Sei sulla pagina 1di 126

AMAR E CRESCER

o crescimento da igreja tem sido causa de perturbação para muitos.


Há igrejas e pastores que, quase em desespero, abraçam cada nova
técnica que, aparentemente, tem sido causa do sucesso de outros
ministérios. Outros tomam atitudes contrárias: resistem ao
crescimento porque, afinal, "os irmãos já não se conhecem." Um
organismo saudável obviamente cresce. Esta é a tese deste livro:
quando os irmãos em Cristo vivem naquela sua principal
característica, que é o amor uns pelos outros e pelos perdidos, o
crescimento da igreja será natural e espontâneo.
O Rev. Juarez nos leva em um passeio agradável pelas páginas da
Bíblia e por exemplos da vida da igreja, abordando aspectos como
serviço mútuo, ensino, alegria, ação social, oração e missões. Que
seu testemunho possa servir de estímulo e inspiração para os crentes,
na obra do Reino.

Juarez Marcondes Filho é casado com Renata e tem 2 filhos, Beatriz


e Bernardo. Exerce seu ministério como pastor da Igreja Presbiteriana
de Curitiba/PRo Formou-se no curso de bacharel em teologia pelo
Semindrio Presbiteriano do Sul, em Campinas, e no curso de mestrado
em teologia pastoral pelo Semindrio Teológico Sul Americano, em
Londrina. O presente livro fOi sua tese de mestrado.

ISBN 85-87143-17-4

9788587143174 >
JUAREZ MARCONDES FILHO

AMAR E
CRESCER
o fATOR COMUNhÃo NO
CRESciMENTO dA iGREjA

Descoberta Editora Ltda.


Londrina - Curitiba
Ficha catalográfica:

Marcondes Filho, Juarez


Irmãos amados: o fator comunhão no crescimento
da igreja / Juarez Marcondes Filho. - Curitiba,
Descoberta, 1999.
128 p.
ISBN 85-87143-17-1
1. Igreja 2.Comunhão 3.Crescimento da igreja

Revisão: Hans Udo Fuchs


Capa: Luciana Marinho
Diagramação: Marianne B. Richter
Impressão: Imprensa da Fé

1ª edição: 1999
Todos os direitos reservados para:
Descoberta Editora Uda.
Rua Max Rosenmann, 364
CuritibafPR 82600-150
Tel/Fax: (041) 356 5083
E-mail: descober@uol.com.br

I I
,
SUMARIO
PREFÁCIO 5
INTRODUÇÃO - POR QUE AS PESSOAS
VÊM À IGREJA? 7
CAPíTULO I - NA CRIAÇÃO E EM ISRAEL 19
Criação - A Busca do Interlocutor 19
Queda - A Quebra da Comunhão , 21
Missão - A Comunhão Universal 23
Salmo 133 - Os Irmãos Unidos 25
Voz Profética - A Denúncia da Ausência de
Comunhão 26
CAPíTULO 11 - NA IGREJA E NA CONSUMAÇÃO 29
Jesus e os Discípulos 31
A Comunidade de Jerusalém 33
A Visão Paulina da Comunidade 35
O Apelo aos Hebreus 36
A Comunhão nas Cartas Gerais 37
A Comunhão no Apocalipse 38
CAPíTULO 111- O PASTORADO VOLTADO PARA A
COMUNHÃO 41
Como nos vemos 42
O que fazemos , , 44
O que é pastorear 45
CAPíTULO IV - TRABALHO PARA TODOS 49
Eleição para Serviço 49
Servir a humanidade 50
O Povo que só quer se servir 51
Dons e Serviços 52
A Maturidade como Alvo 53
Ministérios, Hoje 54
CAPíTULO V - FORTALECENDO A COMUNHÃO 57
Estar Juntos para Aprender 58
Metodologia de Ensino 60
Todo o Conselho de Deus 62
CAPíTULO VI- O REINO DA COMUNHÃO 65
A Promoção da Justiça... 68
A Vivência em Paz..... 69
A Manifestação da Alegria....................................... 71
CAPíTULO VII - O OMBRO AMIGO 75
Consolação pela Palavra 77
Exortação................................................................ 79
Consolação pelo Contato 81
Consolação para Consolar...................................... 83
CAPíTULO VIII-ASSISTINDO AOS QUE PRECiSAM.... 85
Evangelizar ou Fazer Ação Social? 85
Cuidado com o Assistencialismo 87
Avivamento e Ação Social....................................... 88
A Igreja Presbiteriana de Curitiba 92
CAPíTULO IX - BUSCANDO JUNTOS A
PRESENÇA DE DEUS 95
Devoção Pessoal e Intercessão Comunitária 96
O Dom da Intercessão 98
"Pai-Nosso" 99
Orar pelo quê? 100
CAPíTULO X - CHAMANDO OUTROS À
COMUNHÃO 103
Proclamando o Evangelho 105
Aproximando os Povos 107
Provocando a Atenção 108
Provocando o Estímulo 110
Motivando o Deslocamento..................................... 111
CONCLUSÃO - O CRESCIMENTO DA IGREJA 115
REFERÊNCIAS BIBLlOGRAFICAS 121

I I
,
PREFACIO
Crescimento da Igreja parece ser uma preocupação
generalizada. Seja nos grandes fóruns, seja em conversas
triviais, o assunto aparece. Se a nossa congregação está
crescendo razoavelmente bem, não economizamos
palavras para apresentá-Ia; é fácil observar a entre
lideranças: "Quantos membros tem a sua Igreja?" é
pergunta inescapável. Se a congregação não anda bem,
com mais razão, o tema retoma.
Quero aqui compartilhar minha visão ministerial e,
muito especialmente, defender que o crescimento de uma
igreja local passa necessariamente pela comunhão que é
experimentada em seu meio. A comunhão levará os
membros a desejarem sempre estar juntos, trabalhando
na causa de Cristo, motivando outros a virem fazer parte
da mesma comunhão.
Meus agradecimentos sinceros a todos que, de um
modo ou de outro, colaboraram para que fosse possível
colocar essas idéias por escrito: à Igreja Presbiteriana de
Curitiba: Conselho, colegas e membros; ao Seminário
Teológico Sul Americano: diretores, professores e colegas,
pelo incentivo; e, acima de tudo, aos filhos e à esposa,
que motivou e ainda formatou todo o trabalho: todo o
carinho.
Dedico este modesto trabalho à memória do Rev.
Prof. Elias Abrahão, falecido há alguns anos em acidente
automobilístico. Pastor, mestre, teólogo, estadista, sempre
me incentivou no ministério e nos estudos, e foi ardoroso
defensor da comunhão dos filhos de Deus..
INTRODUÇÃO

POR QUE A AS ,
PESSOAS VEM A
IGREJA?

o assunto do momento é o crescimento da igreja. A


Igreja Presbiteriana do Brasil, denominação de caráter
conservador, acostumada a um crescimento tímido, lançou
um projeto nacional de plantação de igrejas. As diversas
instâncias conciliares são desafiadas a mapear sua região
de alcance, de modo a identificar as áreas não cobertas e
implantar novas congregações nesses lugares. Isto vale
para cidades, distritos, bairros e pequenas vilas. O alvo é
dobrar, em pouco tempo, o número de presbiterianos no
Brasil. Trata~se, apenas, de um exemplo entre muitos
outros em todo o mundo.
A sobrevivência da igreja nos tempos das
perseguições (séculos I a 111) cedeu lugar às grandes
discussões teológicas que motivaram os concílios
ecumênicos (séculos IV em diante). O movimento
reformador da igreja (século XVI) venceu as barreiras
medievais (séculos VI a XV), fazendo a igreja retornar às
suas origens, à Palavra de Deus. O movimento missionário

7
moderno, surgido no século passado, levou o evangelho
aos lugares mais distantes, propiciando um crescimento
da igreja tão diversificado como jamais foi visto
anteriormente.
Mesmo assim, há muitos grupos de povos a serem
alcançados. Assim sendo, o tema que tem dominado a igreja
no presente é o que diz respeito ao seu próprio crescimento.
Congressos internacionais, jornadas de estudo,
conferências, palestras, temáticas denominacionais,
projetos globais, tudo voltado para a questão do crescimento
da igreja.
Alguns grupos do passado e do presente são motivo
de pesquisa, no esforço de descobrir as causas do
crescimento da igreja, em dado período e em certo lugar.
Os grupos pesquisados são escolhidos por uma simples
razão: costumam reunir multidões de pessoas. Quer em
santuários sofisticados ou templos muito simples, as
pessoas se multiplicam.
Daí perguntarmos: O que motiva toda essa gente a
lotar os edifícios religiosos? Qual a razão dessas pessoas
se filiarem às comunidades religiosas? enfim, por que as
pessoas vêm à igreja?
Não é propósito deste trabalho admitir, de
imediato, a operação divina em todas as coisas. Tal
simplificação retira de nós o esforço de refletir sobre
questões menos gloriosas, porém muito sérias. É justo
afirmar, sem sombra de dúvida, a ação de Deus no
crescimento da igreja. "O crescimento vem de Deus."1
No entanto, o objetivo deste trabalho é levantar as ações
humanas, com a permissão e a direção de Deus, para
o crescimento da igreja.

I I
Assim sendo, percebemos que muitas pessoas vêm
à igreja por mero costumeirismo. É comum atribuir tal
experiência às comunidades pequenas e que, virtualmente,
não crescem. Isto não passa de tabu e preconceito. Vamos
encontrar, nas grandes, nas médias e nas pequenas
igrejas, indivíduos acostumados a ir às reuniões da igreja
e, por isso, sempre vão. Habituaram-se a freqüentar os
trabalhos naqueles determinados dias e horários e, quase
que automaticamente, não se ausentam. Tal razão não
demanda maiores esforços para o cumprimento do
programa religioso. Mas certamente, será um entrave
quando as coisas sofrerem mesmo que sejam ligeiras
alterações.
O costume de ir à igreja não é mau em si. Trata-se
de um hábito, não de um vício, como o tabagismo,
alcoolismo ou toxicomania. Vício seria o contrário, deixar
de ir. Aliás, as Escrituras fazem esta ponderação: "Não
deixemos de congregar-nos como é costume de alguns."2
Mais do que isto, devemos observar a importância de
cultivar bons hábitos. Ter o costume de freqüentar os
trabalhos da igreja é melhor do que buscar companhias
prejudiciais. O que se questiona no costumeirismo é ser
ele a única ou uma das poucas razões para se ir à igreja.
Pessoas que fazem coisas por mero costume não sabem
responder "por que fazem o que fazem".3
Uma outra razão, geralmente evocada, pela qual as
pessoas vêm à igreja diz respeito à pregação da Palavra
de Deus. É forçoso notar a importância da proclamação
no culto público. Via de regra, o sermão acontece da
metade para o fim do serviço religioso. Muitas pessoas
se atrasam, não chegam para a primeira parte, mas se
estiverem presentes na exposição da Palavra se darão
por satisfeitas e poderão justificar o seu esforço e sua

9
presença na igreja. Tanto, que boa parte delas, mal termina
o sermão e, já deixam o santuário.

Da importância dada ao sermão se entende o lugar que ele


ocupa na liturgia calvinista - o lugar central. Isso não significa
que Calvino tenha dado uma importância exagerada ao prega-
dor; significa apenas que, para ele, o sermão tem que ser nada
mais, nada menos do que a fiel interpretação da verdade revela-
da nas Escrituras, dirigida aos problemas do momento. 4

Eis uma boa razão para congregar-se: ouvir um


sermão que toque nas questões radicais da vida, que
aponte um caminho de solução para tantos impasses na
existência. A mensagem, sendo bíblica, trará o alimento
espiritual necessário ao fiel que busca solidez na vida. O
conhecimento doutrinário e teológico se revestirá em
fortalecimento ao homem de todos os tempos.
Mas a ênfase calvinista na Palavra nunca pretendeu
gerar o pulpitocentrismo que nos cerca, no presente. De
um lado, o povo de Deus se acha refém de uma certa hora
mágica em que toda a nossa espiritualidade será
acrescida ou não, dependendo da mensagem que será
ouvida. E, paradoxalmente, muitas vezes, um bom sermão
recebido, se converterá no estabelecimento da inércia
espiritual. Assim raciocinam muitos crentes: não preciso
estudar a Bíblia diariamente, uma vez que no domingo eu
irei ouvir um excelente sermão.
Não bastasse esta displicência, muitos pregadores
se convertem em estrelas do púlpito e passam a ser muito
recorridos, em detrimento de muita gente boa que,
simplesmente, não tem fama. Nada a favor da
mediocridade. O que é mister demonstrar neste ponto, é
que muito do crescimento em certos segmentos religiosos
está centrádo em figuras exponenciais. É preciso cuidar
para que a legítima motivação do crescimento na Palavra

10

, I
não degenere em seguimento de homens. De qualquer
modo, muitas pessoas vão à igreja porque vão ouvir a
pregação da Palavra de Deus.
As razões vão se aliando: o bom hábito de freqüentar
a igreja, o desejo de ouvir uma Palavra do Senhor. Mas há
quem ache de fundamental importância o programa
oferecido, mormente, o programa do culto. Por culto,
queremos entender as reuniões em geral na igreja; afinal
de contas, em todas elas há algum tipo de liturgia envolvida.
Um bom programa atrai. É preciso equilibrar as
diversas partes. Não se pode olvidar, também, que a
monotonia cansa. Usar da criatividade não é pecado.
COSTAS indaga: "Por que será que quando se
distribui a criatividade, parece que os evangélicos nunca
estão por perto para pegar a sua parte?"5 Em nossa igreja
há um excelente coro que motiva muitas pessoas a virem
à igreja. É fácil constatar isto quando o coro não se
apresenta; a frustração fica estampada no rosto dos
crentes.
A busca de um programa atraente tem exigido um
esforço hercúleo para manter a congregação assídua. Em
alguns casos, os cultos andam beirando aos "shows". Os
dirigentes não conduzem mais a liturgia; se transformaram
em animadores de auditório. A parte musical - muito
comum nas apresentações artísticas - ganhou a
central idade do encontro. Toda atenção ficou voltada à
parafernália dos instrumentos, aos ritmos e aos muitos
decibéis.

A música como linguagem é simplesmente um meio, não um


fim. Todas as vezes em que a música se torna um fim em si
mesma, ela usurpa o lugar que pertence só a Deus e torna~se
um ponto de discórdias e de divisões na Igreja. 6

11
o interesse pela igreja, em alguns ambientes, tem
se deslocado do show para o atendimento de
necessidades imediatas. Como parte fundamental do
programa de culto, é oferecida a esperança da resolução
de problemas em tempo recorde. Tem algo a ver com a
expectativa da pregação da Palavra. A diferença de um
de outro, está no imediatismo e na natureza do
atendimento. O alimento espiritual ministrado pela Palavra
traz alento ao âmago do ser e pode distender a esperança
para um futuro, mais próximo ou distante. Já, quem tem
pressa e tem casos mais palpáveis e concretos, vai
procurar um programa que o atenda.
O que dissemos até aqui não tem por objetivo julgar
o que acontece, emitindo um parecer favorável ou
desfavorável. Cabe-nos, apenas, constatar o fato em si e
suas conseqüências. Por outro lado, é fácil observar que
algo autêntico pode degenerar em vil imitação, ou que
podemos ser genuinamente motivados a ir à igreja e
contribuirmos com o seu crescimento pelas razões já
aludidas.
Ainda, uma razão, que muitos podem questionar, mas
nos parece muito sugestiva, diz respeito ao local e horário
dos encontros do povo de Deus. Algumas igrejas não estão
crescendo porque simplesmente não atentaram para esses
detalhes. O local escolhido para as reuniões e cultos
tornou-se obsoleto, desconfortável, de difícil acesso.
Dizemos tornou-se, presumindo o bom senso de quem
começou o trabalho e, certamente, escolheu um lugar que
à época era adequado. Infelizmente, muitos, desde o
princípio, começam errados.
Conforto e beleza são imensamente atrativos. Tanto
que alguns santuários são freqüentados sem qualquer
esforço de persuasão. Sua estrutura e majestade se

12

I I
encarregam deste empenho. Novamente, o desvio do
propósito original se avizinha. O lugar tornou-se mais
importante do que o que se faz nele. E, em nome de boa
assistência, se faz nele o que não se deveria fazer.
Quanto à questão de horário, apenas um exemplo.
Temos três cultos dominicais em nossa igreja; dois pela
manhã e um à noite. São congregações diferentes que se
reúnem neles. Tínhamos um problema de concentração no
segundo culto matinal; por outro lado, os dois grupos que
vinham de manhã não se encontravam; um culto era muito
cedo e outro muito tarde. Fizemos uma ligeira mudança: o
primeiro culto começaria trinta minutos mais tarde e o
segundo, trinta minutos mais cedo. Com isso, aproximamos
os dois grupos, e muitas pessoas que vinham no segundo
culto acharam melhor vir no primeiro, uma vez que ele não
era mais tão cedo quanto antes. O segundo culto continua
muito concorrido, mas o primeiro, teve um crescimento
muito considerável.
A pergunta permanece: por que as pessoas vêm à
igreja? As razões alegadas até aqui, quando manifestas
sinceramente ou não, nos sugerem que a eventual não
satisfação destes anseios pode levar as pessoas a
procurarem outras igrejas, ou mesmo deixarem de
congregar-se por algum tempo. Mas há um motivo especial
que leva as pessoas a estarem na igreja e, muito
sinceramente, nela permanecerem, haja o que houver. E é
a respeito dele que pretendemos dissertar no presente
trabalho.
O que leva uma mulher crente a deixar a sua casa várias
vezes por semana, tomar uma condução coletiva, atravessar
vários bairros, para chegar à nossa igreja e participar das
muitas atividades que ali sé realizam? Neste trajeto ela
passa por, pelo menos, três igrejas de sua própria

13
denominação. Porventura, ela não poderia acostumar-se a
ir a uma dessas igrejas? Nelas não é pregada a Palavra de
Deus? Os programas não são atraentes? A resposta a tudo
isso é que, em nossa igreja, ela encontrou o seu espaço,
um ambiente fraterno; a nossa igreja é a sua casa.
De um ponto de vista superior, afirmamos que Deus
chama os que são seus do mundo para o reino e, por
conseqüência, se estamos nesta ou naquela igreja, não
podemos deixar de vislumbrar os caminhos de Deus em
nossa vida. Mas, de uma perspectiva muito prática e
humana, não podemos afirmar com segurança que os
crentes estão em nossa igreja porque pregamos a pura
Palavra de Deu's ou porque a nossa programação é muito
atraente, se eles não se sentem verdadeiramente em casa.
Nossa igreja tem a sua sede no centro da cidade.
Nossa cidade é a capital de um próspero estado brasileiro.
Muita gente vem do interior e mesmo de outros estados à
busca de melhor sorte nos negócios ou em razão de estudos.
Os crentes também têm esse direito. O primeiro lugar de
culto que procuram é a nossa igreja. Acostumamo-nos a
saudar os visitantes em nossos cultos. Em certas épocas,
como início de ano, há cultos em que temos mais visitantes
do que membros da igreja, que, evidentemente, estão em
viagem de férias. Passam-se alguns meses e, em visita a
outras igrejas da cidade, nos encontramos com muitos
daqueles rostos que estiveram no início conosco. Boa parte
deles fica conosco. Outros, no entanto, descobrem que o
seu ninho está naquela outra comunidade.
Estamos entrando no capítulo das relações humanas
e da sociabilidade.

fi.. sociabilidade é a propensão do ser humano de viver junto .


com os outros e comunicar-se com eles, torná-los participan-

14

I I
tes das próprias experiências e dos próprios desejos, conviver
com eles as mesmas emoções e os mesmos bens.7

Os indivíduos sentem necessidade de se unirem em


grupo. E a comunidade cristã tem por objetivo precípuo
preencher esse anseio. Quando alguém vem às nossas
igrejas e houve uma profunda, séria e abençoada
mensagem da Palavra de Deus, quer experimentar isso com
os outros. Não necessariamente com o grupo todo, numa
espécie de uniformização de experiência. Mas dentro do
grupo maior haverá um grupo mais específico com quem
compartilhar a experiência de fé.
Com isso queremos afirmar que não basta ao crente
ter o conhecimento da Palavra de Deus. Ele almeja sentir-
se parte do grupo. Sim, ele espera ser edificado
espiritualmente. Mas, inegavelmente, ele vai à igreja para
ter comunhão com o povo de Deus. É a primeira vez que
mencionamos a palavra "comunhão" neste trabalho. Mas
é dela que vamos nos ocupar ao longo de todo ele.
Quando falamos do crescimento da igreja, pensamos
nos templos lotados de fiéis, adorando a Deus num culto
verdadeiramente espiritual. 8 Mas quantos destas miríades
de crentes estão experimentando real comunhão na família
da fé? Mais que isto: que valor para o crescimento da igreja
atribuímos ao fato das pessoas sentirem-se bem umas com
as outras? Ainda: imaginamos que a vertical idade de
nossa espiritualidade nada tem a ver com a horizontalidade
das nossas relações?
Será falso admitir que os nossos interesses com a
igreja sejam de ordem essencialmente espiritual. Na
verdade, nosso entendimento é que nossas relações
p~ssoais, sociais e comunitárias são expressões de nossas
espiritualidade. '''Quando vos reunis na igreja'9 não se refere
a um lugar ou prédio, mas a um agrupamento de pessoas

15
com o propósito de cultuar e ter comunhão, juntos."1D
Chamam-nos a atenção as expressões "agrupamento",
"comunhão" e "juntos".
Afirmamos que as pessoas vêm às igrejas porque
querem estar junto aos outros, querem fazer parte de um
agrupamento. Defendemos que o crescimento da igreja,
pela graça e virtude divina, está fortemente vinculado ao
fator comunhão. Isto é, os crentes se unem à igreja onde
encontram comunhão, onde se descobrem em casa.
Numa outra vertente, questionamos seriamente o
aglomerado de pessoas nos santuários à busca do
suprimento de suas necessidades, que não passa pelo
teste da comunhão. Em nosso meio já ficou amplamente
cunhada a expressão "igreja-rodoviária" .11 Trata-se
daquela comunidade - se é que podemos chamá-Ia assim
- que mantém atividades religiosas o dia todo com o
propósito de atender às centenas de pessoas que passem
por ali, sem, no entanto, propiciar vínculos, relacionamentos,
contatos, comunhão entre os freqüentadores. Apesar de,
em tais instâncias, haver muito mais o que criticar, o que
nos interessa é que a reunião de muitas pessoas,
necessariamente, não implica em verdadeiro crescimento
da igreja.
O Credo Apostólico ecoa há mais de 19 séculos:
"Creio na comunhão dos santos." Assim como afirmamos
a crença em Deus Pai e Deus Filho, confessamos crer no
Espírito Santo, que constitui a igreja universal, onde os
santos se acham congregados em comunhão uns com os
outros. É matéria de fé. É confissão de crença. É
proclamação e vida na igreja.
Em tempos em que há um.despertamento por parte
da igreja em relação à terceira pessoa da Trindade, é
mister indagar: Em que medida o Espírito Santo que

16

I I
confessamos, no afã de fazer a igreja crescer, propicia a
comunhão entre os membros da igreja? Ou, por outra,
nossa pressa em ver a igreja crescer é coerente com a
nossa confissão doutrinária? Ou, ainda: quando apelamos
para as manifestações do Espírito, estamos atentos para
os resultados disto em nossas relações pessoais e,
conseqüentemente, sociais?
Por comunhão entendemos as relações fraternais que
se estabelecem no seio da comunidade cristã, e que
garantem vínculos entre os membros da igreja a ponto de,
não somente, tomarem prazeirosa a convivência entre
irmãos, como também, marcarem o seu testemunho
perante o mundo, provocando intensa atração deste para
a igreja.
Nosso propósito é demonstrar em que medida o
ambiente fraternal corrobora para o crescimento integral
da igreja, e de que modo a comunhão entre os irmãos
refletirá real incremento na vida da igreja. Não basta
constatar um crescimento numérico na igreja que não se
traduza em verdadeiro ajuntamento dos eleitos de Deus.
Nada contra o crescimento em números. Apenas, o
cuidado para não criar ilusão de ótica, imaginando ver uma
igreja muito grande, mas não uma grande igreja.
Nosso trabalho deseja atravessar as Escrituras
Sagradas do Antigo e do Novo Testamento, procurando
as indicações desta vida comunitária do povo de Deus,
para, em seguida, traçar as relações da comunhão com
práticas pastorais.

1 1Coríntios 3.9.
2 Hebreus 10.25.
3 HAMMER, Michael e James Champy, Reengenharia, p. V.
4 FERREIRA, Wilson Castro, Calvino, vida, influência e teologia, p. 163.

17
5 Orlando Costas, in STEUERNAGEL, Valdir (00.), A seNÍço do reino, p. 180.
6 Guilherme Kerr, in HORRELL, J.Scott, Ultrapassando barreiras I, p. 42.
7 MONDIN, Batista, O homem, quem é ele?, p. 154.
8 João 11.18.
9 1Coríntios 11.18.
10 HORRELL, J. Scott, Ultrapassando barreiras I, p. 12.
11 Rev. Caio Fábio D'Araújo Filho a espalhou por todo o país.

18

I I
CAPíTULO I

,.
NA CRIAÇAO
E EM ISRAEL
(COMUNItÃO NO ANTiGo TESTAMENTO)

Quando falamos a respeito de comunhão, as idéias


que vêm à nossa mente estão muito ligadas à visão que
temos da igreja como a conhecemos no presente.
Comunhão, para nós, é o povo de Deus reunido, num
santuário, adorando ao Senhor. Uma concessão especial
é feita no tocante à Santa Ceia, expressão maior da
comunhão da Igreja de Cristo; alguns grupos chegam a
chamar o ato eucarístico de ''tomar a comunhão". De
qualquer forma, o conceito de comunhão está fortemente
vinculado às noções neo-testamentárias. E o Antigo
Testamento? Afinal, o que tem ele a dizer a respeito? Não
temos por objetivo esgotar a riqueza escriturística acerca
do assunto, mas alguns tópicos essenciais serão
demonstrados a seguir.

CRIAÇÃO - A BUSCA DO
INTERLOCUTOR
Podemos principiar a leitura da Bíblia de qualquer
parte. Aos iniciantes na fé, sugerimos que leiam os

19
evangelhos, depois algumas epístolas, e quem sabe, então,
os salmos. As dificuldades literárias próprias do Antigo
Testamento são contornadas com tais indicações. Mas o
que nos aguarda na primeira página do Gênesis? Que
tamanha barreira nos impede de compreender o seu
sentido. Trata-se de uma página, cuja beleza poética é
incomparável. A estética e a simetria são in igualáveis. E o
seu conteúdo extrapola todas as expectativas. Não podemos
ter compreensão do propósito divino se não atentarmos para
o seu ato criativo. Principiemos nossa jornada:
Disse Deus: façamos o homem à nossa imagem,
conforme a nossa semelhança; tenha ele domínio sobre os
peixes do mar, sobre as aves do céus, sobre os animais
domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os répteis que
rastejam pela terra. Criou Deus, pois, o homem à sua imagem,
à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. 1
Notamos de imediato o acontecimento do primeiro
diálogo: "Façamos." Não se trata de plural majestático.
Deus, em plena comunhão trinitária, decide criar o ser
humano, para gerir todo o cenário anteriormente criado.
Diálogo e comunhão andam juntos. A comunhão aponta
para a necessidade de comunicação. A comunicação se
efetivará através do diálogo. Portanto, o primeiro sinal de
comunhão no Antigo Testamento nos é manifestado pelo
próprio Deus, em seu ser.
No entanto, surpreende a decisão trinitária. Deus
resolve criar o ser humano à sua própria imagem e
semelhança. Assim sendo, como Deus anseia por
comunicação, sua criatura também ansiará; também, como
Deus vive em perfeita comunhão, este será o propósito para
com a humanidade. A imago dei no ser humano nos torna
moral e espiritualmente semelhantes a Deus. "A criação do
homem fez surgir um ser semelhante a Deus, com o qual o

20

I I
Criador poderia manter relações no nível intelectual, moral e
espiritual.''2 "O conteúdo da imagem é expresso em conceitos
tais como a possibilidade da comunhão e comunicação com
Deus."3 Na criação, Deus está à busca de um interlocutor,
com quem possa dialogar e caminhar junto. Para isto, habilita
sua criatura com sua imagem e semelhança. O ser humano
toma-se apto a ter comunhão com Deus.
Mais do que isto: o ato criativo de Deus aponta para
o anseio divino de comunhão do homem com o seu
semelhante. A criação de homem e mulher atende a esta
expectativa. De Gênesis 1.27 é necessário saltar para
Gênesis 2.24, onde iremos encontrar a plenitude da
comunhão entre as criaturas: "O homem se une à sua
mulher e os dois se tornam uma só carne." A ordem divina
para a multiplicação do ser humano completa o propósito
divino: Deus não quer somente um único interlocutor, mas
uma grande família em plena harmonia e comunhão.

Harmonia total: harmonia do homem com Deus, do homem com


os homens, do homem com os animais, do homem com a na-
tureza. É a ordem radical, o oposto do caos que o homem co-
nhece e experimenta na vida diária. Nada de ambivalência. 4

QUEDA - A QUEBRA DA COMUNHÃO


Tudo ia tão bem. Por que as coisas ficaram tão ruins?
Não há espaço aqui para discutir os desígnios divinos, nem
tampouco levantar argumentos pró infralapasarianismo ou
pró supralapsarianismo. 5 Somente irrita-nos imaginar que
o homem, semelhante a Deus, tenha perdido a rica
oportunidade de uma vida plena de felicidade. E perdeu
por causa da rebeldia do seu ser. O exemplo do primeiro
homem foi repetido várias vezes. "Tanto na história do
Éden, como na história do Dilúvio, como na de Babel, o

21
que vemos é que, desde o início, a humanidade tem se
caracterizado pela rebeldia."6
O homem, de sua parte, quebrou a comunhão com
Deus, quando pecou. O verbo hebraico chatha literalmente
significa "errar o alvo". O alvo de Deus para o homem não
era que assumisse o lugar de Deus, mas que "vivesse
como Deus vive". 7 A rebeldia do homem o levou a perder
esta condição.
A quebra da comunhão principia quando o homem
deixa de atentar para a Palavra de Deus e passa a dar
atenção a outro tipo de mensagem. A mulher foi ouvir a
serpente, em vez de ouvir ao Senhor. Também o homem
prestou mais atenção na mulher do que em Deus.
Novamente a questão da comunhão passa pela
necessidade de verdadeira comunicação.
O rompimento da comunicação trouxe
conseqüências na relação com Deus. O casal passou a
"esconder-se da presença do Senhor".8 Notemos que
Deus chama suas criaturas para a comunhão, para o
diálogo, mas elas sentem-se envergonhadas de seus atos.
Atitudes indesejáveis em nossa vida e nos relacionamentos
diversos impedem-nos de ter uma comunhão mais
decidida com Deus.
A quebra da comunhão alcançou o relacionamento
entre os seres humanos. Não se trata de mera intimidação
diante do Criador, mas de barreiras entre os homens. O
homem defende-se acusando a mulher que Deus lhe havia
dado. 9 Deixaram de ser uma só carne; passaram a ter
restrições um com o outro. A expulsão do Jardim do Éden 10
é a assinatura cabal da quebra da comunhão.
. No entanto, é justamente neste quadro sombrio e
negativo que a esperança de comunhão e, por que não dizer,

22

I I
a necessidade de comunhão, se levanta. Há uma aceno de
mudança neste cenário em Gênesis 3.15. E é mister fazer a
conexão entre Gênesis 3 e Romanos 5, especialmente o
versículo 19: "Pela desobediência de um só homem, muitos
se tornaram pecadores, assim, também, por meio da
obediência de um só, muitos se tornarão justos." O que
queremos demonstrar é que até mesmo a queda do homem
reafirma a importância e a necessidade da comunhão.

Não há dúvida de que Deus é o protagonista da história sagrada,


mas ele tem sempre um interlocutor - o homem. Este foi feito
para ter relação com ele. Esta relação se tornou negativa, visto
que emergiu o pecado. Mas, isso não é a negação de sua natu-
reza fundamental, a de interlocutor; ao contrário, pressupõe-na. 11

MISSÃO - A COMUNHÃO UNIVERSAL


Continuamos, ainda, em Gênesis, mas saltamos para
o capítulo 12, onde encontramos o chamado de Abraão.
Por que deixar para trás as genealogias, a história de Caim
e Abel, o Dilúvio e Noé, e mesmo Babel? Não têm nada a
nos dizer em relação ao nosso assunto? E qual a razão
para deter-se em Abraão? Tudo o que ficou no hiato entre
Gênesis 3 até 11 tem relevantes ensinos, mas não
poderíamos tratar passo a passo, no texto bíblico, a
respeito do tema da comunhão. Por outro lado, a vocação
de Abraão é um marco, não apenas para o povo de Israel,
mas para a Igreja e para toda a humanidade.
"A partir do capítulo 12 de Gênesis, lemos sobre a
restauração da unidade e da comunhão anteriormente
perdidas e quebradas entre Deus e a humanidade."12 Pelo
menos esta é a proposta, a promessa, a esperança. Alguns
estudiosos afirmam mesmo que a história do povo d~ Deus
somente tem início a partir deste episódio. Os capítulos

23
iniciais de Gênesis não passam de palavras introdutórias,
prolegômenos.
No entanto, é equivocado imaginar que a história
antecedente não compromete o que se segue. Ao
contrário, o próprio conteúdo da chamada abraâmica
aponta para o vínculo existente entre o povo de Israel, cuja
história está para começar, e todos os povos da terra,
representado nas genealogias de Gênesis 10 e 11 . Abraão
é chamado para ser bênção para todas as famílias da terra.
"Toda a história de Israel nada mais é do que a continuação
do trato de Deus com as nações."13 "Assim, todo o curso
da obra especial de Deus fica confinado a um estreito canal
de um pOVO."14
O que deve ser destacado é o objetivo divino de
reatar boas relações com sua criatura, através de um
instrumento, o povo de Deus. "A chamada divina não é
para privilégios, independente de obrigações; uma família
para ser bênção para todas as famílias da terra."15 A
constituição do povo de Deus inverte a agenda divina para
atingir de todo modo o seu objetivo. Em Gênesis 1, o
começo dos começos, na generalidade de Adão, Deus
quer alcançar cada criatura. Em Gênesis 12, o segundo
começo, na particularidade de Abraão, Deus quer alcançar
todos os povos.
O propósito de Deus é reatar as relações de amizade
e companheirismo rompidas pelo pecado humano. A
comunhão entre o homem e Deus é restaurada, e a
experiência de fraternidade entre os seres humanos se
manifesta. Principiando pelos patriarcas, avançando pela
cativeiro e libertação de Israel, culminando na conquista
da terra, e seus diversos governos, Deus se revela como
amigo da humanidade, desejoso de que os homens, entre
si, sejam amigos. Vejamos um exemplo:

24
SALMO lJJ - OS IRMÃOS UNIDOS
Poderíamos, sem sombra de dúvida, afirmar que esta
página é um elogio à comunhão. Detenhamo-nos nesta
exclamação: "Oh! Como é bom e agradável viverem unidos
os irmãos!" A comunhão está manifesta na união, no ato
de unir-se, juntar-se, encontrar-se. E o que se diz a seu
respeito? Que isso é bom, benéfico, faz bem. E que agrada.
Entre tantos desagrados que possamos experimentar, a
comunhão do povo de Deus nos oferece um alento, um
conforto, uma esperança.
Este é um dos cânticos dos romeiros que subiam a
Jerusalém. Moravam em aldeias e cidades distantes, longe
da convivência calorosa do templo. A oportunidade que
se lhes aparecia, geralmente, era a das festas religiosas.
E naquele caminho ansioso, cantarolavam este salmo.
Aparentemente, vislumbravam os laços fratemos que
uniam os sacerdotes e os levitas. O verbo "viver" traduz o
sentido de "sentar-se para a refeição de comunhão,
encerrando a peregrinação da festa das Tendas".16 Não vem
ao caso, agora, discutir as querelas entre sacerdotes e
levitas, e deles com o povo. O que é colocado como
fundamental nesta passagem é a experiência da comunhão,
do estar junto, do sentir-se em casa. Tal sentimento de alegria
é expresso através de figuras muito sugestivas.
A primeira delas, o óleo precioso. Trata-se do perfume
feito com mirra fluída, cinamomo odoroso, cálamo aromático,
cássia e azeite de oliveira. Seu uso era recomendado na
unção da tenda da congregação, na arca do testemunho,
na mesa, no altar e, finalmente, no próprio sacerdoteY
Como todo perfume, trazia frescor. Mas, muito mais do que
isto, era uma marca inconfundível. Este era um óleo exclusivo.
A comunhão do povo de Deus tem este sinal característico

25
e inigualável. A igreja reunida em santa comunhão exala um
perfume que ninguém esquece.
O orvalho do Hermon, cujo cenário é encantador,
revela o equilíbrio da natureza e a sucessão normal dos
acontecimentos e das estações. "Serei para Israel como
orvalho, ele florescerá como o lírio e lançará sua raízes
como o cedro do Líbano."18 Quando o povo de Deus se
acha em harmonia e verdadeira comunhão pode-se
aguardar bons resultados, frutificação abundante. Do monte
Hermon, Deus envia a sua bênção sobre todo o povo.
Bênção e comunhão são temas coincidentes. O povo que
vive coeso e unido será sempre abençoado.
Do cântico dos romeiros para a realidade de Israel,
o povo reunido formava o qahal, "uma grande família que
apesar de sua diversidade de idade, circunstâncias e lugar
de habitação foi marcada com um número singular,
considerada como uma SÓ."19
, ,
VOZ PROFETICA - A DENUNCIA DA
A _

AUSENCIA DE COMUNHAO
Contrastando com o belíssimo Salmo e tantas outras
expressões graciosas com respeito à comunhão,
deparamo-nos com a denúncia severa da parte dos
profetas em relação ao desrespeito à pessoa humana no
seio da sociedade e nas instâncias religiosas. É um bom
exercício, a leitura dos profetas à luz de sua crítica às
estruturas muito elaboradas, mas que não levavam em
consideração os laços fraternais.

Ai dos que decretam leis injustas, dos que escrevem leis de


opressão, para negarem justiça aos pobres, para arrebatarem o
direito aos aflitos do meu povo, a fim de despojarem as viúvas e
roubarem os órfãos. 20

26

I I
Não se pode imaginar santa comunhão aliada à
injustiça social. Não podemos nos sentir confortáveis em
nossos santuários, adorando a Deus, junto aos nossos
irmãos, quando ao nosso redor há um estado de
miserabilidade gritante, clamando o nosso auxílio. O consolo
de nossas relações fraternais deve nos mobilizar na direção
do atendimento das necessidades humanas. Nossa voz e
nossas mãos devem se aliar para beneficiar a coletividade
que nos cerca. Longe de nós, o comodismo de uma
comunhão anestesiada para com a realidade social.
A comunhão no seio do povo de Deus se constitui num
tremendo privilégio. "O privilégio implica em responsabilidade.
Israel foi um povo muito privilegiado, mas se esqueceu de
suas responsabilidades.''21 Da mesma forma, a igreja de todos
os tempos e, principalmente, de nossos dias, está
comprometida com a justiça social, econômica, moral etc.
Outro tema que tocou profundamente a palavra
profética foram as relações familiares. Sendo Israel uma
grande família, a quebra de preceitos nesta unidade
familiar afetava a todo grupo. Vejamos somente este
exemplo:

o Senhor foi testemunha da aliança entre ti e a mulher de tua


mocidade, com a qual tu foste desleal, sendo ela tua compa-
nheira e a mulher da tua aliança. [ ] Ninguém seja infiel para
com a mulher de sua mocidade, [ ] porque o Senhor, Deus de
Israel, diz que odeia o repúdio e também aquele que cobre de
violência as suas vestes. 22

É um tema que volta a preocupar-nos: a infidelidade


conjugal, o abandono do lar, e a própria violência dentro
de casa. O profeta apercebeu-se da quebra da comunhão
almejada pelo Senhor no meio do povo, e proclamou o
juízo de Deus. .

27
Pudemos perceber que o Antigo Testamento trata de
comunhão de uma maneira muito rica e instrutiva. Primeiro
de tudo, Deus mesmo é o autor da comunhão quando dá o
próprio exemplo em seu trino ser, numa feliz comunicação.
Da mesma forma, Deus estende o processo de comunhão
quando da criação do seu interlocutor, o homem, criado à
sua imagem e semelhança. A queda nos apresenta todas
as desvantagens e prejuízos da quebra da comunhão, mas
não permite a manutenção perpétua desta condição. O
chamado de Abraão é o indicativo do propósito de Deus
de constituir um povo em comunhão com ele e uns com os
outros, na busca de alcançar todos os povos. Por
derradeiro, demonstramos o valor atribuído à comunhão
do seio de Israel, na menção do Salmo 133, mas, também,
a necessidade de estar atento para eventuais quebras
desta comunhão, com voz profética.
1 Gênesis 1.26-27.
2 FERREIRA, Wilson Castro, Esboço de teologia bíblica, p. 34
3 KAISER, Walter C., Teologia do Antigo Testamento, p. 77.
4 MESTERS, Carlos, Deus, onde estás?, p. 10
5 São posições antagônicas em relação à ordem dos acontecimentos: o
"supra" assevera que Deus elegeu alguns para a salvação e
outros para a perdição e permitiu a queda como meio de atingir o seu
fim; o "infra" defende que Deus previu e permitiu a queda, então
decretou a eleição como meio de salvar alguns.
6 FERREIRA, Júlio Andrade, Conheça a sua Bíblia, p. 20.
7 GIRDLESTONE, Robert, Synonims of the Old Testament, p. 77.
8 Gênesis 3.8.
9 Gênesis 3.12.
10 Gênesis 3.24.
11 FERREIRA, Júlio Andrade, Conheça sua fé, p. 17.
12 CARRIKER, Timóteo, Missão integral, p. 14.
13 BLAUW, Johannes, A natureza missionária da igreja, p. 19.
14 VOS, Geerhardus, Biblical theology, p. 76.
15 MARCONDES Filho, Juarez, Missão integral- mito e realidade, p. 8.
16 Bíblia de Jerusalém, p. 776.
17 Êxodo 30.22-33.
18 Oséias 14.5.
19 GIRDLESTONE, Robert, Synonyms of the Old Testament, p. 229.
20 Isaías 10.1 ,2. .
21 pon, Jerônimo, EI mensaje de los Profetas Menores, p. 31.
22 Malaquias 2.14-16.

28

, r
CAPíTULO 11

NA IGREJA
E NA CONSUMAÇÃO
(COMUNhÃo NO Novo TESTAMENTO)

Em nossa leitura da Bíblia, ao alcançarmos o Novo


Testamento, somos surpreendidos por uma nova ordem
das coisas. A última seção do Antigo Testamento são os
profetas, a maior parte deles, do tempo dos reis. Nos
evangelhos, seção que inaugura o Novo, nos deparamos
com um Israel não autônomo, subserviente ao Império
Romano. As estruturas sociais foram afetadas. A ordem e
o direito sofreram adaptações. As relações religiosas,
também.
É preciso lembrar que a transição se deu no bojo de
sucessivas invasões, exílios e domínios externos. Israel fora
invadido, primeiramente, pelos assírios e, depois, pelos
babilônios. O exílio, começado no tempo de
Nabucodonosor, deixou marcas profundas na mente e no
coração do povo. Reinstalado em sua terra, este povo
continuará sendo dominado, ora, pelos sírios -
selêucidas, ora, pelos egípcios - ptolomeus. Por fim, em
. novo estilo, surgem os romanos.

29
É neste contexto que foi forjado o judaísmo como o
conhecemos no Novo Testamento. Ao tratarmos do nosso
tema, precisamos levar em consideração as mudanças
estruturais que aconteceram com o povo que foi chamado
para ser o modelo de comunhão com Deus e entre si. Ao
lermos as páginas dos evangelhos nos deparamos com
alguns grupos ainda desconhecidos no Antigo Testamento.
Por exemplo:
Os fariseus, do termo perusim, que significa
"separados": "Os fariseus são os que se distinguiram do
am hã'ares, da gente comum e simples que não tomava
particularmente a sério a observância da lei."1 A
característica principal dos fariseus era o seu rigor legal;
compreendiam a lei em suas minúcias sem tergiversar. O
que nos chama a atenção é a sua atitude exclusivista.
Evidentemente, para eles comunhão era algo restrito ao
seu grupo seleto; somente poderiam estar com eles
pessoas que se adaptassem às suas expectativas.
Os saduceus, nome que remonta aos tempos
davídicos, de um sacerdote chamado Zadoque,2
representavam a elite religiosa. Não eram rigorosos em
matéria legal e, em questão de fé, eram tremendamente
cépticos. Ser sacerdote "significa não só uma preeminente
função cultuai, mas também poder político".3 Desde muito
tempo, as lideranças sacerdotais freqüentaram os palácios
reais com o fim de aderir ao mando externo. Isto sempre
provocou a irritação dos fariseus, por causa da quebra de
muitos princípios, e da população em geral, sempre
prejudicada por decisões que favoreciam o Império.
Apenas, perguntamos neste ponto: é possível retirar do tipo
de atitude saducéia algum ensino acerca de comunhão?
Em que medida a vida e a prática dos saduceus se parecia

30
com o alvo do chamado de Abraão, ser bênção para todos
as famílias da terra?
Revoltados com o mundanismo saduceu,
encontramos neste período as comunidades essênias. A
mais famosa delas foi a de Qumrã. O objetivo primordial
dos essênios era restaurar o caráter comunitário, ou seja,
a manifestação de uma ampla comunhão de interesses,
projetos, bens etc. No entanto, sua piedade e amor eram
superados pelo seu radicalismo em exigências legais e
morais. Os essênios provêm do mesmo movimento dos
assideus apocalípticos, de onde surgiram os fariseus. A
atitude radical de João Batista conferiu-lhe a hipótese de
ter sido ele um essênio; e do próprio Cristo se disse ter
sido essênio, também. No entanto, dificilmente poderíamos
casar a comunidade de discípulos de Cristo com a
comunidade dos essênios.

JESUS E OS DISC(PULOS
É contra este pano de fundo que surge Jesus de
Nazaré, proclamando o Reino de Deus e atraindo muitos
como seus seguidores. Jesus conhecia a estrutura religiosa
e social do seu tempo e, sem dúvida, percebeu a
incoerência desta estrutura com o propósito de Deus para
com o seu povo. Jesus sabia perfeitamente do alcance de
suas palavras nos ouvidos dos fariseus, saduceus e,
eventualmente, essênios - já que estes viviam em certo
isolamento. Jesus anseia por restaurar o desígnio de Deus
de um povo em perfeita comunhão. Examinemos duas
passagens bíblicas.
A primeira delas no início do sermão do Monte:
"Vendo Jesus as multidões, subiu ao monte e, como

31
assentasse, aproximaram-se os discípulos; e ele passou
a ensiná-los."4
Stott afirma "que o propósito principal de Jesus ao
subir uma colina ou montanha para ensinar era fugir das
numerosas multidões";5 podemos depreender do final do
capítulo 4 de Mateus a exaustão de Jesus em atender a
tanta gente e a tantos casos. Não compreendemos que
Jesus estivesse fugindo de qualquer coisa. Ao contrário,
sempre vemos o Mestre atendendo todas as necessidades
que o cercavam.
No entanto, é mister distinguir o trato dispensado à
multidão e o ensino ministrado aos discípulos. Não temos
dúvida de que Jesus "viu a multidão"; tal olhar é indicativo
do seu interesse em todos os que ali estavam. Mas à
proximidade dos discípulos, Jesus respondeu com o seu
ensino. O ponto que desejamos levantar é que todos
estavam juntos - dado importante para a comunhão, -
mas o ensino de Cristo tornou a comunhão algo palpável.
Mais do que isto: Jesus não quer multidões ao seu encalço,
mas uma comunidade de discípulos.
A segunda passagem que queremos examinar é a da
oração sacerdotal de Cristo. 6 Nesta prece, Cristo pede ao
Pai santificação aos seus discípulos (v. 17, 19) e introduz o
tema da missão, uma vez que os discípulos seriam enviados
ao mundo como ele o fora (v. 18). Mas o que é notável aqui é
a súplica pela unidade dos discípulos. Unidade que traduz a
perfeita comunhão entre os seus seguidores. Comunhão e
unidade baseadas no testemunho da própria Trindade;
"unidade de essência e este é todo o mistério da Trindade;
existem três pessoas e um só Deus; a essência é a mesma
e, contudo, há três pessoas distintas."?
Este é o tipo de comunhão que Jesus propõe aos
seus discípulos: apesar de muita distinção e diversidade,

32

i I
há uma unidade intrínseca, essencial, que nos faz estar
juntos. A comunhão não será praticada pela exclusão, por
ritos de pureza, por criação de castas e elites. Tão somente,
a comunhão será praticada pelo compromisso com Cristo.
Ou seja, quem estiver comprometido com Cristo e o seu
Reino, estará em comunhão com os discípulos.

A COMUNIDADE DE JERUSALÉM
Porque, ousadamente, proclamou uma mudança
estrutural através da implantação do Reino de Deus, Cristo
foi crucificado. Foi morto pelos nossos pecados, sim,
trazendo-nos redenção eternal; é assim que Deus o fez
Senhor e Cristo, mas os homens o crucificaram 8 por não
se adaptarem à sua Palavra. No entanto, o seu projeto de
um povo unido não ficou esquecido. O investimento de
Jesus na vida de seus discípulos imediatos resultou positivo
para a expansão do Reino. Assim é que o anseio de ampla
comunhão entre os comprometidos com Jesus pode ser
visto de imediato na comunidade de Jerusalém. 9
As características levantadas por esta comunidade são
indicativos de uma plena comunhão vivida pelos discípulos.
E, de fato, uma expressão marca definitivamente esta
experiência; koinonia, literalmente, comunhão. A prática da
koinonia estabelece as coisas que temos e praticamos em
comum com alguém ou grupo. Barclay afirma que na vida
cristã há uma koinonia no compartilhamento da amizade, no
atendimento dos necessitados, na ministração do evangelho,
na fé, no companheirismo do Espírito que está presente no
homem, com Cristo e com Deus; 10
Muitas coisas em comum. Porém, tais coisas não são
meramet:lte mencionadas, lembradas em discursos, mas
sim, experimentadas de uma perspectiva muito prática e
envolvente, verdadeiramente comprometida. "A verdadeira

33
comunhão é sempre ativa."11 Por isso, observamos o
comportamento dos primeiros cristãos em Jerusalém,
diante do quadro de necessidades das pessoas. Havia
comunhão de sentimentos, de sonhos, mas, também, de
bens.
Em tempos de preocupação com o crescimento da
igreja, a primeira comunidade de Jerusalém é sempre
lembrada. Diante de estatísticas tão desanimadoras quanto
ao incremento de membros, lemos: dia a dia o Senhor
acrescentava os que iam sendo salvos. Mas é inevitável
assinalar que o esforço evangelizador da igreja não estava
em qualquer técnica espetacular, nem na competência de
determinado discurso. Estava simplesmente do modus-
vivendi da comunidade. O estilo de vida dos discípulos
encantava a coletividade. Literalmente se diz que eles
granjeavam a simpatia de todo o povo. Alguns empenhos,
de certos segmentos cristãos, em nossos dias, são
extremamente antipáticos à população e desgastantes para
a glória de Deus e prestígio da igreja.
Uma questão que sempre é colocada demonstra que
a comunidade de Jerusalém se constituiu num exemplo
único e irrepetível. Realmente, há características muito
peculiares na igreja antiga. No entanto, os princípios ali
vividos são válidos para qualquer época e para com toda
a cristandade. Mais que isto: em situações igualmente
peculiares em outras circunstâncias deve-se recorrer aos
mesmos princípios. Não se espera que os crentes se
desfaçam de seus bens, mas sim que os coloquem à
disposição de Deus no seu reino. O mesmo espírito de
comunhão e ambiente fraternal experimentado pela igreja
nascente deve ser vivido por nós em nosso tempo de
peregrinação.

34

I I
A VISÃO PAULINA DE COMUNIDADE
Boa parte do Novo Testamento é ocupada pelo
apóstolo Paulo. Suas viagens missionárias ocupam a
atenção do escritor do terceiro evangelho, no livro dos
Atos. De longe, é o escritor mais presente, através de suas
missivas epistolares. Assim, vencendo o parecer de Jesus
e a experiência de Jerusalém, é preciso dar atenção ao
que Paulo fala a respeito de comunhão. Não temos espaço
para declinar todas as suas observações sobre o assunto,
mas dois conceitos se destacam: a igreja é o corpo de
Cristo e, a unidade do corpo deve ser preservada.
Na igreja de Corinto estava havendo problema na área
da comunhão. Os crentes estavam juntos, mas não
propriamente em comunhão uns com os outros. Havia
algumas preferências e menosprezos. E, para surpresa geral,
atitudes estas motivadas por busca de espiritualidade. A
questão dos dons espirituais12 é o pano de fundo para Paulo
apresentar a sua visão de igreja. Para ele, a igreja não é uma
instituição comum, um agrupamento religioso; a igreja é o
corpo de Cristo. O corpo tem muitos membros, mas continua
sendo um só corpo. Para o bom funcionamento do corpo, é
preciso que todos os membros tomem conhecimento uns dos
outros e convivam harmonicamente. Uns cuidarão de uma
funções, outros, de outras. Mas tudo funcionará a contento se
houver respeito e atenção para com todos.
A comunhão é fruto do reconhecimento de que não
estamos sozinhos na igreja. Quando percebemos a
existência dos outros, das duas, uma: ou iremos vivenciar
juntos a obra de Cristo, ou vamos nos isolar. Infelizmente,
muitos têm optado pelo afastamento e gerado grande
tristeza do seio da igreja.

35
Ao tratar da unidade, Paulo nos faz lembrar dos valores
que nos unem: o mesmo Deus, o mesmo Senhor, o mesmo
corpo, a mesma fé, o mesmo batismo, a mesma esperança, o
mesmo Pai. 13 Com os olhos postos nestes elementos
essenciais, não nos deixaremos enredar para os periféricos
que nos distinguem. Pelo contrário, veremos nossas diferenças
como manifestação da criatividade divina em nós, em busca
de um sério compartilhamento de nossas experiências. "Onde
participam muitos indivíduos de uma experiência tão íntima
como a sociedade do Filho de Deus deve haver uma unidade
muito íntima entre eles."14
Como missionário aos gentios, Paulo se transformou
no campeão pela unidade do corpo de Cristo, e ele buscou
como ninguém a comunhão universal do santos. Foi o
testemunho vigoroso na quebra de todas as barreiras que
pudessem impedir alguém de chegar ao reino de Deus e
experimentar a comunhão do povo de Deus.

o APELO AOS HEBREUS


Encontramos nesta epístola, cujo autor é
desconhecido, um apelo muito sugestivo ao nosso tema:

Consideremo-nos também uns aos outros, para nos estimular-


mos ao amor e às boas obras. Não deixemos de congregar-
nos, com é costume de alguns; antes, façamos admoestações
e tanto mais quanto vedes que o Dia se aproxima. 15

João Calvino afirma que o ingresso de gentios na


comunidade cristã causou desagrado entre os judeus, que
se valeram deste argumento para não se fazerem
presentes nas reuniões da igreja. 16
É verdade que a comunhão extrapola o aspecto da
presença física. "Ausente quanto ao corpo, contudo, em
espírito, estou convosco."17 Mas o apelo feito aos Hebreus

36

I ;
nos revela um aspecto fundamental da comunhão. Podendo
estar juntos, não devemos ficar separados.
Freqüentemente, tratamos de pessoas que não
querem mais ir à igreja, alegando, no entanto, que
continuam com muita fé, fazendo inclusive suas orações e
meditações na Palavra de Deus, mais, ainda, do que faziam
anteriormente. E a razão de não irem à igreja é justamente
a de não se encontrarem com determinadas pessoas.
Precisamos estar em comunhão com os irmãos por
duas razões básicas:
1) Para nos estimularmos mutuamente ao amor e às
boas obras. Não podemos amar se não tivermos um objeto
para este amor. Ainda, trabalhar sozinhos é desanimador.
2) Para nos exortarmos mutuamente, o que se constitui
em estímulo, também. É uma boa razão para nos
encontrarmos com quem nos ofendeu - exortá-lo.

A COMUNHÃO NAS CARTAS CERAIS


No prosseguimento de nossa leitura do Novo
Testamento deparamo-nos com as epístolas universais ou
cartas gerais. Nelas, também, podemos perceber a
preocupação com a questão da comunhão.
1) Em Tiago, surge o desafio de transformarmos a fé
em ação. Nossa comunhão de sentimentos e fé precisa
passar pelo teste do atendimento das necessidades dos
que nos cercam. 18
2) Em Pedro, cujo contexto é o de ameaças de
perseguições, vemos a figura do edifício espiritual, onde
cada membro d~ igreja é uma pedra espiritual. As pedras
são cuidadosamente ajustadas para que haja beleza e
funcionalidade e segurança na casa como um todo. 19

37
3) Em João, percebemos a preocupação com o amor
fraternal, marca inconfundível do povo que vive em
comunhão. O apóstolo contrapõe, em especial, o amor ao
mundo, que retira de nós o amor do Pai. Já, quem ama ao
irmão é sinal de que o amor do Pai está nele. 20
4) A minúscula epístola de Judas faz referência às
divisões que rondavam a igreja, ainda no seu nascedouro.
É um apelo ao zelo pela unidade do corpo de Cristo. 21

A COMUNHÃO NO APOCALIPSE
Provavelmente o cenário mais amplo de comunhão
nos é oferecido neste livro. Vejamos esta passagem:

Eis grande multidão que ninguém podia enumerar, de todas as


nações, tribos, povos e línguas, em pé diante do trono e diante
do Cordeiro, vestido de vestiduras brancas, com palmas nas
mãos. 22

É um retrato contundente da comunhão universal dos


crentes entre si e com Deus. A missão dada à Abraão se vê
realizar neste quadro futuro, incomparável. O propósito criador
de Deus, manifesto desde a primeira página da Escritura,
encontra eco na visão joanina, no derradeiro livro da Bíblia.
Assim, vivemos o desafio da comunhão no presente,
baseados na promessa do passado, na esperança do porvir.
O Apocalipse, ainda, descreve a comunhão através
da figura das bodas do Cordeiro, na qual todos os que
são chamados se constituem em bem-aventurados. 23
Mas comunhão verdadeira é aquela que nos revela a
companhia divina, promovendo o consolo e nos
constituindo, verdadeiramente, em povo de Deus. Por isso,
a nota mais alta neste capítulo é vista do alto desta
declaração:

38

, I
Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com
eles. Eles serão povos de Deus, e Deus mesmo estará com
eles. E lhes enxugará dos olhos toda a lágrima, e a morte já
não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as
primeiras coisas passaram. 24

1 SCHUBERT, Kurt, Os partidos religiosos hebraicos da época


neotestamentária, p. 23.
2 Ezequiel 40.46; 44.15.
3 SCHUBERT, K., op. cit., p. 15.
4 Mateus 5.1,2.
5 STOTT, John R. W., Contracultura cristã, p. 6
6 João 17.
7 LLOYD-JONES, Martyn, A base da unidade cristã, p. 19.
8 Atos 2.36.
9 Atos 2.42-47; 4.32-35.
10 BARCLAY, William, Palabras griegas dei Nuevo Testamento, p. 132.
11 ROTHMANN, Johannes H., Atos dos Apóstolos no contexto do século
XX, p. 101.
12 1Coríntios 12.
13 Efésios 4.4-6.
14 0000, C. H., A mensagem de são Paulo para o homem de hoje, p.
145.
15 Hebreus 10.24-25.
16 CALVINO, João., Epistola a los Hebreos, p. 211.
17 Colossenses 2.5.
18 Tiago 2.14-26.
19 1Pedro 2.
20 1João 2.15-17; 4.17-21.
21 Judas 19.
22 Apocalipse 7.9.
23 Apocalipse 19.9.
24 Apocalipse 21.3,4.

39
CAPíTULO 111

o
PASTORADO
VOLTADO PARA A
COMUNHAO -
(COMUNItÃO E LidERANÇA)

Conceituamos comunhão como o desenvolvimento


das relações fraternais no ambiente da igreja. Ansiamos
por ver o povo de Deus convivendo em ampla harmonia e
paz, progredindo no amor mútuo, crescendo na graça e
no conhecimento de Cristo. Desejamos a concretização
da comunidade de fé que cria laços entre os seus membros
a ponto de se sentirem parte uns dos outros. Tal extensão
de comunhão envolve todos os participantes da igreja,
indistintamente. Não há exclusividade para este ou aquele
segmento. Todos podem e devem envolver-se. Mas, mui
especialmente, as lideranças da igreja. Não podemos
esperar o interesse da Igreja como um todo se sua
liderança, em primeiro plano, não demonstrar este alto nível
de comunhão. O tema proposto pretende exatamente
desafiar os líderes da igreja a perceberem a importância
do seu papel como promotores da comunhão.

41
Definimos, aqui, pastorado não como a figura limitada
do pastor, devidamente ordenado para o ministério
pastoral como o conhecemos na maioria das igrejas. O
pastorado diz respeito a toda liderança que conduz, ou pelo
menos deveria conduzir, pastoralmente a igreja.
Fica de início esta indagação: como conduzir a Igreja
para o despertamento da comunhão? Que deve fazer a
liderança para atingir este objetivo? Ou, por outra, o que deve
deixar de fazer? (Provavelmente, muito das cisões e drásticas
divisões que tem ocorrido no seio da igreja de Cristo, ao longo
dos séculos, seja fruto do pouco interesse dos que estavam
à frente do povo de Deus no tocante à preservação dos laços
fratemais. Em nome deste ou daquele valor doutrinário, abriu-
se profundo abismo entre os irmãos.)

COMO NOS VEMOS


Para responder a esta importante questão,
examinemos dois versículos do Novo Testamento, a
começar com: "Pastoreai o rebanho de Deus, [...] não como
dominadores dos que vos foram confiados, antes tomando-
vos modelo."1
Vemos claramente dois modos diferentes de conduzir
a igreja de Cristo: ou a conduzimos como modelos do
rebanho, ou como dominadores. Ou ficamos diante do
povo de Deus para tornarmo-nos o padrão dos irmãos,2 o
exemplo a ser seguido, ou passamos a nos assenhorar
dos membros da igreja, como se não fossem pessoas,
mas objetos que podem ser manipulados a bel prazer.
Como nos enxergamos na condição de pastores do
rebanho de Deus?
Duas palavras neste versículo ajudam-nos a
compreender o nosso papel: kleros3 e poimnion4 . A

42

I I
primeira palavra tem a ver com a herança de Deus
depositada em nossas mãos. O Senhor é o criador dos céus
e da terra; tudo o que há pertence a ele. Mas é maravilhoso
observar o cuidado particular que Deus tem para como o
seu povo, a quem ele trata como porção. A herança não
nos pertence. Ela é de Deus sob o nosso cuidado. E como
cuidamos da herança de Deus? Com ação pastoral.
Cuidamos com a mesma atenção que o pastor dispensa
às suas ovelhas. Assistimos o povo de Deus como o próprio
Deus assistiria. "Nós devemos pastoreá-Io como Deus."5
É curioso que o vocábulo kleros, cujo significado é
rico no sentido de envolver todo o povo de Deus, tenha se
degenerado no entendimento que temos de "clérigo",
distinguindo-o do "leigo", isto é, do povo propriamente dito.
Contrapomos um ao outro, conferindo a este a condição
de subserviência e, àquele, a posição de mando. Nenhum
clérigo é digno do nome se não se refere com amor e total
dedicação à porção que lhe foi confiada. Sobre o clero
em geral, pesa uma ácida crítica por sua visão, muitas
vezes, desencarnada da realidade, sua falta de
compromisso com as causas do povo, sua indiferença para
com a vida da comunidade.

À medida que algumas pessoas começam a enxergar mais


além, vão se desenraizando, vão se desinstalando da vida co-
munitária, onde as pessoas têm nome, cara, problemas, amar-
guras, crises emocionais, crises depressivas; onde as pesso-
as têm problemas psicológicos, onde as pessoas têm filhos e
sepultam mortos; onde as pessoas casam e descasam, amam
e desamam: na igreja. 6

Todas estas coisas acontecem em nossa igreja. Há


quem imagine que estas realidades só têm lugar lá, no
mundo, fora da igreja. Mas a igreja está inserida no contexto
do seu tempo e sofre conseqüências como estas. Daí, a

43
necessidade de nossa pastoral ser relevante, engajada com
a vida da nossa gente.
Como nos enxergamos? Se nos vemos como
dominadores, teremos muito pouco a acrescentar à vida
da nosso rebanho. Poderemos até gerar uma impressão
de liderança, no entanto, estaremos colocando em sério
perigo a comunhão do povo de Deus, da qual deveríamos
ser efetivos promotores. Se, por outro lado, nos vemos
como o modelo do rebanho, a primeira característica que
devemos demonstrar é a nossa ânsia pela realização de
um harmônico e bem-aventurado ambiente fraternal.
Envidaremos todos os esforços necessários para
promover a convivência amorosa do povo de Deus.
Seremos, antes de tudo, inspiradores da comunhão.

o QUE FAZEMOS
Ainda, atentemos para o ensino desta outra passagem:
"Deus concedeu pastores e mestres com vistas ao
aperfeiçoamento dos santos para o desempenho do seu
serviço, para a edificação da igreja."?
Hendriksen afirma que pastores e mestres "é uma
designação de ministros de congregações locais,
'presbíteros docentes (ou supervisores)' . Por meio da
exposição da Palavra estes homens pastoreiam seus
rebanhos."a Não se trata de dois encargos, mas de um único
ministério que tem uma dupla função: pastorear e ensinar.
De um lado, o ensino é eminentemente pastoral, de outro, o
pastoreio é profundamente didático. Ao expor a Palavra ao
povo de Deus, o pastor-mestre tem por objetivo aperfeiçoar
o rebanho. A palavra catartismos9 aponta para a disciplina
cristã que ''visa equipar melhor o. homem para fazer frente
às tentações e exigências da vida" .10

44

, i
Quando a liderança se dispõe a equipar o rebanho,
ela está contribuindo decisivamente para o
desenvolvimento da comunhão do seio da igreja. Crentes
edificados, fortalecidos, em nada se parecem com
membros de igreja que vivem a contender e criar discórdia
entre os irmãos. Crentes habilitados assumem tarefas
importantíssimas na vida da igreja e se tornam referenciais
aos demais.
Até aqui temos atendido a duas questões do pastorado
e da liderança da igreja na busca do incremento da
comunhão. Em primeiro lugar como a liderança se vê
perante o rebanho e perante o Senhor. Em segundo lugar, o
que esta liderança faz. Ela treina e aperfeiçoa os membros
da igreja para a realização de ministério. Mas o pastorado
será vital para o crescimento da comunhão da igreja se
algumas medidas práticas forem levadas em consideração.

o QUE É PASTOREAR?
Há muito o que dizer a respeito deste ponto. Muitos
tratados já foram escritos. Mencionamos, apenas, três
aspectos, às vezes, esquecidos.

AdMiNisTRAR CONFLiTOS
Às vezes, é com certo humor que encaramos este
mister. Isto, no entanto, não lhe tira a seriedade. Sim,
pastorear com vistas a uma efetiva e larga comunhão na
igreja implica necessariamente em administrar conflitos. É
equivocado imaginar que a comunhão se transforma num
antídoto para os contraditórios. É mais ou menos como se
raciocinássemos assim: na igreja onde há muitos choques
de idéias não está havendo comunhão. Comunhão e
opiniões divergentes não se excluem. Mas se não houver

45
boa orientação e espaço para a apresentação das posições
divergentes, poderemos ter crise na busca da comunhão.
Cabe, portanto, à liderança tomar conhecimento das
posições antagônicas, permitir-lhes a livre expressão, e
encontrar o caminho da convergência. As três atitudes
precisam se consolidar. Somente tomar conhecimento pode,
apenas, transferir ao pastorado a responsabilidade do
conhecimento dos fatos. Avançar para o livre debate se
constitui num expediente de maturidade, afinal, quem pensa
o que pensa, vai ter que se apresentar. Mas se o pastoreio
não se consumar na busca de uma via média, autorizada
pela Palavra de Deus, não haverá bom desfecho para a
tarefa da administração de conflitos. Não se trata de uma
receita; são, apenas, princípios. Na verdade, cada assunto
demandará tremenda habilidade, e, geralmente, muita
paciência, afinal, quanto ao prazo para este processo,
qualquer palpite é temerário.

OUViR o REbANko
Se "todo homem deve estar pronto para ouvir, tardio
para falar e tardio para se irar",11 muito mais a liderança
da Igreja. Barclay cita o dito judaico que aponta vários tipos
de indivíduos:

o que é pronto para ouvir e pronto para esquecer; seu lucro é


cancelado por sua perda. O que é tardio para ouvir e tardio para
esquecer; sua perda é cancelada pelo seu lucro. O que é pron-
to para ouvir e tardio para esquecer; este é sábio. O que é tardio
para ouvir e pronto para esquecer; este é o pior de todos. 12

Boa parte das lutas pastorais com o rebanho se


resolveriam se houvesse maior audição: do rebanho para
com a sua liderança. Mas, igualmente, e com muito maior
responsabilidade, do pastor para com o rebanho. Pastores'
e lideranças em geral, geralmente, se escudam atrás de

46

I I
legislação eclesiástica para não atentar aos clamores do
povo de Deus. Talvez a crise de comunhão em algumas
igrejas esteja centrada no pouco espaço concedido à voz
do rebanho. A dificuldade de se usar esta prática se
encontra na visão pastoral do pulpitocentrismo. Pastores
e lideranças estão aí para falar, e a congregação para ouvir.
Se nós pastores urgentemente não aprendermos a ouvir o
rebanho que nos foi confiado não poderemos bem conduzi-
lo por muito tempo. Aliás, é o que costuma acontecer. Na
primeira oportunidade, a liderança é trocada. E, se a
liderança não for substituída, o próprio rebanho se
encarrega de dispersar-se.

COMpARTiLItAR o MiNisTÉRio
"Somos do parecer de que a chave do êxito do
crescimento da igreja está na participação integral de toda
a comunidade. Uma igreja cresce quando todos os seus
membros estão envolvidos neste objetivo." 13 Portanto,
pastorear com vistas ao incremento da comunhão implica
em dar espaço a todos dentro da igreja para a efetiva
realização de alguma tarefa. Teremos oportunidade de
tecer maiores comentários no próximo capítulo, mas o que
desejamos marcar é o estabelecimento de uma filosofia
de ministério que abre espaço para todos dentro da igreja.
Quando "os pastores cobrem os espaços por não verem
outra alternativa, o resultado prejudica a todos: os pastores
ficam exaustos e frustrados; e os leigos não se sentem
realizados, nem andam satisfeitos como parte do corpo
de Cristo",14 Quando a igreja é tocada por uns poucos, os
demais não se sentem participantes da vida plena da
comunidade enão assumem responsabilidade no tocante
à comunhão. Para estes, tanto faz se o ambiente é.amistoso
e fraternal. Sua participação na igreja está restrita a uns
poucos encontros, meramente devocionais. Uma divisão

47
racional das tarefas, pela vocação do Espírito, catalisará
a atenção de todos para a vida integral da comunidade.
Nossa primeira abordagem, à luz do ensino
escriturístico acerca da comunhão, deseja comprometer
as lideranças da igreja com a tarefa de serem o instrumento
para motivar o ambiente fraternal, contornando todas as
dificuldades e promovendo o encontro de todos os
interesses. Para isto, é mister ter uma visão bem clara a
respeito do que significa pastorear ou liderar - como nos
vemos e o que fazemos. Por fim, algumas orientações bem
práticas podem ajudar.
É missão pastoral'1rabalhar as relações comunitárias
a fim de que nesse mundo hostil e indiferente a igreja seja
a comunidade alternativa". 15

1 1Pedro 5.3.
2 1Timóteo 4.12.
3 Traduzida como "confiados", significa "a porção que pertence a Deus e
foi deixada sob a responsabilidade dos pastores".
4 Traduzida como "rebanho", tem a mesma raiz de "poimênica", que se
refere à ação pastoral.
5 BARCLAY, William, Letters of James and Peter, p. 318.
6 D'ARAÚJO Filho, Caio Fábio, Novos ministros para uma nova realidade,
p.37.
7 Efésios 4.11,12.
8 HENDRIKSEN, William, Efésios, p. 245.
9 Significa: treinamento, equipamento.
10 BARCLAY, William, Palabras griegas dei Nuevo Testamento, p. 129.
11 Tiago 1.19.
12 BARCLAY, w., LetterofJames and Peter, p. 65.
13 MARCONDES Filho, Juarez, O ministério dos santos e o crescimento
da igreja, p. 3.
14 João Batista Cavalcante in HORRELL, J. Scott (ed.), Ultrapassando
bar(eiras, p. 16. .
15 D'ARAUJO Filho, Caio Fábio, op. cit., p. 39.

48
CAPíTULO IV

TRABALHO PARA
TODOS 1
(COMUNJtÃO E SERViço)

ELEiÇÃO PARA SERViÇO


Uma das doutrinas mais caras e mais controversas
dentro da teologia cristã é a doutrina da eleição. Deus
escolhe um povo. Este povo escolhido, por causa desta
eleição, recebe as promessas divinas, formuladas numa
aliança especial. A beleza deste ensino encerra o caráter
divino que age com liberdade e soberania e, acima de
tudo, com propósito. Daí, perguntar-se: para que Deus
escolhe um povo?
O privilégio da escolha não pode ofuscar o objetivo da
mesma. Mais do que receber o privilégio da escolha, o povo
escolhido assume uma tremenda responsabilidade da qual
deverá ele se desincumbir com brilhantismo. E tal
responsabilidade não é outra senão o serviço de Deus.
Portanto, a eleição do povo de Deus é para o serviço de Deus.

Israel não é tanto o objeto da eleição divina quanto sujeito do


serviço exigido por Deus à base da eleição. (...] Não há serviço
mediante eleição, antes, eleição por causa do serviço. (...] A

49
eleição não é primariamente privilégio, mas responsabilidade.
Se a responsabilidade é recusada, a eleição pode até se tornar
motivo de punição divina. 2

E mais, o que se diz com respeito a Israel não difere


daquilo que se dirige à igreja, como povo escolhido por Deus:

Em ambos os Testamentos é mais a necessidade que o mere-


cimento que provoca a eleição, e esta não é mais alguma coisa
que confira simplesmente um favor aos eleitos. Pede uma res-
posta, e essa resposta se deve traduzir em serviço.3

O povo de Deus, no Antigo e no Novo Testamentos,


recebeu o chamado para revelar o caráter de Deus ao mundo,
e deve tomar esta convocação como um ministério, ou seja,
como um serviço intransferível. Cabe à igreja hoje
compreender sua condição de redimida, não como mero
privilégio que a coloca numa posição confortável, mas como
povo que só tem razão de ser na medida em que serve a
Deus no mundo. A salvação, portanto, como conseqüência
da eleição precisa desembocar em serviço.

SERVIR À HUMANIDADE
o ministério do povo de Deus é um serviço que,
fundamentalmente, se presta ao próprio Senhor Deus. Ele
não divide a glória de receber exclusiva adoração com
absolutamente ninguém. No entanto, ele remete o serviço
que lhe é oferecido a um objeto muito querido do seu amor,
isto é, ao próprio ser humano. Assim, quando a igreja
atende ao próximo está essencialmente servindo a Deus.

AMAR A DEUS, AMAR AO pRóxiMO

Quem captou com muita propriedade este sentido


do serviço foi o apóstolo João. Ele afirmou: "Aquele que
não ama a seu irmão, a quem vê, não pode amar a Deus,

50
a quem não vê. (...] Aquele que ama a Deus ame também
a seu irmão."4 As duas realidades se acham estreitamente
relacionadas. Não se pode fazer uma coisa sem trazer a
outra como conseqüência. E, necessariamente, fazendo
uma delas, a outra estará sendo preenchida. Por isso, à
indagação a respeito de qual seria o grande mandamento
na lei, Jesus respondeu: o mandamento é tanto um como
dois - amar a Deus e amar ao próximo; tudo na vida
decorre desta implicação fundamental. 5

SERViR A DEUS, SERViR AO PRóxiMO

A expressão "amor' nas Escrituras não traduz qualquer


sentido de sentimentalismo. O amor é sempre prática de
vida. Revela-se em atitudes concretas e, portanto, poderá
ser conferido em atos claros de serviço. O apóstolo Paulo,
tratando dos deveres da família e do trabalho, pontificou que
nossa atenção para com pais, filhos, esposos, patrões ou
empregados deve estar baseada no serviço a Deus. "Tudo
quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o
Senhor e não para homens."6
Duas coisas se destacam desta compreensão: o
objeto do nosso serviço são os homens, mas o espírito
que permeia nossa tarefa é o de culto a Deus. Assim é,
que ambas as realidades permanecem estreitamente
envolvidas. Servir a Deus, servindo aos homens; o serviço
aos homens como um culto que se presta reverentemente
ao Senhor.
,
O POVO QUE 50 QUER SE SERVIR
O ditado é antigo, mas bem vivo e real: "Quem não vive
para servir, não serve para viver". O serviço é colocado em
termos de sentido de vida. Só há razão para viver se há um

51
serviço para ser prestado, do contrário não há serventia. O
que se sabe entre o povo comum, muito mais grave o é para o
povo de Deus. O entendimento que o povo de Deus deve ter
de que sua eleição é para serviço redimensiona sua fé à luz
desta incumbência. E, na medida em que o povo, porventura,
rejeite o seu mister, estará rejeitando sua fé e sua vida.
O episódio entre Jesus e a mãe de Tiago e João? é
bem ilustrativo deste princípio. De início, a bondosa mãe
desejava uma posição privilegiada para os seus filhos no
reino de Deus. E Jesus caminhou no raciocínio de que não
há maior privilégio do que o de servir. Grandeza e primazia
estão efetivamente vinculados a serviço e disponibilidade.
Israel, em muitos momentos de sua história, olvidou este
princípio. Foi regiamente julgado pelo Senhor. A igreja não
está isenta do mesmo juízo. Aliás, preocupa-nos,
extremamente, o surgimento de uma igreja rica e poderosa
que apregoa sem qualquer comedimento os privilégios e as
vantagens, mas não se dispõe a servir a Deus, servindo aos
homens. Mais do que alienação em relação às realidades
prementes, esta atitude trai uma profunda irresponsabilidade
e demonstra uma fragilidade teológico-doutrinária.

DONS E SERViÇOS
As dádivas divinas devem ser vistas da perspectiva
do serviço. Os dons não foram dados por Deus para
ornamento espiritual ou embelezamento religioso, mas
para incrementarem o serviço dos crentes. Efésios 4.12
insiste neste tema: "É para o desempenho do serviço." Há
3 propósitos declarados aqui:
1) O propósito imediato: o treinamento do crente, com
o auxílio decisivo da liderança;
2) O propósito final: a edificação do corpo de Cristo;

52
3) O propósito funcional: todo mundo trabalhando.
Há trabalho para todos no seio da igreja. A
multiplicidade dos serviços é muito grande. E no texto bíblico
são elevados à categoria de "ministérios" - diakonia. Neste
sentido, todos os crentes são diáconos, ou seja, têm um
ministério, um serviço a realizar.
Os serviços surgem conforme as necessidades. Foi
assim desde o princípio. Os diáconos propriamente ditos
foram estabelecidos na igreja por causa da necessidade
de atendimento social. 8 Os "melhores dons"9 são na
verdade aqueles que são os mais urgentes na vida da
comunidade, que vão atender a uma necessária demanda.
Nunca são dados como enfeite, acessório e supérfluo.
Um bom teste a respeito dos dons espirituais é
procurar saber até onde quem alega ter determinado dom
está disposto a ir em termos de servir a Deus, servindo ao
próximo. Infelizmente, boa parte dos examinados não vão
além das portas do templo e do horário de culto.

A MATURIDADE COMO ALVO


o propósito final dos dons, como já vimos, é a
edificação do corpo de Cristo. Mas o que isto significa?
Uma igreja muito grande? Não? Então, uma igreja pequena,
mas muito séria em seu trabalho? Também não. A edificação
do corpo acontece na maturidade integral da igreja.
1) Maturidade espiritual: unidade da fé, pleno
conhecimento do Filho de Deus, varão perfeito (Efésios 4.13).
Uma igreja cujos membros são imaturos espiritualmente,
dificilmente realiza o seu ministério e, conseqüentemente, não
cresce. Esta maturidade decorre do aprofundamento da
comunhão com Deus, na oração e 'na meditação;

53
2) Maturidade doutrinária (Efésios 4.14): como
resultado da maturidade espiritual, a igreja não é sacudida
por terremotos doutrinários e levada por ventos de doutrina
e que, geralmente, não passam de "doutrina de vento";
3) Maturidade comunitária: diz respeito à percepção
de que não se está sozinho. Existem muitos membros, que
devem cooperar uns com os outros, ajustando-se,
consolidando-se (Efésios 4.16).
É comum verificarmos que um sinal de maturidade
pode não vir acompanhado do outro. Muitos que se acham
firmes em Cristo (espiritual) não estão tão firmes com os
irmãos (comunitária).
A edificação que almejamos para a igreja, e pela qual
lutamos, decorre de um crescimento equilibrado. As
relações vertical e horizontal em perfeito ajuste propiciam
um enorme interesse dos de fora. A igreja equilibrada produz
uma atração muito forte e duradoura nos que não conhecem
a Cristo e poderão, por intermédio do seu ministério, vir a
conhecê-lo. Sem dúvida, os percentuais de crescimento
numérico das igrejas sofreriam uma seríssima inflação se
não fôssemos tão imaturos, se todos trabalhássemos.

MINISTÉRIOS, HOJE
1) ACONsdltAMENTO

"Aconselhai-vos mutuamente..."10 Este é um ministério


vital na igreja. Precisamos de conselheiros e de conselhos;
o material de aconselhamento, sem dúvida alguma, é a
própria Palavra de Deus. Através deste ministério, a igreja
permanece ininterruptamente atendendo homens e
mulheres ql,le precisam de algum tipo de orientação. Pode
tratar-se de caso pessoal ou familiar, profissional ou
econômico, moral ou espiritual. Além disso, o ministério de

54
aconselhamento existe para orientar conselheiros; os mais
experimentados são recorridos pelos iniciantes.

2) AdMiNisTRAÇÃO
"O que preside com diligência... "11 A direção
soberana e absoluta da igreja pertence a Cristo, cabeça
da igreja. No entanto, no plano horizontal, ele ordenou
lideranças para exercerem a direção da comunidade. A
liderança é plural. Daí, a necessidade de organização e
administração. Conceitos seculares a este respeito podem
ajudar no empreendimento eclesiástico, porém, sempre
com o entendimento de que a natureza empresarial da
igreja é distinta da natureza do mundo.

1) AssisTÊNciA
Diz respeito ao atendimento social. A igreja está
inserida no contexto do mundo e não pode omitir~se diante
das necessidades gritantes. Neste ponto, é de todo
inconveniente a. discussão se a igreja deve somente
evangelizar ou evangelizar e assistir aos carentes. A
missão da Igreja é servir a Deus; se, em determinada
circunstância, cabe somente a Palavra, preguemos; mas
se, em outra, o pão é necessário, não podemos nos furtar.
Manter creche, orfanato, lar de idosos, criar sistema de
cestas básicas, enxovais para bebês etc. são algumas das
atividades realizadas por este ministério.

4) CASAis
Este é um ministério que coloca a igreja no seu devido
lugar, isto é, dentro de casa. Há pessoas sobejamente
convertidas no templo e, precariamente, no lar. Através de
atendimento pessoal, prômoção de encontros, classes de
estudo etc., casais trocam experiências à luz da Palavra
de Deus.
55
~) ENSiNO

O ensino, num primeiro plano, pertence ao degrau


de cima dos ministérios - pastores e mestres. Aqui,
porém, é preciso demonstrá-lo em toda a sua extensão.
Os líderes contam com um exército de professores de
escola dominical, dirigentes de grupos familiares,
instrutores das sociedades internas e departamentos que,
sendo devidamente treinados, transmitem o ensino da
Palavra de Deus, de modo muito eficiente, a todos os
segmentos da comunidade.

6) EVANGElizAÇÃO
Nisto toda a igreja deve estar envolvida. A tese que
defendemos é que o crescimento da igreja decorre da
participação de todos os membros, cada qual no seu
ministério. O ministério específico da evangelização,
contudo, está relacionado com missões. Trata-se da
expansão do trabalho sediado num único centro para novos
centros de irradiação da Palavra de Deus. Em nosso caso,
de igreja de centro de cidade, a abertura de pontos de
pregação nos bairros não alcançados é feita pelos
membros da igreja.

1 Este capítulo faz parte da monografia O ministério dos santos e o


crescimento da igreja, por Juarez Marcondes Filho.
2 BLAUW, Johannes, A natureza missionária da igreja, p. 23.
3 ROWLEY, Harold Henry, A fé em Israel, p. 71.
4 1João 4.20,21.
5 Mateus 22.34-40.
6 Colossenses 3.23.
7 Mateus 20.20-28.
8 Atos 6.1 ,4.
9 1Coríntios 12.31.
10 Colossenses 3.16.
11 ~omanos 12.8.

56

, I
CAPíTULO V

fORTALECENDO A
COMUNHAO -
(COMUNJtÁO E ENSiNO)

Duas coisas acontecem quando a comunhão tem lugar:


compartilhamento e aprendizado. Quem se aproxima de ou-
trem, no contexto da comunidade, o faz tanto para oferecer
como para receber. Sempre que estivermos juntos, ao mesmo
tempo, vamos ser canais de bênçãos para os outros e ser acres-
cidos em algo. 1

Há uma estreita relação entre o ensino da Palavra


de Deus e a comunhão dos santos. Todas as vezes que o
povo de Deus se reúne há uma oportunidade para
crescermos no conhecimento de Cristo Jesus e, ao mesmo
tempo, crescermos em comunhão uns com os outros. Não
podemos conceber uma coisa sem a outra. De um lado, o
encontro do povo de Deus não se constitui, simplesmente,
numa reunião de pessoas, mas num encontro com o
próprio Deus. Nesta circunstância, Deus quer falar aos
nossos corações, trazer alento à nossa alma, edificar a
. nossa vida. De outro lado, o ensino bíblico deverá repercutir
em nossas relações pessoais, a começar com nosso
relacionamento com os irmãos que estão junto de nós.

57
É mister questionar qualquer encontro da igreja que
não redunde nestas duas realidades: ensino e comunhão.
Não importa se o assunto é administrativo ou tem a ver
com ação social, ou com projetos educacionais. De alguma
forma, Deus estará propiciando convivência e aprendizado
no seio da igreja.

ESTAR JUNTOS PARA APRENDER


Em se tratando de fixar alguma matéria em suas
mentes, algumas pessoas sempre enfrentarão dificuldade
em aprender em grupo. Seu rendimento individual é muito
maior. Sua concentração se torna plena. Sua capacidade
de apreensão ganha um alcance que, se estivesse com
outras pessoas, os resultados seriam negativos.
No caso do ensino da Palavra de Deus não estamos
nos referindo à absorção de uma matéria científica, ou do
conhecimento de datas e dados históricos. Não se trata
de um esforço acadêmico. O aprendizado das Escrituras
Sagradas diz respeito à vida. E a vida, que é gerada de
vida, quer produzir vida no contato com outras vidas. Jesus
afirmou: "Eu vim para que tenhais vida abundante."2 O
adjetivo proferido pelo Mestre tem o propósito de salientar
a insatisfação com a mesquinhez, com a sovinice da
existência. O empobrecimento de nossa existência se deve
em grande parte à retenção que fazemos de nossa vida,
não desejando compartilhar com ninguém nossas
experiências pessoais. De certo modo, temos temor de
partilhar com outrem o que acontece conosco.
A igreja se constitui num ambiente propício para o
aprendizado comunitário. Sua estrutura física é concebida
para atender tal expectativa. Ç) salão maior é consagrado
como santuário para abrigar a família da fé. Ali, ela pode
expressar sua adoração a Deus, mas, ao mesmo tempo, está

58
fratemalmente congregada para ouvir a Palavra do Senhor.
As salas anexas têm o objetivo de abrigar os grupos menores
dentro da igreja, subdivididos por idade, ou por interesse.
Talvez, justamente, nestes segmentos menores a comunhão
se expresse de maneira mais vigorosa e o ensino seja
ministrado com muito maior efetividade.
Na medida em que uma igreja local cresce
vigorosamente, precisa estar atenta para não perder
ninguém no meio da multidão. É necessário que aquele
membro recebido na presença de toda a congregação logo
descubra um grupo menor, dentro da igreja, onde possa
expressar-se com maior efetividade. Geralmente, esta
escolha recai por afinidade com o que é feito no grupo ou
pela amizade de quem introduz o novato. O trabalho de
células familiares, quer para a evangelização, quer para a
edificação dos crentes, tem sido de uma eficácia
comprovada. Em cada lugar ele sofre as necessárias
adaptações. Porém, o princípio que o norteia é justamente
o de criar um espaço muito particular para aquele que se
achega à comunidade.
Alguém pode alegar que, no isolamento do seu
domicílio, ora, lê a Bíblia, estuda a lição da escola dominical
e até faz o compromisso de servir a Cristo. Mas por quanto
tempo tal expediente sustentará uma fé, distante do calor
dos irmãos? Da fogueira chamejante sai um pedaço de
lenha incandescente; por algum tempo, aquele pedaço de
pau continuará aquecido. No entanto, o tempo se
encarregará de esfriá-lo. A comunhão que o povo de Deus
sedia tem por objetivo tomar-nos sempre quentes na fé,
no amor, na esperança, no serviço, no temor a Deus, no
encorajamento, no enfrentamento de situações mui
complexas.

59
Por outro lado, há quem compreenda a importância
de estar no templo para estudar a Palavra de Deus, mas
não deseja que isto gere um vínculo maior com os outros
irmãos. Trata-se de uma atitude ambígua, pois, na verdade,
quem age assim confessa a necessidade de estar com
outros para aprender os propósitos de Deus. No entanto,
teme os desdobramentos de crescer junto aos outros. O
argumento predileto para sustentar este comportamento é
o de que a fé é algo pessoal, e cada um terá sua experiência
de Deus.
Correto. De um mesmo fato cada qual poderá tirar
proveito diferenciado. Também é correta a assertiva com
respeito à fé pessoal. Porém a fé pessoal nos coloca cara
a cara com Deus que, por sua vez, nos remete ao
semelhante e, no caso de nossa abordagem, nos remete
à família da fé.

METODOLOCIA DE ENSINO
Ao pensarmos em ensino, certamente vem à nossa
mente o legado mais que milenar da cultura helênica, bem
elaborado, mais recentemente, pelo movimento cartesiano.
Assim imaginamos os alunos dentro da sala de aula,
ocupados com seus apontamentos, tendo à frente o
instrutor, passivo, descomprometido com qualquer coisa
que exceda a matéria em questão, desconectado dos
interesses pessoais ali envolvidos.
Em Israel, o ensino era ministrado em moldes mais
familiares, mesmo assim, não se pode comparar com o
discipulado que Jesus nos oferece:

A vida de um talmid como talmid resumia-se no estudo dos


escritos sacros, freqüência às classes e discussão sobre pas-
sagens ou casos difíceis. O discipulado, como Jesus o conce-
bia, não consistia numa disciplina teórica deste tipo, mas numa

60

, I
tarefa prática a cuja realização os homens eram chamados a
entregar-se inteiramente e com toda energia. O discipulado,
portanto, não consistia na matrícula num colégio rabínico, mas
no aprendizado para a obra do reino. 3

o matetes4 estava mais para aprendiz do que para


estudante. E esta é a metodologia que deve prevalecer
nos círculos comunitários. O professor não é um estudioso
teórico que transmite informação e conhecimentos. O
aluno, por seu turno, não recebe passivamente os ensinos,
como quem aquilata dados para prestar algum exame.
Professor e aluno interagem com as questões mais
profundas da existência, promovendo implicações na vida
de ambos.
Jesus ensinou os seus discípulos acerca da cruz.
Asseverou veementemente o seu compromisso de ir às
últimas conseqüências. Não podemos ver Jesus ensinando
a este respeito de maneira fria e calculista, sem medir os
resultados na sua própria vida e na vida dos discípulos.
Estes, de igual modo, tiveram sérias dificuldades para
aceitar esta mensagem, pois ela era carregada de vida-
e morte. De fato, o ensino da Palavra de Deus é um ensino
radical que mexe com o ser humano para a vida e para a
morte. E, em se tratando deste último tema, ninguém pode
ficar indiferente.
Como podemos notar, trata-se de uma mensagem
encarnada, isto é, feito gente, que palpita, sensibiliza-se,
respira profundamente. Ela nos faz rir, ou chorar. Ela nos
aquieta, ou inquieta. Ela nos tranqüiliza, ou nos desinstala.
De qualquer modo, a verdade é uma só; no contato com
ela ocorre algum tipo de mudança.
Aquilo que é mudança no indivíduo ganha proporções
muito maiores e comprometedoras no grupo, provocando
intensa comunhão.

61
A comunhão cristã não está naquilo que fazemos em comum,
mas no que somos, da mesma forma que nossa identidade não
é estabelecida pelo que fazemos, mas pelo que somos em re-
lação aos outros. s

Neste ponto, diferentemente do capítulo anterior, não


estamos levando em consideração as tarefas realizadas
em conjunto, mas a natureza essencial do ser, modificada
pelo ensino da Palavra de Deus.
Conceituamos, assim, a metodologia do ensino
bíblico como algo vivo, que movimenta as entranhas do
ser, que provoca alterações, tanto em quem partilha a
mensagem, como em quem recebe, numa interação
maravilhosa, propiciada pelo Espírito de Deus.

TODO O CONSELHO DE DEUS


Não apenas a totalidade do ser é tocada, através desta
metodologia espiritual, mas o próprio ensino ministrado tem
um alcance totalizante. "Jamais deixei de vos anunciar todo
o conselho de Deus"6, afirmou o apóstolo Paulo aos
presbíteros de Éfeso no memorável encontro em Mileto. O
que isto significa? Significa que, a menos que ousemos
declarar toda a vontade de Deus, revelada em sua Palavra,
tornaremos o esforço do ensino na igreja uma tarefa
dispendiosa, cujos efeitos deixarão a desejar.

o encobrimento e a negligência de certas verdades, e de certos


aspectos da verdade cristã, sempre tem sido a principal carac-
terística de cada período de decadência na longa história da
igreja.?

É comum imaginarmos que certos assuntos já são


sobejamente conhecidos da congregação. Talvez até o
sejam. Muito provavelmente, de uma parte dela. Mas
aqueles que ainda não tomaram conhecimento ficarão à

62
mercê de tamanha ignorância, somente porque supomos
que o assunto já é sabido?
Primeiro de tudo, é bom considerar a eficiência da
repetição no aprendizado. Além do mais, sempre há algo
de novo e interessante no assunto tão conhecido. Sempre
é possível encontrar uma abordagem inusitada, tornando
a vetusta doutrina notícia de última hora.
Mais séria, porém, é a omissão deliberada da
verdade, geralmente temendo ferir susceptibilidades. Se
imaginamos que a comunhão da igreja ficará abalada
porque resolvemos pregar determinado assunto que a
Palavra de Deus nos recomenda, então, preguemos
mesmo, pois, tal comunhão precisa ser abalada.
Evidentemente, o equilíbrio e a sobriedade devem
marcar o ensino da igreja. A heresia, geralmente, é um
"ensinamento correto sem a influência de uma doutrina
equilibrada".8 Para sermos genuinamente bíblicos não
necessitamos ser exóticos. Pelo contrário, a Palavra de
Deus nos confere sua peculiar central idade. Para sermos
plenamente bíblicos, devemos anunciar o propósito de
Deus até às últimas instâncias.
Comunhão e ensino caminham juntos. Uma igreja,
equilibradamente doutrinada, vive suas relações fraternas
de modo autêntico. Permite-se confessar seus equívocos
e pecados, à luz da Palavra de Deus, pois conhece o amor
perdoador e transformador do Senhor. Não se trata,
portanto, de comunhão para consumo externo, de
aparência. É comunhão calcada do ensino bíblico,
ministrado com amor e profunda interação, a uma
comunidade que se dispõe a aprender em conjunto, sem
isolamentos.

63
Em nossa análise, até aqui, admitimos o papel
fundamental da liderança para a promoção da comunhão.
Pastores e aqueles que auxiliam diretamente no pastoreio
são responsáveis em primeiro plano pela manifestação
autêntica da comunhão no seio da igreja. Sem dúvida,
encontram-se na liderança da igreja aqueles que têm o
ministério do ensino. Neste sentido, acham-se duplamente
compromissados com a comunhão do povo de Deus, quer
como liderança, quer como ensinadores da Palavra de Deus.
É nosso propósito no presente trabalho demonstrar
a importância conferida à comunhão com vistas ao
crescimento da igreja. Aqueles que ministram o ensino de
Deus à igreja precisam trazer profundidade bíblica e densa
espiritualidade, para que não vejamos a igreja derivar para
o exotismo infindável, usado como arma para atrair
multidões. Lembremo-nos sempre da opção segura e
equilibrada de Cristo, que não se deixou conduzir pela
multidão, mas promoveu o autêntico discipulado.

1 MARCONDES Filho, Juarez, Igreja Presbiteriana de Curitiba -


comunidade viva, p. 15.
2 João 10.10.
3 MANSON, T. W., O ensino de Jesus, p. 239.
4 Discípulo.
S SOUZA, Ricardo Barbosa de, O caminho do coração, p. 210.
6 Atos 20.27.
7 LLOYD-JONES, Martyn, Avivamento, p. 37.
8 L1NTHICUM, Robert C., Revitalizando a igreja, p. 40.

64

I I
,
CAPITULO VI

o REINO DA
COMUNHAO -
(COMUNhÃo E vidA cRisTÃ)

Em que se constitui o verdadeiro cristianismo? Como


podemos qualificar a vida cristã? Quais as suas
características? O que é marca essencial na conduta cristã
e, por conseguinte, o que é acessório? Muitas vezes, o
secundário assume a dianteira e perdemos todo o
referencial. Daí, perguntarmos, de imediato, por aquilo que
necessariamente não é vida cristã.
A mera religiosidade, mesmo cristã, pode não
conferir uma vida cristã autêntica. Sempre que falamos
em cristianismo, mais do que a sua história e a sua
doutrina, pensamos a respeito dele como uma religião. É
mesmo de se indagar se Jesus Cristo fundou uma religião.
Ao que tudo indica, ele nasceu e morreu dentro dos limites
do judaísmo. Por isso, há quem atribua aos apóstolos de
Cristo a responsabilidade pela existência do cristianismo
como religião. De qualquer modo, a questão que se impõe
é: manifestamos vida cristã, simplesmente, por
cumprirmÇ>s os ritos próprios da fé cristã? Podemos nos
considerar genuinamente cristãos porque abraçamos um

65
modo de adorar a Deus? Estamos longe de afirmar que o
rito cristão não seja importante. Certamente, tem o seu
lugar. Mas a essencialidade do autêntico cristianismo não
se esconde na prática do culto religioso.
Além da religiosidade, muitas vezes o cristianismo é
identificado com o cumprimento das leis que, se supõe,
estabelecidas pelo criador. Quem é o cristão? Cristão é
aquele que conhece e obseNa as recomendações legais.
Quanto às próprias leis, não há consenso em toda a
cristandade. Alguns impõem mais peso sobre o homem,
outros, não são tão rigorosos. Mas tanto um como outro
marcam o cristianismo pelo seguimento de regras. Aqui, não
nos referimos, propriamente, aos grandes pilares doutrinários,
aceitos universalmente. Pensamos em coisas como: "Fica
proibida a entrada de crianças na Iivraria."l
O exemplo não é único; só no exemplar de onde
extraímos esta regulamentação há centenas de outras
muito semelhantes. A indagação que fica é: se as crianças
entrarem na livraria deixarão de ser cristãs? A vida cristã
ficou refém do legalismo? Onde está a vida abundante que
Cristo prometeu?
Alguns imaginam que a vida cristã está identificada
com um determinado tipo de linguagem. Certas expressões
religiosas vão se transformando na senha para
adentrarmos certos ambientes, devidamente reconhecidos
como irmãos em Cristo. Acostumados a atender todo tipo
de situação, já percebemos o uso indiscriminado e
deliberado por parte de alguns indivíduos que imaginam
que se disserem "paz do Senhor, irmão" vão poder ganhar
algum tipo de ajuda. Somos do parecer que a conversão
operada pelo Espírito Santo no homem traz sérias
conseqüências em seu modo de se comunicar, afinal, o
Espírito de Deus nos concede o louvor como idioma do

66
reino. 2 Mas daí, afirmar que refrãos religiosos estabelecem
as bases da nossa vida cristã, é coisa muito diferente.
Precisamos mesmo é de muito cuidado com um
"evangeliquês" muito em voga em nossos dias.
Na busca do essencial no cristianismo nos
deparamos com a Palavra de Deus: "O reino de Deus não
é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no
Espírito Santo."3
Comida e bebida são importantes? Sim. Mas quando
estamos com fome ou com sede não escolhemos o que
nos vai ser servido. O apóstolo Paulo estava justamente
tratando disso. Na igreja em Roma havia certos escrúpulos
em se comer carne sacrificada ao ídolo, ou na guarda de
certos dias etc. Tal matéria se tornou prioritária nas
discussões da igreja; contendas e cisões estavam sendo
forjadas nos bastidores da comunidade por causa disso.
Até que o apóstolo pontificou: isto é tremendamente
secundário e algumas medidas podem sanar o
comportamento dos irmãos. Fundamental é o reino de Deus.
Essencial no cristianismo é o reino de Deus. Básico
na vida cristã é a soberania de Deus na vida. Vital para a
igreja de Cristo é o senhorio de Cristo. Tal entendimento
deve nortear o pensamento de toda a igreja, passando ela
a comungar os valores inerentes ao reino de Deus.
Desejamos aliar as características do reino de Deus à
expressão de comunhão no seio da Igreja. Isto é, quanto
maior experiência da soberania de Deus na vida, maior
comunhão entre os congregados. Quanto. maior
envolvimento dos irmãos entre si, necessariamente, mais
o reino de Deus irá se sobressair. Vejamos algumas
características do reino.

67
A PROMOÇÃO DA JUSTiÇA
Promove-se justiça exatamente no contexto de sua
ausência. Onde se manifesta a injustiça aí se faz
necessário envidar todos os esforços para que a justiça
se apresente. A doutrina da justificação pela fé é um
exemplo notável deste princípio. Deus realizou em Cristo
a justiça, e concedeu a declaração de justo ao pecador. A
comunidade dos redimidos é formada pelos que
receberam esta condição, pela paciência e misericórdia
de Deus.
a cristão não busca, apenas, justiça para si, mas para
os outros, também. Num primeiro sentido, no que tange
ao anúncio da salvação. Mas, numa visão mais ampla, isto
implica no inconformismo do povo de Deus com toda e
qualquer tipo de injustiça. Manifestamos "uma torrente de
generosidade e de iracúndia profética que impede a
aceitação do mundo assim como está".4 Nossa vida cristã
não pode compactuar com a corrupção, com a
desonestidade, com a mentira. E a comunhão dos salvos
deve profetizar de maneira contúndente a sua
desaprovação diante da injustiça.
Nosso cristianismo não pode falar das mansões
celestiais em detrimento do déficit habitacional que ronda
o mundo. Nossa vida cristã não pode proclamar as bodas
do Cordeiro, esquecendo-se das miríades esfaimadas
entre todos os povos. O "pão da vida" nutre a alma, mas
aponta caminhos para minorar a aflição no corpo do
homem. "Enfocar os benefícios das bem-aventuranças
exclusivamente na vida após a morte é trair as intenções
de Jesus."5 Jesus intentou incutir em seus seguidores a
responsabilidade com a proclamação e a promoção da
justiça no presente século. Jesus declarou que somos sal
da terra e luz do mund0 6 , ou seja, o local de nossa

68
ministração é a terra, o ambiente de nossa aparição é o
mundo.

Pecamos quando aconselhamos as pessoas a não se mete-


rem em política, referendando, assim, vezes sem conta, um
status quo injusto. Pecamos quando usamos a teologia da sub-
missão à autoridade para produzir o imobilismo e a quietude
nas questões sociais. Pecamos quando deixamos de conde-
nar a injustiça e a corrupção e nos comprometemos com mei-
as-verdades. A voz profética tem o seu lugar insubstituível em
nosso meio.?

É importante considerar que a promoção da justiça


em meio à injustiça precisa encontrar eco no ambiente da
própria comunidade. Aqueles que promovem a justiça,
vivem a justiça individual e comunitariamente. Quando
alguém conhece a Cristo e entrega o seu viver à soberania
de Deus, "é liberado de uma falsa para uma verdadeira
comunidade."8 Por isso, precisamos sempre estar
checando nossa vida em comunhão para não permitirmos
que a justiça que caracteriza o reino de Deus se encontre
comprometida exatamente entre os cidadãos deste reino.
Um exemplo muito claro disto se configura quando
permitimos que os da própria família da fé fiquem
desassistidos.

A ViVÊNCIA EM PAZ
A vida cristã se caracteriza, também, pela experiência
da paz. Há uma ordem conseqüente: justiça, paz. "O efeito
da justiça será paz, e o fruto da justiça, repouso e seg.urança,
para sempre.''9 Não podemos conceber a paz em ambiente
de injustiça. Seria uma falsa paz. Paz e justiça se combinam
perfeitamente, conferindo à humanidade duas virtudes
essenciais para a realização do ser humano. São dois
anseios que devem ser buscados a todo custo.

69
Novamente a doutrina da justificação deve ser
evocada: "Justificados, mediante a fé, temos paz com
Deus."1o O primeiro sinal de vida cristã é a paz com Deus.
O pecado colocou o homem em guerra com o criador. Deus
em Cristo promove a reconciliação. 11 Quando o senhorio
de Cristo reina absoluto no coração do homem, este
adquire acesso pleno à presença de Deus. Não há
impedimentos, não há vergonha, há um livre e supremo
caminho aberto, porque a paz foi declarada.
Da paz com Deus para a paz consigo mesmo. O
pecado não somente provocou guerra com Deus, mas tomou
o homem um ser dividido, auto-beligerante. Tal homem vive
perturbado, temeroso, inconstante. Falta-lhe o equilíbrio que
só a paz de Deus pode lhe conferir. Cristo pronunciou
solenemente: "Deixo-vos a minha paz, a minha paz vos
dou."12 O significado de tais palavras no coração da
humanidade tem um alcance muito grande. A paz com Deus
nos garante a paz de Deus. A fé cristã afirma não somente
o encontro do homem com Deus, mas do homem com ele
mesmo.
Mas, finalmente, alcançamos a plenitude da
experiência da paz quando ela é manifestada em nossos
relacionamentos. A paz com os homens tornou-se possível
pela ação do próprio Deus. Afirmamos a paz com os
homens a partir da paz de Cristo em nós. Ouvimos muito a
respeito de paz. Sabemos de organizações internacionais
que vivem para esta tarefa. Mas, neste caso, trata-se da
paz dos homens com os homens. O que proclamamos é a
paz de Deus promovendo a paz entre os homens.
É importante salientar esta distinção, porque a paz
do homens tem sua precariedade. Não julgamos sem efeito
os esforços mundiais a favor da paz. Tudo o que se
constituir num empreendimento a favor do alívio das gentes

70
oprimidas e da fraternidade universal será motivo de
reconhecimento entre nós. Mas a paz dos homens tem
limites.
A paz de Deus é ilimitada, por isso mesmo
incompreensível. 13 A paz de Deus leva em consideração
as divergências entre os envolvidos e ministra o consenso
de maneira maravilhosa. "A paz de Cristo é o árbitro em
nosso coração, à qual, também, fomos chamados em um
COrpO."14 Isto implica não apenas na paz, mas na unidade,
na comunhão.
A conceituação da paz como característica do reino
de Deus vincula a igreja ao compromisso de experimentar
em toda a sua extensão a comunhão pacífica. Por mais
posicionamentos divergentes, sempre reinará no seio da
comunidade a tranqüilidade. A serenidade será marca
essencial nos relacionamentos entre os membros da igreja.
E isto se constituirá num testemunho vigoroso ao mundo.
O mundo que vive em guerras poderá encontrar na
comunhão da igreja a expressão maior e o desafio de lutar
a favor da paz.

A MANIFESTAÇÃO DA ALECRIA
"Não vos entristeçais, porque a alegria do Senhor é
a vossa força."15 "Alegrai-vos sempre no Senhor, outra vez
digo, alegrai-vos."16 Marca essencial na vida cristã é a
alegria. A comunhão dos santos deve estampar de maneira
bem destacada esta característica. Tal alegria deve
manifestar-se no culto a Deus. Não se admite que o
encontro do povo de Deus com o próprio Deus seja
marcado pela indiferença, pela apatia. Em alguns círculos
cristãos tem dominado ur,na atitude circunspecta, uma certa
"aversão a entusiasmo"17. Isto precisa ser vencido por uma
adoração esfuziante, plena de alegria.

71
A alegria também deve ter lugar nas relações fraternais.
O povo de Deus quando se acha reunido na presença de
Deus, tem a ventura de poder estreitar seus laços de amizade
a carinho. Necessidades são supridas, corações são
consolados, vidas são restauradas. E muito outros motivos
manifestam em nós a alegria. Alegria do Senhor em nós,
vivenciada entre os irmãos.
"Se enchermos nossa vida com coisas boas e
simples, e constantemente dermos graças a Deus por elas,
conheceremos a alegria."18 Quem não se alegrará por algo
bom e simples como o perdão de Deus. Todas as vezes
que nos lembrarmos da cena do Calvário ficará gravado
em nossa mente o gesto generoso da salvação de Deus
para conosco. Há vidas profundamente angustiadas porque
olvidam esta realidade. No tocante à comunhão entre os
irmãos, isto é vital. Nossas diferenças serão arbitradas
pela paz de Cristo, mas, também, pela lembrança de que
somos pecadores, sujeitos a limitações e falhas e, assim,
como fomos aceitos pelo Senhor, devemos nos aceitar uns
aos outros.
Outra lembrança para encher nosso coração de alegria
é a certeza da vida eterna. Coisas fugazes tomam conta do
nosso ser; enquanto estão conosco nos sentimos plenos;
esquecemo-nos da sua natureza finita; quando se vão, a
frustração toma conta do nosso ser. Estar convicto da vida
eterna remete a nossa existência a uma dimensão maior,
mais segura.
A alegria da comunhão, também, deve sempre estar
em nosso coração. Fomos perdoados pelo grande amor
de Deus e, agora, temos comunhão uns com os outros. 19
As tristezas próprias do mundo são superadas pelo oásis
em que deve se transformar o encontro do povo de Deus,
a convivência fraterna entre os filhos de Deus. Alegria era

72
uma marca bem visível na igreja antiga. 20 Em algo muito
simples, como fazer as refeições, o povo de Deus
manifestava genuína alegria.
Muitos motivos de alegria podem estar em nosso
coração, mas finalizamos esta seção lembrando a alegria
do ministério, isto é, a alegria de poder servir. Uma das
coisas que produz tristeza no coração do homem é falta
de sentido, de significância na vida. De outro lado, o
egocentrismo da criatura humana a torna amarga e sem
orientação. Aqueles que participam da comunhão dos
santos aprenderam que, no centro de tudo, está o Senhor
Jesus, rei soberano. Cristo, por sua vez, nos constitui seus
servos, e determinou que o nosso serviço vá na direção
do semelhante. Temos aqui, portanto, uma dupla alegria: a
alegria de ser útil para alguém e alegria de não ser inútil
para si mesmo.
A síntese paulina acerca do reino de Deus não esgota
toda a sua importância e riqueza, mas nos sugere aspectos
essenciais do viver cristão, quais sejam: a promoção da
justiça, a vivência da paz e a manifestação da alegria. O
reino de Deus está no coração do homem e no seio da
comunidade dos fiéis. Quando pessoas ingressam nas
fileiras da igreja não estão, apenas, aderindo a uma
religião; estão, sim, se comprometendo com o reino de
Deus.

1 MIRANDA, David Martins, Doutrina brblica para os dias de hoje, p. 21.


2 ORTIZ, Juan Carlos, O discrpulo, p. 53.
3 Romanos 14.27.
4 BOFF, Leonardo, E a igreja se fez povo, p. 17.
5 Norberto Sarraco in STEUERNAGEL, Valdir, op. cit., p. 196.
6 Mateus 5.13-16.
7 STEUERNAGEL, Valdir, op. cit., p. 156.
8 WRIGHT, G. Ernest, Doutrina brblica do homem na sociedade, p. 114.
9 Isaías 32.17.
10 Romanos 5.1.
11 2Coríntios 5.18ss.

73
12 João 14.27.
13 Filipenses 4.7.
14 Colossenses 3.15.
15 Neemias 8.10.
16 Filipenses 4.4.
17 LLOYD-JONES, Martyn, Avivamento, p. 76. Entusiasmo vem do grego
en theos, que significa "dentro de Deus".
18 FOSTER, Richard J., Celebração da disciplina, p. 227.
191João1.7.
20 Atos 2.46.

74
CAPíTULO VII

o OMBRO AMICO
(COMUNkÃo E CONSOLAÇÃO)

Retomamos à pergunta do início: por que as pessoas


vêm à igreja? Além dos motivos anteriormente alistados,
desejamos acrescentar mais um: as pessoas vêm à igreja
em busca de consolo. De alguma maneira, o encontro do
povo de Deus propicia o conforto que a alma humana
carece. Por assim dizer, a igreja funciona como o ombro
amigo onde podemos descansar dos muitos problemas.
Em algum caso a consolação vai de encontro à
angústia interior do indivíduo. Muitas pessoas adentram à
comunhão do povo de Deus carregadas de aflições
inexplicáveis. A busca de solução através de outros
expedientes já se demonstrou insuficiente; quase que vão
à igreja como um último recurso. E surpreendentemente
são confortadas. Ao limite da compreensão do que seja o
homem, a ciência denominou de inconsciente. Mas "o
inconsciente é parte integrante do nosso ser".1 E precisa
ser assistido.
Outros têm, perfeitamente, consciência de sua
situação. Chegam à casa de Deus carregados de lutas
domésticas: são crises conjugais, expectativas frustradas
quanto aos filhos, desarranjo nas relações com os pais.
Acham-se abatidos porque sua família está em frangalhos.

75
Precisam ser ajudados a melhorar os relacionamentos
dentro do lar. Mas, antes de tudo, precisam de consolo.
Há quem venha à igreja trazendo sua frustração
profissional. Ou trabalha com algo que jamais imaginou
um dia trabalhar, ou se sente habilitado para alguma coisa
que nunca pode exercer. Talvez esteja ali por razões
financeiras, ou aquilo que faz já foi, em algum tempo,
importante, mas, agora, se transformou num pesado fardo
a se carregar.
Neste particular, boa parte das pessoas se acha
frustrada com seu trabalho graças ao avanço tecnológico e
a conseqüente automação. "A automatização do indivíduo
na sociedade moderna agravou a desorientação e
insegurança do indivíduo comum."2 Em função de sua
atividade profissional, há pessoas desconsoladas pelo
tremendo tédio em que se encontram: "O crescente processo
de automação conduzirá a um aumento enorme das horas
de lazer; muitos não saberão o que fazer com o tempo Iivre."3
Tais pessoas vão à igreja buscar um conforto espiritual, que
traga alívio e dê sentido à existência.

O quadro secular que nos cerca provoca grande


tristeza em nossa alma. Os crentes chegam ao culto para
adorar, servir, alegrar-se na presença do Senhor, com a
mente estreitamente vinculada aos últimos acontecimentos.
Especialmente quando os encontros do povo de Deus se
dão após o noticiário televisivo, é inescapável
comentarmos acerca das tragédias mundiais, da violência,
da miséria, dos acidentes. Em função desse cenário,
precisamos extrair da comunhão do povo de Deus algum
tipo de consolação.

76
CONSOLAÇÃO PELA PALAVRA

Tudo quanto, outrora, foi escrito, para o nosso ensino foi escri-
to, a fim de que, pela paciência e pela consolação das Escritu-
ras, tenhamos esperança. Ora, o Deus da paciência e da
consolação vos conceda o mesmo sentir de uns para com os
outros, segundo Cristo Jesus. 4

Diante de angústias interiores, problemas familiares,


lutas profissionais e todo o mundo que nos cerca, o que a
Palavra de Deus tem a nos dizer? O texto bíblico não será
procurado como fonte de histórias interessantes acerca
de personagens e eventos do passado. Ele deve traduzir-
se em mensagem pronta e atualizada para o leitor de hoje.
O quadro que vivemos pode ser desesperador.
Queremos acreditar em dias melhores. Queremos lutar
para que isto aconteça. Queremos estar preparados para
ajudar a melhorar as coisas. Por isso, ansiamos por
esperança. Esta esperança vem no bojo do ensino das
Escrituras.
É curioso como algumas vezes os que ensinam a
Palavra de Deus perdem uma boa oportunidade par
consolar e incutir esperança no coração humano. Sua
mensagem reforça extensivamente as coisas como estão,
e sua conclusão não remete o ouvinte à esperança de
mudança.
É notável que a esperança esteja ligada às Escrituras
e ao próprio Deus: "consolação das Escrituras" e "Deus
da consolação". "As Escrituras são o meio de transmissão
da paciência e do conforto, dos quais Deus é a fonte."5
Portanto, o pregador não fica à caça de algum versículo
que aponte uma chance para o homem; ele busca de todo
o coração o Senhor, de quem procede todo o consolo. O
Espírito Santo de Deus vai guiá-lo a toda verdade. 6 É neste

T1
sentido que compreendemos a ação do Paráclito.? O
conforto promovido pelo Consolador, o Espírito Santo, se
consuma na aplicação da Palavra de Deus no coração do
homem.
A expressão "conforto", sinônimo de "consolo", é muito
sugestiva. Sua raiz latina é fortis, ou seja, força. Confortar
é conceder força ao enfraquecido. E o que fortalece o
coração do ser humano é a Palavra de Deus. O ensino
das Escrituras consola, não porque recolhe as nossas
lágrimas, mas porque dá força. Por isso, algumas pessoas
resistem ser consoladas porque não querem dar ouvidos
e abrir o coração para o ensino bíblico. Vão à casa de
Deus buscando consolação. Mas voltam desconsoladas,
porque não desejam fazer a vontade do Senhor.
Explica-se o desconsolo do povo de Deus, em grande
parte, pelo seu desconhecimento de doutrinas básicas das
Escrituras. Como pregadores, imaginamos que a igreja já
conheça os pilares da fé, e passamos a tratar de outros temas
mais empolgantes. Por algum tempo, nosso auditório vai ficar
em êxtase com a nossa versatilidade, para, depois, cair em
profunda inanição. Estamos longe de sugerir a inibição do
esforço teológico e fazer a propaganda do repeticionismo.
Ao contrário, pregar sempre sobre os fundamentos da fé exige
tremenda dedicação, pois precisamos trazê-los ao cadinho
da vida.
Perguntamos: o povo que vem ao encontro de
comunhão, de consolação, tem sido alimentado com a
visão da soberania de Deus? Ou com a certeza da
presença do Senhor na sua vida? Diante de tantas aflições,
temos proclamado o perdão de Cristo? E a necessidade
de perdão mútuo? No contexto de um mundo que não dá
valor a nada que mereça ser valorizado, temos insistido

78
na reverência ao Senhor e, por conseguinte, no respeito
ao ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus?
A pregação doutrinária deve culminar em prática de
vida. A consolação pela Palavra de Deus deve preencher
esta lacuna, também. A ministração das Escrituras, no seio
da comunidade cristã, deve levar os crentes à tomada de
decisões, ao reatamento de relacionamentos partidos, a
mudanças radicais na vida.

EXORTAÇÃO
O termo consolar - parakaleo, em grego - figura,
nas Escrituras, como exortar. "Parakaleoé a palavra para
exortar aos homens para que realizem obras nobres e que
cultivem pensamentos elevados."a Neste sentido,
queremos enfatizar a força do consolo divino, quando se
requer uma palavra mais efetiva, uma atitude mais eficaz.
Exortação se constitui num dom espiritual -
cha risma ta: concessões da parte de Deus para serviço
no reino. O corpo de Cristo, tem em seus membros a
realização de funções diversas; todas são importantes, e,
cooperam para o funcionamento adequado do corpo. Uns
trabalham no ensino, propriamente dito, outros na
evangelização e, assim por diante. Há quem seja
exortador. "Quem exorta, faça-o com dedicação."9
A relação existente entre exortar e consolar é muito
mais do que a de raiz etimológica. Há um tipo de
consolação que só se torna real em meio à atenção
despertada pela exortação. Assim, quando não exortamos,
com medo de entristecer alguém, na verdade, iremos deixá-
lo no desconsolo.
A exortação tem uma característica essencialmente
pessoal. Enquanto, a ministração das Escrituras, através

79
da pregação, atinge um vasto auditório, a exortação irá
ministrar a mesma Palavra de Deus a um indivíduo, levando
em consideração a sua condição individual. Literalmente,
parakaleo quer dizer "chamar ao lado"10. Não se pode
chamar ao lado, para um particular, a igreja toda. Mas o
exortador, capacitado por Deus para o exercício do seu
dom, identifica quem precisa ser advertido do seu mau
caminho e, com muito amor, ministra-lhe o consolo divino.
A Reforma salientou que a disciplina é uma das
marcas da verdadeira igreja. Algumas igrejas são tidas
como liberais porque em seu meio não são aplicadas
penalidades sobre os faltosos. Já outras são consideradas
muito rigorosas porque à mínima falta estabelecem um
tribunal eclesiástico. O equívoco se estabelece no instante
em que a disciplina foge à sua própria etimologia, qual
seja, o discipulado. Alguém, em sã consciência e
biblicamente falando, pode dizer que não há disciplina em
uma igreja que ensina a Palavra de Deus, cujos membros
se exortam mutuamente? "Ser complacente com o pecado
é uma atitude oposta ao caráter de Deus, ao fruto do
Espírito Santo, à obediência à Palavra de Deus, ao
sacrifício de Cristo e ao amor com que devemos amar uns
aos outros."11 Não podemos tratar com indiferença o
pecado. Mas o exercício da exortação no seio da igreja se
revelará um caminho muito mais eficaz na busca de
disciplina e consolação do que os tribunais religiosos.
O ministério de exortação tem um lugar
importantíssimo na vida da igreja. Talvez algumas pessoas
o exerçam sem se dar conta. Mas os que têm consciência
do seu trabalho devem estar atentos para não
ultrapassarem limites, não criarem atritos, não tornarem
algo tão vital na igreja em motivo de polêmica. O assunto
é sério e não pode ser considerado de outro modo.
Especialmente, é preciso ter cuidado para não deixar a
80
tarefa pela metade. Não "simplifiquemos demais um
problema, reduzindo a solução a uma série de 'passos a
tomar"'.12

CONSOLAÇÃO PELO CONTATO


Dissemos no início desta seção que muitos procuram
a igreja para consolar-se. Até aqui, temos destacado o
lugar das Escrituras como instrumento de consolo da parte
de Deus, quer pela pregação ou estudo em grupo, quer
pela exortação num tratamento personalizado. Mas há uma
consolação que decorre do próprio encontro do povo de
Deus.
"Os que creram estavam juntos e tinham tudo em
comum."13 Na igreja antiga, a comunhão não se esgotava
em bens ou participação eucarística. O fato de estarem
juntos implicava num compartilhamento de ansiedades,
de sonhos, de frustrações, de problemas, de aflições, de
angústias. Aparentemente, não há diferença em quem
está na igreja e quem não está. A única e essencial
diferença, neste particular, é que os que buscam a
comunhão do povo de Deus ficam juntos. As lutas deixam
de ser pessoais e passam a ser comunitárias. Temos a
certeza de que não estamos sozinhos em nossa peleja.
Colocamos aqui a questão da solidão. "Muitos de nós
nem sabem quão solitários estão, e nós todos não temos
idéia de quão solitários estão muitos outroS."14 E a solidão
provoca tristeza que clama por consolo. Daí afirmarmos
que o simples aproximar-se da comunhão dos santos se
constitui numa oportunidade de consolação. Quem se
justifica, com mil argumentos, de que não vai a igreja,
certamente carrega sobre si um far90 mui pesado que bem
poderia compartilhar com outros.

81
o encontro do povo de Deus deve promover este
contato de uma maneira muito efetiva. Preocupa-nos
imaginar que algumas pessoas venham à igreja, cônscias
ou não de que precisam de consolação, adentram o
santuário, atravessam toda a liturgia do culto, e vão embora
sem estreitar, um mínimo que seja, o seu relacionamento
com os irmãos.
Para que o crente não passe incólume em sua ida
ao culto, algumas práticas começam a se tornar correntes
nas igrejas. A saudação fraternal em meio ao culto, quando
todos se levantam e se cumprimentam, é uma dessas
medidas. Há quem ache que isto tira a solenidade do culto;
há quem se exceda - abrace, oscule, pergunte sobre a
família, fale em tom muito alto. É preciso ter em mente que
o objetivo é fazer notada a pessoa e criar uma
oportunidade para diálogo posterior.
Outra medida que vai se consagrando em muitas igrejas
é chamada de "oração dois a dois" (necessariamente, não
precisam ser somente dois). Em meio ao culto, as pessoas
mais próximas oram umas pelas outras. Para isso, precisam
conversar uns poucos segundos, pelo menos, para saberem
os nomes uns dos outros. Algumas pessoas vão enfrentar
uma dificuldade básica: não sabem orar, a não ser sozinhas.
É preciso habilidade e equilíbrio, do contrário, o expediente
se toma inócuo, se não, prejudicial.
Um comitê de recepção ajuda muito, especialmente
na identificação de pessoas novas ou visitantes. Já, ficou
devidamente comprovado que a primeira impressão é a
que fica. Se na primeira vez que a pessoa vier à igreja ela
for bem acolhida, se sentirá em casa. Retornará uma
segunda vez e, daí por diante, sentirá falta se por alguma
razão não puder estar com o povo de Deus.

82
CONSOLAÇÃO PARA CONSOLAR
"Deus nos conforta em toda a nossa tribulação, para
podermos consolar os que estiverem em qualquer
angústia."15
Primeiro de tudo, a lembrança sempre presente do
consolo divino. Quando nos chegamos a Cristo, com toda a
sorte de pecado e dor, ele retira de sobre nós a carga e nos
concede alívio. Ter isto em mente é vital. Às vezes, somos
tentados a imaginar que Deus não tem feito nada a nosso
favor. Tal ingratidão compromete o nosso avanço na
caminhada da fé. E, assim relembrados, passamos em
revista as muitas ações benéficas de Cristo para conosco.
Seu sustento gracioso é a garantia da superação de tantas
lutas e crises.
Agora, indagamos, quais os benefícios que podemos
prestar aos outros em função do consolo que recebemos?
Há alguma relação entre as nossas aflições pessoais e as
de outrem? De que maneira podemos ajudar quem está
aflito?
O acontecimento abaixo esclarece em parte este
ensino. O pastor recebeu a informação de que aquela irmã
que estava grávida havia perdido o seu bebê.
Rapidamente, ele se dirigiu ao hospital para prestar o seu
consolo. Ali ficou por um bom tempo. Finalmente, voltou
para o seu gabinete, profundamente frustrado. Sentiu no
seu coração que sua visita foi de pouco proveito para aquela
jovem. Orou ao Senhor, indagando o que poderia fazer
naquela situação. Foi quando lembrou-se de uma outra
irmã em Cristo que, anos atrás, havia passado por uma
experiência semelhante. Imediatamente, telefonou para ela,
pedindo que fosse visitar aquela jovem. A irmã
prontamente se dispôs e os resultados foram

83
impressionantes. Não era de estranhar que o pastor não
alcançasse o seu objetivo, afinal, nunca havia abortado um
bebê. A consolação recebida há muito tempo conferiu
autoridade à irmã de tal sorte que, em situações como
aquela, ela se constituía num canal de consolo da parte do
Senhor.

1 MARTINS, José Cássio, o inconsciente - nosso íntimo desconhecido,


p.57.
2 FROMM, Erich, O medo à liberdade, p. 172.
3 FRANKL, Viktor E., Em busca de sentido, p. 97.
4 Romanos 15.4,5.
5 GIRDLESTONE, Robert B., op. cit., p. 92.
6 João 14.26.
7 João 14.16.
8 BARCLAY, William, op. cit., p. 169.
9 Romanos 12.8.
1O Pará = ao lado; kaléo = chamar.
11 Eduardo Arata in HORRELL, J. Scott, Ultrapassando barreiras I, p. 102.
12 KNIGHT, Lida E., Quem é você no corpo de Cristo, p. 117.
13 Atos 2.44.
14 BRUNNER, Emil, Nossa fé, p. 97.
15 2Coríntios 1.4.

84
CAPíTULO VIII

ASSISTINDO AOS
QUE PRECISAM
(COMUNltÃO E AÇÃO sociAl)

EVANCELIZAR OU FAZER AÇÃO


SOCIAl?l
A discussão não é de hoje. Afinal, o que deve a igreja
fazer: anunciar o evangelho em sua essência ou ocupar-
se dos desdobramentos que o evangelho traz, tais como
assistência aos desfavorecidos e educação, entre outros?
Por decisão dos seus Supremos Concílios2 , as Igrejas
Presbiterianas do Brasil e Independente estão buscando
um diálogo, com vistas à sua fusão num futuro próximo. A
divisão destes dois grupos se deu no início do século XX, e
tinha em seu bojo a discussão a respeito do que deveria a
igreja fazer: evangelização somente, ou evangelização com
ação social. Um grupo marcou posição inarredável na
primeira opção. Naqueles primórdios não se permitiram
iniciativas tais como instituição de hospitais, escolas, lar de
amparo a idosos. Isto parece ter mudado. É um entrave a
menos na busca da aproximação.

85
Tem havido a compreensão de que é preciso superar
a dicotomia entre a pregação da Palavra e o fazer cristão.
Um evento mundial declarou: "Externamos o nosso
arrependimento por nossa negligência em termos, às
vezes, considerado a evangelização e a ação social como
mutuamente incompatíveis."3 Outra declaração vai mais
longe:

Reconhecemos que a igreja evangélica latino-americana, em


geral, não assumiu fielmente esta responsabilidade. Confundiu
o mundo, ao qual Deus a enviou para servir, como mundano e
pecaminoso, e se isolou dos processos sociais e políticos. Em
alguns casos, inclusive, tem chegado a justificar regimes dita-
toriais violentos. 4

Esta dicotomia é fruto, em parte, do dualismo grego


e medieval que afirmava ser a matéria má e tudo o que
com ela se identifica; somente o espírito, invisível,
desencarnado é que é bom. Escobar vai afirmar que este
dualismo tem influenciado a América Latina, especialmente
através das idéias de Watchman Nee e daqueles que
adotaram o dispensacionalismo da Bíblia de Scofield. 5
Esta ambivalência não pode permanecer pois, na verdade,
o espírito e o corpo procedem do mesmo Deus, tanto
quanto a evangelização e a ação social procedem do
mesmo evangelho. 6
A missão da igreja não é nem evangelizar, nem realizar
a ação social, mas ser serva de Deus.? Quando o contexto
clama por algum tipo de interesse, a igreja, como serva Deus,
deve responder com total dedicação. Se o caso exige simples
proclamação, a igreja irá anunciar a salvação em Cristo. Se
a situação implica em atendimento de necessidades básicas,
a igreja não pode furtar-se a demonstrar o serviço a Deus no
mundo:

86
CUIDADO COM O A5515TENCIALI5MO
A postura clientelista vivida por determinados
governos se constitui na grande tentação da igreja, no
tocante à ação ou assistência social. Por assistencialismo,
entendemos a atitude supridora de anseios imediatos, mas
que não se consumam num projeto estrutural, que beneficie
o indivíduo e a coletividade de maneira abrangente.
Em nosso expediente cotidiano à frente da igreja,
costumamos atender muitas pessoas. Boa parte em busca
de algum tipo de ajuda econômica: remédios (vêm,
inclusive, com a receita), passagem de ônibus, cesta
básica, e assim por diante. Um grande drama se
estabelece: ajudar ou não? Se a resposta for,
simplesmente, positiva, indubitavelmente arranjamos um
cliente (para não dizer, freguês). Via de regra, ele se
encarrega de noticiar a outros necessitados a benevolência
de nossa igreja. Não ajudar parece se transformar numa
atitude escapista e irresponsável. A indiferença se constitui
num pecado gravíssimo.
Não pensemos que vamos encontrar uma saída
mágica para o impasse. Cada situação será tratada com
muito amor, oração e real desejo de ajudar as pessoas.
No entanto, é preciso redimensionar o papel assistencial
da comunidade de fé, a fim de promover-se mudanças
substanciais na vida dos indivíduos e na coletividade. A
ação social, portanto, se constitui num conjunto mais amplo
de medidas, envolvendo a igreja como um todo, com o
objetivo de trazer aos que ouvem o evangelho, igualmente,
melhores condições de vida.
É aqui que observamos o engajamento de todo o povo
de Deus. A ação social abre portas para o envolvimento.
de toda a comunhão dos santos. Os membros da igreja
não se sentirão meros adoradores de Deus ou

87
anunciadores de uma mensagem espiritual, mas se
comprometerão na construção de um mundo melhor.
Assim, como há muitas pessoas procurando a igreja para
a solução de seus problemas mais básicos, há, também,
crentes querendo sentir-se úteis no reino de Deus. Não é
tão difícil emular os crentes para o cumprimento de uma
tarefa social arrojada. Basta planificação e administração.
O povo de Deus deseja se envolver.

AVIVAMENTO E AÇÃO SOCIALa


Falar de avivamento é falar de vida. Se não são
muitas as menções ao avivamento, literalmente falando,
ao longo de toda a Bíblia, não é preciso dizer nada a
respeito de vida, em todas as Escrituras. A mensagem da
Palavra de Deus traz vida. Deus, em Cristo, nos tirou da
morte para a vida. Cristo veio para nos dar vida abundante. 9
O avivamento reacende a compreensão e o alcance
da verdadeira vida espiritual. O conhecimento de Cristo traz
salvação, vida nova. Porém, um certo costumeirismo
espiritual nos assalta e, repentinamente, passamos a não
andar em novidade de vida. 10 Quando volvemos nossa
atenção para a profundidade da Palavra de Deus, tornamos
a ansiar por uma vida de intensa comunhão com Deus.
Tal vivificação tem um caráter tremendamente
pessoal, ou seja, trata-se de uma experiência de cada
indivíduo com Deus. Por isso mesmo, o que foi provado
por alguém, necessariamente não será provado por outrem,
no que tange à intensidade ou a resultados obtidos. Sendo
uma experiência de Deus na vida, a qualidade estará
sempre garantida.
Mas é preciso que este evento pessoal não se
degenere numa manifestação egoísta. Ao contrário, que

88
encontre eco na comunidade dos fiéis, e qual uma pedra
jogada no lago, vá fazendo círculos concêntricos até chegar
na periferia mais extrema possível.
Daí entendermos ser marca inexorável do avivamento
bíblico uma transformação não só no indivíduo, mas em
seu lar, na igreja e na própria sociedade em redor.

A COMUNidAdE
A comunidade primeira em Jerusalém é sempre um
desafio para a igreja de todos os tempos, no que se refere
ao modelo de convivência e relacionamento dos membros
entre si. Atos 2.42-47 não pode ser o libelo de saudade do
paraíso perdido de como viviam os convertidos, mas de
como devemos nos interessar uns pelos outros em nossas
comunidades nos dias de hoje. O avivamento verdadeiro
não se esconde no comportamento emocional deste ou
daquele crente, mesmo que seja o pastor, mas "a
transformação deve estar na alma da igreja". 11
Igrejas que não sejam o espelho de uma comunidade
fervorosa, amorosa, interessada profundamente nos
membros que as compõem, nas famílias que são seus
sustentáculos, igrejas que não têm por alvo fazer a diferença
no meio em que estão inseridas, sem dúvida, precisam
de avivamento. Falando da igreja:

Nenhuma outra instituição social desempenhou papel mais im-


portante ao longo da história, dando às pessoas um senso de
significado para a vida e a oportunidade de ver a própria existên-
cia em relação a uma fonte e a um propósito que transcendem o
dia-a-dia. Com atividades como adoração coletiva, cuidado pas-
toral e programas educacionais, as congregações são visivel-
mente presentes para os membros e para as comunidades. 12

89
o ponto que desejamos demonstrar é o alcance do
avivamento no tocante a toda a igreja. A experiência pessoal
extravasa para uma vivência comunitária. Este é mais um
teste que podemos aplicar para encontrar o verdadeiro
avivamento. Há profundo amor e respeito entre os irmãos
na igreja? Este amor tem motivado a realização de projetos
ousados que justificam a existência da igreja como
sociedade válida no mundo? Ou a igreja, apenas, tem
promovido determinadas celebrações extravagantes,
carregadas de um profundo emocionalismo, que
praticamente a deixam inerte? O exemplo é dramático e
contundente, mas muito do que se tem chamado avivamento
não passa de um entorpecimento espiritual que, num
primeiro momento, gera enorme euforia, para, logo depois,
estatelar indivíduos e comunidades inteiras no chão (às
vezes, literalmente). Quando há overdose, o risco é fatal.

o LAR

Não como extensão da igreja, mas como sua unidade


formadora - "as igrejas devem ser construídas a partir de
unidades familiares, e não a partir de cristãos isolados" 13
- o avivamento deve acontecer nos limites do lar, também.
Avivamento tem a ver com a vida e não com religião,
simplesmente. O homem que compreende a extensão do
avivamento nos limites da igreja deve lembrar-se de que
tal limite passa pela célula familiar.
O apóstolo Paulo incluiu nas características da
plenitude do Espírito os relacionamentos familiares. 14
Muitos imaginam que ser cheio do Espírito implica em falar
línguas estranhas, predizer o futuro ou exorcizar um
demônio. Nada disso está dito aqui. No entanto, além de
uma linguagem espiritual de alto nível, uma atitude de
gratidão na vida, os relacionamentos dentro de casa
manifestam nossa genuína espiritualidade. Neste tempo

90

I I
em que a família vai sendo descartada como célula máter
da sociedade, precisamos de um profundo avivamento
dentro dos nossos lares.

A SOciEdAdE
Paul Pierson 15 propõe um triângulo em que as
camadas, principiando do topo, vão se sucedendo até
alcançar a base. Num primeiro estágio o avivamento toca
o coração de alguém ou um pequeno grupo. A seguir isto
irá refletir-se numa determinada igreja local e suas
congêneres. Mas, enfim, é preciso que o avivamento tenha
conseqüências na sociedade como um todo.
Exemplos disso foram vistos nos avivamentos dos
séculos XVIII e XIX, quando uma sociedade sem princípios,
a partir dos avivamentos, passou a ter parâmetros e valores
que trouxeram justiça social, equilíbrio econômico, saúde
etc. É notório que, ao abandono dos princípios da Palavra
de Deus, por parte da Igreja, se sigam momentos de
degradação em toda a sociedade. Daí ser, efetivamente,
uma prova de verdadeiro avivamento o impacto que uma
comunidade voltada para a Palavra de Deus vai ocasionar
na sociedade em redor. É questionável o fervor intenso
portas adentro do templo, sem ser motivador de reformas
que clamam portas a fora.
"O mandato cultural chama toda a humanidade a
participar na ordenança e na administração da criação,
isto é, na obra da civilização e da cultura."16 Se toda a
humanidade recebeu tal incumbência, um povo vivificado
maior responsabilidade tem.
O avivamento tem que alcançar as periferias das
ci~ades onde estão as favelas malcheirosas, onde es~ão
os desempregados ou subempregados, onde estão as
crianças que não têm escola, chegar não através de

91
liturgias analgésicas, muito menos através de exploração
da credulidade do povo simples, mas por meio da igreja
que é tocada por Deus para levar o evangelho e o pão, a
Palavra e a educação, a doutrina e a ação social.
A proposta de Linthicum 17 de uma igreja com a cidade
supera os modelos de igreja na cidade e igreja para a
cidade. Há igrejas que apenas estão localizadas na
cidade, mas isto não tem qualquer importância, afinal, elas
não se importam com o mundo circundante; a cidade não
lhes diz respeito. Há outras que, ao contrário, percebem
que o seu papel é fazer algo em benefício das melhorias
da cidade; mas, neste afã, olvidam a força da própria
cidade, fazendo tudo por ela, mas não ensinando e fazendo
com a cidade.
Já dissemos que o avivamento é uma ação de Deus
que exige a resposta do homem. Não é possível ouvir a
Palavra de Deus e não alarmar-se, como diz Habacuque,
visto que a voz de Deus não está alheia à realidade que
nos cerca. O avivamento não pode ser uma mera
interiorização do ser. Ele nos faz voltar a atenção para os
anseios de Deus, mas nos remete, também, para a
miserabilidade que nos cerca. Além disso, o avivamento
nos relembra do potencial que a igreja do Senhor recebeu
e é depositária para ter projeto e ação na direção de
soluções divinas para as estruturas dos homens.

A IGREJA PRESBITERIANA DE CURITIBA


Apenas a título de ilustração, sem ufanismo, segue o
exemplo do trabalho de ação social feito por uma igreja local.
Presentemente a igreja mantém um orfanato, uma
creche, uma associação de proteção à infância e à
maternidade, uma associação pró-paz, um centro de

92
produção rural e uma escola de música. O jardim de
infância que funcionou por mais de 25 anos cedeu espaço
para atividades mais prioritárias.
Estão em andamento as obras de um projeto mais
amplo que abrigará: 8 casas-lares, para um total de 64
crianças órfãs; 100 unidades, entre suítes e chalés, para
idosos e casais idosos; uma escola profissionalizante, com
diversas oficinas, tais como: informática, turismo, mecânica
etc.; e, ainda, um complexo comunitário para envolver toda
a igreja e coletividade.
Tudo o que já se fez, e o que está sendo aguardado
para breve, é realizado com a participação integral da
comunidade, sem descurar da tarefa da evangelização.
Ao contrário, todos os projetos levam em consideração o
papel assistencial e educacional, aliado ao anseio de
evangelizar indivíduos, famílias e regiões inteiras. Os
recursos são responsavelmente destinados com vistas a
atender todos os setores.
A ação social beneficia a coletividade que recebe o
trabalho da igreja. Mas beneficia, muito mais, a própria
igreja que se envolve de maneira muito ampla e encontra
um sentido de ser uma bênção para todas as famílias da
terra. 18

1 Parte desta seção foi extraída de MARCONDES Filho, Juarez, Missão


integral - mito e realidade, p. 4.
2 Órgão maior de uma denominação presbiteriana.
3 LAUSANNE, Documentos de, Para que o mundo ouça a sua voz, p. 9.
4 QUITO, Declaração de, Boletim Informativo, nº 19, p. 69.
5 ESCOBAR, Samuel; STOn, John R. W. et aI., Tive fome, p. 13.
6 STOn, John R. W., Evangelização e responsabilidade social, p. 25.
7 BARRO, Antonio Carlos, Tese de mestrado.
8 Esta seção foi extraída de MARCONDES Filho, Juarez, O padrão bíblico
do avivamento.
9 João 10.10.
10 Romanos 6.4.

93
11 L1NTHICUM, Robert C., Revitalizando a igreja, p. 45.
12 ENGEN, Charles van, Povo missionário, povo de Deus, p. 38.
13 GETZ, op. cit., p. 21.
14 Efésios 5.18ss.
15 PIERSON, Paul Everett, Anotações de c/asse.
16 CARRIKER, Timóteo, op. cit., p. 24.
17 L1NTHICUM, op. cit., p. 72ss.
18 Gênesis 12.3.

94

, i
CAPíTULO IX

BUSCANDO JUNTOS
A PRESENÇA DE
DEUS
(COMUNItÃO E ORAÇÃO)

E perseveravam [...] na comunhão [...] e nas orações. 1

Para todos os que enfrentavam com bravura as profundezas da


vida interior, respirar era orar. 2

Orar é a coisa mais ousada e mais humilde que uma pessoa


pode fazer. Ousada, porque se atreve a falar àquele que é maior
do que a imensidão do universo. Humilde porque oração é uma
declaração de impotência. 3

Nossa oração é sempre o efeito de bater Jesus à porta do nos-


so coração. 4

As colocações acima nos põem diante de um mistério


impressionante e de uma responsabilidade que sozinhos
não poderemos atender de maneira perfeita. .

95
DEVOÇÃO PESSOAL E INTERCESSÃO
COMUNITÁRIA
o versículo: "No teu quarto, fechada a porta, orarás a
teu Pai, que está em secreto"5 parece contrastar com este
outro: "Unânimes, levantaram a voz a Deus."6 Num caso,
vemos o incentivo ao cultivo de uma vida piedosa em
particular. Noutro, deparamo-nos com um desafio
comunitário de buscar a presença de Deus em oração.
Não se trata de escolher. Apenas, são situações diferentes.
Conforme o momento exigir, deveremos nos aplicar a um
ou outro tipo de oração.
Quem pratica a vida íntima devocional recebe de
Deus graça num sentido muito particular. Quem estabelece,
na intercessão, um intercâmbio com a comunidade de fé,
estende os benefícios da vida espiritual a todo o grupo.
Uma vem acompanhada da outra e ambas devem se
complementar. Quem, porventura, queira se eximir da tarefa
de reunir-se em oração com o povo de Deus, alegando
que já orou em particular, está manifestando um grave
egoísmo na vida espiritual. Por outro lado, quem imagina
que basta ir aos encontros de oração e sua vida espiritual
alcançará a condição desejável, está fugindo ao convite
do Pai que recompensa em secreto. Num certo sentido,
todos precisamos de um deserto, onde encontraremos
somente com Deus.

o deserto deve ser visto não necessariamente como um afasta-


mento geográfico e social, mas como uma atitude, uma postu-
ra diante de Deus e de nós mesmos. É o lugar ou situação
onde aquilo que supomos ser é desmascarado.?

o que desejamos enfatizar é que, em hipótese


alguma, as Escrituras Sagradas balizam uma preferência
pelo cultivo da vida devocional pessoal em detrimento da

96
intercessão comunitária. Na igreja antiga, comunhão e
oração caminhavam juntas, ou seja, o povo de Deus amava
estar reunido, e amava estar reunido para orar.
O encontro do povo de Deus é sempre uma
oportunidade para buscarmos juntos a presença do Senhor
em oração. Aqui nos referimos, especialmente, à
oportunidade de, através da oração, colocarmos nossos
anseios diante de Deus, pessoais, quando necessários, e
comunitários, também.
Reconhecemos quão importante é a oração na vida
do povo de Deus. Na Igreja Presbiteriana, está na sua
Constituição a determinação de que nenhuma reunião de
caráter administrativo comece ou termine sem uma palavra
de oração. Não importa que assuntos estejam sendo
tratados, o grupo sente a necessidade da presença e
orientação divinas. Os encontros familiares, ou células
como são chamados, aguardam que uma boa parte do
programa inclua intercessão mútua. Ao longo de todo o
desenvolvimento do culto, várias orações são proferidas,
incluindo a comunidade como um todo.
Muitos vêm à igreja com o fito de receberem uma
oração. E não podem ser frustrados neste desejo. Suas
angústias são levadas, constantemente, à presença do
Senhor, mas eles almejam estar em comunhão com os
irmãos, para juntos buscarem a força do Senhor no
enfrentamento dos problemas. Assim, o fortalecimento que
o espírito comunitário nos oferece vai muito além do fato de
estarmos uns com os outros, num apoiamento mútuo.
Estamos juntos, sim, mas na presença do Senhor. Quem
nos fortalece é o Senhor. E cada qual, fortalecido pelo
Senhor, encontra-se apto para ser um esteio para o seu
irmão.

97
Assim, as duas coisas vêm juntas: o querer estar
juntos (comunhão) e o buscar a força de Deus (oração).
Que ninguém deixe de cultivar a intimidade do Senhor. 8
Mas que todos se sintam motivados à oração comunitária.

o DOM DA INTERCESSÃO
Não figura em nenhuma das listas dos dons espirituais
a intercessão como dádiva divina para um ministério
específico. Há quem critique, em certas igrejas, a existência
de um ministério de intercessão. Sua alegação é que todos
devem interceder por todos. Em nossa igreja há uma
designação para Ministério de Intercessão. Também, há
outra designação para Ministério de Eventos; quando o
organizamos, tínhamos certeza de que a Bíblia não fala
acerca de sua existência. No entanto, vimos que, à frente
dos muitos acontecimentos da igreja, estavam
determinadas pessoas aptas para conduzir um programa,
providenciar os recursos, ajudar de maneira decisiva
qualquer segmento da comunidade. A percepção das
necessidades e de quem as suprisse gerou o ministério.
Há um sentido de vocação e dotação do Espírito Santo.
Quem não tem este chamado não persevera.
No tocante ao dom da intercessão, parece haver certo
paralelo. Em qual comunidade cristã não encontramos
irmãos mais interessados em oração do que outros? Estes
não vão deixar de orar. Mas aqueles dedicarão as suas
vidas para interceder pela família da fé, pelos perdidos,
pela nação, etc. Lida Knight levanta uma série de
características destas pessoas e categoriza: "Ao descobrir
um bom número de irmãos com exatamente estas
características, que os demais não têm, é difícil negar que
eles tenham um dom específico pata ministério nesta
área."9

98
o termo entheusis significa um encontro. Se refere
especialmente àquele que procura um rei a favor de outrem.
Tal pessoa se coloca entre o necessitado e o rei. Uma figura
muito sugestiva de tal ministério nos é dada no Antigo
Testamento: "Busquei entre eles um homem que tapasse
o muro e se colocasse na brecha perante mim a favor desta
terra, para que eu não a destruísse." 10
Os intercessores se colocam no seio da igreja como
motivadores tanto da comunhão como da oração, na
medida em que são procurados pelos irmãos com seus
problemas e anseios. Da mesma forma, ele se constituem
em motivadores dos irmãos a que busquem a Deus e a
comunhão fraternal.

Em se tratando do tema proposto - comunhão e


oração - é inescapável, mesmo que de forma muito
rápida, comentar a respeito da oração que Jesus ensinou
aos seus discípulos. 11
Primeiro de tudo, é preciso observar o tratamento
familiar, fraternal, demonstrado por Cristo. Ao dirigir-se a
Deus, fala com o Pai. Nossas orações são dirigidas ao
criador dos céus e da terra, soberano Senhor, mas que é
o nosso Pai. Por isso temos acesso pleno ao seu trono
de graça. É como a filhos que ele vai nos ouvir. E, de sua
bondade paternal, há de emanar o atendimento de
nossos anseios. A figura da família, sugerida por Cristo,
aponta para o ideal da comunidade dos santos: os'irmãos
reunidos em torno do Pai.
A segunda reflexão nos leva para o sentido
extensivo que Jesus deu à sua relação com o Pai. Bem
poderia ter orado assim: "Meu PaL" Nada o impediria. A

99
comunhão no ser trinitário de Deus lhe garantiria plena
liberdade para tanto. Mas, ao proferir "Pai Nosso", estava
determinando, em definitivo, os laços da comunidade dos
discípulos. Deus não era, apenas, seu Pai, mas Pai de
quem seguisse os seus passos.
É significativo na liturgia do culto, e mais ainda, na
liturgia da vida, orarmos juntos a oração que Cristo nos
ensinou. Por ela nos reconhecemos como a família de
Deus. A única que ele tem. Nossas divergências e
desavenças, necessariamente, caem por terra, quando o
Pai Nosso é orado. Ninguém pode orá-lo imaginando-se
melhor que outrem, um filho mais privilegiado, alguém que
se posiciona acima dos seus irmãos. A oração do Pai
Nosso nos qualifica como comunhão dos santos.

ORAR PELO QUÊ?


"Rogo-te que me faças saber qual o teu caminho, e
conhecer-te-ei, para que ache graça aos teus olhos; e
atenta que esta nação é o teu pOVO."12
Comentando a passagem acima, L1oyd-Jones afirma
que Moisés orou por um senso de segurança pessoal-
queria um conhecimento direto de Deus, orou por poder
- queria a presença pessoal do Senhor, e orou por uma
autenticação especial para a sua missão - queria que as
nações soubessem que Israel era o povo de Deus. 13 Num
certo sentido é isto que devemos estar sempre rogando
diante de Deus.
Precisamos saber mais a respeito do Senhor. Nosso
conhecimento de Deus é tão precário. Muitas vezes, o
conhecimento fica num plano extremamente teórico. Não
se trata de um conhecimento experimental, algo que toma
conta da gente. Temos dificuldade de testemunhar a nossa

100

I ;
fé, não por não conhecermos o que a fé professa ou o que
diz a Bíblia, mas por que o que sabemos acerca do Senhor
nos deixa instáveis. Devemos orar por um radical
aprofundamento no conhecimento de Deus em nós e na
igreja.
Também, precisamos orar por poder. Não um poder
banalizado, usado para subverter e tiranizar, mas o poder
do Senhor, marca essencial do Reino de Deus.
"Recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito Santo".14
Deus já derramou seu Espírito. Se há falta de poder, não
se trata de infidelidade divina. Muito provavelmente,
estejamos confiando mais em nós, em nossas técnicas,
do que no poder do Senhor. Nossa oração por poder deve
nos encontrar enfraquecidos em nós mesmos, para que o
poder seja do Senhor. 15
Um último motivo pelo qual orar se constitui na razão
do nosso ministério e chamado. Fomos chamados para ir
às nações levar a mensagem do evangelho. Nossa oração,
portanto, deve se direcionar para a obra de Deus no mundo.
"A oração é um mistério. Deus é Todo Poderoso, contudo
ele deseja nossas orações para consumar sua obra no
mundo. A oração move a mão que fez e que mantém o
universo."16 Orar pelas nações no sentido de sua
evangelização; interceder pelos missionários que lá estão,
e pelos que Deus há de levantar; orar pelos ministérios
diversos da igreja para que todos se direcionem para a
evangelização. Deste modo, a igreja como um todo, em
vida de oração, demonstrará a comunhão de propósitos.
Não desejamos limitar os pedidos de oração. O povo
de Deus tem a liberdade, em seus concertos de oração,
de orar de maneira muito ampla. As preces a favor dos
enfermos, dos enlutados, do bom andamento dos
trabalhos, não ficam absolutamente impedidas de

101
acontecer. Mas os motivos essenciais não podem, jamais,
ser omitidos. E, infelizmente, não é o que vemos. Pedimos
por tudo, menos por aquilo que nos é comum, fundamental
e dá sentido ao nosso ministério e vida.
Devemos motivar o povo de Deus a orar, fechando a
porta do quarto, na privacidade com o Senhor, sem, no
entanto, deixar de encarecer junto à comunidade que
busque o encontro dos irmãos, para, juntos, intercedermos
por causas tão nobres.

1 Atos 2.42.
2 FOSTER, Richard J., op. cit., p. 49.
3 BRUNNER, Emil, op. cit., p. 94.
4 HALLESBY, Ole, Oração, p. 7.
5 Mateus 6.6.
6 Atos 4.24.
7 SOUZA, Ricardo Barbosa de, O caminho do coração, p. 129.
8 Salmo 25.14.
9 KNIGHT, Lida E., Quem é você no corpo de Cristo, p. 208.
10 Ezequiel 22.30.
11 Mateus 6.9-15.
12 Êxodo 33.13.
13 LLOYD-JONES, Martyn, op. cit., p. 178ss.
14 Atos 1.8.
15 2Coríntios 12.9.
16 JOHNSTONE, Patrick J., Batalha mundial, p. 11.

102
CAPíTULO X

CHAMANDO ,
OUTROS ,.A
COMUNHAO
(COMUNItÃO E EVANGelizAÇÃO)

Temos tratado a respeito da comunhão dos santos,


ou seja, a respeito da igreja. Através do desenvolvimento
dos assuntos, vimos a comunidade de Cristo em vários
aspectos: liderança, ensino, ação social, oração etc. Em
tudo isso demonstramos a importância da comunhão como
sinal marcante da vida da igreja. No último aspecto, é
nosso propósito estender o desafio da comunhão a toda
a humanidade, a partir da própria igreja. "Não é possível
que o maior alvo da Igreja seja o crente como indivíduo;
Deus deseja toda a humanidade para si."1 A Igreja não
existe para si, se não para o serviço de Deus no mundo.
Todos os elogios que possamos prestar à realidade da
comunhão dos santos, de sua vida harmônica, de seu
ambiente fraterno, perderão o significado se a vida da
comunidade não se dirigir para alcançar a todo homem.
Podemos afirmar, num sentido bem amplo, que a
igreja não tem razão de ser, apenas, para si mesma. Ao

103
contrário, ela deve direcionar o seu olhar para os outros,
porque toda a humanidade deve estar na igreja. Neste
ponto, Engen indaga: "Se a igreja é para todos, por que
nem todos estão na igreja?"2 A resposta deverá ser
buscada no atendimento ao desafio evangelizador feito à
igreja. Sua missão é proclamar o evangelho da graça de
Deus a todos os homens. Boa parte da humanidade não
se encontra na igreja porque ela tem falhado em seu papel
evangelizador.

A Igreja existe, portanto, para cumprir duas funções fundamen-


tais - a evangelização (fazer discípulos) e a edificação (ensi-
nar-lhes). Por sua vez, essas duas funções respondem a duas
perguntas - primeira: "Por que a igreja existe no mundo?" e
segunda: "Por que a igreja existe como comunidade
congregada?"3

A colocação acima nos remete diretamente à íntima


afinidade que existe entre comunhão e evangelização. A
igreja está inserida no contexto do mundo justamente para
proclamar o evangelho da graça de Deus aos homens. A
militância da igreja que aguarda sua condição de triunfo
se dá neste contexto. Essa expectativa da igreja triunfante
em meio à sua existência no mundo propõe-lhe o desafio
evangelístico. Não fosse a proclamação de que foi
incumbida, e a igreja já poderia ter deixado a vivência
terrena para ir gozar as mansões celestiais. No entanto,
prevalece a condição original: a igreja permanece no
mundo.
De outro lado, ela fica no mundo como comunidade
congregada, demonstrando à humanidade as
características vivenciais do reino de Deus. Através de sua
estrutura e conteúdo ela pode apresentar-se ao mundo
como a alternativa de vida, convocando a todo homem a
participar da comunhão dos santos. De certa forma, temos

104
tanto uma comunhão evangelizadora, como uma
evangelização que traz à comunhão. Vejamos isto em
alguns tópicos.

PROCLAMANDO O EVANGELHO

Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo
de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as
virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravi-
lhosa luz. 4

Atentemos para o fato de que Pedro não se referiu à


igreja como um povo, uma nação, uma raça. A igreja é o
povo, é a nação, é a raça, que congrega todos os povos,
todas as nações, todas as raças. Ela não se dimensiona
pela geografia dos homens, não se limita pelos estatutos
que classificam os indivíduos em privilegiados e
desfavorecidos. A igreja, de uma maneira encantadora,
ultrapassada todas as barreiras e se estabelece como a
única opção de unidade de todos os homens.
A universalidade da igreja fica mais patente, ainda,
na expressão paulina: "Não pode haver judeu nem grego;
escravo nem liberto; homem nem mulher; porque todos vós
sois um em Cristo."5 O apóstolo João, também, inúmeras
vezes se refere a esta condição internacional da igreja:
"Digno és de tomar o livro e de abrir-lhe os selos, porque
foste morto e com o teu sangue compraste para Deus os
que procedem de toda tribo, língua, povo e nação."6 A
igreja se estabelece como o povo capaz de atrair para si,
independentemente de sua condição social, religiosa,
moral, nacional, todo o ser humano, tornando-o parte da
comunhão dos santos.
A finalidade da igreja é a proclamação do evangelho:
"A fim de proclamardes..." A evangelização foi dada à igreja

105
como tarefa intransferível. Não pode ela delegar ou
postergar o desempenho de sua missão. Mais ainda, caso
ela se ache desinteressada no cumprimento do seu dever,
permanece sobre ela agrave suspeita de sua razão de
ser.
A respeito da proclamação, assim se expressa
Padilla:

A proclamação do evangelho marca o kairós, o tempo determi-


nado por Deus para dar cumprimento a seu propósito. Chegou
a hora decisiva da história da salvação! A esperança dos profe-
tas está se realizando. O conteúdo do evangelho não é uma
nova teologia ou um novo ensinamento acerca de Deus, mas
um evento: a vinda do reino. A proclamação do evangelho é
inseparável do chamado ao arrependimento e à fé. Pelo fato de
Deus já estar atuando, convida-se os homens a deixar o peca-
do e voltarem-se para ele. Sem arrependimento e fé não pode
haver participação nas bênçãos da nova era. 7

Proclamar o evangelho é anunciar aos homens o


senhorio de Deus sobre a vida e o universo, ou seja o reino
de Deus. Deus reina, ele é senhor de tudo. Reconhecer
este domínio implica em submeter-se pessoalmente ao
desígnio divino. A aceitação do evangelho anunciado vai
exigir do homem o arrependimento de seus pecados, de
sua maneira desviante de viver a vida fora da vontade de
Deus, recebendo, assim, o perdão de Deus. Nisto se
constitui a mensagem feliz, a boa notícia, as boas novas.
Deus aceita o pecador e age de maneira transformadora
na vida dele.
Essencialmente, evangelizar significa anunciar o
grande amor de Deus. "A evangelização não deve ser
entendida em termos de resultados, mas simplesmente
anunciaras boas novas. na É muito comum em nosso tempo
avaliar o alcance da evangelização pela sua somatária

106
numérica. A evangelização só tem lugar quando se pode
numerar e catalogar os decididos, pensam muitos
evangelizadores. Na verdade, o alcance dos resultados da
proclamação do evangelho não pode ser mensurado. Mas
o conteúdo da mensagem, este sim, deve sempre ser
examinado. Temos realmente proclamado o evangelho?
Ou temos ido até os homens apenas com nossa tradição
e preconceito?9
A igreja, que é o povo capaz de congregar todos os
povos, tem por missão precípua proclamar o evangelho
da graça de Deus. E seu anúncio é feito enquanto
comunidade dos irmãos, família da fé, em ambiente
fraternal.

APROXIMANDO OS POVOS

Cristo é a nossa paz, o qual de ambos fez um; tendo derribado


a parede da separação que estava no meio, a inimizade [...]
vindo evangelizou paz a vós outros que estáveis longe e paz
também aos que estavam perto. 10

Algumas expressões merecem destaque nesta


porção bíblica. A primeira delas é "um", "um corpo". A igreja
é o corpo de Cristo. Um só corpo. A grande avalanche de
denominações que se apresenta no mundo não pode nos
levar a pensar que Cristo tem muitos corpos. Cristo tem
uma única igreja. Alguns grupos denominacionais, com o
propósito de ver prevalecer a visão de um único corpo de
Cristo, atribuem a si mesmos a condição de única igreja
do Senhor. Certamente não nos referimos a esta atitude
pretensiosa. Graças a Deus que a sua igreja ultrapassa
todas as limitações da precariedade humana.
Em segundo lugar, chamam-nos a atenção as
palavras "perto" e "longe". O apóstolo Paulo está se

107
referindo a judeus (perto das promessas) e gentios (longe
das promessas). Curioso é que o chamado é feito a ambos.
Não imaginemos que quem se encontra perto já tenha
tomado posse das promessas. Está perto mas, tanto
quanto quem se acha longe, ainda não recebeu a
concretização das promessas. O ministério da igreja é
aproximar os de perto e os de longe no corpo de Cristo.
Ainda, mais uma expressão significativa:
"Evangelizou paz." A mensagem que aproxima é a
mensagem da paz. Já nos referimos à amplitude desta
paz: paz com Deus, paz com os homens, paz consigo
mesmo. Mas, aqui, vemos a verdade da paz no âmbito de
toda a humanidade: gentios e judeus, gregos e bárbaros,
homens e mulheres, pobres e ricos, a todos é proclamada
uma mensagem que os torna semelhantes, carecidos da
mesma bênção. A paz que é o próprio Senhor Jesus.
O ministério evangelizador da igreja se direciona aos
distanciados, aos afastados, aos marginalizados, que são,
pela mensagem do evangelho, aproximados uns dos
outros. Ficam juntos e unidos no mesmo corpo, a igreja de
Cristo. Vivem a harmonia do Espírito de Deus, em função
da mensagem da paz que lhes foi anunciada. A igreja
assume, assim, o papel de ponte entre os homens.
Essencialmente, a ponte é o próprio Cristo, ou o evangelho
que proclama a Cristo. Mas a igreja é ponte no sentido de
ser a proclamadora da graça de Deus que aproxima a
todos. A mensagem que ela anuncia une duas margens
intransponíveis.

PROVOCANDO A ATENÇÃO

Que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti,


também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me

108
enviaste. [...] Eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aper-
feiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me
enviaste e os amaste, como também amaste a mim. 11

Em sua oração sacerdotal, Cristo vinculou de maneira


muito íntima a comunhão e unidade do povo de Deus com
o ministério da evangelização. Em duas ocasiões, aqui,
Cristo se refere ao conhecimento do evangelho por parte
do mundo, em função do testemunho de amor vivido pela
comunidade.
Ora, o evangelho recebido no coração não somente
transforma o indivíduo, mas constitui a comunidade dos
remidos. Assim, cada neo-converso já é colocado, pelo
Espírito de Deus, no seio da igreja. Não nos referimos à
adesão formal, por meio do batismo, apenas ao fato de
estar encaixado no corpo de Cristo.
Assim, o que o mundo irá ver quando lhe for anunciado
a respeito do amor de Deus não será nenhuma forma de
religião ou oferecimento de doutrina, mas a vida da
comunidade. Em outras palavras, aquele que não conhece
o evangelho não será atraído propriamente pela fiel e bem
colocada exposição do pensamento teológico, mas sim,
pela maneira como vivem os santos.
É preciso velar por isso, para que não sejamos,
porventura, surpreendidos em nosso testemunho como
igreja, que, ao invés de atrair, espanta. "Quanto mais
divididos estivermos, mais ineficazes seremos em dar a
resposta da esperança que temos em Jesus Cristo."12 As
pessoas não crentes olharão para nós e nos verão muito
assemelhados a elas mesmas, cheios de mazelas e
malquerências, desafeições e partidarismos. E vão
indagar: que vantagem traz o evangelho à vida do homem
e da própria sociedade? Não produz uma comunidade
unida e voltada para um objetivo comum?

109
Cristo apela para o modelo de comunhão e unidade
existente entre o Pai e o Filho. Ao ardorosamente
defendermos a doutrina da Trindade, devemos fazê-lo no
bojo das implicações que isto traz para a eclesiologia e
para a missiologia. A igreja se espelha no ser do trino Deus
para realizar a sua missão neste mundo.

PROVOCANDO O ESTíMULO

Quero, ainda, cientificar-vos de que as coisas que me aconte-


ceram têm, antes, contribuído para o progresso do evangelho,
(...] e a maioria dos irmãos, estimulados no Senhor por minhas
algemas, ousam falar com mais desassombro a palavra de
Deus. 13

o que desejamos demonstrar nesta exposição é a


associação existente entre evangelização - tarefa que foi
confiada à igreja - e comunhão, a vida que a igreja deve
revelar. O depoimento que nos é oferecido pelo apóstolo
Paulo, mais uma vez, revela este estreitamento.
O progresso do evangelho acontecia na medida em
que este servo de Deus, com ousadia, proclamava a
Palavra de Deus. Ele, mesmo estando preso, não deixava
de anunciar a salvação em Cristo. Assim, sua prisão se
transformou em oportunidade evangelística. Não foi sem
motivo que se achava preso em cadeias.
Mas o evangelho, também, alcançou maior espaço
porque a comunidade se sentiu motivada a evangelizar a
partir do testemunho do apóstolo Paulo. Se o apóstolo,
estando preso, prestava esta contribuição inestimável à
causa, por que eles, livres, não poderiam muito fazer pela
evangelização?
Chama-nos a atenção a expressão "a maioria dos
irmãos". Como precisamos deste envolvimento abrangente

110
da comunidade! Geralmente, em nossas igrejas locais,
vemos um grupo muito diminuto compromissado com a
evangelização. No entendimento de boa parte da igreja,
esta é uma tarefa para alguns especialistas, e não um
comissionamento para toda a igreja. "Algumas igrejas
praticam o método denominado 'nada'. Este método tem
sido ensinado em algumas escolas teológicas, e equipa a
igreja para não fazer nada em relação a missões."14
Como se vê, o desinteresse na questão começa na
própria liderança e na formação teológica. Constatou-se,
inclusive, o pouco interesse dos seminários na formação
dos seus acadêmicos quanto às matérias missiológicas e
evangelísticas. Trata-se de uma profunda distorção, uma
vez que a igreja existe para proclamar o evangelho. A
doutrinação é decorrente da evangelização, e não o
contrário. Afinal, só se pode doutrinar quem já foi
evangelizado.
O desafio deixado pelos filipenses vai na direção de
um crescente envolvimento da comunidade no ministério
da evangelização. Os métodos irão variar. Cada qual irá
emprestar o seu dom e talento à obra. Mas a participação
integral da comunidade trará um resultado expressivo para
o próprio incremento da comunhão. É bom que se diga
que gente nova na igreja representa um estímulo aos laços
fraternais. Igrejas acostumadas a verem um crescimento
imperceptível tendem a fossilizar as suas relações internas.
É mister um "sangue novo" a correr nas veias da
comunidade.

MOTIVANDO O DESLOCAMENTO

Espero mandar-vos Timóteo. [...] Julguei necessário mandar até


vós Epafrodito.15

111
oapóstolo Paulo achava-se em prisão quando
remete Epafrodito e diz ter a intenção de enviar Timóteo.
Certamente não era um momento em que ele se sentisse
muito resguardado e em condições de abrir mão de
companhias tão prestimosas. No entanto, sua visão do
reino o levou a incentivar o deslocamento de seus
companheiros de ministério.
Esta é uma questão que devemos examinar no nível
do comissionamento missionário em nossas igrejas,
mormente no que tange a obreiros especializados, mas
não menos no que respeita aos crentes em geral. Temos
falado sobre a importância de querer estar juntos como
fator para o crescimento da igreja. As pessoas atravessam
muitos quilômetros para se encontrarem e adorarem juntos
a Deus. Mas em algumas situações é preciso perceber o
chamado de Deus para não mais congregarmos aqui ou
ali, mas irmos mais adiante onde o Senhor deseja que
realizemos o nosso ministério para o incremento do reino.
A visão do deslocamento deve ser oferecida pela
própria liderança. Os pastores precisam motivar seus fiéis
a deixarem a rica comunhão daqueles amados irmãos com
quem sempre convivem para irem buscar outros para o
reino de Deus. Quando a liderança não direciona o povo
para este desafio, o Senhor se encarrega de desalojar o
seu povo. Muitos pastores temem perder algumas famílias
que irão mudar-se. Chegam a propor algum tipo de
impedimento. "O pastor que teme 'perder' um casal, é
alguém que não tem o reino de Deus em vista, mas apenas
a 'sua' igreja."16
E o curioso é que tal deslocamento não impede que
a comunhão se aprofunde. Se o impedimento geográfico
nos afasta da amada comunidade, o ardor missionário nos
aproxima de maneira muito íntima da família da fé. Do

112
contrario, como entenderiamos a vida e ministêrio dos
missionarios que se dispbe a atravessar os oceanos para
evangelizar outros povos? Vao, atendendo ao apelo do
Espirito, a vocacäo de Deus, mas, tambèrn, na certeza que
estarao na comunhäo mais intima do povo de Deus.

1 Hendrikus Berkhof in ENGEN, Charles van, Povo missionârio, povo de


Deus, p. 52.
2 ENGEN, Charles van, op. cit., p. 69.
3 GETZ, Gene, op. cit., p. 55.
4 1Pedro 2.9.
5 Galatas 3.28.
6 Apocalipse 5.9.
7 PADILLA, Rene, Missäo integral, p. 77.
8 John R. W. Stott in STEUERNAGEL, Valdir, op. cit., p. 63.
9 Sidney Roy in STEUERNAGEL, Valdir, No princfpio era o Verbo, p. 249.
10 Efesios 2.14,17.
11 Joao 17.21,23.
12 Felip Adolf in STEUERNAGEL, Valdir, E o Verbo se fez came, p. 181.
13 Filipenses 1.12,14.
14 Edison Queirez in HORRELL, J. Scott., op. cit., p. 141.
15 Filipenses 2.19,25.
16 Ary Velloso in HORRELL, J. Scott., op. cit., p. 115.

113
CONCLUSÃO

o CRESCIMENTO
DA IGREJA

Acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia os que iam sendo sal-


vos. [...] A igreja crescia em número. 1

o que é importante: crescimento qualitativo ou


crescimento quantitativo? Quem está à frente de uma igreja
que cresce muito, se, porventura, descuidar da qualidade,
vai justificar-se com os seus números e, evidentemente,
com a misericórdia de Deus. No entanto, quem não está
vendo seu rol de membros crescer, vai assumir a posição
do crescimento qualitativo: "Não temos muita gente, mas
a gente que temos é de qualidade."
Há um equívoco de origem nesta maneira de ver as
coisas. Qualidade e quantidade caminham juntas. Se algo
é bom, será procurado. Se é duvidoso, será esquecido. E
mesmo quem consegue atrair multidões, sem apresentar
qualidade, não fará isso por muito tempo.
Quando nos referimos à quantidade, pensamos no
crescimento numérico. Quando falamos de qualidade,
pensamos no crescimento espiritual, ou seja, no
conhecimento de Deus e sua doutrina. Mas é preciso .
acrescentar um terceiro elemento que medeia a relação

115
qualidade/quantidade e promove a necessana
intercessão. Chamamos este elemento de "crescimento
em comunidade", ou seja, crescimento na comunhão dos
filhos de Deus. O crescimento equilibrado buscado por
todos deve primar pela harmonia entre qualidade -
comunidade - quantidade.
Se a intimidade dos crentes com Deus não encontra
eco em suas relações interpessoais, vai haver
desequilíbrio. Por outro lado, uma igreja onde as relações
humanas são muito intensas, porém, sem o embasamento
espiritual necessário, poderemos estar diante de um mero
clube religioso. Mas ainda, se intensa espiritualidade e
profundidade de comunhão não se refletirem em
incremento numérico, estaremos novamente diante de um
desequilíbrio. Buscamos ser igreja equilibrada, mas que
cresça. Buscamos ser igreja em crescimento, porém com
um crescimento equilibrado.
Ao longo de toda a nossa exposição estivemos nos
detendo, apenas, no tema da comunhão, ou seja, falamos a
respeito do crescimento comunitário, das relações fraternais.
Discorremos sobre isso com o objetivo de despertar a
discussão concernente ao crescimento da igreja no mundo
que não leva em consideração a importância das relações
comunitárias como fator de integração e incremento dela.
Mais do que isso: nosso interesse foi demonstrar que um
crescimento numérico precisa estar respaldado no
crescimento comunitário. Do contrário, poderemos ter
muitas pessoas assistindo às reuniões da igreja, sem, no
entanto, estarem seguramente integradas.
Não podemos, falando a respeito do crescimento da
igreja, esquecer das igrejas que mais crescem,
presentemente, no mundo, e que têm se tornado um
modelo a ser seguido em outras partes. Nos referimos às

116
igrejas evangélicas da Coréia do Sul. 2 À noite, na cidade
de Seul, capital da Coréia do Sul, podemos vislumbrar um
cenário fabuloso; as milhares de cruzes iluminadas se
destacam em toda a região, cada uma delas
testemunhando a existência de uma igreja no local. Em
Seul iremos encontrar mais de 10.000 Igrejas locais e, em
toda a Coréia, quase 50.000 Igrejas, perfazendo um total
de 10 a 12 milhões de crentes naquele país, para uma
população de 45 milhões de habitantes (em torno de 20%
da população).
A maioria (90%) corresponde a pequenas igrejas,
com até 200 membros. Cerca de 8% corresponde a igrejas
médias e grandes, com até 1.000 membros. No entanto, é
a parcela restante (2%) que se transformou no charme
coreano. Trata-se das igrejas com 2, 5, 10, 50 mil membros,
e a maior igreja do mundo, com 700 mil membros. 3 A
tentação de quem visita a Coréia é imaginar que todas as
50.000 igrejas estão nesta categoria. Na verdade, apenas,
1.000 igrejas superam os 1.000 membros e, apenas, uma
centena de igrejas podem ser consideradas mega-igrejas.
O que nos chama a atenção é que, quer nas mega-
igrejas, quer nas igrejas intermediárias ou pequenas, em
todas elas subsiste um princípio fundamental de crescimento
na base. Ou seja, a igreja não cresceu, e tornou-se grande,
porque concentrou-se nos encontros das multidões, mas
porque investiu nas relações comunitárias, nas relações
pessoais, no crescimento de cada membro, através do
conhecimento de Deus e no relacionamento com os irmãos.
O que é conhecido como movimento de "células
familiares" ou "grupos nos lares" ou "núcleos de famílias"
ganhou impulso na igreja coreana. A igreja pode ser muito
grande, porém ela se acha sUstentada em sua base familiar.
As células são pequenos grupos de pessoas que

117
representam a sua família e que se encontram com certa
regularidade para estudo da Palavra de Deus, oração,
evangelização e comunhão. É a porta de entrada da igreja.
Os núcleos se formam pelas relações que os
membros da igreja têm com amigos, parentes, colegas ou
vizinhos. A amizade é de fundamental importância para a
evangelização. Uma proclamação da Palavra
desconectada de uma relação amistosa pode degenerar
em mero proselitismo. O elo de relações pessoais que
temos deve nos motivar a levar a Palavra de Deus aos
nossos amigos.
A célula se constitui numa igreja em miniatura. Ali
acontece o que deve acontecer na igreja, com uma
vantagem impressionante: todos fazem parte, todos têm
algo a dizer e a cooperar, todos são lembrados. Não
precisamos estar numa igreja muito grande para
percebermos o quanto muitas pessoas ficam esquecidas
e sentem-se sem razão de ser no grupo. Por isso, os grupos
internos da igreja que congregam mulheres, ou jovens, ou
adolescentes, ou pessoas ligadas à música, colaboram
no sentido de dar espaço e reconhecimento a todos. "Os
grupos familiares dão a cada membro da igreja a
oportunidade de participar do ministério de sua Igreja e
de trazer o reavivamento à sua própria vizinhança."4
É bom lembrar que pesa, no presente, também, uma
séria crítica à igreja evangélica na Coréia por deixar-se
enredar por uma certa megalomania e competitividade
entre grandes igrejas. A igreja cresceu porque a sua base
era sólida, não porque tivesse templos majestosos, ou
pregadores virtuosos.
.Da igreja coreana retiramos a importância conferida.
às relações comunitárias para o crescimento da igreja.

118
Uma igreja só pode crescer quando os seus membros são
conhecidos e reconhecidos uns dos outros. Igreja que
cresce é aquela que se sustenta em sua célula básica.
"Deus, sendo amor, só pode ser testemunhado e
experimentado em uma congregação pequena o bastante
para que os membros se conheçam e se aceitem uns aos
outros assim como são aceitos por Cristo."5
Desejamos concluir nosso trabalho destacando
alguns pontos:
1) A comunhão entre os membros da igreja e destes
com Deus é um anseio divino. Deus não nos constituiu
como seu povo para simplesmente recitarmos um credo
ou vivenciarmos uma religião, mas para vivermos pela fé,
em amor, uns com outros.
2) As lideranças da igreja precisam estar cônscias
desta verdade, a fim de conduzirem os membros nesta
diretriz, ensinando-lhes o que a Palavra de Deus diz a este
respeito, desde a criação até à consumação.
3) Os membros da igreja devem envolver-se uns com
os outros, em termos de ministérios diversos, atendendo
às múltiplas necessidades que surgirem, quer de cunho
assistencial, psicológico, moral, econômico etc.
4) A comunhão experimentada no seio da igreja será
um fator tremendo de atração de outras pessoas, tornando
o ministério de evangelização da igreja extremamente
eficiente e, como resultado disto, o crescimento numérico
também.

1 Atos 2.47; 9.31.


2 Em abril de 1997, o autor teve a oportunidade de visitar as igrejas
evangélicas da Coréia do. Sul.
3 Yoído Full Gospel Church, do Rev. David Yonggi Cho.
4 CHO, Paul Yonggi, Grupos familiares e o crescimento da igreja, p. 4.
5 David Roozen in ENGEN, Charles van, op. cit., p. 38.

119
120
REFERÊNCIAS
,
BI BLIOGRAFICAS

ALVES, Rubem, Pai Nosso - meditações. São


Paulo, CEDI, 1987.
BAILEY, Kenneth, A poesia e o camponês. São
Paulo, Edições Vida Nova, 1985.
BARCLAY, William, Letters to Philippians,
Colossians, Thessalonians. Edimburgo, Saint Andrew
Press, 1974.
- - Letters of James and Peter. Edimburgo, The
Saint Andrew Press, 1975.
- - Palabras griegas dei Nuevo Testamento.
Buenos Aires: Casa Bautista de Publicaciones, 1977.
BARTH, Karl, Introdução à teologia evangélica. São
Leopoldo, Editora Sinodal, 1977.
BERKHOF, Luis, Sumário de doutrina cristã. Grand
Rapids, TELL, 1986.
BETTENSON, Henry, Documentos da igreja cristã.
São Paulo, ASTE, 1967.
BíBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo, Edições
Paulinas, 1981.
BITTLlNGER, Arnold, Dons e ministérios. São Paulo,
Edições Paulinas, 1977.
BLAUW, Johannes, A natureza missionária da igreja.
São Paulo, ASTE, 1966.

121
BOFF, Clodovis, Comunidade eclesial -
comunidade política. Petrópolis, Editora Vozes, 1978.
BOFF, Leonardo, América Latina - da conquista à
nova evangelização. São Paulo, Editora Ática, 1992.
- - E a igreja se fez povo. Petrópolis, Editora Vozes,
1991.
BONHOEFFER, Dietrich, The cost of discipleship.
Londres, SCM Press, 1959.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues, Os deuses do povo.
Rio de Janeiro, Editora Brasiliense, 1986.
BROWN, Colin (ed.), O novo dicionário internacional
de teologia do Novo Testamento. São Paulo, Edições
Vida Nova, 1981.
BRUNNER, Emil, Justice and social order. Nova
York,Harper and Brothers, 1945.
- - Nossa fé. São Leopoldo, Editora Sinodal, 1978.
CALVINO, João, As Institutas. São Paulo, Casa
Editora Presbiteriana, 1985.
- - Comentários e las epistolas pastorales de san
Pablo. Grand Rapids, TELL, 1948.
- - Epistola a los Hebreos. Grand Rapids,
Subcomision de Literatura Cristiana de la Iglesia
Reformada, 1977.
CARRIKER, Timóteo, Missão integral - uma
teologia bíblica. São Paulo, Editora Sepal, 1992.
- - Missões e a igreja brasileira. São Paulo, Mundo
Cristão, 1993.
CHAMPLlN, Russell Norman, O Novo Testamento
interpretado. Guaratinguetá, A Voz Bíblica, 1977.

122
CHAUí, Marilena, Conformismo e resistência. São
Paulo, Editora Brasiliense, 1994.
CHO, Paul Yonggi, Grupos familiares e o
crescimento da igreja. Miami, Editora Vida, 1983.
COLEMAN, Robert, A chegada do avivamento
mundial. Rio de Janeiro, CPAD, 1996.
CULLMANN, Oscar, The Early Church. Londres,
SCM Press, 1956.
D'ARAÚJO FILHO, Caio Fábio, Novos ministros para
uma nova realidade. Brasília: Editora Sião, 1987.
DECLARAÇÃO de Quito, Boletim Teológico, Ano 6,
nº 19,dez. 92, p. 69.
DIAS, Zwínglio M., Discussão sobre a igreja.
Petrópolis, Editora Vozes (199-)
DOUGLAS, J. O., O novo dicionário da Bíblia. São
Paulo, Edições Vida Nova, 1983.
0000, C. H., A mensagem de são Paulo para o
homem de hoje. São Paulo, Edições Paulinas, 1978.
EMRICH, Oswaldo Soeiro, Histórico da Igreja
Presbiteriana de Curitiba. Histórico Particular.
ENGEN, Charles Van, Povo missionário -povo de
Deus. São Paulo, Edições Vida Nova, 1996.
ESCOBAR, Samuel (et. al.), Tive fome. São Paulo,
ABU Editora, 1989.
FERREIRA, Júlio Andrade, Conheça sua Bíblia.
Campinas, Livraria Cristã Unida, 1977.
- - Conheça sua fé. Campinas, Livraria Cristã
Unida, 1967.

123
FERREIRA, Wilson Castro, Calvino: vida, influência
e teologia. Campinas, Luz Para o Caminho, 1985.
- - Esboço de teologia bíblica. Campinas, Luz Para
9 Caminho, 1985.
FOSTER, Richard J., Celebração da disciplina,
Deerfield, Editora Vida, 1983.
- - Dinheiro, sexo e poder. São Paulo, Mundo
Cristão, 1985.
FRANKL, Viktor E., Em busca de sentido. São
Leopoldo, Editora Sinodal, 1985.
FROMM, Erich, O medo à liberdade. Rio de Janeiro,
Zahar Editores, 1964.
GARDNER, F. C., Fé bíblica e ética social. São
Paulo, ASTE, 1965.
GETZ, Gene, A medida de um homem espiritual.
São Paulo, Imprensa da Fé, 1977.
- - Igreja - forma e essência. São Paulo, Edições
Vida Nova, 1994.
GIRDLESTONE, Robert B., Synonyms of the Old
Testament. Grand Rapids: Eerdmans, 1981.
GUTIÉRREZ, Benjamim, e CAMPOS, Leonildo S., Na
força do Espírito. São Paulo, Pendão Real, 1996.
HALVERSON, Marvin; e COHEN, Arthur (eds.), A
handbook of Christian theology. Londres, Fontana Books,
1960.
HAMMER, Michael, e CHAMPY, James,
Reengenharia - revolucionando a Empresa. Rio de
Janeiro, Editora Campus, 1994.
HENDRIKSEN, William, Efésios. São Paulo, Casa
Editora Presbiteriana, 1992.

124
- - Filipenses. São Paulo, Casa Editora
Presbiteriana, 1992.
HORRELL, J. Scott (ed.), Ultrapassando barreiras:
igrejas inovadoras e métodos bíblicos. São Paulo, Edições
Vida Nova, 1995.
JEREMIAS, Joachim, O Pai-Nosso - a oração do
Senhor. São Paulo, Edições Paulinas, 1986.
JOHNSTONE, P. J., Batalha mundial. São Paulo,
Edições Vida Nova, 1981.
KAISER JR., Walter C., Teologia do Antigo
Testamento. São Paulo, Edições Vida Nova, 1978.
KITTEL, Gerhard, A igreja no Novo Testamento. São
Paulo, ASTE, 1965.
KNIGHT, Lida E., Quem é você no corpo de Cristo?
°
Campinas, Luz Para Caminho, 1994.
L1NTHICUM, Robert C., Revitalizando a igreja. São
Paulo, Editora Bompastor, 1996.
LLOYD-JONES, Martyn, A base da unidade cristã.
São Paulo, Casa da Bíblia, 1962.
--Avivamento. São Paulo, PES, 1992.
MANSON, T. W., O ensino de Jesus. São Paulo,
ASTE,1965.
MARCONDES Filho, Juarez, Igreja Presbiteriana de
Curitiba - comunidade viva. Curitiba, não editado, 1995.
- - Missão integral - mito e realidade. Curitiba,
não editado, 1995.
- - O ministério do povo de Deus. Curitiba, não
editado, 1996.

125
-- o ministério dos santos e o crescimento da
igreja. Curitiba, não editado, 1996.
- - O padrão bíblico do avivamento. Curitiba, não
editado, 1997.
MARTINS, José Cássio, "O inconsciente - nosso
íntimo desconhecido", in Revista Teológica SPS.
Campinas, 1993.
MESTERS, Carlos, Deus, onde estás? Belo
Horizonte, Editora Veja, 1976.
MOLTAN, W. F., A concordance of the Greek
Testament. Edimburgo, T and T Clark, 1974.
MOLTMANN, Jurgen, La iglesia - fuerza deI Espiritu.
Salamanca, Sigueme, 1978.
MONDIN, Batista, O homem, quem é ele? São Paulo,
Edições Paulinas, 1980.
NIEBUHR, H. Richard, Cristo e cultura. Rio de
Janeiro, Editora Paz e Terra, 1967.
ORTIZ, Juan Carlos, O discípulo. Belo Horizonte,
Editora Betânia, 1976.
PACTO de Lausanne, Para que o mundo ouça a sua
voz. Documento de Lausane, 1974.
PADILLA, C. René, Missão integral. São Paulo,
Temática Publicações, 1992.
POTT, Jerónimo, EI mensaje de los Profetas
Menores. Grand Rapids, Subcomision de Literatura
Cristiana de la Iglesia Cristiana Reformada, 1977.
PREFEITURA Municipal de Curitiba, Secretaria
Municipal de Cultura, Pioneiros da evangelização
presbiteriana. no Paraná. Boletim Informativo da Casa
Romário Martins, Curitiba, vol XV, nº 81, jun 88.

126
RHEE, Kwang-Sun, The principIes of church growth
in Korean context. Seul, Shinil Presbyterian Church, 1993.
ROTTMANN, Johannes H., Atos dos Apóstolos no
contexto do século xx. Porto Alegre, Concórdia, 1979.
SANTA ANA, Julio de, Pão, vinho e amizade. Rio de
Janeiro, CEDI, 1986.
SCHUBERT, Kurt, Os partidos religiosos hebraicos
da época neotestamentária. São Paulo, Edições Paulinas,
1979.
SEEBERG, Reinhold, Manual de historia de las
doctrinas. Buenos Aires, Casa Bautista de Publicaciones,
1967.
SOUZA, Ricardo Barbosa de, O caminho do
coração. Curitiba, Encontro Publicações, 1996.
STEDMAN, Ray C., A dinâmica da vida autêntica.
São Paulo,Sepal Editora, 1975.
STEUERNAGEL, Valdir (ed.), A serviço do reino.
Belo Horizonte, Missão Editora, 1992.
- - E o Verbo se fez carne. Curitiba, Encontrão
Editora, 1995.
- - No princípio era o Verbo. Curitiba, Encontrão
Editora, 1994.
STOTT, John R. W., Contracultura cristã. São Paulo,
ABU Editora, 1981.
- - Evangelização e responsabilidade social. São
Paulo, ABU, 1982.
TILLlCH, Paul, Dinâmica da fé. São Leopoldo, Editora
Sinodal, 1974.
TIPPETT, Alan R., A Palavra de Deus e o crescimento
da igreja. São Paulo, Edições Vida Nova, 1983.

127
TROTMAN, Dawson, Nascidos para se
multiplicarem. São Paulo, Edições Vida Nova, 1976.
VOS, Geerhardus, Biblical theology. Grand Rapids,
Eerdmans, 1980.
WALTER, Williston, História da igreja cristã. Rio de
Janeiro, JUERP, 1980.
WEINGAERTNER, Martin, Em diálogo com a Bíblia.
Curitiba, Encontrão Editora, 1993.
WRIGHT, G. Emest, Doutrina bíblica do homem na
sociedade. São Paulo, ASTE, 1966.

128

Potrebbero piacerti anche