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SAÚDE
UNIVERSALIDADE, IGUALDADE E INTEGRALIDADE DA SAÚDE: UM PROJETO
POSSÍVEL
BELO HORIZONTE
2013
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1. INTRODUÇÃO
em saúde têm sido um dos temas centrais do debate conceitual e político no âmbito do SUS.
A trajetória desse debate tem sido marcada pela crítica e redefinição de idéias oriundas de
conceitual e definem as opções políticas colocadas aos gestores do SUS no que diz respeito à
subsidiar a compreensão das características dos modelos vigentes e das propostas alternativas
propostas de mudança.
reorganização das práticas e dos serviços de saúde emanadas dos movimentos de reforma em
2. ASPECTOS CONCEITUAIS
Locais de Saúde, fomentada pela OPS nos anos 80. No Brasil, este debate deu lugar à
A primeira delas parte da definição apresentada pela OPS (1992) segunda a qual “modelo
seja, uma forma de organização dos estabelecimentos de saúde, a saber, centros de saúde,
serviços do mesmo tipo, por exemplo, rede ambulatorial, rede hospitalar, ou por serviços de
(MENDES, 2009).
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das práticas de saúde que contempla a articulação das ações de promoção da saúde, prevenção
de trabalho em saúde e considera que “modelos assistenciais, podem ser entendidos como
portanto, simplesmente uma forma de organização dos serviços de saúde nem tampouco um
modelos assistenciais são “formas de organização das relações entre sujeitos (profissionais de
saúde e usuários) mediadas por tecnologias (materiais e não materiais) utilizadas no processo
Com base nessas definições, pode-se conceber “modelo de atenção”, de forma sistêmica,
articulando três dimensões: uma gerencial, relativa aos mecanismos de condução do processo
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de reorganização das ações e serviços, uma organizativa, que diz respeito ao estabelecimento
estabelecidas entre o (s) sujeito(s) das práticas e seus objetos de trabalho, relações estas
mediadas pelo saber e tecnologia que operam no processo de trabalho em saúde, em vários
implementação de políticas que criem condições para as mudanças ao nível “micro”, ou seja,
assistenciais ou reabilitadoras. Estas mudanças podem incidir tanto sobre o conteúdo das
saúde nos diversos níveis de complexidade e também na forma de organização das unidades
territorial dos recursos e, ao mesmo tempo busquem o ajuste possível entre o perfil de oferta
hegemônicos europeus e organizou-se inicialmente como uma profissão liberal regida pela
surgimento da nossa Saúde Pública, com o trabalho desenvolvido por Osvaldo Cruz, no
da população.
sendo constituídos dois modelos distintos de atenção à saúde da população: o modelo médico
Este modelo tem suas raízes históricas na medicina liberal a qual se passou, ao longo
função da progressiva incorporação tecnológica. Este processo estruturou as bases dos dois
possibilidade de uma ampla reforma sanitária, ou seja, o sistema público, constituído por um
conjunto heterogêneo de instituições em vários níveis de governo, das quais a mais importante
tanto nos serviços públicos quanto nos privados reproduzia-se o modelo médico-assistencial
hospitalocêntrico, ainda que no âmbito do sistema público este modelo convivesse com o
modelo sanitarista, como veremos a seguir. No sistema público, ademais, grande parte da rede
assistencial era composta por serviços privados contratados e conveniados, o que levou alguns
“privatista”.
Modelo Sanitarista
econômico do país (febre amarela, varíola, peste), realizadas sob comando de Osvaldo Cruz,
organizacional na área, o modelo sanitarista incorporou, ao longo do século XX, além das
controle de doenças e outros agravos, caminhando, a partir dos anos 70 para a implantação de
A partir dos anos 90, o processo de descentralização da gestão do SUS, levou à criação
vigilância epidemiológica realizadas por órgãos federais distintos. Mais recentemente a SVS
outros órgãos governamentais que atuam na área de meio-ambiente. Por outro lado, com a
(ANVISA), que passou a se responsabilizar pela coordenação nacional da política e das ações
sanitária” que inclui a articulação com os órgãos existentes nas secretarias estaduais bem
A criação do Sistema Único de Saúde (SUS), a partir das lutas pela Reforma Sanitária
nos anos 80, implicou na “integração” dos serviços públicos das diversas instituições, que
secretarias estaduais e municipais de saúde. Com isso, o SUS “herdou” o modelo de atenção
serviços que compõem o modelo sanitarista. Este modelo, entretanto, vem apresentando
crescente insatisfação dos profissionais e trabalhadores de saúde e, por último, mas não
menos importante, pela perda de credibilidade e confiança por parte da população usuária.
Tal crise começou a ser analisada no início dos anos 70, apontando-se, além dos
últimos 25 anos, a qual tem “dialogado” criticamente com propostas difundidas no âmbito
internacional.
organização da produção de ações e serviços. Várias das noções e valores propostos por esses
A Medicina Preventiva surgiu nos EUA, como uma reação da Associação Médica
Representando “uma leitura liberal e civil” (AROUCA, 2003) da prática médica, colocou-se
como uma proposta de reforma parcial da prática médica através de mudanças no ensino
médico, para que o profissional viesse a adquirir uma “atitude preventiva” e incorporasse, à
sua prática, condutas preventivas e não apenas condutas diagnósticas e terapêuticas. As bases
entendidas como parte de um processo contínuo, do qual é possível estabelecer uma “História
natural” (LEAVELL E CLARK, 1978) base para a reorganização da prática médica a partir
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Medicina Comunitária, movimento ideológico surgido nos anos 60, também nos EUA. A
preventivista (DONNANGELO, 1976; PAIM, 1986a). Nesse sentido, busca articular a noção
saúde”, além de eleger a “participação comunitária” como uma das suas principais diretrizes
estratégicas.
“pacote de serviços básicos de saúde” para populações pobres constituiu, inclusive, um dos
eixos das propostas preconizadas pelo Banco Mundial na década de 90 para países em
centrais do movimento ideológico da Medicina Familiar, também surgido nos anos 60, no
“médico generalista”, daí que sua formação deveria ser feita, inclusive, ao nível de cursos de
(empresas médicas).
nos anos 70, assim como a implantação dos Sistemas Locais de Saúde (SILOS), na época de
Carta de Ottawa, de 1986. Este movimento traz uma inovação conceitual em relação ao
serem dispostos em um modelo composto pela biologia humana, ambiente, estilos de vida e
médico para a ação social e política em torno da criação e manutenção de condições saudáveis
de vida. Coerentemente com a concepção de “campo da saúde”, estas ações podem ser
desenvolvidas em planos distintos, incluindo desde mudanças nos “estilos de vida” das
pessoas, até intervenções ambientais e mudanças nas políticas econômicas e sociais, inclusive,
níveis de governo, principalmente a partir de meados dos anos 90, processo que culminou
com base na “promoção da saúde”, surgiu, nos EUA, outro movimento especificamente
gerou a elaboração de propostas em torno das “tarefas básicas” da Saúde Pública, quais sejam:
Brasil este movimento repercutiu principalmente no debate em torno da definição das funções
governos a adotarem políticas intersetoriais voltadas à melhoria das condições de vida e saúde
sistematizada no diagrama proposto por Dahlgren e Whitehead (1991), que incorpora, além
interpondo entre eles a ação social organizada em redes de apoio, (suporte à vida e à saúde),
várias dimensões e aspectos do modelo de atenção vigente. Para isso concorrem diversos
nível nacional. O registro e análise destas experiências, bem como a sistematização das suas
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Distritos Sanitários
que adotava a perspectiva sistêmica, enfatizando a base territorial como critério fundamental
para a definição da população coberta e do perfil de oferta dos serviços, levando-se em conta
identificação das necessidades de saúde da população. Tal proposta retomava idéias contidas
no método CENDES - OPS (1965), articulando alguns dos seus conceitos-chave com os
ações com a “oferta organizada” de serviços e as ações previstas nos “programas especiais”
Saúde Escola em São Paulo constituiu o solo onde germinou a re-conceituação da proposta de
Vigilância da Saúde
A Vigilância à Saúde (VISAU) surge no final dos anos 80 e início dos anos 90,
agravos à saúde.
organizada irão discutir e deliberar sobre os problemas de saúde e propor intervenções que
prioritários incluem desde ações de controle dos determinantes, especialmente aquelas que
organização dos diversos grupos para a promoção e defesa das suas condições de vida e
Acolhimento/Clínica ampliada
UNICAMP sobre a gestão e organização do trabalho no âmbito das unidades de saúde, base
vida”, que tem como pilar a preocupação com o acolhimento e o estabelecimento de vínculos
Esse processo implica mudanças na “porta de entrada” aos serviços com introdução
melhoria da qualidade da atenção, o acolhimento pode ser entendido como uma estratégia de
(CAMPOS, 1999, 2003; TESSER, NETO, CAMPOS, 2010). Trata-se de uma proposta que
visa “ajudar usuários e trabalhadores de saúde a lidar com a complexidade dos sujeitos e a
dessas idéias ao debate no âmbito das instituições gestoras do SUS, ao nível federal, estadual
estimular o debate em torno dessas questões e propiciar o “aumento da eficácia das práticas
Saúde da Família
de atenção.
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saúde para os municípios brasileiros no final da década de 90, sendo reafirmado como
para ser considerada uma estratégia de mudança do modelo de atenção à saúde no SUS, na
portanto, um espaço de reorganização do processo de trabalho em saúde nesse nível. Mais que
isso, a Saúde da Família, passou a ser concebida como parte de uma estratégia maior de
qualidade de vida da população das áreas cobertas pelo programa (TEIXEIRA, 2003; PAIM,
2008).
Apesar da importância dessa estratégia para a extensão de cobertura dos serviços, que
vem sendo evidenciada pela enorme expansão do número de equipes do PSF implantadas em
todo o país e pela reafirmação da atenção básica como coordenadora do cuidado no decreto
âmbito do SUS, ainda não se pode afirmar que, no conjunto, as ações e serviços produzidos
Um dos resultados indesejados desse processo tem sido o aumento da demanda por
recente, a implantação dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família- NASF, dotados de equipes
VILASBÔAS, 2010).
5. COMENTÁRIOS FINAIS
uma série de obstáculos, entre os quais, sem dúvida, a recriação permanente das condições
sanitarista.
Nesse sentido, é importante que se mantenha uma atualização permanente dos estudos
discutir até que ponto contribuem para a mudança e transformação da organização dos
protocolos assistenciais que muitas vezes, “em vez de constituir uma tecnologia capaz de
No que diz respeito ao SUS, observa-se uma tendência recente ao fortalecimento deste
modelo, na medida em que o governo federal além de manter o padrão de financiamento que
a maior parte pertencente à rede privada contratada e conveniada, tem estimulado a expansão
organizações privadas.
parte de seus esforços e gastos na gestão do mix público e privado de assistência individual à
atenção à Saúde Mental (CAPS), bem como na implantação das Unidades de Pronto
Atendimento (UPA) e Núcleos de apoio à Saúde da Família (NASF). Todos estes serviços,
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ainda que necessários, tendem a reproduzir o modelo assistencial centrado na Clínica, para o
modelo hegemônico.
inclusive no Brasil. Esta insatisfação, por outro lado, tem contribuído para a expansão
chamadas “racionalidades médicas alternativas” (LUZ, 2001; 2005), que se apresentam hoje
como um diferencial de consumo para as elites vinculadas aos serviços privados, mas também
SUS.
Cabe concluir que apesar dos esforços realizados e dos avanços alcançados, a
mudança operada na organização dos serviços e no perfil das práticas de saúde apenas
quão distante estamos de um sistema de saúde que opere segundo a lógica da intervenção
sobre determinantes, riscos e danos, contribuindo não só para o cuidado à saúde mas
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