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Peças Processuais

Procuradoria Geral do Estado


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GRUPO DE TRABALHO DE DIREITOS HUMANOS

PEÇA PROCESSUAL

Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Taubaté.

Proc. nº 648/98.

FRANCISCO COSTA ROCHA, por intermédio do Coordenador Regional de


Assistência Judiciária ao Preso, vem, acatadamente, nos autos de sua INTERDIÇÃO pedida pelo
Ministério Público, expor e, a final, requerer o quanto se segue:

a – dos antecedentes fáticos e jurídicos deste requerimento –


Por causas sobejamente afamadas – portanto, totalmente dispensáveis de serem
recontadas -, o Ministério Público, ao apagar das luzes da pena privativa de liberdade do
requerente, e para evitar consumação iminente de sua soltura, pleiteou, perante esse mui Digno
Juízo, com supedâneo legal no agora mortíssimo Decreto nº 24.559/34 e sob o argumento central
de que ele ‘representa risco para a ordem pública’, a decretação de sua interdição entrelaçada a
internação em hospital psiquiátrico de regime fechado, a par de pleitear complementarmente, e
com caráter provisório, ou seja, até efetivação desta hospitalização, sua permanência na Casa de
Custódia e Tratamento de Taubaté, nosocômio penal onde s’encontrava, desde maio de 95, em
‘tratamento’ durante o cumprimento da pena reclusiva, e onde, sem interregno algum, ainda hoje
s’encontra, sem tratamento e sem pena reclusiva ...
Regularmente tramitado o procedimento interditório, acolheu-se o pedido ministerial
na íntegra: decreta-se a interdição, determina-se a internação hospitalar em regime fechado e
autoriza-se a manutenção provisória na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté.
Inconformado com o dispositivo decisório concernente à permanência provisória na Casa de
Custódia e Tratamento de Taubaté, por apelação impugna-o o requerente, em busca de reforma,
para que “seja transferido para o lar de sua família, com acompanhamento e tratamento
psiquiátrico oferecido pelo Estado”, sob a sustentação, legal e legítima, de que aquele
estabelecimento, em essência e por definição reservado à execução penal, revelava-se triplamente
inidôneo para, àquel’altura de sua vida – tal e qual no hoje, adira-se para atualizar os dados
recursais -, continuar a confiná-lo: fosse porque exauriu-se a longa trajetória de sua tributação
apenativa, fosse porque ali não se dispõe de tratamento a corrigir seu transtorno mental, fosse
porque o ambiente vocacionado para administrar este tratamento reside em hospital psiquiátrico,
jamais em estabelecimento penal de qualquer espécie.
Para infelicidade do requerente, seu recurso, por unanimidade, foi rejeitado,
escrevendo-se na ementa oficial:
“PEDIDO DE INTERDIÇÃO – sentença acolhendo o pedido – recurso de apelação em que se
colima a reforma, para que o interditando seja liberado para viver em ambiente familiar, com o
devido tratamento – interdição decretada que se justificava, amparada em conclusões periciais –
permanência provisória do interditando em estabelecimento penitenciário misto, até deliberação
posterior do Juízo – legalidade – recurso não provido” (rel. Ruy Camilo – 10ª Cam. de Direito
Privado).

Estava-se, na data do acórdão, em 22 de junho de 1.999.


Está-se, na data de hoje, em 21 de junho de 2.002.
Três longos anos se passaram.
E, com todo o respeito, faz-se forçoso reconhecer que – afora o fenômeno de que a
permanência provisória do requerente na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté convolou-se
em permanência permanente, mutação que, já de ‘per se’, contraria o acórdão – a esdrúxula
situação do requerente continua imprecisa e na estaca zero: nada foi deliberado, por esse mui
digno Juízo,de conclusivo, no sentido de, concretizando-se o ditame sentencial confirmado no
acórdão, removê-lo definitivamente para um hospital psiquiátrico.
E aqui estamos neste impasse.
E ali na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté está o requerente,
desanimado, na antevisão insuportável da perpetuidade de um cárcere que já não mais deveria
tanger seu destino existencial nem sua sina legal.
Eis, em sumária exposição, o conjunto fático de imprescindível interesse à
compreensão e ao deslinde da pretensão em pauta.

b – da pretensão deste requerimento –


A pretensão do requerente é simples e congruente com o decidido: sua imediata
remoção para um hospital psiquiátrico da rede de saúde pública, porquanto se apresenta
acintosamente ilegal sua permanência na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté.

c – do direito à pretensão do requerimento –


Indo diretamente ao ponto de interesse – que a pletora de feitos anda exuberante
para parolagens estéreis - : está limpidamente dito no acórdão, em confirmação à sentença, que a
permanência do requerente na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté “tem caráter provisório,
até que o magistrado delibere, à vista de informações solicitadas, sempre com o intuito de protegê-
lo”.
É exatamente o que, aqui e agora, reclama-se.
Que se acerte materialmente, neste aspecto, a sentença, com a declaração judicial
de que está finda a estadia do requerente na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté e com a
subseqüente providência judicial de transferi-lo para um hospital psiquiátrico da rede de saúde
pública.
Por quê?
Porque, dado o longo tempo decorrido, tal permanência perdeu totalmente o
caráter de provisoriedade, de modo que, a perseverar seu encarceramento em tal estabelecimento
penal e enquanto subsistir este encarceramento, encontrar-se-á o requerente em situação de ilegal
constrangimento.
Esta permanência configura-se legalmente irregular a partir do momento – que não
é de hoje - , do momento em que, em descompasso ao decidido, perdeu ela a marca da
provisoriedade.
E quando ocorreu este momento crucial?
Pode-se desvendá-lo, este momento crucial, sob duas perspectivas, ambas
inerentes ao quadro traçado no teor decisório: sob uma perspectiva material, a decorrer do
exaurimento infrutuoso das providências judiciais realizadas na busca da remoção do requerente
para um hospital psiquiátrico, e sob uma perspectiva temporal, a decorrer da noção cronométrica
do tempo.
Sob a perspectiva material, ocorreu este momento crucial, desde que s’esgotou,
vãmente, todo um conjunto de tentativas desse mui Digno Juízo, para efetivar a internação do
requerente, com a unissonamente recusa e obstinada incompetência das instituições psiquiátricas
em recebê-lo.
Basta reler, com vagar e isentamente, o transcrito trecho fundamental do acórdão
para, com tanto, concordar: o encarceramento provisório perdura e subordina sua validez a um
dado contigencial: o recebimento das informações solicitadas, de forma que, prestadas estas, em
tom negativo ou em tom positivo, dissipa-se a provisoriedade, cabendo ao mui Digno Juízo
deliberar sobre a sorte do requerente, que na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté – ou em
qualquer outro estabelecimento penal – não deverá mais permanecer, sob pena de tal
permanência tornar-se ema permanência permanente, qualidade que, teimosamente, está
ostentando, desde aquele então.
Sob a perspectiva temporal, se não é possível particularizar-se o momento crucial
desta passagem – da mutação do provisório em permanente -, com certeza, pode-se afirmar que
hoje, três longos anos idos e vividos na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, a persistência
da permanência adquiriu foro incontroverso de permanência permanente.
Não se pode, a esta altura dos acontecimentos, falar-se, ou sequer pensar-se, em
provisoriedade, como se esta espantosa situação do requerente estivesse, como à primeira vista
parece, ancorada apenas na espera de uma transferência para um hospital psiquiátrico, pois, desta
maneira, posta a tenaz rejeição hospitalar em abriga-lo, a provisoriedade, em atropelo mesmo à
natureza mesma das coisas, acabará transmudada – em que pese remanescer-lhe aquele nome –
em eternidade, esta ‘cansada esperança’, na intrigante e misteriosa expressão de Jorge Luis
Borges.
O estado de provisoriedade, bem como o de permanente, reside no tempo – este
fluir inexorável que, paradoxalmente, sempre perdura e sempre s’esvai -, o qual, em sua conotação
cronométrica, reclama, ainda que implicitamente, nas operações jurídico-legais, uma duração, ou
seja, um período delimitado, com termo inicial e termo final, duração que será a referência básica
para ‘controlar o ritmo da vida jurídica’, a fim, neste caso, ‘de evitar o prolongamento nefasto de
situações precárias’ (Jean-Louis Bergel, in “Teoria Geral do Direito”, pg. 155).
Ilustre-se, para uma analogia e por exemplo, que as prisões processuais preventiva
e em flagrante não se ajustam indeterminadamente à legalidade; rompe-se a legalidade delas após
o 81º dia, data em que, somados os prazos processuais, deveria estar terminada a instrução
criminal: há um tempo medido a controlar-lhes a legalidade.
Deste modo, e de qualquer outro modo, desde que, num dizer acaciano, todas as
coisas, situações e pessoas existem e repousam no tempo, a provisoriedade do encarceramento
não pode sujeitar-se apenas ao alvedrio subjetivo de aguardar-se indefinidamente um lugar num
hospital psiquiátrico, devendo ter um parâmetro objetivo interno e latente de demarcação temporal,
carregado de certa razoabilidade e de muita moderação, para não se desviar desta característica
de contingencialidade.
Ao abandonar a correspondência com o sentido temporário, o encarceramento
prolongado do requerente na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté torna-se um meio
impróprio e desautorizado, em face da Constituição, para alcançar o objetivo judicialmente
pretendido, à medida que, indo além, muito além, da menor ingerência estatal possível em sua
vida, tortura-lhe mortalmente, dia a dia, o direito de liberdade, como se deduz desta conceituação,
emanada da jurisprudência tedesca, acerca do princípio constitucional, hodiernamente consagrado
nos regimes democráticos, da proporcionalidade entre meio e fim:
“O meio empregado pelo legislador deve ser adequado e exigível, para que seja atingido o
fim almejado. O meio é adequado quando, com o seu auxílio, se pode promover o resultado
desejado; ele é exigível quando o legislador não poderia ter escolhido outro igualmente eficaz, mas
que seria um meio não-prejudicial ou portador de uma limitação menos perceptível a direito
fundamental” (Tribunal Constitucional da Alemanha – transcrito em “Ensaios de Teoria
Constitucional”, pg. 87, de Willis Santiago Guerra Filho – grifos nossos).

À mercê absoluta do Judiciário, impotente e deserdado por uma trajetória de encarceramento


marcada pela indefinição temporal, em que a cada dia se lhe debita, sob o título injusto de
provisório, outro dia, o requerente amarga uma situação que transcende ao desvario da incerteza
existencial: este ermo temporal também retira-lhe a segurança jurídica, garantia conformadora e
informadora do regime jurídico do governado em toda e qualquer contingência de submissão à
atuação estatal, mormente em questões que envolvem o sagrado direito de liberdade.
Exausto da ‘cansada esperança’ de uma promessa incumprida – a de retirá-lo da Casa de
Custódia e Tratamento de Taubaté -, restará ao requerente ao requerente somente o consolo de
apegar-se ao vaticínio daquele lúcido poeta comunista? :
“Nem mesmo o dilúvio
durou eternamente.
Um dia escoaram-se
As águas escuras.”
(Bertold Bretch)

Não.
Chega-lhe, também, lá no fundo de sua inabalável fé – se fé não tivesse, aqui não
estaria -, a expectativa de realizar-se o direito em seu favor.
Porque, ademais de, como visto, a provisoriedade de seu encarceramento ter-se
material e temporalmente diluído, circunstância a exigir sua imediata retirada da Casa de Custódia
e Tratamento de Taubaté, não se pode demitir do processo de interdição seu principal e único
objetivo – neste caso já quase olvidado -, que é o de resguardar os interesses do interditando.
Afiançaram esta versão os mestres de hoje e os de ontem.
No ontem, ensinavam entre os doutos:
“A ação e sentença de interdição têm por fito organizar a defesa do incapaz e assegurar a eficácia
‘erga omnes’” (Pontes de Miranda, in “Comentários ao Código de Processo Civil (de 1.939)” III – 2/
283 e 284 – grifos dele).

Modernamente, professoram doutos de nomeada:


“Na jurisdição voluntária, o juiz age sempre no titular daquele interesse que a lei acha relevante
socialmente, como, na hipótese figurada, é o interditando. Exclusivamente com vista ao interesse
deste é que o juiz proferirá sua decisão: ...” (Cintra, Grinover & Dinamarco, em “Teoria Geral do
Processo”, pg. 154).
e
“A mais interessante destas formas – processo sem lide – se refere à interdição, tipicamente
processo sem litígio: entre o autor no pleito de interdição e o denunciado como incapaz
(interditando) não medeia litígio, porque o primeiro fala no interesse e não contra o interesse do
segundo” (Edson Prata, in “Jurisdição Voluntária”, pg. 232 – grifos dele).

Por tão eloqüente razão, é que o acórdão manda, nem poderia outra ser sua
diretriz, manda que toda a intervenção do mui Digno Juízo de dê “sempre com o intuito de protegê-
lo” : inexiste alternativa, nesta questão de protegê-lo senão a de tutelar seu interesse legítimo,
legal, jurídico e vivencial de retira-lo da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, espaço de
contenção patentemente incompatível com sua condição de interditando que nada deve à Justiça
Penal.
Sob este prisma protetivo, inviabiliza-se, até mesmo, de plano e principalmente, a
justificação sentencial do encarceramento provisório do requerente – “resguardar não só a
tranqüilidade social, mas também a pessoa do interditando” -, à medida que tal expediente
repressor, por sua franca desarmonia com a lei posta e dado o longo tempo decorrido, desfigura-se
num estro de inidoneidade jurídica, consoante se depreende da advertência isenta do juspublicista
Eberhard Schmidt:
“Una acción es correcta jurídicamente cuando constituye un medio proporcionado, correcto,
irreprochable para la consecución de un fin recto. A la inversa, ninguna acción, ni siquiera del
legislador, puede ser correcta jurídicamente si se propone conseguir un fin correcto con medios
desproporcionados o incorrectos” (“La Ley y los Jueces – Valores Positivos y Negativos del
Positivismo”, artigo inserto na coletânea “Derecho Injusto y Derecho Nulo”, pgs. 57 e 58).

Por tanto, sendo aquele expediente repressor um meio juridicamente inidôneo – ou


‘incorrecto’, como disse Schmidt -, não pode prestar-se, nem sustentar, validamente a nenhum fim,
seja este o fim superior do patrocínio da tranqüilidade social, seja este o fim instrumental da espera
de uma vaga hospitalar, seja este o fim ambíguo de proteção do próprio requerente.
Todos os fins e todos os meios, enfim, toda e qualquer experiência jurídica
emanada do Poder Público, para convalidar-se perante o ordenamento jurídico, deve assentar-se –
sempre – na lei e não pode – sob nenhum pretexto – ultrapassar-lhe os limites, vedando-se um ato
tomado por impulsos de outra natureza, pois, como lembra o hoje tão lembrado Norberto Bobbio:
“O Estado não pode colocar-se no mesmo plano do indivíduo singular. O indivíduo age por raiva,
por paixão, por interesse, em defesa própria. O Estado responde de modo mediato, reflexivo,
racional” (in “A Era dos Direitos”, pg. 176).

Por incrível que pareça – e não é incrível, por estar acontecendo -, a atual situação
em que lançaram o requerente, para além de não estar a protegê-lo, está, em autêntica inversão à
imagem e ao sentido que o processo interditório dedica à pessoa do interditando, está a prejudicá-
lo asperamente, posto o desmedido encarceramento a que o submetem.
Aliás, encarcerado com frieza, é de ver-se que este encarceramento provisório na
Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, pela forma como o concebeu a sentença, nunca
findará, porque seu término está subordinado a uma exigência imprevisivelmente inviável.
Formule-se com clareza a tese:
Tendo a decisão fixado que o encarceramento provisório deve subsistir até efetuar-
se a remoção para hospital psiquiátrico fechado, ela, nesta parte, caracteriza-se como sentença
condicional: “aquela cuja eficácia depende de evento futuro e incerto determinado na própria
sentença” (Carnelutti).
Dizendo-se a mesma coisa por intermédio de uma frase que melhor exprima a
condição, assim pode ser entendida a sentença: o direito à desinternação do requerente da Casa
de Custódia e Tratamento de Taubaté está sujeito à condição de encontrar-se um hospital
psiquiátrico fechado que o receba.
Trata-se, então, de uma desinternação dependente de uma condição suspensiva,
ou seja, o direito à desinternação somente surgirá, se a vaga hospitalar fechada surgir, porquanto
“o direito condicional não se adquire enquanto a condição estiver pendente”, de vez que “o titular
do direito condicional não possui, por outras palavras, direito atual” (Orlando Gomes, in “Introdução
ao Direito Civil”, pg. 408), acenando-se-lhe apenas uma ‘expectativa de direito’.
Entretanto, dado que a condição suspensiva estabelecida na sentença, em face da
negativa generalizada do universo hospitalar fechado em acolher o requerente, jamais será
implementada, conclui-se que a sentença estabeleceu uma condição tipicamente ilegal: seja
porque a condição estabelecida apresenta-se materialmente impossível, mesmo que esta
impossibilidade tenha sobrevindo após a constituição do ato (a sentença), espécie condicional
ilícita, segundo o art. 116 do Código Civil; seja porque, e quando menos, a condição estabelecida
priva de todo efeito o ato (sentença), espécie condicional defesa por lei, consoante o art. 115,
segunda parte, do Código Civil.
Destarte, por suas falhas intrínsecas, esta condição, como requisito prévio ao
desencarceramento da Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté, não pode sobreviver, tendo-se
ela por não escrita ou inexistente, a culminar em que, sem a condição aposta, o
desencarceramento do requerente deve ser imediato.
Sob outro patamar, descobre-se que tanto tempo de encarceramento passou que o
Decreto nº 24.559/34, embasante da obrigatoriedade da internação do requerente em hospital
fechado (art. 10), foi, em boa hora e após muitas batalhas, revogado pelo diploma superveniente, a
lei nº 10.216, de 6 de abril de 2.001.
Acerca desta troca de leis, que, mais que mera mudança legislativa, reverteu
completamente o pólo de atuação do internamento psiquiátrico, para, ao invés de, conforme a
antiga lei, privilegiar o caráter opressivo e repressivo da internação, com a nova lei, resguardar em
toda a sua plenitude os direitos invioláveis do interno, ouça-se o discurso de especialistas, para
bem compreender a gênese e o espírito da reforma recentemente empreendida.
Em 1.991, repudiando o Decreto nº 24.559/34, escrevia o Conselheiro Tarcísio de Almeida
Pimentel, do Conselho Federal de Medicina, ao exarar parecer sobre o primitivo projeto de lei que,
alquebrado por andanças diversas e enfeitado por danças, redundou na lei nº 10.216/01:
“A legislação Psiquiátrica Brasileira em vigor data de 1934, quando foi editada através do Decreto
nº 24559, que dispõe sobre a assistência e proteção à pessoa e aos bens de psicopatas.”
”Esta é uma legislação antiquada, e se assemelha à legislação congênere da Europa do
século passado, que era centrado no isolamento e segregação dos doentes mentais e instituições
fechadas – os manicômios.”
“Referido Decreto veio somente referendar seqüestro de doentes mentais ou ‘suspeitos’ de
doença mental e conseqüentemente, a cessão de seus direitos civis submetendo-os a tutela do
Estado.”
”Comparando-se a situação brasileira a de países como EUA, Canadá e vários países
europeus, podemos dizer que a presença dessa legislação nos dias de hoje torna-se ainda mais
violenta e fere os direitos individuais do doente mental.”
“......”
“O Projeto de Lei nº 3.657/89, ora em tramitação no Senado federal, que dispõe da extinção
progressiva dos manicômios e sua substituição por outros recursos assistenciais, e regulamenta a
internação psiquiátrica compulsória, em sendo aprovado vem a recuperar o tempo perdido pelas
políticas de Saúde Mental atrasadas, ineficazes e repressoras, colocando nosso país no compasso
da modernidade institucional requerida nesta década final do século XX. Além disso, resgata os
direitos civis, sociais e políticos de seus concidadãos excluídos da vida social pelo aparato
repressivo constituído pelos manicômios, que são condenados há décadas pela experiência
acumulada nas áreas técnicas e humanísticas” (Processo Consulta nº 201/91 – CFM (14/91) –
parecer aprovado em sessão plenária de 14/06/91).

Por sua vez, em vigoroso comentário aos avanços da nova lei, assim manifestou-se o Dr. Pedro
Gabriel Godinho Delgado, psiquiatra, professor da UFRJ, e coordenador de Saúde Mental do
Ministério da Saúde:
“A lei 10.216 está no oposto diametral de sua antecessora de triste memória, o decreto 24.559, de
3 de julho de 1934. Nascido num período sombrio, o ambiente de ovo da serpente que antecedeu
a ditadura de 1937, o velho decreto que ainda nos regia, ancorava-se na defesa social e na
concepção da negatividade absoluta da experiência da loucura. Longo, pleno de minúcias que
buscavam antecipar todo o imprevisto da conduta humana, sinuoso, sombrio, tornava o psiquiatra
o funcionário privilegiado de um Estado tutelar e repressor. O louco – perigoso e incapaz – deveria
ser protegido nos espaços de confinamento chancelados pela ciência, e o psiquiatra era destituído
de seu mandato terapêutico, erigido em guardião dosossego e da ordem. Claro que a norma legal
de 1934 tinha eficácia esporádica e poucos psiquiatras de fato a conhecem. Mas sua derrogação
pela lei da reforma psiquiátrica é o símbolo de um novo momento. A lei 10.216 articula
eloqüentemente a nobreza da tarefa do tratamento com os direitos do paciente. Ela completa a
agenda da redemocratização, ao colocar no centro da política pública de saúde mental a liberdade
e os direitos.”
“.......”
“A lei 10.216 tem vários outros dispositivos, todos na direção dos direitos do paciente, da
autonomia e centralidade do cuidado, do atendimento comunitário e extra-hospitalar, da
reintegração social dos pacientes há longos anos segregados em instituições asilares. É um
momento importante na história da psiquiatria brasileira, ...” (“Democratização do Atendimento” –
artigo by Internet).

Pois bem, a lei nº 10.216/01, dentre outras salutares novidades, encerrou


definitivamente a fase da divisão dos hospitais psiquiátricos, quanto ao regime de contenção, em
abertos, fechados e mistos, prevista no art. 7º do defunto decreto, e com base no qual pretendia-se
enclausurar o requerente num hospital psiquiátrico fechado.
Despreocupada do nível de contenção hospitalar e preocupada em vedar o
internamento em instituições com características asilares (art. 4º, § 3º) – aquelas instituições
carecentes de capacidade e de empenho na promoção de um efetivo amparo integral e que não
assegurem ao paciente os direitos elencados no art. 2º, parágrafo único -, a lei nº 10.216/01 realça,
com primazia absoluta e a que todos os demais interesses secundarizam-se, que o tratamento
internativo será prestado em estabelecimentos de saúde mental, “assim entendidas as instituições
ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais” (art. 3º,
‘in fine’).
Deste modo, e apegando-se à lei vigente, ao invés de se ficar, ‘ad aeternum’, no
aguardo de uma vaga em hospital psiquiátrico fechado – uma espécie hoje legal e legitimamente
extinta -, cabe a esse mui Digno Juízo adequar o conteúdo da sentença à nova e progressista
realidade institucional do internamento psiquiátrico, com a expedição de ordem judicial,
determinando a transferência, de imediato, do requerente para um estabelecimento de saúde
mental, sem distinção do regime de contenção, que lhe ofereça assistência em saúde mental: “se
estou doente, cure-me !”
À margem de tudo isso, considere-se que a internação determinada pela Justiça, chamada de
internação compulsória, é uma das formas arroladas na lei nº 10.216/01:
“Art. 6º - A internação psiquiátrica será realizada mediante laudo médico circunstanciado que
caracterize os seus motivos.”
“Parágrafo único – São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica:”
“I – internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário;”
“II – internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de
terceiro; e”
“III – internação compulsória: aquela determinada pela Justiça.”

Para que a lei, nas hipóteses de internação compulsória, forre-se de eficácia e


efetividade, deve ter-se em conta que a compulsoriedade ali inscrita compõe-se de duas mãos
entrelaçadas: não somente significa que o paciente não pode furtar-se à internação, ou seja, está
obrigado a ser, mesmo contra sua vontade, internado (= é forçado a ser internado), como também
significa que todo e qualquer hospital psiquiátrico da rede pública – à evidente excepção de
estabelecimentos de saúde mental destinados a transtornos mentais específicos – não pode furtar-
se à internação, ou seja, está obrigado a receber o paciente para internamento (= é forçado a
interná-lo), porque, além de ser “responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de
saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos
mentais, ... , a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental” (art. 3º) e além de uma
determinação judicial, em princípio, não pode ser descumprida nem discutida, além de tudo isso,
ter-se-á o contra-senso de a compulsoriedade escapar do comando judicial, para ficar sob o
controle da psiquiatria ou da administração hospitalar – que se tornarão, para usar a arguta
expressão de Michel Foucault, verdadeiros ‘juízes paralelos’ da internação – ou, em hipótese
extrema, ter-se-á que não se terá o internamento compulsório pela recusa generalizada dos
estabelecimentos de saúde mental em receber o interno compulsório ...
Tamanho e semelhante disparate somente encontraria comparação se se imaginar
uma história em que o Poder Judiciário manda prender Fulano ou Cicrano, cuja prisão inviabiliza-
se em razão de as autoridades policiais e/ou penitenciárias negarem-se, sob este ou aquele
pretexto, a aceitar o dito cidadão em ‘sua’ cadeia ou em ‘seu’ presídio.
Dá para crer?
Aliás, sobre a omissão do Estado em prover a internação dos interditados civis,
atente-se à declaração insuspeitíssima, com ilustração exatamente no drama do requerente, do
decano do Tribunal de Justiça paulista, o Desembargador Sérgio Augusto Nigro Conceição:
“O Estado deve providenciar local adequado para tratamento dos casos de interdição, sob pena de
institucionalizar a prisão perpétua no País” (entrevista ao ‘Diário Popular’, de 13/02/00 – matéria:
“Prisão Perpétua – Justiça descobre como impedir Condenado Perigoso de Sair da Cadeia”, de
Fábio Diamante).

Portanto, tratando-se, para o requerente, de uma interdição compulsória, compete


a esse mui Digno Juízo, pondo cobro a esta situação de indefinição e de ilegalidade, indicar, neste
momento, um estabelecimento de saúde mental da rede pública para, compulsoriamente, recebê-
lo, sob pena de, recusando-se a direção hospitalar na aceitação, incidir no crime de desobediência.
Alfim, materializado que o encarceramento do requerente – enquanto não se
relaciona a nenhum delito e enquanto distancia-se cada vez mais do perímetro da provisoriedade –
está a extrapolar, de muito e muito, o convinhável e justo comedimento temporal, avizinha-se, ao
avesso do direito, a ameaça real da perpetuidade prisional, em inexorável jornada para a
eternização, de modo a joga-lo no abismo do vazio social e existencial, o nada, o nada de que nos
fala a filosofia:
“A marcha progressiva para o nada, o processo lento (ou violento) de niilificação de mim mesmo,
posso bem percebê-lo e até acompanhá-lo nas suas etapas, no momento em que ocorrer. Poderei
pressentir o nada que se aproxima, quando numerosos atributos da minha pessoa, que antes se
afirmavam com vigor, tendem para o nada, ou em nada de convertem, por decadência física ou
moral. Nunca, porém, chego a ter consciência de havê-lo atingido; pois, quando o processo
niilificador chegasse à etapa final, eu já não seria mais nada para presenciá-lo” (Almir de Andrade,
em “As Duas Faces do Tempo”, pg. 133).

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Trazido este escrito, longo pela complexidade e relevância do assunto, em favor e


por solicitação de Francisco Costa Rocha, requer-se, em seu nome e em derradeiro rogo, que lhe
seja ultimada, independentemente de novas consultas prévias e sem mais tardanças, a
transferência para um estabelecimento de saúde mental da rede pública, cessando-se seu ilegal
encarceramento na Casa de Custódia e Tratamento de Taubaté.

Nestes Termos,
Pede Deferimento.

Em Taubaté, aos 23 de julho de 2.002.

Francisco Costa Rocha


Requerente

Rui Carlos Machado Alvim


Procurador do Estado
OAB/SP 29.328
Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 2ª Vara da Comarca de Paraguaçu Paulista

MANDADO DE SEGURANÇA
Autos nº 871/02
Impetrante: COPA COMERCIAL PARAGUAÇUENSE DE AUTOMÓVEIS LTDA.
Impetrado: CHEFE DO POSTO FISCAL DE PARAGUAÇU PAULISTA

A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por seu Procurador que esta


subscreve, nos autos do mandado de segurança em epígrafe, não se conformando, data venia, com
a r. sentença proferida às fls. 1.013/1.028, a qual concedeu a segurança “para que a impetrante
transfira o crédito relativo ao valor pago a maior, em suas operações sujeitas ao sistema de
substituição tributária, em uma única parcela, sem obstáculos fiscais, corrigidos monetariamente
pela variação da Ufesp, acrescidos de juros compensatórios de 1% ao mês, contados da data de
recolhimento a maior de ICMS, até 01.01.99, a partir de quando deverá incidir a Selic, até a data
da efetiva restituição”, vem respeitosamente à presença de V. Exa., com fulcro no art. 513 e ss. do
Código de Processo Civil, interpor o presente recurso de APELAÇÃO, em face das razões
aduzidas em anexo, requerendo, pois, seja devidamente recebido e processado até final remessa ao
E. Tribunal de Justiça-Seção de Direito Público para apreciação e provimento.

Termos em que,
P. Deferimento.

Paraguaçu Paulista, 18 de março de 2003.

Thiago Pucci Bego


Procurador do Estado
OAB/SP 153.530

Apelante: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO


Apelada: COPA COMERCIAL PARAGUAÇUENSE DE AUTOMÓVEIS LTDA.

Impetrado: CHEFE DO POSTO FISCAL DE PARAGUAÇU PAULISTA


MANDADO DE SEGURANÇA
Autos nº 871/02
2ª Vara da Comarca de Paraguaçu Paulista

RAZÕES DA APELAÇÃO

EGRÉGIO TRIBUNAL
COLENDA CÂMARA

Copa Comercial Paraguaçuense de Automóveis Ltda., revendedora de


veículos autorizada da Volkswagen, impetrou mandado de segurança contra suposta ameaça de
prática de ato ilegal pelo Chefe do Posto Fiscal Estadual de Paraguaçu Paulista, pleiteando a
concessão de ordem para que a autoridade impetrada se abstenha de promover qualquer medida
restritiva ao seu direito de utilizar, de forma imediata, os valores recolhidos excessivamente a
título de ICMS, apurados por sua conta e risco, desde o início dos recolhimentos em excesso,
corrigidos monetariamente pela variação da Ufesp, acrescidos de juros compensatórios de 1% ao
mês, contados das datas dos recolhimentos a maiores do tributo, até 01.01.99, a partir de quando
deverá incidir a Selic, até a data da efetiva restituição, transferindo-os a qualquer dos
estabelecimentos das suas substitutas tributárias, sem as restrições constantes dos decretos
estaduais em vigor.
Aduz, a impetrante, em apertada síntese, que, sujeitando-se ao regime de
substituição tributária e realizando vendas de veículos novos aos consumidores por valores
inferiores àqueles utilizados como bases de cálculo do ICMS, antecipadamente recolhido pela
montadora e importadora (substitutas tributárias) quando das saídas das mercadorias dos seus
estabelecimentos, é, nos termos do preceito do art. 150, § 7º, da Constituição Federal, titular de
direito líquido e certo à imediata e preferencial restituição, mediante transferência dos valores às
substitutas tributárias, do ICMS excessivamente arrecadado.
A segurança foi liminarmente concedida, porém seus efeitos foram sustados
pelo preclaro Presidente do Tribunal de Justiça, Desembargador Sérgio Augusto Nigro Conceição,
até que a presente apelação seja apreciada.
A r. sentença confirmou a concessão da ordem para que a impetrante
“transfira o crédito relativo ao valor pago a maior, em suas operações sujeitas ao sistema de
substituição tributária, em uma única PARCELA, sem obstáculos fiscais, corrigidos
monetariamente pela variação da UFESP, acrescidos de juros compensatórios de 1% ao mês,
contados da data de recolhimento a maior de ICMS, até 01.01.99, a partir de quando deverá incidir
a SELIC, até a data da efetiva restituição”.

Tal decisão de Primeiro Grau deve ser reformada pelas seguintes razões.

PRELIMINARMENTE.
Conforme se verifica do teor de fls. 452/518, a apelada, em julho de 1998, impetrou mandado de
segurança – o qual ainda não foi definitivamente apreciado, posto estar pendente ainda de decisão
recurso especial apresentado por ela – que versa sobre o mesmo objeto do presente processo.
O processo precedente foi extinto com fundamento no art. 267, inciso VI, do Código de Processo
Civil pela r. sentença de Primeiro Grau que reconheceu a carência do writ (fls. 507/512). Esse E.
Tribunal de Justiça, por sua 7ª Câmara de Direito Público de Férias “Julho/2001”, manteve a r.
decisão a quo, tendo asseverado o preclaro Desembargador Relator WALTER SWENSSON:
“Verifica-se, que o impetrante, busca através deste mandado de segurança denominado
preventivo, utilizá-lo como instrumento normativo, para regular condutas futuras e
incertas.
A segurança foi impetrada contra atos normativos em tese, visando obter efeitos
patrimoniais pretéritos, o que não se admite.
A autoridade apontada como coatora não praticou nenhum ato e nem é competente
para apreciar pedidos de restituição.
Como ensina o Prof. Hely Lopes Meirelles: “O mandado de segurança admite decisão
repressiva e preventiva (art. 1º). É repressiva quando visa corrigir ilegalidade já
consumada; é preventiva quando se destina a impedir o cometimento de ilegalidade
iminente. Em ambos os casos são necessárias as indicações do objeto e a comprovação
da iminência da lesão a direito subjetivo do impetrante. Não basta a invocação
genérica de uma remota possibilidade de ofensa a direito para autorizar a segurança
preventiva; exige-se prova da existência de atos ou situações atuais que evidenciam a
ameaça temida.
“Não se confunda, segurança preventiva com segurança normativa. O nosso sistema
judiciário admite aquela e rejeita esta.
“Segurança preventiva é a que se concede para impedir a consumação de uma ameaça
a direito individual em determinado caso; segurança normativa seria a que se
estabelecesse regra geral de conduta para casos futuros, indeterminados. A Justiça
Comum não dispõe do poder de fixar normas de conduta, nem lhe é permitido estender
a casos futuros a decisão proferida no caso presente, ainda que ocorra a mesma razão
de decidir em ambas as hipóteses. Embora se reitere a ilegalidade em casos idênticos,
haverá sempre necessidade de uma decisão para cada caso, sem que os efeitos da
sentença anterior se convertam em regra para as situações futuras” – Mandado de
Segurança e Ação Popular, 17ª edição, págs. 68 e 69 – Editora Malheiros.
Por outro lado, próprias da norma legal são a impessoalidade e a generalidade, além,
da abstração. Bem por isso, cristalizou-se, na jurisprudência, o entendimento, definido
na Súmula nº 266 do Pretório Excelso, o não cabimento de mandado de segurança
para atacar lei em tese ou suscitar provimento de efeito normativo.
O mandado de segurança não se constitui no meio apto para alcançar o fim almejado.
Nenhum reparo há que ser feito na r. sentença.” (AC nº 135.362.5/0).

Tenda em vista que nos dois mandados de segurança as partes são as mesmas,
o pedido é o mesmo e a causa de pedir é a mesma (inconstitucionalidade, ante o disposto no art.
150, § 7º, da Constituição Federal de 1988, das disposições da legislação paulista que tratam da
restituição, no regime da substituição tributária, de ICMS nas hipóteses de realização de operação
de circulação de mercadoria por valor inferior àquele utilizado como base de cálculo para fazer a
retenção do imposto), fica patente a caracterização de litispendência. Irrelevante o fato de ter sido
o primitivo processo extinto com base no art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, já que
ainda não ocorreu o trânsito em julgado da decisão em virtude da interposição de recurso especial
pela impetrante, cujo processamento já foi deferido por esse E. Tribunal como se infere dos
inclusos documentos, não sendo incabível cogitar-se da possibilidade do conhecimento do apelo
extraordinário com prolação de decisório que delibere sobre o mérito da causa.
Ademais, consoante prelecionam NELSON NERY JUNIOR e ROSA MARIA
ANDRADE NERY, “Como a sentença de extinção do processo sem julgamento do mérito (CPC
267) não faz coisa julgada material, a lide objeto daquele processo não foi julgada, razão pela qual
pode ser reproposta a ação. A repropositura não é admitida de forma automática, devendo
implementar-se o requisito faltante que ocasionou a extinção do processo. Por exemplo: processo
extinto por ilegitimidade de parte, somente admite repropositura, se sobrevier circunstância que
implemente essa condição da ação faltante no processo anterior. Do contrário, a repropositura pura
e simples, sem essa observância, acarretaria nova extinção do processo sem julgamento do mérito
por falta de interesse processual (CPC 267 VI).” (“Código de Processo Civil Comentado”, Editora
Revista dos Tribunais, 2ª edição, p. 681, nota 1 ao art. 268).
Assim sendo, considerando que a impetrante não sanou a irregularidade que
inviabilizou a apreciação do mérito no primeiro processo, irregularidade essa consistente na
impetração de segurança para atacar lei em tese que objetiva provimento de efeitos normativo, e
patrimonial em relação a período pretérito, impõe-se, aqui também, a extinção do feito sem
julgamento do mérito. Nem poderia ser diferente, sob pena de afronta às decisões judiciais:
imagine-se não se exigir do autor o implemento do requisito faltante para a repropositura de uma
ação; isso seria realmente dar guarida à instabilidade jurídica e à litigância desleal na medida em
que se propiciaria ao demandante a reiterada distribuição da mesma ação até que finalmente ela
fosse apreciada pelo mérito por um órgão jurisdicional, que, adotando entendimento diferente,
concluísse estarem presentes todas as condições de admissibilidade para a promoção do
julgamento com a resolução da lide apresentada.
Data venia, o Judiciário tem que fazer respeitar suas decisões, sendo certo
que, tendo sido anteriormente extinto um processo por ter se entendido que a impetração era
inadequada ao fim almejado, não se deve admitir a renovação da impetração sem a correção do
vício, anteriormente reconhecido, que inviabilizou a apreciação do mérito.

De outra parte, o mandado de segurança foi impetrado contra lei em tese, visto
que inexiste, in casu, ato concreto que possa pôr em risco o suposto direito da apelada.
Com efeito, não houve denegação de pedido administrativo de restituição, ou
recusa de aposição de visto em nota fiscal de ressarcimento, submetida à apreciação do Fisco, de
pretensos valores de ICMS recolhidos em excesso; sequer foram formulados requerimentos dessa
natureza.
Percebe-se, claramente, que os “atos” impugnados neste mandado de
segurança são os preceitos jurídicos constantes da legislação tributária paulista no que concerne à
regulamentação da restituição de ICMS no regime da substituição tributária.
Tais normas jurídicas estaduais, tachadas de inconstitucionais pela recorrida,
disciplinam as hipóteses e as modalidades de restituição de ICMS no sistema de substituição
tributária; porém, essas regras não foram ainda concretizadas, por qualquer autoridade fiscal,
diante dela, exatamente porque até o momento não houve a formulação de pedido administrativo
de restituição, tampouco a solicitação de aposição de visto em nota fiscal de ressarcimento,
conforme exige o art. 270 do RICMS (Decreto 45.490/00), na esteira do disposto no § 1º do art. 66-
B da Lei Estadual 6.374/89 e no § 1º do art. 10 da Lei Complementar Nacional 87/96.
Registre-se, ainda, que a autoridade apontada como coatora sequer tem
competência para apreciar requerimentos dessa espécie, o que induz a sua patente ilegitimidade
para responder à presente impetração.
Não se evidenciou, neste processo, a suposta ameaça a alegado direito da
apelada, já que sequer há indício de que o Fisco não deferiria pedido de restituição, ou recusaria
apor visto em nota fiscal de ressarcimento, de valores de ICMS, comprovadamente recolhidos em
excesso conforme dispõe o art. 66-B, inciso II, da Lei Paulista 6.374/89.
O objeto próprio do mandado de segurança é a invalidação de atos de
autoridades ofensivos de direito individual líquido e certo, o que inexiste na hipótese vertente.
O intento da apelada é outro, e não, como seria de rigor sob pena de carência
da ação especial, a sincera impugnação de efetiva e ilegal ameaça a direito líquido e certo de que
seria titular. Objetiva, na verdade, obter uma decisão judicial que lhe propicie a transferência de
‘créditos’ de ICMS inexistentes, em repreensível abuso - que causa danos ao Erário Público de
impossível ou difícil e incerta reparação, posteriormente – na utilização da segurança concedida.

O deferimento de ordem, nos moldes pleiteados, significa conferir à


impetrante, nas palavras do eminente Desembargador Vanderci Álvares, “um salvo conduto, ou
cheque em branco” (AC 049.846.5/7). De fato, a pretendida transferência imediata de ‘créditos’
de ICMS, de forma ampla, sem a comprovação de sua existência, efetividade e de seus valores no
processo e sem possibilitar ao Fisco o exame prévio, mostra-se não só desarrazoada, como
também temerária e de elevada potencialidade lesiva ao Erário Público.
A propósito, verifique-se à fl. 519 a nota fiscal de ressarcimento que a apelada emitiu, quando da
concessão da liminar, para a efetivação de transferência de ‘créditos’ de ICMS à substituta
Volkswagen do Brasil Ltda.; o valor consignado no documento fiscal de ressarcimento é de R$
4.498.439,45 (quatro milhões, quatrocentos e noventa e oito mil e quatrocentos e trinta e
nove reais e quarenta e cinco centavos).
Entretanto, segundo apurado pela Delegacia Regional Tributária de Marília, de junho de 1998
(mês a partir de que se poderia cogitar de ‘direito’ à restituição, já que do mês de maio de 1998
para trás a recorrida já havia feito o aproveitamento e a transferência de ‘créditos’ à substituta com
base em liminar concedida no processo anterior – mandado de segurança nº 1.317/98, 1ª Vara de
Paraguaçu Paulista) a maio de 2002 (mês da presente impetração), os valores totais de ICMS,
retidos pela Volkswagen por conta das operações sujeitas ao regime da substituição tributária
praticadas pela apelada, somaram R$ 1.378.053,62. Isto é, se ela – o que é inimaginável e,
portanto, insuscetível de aceitação – tivesse vendido aos consumidores todos os veículos pelos
mesmos preços pelos quais os adquiriu da montadora, ter-se-ia um suposto direito à restituição da
quantia especificada, qual seja, R$ 1.378.053,62. Estima-se, porém, que o conjeturado direito à
restituição não ultrapassaria 10% desse valor, percentual extraído de supostos descontos
concedidos quando da alienação dos automóveis.
Daí se vê o quão acertado foi o deferimento do pedido de suspensão dos
efeitos da segurança em questão até que essa C. Corte aprecie o mérito da causa. Impediu-se,
dessa forma, e imediatamente, uma lesão à Fazenda Estadual no importe de mais de R$
4.000.000,00, sendo oportuno obtemperar que a fiscalização, quando exercida posteriormente à
utilização e transferência do ‘crédito’, conforme pretendido pela apelada, não apresenta,
obviamente, a mesma eficiência que a prévia verificação e autorização pelo Fisco, não sendo rara
a ocorrência, após a concretização de tais milionárias transferências, do encerramento das
atividades da concessionária de veículos impetrante, com a dissipação de seu patrimônio, quando
então o Estado, inutilmente, lavra auto de infração e imposição de multa, promove o lançamento,
para reaver a exorbitante quantia indevidamente transferida à substituta, que a utilizou para pagar
seus tributos, quantia essa que proporcionou ao revendedor impetrante o recebimento de veículos
e peças no valor da nota fiscal de ressarcimento, que emitiu sem qualquer conferência pelo
Fisco.
Resulta a carência da ação, pois, também da circunstância de se estar
utilizando o mandado de segurança como substitutivo de demanda de cobrança (na espécie, de
ação de restituição de indébito), o que é inadmissível, como cediço.

Ademais, a segurança, como concedida, produz efeitos patrimoniais em


relação a período pretérito, já que não houve limitação, nesse sentido, na decisão de Primeira
Instância; ao contrário, o deferimento da ordem se deu de forma absolutamente ampla, parecendo
ter acolhido o pedido inicial quanto à determinação de restituição (mediante transferência à
substituta) dos valores recolhidos ‘em excesso’ desde o início de tais recolhimentos.
Ora, primeiro registre-se que os efeitos patrimoniais pretéritos devem ser pleiteados
administrativamente ou pela via judicial própria, nas quais, então, poder-se-á verificar a
procedência dos ‘créditos’ que se pretende aproveitar, bem como apurar seus exatos valores.
Segundo, deve-se atentar para o fato de que em julho de 1998 a apelada, ante a concessão de
liminar (cujos efeitos, infelizmente, não foram tempestivamente sustados) num mandado de
segurança, emitiu nota fiscal e transferiu à Volkswagen do Brasil Ltda. os supostos créditos
gerados até o mês de maio de 1998, de maneira que os eventuais excessos de ICMS recolhidos de
tal mês para trás não podem ser objeto da presente ordem sob pena de dupla utilização dos
mesmos.

Não bastasse, de se observar ainda que, no tocante aos meses de junho de 1997 para trás, já
ocorreu a decadência do pretenso direito à restituição, nos termos do disposto nos arts. 168 do
Código Tributário Nacional e 23, parágrafo único, da Lei Complementar 87/96; o prazo
decadencial é de cinco anos.
Verifique-se, ainda, que o art. 1º do Decreto nº 20.910, de 06 de janeiro de 1932, estatui que “As
dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou
ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em
5 (cinco) anos, contados da data do ato ou fato do qual se originaram.”

Por fim, a título de preliminar ainda, cabe ressaltar a absoluta ausência de certeza e liquidez a
ensejar a utilização da especial via do mandamus. Os fatos alegados – existência de recolhimentos
excessivos de ICMS – não foram comprovados neste feito; aliás, sequer se indicou, especificou,
como seria de rigor, os valores que se quer a restituição. A demonstração inequívoca da
legitimidade do montante que se pretende transferir à substituta tributária é imprescindível.
Neste processo, a impetrante ao menos se deu ao trabalho de anexar à inicial cópia de toda
documentação fiscal concernente ao período em relação ao qual pretende promover o creditamento
de ICMS e a imediata transferência de seu montante à montadora substituta.
Além disso, cumpre trazer à baila, mais uma vez, as ponderações feitas pela autoridade impetrada
nas informações que prestou ao juízo:
“Em qualquer deles deve haver prova da venda por preço inferior. As notas fiscais,
apesar de documento hábil para comprovar as operações mercantis, não se prestam,
por si só, como prova de que a venda foi por preço inferior. É possível(e quase rotina)
a emissão da nota fiscal por preço inferior ao preço da venda (os chamados
subfaturamentos).
Uma coisa, portanto, é vender o produto por preço inferior e outra, completamente
diferente, é emitir a nota por preço inferior. A simples posse da nota de venda não pode
ser admitida como inequívoca prova de venda por preço inferior, do mesmo modo que
a mera alegação de subfaturamento não pode ser tomada como prova do
subfaturamento.
Isto significa que ninguém, diante da singela apresentação das notas de compra e de
venda do veículo, estará habilitado a dizer se se trata de subfaturamento ou de efetiva
venda por preço inferior. Tal aferição somente é possível mediante verificações
complementares que estão a cargo da Fiscalização estadual. Se a Fiscalização
desconfia que houve subfaturamento, que diligencie e prove que de fato houve. Se o
contribuinte diz que vendeu por preço inferior, à Fazenda Pública, do mesmo que na
hipótese anterior, está reservado dever/poder de diligenciar e provar se assim o foi ou
não.
Uma vez que a emissão das notas fiscais é ato unilateral do contribuinte e que não
envolve nenhuma participação da Fazenda, faltando aquelas verificações teremos
apenas e tão somente mera alegação unilateral de venda por preço inferior, o que é
muito pouco para reconhecer um direito oponível ao Estado.”

Sem a prova pré-constituída do indébito tributário, constata-se a incerteza dos


fatos e, conseqüentemente, a iliquidez do direito alegado, donde ressai a manifesta carência do
mandado de segurança, o qual não se presta à ampla dilação probatória, como sobejamente sabido.
Nesse sentido já decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça:
“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. ICMS. COMPENSAÇÃO DO QUE FOI
PAGO A MAIOR EM REGIME DE SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA.
1. Para que haja possibilidade da empresa contribuinte do ICMS se valer da
regra do art. 23, § 1º, da LC 87/96, há que comprovar, de modo inequívoco, o
pagamento a maior do imposto.
2. O nosso ordenamento jurídico não aceita a possibilidade do mandado de
segurança normativo, isto é, o que estabelece regra geral de conduta, para casos
futuros, indeterminados, conforme a lição de Hely Lopes Meirelles.
3. A restituição de tributo oriunda de diferenças monetárias entre o valor do
fato gerador presumido e o efetivamente ocorrido, no regime de substituição
tributária, depende de prova inequívoca da ocorrência de tal fenômeno.
4. Impossível, quando inexiste tal prova, debater-se a respeito em sede de
mandado de segurança.
5. A via excepcional do writ não se adequa para viabilizar pedido de repetição
de indébito.
6. Recurso improvido.
(Recurso em Mandado de Segurança nº 9.693/MS, j. 13/04/2000).
Em resumo, o processo deve ser extinto sem julgamento do mérito: ante a
litispendência; ou em face da carência da ação pela ilegitimidade passiva da autoridade impetrada,
ou pela impossibilidade jurídica do pedido e ausência de interesse de agir (inadequação da via
processual eleita), seja porque não cabe mandado de segurança contra lei em tese (Súmula 266 do
STF) ou porque ele não é substitutivo de ação de cobrança, nem de repetição de indébito (Súmula
269 do STF), seja porque a concessão de segurança não pode produzir efeitos patrimoniais em
relação a período pretérito (Súmula 271 do STF), ou, finalmente, porquanto não há certeza e
liquidez dos fatos constitutivos do pretenso direito diante da inexistência de prova documental
inequívoca nos autos. Ad argumentandum, caso assim não se delibere, deverá ser reconhecida a
decadência no tocante a eventuais valores de ICMS recolhidos em ‘excesso’ de junho de 1997 para
trás.

MÉRITO.
Inicialmente, de se afirmar que só há direito constitucional, nos termos do art.
150, § 7º, da Carta Magna, à imediata e preferencial restituição de valor de ICMS pago por força
da substituição tributária, quando o fato gerador não ocorre, inexistindo-o na excepcional
hipótese de realização de operação de circulação de mercadoria por valor inferior àquele tomado
como base de cálculo para o recolhimento antecipado do tributo. O entendimento da Suprema
Corte, quanto à interpretação da aludida norma constitucional (art. 150, § 7º), já foi exarado por
seu Plenário quando do julgamento da ADI 1.851, nos seguintes termos:

EMENTA: “TRIBUTÁRIO. ICMS. SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA. CLÁUSULA


SEGUNDA DO CONVÊNIO 13/97 E §§ 6º E 7º DO ART. 498 DO DEC. Nº 35.245/91
(REDAÇÃO DO ART. 1º DO DEC. Nº 37.406/98), DO ESTADO DE ALAGOAS.
ALEGADA OFENSA AO § 7º DO ART. 150 DA CF (REDAÇÃO DA EC 3/93) E AO
DIREITO DE PETIÇÃO E DE ACESSO AO JUDICIÁRIO.
Convênio que objetivou prevenir guerra fiscal resultante de eventual concessão do
benefício tributário representado pela restituição do ICMS cobrado a maior quando a
operação final for de valor inferior ao do fato gerador presumido. Irrelevante que não
tenha sido subscrito por todos os Estados, se não se cuida de concessão de benefício
(LC 24/75, art. 2º, INC. 2º).
Impossibilidade de exame, nesta ação, do decreto, que tem natureza regulamentar.
A EC nº 03/93, ao introduzir no art. 150 da CF/88 o § 7º, aperfeiçoou o instituto, já
previsto em nosso sistema jurídico-tributário, ao delinear a figura do fato gerador
presumido e ao estabelecer a garantia de reembolso preferencial e imediato do tributo
pago quando não verificado o mesmo fato a final. A circunstância de ser presumido o
fato gerador não constitui óbice à exigência antecipada do tributo, dado tratar-se de
sistema instituído pela própria Constituição, encontrando-se regulamentado por lei
complementar que, para definir-lhe a base de cálculo, se valeu de critério de estimativa
que a aproxima o mais possível da realidade.
A lei complementar, por igual, definiu o aspecto temporal do fato gerador presumido
como sendo a saída da mercadoria do estabelecimento do contribuinte substituto, não
deixando margem para cogitar-se de momento diverso, no futuro, na conformidade,
aliás, do previsto no art. 114 do CTN, que tem o fato gerador da obrigação principal
como a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
O fato gerador presumido, por isso mesmo, não é provisório, mas definitivo, não dando
ensejo a restituição ou complementação do imposto pago, senão, no primeiro caso, na
hipótese de sua não-realização final.
Admitir o contrário valeria por despojar-se o instituto das vantagens que determinaram
a sua concepção e adoção, como a redução, a um só tempo, da máquina-fiscal e da
evasão fiscal a dimensões mínimas, propiciando, portanto, maior comodidade,
economia, eficiência e celeridade às atividades de tributação e arrecadação.
Ação conhecida apenas em parte e, nessa parte, julgada improcedente.”

Trechos do voto vencedor do MINISTRO RELATOR ILMAR GALVÃO:


“A LC nº 44/83, acrescentou o § 9º ao art. 2º e deu nova redação ao art. 6º e §§ 3º e 4º,
do DL nº 406/68, nestes termos:
“Art. 2º - A base de cálculo do imposto é:
(...)
§ 9º - Quando for atribuída a condição de responsável, ao industrial, ao comerciante
atacadista ou ao produtor, relativamente ao imposto devido pelo comerciante varejista,
a base de cálculo do imposto será:
a) ...
b) o valor da operação promovida pelo responsável, acrescida da margem de
lucro atribuída ao revendedor, no caso de mercadorias com preço de venda,
máximo ou único, marcado pelo fabricante ou fixado pela autoridade
competente.”

“Art. 6º ...
§ 3º - A lei estadual poderá atribuir a condição de responsável:
a) ao industrial, comerciante ou outra categoria dse contribuinte, quanto ao
imposto devido na operação ou operações anteriores promovidas com a
mercadoria ou seus insumos;
b) ao produtor industrial ou comerciante atacadista, quanto ao imposto
devido pelo comerciante varejista;
c) ao produtor ou industrial, quanto ao imposto devido pelo comerciante
atacadista e pelo comerciante varejista;
d) aos transportadores, depositários e demais encarregados da guarda ou
comercialização de mercadorias.
§ 4º - Caso o responsável e o contribuinte substituído estejam estabelecidos em Estados
diversos, a substituição dependerá de convênio entre os Estados interessados.”

Cuida-se de dispositivos por meio dos quais o legislador complementar, no exercício da


competência que lhe foi reservada pelo § 1º do art. 19 da Carta de 1967, em relação ao
antigo ICM, definiu os aspectos subjetivos (contribuintes e seus substitutos), objetivos
(fatos geradores) e de dimensionamento (base de cálculo e alíquota), estabelecendo
regras gerais que, por razões de conveniência, contemplaram a substituição tributária
em ambos os sentidos, seja quanto às operações anteriores (art. 6º, § 3º, a), seja em
relação às subseqüentes (id., id, b, c e d).
De registrar que os dispositivos transcritos não disciplinam a restituição do imposto
recolhido, no caso de não-realização do fato gerador, impondo-se a ilação de que a
restituição deveria operar pelos meios regulares de restituição de tributos (arts. 165/170
do CTN).
Na verdade, a Carta de 1967 e a EC 01/69 não previam, de maneira específica, esse
requisito, o mesmo ocorrendo com a Constituição de 1988 (art. 155, § 2º, XII, b). O
STF, de outra parte, jamais condicionou a legitimidade da antecipação do fato gerador
do ICM, hoje ICMS, à previsão legal da cláusula da restituição.
A Constituição de 1988, em sua redação original, limitou-se a reservar à lei
complementar, de modo específico, a disciplina da substituição tributária do ICMS (art.
156, § 2º, XII, b), sem especificar as duas modalidades (progressiva e regressiva), com
o que, a rigor, recepcionou, no ponto, o DL nº 406/68.
A matéria teve de ser regulamentada pelo Convênio ICM 66/88 (art. 25, II), ante a
norma do art. 34, § 8º, do ADCT/88, para nela fazer abranger o produtor e gerador de
energia e o prestador de serviço, em face da expansão da base material de incidência do
tributo que, a partir da Carta de 88, passou a abranger a energia elétrica e a prestação de
serviços de transporte, além dos serviços de telecomunicações.
Com base nos referidos dispositivos, ao atualizarem os estados os seus códigos
tributários ou ao editarem novos, mantiveram obviamente o instituto, adaptando-os aos
dizeres introduzidos pelo mencionado Convênio ICM 66/88, fazendo, v.g., o Estado do
Rio de Janeiro, por meio da Lei nº 1.423/89 e o Estado de São Paulo, pela Lei nº
6.374/89.
A matéria acabou contemplada na EC nº 3/93, que introduziu, no art. 150 da CF/88, o §
7º, segundo o qual:

“§ 7º - A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de


responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva
ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia
paga, caso não se realize o fato gerador presumido.”

O dispositivo, indubitavelmente, não criou a substituição tributária progressiva, visto


que já integrava o sistema tributário, havendo inovado, entretanto, primeiramente, ao
instituir o fato gerador presumido e, depois, ao estabelecer a garantia de reembolso
preferencial e imediato do tributo pago quando não se tiver ele realizado. Ao autorizar a
atribuição a outrem da condição de responsável pelo pagamento de tributo cujo fato
gerador ainda não tenha ocorrido, na verdade, antecipou, o novo dispositivo, o
momento do surgimento da obrigação e, conseqüentemente, da verificação do fato
gerador que, por isso mesmo, definiu como presumido.
...
A referida LC 87/96, que veio em substituição ao DL nº 406/68, ditou regulamentação
bem mais detalhada do instituto da substituição tributária, relativa a operações
antecedentes e subseqüentes, nos arts. 6º, 8º e 10, havendo disciplinado, em caráter
especial, a restituição, deste modo:
“Art. 6º Lei estadual poderá atribuir a contribuinte do imposto ou a depositário a
qualquer título a responsabilidade pelo seu pagamento, hipótese em que o contribuinte
assumirá a condição de substituto tributário.
§ 1º A responsabilidade poderá ser atribuída em relação ao imposto incidente sobre
uma ou mais operações ou prestações, sejam antecedentes, concomitantes ou
subseqüentes ...
(...)
Art. 8º A base de cálculo, para fins de substituição tributária, será:
I - em relação às operações ou prestações antecedentes ou concomitantes, o valor da
operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído;
II - em relação às operações ou prestações subseqüentes, obtida pelo somatório das
parcelas seguintes:
a) o valor da operação ou prestação própria realizada pelo substituto tributário ou
pelo substituído intermediário;
b) o montante dos valores de seguro, de frete e de outros encargos cobrados ou
transferíveis aos adquirentes ou tomadores de serviço;
c) a margem de valor agregado, inclusive lucro, relativa às operações ou prestações
subseqüentes.
§ 1º Na hipótese de responsabilidade tributária em relação às operações ou prestações
antecedentes, o imposto devido pelas referidas operações ou prestações será pago pelo
responsável, quando:
I - da entrada ou recebimento da mercadoria ou do serviço;
II - da saída subseqüente por ele promovida, ainda que isenta ou não tributada;
III - ocorrer qualquer saída ou evento que impossibilite a ocorrência do fato
determinante do pagamento do imposto.
§ 2º Tratando-se de mercadoria ou serviço cujo preço final a consumidor, único ou
máximo, seja fixado por órgão público competente, a base de cálculo do imposto, para
fins de substituição tributária, é o referido preço por ele estabelecido.
§ 3º Existindo preço final a consumidor sugerido pelo fabricante ou importador,
poderá a lei estabelecer como base de cálculo este preço.
§ 4º A margem a que se refere a alínea c do inciso II do caput será estabelecida com
base em preços usualmente praticados no mercado considerado, obtidos por
levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e outros elementos
fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média
ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em
lei. (que, desse modo, passou a constituir elemento essencial da substituição tributária
progressiva).
(...)
Art. 10. É assegurado ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor do
imposto pago por força da substituição tributária, correspondente ao fato gerador
presumido que não se realizar.
§ 1º Formulado o pedido de restituição e não havendo deliberação no prazo de noventa
dias, o contribuinte substituído poderá se creditar, em sua escrita fiscal, do valor
objeto do pedido, devidamente atualizado segundo os mesmos critérios aplicáveis ao
tributo.
§ 2º Na hipótese do parágrafo anterior, sobrevindo decisão contrária irrecorrível, o
contribuinte substituído, no prazo de quinze dias da respectiva notificação, procederá
ao estorno dos créditos lançados, também devidamente atualizados, com o pagamento
dos acréscimos legais.”

Nos dizeres de Alfredo Becker,

“...a criação do substituto legal tributário tanto é um fenômeno jurídico perfeitamente


normal quanto é um processo técnico de criação do direito utilizado com muito mais
freqüência do que se imagina em todos os demais ramos do direito. O sujeito passivo
da relação jurídica tributária, normalmente, deveria ser aquela determinada pessoa de
cuja renda ou capital a hipótese de incidência é um fato-signo presuntivo. Entretanto,
freqüentemente, colocar esta pessoa no pólo negativo da relação jurídica tributária é
impraticável ou simplesmente criará maiores ou menores dificuldades para
nascimento, vida e extinção destas relações. Por isso, nestas oportunidades, o
legislador como solução emprega uma outra pessoa em lugar daquela e, toda a vez que
utiliza esta outra pessoa, cria o substituto legal tributário.” (op. cit., p. 553).

Na substituição tributária regressiva, ou para trás, esse ressarcimento opera abatendo-


se do preço a ser pago ao fornecedor do produto tributado o valor correspondente ao
tributo devido, que deve ser calculado tomando-se por base o valor da operação,
conforme previsto no art. 8º, I, da LC nº 87/96.
Trata-se de medida que se mostra adequada às hipóteses de operações efetuadas por um
número consideravelmente grande de fornecedores, tendo por objeto, de ordinário,
produtos primários, de origem agro-pecuária, como leite, cana-de-açúcar, laranja, látex,
etc., fornecidos a indústrias de transformação.
Graças ao instituto da substituição, o tributo, em vez de ser exigido de centenas ou de
milhares de produtores, é recolhido por um só contribuinte, possibilitando uma
fiscalização mais simples e eficaz, capaz de evitar a sonegação. Tem por efeito o
diferimento do imposto, calculado em razão de pressuposto material já verificado.
O substituído, aí, é geralmente aquele que não é inscrito como contribuinte, que não
mantém escrita contábil relativa ao ICMS, o qual, por isso mesmo, não tem como
compensar o imposto, que é deduzido do preço dos bens vendidos, com os créditos
relativos a insumos incorporados ao processo produtivo. Arca ele, portanto, com o
tributo relativo à entrada dos insumos e com o devido pela saída dos bens produzidos.
Justamente diante dessa evidência é que a substituição tributária regressiva é de ser
considerada como uma opção para aqueles contribuintes capazes de manter registro
regular de seu movimento operacional e, conseqüentemente, de efetuar a compensação
débitos/créditos, própria do ICMS, que suavizará sua carga tributária.
A substituição progressiva, ou para frente, que alguns acham ser instituição recente,
posto prevista em nossa legislação pelo menos desde 1968 – repita-se – contrariamente
à regressiva, tem por contribuintes substituídos, por sua vez, uma infinidade de
revendedores do produto, circunstância que dificultaria e oneraria, de maneira
acentuada, a fiscalização. Sua prática impede a sonegação sem prejudicar a garantia do
crédito tributário, visto que o tributo pelas operações subseqüentes, até a transferência
da mercadoria ao consumidor final, é recolhido sobre o valor agregado.
Nessa espécie, em vez do diferimento, o que ocorre é a antecipação do fato gerador e,
conseqüentemente, do tributo, que é calculado sobre uma base de cálculo estimada.
...
Trata-se de regime a que, na prática, somente são submetidos produtos com preço de
revenda final previamente fixado pelo fabricante ou importador, como é o caso de
veículos e cigarros; ou tabelados pelo Governo, como acontecia até recentemente com
os combustíveis, e como acontece com a energia elétrica etc.; razão pela qual só
eventualmente poderão verificar-se excessos de tributação.
Por derradeiro, não é difícil demonstrar que o fato gerador presumido não constitui
óbice à exigência antecipada do tributo.
Em primeiro lugar, porque foi instituído pela própria Constituição, havendo sido
regulamentado, como se viu, por lei complementar que lhe definiu a base de cálculo.
Ao fazê-lo, cuidou o legislador de prefixar uma base de cálculo cuja estimativa se
aproxime o mais possível da realidade, ajustando o respectivo valor às leis do mercado,
para não onerar o contribuinte e tampouco prejudicar o Fisco.
Aliás, a LC nº 87/96 não apenas definiu o modo de apuração da base de cálculo na
substituição tributária progressiva, mas também o aspecto temporal do fato gerador
presumido, consubstanciado, obviamente, na saída da mercadoria do estabelecimento
do contribuinte substituto, não havendo cogitar, pois, de outro momento, no futuro, para
configuração do elemento. A providência não é de causar espécie, porquanto, na
conformidade do disposto no art. 114 do CTN, fato gerador da obrigação principal é a
situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
Em segundo lugar, porque, conforme observa Marco Aurélio Greco (in “Substituição
Tributária”, IOB, p. 40 e segs.), a visão tradicional de que a existência da tributação está
centralizada na obrigação e esta não existe enquanto não ocorrido o fato gerador,
desconsidera uma característica ínsita ao fenômeno jurídico que é a de serem as normas
produto de atos de vontade em que se agregam elementos que serão válidos desde que
não contrariem a Constituição; e que esta atribui competência em matéria tributária que
comporta todos os modelos operacionais que não contrariem a sua essência, nem o
conjunto de princípios do sistema de garantias asseguradas ao contribuinte, consistindo
o desafio em encontra-se o ponto de equilíbrio entre, de um lado, a simplificação para a
melhoria das arrecadação e, de outro, a proteção do patrimônio e as garantias do
contribuinte.
A substituição tributária, portanto, resultou de uma opção legislativa, que elegeu como
tributável uma fase preliminar da exteriorização de um dado fenômeno econômico, ou
jurídico, que compõe a materialidade da competência tributária prevista, para fim de
exigir o respectivo recolhimento, antecipando as conseqüências que, no modelo
tradicional, só seriam deflagradas depois da ocorrência do próprio fenômeno.
A escolha da fase preliminar resulta, assim, de opção legislativa, mas não é arbitrária,
porque só tem cabimento se o evento assim considerado atender ao requisito da
necessidade em relação ao evento final (inexistindo este inexistirá o fato gerador); se o
referido evento já apresenta elementos que permitem prever com certo grau de certeza o
evento final (fato gerador); e se a dimensão pecuniária imposta no momento da
antecipação é proporcional à dimensão final que resultará da ocorrência do fato
tributável.
Essas, em resumo, as lições de Marco Aurélio Greco, para quem não há
incompatibilidade constitucional na figura examinada.

“... Ao revés” – concluiu ele -, “a mais moderna doutrina do Direito Tributário


nacional e estrangeiro sustenta sua validade. As dificuldades que sua interpretação e
análise ensejam, ao invés de conduzirem a inconstitucionalidade, propõem, isto sim, um
desafio para todos os aplicadores do Direito tributário, qual seja o de identificar os
seus contornos e limites em função das peculiaridades de cada tributo e realidade
econômica ou jurídica por ele atingida” (op. cit., os. 44/45).

Desnecessária muita agudeza de raciocínio, para perceber, v.g., que a entrega de


veículos novos, feita pela montadora a suas revendedoras autorizadas, atende aos três
requisitos que, segundo a lição transcrita, são exigidos para configuração da
compatibilidade e adequação entre a substituição, como modelo de exigência do tributo,
e o respectivo pressuposto de fato, em face da Constituição.
Com efeito, trata-se de fato econômico que constitui verdadeira etapa preliminar do fato
tributável (a venda do veículo ao consumidor), que o tem por pressuposto necessário;
fato esse que, por sua vez, é possível prever, com quase absoluta margem de segurança,
uma vez que nenhum outro destino, a rigor, pode estar reservado aos veículos que saem
dos pátios das montadoras com destino às distribuidoras, senão a revenda aos
adquirentes finais; sendo, por fim, perfeitamente previsível, porque objeto de tabela
fornecida pelo fabricante, o preço a ser exigido na operação final, circunstância que
concorre para a eliminação de excessos tributários.
O que se tem, na antecipação da ocorrência do fato gerador, no dizer de Sampaio Doria
(em discurso acerca do imposto sobre a transmissão inter vivos de bens imóveis, in “Da
Lei Tributária no Tempo”, 1968, p. 205), é “opção válida do legislador que não faz
nascer o imposto de formalidade oca de significado substancial, nem de ato vazio de
conteúdo econômico”.
O fato gerador do ICMS e a respectiva base de cálculo, em regime de substituição
tributária, de outra parte, conquanto presumidos, não se revestem de caráter de
provisoriedade, sendo de ser considerados definitivos, salvo se, eventualmente, não vier
a realizar-se o fato gerador presumido. Assim, não há falar em tributo pago a maior,
ou a menor, em face do preço pago pelo consumidor final do produto ou do
serviço, para fim de compensação ou ressarcimento, quer de parte do Fisco, quer
de parte do contribuinte substituído. Se a base de cálculo é previamente definida
em lei, não resta nenhum interesse jurídico em apurar se correspondeu ela à
realidade.
Por isso mesmo, a salvaguarda estabelecida na Constituição em favor deste último,
representada pela imediata e preferencial restituição do valor do imposto pago (o
qual, na conformidade do art. 10, § 1º, da LC 87/96, deverá ocorrer em noventa
dias, sob pena de creditamento do respectivo valor, devidamente atualizado, em
sua escrita fiscal) é restrita à hipóteses de não vir a ocorrer o fato gerador
presumido.
Admitir o contrário, valeria pela inviabilização do próprio instituto da substituição
tributária progressiva, visto que implicaria, no que concerne ao ICMS, o retorno
ao regime de apuração mensal do tributo e, conseqüentemente, o abandono de um
instrumento de caráter eminentemente prático, porque capaz de viabilizar a
tributação de setores de difícil fiscalização e arrecadação. Na verdade, visa o
instituto evitar, como já acentuado, a necessidade de fiscalização de um sem-
número de contribuintes, centralizando a máquina-fiscal do Estado num universo
consideravelmente menor, e com acentuada redução do custo operacional e
conseqüente diminuição da evasão fiscal. Em suma, propicia ele maior
comodidade, economia, eficiência e celeridade na atividade estatal ligada à
imposição tributária.
Não seria, realmente, de admitir que, diante desses efeitos práticos, decisivos para
a adoção da substituição tributária, viesse o legislador a criar mecanismo capaz de
inviabilizar a utilização do valioso instituto, com a compensação de eventuais
excessos ou faltas, em face do valor real da última operação, determinando o
retorno da apuração mensal do tributo, prática que justamente teve por escopo
obviar. (Destaques nossos).
Trata-se de aspectos da maior relevância que, infelizmente, na instância de prelibação,
escaparam a este Relator, levando à suspensão da eficácia da norma contida na Cláusula
Segunda do Convênio ICMS nº 013/97, que, justamente, veda a restituição ou a
cobrança complementar do ICMS quando a operação ou prestação subseqüente à
cobrança do imposto, sob a modalidade da substituição tributária, se realizar com valor
inferior ou superior ao presumido.”

Voto vencedor do MINISTRO SYDNEY SANCHES:


“Sr. Presidente, bem ou mal, o § 7º do art. 150 da C.F. constitucionalizou a substituição
tributária, que a antiga legislação infraconstitucional permitia e que nunca foi declarada
inconstitucional por esta Corte. E o fez de modo a só assegurar a restituição da quantia
paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
Chegou a essa solução, pela praticidade que a substituição tributária viabiliza, no que
concerne à arrecadação.
Se se entender que, tanto a complementação quanto a restituição, decorrente do valor da
operação subseqüente, devem ser contempladas, então estará esvaziado o próprio
instituto da substituição, em seus razoáveis objetivos.
E não se deve interpretar qualquer norma jurídica, sobretudo de índole constitucional,
que a esvazie ou a torne inócua.
Peço vênia, pois, para acompanhar o voto do eminente Relator.”

Voto vencedor do MINISTRO MOREIRA ALVES:


“Sr. Presidente, esse sistema foi criado justamente para permitir que não houvesse
sonegação, afastando-se a dificuldade, praticamente intransponível, de fiscalização
nesses casos.
Por que o Poder Constituinte Derivado, que estabeleceu que o fato gerador seria
presumido mas admitiu que a presunção cederia diante da realidade, na hipótese de o
fato presumido não se realizar, e, nesse caso, determinou que houvesse a restituição da
quantia paga, não foi além e não declarou também, se o valor recolhido com base na
presunção, fosse, na realidade, maior ou menor, que deveria haver ou a
complementação dele ou a restituição do pago a maior? Essa distinção se explica, a meu
ver, porque, ou o sistema é assim, ou, se ele deixar de ser dessa maneira, o texto
constitucional será inócuo, e isso em razão de que se essa questão fica a depender da
fiscalização, não haveria explicação para fazer-se, a respeito, uma Emenda
Constitucional, pela falta de finalidade de instituto dessa natureza.
Assim, Sr. Presidente, com a devida vênia, acompanho o eminente relator.”

A decisão fixa o entendimento de que a Constituição Federal admite a


substituição tributária para exigir o tributo sobre fato gerador futuro, exigindo a devolução
imediata e preferencial do imposto retido quando da não ocorrência do fato presumido, mas não
obrigando a restituição por eventual diferencial apurado entre o valor arbitrado para a operação
presumida e aquele efetivamente praticado na circulação subseqüente, por entender que os valores
da incidência tributária fixados em lei são inalteráveis pela disposição das partes.

Esse E. Tribunal de Justiça, nos últimos julgamentos de apelações interpostas


em mandados de segurança que versam sobre a matéria aqui debatida, diante do resultado do
julgamento de tal ação direta de inconstitucionalidade pela Excelsa Corte, vem decidindo de
maneira desfavorável às pretensões deduzidas pelas concessionárias de veículos impetrantes, como
se depreende da Apelação Cível nº 161.694-5/0-00 (j. 28 de janeiro de 2003, v.u.), na qual o
ínclito Desembargador Relator SCARANCE FERNANDES expressamente consignou:
“Assim, inexiste o alegado direito de pronta restituição, com fundamento no art. 150,
parágrafo 7º, da Constituição Federal, eis que no caso não se trata de hipóteses de não
ocorrência de fato gerador, mas sim de operação final com valor inferior à presumida.
...
A Lei 9176/95 do Estado de São Paulo, mais generosa ao contribuinte, permite a
compensação dos créditos do ICMS recolhidos a maior. O exercício deste direito há de
ser feito nos limites dos arts. 1º e 2º do art. 66-B da Lei, ou seja: mediante prévio
requerimento e comprovação das operações efetivamente realizadas em tais condições e
obedecida a disciplina estabelecida pelo Poder Executivo a respeito.
Este relator está revendo seu posicionamento anterior, favorável à tese da impetrante,
tendo em vista o julgamento acima referido (ADIN 1851-AL).”

Nessa conformidade, não há direito líquido e certo, em prol da apelada, à imediata e


preferencial restituição de valores de ICMS que se alega terem sido recolhidos em excesso por
conta de efetivação de eventuais vendas de automóveis por valores inferiores àqueles considerados
para a realização da retenção do tributo, já que o art. 150, § 7º, da Constituição Federal não
agasalha tal situação.

A Lei Complementar Nacional nº 87, de 13 de setembro de 1996, que dispõe


sobre o ICMS, regulando tal direito constitucional à imediata e preferencial restituição, a seu
turno, estabeleceu o seguinte no art. 10:
“É assegurado ao contribuinte substituído o direito à restituição do valor do imposto
pago por força da substituição tributária, correspondente ao fato gerador presumido
que não se realizar.
§ 1º. Formulado o pedido de restituição e não havendo deliberação no prazo de
noventa dias, o contribuinte substituído poderá se creditar, em sua escrita fiscal, do
valor objeto do pedido, devidamente atualizado segundo os mesmos critérios aplicáveis
ao tributo.
§ 2º. Na hipótese do parágrafo anterior, sobrevindo decisão contrária irrecorrível, o
contribuinte substituído, no prazo de quinze dias da respectiva notificação, procederá
ao estorno dos créditos lançados, também devidamente atualizados, com o pagamento
dos acréscimos legais cabíveis.” (Destacamos).

Portanto, da mesma maneira que a Constituição Federal, a lei complementar


somente assegurou o direito à imediata restituição no caso de não verificação do fato gerador
presumido.
Mas é interessante observar, diante do teor dessa norma complementar que
regulamenta o art. 150, § 7º, da CF, que, mesmo que tivesse sido assegurada a imediata restituição
na situação aqui analisada (operação realizada por valor inferior à base de cálculo da retenção do
ICMS), o ressarcimento somente se daria mediante a formulação de pedido administrativo, com a
única ressalva de que, caso não apreciado o requerimento no prazo de noventa dias, o contribuinte
substituído poderia promover o lançamento do ‘crédito’ na sua escrita fiscal. Como se vê, não há,
na lei complementar, a previsão de ressarcimento por meio de emissão de nota fiscal de
transferência dos ‘créditos’ em favor da substituta tributária; muito menos de que se o faça sem a
prévia análise da questão pelo Fisco, como ilegitimamente pretende a recorrida neste writ.

Dispõe, por sua vez, a legislação estadual acerca do tema em análise:


1) Lei 6.374/89:
“Art. 66-B – Fica assegurada a restituição do imposto pago antecipadamente em razão
da substituição tributária:
I – caso não se efetive o fato gerador presumido na sujeição passiva;
II – caso se comprove que na operação final com mercadoria ou serviço ficou
configurada obrigação tributária de valor inferior à presumida.
§ 1º - O pedido de restituição, sem prejuízo de outras provas exigidas pelo fisco, será
instruído com cópia da documentação fiscal da operação ou prestação realizada, que
comprove o direito à restituição.
§ 2º - O Poder Executivo disporá sobre os pedidos de restituição que serão processados
prioritariamente, quer quanto à sua instrução, quer quanto à sua apreciação, podendo,
também, prever outras formas para devolução do valor, desde que adotadas para
opção do contribuinte.” (Grifamos).

2) Regulamento do ICMS (Decreto 45.490/00):


Artigo 269 – Nas situações adiante indicadas, o estabelecimento do contribuinte
substituído que tiver recebido mercadoria ou serviço com retenção do imposto,
observada a disciplina estabelecida pela Secretaria da Fazenda, poderá ressarcir-se:
I – do valor do imposto retido a maior, correspondente à diferença entre o valor que
serviu de base à retenção e o valor da operação ou prestação realizada com
consumidor ou usuário final;
II – do valor do imposto retido ou da parcela do imposto retido relativo ao fato gerador
presumido não realizado;
...
§ 2º - As situações indicadas no “caput” serão comprovadas na forma estabelecida
pela Secretaria da Fazenda.
...
Artigo 270 – O ressarcimento de que trata o artigo anterior poderá ser efetuado,
alternativamente, observada a disciplina estabelecida pela Secretaria da Fazenda, nas
seguintes modalidades:
I – Compensação Escritural: conjuntamente com a apuração relativa às operações
submetidas ao regime comum de tributação, mediante lançamento no livro Registro de
Apuração do ICMS;
II – No Fiscal de Ressarcimento: quando a mercadoria tiver sido recebida diretamente
do estabelecimento do sujeito passivo por substituição, mediante emissão de documento
fiscal, que deverá ser previamente visado pela repartição fiscal, indicando como
destinatário o referido estabelecimento e como valor da operação aquele a ser
ressarcido;
III – Pedido de Ressarcimento: mediante requerimento à Secretaria da Fazenda.
§ 1º - O Pedido de Ressarcimento, no que concerne à sua instrução e apreciação, será
processado prioritariamente pelas unidades competentes da Secretaria da Fazenda.
§ 2º - O valor do imposto a ser ressarcido poderá ser utilizado para liquidação de
débito fiscal do estabelecimento ou de outro do mesmo titular.”

Como se percebe, a legislação paulista, que, inovando, criou o benefício fiscal


representado pela devolução da diferença apurada entre a base de cálculo para o recolhimento
antecipado nos termos da substituição tributária progressiva e o valor efetivo da operação
empreendida pelo substituído, estabelece três modalidades de restituição:
1) Compensação Escritural: segundo a qual a contribuinte, sem qualquer submissão à
prévia verificação pelo Fisco, efetua o lançamento dos valores recolhidos em excesso na
sua escrita fiscal como créditos de ICMS para abatê-los com seus débitos gerados pela
prática de operações de circulação de mercadorias não regidas pelo regime da
substituição tributária;
2) Nota Fiscal de Ressarcimento: quando a mercadoria tiver sido recebida
diretamente do substituto tributário, emite-se documento fiscal, que deverá ser
previamente visado pela repartição fiscal, indicando como destinatário o
estabelecimento daquele e como valor da operação aquele a ser ressarcido;
3) Pedido de Ressarcimento: requerimento dirigido à Secretaria da Fazenda.

Ora, mesmo que se entenda que a norma do art. 150, § 7º, da Constituição Federal ampare a
imediata e preferencial restituição nas hipóteses de realização de fato gerador por valor inferior
àquele utilizado como base de cálculo para a retenção do tributo, o que se admite apenas para
argumentar diante do resultado do julgamento da ADI nº 1.851 pelo Plenário do C. Supremo
Tribunal Federal, não se vislumbra nenhuma inconstitucionalidade nas normas estaduais que
regulam a espécie, as quais estão em absoluta conformidade com a norma do art. 10 da Lei
Complementar nº 87/96. Restituição imediata não significa, com efeito, devolução sem a prévia
verificação, pelo Fisco, da legitimidade dos créditos pretendidos, mas sim que ela não se sujeitará
à regra geral de cobrança de quantia certa contra o Poder Público, qual seja, expedição de
precatório.
Importante anotar que a Lei Estadual, vez que admite o creditamento, na escrita fiscal, sem o
prévio exame pelo Fisco, é mais liberal que a LC 87/96, a qual somente autoriza tal creditamento
caso não se aprecie o pedido administrativo no prazo de noventa dias.
Em relação à modalidade da emissão de nota fiscal de transferência dos créditos de ICMS ao
substituto tributário, modalidade esta criada pelo próprio Decreto Estadual, dada a sua elevada
potencialidade de propiciar fraudes e, por conseguinte, danos ao Erário Público, de fato, somente é
autorizada mediante a aposição de visto do Fisco no documento fiscal de ressarcimento. Portanto,
assim como na formulação de pedido de restituição, sujeita-se à indispensável e prévia análise da
Administração Pública Tributária.

Por outro lado, verifique-se que, ao estabelecer a possibilidade de restituição de ICMS na


excepcional hipótese de realização de operação de circulação de mercadoria por valor inferior
àquele fixado como base de cálculo para a antecipação do recolhimento do ICMS (v. inciso II do
art. 66-B da Lei Estadual 6.374/89), o Estado de São Paulo acabou criando inequívoco benefício
fiscal sem lastro em Convênio (autorização consensual de todos os Estados e o Distrito Federal), o
que induz a sua inconstitucionalidade ante o que dispõe a alínea “g” do inciso XII do § 2º do art.
155 da Constituição Federal.
Não sendo obrigatória a restituição por eventual diferencial de base de cálculo entre a arbitrada
pela lei e o valor determinado pelo substituído tributário nas operações subseqüentes na cadeia de
circulação de mercadoria até o consumo final, a dispensa dessa parcela de imposto assim calculado
só pode ser efetivamente recepcionada, na sistemática tributária vigente, como hipóteses de
benefício fiscal.
A propósito, esclarece-se que o próprio Excelentíssimo Senhor Governador do Estado de São
Paulo, Dr. GERALDO ALCKMIN, no dia 02 de dezembro passado, ajuizou perante o E. Supremo
Tribunal Federal Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 2.777 – v. cópia da inicial em
anexo) na qual pede seja declarada a inconstitucionalidade da norma do inciso II do art. 66-B da
Lei Estadual 6.374/89. Como se depreende do incluso documento (extrato de andamento
processual extraído do site do STF, internet), os autos dessa ação estão conclusos ao eminente
Relator Ministro SYDNEY SANHES, já tendo sido proferido parecer pela C. Procuradoria Geral
da República no sentido da procedência do pedido.

De todo modo, mesmo que não se reconheça a inconstitucionalidade da norma


do inciso II do art. 66-B da Lei Estadual 6.374/89, o que se admite apenas para argumentar, uma
vez certificado que tal benefício fiscal não tem base no disposto no § 7º do art. 150 da Carta
Magna, fica patente que o contribuinte, para gozar do mesmo, necessita fazê-lo mediante o
preenchimento dos requisitos estabelecidos pela legislação tributária da pessoa política que o
criou; vale dizer, a apelada, para poder emitir nota fiscal de ressarcimento de pretensos ‘créditos’
oriundos de diferenças resultantes da realização de supostas operações de circulação de
mercadorias por valores inferiores àqueles arbitrados como base de cálculo do imposto
antecipadamente recolhido, deverá submeter-se às regras e procedimentos estabelecidos pela
legislação do Estado de São Paulo, que foi o verdadeiro instituidor dessa benesse.

Resta claro, nessa conformidade, que inexiste o direito invocado pela apelada
neste mandado de segurança.

Correção Monetária.
Totalmente incabível a pretensão de atualização monetária de eventuais
créditos de ICMS da recorrida, pois os próprios créditos tributários da Fazenda do Estado de São
Paulo não vêm sendo corrigidos monetariamente, conforme estatuído na Lei nº 10.175/98.
Requer, assim, caso seja mantida a concessão da ordem, ad argumentandum
tantum, seja excluída a autorização de atualização monetária dos valores de ICMS que se pretende
aproveitar e transferir à substituta.

Juros.
Também não procede, o pedido de incidência de juros sobre supostos créditos
de ICMS.
Primeiro, porque não existe previsão legal para tal acréscimo.
Segundo, porquanto o Estado jamais esteve em mora para com a apelada, que
não formulou pedido administrativo de restituição. Não havendo mora da Fazenda Pública, mas
sim da própria contribuinte que não foi diligente na via administrativa, na qual sequer pleiteou a
concessão de seu conjeturado direito de ressarcimento, aguardando anos para impetrar um novo
mandado de segurança e tentar obter um novo “cheque em branco”, não há qualquer fundamento
jurídico para se incluir juros em eventuais valores passíveis de restituição.
Terceiro, porque o próprio Código Tributário Nacional, quando trata da
restituição do indébito, estabelece que a incidência de juros somente se dá a partir do trânsito em
julgado de decisão definitiva que determinar a sua devolução (art. 167, parágrafo único).
Requer, pois, caso seja mantida a concessão da segurança, o que se admite
apenas para argumentar, seja excluída a autorização de incidência de juros sobre os valores de
ICMS que se pretende aproveitar e transferir à substituta.

Requerimento.

Por todo o exposto, caso não sejam acolhidas as preliminares supra-argüidas,


requer a Fazenda do Estado de São Paulo o provimento do presente recurso para que então seja
denegada a segurança pleiteada pela concessionária de veículos impetrante, pena de violação às
normas do art. 150, § 7º, da Constituição Federal e art. 10, caput e § 1º, da Lei Complementar
Federal nº 87/96.

Requer, ainda, digne-se esse E. Tribunal em, incidentalmente, declarar a


inconstitucionalidade do preceito do inciso II do art. 66-B da Lei Estadual 6.374/89 (texto dado
pela Lei 9.176/95), em face da sua manifesta contrariedade à norma da alínea “g” do inciso XII
do § 2º do art. 155 da Constituição Federal.

Termos em que,
P. Deferimento.

Paraguaçu Paulista, 18 de março de 2003.

Thiago Pucci Bego


Procurador do Estado
OAB/SP 153.530
Exmo. Sr. Dr. Juiz da Vara Federal de Tupã – 22ª Subseção Judiciária de São Paulo

Ação de Indenização
Autos nº 2002.61.22.000029-1

O ESTADO DE SÃO PAULO, por seu Procurador que esta subscreve, nos
autos da ação de indenização proposta por HÉLIO MINUTI, vem, respeitosamente, à presença
de V. Exa. apresentar sua CONTESTAÇÃO, expondo e requerendo o quanto segue:

Hélio Minuti ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais em face da UNIÃO,
alegando, em síntese, que: é proprietário de um pequeno imóvel rural localizado no município de
Adamantina-SP denominado sítio Santo Antônio, no qual exercia a citricultura, atividade que
garantia a sua subsistência e de sua família; lá existiam 2.461 pés de laranja, plantados há mais de
12 anos e em fase de excelente produtividade; em janeiro de 2000, foi surpreendido com a
informação de que material de seu pomar havia sido coletado para realização de exame que
constata a existência da doença conhecida como cancro cítrico; o resultado do exame feito pelo
Instituto Biológico de Presidente Prudente certificou a presença da bactéria em 282 árvores do
pomar; não pode ser culpado por isso, já que sempre “dispensou todos os cuidados que estavam ao
seu alcance e eram necessários para evitar qualquer contaminação em seu pomar”; a culpa é do
Estado “que permitiu a propagação da doença”; com base no referido laudo, o Escritório de
Defesa Sanitária Vegetal de Dracena-SP, através da notificação nº 15/00, promoveu a interdição
do sítio, impedindo a comercialização dos frutos cítricos de seu pomar; também foi notificado da
necessidade de erradicação e queima de todas as plantas cítricas contaminadas e das limítrofes
num raio de trinta metros; diante desse critério, todo o seu pomar seria destruído; impetrou
mandado de segurança objetivando evitar tal medida de erradicação e queima; não obteve sucesso
na impetração, de modo que, em setembro de 2000, ocorreu a integral destruição de seu pomar; a
responsabilidade civil do Estado é objetiva ante o disposto no art. 37, § 6º, da Constituição
Federal; não incorreu em culpa, posto que, mesmo tomando as precauções cabíveis, viu seu pomar
acometido pela citada moléstia vegetal; mesmo sendo considerada lícita a conduta do Poder
Público, constitui direito seu a obtenção de indenização pelos danos suportados por conta da
erradicação; além das árvores, perdeu uma safra inteira, vez que, no momento da erradicação, os
frutos estavam aptos à colheita e subseqüente comercialização; o próprio preceito do art. 34, § 1º,
do Regulamento da Defesa Sanitária Vegetal garante o ressarcimento em tais situações; na ocasião
da constatação da presença do cancro cítrico em seu pomar, “sentiu-se em uma situação deveras
desconfortável”; posteriormente, assistindo à destruição do pomar, “passou a viver em uma
situação desesperadora e totalmente lamentável”; por conta de reportagens, a maioria da
população local, que não conhece os efeitos do cancro cítrico, pode ter feito um juízo negativo
sobre si, colocando em dúvida sua idoneidade; a tristeza e vergonha suportadas impõem uma
reparação a título de dano moral.

Postulou, por fim, a condenação da ré ao pagamento das seguintes verbas, a serem apuradas em
liquidação de sentença: a) indenização pelos danos materiais provocados pela destruição das
árvores (valor das mudas e despesas de plantio, tratos culturais, preparo da terra, anos de espera
para a primeira colheita); b) indenização pela depreciação havida no valor do imóvel em razão da
eliminação do pomar; c) indenização pela perda das safras vindouras (frutos que seriam colhidos
durante os próximos vinte anos); d) indenização pelos danos morais, sugerindo-se o arbitramento
no importe equivalente a 500 salários mínimos; e) e ônus da sucumbência.

A União foi citada e ofertou contestação, na qual, em preliminar, alegando


que o Estado de São Paulo, por intermédio da Comissão Executiva Estadual da Canecc e da
Secretaria de Agricultura e Abastecimento, é responsável pela execução das atividades da
Campanha Nacional de Erradicação do Cancro Cítrico, pela fiscalização e pela elaboração dos
autos de interdição dos pomares contaminados em seu território, pleiteou a sua citação para
integrar o pólo passivo do processo na condição de litisconsorte necessário.

Não obstante a não concordância do autor, manifestada em réplica, em


promover a inclusão do Estado de São Paulo no processo, V. Exa. determinou que fosse
providenciada a citação deste como litisconsorte passivo necessário.

Preliminarmente.
O Estado de São Paulo, por intermédio de seus agentes administrativos da
Secretaria de Agricultura e Abastecimento, ao promover as medidas de execução da mencionada
Campanha Nacional de Erradicação do Cancro Cítrico – inspecionando pomares, realizando
exames laboratoriais, lavrando autos de interdição, implementando a erradicação e queima das
plantas cítricas contaminadas e suspeitas de contaminação, etc. –, o faz por delegação da União,
conforme se depreende dos Termos de Cooperação Técnica que são regularmente celebrados (v.
docs. 02 e 03 em anexo).

Estabelece, com efeito, a cláusula primeira dos mencionados Termos: “O


presente TERMO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA tem por objeto a execução dos serviços de
defesa sanitária vegetal no âmbito do Estado de São Paulo, mediante a conjugação dos esforços
dos partícipes, ficando delegadas à SECRETARIA as atividades de Defesa Sanitária Vegetal não
privativas do MINISTÉRIO” (grifamos). Na cláusula terceira, constam a competência e as
obrigações de cada partícipe:
“I – Ao MINISTÉRIO:
a) aprovar os procedimentos técnicos e operacionais necessários à implementação dos trabalhos;
b) orientar, supervisionar e fiscalizar os trabalhos delegados, cabendo-lhe especificamente
acompanhar, diretamente ou por intermédio de outro órgão delegado, as atividades a serem
executadas, e avaliar os resultados;
...
II – À SECRETARIA, por intermédio da COORDENADORIA DE DEFESA
AGROPECUÁRIA:
...
k) executar as atividades da Campanha Nacional de Erradicação do Cancro Cítrico – CANECC,
nos termos da legislação vigente;
l) aplicar sanções e adotar medidas preventivas ou de controle de pragas e doenças dos vegetais,
inclusive erradicação, obedecendo à legislação vigente;” (grifamos).

Tal Campanha Nacional de Erradicação do Cancro Cítrico foi instituída pelo


Decreto Federal nº 75.061/74 (v. fls. 98/100) que, entre outras disposições, estatui:
“Art. 2º – A Campanha Nacional de Erradicação do Cancro Cítrico (CANECC), terá por
finalidade traçar normas da política de pesquisa e combate, assim como estabelecer medidas de
caráter técnico e administrativo, necessárias à sua implantação e desenvolvimento em todos os
Estados da Federação contaminados ou suspeitos de contaminação pela doença denominada
cancro cítrico que ataca plantas do Gênero “citrus” e outras afins, objetivando erradicá-la do
território nacional.
Art. 3º – Com o objetivo de promover a execução e a coordenação das medidas necessárias à
implantação e ao desenvolvimento da Campanha, será constituída uma Coordenação Geral com a
seguinte composição:
I – Um Representante do Ministério da Agricultura;
II – Um Representante de cada Estado contaminado ou suspeito de contaminação, indicado pelos
respectivos Secretários de Agricultura;
III – Um Representante dos Produtores Citrícolas.
§ 1º – O Ministro de Estado da Agricultura designará os Representantes referidos neste artigo e os
respectivos Suplentes, que deverão ser técnicos de reconhecida experiência e comprovada
capacidade no setor do cancro cítrico.
§ 2º – O Ministro de Estado da Agricultura, dentre os mencionados Representantes, escolherá e
designará o Coordenador Geral da Campanha.
...
Art. 6º – A campanha atuará em íntimo entrosamento com os diversos órgãos oficiais federais e
estabelecerá convênios para execução com as Secretarias de Agricultura dos Estados
contaminados ou suspeitos de contaminação.
Parágrafo Único – No caso de convênio, deverão, obrigatoriamente, constar as seguintes
cláusulas:
1- Criação de uma Comissão Executiva Estadual, da qual farão parte um Representante do
Ministério da Agricultura, um Representante do órgão convenente e um Representante da entidade
representativa dos produtores citrícolas, com o objetivo de executar as instruções e normas
técnicas para erradicação do cancro cítrico, em seu território.
2- Que o pessoal técnico e administrativo indispensável à execução da CANECC seja de
responsabilidade do órgão convenente o qual deverá colocá-lo à disposição da Comissão
Executiva sob regime de tempo integral e dedicação exclusiva, o mesmo ocorrendo com o do
Ministério da Agricultura.
3- Que o órgão convenente, ouvido o Coordenador Geral da CANECC, poderá firmar contrato de
execução, de colaboração técnica e/ou financeira com outros órgãos públicos, privados, de
economia mista ou para estatais inclusive organismos internacionais, visando ao melhor
cumprimento das atividades, objeto do convênio.
Art. 7º – Para cada Estado contaminado ou suspeito de contaminação o Ministério da Agricultura
designará por indicação do Coordenador Geral da CANECC, um Representante com a
incumbência de fiscalizar o pleno cumprimento das normas técnicas estabelecidas, bem como dos
convênios e contratos que forem firmados para execução da Campanha.
Parágrafo Único – Caberá a esse Representante remeter ao Coordenador Geral uma avaliação dos
resultados alcançados e sugerir medidas corretivas ao Plano Operativo, inclusive, solicitar
suspensão de fornecimento de recursos às unidades executivas se assim aconselhar avaliação.
Art. 8º – Os Governos dos Estados contaminados ou suspeitos de contaminação poderão expedir
os atos complementares que se fizerem necessários à institucionalização da CANECC em seu
território” (grifos nossos).

Por sua vez, dispõe o artigo 6º das Normas Gerais de Funcionamento da


Canecc aprovadas pela Portaria do Ministério da Agricultura nº 47/80, com as alterações
introduzidas pela Portaria nº 93/83 (fls. 102/106):
“Art. 6º – Para a execução da Campanha nos Estados atingidos pela doença denominada cancro
cítrico, será criada uma Comissão Executiva Estadual, da qual farão parte representantes dos
seguintes órgãos:
a) Serviço de Defesa Sanitária Vegetal, da Delegacia Federal do Ministério da Agricultura;
b) Secretaria da Agricultura;
c) De órgão representativo da classe produtora na Unidade da Federação.
§ 1º – A Coordenação Geral da CANECC, designará os representantes referidos neste artigo e
seus suplentes, indicados pelos titulares dos respectivos órgãos, dentre técnicos de comprovada e
reconhecida experiência na área do cancro cítrico, cabendo à Comissão, por designação do
Coordenador Geral, a responsabilidade de execução da Campanha, ficando designado o
representante do órgão convenente, como Executor dos trabalhos no respectivo Estado.
§ 2º – Os representantes e suplentes de que trata o § 1º deste artigo, não poderão ser indicados
para integrar a Coordenação Geral da CANECC” (grifamos).

Como se depreende dos transcritos preceitos, embora a Comissão Executiva


Estadual não constitua um órgão propriamente do Estado de São Paulo, estando integrado à
estrutura da Campanha Nacional e tendo seus membros designados pelo Coordenador Geral da
Canecc, o fato é que, no território paulista, a execução das atividades de erradicação do cancro
cítrico efetivamente é empreendida pelos agentes da Coordenadoria de Defesa Agropecuária da
Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

Entretanto, tendo em vista que a erradicação e queima das plantas cítricas do


pomar do autor foram efetuadas de acordo com as normas jurídicas aplicáveis à espécie – a
propósito v. docs. 04, 05 e 06 em anexo (petição inicial, informações prestadas pela autoridade
impetrada e sentença do mandado de segurança impetrado pelo ora autor), nos quais se verifica o
reconhecimento judicial da legalidade da medida de polícia administrativa adotada in casu –,
inclusive não integrando a causa de pedir da presente ação de indenização a afirmação de
cometimento de ilegalidades pelos agentes estaduais, eventual responsabilidade civil por
decorrência da lícita eliminação das contaminadas plantas cítricas do pomar do autor deverá ser
suportada exclusivamente pela União (detentora natural da competência de defesa sanitária
vegetal e de erradicação do cancro cítrico em todo o território nacional), e não pelo Estado de São
Paulo que agiu por delegação, no estrito cumprimento de seu dever convencional, não tendo,
manifestamente, extravasado os limites impostos pelo princípio da legalidade e pela referida
delegação.

Requer o Estado de São Paulo, pois, seja reconhecida a sua ilegitimidade


passiva (art. 267, inciso VI, do Código de Processo Civil), ou, caso assim não se entenda, o que se
admite apenas para argumentar, que ao menos seja a demanda julgada improcedente em relação a
ele, pelos motivos já expendidos.
Mérito.
Por cautela e em obediência ao princípio da eventualidade, cabe ao Estado
expor a seguir as razões de fato e de direito, que, aliadas aos fundamentos de mérito aduzidos pela
União em sua contestação, certamente deverão, data venia, embasar o julgamento de integral
rejeição do pedido inicial por esse C. Juízo Federal.

Com efeito, da regular execução de medidas de polícia administrativa não


decorre a responsabilização civil do Poder Público por eventuais prejuízos econômicos
acarretados.

A doutrina administrativista é unânime nesse sentido, como se infere dos


trechos de importantes obras jurídicas a seguir transcritos:
“Celso Antônio Bandeira de Mello, esteado em Alesi, observa que essas limitações à
liberdade e à propriedade não limitam os direitos de liberdade e propriedade, ao
contrário, conferem-lhes contornos jurídicos. Destarte, a limitação imposta à
propriedade nada mais é do que a expressão jurídica da propriedade, ou seja, o próprio
direito de propriedade. Daí por que as limitações decorrentes do poder de polícia não
geram direito à indenização.” (Direito Administrativo Sistematizado, Toshio Mukai,
Editora Saraiva, 1999, p. 87).

“... as limitações administrativas, impostas no interesse público, constituem objeto do


direito público, mais especificamente do direito administrativo, pois, embora muitas
das normas legais limitadoras de direitos individuais sejam de caráter constitucional,
penal, eleitoral, é à Administração Pública que cabe o exercício dessa atividade de
restrição ao domínio privado, por meio do poder de polícia fundado na supremacia do
interesse público sobre o particular.
...
Bielsa (1965, t. 4: 375-376) indica três traços característicos das limirações
administrativas:
1. impõem obrigação de não fazer ou deixar fazer;
2. visando conciliar o exercício do direito público com o direito privado, só vão
até onde exija a necessidade administrativa;
3. sendo condições inerentes ao direito de propriedade, não dão direito a
indenização.
Analisando-se as limitações administrativas à propriedade, verifica-se, inicialmente,
que elas decorrem de normas gerais e abstratas, que se dirigem a propriedades
indeterminadas, com o fim de satisfazer interesses coletivos abstratamente
considerados ou, como diz Marcelo Caetano (1970, t. 2:1981), para atender à
“realização de interesses públicos abstratos, da utilidade pública ideal não
corporificada na função de uma coisa”. Se a utilidade pública estiver corporificada
na função de uma coisa, ter-se-á servidão e não simples limitação.
O interesse público a que atende a limitação pode referir-se à segurança, à salubridade,
à estética, à defesa nacional ou qualquer outro fim em que o interesse da coletividade se
sobreponha ao dos particulares. Citem-se, como exemplos de limitações
administrativas: as que impõem a adoção de medidas técnicas para construção de
imóveis, visando a sua segurança e mesmo à salubridade pública; e as que restringem a
altura dos edifícios, por motivos de estética ou de segurança.
Quanto ao conteúdo das limitações administrativas, no mais das vezes corresponde a
uma obrigação de não fazer. Ocorre, no entanto, que, examinado-se os casos concretos,
verifica-se que em muitos deles, embora haja obrigação negativa de não colocar em
risco a segurança, a saúde, a tranqüilidade pública, na realidade a obtenção desses fins
depende de prestação positiva por parte do proprietário. Citem-se, por exemplo, as
obrigações de adotar medidas de segurança contra incêndio ou medidas impostas por
autoridades sanitárias, ou, ainda, a obrigatoriedade de demolir um prédio que ameaça
ruína. Embora impliquem prestações positivas por parte do proprietário, tais
imposições são também limitações administrativas à propriedade, porque a afetam em
um de seus traços fundamentais – o seu caráter de direito absoluto – concebido como
poder de usar e desfrutar da coisa da maneira que melhor aprouver a seu titular.
... Nas limitações administrativas, o proprietário conserva em suas mãos a totalidade de
direitos inerentes ao domínio, ficando apenas sujeito às normas regulamentadoras do
exercício desses direitos, para conformá-lo ao bem-estar social; a propriedade não é
afetada na sua exclusividade, mas no seu caráter de direito absoluto, pois o proprietário
não reparte, com terceiros, os seus poderes sobre a coisa, mas, ao contrário, pode
desfrutar de todos eles, da maneira que lhe convenha, até onde não esbarre com óbices
opostos pelo poder público em prol do interesse coletivo.
Sendo inerentes à propriedade ou constituindo, no dizer de Bandeira de Mello (RDP
9:64), o próprio “perfil do direito”, as limitações administrativas não dão direito à
indenização, que só é cabível quando o proprietário se vê privado, em favor do Estado
ou do público em geral, de alguns ou de todos os poderes inerentes ao domínio, como
ocorre, respectivamente, na servidão administrativa e na desapropriação. Como diz
Bielse (1965, t. 4:376), as restrições não dão direito à indenização, “já que não são
senão uma carga geral imposta a todas as propriedades. Trata-se, segundo se disse, de
uma condição inerente ao direito de propriedade, cujo conteúdo normal se limita pelas
leis”.
...
Sendo medidas impostas pelo poder de polícia do Estado, com fundamento no princípio
da supremacia do interesse público, não cabe ao particular qualquer medida,
administrativa ou judicial, visando impedir a incidência da limitação sobre o imóvel de
sua propriedade; o Estado age imperativamente, na qualidade de poder público, e
somente poderá sofrer obstáculos, quando a Administração aja com abuso de poder,
extravasando os limites legais. Nesse caso, cabe ao particular, além de opor-se à
limitação estatal, pleitear a indenização por prejuízos dela decorrentes.
As limitações podem, portanto, ser definidas como medidas de caráter geral, impostas
com fundamento no poder de polícia do Estado, gerando para os proprietários
obrigações positivas ou negativas, com o fim de condicionar o exercício do direito de
propriedade ao bem-estar social.” (Direito Administrativo, Maria Sylvia Zanella Di
Pietro, Editora Atlas, 10ª edição, ps. 107/110).

“Portanto, as limitações ao exercício da liberdade e da propriedade correspondem à


configuração de sua área de manifestação legítima, isto é, da esfera jurídica da
liberdade e da propriedade tuteladas pelo sistema. É precisamente esta a razão pela
qual as chamadas limitações administrativas à propriedade não são indenizáveis.
Posto que através de tais medidas de polícia não há interferência onerosa a um direito,
mas tão-só definição que giza suas fronteiras, inexiste o gravame que abriria ensanchas
a uma obrigação pública de reparar.” (Curso de Direito Administrativo, Celso Antônio
Bandeira de Mello, Malheiros Editores, 4ª edição, p. 351).

Na mesma linha, recente julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo, ao


analisar apelação interposta contra sentença que denegara segurança impetrada para obstar a
erradicação de pomar contaminado pelo cancro cítrico, deixou consignado:
“O ato impugnado também não desrespeitou o direito de propriedade do
impetrante, assegurado pela Constituição Federal (inciso XXII do artigo 5º da
CF), mas aplicou a regra do inciso XXIII, do art. 5º da nossa Lei Maior.
O interesse público (erradicação de plantas contaminadas pelo cancro cítrico e
medidas para evitar-se a propagação dessa praga) justificam as medidas adotadas,
tendo em vista o interesse social. A limitação (e não supressão) ao direito de
propriedade está plenamente justificada.
Não pode o impetrante, a pretexto do pleno exercício de seu direito de
propriedade, opor-se a execução de medidas de interesse público (erradicação do
cancro cítrico).” (AC nº 193.307-5/4-00-Comarca de Jales, 7ª Câmara de Direito
Público, rel. Des. WALTER SWENSSON, j. 22 de abril de 2002, v.u.).

Na hipótese vertente, o autor – assim como inúmeros outros proprietários que


também tiveram seus pomares contaminados pelo cancro cítrico – teve que suportar a eliminação
e queima das plantas cítricas plantadas em sua propriedade, a fim de que se evitasse a
generalizada e descontrolada disseminação da bactéria, o que representaria um enorme atentado
ao interesse público nacional consistente na produção, comercialização, exportação, etc. de frutas
cítricas sãs.

Já foi sobejamente demonstrado nestes autos quão ofensivo seria ao País a


propagação da referida doença, que causa enorme queda na produção de frutas cítricas, restringe
sobremaneira a aceitação do produto no mercado interno, inviabiliza a sua exportação face à
imposição de barreiras fitossanitárias nos Países importadores, e tudo isso ocasionado, entre
outras coisas, perdas de inúmeros postos de trabalhos no setor e impacto negativo na balança
comercial, considerando-se que o Brasil é um dos maiores exportadores de laranjas e seus
derivados e que tal produto representa considerável fatia das vendas externas.
Sendo indispensável atuar-se para preservar a sanidade das plantações de frutas cítricas,
não se pode invocar o instituto da indenização nas situações em que se vê o Poder Público no
dever de adotar medidas de polícia administrativa com o objetivo de extirpar, do território
nacional, bactéria causadora de danosa doença vegetal. Em tais hipóteses, não se mostra legítima a
reparação de eventuais prejuízos econômicos suportados pelos proprietários que tiveram seus
pomares destruídos pela Administração em virtude da constatação de insuportável nível de
infestação pelo cancro cítrico.

O suposto dano sofrido pelo autor, efetivamente, não é indenizável.

A brilhante lição exarada pelo preclaro Professor Titular de Direito


Administrativo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, CELSO ANTÔNIO
BANDEIRA DE MELLO, auxilia-nos a chegar a essa conclusão; vejamos o que diz o nobre
jurista:
“Inobstante o quanto se expôs, cumpre advertir que não é qualquer dano, relacionável
com os comportamentos comissivos ou omissivos do Estado, que dá margem à
indenização.
Para que nasça o dever público de indenizar é mister que o dano apresente certas
características.
a) A primeira delas é que o dano corresponda a lesão a um direito da vítima.
Quem não fere direito alheio não tem porque indenizar. Ou dito pelo reverso: quem
não sofreu gravame em um direito não tem título jurídico para postular
indenização. Isto é, importa, como disse Alessi, dantes citado, que o evento danoso
implique, ademais de lesão econômica, lesão jurídica.
70. Não há confundir dano patrimonial, dano econômico, com dano em Direito.
O primeiro é qualquer prejuízo sofrido por alguém, inclusive por ato de terceiro,
consistente em uma perda patrimonial que elide total ou parcialmente algo que se tem
ou que se terá.
O segundo, ademais de significar subtração de um bem ou consistir em impediente a
que se venha a tê-lo, atinge bem a que faz jus. Portanto, afeta o direito a ele. Incide
sobre algo que a ordem jurídica considera como pertinente ao lesado.
Logo, o dano assim considerado pelo Direito, o dano ensanchador de responsabilidade,
é mais que simples dano econômico. Pressupõe sua existência, mas reclama, além
disso, que consista em agravo a algo que a ordem jurídica reconhece como garantido
em favor de um sujeito.
71. Não basta para caracterizá-lo a mera deterioração patrimonial sofrida por alguém.
Não é suficiente a simples subtração de um interesse ou de uma vantagem que alguém
possa fruir, ainda que legitimamente. Importa que se trate de um bem jurídico cuja
integridade o sistema normativo proteja, reconhecendo-o como um direito do
indivíduo.
Por isso, a mudança de uma escola pública, de um museu, de um teatro, de uma
biblioteca, de uma repartição, pode representar para comerciantes e profissionais
instalados em suas imediações evidentes prejuízos, na medida em que lhes subtrai toda
a clientela natural derivada dos usuários daqueles estabelecimentos transferidos. Não há
dúvida que os comerciantes e profissionais vizinhos terão sofrido um dano patrimonial,
inclusive o “ponto” ter-se-á destarte desvalorizado. Mas não haverá dano jurídico.
Pela mesma razão não configura dano jurídico o dano econômico sofrido pelos
proprietários de residências sitas em bairro residencial que se converte, por ato do
Poder Público, em zona mista de utilização, Não haverá negar a deterioração do valor
dos imóveis de maior luxo. A perda da tranqüilidade e sossego anteriores tem reflexos
imediatos na significação econômica daqueles bens, mas inexistia direito à persistência
do destino urbanístico precedentemente atribuído àquela área da cidade.
72. Não se deve supor que nos casos referidos descabe indenização por serem lícitos os
comportamentos causadores do dano. Já se mencionou que há responsabilidade estatal
tanto por atos ilícitos como por atos lícitos.
No caso de comportamentos comissivos, a existência ou inexistência do dever de
reparar não se decide pela qualificação da conduta geradora do dano (ilícita ou lícita),
mas pela qualificação da lesão sofrida. Isto é, a juridicidade do comportamento danoso
não exclui a obrigação de reparar se o dano consiste em extinção ou agravamento de
um direito.
Donde, ante atuação lesiva do Estado, o problema da responsabilidade resolve-se no
lado passivo da relação, não no lado ativo dela. Importa que o dano seja ilegítimo – se
assim nos podemos expressar; não que a conduta causadora o seja.
Daí que nas hipóteses focalizadas inexiste responsabilidade por inexistir agravo a um
direito, isto é, porque foram atingidos apenas interesses econômicos, embora também
eles lícitos (mas sem possuírem a consistência de direitos ou sequer dos chamados
“interesses legítimos”, da doutrina italiana).” (Obra citada, ps. 453/455).

Diante disso, pode-se afirmar, com absoluta certeza, que o autor não suportou,
por conta da aludida erradicação das plantas cítricas de seu pomar, nenhum dano jurídico. Há
‘possibilidade’ de que tenha ocorrido prejuízo econômico, mas, de maneira alguma, pode-se dizer
que se caracterizou um dano indenizável ante a ausência de lesão jurídica.

Com efeito, inexiste direito subjetivo do indivíduo manter em sua


propriedade uma plantação contaminada por uma danosa praga e que ainda se propaga com
extrema facilidade. As normas jurídicas são claras em determinar a eliminação e queima das
plantas cítricas quando se constata certo percentual de infestação do talhão pelo cancro cítrico.
Assim sendo, verifica-se que o sistema normativo nacional não garante em favor dos agricultores
e de outros indivíduos titulares de plantações cítricas a manutenção das plantas contaminadas e
das suspeitas de contaminação pela referida praga; a ordem jurídica vigente, realmente, não
assegura, como um direito subjetivo, a permanência de plantações infectadas.

Tratassem de plantas cítricas indenes, a situação seria diferente, posto que aí


sim existiria o direito de manutenção das plantas nas propriedades, decorrendo, pois, de sua
eventual eliminação por ato lícito da Administração, responsabilidade dela em reparar o dano
jurídico provocado. Nessa conformidade, oportuna a transcrição de um trecho da obra do
Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, Carlos Roberto Gonçalves, que traz alguns
julgados versando sobre a responsabilidade civil do Estado por atividade regular:
“Há casos, no entanto, em que a atividade da Administração é regular mas, por causar
dano (injusto), legitima a ação de ressarcimento contra o Estado. Assim:
“Ação indenizatória. Vítima, terceira em relação ao tiroteio, atingida por projétil.
Inexistência de caso fortuito e de prova de culpa desta. Responsabilidade do Estado
reconhecida” (TJSP, 1ª Câm., Ap. 127.771-SP, Rel. Des. Roque Komatsu, j. 11-9-1990,
Boletim da AASP de 2 a 8-1-1991, n. 1.671, p. 2).
“Fazenda do Estado. Responsabilidade desta. Danos causados por disparos de arma de
fogo, em perseguição a criminosos. Polícia militar que, embora considerada reserva do
Exército Nacional, praticou atos da Administração local. Obrigação do causador do
dano, ainda que ocorrente o estado de necessidade” (RJTJSP, 29:46).
“Danos causados à lavoura por obra pública. Responsabilidade objetiva da
Administração. Departamento de Estradas de Rodagem. Responsabilidade solidária da
firma empreiteira e construtora” (RJTJSP, 40:96, 87:1220).” (Responsabilidade Civil,
Editora Saraiva, 6ª edição, ps. 162/163). Destacamos.

Portanto, embora a responsabilidade do Poder Público seja objetiva, exige-se


a realidade de um dano injusto para que surja a obrigação de indenizar. Assim não fosse,
inviabilizar-se-ia a própria existência do Estado, posto que, a cada passo por ele dado, teria que
sair indenizando todos os prejuízos econômicos ocasionados aos administrados, o que seria algo
insustentável e impraticável. A responsabilidade objetiva, efetivamente, não pode fazer do Estado
um segurador universal.

Cuidando-se, destarte, de atuação lícita estatal, o dever de ressarcir somente


emerge quando se evidencia a ocorrência de um dano ilegítimo decorrente da lesão a um direito
subjetivo da vítima do comportamento danoso.

De outra parte, para que se caracterize a responsabilidade civil do Poder


Público nas hipóteses de legítima atividade estatal, mister que o dano, além de jurídico e anormal,
seja também específico.

Ora, o suposto dano econômico versado neste processo não pode ser tachado de específico. Isso
porque a medida de polícia administrativa, consistente na eliminação e queima das plantas cítricas
contaminadas e das suspeitas de contaminação pelo cancro, é prevista, abstrata e genericamente,
nas normas jurídicas de defesa sanitária vegetal e da campanha nacional de erradicação do cancro
cítrico, de forma que todos os agricultores e indivíduos titulares de pomares que se encontrem em
tais situações serão atingidos pela referida providência estatal que objetiva proteger o interesse
público de sanidade das plantações e frutas cítricas do território paulista e nacional.

A propósito e para ilustrar, estamos anexando cópias de alguns autos que


foram lavrados em razão da destruição de algumas plantações, também contaminadas pelo cancro
cítrico, situadas no município de Adamantina (docs. 07 a 36). Portanto, todos os detentores de
pomares infectados estão suportando a mesma medida de erradicação das plantas que sofreu o
autor. As normas de defesa sanitária vegetal são abstratas e genéricas, sendo aplicáveis a todas as
pessoas que se enquadrem nas situações tipificadas; todos aqueles que são titulares de pomares
atingidos pelo cancro cítrico num percentual superior a 0,5% por talhão, destarte, terão todas as
plantas destruídas e queimadas por ação da Administração Pública em virtude da existência dos
aludidos preceitos legais a serem cumpridos por esta.

Registre-se, de outra banda, que é infundada a alegação de que o Poder Público permitiu a
propagação da doença em questão. Na verdade, é fato notório que os órgãos de defesa sanitária
vegetal “vêm trabalhando arduamente para demonstrar às nações ditas desenvolvidas que
produzimos produtos de excelente qualidade e livres de qualquer mal, visando, com isso, ao
rompimento das barreiras comerciais que tanto prejudicam o setor agropecuário, peça
fundamental para o desenvolvimento” (nas palavras do preclaro Presidente do Superior Tribunal
de Justiça, Ministro NILSON NAVES – SS 1144).

A Administração efetivamente tem se esforçado para erradicar o cancro cítrico do território


nacional. Os agricultores devem também fazer sua parte, posto que a diuturna vigilância por eles
exercida é essencial para se evitar a instalação da praga em suas plantações; aparecendo o
primeiro sinal, indício, não se deve hesitar na adoção das medidas cabíveis, objetivando-se afastar
a infestação da doença.

“A disseminação da doença se dá por meio do vento, água, chuva, veículos, máquinas,


implementos, equipamentos e materiais de colheita, pelo homem e atividade dos pássaros, insetos
e animais, sendo que sobre superfícies transportadores o propágulo da bactéria vai aderindo, dadas
as características da substância aderente que o recobre. A colheita também favorece a
disseminação do cancro cítrico. Em nossa região, com condições climáticas favoráveis à
proliferação da bactéria, o agente vento tem se mostrado importante agente disseminador.”
(Trecho das informações prestadas pelo Diretor do Escritório de Defesa Agropecuária de Dracena
ao Juízo nos autos do mandado de segurança impetrado pelo ora autor – doc. 05).

Obviamente não se pode imputar ao Poder Público a responsabilidade pela


instalação da praga na plantação do autor. Não há a mínima evidência de negligência da
Administração; ao contrário, esta tem trabalhado incessantemente para erradicar o cancro do
território nacional.

Por outro lado, vários proprietários, ao invés de colaborarem com a


Administração, têm impetrado mandados de segurança com o intuito de evitar a erradicação das
plantas contaminadas, o que atrasa a indispensável adoção da citada medida de polícia,
fomentando, assim, a propagação da doença; o próprio autor ajuizou mandado de segurança,
conforme se depreende dos inclusos documentos (nºs 04 a 06).

Os órgãos administrativos estão constantemente agindo e fazendo a sua parte, como é de


conhecimento geral. A preocupação com a citricultura nacional é evidente e os trabalhos de defesa
sanitária têm sido desempenhados com muita dedicação pelos agentes do Ministério da
Agricultura e das Secretarias de Agricultura dos Estados convenentes.

A negligência do autor na implementação de eficazes providências


preventivas e motivos de força maior e caso fortuito são, certamente, as causas da instalação da
doença na sua plantação.

Cabe ressaltar, ainda, que o risco de contaminação por pragas danosas é


inerente à atividade agrícola, inclusive e mormente a citricultura. Assim, os proprietários, quando
deliberam plantar determinada lavoura, já o fazem cientes dos riscos ínsitos à agricultura em geral
– que depende de fatores favoráveis da natureza – e ao produto escolhido; daí por que muitos,
cautelosamente, procedem à contratação de seguro agrícola.

Incabível, destarte, transferir-se ao Poder Público os prejuízos econômicos que o próprio titular do
negócio deve suportar.

É fato notório, na atualidade, a ausência de recursos públicos suficientes para a aplicação em


serviços essenciais à população, tais como, saúde, educação e segurança, o que também colabora
para se constatar a injustiça de se utilizar dinheiro público para indenizar tais situações
decorrentes de lícita atuação estatal.
Também não socorre a pretensão do autor a norma do art. 34 do Regulamento de Defesa Sanitária
Vegetal (Decreto Federal 24.114/34), que reza:
“Entre as medidas adotadas para a erradicação, poderá o Ministério da Agricultura incluir a
destruição parcial ou total de lavouras, arvoredos ou matas contaminadas ou passíveis de
contaminação.
§ 1º - Quando as plantas ou matas, cuja destruição for ordenada, ainda se encontrarem indenes,
ou, embora contaminadas, ainda se mantiverem aptas ao seu objetivo econômico, poderá ser
arbitrada uma indenização ao seu proprietário, baseada no custo de produção e levando-se em
conta a depreciação determinada pela doença ou praga, bem como o possível aproveitamento do
material resultante da condenação.
§ 2º - As indenizações poderão consistir, em parte ou no todo, na substituição das plantas
destruídas por outras sadias e de qualidades recomendáveis para o lugar.
§ 3º - Não terá o proprietário direito à indenização sempre que se apurar que a doença ou praga,
por sua natureza ou grau de intensidade, devesse causar a destruição das plantações ou matas.
§ 4º - Perderá direito à indenização todo o proprietário que houver infringido qualquer dispositivo
do presente regulamento ou das instruções especiais baixadas para a erradicação.” (Grifo nosso).

Primeiro, porque as plantas cítricas do autor já não estavam aptas ao seu


objetivo econômico, uma vez que se encontravam contaminadas pelo cancro que, como cediço,
ocasiona forte queda de produção e inviabiliza a comercialização dos frutos. Os frutos colhidos de
plantações contaminadas não são realmente aceitos no mercado em virtude das lesões nas cascas
que exibem.

Conforme demonstra o incluso documento (doc. 01), das 2.461 plantas


existentes no pomar do autor, 282 apresentavam visíveis sinais de contaminação pela bactéria que
provoca o cancro cítrico; colheu-se, então, amostras dessas 282 plantas para a realização de exame
laboratorial; o resultado da perícia confirmou que as 282 plantas estavam efetivamente
contaminadas. Assim sendo, pelo menos 11,45% do pomar do autor estava comprovadamente
doente, mas certamente o percentual era bem superior, tendo em vista que se analisou,
laboratorialmente, apenas amostras colhidas de plantas visivelmente atingidas pela praga.
Ademais, conhecendo-se a elevada capacidade de disseminação dessa doença (inclusive por
ventos, água, o próprio homem, etc.), é lícito concluir que a plantação já estava completamente
comprometida: a natureza da praga e o grau de intensidade da infestação autorizam inferir que a
plantação já se apresentava inábil ao seu objetivo econômico.

Segundo, porquanto, como se deduz do preceito, o arbitramento de uma


indenização é uma faculdade conferida à União; não se trata, evidentemente, de uma imposição,
uma obrigação legal. A norma apenas autoriza a fixação de indenização, mas a sua efetiva
concessão fica a critério da Administração Federal que tem o poder discricionário para arbitrá-la
ou não. Tal indenização caracteriza inequívoca benesse que poderá ser concedida pelo Poder
Público, de acordo com a disponibilidade de recursos para tal fim (inclusive previsão
orçamentária), com as circunstâncias do caso, enfim consoante um juízo de conveniência e
oportunidade da Administração Federal. Inexiste, pois, em razão dessa disposição normativa,
direito líquido e certo à indenização em favor do autor ou de qualquer outro indivíduo que
suportou a mesma medida de polícia administrativa aqui tratada.

Por fim, porque o autor infringiu a ordem de interdição de seu pomar.

Com efeito, aos 24 de maio de 2000, o Sr. Euclides Lezarine foi surpreendido
pela Fiscalização Volante do Escritório de Defesa Agropecuária de Dracena, no km 219 da
rodovia Euclides Figueiredo (SP 563), município de Dracena, transportando, sem nota fiscal do
produtor e sem permissão de trânsito, 15 caixas de laranja pêra, que declarou ter adquirido do
autor (v. doc. 37 – autos de infração, apreensão e destruição das laranjas).

Ora, conforme se infere do incluso auto (doc. 01 – 4ª folha), a propriedade do


autor foi interditada aos 14 de fevereiro de 2000, de modo que, nos termos do disposto no item
1.1. do Anexo I da Portaria do Ministério da Agricultura nº 291/97 (v. fl. 114), estava proibida a
saída de qualquer material cítrico da mesma.

Tal conduta ilícita afasta eventual possibilidade de concessão de indenização,


nos termos do supratranscrito § 4º do art. 34 do Regulamento de Defesa Sanitária Vegetal.

Ademais, considerando o disposto no item 5.1. do Anexo II da citada Portaria


(“Aos proprietários, arrendatários ou ocupantes a qualquer título de imóveis ou propriedades que
descumprirem suas obrigações e responsabilidade serão aplicadas as medidas de erradicação do
método 1” – v. fl. 118), constata-se claramente que a erradicação das plantas contaminadas e
suspeitas de contaminação pelo cancro cítrico é determinada, também, a título de sanção, nas
hipóteses de perpetração de infração administrativa à legislação de defesa sanitária vegetal e da
campanha nacional de erradicação da praga.

Nessa conformidade e tendo em vista que o autor violou a interdição ao


vender frutas cítricas e permitir a saída delas de sua propriedade, conclui-se que a erradicação de
suas plantas caracterizou, além de limitação administrativa proveniente do exercício do poder de
polícia, efetiva e legítima punição frente ao ilícito que cometeu.

E, como sabido, não se indeniza eventuais prejuízos decorrentes de aplicação


de sanção. Realmente, sendo a imposição de penalidade mera e natural conseqüência do
cometimento de uma infração, é inadmissível reparar eventuais ‘danos’ advindos daquela. Quem
infringe as normas deve suportar a sanção, sem direito a qualquer indenização por supostos
prejuízos acarretados pela aplicação da mesma.

A título de ilustração, observe-se que ninguém ousaria em dizer que uma


pessoa que cometeu uma infração penal teria direito à indenização pelos prejuízos que
experimentou por conta do cumprimento de pena privativa de liberdade. A situação aqui tratada é
semelhante: o autor cometeu infração administrativa e, como sanção, teve seu pomar destruído
pelo Poder Público; dessa forma, nenhum direito à indenização lhe assiste por eventuais danos
patrimoniais e morais decorrentes da medida punitiva de erradicação das plantas cítricas.

Danos patrimonial e moral.


Não fosse suficiente para o decreto de improcedência do pedido inicial o que
até aqui se aduziu, cabe ressaltar, ad argumentandum tantum, que a ausência de danos patrimonial
e moral também impõe tal solução.

Prejuízo material.
Com a devida licença, a erradicação do pomar em si (fato que constitui a
causa de pedir desta ação indenizatória) nenhum prejuízo patrimonial acarretou ao autor.

Isso porque sua plantação já estava irremediavelmente comprometida pela


danosa doença do cancro cítrico, de maneira que não se mostrava mais apta a gerar frutos
comercializáveis licitamente. Diante disso, não se vislumbra qualquer dano econômico suscetível
de ressarcimento.

Outrossim, antes da destruição das plantas cítricas, a propriedade do autor já


se encontrava interditada; e, como a interdição implica na proibição de saída da propriedade de
qualquer material cítrico, constata-se que a comercialização das laranjas já estava obstaculizada
por ato administrativo anterior, o qual não integra a causa de pedir da presente demanda. Portanto,
como o autor já estava impedido de colher e comercializar os frutos de seu pomar, a erradicação
das plantas em si não produziu qualquer prejuízo econômico a ele.

A indenização postulada no item “a” (fl. 16), nessa conformidade, não pode
ser concedida, uma vez que as plantas do autor estavam infectadas pela bactéria do cancro cítrico,
o que já significava definitivo comprometimento do pomar, sendo, pois, indevido qualquer valor
que sirva de base para a promoção de nova plantação.

A pleiteada no item “b” não tem qualquer fundamento e caracteriza situação


de dupla reparação (diante dos pedidos constantes dos itens “a” e “c”) por conta de um mesmo e
único suposto dano patrimonial. Ora, ou se pede a indenização para a promoção de nova plantação
ou para ressarcir-se da depreciação havia no valor de mercado do imóvel. Registre-se, entretanto,
que não houve depreciação; ao contrário, melhor um sítio sem plantação cítrica a um com uma
contaminada pelo cancro.

O pleito do item “c”, da mesma forma, é totalmente inadmissível. Como se


indenizar os frutos que ‘seriam’ colhidos nos próximos vinte anos, se é certo que o pomar do autor
já estava fadado à extinção dado o elevado nível de infestação pela citada praga? Aliás, como se
indenizar tal impossível prejuízo econômico, se, no item “a”, já se pede o ressarcimento para a
promoção de nova plantação?
Como se vê, não houve qualquer seriedade e comedimento na formulação dos
pedidos. Há uma inadmissível sobreposição de pleitos.

Por derradeiro, insta salientar que meras alegações e suposições são


insuscetíveis de firmar a responsabilidade civil do agente. Os danos, para serem passíveis de
reparação, devem ser cabalmente comprovados, o que não se verifica no caso em debate. O dano
jamais pode ser fundado sobre hipótese (dano hipotético ou eventual); deve ser certo, não
bastando, pois, a simples possibilidade de realização do lucro.

Dano moral.
O dano moral, como cediço, jamais pode decorrer de atividade lícita, como é a
hipótese dos autos.

Para que se caracterize dano moral passível de reparação civil, mister que haja
ilegalidade, irregularidade, ou negligência na conduta estatal. A ocorrência dessa espécie de dano
somente é compatível com a responsabilidade subjetiva, fundada na culpa do agente.

Como a destruição das plantas cítricas do autor foi inquestionavelmente


praticada com base e por determinação das normas jurídicas aplicáveis à espécie, não há que se
admitir a reparação de pretenso dano moral ‘causado’ por legítima atuação do Poder Público.

Ademais, da narração dos fatos constante da petição inicial e dos elementos de


convicção reunidos nos autos não se dessume qualquer efetivo abalo moral ou psíquico que teria
experimentado o autor em razão do evento em debate. Da própria narrativa inaugural não há como
se extrair um prejuízo moral que demande ou mereça reparação, mormente em face da ausência de
um concreto resultado lesivo.

O que determina se um dano moral é ou não indenizável é o resultado que do


ato dimana; não é o dano jurídico em si que dirá se ele é reparável, mas sim os concretos efeitos
que tal dano provoca. E, in casu, o autor não conseguiu revelar qualquer conseqüência prejudicial,
no campo moral, que da erradicação de seu contaminado pomar em si (ato estatal) adveio.
Inexiste nos autos qualquer elemento de prova que ateste a caracterização de
dano moral suscetível de indenização.

O Desembargador e Professor Carlos Roberto Gonçalves, em seu livro “Direito das Obrigações,
Parte Especial, Responsabilidade Civil” (Editora Saraiva, 2ª edição, 2002, p. 93), sobre a
caracterização do dano moral, assevera:
“Tem-se tornado tormentosa na jurisprudência, por falta de critérios objetivos, a tarefa
de traçar os contornos, os limites e a extensão do dano moral, para saber quais fatos
configuram ou não o dano moral. Para evitar excessos e abusos, recomenda Sérgio
Cavalieri, com razão, que só se deve reputar como dano moral “a dor, vexame,
sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no
comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e
desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou
sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de
fazerem parte da normalidade no nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os
amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto
de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo” (Programa de responsabilidade civil,
2. ed., São Paulo, Malheiros Ed., p. 78).”

Observe-se, ademais, que do evento em debate não resultou qualquer lesão


dos bens que integram os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a
imagem, o bom nome etc. (art. 5º, inciso X, da Constituição Federal).

É nessa conformidade, preclaro Magistrado, que se verifica que o autor não


sofreu qualquer real abalo moral ou psíquico, que, juridicamente, imponha uma reparação civil.

Conclusão.

Diante de todo o exposto, requer o Estado de São Paulo seja reconhecida a sua
ilegitimidade para figurar no pólo passivo deste processo, ou, caso assim não se entenda, o que se
admite apenas para argumentar, seja a ação julgada improcedente (ao menos em relação a si),
condenando-se o autor, em qualquer hipótese, ao pagamento dos ônus da sucumbência,
especialmente dos honorários advocatícios.

Requer, ainda, a juntada dos inclusos documentos (v. relação em anexo) e a


produção de todos os demais meios de provas em direito admitidos.

Termos em que,
P. Deferimento.

Tupã, 06 de dezembro de 2002.

Thiago Pucci Bego


Procurador do Estado
OAB/SP 153.530
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO
PROCURADORIA FISCAL
UT I / PF 12

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA MM. 5ª VARA


DA FAZENDA PÚBLICA.

Processo n. 192/ 053.03.003490-9


Autora: BRASWEY S/A INDÚSTRIA E COMÉRCIO .

A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por seu procurador infra assinado, nos
autos em epígrafe, vem respeitosamente à presença de V. Exa., citada aos 25/03/03 por
força de r. mandado expedido aos 18/03/03, apresentar tempestivamente sua
contestação, esteada nos motivos a seguir elencados:

I DA INICIAL

Cuida-se de ação em que se postulou a anulação do AIIM - AUTO DE INFRAÇÃO E


IMPOSIÇÃO DE MULTA n. 473103 série A lavrado aos 28/04/98 diante da infração
pela contribuinte, do disposto nos artigos 12 incisos do RICMS (Lei 6606/89 com a
redação outorgada pelas Leis 7002/90, 7644/91, 8490/93, 9459/96), implicando na
multa prevista no artigo 17 parágrafos 1º e 2º , 18 inciso I c/c parágrafo 1º e artigo 20
parágrafo 2º da Lei 6609/89 com a redação outorgada pelas Leis 7002/90, 7644/91,
8490/93, 9459/96..
Alegou, basicamente, ser improcedente o AIIM pois segundo sua ótica, não incidiria o
IPVA sobre aviões, de onde sua conclusão segundo a qual, deveriam ser anulados os
lançamentos fiscais decorrentes dos autos de infração indigitados.

II NECESSIDADE DE DEPÓSITO PRÉVIO

Preliminarmente, anote-se que a teor do Art. 38 “caput” da Lei n. 6830/80 (Execução


Fiscal), só é possível a discussão judicial da dívida ativa da Fazenda Pública, quando
em sede de ação anulatória do ato declarativo da dívida, “...precedida do depósito
preparatório do valor do débito, monetariamente corrigido e acrescido dos juros e
multa de mora e demais encargos” (SIC).

Tal depósito não foi efetivado, configurando a ausência de pressuposto de constituição


e de desenvolvimento válido e regular do processo, causa extintiva inarredável ( Art.
267 - VI - CPC).

A pensar-se inversamente, criadas restarão as condições para a propositura de


execução fiscal, passando a correr duas demandas distintas, donde a
imprescindibilidade do depósito. De fato, o depósito integral do débito, na ação
anulatória ou na declaratória negativa de débito fiscal tem por consequência transferir
para essas demandas, o debate acerca do débito (JTJ 167/83), a ponto de “...Uma vez
proposta ação anulatória de débito fiscal, com o depósito do valor questionado, é
defeso à Fazenda Pública ajuizar execução fiscal”( RSTJ 20/308).

III OS FATOS

Como já visto, a Autora agiu sem respeito aos pertinentes dispositivos legais. Ato
contínuo, foi lavrado AIIM - AUTO DE INFRAÇÃO E IMPOSIÇÃO DE MULTA,
pois obviamente presente a infração pela contribuinte, conforme capitulado no aludido
AIIM. Destaca-se: não houve negativa na inicial, acerca dos fatos descritos nos autos
de infração.

IV O AUTO DE INFRAÇÃO ESTÁ CORRETO

Não alegada qualquer discordância quanto aos fatos descritos no AIIM, verificou-se
finalmente correta a capitulação encetada pelo Fisco.

Tampouco mostraram-se incorretos os valores ou as imposições presentes no AIIM,


mera concretização dos fatos averiguados em confronto com as normas que regem a
espécie.
A reforçar a certeza acerca da exatidão dos autos, observa-se que administrativamente,
a Autora não alcançou com sua defesa o sucesso que almejava, vista a regulamentar
confirmação das imposições.

A respeito do tema debatido , é inescapável a lembrança da conclusão alcançada por


CLÁUDIA BOCARDI ALEGRETTI e GEORGIA GRIMALDI DE SOUZA BONFÁ
ao defenderem sua tese A COBRANÇA DO IPVA NAS AERONAVES. Concluíram:

" De tudo quanto restou exposto, é indubitável que, a cobrança do imposto estadual
sobre propriedade de veículo automotor – IPVA incidente sobre aeronaves encontra-
se devidamente fundada no ordenamento jurídico pátrio, estando, perfeitamente claro
e delineado com sua previsão pela Constituição Federal e legislação ordinária.

Não há, pois, qualquer razão de fato e de direito na tentativa dos contribuintes de
exonerarem-se do cumprimento da exação fiscal.

Com efeito, a Constituição Federal ao atribuir aos Estados a competência para


legislar sobre veículos automotores não restringiu a veículos terrestres, não podendo,
pois, a carta suprema, ser interpretada naquilo que não dispôs.

Assim, após a breve explanação que visou uma abordagem de um tema delicado,
gerador de acirrada polêmica, concluímos que o IPVA incide na propriedade de
aeronaves, em 1º lugar porque previsto na Lei Estadual Paulista 6606/89, em seu
artigo 6º, III, lei esta que nada tem de inconstitucional, a uma porque editada pelo
Estado no exercício de sua competência atribuída pela Constituição Federal e, a
duas, porque nem a Carta Magna, nem a lei estadual, restringiu seu alcance para
abarcar em seu conteúdo apenas os veículos terrestres."

VI

Conveniente a lembrança do desenvolvimento lógico percorrido pelas citadas


professoras, que a partir da previsão pela Emenda Constitucional n.º 27, de 28 de
novembro de 1985, com vigência a partir de 1º de janeiro de 1.986, que acrescentou o
inciso III ao artigo 23 da Constituição de 1967, de acordo com a Emenda
Constitucional n.º 1, de 1969, observaram que o Estado de São Paulo editou a Lei n.º
4.955, de 27 de dezembro de 1985, instituidora do imposto sobre os veículos
automotores, regulamentada, posteriormente, pelo Decreto n.º 24.804, de 04 de março
de 1986.

Fato gerador, base de cálculo e contribuintes (sujeito ativo e passivo), para a cobrança
do imposto foram definidos pela Lei n.º 4.955/85 (recepcionada pela atual
Constituição Federal), encontrando-se no Decreto 24804/86 (artigo 1º, parágrafo
único, item 14) a previsão relativa às aeronaves, gravadas pelo IPVA, não existente
inconstitucionalidade na cobrança do imposto, em face da ausência de Lei
Complementar exigida pelo artigo 146, inciso III, "a", da Constituição Federal de
1.988, dado o caráter nacional das normas gerais em matéria de legislação tributária e
diante da desnecessidade de Lei Complementar para a cobrança de IPVA nas
aeronaves, na exata compreensão do disposto no artigo 24 da Constituição Federal ,
diga-se.

A partir de sua singela dicção, verifica-se que qualquer lei ordinária, editada pelos
Estados-membros, que viesse regular o IPVA, independeria, num primeiro momento,
de lei complementar, posto que o artigo 34 do ADCT, em seus parágrafos, atribuiu
competência aos Estados - membros para promulgar as leis necessárias à aplicação
do sistema tributário nacional. São palavras das mencionadas professoras.

E nessa ótica, vê-se que o Estado de São Paulo, ao promulgar a Lei 6.606/89, apenas
exercitou a competência prevista no art. 24, I, explicitada no parágrafo 3º desse
dispositivo da Constituição Federal, confirmada no art. 34 parágrafos 3º e 4º do
ADCT.

Perceba-se, o artigo 155, inciso I, alínea "c" da Constituição Federal conferiu aos
Estados-membros competência para instituir e cobrar imposto sobre a propriedade de
veículos automotores, válido recordar ALIOMAR BALEEIRO, ao comentar o artigo
6º do Código Tributário Nacional: "a pessoa de Direito Público Interno competente
para decretar um tributo também é competente para a ‘legislação plena’ sobre o
mesmo, desde que qualquer delas não contrarie a Constituição Federal. O dispositivo
está em harmonia com os artigos 13, § 1º e 15 da C.F. Todavia, os Estados ainda
estão adstritos à observância não só de suas Constituições, mas também das normas
gerais federais." (Direito Tributário Brasileiro, pg. 67, 10ª edição)

No exercício dessa competência plena, o Estado de São Paulo deu luz à Lei n.º 6.606,
de 20/12/1989 (o art. 6º, III estabeleceu a cobrança de imposto sobre a propriedade de
aeronaves, adotando como base de cálculo o seu valor venal, segundo o ano de sua
fabricação e seu peso máximo de decolagem) , posteriormente alterada pelas leis n.º
7.002, de 27/12/1990, 7.644, de 23/12/1991, 8.052, de 07/10/92, 8.205, de 29/12/92 e
8.490, de 23/12/93, e seguintes, fixadas a hipótese de incidência do tributo, o
contribuinte, a base de cálculo e as alíquotas.

Acrescente-se, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL reconheceu a


constitucionalidade da disciplina do IPVA por meio de lei local (2ª Turma do
STF,AgRg em Ag.167.777-5-SP, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, julgado em
04/03/97, publicado no “REPERTÓRIO IOB DE JURISPRUDÊNCIA “, 1ª Quinzena
de Julho de 1997, n.º 13/97, Cad.1, pág.298): Imposto sobre Propriedade de Veículos
Automotores – Disciplina. Mostra-se constitucional a disciplina do Imposto sobre
Propriedade de Veículos Automotores mediante norma local. Deixando a União de
editar normas gerais, exerce a unidade da federação a competência legislativa plena –
parágrafo 3º do artigo 24, do corpo permanente da Carta de 1988 -, sendo certo que,
com a entrada em vigor do sistema tributário nacional, abriu-se à União, aos Estados,
ao Distrito Federal e aos Municípios, a via da edição de leis necessárias à respectiva
aplicação – parágrafo 3º do artigo 34 do Ato das Disposições Constitucionais
Transitórias da Carta de 1988”.

Colhe-se ainda no mesmo parecer, enfoque pertinente à natureza jurídica das


aeronaves, a partir de definição de JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, para quem veículo
automotor "é o impulsionado por maquinismo interno, com fabricação e circulação
autorizadas, servindo para o transporte de pessoas, bens ou produtos, de natureza
terrestre, hídrica ou aérea", a corroborar a conclusão de que a lei paulista
dispõe sobre a incidência do tributo na propriedade de veículo automotor de qualquer
espécie, não fazendo distinções.

Ainda no aludido parecer colhe-se pesquisa jurisprudencial, obtendo-se significativo


resultado: É legítima a cobrança de Imposto instituído sobre aeronave, tendo como
hipótese de incidência a propriedade desse veículo, e como base de cálculo o valor
venal, estabelecido segundo o ano de sua fabricação e seu peso máximo de decolagem
, pois tais critérios são objetivos, restando respeitados, desse modo, o princípio da
capacidade econômica do contribuinte e o da isonomia." (apelação cível n.º 187.525-
2/3, relator o Desembargador GILDO DOS SANTOS, 11ª Câmara Cível do Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo, votação unânime)

VII

Após esse brevíssimo escorço, a Fazenda do Estado pede vênia para transcrever na
íntegra o referido Parecer. Trata-se de profundo estudo jurídico, trabalho que esgota o
tema e cujas razões são com acato aqui invocadas. Eis o rigoroso trabalho:
A COBRANÇA DO IPVA NAS AERONAVES

Cláudia Bocardi Alegretti


Georgia Grimaldi de Souza Bonfá
Procuradoras do Estado de São Paulo

I. Introdução

Trata-se de tese que visa trazer a debate a experiência paulista na questão da


incidência de IPVA sobre aeronaves posto que, inobstante a clareza das normas
que regem a matéria tanto constitucionais como a legislação infra-constitucional,
há uma resistência no pagamento do referido imposto por parte dos proprietários
dos referidos veículos automotores.

Assim, a presente tese busca apontar os principais argumentos contrários à


cobrança do imposto estadual além de defender tal cobrança que cada vez mais
toma contornos sociais.

II. Breve relato histórico

O IPVA não foi instituído pela Constituição de 1988.

Veio a lume com a Emenda Constitucional n.º 27, de 28 de novembro de 1985,


com vigência a partir de 1º de janeiro de 1.986, que acrescentou o inciso III ao
artigo 23 da Constituição de 1967, de acordo com a Emenda Constitucional n.º
1, de 1969, verbis:

“Art. 23 – Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:


III – propriedade de veículos automotores, vedada a cobrança de impostos e
taxas incidentes sobre a utilização de veículos.”

Em face deste permissivo constitucional, o Estado de São Paulo editou a Lei nº


4.955, de 27 de dezembro de 1985, que instituiu o imposto sobre os veículos
automotores, regulamentada, posteriormente, pelo Decreto nº 24.804, de 04 de
março de 1986.

A Lei n.º 4.955/85 definiu, pois, o fato gerador, a base de cálculo e os


contribuintes (sujeito ativo e passivo), para a cobrança do imposto. O Decreto
supra mencionado, já no seu artigo 1º, parágrafo único, item 14, foi bastante
claro ao prever as aeronaves como também gravadas pelo IPVA.

É necessário ressaltar, preambularmente, que a referida Constituição então


vigente, não exigia que os tributos tivessem tais elementos definidos por Lei
Complementar.

Efetivamente, à época, não se chegou a levantar nenhuma objeção quanto à


inconstitucionalidade da mencionada lei, pois o parágrafo 1º do artigo 18 da
Constituição de 1967 determinava:

“Art. 18 - ...

§ 1º - Lei Complementar estabelecerá normas gerais de direito tributário, disporá


sobre os conflitos de competência nessa matéria entre a União, os Estados, o
Distrito Federal e os municípios, e regulará as limitações constitucionais ao
poder de tributar.”

O texto constitucional não determinava qual seria a área de atuação das normas
gerais, entendendo-se que haveria necessidade de lei complementar dispor
sobre fato gerador, base de cálculo e contribuinte, sendo que estes conceitos
gerais estavam previstos no Código Tributário Nacional, considerado, sem
qualquer controvérsia, lei complementar, bem como sobre os conflitos de
competência e limitações constitucionais ao poder de tributar.

Porém, não foi previsto o fato gerador, a base de cálculo e o contribuinte do


IPVA pela referida norma, até porque o Código Tributário Nacional é anterior à
Emenda Constitucional n.º 27/85, que criou o IPVA.

É bom que se diga neste momento que a lei 4.955/85, fruto do exercício de
competência legislativa plena nos termos do artigo 6º do Código Tributário
Nacional, foi completamente recepcionada pela atual Constituição Federal de
1988.[1]

Tanto é assim que continuou em vigor, por mais de um ano, após a promulgação
da Carta Magna, até ser editada a atual lei (de nº 6.606/89) e, já nesta época,
não havia lei complementar que fosse recepcionada pela Constituição de 1988
para atender a regra da alínea a, do inciso III, do artigo 146, isto é, a existência
de lei complementar que estabeleça o fato gerador, a base de cálculo e os
contribuintes.

III. Modelo atual

Com a promulgação da Constituição de 1988, foi dado um novo enfoque ao


IPVA.

A Lei Maior, no Título IV, Capítulo I, que trata “Do Sistema Tributário Nacional”,
em sua Seção IV, que dispõe a respeito “Dos Impostos dos Estados e do Distrito
Federal”, na alínea c, do inciso I, do artigo 155, estabelece sobre o IPVA:

“Art. 155 – Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir:

I – impostos sobre:
...
c – propriedade de veículos automotores.”

A Emenda Constitucional n.º 3, de 1993, alterou a redação do artigo 155 da


Constituição, mas não o conteúdo, no que diz respeito ao IPVA, que agora está
previsto no inciso III do mesmo artigo.

Atualmente, no Estado de São Paulo, é a Lei Estadual n.º 6.606, de 20 de


dezembro de 1989, promulgada em 21 de dezembro de 1989, surtindo efeitos a
partir de 1º de janeiro de 1990, que trata da matéria.

A exigência do imposto sobre a propriedade de aeronaves, com base na Lei nº


6.606/89, é respaldada pelo inciso III do artigo 6º, o que será mais adiante
pormenorizado, que dispõe:

“ Para efeito de lançamento, quanto a veículo usado, a Secretaria da Fazenda


estabelecerá tabela de valores venais, levando em conta:
...
III. em relação a aeronaves: peso máximo de decolagem e ano de fabricação.”

IV – Ausência de inconstitucionalidade na cobrança do imposto, em face da


ausência de Lei Complementar exigida pelo artigo 146, inciso III, "a", da
Constituição Federal de 1.988.
a) Caráter nacional das normas gerais em matéria de legislação tributária

Preliminarmente, nunca é demais lembrar que o reconhecimento da isonomia


das pessoas constitucionais é corolário dos princípios federativo, da autonomia
municipal e da autonomia distrital.

Tal princípio, ainda que implícito, é uma realidade na compostura normativa


brasileira.

Da desigualdade política existente entre os entes da federação, não decorre a


desigualdade jurídica. De fato, indiscutivelmente em que pese a maior extensão
e complexidade de atribuições acometida a União, não se pode inferir pela sua
supremacia, em face dos Estados-membros, do Município e do Distrito Federal.

Assim, não se pode concluir que existam níveis de governo, o que pressupõe
uma subordinação hierárquica. As relações entre as pessoas constitucionais se
caracterizam por um tratamento isonômico, já que toda lei federal, estadual, ou
municipal busca seu fundamento de validade diretamente na Constituição
Federal.

No dizer de José Souto Maior Borges, “a igualdade jurídica não significa


identidade de atribuições constitucionalmente fixadas para a União, Estados-
membros e Municípios, mas tão-só que essas atribuições, embora diversas,
correspondem todas a enunciados de competência, postos em atuação mediante
princípios e normas estabelecidos na própria Constituição Federal.” [2]

Não há, pois, hierarquia entre as normas emanadas da União, Estados-


membros, Municípios e Distrito Federal, já que, dado o rígido critério de
repartição de competências, todas elas buscam sua validade no texto
constitucional.

Tais considerações preliminares são de suma importância para a análise da


previsão constitucional das normas gerais em matéria tributária através de lei
complementar, retratada no artigo 146 da Constituição Federal.

Isto porque a lei complementar veiculadora de tais normas gerais, que tem por
emissora a União, através do Congresso Nacional, assume foros nacionais,
vinculando Estados-membros, Municípios e Distrito Federal.
A lei complementar sob exame, embora promanada do legislativo federal, sendo
posta no ordenamento jurídico pelos órgãos da União, assume o caráter de lei
nacional, subordinando as pessoas políticas de direito constitucional interno. É o
que defende Sacha Calmon Navarro Coelho[3].

Destarte, para o ilustre jurista[4], as normas gerais de direito tributário,


veiculadas através de leis complementares, são nacionais, eis que eficazes em
todo o território nacional, se dirigindo aos legisladores das três ordens de
governo da federação.

b) Desnecessidade de Lei Complementar para a cobrança de IPVA nas


aeronaves

Muitos contribuintes no Estado de São Paulo ingressaram com demandas


visando exonerar-se ao pagamento de IPVA, sob o fundamento de que para a
sua instituição, seria necessária a edição prévia de lei complementar, nos termos
do que preceitua o art. 146, III, “a” da Constituição Federal. Ora, como não foi
editada lei complementar para definir o fato gerador, a base de cálculo e o
contribuinte do IPVA, o Estado estaria impedido de criar e cobrar o tributo.

A análise do Texto Magno é suficiente para infirmar tal afirmação. De fato, o


artigo 24 do Texto Constitucional é claro ao preceituar que:

"art. 24 - Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar


concorrentemente sobre:

I - direito tributário...;
...
§ 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui
a competência suplementar dos Estados.
§ 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a
competência legislativa plena, para atender as suas peculiaridades."

O artigo sob exame alberga, em seus parágrafos, a chamada competência


suplementar, a qual permite que os entes federados ali referidos suplementem a
competência federal não exercida. Externa, outrossim, a faculdade de
estabelecer normas que explicitem o conteúdo de princípios ou normas gerais ou
que supram a ausência ou omissão destes.
JOSÉ AFONSO DA SILVA, sempre lembrado, analisando o dispositivo, observa:

"Não é, porém, por que não consta na competência comum que Estados e
Distrito Federal (este não sobre polícia militar, que não é dele) não podem
legislar suplementarmente sobre esses assuntos. Podem e é de sua
competência fazê-lo, pois que, nos termos do § 2º do art. 24, a competência da
União para legislar sobre normais gerais não exclui (na verdade até pressupõe) a
competência suplementar dos Estados (e também do Distrito Federal, embora
não se diga aí), e isso abrange não apenas as normas gerais referidas no § 1º
desse mesmo artigo no tocante à matéria neste relacionada, mas também as
normas gerais indicadas em outros dispositivos constitucionais, porque
justamente a característica da legislação principiológica (normas gerais,
diretrizes, bases), na repartição de competências federativas, consiste em sua
correlação com competência suplementar (complementar e supletiva) dos
Estados."[5] (grifos do autor)

Complementam a matéria os § 3º e § 4º do art. 34 do Ato das Disposições


Constitucionais Transitórias:

"Art. 34 - O sistema tributário nacional entrará em vigor a partir do primeiro dia


do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, mantido, até então,
o da Constituição de 1967, com as redações dada pela Emenda nº 1, de 1969,
e pelas posteriores.

§ 3º - Promulgada a Constituição, a União, os Estados, o Distrito Federal e os


Municípios poderão editar as leis necessárias à aplicação do sistema tributário
nacional nela previsto.

§ 4º - As leis editadas nos termos do parágrafo anterior produzirão efeitos a


partir da entrada em vigor do sistema tributário nacional, previsto na
Constituição."

A partir de sua singela dicção, verifica-se que qualquer lei ordinária, editada
pelos Estados-membros, que viesse regular o IPVA, independeria, num primeiro
momento, de lei complementar, posto que o artigo 34 do ADCT, em seus
parágrafos, atribuiu competência aos Estados - membros para promulgar as leis
necessárias à aplicação do sistema tributário nacional.

A propósito, o brilhante jurista SACHA CALMON COELHO NAVARRO expõe


com proficiência, ao comentar as contribuições sociais inscritas no art. 195 da
CF:

"Mas para nós a inexistência de lei complementar não pode obstar o exercício da
competência impositiva das Pessoas Políticas, eminentemente constitucional.
Assim, Estados e Municípios podem, mesmo sem Lei Complementar, instituir as
contribuições do art. 149, parágrafo único da CF, e a União, as contribuições
sociais do art. 195 da Carta. O Congresso, por inação, não pode paralisar o
exercício da tributação pelas pessoas políticas . . .
A Constituição, para finalizar, contém regra expressa no art. 34, parágrafo 3º do
Ato das Disposições Transitórias, autorizando a União, os Estados e os
Municípios a editar as leis necessárias à instituição do sistema tributário, no
âmbito das respectivas competências. Logo a União, mesmo sem lei
complementar e normas gerais, pode veicular tributos e, em especial,
contribuições sociais por leis ordinárias." [6]

De tudo quanto restou exposto, verifica-se que o Estado de São Paulo, ao


promulgar a Lei 6.606/89, apenas exercitou a competência prevista no art. 24, I,
explicitada no parágrafo 3º desse dispositivo da Constituição Federal,
confirmada outrossim, no art. 34 parágrafos 3º e 4º do ADCT.

Ora, o artigo 155, inciso I, alínea "c" da Constituição Federal conferiu aos
Estados-membros competência para instituir e cobrar imposto sobre a
propriedade de veículos automotores.

E instituir o imposto, como se sabe, é fixar na lei a hipótese de incidência, os


sujeitos da obrigação tributária, a base de cálculo e as alíquotas. É o que
caracteriza a já mencionada legislação plena exposta no referido artigo 6º do
Código Tributário Nacional.

Como preleciona o saudoso mestre ALIOMAR BALEEIRO, ao comentar o artigo


6º, do Código Tributário Nacional:

"a pessoa de Direito Público Interno competente para decretar um tributo


também é competente para a ‘legislação plena’ sobre o mesmo, desde que
qualquer delas não contrarie a Constituição Federal. O dispositivo estã em
harmonia com os arts. 13, § 1º e 15 da C.F. Todavia, os Estados ainda estão
adstritos à observância não só de suas Constituições, mas também das normas
gerais federais."[7]

E mais ainda: "a ‘legislação plena’ desde que não viole expressa ou
implicitamente a Constituição Federal ou as normas gerais de Direito Financeiro
da União, pode regular o quantum do tributo, a época e a forma do pagamento, a
competência administrativa dos órgãos e repartições que o devam lançar,
cobrar, fiscalizar, etc..., enfim todos os pormenores impróprios daquelas normas
gerais ou por elas não previstos. No silêncio delas, a norma geral do Estado tem
caráter supletivo (....) . A ênfase na adjetivação – “plena” - quer significar que não
há outras limitações ao legislador, senão aquelas de ordem constitucional....".[8]

Ora, no exercício desta competência plena o Estado de São Paulo expediu a Lei
nº 6.606, de 20/12/1989, posteriormente alterada pelas leis nºs. 7.002, de
27/12/1990, 7.644, de 23/12/1991, 8.052, de 07/10/92, 8.205, de 29/12/92 e
8.490, de 23/12/93, e seguintes. Referida lei fixou a hipótese de incidência
do tributo, o contribuinte, a base de cálculo e as alíquotas.

Inegavelmente a autonomia dos Estados-membros pela Carta Política de 1988


restou fortalecida, na medida em que não só se preocupou em conferir-lhes a
competência concorrente e suplementar, como também em atribuir-lhes,
expressamente, a competência plena, na ausência de lei federal sobre normas
gerais.

O objetivo do legislador constituinte é claro: visou garantir, desde logo, a tais


pessoas políticas, o exercício de suas competências tributárias já no exato
momento da entrada em vigor do novo sistema tributário nacional.

Aliás, a este propósito, o notável SACHA CALMON NAVARRO COELHO,


acentua que:

"... se diante do art. 146, III, "a" não edita o Congresso Nacional lei
complementar a respeito do fato gerador, base de cálculo e contribuintes de
dado imposto discriminado na CF? Fica a pessoa política titular da competência
paralisada pela inação legislativa? A resposta é negativa. É o caso de se dar
aplicação ao art. 24 e §§ 1º a 4º."[9]

Ademais, como reforço de argumentação, em que pesem as abalisadas opiniões


em contrário[10], saliente-se que o artigo 146 da Constituição Federal, em
nenhum momento, pela sua própria localização no texto constitucional,
determinou a necessidade de lei complementar para a cobrança deste ou
daquele tributo, eis que se limitou a explicitar o campo material da lei
complementar, vale dizer, quais as matérias que podem ser objeto de lei
complementar como pressuposto de sua própria validade.

Ora, nem a Constituição nem a Lei Complementar instituem tributos. O que se


contém na Constituição da República é apenas uma previsão genérica de
incidências e uma repartição de competência tributárias entre os entes
federados, atribuindo a estes a competência, ou seja, a autorização
constitucional para instituir e exigir os tributos na feição com que lhes foram
reservados.

Paulo de Barros Carvalho é adepto a esta corrente doutrinária. Para ele, a única
interpretação possível do art. 146 é aquela que prevê sejam estatuídas, por lei
complementar, normas gerais de direito tributário, que dizem respeito às
limitações ao poder de tributar e aos conflitos de competência. Ou seja, o
conteúdo das normas gerais não é outro a não ser esse. O dispositivo
constitucional ora tratado pode ser considerado, então, redundante. [11]

Sustenta que o legislador complementar, invocando a disposição do art. 146, III,


“a”, pode definir um tributo e suas espécies, bem como mexer no fato gerador,
na base de cálculo e nos contribuintes de determinado imposto, ou ainda dispor
sobre obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários, desde
que seja para dispor sobre conflitos de competência.[12]

Aliomar Baleeiro assevera, com propriedade, que a norma geral de Direito


Financeiro não decreta tributo, nem lhe fixa a alíquota. Tal cabe à lei ordinária da
pessoa de Direito Público competente para instituí-lo.[13]

E, Roque Carrazza, de forma brilhante, sustenta que as normas gerais em


matéria de legislação tributária só podem explicitar o que está implícito na
Constituição. Indo além, ela estaria transgredindo os princípios constitucionais já
referidos. [14]

Sendo assim, a Lei Maior, com relação ao IPVA, tratou de definir com precisão o
padrão de incidência do imposto, ou seja, a propriedade de veículo automotor
(art. 155, I, "c").

E a Lei estadual n.º 6.606/89 em nada desbordou dos parâmetros tratados no


Texto Magno, ao instituir o IPVA, estabelecendo, como lhe competia, o fato
gerador do tributo, a respectiva base de cálculo, a definição dos contribuintes do
imposto e demais aspectos da exação.
Da simples leitura da lei estadual, patente está que a mesma se conteve
exatamente nos exatos limites tratados pela Lei.

Com apoio nessa regra constitucional, o Estado de São Paulo editou a Lei
6.606/89 que, em seu art. 6º, III, estabeleceu a cobrança de imposto sobre a
propriedade de aeronaves, adotando como base de cálculo o seu valor venal,
segundo o ano de sua fabricação e seu peso máximo de decolagem.[15]

Por isso, o IPVA tem como fato gerador a propriedade de veículo automotor de
qualquer espécie, o que abrange as aeronaves, os veículos terrestres e as
embarcações.

Ademais, bastante elucidativa a decisão da Suprema Corte reconhecendo a


constitucionalidade da disciplina do IPVA por meio de lei local, como se extrai do
acórdão unânime proferido pela 2ª Turma do STF,AgRg em Ag.167.777-5-SP,
Rel. Min. MARCO AURÉLIO, julgado em 04/03/97, publicado no “REPERTÓRIO
IOB DE JURISPRUDÊNCIA “, 1ª Quinzena de Julho de 1997, n.º 13/97, Cad.1,
pág.298:

“IPVA – NORMA LOCAL – CF/88 – CONSTITUCIONALIDADE


...
Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores – Disciplina. Mostra-se
constitucional a disciplina do Imposto sobre Propriedade de Veículos
Automotores mediante norma local. Deixando a União de editar normas gerais,
exerce a unidade da federação a competência legislativa plena – parágrafo 3º do
artigo 24, do corpo permanente da Carta de 1988 -, sendo certo que, com a
entrada em vigor do sistema tributário nacional, abriu-se à União, aos Estados,
ao Distrito Federal e aos Municípios, a via da edição de leis necessárias à
respectiva aplicação – parágrafo 3º do artigo 34 do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias da Carta de 1988”.

Por todas estas considerações, sustentamos não há qualquer fundamento, quer


constitucional, quer legal, na alegação de inconstitucionalidade da cobrança de
IPVA sobre as aeronaves, ante a ausência de lei complementar prevista no
artigo 146, inciso III, letra “a”, da Carta Suprema.

V. Outro enfoque: natureza jurídica das aeronaves

a) A expressão veículo automotor


O artigo 1º da Lei Paulista 6.606/89 assim dispõe:

“Artigo 1º - O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA,


devido anualmente, tem como fato gerador a propriedade de veículo automotor
de qualquer espécie. (...)”

O vocábulo VEÍCULO possui sua origem no latim vehicùlum, sendo empregado


para traduzir qualquer meio utilizado para transportar ou conduzir pessoas,
animais ou coisas de um lugar para outro , é, em suma, qualquer coisa capaz de
conduzir algo.

Já o vocábulo AUTOMOTOR se refere a todo aquele que “se move por si só”, é
tudo aquilo que se move com propulsão própria, segundo Aurélio Buarque de
Holanda Ferreira.

Desta maneira, podemos afirmar que veículo automotor é aquele que transporta
com movimento próprio, é o que se move mecanicamente, sem intervenção de
força exterior, sendo que em nenhuma das definições houve qualquer menção a
uma eventual limitação espacial, quer terrestre, aérea ou hídrica.

Neste momento, destaca-se a precisa definição de JOSÉ CRETELLA JÚNIOR,


veículo automotor "é o impulsionado por maquinismo interno, com fabricação e
circulação autorizadas, servindo para o transporte de pessoas, bens ou produtos,
de natureza terrestre, hídrica ou aérea" (Sem grifos no original).[16]

Esclarecedora a lição do renomado professor, que nos permite concluir que o


IPVA incide tanto na propriedade de veículos terrestres, quanto aeronaves e
embarcações, com propulsão própria.

Vale transcrever a conclusão de Parecer elaborado, em 18 de setembro de 1995,


pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional em resposta à consulta da
Comissão Técnica Permanente do ICMS - COTEPE/ICMS, vinculada ao
Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ sobre a possibilidade de
estender a tributação do IPVA às embarcações e aeronaves :

" .....De todo o exposto concluímos que, do ponto de vista estritamente jurídico,
nenhum óbice de natureza constitucional ou infraconstitucional impede que
Estados e Distrito Federal criem ou instituam normas tributárias que incidam
sobre a propriedade ou utilização de veículos automotores que sirvam ao
transporte em vias terrestres, hídricas ou aéreas".

Mencionado Parecer foi assinado pelo Procurador de Assuntos Tributários além


do Sr. Procurador -Geral da Fazenda Nacional e o Coordenador de Assuntos
Financeiros e Tributários vinculado ao Ministério da Fazenda.

Desta forma, temos que a própria esfera administrativa federal, há muito,


reconhece a incidência de IPVA sobre a propriedade de veículos automotores
aéreos e hídricos.

Inconcebível interpretação divergente pois a lei paulista é cristalina e dispõe


sobre a incidência do tributo na propriedade de VEÍCULO AUTOMOTOR DE
QUALQUER ESPÉCIE.

Porém, quanto aos veículos automotores terrestres não há qualquer levante


popular quanto à descrição do fato gerador, no entanto, no que se refere aos
veículos automotores aéreos e hídricos, mais comumente nomeados de
aeronaves e embarcações há uma resistência ao seu pagamento sendo a
questão levada diretamente ao Poder Judiciário, exatamente com a intenção de
se eximir da obrigação tributária.

Merece destaque a recente decisão, não unânime, do Colendo Supremo Tribunal


Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 134.509 -AM, que entendeu
que as embarcações não estão compreendidas na competência dos Estados e
do Distrito Federal para instituir impostos sobre a propriedade de veículos
automotores, pois esta norma só autoriza a incidência de tributo sobre os
veículos de circulação terrestre.

O Ministro MARCO AURÉLIO, relator, com voto vencido, entendeu que a


Constituição ao prever o imposto sobre a propriedade de veículos automotores,
não limita sua incidência aos veículos terrestres, abrangendo inclusive, aqueles
de natureza hídrica ou aérea. Cumpre a transcrição de trecho do n. voto:

“ Por outro lado, não se pode introduzir no dispositivo constitucional limitação


que nele não se contém. A incidência abrange a propriedade de todo e qualquer
veículo, ou seja, que tenha propulsão própria e que sirva ao transporte de
pessoas e coisas.
Sob o ângulo jurídico, vale atentar não só para o enfoque consignado no parecer
de Yoshiaki Ichiara, citado em “Comentários à Constituição do Brasil”, de Celso
Bastos e Ives Gandra Martins, 1990, à página 357 – segundo o qual o imposto
incide sobre a propriedade de veículos com propulsão por meio de motor, com
fabricação e circulação autorizadas e destinadas ao transporte de mercadorias,
pessoas ou bens – como também, de forma mais específica, a lição de Cretella
Júnior, para quem , lato senso, veículo automotor é o impulsionado por
maquinismo interno com fabricação e circulação autorizadas, servindo para o
transporte de pessoas, bens ou produtos de natureza terrestre, hídrica ou aérea
– obra citada, página 3.649. Ademais, na lição de Pinto Ferreira, veículo
automotor é todo aquele impulsionado por meio de motor, com sua fabricação e
circulação destinadas ao transporte de pessoas, bens e mercadorias –
“Comentários à Constituição Brasileira”, 5º Volume, artigos 127 a 162, edição
Saraiva, 1992. Fosse o alcance do texto constitucional o sufragado pela Corte de
origem, haveria não só a repetição do texto da Carta anterior, a vedar a cobrança
das taxas, como também a referência aos veículos automotores terrestres. A
especificidade não esxurge ante a alínea “c” do inciso I do artigo 155 da Carta de
1988. Por outro lado, inexistem aspectos a entender-se o alcance do preceito de
forma limitada. O imposto nele previsto incide não só sobre a propriedade de
veículos automotores, terrestres, como também denatureza hídrica ou aérea,
sendo que, por isso mesmo, como mencionado por Cretella Júnior, O Governo
do Estado de São Paulo editou lei, dispondo no campo da gradação percentual,
sobre a incidência do imposto, a abranger embarcações, aeronaves automóveis
de passeio, caminhonete de uso misto, motocicletas, ciclomotores e automóveis
de corrida e de esportes.”

Ora, não cabe ao intérprete distinguir o que a lei não distingue, conforme o
brocardo latino ubi lex non distinguit, nec nos distinguere debemus .

VI. Veículos Automotores Aéreos

Conforme já afirmado, as aeronaves dotadas de capacidade automotora são


obviamente veículos automotores, e assim, a sua propriedade é fato gerador do
imposto estadual, estando sujeita ao recolhimento anual do IPVA.

Tanto a Lei Paulista é clara quanto à exigência do imposto também na


propriedade de aeronaves e embarcações que o artigo 2º assim dispõe:

“Artigo 2º - O imposto será devido no local onde o veículo deva ser registrado e
licenciado, inscrito ou matriculado, perante as autoridades de trânsito, da
marinha ou da aeronáutica. (...) ” (sem grifos no original)

Quanto às aeronaves para que seja habilitada ao vôo é exigido um registro de


matricula no Registro Aeronáutico Brasileiro - RAB além de um certificado de
aeronavegabilidade fornecido pelo Departamento de Aviação Civil - DAC , sendo
que deste documento deve constar o aeródromo de registro.

E exatamente o Estado do local do aeródromo base, onde está registrada a


aeronave é que vem sendo exigido o IPVA.

Muitos contribuintes tentam se eximir do recolhimento do imposto estadual


alegando que pelo fato do registro e certificado serem obtidos através do
Departamento de Aviação Civil - DAC , órgão federal não existiria competência
estadual para exigir o imposto.

Porém não obstante tal órgão ser federal existem seus departamentos regionais
que estão localizados em todos os Estados da Federação, geralmente nos
aeroportos ou aeroclubes, e assim, pode-se fazer um paralelo com o DETRAN
que é órgão estadual porém possui os DENATRANS que possuem seus
arquivos próprios com suas competências próprias que consistem nos órgãos
regionais do Departamento Estadual de Trânsito - DETRAN.

Assim, o fato do veículo automotor aéreo possuir um registro em um órgão


federal, posto que a autorização para voar é dada para todo o território nacional,
não descaracteriza a incidência do imposto estadual, sendo competente o
Estado em que está localizado o aeródromo de registro, ou seja, onde foi
entregue o certificado de registro.

VII. Do tratamento legislativo nos Estados do Rio de Janeiro , Pará, Minas


Gerais e Santa Catarina.

Na maioria dos Estados da federação o tratamento fiscal dado às aeronaves é o


mesmo, ou seja, aeronave é considerada veículo automotor e sua propriedade
está sujeita à tributação estadual. [17]

Desta forma, segue, a título ilustrativo, a transcrição dos artigos da Lei Estadual
do Rio de Janeiro e da Lei Estadual do Pará, que diferentemente da Lei Paulista,
definem de maneira mais clara o termo veículo automotor de qualquer espécie.

LEI 2.877, DE 22 DE DEZEMBRO DE 1997 (Lei Estadual Fluminense):


“Art. 1º - O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores, devido
anualmente, tem como fato gerador a propriedade de veículo automotor de
qualquer espécie, por proprietário domiciliado ou residente no Estado do Rio de
Janeiro ou que esteja sujeito à inscrição no Cadastro Geral de Contribuintes do
Estado do Rio de Janeiro (Caderj), nos termos do Capítulo IX desta Lei.
§ 1º - Para efeito desta Lei, veículo automotor é qualquer veículo aéreo,
terrestre, aquático ou anfíbio, dotado de força motriz própria, ainda que
complementar ou alternativa de fonte de energia natural.”

LEI No 6.017, DE 30 DE DEZEMBRO DE 1996 (Lei Estadual Paraense):


“Art. 1º O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores - IPVA é o
tributo patrimonial que incide sobre a propriedade de veículo automotor aéreo,
aquaviário e terrestre e será devido anualmente. (redação dada ao art. 1º pela
Lei nº 6.427/01 – efeitos a partir de 28 de dezembro de 2001)”

LEI Nº 12.735, DE 30 de DEZEMBRO DE 1997 ( Lei Estadual Mineira):


“Art. 1º - O Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores IPVA -
incide, anualmente, sobre a propriedade de veículo automotor de qualquer
espécie, sujeito a registro, matrícula ou licenciamento no Estado.
Parágrafo único - O IPVA incide também sobre a propriedade de veículo
automotor, ainda que dispensado de registro, matrícula ou licenciamento no
órgão próprio, desde que o seu proprietário seja domiciliado no Estado.”

LEI Nº 7.431 DE 30 DE DEZEMBRO DE 1988 ( Lei Estadual Catarinense).


“Art. 1º - Fica instituído o imposto sobre a propriedade de veículos automotores -
IPVA.”

Assim, temos que a questão da incidência do IPVA nas aeronaves é questão


pacífica também com relação a grande maioria dos Estados da Federação.

Podemos concluir que as legislações estaduais são claras e não deixam margem
de dúvida no que se refere à cobrança de IPVA na propriedade de veículo
automotor seja ele terrestre ou aéreo.

VIII – Tratamento atribuído à matéria pelo Tribunal de Justiça do Estado de


São Paulo

Os argumentos ora expedidos têm sido acolhidos pela jurisprudência do Tribunal


de Justiça de São Paulo, como ilustra o acórdão proferido na apelação cível n.º
187.525-2/3, relator o Desembargador GILDO DOS SANTOS, cuja ementa ora
destacamos:

" IPVA – Aeronave – Declaratória de Inexistência de relação jurídica –


Inadimissibilidade – Base de Cálculo é o valor venal – Respeito à capacidade
contributiva do sujeito passivo desse imposto – Recurso Improvido – Inteligência
do art. 6º , III da Lei 6.606/89 e art.155, I , “c”, da CF.

Ementa oficial: Imposto. IPVA. Aeronave. Valor venal. Critérios.

É legítima a cobrança de Imposto instituído sobre aeronave, tendo como


hipótese de incidência a propriedade desse veículo, e como base de cálculo o
valor venal, estabelecido segundo o ano de sua fabricação e seu peso máximo
de decolagem , pois tais critérios são objetivos, restando respeitados, desse
modo, o princípio da capacidade econômica do contribuinte e o da isonomia.

ACÓRDÃO – Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível


187.526-2/3, da comarca de São Paulo, em que é apelante José Luiz Zillo e
apelada a Fazenda do Estado: Acordam, em 11ª Câmara Cível do Tribunal de
Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, negar provimento ao
recurso.

1. Declaratória de inexistência de relação jurídica, relacionada a imposto sobre a


propriedade de veículo automotor (aeronave).

A sentença de fls. 34-37, com relatório adotado, rejeitou o pedido, impondo os


ônus sucumbenciais ao autor, que apelou, tempestivamente, alegando, em
síntese, que, embora a lei estadual tenha adequadamente considerado o valor
venal do bem, tomou por base o ano de fabricação e o peso máximo de
decolagem , acabando por desvirtuar a própria base de cálculo prevista no art. 5º
da Lei 6.606/89.

Sustenta que esses aspectos técnicos e peculiares dos veículos não podem
prevalecer, asseverando que, tratando–se de “imposto sobre bem patrimonial , a
medida mais significativa é o valor bruto desse bem”.

Apoiando-se nas notas explicativas da tabela de tarifas do Instituto de


Resseguros do Brasil, alega que nelas não há qualquer referência a peso de
decolagem , de modo que esse critério não é relevante para aferição do valor
venal da aeronave.

Invoca, ainda, o princípio da capacidade econômica e contributiva mormente


sobre os impostos diretos incidentes sobre o patrimônio, sob pena de violação
ao princípio da isonomia.

Quer a procedência da ação, invertidos os ônus do sucumbimento (fls. 39.48).

2. Recurso respondido (fls. 50.54) e preparado (fls. 58).

Os autos foram remetidos ao egrégio I. TACivSP, e, de lá, a esta Corte (fls. 61).
É o relatório.

3. A Constituição Federal diz competir aos Estados e ao Distrito Federal a


instituição de impostos, entre outros, sobre a propriedade de veículos
automotores ( art. 155, I, “c”).

Com apoio nessa regra, o Estado de São Paulo editou a Lei 6.606/89 que, em
seu art. 6º, III, estabeleceu a cobrança de imposto sobre a propriedade de
aeronaves, adotando como base de cálculo o seu valor venal, segundo o ano de
sua fabricação e seu peso máximo de decolagem.

4. Verifica-se, pois, que tal imposto instituído tomando como hipótese de


incidência a propriedade da aeronave, e como base de cálculo o valor venal
desse veículo.

No caso do IPVA, sabe-se que a base de cálculo "é o valor venal do veículo,
fixado de conformidade com o seu peso, potência, capacidade máxima de
tração, ano de fabricação, cilindrada, número de eixos, tipo de combustível
utilizado e dimensões", sendo tal valor reajustado anualmente no mês de
dezembro de cada ano através de decreto do Poder Executivo. ( Celso Ribeiro
Bastos, Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário, São Paulo, Ed.
Saraiva, 1.991. p.265).

Vê-se, pois, que a base de cálculo, no caso desse tributo, leva em conta critérios
precisos, sejam os apontados por esse ilustre jurista, como o ano de fabricação
do veículo, seja o peso máximo de decolagem, aspecto ligado à capacidade da
aeronave, que é também um meio de se obter uma avaliação objetiva para,
sobre ela, incidir o imposto.
Como bem acentuou o culto Magistrado sentenciante, "esses dois fatores,
conjugados, permitem uma conclusão aproximada da compatibilidade fiscal,
sobre a valoração patrimonial do bem, requisito da tributação" ( fls.35).

5. Assim, em que pese à combatividade do seu ilustre Advogado, o apelante não


se assiste de razão, não se vendo em que teriam ficado violados os princípios da
capacidade contributiva e da isonomia.

O primeiro deles é informador da tributação através de impostos, segundo se


extrai da Constituição Federal ao dispor que "sempre que possível, os impostos
terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do
contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir
efetivamente a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e
nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do
contribuinte" (Art. 145, § 1º).

Se há casos em que não é possível observar esse princípio, como ocorre


quando se trata de imposto sobre circulação de mercadorias e serviços, na
hipótese de imposto sobre a propriedade de veículos automotores, como é a dos
autos, deve tal tributo ser graduado, para que, quem tem um veículo mais novo,
de maior capacidade e de maior valor, pague mais imposto do que aquele que
tem um veículo mais antigo, com menos capacidade de carga, e, portanto, de
menor valor.

Ora, se o IPVA leva em conta o ano de fabricação da aeronave e,


simultaneamente, o peso máximo de decolagem, está com tais dados,
respeitando a capacidade contributiva do sujeito passivo desse imposto,
anotando-se que este é vinculado ao veículo.

E o princípio da igualdade, segundo Ruy Barbosa, consiste em tratar igualmente


os iguais e desigualmente os desiguais. Pois bem, todos os que tenham
aeronaves do mesmo ano e com o mesmo peso de decolagem, pagarão igual
IPVA, de modo que nenhum arranhão sofreu a isonomia.

Afinal, é vedado "instituir tratamento desigual entre contribuintes que se


encontrem em situação equivalente" (CF. art.150,II).

6. Por tudo isso, mantida a bem lançada sentença, negam provimento ao


recurso.
O julgamento teve a participação dos Des. Oliveira Costa, pres., e Itamar Gaino,
com votos vencedores. São Paulo, 7 de maio de 1.992 – GILDO DOS SANTOS,
relator. " (grifos nossos)

Nesta mesma toada, vale ressaltar o entendimento do Egrégio Tribunal de


Justiça do Estado de São Paulo, que, ao negar provimento à apelação cível nº
386-5 – Ribeirão Preto, em 25 de junho de 1997 (apelante: José Adalberto
Rodrigues Bragheto e outros ; apelado: Chefe do Posto Fiscal em Ribeirão Preto
da Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda), assim dispôs :

“ACÓRDÃO

Ementa oficial:
Tributo – IPVA – Aeronave usada como espécie do gênero veículos automotores
– Base de Cálculo – Valor estabelecido com base no peso de decolagem e ano
de fabricação – Princípios constitucionais respeitados – Apelo improvido.

ACORDAM, em Nona Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do


Estado de São Paulo, por votação unânime, negar provimento ao recurso, de
conformidade com o relatório e o voto do Relator, que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.

O julgamento teve a participação dos Senhores Desembargadores Sidnei Beneti


(Presidente sem voto), Santi Ribeiro e Rubens Elias.

São Paulo, 25 de junho de 1997.

RUI CASCALDI, Relator.

VOTO

Ao relatório da sentença, que se adota, acrescenta-se que o mandado


de segurança impetrado com o objetivo de fazer cessar a exigibilidade do tributo
(IPVA sobre aeronave usada) apurado pelo Auto de Infração e Imposição de
Multa (AIIM) n. 305.074, Série “A”, foi julgado improcedente, denegada a ordem,
cassada a liminar inicialmente concedida.

Visa, o recurso, a reforma total do julgado, insistindo na tese inicial de


que o IPVA não incide sobre aeronaves, por não serem veículos automotores,
bem como que o “peso de decolagem” não constitui critério que permita a real
dimensão do valor venal do bem.

Em contra-razões, sustentou-se o decisum.

Manifestou-se a douta Procuradoria de Justiça pelo improvimento do


recurso.

É o relatório.

O IPVA instituído pela Lei Estadual n. 6.606, de 1989, a qual


estabeleceu, como fato gerador, a propriedade do veículo automotor de qualquer
espécie.

O artigo 5º, desse mesmo diploma, fixou como base de cálculo do


imposto o valor venal do veículo.

O artigo 6º, por seu turno, ainda da mesma lei, estabeleceu que, para
efeito de lançamento, quanto a veículos usados, a Secretaria da Fazenda
estabelecerá tabelas de valores venais, levando em conta , com relação a
aeronaves, o peso máximo de decolagem e o ano de fabricação.

Pela Resolução n.62 da Secretaria da Fazenda, de 22.12.89, fixou-se o


valor venal das aeronaves, levando-se em conta esses dados: peso de
decolagem e o ano de fabricação, critério que os impetrantes sustentam ser
inadequado, a par de também defenderem a não –incidência do imposto na
espécie.

A argumentação de que o IPVA não incide sobre aeronave por não se


tratar de veículo automotor, não procede, pois, em princípio, contraria a
interpretação literal que, da leitura dos dispositivos citados decorre, e onde
aparece bem claro que o imposto incide sobre veículos automotores de qualquer
espécie.

De outra parte, a inexistência de lei complementar em matéria tributária


não seria obstáculo à cobrança do imposto em questão, em face do disposto no
artigo 24 , inciso I, parágrafos 2º e 3º, da Constituição da República, que
concede aos Estados, ao lado da União e do Distrito Federal, competência
legislativa concorrente a respeito de direito tributário e financeiro, dentre outros,
o que, aliás, está muito bem analisado na sentença.
Por fim, com relação a eventual desproporção entre o valor fixado na
tabela e o valor de mercado da aeronave, carecem aos autos, como bem
apontado pelo douto Procurador de Justiça, de qualquer prova que evidencie o
alegado e que, por se tratar de ação com rito específico, que não enseja dilação
probatória, não há como produzi-la.

Ainda que assim não fosse, há entendimento deste Tribunal no sentido


da legalidade do critério adotado pelo legislador com relação aos parâmetros que
conduzem à apuração do valor real de mercado da aeronave ( Apelação Cívil n.
181.920-2-SP, in “RJTJESP”, ed. LEX, vol. 136/263). Confira-se, também , a
Apelação Civil n. 200.8686-2, da Décima Segunda Câmara Civil deste Tribunal,
quanto à base de cálculo do IPVA para veículos automotores em geral ( “JTJ”,
ed. LEX, vol.143/83).

Isto posto, nega-se provimento ao recurso.”

VII. Conclusão

De tudo quanto restou exposto, é indubitável que, a cobrança do imposto


estadual sobre propriedade de veículo automotor – IPVA incidente sobre
aeronaves encontra-se devidamente fundada no ordenamento jurídico pátrio,
estando, perfeitamente claro e delineado com sua previsão pela Constituição
Federal e legislação ordinária.

Não há, pois, qualquer razão de fato e de direito na tentativa dos contribuintes de
exonerarem-se do cumprimento da exação fiscal.

Com efeito, a Constituição Federal ao atribuir aos Estados a competência para


legislar sobre veículos automotores não restringiu a veículos terrestres, não
podendo, pois, a carta suprema, ser interpretada naquilo que não dispôs.

Assim, após a breve explanação que visou uma abordagem de um tema


delicado, gerador de acirrada polêmica, concluímos que o IPVA incide na
propriedade de aeronaves, em 1º lugar porque previsto na Lei Estadual Paulista
6606/89, em seu artigo 6º, III, lei esta que nada tem de inconstitucional, a uma
porque editada pelo Estado no exercício de sua competência atribuída pela
Constituição Federal e, a duas, porque nem a Carta Magna, nem a lei estadual,
restringiu seu alcance para abarcar em seu conteúdo apenas os veículos
terrestres.
BIBLIOGRAFIA

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BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. Editora Forense, 10ª edição,


Rio de Janeiro, 1983.

______________ Limitações Constitucional ao Poder de Tributar. 5a. ed. Rio de


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Saraiva, 1993.

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Comentários à Constituição de 1988 -


Sistema Tributário. 6a. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995.

CRETELLA JÚNIOR, José. Curso de Direito Tributário, 1a. ed., 1993: Forense
Universitária.

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MARTINS, Ives Gandra. Sistema Tributário na Constituição de 1988. São Paulo:


Saraiva, 1991.
SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19ª ed., Editora
Revista dos Tribunais, Malheiros, 2001.

VIII

Forçoso extrair do ponderado, invocada a lógica presente no Parecer transcrito, antes


mesmo da conclusão acerca da improcedência do postulado vestibular, a
extinguibilidade do processo, porquanto ausentes pressupostos de processamento e é
diante dessas evidências que espera a Fazenda Estadual, seja decretado extinto o
processo ou julgada improcedente a postulação vestibular, com os consectários legais.

São Paulo, 21 de abril de 2.003.

J. BUSHATSKY
OAB/SP 50.258
Procurador do Estado de São Paulo.

[1] Efetivamente, dispõe o artigo 6º, do Código Tributário Nacional: “a atribuição constitucional de competência
tributária compreende a competência legislativa plena, ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas
Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municípios, e observado o disposto nesta Lei.”
[2] in “Lei Complementar Tributária”. São Paulo: RT, 1975.”p. 9
[3] in “Comentários à Constituição de 1988 - Sistema Tributário”. 6a. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.114.
[4] idem, p.132.
[5] in “Curso de Direito Constitucional Positivo”, 19ª ed., Editora Revista dos Tribunais, Malheiros, 2001,p. 506.
[6] I n“Comentários à Constituição de 1988 - Sistema Tributário”. 6a. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 128.
[7] In “Direito Tributário Brasileiro, , Editora Forense, 10ª edição, Rio de Janeiro, 1983, p. 67.
[8] Idem, p. 68.
[9] in “Comentários à Constituição de 1988 - Sistema Tributário”. 6a. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1995, p. 130
[10] Parte da doutrina, a mais tradicional, apegada à leitura pura e simples do texto constitucional, arrola três funções para
a lei complementar prevista no artigo 146: a) dispor sobre conflitos de competência; b) regular limitações ao poder de
tributar; c) emitir normas gerais em matéria de legislação tributária.Sacha Calmon (“Comentários à Constituição de 1988 -
Sistema Tributário”, p.133) sustenta essa tríplice função asseverando que tal decorre de escolha feita pelo legislador que
optou, no Brasil, pelo fortalecimento das prerrogativas do poder central. O importante, para este respeitável estudioso, é
que haja um mínimo de autodeterminação política, de auto-governo e de produção normativa da parte dos Estados
federados. Não estabelece, contudo, os limites de atuação das normas gerais. Fábio Fanuchi, analisando as disposições
contidas na Constituição de 1967, modificada pela Emenda n. 1/69, já sustentava, para justificar essa competência
atribuída à União de editar normas gerais, que era “por questão de possibilidade de medida do que seja de interesse geral
para o País; por visão do conjunto das condições internas; por possibilidade de se colocar equidistante dos interesses
regionais ou locais; por razões de hierarquia sem violação do princípio de autonomia; é o Governo Central que poderá se
colocar na posição de árbitro das conveniências na matéria.”Ademais, tecendo considerações históricas sobre a
organização estatal do Brasil, afirmava que a União era a detentora da competência e, porque quis, por mera concessão,
declarou quais os tributos poderiam ser cobrados pelos entes subalternos. As normas gerais de direito tributário seriam a
contrapartida da concessão que o poder central fazia aos entes federados de instituir seus próprios tributos.Todavia,
reconheceu a existência de distorções e abusos da competência legislativa conferida à União, como é exemplo a criação
da “Taxa Rodoviária Única”, criada pelo Decreto-lei 999/69 (“Curso de Direito Tributário Brasileiro”, vol. I, 1971,
p.20/21). Ives Gandra da Silva Martins (“Sistema Tributário na Constituição de 1988”, p. 82 e ss.), tributarista dos mais
conceituados, defende também essa tríplice função, afirmando que sua retirada do texto constitucional representaria a
eliminação de direitos e garantias individuais do contribuinte, pela transferência de tal competência normativa do
legislador complementar para o legislador ordinário. Aduz que a lei complementar, veículo normativo das normas gerais é
apenas explicitador da Constituição; não inova, porque senão seria inconstitucional, mas apenas complementa, tornando
clara a intenção do constituinte.
[11] “Curso de Direito Tributário”, cit. p. 139
[12] O mesmo Paulo de Barros, em outra obra, afiança-nos suas conclusões, ainda atuais, a respeito do
assunto, ao comentar o artigo 18, parágrafo 1º, da Constituição anterior, que ora reproduzimos,
literalmente, ante a sua simplicidade e extrema clareza: “1.) A norma geral é exceção no sistema; a regra
é a exclusividade, na estrita consonância do discrimen constitucional. Sendo exceção, sua interpretação
deve ser restritiva. O Congresso Nacional, ao fazer uso desse importante instrumento legislativo, deverá
interpretá-lo restritivamente; 2.) A norma geral não pode criar tributos e, portanto, não é fonte de
obrigações tributárias. Como a Constituição não cria tributo algum, mas apenas atribui competência à
União, aos Estados e aos Municípios para decretá-los, a lei complementar que, como o próprio nome
indica, deverá complementá-la, também não poderá fazê-lo; 3.) Não podendo criar tributos,
evidentemente, não poderá dispor acerca das formas de extinção. Se não pode dizer como nasce, é
intuitivo, que não possa dizer como se exaurem as obrigações tributárias. Da mesma forma, não caberá às
normas gerais dispor sobre exclusão, suspensão e ‘constituição’ do crédito tributário, tão-somente porque
tais matérias refogem, inteiramente, ao seu campo específico de competência; 4.) Por via de
consequência, grande parte das disposições do Código Tributário Nacional - Lei n. 5.172 de 1966 - não é
norma geral de direito tributário, se bem que venha sob esse título; 5.) Demais, a lei complementar que
repete a Constituição é inócua e a que restringe ou amplia é inconstitucional, de maneira que resta,
apenas, o campo específico sobre que deve versar a norma geral: a) dispor sobre conflitos de
competências entre as entidades tributantes e b) regular limitações constitucionais ao poder de tributar; 6.)
Norma geral que extravase seu campo específico perde o caráter de lei nacional, pelo que não vinculará
os Estados e Municípios, mas tão-só a União, visto que o legislador complementar é o próprio legislador
federal.” (Hipótese de Incidência Tributária e Normas Gerais de Direito Tributário”, in “Interpretação no
Direito Tributário”, São Paulo, Educ, 1975, p.220).
[13] “Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar”, p. 35.
[14] “Curso de Direito Constitucional Tributário”, p.404 e ss.
[15] O julgado do STF mencionado (RE 134.509-AM), ao que tudo indica, confunde o conceito de veículo automotor com
o de veículo terrestre. Ora, tudo aquilo que, transportando a sua própria energia de propulsão, pode ser conduzido na
direção desejada constitui veículo automotor. Daí que as aeronaves também são veículos automotores, razão pela qual
sobre elas deve incidir o IPVA.
[16] In “Curso de Direito Tributário”, p. 168.
[17] Conforme anotado por Gladston Mamede e Eduarda Cotta Mamede, “no que toca às aeronaves, seus proprietários
pagaram IPVA de 0,5% sobre o seu valor em Santa Catarina (art. 5º, V, da Lei 7.543/88);1% em Minas Gerais (art. 10,
IV, da Lei 12.735/97), Tocantins (art, 88, I, b, da Lei 888/96) e no Distrito Federal (art. 3º, I, da Lei 7.431/85); 1,5% na
Bahia (art. 6º, III, da Lei 6.348/91); 2,5% no Rio Grande do Norte (art. 4º, I, Lei 6.967/96) e no Paraná (art. 4º, III, da Lei
11.280/95), 3% no Rio Grande do Sul (art. 9º, I, da Lei 8.115/85); 5% no Rio de Janeiro (art. 10, I, da Lei 2.877/97) e em
São Paulo (art. 7º, I, da Lei 6.606/89).” (Revista de Informação Legislativa, Senado Federal, a. 38 n. 151 jul./set. 2001).
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

PROCURADORIA GERAL DO ESTADO


PROCURADORIA ADMINISTRATIVA - PA.01

RAZÕES
DE
RECURSO ESPECIAL

RECORRENTE :- FAZENDA DO ESTADO DE S. PAULO


RECORRIDOS :- ADROALDO VASC0NCELOS e outros

(PROCESSO DE ORIGEM :-
APELAÇÃO n. 278.858.2/6 - IGUAPE

E. TRIBUNAL,

I - SÍNTESE DOS FATOS

Promove a FAZENDA DO ESTADO DE S. PAULO, ora


RECORRENTE, a presente DESAPROPRIAÇÃO DIRETA, visando que seja
estabelecida a indenização concernente ao valor do imóvel expropriado em face da
instituição da ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA JURÉIA-ITATINS, isto é, DECRETO
24.646/86.
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

O V. ACÓRDÃO recorrido reformou em parte a R.


SENTENÇA de fls. , incluindo na indenização a parcela da COBERTURA VEGETAL
reconhecidamente declarada pelo CÓDIGO FLORESTAL FEDERAL de
PRESERVAÇÃO PERMANENTE, fixando a indenização em cr$235.616.353,41 para
dezembro/93, mais JUROS COMPENSATORIOS, desde a edição do DECRETO
EXPROPRIATORIO 24.646/86 além dos MORATÓRIOS, DESPESAS PROCESSUAIS e
HONORÁRIOS ADVOCATICIOS arbitrados em 10% sobre a diferença ente a oferta e
condenação, ambas atualizadas (fls. 703 combinada com fls. 752).

Em face do que restou DECIDIDO, no V. ACÓRDÃO


recorrido, não foi aplicado corretamente, a LEI, tendo a mesma sido contrariada e
negada a sua vigência, consoante dispositivos legais e razões expostas a seguir, além
de se afastar da orientação estabelecida pela maioria da JURISPRUDÊNCIA exarada
pelos nossos TRIBUNAIS, consoante adiante se especifica e demonstra.

De plano, verifica-se que, entre outros, restaram ofen-didos os


artigos 332 do CPC., arts. 43, 69, 159, 160 inciso. II, 524, 526, 572 do CÓDIGO CIVIL,
art. 27 do DL. 3365/41, art. 3º e 42 da LEI 6766/79, LEGISLAÇÃO FLORESTAL E DO
MEIO AMBIENTE FEDERAL (DECRETO 4.771/65 e DEC. 50.813/61), consoante se
demonstra na exposição a seguir.

Dessa forma fica justificado, conforme adiante se demonstra a


interposição deste ESPECIAL com fundamento no ART. 105, INCISO III, LETRA "A" e
"C" - CF/1988. Senão vejamos :-
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

II - DEMONSTRAÇÃO DO CABIMENTO DESTE RECURSO E RAZÃO DA REFORMA


DO V. ACÓRDÃO.

PERÍCIA NULA

A FAZENDA DO ESTADO, desde o inicio, vem reclamando contra a PERÍCIA realizada


nestes autos, face inúmeras irregularidades que a desqualificam como PROVA para o
fim que foi determinada, vez que do seu resultado não se chega ao JUSTO PREÇO (art.
5º inciso XXIV da CF/88), a que deve corresponder toda e qualquer INDENIZAÇÃO
decorrente de DESAPROPRIAÇÃO.

NÃO foram observadas as regras do art. 27 do DL. 3365/41 e os dispositivos


processuais e as NORMAS TÉCNICAS que orientam toda e qualquer PERÍCIA. Impõe-
se, assim, seja o V. ACÓRDÃO reformado para que a PERÍCIA seja declarada NULA.

Em seu APELO a FAZENDA reclamou a reforma da R.


DECISÃO que fixou a indenização, vez que a PERÍCIA, quer com relação a terra nua
quer no que concerne a avaliação das matas, realizada nos autos não reflete a realidade
dos preços de mercado, ou seja, a JUSTA INDENIZAÇÃO e a regra do art. 27 do DL.
3365/41, havendo, por conseguinte ofensa ao art. 332 e seguintes do CPC..

Além do mais, o V. ACÓRDÃO RECORRIDO não podia


encampar na indenização a parte da COBERTURA VEGETAL declarada de há muito
por LEI FEDERAL como de PRESERVAÇÃO PERMANENTE (CÓDIGO FLORESTAL -
LEI 4.771/65), vez que estas não são indenizáveis porque sobre as mesmas incidem
restrições de uso - preexistentes ao Decreto expropriatorio - e de origem FEDERAL, que
impedem a sua exploração, além do mais inexiste infra estrutura adequada e suficiente
que torne tal exploração viável do ponto de vista econômico, NÃO TENDO A PERÍCIA
EM NENHUM MOMENTO DEMONSTRADO A SATISFAÇÃO ECONÔMICA DESSA
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

EXPLORAÇÃO.

A PERÍCIA encontrou valor para a expropriação objeto


presumindo que seria possível teoricamente se instituir um LOTEAMENTO no imóvel
objeto e se DESMATAR a cobertura vegetal para venda da madeira (lenha, palmitos,
etc...)

Não bastasse isso, o arbitramento é imprestável porque


estabelece uma indenização que se esteia em outros imóveis que se constituem em
LOTEAMENTO já constituído, ALÉM DE CONSIDERAR O PRÓPRIO IMÓVEL
EXPROPRIADO COMO SE LOTEAMENTO FOSSE.

Enfim, AVALIOU-SE UM EMPREENDIMENTO


INEXISTENTE.

A LEI DE LOTEAMENTO - LEI 6.766/79, veda a AVALIAÇÃO de gleba bruta


(art. 42), como se fosse um LOTEAMENTO regular e registrado. O Sr. PERITO para
encontrar o valor do imóvel objeto se esteou em LOTEAMENTO que nada tem haver
com o presente.

Consequentemente, deve ser determinado que outra PERÍCIA


seja elaborada de forma que a avaliação seja procedida de acordo com as normas
técnicas e legais, bem como condizente com a realidade do imóvel objeto, observando-
se, assim, a LEI, a REALIDADE FÁTICA e o art. 332 e seguintes do CPC..

De qualquer forma, a indenização objeto é total-mente


incabível dada a improbabilidade da sua exploração econômica, vez que quando o
RECORRIDO adquiriu o imóvel ob-jeto sobre o mesmo pendiam as restrições de uso
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

impostas pela legislação de proteção am-biental, a legislação flores-tal, que há muito


impediam a sua exploração e desmatamento.

Enfim, a PERÍCIA não levou em conta o preço de aquisição, e


os ônus que incidem sobre o referido imóvel, valor para fins de lançamento fiscal,
conforme determina o DECRETO 3365/41, art. 27.

Tanto o V. ACÓRDÃO RECORRIDO como a PERÍCIA


realizada nestes autos não levaram em conta que para se instalar um LOTEAMENTO no
local é necessário se observar as RESTRIÇÕES DE USO, e que, evidentemente,
tornam inviável tal empreendimento.

Dentre essas RESTRIÇÕES DE USO esta o vigente CÓDIGO


FLORES-TAL - LEI 4.771/65 que em seus arts. 1º, 2º, 4º, 5º, 10, 12, 14, 16 e outros,
estabelece:-

ARTIGO 1º :-
"as FLORESTAS existentes no Território Nacional e as
DEMAIS FORMAS DE VEGETAÇÃO, reconhecidas de
utilidade às terras que revestem, são bens de interesse
comum a todos os habitantes do País, exercendo-se o
Direito de Pro-priedade, com as Limitações que a
Legislação Geral e Es-pecial estabelecem."

ARTIGO 2º :-
"Consideram-se de PRESERVAÇÃO PERMANENTE pelo só
fato desta Lei, as FLORESTAS e DEMAIS FORMAS DE
VEGETAÇÃO, situa-das..."

ARTIGO 4º :-
"Consideram-se de Interesse Público..."

ARTIGO 5º :-
"O Poder Público criará PARQUES NACIONAIS,
ESTADUAIS E MUNICIPAIS e RESERVAS BIOLÓGICA com a
finalidade ..."
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

ARTIGO 10 :-
"Não é permitida a derrubada de FLORESTAS situadas em
áreas de inclinação entre 25 e 45 graus, só sendo nelas
toleradas a extração de toros, quando em regime de
utilização racional que vise rendimentos permanentes"

ARTIGO 12 :-
"Nas FLORESTAS PLANTADAS, não consideradas de
preservação perma-nente, é livre a extração de lenha e
demais produtos florestais ou a fabricação de carvão. Nas
demais FLORESTAS, dependerá de norma esta-belecida em
ato do Poder Público FEDERAL ou ESTADUAL, em
obe-diência às prescrições ditadas pela técnica e
peculiaridades locais.

ARTIGO 14:-
"Além dos preceitos gerais a que esta sujeita a utilização de
florestas, o Poder Publico Federal ou Estadual, poderá :-
a)...
b) proibir ou limitar o corte das espécies vegetais
consideradas em vias de extinção..."

ARTIGO 16:-
"As florestas de domínio privado, não sujeitas ao regime de
utilização li-mitada e ressal-vadas as declaradas de
preservação permanente ... são suscetíveis de exploração,
obedecidas as seguintes restrições:-
a) nas regiões Leste Meridional, SUL e Centro oeste,
esta parte Sul, as derrubadas de florestas nativas,
primitivas ou regenera-das, só serão per-mitidas
desde que seja, em qualquer caso, res-peitando o
limite mínimo de 20% da área de cada pro-priedade
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

com cobertura arbórea localizada, a critério da


autoridade competente.

b) nas regiões citadas na letra anterior, nas terras já


desbravadas e previamente delimi-tadas pela
autoridade competente, fica proibidas as
derrubadas de florestas primi-tivas, quando feitas
para ocupação do solo com cultura de pastagens,
permitindo-se, nesses casos, apenas a extração de
árvores para produção de madeira.

Nas áreas ainda incultas, sujeitas a formas de


desbravamento, as derru-badas de florestas
primitivas, nos trabalhos de instalação de novas
pro-priedades agrícolas, só serão toleradas até o
máximo de 50% da área da propriedade."

Ressalte-se, ademais, que em face a tais dispositivos do


vigente CÓDIGO FLORESTAL, foi expedida a PORTARIA DEPRN-3, em face da qual é
obrigatória a manutenção de, pelo menos, 50% em forma de RESERVAS nas
propriedades cobertas pela MATA ATLÂNTICA, sendo tais bens insuscetíveis de
indenização.

Mas não bastam ai as RESTRIÇÕES DE USO. A própria LEI


FEDERAL sobre PARCELAMENTO DO SOLO - LOTEAMENTO, quer o DECRETO LEI
58/37 quer a LEI FEDERAL 6766/79, também restringe a utilização de imóvel coberto
por mata natural e protegida por LEI, devendo eventual projeto de parcelamento
observar tais ditames. Vejamos o parágrafo único do art. 3º incisos IV e V dessa LEI :-

“art. 3º - ...
§ único - Não será permitido o parcelamento do solo:-
I - em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações,
antes de tomadas as providências para assegurar o
escoamento das águas,
II - em terrenos que tenham sido aterrados ...,
III - em terrenos com declividade igual ou superior a
30% ...,
IV - em terrenos onde as condições geológicas não
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

aconselham a edificação;
V - em áreas de preservação ecológica ou
naquelas onde a poluição impeça condições
sanitárias suportáveis, até a sua correção.”

Examinando-se os autos, verifica-se que o imóvel objeto


apresenta área com aclives e declives, cursos d’água, característica de solo que se
retirada a mata natural implica em grave erosão, etc..., tudo, portanto, a declarar inviável
qualquer PARCELAMENTO DO SOLO tipo LOTEAMENTO, tanto assim, que até a
presente data nada foi feito nessa região, em especial no imóvel objeto, nesse sentido.

A proibição de DESMATAMENTO e de conversão do local


num LOTEAMENTO não é de nossos dias, mas tem origem no pri-mitivo CÓDIGO
FLORESTAL - Decreto n. 23.793/23 de ja-neiro de 1934, depois no DECRETO
50.813 de agosto de 1961, bem como no vi-gente CÓDIGO FLORESTAL - LEI
4.771/65 e na LEI DE LOTEAMENTO - LEI 6.766/79 - art. 3º conforme acima
exposto.

Ainda que restasse, alguma parte da co-bertura vegetal


destacada pela PERÍCIA, descontada as áreas de vedação em face da Legislação
Florestal, que pudesse ser explorada antes da vigência da instituição do Parque
Esta-dual da Serra do Mar e da ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA JURÉIA-ITATINS, é de se
salientar o custo dessa exploração, ou seja, é necessário constatar se tal exploração
se-ria economicamente viável.

O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, por sua 1a. Turma, no


RECURSO EXTRAORDINÁRIO n. 114.682/SP., julgado em 05/11/91 e publi-cado no
DJU. de 13/12/91, sendo relator o MIN. OCTAVIO GALOTTI decidiu consoante trechos
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

citados a seguir e que demonstram a contrariedade em relação ao que foi de-cidido


nestes autos. Vejamos:-

"...renovando-se, para isso, se necessário, a própria perícia, a fim de


que se consi-dere, conscientemente, o problema das matas situadas
em lo-cais de difícil acesso, insuscetíveis, por isso, de aproveitamento
econômico, e, ainda, para que não se perca de vista, como fator
depreciativo, a parcela correspon-dente aos efeitos das áreas se
preservação…o obrigatória, instituídas por lei federal.

Não é de afastar-se de todo a possibilidade de um laudo, ou de próprio


julgador, em lugar do levantamento do potencial madeireiro, por
volume, esta-belecer um percentual fixo a ser agregado ao valor da
terra nua, em razão da presença de matas. Para isso, entretanto, é
necessário que se apurem, em termos econômicos, os efeitos dessa
circunstancia, na região, por meio de cuidadosa pesquisa ou registros
merecedores de credibilidade, que no presente caso não se verificou.

Salvo situações decorrentes do cultivo de espécies madeirei-ras, em


projetos de reflo-restamento, creio que o método mais inadequado de
avaliar-se a cober-tura florestal é por meio de cubagem, onde ordinária
se subestima o componente relativo despesa com a extração da
madeira, em condições adversas de acesso dos meios de transporte,
mui-tas vezes responsável pela completa inviabilização do
empreendimento econômico.

O caso dos autos, por isso mesmo, esta a reclamar uma atenção mais
acurada para essas questões, a fim de que, por efeito de consagração,
em precedente, de inexatidões de tal ordem, não venham a ser
comprometidas substancias parcelas do patrimônio público, na
indenização das extensas áreas envolvidas pelo Parque da Serra do
Mar." (VOTO DA LAVRA DO MIN. ILMAR GALVÃO).

Merece destaque, ainda, nesse mesmo V. ACÓRDÃO, que


demonstra a necessidade de que se proceda a re-gular PERÍCIA cote-jando-se a
realidade fática para se chegar a JUSTA INDENIZAÇÃO, o voto do MIN. SEPULVEDA
PERTENCE, a saber:-
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

"Entre essas críticas, impressiona, logo, a de que a realização do valor


comercial, aparentemente adotado como critério de fixação das matas,
depende de uma exploração não apenas remota, o que, efetivamente,
não seria bastante, mas dispendiosa e aleatória. Isso não lhe desfaz o
valor, mas, sim, a adequação dos critério da sentença.

Como V. Exa. , dou provimento ao recurso e anulo o acórdão re-corrido


para que a indenização se fixe, mediante os meios probatórios
adequados a justa indenização da mata, consideradas as conotações
negativas apontadas no próprio acórdão recorrido, tanto as decorrentes
do regime jurídico da floresta, não bem ex-plicitadas em ambas as
decisões, quanto as dos custos de sua hipotética e fática exploração,
se e na medida em que, ju-ridicamente admissível."

A utilização da PERÍCIA abrangendo o imóvel em duas partes


e a ausência da demonstração dos cus-tos para exploração da madeira e a avaliação
como se o local fosse um LOTEAMENTO, que de fato além de inexistente é totalmente
inviável, não só contraria o art. 332 do CPC. como também o art. 5º inciso LV da
CF/88.

A JURISPRUDÊNCIA , inclusive do E. TRIBUNAL “a quo”


tem se manifestado no sentido que a PERÍCIA é NULA, transformando o julgamento em
diligencia, para que outra seja realizada, observando-se todos os requisitos técnicos e
legais, bem como que reflita a realidade do imóvel avaliando, suas características e
peculiaridades. Vejamos:-
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

“O digno perito ao prestar esclarecimentos em decorrência do que ficou


determinado no acórdão de fls. .456 e 459 de forma incomum, juntou cópias de
V. Acórdãos que acolheram a tese defendida pelos AUTORES. Os integrantes
da turma julgadora, no entanto, e à evidência, não necessitam de
esclarecimentos sobre a matéria jurídica, mas sim sobre a matéria de fato, caso
venham a entender que os apelados tem direito à indenização que perseguem.
Por outro lado, o assistente técnico da ré questionou os valores apontados pelo
perito...”
(APELAÇÃO CIVIL n. 229.077.2/8 - apdos.: JOSÉ CASSIO CHAVES DO VAL
e outros - 7a. CC. de Férias - j. 14/03/95 - vu.)

Por todo exposto, espera a FAZENDA que essa CORTE


SUPERIOR, reforme o V. ACÓRDÃO RECOR-RIDO, para que nova PERÍCIA seja
realizada.

EXCLUSÃO DA INDENIZAÇÃO DE TODA E QUALQUER VEGETAÇÃO


PROTEGIDA PELO CÓDIGO FLORESTAL, CÓDIGO DE ÁGUA e LEGISLAÇÃO
MUNICIPAL

No que concerne ao montante da indenização relativa a


COBERTURA VEGETAL existente no imóvel, o V. ACÓRDÃO RECORRIDO é de ser
modificado, para que daquele va-lor seja excluída toda e qualquer vegetação que antes
do DE-CRETO EXPROPRIATORIO não podiam ser objeto de exploração.

Isto porque essa vegetação já era considerada protetora


ou perma-nente, consoante CÓDIGO FLORESTAL - LEI 4.771/65, DECRETO
50.863/61 e CÓDIGO DE ÁGUAS, antes da legislação que motivou a expropriação.
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

A PERÍCIA tem que apurar tudo o quanto existe no imóvel, e


confrontando a topografia e demais aci-dentes, estabelecer a indenização tão somente
daquela par-cela da vegetação que poderia ser explorada pelos AUTORES antes da
instituição da ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA JURÉIA-ITATINS.

O valor da indenização da cobertura ve-getal não pode ser


estabelecido com base numa hipotética e fática possibilidade de exploração. Referido
valor tem que se refe-rir aquilo que, de fato, é explorável, consoante, alias, ressaltou o
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no V. ACÓRDÃO 114.682 retro ci-tado.

A FAZENDA não pode ser condenada a inde-nizar aquilo que


não causou prejuízo, sob pena de se estar ferindo o disposto no art. 159 e 160 do
CÓDIGO CIVIL, bem como, o procedimento ora reclamado tem haver com o PRINCIPIO
DA JUSTA INDENIZAÇÃO que também prevalece para a FAZENDA DO ES-TADO.

A AVALIAÇÃO levada a efeito neste processo, ademais,


não pode ser levada em conta, porque não considerou o disposto no CÓDIGO
FLORESTAL - Lei 4.771/65, quer com relação as áreas de PRESERVAÇÃO
PERMANENTE, quer com relação ao disposto no art. 16 que determina que o
desmate somente ocorra em 50% das áreas incultas, e que foi observado pelo
PORTARIA DPRN 3, conforme ressaltado pela R. SENTENÇA às fls. 693 dos autos,
que é a característica do imóvel dos AUTORES, ou seja, desprovido de qualquer
cultura.

Logo, a avaliação não poderia abranger todo o imóvel,


como fez o V. ACÓRDÃO RECORRIDO, vez que 50% deve permanecer com a
vegetação nativa, face determinação da LEGISLAÇÃO FEDERAL FLORESTAL,
independentemente das áreas de PRESERVAÇÃO PERMANENTE.

Com relação as áreas de PRESERVAÇÃO PERMANENTE


estas não podem ser PRESUMIDAS, como fez a PERÍCIA encampada pelo V.
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

ACÓRDÃO RECORRIDO, vez que devem ser comprovadas e demonstradas.

O mesmo se aplica com relação aos TERRENOS


RESERVADOS, consoante DECRETO 24.643/19.07.34 ( CÓDIGO DE ÁGUAS).

Em resumo, são as seguintes as parcelas das matas e


áreas que devem ser excluídas da indenização e que erroneamente a PERÍCIA as
introduziu na avaliação, a saber:-

a) áreas e matas consideradas PERMANENTES pelo CÓDIGO


FLORESTAL e que não podem ser presumidas, mas sim
demonstradas;

b) área e matas de RESERVA LEGAL, consoante art. 16 do


CÓDIGO FLORESTAL, que em absoluto foi objeto de qualquer
desconto na avaliação, e,

c) faixas consideradas RESERVADAS, constituídas pelas


margens dos RIOS, consoante CÓDIGO de ÁGUAS, e que não
foram objeto de desconto.

INVIABILIDADE ECONÔMICA DO DESMATAMENTO

A industrialização só pode compreender atividades economicamente viáveis. A retirada


de madeira é recoberta de dificuldades que impossibilitam a exploração econômica da
cobertura vegetal. As dificuldades entre outras são:

a) TOPOGRAFIA DO SOLO - ainda que fosse permitido o desmatamento nas


ÁREAS com declividade acentuada e consoante características do que
constitui o imóvel objeto, haveria a erosão.
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

b) ACESSO - o imóvel objeto é CARENTE de ACESSOS, bem como não tem


meios de transporte interno. E o externo não permite transporte para tal
espécie de atividade, este teria que ser criado pelo próprio explorador, e dai, a
necessidade de construção de estradas para que os caminhões transportando
a madeira tenham acesso.

c) ESCOAMENTO DA MADEIRA - Quanto maior for o custo para a exploração


da madeira menor deve ser o preço em pé. O Sr. PERITO ao considerar o
gasto, não computou no preço da madeira o gasto com transporte, aluguel de
balsas, trabalhadores, encargos, etc....

Ademais, depois do desmatamento, como seriam construído os


imóveis nas encostas e vertentes dos morros ? E a erosão? A esse respeito
merece destaque a APELAÇÃO 122323 (TFR).

PARCELA DA TERRA NUA e COBERTURA FLORESTAL PROTEGIDA PELA


LEGISLAÇÃO FLORESTAL FEDERAL

De qualquer forma, o V. ACÓRDÃO RECOR-RIDO é de ser


reformado, porque quando estabelece o montante da indenização relativa a terra-nua
deixou de excluir a indenização relativa a parcela da terra nua coberta por matas e
florestas protegidas pela LEGISLAÇÃO FLORESTAL FEDERAL

A vegetação protegida só permanece nesse estado se estiver


na terra. Logo, essa terra não pode ter qualquer outra destinação, sendo, portanto,
inexploráveis também. Por essa razão é que a LEGISLAÇÃO SOBRE LOTEAMENTO
veda tal empreendimento e a avaliação como tal nesses locais.

Dessa forma, impõe-se a reforma do V. ACÓRDÃO


RECORRIDO para excluir da indenização a parcela de terra nua destinada a
manutenção da vegetação prote-gida pelo CÓDIGO FLORESTAL, assim como deve
ser deduzida da indenização a parte da COBERTURA VEGETAL protegida pela
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

LEGISLAÇÃO FLORESTAL - LEI 4.771/65.

Repita-se, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL no V.


ACÓRDÃO n. 114.682, estabeleceu que a indenização de co-bertura vegetal em face de
desapropriação pela instituição do PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO MAR, tem que
ser precedida de regular PERÍCIA que apure com exatidão aquilo que pode de forma
concreta ser explorado e não aquilo que remota ou hi-poteticamente poderia ser
explorável.

Verifica-se, portanto, que o V. ACÓRDÃO RECORRIDO é de


ser reformado, inclusive, na parte relativa a avaliação.

INCIDÊNCIA DOS COMPENSATORIOS

O V. ACÓRDÃO RECORRIDO deve ser reformado na parte que da condenação que


determinou a incidência de JUROS COMPENSATÓRIOS na proporção de 12%, desde a
edição do DECRETO 24.646/86.

Os COMPENSATÓRIOS foram instituídos pela JURISPRUDÊNCIA com a finalidade de


substituir o rendimento do bem questionado, fica claro através da CONTESTAÇÃO, da
PERÍCIA e demais elementos dos autos que o EXPROPRIADO jamais explorou o
imóvel em questão, nem obteve qualquer rendimento proveniente do mesmo.
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

Ora, no caso destes autos, não se vislumbra qualquer prejuízo ao EXPROPRIADO a


esse título, pois não ficou provado nos autos que o mesmo obtinha qualquer rendimento
com o imóvel objeto.

Por outro lado, conforme tem assinalado a JURISPRUDÊNCIA, os COMPENSATÓRIOS


INCIDEM A PARTIR DA IMISSÃO NA POSSE PELO PODER PUBLICO. Assim é nas
AÇÕES EXPROPRIATÓRIAS DIRETAS conforme SUMULA 164 do STF., que reza:-

“No PROCESSO DE DESAPROPRIAÇÃO, são devidos JUROS


COMPENSATORIOS desde a ANTECIPADA IMISSÃO NA POSSE,
ORDENADA PELO JUIZ, POR MOTIVO DE URGÊNCIA”

Aliás, esse E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA firmou a SUMULA 69 nesse mesmo


sentido. Vejamos:-

“Na Desapropriação DIRETA, os juros COMPENSATORIOS são


devidos desde a ANTECIPADA IMISSÃO NA POSSE e, na
Desapropriação INDIRETA, a partir da efetiva ocupação do
imóvel.”

No caso destes autos, não se comprovou nem a IMISSÃO NA POSSE e, muito menos,
a OCUPAÇÃO do imóvel pelo PODER EXPROPRIANTE. Ambas IMISSÃO e
OCUPAÇÃO não podem ser presumidas mas concretamente realizadas, conforme já foi
dito.
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

Portanto, há necessidade que se comprove a efetiva IMISSÃO na posse, para que


a partir dessa data incidam os COMPENSATORIOS caso se entenda devidos. Não
pode referida data estear-se em presunção. A Imissão na Posse tem que ter ocorrido de
fato para que os compensatórios passem a incidir.

A mera edição do DECRETO EXPROPRIATORIO, ou do DECRETO que criou a


ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA JURÉIA - DEC. 24.646/86 - em absoluto significa IMISSÃO
NA POSSE. De forma alguma, referido ato significa IMISSÃO NA POSSE, OCUPAÇÃO
ou ESBULHO por parte do ESTADO DE S. PAULO.

Não há prova nos autos que o PODER PUBLICO tenha em algum momento utilizado, ou
se apossado do imóvel objeto.

Portanto, quando o V. ACÓRDÃO RECORRIDO determina que os COMPENSATORIOS


incidam a partir da edição do DECRETO que instituiu a ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA
JURÉIA-ITATINS, esta PRESUMINDO que houve IMISSÃO ou OCUPAÇÃO, o que é
inadmissível em se tratando de indenização que deve ser paga com dinheiro publico.

A indenização por parte do PODER PUBLICO deve corresponder efetivamente aquilo


que tal ente causou prejuízo, desde que este seja comprovado. Ora, a mera edição de
tal Decreto não significa prejuízo, mas sim o cumprimento de um dever legal por parte
do ESTADO, e, ademais, os EXPROPRIADOS não comprovaram ter ocorrido e qual foi
o prejuízo com a vigência do citado DECRETO.

O próprio SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL tem entendido em casos como o


presente que o termo para a incidência dos compensatórios não pode ser a data
do ato estatal senão estiver acompanhado de prova de concreta imissão na posse.
Vejamos:-

"EMENTA OFICIAL:- Constitucional. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA.


Juros compensatórios. Data de sua fluência.
1. Juros Compensatórios fixados a partir da CITAÇÃO, tendo em vista
que não esta comprovada a data da ocupação.
2. Agravo Regimental Improvido.
..................................................
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

"É que a míngua de prova da efetiva data da ocupação do imóvel, a


data da CITAÇÃO inicial é um marco que pelo menos oferece a certeza
de que nela já havia ocupação, ao passo que a data do decreto
expropriatório, bem ao contrário, não passa de uma ficção despida de
qualquer lógica, posto que decreto expropriatório não induz a certeza
de ocupação da terra, porquanto não se confunde declaração de
utilidade pública para fins de desapropriação com a tomada de posse,
de fato, pelo poder desapropriante, quando, então, ocorre restrição ao
uso da terra."
(AI. 135040.7 (AgReg) - PR - 2a. Turma do STF. - j. 30.10.90 -
rel.Min.CARLOS VELOSO - "in" RT. 663/237).

Assim, mister seja reformado o V. ACÓRDÃO RECORRIDO, vez que o termo inicial
para que os compensatórios incidam é O MOMENTO EM QUE FICAR COMPROVADO
A IMISSÃO NA POSSE DO IMÓVEL OBJETO, consoante SUMULA 164 do STF.,
SUMULA 69 do STJ. e PRINCIPIO DA JUSTA INDENIZAÇÃO.

HONORÁRIOS ADVOCATICIOS

O V. ACÓRDÃO RECORRIDO condenou a FAZENDA a


pagar honorários advocaticios arbitrados em 10% sobre a diferença entre o valor da
oferta e a condenação, ambas atualizadas.

A JURISPRUDÊNCIA dominante tem considerado como justo


o percentual de 4% a 6% em ações EXPROPRIATÓRIAS, sobretudo quando o valor da
indenização é elevadíssimo, como no caso presente.
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

Ademais, sendo a ação de DESAPROPRIAÇÃO um


procedimento ESPECIAL que se regula por LEI ESPECIFICA, a condenação de
honorários, estabelecida no art. 27 parágrafo único do DL. 3365/41, não esta sujeita aos
limites do art. 20 § 3º do CPC.. Veja-se a respeito a JURISPRUDÊNCIA :-

“A LEI DE DESAPROPRIAÇÃO é ESPECIAL em relação ao CPC..


Encerra dispositivo próprio para a fixação da verba honorária,
afastando o limite do art. 20, § 3º, do Código unitário. “
(STJ 2a. Turma - RESP. 5974/SP - Rel. Min. VICENTE
CERNICCHIARO - j. 14/11/90 - publicado no DJU de 17/12/90, pag.
15.359).

De qualquer forma, sendo a FAZENDA PUBLICA condenada,


o arbitramento de honorários da parte vencedora rege-se pelas regras do parágrafo 4º
do mesmo art. 20 do CPC..

Assim, a verba honorária deve ser reduzida, consoante


JURISPRUDÊNCIA, e, ademais, por integrar a indenização, fere o PRINCIPIO DA
JUSTA INDENIZAÇÃO arbitramento em percentual tão elevado.

III - CONCLUSÃO

Demonstradas as razões de reforma do V. ACÓRDÃO


recorrido, bem como a divergência juris-prudencial e a legislação que restou ofendida, e
com isso justificada a interposição deste RECURSO com fun-damento no art. 105,
in-ciso III, letras "a" e "c" da CONSTITUIÇÃO FEDERAL, espera a FAZENDA DO
ESTADO DE S. PAULO, seja o mesmo recebido e aco-lhido, processado e quanto ao
mérito julgado PROVIDO, com a conseqüente re-forma da R. Decisão colegiada
recorrida, como é de

JUSTIÇA!
ESPECIAL EM DESAP NA JUREIA

S. Paulo, 21 de março de 1996

FÁTIMA FERNANDES CATELLANI


PROCURADORA DO ESTADO
EXMO

PROCURADORIA ADMINISTRATIVA - PA-1

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA 2a. VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA


CAPITAL

PROCESSO n. 872/96
ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO
AUTORES :- EDMUNDO MALUF e outros

FAZENDA DO ESTADO DE S.PAULO, por sua procura-dora, nos autos em referência,


vem, mui res-peitosamente, à presença de V.Exa., apresentar sua

CONTESTAÇÅO

pelas razões de fato e de direito que passa a expor:-

1. - DOS FATOS

Pleiteiam os AUTORES indenização rela-tiva a imóvel com área de 319.774,70 m2.,


sendo parte da área denominada VILA MALUF, no local chamado AREÃO, BAIRRO DO
GUAIO, no MUNICIPIO E COMARCA DE SUZANO, face as RESTRIÇÕES DE USO
impostas pela LEI n. 5598 DE 06/02/87 e seu REGULAMENTO - DECRETO 37.619 de
06/10/93, os quais tratam das “ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL” e que abrangem
toda a região que circunda e que sofre as conseqüências das cheias do RIO TIETE,
acarretando prejuízo que se caracteriza em interdição ao uso e gozo da propriedade,
consoante fls. 06 da INICIAL, tendo sido violado o exercício do direito de propriedade
EXMO

(art. 524 do CC.), caracterizando a ocorrência de EXPROPRIAÇÃO DIRETA DO


DIREITO DE CONSTRUIR o que é muito diferente das hipóteses de mera limitação de
uso (fls. 06 da Inicial).

No entanto, culminam os AUTORES (fls. 10 da Inicial) por exigir indenização


correspondente a 4/5 do valor do imóvel, face a depreciação que o imóvel sofre em
razão da restrição do direito de construir, mais custas, despesas judiciais e honorários
advocatícios.

De qualquer forma, a presente ação é to-talmente IMPRO-CEDENTE, senão vejamos.

PRELIMINARMENTE

2 - OUTORGA UXÓRIA

Tanto na INICIAL como nas PROCURAÇÕES de fls. 12 e 11, os AUTORES, Srs.


EDITH MALUF TAKLA e EDMUNDO MALUF, constam como casados anteriormente a
vigência da LEI 6.515/77 pelo regime da comunhão universal de bens, ela com o Sr.
PHILIPPE TAKLA e ele com a Sra. VERA RACY MALUF (fls. 18v.). Conseqüentemente,
por força do que dispõe o art. 10 do CPC. são eles partes ilegítimas para sozinhos
proporem a presente ação. Nesse sentido também é a JURISPRUDÊNCIA. Vejamos:-

“PROCESSUAL CIVIL - DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA - AÇÃO DE


NATUREZA REAL - NECESSIDADE DE OUTORGA UXÓRIA - ART.
242 II, 246 e 276 do CÓDIGO CIVIL.

As ações de DESAPROPRIAÇÃO DIRETA e INDIRETA são espécie do


mesmo gênero, ambas importando na transmissão da propriedade
imobiliária para órgão público, impondo-se a este o pagamento pela
aquisição da propriedade.

Por isso, tem natureza real, razão pela qual, para propor ação de
EXMO

desapropriação indireta, a mulher tem que ter autorização do marido.


Recurso provido.”
(ACÓRDÃO no RESP. 46.899-0/SP - rel. min. CESAR ASFOR
ROCHA - 1a. Turma do STJ. - j. 16/05/94 e publicado no DJU em
06/06/94 - rtes.: FESP e rdos: ASTREA CAMPOS DA SILVA)

Assim, devem referidos AUTORES serem intimados para no prazo do art. 284 do CPC.
fazer com que os cônjuges integrem a presente lide, ou obtenham judicialmente a
OUTORGA UXÓRIA, sob pena de NULIDADE conforme preceitua o parágrafo único do
art. 11 do CPC..

3. - TITULARIEDADE NÃO COMPROVADA

Quer se trate a presente ação de uma INDENIZATORIA que resulte em


EXPROPRIAÇÃO INDIRETA ou em MERO RESSARCIMENTO POR RESTRIÇÕES DE
USO, devem os AUTORES desde o inicio comprovar que têm o domínio da área objeto.

Pretendem os AUTORES convencer que são os legítimos proprietários da área em


questão com a juntada aos autos, às fls. 18/21, das CERTIDÕES IMOBILIARIAS
expedidas pelo CARTÓRIO DE SUZANO das MATRICULAS ns. 44.769 e 46.370,
expedidas em junho/93 e julho/95.

Ora, dessa época em que as CERTIDÕES de fls. 18/21 foram expedidas e a propositura
da ação os AUTORES já poderiam ter transferido o domínio da área em questão, ou o
mesmo ter sido onerado, penhorado, dado em garantia, etc...

Conseqüentemente, impõe-se que os AUTORES comprovem serem os atuais e


legítimos titulares do imóvel objeto apresentando CERTIDÃO IMOBILIARIA atualizada,
assim como comprovem que os impostos que incidem sobre os mesmos estão
perfeitamente quitados, vez que se esta ação resultar na EXPROPRIAÇÃO da citada
área, o ESTADO somente deve recepcioná-la de quem é o seu legitimo proprietário, sob
pena de nulidade de todo o processado, bem como livre de ônus e alienações.

Assim, caso os AUTORES não comprovem a titulariedade atual, livre de ônus e


alienações, no prazo do art. 284 do CPC., deverão ser julgados CARECEDORES DE
EXMO

AÇÃO por ILEGITIMIDADE DE PARTE ATIVA.

4 - ÁREA COM RESTRIÇÀO NÃO DISCRIMINADA -


ART. 225 DA LEI 6015/73

Arguem os AUTORES que inicialmente eram titulares da área de 2.904.000,00 ms.,


conforme ESCRITURA de fls. 15/17, a qual foi Transcrita no CARTORIO IMOBILIARIO
DE MOGI DAS CRUZES sob n. 14.268, e sob n. 7607 no CARTORIO IMOBILIARIO DE
SUZANO, embora ambas CERTIDÕES não constem dos AUTOS.

Alegam, ainda que, essa área maior foi desmembrada em várias áreas, sendo que a
objeto destes autos são as glebas “2” e “3”, Matriculadas no CARTORIO IMOBILIARIO
de SUZANO sob ns. 44.769 e 46.370, com a metragem de 414.530,86.

Acontece que, na realidade, conforme alegam às fls. 04 da Inicial, a área que de fato
existe é de 319.774,70, porém em nenhum momento especificam onde começa e
termina referida área, quais são os confrontantes, suas características, logradouros,
proximidade das edificações e esquinas próximas, etc..., tudo conforme exige o art. 225
da LEI DE REGISTROS PUBLICOS.

Portanto, devem os AUTORES, no prazo do art. 284 do CPC., atender a exigência do


art. 225 da LEI 6015/73, descrevendo na forma da LEI, qual é a área objeto, sob pena
de INDEFERIMENTO DA INICIAL por INEPCIA DA INICIAL.

5. INDEFERIMENTO DA INICIAL

A INICIAL também é de ser INDEFERIDA por INEPCIA da INICIAL face flagrante


CONTRADIÇÃO existente na INICIAL e em face da documentação existente nos autos.

Primeiramente, alegam os AUTORES que objetivam indenização vez que o direito de


propriedade deles, em face das restrições de uso decorrentes da LEGISLAÇÃO DE
PROTEÇÃO AMBIENTAL que mencionam, resultou num “NADA ECONOMICO”, que
implica numa DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA e que não houve mera limitação
EXMO

administrativa (fls. 06).

Ora, isso significa que os AUTORES pretendem indenização correspondente ao valor da


imóvel, conforme apurado em PERICIA, vez que o direito de propriedade deles restou
aniquilado, com a conseqüência transferência do domínio da citada área para o
ESTADO, sendo, portanto, esta ação de natureza real.

Acontece que a final, os AUTORES pleiteiam indenização correspondente a tão


somente 4/5 do valor do imóvel em face restrições ao direito de construir, o que significa
que estão querendo indenização por restrição de uso e sem que haja transferência do
domínio para o Estado, sendo, portanto, esta ação de natureza pessoal.

Dessa forma, o DIREITO DE DEFESA do ESTADO esta totalmente prejudicado, porque


se os AUTORES pleiteiam indenização por Expropriação Indireta a conseqüência, além
da indenização, é a transferência do domínio, havendo implicações na natureza da
ação, prescrição, competência, etc.... Agora, se objetivam eles, apenas e tão somente
indenização por restrição de uso, as implicações são outras, com reflexo na prescrição,
competência, etc....

Como se não bastasse, os AUTORES arguem que a área existente de 319.774,70 foi
abrangida pelo DECRETO 37.619 de 06.10.93 e pela LEI 5598/87, e assim objetivam
indenização correspondente ao valor de todo o imóvel quer por EXPROPRIAÇÃO
INDIRETA quer por mera RESTRIÇÀO DE USO AO DIREITO DE CONSTRUIR (4/5 do
valor do imóvel).

Acontece que, consoante CERTIDÃO expedida pela PREFEITURA DE SUZANO a área


abrangida pela citada LEGISLAÇÃO DE PROTEÇÃO AMBIENTAL nas proximidades do
RIO TIETE é apenas e tão somente de 100.530,86m2. (fls. 57)

Assim, fica a duvida, a final a qual área diz respeito a indenização objeto destes autos:-
a área existente de fato de 319.774,70 ou a área de 100.530,86 m2. ?

Dessa forma, como do teor da inicial não decorre o que efetivamente pleiteiam os
AUTORES, a INICIAL é de ser INDEFERIDA por INEPCIA consoante art. 295 inciso I e
§ único inciso II do CPC..

6 - FALTA DE INTERESSE DE AGIR -


EXMO

(RESTRIÇÃO AO USO OBJETIVADO PREEXISTENTE A LEI 5598/87 E DECRETO


37619/06.10.93)

Antes da LEI 5598/87 e do DECRETO 37619/06.10.93 a destinação que os AUTORES


objetivavam dar ao imóvel objeto, ou seja, desmatamento e parcelamento, estavam
vedados, de há muito, pela LEGISLAÇÃO FEDERAL.

Daí que, os AUTORES, também, são CARECEDORES DA AÇÃO, por falta de


INTERESSE DE AGIR, eis que a destinação objetivada, ou seja, o desmatamento
inconseqüente e parcelamento, já estavam de há muito impossibilitado dado proibições
decorrentes da LEI FEDERAL que trata do PARCELAMENTO e LOTEAMENTO, além
da exploração estar vedada em face das disposições da LEGISLAÇÃO FLORESTAL e
de PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE também de origem FEDERAL, bem como
estavam os AUTORES obrigados a respeitar diversas áreas marginais a cursos d’água
em face do CÓDIGO DE ÁGUAS, tudo isso anteriormente a LEGISLAÇÃO
ESTADUAL objeto dos autos que instituiu as ÁREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL
decorrentes do RIO TIETE.

Da documentação existente nos autos o que se ve-rifica é também a pretensão de se


discutir a inviabilização de um di-reito em tese, sobre o uso econômico da propriedade,
não exercitado na época oportuna.

E isto porque, a LEGISLAÇÃO contra a qual os AUTORES se insurgem tão somente


impuseram LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS GERAIS e no INTERESSE DA
COLETIVIDADE. Não tendo os AUTORES, ou seus antecessores, antes de sua entrada
em vigor, promovido a instituição de qualquer empreendimento no local, segundo as
regras anteriormente vigentes, nem por isso, sobrevindo a LEI nova e lhes impondo
maiores restrições, tem ele direito a qualquer indenização.

Não se pode olvidar que a LEGISLAÇÃO ESTADUAL DE PROTEÇÃO as áreas


próximas ao RIO TIETE contra a qual se insurge os AUTORES apenas encampou ou
disciplinou restrições que lhe são preexistentes, posto que já esta-vam previstas no
EXMO

CÓDIGO DE ÁGUAS, CÓDIGO FLORESTAL e demais LEGISLAÇÃO FEDERAL


FLORESTAL e de PROTEÇÃO AO MEIO AMBIENTE, LEI DO LOTEAMENTO, e
LEGISLAÇÃO SOBRE PARCELAMENTO. O ESTADO, portanto, ao editar referidos
di-plomas legais não incidiu em qualquer ilícito, apenas exerceu um di-reito-dever ao
qual esta obrigado sob pena de responsabilização (art. 160 inciso. I do CC.).

Isto se diz porque o ESTADO esta obrigado a dis-ciplinar o uso dessas áreas sobretudo
visando evitar os malefícios de cheias, deteriorização das águas, e demais malefícios.
Esse, aliás é o objetivo dessa LEGISLAÇÃO, conforme se verifica pelo ter dos incisos
do art. 1º do DECRETO 37.619 em anexo.

E, como se não bastasse, o proprietário, em face do que dispõe o art. 572 do CC., tem
a faculdade de usar a sua proprie-dade como melhor lhe aprouver, desde que respeite
as posturas adminis-trativas, no que se constitui a citada LEGISLAÇÃO de
PROTEÇÃO AMBIENTAL a região do RIO TIETE.

Conseqüentemente, quando muito faria jus a indenização se a LEI nova lhe impedisse
de utilizar o imóvel segundo a sua destinação natural (cf. HELY LOPES MEIRELLES,
Direito Administrativo Brasileiro, ed. 1984, pag. 530 e seg.), coisa que não ocorreu.
Apenas no interesse da coletividade, restringiu o seu uso como costumeiramente
su-cede com as legislações municipais de zoneamento, levando-o a retalhar o imóvel
em lotes maiores do que cogitava.

É o caso, também, da LEI FEDERAL sobre os LOTEA-MENTOS, n. 6766/79, que


formulou maiores exigências do que anteriormente vigia. Nem por isso os proprietários
dos imóveis, no momento do lotea-mento, têm direito a qualquer indenização.

O DECRETO 9714/77, nos arts. 55 e seguintes, determina regras de procedimento para


a admissão dos empreendimentos preexistentes e a aplicação de medidas de
adaptação. Com isto visa a LEI assegurar os DIREITOS ADQUIRIDOS dos proprietários
que possuíam, an-teriormente a sua vigência, lotes regularmente licenciados, projetos
de parcelamento, edificação, instalação, ampliação e reformas, aprovadas pelo órgão
EXMO

municipal ou estadual, ou que tivessem sido objeto de finan-ciamento. O dispositivo não


se aplica ao caso em questão, tendo em vista os AUTORES jamais proporcionaram a
área em questão qualquer destinação a não ser permanecer como esta.

Recentemente, em ação semelhante a presente em que se pleiteia indenização em face


da instituição do PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO MAR (Dec. 10.251/77 e Res.
Tombamento), o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA , através do MINISTRO
HUMBERTO GOMES DE BARROS, proferiu a seguinte R. DECISÃO (inclusa) no
RECURSO ESPECIAL n. 30.835/SP publicada no DJU de 22/02/96, a saber:-

“A Recorrente, em ação ORDINÁRIA promovida contra o ESTADO DE S.


PAULO, pretendeu INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA,
traduzida no TOMBAMENTO de propriedade sua.

O V. ACÓRDÃO RECORRIDO extinguiu o processo, sem julgamento do


mérito.
...
O Recurso Especial apoia-se no permissivo da alínea “c”. Nele, trazem-se
a contrate vários acórdãos em que se proclama ser indenizável
transformação de qualquer mata, em reserva de preservação permanente.

Tais arestos, contudo, não se colocam em posição contrária ao V.


Acórdão recorrido. É que, neste não se contraria a tese de que a
transformação gera prejuízo. A indenização é repelida, porque, na
hipótese, porque:

A) AS RESTRIÇÕES JÁ EXISTIAM, POR FORÇA DO CÓDIGO


FLORESTAL, QUANDO A AUTORA COMPROU A GLEBA;

B) AS CARACTERÍSTICAS TOPOGRÁFICAS DO TERRENO


TORNAM ANTIECONÔMICA A EXPLORAÇÃO DA FLORESTA.
EXMO

O dissídio não esta demonstrado.

O Recurso Especial é manifestamente incabível.

Nego-lhe seguimento (...)”


(R. DECISÃO prolatada pelo MIN. HUMBERTO GOMES DE BARROS, no
RECURSO ESPECIAL n. 30.835/SP. (92/0033395-8), Rte.: Soc. Imob.
Guarujá Ltda. e Rdo.: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO)

Como se não bastasse, o DECRETO 37.619/93 determinou que nas AREAS DE


PROTEÇÃO AMBIENTAL inseridas na CATEGORIA de CINTURÃO MEANDRICO, que
é o que menciona a CERTIDÃO MUNICIPAL de fls. 57, que tivessem atividades
licenciadas mas não instaladas, poderiam prosseguir com as mesmas desde que
adaptadas (art. 9º § 2º).

Quanto as áreas incluídas na CATEGORIA - USO CONTROLADO é permitido até a


instalação de novos parcelamentos (art. 10 do citado DECRETO), e os anteriormente
implantados, aprovados e registrados são considerados conformes (art. 12), os não
aprovados dependem da apresentação do PROJETO DE RECUPERAÇÃO AMBIENTAL
(art. 13). Admite-se, nessa CATEGORIA, até mesmo a instalação de
EMPREENDIMENTOS INDUSTRIAIS (art. 14), AGRICOLAS (art. 15) e exploração de
MINERIOS (art. 16).

Quanto as áreas que pertencem a CATEGORIA - PRESERVAÇÃO PERMANENTE, a


exploração das mesmas já era anteriormente impedida pelo disposto no art. 2º do
CODIGO FLORESTAL, além da LEI 6.766/79 e outras.

Como se verifica, os AUTORES não tem razões fáticas para a propositura desta ação,
porque o uso na área objeto é permitido pela própria legislação contra a qual se
insurgem.

Logo, estando o pedido inaugural apenas fundado em simples alegações -


desacompanhado de qualquer prova de efetiva restrição de uso - deverá ser decretada a
EXMO

CARÊNCIA DE AÇÃO com base no art. 267, VI e art. 301, X, ambos do CPC., e julgado
EXTINTO o PROCESSO, con-denando-se o AUTOR nas custas e honorários
advocatícios e demais despe-sas decorrentes da presente ação.

7. - M É R I T O

7.1 - PRELIMINAR DE MÉRITO

DA PRESCRIÇÃO

A indenização pleiteada pelos AUTORES, envolve supostos direitos meramente


pessoais, que estão irremediavelmente PRES-CRITOS, diante do art. 1º do DECRETO
n. 20.910 de 06 de janeiro de 1932:

"As dívidas passivas da UNIÃO, dos ESTADOS e dos MUNICÍPIOS,


bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a FAZENDA
FEDERAL, ESTA-DUAL ou MUNICIPAL seja qual fôr a sua natureza,
prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se
originaram."

Efetivamente, por meio desta ação pretendem os AU-TORES efeitos meramente


indenizatórios, isto é, pessoais, como precedente-mente demonstrado nestas razões.
Realmente, não existindo apossamento administrativo do imóvel dos AUTORES, sua
pretensão se restringe à indenização relativa ao dano e prejuízo sofridos pelo advento
da LEGISLAÇÃO das AREAS DE PROTEÇÃO AMBIENTAL. Vejamos a
JURISPRUDÊNCIA :-

"Em verdade, e à despeito das bens fundadas razões do MM. JUIZ


suscitado, os Autores o que pretendem é tão somente ter indenização
EXMO

pelas restrições (contra as quais se insurgem) que sofreram na ampla


utilização na propriedade, que continua a ser exclusivamente sua. É
uma situação diferente da exploração direta ou indi-reta, que deságua
no desapossamento administrativo ou perda da propriedade,
mere-cendo outro tratamento jurídico. Eles foram atingidos apenas nos
seus direitos pessoais" (ACÓRDÃO proferido pela CÂMARA
ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE S. PAULO, no
Julgamento do CONFLITO DE COMPETÊNCIA n. 3.650-0 -
RELATOR DES. PINHEIRO FRANCO).

"Inconformada com a decisão que reconsiderou despacho anterior e


reconheceu a com-petência do juízo, por se tratar de ação de natureza
pessoal e não real, agravou de instrumento a FAZENDA DO ESTADO.
Após a resposta, a decisão foi mantida.
Buscam os AGRAVADOS, na realidade ressarcimento e prejuízos
decorrentes das restrições sofridas no aproveitamento econômico do
bem, em razão da criação do Parque Estadual.

Não se discute, na verdade, posse ou domínio da área. Correta,


portanto, a propositura da demanda no domínio da agravante.
(ACÓRDÃO proferido pela 11a. CÂMARA CIVIL DO TRIBUNAL DE
JUSTIÇA DE S. PAULO, no julgamento do AGRAVO DE
INSTRUMENTO N. 60.177-2, sendo RELATOR o DES. LUIZ
FRANCISCO).

"Administrativo. LIMITAÇÃO DE USO DA PROPRIEDADE.


Respon-sabilidade Civil. Ação Ordinária de indenização. PRESCRIÇÃO.
Artigos 524 e 550, CÓDIGO Civil. Artigo 269, IV, CPC. DECRETO
20910/32 (ARTIGO 10)
1. Objeto e causa de pedir circunstanciam litígio decorrente de ato
administrativo que não causou a perda da propriedade, adequado à
EXMO

ação ordinária de indenização, sujeita ao prazo qüinqüenal e não ao


vintenário da prescrição.
2. A espécie também não se confunde com a chamada área non
aedificandi, porque não resultou de ato DESAPROPRIATÓRIO (direto
ou indireto).
3. Pretendido direito de indenização sem a qualificação jurídica do fato
como di-reito real.
4. Aplicação do Decreto 20.910/32 (art. 10).
....(RESP. 6118-0/SP. - RTE.:- Gabrielle Canes-trelli e outros RDA.:-
Fazenda do Estado de S. Paulo - 1a. TURMA STJ. - j. 15/12/93

As ações pessoais contra a FAZENDA PÚBLICA prescrevem em 5 (cinco) anos, nos


termos do art. 1º. do DL. 20.910/06.01.32.

Sobre a aplicabilidade do DEC. 20.910/32, no que se refere às ações fundadas em


direitos pessoais, o C. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, em voto da lavra do saudoso
Min. THOMPSON FLORES, já assentou que :-

"O PRETÓRIO EXCELSO, como se vê do aresto citado na petição de


re-curso, já entendeu que dita PRESCRIÇÃO compreende todas as
ações fundadas em direito pessoal, como é a de que tratam os autos"
("in" RE. 46231 - RDA. 97/115).

Com efeito, conforme sustentam os AUTORES, as alega-das restrições imposta à sua


propriedade decorrem específica e direta-mente, da LEI ESTADUAL n. 5598/06.02.87
de imediata aplicação. O DECRETO 37.619/93 apenas regulamentou aquela,
apresentando inclusive inúmeras ressalvas, permitindo o pleno uso nessas áreas.

De-mais disso, a LEI 5598/87 foi acompanhada de mapas e memoriais publicados que
defi-niram o perímetro das áreas protegidas. Portanto, já a partir das mes-mas, nasceu
para os AUTORES o direito de se insurgir contra eventuais pre-juízos acarretados pela
LEGISLAÇÃO mencionada. O princípio regente da ação, na espécie, é o da "actio nata".

Portanto, não o fazendo dentro do prazo de 5 (cinco) anos a partir da edição dos
referidos diplomas legais (1987) e, trans-corrido mais de 09 (NOVE) anos desde a
EXMO

entrada em vigor da LEI 5598/87 que instituiu as "ÁREAS DE PROTEÇÃO


AMBIENTAL” inegavelmente prescrita está qualquer ação através da qual pretendem
os AUTORES reivindicar os supostos direitos invocados na preâmbular.

A DOUTRINA endossa referida tese, conforme lição do Prof. WASHINGTON DE


BARROS MONTEIRO , "in" CURSO DE DIREITO CIVIL, 10. vol., ed. SARAIVA/1983,
pág. 291/2, ao assentar que:-

"Cumpre reconhecer todavia que as pessoas jurídicas de direito publico


interno, união, estados, municípios, bem como as autarquias (DL. n.
4597 de 19/08/1942, art. 20.), recebem tratamento especial, pois suas
dívidas passivas, ou qualquer ação contra elas, prescrevem em cinco
anos apenas (C. CIVIL art. 178 par. 10, n. VI; DEC. n. 20910/32, art.
10.), quando, nos mesmos casos, a prescrição seria mais longa para as
demais pessoas, naturais ou jurídicas."

Ressalte-se, ademais, que o art. 1º. do DL. 20910/32, precedentemente


reproduzido, não permite, "d.v.", sequer dis-tinguir a espécie de ação contra a
FAZENDA PÚBLICA, para aplicar outro prazo prescricional, quando qualquer ação
prescreve em 5 (cinco) anos.

Tal entendimento, também, é corroborado pelo PRETÓRIO EXCELSO que, ao julgar o


RECURSO EXTRAORDINÁRIO 95.592/SP., as-severou:-

"A PRESCRIÇÃO Qüinqüenal a favor da Fazenda Pública, estabe-lecida


pelo art. 10. do DL. 20910 de 1932, alcança "todo e qualquer direito e
ação, seja qual for a sua natureza, sem EXCEPTUAR os assegura-dos
por Lei ao servidor público..." (RTJ. 108/1176)

Recentemente, em julgamento em ação análoga à presente, posicionou-se o


SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, da mesma forma, consoante V. ACÓRDÃO
proferido no RECURSO ESPECIAL n. 5143/SP, DJU. 25/02/91, tendo sido REL. MIN.
EXMO

AMERICO LUZ, como segue:-

"Na verdade, embora a recorrente não tenha invocado diretamente o


dec. 20910/32, observo que seu artigo primeiro torna inútil qualquer
discussão em torno da natureza da ação - se real ou pessoal, pois
expressamente dispõe que, para

todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda


Federal, Esta-dual ou Municipal, seja qual for a sua
natureza.

o prazo prescricional é de cinco anos, contados do ato ou fato que lhes


dão origem. Por isso, as pretensões contra a Fazenda Pública,
ressalvada norma expressa e específica inexistente no caso,
prescrevem em cinco anos."

Do exposto, exsurge, iniludivelmente, qualquer o angulo em que se analise a questão,


inarredável se torna, "d.m.v.", a declaração da PRESCRIÇÃO que fulminou o direito do
AUTOR de pleitear indenização no caso em tela, impondo-se a EXTINÇÃO DO
PROCESSAMENTO com fundamento no art. 269, inciso. IV do CPC..

Dentre os primeiros diplomas a es-tabelecer restrições de uso sobre as matas, florestas,


rios, lagos, margens, etc... existentes na SERRA DO MAR, esta o longínquo CÓDIGO
FLORESTAL de 1934, Decreto 23.793, e, posteriormente, o DECRETO FEDERAL n.
50.813 de 20/06/61. Depois veio o atual CÓDIGO FLORESTAL, a Lei 4.771/65, sem se
falar no CÓDIGO DE ÁGUAS, e a seguir da LEGISLAÇÃO DE PROTEÇÃO DOS
MA-NANCIAIS (LEI 898/75 e 1172/86), além da LEI 5598/87 e DECRETO 37619/93, nas
quais os AUTORES fundamentaram sua pretensão.

Portanto, se alguma indenização é devida aos AU-TORES, o direito de pleitea-la, esta


EXMO

cor-rendo deste o ano de 1934. Por-tanto, a presente ação esta PRESCRITA, porque
entre o primeiro diploma legal que restringiu o uso da propriedade dos AUTORES e a
propositura da presente ação, - devendo-se para tanto, se considerar a data de
09/10/1996, quando ocorreu a CITAÇÃO DA FAZENDA (fls. 65.), no que pese o
mandato ter sido tão somente juntado aos autos em 17/10/96 (fls. 64) - decorreram mais
de 20 (vinte) anos.

Ainda que se conte tal prazo a par-tir do vigente CÓDIGO FLORESTAL que data de
1965, cujas restrições de ocupação e desma-tamento foram encampadas e
regulamentadas pela LEI 5598/87, verifica-se que já ocorreu a PRESCRIÇÃO, posto
entre a sua vigência - 1965 - e a propositura desta ação - 1996 - já transcor-reu mais de
20 (vinte) anos.

Argumentar que só a LEI 5598/87 e o DECRETO 37619/93 restringiu o uso da área em


questão, de forma a inutilizar o direito de propriedade, ensejando o di-reito a
indenização, se constitui em mera tentativa de levar a equívoco o JUDICIÁRIO para
afastar a PRESCRIÇÃO.

Em suma, se considerarmos que "in casu" a PRESCRIÇÃO que se aplica é a do art.


177 do CÓDIGO CIVIL, constata-se que a mesma já transcorreu,.

De qualquer forma, a FAZENDA volta a insistir que a presente ação é de ser julgada
EXTINTA porque não se pode ignorar o DECRETO 20.910/32, que se consti-tui num
legislação especial, a disci-plinar a PRESCRIÇÃO concernente as dividas passivas e as
ações contra a FA-ZENDA PÚBLICA, seja ela da UNIÃO, ESTADOS ou MUNICÍPIOS.

Diante do exposto, REQUER-SE a decretação da PRESCRIÇÃO(art. 269, VI, do CPC.).


EXMO

Todavia, caso assim não entenda esse D. JUÍZO, passa a FAZENDA DO ESTADO a
enfocar as demais questões ligadas ao "meritum causae", todas elas, da mesma forma,
condizentes à IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO, como a seguir se demonstrará.

7.2 - M É R I T O

Inicialmente, cumpre assinalar, que inexistindo o APOSSAMENTO no presente caso,


mas mera restrição ao uso da propriedade dos AUTORES em decorrência da LEI n.
5598/87 e DECRETO 37619/93, está afastada a hipótese de desapropriação indireta e,
por con-seguinte, da indenização total do imóvel objeto da demanda. Resta anali-sar se
as restrições provenientes as LEIS ESTADUAIS mencionadas são in-denizáveis.

A respeito do tema, ensina o Prof. HELY LOPES MEIRELLES, ensina, conforme lição
extraída da obra DI-REITO ADMINISTRA-TIVO BRASILEIRO, 8a. ed./1981, pg. 560 -
RT.), a saber:-
"A nossa CONSTITUIÇÃO assegura o Direito de Propriedade, mesmo
porque é um direito individual por excelência, do qual resulta
prosperidade dos povos li-vres. Mas a propriedade, de há muito deixou
de ser exclusi-vamente o direito sub-jetivo do proprietário, para se
transformar na função social do detentor da ri-queza, na expressão feliz
de DERGUIT. É direito individual, mas um direito individual
condicionado ao bem-estar da comunidade.

É uma projeção da personalidade humana e seu complemento


necessário, mas nem por isso a propriedade privada é intocável. Admite
LIMITAÇÕES ao seu uso e restrições ao seu conteúdo em beneficio da
Comunidade." (grifos do AU-TOR).
EXMO

Assim, com o advento da LEI 5598/87 e DECRETO 37619/93 que objetivam equacionar
e ajudar a resolver os problemas de ocupação de espaço de desconcentração
metropolitana e principalmente preservação dos insubstituíveis recursos naturais, as
propriedades existentes nas zonas sujeitas as cheias do RIO TIETE, etc..., estão
condicionadas às exigências do bem estar social, sofrendo limitações administrativas.

LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS são toda e qualquer imposição geral, gratuita,


unilateral e de ordem pública que condiciona o exercício de direitos ou de atividades
particulares às exigências do bem estar so-cial, percebe-se facilmente que as restrições
ao direito de propriedade dos AUTORES enquadra-se no conceito deste instituto jurídico
que, diga-se não é indenizável.

Mister, ainda, citar a lição de MA-RIA SYLVIA ZA-NELLA DI PIETRO, que consta da
obra SERVIDÃO ADMINISTRATIVA - ed. RT./1978, pg.72, que ensina :-

"Quando, no entanto, a LIMITAÇÃO for apenas no sentido de regular o


exer-cício da propriedade mediante normas restritivas de caráter geral,
impostas no in-terêsse público, não se justifica a indenização, uma vez
que não se trata de restrição imposta a indivíduos determinados, mas a
toda uma coletividade; nesse caso, o sacrifício imposto a todos é
compensado por um beneficio de ordem geral. É o que ocorre com as
chamadas limitações admi-nistrativas à propriedade privada (no sentido
estrito) e também com deter-minados tipos de servidão que se
assemelham àquelas limitações por decorrerem diretamente da lei e
incidem sobre toda uma categoria de prédios, como nas servidões
marginais aos rios públicos e nas servidões ao redor dos aeropor-tos."

Segundo o preciso ensinamento de JOSÉ AFONSO DA SILVA ("in" DIREITO


URBANÍSTICO BRASI-LEIRO, pg. 531 - ed./1981), não basta à distinção entre a
limitação e a servidão administrativas a sim-ples correlação com um bem público, uma
vez que todas as restrições estão assim correlacionadas.

O que importa distinguir é se a restrição foi imposta em função do interêsse


público em geral ou do interêsse especí-fico da entidade pública, este último que,
EXMO

se existente, serviria justa-mente para determinar ou individualizar a propriedade cuja


facul-dade de gozo acabou restringida.

Ora, é evidente que o ESTADO não tem qualquer interesse específico na proteção
dessas áreas próximas e sujeitas as enchentes do RIO TIETE, etc..., porquanto o
in-teresse é só da sociedade em geral.

Decisivo, por igual, que as restrições em debate implicaram tão somente em obrigação
de não fazer ou deixar de fazer, de-las não resultando, por conseguinte, o
desmembramento dos poderes ine-rentes ao domínio, tanto que o DECRETO 37619/93
não impos aos proprietários a obrigação de suportar a realização de obras ou serviços
do Poder Publico

Segundo, ainda, a lição do sempre lembrado mes-tre HELY LOPES MEIRELLES,


concerne a LIMITAÇÃO ADMINISTRA-TIVA :-

"limitação administrativa é toda imposição geral, gratuita, unilateral e de


ordem pública, condicionadora do exercício de direitos ou de atividades
particulares às exigências do bem estar social" ("in" DIREITO
ADMINISTRATIVO BRASILEIRO, 8a. ed./ RT. pg.600).

Isto posto, caracterizando-se essa legislação de proteção as áreas ambientais (próximas


ao RIO TIETE) típico ato de limitações administrativas baixa-das pelo PODER
LEGISLATIVO e EXECUTIVO, não poderão ensejar qualquer tipo de respon-sabilidade
indenizatória para o ESTADO já que este pratica ato que a par de ser legal, veio cumprir
o preceito do art. 160 da EC. 1/69, e que hoje esta estampado no art. 5º inciso XXIII e
art. 170, inciso. III ambos da vigente CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

Assim, ao dissecarmos a figura jurídica da intervenção estatal face a legislação de


proteção a essas áreas ambientais, verificamos:-
EXMO

a) as restrições obedecem a critérios genéricos e consideram outros, de


natureza geográfica (generalidade) (LEI 5598/87, arts. 3º e 4º,
DECRETO 37619/93, diversos dispositivos);
b) a referida legislação é imposta no interesse público, de caráter geral,
com o objetivo de tutelar o uso do solo, para proteger as nascentes dos
rios e os corpos d'agua que nu-trem a nossa região metropolitana;

Não há como escapar do enquadramento embasado pela definição supra mencionada


do Prof. HELY LOPES MEIRELLES, no to-cante a que as restrições impostas ao
particular consubstanciam-se em verdadeiras limitações administrativas.

Pelo que, impossível se furtar ao terceiro ele-mento acima destacado, deste instituto,
qual seja, a sua gratuidade ou sua não sujeição a qualquer indenização.

É o ESTADO fazendo valer o preceito constitucio-nal no tocante à FUNÇÃO SOCIAL da


propriedade. Aplica-se aqui, perfeita-mente a lição que se extrai do V. ACÓRDÃO
proferido na APELAÇÃO N. 134.385-2/Mairiporã, j. em 17/10/88).

Assim, não há como se falar em indenização por hipotéticos prejuízos ao direito de


propriedade dos AUTORES pelas limitações administrativas advindas com a edição da
legislação de proteção dessas áreas ambientais.

Demais disso, a ação foi ajuizada quando já vi-gorava a CONSTITUIÇÃO DA


REPUBLICA promulgada em 1988 que, em seu art. 225 par. 4º., elevou entre outras
áreas, a SERRA DO MAR, a MATA ATLÂNTICA, como patrimônio nacional, com a
previsão de que "sua utilização far-se-á, na forma da LEI, entro das condições que
assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos
naturais. E contra a CONSTITUIÇÃO não se pode invocar DIREITO ADQUIRIDO (AP.
167.374-2 - 11A. Cam.Civil DO TJSP. em 21/02/91).
EXMO

Anote-se que os AUTORES ou seus antecessores jamais deram qualquer


destinação econômica ao imóvel. O advento da legislação em tela (que data de 1987
e 1993) apenas restringiu o uso do imóvel, sem contudo, eliminar o direito de
propriedade do mesmo conforme já demons-trado.

As restrições de desmatamento e utilização de áreas próximas a cursos d'água já


estavam previstas no CÓDIGO DE ÁGUAS, CÓDIGO FLORESTAL, LEI SOBRE
PARCELAMENTO E LOTEAMENTO, todas de origem FEDERAL.

Como já foi dito, o ESTADO tem o dever de disci-plinar o uso dessas áreas, quer em
face das cheias, deteriorização das águas, etc..., a fim de evitar para a sociedade
prejuízos não só mate-riais como também pessoais. Se o ESTADO assim não agir é
responsabili-zado por omissão.

Por outro lado, não pode passar despercebido o fato de que o proprietário
permaneceu inerte por longo tempo, não promo-vendo qualquer atividade no
imóvel. O que significa dizer: a propriedade somente passou a interessa-lo na medida
em que poderia haver eventual indenização do PODER PUBLICO.

O ESTADO não pode ser condenado a indenizar por hipotéticos prejuízos ao imóvel
dos AUTORES, quando cumpre seu dever consti-tucional de implementar medidas que
asseguram a proteção ambiental.

De fato a LEI 5598/87 e o DECRETO 37619/93 longe de extinguir o di-reito de


propriedade dos AUTORES, visa apenas à um modelo de uso do solo nas áreas de
proteção, que se baseia na qualidade de água desejada.

Por outro lado, também o DECRETO 37619/93 não elimi-nou o direito de propriedade
dos AUTORES, mas apenas regulamentou e comple-mentou a LEI 5598/87, definindo e
delimitando o que foi tratado generica-mente na LEI anterior.
EXMO

Dessa forma, fica absolutamente claro que o ES-TADO não infringiu o par. 22, art. 153
da EC. 1/69, equivalente hoje ao art. 5º. inciso. XXII da CF/88, com a edição da
legislação mencionada, ape-nas condicionou o uso das propriedades existentes ao
longo dessas áreas de proteção ambiental, ao bem estar social, cumprindo dever
constitucional.

Ainda é de se considerar que esta a impedir a eventual indenização aos AUTORES, a


ausência da característica de certeza que o dano alegado deve se revestir, consoante
já decidiu o E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA na APELAÇÃO n. 137.965-1.

Conseqüentemente, em face do que já expôs, não há como se dar guarida a


preâmbular.

E, isto porque, retratam os autos caso de sim-ples limitação administrativa não


indenizável e que, tampouco atingiram a substância do direito de propriedade, não
implicando, sequer, em des-membramento das faculdades inerentes ao domínio, quais
seja, as de usar, gozar e dispor da coisa.

8. - CONCLUSÃO

ISTO POSTO, caso superadas as preliminares, o que se admite apenas por cautela, a
FAZENDA pede e espera seja a pre-sente ação julgada IMPROCEDENTE, condenando-
se os AUTORES nos ônus da su-cumbência a que deu causa, inclusive honorários
advocatícios a serem fi-xados na forma da LEI.

Termos em que, protestando pelas mais amplas provas em direito admitidas, em


EXMO

especial, juntada de documentos, perí-cias, vistorias, e outras que se fizerem


necessárias no decorrer da lide.

P. DEFERIMENTO,
S. PAULO, 06 de DEZEMBRO de 1996

FÁTIMA FERNANDES CATELLANI


PROCURADORA DO ESTADO.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

PROCURADORIA GERAL DO ESTADO


PROCURADORIA REGIONAL DE CAMPINAS
SECCIONAL DE JUNDIAÍ

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL


DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S. P.

Processo n. 126/93

A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por


seu Procurador, nos autos da ação de indenização que lhe move MARCO ANTONIO
MALZONI E OUTROS, não se conformando com a r. sentença prolatada, vem à
presença de V. Exa. interpor recurso de A P E L A Ç A O requerendo seja o
mesmo recebido e processado na forma da lei, remetendo-o ao Egrégio Tribunal
competente para apreciação das inclusas razões, onde a respeitável decisão atacada
deverá ser reformada.

Termos em que,
Pede deferimento.
Jundiai, 06 de dezembro de 1994.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

Enio Moraes da Silva


Procurador do Estado
OAB/SP 115.477

RAZÕES DE APELAÇÃO

PROCESSO N. 126/93
APELANTE: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO
APELADOS: MARCO ANTONIO MALZONI E OUTROS

EGRÉGIO TRIBUNAL,
COLENDA CÂMARA,

ÍNCLITOS JULGADORES:

A decisão de primeira instância ora recorrida não


deve subsistir, eis que, “data venia”, não decidiu adequadamente a presente demanda,
merecendo ser reformada, conforme será adiante demonstrado.

Trata-se de ação indenizatória de procedimento


ordinário por desapropriação indireta, em virtude de tombamento de bem imóvel.

Alegaram os apelados que, em razão de Ato de


Tombamento do Governo do Estado de São Paulo ficaram desapossados de seus
imóveis, impossibilitados de tirar proveito econômico dos mesmos, estando, assim, a
exigir indenização da Fazenda do estado de são Paulo.

O douto magistrado de primeiro grau julgou a ação


procedente para condenar a apelante no pagamento da indenização pleiteada,
asseverando que “a autoridade administrativa introduz uma série de restrições ao uso e
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

exploração da área tombada e essas restrições implicam sim em verdadeira proibição


de uso e exploração da propriedade dos autores, passando a ter caráter confiscatório”
(fls.485).

Porém, não agiu com o costumeiro acerto o MM.


Juiz monocrático, posto que a solução imposta ao caso não reflete a melhor aplicação
do direito e dos ideais de justiça que devem nortear as decisões do Poder Judiciário.

DA INFRIGÊNCIA DOS LIMITES LEGAIS DO


DESPACHO SANEADOR

Ao proferir o despacho saneador às fls. 102 dos


autos, o juiz desbordou dos limites da lei adjetiva que disciplina o que pode ser decidido
em tal despacho.

O artigo 331 do Código de Processo Civil não


permite que o juiz decida questão de mérito ao sanear o processo. E foi justamente o
que ocorreu. Ao afastar a incidência da prescrição da ação, restou decidida questão
indissociavelmente ligada ao mérito da causa, que somente deveria ter sido enfrentada
na sentença.

Dúvidas não existem que a prescrição, bem como


a decadência são temas vinculados ao mérito da demanda. Para confirmação desta
alegação, basta observar o que dispõe o Código de Processo Civil:

Art. 269. “Extingue-se o processo com


julgamento de mérito:
...
IV – quando o juiz pronunciar a
decadência ou a prescrição.”

Não há dúvidas de que a decadência e a


prescrição dizem respeito ao mérito da demanda. Neste sentido é a lição do consagrado
publicista Pontes de Miranda:

“Extingue-se o processo com


julgamento de mérito sempre que a extinção resulta de algo que atinge o
direito, a pretensão, ou a ação, ou a pretensão e a ação, ou a pretensão, ou
a ação (direito material).
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

...
Se houve decadência (extinção) do
direito, ou da pretensão e da ação, ou só da ação, extingue-se, com a
sentença, o processo. A prescrição é retirada da eficácia, retirada
regida, aí, pelo direito material, e a sentença que a declara extingue o
processo (art. 269, IV)”. (g.n.).
(in Comentários ao código de Processo Civil, Tomo III, pág.
449, Forense, 1973).

Em sendo questão de mérito, a mesma não


poderia ter sido decidida no despacho saneador, conforme entendimento da
jurisprudência:

“Como se vê, a causa já foi julgada em


duas instâncias, embora o processo ainda não tivesse ultrapassado a fase
do despacho saneador.

Esse extemporâneo julgamento de


mérito tem reflexos também sobre a prescrição: como tanto o despacho
saneador quanto o acórdão recorrido decidiram que o prazo prescricional
não começara a correr, porque o apossamento administrativo, tido como
certo e provado, vinha se prolongando no tempo, evidencia-se que o tema
da prescrição está intimamente legado ao mérito da causa e, por isso, só na
sentença poderia ser validamente apreciado.

Face ao exposto, opino pelo


conhecimento parcial do recurso e pelo provimento, anulando-se em parte o
despacho saneador para ajustá-lo aos limites legais, deixada para a
sentença a matéria que só nela pode ser apreciada e decidida (a existência
do direito à indenização e seu fundamento, bem como o tema da
prescrição).

Acolhendo in totum o pronunciamento


supra, conheço do recurso e lhe dou provimento.”
(RESP N. 5143-SP (90.9300-7). Rel.
Min. Américo Luz. Recte: Fazenda do estado de São Paulo. Recdos:
Manoel Pereira de arruda e cônjuge. – A Turma, por unanimidade,
conheceu do recurso e lhe deu provimento, nos termos do voto do sr.
Ministro-Relator – 2a Turma – 12.12.90).
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

Enfim, ao decidir o mérito da ação


prematuramente, o MM. Juiz “a quo” ofendeu dispositivo da Lei Federal N. 5.869/73 (art.
331 do Cód. De Proc. Civil).

Por esta razão, requer seja decretada a nulidade


parcial do despacho saneador, para adequá-lo aos ditames da lei adjetiva, nos moldes
do quanto exposto acima.

Primeiramente, conforme exposto na contestação


da Fazenda Pública do Estado, a presente ação se encontra prescrita, em razão da
incidência do Decreto Federal n. 20.910/32 cujo artigo primeiro está assim redigido.

“As dívidas passivas da União, dos


Estados e dos Municípios, bem como todo e qualquer direito ou ação contra
a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza,
prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se
originaram.”

O dispositivo supra transcrito não deixa margem a


dúvidas. Não importa qual a natureza da ação, o prazo prescricional em face da
Fazenda Pública será sempre de 5 (cinco) anos.

E, no caso “sub judice”, da data do ato de


Tombamento (08/03/83) até o momento da propositura da ação (11/02/93) decorreram
bem mais de cinco anos.

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça , no mesmo


julgado mencionado linhas atrás, se pronuncia sobre a questão, proferindo a seguinte
decisão:

“Na verdade, embora a recorrente não


tenha invocado diretamente o Decreto n. 20.910, de 6 de janeiro de 1932,
observo que seu art. 1o. torna inútil qualquer discussão em torno da
natureza da ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual
for a sua natureza, o prazo prescricional é de cinco anos, contados do ato
ou fato que lhe dão origem. Por isso, as pretensões contra a Fazenda
Pública, ressalvada norma expressa e específica inexistente no caso,
prescrevem sempre em cinco anos.” (g.n.).

Não há como deixar de aplicar o disposto no


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

Decreto Federal 20.910/32 que estabelece a prescrição quinqüenal para ações em face
das Fazendas Públicas. Hipótese diversa equivaleria à negativa de vigência de diploma
legal que contém norma expressa e específica, que deve prevalecer sobre as normas
gerais que tratam da prescrição.

O jurista Theotônio Negrão, citado na contestação


da Fazenda do Estado, confirma a plena vigência do supracitado decreto, asseverando
que seus efeitos são válidos para ações de qualquer natureza.

A jurisprudência pátria tem proferido muitas


decisões no mesmo sentido , inclusive o próprio Supremo Tribunal Federal, conforme
excerto de julgado reproduzido na contestação fazendária, sendo outro exemplo o
seguinte acórdão:

“De fato ocorrido em 1o de outubro de


1980, ajuizou-se ação indenizatória em 29 de março de 1988.
Toda e qualquer ação contra a
Fazenda Pública, seja qual for a natureza, prescreve em cinco anos.
O decreto judicial que proclamou a
prescrição o fez acertadamente e em harmonia com decisões desta Corte e
do C. Supremo Tribunal Federal. Recurso provido.”
(STJ – Re n. 6.858-RS – 1a. Turma –
Rel. Min. Garcia Vieira – DJU 16.10.91).

E mesmo o Tribunal de Justiça de são Paulo tem


acolhido a prescrição de cinco anos, prevista no indigitado decreto:

“Mas, relativamente à prescrição, tem


razão a agravante.
Inocorrente o apossamento
administrativo, pois não descrito na inicial da ação, nenhum ato que o
caracterizasse e não alegado , também, nenhum dano de natureza pessoal,
está abrangido pela prescrição quinqüenal o direito de eventual indenização
alegado pelos agravados, em razão de suposta restrição trazida ao uso de
sua propriedade pela decretação de utilidade pública, feita muito antes dos
cinco anos anteriores à propositura da ação, como bem o demonstrou a
agravante.” (g.n.). (TJESP – AI n. 159.204-2, da Comarca de Paraibuna,
13a. Câmara Civil, m.v., provimento parcial ao recurso).

Pelo exposto, portanto, requer a apelante seja


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

reconhecida a prescrição da presente ação.


DA INOCORRÊNCIA DA DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA

Para que se cogitasse de eventual direito à


indenização sobre os imóveis apelados, mister seria que tivesse ocorrido a propalada
desapropriação dos referidos bens.

Contudo, isto não aconteceu.

Não ocorreu a desapropriação indireta, pois o


Estado não se apossou dos imóveis dos apelados. Os proprietários das porções de terra
objeto da demanda, continuam com o respectivo domínio, e a Fazenda do Estado nunca
maculou este direito dos recorridos.

Como se deflui dos autos, os apelados nunca


foram desapossados de seus imóveis. Sempre lhes foi possível o uso, gozo e fruição
dos bens em questão. Ao passo que o Estado nunca se beneficiou de algum suposto
apossamento dos imóveis, pelo mínimo período que fosse.

E, não havendo desapossamento não há que se


falar em desapropriação indireta. Apossamento e seu antônimo, dasapossamento são
atos de posse, que se perfazem por meio de ações concretas e não se caracterizam em
decorrência de decretos, resoluções ou em virtude de qualquer espécie normativa.
Noutros dizeres, posse é fato, e este fato não aconteceu.

Neste diapasão, bem esclarecedor é o excerto do


seguinte julgado:
“Apossamento é o ato de posse não
decorrendo de simples decreto governamental.
E tal ato possessório não foi praticado
pela ré.
Aliás o perito que vistoriou o imóvel
atesta o imóvel pela autora ao consignar (fl. 121)-“os autores, ao que se
pode verificar através de documentação juntada aos autos, são os titulares
de domínio da área em estudo, exercendo também a efetiva posse sobre o
imóvel lá mantendo empregados.
...
Esse laudo pericial comprova que a
Fazenda do Estado não se apossou da área pertencente à autora, e por via
de conseqüência a autora não conseguiu provar o apossamento
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

administrativo.”

O Ato de Tombamento não implica e, sem dúvida,


não implicou em desapossamento, mormente considerando as múltiplas atividades
exercidas pelos proprietários em seus imóveis, constatadas pelo perito judicial, tais
como: equinocultura (haras), bovinocultura, reflorestamento de eucaliptos, além da
existência de casas com piscina, quadras de esportes, campo de futebol, salões de
jogos e de festas e de diversas outras edificações de infra-estrutura e destinadas a
empregados (vide laudo pericial às fls. 169).

Às atividades acima praticadas podem ser


acrescentadas, ainda, outras permitidas pelo Ato de Tombamento, como por exemplo:
criação de gado, construção de aviários, desenvolvimento de silvicultura, mineração,
abertura de clareiras destinadas à construção de habitações e seus anexos, construção
de pequenas barragens de contenção para fins de desenvolvimento da agricultura e
piscicultura.

Como se vê, além dos proprietários terem


garantido a posse de seus imóveis, estão, indubitavelmente, usufruindo de muitas
formas de suas propriedades, não se imaginando como aceitar a argumentação de que
teria ocorrido hipótese de apossamento dos imóveis pelo Estado.

Em suma, o presente recurso comporta


provimento, em razão de que o fundamento da demanda, ou seja, suposto apossamento
dos imóveis pelo Poder Público, não se verificou.

DA DISTINÇÃO ENTRE TOMBAMENTO E DESAPROPRIAÇÃO

Corroborando a argumentação da apelante de que


não existiu a propalada desapropriação indireta dos imóveis dos apelados, está a
cristalina distinção entre Tombamento de bens e a desapropriação.

No Tombamento o proprietário continua no


domínio da coisa tombada, sofrendo tão somente limitações na fruição de seu direito
sobre o bem, além de também continuar possuidor do mesmo. Na desapropriação,
diferentemente, ocorre a perda da propriedade do bem que passa para o Poder Público,
podendo haver imediata imissão na posse, no caso da desapropriação indireta.

Não se discute que na desapropriação o


proprietário deva ser prontamente indenizado. Todavia, no Tombamento o mesmo não
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

ocorre. Isto porque, como foi dito, o proprietário continua com o domínio e a posse do
bem, podendo utilizá-lo de inúmeras formas.

Se antes dúvidas existiam sobre o tema, com a


promulgação da Constituição Federal de 1988, a questão foi clarificada, pois a Carta
Magna, no parágrafo único do seu artigo 216, consagrou esta distinção ao dispor que:

“O Poder Público, com a colaboração


da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por
meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e
de outras formas de acautelamento e preservação.”

O tombamento se equipara, sem dúvida, à


limitação administrativa de uso, que é feita em nome de irrespondível interesse público
em detrimento do particular.

E o interesse público no caso “sub judice” se refere


à defesa e equilíbrio do meio ambiente, que não pode ser preterido em razão do escopo
unicamente comercial do particular.

“Assim, a preservação dos recursos naturais pode


ser feita pelas limitações administrativas de uso e pela desapropriação. A primeira tem o
caráter geral e gratuito, e a segunda é individual e onerosa” ( José Carlos Cal Garcia, in
Linhas Mestras da Constituição de 1988, pág. 217, Saraiva, 1989).

Na desapropriação cabe indenização em razão de


que o proprietário não mais tem domínio ou posse sobre a coisa desapropriada. Porém,
no tombamento apenas se impõe limitações no uso da coisa. E é só. Não cabe,
portanto, indenização porque não houve aniquilamento da propriedade. Conforme
fartamente demonstrado em primeira instância, são múltiplas as atividades que os
proprietários podem exercer em seus imóveis.

“Enquanto a limitação imposta não


ocasionar o aniquilamento total da propriedade, o Estado não se acha
obrigado a indenizar.

A ora recorrente não se encontra em


tal situação. Inexiste restrição total ao direito de propriedade” (Acórdão do
TJESP citado às fls. 87/88 dos autos).
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

Ao se vislumbrar o objetivo do tombamento, se


constata que, realmente, não há que se falar em indenização.

A preservação do patrimônio público, incluindo-se


aí o meio ambiente, o mais valioso patrimônio da humanidade, é dever do Estado e da
comunidade, consagrado pelo artigo 216 da Constituição da República.

A proteção deste patrimônio vai mais além do que


o necessário cumprimento de comando constitucional. A sociedade tem sofrido as
conseqüências dos atos de particulares que visam somente o lucro desmedido, sem
atentar para as conseqüências danosas dos empreendimentos desenfreados que
desrespeitam o meio ambiente.

A devastação de florestas tem sido a principal


causa do desequilíbrio ecológico do nosso Planeta. O desmatamento irresponsável tem
gerado o que temos visto em nossos dias: desertificação de grandes áreas, enchentes,
seca e outros males próprios de uma inconseqüente falta de visão do significado da
derrubada de florestas inteiras.

“O estudo comprova que o


desmatamento não está acabando com espécies animais e vegetais. Uma
de suas mais graves conseqüências é a destruição dos mananciais de
água. Sem muita cobertura vegetal, a água bate com muita força no solo e
leva a terra para o rio. Com isso, a profundidade diminui. A evaporação é
menor e, em conseqüência, chove menos. Aí o fenômeno se repete,
reduzindo cada vez mais a fertilidade do solo” (fls. 344 dos autos).

O que se defende aqui, extraindo-se moderna


interpretação do texto magno, é a indisponibilidade do patrimônio público, que no caso,
se refere ao meio ambiente, formado pelas reservas florestais mencionadas na
Resolução que originou o tombamento dos imóveis dos autores, cujo interesse particular
sobre as mesmas deve, obrigatoriamente, ceder passo ao interesse social. Não se está
discutindo aqui somente o valor de um bem imóvel, mas o destino de um patrimônio
público que interessa às futuras gerações.
“O meio ambiente é considerado bem
de uso comum do povo, o que o exclui do rol dos bens que possam ser
utilizados economicamente de forma privada, isto é, de serem apropriados,
no seu uso, pelo indivíduo particular.

O uso do meio ambiente não é bem do


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

Estado nem é bem privado – é bem pertencente a toda coletividade, pelo


que não pode ser apropriado; é bem decorrente de interesse difuso e,
assim, indisponível.”
(Nagib Slaibi Filho, in Anotações à
Constituição de 1988, pág. 328/329, Forense, 3ª edição, 1992).

O Ato de Tombamento em debate veio,


justamente, adequar esta nova realidade social, impedindo que danos irreparáveis
viessem a ocorrer. Mas, veio também conciliar o interesse público com o particular, pois
permitiu o aproveitamento racional das áreas tombadas.

Destarte, requer seja dado provimento ao recurso


para afastar a pretensão dos autores quanto à indenização postulada, uma vez que a
mesma se mostra incabível em função do tombamento dos imóveis, que foi feito em
cumprimento da Constituição e que não se equipara a desapropriação.

DO DESCABIMENTO DA INDENIZAÇÃO EM FACE DAS RESTRIÇÕES


ANTERIORMENTE EXISTENTES

O fundamento da ação proposta pelos apelados,


está todo sustentado no argumento de que ficaram impossibilitados de realizar
empreendimento imobiliário nos seus imóveis.

Contudo, este impedimento não se verificou por


conta exclusiva do guerreado Ato de Tombamento. O impedimento existe e já existia em
decorrência do disposto na lei n. 4.771/65 (Código Florestal), em cujo artigo primeiro
estabelece que “as florestas existentes no território nacional e as demais formas de
vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse
comum a todos os habitantes do país, exercendo-se o direito de propriedade, com as
limitações que a legislação em geral e especial estabelecem”. E outros dispositivos da
mesma lei disciplinam de forma mais minudente as vedações relativas a cortes de
árvores e outras atividades degradadoras do meio ambiente.

Pois bem. Isto significa que mesmo que não


tivesse sido editado o Ato de Tombamento em questão, os apelados não estariam livres
para dar o destino que desejassem às suas áreas de terras, justamente em virtude das
proibições da lei federal supracitada.

O próprio magistrado sentenciante reconheceu


este fato quando afirmou:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

“Em se tratando de área com


cobertura vegetal, em verdade, a restrição do direito de propriedade
derivada do Código Florestal, que ancora na função social da propriedade e
não gera direito à indenização.

Assim, as restrições impostas pelo


Código Florestal por si só já estabeleceram limites ao uso da propriedade,
de forma a preservar a vegetação existente.” (fls. 485).

Embora mais à frente o MM. Juiz monocrático


conclua que estas restrições não aniquilem a propriedade e nem impedem a destinação
natural da coisa, o que se deve ter em conta é que as mesmas proibições são
suficientes para impedir a efetivação do pretendido empreendimento imobiliário
projetado pelos apelados, pois, evidentemente, sem o corte das árvores não haveria
como instalar no local o propalado “loteamento de alto padrão”, que iria seccionar a área
em questão em mais de 34 mil lotes.

E se o impedimento já existia antes do ato de


Tombamento, a presente ação perde seu objeto, posto que o motivo que aparentemente
a originara não pode ser tido como tal. Em outro giro verbal, o que se pensava ser o
fundamento da ação, o Ato de Tombamento, não o é na verdade. O que impede a
4.771/65, a qual é anterior até mesmo à aquisição dos imóveis pelos apelados (vide fls.
43 a 55).

“Se a autora pretende ser indenizada


pelas restrições administrativas decorrentes de lei federal (Código
Florestal), por tais indenizações, se devidas, a Fazenda do Estado não
responde, porque não foi ela que editou a lei que estabelece restrições
administrativas.”
(Ap. Civil n. 174.375-2/3, da Comarca
de Caraguatatuba, Recte: juízo “ex officio”. Apelantes e reciprocamente
apeladas Portal de São José S/C Ltda, e a FESP – 13a. Câmara Civil do
TJESP)

Nossos tribunais têm proferido muitas decisões


neste sentido. O excerto de julgado a seguir reproduzido é mais um exemplo de que a
proteção de nossas florestas e de nosso meio ambiente é preocupação antiga,
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

ganhando contornos menos tímidos hodiernamente, tudo com a intenção de proteger e


sobrepor o interesse da sociedade sobre o interesse estritamente comercial de
particulares:

“Cumpre lembrar que o Código


Florestal, em vigor desde 1965, já cuidava da proteção de florestas e de
todo tipo de vegetação nas áreas indicadas. E os decretos estaduais nada
mais fizeram do que reafirmar, no âmbito desta unidade da federação, a
mesma política de preservação do meio ambiente, mantendo restrições
indicadas pela União. Aliás, esta política foi consagrada na atual Carta
Magna, tanto que a região da Serra do Mar vem nominalmente citada como
patrimônio nacional e sua exploração só poderá ser feita dentro de
condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive
quanto ao uso dos recursos naturais (art. 225, parágrafo 4o C.F.).

Daí decorre que, por força de normas


constitucionais e de diplomas federais, inexiste o alegado direito de dispor
da área como convenha ao dono.”
(Ap. Civil n. 168.049-2/7, da Comarca
de Santos, em que é recorrente o juízo “ex officio”, sendo apelantes e
reciprocamente apeladas a FESP e Barma Incorporações e Com. S.A. –
13a Câmara Civil do TJESP).

Pelo exposto, por força da existência de restrição


anterior que inviabiliza o projeto dos apelados, requer seja dado provimento ao recurso
para reformar a sentença atacada.

DO VALOR DA INDENIZAÇÃO

O magistrado de primeiro grau achou por bem, ao


condenar a apelante no pagamento de indenização, acatar os valores apresentados
pelo perito judicial, sem qualquer reserva ou restrição e sem atentar para as
ponderações do assistente técnico da Fazenda do Estado, o que resultou em
condenação excessivamente elevada e totalmente fora da realidade, com sério e
acentuado prejuízo aos cofres públicos.

Acatando na íntegra o valor apresentado pelo sr.


“expert”, a conclusão a que se chega é que os proprietários dos imóveis foram
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generosamente abençoados com uma indenização que equivaleria à venda imediata de


mais de 34 mil lotes, de uma vez só, em uma área em que praticamente nada investiram
em termos de infra-estrutura e que apresenta declives e aclives acentuados, solo
pedregoso e distante da rodovia (fls. 421).

Não se discute aqui que qualquer tipo de


indenização deva ser pelo preço justo. Entretanto, o valor dos imóveis ultrapassou em
muito este parâmetro.

Primeiro, porque, como dito acima, há sérias


dificuldades para levar a bom termo a urbanização de toda a área tombada, devido à
topografia da mesma, tipo de solo e distância da rodovia mais próxima. Estes fatores,
sem dúvida, dificultam em muito o projeto de loteamento pretendido pelos apelados.

Segundo, porque deveria ter sido levado em conta


que os autores projetaram um loteamento para ocupar somente parte do imóvel,
enquanto o perito judicial supôs que todo o imóvel seria urbanizável. Disto decorre o
elevadíssimo número de lotes possíveis a que chegou o perito.

Terceiro, porque o Plano Diretor do Município de


Jundiaí não permite o desmembramento de terras em áreas rurais na metragem
apontada pela perícia (vide fls. 421).

Quarto, porque, em realidade, não existe a


possibilidade prática de sucesso de um empreendimento como o pretendido pelos
apelados, visto que não haveria mercado comprador para um loteamento que
comportaria quase a metade da população do Município de Jundiai, além de serem
necessários quase cinquenta anos para o mercado imobiliário absorver o gigantesco
empreendimento (fls. 423).

Quinto, porque apurou-se divergências muito


acentuadas entre os valores a que chegou o sr. Perito e aqueles verificados no mercado
imobiliário. O “expert” do juízo chegou a U$ 25,82 o metro quadrado, enquanto foram
encontradas ofertas de vendas de imóveis, com infra-estrutura, na vizinhança que
variam entre U$ 5,00 e U$ 9,00 o metro quadrado (fls. 428), inclusive lotes com casas e
piscinas prontas.

Mas, a perplexidade maior é que a perícia, pelo


uso de equivocados elementos comparativos, tomou como base, para avaliar as áreas
tombadas a existência de ofertas de imóveis localizados em condomínios de alto luxo e
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

nem sequer considerou que se tratam de lotes já urbanizados, de elevadíssimo padrão,


cujos condomínios são dotados de muros em toda a sua extensão, possuem circuito
fechado de T.V., corpo de segurança e todos os melhoramentos, que, no entanto, sem
explicação foram comparados como se terra nua fossem (fls. 427/428).

Caso esta avaliação fosse confirmada, uma


grande injustiça seria acolhida pelo Poder Judiciário, uma vez que os apelados teriam
suas terras nuas avaliados como lotes localizados em condomínios de luxo, com toda a
infra-estrutura.

“Para cumprir o preceito


constitucional, o que se tem de buscar é a determinação do valor venal da
propriedade e este há de ser encontrado, com base nas cotações de
mercado, pouco importando tratar-se de área rural ou urbana.

O que a lei não quer são as


estimativas artificiais, que transformam áreas ainda não loteadas em
hipotéticos loteamentos, para atribuir-se a cada um dos lotes imaginários
cotações equivalentes às do verdadeiros lotes das proximidades.”
(Humberto Theodoro Junior in
Responsabilidade Civil, doutrina e jurisprudência, pág. 255, AIDE Editora,
1989, citando acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Apel. N.
63.172, da Comarca de Itaúna – 01.03.84)

O excerto de julgado acima transcrito é bem


adequado ao presente caso e deve servir como orientador, para impedir que situações
de injustiça como apresente estejam perpretadas.

O assistente técnico da Fazenda do Estado


alertara para os excessos da avaliação judicial. No entanto, seus fortes e consistentes
argumentos não foram apreciados na sentença, preferindo o MM. Juízo “a quo” aceitar
sem reservas a avaliação judicial.

Todavia, por certo esta Augusta Corte fará a


devida justiça, como tem feito em outras oportunidades em que se fez mister, sendo
exemplo a decisão abaixo reproduzida, cuja situação em muito se assemelha à presente
causa:

“Para corroborar a estranha atuação


do perito vale registrar o excessivo valor a que chegou, fazendo com que a
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

gleba “situada na zona rural” tivesse como elemento de comparação o


sofisticado loteamento “Riviera de São Lourenço” e que, por sua infra-
estrutura, conseguiu obter elevado preço no mercado imobiliária.

No entanto, a situação do imóvel


pertencente à autora é bem diversa, seja pela topografia do local , pela
distância em que se encontra, pela cobertura vegetal ali existente, tudo a
tornar irrealizável um projeto de loteamento urbano como a proprietária
pretendia fazer acreditar.

Pelas condições, o tal projeto não


passou, repita-se de mero ardil para justificar indenização pela
impossibilidade de levá-lo adiante e com isso obter, pasme-se a quantia de
Cz$ 326.042,31 em fevereiro de 1987, além, é claro, dos acessórios de
praxe, tudo com correção monetária.”
(Ap. Civil n. 168.049-2-7, Décima
Terceira Câmara Civil do TJESP).

Além do evidente excesso na avaliação, obtido em


razão de utilização de método equivocado, o juiz sentenciante ao fixar o valor da
indenização, beneficiou indevidamente os apelados quando consagrou na decisão como
indenizável a cobertura vegetal dos imóveis tombados, o que é flagrantemente contra o
que a própria perícia constatou.

Ao responder o quesito de número 4, às fls. 199


dos autos, que perguntava se a vegetação serviria para fins de comercialização,
industriais, ou aqueles citados na inicial, o sr. “expert” afirmou: “Não, seu valor é
exclusivamente ecológico e paisagístico, conforme elucida o próprio Ato de
Tombamento.”

E, por seu turno, o magistrado asseverou: “E a


respeito do caso em pauta, jurisprudência pretoriana consagra o entendimento de que a
cobertura vegetal, é, em regra, indenizável” (...) (sic) (fls. 488).

Este fator, por si só, seria suficiente para diminuir o


valor da indenização. Contudo, somando-se a ele todos os elementos já expostos linhas
atrás, conclui-se que, caso os apelados tivessem direito à alguma indenização, o valor
da mesma deveria ser aquele apurado pelo assistente técnico da Fazenda do Estado,
posto que amparado em critérios adequados à realidade do mercado imobiliário e em
elementos comparativos muito mais justos, que é, então, o que requer a apelante, na
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

hipótese de ser confirmada a condenação, reduzindo o seu valor para CR$


385.836.000,00 (fls. 443).

DO DESCABIMENTO DOS JUROS COMPENSATÓRIOS

Como forma de indenizar os lucros cessantes, em


sua opinião, o juiz de primeira instância condenou a apelante a pagar aos apelados juros
compensatórios de 12% ao ano sobre o valor atribuído pelo perito judicial à área, a
contar do ato de tombamento.

Porém, este aspecto da decisão também merece


reforma.

Os mesmos são incabíveis na espécie. Se os juros


compensatórios, em desapropriação indireta, visam indenizar o esbulho praticado pelo
Poder Público, e como, no presente caso, não houve o tal esbulho possessório, à
evidência que não há que se falar em juros compensatórios.

Como ficou amplamente demonstrado, e isto é


fato, a apelante não se apossou dos imóveis dos apelados e a sua condenação em juros
compensatórios se traduz em locupletamento ilícito dos proprietários, principalmente
considerando que o ato de tombamento não pode ser tido como situação análoga à da
imissão da posse, pois, na realidade, os apelados é que continuaram com a posse dos
seus imóveis, usufruindo dos mesmos de múltiplas formas, aproveitando
economicamente de seus recursos, conforme verificado in loco pela perícia.

Eventual confirmação desta condenação


redundaria em duplo benefício dos apelados, já que teriam se beneficiado
comercialmente de suas terras e, agora, receberiam indenização por suposto
desapossamento que não ocorreu. Definitivamente, tombamento não é o mesmo que
desapropriação indireta.

Nem se diga, ainda, que os juros em debate


seriam devidos porque a partir do ato de tombamento os apelados se viram impedidos
de lotear os seus imóveis. Um projeto de loteamento de uma área tão extensa como
esta em questão, leva vários anos para ser viabilizado, tendo que passar por várias
fases antes que se concretize, o que impede seja estabelecida data específica, para a
contagem de condenação em eventuais juros compensatórios para indenizar lucros
cessantes.
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

Por esta razão, requer seja afastada a condenação


da apelante no pagamento de juros compensatórios.

DOS JUROS MORATÓRIOS

Os critérios eleitos na condenação destes


consectários legais não podem prevalecer, devendo a sentença ser reformada.

Com efeito, a jurisprudência mais recente,


inclusive do Supremo Tribunal Federal, vem decidindo que em casos como estes, os
juros moratórios devem ser contados a partir do trânsito em julgado da sentença
condenatória.

“Já quanto aos juros moratórios,


houve um equívoco do decisório de 1o grau. Sua contagem há que ser feita,
conforme jurisprudência pacífica, a partir do trânsito em julgado da sentença
condenatória (precedentes desta Câmara: Apels. 60.284, 61.319 e 61.719).”
(TJMG – Apel. N. 63.172, da Comarca
de Itaúna – 01.03.84).

E não é diferente o entendimento do STF, que


assim já se pronunciou:

“Desapropriação indireta – Juros Moratórios.


Recente orientação da Corte, mudando
anterior entendimento, definiu que os juros moratórios, na desapropriação indireta,
são contados a partir do trânsito em julgado da decisão, a igual do que ocorre com a
desapropriação direta. Recurso Extraordinário conhecido mas desprovido.”
(RTJ 116/825)

Por isto é que, na hipótese de a condenação ser


confirmada em segunda instância, devem os juros moratórios ser contados do trânsito
em julgado da sentença.

DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA QUINTA VARA CÍVEL DA COMARCA DE JUNDIAÍ – S

Por derradeiro, se insurge a apelante contra a


fixação dos honorários de advogados, os quais foram arbitrados em 10% (dez por cento)
sobre o valor da condenação atualizado.

Não é difícil constatar que esta percentagem


constitui em valor deveras elevado para tal verba, considerando o quantum da
condenação. A indenização corresponde à uma cifra de valores estratosféricos, que a
persistir traria para os mesmos patamares a condenação dos honorários advocatícios.

Sem qualquer demérito para o trabalho dos


causídicos dos apelados, há que se reconhecer que a demanda exigiu mais dos
técnicos que avaliaram as propriedades, com a elaboração de extensos laudos, do que
dos patronos das partes. O trabalho jurídico, embora importante, teve suas limitações e
o processo não teve incidentes processuais que exigissem intervenções freqüentes dos
advogados.

Assim, considerando o valor de vulto da


indenização, caso venha a ser julgada procedente, requer seja reduzida a honorária
advocatícia para 6% (seis por cento), como vem ocorrendo em casos semelhantes.

Diante de todo o exposto, confiante no elevado


senso de Justiça desta prestigiada Corte, espera a apelante seja dado provimento ao
presente recurso, reformando a respeitável sentença atacada nos termos pretendidos
nesta apelação.

Jundiaí, 06 de dezembro de 1994.

Enio Moraes da Silva


Procurador do Estado
OAB/SP 115.477
EXMO

PROCURADORIA GERAL DO ESTADO


PROCURADORIA REGIONAL DE SANTOS
Rua Itororó, 59 tel/fax 219.6991

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA 2a VARA PRIVATIVA DOS


FEITOS DAS FAZENDAS PÚBLICAS DA COMARCA DE SANTOS

Processo n. 170/94
Ação Ordinária
Apelante : Rosa Amélia Aguirre Menin e Outros
Apelada : Fazenda do Estado de São Paulo

A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO


PAULO, por sua procuradora abaixo assinada, nos autos em epígrafe,
vem, respeitosamente, à presença de V. Exa., face a APELAÇÃO
interposta, oferecer suas
CONTRA-RAZÕES
sob os fundamentos em anexo, requerendo o seu regular
processamento.
Termos em que,
P. Deferimento.
Santos, 10 de março de 1998

GISELE BELTRAME
STUCCHI PROCURADORA DO ESTADO

2a Vara Privativa dos Feitos das Fazendas Públicas da Comarca de


Santos
Proc. n. 170/94
Ação Ordinária
EXMO

Apelantes : Rosa Amélia Aguirre MeninWaldomiro Vergara e Outros


Apelada : Fazenda do Estado de São Paulo

CONTRA - RAZÕES DE APELAÇÃO

Egrégio Tribunal,
Doutos Julgadores,

Insurgem-se os Apelantes contra a r.


sentença de fls. , que, acertadamente, julgou improcedente a ação
proposta, em vista da inexistência de atos que demonstrassem o
apossamento administrativo, tendo apenas o Estado cumprido
legislação , veiculadora de limitações administrativas , bem como
concluido, através da análise da prova técnica , que inocorreu qualquer
prejuízo aos Apelantes. A r. sentença do D. Juízo "a quo", ao julgar
improcedente a demanda, não merece reparos, tendo trazido os
fundamentos corretos para sua decisão e em conformidade com a lei e
jurisprudência.

I - HISTÓRICO

Os Apelantes ingressaram com a presente


açào buscando receber uma indenização pela suposta perda de
disponibilidade de um imóvel , situado em Bertioga, com 645 ha, a qual
teria decorrido da edição do Decreto 10.251/77. Esse imóvel é
inacessível e apresenta topografia montanhosa, estando em estado
bruto, sem qualquer utilização.

Elaborado laudo pericial, concluiu-se que o


imóvel estava sujeito as limitações impostas pelo Código Florestal,
anteriores ao Decreto aludido pelos Apelantes.

Em vista dessa conclusão do laudo pericial


, o D. Juízo “a quo” concluiu ,com acerto, que o Decreto não afetara a
disponibilidade do bem e que a não utilização do mesmo devia-se a suas
próprias características - inacessibilidade e topografia montanhosa -
além da legislação federal , consubstanciada , entre outras, pela Lei
EXMO

4.771/65 (Código Florestal) , que impedia o desmatamento da área.

Por tratar-se de lei federal, a pessoa


responsável pelo pagamento de indenizaçào , considerando-se a mera
hipótese da mesma ser devida, seria a União e contra ela deveria ter
sido proposta a ação. Porém, em vista do tempo decorrido entre a edição
do Lei (1965 ) e a propositura da ação ( 1995 ) , estaria consumada a
prescrição vintenária.

II - SENTENÇA QUE DEVE SER MANTIDA

A r. sentença de fls., julgou com total acerto a


questào, vez que a Fazenda do Estado não agiu em desconformidade
com a lei, não tendo praticado atos que retirassem dos Apelantes a
possibilidade de usar, fruir e gozar de seu imóvel, mas apenas exerceu
atos de vigilância, que visavam adaptar a utilização da área as regras
pertinentes, que procuram o bem estar da coletividade.

A vigilância que se faz na área está


fundada tanto nas regras contidas na Lei 4.771/65 ( Código Florestal ) ,
como nos Decretos Federais 99.547/90 e 750/93, que determinam a
manutenção da mata em áreas classificadas como de preservação
permanente, e que são aplicadas em todo território nacional. Ademais , a
Lei Municipal 4.078/76, que institui o Código de Uso do Solo, impos
restrições à utilização do imóvel dos Apelantes, classificando como áreas
de preservação ambiental os locais cobertos por vegetação classificada
como Mata Atlântica, os manguezais e as varzeas dos cursos d’ água.

A maior porção do imóvel está sujeita a limitações


, veiculadas pelas leis e decretos aludidos, todos federais ou municipais,
anteriores ao Decreto 10.251/77, dos quais não decorre o direito de
receber indenização. Se seguissemos a tese dos Apelantes , teríamos
de volta o direito de propriedade absoluto, não aquele previsto na
Constituição Federal, em seu art. 5o, XXIII, sendo que todas as
limitações, instituidas, até para segurança dos proprietários, seriam
indenizáveis.

Outra questão não suscitada mas que ,de


igual forma, influe na solução da demanda ,diz respeito a origem da Lei
4.771/65, a qual foi editado pela União, e está em consonância com a
EXMO

determinação constitucional contida no art. 225, parágrafo 4o., que


declarou a Mata Atlântica patrimônio nacional. Não cabe ao Estado-
membro, portanto, responsabilidade pelo que dispõe lei que não editou,
sendo que o cumprimento desta se ateve aos estritos termos de suas
determinações.

Quanto as consequências jurídicas da


aplicação da Lei.4.771/65, são claras e se resumem na criação de uma
limitação administrativa, decorrente de legislação federal, que a todos
obriga. Dela não decorreu a perda da propriedade para os Apelantes.
Não se configurou o aludido apossamento administrativo do imóvel.
Ora, o conceito de apossamento é, evidentemente, jurídico. Esse
conceito relaciona requisitos que devem ser preenchidos para se
configurar a hipótese de incidência da norma. Os requisitos, do conceito
jurídico, são verificados no mundo fático. Prosseguindo, temos que o
conceito de apossamento administrativo tem como requisito a verificação
de um ato físico, que implique na ocupação do imóvel pelo Poder
Público, deslocando o proprietário da área e impedindo o seu reingresso.
Isso, porém,não ocorreu. Analisando o processo, verificaremos que
nenhum dos requisitos impostos para configuração de apossamento
administrativo foram preenchidos:
a) os Apelantes nunca foram despojados de sua propriedade, não
sofrendo qualquer restrição relativa ao acesso para o imóvel;
b) nunca houve execução de qualquer serviço público na área;
c) a Lei 4.771/65 não criou restrições apenas ao imóvel em questão,
mas sim, em vasta área, em caráter geral, condicionando o exercício do
direito de propriedade ao bem comum. Os Apelantes não tiveram vedada
a utilização do imóvel,.apenas deve o uso do mesmo ser compatível com
as limitações contidas na legislação federal ( Código Florestal ).

Nem se diga que o Código Florestal veicula


"limitações relativas", como fazem os Apelantes trazendo em seu auxílio
o parágrafo 1º do art. 3º da citada lei, que dispõe sobre a hipótese de
autorização, pela União, de retirada da vegetação de preservação
permanente, para elaboração de obras de necessidade pública ou
interesse social.

Ocorre que os Apelantes, na tentativa de


demonstrar suas teses, cometem equívoco na interpretação da lei. O
Código Florestal, em seu art. 2º, dispõe sobre a mata classificada como
EXMO

de preservção permanente, da seguintes forma :


Art. 2º - Considera-se de preservação permanente pelo só efeito
desta lei, as florestas:
a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d`água, em faixa
marginal, cuja largura mínima será:
---------------------------------------------
b) ao redor dos lagos, lagoas ou reservatórios d`água naturais ou
artificiais,
c) nas nascentes, mesmo nos chamados olhos d`água, seja qual
for a sua situação topográfica,
d) no topo dos morros, montes, montanhas e serras,
e) nas enconstas ou partes destas, com declividade superior a
45º, equivalente a 100% na linha de maior declive,
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de
mangues,
g) nas bordas dos tabuleiros e chapadas,
h) em altitude superior a 1.880 metros, nos campos naturais ou
artificiais, as florestas nativas e a vegetação compestre

Tais florestas são de preservação


permanente e seu corte é considerado delito,punido com pena de
prisão ou multa (art. 26, Lei 4.771/65 ). A limitaçào é total. No art. 3º, a lei
elenca, ainda, outras espécies de vegetação que pode ser considerada
de preservação permanente, desde que assim declarada por ato do
Poder Público, conforme texto a seguir :
art. 3º - Consideram-se, ainda, de preservação permanente,
desde que assim declaradas por ato do Poder Público, as
florestas e damais formas de vegetação natural destinadas:
.........................................................

Ao “caput” do art. 3º, une-se o parágrafo 1º,


aludido pelos Apelantes:

parágrafo 1º - A supressão total ou parcial de florestas de


preservação permanente só será admitida com prévia autorização
do Poder Executivo Federal, quando for necessária a execução
de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou
interesse social.

Portanto, somente seria possível a


EXMO

supressão da floresta de preservação permanente elencada no art. 3º,


do qual faz parte o parágrafo mencionado e não aquela contida no art.
2º, que independe de ato declaratório. Não se poderia admitir, ao se
interpretar a lei, que um parágrafo possa se referir a um artigo anterior.

Ademais cumpre notar que a limitação


advem da esfera federal, sendo que a supressão das florestas elencadas
no art. 3º exige autorização da Administração Pública Federal, sendo o
Estado parte ilegítima passiva para figurar em uma relação processual
envolvendo pretensão ligada a tal limitação.

Constata-se que a limitação existia desde


pelo menos 1965 e era absoluta, impedindo o desmatamento da área ,
não tendo a legislação estadual trazido qualquer inovação. A situação
dos Apelantes não foi alterado por legislação estadual . Nessas áreas o
desmatamento era e continua sendo proibido e mesmo a Fazenda do
Estado não poderá., ainda que alterada a destinação do imóvel , retirar a
vegetação de preservação permanente.

Deve se observar, ainda, que o imóvel dos


Apelantes não deixou de ser utilizado em decorrência de ato do Estado,
mas por não ser fatica e economicamente viável a sua utilização . Assim,
ao contrário do que alegam os Apelantes, o imóvel em tela não se tornou
imprestável, com a edição do Decreto 10.251/77 , mas sim pelas suas
próprias características . A área é montanhosa e sem acesso, não
possue qualque infra-estrutura quer para uso agro-pastoril ,quer para
habitação, não possuindo solo compatível para a atividade agrícola ou
condições para a construção de casas.

Aliás, em várias oportunidades tem o


Egrégio Tribunal de Justiça de São paulo se posicionado no sentido de
não reconhecer a existência de prejuízo. Nesse sentido é o V. Acórdão
proferido nos Embargos Infringentes n. 236.817-2/04-01, que afirma :
“Enfim, a Serra do Mar não pode ser desmatada, sob pena se suas
escarpas soterrar todas as cidades litorâneas, pelos constantes e
incontroláveis deslizamentos de terras. Tudo que se fizer nela tem
de ser precedido de estudos cautelosos no sentido das preservação
do meio-ambiente, tendo a construção da Rodovia dos Tamoios
dado um pequeno exemplo do quanto é impenitente a Serra do Mar
para os ataques à sua vulnerável estrutura. Parece que quer
EXMO

preservar para a eternidade a singular beleza que o Criador lhe


atribuiu.
Com essas particularidades da Serra do Mar e essa conjuntura
histórica que a cerca, soa estranho que venham os
Embargantes dizer que o Estado de São Paulo esvaziou o
conteúdo econômico do direito de propriedade deles sobre a
área de terras em litígio, se até agora nenhuma tecnologia ao
alcance da nossa civilização é capaz de tornar viável
economicamente a região.”( grifo nosso)

Também o V. Acórdão proferido na


Apelação Cível n. 025.445-5/1 segue essa trilha :
“As possibilidades de exploraçào do local são meramente
hipotéticas. Nào há uma probabilidade objetiva de que tal
exploração venha efetivamente a ocorrer. E, desta feita. não
pode o particular transferir o seu problema de venda de um
bem que está fora do mercado,para o Estado, não por culpa
deste, mas ,sim, pela sua própria condição e localização.” (
grifo nosso )

Por isso, claro está a inexistência de


prejuízo autorizador de uma indenização. Nào se pode indenizar aquilo
que não existia, ou seja, se os Apelantes não podiam usar a área, em
vista de suas características, como impor ao Estado o pagamento de
uma indenizaçào.Ora, o dano não é certo,não havendo qualquer lesão
anormal à propriedade.

Por fim, cumpre ressaltar que ao adquirir o


imóvel em 1979, a área já havia sido abrangida por toda a legislação
aludida, tendo os Apelantes adquirido a mesma com essas limitações,
portanto, pagou por ela preço equivalente a uma área sujeita as aludidas
regras. Nesse sentido é o V. Acórdão proferido na Apelação Cível n.
018.166-5/1, do qual transcrevemos o seguinte trecho:
“No julgamento da Apelação n. 117.524-2, a Egrégia Décima Quinta
Câmara Civil deste Tribunal, fundada em jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal, afirmou-se a legitimidade “ad causam”
do adquirente de imóvel objeto de apossamento administrativo,
considerando que, com a aquisição transmite-se toda a posse,
domínio, direitos e ações que o outorgante exercia sobre o bem (
“RJTJESP”, ed. Lex, vol. 108/136 ). Assim também foi julgado pela
EXMO

Egrégia Décima Oitava Câmara : “se o titular do domínio da área


desapropriada aliená-la a terceiro, fica este sub-rogado no direito à
indenização, que é inerente à titularidade do domínio” ( RT , vol.
627/112 ).
Esse entendimento, que está correto, sem dúvida, tem que ser
entendido nos seus limites, ou seja, é preciso verificar se a
aquisição envolveu efetivamente esse direito, ou se o seu valor
já foi abatido do preço. Alguém que compre um veículo batido,
pagando por ele preço de sucata, não tem direito a pleitear
indenização pela desvalorização do veículo, salvo se esse
direito foi objeto do negócio. E não o tem simplesmente
porque não pagou pelo valor total do veículo, não adquiriu
esse direito à indenização, e, portanto, não pode beneficiar-se
por um valor não incluso na transação, mesmo porque não
sofreu prejuízo.
É o que ocorre no caso em tela e em inúmeros na Serra do Mar,
em que indivíduos têm adquirido áreas imprestáveis,
pirambeiras sem valor econômico, pagando por elas o preço
de mercado, que não passa de alguns reais por alqueire,
inclusive , por causa das próprias restrições administrativas,
que como se analisará, existem há muito tempo.”( grifo nosso )

Assim, a pretensão dos Apelantes , quer porque o


imóvel estava sujeito a meras limitações administrativas veiculadas pelo
Código Florestal, quer porque não se verificou qualquer dano
indenizável, improcede , julgando acertadamente o D. Juízo "a quo"

III - DA INDENIZAÇÃO. DESCABIMENTO DA INCLUSÃO DE


DETERMINADAS PARCELAS

Se, por hipótese, ainda que absurda vier a


este Egrégio Tribunal a dar provimento para a presente apelação , a
Fazenda do Estado não pode aceitar que a indenização se perfaça de
parcelas indevidas, como pretendem os Apelantes.

1. DOS ERROS CONTIDOS NA AVALIAÇÃO

Primeiramente, para que se possa


proceder a uma análise lógica , é necessário que se esclareça que a
EXMO

indenização busca alcançar o justo preço do bem. Na hipótese de


desapropriação este é um princípio constitucional, contido no art. 5o,
XXIV. Na doutrina entende-se que o justo preço e aquele que o bem
alcançaria no mercado, até porque a desapropriação é a transferência
de um bem, alterando-se, apenas a forma de realizar essa transferência
( compulsória ). Dessa forma a avaliação deve se pautar pelo critério
jurídico do justo preço, que significa obter o valor de mercado do mesmo
, sendo essa a interpretação correta da lei.

Por isso, quando se avaliou a área,


deveriam ter sido consideradas todas as suas características, a utilização
viável, quer do ponto de vista fático, quer do ponto de vista econômico,
do imóvel. Todavia, o Sr. Perito não considerou a realidade para efetuar
a avaliação da área, preferindo delirar na elaboraçào de seu laudo.
Assim, avaliou uma área rural , montanhosa e que dista 6.5 km da
estrada como passível de ser loteada. Utilizou elementos comparativos
que em nada se assemelham ao imóvel, pretendendo comparar um
avião supersônico com um barco a remo, sonhou a possibilidade do
empreendimento ser um sucesso absoluto, chegando ao absurdo de
afirmar que 3.740 lotes poderiam ser vendidos em 78 meses, ou seja, 78
lotes por mês, como se fossem cachos de banana !

Somou a todas essas loucuras e delírios a


avaliação em separado da mata, não efetuando sequer a exclusão dos
custos de exploração, fazendo com que o felizardo proprietário desse
imóvel só tivesse lucros.

É claro que , no mercado imobiliário não se


efetuam transferências de partes isoladas do imóvel - vende-se a terra
nua com todas as suas acessões, pagando o adquirente um preço que
engloba tudo o que está incorporado ao imóvel.

Além do mais,a exploração das matas, no


caso, é empreendimento de todo inviável. Ressalte-se que, em sua
totalidade, a área está sujeita a limitações administrativas, veiculadas
por lei federal, que impedem a retirada da cobertura florística ( art. 2o,
10, 16,"b", da Lei 4.771/65 ). A extração de madeira nesses locais é
considerada contravenção penal ( art. 26, da Lei 4.771/65 ) e não
poderia se indenizar alguém pela possibilidade de auferir lucros
com o exercício de ação delituosa. Deve se considerar, ainda, a
EXMO

ocorrência de prescrição da pretensão dos Apelantes com relação as


áreas de presevaçào permanente, em vista desta limitaçào decorrer da
Lei 4.771, editada em 1965, 30 anos antes da propositura desta ação (
art. 178, parágrafo 10 , inciso VI do Código Civil e art. 1o, do Decreto
20.910/32 )

Economicamente, a extração da mata é inviável,


pois os custos com a sua retirada suplantariam os lucros obtidos com a
venda da mesma.O imóvel nào possue acesso e apresenta topografia
montanhosa, exigindo obras caras para contenção das encostas . É de
conhecimento geral os riscos enfrentados pelos moradores da região
com a proximidade do período das chuvas , que acarretam
desmoronamentos, que podem gerar catástrofes gigantescas.

Utilizando de todos os meios para fazer crescer o


valor do imóvel , o Sr. Perito chegou ao preço de quase R$
7.000.000,00 ou de R$ 10.000,00/ha ! Isto contraria todos os valores de
mercado , que podem ser constatados em anúncios de jornal. Em
recente reportagem , “A Folha de São Paulo”, observa que houve uma
queda de valores de imóveis e que no Estado de São Paulo, o preço
médio por hectare de uma área plana, com acesso bom e infra-estrutura
agrícola não ultrapassa os R$ 2.000,00.
Assim, se por hipótese, vier a ser
reformada a r. sentença, não se poderá adotar o laudo do Sr. Perito,
devendo considerado o valor apresentado pelo Assistente Técnico da
Fazenda do Estado ou ser refeita a prova técnica, reiterando-se para
tanto as razões contidas no agravo retido interposto pela Apelada
referente ao indeferimento de pedido de esclarecimentos.

2. DOS JUROS

Juros moratórios.

Os juros moratórios , em
caso de eventual sucumbência , o que se admite para argumentar, são
cabíveis somente a partir de 1o de janeiro do ano seguinte àquele em
que deveria ter sido pago o requisitório e não foi, posto que , a mora, na
hipótese das Fazendas Públicas somente ocorre após o prazo que lhes é
constitucionalmente concedido para pagamento dos precatórios ( art.
EXMO

100, parágrafo 1o, da Constituição Federal ).

Ora, apresentado o precatório em 1o de


julho , a Fazenda do Estado tem prazo até o dia 31 de dezembro do ano
seguinte para efetuar o pagamento . Assim, somente a partir dessa data
poder-se-á cogitar de mora

Contudo, não aceita essa argumentação , o


termo inicial para contagem dos juros moratórios deve ser o trânsito,
conforme a Súmula 70 do STJ.

Juros compensatórios

Descabida, também , a condenação da


Fazenda do Estado em juros compensatórios.

A divisão de juros em duas categorias não


encontra fundamento jurídico e como se percebe na distinção entre um e
outro são utilizadas expressões equivalentes - os moratórios indenizam,
os compensatórios ressarcem - que evidencia a precariedade da
distinção. Na verdade, os juros moratórios são compensatórios, pois
"compensam" o credor do fato de estar privado da utilização de seu
capital.

Constata-se, portanto, que inexistem como


entidades ontologicamente distintas, juros compensatórios e moratórios.
Existem, apenas, juros.

Também, não podem ser considerados


diversos os juros determinados pela lei processual civil, denominados por
Pontes de Miranda como juros processuais. Nenhum preceito legal pode
ser entendido como se mandasse acrescentar "juros processuais"a
"juros moratórios " ou ":Juros compensatórios", posto que estes devem
ser absorvidos pelos processuais, aliás, como ocorre em todos os tipos
de ações.

Esse foi o entendimento esposado pelo Supremo


Tribunal Federal , no Recurso Extraordinário n. 112.389.

Além disso, deve ser considerada a


EXMO

proibição legal contida no Decreto 22.626, de 07.04.33, que em seu art.


1o limita a taxa de juros ao dobro da taxa de juros legais, ou seja, 12%
ao ano. Cumulando-se juros com função compensatória com juros com
função moratória, será atingida uma taxa de 18% ao ano, legalmente
vedada. Aliás, tal proibição foi alçada a princípio constitucional, veiculado
pelo art. 192, parágrafo 3o, da Constituição Federal.

Ademais, os juros compensatórios foram


criados para buscar suplantar os efeitos nocivos da inflação, quando não
haviam índices de correção monetária e a avaliação ficava sempre
defasada. Hoje esse problema encontra-se sanado, atualizando-se os
débitos. Outro ponto relevante traduz-se na falta de utilização do imóvel,
não se podendo compensar a perda do que jamais existiu e por outro
lado, indenizando-se a extração da mata, estar-se-ia já compensando-
se os Apelantes .

IV- CONCLUSÃO

Pelo exposto, a Fazenda do Estado espera


que, no tocante a improcedência da pretensão dos Apelantes, seja a r.
sentença do D. Juízo "a quo" mantida , considerando-se, ainda, para a
hipótese, ainda que absurda de reforma da decisão, as argumentações
no tocante a avaliação e as verbas acessórias, reiterando a necessidade
de nova perícia, pois agindo dessa maneira estará este Egrégio Tribunal
agindo com a costumeira
JUSTIÇA
!
Santos, 10 de março de 1998

GISELE BELTRAME STUCCHI


PROCURADORA DO ESTADO
EXMO

PROCURADORIA GERAL DO ESTADO

EXMA.SRA.DRA.JUÍZA DE DIREITO DA 2ª VARA DA COMARCA DE SÃO


SEBASTIÃO - SSB

Proc.: 488/96 – AÇÃO ORDINÁRIA DE DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA


Apelantes: MELQUIZES ALVES PEREIRA e s/m.
Apelada : FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO

A FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por


seu procurador abaixo assinado, nos autos supramarginados, vem respeitosamente à
presença de V.Ex.ª ofertar tempestivamente as inclusas CONTRA-RAZÕES de
apelação, requerendo para tanto sua juntada, recebimento e regular processamento até
a remessa oportuna para o Egrégio Tribunal de Justiça, com as formalidades de estilo.
Requer, por derradeiro, sejam intimados doravante pela
Fazenda Estadual os Procuradores do Estado EGÍDIO CARLOS DA SILVA, OAB/SP-
71.156, e PEDRO UBIRATAN ESCOREL DE AZEVEDO, OAB/SP-56.961, cujos nomes
deverão ser consignados na capa dos autos.
Termos em que,
P.deferimento.
São Sebastião, 2 de fevereiro de 1998.

João Bosco Pinto de Faria


Procurador do Estado
OAB/SP – 99.056
EXMO

COMARCA DE SÃO SEBASTIÃO – 2ª VARA


DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA 488/96
Apelantes: MELQUIZES ALVES PEREIRA e s/m.
Apelada : FAZENDA PÚBL. DO EST.DE S.PAULO

CONTRA-RAZÕES DE APELAÇÃO

Colenda Câmara!
Eméritos julgadores!

Reiterando o já dito na contestação de fls.123/176, bem como a


manifestação de fls.235/237, para não sermos enfadonhamente repetitivos, a carência
da ação acolhida, com a conseqüente extinção do feito, é de ser mantida por seus
próprios e muito bem lançados fundamentos.
Pois robora esse entendimento tanto a doutrina como a
jurisprudência maciças, valendo transcrever novamente alguns excertos de julgados
altamente esclarecedores, como os seguintes:
“... Anoto que jamais acostou ao processo o seu título de propriedade, de
modo que não poderia ter êxito o seu pleito, ainda que de desapropriação
indireta cuidasssem os autos, porque esta pressupõe que quem pretende
indenização seja o proprietário da coisa, tanto que sempre se considerou
que a expropriatória indireta é verdadeira ação reivindicatória ajuizada
contra o Poder Público, e, por isso, convertida em indenizatória. Somente
pode reivindicar um bem quem for seu dono, e também apenas pode
postular indenização por desapropriação indireta quem for o titular da
coisa. Por tudo isso, a ação não podia e não pode vingar, motivo por que
acolho a inconformidade para o fim de julgar IMPROCEDENTE o pedido
inicial, invertida a carga sucumbencial.”
(Apelação 205.596-2, Re.: Des.Gildo dos Santos, decisão confirmada pelo STJ
no Resp-53.434-8, Rel.: Min.Milton Luiz Pereira)

“O autor deve desde logo provar sua legitimidade


demonstrando seu domínio sobre a coisa de que o poder
público apossou-se.
“(RT-505/167)

“A prova do domínio, representada pela certidão de transcrição


imobiliária, complementada pela instrução, é o documento básico
da ação de indenização em decorrência de desapropriação indireta
EXMO

de terras.”
(RT-545/227)

“Julga-se o autor carecedor da ação de desapropriação indireta se não fez prova


do domínio sobre o imóvel. A sentença deve ser pura, isto é, a condenação não
deve, em regra, estar sujeita a qualquer condição. Se ficassem condicionadas a
acontecimentos futuros e incertos, as sentenças atentariam contra o requisito da
certeza, que é essencial.”
(RT-460-178)

“Só quem tem título pode propor ação. Tem ação de


indenização por apossamento administrativo aquele que
teria reivindicatória contra quem não fosse o Poder
Público.”
(RT-452/178)

“DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA – Apossamento Administrativo – Prova da


propriedade – Obrigatoriedade.
Ementa oficial – Aquele que propõe ação de desapropriação indireta cabe
a prova de ser proprietário do imóvel que alega ter sido apossado pela
administração.
....Devendo a lide ser apreciada e decidida nos limites em que foi proposta
(art. 128 do CPC), a não comprovação da afirmada qualidade de
proprietário da gleba em questão importa na extinção do processo sem
julgamento do mérito, mesmo porque a chamada ação de desapropriação
indireta é, na verdade, uma ação reivindicatória, por meio da qual o
proprietário, não podendo reivindicar a coisa em decorrência do princípio
da intangibilidade da coisa pública, “provando desde logo o seu domínio,
reivindica o correspondente preço, ou seja, a justa indenização pela perda
do bem.” (José Carlos de Moraes Salles, A Desapropriação à luz da
Doutrina e da Jurisprudência, 2ª ed., pág.710)”
(Apelação 256.748-2/3, in RT-719/139)

No mesmo sentido, ainda as apelações 104.254-1,


236.266-2 e 242.674-2, do E.Tribunal de Justiça deste Estado.
Confira-se ainda nos v.acórdãos juntados pelos próprios
autores, onde estão assinaladas em amarelo, para melhor visualização, as referências à
imprescindibilidade da prova dominial para viabilizar as desapropriações indiretas, que
são sucedâneas da reivindicatória (fls.189, 190, 191, 192, 193, 194, 195, 208, 220, 222,
223, 225, 226).
EXMO

Ressalte-se, por oportuno, que a jurisprudência trazida à


baila pelos recorrentes, refere-se exclusivamente às desapropriações diretas, que são
institutos jurídicos de disciplina totalmente diversa das denominadas desapropriações
indiretas, como muito bem colocado no v.acórdão citado nas razões recursais às
fls.267/268 (A.I.131.753-2 do TJSP), eis que as segundas são “uma ação tipicamente
indenizatória pela prática de ato ilícito, voraz esbulho oficial, regida pela lei civil
(arts.15, 159, e 1.059 do Código Civil). Na desapropriação indireta, mesmo perdida
a posse e o domínio, não é possível reivindicá-la, pois, embora o ato seja
manifestamente ilícito, prevalece o interesse público” (fl.267).
Assim, conquanto nas desapropriações diretas é possível
expropriar quaisquer direitos, nas desapropriações indiretas, verdadeiras
reivindicatórias, a titularidade dominial é requisito indispensável para sua propositura,
sob pena de impossibilidade jurídica do pedido, que induz à carência de ação.
Daí porque, embora a jurisprudência tem entendido que
seja viável a desapropriação direta de direitos possessórios com benfeitorias, fixando a
indenização em 60% da equivalente para a propriedade, tal entendimento jamais pode
ser estendido para a desapropriação indireta, “instituto jurídico de disciplina diversa”,
no dizer do eminente Desembargador Camargo Viana (fl.267).
Mas não é só. No caso presente, como muito bem captado
pela ínclita julgadora, às fls.257/258, não há qualquer prova efetiva da posse dos
autores, tampouco do uso que faziam da área, não ficando demonstrada qualquer
limitação que eventualmente tenham sofrido com a criação do Parque da Serra do Mar,
não se inferindo daí qualquer prejuízo efetivo que eventualmente tenham suportado, o
que caracteriza inelutavelmente falta do interesse de agir, também motivo bastante por
si só para a decretada carência de ação.
Aliás, residem os recorrentes em São Paulo (fls.2 e 12),
sendo ele comerciante e ela do lar, e o instrumento particular de fls.36/40, datado de
07.03.83, ratificado pela escritura pública de cessão de direitos possessórios de
fls.31/32, ambos lavrados em Mogi das Cruzes, à míngua de transcrição no registro
imobiliário da comarca de São Sebastião, não fazem prova de nada, já que miríades de
outros documentos semelhantes e versantes sobre a mesma gleba, ou parte dela,
podem existir alhures, principalmente em São Sebastião, onde situada a área “sub
studio”.
Neste passo, também cabe outra intrigante observação. A
confusa documentação dos apelantes (fls.18/42), como muito bem anotado pelo ilustre
representante do “Parquet”, à fl.246, em abono da contestação fazendária e
manifestação de fls.235/237, não oferece qualquer segurança quanto à metragem
correta da área, e principalmente quanto a sua localização, conforme muito bem
demonstrado no documento de fl.174, assinado pelo engenheiro agrimensor José
Roberto M.Andrion, funcionário do Instituto de Terras do Estado de São Paulo – ITESP,
EXMO

onde este técnico deixou assentado que a planta apresentada não possibilita a exata
localização da gleba nas cartas oficiais do IBGE, que o croqui apresentado é totalmente
impreciso, tendo o próprio requerente usado a expressão “local aproximado do
imóvel”, e que o memorial descritivo fornecido é falho, carecendo de elementos
técnicos.
Tudo isso milita contra a presunção de posse efetiva dos
recorrentes, como de resto coloca em xeque a idoneidade dos documentos de cessão
de direitos possessórios nos quais se arrimam os demandantes (fls.31/42), e
principalmente coloca a nu a total ausência de prova de prejuízos efetivos, sequer
alegados, como muito bem entendeu a nobre julgadora.
Mais do que isso, essa insegurança documental e a total
imprecisão na localização do imóvel induzem também à incontornável inépcia da
exordial. Confira-se, a respeito, os seguintes excertos jurisprudenciais:

“Reivindicatória – Bem Imóvel – Exercício da ação condicionado à precisa


caracterização e individualização da área reivindicanda – Descrição das
confrontações sem lhes descrever a forma e o rumo que a tanto não
eqüivale. O exercício da ação de reivindicação de bem imóvel apresenta
como condição essencial a precisa caracterização e individualização da
área reclamada, não se considerando como tal a descrição das
confrontações sem lhes descrever a forma e o rumo.”
(RT-674/188)

No mesmo sentido, v. RT-581/174 e RT-607/88, entre uma


pletora de julgados, e mais:

“Reivindicatória – Imóvel não individualizado – Inadmissibilidade.”


(RT-637/168)

No mesmo toar a doutrina, conforme pontifica o


insuperável Pontes de Miranda, em precisas e preciosas palavras:

“Para se reivindicar é preciso que se saiba o que é que se vindica e tal


bem possa ser distinguido entre os outros bens. A caracterização é
indispensável, para o juiz executar a sentença, sem dar um bem por
outro.”
(in “TRATADO DE DIREITO PRIVADO”, XV/304 – in RT-703/139)

Em arremate, aguarda a Fazenda Estadual e o povo


paulista que fique mantida a indefectível r.sentença recorrida de fls.255/258, por seus
EXMO

próprios e muito bem lançados fundamentos.


Negando provimento ao apelo interposto, estará esta
augusta Corte Suprema bandeirante, baluarte inexpugnável do direito brasílico
desd’antanho, aplicando o melhor direito e fazendo a tão esperada, necessária,
imorredoura e consuetudinária, diga-se “en passant”, em partindo desta
Casa, JUTIÇA!
Termos em que,
P.deferimento.
São Sebastião/São Paulo, em 2 de fevereiro de 1998.

João Bosco Pinto de Faria


Procurador do Estado
OAB/SP – 99.056
EXMO

EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA DISTRITAL DE ILHABELA.

A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por seu procurador infra-assinado, nos


autos da AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA
que lhe promovem FRANCISCO CARLOS KUZOLITZ E OUTRO (proc. 53/97), vem
respeitosamente apresentar as inclusas CONTRA-RAZÕES DE APELAÇÃO, para os
devidos fins de Direito.
Requer conste da contracapa, para a devida intimação, o nome dos Procuradores do
Estado Drs. EGIDIO CARLOS DA SILVA, OAB/SP 71.156, PEDRO UBIRATAN
ESCOREL DE AZEVEDO, OAB/SP 56.961 e FATIMA FERNANDES CATELLANI,
OAB/SP 36.071, responsáveis pelo acompanhamento do recurso perante o E. Tribunal
de Justiça.

P. Deferimento.

De SJCampos para Ilhabela


em 22 de fevereiro de 1999

Jaques Lamac
Procurador do Estado
OAB/SP 57.222

CONTRA-RAZÕES DE APELAÇÃO
COLENDA CÂMARA

1.- Insurgem-se os Apelantes contra a r. sentença que, mesmo rejeitando algumas das
preliminares suscitadas pela ora Apelada, concluiu, no mais, com irrepreensível acerto
ao extingüir o feito por falta de interesse de agir. Fundou-se no fato de que as limitações
de uso não autorizam o pedido de indenização através de ação de desapropriação
indireta uma vez que inocorreu apossamento sendo certo que “a simples declaração de
utilidade pública do bem não implica necessariamente em desapropriação, que poderá
EXMO

não se efetivar, como ocorreu neste caso (fls. 154). Ademais, os Apelantes adquiriram a
área em questão em 1.992 “quinze anos após a criação do parque ecológico, já sabendo
das restrições existentes que, certamente, influíram no preço pago.”(fls. 155).

2.- Esmeram-se os Apelantes na busca de motivação hábil ao desiderato de fornecer


acicate a sua irresignação, não padecendo a r. sentença, no entanto, dos defeitos
apontados no recurso, cabendo ressaltar, de início, que o pedido, tal qual formulado, é
impossível de ser atendido consoante passa a demonstrar.

3.- Avaliando que a r. sentença “afastou todas as preliminares argüidas pela Ré, salvo a
Inocorrência de Apossamento, na qual se fundamentou a decisão de carência de ação..”
(fls. 167), postulam os Apelantes a reforma “julgando-se PROCEDENTE A AÇÃO para
condenar a Apelada a ressarcir os Apelantes....” (fls. 176). PRELIMINARMENTE, cabe
argüir a V. Exas. que o recurso não pode ser conhecido pois tal pedido é juridicamente
impossível. De fato, tendo a r. decisão de primeiro grau cingido-se a examinar e acolher
a preliminar de falta de interesse de agir, ao E. Tribunal é vedado suplantar os limites da
decisão de carência, julgando o mérito da demanda, consoante pleiteado pelos
Apelantes. Os princípios do duplo grau de jurisdição e do “tantum devolutum quantum
appelatum” impedem o conhecimento do recurso assentado em pedido juridicamente
impossível pois, nos termos do RESP 1.798, “....o tribunal não pode reformar a sentença
diferentemente do postulado pelo recorrente” (Nota 6 “e” ao artigo 515 do CPC de
Theotonio Negrão).

4.- Por outro lado, não tendo havido exame do mérito na r. sentença, é inatendível a
postulação dos Recorrentes, sendo de rigor o improvimento do recurso pois “......se o
juiz não proferiu sentença de mérito este não poderá ser decidido pelo tribunal, em grau
de apelação” consoante julgados insertos in RTJ 82/288 e RT 499/159 (nota 6 ao artigo
515 do CPC de Theotonio Negrão). No mesmo sentido as decisões do E. STJ aludidas
ao final da mencionada nota 6 (RESP’s 8.123, 8.906 e 11.747) assim como os recentes
RESP’s 36.867, 34.391, 16.110 e 6.983 e ainda os Recursos Extraordinários 84.467 e
72.015. Não tendo sido objeto de discussão no feito a plausibilidade de decisão de
mérito em sendo afastada a preliminar acolhida, tal assunto não foi devolvido ao
Tribunal eis que nem sequer cogitado em primeiro grau, sendo de rigor, em caso de
conhecimento, o improvimento do recurso eis que, limitado à matéria objeto de
preliminar, não pode ensejar o acolhimento pelo mérito, sendo este único pedido
formulado (fls. 176).

5.- Quanto à matéria de fundo explorada no recurso, a argumentação de que o imóvel foi
“colocado fora de comércio” por força do Regulamento de Parques (fls. 169) é deveras
esquálida pois as alienações de áreas situadas dentro do Parque se sucedem sem
EXMO

qualquer impecilho. O Decreto Estadual em tela, longe de impedir a alienação que


somente através de lei seria obstável, apenas mais uma vez tentou assegurar a
preservação. De fato, fossem as áreas inalienáveis, inválidas seriam as transações e até
mesmo as transmissões mortis causa pois se tratariam de bens “fora de comércio” o
que, à toda evidência, inocorre mesmo porque somente a lei ou ato voluntário do
proprietário poderiam disciplinar a pretensa inalienabilidade. Fosse a área inalienável, a
aquisição pelos próprios Apelantes em 1.992 restaria inviabilizada, o que, à evidência,
inocorreu conforme matrícula imobiliária acostada à inaugural.

6.- E, na realidade, longe de impedir o comércio de terras, a legislação apenas


prossegue assegurando a preservação das matas que, conforme acertadamente
concluído pela douta magistrada, desde 1.934 é resguardada da devastação (fls. 155). A
limitação de uso, de há muito instituída e também reforçada pelo Estado através do
Decreto n. 9.414/77, não tem por escopo a expropriação de direitos dominiais ou
assemelhados de modo a apoderar-se das terras mas visa, tão somente, assegurar o
uso das montanhosas escarpas consoante sua destinação natural. De fato, acaso
retirada a sensível cobertura vegetal, as íngremes escarpas da Ilhabela ruiriam com a
força das águas pluviais que, não estancadas pela exuberante folhagem que assegura a
infiltração em doses homeopáticas, acabariam por provocar erosão tão intensa que, em
reduzido tempo, pouco restaria do imóvel com a degradação da flora e devastação da
fauna.

7.- As áreas montanhosas da Ilhabela que formam o Parque Estadual (acima da cota
200) sempre foram mantidas intocadas a fim mesmo de preservar a parte inferior que,
não há dúvidas, ruiria em desmoronamentos acaso retirada a cobertura vegetal superior
que lhe assegura a integridade. Estando as áreas classificadas como "VIII - Terras com
características ainda mais adversas, sendo indicadas somente para o abrigo da flora e
fauna. Em geral são constituídas pelas escarpas de serras e afloramentos rochosos" -
(Instituto Agronômico do Estado de São Paulo - Boletim Técnico n. 03), é evidente que
sua destinação natural, apreendida pela União (Código Florestal de 1.934 e Decreto
Federal n. 44.890/58), Estado e também pelo Município (Lei Municipal n. 98 de
25/11/1980 – arts. 13, 17, 20, 21, 22 e 55) é indubitavelmente a preservação, realidade
inafastável de todos aqueles que adquiriram essas áreas após 1934, entre os quais os
Apelantes.

8.- A fim de não enfastiar V. Exas. com a repetição de todos os aspectos e respectiva
jurisprudência abonadora inseridos na contestação, solicita que lá sejam examinados (
ítens 8 a 12).

9.- As notícias de jornais em que se apegam os Apelantes não fornecem a sustentação


EXMO

almejada à configuração do apossamento pois, inobstante tenha o Estado se


estruturado para controlar os desmatamentos, a utilização das áreas pelos proprietários
permanece assegurada, consoante a sua destinação. Assim, podem as áreas que
formam o Parque (acima da cota 200) servir para o turismo ecológico, atualmente muito
em voga, estudos científicos, criação de espécies vegetais e animais e mesmo abrigar
cabanas condizentes com a preservação ecológica. Ademais, nada impede que
residências sejam erigidas nas partes inferiores, abaixo da cota de altitude determinada
pela legislação, sendo perfeitamente utilizáveis as partes superiores para lazer e recreio.
Trata-se de utilizar das áreas respeitando a sua destinação natural, nos moldes de sua
classificação. Na proteção dos ecossistemas, o Estado tem investido consideráveis
recursos, conforme noticiam as matérias jornalísticas, mas o direito de propriedade
prossegue normalmente exercido, respeitadas as limitações ditadas pelo cunho social
de que se deve revestir.

10.- Cuidou a douta magistrada sentenciante de reforçar a fundamentação do decisum


que também se lastreou no fato de terem os Apelantes adquirido a área em 1992,
“quinze anos após a criação do parque ecológico, já sabendo das restrições existentes
que, certamente, influíram no preço pago.”(fls. 155). E, de fato, sendo sobejamente
sabedores das limitações de uso incidentes sobre a área que adquiriram, não podem os
Apelantes invocá-las para obtenção de indenização consoante remansosa
jurisprudência referida no ítem 6. da contestação bem como na r. sentença. Seria
mesmo despropositado propiciar-lhes injustificável enriquecimento sem causa à custa do
patrimônio público, reiterando-se também, a esse respeito, todo o exposto nos ítens 26 a
39 da resposta.

11.- Cabe repisar, por outro enfoque, que o título dominial apresentado pelos Apelantes
não possibilita a identificação da área pois os dados nela constantes são
manifestamente insuficientes, máxime considerando que os Apelantes somente
adquiriram a METADE IDEAL da antecessora SANTA MÔNICA EMPREENDIMENTOS
E PARTICIPAÇÕES S/C LTDA, nos termos dos R. 2 e R. 3 da matrícula 18.795,
valendo, a propósito todo o exposto nos ítens 3 a 5 da contestação. Tal impossibilidade
de individualização da área, cujos dados são vagos e imprecisos, também impede o
prosseguimento da demanda que, para validamente se instalar, prescinde da definição
da res in judicio deducta. Por oportuno, cabe ora colacionar o recentíssimo julgado da 7ª
Câmara de Direito Público desse E. Tribunal que, na AC 024.620.5/3-00, decidiu:

“Toda a argumentação que se lançou no apelo termina por mostrar a falta de


razão dos recorrentes. Os títulos emergiram precários e sua antigüidade, por si
só, não basta para fazê-los aptos, a operar como documentos indispensáveis, na
ação indenizatória. Os custos de eventual retificação dos títulos não é motivo
EXMO

suficiente para arredar o decisum atacado... Na denominada desapropriação


indireta, de modo inafastável, precisa o autor comprovar o domínio do imóvel,
além de evidenciar que lhe vem pagando os impostos. Não basta, entretanto,
demonstrar o aludido domínio; cumpre lhe individuar o imóvel a ponto de não
se poder lhe duvidar dos limites, ou confrontos. Exata localização dos imóveis
consiste em exigência que não se pode ignorar. No caso dos autos irrompem
mais vacilações que certezas jurídicas....A descrição incerta, a dúvida quando à
lindes, na reivindicatória não se pode resolver, por via de perícia, no curso da
ação. Por isso, nega-se provimento ao apelo..”.

O julgado ficou assim ementado:

“DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. Imprescindibilidade de certeza do título de


domínio do imóvel na reivindicação do preço ou da indenização. Recurso
Improvido.”

Reexaminando o tema, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, através do Agravo de


Despacho Denegatório número 221.321-4, confirmou o entendimento, indagando:
“Como então, diante desse quadro, dizer-se da subsistência dos títulos e respectivos
registros, a justificar o pedido de indenização?” Mesmo conhecendo do recurso, o
Ministro MARCO AURÉLIO, por tais fundamentos, negou-lhe acolhida, isto em
18/8/1998.

12.- Tal douto entendimento é igualmente aplicável ao presente caso em que os dados
constates do título são manifestamente dúbios e aéreos, sendo certo que a meação
possuída pelos Apelantes somente seria apurável através de procedimento judicial
específico uma vez que sequer existem no título os elementos que decifrem as
características da gleba ou sua dimensão. Por conseguinte, as decisões acima referidas
cuidam de situação análoga, sendo plenamente aplicáveis.

13.- Acresce, ainda, que, pertencendo as ilhas à União (artigo 20, IV, CF), há flagrante
nulidade se a mesma não for ao menos intimada para o feito, até porque editou o
aludido Decreto 44.890/58 bem como ampla legislação sobre a proteção de florestas. A
matéria encontra-se desenvolvida nos ítens 14 a 18 da contestação, cujo exame solicita
a V. Exas pois, mesmo rejeitada na r. sentença, é passível de reexame eis que
mencionada nas presentes Contra-Razões.

14.- Outras matérias, incluídas a título de preliminares de mérito, também convém


figurem nas presentes contra-razões, até por força do princípio da eventualidade. Assim,
por não ter sido aperfeiçoada a citação no prazo legal consumou-se a PRESCRIÇÃO
EXMO

VIINTENÁRIA, aspecto não cogitado na r. sentença mas de capital importância pois


ceifa o próprio direito de ação já em seu nascedouro, nos próprios termos admitidos na
decisão. No tocante a decadência, sendo o Decreto criador do Parque de 1.977, sem
que até o momento tenha sido efetivada qualquer desapropriação, tem-se que é inviável
a pretendida intervenção na propriedade alheia por força do aludido mandamento. Por
outro enfoque, a propositura da ação após quase VINTE anos da sua edição é também
inadmissível pois a ocorrência da prescrição quinquenal é inarredável em face do
Decreto n. 20.910/32 reforçado, especificamente, pelo artigo 5º da Medida Provisória n.
1.703, antecedida pelas de número 1.658, 1.632 e 1.577 de 12/6/1997 e que dispõe:

“Extingue-se em cinco anos o direito de propor ação de indenização por


apossamento administrativo ou desapropriação indireta, bem como ação
que vise indenização por restrições decorrentes de atos do Poder
Público.”

A respeito do tema, reitera o expendido nos ítens 18a a 25 da resposta, ora reiterados.

15.- A indulgência com que, no passado, alguns infelizes julgados de Altas Cortes
concederam nababescas indenizações animou os experts a proporem ações análogas à
presente, tendo proliferado a “indústria” da renda fácil à custa do Estado. Muitas áreas
preservadas, adquiridas por tostões, acabaram rendendo milhões sem nenhum
investimento ou esforço que não a graça da natureza, sob o roto argumento de
“desapropriação indireta”. Mais conscientizados, os D. Julgadores desse E. Tribunal têm
sistematicamente negado os pleitos cujas decisões, na atualidade, têm sido mantidas
nas Superiores Instâncias, constituindo-se expressivo exemplo os julgados acima
mencionados. Manda a cautela, no entanto, que seja reapresentada, em apertada
síntese, toda a matéria incluída a título de PRELIMINAR para que, acaso assim
entendam Vossas Excelências, mereça análise e acolhimento.

16.- Diante do exposto, aguarda que o recurso NÃO SEJA CONHECIDO por conter
pedido juridicamente impossível. Sendo conhecido, que lhe seja negado provimento
porque o julgamento de primeiro grau, tendo se albergado unicamente na falta de
condições para a ação (interesse de agir), impede seja enfrentado por V. Exas. o mérito
que constitui o único pedido solicitado pelos Apelantes. O improvimento do recurso, sob
outro enfoque, poderá resultar, outrossim, do reconhecimento de que a matéria foi bem
decidida no juízo “a quo”. Acaso resolvam V. Exas. prosseguir no julgamento em relação
às demais questões preliminares, aguarda que seja reconhecida a ocorrência da
PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA pelo atraso no aperfeiçoamento da citação por desídia dos
próprios Apelantes, matéria não examinada na r. sentença, ou que os demais aspectos
abordados sejam reexaminados de modo que a conclusão do “decisum” seja mantida,
EXMO

mesmo que por outros fundamentos, sendo tais pedido conformes o Direito e a Justiça.

De SJCampos para Ilhabela


em 22 de fevereiro de 1999

Jaques Lamac
Procurador do Estado
OAB/SP 57.222
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO
Procuradoria Administrativa
PA-1 – Desapropriações

Exmo. Sr. Desembargador Relator do Acórdão n. 248.964.2/5, do Egrégio Tribunal de


Justiça do Estado de São Paulo

Processo n. 248.964-2/5 - Cananéia


Embargante: Fazenda do Estado de São Paulo
Embargado: Distribuidora de Produtos Alimentícios Golding Ltda.

A Fazenda do Estado de São Paulo, pelo Procurador que esta


subscreve, nos autos do processo em epígrafe, vem, respeitosamente, à presença de V.
Exa., interpor, com fundamento no artigo 530 do Código de Processo Civil, embargos
infringentes do V. Acórdão publicado em 12/6/00, pelas razões que passa a expor:

01. Nos autos da apelação cível em epígrafe, esse E. Tribunal de


Justiça, em sua Terceira Câmara de Direito Público, por votação majoritária, entendeu
ser possível e pertinente a ação em epígrafe, rejeitando por isso a preliminar de carência
de ação, porquanto teria ficado demonstrado o domínio quanto à faixa incontroversa, que
atinge mais da metade da área titulada.
Nesse sentido, o valor correspondente à terra nua, acrescido do
relativo à cobertura vegetal, deveria ficar dentro do limite de 53,3%. Os juros
compensatórios foram fixados em 12% ao ano desde a citação. À condenação
acresceram-se os juros moratórios de 6% ao ano, do trânsito em julgado, além de
honorários advocatícios, também de 6%, incidentes sobre o total da condenação, e
ressarcimento de despesas processuais.
02. Contudo, com mais acerto, o D. Desembargador Relator, Dr.
Hermes Pinotti, adotando entendimento diverso, entendeu que, diante da incerteza da
titularidade do domínio, a EMBARGADA deveria ser considerada carecedora de ação,
nos termos do art. 267, inciso VI, do CPC, ficando caracterizada a ilegitimidade de parte,
com sua condenação no pagamento de custas, despesas processuais e honorários
advocatícios de R$ 3.000,00 (três mil reais), corrigidos da data da publicação do
acórdão.
Adentrando na apreciação da matéria de fundo, conquanto tenha
entendido não se tratar de simples limitação administrativa, o d. voto minoritario, após
reconhecer que a cobertura vegetal foi super avaliada, e mais, que há de se descontar as
áreas de preservação permanente previstas pelo Código Florestal e que a exploração da
madeira seria economicamente inviável, concluiu que haveria de ser considerado apenas
o valor da terra nua, nos termos do parecer do Assistente Técnico da Fazenda do Estado
de São Paulo, ou seja, Cr$ 15.120.646,00 (quinze milhões, cento e vinte mil, seiscentos
e quarenta e seis cruzeirso), em valores de outubro de 1990 e, ainda, que os juros
compensatórios são indevidos, à luz do RESP n. 108.896-0-SP, rel. o Exmo. Sr. Ministro
Milton Luiz Pereira. Finalmente, se devidos forem os juros compensatórios, a partir de 30
de julho de 1998 deveriam ser reduzidos para 6%, consoante o disosto no art. 4°, § 1°,
da Medida Provisória n. 1703-15. Em não sendo acolhida a preliminar de carência de
ação, os honorários advocatícios deveriam ser reduzidos para 4%.

03. Sobreposição de áreas - Incerteza da Titularidade do


Domínio
Preliminarmente, destaca a EMBARGANTE o acerto do voto
minoritário, que deu pela carência da ação. Destacou, na oportunidade, o Exmo. Sr.
Desembargador Relator:
"De início, alguns esclarecimentos quanto à matéria de fato:
A autora alega que, desde 1984, pela atuação da Guarda Florestal,
perdeu a disponibilidade de uma área de 2.694 alqueires, em razão do
apossamento administrativo decorrente da criação do Parque Estadual
de Jacupiranga (Decreto Lei Estadual n. 145 de 08/8/1969).
A indenização foi fixada em Cr$ 3.463.433.562,00, para outubro de
1990, que naquela época equivaliam a US$ 34.940.267 ou R$
50.775.160,78 (cinqüenta milhões, setecentos e setenta e cinco mil,
cento e sessenta e oito centavos), isto em junho de 1998 (vide fls. 1.282
- 6º volume).
O laudo do perito judicial nomeado pela Câmara fixou valores ainda
maiores: Cr$ 3.754.905.299,00, que correspondiam na época (1990) a
US$ 36.794.760 ou R$ 55.048.239,52 (vide fls. 1.282 - 6º volume).
Desde a contestação, a Fazenda está sustentando a existência de
sobreposição de áreas, fato a impossibilitar prova convincente do
domínio, requisito básico para a propositura da ação de indenização por
apossamento administrativo.
A questão é complicada e o perito judicial nomeado em primeira
instância chegou a admitir que a sobreposição acontecia com referência
a Massao Kano (fls. 340), cujas terras estariam dentro da área de 2.694
alqueires da autora-apelada (fls. 402).
É certo que, posteriormente, reexaminando a questão, referido 'expert'
retificou essa conclusão (fls. 874/876).
Isto tudo mostra como o exame da matéria provoca perplexidade.
O assistente técnico da Fazenda do Estado ofereceu, nesta instância,
elementos que mostram a existência de ponderáveis dúvidas quanto ao
título de domínio da autora.
A questão já havia sido levantada pelo Instituto de Terras, conforme
assinalada a fls. 1.287 e ficou melhor esclarecida com parecer solicitado
a uma renomada empresa de consultoria, que utilizou métodos
modernos, como se pode verificar a fls. 1.291:
'A plotagem dos imóveis foi feita sobre foto imagem de satélites (cartas
ns MI-2828-4 e nº MI-2844-2) e mapas 1:50.000 do IBGE (cartas Rio
Guaraú - SG.22-X-B-VI-4 e Ariri - SG.22-X-D-III-2), tratando-se de
estudo articulado de alta especialização técnica, envolvendo a utilização
de recursos sofisticados de geoprocessamento, tais como sistemas de
informações geográficas, processamento de imagens e modelagem
volumétrica de terrenos' (fls. 1.291).
Daí a conclusão no sentido da existência de 'diversas sobreposições de
áreas,...' (fls. 1.291)".
Não descuidou o DD Desembargador Relator de atentar para os
termos do disposto na Lei 6.015, de 31.12.1973 (Lei de Registros Públicos), que assim
dispõe: "Art. 225. Os tabeliães, escrivães e juízes farão com que, nas escrituras e nos
atos judiciais, as partes indiquem, com precisão, as confrontações e as localizações dos
imóveis, mencionando os nomes dos confrontantes e, ainda, quando se tratar só de
terreno, se esse fica do lado par ou ímpar do logradouro, em que quadra e a que
distância métrica da edificação ou da esquina mais próxima, exigindo dos interessados
certidão do registro imobiliário. § 1°. As mesmas minúcias, com relação à caracterização
do imóvel, devem constar dos instrumentos particulares apresentados em cartório para
registro. § 2°. Consideram-se irregulares, para efeito de matrícula, os títulos nos quais a
caracterização do imóvel não coincida com a que consta do registro anterior". Nesse
sentido, ponderou o Exmo. Sr. Desembargador Relator, no voto que pretende a
EMBARGANTE passe a prevalecer:
"Observa-se, também, que a petição inicial não descreveu
adequadamente a área que seria de propriedade da autora, isso em
termos de correta individualização, tendo em vista o princípio da
especialidade referente aos registros públicos (artigos 225, §§ 1º e 2º,
da Lei 6.015/73)".
Assim sendo, concluiu o Exmo. Sr. Desembargador HERMES PINOTTI que, existindo
dúvida quanto ao domínio, a ação não pode prosperar em termos de legitimidade ativa,
reportando-se ainda a jurisprudência desse mesmo E. Tribunal de Justiça ("Indenização -
Desapropriação Indireta - Prova de ser proprietário do imóvel - falta - Carência de ação'
(RJTJSP 98/144)", da qual, pedimos vênia para transcrever algumas passagens do
acórdão, prolatado em sede de Apelação Cível n. 60.753-1, em que figuram como
apelante Marcos Keutenedjian e outra e como apelada a ora EMBARGANTE:
"A v. sentença deu pela carência da ação, atinente à pertinência
subjetiva ativa, ante os termos da inicial. Isto é, os autores alegaram
terem sofrido dano, na qualidade de proprietários do imóvel declarado
de utilidade pública. Disseram, em outros termos, que sofreram danos
decorrentes da qualidade de senhores da terra.
Assim, se não são donos da terra atingida pelo Dec. N. 10.251, falta-
lhes qualidades para reclamar conseqüências da titularidade que não
possuem. Id est, com vista à relação jurídica de direito material
deduzida (o direito de propriedade lesado), não estão os autores
legitimados para a causa. Ou seja, a relação jurídica, posta em termos
de objeto do litígio, na inicial, tem por pressuposto o domínio.
A qualidade de proprietários dos autores, retratada na inicial se pôs em
termos de idoneità desunta della sua pozisione rispetto alla lite
(CARNELUTTI, "Sistema di Dirittto Processuale", I/361, ed. Cedam,
1963).
Os autores alegaram, em síntese, titularidade do direito a indenização
em razão de uma qualidade, a de serem senhores do bem, o que os
documentos vindos aos autos não favorecem.
A qualidade jurídica que os aptes. Invocam a justificar a situação
processual ensejadora do direito de ação, o domínio, por não lhes
pertencer os tornou carentes de legitimidade para agir.
..............................................................................................
Sem prova do domínio invocado, que é o fundamento do pedido de
indenização, outra não podia ser a decisão senão a de Juízo de
carência. O aceno, em nível de recurso para outro fundamento jurídico a
amparar a pretensão indenizatória, não pode ser acolhido, por equivaler
a modificar a ação.
Assim, e dando destaque às bem deduzidas manifestações da
Fazenda, através de seu d. Procurador José Milton Garcia, nega-se
provimento ao apelo" (RJTJESP 98, pp. 145/146).

Em julgamento de Recurso Extraordinário n. 114.390-SP (Segunda Turma), em que


figuram como recorrentes Rubens Vieira Pinto, sua mulher e outros e, como recorrida, a
FEPASA - Ferrovia Paulista S/A, o Egrégio Supremo Tribunal Federal concluiu que "Só
tem direito a indenização por apossamento administrativo quem prova ter domínio do
bem questionado":
"...os recorrentes não têm o domínio das terras que pretendem haver
sido apossadas pela estrada de ferro. Nem sabem definir as áreas
respectivas, tanto que na inicial pediram fossem elas determinadas por
via de perícia.
No RE 97.317, julgado nesta Turma em 5-2-85, Relator o Ministro Aldir
Passarinho, assentou-se que:
'Desapropriação indireta.
A indenização por apossamento administrativo só
pode ser pleiteada por quem comprove ser o legítimo
proprietário da área questionada.
E se o Tribunal de Justiça a quo não reconheceu,
ante a prova dos autos, a titularidade dos autores, e
sendo incabível, na via estreita do apelo excepcional
reexamina-las, não é de conhecer-se do recurso.
Embora demonstrem os autores que a jurisprudência
é no sentido de que o prazo prescricional, na
chamada desapropriação indireta, é o mesmo das
reivindicatórias, e não o qüinqüenal, inútil decidir-se a
respeito se a pretensão de logo esbarra no óbice
pertinente à legitimidade ad causam dos litigantes.
Recurso extraordinário não conhecido' (RTJ
115/1.255)".

(In RTJ 123, pp. 368/369).


Invoca-se, ainda, decisão paradigmática desse Egrégio Tribunal de Justiça de São
Paulo, nos autos da Apelação Cível n. 108.778-2, da 9ª Câmara, julgado em 25.9.86, que
teve como relator o Exmo. Sr. Des. Camargo Viana:
"Desapropriação Indireta - Apossamento Administrativo - Dúvida quanto
à titularidade do bem - Ônus da prova a cargo do proprietário - Incerteza
quanto a pertencer o direito invocado àquele que figura no pólo ativo da
demanda - Ilegitimidade de parte - Carência de ação configurada -
Recurso improvido' (RT 613/78).
Na desapropriação indireta, à parte dita expropriada incumbe o ônus da
demonstração do escorreito domínio, fundamento da pretensão inicial
indenizatória, que, se inexistisse, gera carência de ação, por
ilegitimidade de parte' (Apelação Cível n. 108.778-2 - 9a C., J. 25.09.86,
Rel. Des. Camargo Viana).
...nesta ação ordinária de indenização por apossamento administrativo -
ato ilícito civil, por excelência - alcunhada impropriamente
desapropriação indireta, invertem-se os ônus da prova em relação à
desapropriação. À luz da hermenêutica do Pretório Excelso, é mister
afirmar que não há identidade entre a desapropriação e a ação de
indenização por apossamento administrativo (desapropriação indireta),
'porquanto esta última importa, sem dúvida, num apossamento ilegítimo,
constituindo, inclusive, ilícito civil' (RTJ 114/794). Na primeira, o ônus da
prova de domínio da área expropriada é incumbido ao órgão público
expropriante. Na última, por sua vez, no autor recai o ônus da prova,
isto é, o proprietário do imóvel esbulhado tem que demonstrar seu
domínio escorreito e a sua violação.
Acaso remanesçam dúvidas sobre a titularidade do domínio, a ação não
merece procedência. Isto porque a prova sobre o domínio tem que ser
contundente efetiva e precisa para imputar ao Poder Público o
pagamento de justa indenização. Assim, avulta a prova dominial como
condição da ação, tendo o escopo de estabelecer a certeza sobre a
titularidade do direito invocado no pólo ativo da relação jurídica
processual.
Aliás, foi o que esta C. Câmara decidiu ao julgar a Ap. cível 100.752-2,
em que foi consignado que ''à parte dita expropriada incumbe o ônus da
demonstração do escorreito domínio, fundamento da pretensão inicial'.
Como esclarece Moniz de Aragão (Comentários ao Código de
Processo Civil, v. II/437, Forense, 1ªec.), a legitimidade ad causam é
'a pertinência da ação àquele que a propõe e em confronto com a outra
parte'.
E a ausência de uma das condições da ação é motivo para rejeitar a
pretensão deduzida. Dessa opinião comungam Arruda Alvim (Manual,
v. I/257, Ed. RT, 1986), assinalando que é necessária a existência
simultânea das condições da ação e Botelho de Mesquita (Da Ação
Civil, Ed. RT, 1975, p. 78), afirmando que a falta desses requisitos
mínimos impede o julgamento sobre as demais.
De feito, as provas aqui colacionadas não demonstram com efetiva
precisão qual é a área de domínio do autor, não precisam sua
localização, sua metragem, resumindo-se, tão-somente, a informar que
mediante transação o autor e demais pessoas adquiriram algum terreno
naquela região.
Vale dizer, a insuficiência probatória destes documentos fulmina a
pretensão deduzida, vez que neste procedimento é indispensável a
prova dominial" (RT-613, pp. 79/80).

A brilhante declaração de voto vencido reporta-se, ainda, a


outros precedentes jurisprudenciais relativos a casos não apenas análogos, mas
expressamente relacionados com o presente, isto é, relativos ao imóvel cuja indenização
ora é pretendida:
"Importante anotar que, em março de 1998, a Colenda Oitava Câmara
'Janeiro 97' de Direito Público, deste Tribunal apreciou questão
assemelhada, envolvendo o mesmo Parque Estadual de Jacupiranga e
onde o tema da superposição de áreas foi analisado, até com referência
expressa à apelada Distribuidora de Produtos Alimentícios Golding Ltda
(Apelação 33.814-5/0 - Rel. Des. WALTER THEODÓSIO):
'A fls. 965, o perito afirma que o imóvel em questão
sobrepõe às áreas da GOLDING S/A, Antonio Fleury
de Camargo e José Queiroz Maltozo, que, por sua
vez, se sobrepõem à área da SECOMIL, processo n.
353/89.
A planta de fls. 968 mostra a sobreposição da área
destes autos por áreas da GOLDING LTDA, Antonio
Fleury de Camargo e José de Queiróz Mattoso.
Nessa planta, não há resíduo da área pretendida pela
autora, em face da sobreposição das três áreas
descritas.
A planta de fls. 732 dá notícia, mais, de sobreposição
da área invocada pela autora, por parte de áreas de
Massao Kano e GOLDING Ltda.
A sobreposição de Massao Kanno está revelada, na
planta de fls. 734 e na de fls. 741.
A sobreposição da GOLDING LTDA está reproduzida
na planta de fls. 735'.

Tendo em vista essa prova técnica, o v. acórdão deixou bem claro:


'Diante desse quadro conturbado de áreas
sobrepostas, tumultuando a titularidade do domínio,
não há como acolher-se o apelo, que intenta
indenização por apossamento administrativo.
Despiciendo se mostra a análise das verbas
acenadas no feito, em torno da riqueza vegetal e sua
indenização por viabilidade de explicação (rectius:
exploração) comercial.
Perfilha-se o entendimento da r. sentença, eis que há
relevantes dúvidas sobre a certeza e determinação da
área do imóvel referido na inicial.
Dada a sobreposição de áreas reveladas no feito, não
há certeza da titularidade do domínio, projetando
turbulência no âmbito da 'legitimatio ad causam' ativa'
(fls. 1.516/1/517).

Resulta, portanto, que diante da incerteza da titularidade do domínio a


autora é carecedora da ação, por ilegitimidade de parte (artigo 267, VI,
do CPC)".
É insofismável a lúcida conclusão oferecida no V. Voto do Exmo.
Sr. Desembargador Relator, devendo por tal motivo, data maxima venia, prevalecer
sobre os termos do voto majoritário.

04. Superavaliação da Cobertura Vegetal


Em sendo, por um absurdo, superada a preliminar de carência de ação, impõe-se sejam
acolhidos os argumentos esposados na declaração de voto vencido, relativos aos ainda
elevadíssimos valores a que se chegou, isto é, CR$ 51.450.163,27 para o mês de
outubro de 1990.
Cumpre, neste passo, converter tais valores para os padrões monetários vigentes em
junho de 2000:
Valor da terra nua: R$ 138.995,01
Valor singelo da condenação: R$ 887.336,66
Desconsiderou-se, em primeiro lugar, a impossibilidade de se
avaliar destacadamente solo e acessões naturais
A avaliação em separado da mata e da terra nua não pode ser aceita como
procedimento avaliatório correto.
No mercado imobiliário não se conhecem transações de partes do imóvel: o imóvel é
transferido em seu conjunto, com todas as acessões a ele incorporadas e sem que se
paguem preços distintos. Como a avaliação deve se pautar pelo critério jurídico do justo
preço e este é a expressão do valor que o bem alcançaria no mercado, é juridicamente
impossível realizar avaliações distintas para o solo e suas acessões naturais. Além do
mais, as matas não são obra do homem, que nada gastou com as mesmas e nem
sequer dispende esforços no sentido de mantê-las: as matas surgem e mantêm-se em
razão de ciclos ecológicos naturais, sem interferência humana. Ao contrário, no caso, o
homem só é capaz de destruir tais acessões.
É certo que ao adquirir o imóvel o EMBARGADO não pagou preços distintos pela terra e
pela mata, mas ambos englobadamente e de forma indistinguível.
Aliás, esse entendimento é esposado pela jurisprudência:
“Não se vê como possa se destacar o valor da terra do valor
individualizado das essências existentes na terra, de sorte a que a
indenização se componha de dois valores diversos. A prevalecer o
raciocínio da sentença, o valor do alqueire chegaria a nível de
propriedades situadas nas melhores zonas do Estado, quando é sabido
que as terras de Cunha não alcançam valores significativos. (...)
Quando os expropriados adquiriram a terra já existiam as matas e nem
por isso o preço da aquisição foi considerado sob duplo enfoque: preço
da terra e preço das matas” (Apelação Cível n. 42.431-2).
Também desconsiderou-se a inviabilidade fática e econômica da exploração comercial
da mata, como muito bem foi destacado na declaração de voto vencido:
"...quanto à possível extração de madeira - com a devida exclusão
daquela existente nas áreas de preservação permanente - verifica-se
que sua exploração seria inviável economicamente, conforme se pode
concluir da topografia do imóvel, grande parte ocupado por montanhas
(vide fotos de fls. 358, 360, 362 e 364). Daí resultaria que o preço da
extração e transporte superariam o valor comercial da madeira.
Portanto, há que se considerar apenas o valor da terra nua, nos termos
do parecer do Assistente Técnico da Fazenda do Estado, verbis, 'O
exame da distribuição das espécies por faixa diametral demonstra que
84,35% do total que compõe a amostra inventariada, descrita à fls.
408/496, está abaixo de 45 cm de DAP, ou seja, sem perspectiva de
aproveitamento econômico.
O restante (15,65% do total inventariado) assume o perfil de exceção,
pois nenhum incauto haveria de investir em infra-estrutura naquele
imóvel íngreme (fls. 358 e 364) com o propósito de obter o retorno
econômico ou compensação financeira com a derrubada e venda da
madeira de maior porte que ali existisse, porém não em economia de
escala e sem uniformidade de espécies, desestimulando toda e
qualquer exploração comercial' (fls. 1.145).
Assim, por via de conseqüência, a indenização deverá corresponder
apenas ao valor da terra nua (...)".

Pondera, por oportuno, que, em sendo acolhido este aspecto do voto vencido, deverá ser
observado o limite de 53,3% que, de acordo com o voto majoritário, seria a "área
reconhecidamente livre de qualquer possível superposição", pena de reformatio in pejus
do valor da terra nua.
O projeto de extração da madeira restringe-se à retirada pura e simples da vegetação
que cobre o imóvel. Cumpre indagar se seria possível o completo desmatamento do
terreno. Quais seriam as conseqüências da eliminação da cobertura vegetal? Ora,
qualquer pessoa sabe que o total desmatamento de uma área traz conseqüências
desastrosas, tais como a desertificação e a perda das características do solo.
Inviável, ainda, a exploração da cobertura florísitca quando esta é analisada sob o ângulo
econômico.
Ressalte-se que o EMBARGADO jamais explorou o imóvel e, ao que tudo indica, não
pretendia implantar qualquer projeto, especialmente para extração da vegetação.
A total falta de infra-estrutura para o exercício da atividade extrativa torna necessária a
elaboração de estudos sobre a estimativa de gastos com a produção. Tal exame seria
imprescindível para avaliar os custos do empreendimento e se este traria lucros e qual o
montante destes.
A avaliação feita dessa forma não leva em consideração os problemas existentes para a
extração da cobertura florística. Se o explorador viesse a dispender valores elevados na
tarefa de retirar a vegetação, estes gastos seriam agregados ao preço final do produto,
fazendo com que o mesmo não fosse competitivo para a comercialização.
Alguns desses gastos não computados estão ligados a:
a) escoamento: deve-se considerar a necessidade de serem construídas vias de
escoamento internas, permitindo o transporte da madeira. Acrescente-se que a área
encontra-se distante de usinas de beneficiamento, sendo servida por precárias estradas
de terra, em péssimas condições;
b) topografia: áreas com topografia acidentada apresentam custos elevados para
extração da madeira, sendo necessário que se incluam nos gastos obras de contenção
de encostas, além de custos mais elevados para transporte de maquinário e da própria
madeira extraída;
c) utilização da lenha: o aproveitamento possível para a lenha é como fonte energética
em fornos, especialmente de padarias. A sua extração apresenta altos custos, porém o
seu valor é muitas vezes inferior ao da madeira. A partir desta observação fica
evidenciado que a sua exploração não é rentável e seria desconsiderada por qualquer
explorador que se dispusesse a efetuar a extração da cobertura florestal;
d) estudos técnico-científicos: acresça-se aos gastos aqueles necessários para
elaboração de estudos técnico-científicos de estoques e de garantia de capacidade de
manutenção das espécies que é obrigatório nas regiões com características de mata
atlântica, conforme determina o art. 2°, inc. II, do Decreto Federal 750/93.
A extração da madeira, no caso "sub judice", seria repleta de dificuldades e de elevados
custos, os quais, agregados ao valor final do produto, o tornariam extremamente caro,
inviabilizando sua comercialização. A área apresenta características desfavoráveis para
a extração da madeira, as quais deveriam ser informadas quando feita a pesquisa.
Não se pode analisar o potencial da vegetação como se fosse riqueza facilmente
apropriável. Seu valor depende do desenvolvimento de uma atividade empresarial e
apenas a partir de parâmetros de lucro que esse empreendimento possa fornecer é que
seria possível avaliar-se o montante do prejuízo a ser ressarcido.
Recentemente, o Colendo Supremo Tribunal Federal julgou imprescindível a realização
de estudos que certificassem a possibilidade de exploração econômica da mata e qual o
lucro efetivamente obtido, esclarecendo:
"Na verdade, diante da gravidade do tema que envolve toda a extensa
região da Serra do Mar, é de máxima conveniência que o Tribunal de
origem aprecie o laudo oferecido pelos peritos sob a ótica que foi
sustentada no voto que prevaleceu no acórdão, renovando-se, para
isso, se necessário, a própria perícia a fim de que se considere,
conscientemente, o problema das matas situadas em locais de difícil
acesso, insuscetíveis, por isso, de aproveitamento econômico, e, ainda,
para que não se perca de vista, como fator depreciativo, a parcela
correspondente aos efeitos das áreas de preservação obrigatória
instituída por lei federal" (trecho extraído do R.E. 114.682/SP).
Nesse sentido, pleiteia a EMBARGANTE o acolhimento das razões expendidas no r. voto
vencido, consentâneas com os termos dos artigos 2°, 3°, 16, § 2°, do Código Florestal e
com o art. 2°, inc. II, do Decreto Federal 750/93, com isto excluindo os "produtos
florestais" do valor da indenização, isto por ser flagrantemente ilegal a inclusão das
matas de preservação permanente e da reserva florestal obrigatória no valor da
indenização.
As florestas estão sujeitas às limitações contidas nos arts. 2° e 10 da Lei
4.771/65, tornando-se necessário que o proprietário da área recoberta por vegetação
exclua um percentual para a formação de reserva obrigatória (art. 16 da Lei 4.771/65). As
áreas de preservação permanente não estão incluídas no percentual de reserva
obrigatória, mas somam-se a essas.
Com relação a estas florestas não resta ao Poder Público outra
alternativa senão conservá-las, uma vez que a declaração de serem de preservação
permanente advém de lei federal. O Estado receberá a área com todas as limitações
administrativas, sendo obrigado a respeitá-las. Nem poderá o Estado buscar
ressarcimento desse valor perante a União, pois as limitações são consideradas não
indenizáveis.
A melhor doutrina de Direito Ambiental entende que as Areas de
Preservação Permanente (APPs) e as Reservas Florestais Legais são inindenizáveis.
Socorremo-nos das lições de Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin:
"Já observamos que, diversamente, outras unidades de conservação,
confirme sua configuração, podem chegar a atingir todo o imóvel,
inviabilizando, por inteiro, qualquer forma de exploração econômica, o
que gera, evidentemente, dever de indenizar. Não é assim com as
APP's e a Reserva Florestal Legal".
"Em linhas gerais, nenhum dos dispositivos do Código Florestal
consagra, aprioristicamente, restrição que vá além dos limites internos
do domínio, estando todos constitucionalmente legitimados e
recepcionados; demais disso, não atingem, na substância, ou aniquilam
o direito de propriedade. Em ponto algum as APPs e a Reserva Legal
reduzem a nada os direitos do proprietário, em termos de utilização do
capital representado pelos imóveis atingidos. Diante dos veículos que
sobre elas incidem, tanto aquelas como esta aproximam-se muito mais
da modalidade de propriedade restrita [ Propriedade restrita é aquela
em que algum ou vários dos seus poderes elementares estão, total ou
parcialmente, destacados e atribuídos a outrem. No caso das APPs e
Reserva Legal, nos termos do art. 225, da Constituição, os atributos
ambientais da propriedade, apesar de mantidos em poder do
proprietário, por extensão são igualmente conferidos à coletividade e às
gerações futuras. Sobre propriedade restrita ou limitada, cf. Orlando
Gomes, Direitos Reais, 8ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 1983; Silvio
Rodrigues, Ob. cit., p. 82" ] , restrita, sim, mas nem por isso menos
propriedade".
"Tanto as APPs ope legis, como a Reserva Legal são, sempre, limites
internos ao direito de propriedade e, por isso, em nenhuma hipótese são
indenizáveis. Integram a essência do domínio, sendo como o título
transmitidas; [ Aliás, o Código Florestal, no caso da Reserva Legal, é
expresso, prevendo a vedação de 'alteração de sua destinação nos
casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento da
área' (arts. 16, par. 2 e 44, par. Único) ]. Não importam, per se,
novamente tomando por empréstimo as palavras do Ministro Celso
Mello, 'em esvaziamento do conteúdo econômico do direito de
propriedade'. A desapropriação, sabe-se, 'priva o particular do bem de
quem é proprietário'; ora, não é isso que se dá com as APPs e Reserva
Legal, pois o senhor dessas áreas não deixa de ser o proprietário
original, o particular".
"Se 'desapropriar é retirar a titularidade de alguém', não se pode falar,
como regra, em conduta desapropriante na proteção do meio ambiente
(do qual fazem parte as florestas nativas) pela via da Reserva Legal e
das APPs, que do dominus nada retiram, só acrescentam, ao
assegurarem que os recursos naturais — mantidos em poder do titular
do direito de propriedade — serão resguardados, no seu próprio
interesse (= de sua propriedade) e das gerações futuras, agrupamento
que inclui, é bom lembrar, seus descendentes. A regulamentação
estatal, em questão, orienta-se pela gestão racional dos recursos
ambientais, procurando assegurar sua 'fruição futura', sem que isso
implique, necessariamente, alteração do núcleo da dominialidade"
("Desapropriação, Reserva Florestal Legal e Áreas de Preservação
Permanente", in Temas de Direito Ambiental e Urbanístico, org. por
Guilherme José Purvin de Figueiredo, São Paulo, 1998, Max Limonad,
pp. 77/78).
Nessas áreas não poderia o EMBARGADO, por força do Código
Florestal, fazer o que quer que fosse. Assim, não há porque indenizar aquilo que não se
alterou. O prejuízo inexiste.
Deve, ainda, ser aduzido que a determinação legal embasa-se na
realidade, pois a proibição visa justamente impedir desmoronamentos, assoreamentos,
enfim, que o solo se desertifique.
Assim, é necessário que se faça a exclusão do percentual estipulado
pela legislação florestal e penal mencionadas.
De acordo com o disposto no art. 5°, inciso XXIV, da Constituição
Federal, a indenização pela perda da propriedade deve ser justa, significando que a
mesma deve atingir o valor que o bem alcançaria no mercado imobiliário, se
comercializado em condições normais, proporcionando a recomposição do patrimônio do
expropriado.
Justo preço, contudo, não implica em super-valorização, o que infringiria a própria
Constituição e a legislação federal, gerando um enriquecimento ilícito, repudiado pelo
Direito. O repúdio ao enriquecimento indevido, de acordo com Sílvio Rodrigues, estriba-
se no princípio maior da eqüidade, que não permite o ganho de um em detrimento de
outro, sem uma causa que o justifique ("Direito Civil", Saraiva, 7ª ed., 2º vol, p. 173), o
que implica, também, em desrespeito ao princípio constitucional da igualdade (art. 5° da
C.F.).
A esse respeito, ensina José Carlos de Moraes Salles:
"...para que haja justeza e justiça na indenização, é preciso que se
recomponha o patrimônio do expropriado com quantia que corresponda,
exatamente, ao desfalque por ele sofrido em decorrência da
expropriação. Não se deverá atribuir ao desapropriado nem mais nem
menos do que se lhe subtraiu, porque a expropriação não deve ser
instrumento de enriquecimento nem de empobrecimento do
expropriante ou do expropriado".
"A indenização deve, portanto, ser exata, no sentido de que ao
expropriado há de se dar precisamente o equivalente ao que lhe foi
tomado pelo expropriante" ("A Desapropriação à Luz da Doutrina e da
Jurisprudência", 3ª Edição, Atualizada e Ampliada, Editora Revista dos
Tribunais, p. 460).
Como destacado já em sede de apelação, quanto ao valor da indenização, mesmo tendo
o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo se louvado parcialmente no laudo divergente
do assistente técnico da EMBARGANTE, certo é que os valores encontrados são em
muito superiores ao valor de mercado.
Ora, fica aqui evidenciada a afronta direta à Constituição da República, impondo-se por
conseqüência que seja determinada a realização de nova perícia, como fora requerido
em grau de apelação, para que, na remota hipótese de se entender que efetivamente
ocorreu o desapossamento do bem pela Administração Estadual, seja efetivada uma
avaliação correta do imóvel.

05. Juros Compensatórios Indevidos - Afronta aos termos do art. 4º, § 1°, da
Medida Provisória n. 1.703-15, de 30/7/98
É de inegável acerto o r. voto vencido quando afirma que os juros compensatórios são
indevidos, cabendo aqui nova transcrição da decisão do Colendo Superior Tribunal de
Justiça:
"Administrativo. Desapropriação indireta. Estação Ecológica. Juros
compensatórios. Não incidência.
Administrativo. Ação ordinária. Desapropriação indireta. Estação
Ecológica. Juros compensatórios. Exame probatório contrário à
incidência. Súmula 7/STJ.
O decreto expropriatório, por si só, não opera impedimento ao uso e
gozo da propriedade. Inexistência de concreta exploração econômica
anterior para ser compensada por juros compensatórios. Não são
indenizáveis hipóteses de aproveitamento. Convencimento assentado
no exame de provas, feito nos limites da soberania reservada às
instâncias ordinárias, não se expõe à via especial" (RESP n. 108.896-0 -
SP - Rel. Min. MILTON LUIZ PEREIRA - Quarta Turma. Maioria. DJ de
20/8/98).

Ademais, constituirá flagrante afronta aos termos do disposto no


artigo 4°, § 1°, da Medida Provisória n. 1.703-15, de 30/7/98, caso esse E. Tribunal de
Justiça não venha a reconhecer que os juros compensatórios, quando devidos, devem
limitar-se a 6% e não mais a 12%.

06. Redução dos Honorários Advocatícios


Diante do elevado valor da condenação, impõe-se a redução dos honorários advocatícios
para 4% (quatro por cento), com base no artigo 20, § 4°, do Código de Processo Civil,
conforme proposto pelo Exmo. Sr. Desembargador Hermes Pinotti.
Diante do exposto, aguarda a Fazenda do Estado de São Paulo que sejam conhecidos e
providos estes embargos infringentes, acolhendo-se a preliminar de carência de ação em
razão da incerteza da dominialidade, nos termos do voto vencido ou, em sendo esta
superada, sucessivamente, fixando-se a condenação em valor equivalente a 53,3% do
valor alcançado para a terra nua, face à inviabilidade econômica da exploração da
cobertura vegetal e às restrições legais impostas pelos artigos mencionados da Lei
4.771/65 - Código Florestal. Aguarda, também, a exclusão do cômputo dos juros
moratórios ou, ao menos, sua fixação nos termos do disposto no art. 4°, § 1°, da Medida
Provisória n. 1.703-15, de 30/7/98 e, finalmente, a redução dos honorários advocatícios
para 4% do valor da condenação, nos termos do art. 20, § 4°, do CPC, isto como medida
da mais lídima e cristalina
JUSTIÇA!

São Paulo, 30 de junho de 2000

Guilherme José Purvin de Figueiredo


Procurador do Estado - OAB/SP 72.591
Exmo

PROCURADORIA ADMINISTRATIVA

Exmo. Sr. Dr. Desembargador Presidente do E. Tribunal de Justiça do Estado de


São Paulo

Processo nº 56.496.5/9-02
Sala 239

A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por sua


Procuradora, nos autos em epígrafe, em que contende com DILCEU ZANATTA E
OUTROS, vem, respeitosamente, apresentar CONTRA-RAZÕES ao RECURSO
ESPECIAL, pelas razões anexas, requerendo sua juntada e regular
processamento.

Termos em que,
P. Deferimento.
São Paulo, 29 de setembro de 1998.

BEATRIZ CORRÊA NETTO CAVALCANTI


Procuradora do Estado
OAB 78.586
Exmo

Contra-razões ao recurso especial nº 56.496.5/9-02


Recte.: DILCEU ZANATTA E OUTROS
Recdo.: ESTADO DE SÃO PAULO
Tribunal de origem: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Comarca: JUQUIÁ - proc. nº 182/93 - 1º OFÍCIO

Nobres Ministros,

1. Trata-se de ação de rito ordinário objetivando indenização


em decorrência das limitações administrativas impostas pelo Decreto estadual nº
22.717, de 21.09.84, que criou a Área de Proteção Ambiental da Serra do Mar, e
pela Resolução nº 40/85, julgada improcedente pelo E. Tribunal paulista, que
negou provimento à Apelação do Estado.

Decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça com inegável acerto, isto


porque ficou evidenciado que os autores adquiriram a área posteriormente à
edição da norma estadual de criação da APA, tendo, apesar das restrições,
mantido a posse do imóvel, atestada pela presença de um caseiro (fls. 307) e pelas
plantações realizadas por terceiros (fls. 306).

Ademais, a aquisição do bem quando já existentes as


restrições naturalmente se deu com o abatimento no preço dos ônus suportados
pelo imóvel. O pagamento de indenização pelo valor total do imóvel não é
compatível com o nível de limitações que atingem o imóvel em tela, cuja utilização
é ainda possível, não se cuidando de hipótese de aniquilamento do direito de
propriedade.
Exmo

2.NO MÉRITO

Quanto ao mérito, digno notar que os recorrentes


encontram-se na posse regular de todo o imóvel, não tendo o Estado praticado
qualquer ato de ocupação.

O Decreto estadual nº 22.717/84, que criou a APA da Serra


do Mar, não importou em supressão das prerrogativas de uso e gozo do imóvel,
tampouco o fazendo o tombamento instituído pela Resolução nº 40/85.

Referidas normas estaduais não determinaram a


incorporação da área sub judice ao patrimônio do Estado, nem a afetaram a uma
finalidade pública, de modo a se caracterizar apossamento administrativo.

A criação da APA da Serra do Mar não provocou o


esvaziamento do direito de propriedade, tanto assim que declarou o v. aresto
recorrido:

“De notar que tanto o Estado não interferiu


na posse e propriedade dos apelantes que esses ainda mantêm
ali um caseiro (f. 307) e terceiros puderam fazer plantações (f.
306).”

O Estado não promoveu qualquer ato de ocupação do bem ,


o que implica em se ter por infundado o pedido de indenização do imóvel, que
remanesce intocado em poder dos autores.

Como é curial, não se indenizam danos hipotéticos, mas


prejuízos efetivos. Nas palavras do DES. SCARANCE FERNANDES, em caso
análogo (Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível nº 18.166.5/5-02, em
que eram partes Fazenda do Estado e Sérgio Lessa da Fonseca), ficou decidido
que:

“ Alguém que compre um veículo batido,


pagando por ele preço de sucata, não tem o direito a pleitear
indenização pela desvalorização do veículo, salvo se esse direito
foi objeto do negócio. E não o tem simplesmente porque não
pagou pelo valor total do veículo, não adquiriu esse direito à
Exmo

indenização e, portanto, não pode beneficiar-se por um valor não


incluso na transação, mesmo porque não sofreu prejuízo.”

..........
“Em suma: não houve apossamento
administrativo e a propriedade pode ser explorada para fins
diversos, respeitadas as limitações que existem desde o Código
Florestal, portanto, anteriormente à aquisição do imóvel pelos
autores. Tanto é verdade que os autores mantiveram lá uma
plantação de cacau, iniciada após os decretos mencionados na
inicial.

Em conseqüência, não houve nenhum


prejuízo pelos autores. O preço que pagaram pela propriedade
podem obter por ela, a qualquer momento no mercado,
evidentemente, pelo preço de mercado. E os prejuízos que
tiveram com a plantação de cacau devem-se ao risco do negócio.
Quando adquiriram a propriedade já estavam em vigência os
Decretos impugnados. Portanto, já havia, como dito, todas as
restrições hoje existentes. Se assim é, evidentemente não
sofreram prejuízo algum.”

Sobre as restrições trazidas pelo tombamento instituído pela


Resolução nº 40/85, pede-se vênia para citar o seguinte julgado:

“Trata-se de pedido de indenização em


razão de apossamento administrativo, de uma área do Município
de Cubatão abrangida pela Resolução nº 40, de 06.06.85, da
Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo - CONDEPHAAT,
referente ao Tombamento da Serra do Mar.
O teor da Resolução nº 40/85 revela
diretrizes que visam conciliar esforços integrados para a
preservação da área tombada, sem ruptura total com formas
adequadas de uso do solo em atividades preexistentes, e
previstas no seu plano de manejo, como descreve o seu artigo 9º,
em dezesseis itens.
Estão previstas a manutenção de
instalações e as propriedades particulares preexistentes, com
Exmo

suas funções originais, respeitada a cobertura vegetal


remanescente.
Os projetos de reforma, demolição,
construção e mudanças de uso, e futuras cessões de área em
comodato serão submetidos à aprovação do Condephaat..
As áreas de lazer, educação ambiental e
pesquisas terão continuidade em suas funções originais.
Nos itens referidos, a Resolução determina
medidas de preservação da área, e a venda de propriedades
independe de autorização do Condephaat (item nº 15 do artigo
9º). Assim, em rigor, não houve qualquer
efeito sobre o direito dominial, e o imóvel pode ser usado com as
restrições que, ademais, já constam do Código
Florestal.”
( Embargos Infringentes nº 34.570-5/4-
01, Embte.: FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO; Embda.:
UNIPAR COML. E DISTRIBUIDORA S/A, 9ª Câmara Janeiro/97,
por maioria de votos, Relator DES. WALTER
THEODÓSIO)

Ademais, a área foi adquirida pelos autores após a edição


das restrições estaduais. Oportuna, por isso, a citação de acórdão proferido em
Embargos Infringentes, em desapropriação indireta referente ao Parque Estadual
da Serra do Mar, que bem aprecia a questão da existência de restrições legais
anteriores do Código Florestal:

“ Enfim, não demonstraram


os embargantes concretamente que a criação do Parque
Estadual da Serra do Mar e mesmo o tombamento da região em
causa trouxeram entraves insuperáveis à imediata exploração
econômica de seu prédio rústico, de forma que fatos
juridicamente relevantes justificassem a intervenção do Judiciário,
até porque está preservada a posse dos proprietários. E, como
bem assinalado no V. Acórdão atacado, se restrição ao direito de
propriedade está a haver, o primeiro questionamento a se fazer é
quanto ao Código Florestal, de maneira que, se algum ente
político tiver que indenizar, certamente primeiro será a
União.
..........”
Exmo

( Embargos Infringentes nº 236.817-2/4-01 , TJSP Embte.:


Pedro Vergara; Embdo.: FESP, Relator DES. SILVA FILHO,
rejeitados os embargos, maioria de votos, julgamento em
25.03.96, grifo nosso)

Cite-se, ainda, julgado proferido pelo E. Tribunal paulista na


Apelação Cível nº 255.650-2/9, envolvendo área também localizada na Serra do
Mar:

“...
Não defiro, pois, qualquer indenização aos
Autores porque: a) nunca mantiveram na área qualquer atividade
econômica, nem demonstraram que pretenderam fazê-lo antes,
ou que tivessem condições para tanto; b) tinham e continuam
tendo a posse da área, sofrendo apenas limitações
administrativas que já existiam ao tempo do Código Florestal, de
acordo com a função social do imóvel.”

( Apelantes e reciprocamente apelados:


FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO E FRANCISCO
MUNHOZ, Relator o DES. PINHEIRO FRANCO, julgamento em
05.04.95, v. u., Comarca de Ubatuba)

A obrigação de indenizar só cabe se provado o dano. E os


autores não lograram provar o prejuízo efetivamente sofrido. Ora, se o Estado não
ocupa a área, se os autores até já desenvolveram atividades agrícolas no local
após as restrições -- pois a aquisição é posterior – em que consistiria o dano
indenizável? Não se pode compelir o Estado a indenizar se nenhum dano causou
aos autores.

Verifica-se, pois, inexistir sustentação jurídica para a


pretensão veiculada no recurso especial, que importaria, em última análise, em
reexame da prova pericial realizada, o que é vedado nesta sede, nos termos da
Súmula 7. Ressalte-se, ainda, que de acordo com a lei processual, é livre o
convencimento do juiz, desde que fundamente suas decisões. Torna-se, portanto,
soberana, a r. decisão atacada ao julgar o feito segundo as provas produzidas,
tanto que declinou inclusive as folhas onde encontrou elementos de fato para
chegar à conclusão fundamental de que inocorreu apossamento administrativo.
Exmo

Tudo isto, agora, não pode ser revisto em face da Súmula 7.

Sendo a aquisição da área posterior à edição do decreto


estadual de criação da APA da Serra do Mar, argumenta-se que o adquirente se
sub-roga em todos os direitos e obrigações do bem. Entretanto, a questão que se
põe é a de terem sido ou não objeto da transação os direitos indenizatórios
decorrentes das limitações administrativas, fato que aqui não restou comprovado.

Ademais, não comprovada a ocupação estatal, constatando


o próprio v. aresto recorrido que o proprietário pode utilizar-se do imóvel, não se
verifica a hipótese de desapropriação indireta, razão pela qual, caso conhecido o
recurso, impõe-se seja negado provimento.

3. DA PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL AO MEIO


AMBIENTE E DA FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

As limitações impostas pelo Estado de São Paulo coincidem


com a preocupação de proteção à natureza revelada pelos constituintes de 1988,
que estabeleceram, no art. 225, caput e parágrafo 4º, o dever de respeito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado, e erigiram a Mata Atlântica à condição de
Patrimônio Nacional, do qual é parte a Serra do Mar.

Por outro lado, as imposições administrativas são


autorizadas pela mesma Carta em seus arts. 5º, inciso XXIII e 186, que
prescrevem que a propriedade deve atender a sua função social, especialmente
a de preservação do meio ambiente. Estes os fundamentos das restrições
impostas pela recorrida, os quais, aliados ao princípio da justa indenização,
merecem subsistir.

4. DO NÃO CABIMENTO DO RECURSO PELA ALÍNEA C -


DIVERGÊNCIA NÃO DEMONSTRADA

Há que se atentar não terem os autores transcrito os trechos do


acórdão recorrido que configuram o dissídio com os paradigmas.

De fato, não há qualquer citação de trechos da r. decisão


atacada, como também não foram demonstradas de forma analítica as
circunstâncias identificadoras dos casos confrontados, restando, assim,
Exmo

desatendido o disposto no art. 255, parágrafo 2º do RISTJ.

Diversos acórdãos trazidos como paradigmas tratam de outras


questões correlatas (indenizabilidade das matas, apossamento administrativo) mas
não da alegada afronta ao direito de propriedade, de que trata o art. 524 do CC.
Foram utilizados, ainda, como termo de comparação decisões proferidas em ações
baseadas no decreto de criação do Parque Estadual da Serra do Mar, que não
podem ser confrontadas com o caso em apreço, que se refere a outra natureza de
limitações - criação da APA da Serra do Mar e tombamento - que importaram em
graus de restrição muito menores.

Ademais, a prova pericial é que determinou a conclusão de que


não houve apossamento administrativo, de tal sorte que a questão não pode ser
analisada por este C. STJ por meio de demonstração de divergência, por se tratar
de matéria de fato.

Necessário seria que os recorrentes trouxessem à baila


caso em que as provas também indicassem a ausência de ocupação estatal, a
prova do prejuízo e a aquisição posterior às restrições federais e do decreto
estadual de criação da APA, pois tais questões é que embasaram o v. aresto
recorrido.

Certo é que a decisão atacada assentou em fundamentos da


prova, não havendo como rever, em recurso especial, os elementos que formaram
a livre convicção da Turma julgadora. Ademais, se não trazido paradigma com as
mesmas circunstâncias deste feito, não há prova do dissídio, ainda que se cuide
igualmente de ação pelos efeitos decorrentes da criação da APA da Serra do Mar.

Conclui-se, portanto, restar não demonstrado o dissídio na


forma exposta pela recorrente, impondo-se seja negado provimento ao presente
recurso também pela alínea c.

5. REQUERIMENTO

Por todo o exposto, aguarda a Fazenda Estadual seja negado


seguimento ao recurso especial, dada a impossibilidade de admissão em face do
que dispõe a Súmula 7, e pela não demonstração do dissídio. Caso seja
adentrado o mérito, requer seja negado provimento ao recurso, pelas razões acima
expostas.
Exmo

JUSTIÇA!
São Paulo, 29 de setembro de 1998.

BEATRIZ CORRÊA NETTO CAVALCANTI


Procuradora do Estado
OAB 78.586

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