EFEITO DA ADIÇÃO DE SULFITO SOBRE A PRODUÇÃO DE ALCOÓIS
SUPERIORES DURANTE A FERMENTAÇÃO ALCOÓLICA
L.E. G u t i e r r e z *
RESUMO: Foi estudado o efeito de quatro concentra¬
ções de sulfito (19, 6 9 , 119, 219 ppm) e m mostos de m e l a ¬ ço de cana em pH 4,O e o efeito do pH de mosto sulfitado sobre a produção de e t a n o l , acetaldeído e os alcoóis n-propílico, isobutílico e isoamílico durante a f e r m e n t a - ção alcoólica por Saccharomyces cerevisiae. Não foram de¬ tectadas diferenças significativas entre os teores de etanol dos mostos sulfitados. Houve aumento s i g n i f i c a t i - vo no teor de acetaldeído e redução significativa nos teores de alcoóis superiores c o m o aumento da c o n c e n t r a - ção de sulfito. A elevação do pH do mosto sulfitado pro¬ vocou aumento significativo nos teores de acetaldeído e alcoóis superiores não afetando a produção de e t a n o l .
Termos para indexação: sulfito, fermentação al-
coólica, óleo fusel, alcoóis s u p e r i o r e s , Saccharomyces cerevisiae.
EFFECT OF SULFITE ON HIGHER ALCOHOLS PRODUCTION
DURING ALCOHOLIC FERMENTATION
ABSTRACT: The effect of sulfited m e d i u m and its
pH on the e t a n o l , acetaldehyde a n d higher alcohols production during fermentation of cane molasse b y Sac- charomyces cerevisiae was studied. There w a s no
* Departamento de Química da E.S.A. "Luiz de Q u e i r o z " da
Universidade de São Paulo - 13.4OO - P i r a c i c a b a , S.P . e CEBTEC/FEALO. significant effect of sulfite on ethanol production. The results showed a significant increase in acetaldehyde and a reduction in higher alcohols content with the increase of sulfite concentration. The increase in the pH of sulfited m e d i u m caused an increase in acetaldehyde and higher alcohols content and did not affect ethanol production.
Index terms: sulfite, alcoholic fermentation,
fusel o i l , higher a l c o h o l s , Saccharomyoes cerevisiae.
INTRODUÇÃO
0 sulfito e um dos componentes de melaço que pode
afetar o desenvolvimento da fermentação alcoólica. Se- gundo BASSO (1988), o teor de sulfito no melaço pode a l - cançar níveis de 700 ppm , o que poderia resultar em mos^ tos com cerca de 175 ppm de S C ^ . GLACET et alii (1975) v e r i f i c a r a m que a adição de 1000 a 3000 p p m de sulfito resultou no aumento do tempo da fermentação a l c o ó l i c a , enquanto UZUKA et alii (1985) v e r i f i c a r a m que a concentração de acetaldeido aumentou com concentração de sulfito embora o ãcido piruvicO' nao tenha sido afetado. A descarboxilase piruvica e capaz de descarboxilar outros cetoãcidos a l e m do ãcido piruvico (NORDSTROM, 1963; SUOMALAINEN & OURA, 1957) e essa enzima exige p i - rofosfato de tiamina como cofator, sendo que sulfito p o - de destruir a tiamina, diminuindo a atividade dessa e n - zima (WHITING, 1 9 7 6 ) , Outras enzimas necessárias para a fermentação alcoólica p o d e m ser inibidas pelo sulfito, como as desidrogenases de gliceraldeido e alcoólica (MAIER et alii, 1 9 8 6 ) .
BASSO, L.C. (Escola Superior de Agricultura "Luiz de
Q u e i r o z " / U S P , P i r a c i c a b a - S P ) . Comunicação p e s s o a l , 1988. Diversos fatores afetam a produção de alcoõis s u - periores (õleo fusel) durante a fermentação alcóolica NORDSTROM & CARLSSON (1965) v e r i f i c a r a m que a d e f i c i ê n - cia de magnesio provocou maior formação de alcoõis su- periores e FAHRASMANE et alii (1985) r e l a t a r a m que a pro duçao de alcoõis superiores foi maior no gênero Saacha- romyces oerevisiae do que no gênero Sohizosaccharomyces. REYNAUD et alii (1983) v e r i f i c a r a m que a m e t i o n i n a e o ãcido glutãmico inibiram a formação de õleo fusel. BEECH & DAVENPORT (1970) v e r i f i c a r a m que o suco de m a ç a s u l f i - tado produziu cidra com teores menores de õleo fusel. A formação de õleo fusel ocorre a partir da descar boxilaçao de cetoãcidos provenientes de aminoãcidos se- gundo experimentos clássicos de E h r l i c h (BRAUN, 1957 ; INGRAHAM & GUYMON, 1960; YOSHIZAWA et alii, 1 9 6 1 ) . SUO- MALAINEN & KERANEN (1967) relataram que a adição de v a H na aumentou o álcool isobutilico, leucina aumentou ál- cool isomílico e isoleucina aumentou ãlcool amilico opti camente ativo. 0 objetivo do presente trabalho foi o de verificar o efeito de quatro concentrações de sulfito sobre a for- mação de alcoõis superiores e acetaldeido durante a fer- mentação alcoólica.
MATERIAL E MÉTODOS
Mosto: foi obtido por diluição de melaço de cana
com a seguinte composição: Brix v o l u m e : 8 2 , 1 , açúcares redutores totais: 6 3 , 2 % , Nitrogênio total: 550 p p m , Potássio; 2,3%, M a g n e s i o : 0,42% e Cálcio: 0,23%, 0 pH do mosto foi acertado a 4,0 com solução de ácido s u l - furico e esterilizado a 120°C durante 15 m i n u t o s . 0 mos to testemunha apresentou 19 ppm de SO2 e com a adição de sulfito de sõdio foram obtidos mostos com 6 9 , 119 e 219 opm de sulfito. Açúcares redutores totais do mosto foi de 12,60%. Ensaio de fermentação: 90 ml de mosto foram ino- culados com 10 gramas de fermento de panificaçao Fleis- chmann (Saooharomyoes oerevisiae) com 99% de viabilida- de celular, e a fermentação conduzida, sem agitação, em tubos de centrifuga de 200 ml a temperatura de 32 - 1°C. Apôs o final da fermentação, os tubos foram centrifugados e o sobrenadante utilizado para as ana- lises químicas e o fermento reutilizado para novas fer- m e n t a ç õ e s , realizando-se quatro ciclos fermentativos Açúcares redutores do vinho foi de 0,70%. Analises q u í m i c a s : o vinho foi destilado em m i - crodestilador Kjeldahl e a densidade do destilado obti- da em densímetro digital Anton-Paar DMA 46, segundo AMO RIM et alii (1982). Açúcares redutores totais do mosto e açúcares redutores do vinho e sulfito do mosto foram determinados segundo descrito em AMORIM et alii (1986). A c e t a l d e i d o , alcoõis n-propílico, isobutílico e isoamí- lico foram determinados por cromatografia em fase gaso- sa (CG-17) com detetor de ionizaçao de chama utilizando -se coluna m e t á l i c a com HALLCOMID M18 a 15% sobre cro- mosorb W (CG-1904) com 2 metros de comprimento e 0,5 cm de diâmetro interno, temperatura do vaporizador 160°C, temperatura da coluna 110°C, temperatura do detetor 220°C, gãs de arraste nitrogênio com fluxo de 50 mil m i n . 0 volume de amostra injetado foi de 2 microli- tros. Analise e s t a t í s t i c a : foi utilizado o delineamen- to inteiramente casualizado com quatro tratamentos e quatro repetições segundo P I M E N T E L GOMES (1985).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Na Tabela 1 sao apresentados os teores de e t a n o l ,
acetaldeido e os alcoõis n-propílico, isobutílico e isoamílico do vinho obtido com diversas concentrações de sulfito e m pH 4,0. Nao foram observadas diferenças significativas no grau alcóolico dos diversos trata- m e n t o s , tendo o rendimento da fermentação alcoólica se situado em torno de 8 5 % . Como pode ser observado na Tabela 1, o sulfito a- fetou significativamente a produção de acetaldeído e alcoõis superiores. A concentração de acetaldeído a u - mentou com a adição de sulfito confirmando observações de UZUKA et alii (1985). Os alcoõis superiores detectados no presente tra balho foram reduzidos significativamente c o m o aumento de concentração de sulfito no mosto (Tabela 1) c o n f i r - mando observações feitas por BEECH & DAVENPORT (1970) para cidra. 0 aumento na concentração de acetaldeído do vinho poderia aumentar a produção de glicerol e portanto re- duzir os teores de e t a n o l . E n t r e t a n t o , esse aumento teõ rico do glicerol poderia resultar, no m á x i m o , em a u m e n - to de cerca de 0,03 ml de etanol/100 ml de v i n h o . Como a produção de alcoõis superiores esta rela- cionada diretamente com o m e t a b o l i s m o de aminoacíd-.>r> (INGRAHAM & G U Y M O N , 1960; Y O S H I Z A W A et alii, 1961; SUO- MALAINEN & K E R A N E N , 1 9 6 7 ) , a diminuição n a p r o d u ç ã o de alcoõis superiores provocada pelo sulfito poderia es- tar relacionada tanto com a redução do m e t a b o l i s m o de aminoãcidos pelas leveduras como pela inibiçao das e n - zimas descarboxilase p i r u v i c a (WHITING, 1976) e desidro genases alcóolica e de gliceraldeido-3-fosfato (MAIER et alii, 1 9 8 6 ) . Na Tabela 2 sao apresentados os teores de e t a n o l , acetaldeído e alcoõis n-propílico, isobutilico e isoamí lico do vinho obtido de mosto sulfitado com 219 p p m de SO2 e em tres valores de p H . A elevação do p H nao a f e - tou significativamente o grau alcoólico mas p r o v o c o u au mento significativo nos níveis de acetaldeído e alcoõis superiores. Provavelmente a forma mais prejudicial ao metabolismo de aminoãcidos e s t a r i a em pH mais baixo. Com a elevação do p H , diminui a proporçao^de SO2 livre e aumenta a forma H S O 3 e SO^ . 0 acetaldeído aumentou significativamente com o aumento do pH,porque a forma HSO3 esta em maior proporção (ANACLETO & U D E N , 1 9 8 2 ) . + p K : 1,81 S0 2 + H 0 2 ^ * HS0 3 + H p K : 6,91 HSO3 ^ * SO3 + H
Sendo que na forma de HSO3 ocorre a reação da adi-
ção com acetaldeido, impedindo a ação da desidrogenase alcoólica (CONN & S T E M P F , 1966).
CONCLUSÕES
Pelos resultados apresentados no presente traba-
lho, as seguintes conclusões podem ser m e n c i o n a d a s : A p r e s e n ç a de sulfito em mostos em concentrações de ate 219 p p m em pH 4,0 nao afetou significativamente a produção de e t a n o l . 0 sulfito aumentou a produção de acetaldeido e reduziu os teores de alcoóis n-prooíli- co, isobutílico e isoamilico. A elevação do pH de mosto sulfitado reduz o efei- to tóxico sobre a produção de alcoóis superiores po- rem a u m e n t a a formação de acetaldeido.
AGRADECIMENTOS
À FERMENTEC - Assessoria em Fermentação alcoólica
pelos recursos fornecidos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
A M O R I M , H.V.; ZAGO, E.A.; OLIVEIRA, A . J . Métodos analí-
ticos para o controle da fermentação alcoólica e apa¬ lhos de destilação. P i r a c i c a b a , FERMENTEC, 1986 71p. A M O R I M , H.V.; ZAGO, E.A.; OLIVEIRA, A . J . Novos métodos para o controle da fermentação alcoólica. São Pau- lo, Sociedade B r a s i l e i r a de M i c r o b i o l o g i a , 1982. 58p. ANACLETO, J . & U D E N , N . v a n . Kinetics and activation energetics of death in Saccharomyces cerevisiae in duced by sulfur dioxide. Biotechnology and Bioenginee¬ ring, New Y o r k , 34: 2477-86, 1982. BEECH, F.W. & DAVENPORT, R.R. The role of yeasts in cider-making. I n : R O S E , A . H . & H A R R I S O N , J.S., ed. The yeasts. New Y o r k , A c a d e m i c P r e s s , 197O. v.3 , p. 73-145. BRAU, H.M. Review on the origin and composition of fusel oil. Rio P i e d r a s , University of Puerto R i c o , 1957. 3Op. (Technical paper, 1 7 ) . CONN, E . E . & STUMPF, P.K. Outlines of biochemistry. New York, John w i l e y , 1966. FAHRASMANE, L.; JOURET, C ; P A R F A I T , A.; GALZY, P. Production of higher slcohols and short-chain fatty acids by different yeasts used in rum f e r m e n t a t i o n s . Journal of Food Science, C h a m p a i g n , 5O: 1427-3O , 1985. GLACET, A.; LETOURNEAU, F . ; L E V E Q U E , P.; VILLA, P. Kinetic study of sulfite ion inhibition during alcoholic fermentation of beet m o l a s s e s . Bioscience, W a s h i n g t o n , 4(1): 1 6 - 9 , 1985. A p u d Chemical Abs tracts, Columbus,1O3: 36142g, 1985. INGRAHAM, J.L. & G U Y M O N , J.F. The formation of higher aliphatic alcohols by mutant strains of Saccharomyces cerevisiae. Archives of Biochemistry and Biophysics, New Y o r k , 88: 157-66, 196O. MAIER, K.; H I N G E , H . ; L E U S C H E L , L. M e c h a n i s m of sulfite action o n the energy m e t a b o l i s m Saccharomyces cerevisiae. Biochimica et Biophysica Acta, A m s t e r d a m , 848: 12O-3O, 1986. NORDSTROM, K. & C A R L S S O N , B.O. Yeast growth and formation of fusel a l c o h o l s . Journal of the Institute of Brewing, L o n d o n , 71: 171-4, 1965. PIMENTEL GOMES, F. Curso de estatística experimental 11.ed. São P a u l o , N o b e l , 1985. 466 p. R E Y N A U D , V.; L H U G U E N O T , J.C.; PARFAIT, A.; BELIN, J.M. Improvement of the n i t r o g e n fraction for improved rum f e r m e n t a t i o n . Cah. Ens. Bana, 4: 63-75, 1983. Apud Chemical Abstracts, C o l u m b u s , 1O1: 168995f , 1984. S U O M A L A I N E N , H. & K E R A N E N , A.J.A. V a l i n e , leucine and isoleucine as precursors of branched fatty acids in y e a s t . Suomen Kemistilehti B, H e l s i n k i , 4O: 288-9, 1967. S U O M A L A I N E N , H. & OURA, E . Yeast carboxylase and cell permeability. Acta Chemica Scandinavica, Copenha- gem, 11: 1O9O, 1957.
U Z U K A , Y.; N O M U R A , T.; TANALA, K.; K O M A T S U , T.; SHIMA¬
DA, M. Effect of sulfur dioxide on the growth of wine east and the accumulation of metabolic interme¬ diates in weakly acid pH medium. American Journal of Enology and Viticulture. D a v i s , 19: 13-8, 1985. A p u d Chemical Abstracts, 1O2: 216457b, 1985. W H I T I N G , G.C. Organic acid m e t a b o l i s m of yeast during fermentation of alcoholic beverages - a review. Journal of the Institute of Brewing, L o n d o n , 82:84- 92, 1976. Y O S H I Z A W A , K . ; FURUKAWA, T.; TADENUMA, M . ; YAMADA, M. The formation of higher alcohols in the fermentati- on of amino acids by yeast. Agricultural and Bio- logical Chemistry. T o k y o , 25: 326-32, 1961