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Com dezenove anos, William Carey se casou com Dorothy, cunhada de seu patrão.
Dorothy era cinco anos mais velha do que Carey, não sabia ler e logo revelou um
temperamento difícil. No casamento reinava pouca harmonia e, para dificultar ainda mais a
vida familiar os problemas econômicos eram comuns, tornando-se mais intensos com o
crescimento da família e a responsabilidade de Carey no cuidado de sua cunhada e de quatro
sobrinhos, após a morte do seu patrão.
Uma das dificuldades que William Carey teve que enfrentar para incutir a necessidade
do envio de missionários às nações. Carey expõe argumentos lógicos e teológicos
apresentando-os como fundamentos para o envio de missionários aos pagãos, frisando
especialmente que o Reino de Cristo tem que ser proclamado a toda a terra. Num sermão
sobre Isaías 54.2-3, dirigido a um grupo de pastores batistas em Nottingham, no dia 31 de
maio de 1792, Carey reforçou os apelos constantes da sua “Investigação” e pronunciou a frase
que se tornou célebre como a filosofia de trabalho do grande missionário: “Realizar grandes
coisas para Deus; esperar grandes coisas de Deus.”
Em junho de 1793, ele e sua família partiram para a Índia Carey chegou em Hooghly no
dia 11 de novembro de 1793, marcando o início da grande era das missões além mar,
promovidas pela Inglaterra e Estados Unidos. Em virtude da oposição da Companhia das Índias
Orientais, a família Carey foi para o interior da Índia e, logo depois, para Malda. Ali, William
Carey de dedicou a aprender a língua bengali e se aventurou numa tradução do Novo
Testamento para essa língua. O trabalho, contudo, revelou-se um fracasso, pois Carey não
tinha habilidade em redação, conhecia muito pouco da dinâmica da língua e a tradução
tornou-se ininteligível. Isso não desanimou o infatigável missionário que refez a tradução até
que pudesse ser compreendida pelo povo bengalês.
Com dedicação sem igual, disposto a sacrificar seus bens, tempo e qualquer outra coisa
a que pudesse se apegar, dono de um caráter dócil e uma vida santa, Carey organizava escolas
(ele organizou, inclusive, o colégio Serampore para treinamento de evangelistas nativos),
ensinava línguas orientais no colégio de Fort William em Calcutá e continuava seus esforços na
tradução da Bíblia que verteu inteira para três idiomas: bengalês, sânscrito e marathi. Além
disso, traduziu porções da Bíblia para inúmeras outras línguas, ainda que a qualidade de seu
trabalho não fosse muito apreciada pelos críticos.
O primeiro obstáculo que William Carey teve que enfrentar para realizar seu alvo de
evangelização dos pagãos foi a sua própria igreja. Reinava em seu tempo a idéia de que a
Grande Comissão não se aplicava aos cristãos em geral, mas exclusivamente aos apóstolos
diante de quem o Senhor ressurreto a enunciou. Esse pensamento estava fortemente
associado a uma teologia hipercalvinista que tirava da igreja o dever de anunciar as boas novas
aos perdidos das nações distantes. Conta-se que quando o jovem pastor apresentou as suas
ideias revolucionárias para a época a um grupo de ministros, um deles lhe disse: “Jovem,
sente-se. Quando Deus quiser converter os pagãos, ele o fará sem a sua ajuda ou a minha”.
Carey reagiu contra essas ideias. Realçou o dever da igreja de evangelizar os povos e disse que
se a Grande Comissão se restringisse aos apóstolos, então a ordem de batizar também estaria
restrita a eles. Ademais, argumentou, se só aos apóstolos se aplicam as determinações da
Grande Comissão, os ministros que têm pregado o evangelho a outros povos têm agido sem
autorização de Deus para tanto e a presença constante de Cristo prometida na Grande
Comissão também não se aplica a ninguém além dos ouvintes originais.
O terceiro obstáculo ao ministério de Carey (e talvez o mais difícil) foi a sua esposa.
Desde o início Dorothy se opusera á ida de Carey à Índia e se recusara a ir com ele. Juntamente
com outro missionário, John Thomas, Carey chegou a partir sem a esposa. A viagem, porém,
foi interrompida por motivos burocráticos quando o navio ainda estava na Inglaterra. Por esse
tempo, Dorothy mudou de ideia e resolveu partir com o marido e seus quatro filhos pequenos
(um deles com apenas três semanas).
Estando já na Índia, Carey, como já dito, se viu forçado a partir para o interior em face
da oposição da Companhia das Índias Orientais. Na ocasião, Dorothy, mais uma vez, revelou-se
uma mulher inadequada como esposa de missionário. Ela se mostrou cada vez mais abalada
psicologicamente. Ademais, instalada em meio a pântanos, a família viu-se em circunstâncias
deploráveis e Dorothy ficou muito doente, exigindo, juntamente com os filhos, a total atenção
do marido. A situação só melhorou quando ele conseguiu se transferir para Malda onde foi
trabalhar como capataz numa fábrica de anil. Ali, porém, Dorothy demonstrava que sua saúde
mental estava em notável declínio. Com a morte de um dos filhos, que então contava com
cinco anos, a esposa de Carey enlouqueceu totalmente.
A demência de Dorothy teve resultados trágicos para a família. Um deles se fez sentir na
educação dos filhos. Carey, além de viver constantemente ocupado com inúmeras tarefas, era
um homem muito dócil, incapaz de ser rígido com as crianças. A mãe, no estado em que se
encontrava, não tinha condições de suprir a ausência e falhas do pai na correção dos meninos
que cresceram como vadios indisciplinados. Foi a interferência firme da Sra. Marshman e a
posterior dedicação de Charlotte Rumohr, a segunda esposa de Carey, que impediram que os
filhos de Carey se perdessem totalmente. A grande luta de Carey com a doença de sua esposa
findou-se em 1807, quando Dorothy faleceu aos 51 anos de idade. Foi o fim de um triste
obstáculo para a obra missionária que jamais contou com o real apoio daquela mulher, mesmo
em seus dias de saúde física e psíquica.
O quarto fator que pode ser citado como obstáculo ao trabalho de William Carey foi sua
chocante dificuldade com traduções. Como visto acima, Carey não conseguia se fazer entender
quando escrevia uma sentença, de forma que sua obra sofria sérios e justos ataques de
qualquer pessoa que tivesse paciência para avaliá-la. Para piorar a situação, em 1812 ocorreu
um incêndio que destruiu anos de seu intenso e difícil trabalho de tradução. O modo como
Carey superou tudo isso foi através da perseverança. De fato, Carey era um homem que nunca
desistia. Nada fazia com que ele interrompesse sua obra. Se ao final de uma tradução ele
descobria que o texto era de difícil compreensão, ele retomava pacientemente o trabalho e
fazia tudo outra vez, até que o resultado fosse satisfatório para os leitores. Mesmo quando
suas traduções foram queimadas em 1812, esse incansável missionário aceitou o fato como
manifestação da vontade de Deus e iniciou tudo outra vez com zelo ainda mais intenso.
O último obstáculo que Carey enfrentou em seu trabalho missionário foi decorrente
da chegada de novos missionários enviados da Inglaterra a Serampore pela Sociedade
Missionária Batista. De fato, com a chegada desses missionários a paz da missão de Serampore
chegou ao fim. Os novos obreiros se recusaram a se submeter à liderança dos veteranos e
também não aceitaram adotar o estilo de vida e filosofia de trabalho do “Trio de Serampore”.
Assim, o resultado inevitável foi a divisão. Então, os missionários mais novos se afastaram e
formaram a União Missionária de Calcutá.
A Sociedade Missionária Batista, a que Carey estava ligado desde que fora fundada por
sua própria influência, tinha por esse tempo líderes que sequer o conheciam pessoalmente.
Esses líderes deram apoio aos missionários jovens que eles próprios haviam nomeado. Por
tudo isso, em 1826, a Missão de Serampore cortou relações com a Sociedade Missionária
Batista. Como resultado desse rompimento, terríveis problemas financeiros começaram. Não
havia como a missão de Carey se sustentar e também suprir as necessidades dos diversos
postos missionários ligados a ela sem o apoio da Inglaterra. Carey, como em outras ocasiões,
também soube lidar com esse obstáculo ao trabalho do Senhor. A solução foi simples: auto-
humilhação. Carey e Marshman, vendo que não havia meios de continuar sem o sustento da
Sociedade, se submeteram novamente e ela. Assim, foi dada continuidade ao trabalho até que
a morte, o último oponente, se levantou. Contra esse obstáculo o corajoso missionário não
teve como lutar. William Carey morreu em 1834.