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Introito:
O primeiro cenário é composto por placards, onde se vê uma imagem que simboliza rajadas
fortes de vento, em turbilhão. (Esta imagem pode ser pintada ou projetada. Caso seja projetada,
ficava bem em movimento. Podiam-se representar também algumas folhas de papel a esvoaçar.)
Diante dos placards, várias figuras rodopiam, atravessando toda a cena, com panos compridos.
Ouve-se o som do vento.
Mensageira: (Entra a correr, pela esquerda, e para à boca de cena. Faz o gesto de quem está a
escutar)
– O vento sopra forte (pausa). E vem do Norte! O que traz com ele, desta vez?
Parecem vozes. Ouço gritos! Estarão aflitos ou contentes?
(Olha para todos os lados, como quem procura descobrir o que se passa. Sai a correr,
pela direita. As figurantes continuam a rodopiar e vão saindo de cena, cada uma
pelo seu lado.)
Cena 1:
O placard é retirado e vê-se um livro gigante, semiaberto. Além do livro, há uma grande
árvore: um gondoeiro. Espalhados pelo fundo da cena, mas imóveis, estão um macaco, um galo,
um cão e um crocodilo. O crocodilo está deitado.
Um Galo de Barcelos espreita por entre as folhas do livro. Assusta-se (dá um grito) e recolhe-se.
Devagar, volta a espreitar. Decide sair. Os seus movimentos são desengonçados, como se lhe
custasse equilibrar-se. Saem a Carochinha e o João Ratão e também lhes custa movimentarem-
se normalmente. A Carochinha coloca as mãos na barriga, como se estivesse enjoada.
Galo de Barcelos: Que horror, ia ficando sem as minhas belas penas! (Olha em volta, admirado)
Que sítio é este? (para os outros) Onde estamos?
Carochinha: (tentando recompor-se) Não faço a mínima ideia! Ainda agora estava a espreitar à
janela da minha casinha…
João Ratão: E eu… E eu ia… (faz uma pequena pausa, tentando controlar o embaraço). Ia a passar
em baixo. Ia dizer-te…
Galo de Barcelos: (impaciente) Vocês querem parar com isso? Eu ia fazer uma coisa muito
importante e agora estou aqui!
Galo de Barcelos: Olha, ia salvar um homem de morrer enforcado. E agora? Podes dizer-me
onde estamos?
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João Ratão: Sei tanto como tu! (olha à volta) Que sítio estranho!
Cena 2:
Coelhinho Branco: Eu sou o coelhinho Branco. Fui à horta buscar uma couve e ia para casa
fazer um caldinho. Mas está lá a Cabra Cabrês…
Cabra Cabrês: Que te salta em cima e te faz em três! (Ri-se. Depois para e olha em volta,
surpreendida.) Mas esta não é a casa do Coelhinho Branco! Onde estamos?
Galo de Barcelos: Isso queria eu saber! Mas não tenho tempo a perder. Não posso ficar aqui.
Tenho de ir cantar para provar a inocência daquele pobre coitado.
E estou com as penas todas desalinhadas!
(vai ajeitando as penas, enquanto sai de cena)
Coelhinho Branco: Posso ir contigo? Tenho medo de ficar aqui! (sai de cena)
Cabra Cabrês: Eu vou também. Não gosto deste sítio. (sai de cena)
Cena 3:
João Ratão: (olha para a Carochinha e suspira) Enfim, sós! Agora já me lembro do que ia
dizer-te. (oferece-lhe uma flor) Aceitas casar comigo?
Carochinha: Estás maluco? Onde é que eu vou encontrar um vestido de noiva aqui?
Onde é que vamos casar?
João Ratão: Anda comigo. Vamos ver que lugar é este. (repara no macaco)
Olha, está ali alguém. Vamos perguntar-lhe. (aproxima-se) Olá! (O macaco não se
move. João Ratão insiste) Oláááá?! O que se passa? Cortaram-te a língua?
(O macaco não responde)
Carochinha: Está ali um cão. Vamos perguntar-lhe. (aproxima-se) Olá, podia dizer-nos
onde estamos? (o cão também não se move nem responde)
João Ratão: Vamos tentar com o galo. (aproxima-se e apresenta-se) Olá, o meu nome é João
Ratão. Posso saber como te chamas? (o galo não se move, nem responde)
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Cena 4:
Entram em cena uma cigarra, uma formiga, uma coruja e uma águia. Vêm a discutir. Primeiro,
só se veem gestos. À medida que se aproximam da boca de cena, ouvem-se as vozes.
Formiga: (para a cigarra) O que fizeste à minha despensa? O que vou comer agora?
Cigarra: Não fui eu! (olha em volta) Mas este sítio é bonito! E está calor! Apetece-me cantar.
João Ratão: (para todas) Parem com isso! (aponta para os outros animais) Estou a tentar falar
com eles…
Formiga: Estou a ficar com fome. Vou procurar algo para comer. (sai de cena)
Cena 5:
Ouve-se de novo o som do vento. As personagens em cena olham para o céu, com ar assustado.
Carochinha: Eu também!
Coruja: (apontando para o crocodilo, imóvel) Está ali um tronco. Vamos trazê-lo para cá.
João Ratão: Boa ideia! (aproxima-se do crocodilo e agarra-lhe pelo rabo, tentando puxá-lo.
O crocodilo afasta-se. Todos gritam.)
Galo de Barcelos: Chamaram-me? Onde está ele? Quem é o condenado, desta vez?
Os outros animais começam a mexer-se. A Coruja, a Joaninha, a Cigarra, o João Ratão e o Galo
de Barcelos assustam-se ainda mais e continuam a correr de um lado para o outro, a gritar.
Cena 6:
Vindo do fundo, entra em cena um Lia-na’in. É velho e caminha com alguma dificuldade,
apoiando-se num pau. Os que estão a correr param assim que o veem. Perguntam em coro: “Quem
és tu?”
Lia-na’in: Eu sou o Lia-na’in, o senhor da palavra, e esta é a minha terra. E vocês, quem são?
O que fazem aqui?
Galo de Barcelos: Não sei como viemos aqui parar. Eu sou o Galo de Barcelos.
Coruja: Eu sou a Comadre Coruja, que tinha uns filhos muito lindos. (triste) Mas um dia pedi à
Comadre Águia para tomar conta deles e ela comeu-os. Depois, soprou um vento…
Lia-na’in: A tua história é muito triste, Comadre Coruja. (para a cigarra) E tu, quem és?
Cigarra: Eu chamo-me Cigarra. Gosto muito de cantar, mas a minha vizinha formiga não gosta
nada…
Cigarra: Não sei. Foi procurar comida. Está sempre a procurar comida. Ela não sabe fazer outra
coisa!
João Ratão: E eu esqueci-me do que estava a fazer… (apontando para os outros animais, enquanto
pergunta ao Lia-na’in) Se esta terra é tua, então sabes quem eles são?
Lia-na’in: Sei. (vai apontando para cada um e apresentando) Este é Manumatadador, o galo
mágico. Este é o Lafaek...
(as personagens vão olhando com admiração para os animais que o Lia-na’in apresenta, mas estes
continuam entregues às suas atividades, sem interagir com os visitantes)
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Galo de Barcelos: (Interrompe o discurso do Lia-na’in, desconfiado) Disseste que esse galo é
mágico, mas parece-me um galo muito comum… Nem sequer fala!
Lia-na’in: Ainda não é hora mas, quando cair a noite, ele falará. (pretende continuar as
apresentações e aponta para o cão) E este…
Lia-na’in: Sim, à noite todos falam. (um pouco irritado por ter sido interrompido, bate com o
bastão no chão, enquanto diz) Quem lhes dá a palavra sou eu!
Cena 7:
Caiu a noite. Todas as personagens que viajaram com o vento estão sentadas em semicírculo.
Entre as duas metades do semicírculo, encontra-se o Lia-na’in. Todos o escutam. À medida que
ele vai falando, as figuras que antes não falavam, vão-se colocando, à vez, no centro do
semicírculo e contam a sua história aos presentes, acentuando as palavras com mímica. O
primeiro é o macaco.
Macaco: Eu tenho muitos nomes, mas podem-me chamar de Macaco. Vou contar-vos a minha
história:
No outro dia, eu queria passar uma ribeira. Os meus irmãos já tinham passado quando
não havia água, mas eu estava a dormir e só acordei quando choveu. A água subia, subia… E eu
não sei nadar. Ai, Marômak! Apareceu um lafaek, depois outro, depois outro… E queriam todos
comer-me. De repente, eu disse “Não me comam, porque eu sou apenas um macaco. A minha
carne não chega para todos vocês. Olhem para o outro lado da ribeira, estão ali os meus irmãos.
Deixem-me em paz, e eu vou chamá-los para vos alimentarem”. (ri-se) Hehehe, os lafaeks
acreditaram em mim e fizeram fila, de um lado ao outro. Eu saltei por cima deles e cheguei a
salvo ao outro lado da ribeira.
(para os presentes, fazendo uma vénia) Digam lá, se não sou o animal mais esperto de todos!
(os outros concordam, com gestos de cabeça, enquanto o macaco se vai sentar, a fazer
macaquices)
Cena 8:
Cão: (vai para o centro, prepara-se para contar a sua história, mas não consegue parar de rir)
Hahahaha. O mais parvo, isso sim! (para o macaco) Já te esqueceste daquele dia em que
foste enganado pelo rato e te queimaste todo? Hahahaha…. O mais esperto! Tu só serves
para estar em cima das árvores. Se te apanho a roubar a horta, nem sabes o que te faço!
Cão: (reverente) Sim senhor, vou contar. (afina a voz, encara os presentes e começa)
Há muito tempo, eu andava a caçar com o meu senhor e encontrei um veado. Fui atrás
dele e apanhei-o sozinho. Depois, o meu senhor assou o veado e começou a comer.
Não me deu nada. E eu disse-lhe “Então eu chamo-te para me ajudares e tu não me ligas?
Deixaste-me sozinho a matar este grande veado. Só apareceste quando o veado já estava
morto”. Ele continuou a comer. Comeu a carne toda e deixou para mim só os ossos e a pele.
(para os presentes, com tristeza)
O meu senhor é malandro como o macaco, mas eu tenho de fazer o que ele manda.
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Cigarra: Porquê?
Lia-na’in: Não te queixes cão, que os homens levam-te para todo o lado. Não podes comer muito,
porque ficas pesado e depois já não podes correr atrás dos veados. És um guerreiro,
lembra-te disso.
Mas vamos agora ouvir o galo.
Galo de Barcelos: Aposto que a história dele não é melhor do que a minha!
Cena 9:
Lia-na’in: (irritado, bate com o bastão no chão) Ninguém te deu a palavra. Por isso, não
interrompas! (para manumatadador) Continua…
Manumatadador: Há muito tempo, o Liurai de Loro Leten, que se chamava Kheli, recebeu a visita
de sete mulheres de Sakari que queriam casar com ele. Ele escolheu a mais
nova, que se chamava Buik Ibun. Quando ela estava grávida, ele teve de viajar e pediu às outras
para o avisarem, quando fosse a hora. Sete dias depois, nasceram os gémeos Sawak e Koli. Mas as
irmãs taparam-lhe os olhos e os ouvidos e trocaram os bebés por dois cachorros. Quando Dom
Kehli chegou a casa, a mulher apresentou-lhe os cães, como se fossem os filhos. Ele ficou furioso,
mandou-a embora e casou com as irmãs dela.
Galo de Barcelos: E onde é que tu entras, nessa história? Ainda não ouvi nada…
Lia-na’in: (levanta-se, furioso) Aqui, quem dá a palavra sou eu! (tosse e cai em seguida. O seu
estado de fraqueza é evidente)
(As outras personagens aproximam-se do velho Lia-na’in. A Águia abana as suas asas, para o
refrescar. A cigarra toca flauta, para o animar. A formiga oferece-lhe um pedaço de pão. A coruja
toma-lhe o pulso…)
Coruja: (para os outros) Ele está muito fraco. (para o macaco, o cão, o galo e o crocodilo, que
andam às voltas sem saberem o que fazer) E vocês? Não podem ajudar?
Lia-na’in: (fala com dificuldade) Estou velho. Se eu morrer, eles desaparecem. Por isso, estão
com medo.
Lia-na’in: Porque eles vivem na minha memória. Não é aí que vivem todas as personagens das
histórias? (aponta para os viajantes, um por um) Tu… tu… tu… Onde vivem vocês?
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(Os viajantes apontam para o livro)
Todos: Um livro!
Lia-na’in: Um quê?
Todos: Um liiiiiivro!
Carochina: Um livro é… onde estão guardadas coisas que nos fazem sonhar!
Cigarra: Há livros com cantigas muito bonitas. (enquanto diz isto, faz movimentos de dança)
Galo de Barcelos: (entufando o peito) O livro que tem a minha história é muito antigo!
(João Ratão aproxima-se do velho Lia-na’in e segreda-lhe algo ao ouvido. Este vai fazendo
expressões de surpresa. João Ratão continua.)
Lia-na’in: (entusiasmado) Quer dizer… Quer dizer… Se este macaco, este cão, este galo e este
Lafaek vivessem num livro, como vocês, podiam ir para qualquer lado? E falar sozinhos,
Sem precisarem de mim?
Coruja: Podiam falar sempre que alguém pegasse no livro para ler.
Lia-na’in: Eu estou velho. Qualquer dia, vou passar para o outro mundo…
Lia-na’in: Sim, o mundo invisível. Nesse mundo, já não vou poder contar histórias. Quando eu
morrer, eles desaparecem (diz isto, apontando para o macaco, o cão, o galo e o
crocodilo). Eles morrem também, perceberam?
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Galo de Barcelos: Foi por isso que te zangaste comigo? Porque eu interrompi a história?
Lia-na’in: Foi. Desculpa. Eu tenho de contar as histórias todas que sei antes de morrer. Tenho
de encontrar outra pessoa que as guarde na memória. Preciso de alguém para
continuar…
Lia-na’in: Tenho, mas eles foram para a cidade. Na cidade, já não há fogueiras, para nos
sentarmos à volta delas a contar histórias… Na cidade já não há noite…
(os outros vão acenando com as cabeças, em sinal de concordância, enquanto vão comentando
entre eles as palavras do velho Lia-na’in)
Formiga: E bibliotecas!
João Ratão: Tive uma ideia! E se eles fossem connosco? Quero dizer: no nosso livro!
João Ratão: Se eles entrassem no nosso livro… já podiam continuar a viver, mesmo depois de tu,
ehhh, depois de tu…
Lia-na’in: Depois de eu morrer? Se é como vocês dizem… Onde está o vosso Lia-na’in?
Coruja: Não sabemos. As nossas histórias foram inventadas há muito tempo. Depois, alguém as
guardou ali… (aponta para o livro)
Coruja: Não é bem assim. Precisamos de alguém para ler o livro. Mas podem ser muitas pessoas.
Águia: E pode ser em qualquer sítio. (rodopia, de asas abertas, enquanto fala)
Lia-na’in: (para o cão, o macaco, o crocodilo e o galo) O que é que vocês acham disto? Podem
falar.
Cão: Eu vou ter uma casa nova? (sacode o corpo) Parece-me bem!
Macaco: E nesse livro também há árvores, para eu balançar? (os outros acenam que sim) Que bom!
(começa a rir e a dar pulos de alegria)
Crocodilo: Eu vou precisar de muitas páginas! (olha à volta) Não me olhem assim. Eu estou a
crescer. E sou o animal mais antigo de todos. (com orgulho) Eu sou esta terra!
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Coruja: Está bem, não te preocupes. Arranja-se uma edição com muitas páginas.
(para o Lia-na’in) Agora que o teu problema está resolvido, podemos ouvir o resto das
tuas histórias?
Cena 10:
Sentam-se todos à volta do velho Lia-na’in. O galo ocupa o centro do círculo. Por gestos, vai
Contando o que resta da sua história. Senta-se e dá lugar ao crocodilo, que conta a sua história
por mímica. Enquanto isso se passa ao fundo da cena, entra a mensageira, que se coloca do lado
esquerdo. Fala para o público.
Mensageira: E assim ficaram a noite toda a ouvir como o Manumatadador salvou os gémeos Sawak
e Koli, como o Lafaek se transformou em ilha e muitas outras histórias...
Quando as histórias acabaram, o sol já ia bem alto no céu.
As personagens levantam-se e fazem um círculo à volta do livro. Uma a uma, desaparecem por
entre as páginas, enquanto o velho Lia-na’in vai acenando. Na hipótese se se poder jogar com
projeções, cada personagem podia levar consigo uma grande folha de cartolina branca, na qual
se iam projetando imagens alusivas às suas histórias. Assim, os movimentos teriam de ser mais
lentos e mais lenta a entrada de cada uma no livro.
Lia-na’in: Adeus, adeus. Não se esqueçam das palavras que eu vos ensinei! Adeus!
Surgem de novo os figurantes, que rodopiam pela cena, como no início. Ouve-se o vento.
(FIM)