consenso quanto às definições das suas áreas correlacionadas:
 Psicologia forense
 Psicologia da Justiça/Judicial
 Psicologia Legal
 Psicologia Criminal
 Psicologia do Comportamento Desviante.

Tentativas de definição
 Etimologia da palavra: fora/fórum: espaços das cidades onde se situavam os
tribunais
 Aplicação dos conhecimentos e metodologias da psicologia às questões judiciais
 Utilização dos conhecimentos psicológicos como colaboradores da
administração da Justiça.
 O campo da Psicologia aplicada que se ocupa da recolha, exame e apresentação
de matéria científica de natureza psicológica para fins judiciais (Haward, 1981).
 Objeto da psicologia forense: conjunto das circunstâncias específicas que ligam
o sujeito à lei, introduzindo linhas de compreensão, avaliação e intervenção em
torno do “binómio Sujeito-Lei”.

Caracterização geral dos domínios de investigação científica e de intervenção do


psicólogo no sistema de justiça
 Intervenção em Vítimas e Agressores.
 Trajetórias vitimárias (trajetórias e dinâmicas das vítimas).
 Perfis criminais/perfis comportamentais/psicológicos – profiling (apoiam a
investigação criminal).
 Psicologia do testemunho (que variáveis influenciam a capacidade de
testemunhar, de que forma é que este testemunho influencia juízes e jurados?
Note-se que existe um escrutínio permanente que nos obriga a ser muito
competentes).

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 Tomada de decisão judicial (como se tomam decisões e até que ponto a


Psicologia é útil: e.g. adoção).
 Contacto das vítimas com o sistema de justiça e risco de vitimação secundária
(e.g. o caso particular das crianças, vítimas mais vulneráveis).
 Protocolos de avaliação psicológica forense.

Perfis psicológicos ou profiling


Realizado ao nível da colaboração do psicólogo na investigação criminal é um método
para relacionar crimes e criminosos em série: uma análise de “padrões” (comuns),
realizado por profissionais altamente especializados que atuam como auxiliares da
investigação e que recorrem a diferentes disciplinas do saber (e.g., criminologia,
psicologia).
É um instrumento de apoio, que por si só não resolver crimes – quem os resolve são os
agentes policiais. Contudo muitas vezes chamado na fase do julgamento, ajuda a
investigar e a interrogar os sujeitos.

Utilidade:
 Reduzir o leque dos suspeitos e encaminhar a investigação criminal num dado
sentido, dizendo que tipo de pessoa terá cometido aquele crime (aumenta a
possibilidade do indivíduo responsável ser detido, logo, reduz o número de
potenciais vítimas)
 Ajudam a decidir a melhor forma de conduzir o interrogatório de um suspeito,
no sentido de mais facilmente obter a confissão.
 Testemunha-perito nos julgamentos para ajudar a explicar/entender as dinâmicas
dos crimes em série, habitualmente incompreensíveis para o “comum cidadão”.

O profiler tenta “colocar-se na mente do criminoso, pensar como ele terá pensado antes,
durante e após o crime, ver o cenário do crime da forma que ele viu. Fá-lo com recurso
às ciências do comportamento e às técnicas da investigação criminal e não através de
qualquer poder “extra-sensorial”/”paranormal”. Deste modo, o profiler não é um
médium, nem vê o que aconteceu, infere lógica e racionalmente, a partir das pistas

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

físicas e comportamentais deixadas pelo criminoso e através do que a vítima, viva ou


morta, lhe pode revelar sobre o ofensor.
Ao tentar reconstruir o que aconteceu e quais ao as motivações/fantasias do criminoso,
ao analisar as características da cena do crime e da vítima, tem que se colocar “no ponto
de vista do criminoso” e seguir as descrições da vítima (quando sobrevive).

Estratégias em que se baseia:


 Identificação da “assinatura”: aquilo que o criminoso faz para “preencher as
suas necessidades psicológicas/fantasias”, que não seria necessário para a
concretização do crime; tende a manter-se fixa ao longo do tempo.
 Identificação do modus operandi ou dos padrões comportamentais: aquilo
que o criminoso tem que fazer para concretizar o crime (forma como é planeado,
executado e como, posteriormente, se evita a detenção)
 Inclui o tipo de vítima, o local e o momento em que o crime teve lugar, as
ferramentas ou métodos utilizados, o modo como o assassino se aproxima da
vítima, a existência de cúmplices e distinção de pistas que ele possa ter deixado
no local do crime. Pode variar, havendo mudanças deliberadas para confundir a
polícia ou que surgem naturalmente (talvez durante os primeiros assassinatos
que nem sempre seguem o plano).
 É dinâmico pois aparenta ser melhorado com base em três fontes de
informação:
o Os erros cometidos em ações passadas
o As reações das vítimas
o O tempo passado na prisão no caso de ser reincidente.
o O MO pode tender para uma assinatura, acabando os dois conceitos por
se sobrepor.
Exemplo: relação entre fantasias, assinatura e MO - classificação das
violações em série em dois grupos: orientadas pela fantasia e orientadas
pelo MO

 Vitimologia como termo num sentido muito restrito: características físicas,


sociodemográficas e psicológicas da vítima, rotinas, hábitos, comportamentos,
atitudes, … “saber tudo sobre a vítima”. O objetivo é perceber por que razão o
criminoso escolheu aquela vítima, o que ajuda a compreender as suas
motivações/dinâmicas de ação.

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

 Importância de perceber os “stressores pré-crime” → também ajudam a


entender as motivações internas e as dinâmicas psico-emocionais do SK.

Ao profissional profiler não interessa descobrir porque foi que o indivíduo cometeu
aqueles crimes, mas sim, quem é o indivíduo que os praticou (nem todos os autores
concordam com esta afirmação; o porquê pode ser um importante meio para aceder ao
quem…).

Metodologia de base estatística: duas linhas investigativas


 Uma abordagem mais quantitativa: segue os princípios da psicologia
experimental, tendo como principal objetivo a elaboração de hipóteses e a sua
posterior testagem. Esta abordagem apresenta como principal limitação
restringir-se a dados estatísticos, em detrimento de informação relevante que
poderá ser adquirida aquando do estudo de caso.

 Uma abordagem mais qualitativa: tem por base a psiquiatria forense e a


psicologia clínica, onde o investigador obedece a uma análise clínica,
elaborando o perfil e sofrendo influência da sua experiência profissional para
chegar a conclusões, em detrimento de dados estatísticos. A sua principal
limitação é o facto de se centrar nas características individuais o que acarreta
uma grande dificuldade quando se quer expandir as conclusões para a população
em geral.

A criança na justiça
 Abordagem jurídica da criança vítima: Justiça Protetiva, Justiça Penal.
 Perspetivas da criança sobre a Justiça:
o As suas expectativas acerca da intervenção dos vários atores.
o Diferentes perceções e impacto psico-emocional e desenvolvimental do
envolvimento no processo judicial.
 Participação da criança no processo judicial: áreas "sensíveis" - o(s) contexto(s)
judiciais devem ser adequados e preparados para que a criança seja uma “boa
testemunha”.

Conceito de vitimação secundária: evitar a situação paradoxal que se verifica quanto à


efetiva proteção dos direitos da criança: “Nos tribunais há uns senhores que nos

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

defendem e também nos fazem muitas perguntas e depois contamos tudo outra vez e
assim estamos sempre, sempre a lembrar das coisas más...” (A. de 10 anos, avaliada no
GEAV no âmbito de um inquérito de abuso sexual).

Análise e interpretação de resultados das etapas da trajectória processual


1) Contactos com a Polícia Judiciária
o Importância dos espaços.
o Avaliação muito positiva do trabalho da PJ e do contacto relacional
estabelecido, pois as crianças valorizam os espaços onde são acolhidos e estes
transmitem-lhes segurança, confiança, proteção.
o Valorização da participação da criança.

2) Contactos com o Ministério Público/Tribunal


o Desadequação dos espaços: “Os tribunais são assim sítios em que está toda a
gente de pé encostada às paredes nos corredores e nas escadas e depois vêm
senhoras que falam alto e chamam pelos nomes das pessoas que estão
encostadas nas paredes”.
o Centralidade da figura do “Juiz” na condução do processo e do projeto de vida
da criança: “O Juiz é que manda na minha vida, ele é que vai decidir o que é que
vai acontecer comigo…agora tenho de esperar que ele decida”.
o Figura fortemente associada à Justiça Penal/Punitiva: “Os juízes mandam nos
polícias…Acho que servem para mandar prender os que a polícia leva lá ao
tribunal…”
o Distanciamento relacional.

3) Exames periciais: Sexologia forense


o Locais: clara diferenciação entre o contexto médico forense e os contextos
clínicos/médicos a que a criança está habituada.
o A exploração corporal implicada provoca a experiência corporal de embaraço.
o Conforto relacional, contextualização e explicação dos procedimentos,
privacidade como facilitadores da experiência.

4) Exames periciais: Perícia forense


o Sem influência da desejabilidade social.

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

o “Vá lá, pode começar a fazer perguntas que eu já estou a ouvir…é melhor ir
buscar um papel porque se não ainda se esquece e depois tenho de dizer outra
vez”.
o Contexto relacional positivo e acolhedor: “Disseram-me que a Dra. trabalhava
para o tribunal, não é? Ainda bem porque assim eu posso dizer-lhe tudo e você
depois conta ao Juiz, não é?”

Referência à intervenção psicológica com vítima e com agressores


Avaliação psicológica: vítima, agressor, do risco e do impacto da vitimação.

Diferentes modelos/estratégias de intervenção:


o Intervenção nas vítimas
o Modelo de intervenção em crise
o Planos de segurança
o Intervenção psicoterapêutica – abordagens narrativas

o Intervenção nos agressores - não têm uma patologia na origem da sua agressão
mas sim fatores de duas ordens:
o Sociais: crença na supremacia do homem sobre a mulher → Intervenção
psicoeducativa
o Psicológicos: caso se verifique que a problemática é mais de
autocontrolo, gestão do stress, ... → Intervenção psicoterapêutica

Avaliação psicológica forense


A avaliação psicológica forense: situa-se num “território de interface” entre os
domínios da psicologia, da medicina legal, da psiquiatria, do direito.
A perícia psicológica constitui um instrumento privilegiado de interface entre o discurso
psicológico e o discurso jurídico, e tem como principal objetivo a interpretação clínica
dos dados da avaliação realizada em contexto forense, enquadrando estes resultados no
contexto e processo judicial que lhe deu origem.

Campo da avaliação psicológica forense


 Processo penal
o Ofensores adultos: arguidos ou condenados

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

o Vítimas: diretas ou testemunhas


 Processo tutelar educativo: menores delinquentes
 Processo promoção e proteção: menores em risco/perigo
o Vítimas e desviantes
 Direito de família
o Regulação do poder paternal
o Inibição do poder paternal
 Civil: Avaliação do dano
 Trabalho

Avaliação Psicológica Forense ≠ Avaliação em Contexto Clínico


O cliente não é o consulente mas sim o sistema de justiça. A sua postura deve ser mais
neutra, mais afetivamente desprendida, tendo em vista o apuramento dos danos, a
determinação de responsabilidades e uma avaliação rigorosa das características do
arguido.
O psicólogo na área forense deve:
o Entender que o seu comprometimento para com a manutenção do
controlo social (uma vez que trabalham para a justiça), é prioritário em
relação ao bem-estar do indivíduo, mesmo que isso implique a quebra da
confidencialidade.
o Ter um conhecimento profundo do modo como funciona o sistema
judicial: a aceitabilidade do seu trabalho vai depender da sua capacidade
de traduzir as informações psicológicas em termos compreensíveis para
os outros atores do sistema judicial.
o Situar-se num registo clínico, isto é facilitador da emergência da
especificidade/ originalidade daquele sujeito, da sua compreensibilidade,
tradutor do discurso idiossincrático para o discurso judicial

Os programas de intervenção: trabalho de mediação em casos de litígio sobre a


regulação do poder paternal, intervenções destinadas à redução de risco de violência na
cadeia ou na comunidade, programas de reeducação de menores.

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

A avaliação no contexto forense: enquadra-se, teórica e metodologicamente, nos


princípios da avaliação psicológica geral, embora tenha como objeto de estudo a
originalidade do sujeito que por alguma razão tomou contacto com a justiça.

Avaliação psicológica forense de Crianças vítimas de Abuso Sexual


Implica:
 Domínio exemplar das metodologias e instrumentos de avaliação e da
entrevista clínica; metodologias de avaliação gerais e específicas.
 Conhecimentos aprofundados, teóricos e clínicos, sobre o fenómeno, suas
dinâmicas, fatores, processos, consequências, etc.
 Conhecimentos aprofundados de psicologia do desenvolvimento.
 (re)Conhecimento das dinâmicas do segredo e/ou do síndroma de
acomodação ao abuso.
 Ultrapassar a “desconfiança histórica” face ao testemunho da criança -
Durante décadas o sistema de justiça duvidou da capacidade da criança para
testemunhar. Traduzia o ceticismo da comunidade judiciária em relação à
capacidade de criança para produzir um testemunho verídico. A criança seria
uma espécie de testemunha de 2ªclasse.

Especificidades do testemunho da criança

 A “arte” da entrevista/inquérito à criança - Na maioria dos casos um bom


testemunho infantil depende mais da qualidade do entrevistador do que das
características da criança...
 Há mais “falsos negativos” do que “falsos positivos” - Tendência para esta
percentagem aumentar em situações de divórcio litigioso, mas, mesmo assim, é
reduzida.
 O testemunho da criança vítima: potenciais dificuldades/problemas
o Confusão ou ambiguidade face ao significado do que aconteceu.
o Dificuldade de recordação/evocação de detalhes periféricos.

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Psicologia do Comportamento Desviante Ana Mendes / 2013

o Dificuldade ao nível das noções de espaço e tempo, das relações de


ordem (e.g. o que é que aconteceu antes? O que é que aconteceu depois?)
e de duração (e.g. quanto tempo demorou?)
o Dificuldades na atribuição de intenções e estabelecimento de relações
causais.
o Manipulação por parte de adulto(s)/susgestionabilidade.
o Limitações associadas ao desenvolvimento e crescimento.

 Alguns cuidados a ter


o A repetição de inquéritos e de perguntas acerca do mesmo assunto pode
alterar a perceção do vivido.
o Ajustar as questões à idade e ao nível desenvolvimental.
o Não ter expectativas irreais para a idade da criança.
o Ter cuidado com a postura e tonalidade emocional.
o Progredir do geral para o específico.
o Promover o discurso livre.
o Não pedir à criança que atribua intenções ao agressor.
o Evitar questões de “sim” ou “não”, e que impliquem mais do que uma
resposta.

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