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CHUPÁ:

DA CABEÇA AO
CORAÇÃO
DA OBRA DE GILA MANOLSON
Agradecimentos
Capa: Sara Lipceac
Tradução: Esther Chaya Levenstein
Diagramação: Rinat S. Azulay
Consultoria geral: R. Daniel Sztejnhauer
Revisão Final: Sibeli M. Zeitoune

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

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forma ou por qualquer meio, seja eletrônico, mecânico, fotocópia,
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Shaarei Biná Brasil.
ÍNDICE
Prefácio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
Apresentação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13

PARTE 1 - MONTANDO O PALCO


Capítulo 1: Um novo sentido para o namoro . . . . . . . . . . . .17

PARTE 2 - ESTAR PRONTO


Capítulo 2: Fazendo você mesmo crescer. . . . . . . . . . . . . . .33
Capítulo 3: Por trás do “frio na barriga” . . . . . . . . . . . . . . . 49

PARTE 3 - AMOR
Capítulo 4: Amor e Casamento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
Capítulo 5: Afirmação da Feminilidade . . . . . . . . . . . . . . . .75

PARTE 4 - SER PRÁTICO


Capítulo 6: “Lidando com sua cabeça”. . . . . . . . . . . . . . . . .93
Capítulo 7: Fique longe de abuso . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111

PARTE 5 - ESTAR INFORMADO


Capítulo 8: Dinheiro e sentimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
Capítulo 9: Uma pitada de prevenção . . . . . . . . . . . . . . . . 133
PREFÁCIO

O casamento, que atualmente é considerado uma instituição


falida no mundo, continua sendo um dos alicerces do povo
judeu. É um assunto central e único, que nos possibilita
atingir o grau máximo do nosso potencial espiritual. Foi com o objetivo
de mostrar este enfoque, em especial ao público jovem, que está na
fase de escolher a pessoa com quem vai passar o resto de suas vidas,
que decidimos investir no projeto de trazer para o público brasileiro
a fantástica didática da Sra. Gila Manolson, na qual ela explica, de
modo atual e inteligente, o conceito de shiduch - a forma judaica de
relacionamento entre o homem e a mulher, antes do casamento.
O que caracteriza o shiduch é a abstenção do contato físico antes do
casamento – o que, nos dias de hoje, parece uma ideia incompreensível,
diante da nossa época de liberação e banalização dos relacionamentos
íntimos –, será incrivelmente esclarecido nas páginas desse livro como
a forma mais eficaz para escolher o parceiro de uma vida inteira. Pode
parecer estranho, mas esse modelo de vida judaico, certamente, irá
inspirar pessoas de diversas crenças.
O livro vem também vem desmitificar a “ilusão hollywoodiana”,
com seu famoso “E viveram felizes para sempre” – que é normalmente
onde o filme acaba, mas onde o enredo real começa, cheio de testes e
dificuldades, que são parte natural da vida e do casamento.
Temos a sincera expectativa de termos contribuído para que você
aprenda sobre este modo de vida aparentemente utópico, mas que
há séculos é o que mantém os casamentos judaicos – os quais têm
o índice de divórcios infinitamente menor do que as estatísticas do
mundo secular.

A Equipe da Shaarei Biná Brasil

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APRESENTAÇÃO

A s pessoas sempre me perguntam: “O que a levou a escrever?”.


A resposta é simples: frustração. Sempre que tenho algo a
dizer, que talvez possa ajudar os outros a levarem uma vida
melhor, eu me sinto frustrada por não poder contar isso para todo
mundo. Daí, acabo escrevendo um livro.
“Como Encontrar sua Metade” (Head to Heart) dá conselhos
práticos e filosóficos para quem está se preparando para um shiduch
(encontro entre um homem e uma mulher, sem contato físico, com
o objetivo de analisar suas compatibilidades, visando o casamento) e
para a chupá (casamento judaico). Não se trata de um guia lógico. Já
há outros livros excelentes sobre este assunto e acho, sinceramente,
que você deveria procurar lê-los (informe-se sobre eles na livraria
judaica mais próxima ou peça dicas a alguém em quem você confie,
em relação a esse assunto). O objetivo deste livro é trazer algumas
questões à luz da discussão.
Esta obra pretende abordar o relacionamento a dois, por meio da
análise de alguns aspectos importantes, muitas vezes esquecidos pelos
futuros casais.
“Como Encontrar sua Metade” se parece, em muitos e importantes
aspectos, com meus livros anteriores, como “The Magic Touch” e “Além
do Espelho – Um enfoque atual sobre Tsiniut” (“Outside/Inside”, Ed.
Sefer, 2002), que pretendem falar a você leitor (a), não importando se
nasceu em um lar religioso, se é um baal teshuvá (alguém que se tornou
religioso) ou se ainda está dando os primeiros passos no Judaísmo – e
ao abordar um lado tão realista da vida, é preciso fazê-lo de modo “pé
no chão”, de acordo com o senso comum. Embora boa parte do que
eu diga seja direcionada especificamente ao público judeu, uma outra
grande parte – baseada em conhecimento prático e princípios aceitos
da psicologia – não o é. Ao mesmo tempo, todo o material presente
está de acordo com a filosofia da Torá.

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Este livro também difere de minhas outras obras. Em primeiro
lugar, enquanto “The Magic Touch” e “Além do Espelho” tratavam,
cada qual, de um tema único (abster-se de contato físico antes do
casamento e a necessidade de se autodefinir, de acordo com o seu
“eu” interior, respectivamente), “Como Encontrar sua Metade” aborda
uma variedade de temas co-relacionados. A Parte 1 analisa o objetivo
do shiduch; a Parte 2 foca no crescimento pessoal; a Parte 3 apresenta
reflexões sobre amor, casamento e o papel da mulher judia nos dias
de hoje; a Parte 4 discute assuntos práticos, ligados ao shiduch, e a
Parte 5 levanta questões haláchicas (ligadas às leis judaicas), relevantes
à vida de casado. E, enquanto alguns capítulos podem despertar
mais interesse do que outros, acredito que todos são essenciais. Em
segundo lugar, também apresento tópicos revisados por Rabinos,
educadores, terapeutas e aqueles que atuam nas cortes rabínicas (beit
din). Capítulos com halachot (leis judaicas) foram também revisados
por dois poskim (autoridades legisladoras judaicas), cujas cartas de
aprovação constam no início deste livro.
Meu objetivo, entretanto, é o mesmo de sempre: o de trazer mais
sabedoria judaica à sua vida. Não importa quem você seja ou qual a
sua trajetória até aqui. Espero que este livro o ajude a encontrar um
relacionamento pleno e duradouro, revelando o que você deve saber
antes do shiduch e da chupá.

AGRADECIMENTOS
A Hashem, que mais uma vez me abençoou com a oportunidade de
escrever um livro e eu sou, sem dúvida, agradecida a todas as outras
pessoas que me ajudaram nesta empreitada:
Primeiramente, RavYitzchak Berkowitz, shlit”a, cuja sensibilidade,
conhecimento haláchico e direcionamento da hashkafá (visão de Torá)
inspiraram este projeto.
Rabino Zev Leff, shlit”a, por sua contínua força moral e apoio
prático.
Batya Friedman, uma amiga devotada e crítica brilhante, sem a
qual e sem seu constante apoio, incentivo e sua profunda percepção,
sempre em sintonia comigo, não teria conseguido escrever este livro.
Debra Kershner, M.A., uma pessoa e uma profissional altamente
capacitada, por suas sábias observações e generosa ajuda.

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Marina Goodman, autora do livro “Why should I have to Stand Behind
The Mechitzah If I Could Be A Prayer Leader?”, uma incrível mina de ouro
de observações astutas e sugestões precisas.
Rebetzin Tziporah Heller, que escreveu “More Precious Than Pearls:
Selected Insights into the Qualities of the Ideal Woman”, por tudo o que eu
aprendi a apreciar sobre a feminilidade judaica e por sua revisão sagaz
do meu manuscrito. Outra professora extraordinária, por meio da
qual compreendi o porquê de as mulheres estarem mudando sempre.
Todos os outros que, generosamente, contribuíram com seus
conhecimentos, incluindo Miriam Adahan, Ph.D. e autora de uma série
de vários volumes, chamada “O Manual de Miriam Adahan” (Editora
Colel, 1996), nos quais aborda diversos temas, como educação,
comportamento, vida a dois etc. Rabino Michael Broyde, juiz no
Beit Din da América e professor de direito na Emory University; a
shadchanit (casamenteira) Heather Cirota; Rosie Einhorn, assistente
social e coautora de “Talking Tachlis: A Single’s Strategy for Marriage”;
Rebetzin Lea Feldman; as pesquisadoras Lynn Finson e Rachel Frumin;
Debby Gross, diretora do Crisis Center for Religious Women, em
Jerusalém; Rachel Levmore, advogada da corte rabínica; a assistente
social Shaya Ostrov, autora do livro “The Inner Circle: Seven Gates to
Marriage”; a Ph.D Miriam Reinfeld; Sarah Schneider, autora do livro
“Kabbalistic Writings on the Nature of Masculine and Feminine”; as Ph.D’s
Phyllis Strauss e Deborah Tobin, que atuam no Programa Educacional
de Prevenção do Shalom Task Force, em Nova York.
Dois fantásticos educadores, aos quais sou imensamente grata:
Rabino Dr. Natan T. Lopes Cardozo e Dr. Michael Kaufman, autor do
livro “Love, Marriage, and Family in Jewish Law and Tradition”.
Todas as outras pessoas especiais, que ofereceram ajuda e/ou
retorno sobre esta obra, incluindo Shaina Buchwald, Miriam Ciner,
Israel Ellen, Elana Epstein (nossa incomparável bat bayit), Dena
Estrin, Leat Galimidi, Marina Gelfand, Chana Levitan, Tova Saul,
Leah Schachter, David Teten e Moshe Zeldman; e os agradecimentos
especiais a Tamar Bezalely, Stuart Green, Leon Aaron Kenin e Brett
Weil.
Aos diversos escritores (além daqueles citados no texto), cujos
livros tiveram forte influência em minhas ideias, incluindo Reuven P.
Bulka, autor de “Jewish Marriage: A Halakhic Ethic”; Aharon Feldman,
que escreveu “O Rio, a Chaleira e o Pássaro: ” (Colel Torá Temimá do
Brasil, 1994); Manis Friedman, autor de “Será que ninguém mais se

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envergonha?” (Ed. Maayanot, 1990); Lawrence Kelemen, autor de “To
Kindle a Soul Ancient Wisdom For Modern Parents and Teachers”; Maurice
Lamm, autor de “The Jewish Way in Love & Marriage”, e Wendy Shalit,
que escreveu “A Return to Modesty: Discovering the Lost Virtue” e também
me ajudou na revisão dos meus manuscritos.
Meus amados, profundamente amados, filhos Chananya, Elyashiv,
Yair, Temima, Emuna, Ayelet e Yisrael, pela paciência e tolerância
durante o tempo em que estive escrevendo este livro.
E, finalmente, a Avraham, minha alma-gêmea em tudo.

Gila Manolson

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INTRODUÇÃO
C asamento sempre implica surpresas. Algumas podem ser
deliciosas; outras, nem tanto. Este livro foi escrito para
ajudá-lo a sentir mais satisfação e menos decepção. Falando
mais claramente, seu objetivo é auxiliá-lo a entrar em um casamento
com a melhor chance de satisfazer suas esperanças e expectativas,
trazendo-lhe a maior felicidade possível.
Viver no século 21 implica uma série de situações a serem
enfrentadas. Cada vez mais, as relações não estão funcionando como
deveriam. Muitas pessoas "se apaixonam" e se casam sem a menor
ideia realista sobre o que são o amor e o casamento. Outros, levados
pelos impulsos do coração, embarcam em relacionamentos difíceis, às
vezes com parceiros violentos, e nem sequer se dão conta do porquê
de estarem imersos nesta situação. O resultado? Cada vez mais casais
divorciando-se do que permanecendo juntos. Quando me tornei
uma judia observante (ortodoxa), aos 22 anos, senti que havia sido
resgatada de um mar de loucura e, finalmente, tinha me assentado em
uma ilha de sanidade. Com o tempo, porém, percebi que os problemas
que assolam a sociedade em geral também afetam o mundo judaico,
que, por sua vez, está às voltas com seus próprios dilemas, como as
dificuldades no processo de guet (divórcio) e a questão do feminismo.
Felizmente, você pode evitar a maioria desses problemas se estiver
preparada (o) para um shiduch ou casamento, como faria se almejasse
um cargo em uma grande empresa. Primeiramente, você precisa
cursar uma universidade de ponta, obter altas notas na graduação e na
pós-graduação, além de se sair muito bem na entrevista de emprego.
Tudo isso requer muito tempo e esforço, certo? Mas e quando o
assunto é shiduch e casamento, cujo sucesso irá contribuir mais para
sua felicidade do que qualquer outra coisa? Eles também exigem

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preparo e dedicação. E o tempo para começar essa preparação não é
apenas quando faltarem três meses para o casamento (ou depois que
se passarem três meses da chupá), mas agora. A passagem do estado de
solteiro para o de casado não deve ser feita de maneira leviana. Essa
transição deve ser inteligente, com muita reflexão, aprendizado e,
sobretudo, crescimento. Se você optar por adquirir a sabedoria e fizer
sua parte, empenhando-se, poderá experimentar um longo, profundo
e gratificante relacionamento.
Este livro irá ajudá-lo a chegar lá.
Nota: Todas as histórias escritas a seguir são verdadeiras ou
baseadas em fatos e pessoas reais. Apenas os nomes foram alterados.

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PARTE 1
MONTANDO O PALCO
“Sair” significa coisas diferentes para pessoas
diferentes. Capítulo 1, “Um novo sentido
para o namoro”, aborda a questão que precede
todas as outras: o objetivo do “namoro”.

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CAPÍTULO 1
UM NOVO SENTIDO PARA O NAMORO

N amorar ocupa o centro emocional da vida da maioria das


pessoas solteiras. Se você está interessado em alguém
(ou espera estar), talvez ainda consiga se concentrar
no estudo ou no trabalho, mas, provavelmente, a coisa que mais
passa pela sua mente é: quando irei vê-lo (a) de novo? Agora,
proponho que você olhe para o namoro sob um novo ângulo,
e da forma mais honesta possível, porque quero questionar um
pouco alguns pontos do senso comum, que cercam este assunto.
As pessoas namoram por muitas razões. Quando pergunto a
adolescentes ou a outros solteiros, que ainda não estão pensando
em casamento, por que, afinal, namoram e qual o objetivo desses
encontros, eles costumam responder:
"Diversão".
"É pela atração física".
"Hormônios".
"Todo mundo faz isso."
"Ora, você não tem que ficar sozinho."
Quando pergunto por que eles acham que os outros namoram,
arriscam alguns palpites:

Um novo sentido para o namoro  17


"Status".
"Segurança".
"Ego".
E quando pergunto a algumas pessoas mais sensíveis o porquê de
elas namorarem, me respondem: "Para ter alguém por perto e com
quem compartilhar".
Eu poderia passar páginas e mais páginas analisando essas
respostas, mas, na minha opinião, nenhuma delas é uma boa razão
para namorar. Quando você namora, permite que alguém desenvolva
sentimentos fortes por você, e isso não é justo para com a outra
pessoa, principalmente se você está interessado em algo que não seja
um relacionamento sincero. E se, por um lado, o namoro pode fazer
você se sentir acolhido e querido, por outro, não vai, a longo prazo,
curá-lo da solidão ou da insegurança. Também não irá satisfazer o seu
desejo (consciente ou inconsciente) pela aproximação genuína, aquela
de alma para alma.
No entanto, há um argumento mais convincente para o namoro:
"Namorar muitas pessoas aumenta o seu desenvolvimento pessoal,
ensina as habilidades de relacionamento, ajuda a entender o sexo oposto
e revela suas necessidades. É a maneira mais eficaz de se aprender
como escolher a pessoa certa e... fazer o casamento funcionar”.
Em outras palavras, o namoro é um ensaio para a coisa real. Os pais
que apoiam essa ideia, muitas vezes desencorajam os adolescentes a
relacionamentos de longo prazo, por medo de frear seu crescimento
emocional e também preocupados com o risco de o filho se casar com
a primeira namorada. Seguindo esta mesma linha de raciocínio, de que
o namoro prepara para o casamento, sem estarem envolvidos em uma
experiência de namoro a longo prazo, como poderiam estar prontos?
Dilemas à parte, chegamos à conclusão, então, de que o namoro é
a preparação para o casamento. De todas as razões para se envolver em
relacionamentos, esta parece ser a mais inteligente. Mas será que é?

DESAFIANDO O PRINCÍPIO DA EXPERIÊNCIA


Uma experiência maior com namoros leva a um casamento melhor?
Vamos observar nosso mundo. A maioria das pessoas está
procurando atingir uma quantidade impressionante de experiências

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de relacionamento, começando cada vez mais cedo a namorar, o que
envolve vários parceiros e um considerável contato físico. Assim,
deveríamos ser extremamente sábios, pessoalmente desenvolvidos e
desfrutar a felicidade conjugal. No entanto, de acordo com um relatório,
de 1995, do Conselho de Famílias da América1, a probabilidade de um
casal recém-casado acabar divorciado é de 60%. Se adicionarmos a
este percentual o número daqueles que permanecem casados, apesar
da infelicidade mútua, o casamento moderno surge como uma enorme
falha. Concluindo: toda essa experiência de namoro, aparentemente,
não está valendo a pena.
Alguns argumentam, é claro, que o casamento sempre esteve
fadado à falência. Enquanto ele servir a um propósito social, talvez
simplesmente não possa suprir a necessidade do ser humano de
amor e felicidade duradoura, e está se desintegrando só agora
porque o divórcio tornou-se mais aceitável (e, para as mulheres,
economicamente mais viável). Já ouvi pessoas dizendo: “Nem pensar
que é para sempre" ou "Entre em uma relação, qualquer que seja ela,
e espere até que ela acabe." Em outras palavras, devemos parar de
fantasiar e ser mais realistas.
No entanto, nós, os judeus, acreditamos em casamento. Sabemos
que, com bastante trabalho, duas pessoas podem desfrutar de amor, ao
longo de uma vida profundamente satisfatória. Também suspeito que,
em seus corações, mesmo os cínicos mais desiludidos não perderam a
esperança na relação. Apenas não acreditamos que a experiência com
o acúmulo de namoros seja o caminho para se chegar lá.
Ainda assim, como o "namoro experimental" tornou-se tão
popular?
Desde o início da história moderna, até meados do século retrasado,
os aspectos práticos do casamento não sofreram grandes mutações de
geração a geração. Costumes sociais e sexuais, os papéis de gênero e
as expectativas conjugais mudaram gradualmente, se tanto. Mas, aí
vieram os anos 60. Da noite para o dia, os jovens redefiniram sua
masculinidade, feminilidade e os relacionamentos. Assim, o casamento
foi colocado na lista de espera e o mundo comemorou sua nova liberdade
sexual. Em dez anos, a ordem social foi completamente transformada.
Quando eu e meus amigos atingimos a maioridade, a sociedade ainda
estava sentindo os tremores deste terremoto transformador – e as

1 “Marriage in America: A Report to the Nation, 1995”, disponível no Institute for


American Values, 1841 Broadway, Suite 211, Nova York, NY 10023

Um novo sentido para o namoro  19


pessoas sentiram que tudo o que dissesse respeito ao relacionamento
entre homens e mulheres tinha mudado, inclusive o amor. Nossos pais
passaram a nos dar muitos conselhos sobre qual faculdade cursar, que
profissão escolher, mas não sabiam mais nada sobre relacionamentos.
A mensagem que muitos de nós tivemos foi: "Olha, nós sabemos o
que faz nosso casamento funcionar. Mas o mundo tornou-se um lugar
diferente agora. Então, vá buscar experiência, descobrir as coisas. E
boa sorte...".
Assim, minha geração passou a sair e acumular experiências. E os
resultados foram catastróficos. E o pior: a maioria dos jovens de hoje
ainda está seguindo pelo mesmo caminho.
Não me interprete mal. Certamente é possível aprender com o
namoro, mas não necessariamente a como ter sucesso no casamento.
Logo depois de um rompimento, você pode refletir e saber onde você
precisa crescer, ou apenas onde o seu ex precisa. Você pode descobrir
por que continua a atrair as pessoas erradas, ou por que o sexo oposto
não pode ser confiável. Você pode aprender como conseguir amor, ou
que se trata de um sonho impossível.
Há alguns anos, falei com uma solteira convicta, cujo coração
estava endurecido, devido a uma coletânea de relacionamentos
fracassados​​. Ela olhou nos meus olhos e me disse, categoricamente: “A
experiência me ensinou a parar de esperar. Aprendi a me tornar tão
independente, que eu não me importo se não há um homem na minha
vida". No entanto, o que ela tinha "aprendido" só a deixou menos
pronta para encontrar o amor que, debaixo da dor de sua negação, ela
ainda desejava. O namoro pode ser educativo, mas a educação nem
sempre é sábia.
Ao mesmo tem p o, qualquer sabedoria que você adquira vai se
mostrar tota l mente irrelevante a partir do momento em que você
se casar. O casamento é completamente diferente até de um namoro
duradouro ma i s comprometido (também é totalmente diferente
de viver junto, o que para a maioria das pessoas é apenas "brincar
de casinha"). Para obrigar dois "Eu’s" a se submeterem a um não-
negociável " n ós", o casamento requer muita autotransformação.
Além disso, a ntes que as coisas estejam assinadas e seladas, você
só vai revel a r a melhor parte do seu comportamento, mesmo que
inconscientemente. A partir do momento em que o relacionamento é
“pra valer”, o verdadeiro “Eu” surge.
Conheço um casal que namorou um longo tempo antes de se casar.

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Numa manhã de domingo, pouco depois de seu casamento, o marido
anunciou que estava indo para o escritório.
"Desde quando você trabalha aos domingos?", sua esposa
perguntou, surpresa.
"Eu não tinha de ir, mas estou começando agora."
"E nosso brunch de domingo?"
"Eu sei, querida, mas chegou a hora de tentar uma promoção, e
essa é a maneira de consegui-la."
"Mas você sempre me pareceu relaxado sobre seu trabalho e sobre
o dinheiro."
"Bem, se eu quiser vencer, isso terá de mudar."
Este pequeno episódio ilustra como coisas imprevisíveis podem
surgir no casamento. Uma mulher única de espírito independente
pode, como esposa, passar a querer muito tempo junto com seu
cônjuge. Um noivo apaixonado pode, quando se tornar marido, de
repente precisar "fazer suas próprias coisas." Workaholics (viciados
em trabalho) saem do armário. E, muitas vezes, o casamento expõe
expectativas de papéis mais tradicionais, que jamais viriam à tona
durante o namoro. Tudo isso significa que, enquanto um casal de
namorados pôde conhecer as "regras" do seu relacionamento, o
casamento é um jogo totalmente novo. E aqui é onde a experiência
antes do casamento poderia se tornar uma realidade. Mas se aprender
um novo esporte é algo difícil, pior ainda quando se achava que já se
sabia como jogar. O desapontamento e o desânimo resultantes podem
até arruinar o casamento. Não é nenhuma surpresa, então, que, de
acordo com estudos feitos pelo Dr. David Myersm, em “The Pursuit
of Happiness”, casais que vivem juntos antes do casamento são muito
mais propensos a se divorciar do que aqueles que não passaram por
essa experiência.
Em suma, o namoro pode ensiná-lo a namorar, mas não vai ensiná-
lo a se casar e a ilusão de que ele pode fazer isso é extremamente
prejudicial. O casamento deve ser abordado com uma mente aberta e
com o menor preconceito possível. Trata-se de uma experiência nova.
Então, como você pode acumular a sabedoria e o crescimento
necessários para um casamento bem-sucedido? A resposta é simples:
embora muitos aspectos práticos do casamento (como quem é o
cozinheiro e quem é o chefe de família) possam ter mudado ao longo

Um novo sentido para o namoro  21


dos anos, o que faz o amor durar não mudou. Cada geração não precisa
reinventar a roda novamente. As oportunidades de aprendizagem que
precisamos sempre estiveram lá e ainda estão sem que, para ter acesso
a elas, seja preciso namorar.
Vamos olhar brevemente sobre o que um bom casamento requer.
Para começar, cada parceiro deve possuir uma personalidade adulta
e razoavelmente saudável. Esse ativo inclui maturidade, autonomia,
autoestima, confiança, capacidade para a intimidade emocional
e autoconhecimento (que serão discutidos no Capítulo 2). Essas
características não precisam ser adquiridas no namoro. Elas devem
ser adquiridas na vida. O namoro nos distrai de dar atenção ao
desenvolvimento desses requisitos. Perguntas como:
"Será que eu estou em forma?”;
"Estou causando uma boa impressão?";
"Será que ela vai querer sair comigo de novo?";
"Será que isso vai até onde minhas expectativas estão?"
"Será que ele vai querer ficar comigo?"
não deixam muito tempo e energia para que você possa ponderar
se está realmente desenvolvendo as qualidades necessárias para um
casamento bem-sucedido. Consequentemente, não há nenhuma razão
para acreditar que você vai ganhar a maturidade ou o autoconhecimento
de que precisa. É ainda menos provável que você se torne capaz de
ter verdadeira intimidade com alguém, já que a intimidade depende,
em grande parte, de confiança e os rompimentos (parte inevitável
do namoro) vão corroer essa confiança (tanto em si próprio como
no outro). A dependência emocional que o namoro muitas vezes
promove não vai ajudá-lo a alcançar a autonomia. E a autoestima, a
chave de tudo (incluindo a verdadeira intimidade), está mais apta a
sofrer do que prosperar nas relações transitórias onde, raramente,
somos apreciados por quem realmente somos.
Lembro-me de como muitos dos meus colegas da escola se
transformaram assim que começaram a ficar com outras pessoas.
Apesar de tudo o que tinham em si, sua popularidade dependia de sua
capacidade na hora de atrair o sexo oposto. Quanto maior o sucesso,
maior era a perda de si mesmo. E uma vez que você está viciado em
aprovação (particularmente deste tipo), pode ser difícil sair deste
tipo de comportamento. No entanto, uma relação satisfatoriamente

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madura exige autoestima, com base no que você é por dentro, não por
fora. A aprovação não vem dos outros, mas de si mesmo.
Parceiros em um bom casamento devem entender também o que
são o amor e o casamento (vide Capítulo 4). Apesar das mudanças
trazidas pelo movimento feminista e da revolução sexual, o amor e
o casamento não se tornaram algo inteiramente novo. Sua essência é
eterna, o que significa que eles não precisam ser descobertos da maneira
mais difícil. E o Judaísmo é o melhor professor; relacionamentos estão
entre os piores mestres. Namorar, raramente, envolve o verdadeiro
amor (não importa o que nós possamos pensar à época) e é, portanto,
muito melhor em nos ensinar o que o amor não é do que o que ele
é. E, como vimos, o potencial de casamento é improvável de se
materializar a partir de um relacionamento que não seja o casamento.
Um casamento bem-sucedido também requer uma compreensão
das diferenças de gênero. Muitas vezes, as pessoas acham que
vão adquirir essa percepção também no namoro. No entanto, os
namoradores veteranos, quando mais tarde vierem a se casar, irão
dizer o quanto errada é essa suposição.
Joel e Liz tornaram-se religiosos aos vinte e poucos anos e se
casaram logo em seguida. Vi Liz dois meses após o casamento. "Achei
que, pelo fato de Joel ter tido alguns namoros duradouros, isso o
havia ensinado algo sobre as mulheres", ela me disse, com franqueza.
"Mas o cara não sabe nada. Várias vezes por dia eu tenho de explicar:
‘Querido, eu sou uma mulher, e as mulheres sentem assim...’, ou ‘Isso
pode funcionar para você, que é homem, mas eu preciso...’. Ele é um
sem-noção."
"Mas, é claro, você entende completamente o seu marido, não?",
perguntei, com um sorriso.
Ela sorriu com tristeza: "Se você quer saber a verdade, apesar dos
meus próprios relacionamentos passados​​, eu estou igualmente no
escuro a respeito dos homens".
Se namorar nos iluminasse sobre o sexo oposto, milhões de casais
adultos não estariam devorando livros como “Homens são de Marte,
Mulheres são de Vênus”, de John Green. Em vez de namoro, os livros
são, provavelmente, a melhor maneira para obter essa educação de
gênero antes e durante o casamento. E obter esse conhecimento,
com o propósito de aplicá-lo no casamento, vai ensiná-lo a viver com
alguém, compartilhar com o outro e amar alguém que é tão diferente

Um novo sentido para o namoro  23


de você. Assim, você vai apreciar o mundo através de outros olhos.
Então, se você está investindo uma porção de tempo e energia
em namoro, as chances são de que você não está tirando o máximo
proveito dessa energia, como pode ver. Rosie Einhorn, uma popular
conselheira pré-marital (e coautora do livro “Talking Tachlis: A Single’s
Strategy for Marriage”), aborda essa questão sem muitos rodeios: "Toda
essa experiência é inútil".

SAIR ILESO
Mesmo que a experiência nos custasse só o tempo e o sentimento,
o que já seria triste o suficiente, a vida é curta, e é uma vergonha
gastá-la para descobrir o básico, em vez de colher os frutos do
conhecimento existente. No entanto, a experiência também tem seu
preço, emocionalmente falando.
A relação não é um jogo. Ela significa partilhar, criar uma abertura
para a intimidade, ser vulnerável. Então, quando termina, dói. "Eu
sinto que deixei uma parte de mim com a minha ex-namorada", disse-
me um jovem, certa vez. "E uma vez que você dá de si mesmo, você
não pode simplesmente pegar essa parte de volta. Agora eu estou
com medo de deixar que isso aconteça novamente." Um rompimento
poderá deixá-lo muito desconfiado quando tiver de investir em outro
relacionamento.
Quando o mundo secular coloca na balança, de um lado a
preservação contra danos emocionais e, do outro, a experiência, esta
última é a vencedora. A experiência, apesar de tudo, dá um certo ar de
sofisticação ao mundo secular. Ela é, supostamente, seu ingresso para
a vida adulta. Mas e quanto à preservação emocional? Muitas pessoas
nem sequer sabem o que isso significa. Se o sabem, afirmam que esse
instinto de preservação emocional acaba naturalmente, com o passar
da idade, como um lagarto que muda de pele. Se esse é o preço da
experiência? Bem, eles darão de ombros, afinal, tudo isso faz parte do
crescimento.
A tradição judaica vê as coisas de forma diferente. O mundanismo
e a sofisticação podem ser úteis ou prejudiciais; eles, em si mesmos,
não são, definitivamente, valores (e eles não são, de modo algum,
sinônimos de sabedoria). Mas e a saúde emocional? Como fica um
coração partido, sem capacidade de confiar, de acreditar que as
coisas vão funcionar, de sentir que a vida é boa? Estas qualidades são

24  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


preciosas – e enquanto elas dependem inicialmente da nossa educação,
já nos primeiros anos de vida, os relacionamentos posteriores podem
afetá-las ou mesmo aniquilá-las. Dado o alto custo da experiência, há
muito a ser dito sobre a inocência. E isso não significa ingenuidade,
pois, como eu já disse, há outras (e muito melhores) maneiras de se
aprender sobre a vida do que as tentativas e erros.
Mesmo se você soubesse que um rompimento não lhe deixaria
pior, desgastado, poderia prever a reação de seu ex-parceiro (a)?
Namorar pela experiência, portanto, não é algo muito sensível. Isso
pode ser até considerado como estar usando alguém.
Você pode estar surpreso com esse tipo de linguagem dura. Mas
essa realidade foi ilustrada por mim em uma conversa com Sandra,
uma mochileira, que cruzava o mundo e colecionava inúmeros
relacionamentos breves.
"Eu não concordo com todo o seu argumento contra a experiência",
disse ela. "Sem todas as experiências que tive, eu não seria quem sou
hoje. Eu não me conheceria tão bem, não teria o entendimento sobre o
universo masculino que tenho, não teria a auto-confiança que tenho."
"Eu, eu, eu", interrompi Sandra. "E todos esses caras? Poderia um
deles ter sentido algo a mais por você? Ele poderia até ter se sentido
usado, quando você disse a ele: ‘Foi um prazer conhecer você.Você foi
uma grande experiência de aprendizagem para mim’?”
Sandra ficou surpresa. "Isso não é justo", ela se opôs. "Todo homem
que conheci concordou em ter um relacionamento passageiro, porque
ele sabia que também iria conseguir algo com isso. O relacionamento
não foi benéfico só para mim – foi para ele também.”
"Huuumm. Então, você realmente quis dizer: ‘Se não tivéssemos
todas as experiências que tivemos, nós não seríamos o que somos
hoje’.”
Ela parecia desconfortável.
"Em outras palavras, em vez de usá-lo para o seu próprio
crescimento, vocês estavam usando um ao outro. O que é melhor?"
Agora Sandra realmente estava irritada: "O que há de errado com
isso?", ela retrucou. "Éramos adultos conscientes."
Infelizmente, para os “caçadores de experiência”, no Judaísmo não
existe o conceito de "adultos responsáveis​​". Não significa que está

Um novo sentido para o namoro  25


tudo bem, caso dois adultos concordem em compartilhar de alguma
intimidade, que não magoe ninguém mais. Eles poderiam estar
prejudicando a si mesmos. Pior, um deles poderia estar se aproveitando
do outro, que nem sabe direito o tipo de relação em que está se
envolvendo ou que está tentando negar seus desejos por algo mais
profundo. “Adultos responsáveis​​” geralmente é um termo bastante
sofisticado, que serve como desculpa para justificar o egoísmo. A lei
secular pode não ter nenhum problema com isso, mas a lei judaica
se preocupa com o bem-estar emocional e espiritual da pessoa, que
inclui saber amar. Estas duas pessoas estão à procura de experiência e
prazer para si mesmas. O amor, ao contrário, diz respeito à procura
pelo compartilhar.
É claro que o exemplo de Sandra é extremo. Mesmo se você
estiver no "período de experiência", pode procurar algo mais do que
duas semanas de aventura em um país distante. Ainda assim, há um
problema. Não importa se vamos ou não reconhecê-lo, mas o fato
é que todas as relações alimentam nossa esperança inconsciente por
convivência e plenitude. No entanto, se a relação não for orientada
para o compromisso, ela irá terminar. E nós sabemos disso.
Recentemente, uma amiga esteve reavaliando sua experiência de
namoro antes do casamento: "Eu sempre fui uma boa namorada:
agradável, doce e carinhosa e nunca tive a intenção de causar qualquer
dor ao outro. Mas, certa vez, percebi que o relacionamento não iria
chegar a lugar algum e coloquei um ponto final na história – ele ficou
gravemente ferido. Sua autoconfiança foi atingida, e eu sabia que ele
não se entregaria de novo a alguém, como ele se entregou a mim,
durante muito tempo. Somente agora, em retrospectiva, vejo que o
sistema de namoro é inerentemente defeituoso".
Jenny também aprendeu isso da maneira mais difícil. Quando
tinha 24 anos, ela visitou Israel a passeio e não estava procurando um
relacionamento sério, mas acabou conhecendo Uri, um sabra (natural
de Israel) de 22 anos. Rapidamente, ela se viu envolvida com ele –
muito mais do que ela esperava. "Cada momento com ele é o céu", ela
me disse, alegremente. Três meses depois, ela estava chorando muito.
Após uma pequena briga, Uri, inexplicavelmente, terminou com ela.
Depois de um exame mais atento, a razão do rompimento tornou-se
muito clara. Com a relação em curso, Jenny tinha percebido o quanto
ansiava por um marido e filhos. Uri, no entanto, tinha terminado
recentemente o serviço militar e entrado para a universidade e,
portanto, não estava pronto para se estabelecer. Sentindo que Jenny

26  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


queria mais do que ele estava preparado a dar, ele usou a briga como
desculpa para terminar o relacionamento – e Jenny ficou com o
coração partido.
Poucos namoros levam a compromisso, a menos que cada parceiro
inicialmente assim o queira. Não importa o quão bom e gentil cada
um seja, um (ou ambos) vai se machucar. Mesmo quando o namoro
não implica o fato de se estar “usando” alguém, a insensibilidade está
envolvendo essa relação. Estamos brincando com algumas das partes
mais profundas de nós mesmos.
Então, pense duas vezes antes de se envolver e envolver outra
pessoa em uma relação improvável, sem futuro (seja porque você não
está a fim; ele ou ela não é o que você está procurando, ou você não
está pronto para algo sério).Todo mundo faz isso, mas isso não significa
que esteja certo. Namoro enquanto você ou o outro (ou ambos) está
no “período de experiência” significa desconsiderar os sentimentos do
outro e o seu próprio.

NAMORANDO PRA VALER


Até agora, um ponto precisa estar claro. A máxima: "A experiência
é o melhor professor" raramente se aplica aos relacionamentos e,
mesmo quando o é, trata-se, definitivamente, do caminho mais difícil
e menos inteligente de se aprender. Ligar-se à sabedoria pré-existente
e trabalhar sobre si mesmo são meios muitos mais eficazes, sensíveis
e menos dolorosos.
Por isso, no Judaísmo tradicional, o namoro não é “para experiência”.
Primeiro, você se transforma em alguém que pode encarar um
relacionamento com maturidade. Então, você sai de shiduch (encontro
entre um homem e uma mulher, sem contato físico, com o objetivo
de analisar suas compatibilidades, visando o casamento), porque você
quer iniciar um compromisso de vida com a outra pessoa – em outras
palavras, porque você está pronto para o casamento.
Deixe-me dizer algumas palavras sobre o casamento, uma vez que
a simples menção da letra “C” faz algumas pessoas estremecerem.
Afinal, o casamento é assustador. Significa sempre considerar as
necessidades do outro, seus desejos e sentimentos, e nunca mais viver
só para si mesmo. E isso é exatamente o seu propósito. Casamento
pede que nos tornemos totalmente adultos. Ele nos desafia a superar
nosso egoísmo natural e dar espaço para outra pessoa no centro das

Um novo sentido para o namoro  27


nossas vidas – permanentemente.
Eu conheci alguém que, confrontado com este desafio, bateu
as asas e voou. Aos 23 anos, Tom deixou sua jovem esposa e filha,
comprou uma motocicleta e caiu na estrada. Depois de viajar o mundo
por 25 anos, ele desembarcou em Israel, onde se estabeleceu em uma
pequena caverna no deserto do Sinai. Quando eu o conheci, ele tinha
60 anos, ainda estava vivendo na caverna, desfrutando da companhia
ocasional de soldados e turistas e divertindo-se com sua liberdade.
Enquanto ele se dizia feliz, eu olhava para ele e sentia um misto de
pena e tristeza. Na ânsia de fugir, ele havia perdido a chance de amar.
Ele ainda era uma criança – e profundamente sozinho.
Se você é um solteiro urbano, cujos encontros são no deserto
selvagem ou na cidade (igualmente selvagem) e cujo único objetivo
é evitar o compromisso, significa que você não cresceu. Qualquer
um pode dizer: "Eu quero ficar com você", ou mesmo "Eu quero
um relacionamento duradouro". Mas o que separa os homens dos
meninos (e as mulheres das meninas) é a capacidade de dizer "eu
quero me casar com você." Casamento. E o casamento – em vez do
namoro de experiência – é o que um namoro deveria ser.
Certa vez, eu dava uma palestra sobre este tema a um grupo de
jovens de famílias religiosas e, ao avançar a discussão, os sentia menos
e menos felizes. Quando concluí a palestra, me vi diante de uma sala
silenciosa, repleta de rostos extremamente sombrios. Finalmente, um
rapaz na fila da frente levantou a mão, hesitante.
"Sra. Manolson", ele disse, lentamente, "você disse que o namoro
deve ser para o casamento. E nenhum de nós aqui está pronto para se
casar. Assim...", ele fez uma pausa, quase com medo de continuar,
“...isso quer dizer... você está dizendo... nenhum de nós deveria
namorar?”.
Sem rodeios, respondi: "É isso aí".
Houve um momento de silêncio assim que a terrível verdade
veio à tona. Então, olhando para mim, totalmente desamparado, ele
perguntou: "Bem, o que devemos fazer?".
Um segundo rapaz imediatamente ergueu a mão (não parecendo
mais feliz do que o primeiro) e disse: "Devemos estudar Torá, certo?".
"Isso mesmo", respondi. "Mas 'aprender Torá’ significa mais do
que apenas se esforçar para entender um trecho do Talmud. Significa

28  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


trabalhar sobre si mesmo. Então faça isso, porque, um dia, uma mulher
muito especial será grata a você por ter feito esta escolha – você verá.”
Para encontrar a pessoa certa, você deve ser a pessoa certa, e
isso não vem do namoro, mas da verdadeira sabedoria e enfoque no
trabalho interno. Por isso, considere a inversão da abordagem popular
de namoro. Primeiro, dedique-se à etapa que a maioria das pessoas
pula, em sua corrida desenfreada à procura de relacionamentos:
torne-se alguém que pode ter um relacionamento que vai durar uma
vida. Em seguida, saiba o momento certo para procurar pelo parceiro
ideal, para viver esse relacionamento pleno e duradouro.
Fazer uma pausa no namoro pode não ser fácil no começo. Mas,
em breve, os benefícios se tornarão claros. Um deles é que as suas
amizades do mesmo sexo serão obrigadas a se fortalecer e a enriquecer.
"Desde que eu parei de namorar, me tornei muito mais próxima
de minhas amigas", me contou uma jovem chamada Jamie. "Metade
das nossas conversas girava em torno dos rapazes e dos problemas
relacionados a eles – como duas de nós se interessarem pelo mesmo
garoto ou alguém se sentindo abandonada, quando sua melhor amiga
está namorando e ela, não. Agora, em vez de competição e ciúme, há
união e partilha. Falamos sobre coisas importantes, como aquilo em
que acreditamos, quem somos e quem queremos ser. Quanto mais
eu me descubro, mais eu aprecio minhas amigas." Jamie poderia ter
acrescentado que essas amizades também ajudam a construir o sentido
de autoconfiança, que permite que você se sinta bem, mesmo sem um
namorado ou a aprovação da namorada, o que torna mais provável que
você acabe com a pessoa certa, pelas razões certas. (Mais sobre isso no
próximo capítulo.)
Além disso, a energia que você gastava com o sexo oposto está
liberada para seu próprio crescimento – e saber que você está
crescendo é muito bom. Pode começar até a se sentir melhor do que
quando namorava. Uma coisa é certa: esse período irá prepará-lo para
o casamento de uma maneira única. Pense nisso – pois a melhor coisa
que você pode trazer para o casamento é um você em versão melhorada.

Um novo sentido para o namoro  29


30  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
PARTE 2
ESTAR PRONTO
Numa bela manhã, você acorda. O sol está brilhando e o
mundo, cheio de promessas. Você pensa em como seria maravilhoso
compartilhar sua vida com outra pessoa. “Sabe?” você diz a si mesmo:
“Acho que estou pronto para me casar”.
O que você realmente quer dizer é: “Eu acho que quero me casar”.
Mas querer não significa que você está pronto para isso. Estar pronto
para o casamento significa alcançar um determinado ponto – e não é
a “idade certa”, o “nível adequado” de prática religiosa ou nem mesmo
estar se sentindo incompleto sem a “pessoa certa”. É a obtenção de um
valor crítico de sabedoria, crescimento e autoconhecimento – e isso
leva tempo e trabalho.
Então, mãos à obra. Capítulo 2,“Fazendo você próprio crescer”,
discute as qualidades para crescer, a fim de se tornar um bom parceiro.
Capítulo 3, “Por trás do ‘frio na barriga’”, aborda as forças
psicológicas por trás da atração.

 31
32  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
CAPÍTULO 2
FAZENDOVOCÊ PRÓPRIO CRESCER

C erta vez, um casal de amigos disse que queria fazer algo


novo e excitante. Então, foi saltar de paraquedas.
Primeiramente, eles completaram várias horas de
treinamento. Eles ouviram tudo o que o instrutor tinha a dizer sobre o
funcionamento de um paraquedas.Aprenderam a posição adequada para
os primeiros segundos de queda livre, como controlar o paraquedas,
depois de ele se abrir e o que fazer caso isso não aconteça... Eles
foram ensinados a absorver o choque da aterrissagem, dobrando os
joelhos e rolando. Depois da aula, foram praticar no chão, mais e mais.
Finalmente, colocaram seus equipamentos, embarcaram no avião e
decolaram. Cada um executou um salto perfeito – e foi emocionante.
Casar é muito mais emocionante – mas, como no paraquedismo,
você precisa de muita preparação antes de “saltar”.Você deve aprender
o que é preciso para ter um casamento bem-sucedido. Então, você
tem de praticar – não namorando (as razões já foram explicadas no
capítulo anterior), mas em qualquer outro tipo de relação, porque o
seu casamento pode ser tão bom quanto seus outros relacionamentos
humanos. Veja a coisa de maneira ainda mais ampla: você vai ser tão
bom cônjuge quanto o é como pessoa. Assim, o primeiro passo na
preparação para o casamento é trabalhar sobre si mesmo.

Fazendo você próprio crescer  33


TRABALHO INTERNO
Como alguém se torna uma pessoa melhor?
A sociedade ocidental nos exorta a permanecermos jovens.
Propagandas exaltam a boa aparência, diversão e liberdade de
responsabilidades – quanto mais jovem você for, provavelmente
mais goste disso tudo. Muitas vezes as pessoas aspiram não só por
uma aparência mais jovem, mas atitudes e comportamentos juvenis
também. (Recentemente, descobri que a definição para livros didáticos
para adolescentes passou a incluir adultos até 25 anos – em alguns Estados
americanos, essa classificação abrange até os 40 anos).
Entretanto, a cultura popular tem um histórico pobre em relação
ao casamento. Uma das razões é que um relacionamento bem-sucedido
não exige juventude, mas maturidade. A sociedade, infelizmente,
assume que até mesmo o mais adulto infantilizado está maduro o
suficiente para casar. Como Lisa Aiken aponta em “Beyond Bashert: A
Guide to Dating and Marriage Enrichment”, que você deve passar por
um teste para obter a carteira de motorista, mas não para ter uma
licença de casamento. No entanto, a maturidade emocional, como a
habilidade de condução, não está necessariamente relacionada à idade.
Lembro-me de como fiquei chocada quando uma garota de 17 anos,
de uma família judaica religiosa, me contou que havia ficado noiva; até
que percebi o quanto ela era muito mais madura do que eu, quando
me casei, aos 26 anos. A maturidade emocional é produto da educação
e do autodesenvolvimento. E, enquanto você não pode mudar a forma
como você foi criado, pode melhorar e se transformar na pessoa que
quer ser.
Nenhum de nós é totalmente criança ou adulto 100% do tempo.
Todos nós estamos em algum lugar entre esses dois extremos – mas,
sinceramente, espero que sempre estejamos nos movendo em direção
à idade adulta. Se você nunca esteve em um casamento bem-sucedido,
pode ser difícil entender o quanto de maturidade isso requer, mas
saiba que você é capaz de desenvolvê-la. Algo que você pode fazer é
perguntar a alguém que seja muito bem casado e por um bom tempo,
que o conheça bem, que irá lhe responder honestamente se você já
atingiu o grau de maturidade necessário para o casamento. (Eu fiz isso
aos 23 anos, e o Rabino, polidamente, respondeu: "Você ainda tem potencial
para crescer como solteira”.) Obter uma imagem mais clara de onde você
precisa crescer e melhorar, no entanto, requer um pouco mais de
introspecção. Pergunte a si mesmo ou, melhor ainda, peça a um casal

34  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


de bons amigos para que lhe responda às seguintes indagações – e diga
a eles que você está pronto para ouvir a verdade, seja ela qual for:
Sou sincero?
1. Estou aberto para ver quem eu sou?
2. Aceito críticas e admito quando estou errado?
Sou disciplinado?
3. Sou paciente?
4. Tenho autocontrole?
5. Consigo esperar pelo reconhecimento de outra pessoa em
relação a mim?
Consigo enxergar as coisas em perspectiva?
6. Posso distinguir entre o que é mais e menos importante na vida?
7. Dou mais valor para as satisfações do que às frustrações?
8. Tenho senso de humor?
Eu sou responsável?
9. Posso perseverar para alcançar um objetivo?
10. Sou confiável?
Sou realista?
11. Estou preparado (pelo menos intelectualmente) para não ter
tudo o que eu quero?
Eu quero crescer?
12. Estou empenhado em me tornar uma pessoa melhor?
Minha amiga Meredith, certa vez, compartilhou sua perspectiva
sobre por que acredita que vale a pena começar este trabalho de
autoconhecimento antes do casamento. "Eu sempre fui defensiva",
ela me disse, "e isso acontece, geralmente, quando eu e meu marido
discutimos – ele diz algo com a intenção de me ajudar, mas eu tomo
isso como crítica e fico chateada. Daí, ele também se chateia e tudo
piora. Se eu tivesse começado a abordar esta questão quando ainda era
solteira, poderia ter evitado o trabalho muito mais difícil e lento que
tenho agora.” (O excesso de sensibilidade às críticas, normalmente, denota um
problema de autoestima –Vide mais adiante.)

Fazendo você próprio crescer  35


Você deve ter notado um denominador comum nas 12 características
listadas acima: ver além de si mesmo e para além do presente. Esta
capacidade distingue as crianças dos adultos, e a maioria de nós a tem,
em certo grau. No entanto, todos nós caímos em um autocentrado
processo de pensamento e comportamento.
“Estas lombadas de velocidade me deixam louco”, resmungou,
certa vez, um motorista de táxi quando entramos em meu bairro.
“Milhares de crianças vivem aqui”, disse-lhe, educadamente,
“e aconteceram vários acidentes terríveis, devido ao excesso de
velocidade.”
“Tudo o que sei é que, a cada dois segundos, tenho de diminuir o
ritmo. É ridículo!” queixou-se.
“Você não acha que proteger as crianças é mais importante?”,
perguntei-lhe, diretamente.
“Até onde você quer levar essa discussão?”, ele respondeu,
“enquanto estamos discutindo, poderíamos muito bem voltar para a
época dos cavalos e da charrete.”
Esse é um homem adulto mostrando sua maturidade emocional,
correspondente a de um garoto de 5 anos. Todos nós regredimos
quando estamos mal-humorados, mas temos de lutar contra isso.
Devemos, constantemente, esforçar-nos para ver o mundo através de
uma lente grande-angular.
Junto com a expansão de sua percepção da vida, a maturidade
emocional desenvolve o foco nas necessidades dos outros, em seus
desejos e sentimentos. Felizmente D’us nos criou de tal maneira, que
nos preocuparmos com o outro nos faz bem.
Ao mesmo tempo, se só o que conseguimos é nos sentir bem,
estamos perdendo o barco. Há muitos anos, inspirada pelo que eu
achava que era o altruísmo, telefonei para um hospital local e me
ofereci para entreter as crianças internadas, por meio da música.
“É uma oferta muito boa”, a mulher com quem falei me disse, “mas
agora estamos com falta de mão de obra e precisamos de ajuda mais
básica, como levar crianças em cadeiras de rodas para passear, vesti-las
e alimentá-las."
Fiquei decepcionada. "Mas eu quero cantar e tocar violão para as
crianças."

36  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


A mulher foi direta: “Você está procurando fazer o que quer ou o
que nossas crianças precisam?”.
O egocentrismo prevalece em nossa sociedade, a tal ponto que
até mesmo um ato de caridade pode ser maculado por interesses
próprios. Doação egocêntrica é certamente melhor do que nenhuma
doação, mas deve ser um trampolim para uma preocupação genuína
com os outros. A maturidade emocional nos relacionamentos significa
tomar o caminho inverso.
Então dê uma boa olhada em como você se relaciona com os
amigos, companheiros de quarto, colegas de trabalho, irmãos, e, sim,
até mesmo com seus pais. A seguir, faça a si mesmo essas perguntas
(ou, mais uma vez, peça para alguém próximo e de confiança, que as
responda a você):
Estou compartilhando?
13. Posso colocar as necessidades e os desejos dos outros antes, ou
ao menos no mesmo patamar que os meus?
14. Posso compartilhar sem "contabilizar pontos"?
Sou sensível?
15. Estou atento e sou receptivo para com os outros?
16. Tento ser consciente dos sentimentos dos outros?
17. Tenho empatia e me identifico com alguém?
18. Dou carinho, conforto e apoio?
Sou respeitoso?
19. Tolero as diferenças e valorizo a individualidade?
20. Valido as perspectivas das quais discordo?
21. Respeito limites e a privacidade dos outros?
Sou capaz de me comunicar de forma eficaz?
22. Compartilho sentimentos positivos?
23. Expresso sentimentos negativos sem atacar o outro?
Sou flexível?
24. Resolvo conflitos por meio de conversa e negociação?
25. Posso ceder?

Fazendo você próprio crescer  37


Amo os outros, apesar de suas falhas?
26. Telefono para alguém, mesmo quando estou zangado com ele
ou ela?
27. Enfatizo a bondade, em meio a falhas?
28. Estou disposto a ficar em um relacionamento, enfrentando
bons e maus momentos?
Como eu disse, todas essas características implicam em focar nos
outros. Pare de vez em quando, durante suas interações com outras
pessoas, e reflita: "Quanto eu estou pensando sobre seus interesses em
oposição aos meus?" "Posso sair do meu lugar e me colocar no dele
(a)?" Este exercício simples, mas de abrir os olhos, pode impulsioná-
lo a um maior cuidado para com o outro.
Se você respondeu à maioria das 28 questões com um honesto
"sim", você está maduro o suficiente para iniciar um relacionamento
bem-sucedido. Se suas respostas são menos positivas, você tem algum
trabalho a fazer, antes de se envolver com alguém. Dê um tapinha
nas próprias costas, pelo simples fato de ter olhado para dentro de si
com honestidade e vontade de crescer. Em seguida, comece. Estude
o que a Torá tem a dizer sobre o desenvolvimento pessoal. Frequente
aulas, ouça shiurim sobre o tema, leia livros. E, ainda melhor: tente
passar um tempo com as pessoas, cujos casamentos você admira.
Idealmente, seja uma espécie de aprendiz na casa de algum “casal-
modelo”. (Muitas famílias irão recebê-lo. Eu não sei se eu e meu marido
nos qualificamos como um “casal modelo”, mas a gente sempre está disposto a
ajudar). Observe como o marido e a mulher tratam seus filhos e um
ao outro. Grave seus comportamentos no mais íntimo de seu ser. Mais
importante ainda: experimente colocar em prática o que aprendeu
em seus próprios relacionamentos, com amigos, familiares etc.
Uma das melhores maneiras de se crescer é simplesmente ajudar
as pessoas. Casamento é fundamentado em chessed (atos de bondade).
Então, comece já a desenvolver seus “músculos de compartilhar”. Seja
um voluntário regularmente.Tente encontrar maneiras de compartilhar
em seu dia a dia. Para realmente exercitar essa característica, às vezes
chegue até a concordar em fazer coisas das quais você realmente não
gosta. (Aprendi a dizer "sim" antes de eu ter tempo para pensar sobre isso:
"Sheila Green está doente e precisa desesperadamente de várias horas de sono,
mas seu bebê está com diarreia e, constantemente, chora.Você acha que poderia
ajudá-la?". "Sim"). Lembre-se sempre que uma pessoa especial vai

38  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


amá-lo por todo seu esforço para se tornar o melhor possível de si
mesmo.
Como você pode ver, quando falo em atos de chessed, falo de
trabalho prático, real – e é natural resistir a isso, especialmente se
você está cansado de ser solteiro e de “seguir com a vida mesmo
assim”. Uma jovem que estava longe de estar pronta para o casamento
me perguntou, com impaciência: “Muitas pessoas imaturas se casam
e depois crescem. Por que eu não posso?". Sim. Você pode. Mas você
realmente quer ser uma esposa imatura para alguém que você ama?
Além disso, você provavelmente foi atraída por alguém não mais
maduro que você mesma (e a imaturidade pode atingir níveis mais baixos
do que você pensa). Em outras palavras, o que você é, é o que você
vai conseguir. Então, pergunte a si mesmo: “Estou preparado para
me casar com alguém como eu?”. “Estou disposto a entrar em brigas
conjugais e, possivelmente, um divórcio, em vez de crescer antes do
casamento?”.
Se você respondeu não a alguma das questões acima, então, deve
superar o impulso de embarcar em um casamento antes de estar
pronto. Imagine o tipo de pessoa com quem você quer se casar, e
tente se tornar o tipo de pessoa que ele ou ela vai querer. Você não
precisa atingir a perfeição (ou mesmo chegar perto dela), pois não teria
nada para fazer depois de se casar. Mas você pode ser capaz de criar
um relacionamento em que você e seu (sua) parceiro (a) possam
continuar a crescer juntos, com pouca dor e a maior alegria possível.

CRIANDO INTIMIDADE
Além de maturidade, pelo menos quatro qualidades contribuem
para um casamento ser bem-sucedido: independência, autoestima,
confiança e capacidade para a intimidade emocional. É importante
entender esses atributos, a sua origem, e por que eles são tão essenciais.
Independência significa ver a si mesmo como uma pessoa
independente, que se conhece, anda com as próprias pernas e
sabe muito bem aonde quer chegar. Infelizmente, muitas pessoas
dependem, em demasia, das outras, chegando mesmo a sentir pânico
quando se veem sozinhas. Eu tinha uma amiga na escola, cujos pais
se separaram. Desesperada, a mãe cometeu suicídio. Isso é uma falta
de autonomia levada ao extremo. Mas exemplos menos trágicos são
bastante comuns.

Fazendo você próprio crescer  39


"Ora, mas você não deveria se sentir incompleto antes de se
casar?", você pode estar se perguntando. A resposta é: Sim, mas
se sentir incompleto não é sinônimo de carência e insegurança.
Dependência saudável significa reconhecer sua solidão. Dependência
doentia significa temê-la. Para uma pessoa insegura, a solidão significa
não ter nenhuma fonte de validação ou, em casos mais graves, perder
a própria identidade. Essa pessoa se sente desesperada por não estar
com alguém – e eu não preciso nem dizer o quanto isso é perigoso...
Muitas vezes, falo aos jovens: "Antes que você possa ter um bom
relacionamento, você deve aprender a viver sem ele". Uma pessoa
autônoma deseja, profundamente, compartilhar sua vida com os
outros, mas ela é sólida como indivíduo.
Uma forma de avaliar o seu nível de autonomia é observar sua
atitude para com os outros. Se você é excessivamente dependente,
constantemente se preocupa com questões como: "O que eles pensam
de mim?". Agora, se você é mais autônomo, vai perguntar: "O que eu
acho deles?"
A autoestima está ligada a muitos dos elementos da maturidade
emocional acima citados e é o ingrediente mais importante em um
relacionamento bem-sucedido. A autoestima não é um chavão pop
da psicologia para "sentir-se bem consigo mesmo." Ela é construída
sobre o fato de ser bom, competente e amado, reconhecendo que
possui essas qualidades. Ser uma pessoa boa exige trabalhar o caráter;
competência requer o desenvolvimento de suas habilidades, e se você
é um ser humano correto, já é, automaticamente, amado aos olhos de
D’us (o Único cuja opinião realmente importa).
No entanto, o modo como você se sente amado pode depender
do tipo de criação que recebeu. Eu conheço um homem chamado
Daryl, a quem foi ensinado que se ama apenas aquele que é bem-
sucedido física ou intelectualmente. Assim, ele passou a acreditar que
ele só seria amado se conseguisse se sobressair em tudo. Os pais de
Robert, por outro lado, o aceitam incondicionalmente. Assim, ele
quase sempre se sente bem consigo mesmo. Se você quiser questionar
sua maneira de amar, sua infância pode ajudá-lo a compreender como
a sua autoimagem foi desenvolvida e como isso o afetou. A partir daí,
conseguirá “pintar” um autorretrato mais baseado na realidade.
A autoestima também tem de enfrentar propagandas, TV e filmes,
os quais passam valores artificiais (como aparência, dinheiro e glamour),
que acabam substituindo o que deveriam ser as pedras angulares de

40  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


uma autoestima genuína. Para mulheres e homens, as revistas são as
piores fontes disso. Todo seu objetivo é fazer com que você se sinta
mal (a menos que compre os produtos dos seus patrocinadores). Para a saúde
de sua própria autoestima, que está profundamente enraizada no
conceito que tem de si mesmo, ignore os meios de comunicação. E
evite comparações, seja com modelos de revistas ou com seus vizinhos,
a menos que eles inspirem o seu crescimento pessoal. A autoestima
está em não se comparar com os outros, mas olhar para si mesmo e
gostar daquilo que vê.
Provavelmente, você já percebeu que a autoestima é fundamental
para um relacionamento bem-sucedido. Ela permite que você
descubra que o amor que você dá é significativo e que o amor que
você recebe é merecido. Uma mulher recém-casada veio a mim com
um problema de autoestima clássico: "Quando meu marido diz que
me ama, não aceito isso completamente", ela confessou. "Uma parte
de mim pensa: 'Cara, devo realmente tê-lo enganado sobre quem
eu sou’. Eu me sinto como uma impostora”. Depois de reconhecer
sua educação excessivamente crítica, ela foi capaz de desenvolver a
autoestima para receber plenamente o amor de seu marido.
A autoestima também aparece com destaque em sua escolha
inconsciente de um cônjuge e no sucesso desse relacionamento.
Semelhante atrai semelhante. Assim, provavelmente, vai encontrar
alguém, cuja autoimagem é, em grau maior ou menor, similar à sua.
Se a sua autoestima é boa, as chances são de que seu parceiro seja
assim e vocês vão interagir positivamente, pois a autoestima elevada
elimina a concorrência e permite dar ao outro o que ele precisa. Ela
derruba as paredes defensivas, permitindo que você e seu parceiro
(a) alcancem o entendimento verdadeiro. Ela faz com que você aceite
críticas sem se ofender ou magoar, porque você está de mente aberta
e disposto (a) a mudar.
Alguém que conheço demonstrou esta verdade uma vez. Um dia,
ao bater à porta da Sra. Cohen, a quem eu pretendia visitar, sua vizinha
abriu a porta de sua casa e me perguntou: "Você está procurando a
senhora Cohen?".
"Sim", respondi.
Ao perceber que eu estava ali para falar sobre um dos filhos da
Sra. Cohen, essa mulher balançou a cabeça, com conhecimento de
causa:"Se tiver algum problema, me diga."

Fazendo você próprio crescer  41


Como conheço essa mulher e sei que ela está sempre procurando
melhorar a si mesma, dei-lhe meu sorriso mais amigável e perguntei:
“Mas isso não é lashon hará (fofoca)?”.
Assustada, tomou a defensiva: "Acho que não, eu só estava tentando
ajudar".
"Tenho certeza disso", respondi, gentilmente, "mas eu não sei se
era necessário a senhora ter dito o que me disse."
Um pouco nervosa, ela respondeu: "Bem, eu não sei se foi lashon
hará", e retirou-se para seu apartamento.
Mais tarde, ela me ligou. "Peço desculpas", disse. “Você estava
certa. Vou me cuidar mais sobre lashon hará, a partir de agora.”
Fiquei impressionada. Quando o ego é saudável, você não precisa
ficar sempre se protegendo.
A autoestima atrai não apenas alguém capaz de "interações
saudáveis​”​, mas alguém que o ama por aquilo que você é. Se você não
está seguro de quem é por dentro, vai procurar validação externa,
que irá nortear a sua aparência, quem você é ou o que pode fazer. E
isso vai deixá-lo inevitavelmente fraco, como diz uma velha canção: "à
procura de amor em todos os lugares errados."
Uma jovem me disse que, infelizmente, continuava a se envolver
com os rap az es errados. Ela não queria, mas algum vazio interior
a obrigava a isso – a cada relacionamento, ela se sentia ainda mais
vazia. Embora eu soubesse que ela precisava de aconselhamento para
trabalhar essa questão, decidi dar um palpite sobre o que poderia estar
acontecendo.
"Você acha que tem amor suficiente de seus pais? Particularmente
do seu pai?", perguntei-lhe à queima-roupa. “Pergunto isso porque
você está sedenta por atenção."
Algo ocorreu em seus olhos. "Pode ser", ela disse, lentamente.

"Os seus relacionamentos lhe dão o que você procura?”


Houve um longo silêncio. "Não. Mas por um tempo, eles me fazem
sentir bem."
"Eles a fazem se sentir bem internamente ou só externamente?"
Houve um tempo muito longo e doloroso de silêncio. "Só por
fora."

42  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


"Bem", eu disse, suavemente, "provavelmente, a melhor maneira
de obter o amor que você está procurando é aprender a amar a si
mesma."
Uma autoimagem forte protege contra complicações
autodestrutivas. Ela dá confiança para escolher com quem se pretende
estar; acreditar que alguém que vale a pena vai escolher você, e jamais
se contentar com menos. Autoestima saudável é um pré-requisito
para um relacionamento saudável. (Para saber mais sobre a autodefinição
e autoestima, leia meu livro “Além do Espelho – Um enfoque atual sobre
Tsiniut”.)
Se a autoestima significa acreditar em si mesmo, a confiança
significa acreditar nos outros. Como a autoestima, sua capacidade
de confiança deriva, em grande parte, de sua infância, bem como
das relações posteriores, as quais, muitas vezes, jogam luz às nossas
experiências de crescimento. Se os seus pais foram presentes, você vai
achar que é mais fácil confiar nos outros. Mas, se eles foram ausentes,
física ou emocionalmente, você terá tendência a suspeitar de todos.
Aliza estava esperando 25 minutos, quando Jason, com quem ela
havia saído várias semanas, finalmente chegou, apressado. "Onde você
estava?", ela disparou. "Você está atrasado!".
"Sinto muito", ele respondeu, ofegante, “mas perdi o ônibus, e o
próximo levou um longo tempo para vir...”
“Isso não é desculpa!”, ela interrompeu, quase gritando. “Eu fiquei
esperando meia hora!”.
Jason ficou chateado. "Olha, foi a primeira vez que isso aconteceu, e
vou fazer o meu melhor para não deixar que isso aconteça novamente.
Peço desculpas."
Com lágrimas nos olhos, Aliza mal registrou suas palavras: "Eu
disse que estava esperando meia hora. Como você acha que me senti,
me perguntando se você chegaria ou não?!”
Esta jovem, de desconfiança enraizada, vai, inevitavelmente,
atormentar seu casamento. A confiança também pode ser danificada
por uma separação traumática, incluindo o divórcio dos pais (ou,
pior, o seu próprio). Se o seu nível de confiança não está onde deveria,
comece a dar atenção a isso (talvez buscando ajuda profissional ou um bom
conselheiro). Enquanto um relacionamento amoroso com compromisso
pode construir a sua confiança, você deve, em primeiro lugar, ter o

Fazendo você próprio crescer  43


suficiente dela para entrar em um.
A autoestima e a confiança estabelecem as bases para a intimidade
emocional. Intimidade é muitas vezes confundida com o “grude” da
fase inicial de um relacionamento. No entanto, a intimidade não é a
proximidade súbita, ilusória, que vem de química forte, envolvimento
físico, ou a sensação de que o chão debaixo dos seus pés está sumindo.
O chão pode ser reconstruído em questão de segundos, envolvimento
físico pode ser apenas físico, químico e pode sair pela culatra (ver
Capítulo 3), e, assim, a “proximidade” transforma-se em distância.
Intimidade é a capacidade de expor o seu eu interior, ser vulnerável e
deixar seu parceiro fazer o mesmo.
Depois de dois encontros com Shari, Oren sentia-se tomado pela
paixão. Shari sempre lhe dava atenção, olhando calorosamente em seus
olhos e mostrando grande interesse em tudo o que ele dizia. Sua voz
era suave e gentil, sua compreensão, seu sorriso... "Eu já me sinto tão
íntimo dela", ele suspirou ao amigo. "É como se ela me conhecesse."
Shari fez Oren sentir-se especial, mas isso não é intimidade. Além
de confiança no outro e crença em si mesmo, a intimidade requer
realmente conhecer um ao outro – e isso leva tempo. Não existem
atalhos para a intimidade.
Tal como acontece com a maturidade e a autoestima, você vai,
inconscientemente, ser atraído por alguém, cuja capacidade de
intimidade emocional corresponde à sua própria.
Denise procurou aconselhamento antes do casamento porque ela se
sentia frustrada com a resistência de Ron em se abrir emocionalmente.
"Quando você notou esse bloqueio nele?" perguntou o conselheiro.
“Já no início do relacionamento”, ela disse com tristeza, “mas eu
pensei que, com o tempo, ele fosse se abrir."
O conselheiro virou-se para Ron: "O quanto você acha que
consegue se abrir de verdade para Denise?"
Ele hesitou. “Bem, eu nunca disse isso a ela... Mas acho que ela é
tão bloqueada quanto ela diz que sou."
Denise ficou chocada. Mas ela finalmente percebeu que, tanto
quanto ela desejava intimidade, ela também a temia, e que ela,
inconscientemente, havia escolhido Ron porque, em parte, sabia que
ele não iria forçá-la para além de seus limites de intimidade.

44  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


Mesmo que a sua autoestima e confiança sejam sólidas, a intimidade
emocional pode ser difícil se os seus pais reprimiram seus sentimentos,
ou se você “aprendeu” a não expressar o que sente. E enquanto esse
problema pode não ter consequências graves até que você esteja
casado, é melhor que comece a cuidar dele agora. Abrir-se requer
coragem, mas alguns tipos de crescimento são tão gratificantes, que a
intimidade emocional não é apenas a essência do casamento, mas um
dos mais belos presentes da vida. Desbloquear o seu coração vai fazer
com que você se sinta como emergindo de um armário escuro para a
luz do Sol e será mais fácil encontrar sua alma gêmea sob a luz.
Explorar esses aspectos de si mesmo pode ser um pouco assustador.
Mas tenha em mente o seguinte: “As pessoas querem se casar com
outras parecidas com elas mesmas”. Eu conheci uma mulher que
preferiu não mergulhar em si mesma, até que ela perguntou sobre um
homem em quem estava interessada, e foi dito muito deliberadamente
a ela: “Ele não é tão completo como pessoa, mas talvez seja o melhor
que você possa ter no momento”. Essa resposta lhe deu o impulso
que precisava para trabalhar sobre si mesma. Quase todos nós temos
problemas – e vale a pena cuidar deles antes do casamento.

CONHECER A SI MESMO
Até agora discuti o que você precisa para ser um bom parceiro
(a) para alguém. Escolher a pessoa certa exige mais do que
autoconhecimento. O ideal seria ter um ou mais mentores que
pudessem ajudar a clarear quem você é e o que precisa em um parceiro
(a) ideal.
Primeiramente, perceba sua natureza. Quais são seus pontos fortes
e os fracos? Como você pode contribuir em um relacionamento? O
que seu parceiro (a) deve oferecer?
“Minha espiritualidade é muito voltada para as pessoas”, eu disse a
meu futuro marido, quando estávamos saindo de shiduch. “Eu me sinto
próxima de D’us por meio de como me relaciono com os outros”.
Avraham, eu descobriria logo, era muito ligado aos feriados judaicos e
às rezas. Juntos, nossa vida religiosa é rica em todos esses elementos.
Seu parceiro (a) não precisa ser exatamente tudo o que você não é,
mas é bom ter certeza de que os pontos mais básicos e importantes
estarão sendo atendidos. (Alguém, por exemplo, que seja mais apto para
cuidar das despesas da casa do que você).

Fazendo você próprio crescer  45


O próximo passo é entender suas necessidades. E esse ponto é
um desafio, porque pode se tornar uma armadilha, já que é difícil
diferenciar necessidade de caprichos. Necessidades são essenciais
para sua felicidade e plenitude. Por exemplo, cada um precisa, em
níveis diferentes, dividir suas emoções, de comunicação intelectual,
ligação na observância religiosa e de atos de conforto e acolhimento.
Por outro lado, caprichos não derivam de seu eu mais profundo, mas,
geralmente, de se sentir inserido na sociedade ou nos moldes vendidos
pela mídia. Para diferenciar entre necessidade e capricho, você deve
se empenhar ao máximo em se desligar dessas vozes externas (mídia,
sociedade etc.).
Sherry passou muitos e fúteis anos procurando pelo Sr. Perfeito.
Mas, assim que ela começou a ouvir a si mesma, descobriu que
enquanto ela desejava profundamente um homem como o das
propagandas, “alto, charmoso, rico, que pagasse jantares caros, férias
exóticas e passasse noites românticas ao lado de uma lareira”, o que
ela precisava era de uma pessoa razoavelmente atraente, que fosse
mentser (alguém íntegro), que tivesse uma vida decente, encorajasse
sua carreira, a amasse e quisesse crescer emocional e espiritualmente.
Ela o encontrou e eles agora estão casados e felizes – tão felizes, que
ela acabou até se esquecendo de tudo aquilo que certa vez procurara
em um homem.
Separar capricho de necessidade é muito importante quando estes
se contradizem.Você talvez queira um profissional bem-sucedido, mas
você precisa de alguém mais focado na espiritualidade; você talvez
queira um homem que passe o dia estudando Torá, mas talvez precise
de um que esteja livre para passar muito tempo com você. E mesmo
que não se contradigam, os caprichos são a cereja do bolo, enquanto
as necessidades são o que realmente conta.
Depois de analisar suas necessidades, passe a observar seus valores.
Muitos de nós assimilamos, passivamente, os valores da sociedade
(os quais são totalmente questionáveis), ou os escolhemos entre uma
gama limitada de opções. Como, conscientemente e racionalmente,
você chegou a seus valores? Enquanto eles talvez mudem com o
tempo, você deve se esforçar procurando saber e analisando o que é
importante para você, e o que não mudará com o tempo. Assim, seu
casamento será erguido sobre bases duradouras. Se você acaba de se
tornar religioso, perceba que assimilar novas crenças e práticas não
acontece da noite para o dia. Não importa o quanto você esteja certo
sobre sua nova direção, deixe que ela entre em seu íntimo e se torne

46  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


parte de você, antes que se envolva com outra pessoa.
Andy estava estudando em um programa introdutório de Judaísmo,
quando encontrou Deborah, que havia se tornado observante alguns
anos antes. Em duas semanas, a relação decolou e Andy estava certo
de que queria se casar com ela. Deborah prometeu esperar por ele
enquanto ele “descobria” a religiosidade. Assim, Andy ingressou em
uma yeshivá por seis meses. Eles então se casaram. Um ano depois,
se divorciaram. “Eu realmente a amava – e ainda a amo – mas eu
simplesmente não estava pronto para me tornar religioso”, confessou
Andy. “Deborah tinha um cabelo lindo e eu não queria que ela o
cobrisse. E eu também não queria parar de fazer as coisas que estava
acostumado a fazer aos sábados. Tudo foi muito rápido. Eu me senti
preso – e tive de cair fora.”
Trazer o Judaísmo para sua vida leva tempo. Sempre que uma moça
acaba de se tornar religiosa (por exemplo, há seis meses) e me procura
dizendo que está pensando em sair de shiduch, costumo responder:
“Callllmmmmaaaa!!!”.
Enquanto algumas pessoas abraçam a religião muito rapidamente,
outros ainda não o fizeram o suficiente antes de pensar em casamento.
Carrie estudou em um programa para iniciantes por algumas semanas
e se tornou observante. Ansiosa em “seguir em frente”, ela se casou
pouco tempo depois com um colega, que também participava de
um programa similar para rapazes. Agora ela queria se tornar mais
religiosa, mas seu marido, não. “Eu não consigo mais”, ela disse,
infeliz. “O casamento judaico não era para abarcar um crescimento
espiritual?”. Sim, é. Mas antes de se casar, você precisa aprender como
você quer crescer, daí, você saberá escolher quem crescerá junto com
você.
Finalizando, olhe mais profundamente para dentro de você mesmo.
Como estão sua personalidade e suas emoções? Quais as necessidades
emocionais escondidas em seu íntimo que você trará para uma relação?
O que você, inconscientemente, espera de um casamento?
Esses assuntos complexos são o tópico do próximo capítulo.

Fazendo você próprio crescer  47


48  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
CAPÍTULO 3
POR TRÁS DO “CLICK”

V ocê aprendeu sobre as qualidades pessoais necessárias para


um relacionamento saudável e eu o encorajei a fortalecê-
las em você. Neste capítulo, vou compartilhar alguns
conselhos sábios sobre amor e casamento, os quais, espero, você irá
guardá-los no fundo do coração. Eles irão conduzi-lo a uma longa
jornada para prepará-lo para uma relação permanente. No entanto,
independentemente do tipo de união que você deseje, poderá se
beneficiar de um tipo adicional de conhecimento e crescimento, por
meio desses conselhos.
Muitos escolhem um parceiro (a) baseados em razão e emoção.
Alguns agem mais intelectualmente, enfatizando critérios objetivos,
em algo como um jogo de valores e objetivos. Outros seguem seus
corações, optando por alguém que provoca certos sentimentos. Há
ainda outros que tentam encontrar um balanço entre esses dois tipos
(No Capítulo 6, eu argumento a favor de se deixar conduzir pela razão). Mas,
no final, todos estamos procurando pela compatibilidade ideológica e
pessoal, que crie uma conexão forte.
No entanto, algumas pessoas – e você talvez seja uma delas –
querem algo mais. No fundo (quer admitam ou não), anseiam pelo
indefinível, indescritível “click”. Esse “click” está, na maioria das
vezes, parcialmente ligado à atração física, aparência, carisma ou uma
mistura de todos esses ingredientes. Ao mesmo tempo, a maioria das
pessoas dirá a você “é algo que não dá para explicar”, algum ingrediente

Por trás do “click”  49


secreto que faz com que se sinta que aquela relação vai dar certo – e
é romântico deixar que isso permaneça como um “mistério”. Mas se
você está procurando por essa sensação, talvez esteja interessado em
uma visão psicológica sobre o tema. Pois parece que esse “click” não é
nada místico, mas está em seu inconsciente.

SENDO HUMANO
De acordo com um Midrash (uma antiga visão da Torá), homem
e mulher foram criados como um só ser completo, mas depois D’us
achou melhor separá-lo em dois seres incompletos. Machos e fêmeas
solteiros “relembram” que certa vez foram parte de um todo e tentam,
assim, voltar a serem um, por meio da reunião de suas almas-gêmeas.
Nós olhamos para o casamento como uma maneira de recuperar nossa
integridade espiritual.
A psicologia sugere outros aspectos de nosso caráter incompleto.
Ao crescermos, nós adquirimos “defeitos”. Nenhum de nós atinge
a idade adulta em perfeita forma emocional. Consequentemente,
nossa psique quer “consertar as coisas”. E, assim como nós esperamos
que o casamento restaure nossa completude espiritual, nós também
esperamos que ele restaure nossa integridade emocional.
E o que é “integridade emocional”? É estarmos completamente
alegres e relaxados, conscientes e conectados com todos os aspectos
de nosso ser – sentirmo-nos completamente amados, em contato com
todo nosso ser e repletos de vida.
Se esta descrição parece mais um sonho, saiba que ela é. Ninguém
passa por tudo isso durante a vida adulta. No entanto, quando
crianças, recebemos isso de nossos devotados e conscientes pais ou
outros tipos de pessoas que cuidaram de nós naquela época. E eles
foram seres humanos. Não tinham superpoderes ou eram “sabe-
tudo”. Além do mais, eles certamente também tinham suas próprias
dúvidas emocionais, as quais “contaminaram” a maneira com que eles
nos criaram. Consequentemente, eles não poderiam nos dar tudo
de que precisávamos em cada estágio de nossas vidas. Podemos ter
sido criticados, muitas vezes tivemos nossos sentimentos reprimidos,
tivemos liberdade demais ou pouco afeto. No final, esses erros nos
deixaram a desejar.
Talvez nossos pais tenham explicitado sua insatisfação com alguns
aspectos de nosso comportamento e nos reprimiram – talvez você

50  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


precisasse chorar, dançar ou expressar suas opiniões. Até então fomos
ensinados a reprimir e dissimular essas necessidades.
Então, como seres humanos normais, nosso crescimento através
dos anos não foi perfeito. E, ao mesmo tempo em que emergimos
razoavelmente “juntos”, nós também emergimos menos completos.
(Como mãe, eu gosto de acreditar que D’us deu falhas para que os meus
filhos tenham de lidar com essas “coisas” como adultos. Eu prefiro me ver como
geradora de oportunidades para seu crescimento do que aquela que atrapalha).
O fato de nós termos atingido a idade adulta com alguns déficits
poderia ser o fim da história, se não fosse pelo fato de como nós
percebemos a realidade em nossos primeiros anos de vida. Enquanto
pequenos, nós tendemos a acreditar que as coisas – não importa se boas
ou ruins – acontecem por nossa causa. (Uma criança pode acreditar que
ela foi a causa do divórcio de seus pais). Ao mesmo tempo nós veneramos
nossos pais, acreditando que tudo o que eles fazem está certo. Por
esses motivos nós não podemos admitir as deficiências de nossos pais
e como elas nos afetaram. Em vez disso, nós, inconscientemente,
concluímos que se eles não atenderam a nossas necessidades, deve ter
sido culpa nossa. Certamente, nós não merecemos ser amados.
Sentir-se incapaz de despertar amor é doloroso. É difícil viver
com este sentimento. Então, nossa mente nos fez um grande favor:
ela armazenou esta dor bem longe de nosso alcance, em nosso
inconsciente. E ela ainda está lá.
Muitos não percebem o quanto estão feridos. Não importa
quão evidente seja o “estrago” que tenhamos sofrido, ele não afeta,
de modo claro, nossas amizades, trabalho ou outras atividades, ou
nos impede de sermos felizes ou bem-sucedidos. Ocasionalmente,
um fato aparentemente insignificante poderá provocar uma reação
emocional inexplicável (que indica que algum “botão” foi acionado em nosso
inconsciente), mas os sentimentos passam e a vida segue.
Entretanto, nossas feridas talvez se tornem mais relevantes quando
procuramos alguém com quem casar. A teoria a seguir não serve para
todo mundo. Mas ela aponta um elemento significante (até mesmo a
chave) em algumas relações. E a ideia é que as feridas das pessoas são a
base do “click” pelo qual elas procuram.

Por trás do “click”  51


A CONEXÃO INCONSCIENTE
Como eu disse, adultos querem plenitude e amor incondicional –
e a teoria é que você é atraído para uma pessoa a quem sente que pode
prover. Quando você encontra alguém, seus scanners subliminares
entram em ação. Eles analisam e registram as expressões faciais da
pessoa, o olhar, a linguagem corporal, o andar, o jeito de falar, as
atitudes, o estilo e o comportamento, tudo para determinar se ele ou
ela possui determinados traços. Isso pode soar pouco romântico, mas
você sempre procura alguém que se pareça com seus pais.
As pessoas reagem de maneiras diferentes a essa teoria. Se você
acha que seus pais são os melhores, talvez fique feliz. Se você não se
dá bem com eles – bem, talvez não se sinta tão feliz assim com essa
afirmação. De qualquer maneira, a ideia de se “casar com seus pais”
talvez mexa com o seu senso de autonomia adulta, e talvez você não
queira aceitá-la.
“Daniel (ou Daniela) não tem nada a ver com os meus pais”, talvez
você diga. “Ambos são voltados aos negócios, e Daniel é um artista.
Meus pais são extrovertidos, e Daniel, não. São como a água e o vinho.”
Mas se você olhar profundamente, talvez comece a encontrar
algumas similaridades. Pode ser que Daniel se dedique à arte com
o mesmo empenho que seus pais se voltaram a seus negócios. Talvez
o jeito introvertido de Daniela esconda os mesmos sentimentos que
seus pais extravasam com barulho. De fato, em algum ponto de seus
casamentos, algumas pessoas vão se ver dizendo a seus maridos ou
esposas: “Eu não acredito como você se parece com a minha mãe” ou
“Sabe, você está agindo do mesmo jeito que o meu pai”.
O que se esconde por trás dessa atração?
Em um nível básico, nós estamos à procura daquilo que nos é
familiar. Se você está saindo com alguém apenas por diversão, talvez
um tipo exótico possa atraí-lo; mas, quando você está à procura de
“algo pra valer”, inevitavelmente, vai orbitar em torno do que você
“conhece” e se sente confortável – e nada soa mais familiar do que as
personalidades das pessoas com quem você cresceu.
Essa tendência pode até ser vantajosa. Se seus pais foram
basicamente felizes, compreensivos, presentes e carinhosos, você será
levado, calorosamente, a se conectar com alguém que irradia algumas
dessas maravilhosas qualidades.

52  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


Mas esse raciocínio é mais complexo. Seu inconsciente também
procura alguém com as características indesejáveis de seus pais. Ele
quer que você se case com uma pessoa que não apenas detenha as
melhores características da mamãe e do papai, mas alguém com quem
você reviva as mesmas experiências “indesejáveis” que você teve com
eles.
Assim, você estará indo de volta ao ambiente emocionalmente
familiar, para que tenha uma segunda chance de emergir com todas
as necessidades que você encontrou ali. O tipo de amor que você não
teve de seus pais, agora poderá obter de sua esposa. Você se sentirá
completo. E você estará apto a confirmar o seguinte: “Não foi minha
culpa que não tive tudo o que precisava de meus pais. Afinal, estou
tendo tudo isso agora, de alguém que sente exatamente como eles. Eu
estou repleto de amor”.
Geralmente, em alguns encontros com alguém que lhe dá aquele
“click”, você vai perceber uma série de características de seus pais nele
(a). Talvez isso até o perturbe. Mas a consciência possui um grande
poder de persuasão. Dr. Jeff Auerbach (autor do livro “Irritating the Ones
You Love:The Down and Dirty Guide to Better Relationships”) reconstrói o
seguinte diálogo interno:
Consciência: “Por que ele (a) faz isso? É o tipo de coisa que me
chateia. Não tenho certeza de que saberei lidar com isso no(a) meu
(minha) marido (esposa)...”
Inconsciente: “ Você está de brincadeira?!? Ele (a) é perfeito (a). É
exatamente a pessoa certa para lhe dar o que você nunca recebeu de
seus pais”
Consciência: “Hummm. Na verdade, isso não é nada. E, de qualquer
forma, ele (a) tem tantas qualidades, das quais eu realmente gosto”
E aí vem a desastrosa conclusão final de que seu inconsciente está
passando dos limites:
Consciência: “E eu sempre posso transformá-lo (a) (naquilo que eu
gostaria que meus pais fossem)”
Uma amiga me contou uma breve conversa com seu futuro sogro.
“Quero que saiba”, disse ele, “que meu filho raramente fala sobre seus
sentimentos”.
“Oh, eu estou acostumada”, ela respondeu, calmamente. “Meu pai
também era assim”.

Por trás do “click”  53


Ela não percebeu que isso não era uma coincidência – ou que as
cicatrizes de “uma relação pai-filha que deixou a desejar” estariam atrás
de seus esforços para fazer com que seu marido fosse mais expressivo.
Além da semelhança de sentimentos familiares e de que desta vez
essa relação familiar dará certo, você procura por um par com o qual
possa, indiretamente, viver experiências reprimidas de si mesmo (a).
Se você cresceu aprendendo a racionalizar as emoções, talvez seja
atraído por alguém muito sentimental. Se você sempre planeja tudo
o que faz, talvez procure por alguém mais espontâneo. Esse desejo
de procurar partes perdidas de nós mesmos é sempre explicado pela
máxima: “Os opostos se atraem”.
Essas são as peças principais do quebra-cabeça da atração. Um
“click” inicial reflete a esperança inconsciente de que o “click” conserte
os erros de sua infância e o faça pleno. Sem conhecer seu próprio
interior, entretanto, você não irá perceber isso. Ao encontrar a “pessoa
errada”, seu inconsciente rapidamente conclui: “Não, não existe nada
familiar aqui que preencha minhas necessidades”. Enquanto todo
o seu consciente afirma: “Ela (e) é perfeita (o), linda (o), legal e
inteligente... Ainda assim, eu não sinto nada especial por ela (e)”. Mas
quando aqueles scanners subliminares identificam um vencedor, seu
inconsciente se iluminará: “Sim! Essa é a pessoa que fará tudo certo!”.
Enquanto tudo o que você percebe disso é: “Uau! Eu realmente gosto
dela (e) e nós temos muito em comum. Acho que essa relação tem
futuro”.
E, da mesma maneira que você vive todas essas atividades
inconscientemente, seu parceiro também vive as dele. Ele também
espera que você irá curar suas feridas de infância. Ela também acredita
que você a fará sentir-se completa e plenamente amada. Além disso,
para ganhar um ao outro, cada um vai, divina e habilmente, prover
exatamente tudo o que seu parceiro quiser. O resultado pode ser
eufórico. Para completar seu romance, o sentimento intoxicante de
que tudo aquilo de que você tanto sentiu falta ou perdeu na infância,
você está trazendo de volta. Enquanto a simples atração física pode fazer
um jovem coração adolescente palpitar, essa inebriante perspectiva de
se sentir completo e digno é o que a maioria dos adultos chama de
“estar apaixonado”.

54  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


HORA DE ACORDAR
Esse tipo de romance pode seguir em frente, vocês agora deveriam
viver “felizes para sempre”, como nos filmes da Disney. Mas, a partir
do momento em que você se casa, o enredo se torna mais dramático.
Não importa se depois de uma semana, um mês ou alguns meses,
você pode acordar uma manhã e perceber que está bem longe do
mundo encantado. E, a menos que esteja preparado, isso pode ser um
tremendo choque.
Jon e Rebecca contam sua experiência.
Dois solteiros solidamente estabelecidos, cada um se sentia pronto
para se casar. Ambos haviam trabalhado sobre si mesmos e tentado
aprender o que precisavam para ter uma relação bem-sucedida. Além
disso, os dois vieram de famílias emocionalmente saudáveis, cercados
por pais casados e felizes.
Como todo mundo, entretanto, as formações de Jon e Rebecca
não eram perfeitas e influenciaram sua escolha com quem se casar – e
o que aconteceria depois do casamento.
Jon cresceu em um ambiente um tanto controlador. Sua mãe era
acolhedora, esfuziante e amorosa, mas cuidava em demasia da vida
do filho. Assim que ele chegava à sua casa, ela perguntava a ele onde
esteve, o que fez e o que estava planejando fazer. Jon se sentia sufocado
e desenvolveu uma forte necessidade de ter seu espaço. Seu pai era
mais tranquilo. Brilhante e articulado, ele compartilhava a maioria de
seus sentimentos e pensamentos, mas tinha dificuldade de expressar
seu amor.
Jon também era dono de uma mente ativa e de uma personalidade
expressiva, mas, como o pai, era difícil para ele expressar seu amor.
Os pais de Rebecca eram parecidos com os de Jon. Seu pai era
muito inteligente, mas muito crítico, expressando seu amor pela
filha somente depois de ela trazer para casa um boletim só com notas
10. Assim, Rebecca passou a entender que o amor depende, acima
de tudo, de aprovação, enquanto que, lá no fundo, o que ela mais
queria era ser amada simplesmente pelo que era. Sua mãe era menos
crítica. Alegre e repleta de energia positiva, ela era, entretanto, menos
ligada a alguns de seus sentimentos. Como ela, Rebecca desenvolveu
uma personalidade emotiva e extrovertida, mas tinha problemas em
reconhecer e expressar tudo o que sentia lá no fundo de sua alma.

Por trás do “click”  55


Quando Jon e Rebecca se encontraram, eles sentiram aquele
“click” imediato. Rebecca foi atraída pelo raciocínio direto e pela
personalidade de Jon (que lembrava a de seu pai). Ela estava feliz,
embora percebesse que, algumas vezes, ele era direto demais em suas
colocações. Jon era perfeito para o jeito extrovertido que Rebecca
procurava (muito parecido com o de sua mãe), ignorando que, às vezes,
ele se tornava extrovertido demais.
Então, cada um era o “afeto perdido” para o outro. O jeito fácil de
Jon expressar o que pensava era um sopro de ar fresco para Rebecca,
que a ajudava a se religar com toda a gama de suas próprias emoções.
O estilo aberto de Rebecca expressar seu afeto tocava fundo em Jon,
levando-o a se reencontrar com seu desejo enterrado de expressar
amor.
O sentimento de “É isso! Encontrei o par ideal” levou Jon e Rebecca
a fazerem esforços especiais para preencher as necessidades ocultas de
cada um. E como Jon queria espaço, Rebecca o deixava à vontade para
informá-la sobre suas atividades, em vez de lhe fazer várias perguntas.
Ciente de que ela precisava de total afirmação, Jon, por sua vez, falava
sempre o quão especial ela era e evitava qualquer tipo de crítica.
O resultado era maravilhoso. “Parece que dá tão certo”, dizia Jon,
entusiasmando, a seu colega de quarto. “Eu mal posso acreditar que já
me sinto tão próxima dele”, Rebecca contava, encantada, à sua melhor
amiga. Não se passou muito tempo, eles ficaram noivos e se casaram.
Alguns meses depois, porém, as coisas não foram tão suaves
assim. Inconscientemente, Rebecca estava esperando receber o amor
incondicional que ela não teve de seu pai, enquanto Jon buscava pelo
espaço emocional que sua mãe não lhe deu. Mas seus desejos não
foram preenchidos. Pelo contrário. Cada um passou a ferir o outro
exatamente no mesmo ponto em que foram feridos quando crianças. O
pensamento sagaz e incisivo de Jon passou a soar extremamente crítico,
reconectando o medo de Rebecca de não ser amada. O entusiasmo e o
jeito efusivo dela se tornaram exagerados, sufocando Jon novamente.
Cada um passou a irritar os nervos do outro exatamente no ponto em
que seus pais os irritavam.
“Por que tudo mudou?”, eles se questionavam, infelizes. Assim que
o desencanto cresceu, cada um passou a focar menos nas necessidades
do outro e mais nas suas próprias, individualmente. Rebecca pedia por
mais amor e atenção, enquanto Jon insistia em ter mais tempo para
ele – o que só fazia Rebecca pedir por mais atenção, causando mais

56  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


o afastamento de Jon. Um círculo vicioso estava estabelecido e posto
em ação.
Além disso, aspectos da personalidade de um e de outro, outrora
bem-vindos, eram, agora, um problema para eles. A prontidão de
Jon em expressar uma vasta gama de emoções começou a incomodar
Rebecca (como sua mãe a havia “ensinado” a ser). A carência de Rebecca
estava começando a constranger Jon (como ele havia “aprendido” com seu
pai). As mensagens de seus pais de “nós não fazemos isso” ressurgiram,
e aqueles traços que antes os atraíram agora os repeliam.
Depois de apenas alguns meses de casamento, Jon e Rebecca
estavam, cada um refletindo sozinho, se a união não tinha sido um
erro. Mas, acredite ou não, essa mudança nos relacionamentos é
normal. Alguns casamentos bem-sucedidos passaram por isso. Por
ora, aquele “frio na barriga” que levou Jon e Rebecca a ficarem juntos
estava criando dificuldades, mas isso também pode ser um meio para
se atingir um tremendo crescimento e plenitude pessoais – se cada
um lutar para entender por que se atraíram um pelo outro, trabalhar
para iluminar sua própria bagagem emocional e tentar suprir as
necessidades do outro. D’us deve ter criado essa “escolha inconsciente
do cônjuge” para encorajar ambos, tanto marido quanto esposa, a
enfrentar suas próprias feridas e crescer sobre elas. Assim, eles podem
se tornar mais completos, não apenas como indivíduos, mas como
casal.
Com muito esforço (e alguns conselhos), Jon e Rebecca atingiram
uma relação sólida e feliz. Ao mesmo tempo, sua jornada para a
plenitude teria sido mais fácil se eles tivessem embarcado nela, cada
um com uma maior autoconsciência e, assim, teriam uma vantagem
na hora de enfrentar o crescimento que seu casamento requeria.

TORNAR-SE CONSCIENTE
Como a típica (e muito resumida) história acima esclarece, os
principais problemas conjugais, muitas vezes, resultam do “click”
inicial. Enquanto inúmeros casamentos falham devido à falta de
desenvolvimento pessoal e/ ou de valores adequados, outros afundam
porque os parceiros não conseguem ou não querem chegar ao
topo e entender o que os está guiando inconscientemente e ao seu
relacionamento.
Claro, para evitar esses conflitos, você pode renunciar ao “click”.

Por trás do “click”  57


Dividir metas e valores, respeito mútuo e admiração, boa comunicação,
atração física e se divertir com a companhia um do outro pode ser
quase o suficiente para um belo casamento. Enquanto uma relação
assim pode, inicialmente, ser menos intensa do que aquela feita a
partir de uma escolha inconsciente, ela pode ser tão boa quanto e
muito mais fácil. (Eu conheço algumas pessoas que estariam melhor com uma
noiva ou noivo por correspondência do que com os parceiros que elas continuam
escolhendo).
Entretanto, se você quer um “click”, prepare-se para lidar com
questões profundas. A solução – e a solução para a maioria das
dificuldades conjugais – será fazer tudo o que puder para preencher
as necessidades emocionais de seu parceiro (supondo, ao menos, alguma
reciprocidade). Compartilhar de forma incondicional não apenas gera
amor (como você verá no próximo capítulo), mas ajuda a curar as feridas
da infância. Já que é difícil compartilhar quando você está bloqueado
por sentimentos de origem misteriosa.
Está claro o que tudo isso significa em sua preparação para o
casamento:Você deve abordar o casamento com um saudável realismo
e respeito por sua complexidade – que pode incluir conhecer a si
mesmo de forma mais profunda. Como o psicólogo Harville Hendrix
escreve em “Viver com mais amor” (“Getting the love you want”, Difusão
Cultural) – um livro cujo título “popular” desmente seu conteúdo –,
“mesmo que você não perceba todo o potencial (de uma intimidade, de
alegria, de uma união duradoura), não depende de sua habilidade para
atrair o par perfeito, mas sim, de sua boa vontade para conhecer mais
sobre seu próprio lado oculto”. Por enquanto, um bom casamento
pode ser a cura. Fazer de você alguém pleno não é responsabilidade
de seu cônjuge – mas sim, sua. Estando ciente de suas feridas antigas e
de suas necessidades emocionais antes de você se casar pode reduzir
sua intensidade e você trará menos bagagem e mais compreensão para
seu relacionamento. E buscará alguém com quem casar que seja, assim
como você, mais pleno.
Para se autodescobrir internamente, você deve examinar como
foi sua formação e como ela o afetou. Às vezes, um amigo perspicaz
pode ajudar. Para muitos de nós, entretanto, o caminho mais rápido
e eficiente é procurar a ajuda de um conselheiro profissional, alguém
experiente em ajudar solteiros a se preparar para o casamento. Aceitar
ajuda de alguém não significa que você tem um problema – significa
que você quer uma mãozinha para aprender a viver uma vida mais
feliz e produtiva. Qualquer conselheiro que você escolha deve ser

58  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


licenciado, compatível com sua personalidade, sua cultura e suas
crenças religiosas; alguém com quem você sinta alguma conexão.
Ele ou ela deverá, também, identificar rapidamente suas questões e
ajudá-lo a respondê-las. Sim, isso custa algum dinheiro, mas vai custar
menos do que depois que você estiver casado, quando os problemas se
tornarão duas vezes mais complexos. Levando em conta o quanto as
pessoas gastam para fazer uma linda festa de casamento, por que não
dedicar parte dessa soma para se preparar para casar?
Casamento precisa de raízes e flores em solo fértil de objetivos
compartilhados, respeito e apreciação. Para alguns de nós, este
sucesso também depende da resolução de antigas questões e de se
tornar mais pleno. Com o suficiente esforço e trabalho interno – e,
sempre, muita oração – seu casamento pode ser a experiência mais
profunda e recompensadora que se destina a ser.

Por trás do “click”  59


60  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
PARTE 3
As bases de qualquer casamento ótimo são
hashkafá (perspectiva), que deve ser sólida,
valores bem pensados e uma direção sadia.
Capítulo 4, “Amor e Casamento”, apresenta
alguns pensamentos fundamentais, os quais
você precisará para ter um relacionamento
bem-sucedido. Capítulo 5, “Afirmação da
Feminilidade”, endereçado às muitas e
controversas questões a respeito da mulher
judia e seu papel nos dias de hoje.

 61
62  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
CAPÍTULO 4
AMOR E CASAMENTO

A inda que este capítulo fosse um livro em si, ele não seria
suficiente para capturar todas as dimensões dessa tão
enriquecedora parte da vida, que são amor e o casamento.
O assunto é tão vasto quanto o oceano. Espero que as ideias básicas, a
seguir, despertem uma vida toda de aprendizagem.

O DOM DO AMOR
Há alguns anos, falei a um grupo de estudantes do ensino médio,
vindos de lares não religiosos, a respeito da ideia do amor sob a ótica
judaica.
“Alguém me defina amor”, eu disse.
Ninguém respondeu.
“Ninguém quer ao menos arriscar um palpite?”, perguntei.
Ainda não obtive nenhuma resposta.
“Então, vou lhes propor algo: eu vou definir o amor e aqueles que
concordarem com essa definição levantem a mão, ok?”
Eles mexeram as cabeças, em sinal de concordar com minha
proposta.
“Ok. Amor é o que você sente quando encontra a pessoa certa.”

Amor e Casamento  63
Todos ergueram as mãos. E eu pensei, “Opa!”
E é assim que algumas pessoas enxergam uma relação. Consciente
ou inconscientemente, elas acreditam que o amor é uma sensação
(baseada na atração física e emocional) que, mágica e espontaneamente,
faz com que o Príncipe ou a Princesa Encantada apareça. E, de
repente, facilmente, essa sensação pode espontaneamente degenerar
quando a mágica “não estiver mais ali”. Você se apaixona e você pode
se desapaixonar. A palavra-chave é inércia. Erich Fromm, em seu
famoso tratado “A Arte de Amar” (“The Art of Loving”, Ed. Itatiaia,
1996), observou a triste consequência desse conceito equivocado:
“Não há qualquer atividade ou qualquer empresa que seja iniciada com
tanta esperança e expectativa, e, no entanto, falhe tão regularmente
quanto o amor.” (A primeira edição do livro foi lançada em 1956 – se tivesse
sido escrito nos dias atuais, há grandes chances de que o autor fosse muito mais
pessimista).
Então, o que é o amor – o amor real e duradouro? O amor é o laço
que resulta da profunda apreciação da bondade do outro.
A palavra “bondade” talvez tenha surpreendido você. Afinal de
contas, a maioria das histórias de amor não é feita de casais encantados
com a ética do outro. (“Eu estou encantada por seus valores!”, ele diz a
ela, apaixonadamente. “E eu nunca encontrei um homem tão virtuoso!”,
ela responde.) Entretanto, em seu estudo sobre casamentos bem-
sucedidos na vida real (“The Good Marriage: How and Why Love Lasts”),
Judith Wallerstein relata que “o valor que esses casais depositaram nas
virtudes morais de seus parceiros foi um achado inesperado.” Para a
mente judaica, isso não é nada inesperado. O que nós valorizamos
mais em nós mesmos, nós valorizamos nos outros. D’us nos criou para
nos vermos como bons (daí a nossa necessidade de racionalizar os nossos
erros ou de nos arrependermos deles). Assim também nós procuramos ver
a bondade nos outros. Uma boa aparência física, uma personalidade
cativante, inteligência e talento (tudo isso conta para alguma coisa)
podem atrair você, mas a bondade é o que o move para o amor.
Se o amor vem da apreciação pela bondade, ele não precisa
simplesmente acontecer – você pode fazê-lo acontecer. O amor é
ativo. Você pode criá-lo. Basta focar no que há de bom na outra pessoa
(e todos têm algo de bom). Se você pode fazer isso facilmente, vai amar
facilmente.
Certa vez, eu estava em um concerto intimista, em que o artista,
uma pessoa profundamente espiritualizada, olhou fixamente para

64  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


a sua plateia e disse, “quero que saibam que eu amo todos vocês”.
Eu sorri e pensei: “Claro”. Analisando a cena agora, passados alguns
anos, percebi que o meu cinismo estava equivocado. Esse homem,
certamente, viu a bondade nos outros e todos os que estavam lá
disseram o suficiente sobre si mesmos para que ele pudesse os amar.
Na verdade, o Judaísmo idealiza um universo assim, feito de amor
incondicional.
Obviamente, há uma grande distância daqui até o amor mais
profundo e pessoal, desenvolvido com o passar dos anos, especialmente
no casamento. Mas ver a bondade nas pessoas é o começo.
Susan aprendeu sobre esse fundamento do amor depois de ficar
noiva de David. Quando ela telefonou a seus pais para lhes contar
a boa notícia, eles ficaram exultantes. Ao final da conversa, sua mãe
disse: “Querida, quero que você saiba que nós a amamos e amamos
David”.
Susan estava um pouco confusa. “Mamãe”, ela disse, hesitantemente,
“eu realmente agradeço seus sentimentos, mas, com toda a honestidade,
como você pode dizer que ama alguém que nunca viu?”
“Nós estamos escolhendo amá-lo”, sua mãe explicou, “porque o amor
é uma escolha”.
Não haveria sabedoria melhor que sua mãe pudesse lhe dar antes
do casamento. Ao focar na bondade, você pode amar praticamente
qualquer pessoa.
Agora que você já está nutrindo sentimentos tão calorosos por toda
a humanidade, como você pode intensificar seu amor por alguém? Na
maneira como D’us nos criou, as ações afetam mais nossos sentimentos.
Por exemplo, se você quiser se tornar mais benevolente, voltar sua
mente para pensamentos benevolentes pode ser um começo, mas dar
tzedaká (fazer caridade) o levará a ser benevolente. Da mesma maneira,
o melhor caminho para sentir amor é ser amoroso – o que significa
compartilhar. Enquanto a maioria das pessoas acredita que o amor leva
a compartilhar, a verdade (como escreveu Rav Eliyahu Dessler em “Kuntres
HaChessed”, seu famoso discurso sobre bondade) é exatamente o oposto:
Compartilhar leva ao amor.
O que é compartilhar? Quando um entusiasmado marido “faz-
tudo” anuncia, todo feliz, para sua esposa (nada habilidosa com os
consertos de casa), “Querida, espere até você ver o que eu comprei para
o seu aniversário – uma furadeira com caixa tripla de ferramentas!” –

Amor e Casamento  65
isso não é compartilhar. Nem tampouco um pai forçando seu filho a
fazer aulas de violino para realizar o sonho que ele sempre teve de ser
um virtuose. O verdadeiro ato de compartilhar, como escreveu Erich
Fromm, segue na direção oposta e necessita de quatro elementos. O
primeiro é cuidado, uma demonstração ativa de preocupação com a vida
e o crescimento do receptor. O segundo é responsabilidade, atendendo
às necessidades dele ou dela, expressas ou não (particularmente, em uma
relação adulta, atender às necessidades emocionais). O terceiro é respeito,
“a habilidade de ver a pessoa como ele (ou ela) é, estar consciente
sobre sua (dele ou dela) individualidade única”, e, consequentemente,
querendo que a pessoa "cresça e se desenvolva como ele (ela) é”. Esses
três componentes dependem, todos, do quarto, compreensão. Você
pode ter cuidado, responsabilidade e respeito pelo outro somente
quando conhecer profundamente ele ou ela.
O efeito de um compartilhar genuíno e direcionado ao outro é
profundo. Ele permite que você penetre no universo da outra pessoa e
revele a você a percepção da bondade dele ou dela. Ao mesmo tempo,
significa investir parte de você no outro, permitindo que você ame
essa pessoa como ama a si mesmo.
Há alguns anos, conheci uma mulher que eu achava muito antipática.
Então, decidi tentar a teoria do “compartilhar leva ao amor”. Um dia,
eu a convidei para jantar. Alguns dias depois, me ofereci para ajudá-
la em um problema pessoal. Em outra ocasião, li algo que ela havia
escrito e falei o que achei e a elogiei. Hoje, nós temos uma relação
calorosa. Quanto mais você dá, mais você ama. Esse é o motivo pelo
qual os pais (que lhe deram mais do que você imagina), sem dúvida, o
amam mais do que você os ama, e você, por sua vez, amará mais seus
filhos do que eles o amarão.
E como o amor profundo e íntimo emana do conhecimento e do
compartilhar, ele não surge da noite para o dia, mas sim, com o tempo
– o que quase sempre significa depois do casamento. A intensidade
que alguns casais sentem antes do casamento é geralmente atribuída a
uma grande afeição, imbuída do sentimento de “ter algo em comum”,
química e antecipação. Talvez essas sejam as sementes do amor, mas
elas ainda não brotaram. No dia do casamento, as emoções estão à flor
da pele, mas o verdadeiro amor deveria estar em seu nível mais baixo,
porque é esperado que ele sempre esteja crescendo, com marido e
mulher dando mais e mais um ao outro.
Certa vez, me encontrei com uma mulher que me explicou o

66  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


segredo de seu casamento se manter feliz por 25 anos. “Uma relação
tem seus altos e baixos”, ela me disse. “Os baixos podem ser realmente
baixos – e quando você está em um momento desses, você tem três
opções: ir embora; ficar em um casamento sem amor ou escolher amar
seu cônjuge”. Dra. Jill Murray (autora do livro “But I love him: Protecting
your daughter from controlling, abusive dating relationships”) escreve que
se alguém engana você, ao mesmo tempo em que diz amá-lo, lembre-
se: “Amor é comportamento, ação”. Uma relação prospera quando
os parceiros estão comprometidos em um comportamento amoroso
contínuo, um compartilhar incondicional – não apenas dizendo “eu te
amo”, mas mostrando isso na prática.
Infelizmente, o ato de compartilhar nem sempre é fácil. Em uma
sociedade autocentrada, egoísta, olhar para fora de si pode parecer uma
virtude, ao passo que compartilhar também significa, prontamente,
correr o risco de ser feito de bobo, de ser enganado. As mulheres, cuja
natureza é a de compartilhar, podem ser particularmente cautelosas a
respeito dessa ameaça.
Após fazer uma refeição de Shabat na casa de alguém, foi pedido
a uma jovem que ajudasse a tirar a mesa. Assumindo prontamente a
defensiva, ela disparou: “Lavar pratos eu não lavo”. (Eu costumava ser
tentada a responder dessa maneira, se os homens não estivessem ajudando, até
que decidi que o jeito deles em não serem prestativos não iria me fazer ser igual
a eles). As possibilidades são as mesmas de uma mulher sentir medo de
ser um capacho em seu casamento.
Já a disputa por “quem será o número um da casa” não é necessária,
se cada parceiro estiver comprometido em olhar para fora, para o
outro.
Eis como o Rabino Shmuel Veffer, durante umas aulas que lecionou
no programa Discovery, em Jerusalém, ilustrou essa situação:
Você e seu cônjuge trabalharam duro neste ano. Agora, têm a
oportunidade de passar longas e merecidas férias juntos, e vocês estão
decidindo para onde ir.
“Eu estou tão cansado, depois de passar 40 horas por semana
naquele escritório”, ele reclama. “Que tal viajar para as montanhas,
para acampar e fazer um pouco de escalada?”.
“Isso são férias?”, ela lamenta. “Depois de cuidar de duas crianças
pequenas o dia todo, eu só quero me esticar em uma cadeira para me
recuperar”.

Amor e Casamento  67
“Eu estive sentado em uma cadeira por meses a fio, e agora tenho
de ficar como um saco de batatas na sala? Eu quero sair, me mexer,
fazer alguma atividade”.
“Andar do meu quarto até a piscina e voltar é uma atividade mais
do que suficiente para mim”, ela devolve.
No final, ambos estão comprometidos e trancados nas cabines
individuais de seu egoísmo. E a negatividade de seu egoísmo arruinou
suas férias – e, pior, os afastou ainda mais.
Mas a situação poderia ser diferente:
“Você parece cansada”, diz ele à esposa, cheio de compaixão.
“Talvez devêssemos ir a um resort tranquilo e bacana”.
“Parece maravilhoso”, ela responde, “mas depois de passar tanto
tempo no escritório, provavelmente você precisa sair e se movimentar.
Por que nós não vamos acampar e fazer um pouco de escalada?”
“Seria divertido, mas não seria demais para você? Eu acho que nós
poderíamos ir a um lugar onde você pudesse relaxar”, devolve ele.
“Você ficaria aborrecido de ficar sentado em um lugar assim.Vamos
fazer algo mais agitado”, ela sugere.
Ao final, vocês dois ainda estão em sua cabine individual, com suas
próprias necessidades, mas estão felizes e recarregaram um ao outro
com energia positiva. E o mais importante: deram um passo gigantesco
na construção de seu amor, ao não perguntar “que vantagens há para
mim nisso?”, mas sim, “no que isso pode ajudar o outro?”.
E já que compartilhar gera amor, também demanda uma identidade
de si mesmo, integridade e consciência de suas necessidades. (E é o
que o previne de que o outro tire vantagem de você). O amor genuíno não
emerge da anulação de si mesmo, mas sim, do desejo de compartilhar
tudo o que você é com o outro. Durante uma viagem de táxi, eu
ouvi uma canção popular, em uma rádio israelense. “Com você eu
sou o mundo inteiro; com você eu sou o universo inteiro”, o cantor
dizia. “Sem você eu sou apenas meia pessoa; sem você, na verdade, eu
sou nada”. “Argh!”, pensei – isso não é amor; é neurose. (E, chocada,
imaginei quantas adolescentes sonham em ter um rapaz cantando esses versos
para elas). Para “perder-se” em uma relação é preciso ter um parceiro
que esteja fazendo o mesmo ou, então, apenas um estará fazendo o
trabalho de compartilhar. Nenhum cenário é bom. Um partilhar sadio
inclui reciprocidade (salvo circunstâncias incomuns) e é sustentado por

68  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


um sólido senso de si mesmo. Em um relacionamento saudável, em
vez de se perder, você se encontra.
Além de saber o que é o amor, precisamos saber o que não é. O amor
não é o remédio para todos os males. Ele não vai lhe dar identidade,
significado ou propósito. Ele (sozinho) não fará de você uma pessoa
melhor. E não fará você completamente feliz. Uma relação com outra
pessoa nunca pode fazer essas coisas – só um relacionamento com
D’us pode. Além disso, o amor não o faz emocionalmente pleno. Ele
não o resgata da mudança ou remove a dor. Ele pode até aumentá-la,
até que você e seu parceiro trabalhem em suas questões. Finalmente,
o amor não é “dramático”, ao menos não no sentido convencional da
palavra.
O amor pode, entretanto, ajudá-lo a se sentir centrado e em casa
no mundo, inspirar crescimento e contribuir, significativamente, para
a felicidade. Com o trabalho certo, ele pode curar. E enquanto o amor
possui excitação e paixão, há ainda mais prazer no drama silencioso de
suas almas se movendo cada vez mais próximas. Esse profundo senso
de paz e crescente unicidade é, talvez, a recompensa mais maravilhosa
do amor.

A ESTRADA PARA A UNICIDADE


O casamento é a moldura na qual o amor pode se desenvolver.
Como a união final das almas, um bom casamento cultiva um poderoso
e inigualável sentimento de pertencimento, plenitude e compleição.
O que esta suprema mitsvá (preceito) oferece de satisfação profunda é
um dos mais maravilhosos presentes de D’us.
No entanto, um casamento, assim como o amor, é cercado de
expectativas falsas. Elas estão enraizadas, em parte, na frequente e
inconsciente esperança de que o casamento vá consertar os problemas
de infância do outro (como dito no Capítulo 3). Elas também estão
fincadas na mídia, que “vende” os relacionamentos – e a própria vida
– como um carrossel de paixão e diversão infinitas. E, é claro, há
aquele final com toque de eternidade, o qual nós refutamos em nosso
intelecto, mas que acaba atingindo nossos sonhos inconscientes: “E
eles viveram felizes para sempre”. (Eu evito ler esse tipo de história para
meus filhos; eu prefiro algumas do tipo “The Paper Bag Princess”, na qual, depois
de enfrentar um dragão e resgatar seu amado príncipe, a princesa percebe que o
moço não passa de um chato e preguiçoso e, então, eles não se casam. Qualquer

Amor e Casamento  69
coisa é mais realista do que o “Felizes para sempre”).
Assim, se o casamento não é o sonho que pensávamos que fosse;
o que ele é, ao final das contas? Como o amor, ele é muito mais
fundamentado e real, enquanto elevado: Casamento é a união espiritual
de duas pessoas que querem dividir suas vidas e atingir objetivos em comum.
“Atingir objetivos em comum” pode soar menos romântico e mais
apropriado entre sócios de uma empresa. Mas esses objetivos são
profundos. Eles incluem amor, crescimento espiritual e emocional,
além do sentimento de unicidade com seu cônjuge.
Ao mesmo tempo, casamento é maior do que seu relacionamento
pessoal. Em um artigo intitulado “The End of Courtship” (The Public
Interest, Winter 1997) o autor, Leon Kass, atribui o fracasso do
casamento, entre outros fatores, à falta de “aspirações transcendentes”.
Um casamento com foco exclusivo no “sentir-se bem juntos” está
fadado ao sofrimento, porque nunca pode fornecer o constante
retorno emocional que se espera. Quando você vive por algo além
de sua própria felicidade – como a construção de uma família, ser
parte de uma comunidade e ajudar os outros (tudo isso faz parte do
serviço a D’us) – questões pessoais estarão menos propensas a destruir
a relação.
Isso não quer dizer que você não deva ser feliz. Mas a felicidade
no casamento, como na vida, não é um objetivo; é um resultado. Ela
não pode ser perseguida diretamente; ela vem dos atos de fazer o
que o seu verdadeiro “eu” quer. Quando você usa o que D’us lhe deu
para beneficiar os outros, você é feliz. Quando você e seu parceiro
compartilham um com o outro, dentro da gama de objetivos que
inclui ambos e transcendem vocês dois, daí, então, vocês formam um
casal feliz.
Um casamento bem orientado requer tempo e paciência. Eu me
lembro de pensar, durante os três primeiros meses do meu casamento:
“Se marido e esposa devem ser tão próximos, como parte de mim ainda
se sente mais próxima de minha antiga companheira de quarto?”. De
alguma maneira, eu não percebia que eu não estava profundamente
ligada a meu marido como deveria. E não importa o quanto você
esperou por ele, o casamento não é um “ponto de chegada”. Ele é o
início de um longo processo para construir algo junto, cuja recompensa
vem, não no final, mas a cada etapa do caminho.
Atingir objetivos requer esforço. Eu nem deveria dizer isso, mas

70  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


muitos adultos “jogam a toalha” ao menor sinal de que as coisas não
estão indo bem. Eu conheço uma mulher cujo marido disse a ela, logo
depois do casamento: “Bom, parece que não está dando certo. Acho
que nós temos de nos divorciar” – e assim eles fizeram. Até o melhor
relacionamento enfrenta conflitos e insatisfações, mas ambos os
parceiros devem investir em resolvê-los com cuidado e cumplicidade.
É lidando e trabalhando com problemas do passado que um casamento se torna
belo.
O fato de que o casamento dá trabalho implica que seu cônjuge não
será perfeito e tampouco completamente compatível com você. (Essa
última afirmação é garantida pelo fato de que, em última instância, trata-
se de que um é homem e o outro é mulher). Um cônjuge não é a realização
de uma fantasia. Eu perguntei ao mesmo grupo de adolescentes que
acreditava que o amor é um sentimento que você tem: “Quantos de
vocês esperam que a pessoa com quem vocês se casarão irá preencher
suas necessidades emocionais?”. De novo, todos levantaram as mãos
– e, novamente, eu pensei, “Opa!”. Seu par deve compartilhar seu
ponto de vista sobre as questões mais importantes da vida e tornar-
se o seu companheiro mais íntimo. Mas, a não ser que ele ou ela
vistam uma roupa com um grande “S” vermelho na frente, uma capa e
consigam saltar do alto de edifícios em um só pulo, não espere muito.
Talvez você deva procurar professores de alto nível de estimulação
intelectual e amigos do mesmo sexo para entender as questões de
seu cônjuge (apesar dos melhores esforços dele ou dela), que você não
pode compreender. Do mesmo modo, seu companheiro não será um
Super-Homem ou uma Super-Mulher no estudo da Torá, na carreira
ou na cozinha. Nem ele ou ela parecerá top model. (Sem maquiagem, luz
correta e escova nos cabelos, até as supermodelos não parecem supermodelos).
Nada disso significa que você se casou com a pessoa errada. Significa
que você casou com um humano, exatamente como você. Seu cônjuge
não será mais perfeito do que você é, mas como sua alma-gêmea (veja
o final do Capítulo 5), seu cônjuge será perfeito para você.
Além disso, casamento é baseado no realismo e uma coisa que pode
destruí-lo é a mídia. O pior criminoso é a TV. O problema não é só
o que é mostrado nela – belos casais, cujos problemas são resolvidos
na primeira meia-hora do horário nobre – mas o meio por si só. A TV
é, por natureza, feita de ações atrevidas, grosseiras, rasas e rápidas;
qualquer programa que tentasse retratar algo tranquilo, sutil, gradual
ou profundo – como o desenvolvimento de uma relação profunda,
feito ano após ano – iria nos dar sono. Essa limitação faz a TV se

Amor e Casamento  71
distanciar da realidade, o que significa também se distanciar do amor
e do casamento. Com a audiência crescendo, começamos a sentir as
relações superficialmente. (Eu me lembro de uma cena engraçada, no filme
“Muito Além do Jardim”, na qual um solitário jardineiro, cujo conhecimento
do mundo ele adquiriu apenas assistindo à TV, tenta iniciar um romance com
uma mulher, mas ele só consegue se guiar pelas emoções. Não há conteúdo.
É extremo, mas há uma forte mensagem aqui). Se você leva a sério o fato
de tratar o casamento e o amor com a mentalidade mais saudável
possível, passe menos tempo em frente à TV e mais no mundo real,
onde os relacionamentos reais acontecem. (Eu deixei de assistir à TV aos
18 anos, depois de ler um livro chamado “Four Arguments for the Elimination
of Television”, de Jerry Mander, que me convenceu a tirá-la da minha vida.
Esta foi uma das melhores coisas que eu poderia ter feito pelo meu futuro
casamento).
Enquanto você decide sobre quanto ainda vai assistir à TV, você tem
de resolver a respeito de outras influências em seu casamento, como
o relacionamento de seus pais. Um mau casamento ou um divórcio
podem produzir estragos em sua família (e, assim como qualquer outro
trauma de infância,vale a pena trabalhar seus sentimentos com um profissional).
Mas você não está, de forma alguma, condenado ao destino dos seus
pais, se você se preparar para seu próprio relacionamento e trabalhar
sobre ele. No livro “The Good Marriage: How and Why Love Lasts”, de
Judith Wallerstein, a maioria dos casais entrevistados que se dizia feliz
descreveu o casamento de seus pais como infeliz. Por outro lado, se o
casamento de seus pais é bem-sucedido, isso não quer dizer que você
vai seguir suas pegadas naturalmente; muitas pessoas de lares intactos
se tornam estatísticas de divórcio. E, embora seu passado afete seu
futuro, ele não pode determiná-lo – só D’us e você podem. A opção
pela sabedoria e pelo crescimento lhe dará força para, com a ajuda de
D’us, criar o casamento que você quer.
Exatamente como o amor, um bom casamento é algo que você faz
acontecer. Seu desenvolvimento pessoal e a boa vontade em fazer funcionar
afetará seu sucesso muito mais até do que com quem você escolheu se casar.
Como um rabino certa vez disse, “O que faz um casamento funcionar?
As habilidades para fazê-lo funcionar”. Compartilhar, comunicação,
respeito e desejo de crescer – esses são os alicerces para uma união
sólida e feliz.
O aspecto mais relevante para uma bem-sucedida e duradoura
relação é a unicidade entre marido e esposa. Unicidade significa que
o casal se enxerga como um só, com cada parte atuando e sentindo-se

72  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


em alinhamento com o outro. Além de amor e intimidade emocional,
um ponto crucial para ajudar na unicidade é a exclusividade. A
exclusividade significa erguer as barreiras necessárias para preservar a
privacidade e a excepcionalidade de seu relacionamento.
Fran era amiga de Craig quando ela conheceu seu futuro marido.
Agora que ela está casada redefiniu aquela antiga amizade: “Eu não sou
mais amiga de Craig – meu marido e eu somos amigos de Craig. Eu sou
parte de um casal e não quero manter uma amizade com alguém do
sexo oposto independente do meu marido. Eu cedi. Para ajudar, meu
marido não é ciumento nem inseguro – as coisas são mais sadias desse
jeito. Foi um pouco duro para Craig no início, mas ele entendeu”.
Particularmente em suas interações com o sexo oposto, cada passo
saudável que você dá nesta direção (“Nós podemos ser amigos até este
nível, não mais”) é um ato de amor para com seu cônjuge, tornando
seu casamento um lugar sagrado, reservado apenas para vocês dois.
A essência da unicidade, entretanto, é a identificação mútua. Isso
significa ver seu cônjuge como parte de você, dividindo seus medos
(como o disse o Rav Arieh Levine ao médico, “O pé da minha mulher
nos dói”) e alegrias. Significa reconhecer que o que a (o) machuca o (a)
machuca também, cuidar dela (dele) é cuidar de você mesma (o).Assim
é o mandamento do casamento. Ou melhor, como traz o livro “Bate-
papo, um Guia para Discussões Que nos Façam Refletir”, de Nechemia
Coopersmith (Ed. Sefer, 2010): “Eu não estou comprometida com
minha mão; eu sou minha mão, e minha mão é eu.” E só algo como
uma gangrena poderia fazer com que você amputasse um membro,
somente algo grave e incurável deveria ser capaz de fazer com que
você colocasse um ponto final no seu compromisso com seu cônjuge.
Identificação mútua também significa sacrificar um pouco de sua
independência e de seus desejos em nome de sua união. Conheço um
homem, cujos negócios o faziam viajar para longe, com frequência.
Sua mulher se sentia muito sozinha, mas ele adorava seu trabalho e se
recusava a mudar de emprego. Isso não é um casamento. Assim como
a dança requer sincronia, o casamento significa fazer de tudo, tendo
em mente a felicidade de seu parceiro.
Entretanto, uma vez que vocês se casam e se tornam um, cada
parte individual de vocês não desaparece. Um “nós” é construído
sobre dois “eu”’s, não dois ninguém. Quem vocês continuam a ser e
com o que vocês contribuem como indivíduos é o que dá força para
sua unicidade. Ao mesmo tempo, a inclusão neste grande todo faz

Amor e Casamento  73
cada um de vocês ser muito mais do que vocês eram.
Apesar de todo esse realismo, o casamento é algo com um quê
de sobrenatural. Sua fórmula não é, um mais um igual a dois ou duas
metades igual a um todo. É um mais um igual a Um. É como misturar
as cores vermelha e azul e originar o roxo e ver todas as três cores
simultaneamente: cada uma de suas personalidades mais seu destino
compartilhado.
Contudo, o amor e o casamento são uma jornada espiritual com
destino à transformação e ao crescimento. Assim, embarque nela com
sabedoria. Entretanto, a estrada pode ser, às vezes, acidentada. Mas,
se vocês sabem seu destino e estão prontos para trabalhar para chegar
lá, a jornada pode ser profundamente recompensadora.

74  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


CAPÍTULO 5
AFIRMAÇÃO DA FEMINILIDADE2

Quando eu ainda era solteira e tinha acabado de me tornar religiosa,


um assunto que levava a muita discussão entre minhas colegas e eu era
o papel de cada gênero (homem e mulher) no casamento. Em busca
de respostas, minha amiga Shira recorreu a uma mulher religiosa e
bastante inteligente, mãe de muitas crianças, para saber como ela via
essa questão.
“Eu levo a minha casa do meu jeito”, a mulher disse: “Isso deixa
meu marido com todo o tempo livre para estudar e ensinar Torá”.
Shira esperava por uma resposta diferente. “Eu sou muito ligada à
feminilidade”, ela disse. “Mas eu nunca poderia viver assim, com uma
divisão tão exata de papéis. Eu tenho muitas necessidades intelectuais,
que não combinam com os cuidados da casa e das crianças. E eu não
quero que meus filhos cresçam educados por uma babá. Assim, preciso
de um marido que seja mais envolvido com as tarefas de casa”.
A mulher balançou a cabeça negativamente. “Nem você ou seu
marido vão atingir seus respectivos potenciais sendo ‘pau pra toda
obra’. Para isso, você tem de se especializar. Seu marido deve ter a
especialidade dele e você, a sua”.
Shira ficou deprimida. “Isso até que faz sentido”, ela admitiu depois,
“mas e se a sua realidade pessoal não se encaixa nesta realidade?”.

2 Nota: Este capítulo não é só para mulheres

Afirmação da Feminilidade  75
Shira casou-se com um homem com quem pôde construir a vida
que queria, apesar de estar assustada com a ideia tradicional de ser
uma dona de casa todo o tempo ou de ao menos trabalhar para que
seu marido pudesse estudar Torá. Por um longo período, ela oscilou
entre sentir-se “um peixe fora d’água” e ressentir-se deste sentimento.
Rebeca era uma dona de casa com duas crianças pequenas, quando
seu marido, um professor de Judaísmo, levou a família para Israel,
para um ano sabático, só de estudos. Durante uma visita à minha casa,
ela parecia infeliz. “Eu não acho que meu marido me respeite”, ela me
disse. “Ele vê este ano como uma oportunidade de desenvolvimento
intelectual e sempre vai às aulas. Eu também frequento algumas, mas
depois de 1 ou 2 horas estou pronta para voltar para casa e cuidar das
crianças.”
“E qual é o problema?”, perguntei.
“Bem, eu não achei que isso fosse um problema, mas meu marido
acha. Outro dia, ele me perguntou: “Você não quer fazer algo a mais
em sua vida? Não quer crescer?”. “Mas eu adoro ler livros novos para
meus filhos, assar cookies com eles, ensinar hebraico a eles e brincar
com eles – e eu sinto que estou crescendo sendo mãe em tempo
integral.”
Ela me olhou com tristeza. “Eu costumava me sentir bem comigo
mesma, mas, ultimamente, tenho pensado – será que estou perdendo
alguma coisa?”.
Não são apenas as mulheres judias que enfrentam esses dilemas.
Algumas abraçam a vida doméstica. Outras pulam fora dela. Outras,
ainda, conseguem equilibrar as tarefas domésticas com a carreira.
Mas, com o mundo secular e a sociedade judaica emitindo alto
e frequentemente mensagens autocontraditórias sobre quem as
mulheres devem ser, algumas ficam confusas.
Homem ou mulher, seus sentimentos a respeito do papel da
mulher judia vai afetar – e muito – a escolha daquele (a) com quem
você vai se casar, a relação que ambos vão construir e as recompensas
que o casamento e a família trarão para vocês. Assim, seja qual for seu
ponto de vista em relação a esse ponto, a seguinte perspectiva sobre a
feminilidade judaica pode ajudá-lo (a) a apreciar-se – e, se necessário,
negociar – as frequentes necessidades conflituosas da mulher atual.

76  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


TRADIÇÃO3
O que o Judaísmo e a tradição judaica dizem sobre a mulher e seu
papel no mundo?
A Torá fala da criação da mulher com o seguinte verso; “E o Eterno
D’us disse: ‘Não é bom que o homem fique sozinho; Eu farei para ele
uma ajuda para se igualar a ele” (Bereshit, 2:18). A mulher é concebida
para ajudar o homem. Ser a “ajudante” de alguém evoca todas
aquelas desagradáveis palavras com “sub” – submissa, subserviente,
subordinada, subjugada –, que implicam inferioridade.
Mas esse é o verdadeiro significado de “ajuda”? Vejamos o maior
Auxiliador de todos: D’us. D’us não é inferior. Se alguma vez você já
pediu algo a D’us é porque sabe que Ele pode ajudá-lo e você precisa de
Sua ajuda. Similarmente, definir a mulher como ajudante do homem
não a coloca abaixo dele. Apenas significa que a mulher pode ajudá-lo
mais do que ele pode ajudá-la, já que o homem tem mais necessidade
de receber ajuda. E assim como D’us ser um “Auxiliador” não O faz
menos importante que você; uma mulher que contribui igualmente
para os objetivos que ela e o marido pretendem alcançar não é menos
importante do que ele.
Além do mais, “ajudante” não significa “servo”. Um servo obedece
ordens; um ajudante tenta fazer o que é melhor para o “auxiliado”.
A palavra hebraica para “se igualar a ele “ (kenegdo) significa,
literalmente, “enfrentando-o”. A mulher deve ficar em oposição ao
homem, vendo-o de seu próprio ponto de vista e decidir como ajudá-
lo – algumas vezes até enfrentando-o.
E que tipos de ajuda uma mulher foi criada para dar? No Gan Eden,
homem e mulher não tinham necessidades físicas. Eles não usavam
roupas e a comida brotava pronta para ser ingerida. Sem trabalho,
o homem não precisava de alguém que cuidasse da casa e nem de
uma secretária. A única ajuda que a mulher podia dar era a espiritual.
Depois do erro fatal de comer da Árvore do Conhecimento do Bem
e do Mal, quando o homem foi amaldiçoado com o esforço físico,
alguém poderia argumentar que a ajuda da mulher foi ampliada para
a esfera material, com atividades como cozinhar os alimentos que ele
plantou para crescer (ou, hoje, que ele comprou). Mas a razão da existência
feminina e a essência da ajuda que ela provê continua a ser espiritual.

3 Devo à minha professora, Rebbetzin Tziporah Heller, o entendimento básico das


mulheres apresentado nesta seção (Tradição)

Afirmação da Feminilidade  77
E mais: desde que a mulher é a ajudante do homem, se não
existissem homens, não haveria a necessidade de mulheres? A resposta
para esta questão, está expressa em um famoso Midrash, que nos leva a
um profundo entendimento do papel da mulher.
Quando nós éramos escravos no Egito, a Torá nos conta que o
Faraó decretou que todos os recém-nascidos do sexo masculino
fossem jogados no Rio Nilo. O Midrash (Yalkut Shimoni, Shemot,
2:165) conta que nosso líder à época, Amram, decidiu não trazer mais
crianças para um mundo assim. Então, ele se divorciou de sua esposa,
Yocheved. O restante dos homens de Israel seguiu seus passos. Mas
Miriam, a filha de 5 anos de Amram, chamou a atenção de seu pai:
“O que você fez é pior do que o que o Faraó fez”, ela disse a ele. “O
Faraó decretou a morte sobre todos os bebês meninos, mas você, ao
se recusar a ter mais filhos, também acabou com todas as gerações
futuras de meninas”.
Amram poderia ter respondido, “E daí? Sem homens, por que
nós precisamos de mulheres?”. Mas ele não o fez; prontamente, ele
voltou a se casar com Yocheved e o restante dos homens fez o mesmo.
E da volta de Amram a Yocheved veio Moshe (Moisés), que nos tirou
do Egito e nos levou ao Monte Sinai, para que recebêssemos a Torá.
Amram entendeu a mensagem implícita de Miriam: que as mulheres são
valorosas por si mesmas. E nossa redenção e surgimento como o povo de
D’us veio desta afirmação do valor intrínseco do sexo feminino.
Claro que o valor de uma mulher pode ser revelado, indiretamente,
por meio de sua influência sobre os outros. Eu conheço uma mulher
sem filhos que ajudou inúmeros jovens deficientes – chegando a sete
de uma só vez. Se você a vir, ela pode nem parecer tão especial. E ela
quer que seja assim. Mas cada criança que ela cuidou é um poderoso
testemunho de sua silenciosa força e de sua grandeza interna.
Assim além de ajudar o homem, a mulher tem sua própria razão
de ser. Talvez as mulheres sejam ajudantes, em um sentido cósmico,
contribuindo com algo de que todos nós precisamos. De fato, “Adam”,
o beneficiário da ajuda da mulher é, segundo o Midrash, entendido não
como “homem”, mas como a humanidade. Assim, como as mulheres
ajudam a humanidade?
Diz a Torá que a mulher foi criada da costela do homem. A costela
protege órgãos vitais, enquanto se mantém invisível, para quem
observa o lado externo do corpo. Esse simbolismo sugere que as
mulheres são as guardiãs da espiritualidade, através da manutenção da

78  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


consciência do invisível e do interno.
Há muito a ser dito sobre encobrimento. O invisível é sempre mais
poderoso. O melhor exemplo, novamente, é D’us. Ele que trouxe o
cosmos à existência, o sustenta a cada momento e está intimamente
ligado a cada aspecto de nossas vidas, o que é totalmente invisível
aos olhos. E enquanto D’us está fora e acima de nós, todos nós
possuímos uma parte de D’us – nossa neshamá (alma). Nosso eu mais
real e contínuo e a força que dirige está por trás das nossas maiores
realizações, está invisível e dentro de nós.
Como uma mulher expressa sua relação especial com o interno?
A pedra angular desta conexão e a marca registrada da mulher é a
tzniut. Erroneamente traduzida como recato, a tzniut não é apenas um
código de vestimenta ou de comportamento. De fato, poucos de nós
compreendem a fundo este conceito.
Tzniut vem da palavra tzin’a, privado. É uma consciência, uma
percepção transformada em ação. Começa com o reconhecimento de
que sua fonte de singularidade e autoestima não está na sua aparência,
nos seus feitos, talentos ou qualquer outra coisa que você possa ver.
Sua verdadeira identidade é quem você é por dentro – sua habilidade
em se aproximar de D’us tornando-se um ser humano melhor. Assim,
tzniut significa saber quando e como manter seu exterior privado,
refletindo seu interior, em vez de suplantá-lo.
Eu li uma história, na qual um grupo de mulheres arranjou um
encontro às escuras para uma amiga, que era professora. Elas avisaram
o homem de que, como uma intelectual, ela talvez vestisse algo bem
conservador. Em vez disso, ela optou por uma blusa bem decotada e
uma saia que marcava o corpo. “Uau!”, disse o homem, “seu cérebro
ficou em casa!?!”.
A sociedade é obcecada pelo exterior. Nós gastamos mais energia
com a aparência do que com a essência. Tzniut nos pede para focar
mais além – além do cérebro, mais em nossa neshamá. Quando nós
não estamos distraídos com o corpo ou com o comportamento, é mais
fácil ver o que está por baixo. Vestir e agir com tzniut desafia os outros
a olharem para além do seu exterior, para o seu interior e os encoraja
a apreciarem quem você realmente é.
O Midrash afirma que, uma vez criada a mulher, D’us disse a ela:
“Tehê ishá tznuá” – “Seja uma mulher que se define internamente”
(Bereshit Rabba, 18:2). Tzniut é uma virtude para ambos os sexos,

Afirmação da Feminilidade  79
mas as mulheres são suas guardiãs especiais (para uma discussão mais
ampla sobre o significado profundo de tzniut, veja meu livro “Além do
Espelho – Um enfoque atual sobre Tsiniut” -, Ed. Sefer, 2002).
Uma segunda expressão significante de feminilidade, fortemente
ligada à tzniut, é cuidar da casa, que significa criar um ambiente
carinhoso e acolhedor para si mesma. Grande parte de nossa vida
transcorre em público, onde nós sempre temos de agir respeitando
regras e critérios, como numa performance ou aparição. O Judaísmo
vê a mulher como alguém dotada das habilidades emocionais
necessárias para construir um lar, um santuário particular, no qual
você se reencontra consigo mesmo.
Assim como muitas ocupações atuais, os cuidados com a casa têm
sido afastados de seu conteúdo espiritual. Entretanto, as consequências
da falta de espiritualidade nos cuidados em construir um lar têm sido
particularmente severas. Quando você desespiritualiza a Medicina ou
o Direito, você ainda assim tem uma profissão interessante, regida
pela inteligência e ambição. Mas quando você tira a espiritualidade do
processo de manter um lar, você fica apenas com as tarefas domésticas,
as quais muitos acham extraordinariamente estúpidas e chatas. Fazer
um lar, entretanto, não significa, necessariamente, ser aquele que o
limpa. Fazer um lar significa criar um lugar que nutre o corpo e a
alma.
Cuidar da casa, tampouco, rende salário ou reconhecimento
público. Muito menos algum indício de valor espiritual. Um craque
do futebol ganha centenas de milhares de dólares ao ano, enquanto
aqueles que ajudaram a salvar vidas durante o Holocausto não
receberam nenhum reembolso por isso. Nem as donas de casa. O
mais significante de todos os trabalhos não vem com um salário (ou ao
menos não com um pagamento significante).
E nem faz ninguém famoso. Como Rabino Nachum Braverman
(autor de “The Death of Cupid: Reclaiming the Wisdom of Love, Dating,
Romance and Marriage”) certa vez escreveu, Madre Tereza pode ter até
recebido o Prêmio Nobel por cuidar de doentes, sujos e necessitados
de Calcutá, mas milhões de donas de casa anônimas de todo o mundo
fazem o mesmo em seus lares.
À exceção dos filhos, algumas esposas se ressentem de “servir” a
seus maridos. Há apenas algumas gerações, uma dona de casa servia
a seu marido sem pensar assim, pois sabia que, em troca, ele estava
servindo a casa com algum propósito maior (como prover uma “boa

80  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


vida” para ela e para as crianças). Hoje, talvez, ele esteja servindo nada
mais do que ao seu ego. Assim sendo, por que ela não pode servir a si
própria e jogar no lixo os cuidados com a casa, em troca de algo que
lhe dê mais prestígio? Em um casamento judaico, entretanto, ambos,
marido e mulher, servem unicamente a D’us.
E, o mais importante, o cuidado com a casa não é servidão. É carinho
e bondade para com aqueles com os quais mais nos importamos.
Quando eu me casei, era bem sensível a qualquer conotação de
“servidão”. Uma noite, meu marido estava sentado na sala de jantar
estudando, enquanto eu lia no sofá. Em determinado momento,
percebi que ele olhou para cima, recostou-se e parecia um pouco
hesitante e distraído. Pouco tempo depois, ele voltou ao estudo mas,
em alguns minutos, estava de novo parado e hesitante. Perguntei se
estava tudo bem.
“Só preciso de alguma coisa... como... cookies”, ele disse.
Eu ergui minhas sobrancelhas. “Deixe-me ver se entendi. Você não
quer se levantar para buscar algo para você e gostaria que eu fosse?”
Com a mais fofa e cativante expressão que ele poderia fazer, ele
confessou: “Sim”.
Eu não estava pronta para ir. “Só uma pergunta”. Sabendo que ele
não era um machão (e nem bobo), eu sabia a resposta, mas queria ouvi-
la. “Você quer que eu traga cookies para você porque acha que tenho a
obrigação disso ou porque você quer um pouco de carinho?”
Ele não hesitou: “A segunda opção”.
“Neste caso”, eu disse, “ficarei feliz em trazer”. Eu fui para a
cozinha, peguei alguns cookies e os arrumei em um prato, coloquei
leite em um copo e os trouxe com o meu sorriso mais caloroso. Ele
me agradeceu e voltou a estudar, mastigando feliz. Isso não é servidão.
É amor (E um bom marido saberá retribuir da mesma forma para sua esposa).
Carinho nos traz a outra manifestação tradicional de feminilidade.
Se um lar é onde alguém pode receber amor e aceitação, a atividade
com a qual passamos isso a um filho é a paternidade – e já que as
mulheres sempre escolhem ser as primeiras a cuidar dos demais, isso
quase sempre significa maternidade.
A maternidade é poderosa. Imbuídas de passar os valores judaicos
para a geração seguinte, as mães judias preservam o Judaísmo. Mas

Afirmação da Feminilidade  81
você pode retrucar: as escolas não atuam de modo determinante no
sentido de despertar o interesse da criança para uma vida judaica?
Isso vai depender da qualidade do papel desempenhado pela mãe.
Se maternidade significa prover alimentação e roupa e assegurar a
aquisição de habilidades sócio-acadêmicas, as crianças receberão bem
outras influências. Mas, se a maternidade significa, acima de tudo,
incutir, de maneira amorosa, valores positivos – não apenas ensinando-
os, mas, mais importante ainda, dando o exemplo –, a mãe exercerá
uma influência forte em seus filhos.
Esta educação ocorre em diferentes níveis. Meus pais tentaram
assegurar que seus valores de educação secular, cultural e de conforto
dominassem minha vida. Ao mesmo tempo, eles – em especial minha
mãe – inadvertidamente, me transmitiram convicções muito mais
importantes: de que a vida é cheia de significados, que há moralidade
e que eu deveria sempre acreditar em mim. Isso me impulsionou a
um estilo de vida bastante diferente do deles, mas isso me trouxe uma
tremenda felicidade. Inconscientemente, a influência de minha mãe
foi tão poderosa sobre mim, que sobrepujou, e muito, os valores que,
conscientemente, ela procurou me incutir. (Ela, provavelmente, sente por
não ter me dado o que ela queria – mas eu a amo por me dar o que me deu).
Ainda assim, esse tipo mais profundo e intangível de abordagem
parece estar em declínio. Em 1988, em seu livro “Dr. Spock on
Parenting”, Dr. Benjamin Spock lamentava que as doenças sociais
e as tragédias fossem decorrentes de nossa pobreza espiritual e
declarou que “nossa sociedade está desintegrando-se”. Na mesma
linha, a Rebbetzin Tziporah Heller, uma famosa educadora, certa vez
comentou: “Nos anos 60 e 70, as pessoas vinham para o Judaísmo à
procura de espiritualidade. Hoje, elas vêm à procura de moralidade”.
Grande parte do mundo ocidental, muitas vezes parece uma brilhante
e polida maçã, mas cujo interior está podre. A única saída é reafirmar e
fortalecer a influência interna sobre os filhos. E as mães são essenciais
nesta função.
Reconhecer o valor da maternidade deverá levá-la a refletir sobre a
sua futura vida em família. Se você e seu cônjuge pretendem trabalhar
em período integral, colocar seus filhos em uma creche (ou escolinha)
e dar a eles uma ou duas horas de atenção ao final do dia (se é que você
terá alguma energia restante para isso), por favor, pense duas vezes.
Filhos necessitam de qualidade de tempo, mas também precisam de
quantidade. Ainda que avós amorosos ou babás de tempo integral, que
compartilhem de seus valores, possam ajudar, crianças, em última

82  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


instância, precisam da Mamãe e do Papai. E as crianças não aprendem
os conceitos mais importantes da vida, ou desfrutam de proximidade
suficiente com os pais, por meio de pequenas porções de atenção
concentrada, cada uma delas “supostamente destilando a essência da
boa paternidade”, nas palavras de Judith Wallerstein e Sandra Blakeslee
(autoras de “The Good Marriage”). “Filhos não entendem o conceito
de qualidade de tempo; eles são inocentes o suficiente para clamarem
por ‘tempo, tempo’ – tempo para dormir, tempo para brincar, para
contar história, jogar, apenas ficar junto e nem ver o tempo passar.
Eles não ‘compram’ a chamada ‘paternidade amostra grátis’, não
importa o quanto bonitinha ela pareça, pois eles acham que as ajudas
são poucas e só os deixam mais sedentos por mais”.
Filhos sentem a necessidade de uma presença paterna constante,
pois eles aprendem a maioria das coisas por “osmose” – por estarem
cercados, várias horas por dia, daqueles dos quais podem absorver o
significado da vida.
Tão essencial quanto a presença paterna é os filhos aprenderem quem
eles são. Uma cuidadora de crianças, certa vez me disse: “As crianças
do meu centro são todas bem adaptadas social e intelectualmente. Mas
elas não têm noção exata de si mesmas”. A individualidade decorre de
um lugar definido no mundo e de modelos estáveis.
Filhos também precisam de amor, e os melhores provedores são
aqueles totalmente devotados a eles e que amam a sua singularidade –
em outras palavras, seus pais.
E ainda: a influência interna vem em primeiro lugar e,
principalmente, das mulheres. Uma decisão haláchica, escrita em
meados do século passado pelo Rav Zalman Sorotzkin (de abençoada
memória), afirma que em períodos nos quais é preciso fortalecer a fé,
a educação feminina deve ser nossa prioridade, já que a compreensão
da fé pela mulher é mais imediata do que a do homem e vai influenciar
seus filhos e marido (Moznayim LeMishpat 1:42). Por sua natureza e
como esposas e mães, as mulheres são a chave para o futuro.
A maternidade não precisa – e não deveria – estar restrita à própria
prole. A primeira mulher, Chavá (Eva), foi chamada de “a mãe de
toda a vida”, antes mesmo de gerar seus filhos (Bereshit, 3:20). Além
disso, a maternidade ultrapassa qualquer relação biológica ou adotiva.
Cultivando o melhor nos outros – incluindo seu marido, amigos,
amigos dos filhos, colegas de trabalho, alunos, conhecidos e qualquer
um que encontre – toda mulher pode prover a maternidade de que o

Afirmação da Feminilidade  83
mundo tão desesperadamente precisa.
E, apesar de as pessoas nem sempre apreciarem o que não é visto e
que está interno, D’us aprecia. A história é contada (Baba Batra, 10b)
de um sábio, cujo filho quase morreu e teve uma visão do mundo
vindouro, antes de retornar para este mundo. “Eu vi um mundo de
cabeça para baixo. O mais alto estava embaixo e o mais baixo estava
acima”.
Seu pai respondeu: “Você viu um mundo nítido”.
O mundo de verdade é o oposto deste mundo. No mundo vindouro,
tudo aquilo que a sociedade preza não serve para nada, enquanto que a
espiritualidade, o carinho e tudo mais que nós dispensamos significam
tudo. O mesmo acontecerá com a vinda de Mashiach, o “mundo
vindouro” da História.
Rav Arieh Kaplan (de abençoada memória) afirma que o feminino
representa o futuro4. O papel das mulheres é trazer os valores do
futuro ao presente.

MUDANÇA5
Nós temos visto a importância dos valores femininos tradicionais,
ainda que defendê-los foi mais fácil para nossas tataravós do que o
é para algumas mulheres de hoje. Nosso mundo ainda se recupera
do que, possivelmente, foi a maior revolução social da história: o
movimento feminista, o qual contestou os papéis dos gêneros dentro
da família e na sociedade.
As reações do mundo da Torá ao feminismo sempre foram tanto
“pró” quanto “contra”. Muitos dos chamados “de esquerda” viram o
feminismo como um movimento enviado dos Céus; muitos dos “de
direita” viram-no como uma ameaça. O feminismo trouxe, ainda,
claramente, tanto mudanças positivas quanto negativas. Vasculhar a
confusão talvez ajude a entender de onde veio o movimento feminista.
A compreensão do gênero vem se deslocando por várias gerações
passadas. A inteligência feminina foi historicamente concebida como
4 Todas as citações do Rav Arieh Kaplan são de seu artigo “Male and Female”, que
estão em “Immortality, Resurrection and the Age of the Universe: A Kabbalistic View” (Nova
York: Ktav/AOJS, 1993)
5 Eu dou crédito a uma professora que tive (da comunidade Gever Chassid) pelas
ideias apresentadas nesta seção (“Mudança”). Para uma explanação completa, veja “An Inner
View of Feminism: The Secret of N’Kevah Tsovev Gever”, em www.orot.com

84  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


concreta e deste mundo, adequada, principalmente, para os reinos
terrestres, algo “pé no chão”. A inteligência masculina, por outro
lado, foi vista como algo mais inatingível e abstrata, sugerindo desafios
mentais como o estudo da Torá. As mulheres, além disso, receberam
seu conhecimento sobre assuntos abstratos por meio dos homens, que
desfrutavam de mais status social.
Eu disse status social, porque D’us vê as coisas de maneira diferente.
De acordo com o Seder HaDorot, Rav Yehoshua, um brilhante
estudante de Torá, soube, por meio de um sonho, que seu lugar no
mundo vindouro seria ao lado do açougueiro Nannas. Atordoado, ele
foi tentar descobrir quem era Nannas e, depois de muito procurar, o
encontrou – um judeu simples, extraordinariamente devotado a seus
pais idosos. Ao ver isso, Rav Yehoshua exclamou, “Quão afortunado
eu sou por ter uma porção no mundo vindouro ao lado de Nannas, o
açougueiro”.
Como um grande estudante de Torá, RavYehoshua ocupava uma alta
posição neste mundo. No entanto, cada homem, tanto Rav Yehoshua
quanto Nannas, o açougueiro, havia preenchido seu potencial, dado por
D’us e, portanto, aos olhos d’Ele, eram equivalentes. Similarmente,
apesar de suas diferenças, homens e mulheres são igualmente capazes
de atingir a grandeza espiritual, em seus próprios caminhos.
Mas o “próprio caminho” das mulheres não é sempre o que
costumava ser. Um crescente número delas está se especializando no
pensamento abstrato, tornando-se doutoras nas ciências, matemática,
psicologia e filosofia. Elas também têm atingido novos níveis no
estudo da Torá. E, pelo Judaísmo, nada na História é incidental. A
cada geração, certas energias Divinas cercam nossas vidas (Gaon de
Vilna, Even Shelema, 11:9). Portanto, se as mulheres estão mudando,
as influências espirituais em nosso mundo também estão.
De fato, as mudanças que vemos foram previstas há muito tempo,
como nos revela um olhar em algumas das fontes relevantes da Torá.
A história da Criação nos conta, “E D’us fez duas grandes luminárias”
(Bereshit, 1:16), implicando que sol e lua eram, originalmente,
equivalentes em tamanho. Mas o verso continua, “a maior luz
governava de dia, e a menor luz governava à noite”. O Talmud (Chulin
60b) nos conta que a lua perguntou a D’us, “Mestre do Universo,
podem dois reis dividir a mesma coroa?” – em outras palavras, “Podem
duas luzes, igualmente grandes, coexistirem?”. D’us replicou, “Então,
vá e se diminua”. Depois de tentar, sem sucesso, consolar a lua, D’us

Afirmação da Feminilidade  85
reconheceu sua dor, dizendo, “Traga uma expiação para Mim por fazer
a lua menor”.
Tradicionalmente, a mulher é representada pela lua e o homem,
pelo sol. O Midrash nos conta que o homem e a mulher foram criados
igualmente “luminosos” – a luz sempre representa a Torá (veja Mishlei,
6:23). Inicialmente, a mulher penetrava nas profundezas da Torá, como
o fazia o homem. Mas então ela perdeu um pouco de sua percepção
abstrata, e seu caminho para a perfeição espiritual se tornou mais “pé
no chão”, “terrestre”.
No futuro, entretanto, as mulheres vão recuperar sua luz, como
disse o profetaYeshayáhu (30:26): “A luz da lua será como a luz do sol”.
Na santificação mensal da lua nova (Kidush Levaná), nós rezamos, “Que
seja a Tua vontade... corrigir a falha na lua e que não haja diminuição
dela. Que a luz da lua seja como a luz do sol e como a luz dos sete dias
da Criação, como era antes de ser diminuída”.
Irmiáhu (31:21) é ainda mais explícito sobre as mudanças que
virão ao sexo feminino: “D’us criou algo novo na terra. A mulher
vai envolver o homem”. Rashi, o comentarista da Torá do século 11,
entende, daqui, que a mulher irá cortejar o homem (uma inversão de
papéis interessante). Ele oferece, então, uma explicação ainda mais
intrigante: uma mulher vai envolver no sentido de ser – de se tornar –
um homem. E já que o Judaísmo quer que os homens sejam homens e
as mulheres sejam mulheres, o que isso quer dizer? De volta ao século
1, Targum Yonatan traz uma resposta. De modo fascinante, a tradução
para o aramaico da frase “a mulher vai envolver um homem” é “a nação
da casa de Israel vai estudar Torá”. Diferentemente do termo “benei
Israel”, “beit Israel (a casa de Israel)”, refere-se tanto a homens quanto
a mulheres (como Rashi cita em Devarim, 34:8). No futuro, mulheres,
assim como os homens, estarão envolvidas no estudo da Torá.
Mais detalhista ainda é o famoso comentário chassídico do
século 19, chamado Ma’or VaShemesh (em Shemot, 15:20). Explica o
Ma’or VaShemesh que o nosso mundo é como uma linha. Uma linha
tem um começo e um fim, onde cada ponto precede o anterior,
sucessivamente. Portanto, uma linha simboliza hierarquia. Do mesmo
modo, em nosso mundo, o conhecimento da Torá é hierárquico. Cada
um de nós sabe mais que uma pessoa e menos do que outra, o que
significa que cada um precisa se voltar a alguém que “esteja à sua
dianteira” para adquirir sabedoria. No futuro, entretanto, o mundo
parecerá um círculo, sem começo nem fim, sem “alguém na dianteira”

86  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


ou “atrás”, somente pontos equidistantes do centro. De acordo com
Ma’or VaShemesh, “a mulher irá envolver o homem”, com a “mulher”
representando a humanidade e o “homem” simbolizando D’us. (Embora
D’us transcenda o conceito de gênero masculino/feminino, D’us é um doador
e o doar é, tradicionalmente, descrito como “masculino”, enquanto o receber é
“feminino”). Em última análise, toda alma humana estará como pontos
em um círculo, tendo D’us ao centro. Em lugar de receber sabedoria,
conhecimento de outros, nós aprenderemos diretamente de D’us,
tanto homens quanto mulheres. Assim afirma Irmiáhu (31:33), “E não
mais precisarão ensinar cada um a seu vizinho..., pois todos já Me
conhecem, do mais simples ao mais destacado...”.
Esses profetas e comentaristas estão se referindo à redenção,
à Era Messiânica. E, como a redenção se aproxima, suas mudanças
começam a se infiltrar no mundo para nos preparar (Kuzari, 4:23).
De um modo geral, nós acreditamos que a redenção está próxima
e essas mudanças já começaram. Mulheres estão reconhecendo que elas
podem se desenvolver em áreas nas quais elas raramente estavam aptas
antes. Como o Rav Arieh Kaplan escreveu: “O novo despertar entre as
mulheres é apenas um vislumbre da luz da Era Messiânica”.
Até agora, poderia soar como se o feminismo fosse, de fato, uma
dádiva de D’us. Sem sombra de dúvidas, é por essa razão que o Rav
Kaplan descreve o fenômeno positivo que estamos testemunhando
como “o novo despertar entre as mulheres” e não “feminismo” ou
“movimento feminista”.
Cada energia que vem ao mundo pode ser usada para propósitos
sagrados ou usurpada para o lado oposto. Por exemplo, a Era Messiânica
também trará igualdade econômica, descobertas científicas e o povo
judeu retornará à terra de Israel, tudo isso já começou. No entanto, a
questão da igualdade econômica caiu em mãos erradas e se tornou o
Comunismo. A ciência, que poderia revelar a grandeza de D’us e ser
um benefício para a humanidade, também se tornou uma ferramenta
para o ateísmo e para a destruição em massa. E o retorno a Sion,
de forma miraculosa como ele é, ainda terá de culminar com uma
sociedade baseada na Torá, servindo como uma “luz entre as nações”.
Assim também é a mudança para as mulheres. Apesar de trazer
muitos benefícios, ela também deu margem ao surgimento de
ideologias nada saudáveis. Enquanto as mulheres agora desfrutam
de mais oportunidades profissionais e de liberdade pessoal, elas
também são vítimas da objetivação, de expectativas masculinas e da

Afirmação da Feminilidade  87
desvalorização da interioridade. Como resultado, algumas mulheres
se sentem autorrealizadas e plenas, outras são infelizes e despedaçadas
(como documentado, por exemplo, por Mary Pipher em “O Resgate de Ofélia”,
e por Elizabeth Perle McKenna em “When Work doesn’t Work Anymore”).
Talvez, o Rav Kaplan estivesse, de certa maneira, se referindo a esta
dolorosa situação, quando escreveu: “As mudanças cataclísmicas
que acontecerão quando o fim estiver próximo irão resultar em um
deslocamento considerável, sempre referido como chevlei Mashiach, as
dores do parto de Mashiach”.
Da mesma forma, o mundo da Torá teve perdas e ganhos com o
movimento das mulheres. Em esferas mais liberais as quais deram boas-
vindas ao feminismo, mulheres agora se beneficiam do estudo avançado
da Torá e têm uma participação mais ampla na vida judaica, ainda que
o outro lado do feminismo não seja conhecido aí. Em resposta, os
meios mais conservadores tomaram grandes medidas para defender
e fortalecer o papel feminino tradicional. Ao fazê-lo, no entanto,
alguns sentem que têm tendência a rejeitar qualquer inovação positiva
que pudesse ser classificada como feminista. Consequentemente, a
comunidade judaica está precariamente dividida sobre as questões
referentes às mulheres.
Acima de tudo, o feminismo deixou alguns judeus em conflito
com a imagem e, mais importante, com a autoimagem. Por um lado,
aqueles que defendiam a igualdade feminina no Judaísmo acusaram o
rabinato de resistir a ela. Esse ataque gerou confusão, autodúvida e uma
erosão sutil do orgulho judeu dentro dos segmentos da comunidade
observante.
Não obstante, acredito que nós podemos abraçar essa mudança
de um modo autenticamente judaico: com uma inabalável lealdade a
ambos, tanto à palavra quanto ao espírito da Torá (como entendida pela
geração de nossos líderes e sábios) e aos valores femininos, tão necessários
à nossa sobrevivência espiritual.

TRAZER ISSO PARA NOSSO LAR


E o que isso tudo tem a ver com a preparação para o casamento?
Antes de assumir um compromisso com outra pessoa, você deveria
analisar essas questões, porque elas irão afetar de maneira decisiva a
sua vida e a sua felicidade.
Eu tenho tentado influenciar seu pensamento a percorrer os

88  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


seguintes pontos:
Primeiramente, desfazer a ideia de que os valores femininos
tradicionais nos colocam em risco espiritualmente. Apesar de que a
lua irá recuperar sua luz, ela continuará a ser lua, inalteravelmente
distinta do sol. Mulheres, como mulheres, têm uma contribuição
única a dar, e o mundo depende disso. A consciência interna é a alma
da humanidade, proporcionando a seus filhos a força e a visão de ser
diferente e fazer a diferença.
Em segundo lugar, após afirmar o feminismo, cada mulher tem
o direito de ser quem ela é (assim como cada homem). Se você é uma
mulher tradicional, sabe que está seguindo os passos de gerações de
mulheres judias que criaram nosso destino. Se você é uma pensadora
abstrata, saiba que fontes judaicas previram um crescente número de
mulheres como você – nem mais ou menos valorosas aos olhos de
D’us do que suas versões tradicionais, apenas diferentes. Quem quer
que você seja, case-se com alguém que aprecie você e queira crescer
com você o máximo possível.
Em terceiro lugar, nossa resposta ao feminismo deve ser
altamente discriminadora. O feminismo é “um pacote de misturas”
– provavelmente, porque, como já disse, algumas de suas partículas
potencialmente sagradas foram transformadas em energia destrutiva.
Nós devemos, com muito critério e bom senso, selecionar o bom do
mau (sempre com as orientações rabínicas), acolhendo o que é sagrado e
rejeitando o que não é.
Finalmente, a verdadeira mudança exige paciência. Como escrevi,
este período da História tem sido chamado de “as dores do parto de
Mashiach”, e, como nós parecemos estar no difícil e semifinal estágio
de transição do parto, neste ponto, o nascimento é iminente. E, como
uma mãe, sentimos uma incontrolável necessidade de empurrar o
bebê para fora. Mas a necessidade é prematura, daí, ela deve esperar.
Hoje, em virtude da explosão da igualdade feminina, há um grande
desejo de empurrar para frente. Como um nascimento, no entanto,
a mudança emergirá, completamente, apenas quando e como D’us
quiser.
Enquanto isso, nós devemos ser quem somos. Nós podemos
encorajar ambos, homens e mulheres, a afirmar sua individualidade
e expressá-la no casamento. E, no mundo judaico, como um todo,
nós podemos promover, de maneira sadia e gradual, a adaptação das
novas necessidades intelectuais e espirituais das mulheres, enquanto
fortalecemos tudo o que as grandes mulheres judias de nossa História
fizeram. Por este mérito, que apressemos a revelação daquela luz no
horizonte.

Afirmação da Feminilidade  89
90  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
PARTE 4
SER PRÁTICO
Depois do crescimento pessoal e de
entender o que é amor e casamento, casar
requer prática. Você quer achar a pessoa
certa de maneira tão eficiente e indolor
quanto possível. Capítulo 6: “Lidando com
sua cabeça” explica o “encontro” judaico
e como fazer com que ele funcione para
você. Capítulo 7: “Fique longe de abuso”
ensina a evitar o casamento com uma pessoa
de personalidade agressiva e identificar um
potencial cônjuge amoroso.

 91
92  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
CAPÍTULO 6
“LIDANDO COM SUA CABEÇA”

S air com alguém para casar é algo complexo. Enquanto D’us,


em última análise, faz duas pessoas ficarem juntas, você deve
investir no esforço para encontrar sua alma-gêmea. E, mesmo
que você sinta aquele “click” por alguém (veja Capítulo 3), você terá de
decidir, com sua lógica, se este é seu par perfeito. E, ainda que você
deixe as coisas “ao acaso”, seu coração pode empurrar sua mente para
fora da caixa.
Jay havia acabado o primeiro ano na faculdade de Medicina e me
contou, cheio de tristeza, que também havia terminado a relação de
mais de um ano com Melissa.
“Eu cresci em uma comunidade rica, fora de Nova York, onde
eu, basicamente, tinha tudo o que queria. Me davam de tudo. Mas
eu sempre fui um idealista e muito independente, e, naquela época,
quando me formei no colegial, sabia que não queria o estilo de vida
dos meus pais. Em vez disso, decidi estudar Medicina e cuidar dos
pobres de países do Terceiro Mundo.”
“A vida de Melissa”, continuou Jay, “era totalmente o oposto. Ela
sempre tivera de lutar por tudo o que conseguiu. Ela solicitou uma
quantidade enorme de empréstimos para financiar seus estudos e está
trabalhando duro para se manter na escola. Ela também é muito ligada
à sua família. E ela não conseguiria me acompanhar à África ou ao
sudoeste da Ásia; ela não quer isso. Seu sonho é encontrar um trabalho
em um subúrbio confortável, perto de seus pais, pagar suas dívidas e

“Lidando com sua cabeça”  93


seguir seu próprio caminho. Ela quer, acima de tudo, respirar livre de
preocupações, pela primeira vez na vida”.
Eu estava abalada. “Quando você descobriu esse problema?”,
perguntei.
“Lá pelo nosso quarto encontro, quando começamos a falar sobre
o que cada um planejava fazer de sua vida. Mas, como nós já estávamos
emocionalmente envolvidos, deixamos esse assunto em banho-maria.
Nós achamos que se tivéssemos algo real, isso funcionaria de alguma
maneira.”
“Nos meses que se seguiram, nossa relação ficou mais séria. A
‘questão’ continuava vindo à tona, mas toda vez que isso acontecia,
a varríamos para debaixo do tapete. No final do ano, nós não
encontramos saída. Nossas vidas tomaram direções diferentes. E,
então, tivemos de decidir: ou ficaríamos juntos pelos próximos três
anos e romperíamos quando nos formássemos, ou terminaríamos
agora. Ao final, rompemos.”
Quando Jay falou de novo, sua voz estava cheia de dor. “Nós
acreditamos que o amor supera tudo. Acho que estávamos enganados.”

“NÓS PODEMOS LIDAR COM ISSO?”


Um dos erros mais graves do namoro é se ligar emocionalmente a
alguém antes de saber se vocês são, fundamentalmente, compatíveis.
Não importa o quanto vocês estão caminhando para ser um casal, uma
diferença grande pode privá-los de um futuro juntos.
Seu parceiro talvez ame o estilo de vida nova-iorquino, mas o
seu sonho é fazer aliyá (imigrar para Israel). Ele quer uma mulher
que trabalhe, para que ele possa dedicar-se ao estudo da Torá, mas
você quer ficar em casa e cuidar das crianças, enquanto seu marido
provê a renda. Algumas questões não são conciliáveis e o resultado
é a separação e muita dor, levando-os à estaca zero na busca de um
relacionamento duradouro.
“Mas se duas pessoas se amam o suficiente para quererem casar,
elas não podem assumir esse compromisso?”, você pode perguntar.
Nem sempre. Você não pode viver, ao mesmo tempo, em Nova York
e em Israel e, a menos que ele seja muito rico, um homem, em geral,
não pode estudar Torá o tempo todo, sem a ajuda financeira de sua
mulher. E, quando estão comprometidos seriamente, eles não podem

94  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


deixar existir qualquer resíduo de infelicidade, o que corrói um
casamento. Ao invés de soluções viáveis eles talvez se desesperem,
depois do casamento, na tentativa de preservar um relacionamento
que nem deveria existir.
Quando duas pessoas devem se comprometer? Se ambos são
maduros, você e seu cônjuge devem estar prontos para trabalhar juntos,
seja em questões simples, como dormir de janela aberta ou fechada,
seja na hora de decidir o destino de suas próximas férias ou como vão
gastar seu dinheiro. Mas nenhum de vocês pode se comprometer indo
contra suas crenças e aspirações básicas. Você não pode desistir de quem
você é pelo outro. E nem deveria querer que o outro o faça por você. O
amor não é apenas amar a personalidade do outro. Como dissemos no
Capítulo 4, é também apreciar as virtudes do outro – o que inclui amar
seus princípios e ambições, amar seus sonhos e querer que ele (a) os
realize. Se seus valores e objetivos são muito diferentes, vocês talvez
até se amem, mas não estão aptos a viverem juntos.
Claro, não comprometer quem você é presume que você é alguém
e que se ama. Eu conheço um rapaz, cuja namorada terminou com ele
porque ele não compartilhava dos ideais espirituais dela. Arrasado,ele
prometeu que faria “qualquer coisa” para tê-la de volta, começando
com o fato de deixar de lado seus valores objetivos e seu estilo de vida,
passando a adotar os dela. Ela estava exultante. Eu, não. Qualquer um
que desista de tudo por alguém se torna um ninguém e estar com
um ninguém não é nada animador. Se você se imagina negociando
suas convicções por um relacionamento ou espera, entusiasmado,
que alguém o faça por você, pondere. Uma pessoa com autoestima é
alguém que quer se casar com outro alguém. Não com um ninguém.
Uma das questões sem saída (como mencionado ao final do Capítulo
2) é a religião. Às vezes uma pessoa que se tornou recentemente mais
observante no Judaísmo ou que há muito tempo está tentando se
tornar mais observante, se envolve com alguém menos religioso, na
esperança de que ele (a) “faça a mudança”. Entretanto, pensamentos
desejosos não criam realidades. E o compromisso talvez deixe o
parceiro mais triste e solitário; e o menos religioso, ressentido.
Há alguns anos, participei de um programa educacional para
adultos judeus. Dentre os inscritos, estava um jovem que havia acabado
de fazer teshuvá (tornar-se observante) e sua namorada de algum tempo,
que não era religiosa. Ela via com muita má-vontade o crescimento
espiritual dele, mas, mesmo assim, ele a trouxe para o seminário,

“Lidando com sua cabeça”  95


na esperança de que ela se inspirasse e seguisse o mesmo caminho
dele. Mas isso não estava dando certo e tudo começou a desmoronar
rapidamente.
Na tarde de Shabat, no saguão do hotel, eu testemunhei seu
rompimento. Em lágrimas, a jovem se dirigia à porta de saída, com sua
bolsa a tiracolo. “Espere!”, seu ex-namorado gritou para ela. “Se você
deixar o hotel carregando esta bolsa, estará profanando o Shabat!”.
Ela se virou e o encarou: “Que diferença isso faz agora?”.
Eu sempre fiquei imaginando o que teria acontecido, caso
eles tivessem firmado um compromisso e se casado. Eu a imagino
lembrando a ele, cheia de raiva, a cada briga, “eu estou fazendo
essas coisas religiosas só por você”, enquanto ele estaria igualmente
amargurado, pensando no quanto ele viveria melhor sem ela.
Embarcar em um casamento no qual um ou ambos sacrificaram algo
especial pelo outro é procurar por encrenca.
Resumindo, o amor nem sempre conquista tudo. Para construir um
futuro com alguém, sua relação deve não somente parecer certa, mas
ser certa. Esse fundamento deve ser mais do que emocional. Então, por
que sair com alguém sobre quem você sabe tão pouco? Por que não,
primeiramente, descobrir se seus valores e objetivos são compatíveis?
E, assim sendo, nós temos o que é conhecido como shiduch
(“combinação”) como sistema de encontro.
Talvez você não faça boas associações ao termo shiduch. Talvez você
tenha assistido a “Um Violinista no Telhado”, no qual a trêmula e idosa
casamenteira diz, “ela é feia e ele é cego, portanto, formam o par
perfeito!”. Há ainda a versão moderna e igualmente absurda: “Ele tem
24 anos; ela, 22. Ambos são altos e americanos.Vamos apresentá-los!”.
Deixando as paródias de lado, vamos falar sério.

ENCONTRO INTELIGENTE
O encontro de shiduch tem quatro características.
Em primeiro lugar, ele atesta que vocês estão prontos para se casar.
O que significa que vocês estão razoavelmente maduros, sabem quem
são e têm alguma ideia de seus objetivos e o tipo de pessoa com quem
querem se casar. Vocês também sabem o que é negociável e o que
não é. Esse conceito de racionalizar até o ponto de ter uma “lista” de

96  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


qualidades que você procura em alguém, talvez não agrade a todos.
(É engraçado como racionalizar as relações nos incomoda, como se usar nossa
mente significasse que você não tem coração). Se você é honesto, porém,
vai admitir que há um “check-list” um tanto distorcido em sua mente –
e o shiduch pede que você o clareie.
Em segundo lugar, um shiduch é arranjado através de uma terceira
pessoa. Ele ou ela deve entender você, ser bastante sábio e perspicaz,
e capaz de apresentá-lo a alguém que lhe seja fundamentalmente
compatível. (Excluem-se aí as pessoas bem-intencionadas, ansiosas para vê-lo
casado, passando por cima de sua habilidade em discernir quem é apropriado
ou não). Seu círculo de potenciais “casamenteiros”, portanto, pode,
ou não, incluir parentes, irmãos, amigos, professores, pessoas da
comunidade, Rabinos, esposas de Rabinos, entre outros. Após um
encontro, essa terceira pessoa pode também atuar como uma ponte,
relatando as impressões de um para o outro. Assim, ninguém precisa
sofrer uma rejeição cara a cara antes que a relação decole. Essa terceira
parte pode também solucionar os problemas. Um homem que
conheço voltou de seu primeiro encontro com uma jovem que, para
seu desespero, não parou de falar durante duas horas. “Provavelmente,
ela estava nervosa”, disse-lhe a mulher que arranjou o encontro. “Tente
sair mais algumas vezes”. E ele assim o fez e, no terceiro encontro,
estavam conversando normalmente. Hoje, estão casados e felizes.
Em terceiro lugar, antes e durante os encontros, seu “casamenteiro”
ou outra pessoa que você indicar irão em busca de indícios de um
parceiro em potencial. Nos meios mais tradicionais, os pais são
especialmente ativos na coleta dessas informações; se os seus não o
são, você deve ser. Aqueles que conhecem o seu (a sua) pretendente há
mais tempo ou em contextos diferentes podem trazer um retrato mais
fiel dele (a), clareando qualquer coisa na relação. (Abordaremos sobre o
assunto mais adiante).
Finalmente, o encontro de shiduch não inclui toques – deve-
se ser shomer neguiáh. Enquanto isso seria ridiculamente difícil, se
você pretendesse sair com ele por alguns anos, este autocontrole é,
definitivamente, possível em um período mais curto, em uma relação
direcionada ao casamento. Claro que alguns ainda insistem que “tentar
ir além” ajuda a determinar a compatibilidade no casamento. Todas
as evidências indicam que eles estão completamente equivocados,
por sua rasa e triste concepção de sexualidade. A verdadeira sexualidade
expressa não apenas quem você é, mas seus sentimentos por seu parceiro e a
qualidade de sua relação. Nem as positivas ou negativas experiências

“Lidando com sua cabeça”  97


pré-maritais podem predizer o futuro, pois sem o amor e a intimidade
emocional - que vêm com o casamento - seu verdadeiro eu sexual não
pode vir à tona.
Embora possa soar estranho, postergar o contato físico é, na
verdade, a melhor maneira de avaliar a compatibilidade. Ela promove
a objetividade, permitindo que você enxergue o outro sem as ilusões
frequentemente criadas pela proximidade física. Ela força uma genuína
conexão de pessoa para pessoa. (Melhor do que “de corpo para corpo”).
Ajuda a descobrir se você pode apreciar o outro não pelo quanto ele
(ela) a (o) faz se sentir bem, mas por quem ele ou ela, na verdade, é.
Ser shomer neguiáh é, além de tudo, essencial para responder à grande
questão: “Essa é a pessoa com a qual quero passar o resto da minha
vida?” (Todos esses e mais alguns pontos são discutidos ao longo do meu livro
“The Magic Touch”).
Sair com alguém com o objetivo de casar, usar um intermediário,
pesquisar e ser shomer neguiáh, tudo isso o ajudará a usar sua cabeça
antes do coração e forma o que se chama “encontro religioso”. Além
disso, encontro é encontro. Você precisa ver se há conexão pessoal e
atração física. Se pode haver respeito mútuo e admiração, se vocês
podem rir juntos e lidar com a fraqueza de cada um. E, além disso,
precisam ser honestos e realistas.
Eu me lembro perfeitamente do meu primeiro shiduch. Eu estava
aparovada. O que eu deveria vestir, como deveria agir, o que deveria
dizer? De repente, de uma lembrança remota, ouvi a voz da minha
mãe me dizendo, calmamente: “Seja você mesma”.
A primeira e a última regra de um encontro religioso são: seja você
mesmo. Não finja ser nada que você não é (não importa o quanto você
desejaria ser) nem tente se convencer de que quer algo diferente daquilo
que realmente precisa. Uma amiga minha, que adorava a natureza,
costumava dizer aos seus casamenteiros apenas que ela queria se casar
com um estudante sério de Torá. Finalmente, percebendo que ela
não estava sendo totalmente sincera, ela passou a requisitar um “frum
(religioso) montanhês”. Pouco depois, ela se casou com alguém que,
além de estudar e ensinar Torá, amava a natureza e escalar era um de
seus passatempos preferidos.
Se você se tornou um observante depois de adulto, lembre-se de
que, enquanto suas crenças, costumes, aspirações, e até mesmo seu
caráter, talvez tenham mudado, sua essência natural, não. Talvez você
esteja mais desenvolvido espiritualmente, mas você ainda é você – o

98  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


que significa que você precisa de alguém basicamente parecido com
quem você gostaria de se casar antes de se tornar religioso.
Depois de encontrar Avraham, o homem com quem me casaria
mais tarde, minha mãe estava aliviada. “Eu sei que a vida de vocês
dois é muito diferente das que vocês tinham”, ela me disse, “e muito
de sua conexão é baseada em aspirações espirituais em comum. Mas,
mesmo que vocês não fossem religiosos, eu poderia, com certeza,
vê-los juntos”. Ela estava certa – e esta é a grande razão para que um
casamento funcione.
Assim, seja verdadeiro consigo mesmo no encontro. Apresente-se
como você é. E, ao mesmo tempo em que estiver aberto a conselhos,
confie em seus instintos (os quais lhe foram dados por D’us por alguma
razão) na hora de decidir quem é a pessoa certa para você.

FAÇA DO MODO CERTO


E, no caso de seu casamenteiro garantir que qualquer um com
quem você sair está “no páreo” e pode ser a pessoa certa, como você
pode tirar o máximo proveito de um encontro? Deixe-me oferecer
algumas sugestões práticas:
Em primeiro lugar, encontre alguém que possa aconselhá-lo (a)
(preferencialmente, de graça)6. Seu casamenteiro pode, muitas vezes,
preencher essa função, ou, talvez, você prefira alguém de fora. Além
de saber como tirar o máximo proveito de um encontro religioso, seu
conselheiro deve conhecer bem sua personalidade e suas necessidades.
Certa vez, disse a uma mulher, que pretendia parar de ver uma pessoa
com quem estava saindo porque não sentia que ele e eu poderíamos
dialogar, intelectualmente falando. Ela balançou a cabeça. “Você está
cometendo um erro”, ela disse, enfaticamente, “você estará ocupada
o dia todo com a casa e com as crianças, enquanto ele estará fora,
trabalhando ou estudando. Quanto tempo você acha que terão para
falar sobre filosofia?”. Eu estremeci. Definitivamente, ela estava me
contando algo sobre seu casamento, pensei, mas não sobre o tipo de
casamento que eu queria. Qualquer um que se ofereça como guia
deve respeitar quem você é.
Comece o processo de encontro informando às pessoas (e a todos)
que você está pronto (a) para se casar, mesmo se alguns deles conheçam
6 Se você consegue escrever em inglês, pode se consultar com um conselheiro
neste assunto, através do e-mail advisor@sassonvsimcha.org

“Lidando com sua cabeça”  99


os mesmos solteiros disponíveis. Enquanto uma pessoa (alguém a quem
eu respeito muitíssimo) me contou que ela nunca teria me apresentado a
Avraham, porque nós parecíamos tão diferentes, outra percebeu nossa
profunda afinidade. Nunca dependa de apenas uma terceira parte.
Nos primeiros encontros, não fale de coisas muito sérias (apesar
de que “muito sério” dependerá de quão intensos vocês são). Você já sabe que
ambos têm muito em comum – só precisam conhecer um ao outro.
Relaxe, converse e tente não criar expectativas (algo como “fogos de
artifício”) ou avaliações superficiais (“Ele/ela parece muito isso, não é
suficientemente aquilo...”). Mostre que você está feliz em encontrá-lo (a)
e espere que o encontro seja bom, independentemente de onde ele
aconteça. Não entreviste seu pretendente. Demonstre um interesse
verdadeiro sobre a vida dele (a). Ouça. Não dê razões para que ele
(a) reclame mais tarde, “ele (a) parecia legal, mas tudo o que fez foi
falar de si mesmo (a)”. Acima de tudo, seja acolhedor (a). Faça-o (a) se
sentir bem com elogios apropriados (“Deve ter sido um trabalho duro
alcançar tudo o que você alcançou”). Este tipo de elogio abrirá ambos para
sentimentos positivos. E comece a ver se vocês podem desenvolver
respeito mútuo e admiração, que definem um relacionamento
saudável.
Mantenha esses encontros iniciais curtos (não mais do que duas
horas) e não mais frequentes do que duas vezes por semana. Conhecer
alguém novo pode liberar uma avalanche de emoções. Conduzir a
situação lentamente dará tempo para que você a processe.
A história a seguir ilustra o quão crucial um intervalo emocional
pode ser.
Tamar teve um primeiro encontro maravilhoso, com um homem
atraente e charmoso, que demonstrou grande interesse por ela.
Como ele estaria na cidade apenas por duas semanas, ele pediu para
vê-la todas as noites, com o que ela consentiu prontamente. Após 12
encontros consecutivos, ela estava certa de que “era ele”. Na noite
seguinte, no entanto, eles não puderam se ver, e durante aquele
pequeno intervalo, de repente, Tamar percebeu que ela tinha algumas
questões sobre seu parceiro. O seu próximo encontro foi na noite
da partida dele, e ele, romanticamente, a pediu em casamento. Pega
de surpresa, Tamar gaguejou que não estava pronta para decidir. Ele
explodiu: “Eu passei duas semanas inteiras com você e isso é tudo
o que você tem a dizer?!”, ele gritou. “Quem você pensa que é?”.
“Você não vai conseguir acabar com isso!”. Tamar estava chocada – e

100  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


percebeu o quão perto ela esteve de cometer um erro desastroso.
(Veja, no próximo capítulo, como lidar com personalidades abusivas).
Se depois do primeiro e do segundo encontros você ainda não tem
certeza, saia de novo. Ao final do terceiro ou quarto encontro, você
deverá saber mais. Se não, provavelmente, esta pessoa não é para você.
Se você está interessada (o), mas ele (ela), não, tente não levar isso
para o lado pessoal (a menos que a seu casamenteiro possa indicar algo
sobre o qual você precise melhorar). Nós todos temos nossas razões
(geralmente subjetivas) para sermos atraídos por uma pessoa, e não por
outra. Acredite que a pessoa certa está logo ali.

O QUE NÓS DEVEMOS PROCURAR EM UM ENCONTRO?


Em uma palavra, qualidade – e que não seja externa, mas interna.
Boa aparência, charme e sucesso podem deslumbrar, mas não podem
substituir coisas tão básicas, como caráter e aspirações espirituais. Você
quer se casar com uma essência, e não com uma imagem.
Efraim era charmoso, brilhante, bem-sucedido, carismático e tinha
sido um dos melhores alunos de sua yeshivá. Quando ele pediu Rina
em casamento, ela se sentiu a mulher mais sortuda do mundo. Após
dois meses de casamento, ela percebeu que estava longe disso. Seu
marido se mostrou autocentrado, nada compartilhador e, para piorar,
insistia em que ela o aceitasse como ele era. Uma amiga próxima de
Rina, Toby, aprendeu uma grande lição desse casal. Ela se casou com
um homem que era, em suas palavras, “razoavelmente bonito”, tinha
pouco dinheiro, mas um grande coração e queria crescer e fazê-la feliz
– 10 anos depois, ela ainda se sentia uma felizarda. (As qualidades pelas
quais você deveria procurar em um parceiro são as mesmas que você deveria ter
antes de se casar – veja o Capítulo 2).
Além da essência, procure pelo senso comum. A vida de casado
não é viver no paraíso, mas sim na terra. Não importa que maravilhosa
neshamá seu cônjuge tenha, ele (a) precisa estar disposto (a) a lidar
com as realidades práticas deste mundo, seja para ganhar a vida, cuidar
da casa, ou um pouco de cada.
Por quais semelhanças e diferenças você procura? A natureza de
seu parceiro deve completar a sua de diversas maneiras, mas não há
como estabelecer uma regra para isso. Um intelectual introvertido
talvez precise de alguém igualmente tímido, porém um pouco mais
emocional; outro talvez necessite de alguém igualmente intelectual,

“Lidando com sua cabeça”  101


mas um pouco extrovertido. Talvez você precise de alguém que seja
o seu oposto, mas as diferenças entre vocês devem funcionar. Por
exemplo, se você é um bagunceiro, que aspira ser mais organizado,
você se encantará com alguém mais ligado à limpeza e arrumação,
mas ele (a), provavelmente, irá achar que você é intolerável – e talvez
você passe a ansiar pelo conforto descontraído de um companheiro de
bagunça. Resumindo: procure por alguém com quem você possa viver
e que possa viver com você.
Além das evidentes diferenças benéficas, vá atrás das maiores
semelhanças possíveis. Quanto mais vocês tiverem em comum, menos
vocês irão discordar e a relação será mais fácil. Ter uma formação
social, cultural e intelectual semelhante é especialmente importante,
pois ela molda suas expectativas conjugais e sua abordagem a questões
como a criação dos filhos e o estilo de vida que terão. Não se preocupe
com o fato de que você estará perdendo a oportunidade de crescer
superando diferenças. Só o fato de um de vocês ser homem e o outro,
mulher, já é diferença suficiente. Além disso, D’us dará a vocês os
desafios necessários.
Ambos devem compartilhar da mesma aspiração religiosa. Você
não precisa estar no mesmo lugar que o outro, em termos religiosos,
mas precisa estar se movendo para a mesma direção (como citado
anteriormente, neste capítulo e no final do Capítulo 2).
A atração física é importante, mas não imediatamente. Eu conheço
casais que estão casados e felizes agora porque uma das partes resolveu
se colocar à disposição do parceiro para ver se o outro iria “crescer”
com ele (ela). Então, não rejeite rapidamente alguém baseado na
aparência, a menos que ele ou ela lhe cause repulsa de verdade.
Pergunte a si mesmo: Há momentos em que você se sente mais atraído
por essa pessoa? Por quê? Ele (ela) pode fazer algo a respeito? Não meça
alguém com quem sair comparando-o (a) a um “tipo” preconcebido –
tente enxergá-lo (a) sem qualquer prejulgamento. Você deve tentar
apreciar seu tipo de beleza ou como sua personalidade colore sua
aparência. Tenha em mente que seu cônjuge talvez não seja nem a
remota lembrança da pessoa que você imaginou. E enquanto você vir
o progresso desse tipo de percepção, a cada encontro, persista.
Atração pessoal e emocional pode levar tempo. Nessa etapa, nem
você está, necessariamente, mostrando quem realmente é. Não ache
que você jamais sentirá o que você precisa sentir só porque isso ainda
não aconteceu.

102  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


Aos 45 minutos de seu primeiro encontro, Yaakov se ofereceu
para acompanhar Aviva até sua casa. “Olha”, ele disse a ela, “quero ser
sincero com você. Você não é para mim”.
Aviva não sentiu interesse por ele também, mas ela estava
incomodada e resolveu mostrar isso a ele. “Eu não me importo se nós
sairemos novamente ou não”, ela disse a ele, num tom frio, “mas achar
que você me conhece após 45 minutos é ridiculamente superficial”.
Assim, uma longa hora de conversa se seguiu, durante a qual, com
muita boa-vontade, ambos se comunicaram de forma direta e sincera
– e eles saíram de novo. Hoje, têm um casamento excelente.
Do mesmo modo, não exclua uma pessoa por ela ter feito algo
tolo. Algumas moças me perguntam, “Como eu deveria reagir ao fato
de que, às 11h30 da noite, ele me disse até logo e me deixou sozinha
esperando o ônibus?”. Minha resposta: Na primeira vez, considere que
se trata de falta de noção. Mas se vocês saírem novamente, traga o
assunto à tona. Desculpas sinceras e uma mudança na conduta dele
dirão muito mais sobre o seu caráter do que seus erros.
Acima de tudo, dê uma chance.
Depois de algumas saídas, caso sentir que um relacionamento está
se desenvolvendo, prolongue seus encontros. Entretanto, procurem
se ver apenas duas ou três vezes por semana, por algumas semanas.
Durante esse intervalo, falem rapidamente ao telefone. Levar isso
lentamente pode ser difícil, mas vocês não querem correr o risco de
uma avalanche emocional e confusão (mais comum entre as mulheres).
Assim que as coisas forem ficando mais sérias, você precisa ver como
se sente se ficarem mais tempo juntos, ou talvez vocês precisem de
mais espaço.
E o que você faz nesses encontros expandidos? Já que o encontro
é, de certa forma, artificial, faça-o mais natural e “real”. Passe o tempo
de vocês juntos em lugares diferentes, fazendo coisas diferentes e na
companhia de pessoas diferentes. Inclua algumas atividades informais
e divertidas, que possam encorajar ambos a relaxar e serem vocês
mesmos. Evite ambientes extremamente “românticos” – vocês querem
se manter tão objetivos quanto possível. Preste atenção aos reflexos
súbitos de personalidade, como a maneira com que ele dirige e
estaciona. Observe como ele (a) trata os outros. Se tiver oportunidade,
veja como ele se comporta em Purim (!). Perceba como ele (a) reage
a frustrações, como perder o ônibus ou não encontrar mesas vazias

“Lidando com sua cabeça”  103


em um restaurante. (Um casal que conheço foi pego por uma tempestade, e o
jeito tranquilo e brincalhão da mulher de encarar a situação o levou a perceber
que ela era a pessoa ideal). Veja como ele (a) lida com desavenças. Ele
(a) pode dar suas opiniões, respeitar as suas e se portar de forma
madura para resolver conflitos? Ele (a) sabe receber críticas? Ele (a)
pode abrir mão de dar a última palavra? Veja o que o faz feliz, triste,
exultante ou aborrecido (a). Apresente-o (a) para as pessoas que você
conhece e peça suas impressões.Também encontre os amigos dele – as
companhias podem dizer muito sobre alguém.
Estabeleça modelos. Quando minha amiga Marisa encontrou
o Rabino de seu futuro marido – numa família que amava Torá, as
pessoas e a vida – ela soube que havia escolhido a pessoa certa. Por
outro lado, você talvez descubra o oposto. Certa vez, saí com um
rapaz muito legal, que parecia ser mais conservador do que eu. Nós
decidimos passar o Shabat juntos. No jantar, ele me levou à casa de
seu Rabino favorito, que ficou sentado e conversando, enquanto
sua esposa o servia e limpava a mesa. Eu estava desconfortável. No
almoço, eu o levei a uma família da qual eu gostava, onde ambos,
marido e esposa, discutiam sobre Torá à mesa e tiravam a louça juntos.
Ele estava desconfortável. E aquilo encerrou nossos encontros.
Novamente, o papel dos gêneros é algo que merece consideração
especial. Há beleza e sabedoria na tradição de uns, mas não menos na
personalidade e necessidades únicas de outros (veja Capítulo 5). Você
também pode ter sentimentos conscientes e inconscientes a respeito
de “o que uma esposa deve fazer” e “o que um marido deve fazer”,
decorrentes de o que seus pais fizeram e ou você gostaria – e esses
sentimentos surgem quando você se casa.
Dona de uma mente progressiva, a ashkenazia Donna se casou
com um homem vindo de uma família tradicional sefaradi, que dizia
compreender grande flexibilidade a respeito dos papéis dos gêneros.
Uma vez casado, ele descobriu que, para se sentir acolhido, ele precisava
que sua esposa o tratasse mais como sua mãe havia tratado a ele e a seu
pai. Infelizmente, o que era natural e confortável para ele era opressivo
para ela – e eles perceberam que tinham um grande problema. Esteja
atento a alguém com um histórico muito diferente do seu, a menos que
ele ou ela produzam evidências (não apenas palavras) de compatibilidade.
(Curiosamente, Arlie Hochschild relata no livro “The Second Shift”, que os
maridos mais dispostos a ajudar em casa não são aqueles cujos pais ajudavam
ou que foram ensinados a ajudar em casa, mas aqueles cujos pais haviam se
separado ou que eram ausentes e a quem, consequentemente, não querem imitar).

104  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


Eu estava pronta para discutir os papéis no casamento quando Avraham
e eu estávamos saindo. “Eu não tenho uma abordagem 100% clara
sobre quem faz o que em casa”, eu disse a ele. “Eu também não preciso
dividir metade das tarefas para cada um. Eu sou mais do tipo 70/30.
O que você acha?”
“Eu não consigo me ver cozinhando ou lavando”, ele disse (já que a
mãe dele sempre fez tudo). “Mas eu não me incomodo de fazer as compras
da casa, limpar e outras coisas”.
Eu não gosto de fazer compras e odeio limpar, mas eu não ligo de
ter que lavar e, na verdade, adoro cozinhar. Então, me pareceu que a
coisa iria funcionar.
Essa sequência de encontros mais longos também são o lugar e o
momento para discutir, em detalhes, valores, crenças e objetivos.Você
sabe que as peças maiores do quebra-cabeça já se encaixam – agora,
chegou a hora de ver se as menores também.
E quanto mais vocês se aproximam de um terreno mais intelectual,
continuam a expandir sua intimidade emocional. Revele mais sobre
você mesmo e seu passado e peça para que seu parceiro faça o mesmo.
(Pergunte a seu Rabino que informações negativas deve omitir). Compartilhe
mais sobre como você se tornou quem é. Veja se ambos podem ser
vulneráveis, e se seu companheiro (a) corresponde com amor e
carinho. Quando uma conhecida minha perdeu seu avô, a empatia e a
compaixão demonstradas por seu companheiro mostraram a ela que
poderia contar com ele emocionalmente falando.
Saiba mais sobre as experiências do outro, sua vida em família, suas
ocupações, traga esses tópicos à tona durante a conversa, mas sem
que pareça um interrogatório. Como foi sua educação? Que trabalhos
ela já teve? Que tipo de amizades e, caso seja relevante, que tipo de
romances (sem detalhes) ele já teve? Fazer esses tipos de perguntas
talvez seja um tanto desconfortável, algumas vezes, mas é algo sensato,
se você está levando as coisas a sério. Se parecer inapropriado, você
deve fazer com que esse encontro não dure muito.
Uma amiga se encontrou com um rapaz que, após algumas semanas,
ainda não se sentia à vontade em compartilhar mais sobre sua vida
com ela. Ela, então, decidiu perguntar sobre seus relacionamentos
passados com outras mulheres e descobriu que eles haviam sido
breves e superficiais. Um conselheiro a ajudou a ver que ele tinha

“Lidando com sua cabeça”  105


um problema sério em falar sobre sua intimidade emocional, e ela
decidiu parar de vê-lo. Um homem que estava, da mesma maneira,
intrigado porque sua companheira não podia se abrir com ele, acabou
descobrindo que ela perdera o pai e sofrera com o rompimento de um
noivado. Ao perceber que ela ainda não estava pronta para se mostrar
vulnerável, ele deu o tempo a mais de que ela precisava. Saber sobre o
passado do outro pode esclarecer o presente.
Uma vez que vocês sintam “que talvez tenham encontrado a
pessoa certa” (ou, preferencialmente até antes disso), assegurem-se de
encontrar e passar um tempo com os pais um do outro. (Sei que,
caso isso necessite que se faça uma viagem, talvez custe caro, mas é melhor
assim). Nós absorvemos o comportamento que temos, tanto positivo
quanto negativo, daqueles com os quais crescemos. Assim, a menos
que tenhamos trabalhado duro para mudar isso, nós nos tornamos
notavelmente parecidos com nossos pais. (Após uma visita à mãe de sua
futura esposa, um dos amigos do meu marido disse a ela, brincando,“Eu perdoo
você”). Essas semelhanças serão especialmente importantes, uma vez
que nós casemos e tenhamos nossos filhos. Então, perceba: Como os
pais dele se relacionam entre si, com ele e com os irmãos dele? Como
a família interage? E mesmo que as coisas tenham mudado desde a
infância dele (a), a dinâmica básica (sensibilidade, comunicação, expressão
de afeto ou os opostos), provavelmente, é a mesma e, sem dúvida, vai
lançar luz sobre o tipo de cônjuge (e pai ou mãe) que ele ou ela será.
Conheço um casal que estava saindo e a relação estava
progredindo, mas o homem estava incomodado com algo que ele não
sabia definir. Então, ele se encontrou com a mãe dela, uma mulher
altamente crítica e, de repende, entendeu que seus encontros haviam
mostrado sinais desta mesma disposição nela. Minha amiga Tehilla
teve uma experiência totalmente oposta. Depois de sair com Rafael
por algumas semanas, ela encontrou o pai dele e seus irmãos mais
velhos – três homens excepcionalmente sensíveis, espiritualizados e
emocionalmente sintonizados. Desde o início, ela sentia que aquele
rapaz calado tinha um coração de ouro, mas conhecer esses homens,
com os quais ele havia crescido e o carinho de suas interações, só
confirmou esse sentimento. Famílias podem lhe dizer muito.
Tanto quanto possível, dê um passo atrás em seu relacionamento e
faça uma “verificação da realidade”. Entre outras coisas, tenha certeza
de que você está ciente de, ao menos, algumas falhas da outra pessoa.
Ninguém, não importa o quão maravilhoso seja, é perfeito. Se você
pensa de outra maneira, talvez esteja idealizando – continue a sair

106  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


até que sua pintura seja mais realista. Por outro lado, seu parceiro (a)
talvez tenha medo de revelar seu verdadeiro eu. Nesse caso, você deve
descobrir por quê. Se você desconfiar de algum indício de distúrbios
físicos ou mentais, investigue-os. Se você não descobrir nada, mas
alguma coisa pareça “errada”, siga suas intuições.
Uma jovem conhecida estava saindo com um homem que parecia
consideravelmente carinhoso, mas um tanto fechado, levando-os a
silêncios desconfortáveis. A pessoa que os apresentou pediu a ela que
relevasse esse comportamento, atribuindo isso ao ambiente rigoroso
da yeshivá onde ele cresceu, o que o levou a não estar habituado a
conversar com mulheres. Contrariando o instinto dela, eles se casaram
– e ele se revelou perturbado, dono de um sério distúrbio mental, e
abusivo. Idealmente, você deveria se sentir completo (a) a respeito
de quem você está escolhendo para se casar. Caso contrário, talvez
você precise de ajuda profissional sobre como proceder. Entretanto, a
decisão final é somente sua.
Alguns problemas, em vez de serem a razão objetiva para terminar
um relacionamento, dependem de sua reação. Após alguns encontros,
Chana contou a Shmuel que era diabética, mas garantiu a ele que se
tratava há anos. Mas, por ter perdido um irmão com hipoglicemia,
Shmuel não soube lidar com a enfermidade de Chana. O próximo
rapaz com quem ela saiu não teve tanta ansiedade a respeito disso.
Qualquer que seja a dúvida, procure se aconselhar com alguém, mas
siga seus próprios instintos.
A cada passo dessa jornada, procure por outros que conheçam
a pessoa com quem você está saindo – colegas de quarto, vizinhos,
rabinos, professores, alunos, empregados, patrões, colegas de
trabalho, qualquer um – e pergunte suas impressões. (Ao fazer isso, ambos
devem evitar lashon hará, fofoca. Um livro como “Chafetz Chaim: Uma Lição
a Cada Dia”, do Rabino Shimon Finkelman e Rabino Yitzchak Berkowitz,
explica quais informações são proibidas, permitidas ou obrigatórias de serem
dadas). Em vez de iniciar um inquérito (“O que você pode me dizer a
respeito da pessoa que estou saindo?”), faça perguntas específicas, que
necessitam de respostas específicas.
Fazer seu dever pode poupá-lo da “dor de cabeça” de terminar um
relacionamento sério, um noivado ou até um casamento. Conheço
uma mulher que se casou com um homem sem saber que ele era um
bandido procurado internacionalmente. Mais comuns são histórias
como a de um rapaz, cujos sogros ocultaram a instabilidade emocional

“Lidando com sua cabeça”  107


da filha (acreditando, ingenuamente, que, uma vez casada, tudo ficaria bem).
De acordo com um rabino, que trabalha na corte rabínica, a maioria
dos casos em que o marido se recusa a dar o divórcio à mulher poderia
ser evitada por meio de uma verificação antes do casamento. Enquanto
seu parceiro parecer normal e saudável, você não vai se preocupar
com isso. Mas deveria. Pesquisar sobre um parceiro em potencial não
é uma ideia antiquada. É uma obrigação.
Se (após falar sobre isso com outros) você decidir que essa não é a pessoa
certa para você, não deve ter medo de terminar a relação. Qualquer
coisa que chateie você agora, provavelmente, chateará muito mais
quando se casarem. “Melhor” um relacionamento e até um noivado
que não deu certo do que um divórcio.
Se você se pegar pensando em termos como “nós”, então, está
perto de decidir por um “sim”. Nesse momento, talvez seja uma
boa você procurar por um aconselhamento pré-marital com alguns
casais ou com um profissional qualificado e religioso. Você ganhará
incalculáveis conhecimentos sobre você mesmo, seu parceiro, e seu
relacionamento e aprenderá ferramentas para se comunicar quando
estiver casado (a). (E, uma vez que você fique noivo, descubra se há um curso
de preparação para o casamento judaico que você possa fazer).
Mesmo o encontro que eu descrevi não eliminará as surpresas pós-
casamento. Mas elas serão aquelas com as quais você poderá lidar. O
propósito do shiduch é atingir o ponto de saber, “esta é a pessoa com
a qual eu quero e com a qual eu posso fazer uma relação funcionar.”
Quanto tempo leva para decidir? Como você, provavelmente, já
percebeu, o shiduch é mais complicado hoje do que já foi. Quando as
pessoas vivem em uma cidade pequena, em comunidades homogêneas,
onde todo mundo conhece todo mundo, valores e crenças são
previsíveis, e as referências de caráter são mais fáceis de serem
obtidas. Com a transição para a vida moderna e as diversas influências
sobre nosso pensamento e comportamento, seu parceiro é muito
menos conhecido pelo casamenteiro, não importa quanta pesquisa
ele ou ela faça. Ao mesmo tempo, nossas expectativas subjetivas a
respeito do casamento são muito maiores (para melhor ou para pior).
Você deve, além disso tudo, descobrir mais sobre você mesmo – e
isso significa longos encontros consigo. Eu não posso lhe dizer quanto
tempo, porque o importante não é a quantidade, mas a qualidade do
tempo que vocês passam juntos. Você estará pronto (a) para se fazer a
pergunta não somente após algum número mágico de semanas, meses

108  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


ou encontros, mas quando você tiver descoberto o necessário sobre
a outra pessoa. Talvez você sinta que já sabe tudo o que precisa sobre
o outro muito cedo, mas continue a sair até que você realmente o saiba.
Algumas pessoas não concordam com a necessidade de estender
muito esses encontros, porque “você nunca vai conhecer realmente a
pessoa até que vocês estejam casados”. Isso é absolutamente verdadeiro,
mas você certamente saberá mais e mais para tomar a decisão certa,
depois de sair diversas vezes, como descrito anteriormente, do que
depois de poucos encontros agradáveis, em seu melhor vestido e com
seu melhor comportamento.
Outros destacam que “o par certo é determinado siyata diShmaya
(com a ajuda dos Céus), de qualquer maneira”. Sim, D’us provê nossa
alma-gêmea – então, reze para reconhecê-la (o), mas D’us também
espera que nós ajamos com responsabilidade e inteligência, como em
todas as outras áreas de nossa vida.
Há ainda os que são contra essa sucessão longa de encontros,
preocupados que o casal pare de ser shomer neguiah. Essa, sim, é uma
preocupação verdadeira. Assim, marque esses encontros em locais
bem iluminados, públicos, mantenha as próprias mãos entrelaçadas
nas costas, faça parte de um grupo de apoio a shomer neguiah – o que
quer que funcione para você. Se a tensão invadir a relação, perceba
a fonte disso e, se necessário, dê um tempo. Mas não tenha medo
da tentação – ou qualquer outra coisa – nem saia em debandada,
tomando uma decisão prematura.

UM PAR FORMADO NOS CÉUS


Claro que esses encontros devem terminar. E é quando algumas
pessoas ficam empacadas. A “compromisso-fobia” está espalhada
por todo o mundo nos dias de hoje (como mencionado no Capítulo 1),
particularmente, entre o número crescente de pessoas que sofreram
traumas como abandono e divórcio. Por outro lado, “mãos frias”
podem ser sinal de algo errado na relação. Um conselheiro qualificado
pode ajudar a entender o que está acontecendo, e se você chegar à
conclusão de que a relação é a certa, irá ajudá-lo (a) a superar seus
medos. (Se a ansiedade surgir após você ficar noivo, não marque a data do
casamento até que isso se resolva).
Algumas vezes, no entanto, as pessoas se tornam relutantes em
se comprometer, simplesmente porque, ao fazê-lo, outras opções

“Lidando com sua cabeça”  109


são descartadas. Depois de tudo, como você sabe que não há alguém
melhor?
Uma amiga minha tem a melhor resposta: “Você não sabe”, ela diz.
“Em algum lugar lá fora há um homem que formaria um par melhor
comigo do que o meu marido. Provavelmente há muitos deles. E eles
devem estar tão felizes com suas almas-gêmeas como eu estou com a
minha”. D’us traz uma determinada pessoa e não outras em sua vida
por motivos que só Ele sabe. Se você escolhe sabiamente, ele (a) se torna
sua alma-gêmea.
Uma das sete bênçãos que são recitadas debaixo da chupá (pálio
nupcial) diz: “Alegre os amados parceiros como Você alegrou Suas
criaturas no Gan Eden de outrora.” Já que Chavá era a única mulher na
terra, Adam podia se alegrar em saber que eles foram feitos um para o
outro. Para o resto de nós, casamento requer um “salto de fé”. Mas se
você usa sua cabeça e seu coração – nesta ordem – você também terá
tanta certeza quanto humanamente é possível, que você encontrou
sua alma-gêmea.

110  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


CAPÍTULO 7
FIQUE LONGE DE ABUSO

I nfelizmente, maus-tratos se tornaram uma preocupação no


mundo judaico. Embora mais raros em casamentos construídos
sobre valores judaicos, eles existem, e certas comunidades estão
enfrentando esse problema.
Solteiros podem e devem aprender a reconhecer um agressor em
potencial antes de se casar com ele ou ela. Por outro lado, se essa
formação não for contundente, não será eficaz. Você não pode lutar
contra o tétano sem uma vacina, e você não pode escapar do risco do
abuso (o qual é mais provável, aponta o Rabino Abraham Twerski, do que pisar
sobre uma agulha enferrujada) sem uma medicina preventiva igualmente
eficaz. Por outro lado, eu não quero assustar ninguém e fazer com
que desistam completamente do casamento. Assim, tentarei achar um
equilíbrio e criar um nível saudável de consciência.
Uma pessoa que sofre de um profundo sentimento de inferioridade e
autorrejeição, adquiridos na infância, talvez tente erguer sua autoestima
afirmando seu poder sobre os outros. Isso pode ser expresso por meio
de abusos físicos ou emocionais. E, embora personalidades agressivas
existam em ambos os sexos, elas são mais comuns entre os homens,
que são, geralmente, mais fortes fisicamente e economicamente, e
têm um grande desejo inato de “liderar”. Consequentemente, e para
evitar escrever repetidas vezes “ele ou ela”, “dele ou dela” etc., vou
me referir ao agressor no masculino, sem a intenção de excluir as
agressoras.

Fique longe de abuso  111


É importante diferenciar entre pessoas normais que, algumas vezes,
agem agressivamente, de alguém com um desvio de personalidade.
Alguém que, ocasionalmente, “perde o controle” e é agressivo tem
um grande defeito de caráter, mas pode olhar para si objetivamente,
sentir remorso de verdade e querer mudar. A terapia pode ajudar,
dependendo da profundidade das feridas de sua infância e de sua
determinação. Infelizmente, seu problema talvez seja detectado apenas
depois da chupá, ao ser desencadeado por estresses pós-casamento,
como as finanças e os filhos.
Um problema de personalidade agressiva é muito mais sério, e
também mais fácil de se reconhecer, e é sobre ele que quero falar. As
feridas dessa pessoa são tão profundas e penetrantes, que se relacionar
agressivamente parece normal para ela. Ele é tipicamente cego para
sua doença e se recusa a receber ajuda. Felizmente, quase sempre é
possível detectar que ele é, antes do casamento, desde que você saia com
ele o tempo suficiente e preste muita atenção em seu relacionamento. Conheço
algumas mulheres, de seculares a estritamente observantes, cujos
maridos se revelaram agressivos, e em todos os casos, os sinais de
alerta foram dados antes do casamento. Essas mulheres (e suas amigas)
apenas não identificaram esses sinais – ou os ignoraram.

LUZES VERMELHAS
Como você pode identificar um potencial agressor enquanto você
estiver saindo com ele?
A melhor maneira é você se familiarizar com os traços de uma
personalidade agressiva. Enquanto alguns agressores possuirão cada
um desses sinais, todos vão possuir alguns deles.A lista a seguir descreve
como cada traço aparece no casamento, como ele se manifesta no
shiduch e como pessoas normais deveriam agir. Por mais que se diga,
por mais assustador que isso tudo pareça, não exagere. Não invente uma
desculpa, no meio de um encontro, para consultar, ansiosamente, essa
lista no banheiro. Não derrame, de propósito, sopa quente sobre o
colo do seu companheiro apenas para testar sua reação ao estresse.
Vá em frente, tendo em mente que se trata de um ser humano digno,
decente, que pode ser a pessoa certa. E entenda, também, que a maioria
das pessoas normais (incluindo eu e, provavelmente, você) tem algumas dessas
características, ainda que de forma mais branda. Se a insensibilidade,
a crítica exagerada e a intolerância sempre denotassem abuso, as
crianças teriam sido tiradas da maioria dos pais e os casamentos

112  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


teriam terminado antes mesmo de começarem. Entretanto, se alguém
demonstra não um ou dois desses comportamentos, mas muitos, e não
uma vez ou duas, mas repetidamente, uma luz vermelha deverá ser
acesa.
Eis os traços:
1) Ele é muito controlador e possessivo. Esta é a característica
básica de uma personalidade agressiva, e será discutida mais
detalhadamente à frente.
No casamento: Ele vai controlar cada detalhe e momento de sua
vida – sua roupa, as finanças, a vida social, a observância religiosa, e
mais – até o ponto de transformá-la em sua marionete.
Enquanto estiverem saindo: Ele talvez mantenha o controle sobre
aonde você vai, como você gasta seu dinheiro e quanto tempo
passa com quem. Ele talvez tente influenciar seu comportamento e
seu pensamento. Ele pode querer que você esteja à disposição dele
constantemente. Ele talvez force para que a relação ande mais rápido
do que o progresso natural dela.
Sempre queYehuda ligava para o celular de Miriam (o que ele fazia diversas
vezes por dia) e ouvia barulho ao fundo, ele rapidamente perguntava, “Onde
você está? Quem está aí? O que está acontecendo?”.
Se Marci citava a opinião de alguém, Avi insistia para que ela não a
seguisse.
Jerry sempre decidia para onde ele e Rhonda iriam.
Evan ficou magoado com Dana porque ela não quis ficar noiva dele até que
ela conhecesse os sogros, e, após o encontro, ele insistiu para que ficassem noivos
imediatamente.
As pessoas normais com as quais você sair vão querer passar um tempo
com você, mas não vão exigir isso. Apesar do interesse em sua vida,
elas vão respeitar sua privacidade. Se você não estiver certa sobre a
relação, elas talvez tentem balançar você, mas sem muita pressão. Elas
saberão onde elas terminam e onde você começa e vão reconhecê-la
como uma pessoa em seus próprios direitos.
2) Ele tem uma personalidade de Jekyl/Hide (dupla)
No casamento: Ele demonstrará respeitabilidade, charme e carisma,
alternando isso com um comportamento obscuro e, principalmente,

Fique longe de abuso  113


monstruoso.
Enquanto estiverem saindo: No início, você talvez só veja o lado bom
dele. (Eu ouvi falar de noivos agressivos, descritos como “muito suaves”).
A grande parte de sua bondade, entretanto, “é muito boa para ser
verdade”.
Steve era um perfeito cavalheiro com Erin, mas frio e duro com outros, sem
uma razão aparente. Quando ela perguntou o porquê disso, ele a despistou,
dizendo,“Não vale a pena falar sobre isso”.
As pessoas normais com as quais você sair serão boas e verdadeiras.
Talvez, ocasionalmente, elas se comportem mal, mas reconhecerão
isso. Seus humores vão combinar dentro de uma personalidade
agradável e consistente.
3) Ele é sedento por poder e manipulador.
No casamento: Ele irá despersonalizá-la em um objeto a ser
explorado, usará a religião para dominar você e procurará se vingar
contra qualquer um (incluindo você) que o contrarie.
Enquanto estiverem saindo: Talvez ele demonstre grande interesse em
saber quanto dinheiro você ou seus pais têm e em usar seus recursos
para seu próprio interesse. Pode ser que compre presentes caros para
você para ganhar algo mais ou obter algo de você. Talvez ele dê ordens
a pessoas à sua volta e faça pronunciamentos de “macho”, como “Eu
sou o chefe por aqui”. Talvez ele faça de tudo para conseguir que seja
do jeito dele.
Apesar de saber que Amy era shomeret neguiah, Josh continuava a
pressioná-la para terem contato físico.
Quando Penny contou a Nathan que ela precisava que ele devolvesse seu
carro mais cedo do que ele achava necessário, ele, de propósito, devolveu o carro
mais tarde.
Quando outro motorista cortou Avner, Avner fez o mesmo com ele e, a partir
daí, passou a dirigir bem lentamente, observando o outro motorista pelo espelho
retrovisor.
Quando Julie disse que queria romper com Phil, ele ameaçou falar mal
dela.
As pessoas normais com as quais você sair estarão interessadas em quem
você é, não o que você tem ou o que pode fazer por elas, e eles não
vão querer “comandar” você.

114  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


4) Ele não se solidariza
No casamento: Ele será alheio às suas necessidades e sentimentos
e como o comportamento dele afeta você. Ele será incapaz de se
relacionar íntima e consistentemente.
Enquanto estiverem saindo: Ele pode ser muito solícito para disfarçar
tudo o que está faltando dentro dele. Ele pode declarar que sua
observação dolorosa foi apenas em tom de brincadeira. Ele pode ser
indiferente, não ter consideração e/ou respeito. Ele pode se retirar
quando estiver chateado. Ele pode ser cruel com os animais.
Alex ria de um modo estranho e excitado quando Sharon contava sobre o
infortúnio “engraçado” de alguém, e ao ouvir outra má notícia, ele ignorava ou
dava de ombros e dizia,“A vida segue” ou “Ele deve ter merecido isso”.
Um dia, Beth viu Eric, do outro lado da rua, chutando um gato.
As pessoas normais com as quais você sair talvez, algumas vezes, não
tenham sensibilidade, mas sentirão por outros, tratando-os como
eles as tratam. Se elas ferirem seus sentimentos, você sentirá que
isso aconteceu por ignorância, não por mesquinhez, e elas estarão
arrependidas de verdade.
5) Ele desafia os limites
No casamento: Ele sempre testa até onde pode ir.
Enquanto estiverem saindo: Ele talvez tente ir além no que puder, em
todos os tipos de coisas, pequenas (ou até grandes), incluindo infringir
a lei.
QuandoYossi viu meio pote de sorvete no freezer da tia de Shani, ele sugeriu
que eles terminassem com o sorvete sem que a tia soubesse.
Joe queria mostrar a Michelle a vista de um lugar não-público e, ao
encontrar a porta trancada, ele planejou como poderiam entrar sem acionar o
alarme de segurança.
As pessoas normais com as quais você sair podem até ser tentadas a
uma transgressão menor, mas irão, essencialmente, obedecer à lei e
respeitar as regras.
6) Ele é compulsivo e faz exigências fora da realidade
No casamento: Ele será mesquinho e terá expectativas irracionais,
tornando-se furioso quando as coisas não saírem como “deveriam” e

Fique longe de abuso  115


fará você se sentir culpada e envergonhada quando você não atender
às suas normas.
Enquanto estiverem saindo: Ele pode ser obsessivo em relação ao
externo, criticando sua aparência ou se fixando sobre algum detalhe
da observância religiosa que ele quer que você corrija. Talvez ele reaja
negativamente a qualquer coisa inesperada.
Quando Elisheva sugeriu uma mudança do local de seu encontro, Bob ficou
muito chateado.
Quando Rivky vestiu uma saia, Mordechai achou que ela estava muito
curta, ele foi antipático e frio durante toda a noite.
Ari sentiu-se envergonhado por Stacey não passar uma impressão frum
(religiosa) suficiente, insistindo para que ela acrescentasse mais termos em
hebraico e em iídiche em sua fala.
As pessoas normais com as quais você sair podem ser críticas, mas
vão tolerar imperfeições, incluindo as suas. Elas vão gostar de sua
aparência, mas vão focar em seus aspectos mais profundos.
7) Ele é arrogante, autocentrado e intolerante
No casamento: Ele observará tudo por sua própria perspectiva, vai se
manter acima de quase todo mundo e terá muito preconceito contra
pessoas de diferentes culturas ou religiões. Ele terá um estereótipo
rígido de gêneros e desprezará as mulheres.
Enquanto vocês estiverem saindo: Talvez ele se divirta ridicularizando
ou desprezando os outros. Ele pode se indispor ao perder uma
discussão. Ele talvez não tenha mentores, recuse ajuda e se oponha
a consultar uma autoridade (como um Rabino) sobre qualquer coisa
importante ou pessoal.
Larry fazia pouco dos parentes menos religiosos de Shoshana, apesar das
marcantes lacunas em sua própria observância e ridicularizava os Rabinos que
se opunham a seu ponto de vista.
Hal sempre dizia à sua mãe para ficar quieta.
Tzvi tirou sarro de Susan por ela frequentar “classes para iniciantes” de
Torá.
Quando Esther disse que ela queria fazer pós-graduação, Adam respondeu:
“Ah, então você está querendo ser uma destas grandes mulheres de carreira?”.
As pessoas normais com as quais você sair podem fazer julgamentos e,

116  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


ocasionalmente, se mostrarão arrogantes e desdenhosas. No entanto,
você vai ver a humildade delas em atitudes como: Irão procurar por
indivíduos mais sábios para buscar ajuda e considerarão as opiniões
dos outros. Elas irão respeitar seus pais. Podem até ridicularizar a
crença e o estilo de vida dos outros, mas não irão ridicularizar outro
ser humano. Geralmente, serão abertas, e não fechadas aos outros.
8) Ele exterioriza os problemas
No casamento: Ele culpará todos (especialmente você) por sua conduta
e tudo o que acontece a ele, e se justificará, cruelmente, dizendo que
você mereceu isso.
Enquanto vocês estiverem saindo: Ele pode se recusar a ser repreendido
e culpará os outros por seus problemas ou por seu comportamento.
(Note bem: Você nunca é responsável pelo comportamento de outro adulto).
Dov culpava o novo gerente de seu banco por seu cheque devolvido.
Gary disse a Adrienne:“É culpa sua eu ficar assim tão bravo”.
As pessoas normais com as quais você sair podem até ser defensivas,
mas, eventualmente, elas vão olhar para si mesmas honestamente,
admitir que estavam erradas e assumir a responsabilidade por suas
ações.
9) Ele é paranóico
No casamento: Ele irá acusá-la falsamente, temer que os outros
estejam tirando vantagem dele ou agindo por suas costas, e verá a si
mesmo como vítima.
Enquanto vocês estiverem saindo: Ele pode levar pequenos erros para
o lado pessoal ou atacar alguém que ele sentiu que o estava “atacando”
ou que iria atacá-lo.
Quando uma criança, acidentalmente, correu na direção de Levi, ele
empurrou o menino e gritou com ele.
Quando Brad viu Joanne olhando na direção de outro rapaz, ele a acusou
de estar interessada nele.
Quando Avigayil chegou cinco minutos atrasada para um encontro, Shlomo
disse a ela, furioso: “Você sabe que eu odeio ficar esperando por você – você fez
isso de propósito, só para me irritar”.
As pessoas normais com as quais você sair, talvez, vez ou outra, pensem

Fique longe de abuso  117


que alguém tem algo contra elas, mas vão colocar um ponto final nas
preocupações injustificadas e, geralmente, avaliar a realidade com
mais precisão.
10) Ele mente, engana, minimiza e nega
No casamento: Ele sempre estará conspirando para negar aquilo que
ele fez.
Enquanto vocês estiverem saindo: Ele pode até se desculpar, inventando
novas mentiras, para dizer por que não estava em determinado lugar
ou fazendo algo que deveria estar; esquivar-se de erros, nos quais
ele foi apanhado e negar seu mau comportamento, como se fosse
algo insignificante ou como se nunca tivesse acontecido. Talvez ele
reivindique (ou alegue) ter adquirido coisas que não tem.
Chayim disse aYehudit que ele tinha estado naYeshivá todo o dia, mas, na
verdade, ele foi para a cidade com os amigos.
Aaron disse a Dina que ele tinha pós-graduação, quando não era nem
formado na faculdade ainda, além de estar devendo créditos em diversas
matérias.
As pessoas normais com as quais você sair podem até se desculpar por
determinado comportamento do qual elas mesmas se envergonham,
mas, em sua essência, são honestas.
11) Ele não sabe lidar com a raiva, frustração ou estresse
No casamento: Ele será muito nervoso e de sangue-quente, não
conseguirá lidar com as situações, explodirá facilmente e reagirá
fisicamente (por exemplo, jogando ou quebrando coisas).
Enquanto estiverem saindo: Sua fúria talvez “vaze” em muita falta de
paciência, reaja de modo exagerado diante de situações cotidianas
mais complicadas (como congestionamento de trânsito, temporais e atrasos)
ou mesmo com pequenas explosões.
Jeff explodiu quando o garçon se esqueceu de trazer água.
Quando Andrea provocou Paul, ele parou o carro, esmurrou o painel de
controle e saiu.
As pessoas normais com as quais você sair serão impacientes
dentro dos limites normais e perderão seu controle apenas ocasional e
moderadamente, se tanto. O estresse não as oprime.

118  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


12) Ele é fisicamente e/ou verbalmente agressivo
No casamento: Ele irá provocar os outros fisicamente e/ ou
chamando-os por apelidos ridículos e usará a força para conseguir o
que quer.
Enquanto vocês estiverem saindo: Talvez ele seja rude e provocador
com os outros, dirija de modo extremamente agressivo e competitivo,
xingue os outros motoristas e pedestres, trate os outros de forma
grosseira e use a força contra objetos inanimados.
Quando Jeremy foi, educadamente, avisado de que a mesa na qual estava já
havia sido reservada, ele amaldiçoou o garçon resmungando baixinho.
Quando o refrigerante não saiu da máquina, Kurt a chutou ferozmente.
Bob procurava pela chance de esmagar seus oponentes durante jogos de
hockey.
As pessoas normais com as quais você sair podem se tornar
briguentas ao serem provocadas por outros, mas não sempre. Elas vão
jogar por diversão, não por violência.
13) Ele é autodepreciativo e sempre tende à depressão
No casamento: Ele dirá sempre que se odeia e gostaria de se matar,
ou até tentará o suicídio. (Esta autoaversão não é contraditória à arrogância
de um agressor, o qual, meramente, mascara seu sentimento profundo de
inferioridade).
Enquanto vocês estiverem saindo: Ele pode se colocar para baixo,
parecer patético (muitas vezes para manipular seus propósitos) ou fazer
afirmações fortes sobre o que ele fará se você não se casar com ele.
Se passasse um dia em que Yitzchak não visse Mindy, ele logo diria a ela
que estava deprimido.
Quando Yael duvidou de seu futuro juntos, Ben disse a ela: “Não é culpa
minha; nada de bom acontece para mim”, e quando ela rompeu com ele, ele se
desesperou:“Eu vou sumir e nunca mais volto a aparecer”.
As pessoas normais com as quais você sair terão uma autoestima
saudável. Até um grande revés não é capaz de abalá-las e elas vão se
recuperar em um período de tempo razoável.
14) Ele tem um histórico de violência, mesmo quando
canalizada corretamente

Fique longe de abuso  119


No casamento: Você descobrirá que ele era um tirano quando
mais jovem e/ou seu trabalho é uma válvula de escape para o
comportamento abusivo.
Enquanto vocês estiverem saindo: Ele pode ter amigos indesejáveis ou
um trabalho que ele adora, mas que uma pessoa sensível nunca faria.
Todd disse a Ellen que ele andava com uma turma da pesada na escola.
Stu foi preso duas vezes por roubar alguém.
Eitan trabalhava em um serviço secreto interrogando suspeitos de terrorismo.
As pessoas normais com as quais você sair não serão violentas.
Se seu trabalho, ocasionalmente, implicar brutalidade (como certos
tipos de policiais, seguranças etc.), elas vão relatar isso como uma infeliz
necessidade, não com um prazer.
15) Ele tem um histórico de abuso de substâncias ilícitas
No casamento: Ele fará uso (ou você descobrirá que ele faz) de muita
bebida e/ou drogas.
Enquanto vocês estiverem saindo: Ele talvez mencione o quanto
“selvagem e maluco” ele é (ou era) com amigos e se recusa ser chamado
de dependente com frases como “Nós só estávamos nos divertindo”.
Em casamentos, Ilan bebia muito além do socialmente aceito, e ignorava as
reclamações de Lori dizendo:“Não me perturbe”.
As pessoas normais com as quais você sair podem, ocasionalmente,
ter se envolvido com álcool ou drogas, mas devem ter superado isso
e, agora, bebem com moderação. Qualquer vício deve ter um suporte
para superação (por exemplo, uma bem-sucedida participação nos Alcoólicos
Anônimos).
16) Ele testemunhou ou sofreu abuso por parte dos pais,
privação ou negligência
No casamento: Você descobrirá que um de seus pais agrediu o outro,
ou que um ou ambos abusaram dele. (Neglicência e privação podem ser
abuso passivo).
Enquanto vocês estiverem saindo: Ele talvez conte, de maneira
voluntária, sobre sua infância, mas o mais comum é você ter de
perguntar. Se ele é do tipo aberto, talvez admita ter ressentimento de
seus pais; se é do tipo fechado, talvez finja que eles são perfeitos e não
quer que você os encontre. Se a verdade é revelada e você expressa

120  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


compaixão, ele talvez garanta que nunca fará o mesmo que seus pais e
que não precisa de ajuda profissional.
Mark contou a Stephanie que ele tinha sido um garoto que passava a maior
parte do tempo sozinho e que não se dava bem com a mãe, que, por sua vez,
passava a maior parte do tempo longe de casa.
Ken não contou a Ronit que seus pais eram separados e que ele não tinha
contato com seu pai, que era violento.
Quando Eli mencionou que ele havia sofrido agressões físicas em sua casa e
Karen perguntou se ele achava que jamais faria algo semelhante a seus filhos,
ele respondeu, com raiva:“Cale a boca”.
As pessoas normais com as quais você sair virão, ao menos, de lares
não disfuncionais. Se não, elas terão de procurar uma terapia e estarão
prontas a discutir seu passado e como trabalharam para lidar com seus
problemas.
Volto a salientar: Nenhum dos traços anteriormente citados
indica uma personalidade agressiva. Servem apenas para “ligar os
pontos”. Ligando-os, ou seja, conectando muitas dessas características
em uma única pessoa, talvez surja a figura de um agressor. Para fazer
isso, é necessário dar uns passos para trás e olhar tão objetivamente
quanto possível para a outra pessoa e suas interações com ela.
Uma vez que a relação decola, o controle (o primeiro traço descrito)
se tornará especialmente evidente e pode ser a chave para identificar
um agressor em potencial. O grande obstáculo aqui é que as táticas
de controle de um agressor podem ser extremamente lisonjeiras. De
fato, você deve estar pensando, “Por que alguém iria se casar com uma
pessoa com um desses traços?” eis o porquê. Ele talvez insista para que
você esteja disponível pelo celular, dizendo que ele sente muito sua
falta. Ele talvez diga que roupas deve usar ou como seu cabelo deve
estar dizendo que ama olhar para você. Ele pode tentar limitar suas
interações com outros dizendo que quer passar todo o tempo dele
com você. Talvez ele sinta ciúme de vê-la falando com outro homem
e force você a ficar noiva dele antes que você esteja pronta para isso,
dizendo que ele conhece você e ele sabe que vocês foram feitos um
para o outro.
Mas, eventualmente, essa atenção revelará, por si mesma, o
porquê de ela existir. Uma vez que vocês estejam noivos, ele tentará
tomar todas as decisões referentes ao casamento. E, uma vez casados,
ele tentará governar cada detalhe de sua vida, roubando você de sua

Fique longe de abuso  121


individualidade.
Há ao menos três maneiras de testar se o comportamento dos
pretendentes, descritos anteriormente, referem-se só a arroubos
de paixão ou são indícios do desejo de controle. Uma delas é
simplesmente observar como ele reage quando você não concorda
com ele. Quando você diz a ele, “Eu não quero deixar o meu celular
ligado a noite inteira”, ele briga ou respeita sua privacidade? Quando
você diz, “Se você não gosta dessa roupa, eu não vou usá-la em nossos
encontros”, ele exige que você pare de usá-la em qualquer ocasião, ou
respeita seu desejo de escolher seu guarda-roupa? Quando você diz a
ele, “Eu vou passar esse Shabat com minhas amigas”, ele fica chateado
ou respeita seu direito à sua própria vida social? Quando você diz a
ele, “Eu não estou pronta para decidir sobre casamento”, ele passa a
pressionar você, ou respeita sua necessidade de ter seu tempo? Como
você deve ter notado, a chave para a resposta “correta” é respeito – por
sua independência e por seus limites.
Outro sinal de controle é como ele tenta (ou não tenta) resolver
conflitos. Ele se torna furioso e se desliga emocionalmente, ou ele
consegue compartilhar os sentimentos dele enquanto é sensível aos
seus? Ele precisa fazer tudo do seu próprio jeito ou vocês podem
trabalhar juntos para encontrar uma solução mutuamente satisfatória?
Talvez, o melhor termômetro do comportamento dele seja sua
própria maneira de responder. Você evita discussões porque “não vale
a pena” ou pode discordar dele quando necessário? Você sempre cede
para que não haja briga ou você pode expressar seus próprios desejos?
Quando ele está furioso, faz seu estômago virar com ansiedade ou
você pode se manter erguida sozinha? Olhar não apenas para ele, mas
também para você, é um indicador poderoso da saúde de sua relação.
Na falta de informação de fora, você pode determinar se uma
pessoa é agressiva apenas passando um tempo suficiente com ela para
começar a desenvolver intimidade emocional (um profundo e aberto
compartilhamento), pois essa proximidade vai revelar o verdadeiro “eu”
dela. Encontre – se necessário, crie – oportunidades para ver como
ela age quando está chateada, desapontada, furiosa ou frustrada. Passe
um tempo junto: ele, você, sua família e seus amigos e pergunte a ele
impressões a respeito do rapaz. (Qualquer recusa da parte dele em passar
um tempo com essas pessoas é motivo de preocupação). Se alguém não gostar
de algo nele, verifique. Talvez você não veja porque não quer ver.
Depois de alguns meses que conheceu o noivo de Ruth, sua mãe disse a ela

122  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


que “não sentia algo bom” em relação a ele. Ao ser inquirida sobre o porquê,
tudo o que ela pôde dizer era algo ligado a seu temperamento. Acreditando que
nada poderia estar errado, Ruth foi em frente com o casamento. Seu marido se
mostrou altamente agressivo. Moral da história: Não seja rápida em ignorar as
intuições de sua mãe, ou daqueles que sejam mais objetivos do que você e que
têm as melhores intenções em seus corações.
Como eu disse no último capítulo, é importante investigar a vida
em família de um indivíduo. Como seus pais o disciplinaram? Poderia
algum trauma levá-lo a um comportamento abusivo? Como seus pais
se relacionavam entre si quando ele era criança? Enquanto muitos pais
de lares agressivos mantêm a fachada de uma harmonia doméstica,
você pode sentir um clima qualquer no ar. Se seu pretendente rejeita o
tipo de casa da qual ele vem, ele pode dizer a você - e deve dar provas-
(por exemplo, consultando um terapeuta) de que suas feridas da infância
foram devidamente curadas.
Eu também recomendo questionar sobre seu passado mais
recente – atividades, amigos, e, caso seja relevante, suas relações com
o sexo oposto. (Ter medo de fazer perguntas desse tipo é um mau sinal).
Se seus envolvimentos com outras mulheres não foram sinceros ou
infringiram a halachá (lei judaica), ele se arrepende disso? E se ele
viveu uma (ou mais) situações assim, o que, realmente, não é algo
bom, isso pode indicar um problema. Relações doentias indicam uma
personalidade doentia.
Finalmente, eu mencionei a importância de procurar aqueles
que o conhecem ou conheceram há mais tempo e em circunstâncias
diferentes. Esta informação é crucial, já que hoje as pessoas costumam
aparecer nos locais de encontro como completas desconhecidas. O
que ex-patrões, professores, colegas de quarto e outros dizem sobre
ele? Relutar em oferecer referências pode, imediatamente, pressionar
o botão de alerta.
Se você observar, repetidamente, diversos dos traços listados na
pessoa com quem você está se encontrando, esteja atento, mas não
tire conclusões precipitadas. Ao mesmo tempo, não tente negar tudo,
não se culpe ou o julgue favoravelmente (uma qualidade admirável, mas
que não significa que deve ser exercida sobre a mesma pessoa sempre e sempre).
Procure a opinião de um profissional. Se ele tem uma personalidade
agressiva, saia da relação imediatamente, e pergunte a um Rabino sobre
sua obrigação de avisar outras pessoas. Se você não está pensando em
terminar, ganhe tempo para ter uma outra perspectiva. Talvez você

Fique longe de abuso  123


pense que por ele se importar com você mais do que com qualquer
outra pessoa, ou porque você o fará mais feliz do que qualquer outra
pessoa, você o mudará. Errado. O casamento apenas trará à tona o
pior dele. A fantasia de “resgatar” significa que, provavelmente, você já
está tolerando um tratamento que não deveria tolerar. Além do mais,
enquanto uma orientação espiritual deve acompanhar uma terapia
informal, não pense que o estudo da Torá e/ou uma maior observância
religiosa será a cura mágica. Alguém cuidadoso na observância de
muitas leis religiosas pode, ainda assim, agir de modo antiético. E,
mesmo que ele mergulhe nas abordagens judaicas para melhoria de
sua personalidade, a Torá não é terapia. Uma personalidade agressiva e
abusiva só será curada se admitir sua disfunção, quiser mudar e aceitar ajuda
para suas necessidades. E você também se beneficiará de conselheiros
para entender por que entrou neste relacionamento.

VERIFICANDO-SE
Agora você sabe como reconhecer uma pessoa agressiva/abusiva.
E qualquer um, não importa o quão emocionalmente saudável seja, pode se
envolver com alguém assim. O que pode aumentar suas chances de isso
acontecer?
A resposta é, geralmente, algo em sua história pessoal. Por
exemplo, se você foi muito criticado ou emocionalmente privado,
pode ter ficado com a autoestima baixa e carente de amor. Pense
profundamente sobre sua infância. Seus pais o aceitavam do jeito
que você era, ou somente quando você satisfazia as necessidades e
expectativas deles? Observe seus padrões atualmente. Você entra de
cabeça em uma relação? Você cancela planos com uma amiga sempre
que um pretendente aparece? Sua autoestima depende da aprovação dos
outros? Você substitui proximidade física por intimidade emocional?
Se sim, você está mais propensa, não apenas a atrair alguém que a
maltrate, mas a perder o autorrespeito para identificar o que está
acontecendo. Você vai acreditar mais facilmente nos argumentos dele
de que você causa seu mau comportamento. E você estará mais pronta
para consentir no casamento prematuramente.
Se você não se ama o suficiente, talvez tenha também medo de
intimidade emocional (veja o Capítulo 2). Uma relação abusiva nunca
é íntima, então, ela mantém a distância emocional com a qual você

124  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


talvez se sinta mais confortável.
Outro fator de risco é ter sido forçado a assumir o papel paterno
em uma idade jovem. Seus pais se voltaram para você para ter o carinho
que eles deveriam ter entre si ou de amigos? Foram ambos (ou um
deles) sempre física ou emocionalmente ausentes, deixando para você a
responsabilidade sobre seus irmãos mais novos? Indivíduos agressivos
são altamente imaturos, suplicam desesperadamente por carinho e
desencadeiam esse sentimento familiar de se sentir necessário. Ao
mesmo tempo, como em sua infância, a energia que você devota para
cuidar dos outros é em detrimento da compreensão de si mesmo e de
suas próprias necessidades.
Entretanto, o fator mais forte que impulsiona você a uma relação
abusiva é o que você testemunhou durante seu crescimento. Como eu
disse (no Capítulo 3), nós todos, inconscientemente, gravitamos em
torno daquilo que parece familiar, o que nós consideramos “normal”.
Se seu pai era agressivo com sua mãe (ou vice-versa) você está sujeito
a se casar com um agressor ou abusar, você mesmo, de seu próprio
cônjuge ou de seus filhos. Algumas vezes, dois produtos de um
casamento ruim cria um bom, no qual eles “resgatam” cada um de
seus respectivos passados, mas isso é raro. A menos que seja tratado, o
abuso, geralmente, passa de uma geração a outra.
E mesmo se não havia, de fato, agressão física ou verbal em sua
família, comportamentos como gritos frequentes podem ser o
suficiente para fazer o abuso parecer familiar. Além disso, querer
que seu próprio casamento seja mais tranquilo do que o dos seus
pais pode levar a concessões perigosas. Uma jovem me contou que
observou certas atitudes no homem do qual ela posteriormente se
divorciou, “Quando nós estávamos saindo, eu vi seu temperamento,
mas eu estava com tanto medo de reviver a experiência de brigas que
eu presenciei em minha casa, que eu o deixava sempre continuar com
seu jeito.” Com isso, ela, inconscientemente, deu licença para que ele
a agredisse.
Se você se reconhece em algumas das descrições acima, ou se já foi
agredida, procure um conselheiro competente agora. Se você é viciado
em relações doentias, grupos de apoio podem ser mais eficientes. Não
espere para ver se os problemas vão surgir depois do casamento. Eles
irão – então, faça o trabalho primeiro.
Um aviso para mulheres mais velhas, tão ansiosas com suas
perspectivas de casamento: Mesmo que você seja emocionalmente

Fique longe de abuso  125


estruturada, o desespero pode cegá-la para os sinais de alerta
(especialmente se você foi aconselhada a não ser “muito exigente”). Tenha
cuidado. Você pode, sim, ser menos exigente e, ainda assim, ter um
casamento feliz, mas não com alguém de comportamento abusivo.
Você aprendeu sobre os sinais de aviso de um agressor – e nós
todos temos de sabê-los, não importa se para seu próprio bem ou
pelo bem de um amigo. Embora minha própria trajetória de shiduch
tenha incluído somente rapazes normais, legais, se eu tivesse essas
informações antes, poderia prevenir alguns casais de casamentos que
nunca deveriam ter acontecido. Leve essa lição com você e passe
adiante. Você estará mais propensa a se casar com uma pessoa sadia,
com quem terá uma relação saudável e ajudará outros a conseguirem
o mesmo.

Para mais referências, veja:


1) Rabino Abraham J. Twerski, M.D., “The Shame Borne in Silence:
Spouse Abuse in the Jewish Community” (Pittsburgh: Mirov Press,
1996).

2) Miriam Adahan, “Living with Difficult People – IncludingYourself ”


(Jerusalém: Feldheim Publishers, 1991).

Para conselhos sobre uma situação pessoal, o mais recomendado é


contatar seu rabino, sua sinagoga ou centros judaicos.

126  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


PARTE 5
ESTAR INFORMADO
O casamento judaico é um relacionamento
espiritual, duas pessoas se comprometem por
toda a vida a crescerem juntas e desenvolverem
um amor profundo e duradouro. Entretanto, é
também um relacionamento legal, civil – e muitos
entram nele sem conhecimento de seus termos ou
opções. Capítulo 8: “Dinheiro e sentimento”,
discute o aspecto financeiro do casamento.
Capítulo 9, “Uma pitada de prevenção”,
descreve a solução moderna para dar às mulheres
casadas a proteção que o Judaísmo quer que elas
tenham.

 127
128  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
CAPÍTULO 8
DINHEIRO E SENTIMENTO

Quando eu decidi escrever meu primeiro livro, fui, entusiasmada,


levar a ideia para um editor judeu. Ele me disse que esse tipo de obra
não venderia, então eu mesma tive de financiá-lo e estar preparada
para suportar a perda. Mais otimista do que ele, eu estava pronta para
ver no que daria. Apenas uma coisa me preocupava: a questão sobre
qual dinheiro eu estaria arriscando.
Falando claramente, eu e meu marido, Avraham, sempre tratamos
todo e qualquer dinheiro que tínhamos (ou temos) como “nosso”. Mas
eu estava bem consciente de que, a menos que uma esposa opte por se
bancar parcialmente, a halachá (lei judaica) incumbe o marido de arcar
com o sustento do casal e, consequentemente, ele é o dono de todo e
qualquer dinheiro que a mulher ganhar. Avraham e eu tínhamos esse
acordo original, que significava que tudo o que eu ganhasse pertencia
a ele. Eu, provavelmente, financiaria o livro unicamente com o
dinheiro que Avraham tinha trazido para o casamento e, portanto,
também pertencia a ele (como minhas economias pré-matrimoniais, se eu
tivesse alguma, teriam permanecido minhas). Enquanto Avraham estava
totalmente por trás do projeto, eu tinha essa preocupação na minha
cabeça, de que não deveria usar o dinheiro dele.
Pouco tempo depois, minha avó (de abençoada memória) faleceu e
me deixou uma herança em dinheiro. Eu disse a Avraham que eu iria
em frente com o livro, já que, agora, tinha meus próprios fundos.
Avraham sorriu e disse: “Ótimo!”. Havia algo levemente suspeito em

Dinheiro e sentimento  129


seu jeito, mas, em minha empolgação, ignorei isso.
Alguns anos depois (minhas esperanças pelo sucesso do livro tinham se
concretizado), eu disse a Avraham que queria usar os lucros do meu
primeiro livro para fazer um segundo. “Acho ótimo poder publicar
meus livros com meu próprio dinheiro”, disse, feliz.
Então, ele disse: “Eu não tenho certeza de que a herança deixada
por sua avó para você, ou o que você fez com ela, eram realmente
seus”, ele disse.
“O que você quer dizer?”, perguntei, na defensiva. “Minha avó
deixou essa herança para mim por sua própria vontade. Claro que é
minha”.
“Não tenho certeza disso”, era tudo o que Avraham dizia.
Dois anos depois, a questão veio à tona de novo, durante a aula de
um Rabino, para quem eu recontei essa história.
“Sinto muito em lhe dizer”, disse o Rabino, “mas seu marido não
está errado. Não é suficiente que sua avó tenha deixado o dinheiro
especificamente para você. Ela também deveria estipular que seu
marido não teria direito sobre ele, o que eu duvido que ela tenha
feito”.
Assim, o dinheiro nunca foi meu. Eu estava profundamente abalada
com o fato de Avraham não ter me alertado na primeira vez em que
o recebi. Ao mesmo tempo, como era uma mulher casada, religiosa e
educada, estava chateada por nunca ter tido conhecimento a respeito
dessa lei. Se eu estivesse em um tipo diferente de casamento, essa
cláusula perdida poderia ter provocado algo desagradável.

FAZENDO DO “50-50” UMA REALIDADE


A base de um casamento judaico é dar. Assim, os fatores legais
devem desempenhar um papel insignificante. Não obstante, as leis
de um casamento judaico incluem opções financeiras para as quais os
casais deveriam estar atentos.
Uma questão significante é a que se refere à posse de propriedades
e de capital. No mundo ocidental atual, a maioria das mulheres se
considera parceira financeira completa no casamento, um estatuto
reconhecido frequentemente pelo direito civil. Por séculos, o Judaísmo
encorajou os casais a ver seu relacionamento pelo lado espiritual. Na

130  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO


verdade, os tenayim, o acordo escrito e selado entre as duas famílias
estabelecendo as condições financeiras do casamento de seus filhos,
estipula que o casal irá controlar seus ativos de forma igual, decidindo,
mutuamente, as questões monetárias.
Enquanto essa atitude pode ser o ideal judaico, a halachá real de
propriedade é diferente, pelos motivos que eu expliquei. Esse detalhe
talvez não tenha relevância, na prática, a menos que o casal se divorcie
e a esposa exija “sua metade” de seu acerto, nesse caso, ela descobrirá
que não tem a metade. No entanto, mesmo um casal que espera ser
feliz no casamento para toda a vida pode se sentir desconfortável com
essa situação.
Para fazer do “50-50” (meio a meio), algo mais concreto, você deve
fazer um shtar hilchati (documento legal judaico) declarando que marido
e mulher dividem tudo igualmente, o que quer que tenham trazido
para o casamento e/ou depois dele. Este shtar pode ser incluído como
parte de um acordo pré-nupcial, o qual será discutido no próximo
capítulo.

DE PAI PARA FILHO


A herança é outro assunto financeiro pertinente. Sem o shtar
hilchati, descrito acima, qualquer propriedade de ambas as partes
se torna herança do marido. Com o shtar, elas se tornam de ambos,
dele e dela. Alguns preferem que a herança permaneça “na família”,
entretanto, que ela pertença apenas ao herdeiro efetivo. Se ambos os
lados preferem esse caminho, você e seu (sua) noivo (a) podem assinar
um acordo no qual cada parte abre mão de qualquer herança do outro.
(Essa prática é comum em muitos círculos tradicionais, onde uma ou ambas
as famílias são ricas). Alternativamente, se uma mulher espera herdar
dinheiro, ela pode pedir a seu benfeitor que estipule no testamento
que “seu marido não tem autoridade sobre o dinheiro”.
Minha própria história terminou feliz: meu marido gentilmente
me deixou pensar que o dinheiro que eu herdei era meu e eu pude
publicar meu livro. Não obstante, quando envolve assuntos legais, a
ignorância nunca é uma virtude. Não importa o quanto você espere
que seu casamento seja bom, vale a pena conhecer a lei.

Dinheiro e sentimento  131


132  CHUPÁ: DA CABEÇA AO CORAÇÃO
CAPÍTULO 9
UMA PITADA DE PREVENÇÃO

Em uma perfumada e estrelada noite de Chanucá, sobre o gramado


de um lindo moshav próximo a Jerusalém, eu fiquei debaixo da chupá
com meu futuro marido. Avraham recitou, em hebraico, “Veja, você
está consagrada a mim com este anel, de acordo com a lei de Moisés
e de Israel”, e colocou o anel de casamento no meu dedo. A partir
daquele momento, nós estávamos legalmente casados. A seguir, era
hora de ler a ketubá, o acordo haláchico que acompanha o casamento.
“Eu não ligo de não ter uma ketubá extravagante”, eu havia dito
algumas semanas antes. “Que graça tem em fazer uma obra de arte
em um pedaço de papel tão ligado às leis, sem romantismo?” Avraham
encolheu os ombros e não disse nada, me deixando a responsabilidade,
caso ele usasse a impressão comum, fornecida pelo Rabinato de Israel.
Agora Avraham tirou a ketubá. Mas não era o que eu esperava. Sobre
um belo arco-íris desenhado em pastel, estavam impressas flores do
campo, em volta de uma moldura violeta, com caligrafia em hebraico
– e tudo feito por ele. Eu estava profundamente tocada e emocionada.
De repente, percebi o quanto esse “nada romântico” pedaço de papel
significava para mim.
A ketubá é a expressão principal dos laços do casamento, não
apenas do ponto de vista haláchico, mas, para a maioria das mulheres,
do ponto de vista emocional. Legislada por Rabinos há mais de 2 mil
anos, esse documento obriga um marido a honrar sua esposa e prover
todas as suas necessidades, incluindo alimentação, roupas e intimidade

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marital. Sua característica principal, entretanto, é especificar a soma
de dinheiro que ele concorda em dar a ela, caso ele faleça antes ou se
divorcie dela. Essa garantia é feita com a intenção de dar a ela alguma
segurança financeira em ambos os casos e para desencorajá-lo de
entrar com o pedido de divórcio. Nos tempos antigos, investir esse
montante poderia produzir uma renda estável de longo prazo. Hoje,
o valor é, normalmente, não mais do que alguns poucos mil dólares,
a menos que o homem decida aumentar essa quantia. (O sustento dos
filhos permanece sob a responsabilidade do marido). A ketubá é considerada
tão importante que um casal não pode viver junto, como marido e
mulher, sem ela.
Infelizmente, enquanto a ketubá mantém seu significado emocional
e ocupa um lugar de destaque em muitas paredes de salas de estar,
confiar nela como proteção para a mulher em caso de divórcio se
tornou um problema maior.

O IDEAL E A REALIDADE
Sarah e Michael, um casal de noivos de cerca de 20 anos de idade
cada, sentou para planejar seu casamento. A banda, o salão, o bufê
e a lista de convidados foram rapidamente definidos. O próximo
tópico era a ketubá – quem iria desenhá-la, e que soma estaria gravada
nela. Como Michael vinha de uma família rica, Sarah esperava que
ele acrescentasse algo significante à quantia mínima estabelecida na
ketubá.
“Vamos usar o número 18”, propôs Michael, romanticamente,
referindo-se ao valor numérico da palavra chai, vida. “Eu vou escrever
na ketubá US$ 18 mil”.
Sarah estava surpresa. “Qual o problema?”, Michael perguntou.
“Você não gosta do 18?”
“Eu gosto... mas...”
“Mas o quê?”
Com o que achou que fosse um sorriso bonitinho, Sarah disse,
“Que tal acrescentar um outro zero?”
Michael não sabia o que responder. Sentindo a necessidade de
ajuda, os dois procuraram Rav Friedman, um respeitável líder da
comunidade e possek conhecido por sua fala sem rodeios.

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“Bem, tenho boas e más notícias”, ele os informou. “A boa notícia
é que vocês não precisam se preocupar em escrever na ketubá US$ 18
mil ou US$ 180 mil, porque isso realmente não importa. A maioria
dos homens possui apólices de seguro de vida, cujo valor excede ao da
ketubá. E, quando os casais se divorciam, eles quase sempre dividem
suas propriedades levando em considerações pontos como quem
ficará com a guarda dos filhos e a necessidade financeira de cada parte.
Assim, vocês podem passar para as preocupações mais divertidas,
como quem vai fazer o design da ketubá e a caligrafia.”
“OK”, disse Sarah, inquieta. “Qual a má notícia?”
“A má notícia”, Rav Friedman continuou, sobriamente, “é que,
hoje, os judeus vivem sob a jurisdição de governos seculares, então
não importa quanto dinheiro a esposa tenha direito, um beit din (corte
rabínica) não pode assegurar que ela o terá”.
O casal estava chocado – especialmente Sarah. Como ela nunca
soube disso antes?
“Se há um divórcio”, o Rabino continuou, “um homem decente
pode dar à sua esposa um acordo justo, particularmente se ele
realmente quer terminar tudo. Mas, se sua esposa se sente mais forte
para sair do casamento do que ele, pode haver grandes problemas. O
divórcio judaico exige um consenso. Muito além disso, o marido pode
resistir e exigir qualquer coisa para concordar.”
“Mas por que um homem agiria assim?”, Michael perguntou.
“Michael”, Rav Friedman explicou, “o divórcio é um período
de muita má-vontade e a raiva pode superar a decência. Cada parte
reclama da outra, e aquele que sair com a maioria das posses e com a
guarda dos filhos pode se sentir vingado. Ele pode dizer: ‘Veja, se eu
consegui tudo isso, o divórcio não pode ser minha culpa’”.
O rapaz balançou a cabeça. “Eu não posso imaginar alguém fazendo
isso.”
“Bom saber disso no seu caso, mas, infelizmente, é o que acontece
– e, embora a esposa possa agir da mesma maneira com seu marido, é
algo menos comum. Além do mais, se a esposa desafia o beit din e se
recusa a aceitar o divórcio, seu marido pode tentar conseguir o que
é chamado de um heter meah rabbanim, “permissão de cem rabinos”.
Embora só seja concedido em certos casos, ele permite que o marido
deixe de cumprir o decreto de mais de 1 mil anos, que baniu o

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casamento com mais de uma mulher – o que é permitido pela Torá – e
se case com outra pessoa. Uma mulher cujo marido nega o divórcio
não tem essa opção.”
“Os Rabinos não podem fazer nada para ajudá-la?”, Sarah queria
saber.
“Eles podem tentar”, respondeu Rav Friedman. “Eles podem
publicar avisos alertando as pessoas para impedir a entrada deste
homem em toda sinagoga, boicotar seus negócios e outros meios
de mantê-lo no ostracismo – em outras palavras, eles podem fazer
a vida dele tão difícil, que ele pode acabar cedendo. Em Israel, o
governo pode cortá-lo de diversos benefícios e direitos e até prendê-
lo. Nas comunidades chassídicas, o rebe pode enviar vários de seus
companheiros, a fim de ‘persuadi-lo não verbalmente’ a dar o divórcio.
Outras comunidades criaram suas próprias e criativas soluções. Mas
se nada funciona, a esposa está amarrada a ele. E, além do sofrimento
dela, é um terrível chilul Hashem (profanação do nome de Hashem),
já que é como se o Judaísmo não levasse a mulher em consideração”.
Houve um longo silêncio. Sarah olhou de relance para Michael,
esperando sua resposta.
“Rav Friedman”, Michael disse, finalmente, “nem Sarah ou eu
temos a menor dúvida de que nosso casamento vai durar. Mesmo se
nós estivermos errados, D’us não permita, eu não posso me imaginar
tratando minha esposa de modo injusto. Mas se a ketubá já não protege
as mulheres, eu acho que não podemos tampar o sol com a peneira.”
Aliviada em seu íntimo, Sarah acrescentou: “eu duvido que meus
pais vão querer isso para nós também. Enquanto eles pensam no
mundo de Michael e se sentem tão bem sobre o nosso relacionamento,
eles ficariam muito chateados ao saber que sua filha está casando sem
qualquer proteção.”
Rav Friedman concordou. “Você tocou em pontos importantes,
com os quais eu concordo. Mas há uma questão aí que é maior do que
você e seus pais. Ela diz respeito a Klal Yisrael (o povo judeu como um todo).
A maioria das mulheres judias religiosas nunca se divorciará. Mas uma
minoria, sim – e, para sua segurança, é importante que a cerimônia de
casamento inclua um acordo haláchico que possa protegê-las.”

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RESTAURANDO A PROTEÇÃO
Se você está preocupado com o divórcio judaico hoje, pode
demonstrar responsabilidade por Klal Yisrael assinando um acordo
pré-nupcial haláchico.
Algumas pessoas associam os acordos pré-nupciais com aqueles
usados nos casamentos civis, para garantir que, em caso de divórcio,
ambas as partes “levem o que é seu”. Um acordo judaico pré-nupcial,
entretanto, simplesmente restaura a proteção básica que a ketubá
outrora dava às mulheres, com uso das cortes civis para fazer cumprir
seus termos. Um acordo pré-nupcial ainda preserva o espírito e
o propósito da lei judaica e é apropriado até para os círculos mais
tradicionais e religiosos. Dentre os proeminentes Rabinos que
endossam os acordos pré-nupciais, estão Rav Zalman Nechemyah
Goldberg, da mais alta corte rabínica de Jerusalém, e Dayan Chanoch
Ehrentreu, do beit din de Londres, cuja formulação é aprovada pelo
Rav Yosef Shalom Elyashiv ZT”L, de Jerusalém, e é usada em todo o
Reino Unido.
No acordo pré-nupcial mais comum, as partes concordam que se
ambos quiserem dissolver o casamento, o caso será decidido por um
beit din específico, e cada um pagará a ajuda financeira ao cônjuge,
referente a cada dia que ele ou ela impedir ou rejeitar o valor do
divórcio ordenado pela corte. O documento também pode dividir
a propriedade do casal em 50-50 (meio a meio), ao incluir o shtar
hilchati descrito no último capítulo. Um acordo pré-nupcial ajuda
a terminar um casamento com dignidade, sem maus-tratos. Uma
autoridade da corte rabínica de Jerusalém estima que os acordos pré-
nupciais, halachicamente compromissórios, podem eliminar 90% dos
problemas dos maridos que se recusam a dar o divórcio ou das esposas
que se recusam a aceitá-lo.
Apesar de seus benefícios, um casal que deseja fazer um acordo
pré-nupcial pode encontrar opositores bem-intencionados. Quando
intelectual, a preocupação é geralmente baseada sobre o conteúdo
do acordo. Um divórcio haláchico deve ser voluntário. Quanto maior
as consequências financeiras impostas sobre a parte não-cooperativa,
maior o risco de coagir um divórcio. Por outro lado, quanto menores
as consequências, menos eficaz será o mecanismo do acordo pré-
nupcial. Felizmente, existem versões que encontraram a aprovação
rabínica e impediram o comportamento antiético nos processos de
divórcio. (Na realidade, alguns Rabinos são tão convictos dos benefícios dos

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acordos que eles não oficializam casamentos sem um).
A maioria das objeções aos acordos pré-nupciais, entretanto, é
emocional. Um rapaz que conheço foi questionado, “Por que começar
seu casamento com um pé para fora da porta?”. No entanto, por
apenas restabelecer salvaguardas, como as fornecidas pela ketubá, um
acordo judaico pré-nupcial não pressupõe menos aposta na confiança
entre noiva e noivo ou otimismo em relação ao sucesso do casamento.
A ketubá é, na verdade, um acordo pré-nupcial criado há 2 mil anos
– e, como o seu antecessor, a versão moderna indica a seriedade do
compromisso de um casal e da crença em seu casamento. Como um
advogado disse, “O público tem de ser ensinado que assinar um acordo
pré-nupcial não é uma declaração de guerra, mas um ato de amor.”
A outros casais pode ser dito, “Em nossa comunidade, isso não é
feito”. O desconforto diante de algo não familiar é compreensível.
Entretanto, “não é feito” é um motivo fraco para negligenciar algo que
talvez possa ser feito.
Uma razão particularmente masculina para fugir de um acordo
pré-nupcial pode ser o interesse pessoal. Embora o acordo proteja
ambas as partes em um casamento, ele é geralmente empregado para
a segurança da mulher. Talvez um homem se pergunte, “Por que um
homem deveria assinar isso?” Eu devolvo a questão a ele, “Por que
um homem daria a ketubá a sua esposa?” A resposta a ambas questões
é simples: porque ele entende que o Judaísmo quer que as mulheres
sejam protegidas no casamento. No entanto, se um homem aprecia a
proposta de um acordo pré-nupcial, e, mesmo assim, ainda se recusa a
assinar um, ele está efetivamente dizendo, “Se nós nos divorciarmos,
quero estar pronto para ferir você.”
A mais comum, entretanto, é a reação de “nojo”: “Por que você
iria querer que um documento tão ‘nojento’ fizesse parte do seu
casamento?”. Eu sempre acho essa desculpa hilária, já que a ketubá
em si, vista como uma bela declaração de compromisso matrimonial,
primariamente, declara quanto o marido deverá dar à sua esposa, no
caso de divórcio. Você não pode ficar mais “enojado” com algo nada
romântico do que com isso. Nós apenas estamos mais acostumados
com a ketubá e não com os acordos pré-nupciais. Talvez a solução seja
que os acordos pré-nupciais se tornem tão universais quanto a ketubá,
o que muitos Rabinos acreditam que irá acontecer.
Quando você era pequeno e tinha de tomar uma vacina, sem
dúvida, você protestava, “Eu não preciso! Eu não vou ficar doente!”. Se

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a doença em questão pudesse ser evitada mantendo os cuidados com a
higiene, provavelmente, você estará certo. Mas como o Ministério da
Saúde não pode vacinar apenas as pessoas que não mantêm os hábitos
de higiene – e porque, não importa o quão limpo você seja, a doença
pode acometê-lo – todos precisam ser imunizados. É uma questão de
saúde pública.
Os acordos pré-nupciais são similares – e foi com essa preocupação
para com o povo judeu que minha amiga Marina apresentou a ideia
a seu futuro marido. “Eu sei que nenhum de nós jamais vai precisar
disso”, ela disse a ele, “mas, para a segurança daqueles que irão, eu
gostaria que isso se tornasse uma prática comum para cada um em klal
Yisrael. Assim, queria que a gente ajudasse isso a se concretizar”. E ele
aceitou.
Você também pode fazer do acordo pré-nupcial parte de seu
casamento, juntamente com uma declaração pública explicando o
porquê dele. Na opinião de um crescente número de Rabinos e jovens
casais, é uma maneira de dizer, “Eu me importo”.

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PALAVRA FINAL
Ser um judeu solteiro significa andar na corda bamba. Você deve
estar sempre preparado e ansioso para se casar; ao mesmo tempo,
deve viver o presente plenamente. O truque está em fazer coisas que
tragam prazer e satisfação e, ao mesmo tempo, ampliem suas chances
de encontrar sua alma-gêmea.
Em primeiro lugar, e o mais importante, é que essa estratégia
significa crescimento espiritual. O Judaísmo ensina que o mundo
se mantém sobre três pilares: o estudo da Torá, a reza e os atos de
bondade. O mesmo se dá com o seu bem-estar espiritual. Mesmo que
você seja um estudante de Torá brilhante, você precisa praticar chessed;
se você sempre ajuda os outros, precisa estudar, e todos precisam falar
com D’us, sempre e honestamente, por meio das tefilot (rezas). Tudo
isso alimentará sua mente, seu coração e sua alma, ampliando sua
autoestima e fazendo de você um parceiro ainda mais promissor para
alguém especial.
Trabalhar e apoiar a si mesmo também pode ajudar a construir
a autoestima necessária para um relacionamento saudável. Mas
escolha cuidadosamente sua carreira. Se você está levando a sério
a possibilidade de se casar, a falta de dinheiro ou de satisfação no
trabalho vão reduzir suas chances. Uma jovem advogada me contou
que quando ela percebeu que a Vara de Família a estava desagradando,
ela rapidamente trocou para Direito Tributário, um campo bem
menos excitante, mas onde ela poderia preservar os traços de caráter
que ela queria trazer para seu futuro casamento. Essa, sim, é uma
advogada esperta.

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Não importa o quanto você ganhe, se quiser experimentar viver
com outra pessoa, considere a hipótese de dividir a casa com um
(a) colega. Aprender a dividir o espaço, responsabilidades e ignorar
algumas diferenças está entre as melhores maneiras de se preparar
para a vida de casado.
Além de construir seu caráter, desenvolva todos os talentos e
habilidades possíveis, que não entrem em conflito na hora de encontrar
sua alma-gêmea. Aprenda coisas novas. Amplie seus horizontes. Você
se tornará mais interessante e vivo e mais pessoas vão querer ficar
ao seu lado. Você também será mais atraente. Certa vez, alguém
perguntou a uma conhecida rebetzin qual era seu tipo de beleza
favorito. Ela respondeu, “Educação. Ela dá brilho aos olhos”. Assim
também o é para uma infinidade de outras atividades. Faça com que
você se ilumine.
Mas, não ignore seu bem-estar físico. Se você é um sedentário e
viciado em comidas nada saudáveis, talvez seja hora de começar a se
mexer e a comer corretamente. Tornar-se mais saudável e mais em
forma pode ser um desafio, mas você vai amar os resultados.
De tudo o que eu mencionei, chessed deve estar no topo da lista. Dê
aos outros. Use seus talentos e habilidades para enriquecer não apenas
sua própria vida, mas a vida de outras pessoas. Você verá o quanto
verdadeiramente abençoado você é, e a felicidade verdadeira que
resulta de se dedicar a projetos dignos, quer seja uma causa nacional
ou às necessidades de seu vizinho. E, ao mesmo tempo, desenvolverá
a qualidade mais significante para uma relação longa e cheia de amor.
Assim, enquanto continua a trabalhar direcionado ao casamento,
não coloque sua vida no modo “espera”. Há muito a ser feito neste
mundo. Vá e doe-se. Você será mais rico por isso – e seu crescimento
o aproximará daquele dia especial pelo qual você tanto espera.

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