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B MANDEL

Mao representa, primeiro que tudo, a vitória da terceira revolução


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a subordinar o exército de libertação popular, nascido da guerrilha anti-
japonesa, ao exército dé Tchang Kai-chek, e recusou sacrificar as suble-
vações camponesas nas aras dum governo de coligação com a burguesia. 8
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trariamente à URSSdos anos 40 e 50, as massas não se mostram desmo-
ralizadas nem passivas. A luta enter.burocrática pela sucessão não se deci:
dirá independentementeda intervenção dessas massas. A crise do
ntaoismo encontra-se aberta daqui para diante. Terá o seu desfecho com
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a vitória da revolução política anui-burocrática, com o poder exercido
pelos trabalhadores e camponeses chineses, que consolidará e tornará
irreversíveis as aquisições da grande revolução chinesa.

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A CHINA
ANTES E DEPOIS
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FICHA TÉCNICA

Tíf /a; A China antese depoisde Mao, afmde/, S. W'#, C. Roisi, Ro#sie/, l,em

Traí çZa; A. Castra e M. melena Feneira

Direitos ãe tepfoãação e adaptação desta edição


reservados para todos os países ãe língua portuguesa

l.' edição, Março de 1977


INTRODUÇÃO
Edição n.' 14
E. MANDEL
EDIÇÓESANTÍDOTO
Rua da Beneficência,121- 1.' Dt.
Lisboa4-- Telef. 7692 93
Mao representa,primeiro que tudo, a vitória da terceira revo-
lução chinesa, o derrube do poder da burguesia e dos proprietários
fundiários, a ruptura do cerco da URSS pelos países imperialistas,
a fundamental modificação das relaçõesde forças à escalamundial.
Qualquer que seja a nossa oposição ao regime burocrático que hoje
domina na República Popular da China, devemos, em primeiro lugar,
julgar o papel de Mao na história do 20.' século em função das rela-
ções com as classesfundamentais do mundo contemporâneo.
A vitória da terceira revolução chinesa, de que ele foi o principal
obreiro, é o mais importante acontecimentodo XX.' séculodepois
da revoluçãosocialistade Outubro na Rússia.A China não é um
país qualquer. Tendo sido outrora o país mais avançadoe rico do
mundo, a ingerência do capitalismo estrangeiro a partir do século xlx
bloqueou a sua transacçãopara a formação duma potência imperia-
lista autónoma como a que a$ elas-ses
japonesastinham conseguido
criar «in ex-tremas».
Dezenas de milhões de camponeses e. de artíâces empobrecidos
foram submetidosdurante decéniosa um regime de miséria, de
opressãoe de humilhação cada vez mais insuportável. Sublevaram-se
em vagas sucessivas,desde a revolta dos Tai-Ping até à dos Boxers,
da revoluçãode 1911 até à de 1925/27. Estassublevações
não tive-

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ram saída possível até à aparição dum proletariado suficientemente ticamente proletária, conquanto desta tenha tido o conteúdo histó-
poderoso para pâr a sua candidatura à direcçãopolítica e organizar rico e social: a destruiçãoda poder e da propriedadeburguesa,a
o país, libertar o campesinatodo jugo dos proprietários fundiários destruição do Estado burguês.
e dos usurários; eis o 'que só foi possível pela conquista da hegemonia Mas se Mao não foi nem Lenine nem Estaline, o regime buro-
proletária no seio da revolução chinesa, pelo transcrescimento da crático que erigiu na República Popular da China apresentatraços
revolução democrática burguesa em revolução socialista, pelo esta- comunscom o regime estalinista da URSS: a asfixia da democracia
belecimento da ditadura do proletariado. proletária, a ausênciade gestão das empresasindustriais pelos tra-
A segunda revolução chinesa sofreu uma trágica derrota em 1927 balhadores, a deformação pragmática do marxismo, o culto da per-
porque Estaline impôs ao jovem Partido Comunistaa sua subordi- sonalidadede Mao e os privilégios materiais da burocracia. Explicar
nação política ao Kuomintang burguês de Tchang Kai-chek. estesfenómenosexclusivamentepelo atraso da China, que é eviden-
A terceira revolução chinesa l)âde triunfar porque, a despeito t©mente uma das razões da burocratização, equivale a sub-estimar a
de textos errados como a<<Nova Democracia», Mao se recusou na importância do factor e a dinâmica do movimento das massasna
prática a subordinaro exército de libertaçãopopular, nascido da R. P. da China.
guerrilha antijaponesa,ao exército de Tchang Kai-chek, e recusou É aí que se revela a dimensão verdadeiramente trágica do Mao
sacrificar as subleveçõescamponesasnas aras du'm governo de coli- avelhantado. Inquietou-se com as consequências da burocracia do
gação com a burguesia. A terceira revolução c})mesa levou à criação partido e do país sobre a despolitização das massas, à semelhança
da República popular da China, Estado operário graçasao qual o do que aconteceuna URSS.Colocadoem minoria na direcçãodo
povo chinês se tornou uma grande nação independente no mundo, partido apóso malogrodo«grande salto em frente», dirigiu-se às
arrancada
ao malta-smo
e à fome. Nenhumacontecimento
posterior massaspor cima do aparelho do partido. Assim teve início a Revo-
pode apagar o mérito histórico que pertence a Mao pelo papel-chave lução Cultural, que apresentou traços comuns com a radicalização
que desempenhou na vitória da Revoluçãosocialistana China. da juventude no resto do mundo. Foi desencadeada sob o signo da
A terceira revolução chinesa não foi uma revolução socialista fórmula;«Em última análise, as lições da história resumem-senisto:
«normal». Teve lugar após uma longa e devastadoraguerra do im- «a revolta é justificada». Mas, quando asmobilizaçõesde massatrans-
perialismo japonês contra a China, guerra que arruinou a economia bordavam mais e mais do controle da fmcção maoísta, quando che-
e desagregouo proletariado urbano. Este facto subjectivo, aliado à garam à aparição de tendências oposicionistas de esquerda, quando
deliberada orientação de Mao no sentido de abafar a luta do prole- começaram
a aria-star
os trabalhadores
inclusivamente
na via da
tariado urbano, teve como consequêncianão poder a classeoperária greve,Mao fez contra-vapore procedeu à reunificaçãocom a maioria
representar um papel autónomo no decursoda terceira revolução chi- do aparelho.Os«Guardas Vermelhos»foram disciplinadose repri-
nesa. A direcção do processo revolucionário esteve nas mãos dum midos. A regra passou então a ser: <<todaa revolta é justificada, salvo
PC altamente burocratizado que impediu todo o desenvolvimento a revolta contra o pensamentode Mao Tse-tung.»
dos sovietes e dos conselhosoperários na China. A revolução dlinesa A viragem interior à direita levou a uma ainda mais pronunciada
foi, desde o início, uma revolução burocratizada. Mao não foi nem viragem à direita no plano político externo. Depois de ter censu-
Lenine nem Estalhe, precisamenteporque dirigiu uma revolução rado aos dirigentes -soviéticos a falta de apoio aos movimentos revo-
e não uma contra-revolução,mas também porque a revolução que lucionários e o excesso de concessões ao imperialismo, a direcção
dirigiu não foi, na forma da sua organização,uma revolução auten- maoísta descobriu a existência do«social-mperialismo» na URSS,

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de duas«superpotências»colocadasno mesmoplano, e a seguir des-
cobriu o <<jovem»imperialismo soviético, considerado como o mais
agressivo e portanto o mais perigoso.
Lembremos, por memória, a cínica traição aos movimentos revo-
lucionáriosno Ceilão,no Sudãoe na Etiopa, o apcüoconcedidoao
carrascoiraniano, a mão estendidaüos imperialistas europeus,para
reforçar os seus exércitos contra a URSS.
O Conflito sino-soviético, do qual cabe à burocracia kruchtche-
viana a responsabilidadeprincipal ao suspendera sua ajuda econó-
mica e militar à República Popular da China, e depois a Revolução
Cultural, tinham exercido uma real atracçãosobreparte das novas
vanguardas à escala mundial. O maoismo apareceu, aos olhos dos
partidos comunistas oficiais, como uma alternativa de esquerda e ter-
EVOLUÇÃO E TRAJECTÓRIA
ceiro-mundista,ou até libertária. O fim da RevoluçãoCultural, a
viragem à direita da política externa chinesae a transformaçãodas
DA CHINA POPULAR
organizações maoístas em seitas neo-estalinistas, obscureceram sin,
gularmente esta imagem. Mao morreu no momento em que o maoismo
entrou em declínio à escala internacional.
Mao deixa uma República Popular da China em plena ebulição.
Clontrariamente à URSS dos anos 40 e 50, as massas não se mostram
desmoralizadas nem passivas. A luta interburocrática pela sucessão
não se decidirá independentemente da intervenção dessa-smassas.
A crise do maoismo encontra-seaberta daqui para diante. Terá o
seu desfecho com a vitória da revolução política antiburocrática, com
o poder exercido pelos trabalhadores e camponeseschineses, que
consolidará e tornará irreversíveis as aquisiçõesda grande revolu-
ção chinesa.

Setembro de 1976

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l ORIGENSE EVOLUÇÃO
DA TERCEIRAREVOLUÇÃO CHINESA

E. MANDEL
Dezembrode 1950

l Origem e significado da vitória de Mao Tse-tung


Meio bilião de habitantesnum subcontinentetão vasto como a
Europa(:), tribos nómadas vivendo lado a lado com os proletários mo-
dernos, o candeeiro de petróleo e o carburante de Rockfeller pene-
trando naspequenasaldeias do sul, ao passoque o dinheiro continua
a ser desconhecidoem regiõesinteiras: eis a China contemporânea,
exemplo clássico do desenvolvimento histórico combinado de toda
a Ária. A penetraçãodo capital internacionalapenastinha indus-
trializado uma estreita faixa costeira e algumasprovíncias setentri-
nais; no resto do país, a sua acçãolimitara-se à destruição do arte-
sanato secular e ao es-magamento do camponês -sob o peso da usura.
Entre este capital internacional e a ma'ssado povo chinês havia-se
introduzido uma classede intermediários, os«compradons», vivendo
do lucro comercial que os empresários estrangeiros hes abandonava
e tran-sformandoesselucro em capital usurário, pelo qual sangravam
o campesinato
até ao esgotamento.
Incapazde unificar o país,de
assegurara sua independência, de resolver a questão agrária conforme
as suas particularidades sociais próprias, esta burguesia de «com-

(') A superfície da China, incluindo o Sinkíang e a Mandchúria mas san


o Tibete e a Mongó]ia exterior, é de 9,7 milhões de kaf, ou seja, ligeiramente
inferior à da Europa. Englobando o Tíbete e a Mongóha exterior na China, a
superfície desta torna-se 15 go superior à da Europa.
pradores>>não podia desempenhar nenhum papel progressivo na his- bacias agrícolas do Norte e do Sul, que os japoneses nunca consegui-
tória e mantinha o país no canise na prestação.A velha cultura ram ocupar, encontravam-se isolada-sdos centros industriais desen-
chinesa desagregava-se;a ignorância e o analfabetismonos campos volvidos.No Norte, sobretudonos territórios ocupadospelasgueni-
atingiam um ponto culminante. Ao mesmo tempo, R)rjava-senas ]has comunistas au pelas milícias camponesaslocais, o artesanato
grandes cidades, comolinguagem corrente nas relações com os alcançouum novo desenvolvimento('). O comércio afrouxou e cres-
«senhoreu> estrangeiros, a gíria infernal e altamente simbólica: ceram constantementeas tendênciaspara a autarquiaprovincial e
«pidgiü english», na qual <<eu sou» se traduz por «eu pertenço a>>. mesmo cantonal. O país começava a concentrar-se om si mesmo.
Tal é o país que se torna teatro da mais importante revolução preci- Este recuo -teveefeitos consideráveisna economiaagrári-a.Fo-
pitada pela 2.' guerra mundial. ram cortados os laços com o mercado mundial, que tinha permitido
reduzir as flutuaçõesdo abastedmentoem arroz e trigo. Disso resul-
tou a fome a cada má colheita. Províncias inteiras, contando milhões
A decomposição da sociedade chinesa contemporânea de habitantes, foram assim atingidas, sobretudo no decurso da
grandefome na planície setentrional em 1941-1943.Culturas como
A sociedade chinesa, fina bastarda da meiga China e do impe- a do algodão, destin-adas a ser vendidas nas cidades, foram reduzidas
rialismo mundial, mantivera-seininterruptamente submetida a san- em proveito de culturas alimentares('). Ao mesmo tempo, os pe-
grentas convulsões. Como principal teatro das rivalidades imperia- quenosfuncionários locais e outras esteios do Kuomintang, sob os
listas no Extreme-Oriente, estava fragmentada entre chefes mili- efeitos da inflação crescente,procuraram melhorar a sua situação
tares que conduziam as suas guerras privadas com os subsídios de apropriando-sede i-mensalextensões de terras de camponeses,comu-
cada uma das grandes potências interessadas no comércio chinês, nais e senhoriais. Calcula-se que, na província de Szechwan, 20 a
para depois se tornar vítima duma guerra de conquista conduzida em 30 % dos proprietários fundiários conquistaram as suas terras du-
boa e devida forma pelo imperialismojaponês.A derrota da revo- rante a guerra, representandoessaspropriedades90 % das terras
lução chinesa de 1925-1927 não tinha permitido encontrar uma solu- dos antigos proprietários fundiários(') . Esta evolução ainda se acen-
ção progressivapara as contradiçõesem que esta sociedadebastarda tuou após o fim da guerra, quando o governo fez tomar por socie-
se debatia. Foi por isso que a seguir se assistiu a uma lenta decom- dades nacionalizadas as terras pertencentes aos japoneses. A«North
posição das relações fundamentais em que a sociedade chinesa China Exploitation(l;ompany», por si só, apoderou-sede várias cen-
assentava. tenas de milhares de«mow>> de terras, unicamente na província de
O imperialismo japonês tinha investida capitais consideráveis na Hopei(l mow = 0,66 ha.) ('). O imposto pago em espécie desde
Mandchúria, colonizada a partir de 1931. AÍ fizera afluir o equivalente 1941; os empréstimos forçados e as inumeráveis requisições do exér-
em «yen»de cercade 5,5 biliões de dólares('). Um vasto movi- cito deram.o golpede misericórdiana economiaagrária,desdehá
mento de industrialização tinha duplicado a produção carbonífera
e triplicado a produçãometalúrgica.Mas est©movimentode indus- (') Jack Belden: <#Cói sóaéef /óe ioof/d», Nova lorque, Hmper &
trialização em nada aproveitava ao conjunto do país. As grandes Brothers, 1949, pp. 145 e 151.
(')«U; S. re/a/io i ifó Cói#4», basedin the files of the SkateDeputment,
Washington, Agosto de 1947, pp. 127-128.
(') Relatório de Pauley, enviado especial do presidente Trumün à Mand- (') lóld. p. 60--Belden, op.cif. pp. 145e 151.
chúria na Primavera de 1946. Conforme o«Neve Zwrcóm Ze//##g» de 45.47. (') Belden, op. cif., p. 151.
muito vacilante. Numerosa-saldeias entraram em decadência;o nú- de todas as empresas que eram propriedade japonesa e apropriou-se
mero de camponesesmortos de fome durante a guena é calculado assim da parte de leão das indústrias têxtil e carbonífera (:'). As qua
em 10 a 15 milhões! (') Vastas extensões de terras ficmam incultas. tro famílias Tchang Kai-thek, Soong, Kung e irmãos Cheng salteavam
Esgotado por séculos de colheitas demasiado frequentes e pela falta essas empresas nacionalizadas como se fossem domínios privados e,
de cuidados,o solo, por sua vez, rebelou-secentra o anoto arcaico ao mesmo temi)o, utilizaram a sua posição política para acumular
de produção na China -setentrional. O rendimento por«mow» baixou fortunas fabulosas na gestão dessas mesmas empresas e para estabe-
sem cessar('). Belden calcula que, no fim da guerra, 50 mihões de lecer, em numerosossectores,monopóliosde facto para as suas
«mow» (3,3 milhões de hectares)se encontravamnão cultivados nas empresas privadas.
três ferteis províncias de Honan, Hupeh e Hunan. Centenasde mi- O escritor americanoGeorge Maorad, apesar de apologista do
lhares de pequenose médios camponesestinham sido esbulhados('). Kuomintang, descreve nestes termos a situação assim criada:
O preçoda terra sofreuimportante desvalorização
por efeito de nu-
merosos camponeses(") se verem na obrigaçãode vender as suas «Utilizando empréstimos governamentais e os materiais da
pequenas parcelas. A guerra e o imediato pós-guerra criaram assim, UNRRA e confiscandoas propriedadesdo inimigo, os mono-
por um lado, uma nova camadade proprietários especuladores
e pólios do E-stadoe das quatro famílias conseguiramem breve
parasitários e, por outro, uma enorme massa de camponesesexpro- nomopolizara indústria mineira, a indústria pesada,as indús-
priadas. Esta lwlarização da sociedaderepresentou uma última agudi-
trias da seda,do algodãoe da fiação,a indústriado açúcar,os
zaçãodas contradições sociais e foi a parteira da 3 .' revolução chinesa.
transportese, naturalmente, os bancose o comércio com o ultra-
A súbita reconquista pela China das grandescentros hdustríais
mar... Além da sua participação decisiva no governo naciona-
quando da capitulação japonesa, assinalou a brutal confirmação dum
lista, o trust Soong-Kunge seussatéliteseramtambémproprie-
aspecto típico da China contemporânea: a ultrapassagem da burgue-
tários da Chinallllighway Tra-nsportCompany,Fu Chung Cor-
sia industrial, extremamentedébil, pelo«capital burocrático». A par-
poration, Yangtzé Development Corporadon e Universal Trading
tir de 1936, asnacionalizações
tinham galão importância.Os núme-
Corporation. Assim, as grandesfiações japonesasde algodão na
ros governamentaisindicam que em 1942 o Estado possuíavinte
centrais eléctricas, oito fábricas de aço e metalúrgicas, várias fábricas China, que em 1937 se tinham tornado rivais das indústrias de
Bombaim e de Manchester, eram absorvidaspela China Textile
de construções mecânicas e de aparelhagem eléctrica e uma dezena
Development Corporation, que, graças aos empréstimos gover-
de destilações de álcool("). No fim da guerra o govemo apoderou-se
namentais e aos fornecimentos de algodão governamental, fica-
vam em posiçãode eliminar as fábricasprivadascHnesase bri-
(') Belden, op. clf., p. 151.
tânicas. Os monopólios obtinham também um tratamento pre-
(') Artigo dum professor dlinês no «Jo#r#aZo/ F©m Eco omfcs»,citado
por John Bowmanem «l,e Paysa#CÓf#off»(«Wmêaf J fn#affo#a/ meus», ferencial na distribuição dos carburantes,dos meios de trans-
N.' de Jün.'/Fev.' de 1949). porte e das matérias-primas». («Lost peace in China», ed. Dutton
(') Belden, op. cff., pp. 151, 157. & Co., Nova lorque 1949, pp. 197, 198).
(") Artigo do jomal«T# K##g Pao»,de Pequim,reproduzidopelo «New
yoré H«aZd Trió##e» de 8.7.1947.
(") «Cói Ha dZ,aoê» 1937-1943, compiled by the Chinesa Ministty of (") Relatório do general americanoWedemeyer«tJ.S. Re/#ffo#i...»
Infoiznadon, McMillan, N. lorque, 1943, pp. 432, 436. PP.780, 793.

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70 % do orçamento foi consagrado ao exército (:'). O que provocou
Eis aqui uma forma de concentração
do capital monopolistaque
um enorme déficite orçamentalultrapassando2/3 das despesas,e
os países desenvolvidos nunca tinham cohecido.
essedéfice apenaspede ser coberto pela desenfreadaemissãode notas.
Quando um membro duma destas famílias, o financeiro
A partir de 1940, os preços tinham já chegado a uma média de 3500
T. V. Soong, ex-presidente do Banco da China, ex-ministro dos Ne-
(nível de 1937 : 100) e emcertasprovíncias mesmoalém de 5500 (").
gócios Estrangeiros, ex-primeiro-ministro, foi nomeado governador
O fim da guerrafoi assinalado
por umapronunciada
aceleração
do
da rica província de Kuangtung em Setembrode 1947, quatro
movimento inflacionista. Durante o ano de 1946 os preços subiram
meses após a sua demissão de chefe do governo e 'sob pressão da opi-
de 700 % em Xangai. De Janeiro a Julho de 1947 subiram de novo
nião pública, a imprensa explicou esta nomeaçãocomo resultado dum
500 %. A circulaçãomonetária elevou-se,de 1,15 triliões de dólares
donativo que o mesmo Soongacabarade fazer em favor do fu'ndo
chinesesem 1946, para 11,46 triliões de dólares chinesesem Julho
de caridade do Kuomintang e que seelevava a 500 biliões de dólares
de 1947. A partir desse momento, o ritmo da inflação acelerou-se,
chineses, ou 10 milhões de dólares americanos, representado por
comoo indica o câmbiodo dólar a.mexicano
no mercadolivre de
acções e obrigações de importantes empresas industriais e comer-
Xangai:
ciais (:'). O «capital burocrático>> era pois a conquista de posições
dominantes na economia, pela exploraçãoda função pública, com-
l dólar americano valia (em dólares chineses):
binada com a compra de postos dirigentes do Estado por meio dos
enormes lucros arrancados à economia. 36000emJunhode 1947 -- 44000 emAgostode 1947
100 000 em Outubro de 1947 -- 165 000 em Novembro de 1947
Estas práticas extremas de corrupção e de despotismo, colidiam
500 000 em Março de 1948 -- 1 000 000 em Maio de 1948
não só com os capitalistasestrangeiros,que se viam excluídosduma
10 000 000 em Agosto de 1948 (:').
parte dos seuslucros tradicionais, -mastambém com a maioria dos
próprios <<compradores»chineses, privados de acesso às melhores
A amplitude assumidapor esta inflação rematou com a elimi-
fontes de lucro por m(mopolizadaspelas «quatro famílias». Estas
nação da moeda como meio de pagamento ünensal dos salários e alu-
camadas burguesas indígenas, afastadas duma actividade industrial
ou comercial rendosa, concentravam-semais ainda na especulação gueis, pagamentos que se efectuavam por meio de sacas de -trigo;
e na usura, acelerandoassim a desagregação
da economiae alimen- na tesourização do ouro e das divisas estrangeiras, na armazenagem
maciça das mercadorias e, por conseguinte, na 'sua rarefacção. No fim
tando o ódio de todas ascla-sses
produtoras em relação ao Kuomintang
de Agosto de 1948, o governo fez uma derradeira tentativa de esta-
e ao seu putrefacto regime.
bilização da situação monetária, pondo em circulação urna nova
Mas o factor que mai'scontribuiu para a desagregação
das rela-
moeda, o <<yuan»de ouro. Os preços foram estabilizadas e decre-
ções sociais-tradicionais, foi a inflação galopante que se desenvolveu
tadas penas rigorosas para reprimir a especulação.Mas o público
durante a guerra e no imediato pós-guerra. Além do parasitismo uni-
versal do regime, a causa desta inflação residiu antes de tudo na
enorme massa de despesas governamentais improdutivas, para a ma- (:') «U. S. reza/jo J fzÓ CÓ; a», P. 770.
nutençãoduma burocraciae dum exército hipertrofiados: em média, (") «Cóí a lJa dóoo&», p. 612, 613.
ÇI' ) <KUniled Status retations wilb China», pp. ]82, 1$3 -- 4&Neae Zücber
Zeffzfmg», 21.8.1947, 29.4.1947, 5.6.1948 --«Nem yof.ç Hera/d Trfóu#e»
21.5.1948 e 7.8.1948.
(") Jornal «Nele Zdrcón Zelf##g», de 2.10.1947
mostrou-se céptico porque, ao mesmo tempo, os números orçamen- esgotar-seeste empréstimo, as coisas ficaram por aí ("). Finalmente,
tais mostravam que os rendimentos anuaisdo governo mal cobriam esta situação teve como desfecho a paragem do comércio entre a ci-
dol; meses das i as despesas("). Por isso, a inflação recomeçou em dade e o campo Grandes s/ocas de produtos alimentares e de algo-
força logo após a reforma agrária.Quinze dias mais tarde os preços dão acumularam-senas aldeias da Manchúria e da China setentrional.
tinham quaseduplicado.Seissemanasmais tarde a alta dos preços ao passo que a fome reinava nas cidades. Ao mesmo tempo, grandes
atingia 45 %. Quatro semanas
depois, o índice oficial elevava-sea r/oc;.êrde carvão acumulavam-senos centros mineiros, enquanto a
81. % (:'). Entre Novembro de 1948 e Janeiro de 1949, os preços população ca-mponesa sofria teuivelmente de frio durante o Inverno.
subiram de 500 %. Estava aberto um novo ciclo de inflação galo- Toda a vida económicado paíspareciaimobilizada("). A incúria
pente do regime saltava aos olhos de todos.
A inflação teve como desfechouma prostaçãocompleta dos ne-
gócios.«A produção está paralisada», escrevia o correspondente do
<<Neue
Zürcher Zeitung>>
no número 17 de Outubro de 1948 deste A intervenção americana na China
jornal -- «por efeito da falta dematérias-primas. Os produtores cam-
ponesesrecusam vender os seus produtos enquanto não puderem A intervenção imperial tinha impedido a transformação da China
comprar produtos alimentares aos preços oficiais». O medo da infla- em nação moderna: tinha, ao mesmo tempo, concedido um apoio
ção levou a um desinvestimento de capitais maciço. Estes capitais, imprevisto às relações sociais particulares que caracterizavam a
transformados
em barrasde ouro ou em dólares,afluírama China da primeira metade do século xx. Com o fim da guerra, esta
Hong Kong, aos Estadas Unidos e à América Latina. A aparelha- situaçãoviu.se radicalmente subvertida. Das antigas potênciaspro-
gem indu-strial deteriorou-se. As máquinas deixaram de ser repa- tectorasda ordem social chinesa,só a (»ã-Bretanhae os Estadas
radas. O capital deixou de ser renovado. A inflação devorou as Unidos subsi-suamcomo forças independentes, e a própria Grã-Bre-
reservasque a guerratinha deixadointactasno país.A produção tanha estava demasiadoenfraquecida para intervir eficmmente na
carbonífera caiu para metade do nível de antes da guerra; a pro- China. Foi sobre o imperialismo americano que recaiu o peso da
dução de têxteis situou-se -a nível idêntico. Em toda a Manchúria, defesadessacivilização cristã que havia estigmatizadoa China com
a produção industrial em 1948 era de 10 % do -seunível normal. Um o selo do ópio, dos«coolies>>e das casaspúblicas de Xangai.
caso típico, citado no relatório do general Wedemeyer, é o das minas Com o deflagrar da guerra entre o Japão e os Estados Unidos
de carvão Hwainan, na China central, propriedade dum trust con- acentuou-se considerav-elmente o interesse americano pela China.
trolado por duas das quatro faanílias,os Soonge os Kung: a China Enquanto que banqueiros e técnicos preparavam planos de créditos
Finance Development Corporation. Este tlu'st possuía grandes reser- e de investimentos de capitais, o general Stilwell procurava utilizar
vas em divisas estrangeiras, mas recusava utiliza-las no reequipamento o imenso potencial humano chinês para a criação de novos exércitos
das suas minas. Foi o próprio governo que fez arrancar a produção dotados de equipamento moderno. Foi no decurso dessas tentativas
por meio dum espréstimo de um milhão de dólares americanos; após que os chefes militares ianques tiveram os primeiros contactos pro-

(") «Neve Zlircóer Zeif##g», 9.9.1948. (")«U. .ç. re/a/io i wi/ó CBi#a», pp. 781, 782, 789 e 793.
(u) «Nele ZZircóef Zei/#ng», 16.10.1948 e 28.11.1948 -- «New yoré tn) «Neve Ziirçber Zeit&tig», 4.5.4] e 3.6.41 --«U. S. retatioKS witb
fiel d Tfi& e», 14.10.1948. CÓj#a» P. 221.

20 21
tang. Por outro lado, era necessário substituir o governo de
longados com os dirigentes do Kuamintang e que compreenderam
Tchang Kai-chek por outro capaz de evitar a deflagração duma
que a regime de Tchang Kai-chek se encontrava desesperadamente
ído e condenado a desaparecer. Os documentos publicados guerra civil em grandeescala,visto que o Kuomintangnão podia
deixar de perder semelhante guerra. Ora, o único meio de que o im-
pelo Departamento de Estado americano contêm relatórios dos agen-
perialismo americano dispunha para pressionar o Kuomintang era
tes secretos, redigidos em 1943-1944, todos unânimes em predizer
precisamenteo auxílio que Ihe fazia chegar.Não podendodecidir-se
a derrota de Tchang Kai-chek na eventualidade duma guerra civil em
a cortar esseauxílio para arrancar ao Kuomintang concessõesreais,
grande escala na China. O relatório do agente John Steward Service
via antecipadamente condenadas ao malogro todas as tentativas para
caracteriza a situação nas províncias controladas pelo Kuomintang
chegar a uma conciliação entre o PC chinês e Tchan Kai-chek.
da forma seguinte:
No entanto, as basespolíticas e militares du-mtal compromisso
tinham sido regi-sdurante os primeiros anos do pos-guerra.Dis-
l O moral é baixo e o desânimoé geral. Existe um sentimento
pondo, graças ao auxílio americano, dum material urra-moderno,
universal de desespero.
os exércitos de Tchang Kai-chek tinham sido transportados por aviões
2 A autoridade do governo central enfraqueceu nas regiões afas-
e navios americanospara os grandes centros da Mandchúria e do
tadas das grandes cidades. O governo é incapaz de fmer exe- Norte, a fim de ocuparem rapidamente as cidades evacuadas pelos
cutar as suas ordens e as sua-sdirectivas. O governo começa
japonesese depor:spelos russos. Os grupos de guerrilheiros comu-
a ter dificuldades em reunir alimentaçãobastantepara o seu nistas. oficialmente unidos ao exército regular sob o nome de
grande exército e para a burocracia. 8.' Exérc/fo de .Afarcóa, tinham ocupado alguns distritos agrícolas
3 A estrutura governamental e -militar está infiltrada e des-
e só raras cidades, após o que suspendera-mas suas operações. Em
moralizada de alto a baixo por uma corrupção sem precedente 11 de Outubro de 1945 foi concluídoum acordoentre o Kuomintang
em amplitude e ostentação.
e o PC chinêsque previa a convocaçãoduma Com/eréciózco i //ipa
4 As classes intelectuais e assalariadas, que são as que mais
popa//ar a fim de sanar todas as divergências. Essa conferência reu-
sofreram com a inflação, estão ameaçadasde desaparecimento.
niu-se em Tchungking em Janeiro de 1946 e, após vinte e um dias
Os grupos de formação universitária não sofreram apenasdo
de di-scussões, adoptou uma série de resoluções sobre a organização
esgotamento e da desmoralização consequentesà sua miséria
dum governo de coligação, a reconstrução do país, os problemas mili-
económica: o peso de anos de vigilância política e de repres-
tares, a convocaçãoduma Assembleiaconstituinte, etc. Não foi abor-
são roubaram-lhestambém o vigor intelectual e a capacidade dada u-mareforma radical ("). Finalmente, em 25 de Fevereiro de
de direcção que outrora tinham possuído(").
1946, sob a égide do general Marshall, encarregado da missão espe-
cial de conciliadorna China, o Kuomintang e o PC chinêsconcluíram
Esta compreensão da situação chinesa colocava o imperialismo ame-
ricano ante um dilema insolúvel no momento de terminar a guerra na
um acordopara a unificaçãodas forçasarmadas.A via para a paz
social parecia aberta (").
Ásia. Por um lado, era necessárioprestar o auxílio máximo a Tchang
Kai-chek, para impedir um afundamento rápido da China do Kuamin-
(") «U.S. rezam/o
i mifó Cói#d»,pp. 1}6 e 140
(") <#tr.S. re/anjo i i/b Cói#ú» pp. 140 e 143
(n} <<U.S. telations witb CEiRa», p 3Gl-

2j
22
Contudo, no próprio momento om que estes acordos eram concluí- que o tempo trabalhava contra elas. A aventura militar, na qual se
dos, as hostilidades estavam prestes a recomeçar.A responsabili- precipitaram com uma cegueira raramente igualada ("), não tinha
dade disso cabe muito claramenteao Kuomintang, e o general sido desejadanem provocada pelo PC chinês, que parece ter pro-
Marshall, algunsmesesmais tarde, não hesitou em publicar uma curado seriamente a via do compromisso (").
declaração na qual enumerava os<<sete erros de Tchang Kai-chek», O malogroda missãode conciliaçãodo generalMarshalle da
sete casos claros de agressão mili'tar das forças do Kuomintang em missãode informaçãodo generalWedemeyerque Ihe sucedeu,de
violação dos acordos concluídos previamente com o PC chinês. A par- modo nenhum significava o abandono pelo imperialismo americano
tir do Verão de 1946 verificou-se um reinício geral das hostilidades, da sua política de intervenção e de <<pacificação»
da China. Durante
e no fim desse ano os exércitos do Kuomintang iniciaram uma ofen-
dois anos, a política americanacontinuou a oscilar entre dois objec-
siva geral para tomar os territórios ocupadospelos exércitos comu- tivos contraditórios;evitar toda a derrocadado poder do Kuomin-
nistas. Tinha estalado a guerra civil generalizada(").
tang,por lado,a tentarliberalizaro regimee leva-loa pâr fim
Formalmente, a missãode conciliação do general Marshall falhara
à guerra civil, por outro. Se parece terem sido sincerasas intenções
na questãoda ocupaçãodos territórios que tinham mudadode mão conciliadoras dos americanos na China, a prá/ica a intervenção ame-
depois de 13 de Janeiro de 1946, data da abertura da Conferência
ricana levou ao prolongamentoda ditadura de Tchang Kai-chek.
Consultiva Popular. O PC chinês pedia o ifaf g o úm/ee a manu- A«pressão>>exercida sobre o marechal no sentido de introduzir re-
tenção das reformas sociais anteriormente introduzidas nessas re-
formas «progressivas>>apenas obteve resultados ridículos (").
giões. Mapshall propôs a evacuaçãodos territórios e a sua transfor-
Foi considerável o total da ajuda americana concedida ao Kuo-
mação numa espécie de mo mam's Jaez(terra de ninguém). Tchang
mintang, o que desmente de modo flagrante todos os meios reaccio-
Kai-chek pediu a sua ocupaçãopelas forças «governamentais»(").
Na realidade, os proprietários fundiários estavam convencidos da nários, nos Estadasl.Jnidose no resto do mundo, que tentam ex-
inevitabilidade de sublevaçõescamponesasem grande escala. Não plicar a vitória de Mao Tse-tungpela«insuficiência>>
do apoio con-
tinham nenhumaconfiançaem que o PC cllinês, no seguimentoduma cedido por Washington à reacção chinesa. No que respeita à ajfzlda
eventual entrada num governo de coligação, fosse capaz de sustaf
essas sublevações. Receavam, por consequência, que qualquer pro-
(") Numa entrevista com MarshaH, em 1.12.46, Tchang Kai-chek afirmou-se
longamento do período de relativa liberdade usufruído pelos campo- caQ de <Ke:çterminar
as forças camanislasem 8 a 10 meses».)\ates ôsso, os
neses nas regiões ocupadas pelos comunistas conduzisse fatalmente seus conselheiros militares tinham mesmo anunciado o desmantelamento dos
à ocupação das terras e que o exemplo dessas regiões se propagasse a exércitos comunistas em três meses!(lóid. pp. 212, 216).
(") Ver a declnação do comandante em chefe dos exércitos comunistas,
todo o campesinato cl)mês. O único modo de evitar esta catástrofe era
(:kxu Teh : <<seo Kt&omitltatig tivesse respeitado as decisões da Confetêticia Consul-
reconquistar rapidamenteessasregiões,utilizando o período em que tiva Pop iar não teria havido a guerra ciui{» Robelto PaNne: «]orney to Reá
as relações de força militares eram fundamentalmente favoráveis ao Cói#a», ed. Heinmann, Londres, 1947, p. 14) Payne diz também que o PC chi-
Kuomintang. As classespossuidoras chinesas tinham compreendido nês propôs como árbitro duma administração comum da cidade de Tchangchung
uu grande capitalista mandchú, Mo Ti-huei(op. c/f. p. 109).
(") Assim, para combater a inflação, o governo decidiu em Setembrode
(") «U.S. /e/a#o s wi/ó Cói#oB pp. 151 e 156--«Eco#o@if/a» de 1947 suspender a importação de produtos cosméticose limitar a duas horas
19.4.47. a duração dos banquetes,autorizando somenteuma quantidade de pratos igual
(") «U. S. fe/ fio s wi/ó Cói#aA»pp. 232, 158 e 166. ao número de convivas, tendo como limite oito pratos!

24 2j
mf/içar propriamente dita, além da presença na China de numerosos abandonoformal destatutela deu--se
no momentoem que a dita-
conselheiros
americanos
e do transportede soldadose materialdo dura, apoiada num serviço secreto de 200 000 membros, precipitou
Kuomintang em navios e aviões americanos,comportou o forneci- o l)aís numa vaga de repressões nunca igualada ($').
mentode armase muniçõesde valor superiora um bilião de dólares O terror que fez reinar na Formosaem 1947 é um exemplo con-
americanos, conjuntamente com 700 milhões de dólares de forneci- vincente da natureza «denlocrática>>do governo de Tchang Kai-chek.
mentos em regime de <<empréstimo-agendamento» após o/im da Em 25 de Fevereiro de 1947 estalaram ali incidentes que desfecha-
guerra ma .Ária ("). Quanto à ajuda económica, as fontes oficiais ram no essa:ssinato
de várias pessoaspelos soldadoschineses.A popu-
americanas avaliam-na igualmente num bilião de dólares, mais uma laçãoda Formosasublevou-see formou conselhospolíticos que re-
venda de excedentesamericanosdu-m valor de custo igualmente dum clamaram uma constituição democrática para a ilha. O governo
bilião de dólares ("). Ou seja, em total, mais de três biliões de dó- encetou conversações com a população, para ganhar tempo até à che-
lares, que não puderam salvar Tchang Kai-chek. É que nada teria gada de reforços do continente. Com o desembarque das tropas chi-
podido conter as ondas alterosas da 3.' Revolução chinesa. nesas começou uma repres'são sangrenta. Os americanos fixam as
vítimas em 5000 mortos: os habitantes da Formosa falam de 20 000
pessoas assassinadas("). A história vinga-se de Tchang Kai<hek
A desintegração do poder abandonando-o hoje ao ódio subterrâneo e tenaz da infeliz população
desta ilha.
Não é passível compreendera derrota de Tchang Kai<hek desde A ditadura do Kuomintang não era de natureza fascista, como já
que se considerecomo a derrota dum governo«democrático»frente antes Trot-sky fez notar (") ; ao contrário dos regimes fascistas, não
ao poderio «totalitário>>dos comunistaschineses.Do ponto de vista dispunl)a de qualquer apoio -na massa da pequena burguesia, que
social, o regime do Kuomintang, baseado na aliança dos proprietá- Ihe era violentamente hostil. Era uma ditadura militar apoiadanuma
rios fundiários e dos burgueses <<compradores»,foi esmagado pelas
aliança entre proprietários fundiários, certas camada-sde compradores
sublevações
dos camponeses
explorados.Mesmodo ponto de vista e a vastacastade militarese de burocratassuperioresdo regime.
formal. foi a iniciativa espontânea e o «self-governament>>(autch
Segundoo jornal suíço <<DerBund» a China contava6773 generais
governo) local dos camponeses revoltadas em grau considerável que
em serviço (15 de Junho de 1948). No entanto, a guerra modificou
permitiu aos exércitos de Mao Tse-tung esmagaro despotismo putre-
a base deste regime. Isolado dos grandes centros indo:suiais e das
facto e universalmente detestado do Kuomintang.
camadasdecisivas de compradores,Tchang Kai-chek foi forçado a
Cam efeito, nada seria mais contrário à realidade do que designar
apoiar-sepredominantementenos proprietários fundiários mais con-
pelo nome de democracia burguesa a ditadura de Tchang Kai-chek.
servadorese retrógradas. Por isso, o peso político dos representan-
Ditadura francamente afirmada cama tal, visto que o Kuomintang
tes desta classe,(-nomeadamente
a «clique» do Comité Central do
declarou abertamente exercer a tutela do povo chinês considerado
imaturo para o exercício da soberania poli:tica, até 1974 (':). E o
(") Payne, ap rff., p. 110.
(") «U. S. re/afia s wi/ó Cói#a», PP. 940, 942, 945, 946, 952, 955 e 969. (") «U.S. reZ flo i wi/ó Cói#a», pp. 925 e 933--Belden, op. cf/.,
(") «tJ.S. re/a//o#swffÓ Cói#a», pp 1043 e 1044. PP.394, 397.
(') Conforme«Program OJrPo/Íflca/ T feZage»,carta fundamental do (") L. Trotsky, Lettre aux camaradas
de Pékin«U#e safa/égiede J'ac/io
Kuomintang entre 1928 e 1937, in«Cói#ú Ha dóoo&», P. 85. e/ o Zer spéc /affons».(«l,a L#ffe de C/asse», n." 46-47, Jan.'/Fw.' 1933).

26 27
r'

Kuomintang) tornou-se preponderante ("). É isso que explica o fra- brar habilmente entre <<cliques>>
militaristas que mutuamentese hos-
cassodo compromissode 1946, apesarde ser favorável à burgue- tilizavam("). Mas a alteraçãoda relaçãode forçasentre proprie-
sia industrial da China setentrional,que, em 13 de Abril de 1946, tários fundiários e compradores durante a guerra, modificou profun-
enviara uma delegaçãoao estado-maiordo Kuomintang para obter damente as bases do poder do Kuomintang. Mais :fatal ainda se mos-
trou .ser-lheo desenvolvimentona China setentrional e na Mandchú-
a cessaçãoimediata das hostilidades(").
A personalidade de Tchang Kai-chek é o reflexo fiel do regime
ria de órgãosde autodefesae de autogovernodos camponeses,
du-
que encarna.Harold lsaacs pintou-nos de Tchan Kai-chek um rante o mesmo período. Nas aldeias perdidas, aonde as tropas japo-
retrato tão impediosocomofiel. Filho dum proprietáriofundiário nesasnão p(xlia fazer chegar forças de reconhecimentoe das quais
e comerciante, da provínciade Chekia-ng,
TchangKai-chekfoi em tinham sido precipitadamente evacuadasas tropas do Kuomintang,
1911 para Xangai, aondeprocurou fazer carreira como corretor da constituíram-se sólidos núcleos de resistência anta-imperialista e de
Bolsa. Estabeleceu relações com sociedades secretas e frequentou democracialocal. Mesmo atrás das linhas japonesas,surgiram milí-
-- diz lsaacs --<<gangsters e banqueiros, contrabandistas e explo- cias de aldeia e municipalidades clandestinamente eleitas. 0 8.' Exer-
radores de bordeis, penhoristas e a escu'm-alha
dos portas internacio- ci/o de .Afarcóa comunista, cedo começou a coordenar este movi-

nalizados».Rondou a prisão, foi salvo desta pela protecçãode mento de resistênciasob a sua direcção; não dispondo de quadros
compradores e, depois, seguiu para o sul, aonde ligou a sua sorte à suficientes, foi obrigado a abandonar às aldeias um grande grau de
de Sun Yat-sen. Como jovem oficial de carreira, foi escolhido pelo autonomia e de democracia. Certas unidades administrativas, reagru-
pai da República chinesa para passar seis meses em Moscovo em padasde forma bastantefrouxa, foram encimadaspor uma instân-
1923. No -seu regresso, tornou-se comandante da Academia militar cia central criada de cima, o«governo de região fronteiriça .Shansi-
de Whampao, cons.truída e administrada com fundos russos, e é desta -Hopei-Shantung-Honan», no qual os elementos locais e não comu-

posição que partirá em 1925 para a expediçãomilitar que Ihe per- nistas tinham uma bastante larga representação("). Para o fim da
mitiu, após o esmagamentoda revolução em 1927, unificar a China guerra, es-te<<governo>>
e as autoridades que os comunista-stinham
sob a sua ditadura. Os massacresque promoveu continuam, mesmo formado noutras partes do país controlavam já cerca de 90 milhões
hoje, a ser impressionantes. de pessoas ("). A massa dos camponeses, embora observando com
De Abril a Setembro de 1927, 32 316 pessoas foram executadas desconfiançaa'smedidas das novas autoridades, tendentes a impedir
por «crimes políticos». De Janeiro a Agosto de 1928, o número a reforma agrária até 1946, consideravano entanto o novo governo
de condenados
à morteelevou-se
a 27 699.No fim de 1930cal- como o primeiro que não agia constantee deliberadamentecontra
culava-se que 130 000 adversários políticos tinham sido liquidados o povo. Mostrou--sepor isso pronta a conceder-lheo seuapoio, desde
pelo regime. Estatísticas incompletas e apenas respeitantes às cida- o momento em que a suafundamental reivindicação-- a da terra --
era satisfeita (").
des de seis províncias,mencionam38 788 pessoasexecutadaspor
motivos políticos durante o ano de 1931.
Tchang Kai-chek manteve-seem posição dominante, diz lsaacs, (u) Hatold lsaacs,«No peace/or .b/#», McMiUan, N. lorque, 1947,
pp. 54, i5, 60 e 61.
ao dar satisfação imediata a todas as classesdominantes e ao mano-
(") Belden, op. cü., pp. 28, 52, 53, 55, 71 e 84.
(") Relatório de Dawis, agente do State Department, in«U. S. reZafio i
(") Belden, op. cf/., p. 422 witb China», p. 5GR.
(") Payne, op. cif., p. 109.
(") Belden, op. cif., p. 83, 84, 161 e 162.

29
28
O regime de Tchang Kai-chek encontrou-se assim ante um adver- pelo facto de conhecera data e as modalidadesdesta reforma! (")
sário cujas forças cresciamincessantemente.Por outro lado,, os -seus O relatório do general Wedemeyer afirma que os fiscais das contri-
recursos iam sempre diminuindo, corroídos por u'ma corrupção desen- buições impunham aos camponeses taxas que estes eram incapazes
freada. Belden cita o casodum coronel que devia retomar o comando de pagar, enquanto que os empréstimos e comerciantes ricos podiam
dum batalhão, mas que foi afastado desseposto por não poder pagar subtrair-se às obrigações fiscais por meio duma contabilidade fal-
aos seus superiores o <<tributo>>habitual. Foi então nomeado respon- seada("). O mesmo relatório declara -que os serviços marítimos da
sável da unidade de transportes do seu regimento. Nessa qualidade, alfândega,«considerados durante os anos anteriores à guerra, pela
tinha que dar 1/7 de toda a suagasolinaao oficial encarregadodo eficácia e honestidade da sua administração, sem igual no mundo
depósito de abastecimentos. Os seus -superiores reservavam-se mais inteiro. . ., acusavam actualmente uma corrupção que ultrapassava
1/7 da gasolina para seu uso pessoal. Para poder abastecer o regi- tudo o 'quetinha existidodesdehá 79 anos».Os comerciantes
su-
mento, este coronel era ele próprio obrigado a vender gorduras no bornava-mas autoridades alfandegárias para poder retirar fraudulen
mercado negro a fim de repor a quantidade de gasolina de que os lamente as mercadorias,dispensar-sedas licenças obrigatórias ou
oficiais corruptos se apropriavam("). O escritor chinês Pei Wan- dos direitos alfandegários, passar por círna dos regula-mentor respei-
chung conta que as autoridades administrativas da-saldeias, respon- tantes aos preços ou, simplesmente, obter mais rápido despacho.
sáveispela incorporaçãodos jovens recrutas no exército, tinham or- O relatório declara ainda que as importâncias utilizadas nesta cor-
rupção não iam contudo além duma média de 10 % do valor das mer-
ganizadona província de topei u-msi-stemasegundoo qual toda a
família disposta a pagar'somasexorbitantespodia reter os seusfi- cadorias consideradas, enquanto que o Departamento de Impostos
directos absorvia, nas suas «despesasadministrativas», até 60 % das
lhas ("). Ao mesmo tempo, os efectivos em falta foram inscritos nos
importância cobradas (").
registos dos regimentos para que os oficiais pudessemembolsar os
À excepção dos al-tos dignitários do regime, que organizaram a
soldos correspondentes. Disso resultava que numerosas formações
fraude e a corrupçãocomo um <<racket>>
privado, a grandemassados
armadasnão contavammais do que 60 % dos efectivos l)resumí-
pequenos funcionários foi i-mpelida na via da corrupção pela fla-
veis ("). A situação torna-se ainda mais clara quando se acrescenta
grante insuficiência dos seus salários. A inflação tinha atingido mais
que muito frequentemente
os oficiais do Kuomin-tangvendiamoç os funcionários e as classes médias assalariados do que os trabalha-
seus exércitos aos comunistas.
dores industriais. Em Março de 1948, um professor universitário
A reforma monetária de Agosto de 1948, criando o yuan de ouro,
ganhava 10 milhões de dólares chineses, equivalente a 20 dólares
tinha sido preparada com tal segredoque até os conselheirosame- americanas ou 7000 francos franceses ("). Não tinha possibilidade
ricanos do governo chinês não tinham disso sido informados. Mas de obter rendimentoscomplementares
a estesaláriode fome. Não
cedo se viu que o -secretáriogeral do Ministério das Finanças tinha surpreende que, nestas condições,«as classes cultivadas e intelec-
organizado na Bolsa de Xangai a sua própria pequena especulação,

(")«/Vede Z#rcóef Zàíwmg», 9.9.48.


(") Belden, op. cif., p. 376. («)«U. .ç. re/afia i wiró Calma», p. 758.
(")«Nem yoré Hera/d Tr/&a#e», 8.7.47; o general Wedemeyer estende Ç«) <U. S. retations witb Cbitta», p. ]99.
esta conclusãoa toda a Clüna(«U. S. re/a/ia f l/ó CÓ/#a»,p. 759). (") «Neve Záírcóef Zeü##g», 15.6.48 (Nota da tradução: os 7000 írs. men
(") Belden, op. c/f., p. 376. clonados são francos veios, a que correspondem 700 frs. actuais.

30

l
tuais se tenham, quase completamente alienado do regime» ("), e cial para julgar as«insubordhações de estudantes».Milhares de estu-
dantes e várias centenas de professores foram afastados das escolas
assinalema sua hostilidade com imponentes movimentos de protesto
centrados à vara das universidades. secundárias e superiores (").
Em 1946 houve -sobretudo manifestações para saudar a conclu- Por sua vez, também o movimento operado conheceu,durante
são da trégua, ma:sos manifestantes que aclamaram tanto os dirigen- os primeiros anos do pos-guerra, um período de forte ascenso nos
grandes centros industriais. Durante o ano de 1946 houve 1600 gre-
gentes do Kuomintang como os do PC chinês, foram atacados pela
vesem Xangai("). Foi conquistadaa escolamóvelde s-alários
e os
polícia e pelo exército. Em Schuchow,12 estudantesforam mortos trabalhadores obtiveram numerosos prémios suplementares para
e 25 foram feridos. O director da Escola secundáriafoi também
morto. Em Kunming, dois professoresforam assassinados depoisde neutralizar os piores efeitos da inflação. Em 1947 eclodiu nova vaga
de greves, que, em Maio, levou quase à greve geral em Xangai, como
ter falado numa reunião em favor da trégua ("). Em 1974 o movi-
protesto contra a supressão temporária do sistema de escala mó-
mento foi muito mais amplo. Os estudantesdas universidadesde
vel ("), que foi restaurado. Em 1948, no entanto, a aceleração do
Xangai, Pequim, e Nanquim proclamarama greve geral. 3000 estu-
movimento inflacionário e o agravamento da situação militar pro-
dantes da Escola Superior de Transportes ocuparam a gare do Norte
vocaramum períodode recuodo movimentooperário.A luta pelas
de Xangai, apoderaram-sedum comboio e quiseram seguir para Nan-
necessidades
individuais e familiaresvitais -subrepâs-se
a tudo. Sob
quim a fim de discutir com o governo ('o). Os estudantesç)rocura-
o peso da apatia, a população começou a apelar para o exército no
ram organizar a greve geral para 2 de Junho. A repressãofoi rápida sentido de resolver as suasdificuldades. Houve então somenteper-
e violenta. Milhares de soldadose polícias cercaramas universidades
turbaçõescausadaspela fome e tumultos devidos à escassezde arroz.
de Xangai e de Nanquim, prendendo e agredido centenas de estu-
A autoridade do Estado desapareceupor completo. O desejo de
dantes.Em Hankow e Chungking, o número de vítimas foi ta-mbém
paz era universal. Todas as classes da nação estavam desgostosos do
elevado. 923 prisões, várias dezenasde mortos e um milhar de feri-
dos, tal foi o balanço do movimento estudantil de 1974 (':). regime.Mas faltava ainda que uma classeIhe aplicasseo golpe de
misericórdia. Foram -as insuneições camponesas que denubaram
Em 1948, o -movimento recomeçou durante a Primavera. Em
Tcang Kai-chek.
Pequim, uma manifestaçãode massachocou-secom uma barragem
da polícia. Houve dos dois lados numerososmortos e feridos. Em
Kunming, a 15 de Julho de 1948, a polícia organizouum raide à
Universidade, -matou5 estudantes,feriu uma centenae prendeu 1200,
A questão agrária
300 dos quais foram enviados para um campode concentração.Os
O desigual desenvolvimento histórico da China teH o seu mais
presosforam submetidosa infamestorturas; 30 delesforam enter-
fiel reflexo na desigualdade do desenvolvimento da agricultura das
rados vivos. Em Agosto de 1948, foi constituído um tribunal espe-
diferentes regiões chínes-as.Assim, é impossível dar um quadro sim-

(") «Fbe TjmeJ2B, 19.5.48.


(') Belden,op. cif., pp. 404--«U. S. re/af;o s wifó Cóí#a», pp. 277
(") Belden, op. ci/., p. 399.
8G9e 8n2.--«Nele Ziifcber Zeitung», Tl:i.4g.
(n) «U.S. re/afia J wifb CÓ/ a», pp. 238 e 239.--«Nele Záífc&er
(n)«Neve Zâircóer Zeíf##g», 12.8.47.
Zei/w#g», 21 .5.47 -- «Le Soir», 22.5.47.
(" )«Nieziwe Roffetdamscbe Coufalzt», 12.5.4?.
(') Belden, op. cif., pp. 401 e 402.

32
}
pies das relações de classe na aldeia chinesa, visto que essasrelações Em 1936, o professor Creu Han-sung calculou que 65 % do
variam enormemente de região para região. Con-tudo, é possível campesinato chinês ou não possui nenhuma terra ou possui dema-
chegar a um certo número de genaalizações.A agricultura das pro- siado pouca para ocorrer às suas necessidades (").
víncias á s#J do Yangtzé é em geral mais avançadado que a das pro- A agricultura chinesa caracteriza-setambém por uma forte dife-
víncias setentrionais; no norte, por sua vez, quanto mais nos afas- renciação da/arma de pagame#/o da renda agrária. Esta renda, em
tamos da costa e das principais linhas de caminho-de-ferro mais au- espécie, ou se paga numa quantidade fixa ou através duma parte da
mentam as sobrevivências feudais da agri(:ultura("). Na Colina meri- colheita anual. Em geral, as culturas industriais(algodão, chá) pa-
dional, as propriedadessão de di-mençãomédia inferior à das exis- gam renda em dinheiro; as cultura-s alimentares pagam predominan-
tentes na China setentrional. Mas essadiferença apenasexprime a temente renda em espécie. Esta renda é extrem.amente elevada. As
pobreza da agricultura no norte, incapaz de assegurar a subsistência fontes oficiais do Kuomintang fixam-na«em média» em 40-60 %
dos camponeses com base em parcelas mais pequenas. Enquanto que da colheita, mas em numerososcasosos proprietários fundiários re-
no sd da China apenas metade das propriedades tem superfície su- cebemmais de 60 % da calhei-ta,como o demonstram os números
perior a 0,66 ha. e 30 % superior a 1,3.ha.,na China setentrional seguintes:
75 % das propriedades têm mais de 0,66 ha., pelo menos 50 'Xo mais
de 1,3 ha. e IÍ5 % mais de 2 ha. Estesnúmeros indicaKntambém as Percentagem das propriedades pagattdo sobre a colheita
(! ínensões médias, extremamente reduzidas, das propriedades chi-
nesas ("). . . ProuÍHciü De .50d 60 % De 60 d 70 % Mais de 70 qa
No norte da China predomina o sistema da pequena propriedade
fundiária; no sul, a maioria das camponeses são rendeiros e meeiros. topei 6,9 ! 16,0
No entanto, o número de camponesesindependentesdiminuiu for- Szechwan 28,9 21,7
temente em toda a China a partir do princípio do século, como a Shantung 3,4 9,4
reconhecem as fontes oficiais do Kuomintang. Em certas províncias
Suiyuan 6,3 12,5
da China meridional, a percentagem de camponeses proprietários
FIOIIatI.....8BBB-'gBl9.+«8.«&
! 11,0 i 13,6
das suasterras desceu a níveis muito baixos: na província de Chekiang
Shansi 24,8 14,3
(ao sul de Xangai e ao longo do mar) é de 18 %;, na rica província
de Kwantung, (na qual se situa Cantão) é de 21 %; na província de Fukien 19,3 9,7
Fukieng, entre Chekiang e Kwantung, é de 25 %, etc. Quanto mais Xa1lgai 9,] 4,5
a agricultura se capitalizou, mais a pequenapropriedaderecuou ante Hunan ÍÕJ 51
Q arrendamento
e o contratode meios("). Kansu 4,9 4,9
Etc. (")
(') Huold lsaacs: «Tóe Tfagedy o/ fóe Cói ese ReuoZ#/io#»,Seeker
& 'D7otburg, N. lorque, 1938, p. 28--Belden, op. cf/., P. 115
(') «Cój a H d&ooê», pp 609 e 610. (") <<.4graria# Proa/ems f# So /óef CBf#a», citado por lsaacs: «Tóe
(n) «CÓj#a Ha#dboo&», p 605. Lê-se aí:«.4 propriedade/w#d/arfa fe#z-ie Tradegy» p. 29.
a àn cada uez mais tias mãos d«m pequeno grtlpo de pessoas»,
coneentra ('p) lójd., p. 68.

34
índia. Devido à falta de terras, o proprietário fundiário tem inte-
resse em manter a produção nos limites da pequena cultura inten-
siva, semelhante à cultura hortícula, sem uso de métodos de produ-
ção e dos instrumentos técnicos modernos. Cada ano, o sobreproduto
e uma parte do produto necessáriosãosubtraídosà agricultura e vão
alimentar e enriqueceros proprietários, os burocratase os inúmeros
oficiais. Esta crise permanente da agricultura não pode ser resolvida
a menos que os proprietários sejam expropriados, seja tornada im-
possível, pela nacionalização do solo, uma nova concentração das ter-
ras, seja interditada a venda e compra de terras, e o campo possa ser
capaz de fornecer à cidade um mercado para uma indústria que, par
sua vez, fornecerá ao campo os in'strumentoscapazesde desenvol-
ver consideravelmente a produção agrícola.
Além desta causa fundamental da pobreza do camponêsna China,
outros :males, por acréscimo, o atormentam, os principais dos quais
são as sobrevivênciasfeudais, a usura e os impostos exorbitantes.
As sobrevivências feudais são múltiplas na China setentrional e
mesmo em certas províncias interiores da China meridional. Não
muito longe de Xangai, pode-sever os castelosde laimados proprie-
tários fundiários rodeados das míseras choças dos camponeses.
O <<senhor»de cada sa/ (unidade social composta de várias aldeias)
é, simultaneamente,juiz, comerciante, cobrador de impostos, usu-
rário e carrasco.Possui o seu próprio exército recrutado na base do
«voluntariato>> entre os servos e os camponeses pobres da região.
Estes proprietários fundiários dispõem praticamentedum poder
absoluto sobre a existência de toda a populaçãodo seu iai. As cor-
veias, os direitos senhoriais e a concubinagem existem em grande
escala(").
A usura é a consequênciadirecta da exorbitante taxa de renda,
que impede a constituiçãopelos camponeses
do mínimo fundo de
reserva. Expandiu-se consideravelmente com a comefcia/lzação da
agricultura, que -sujeita o v-dor das colheitas às flutuações do mercado

(") Agnes Smedley, artigo citado--Belden, op. cií., pp. 155 e 158

37
36
mundial. Se por causasnaturaisou por efeito do movimentodos çado até ao paroxismo como nos últimos anos de domínio do Kuo-
pi'eços o produto da colheita coloca o arrendatário na impossibili- mintang. Além do imposto sobre a terra, havia dezenasde impostos
dade de pagar os seusimpostos ao Estado e a fenda ao proprietário, suplementares diferentes, que, a partir de 1941, começaram a ser
é obriga(io a pedir dilüeiro emprestadoâo usurário, que é em geral cobrados em espécie. Em 1942 foram estabelecidos monopólios do
Estado para a venda de sal, açúcar, tabaco e fósforos ("). Ao
o próprio pr(4)rietário ou um membro da família deste.Ver-se-ácam
frequência obrigado a obter por empréstimo as sementespara a época mesmo tempo, foi estabelecido e ampliado o sistema de requisições
seguinte, ou até mesmo certa quantidade de géneros aliment-ares par:a militares sobre a mão-de-obrae os produtos agrícolas, que singra-
dar à família a -suamagraraçãodiária de illilho ou de arroz.As ta- ram até à exaustãoregiõesinteiras. No já citado artigo do escritor
xas de juro eram exuemamente elevadas e subiram incessantemente Pei Wen-chung conta-se que na província de limpei ninguém queria
nos últimas anos. Nas vésperas da guerra, esta's taxas atingiram 40 a aceitarum mzoz/de terra como oferta, porque a taxa especialexcedia
60 % ao ano. Durante a guerra, uluapassaram os 100 % por /rf' efectivamentetodo o rendimento anual que se poderia tirar dessa
mestre. Nestas condições, quem poderia admirar-se par a mais bela parcelade terra. Belden cita casosem que o imposto especialsobre
casa de cada aldeia ou vila ser o estabelecimento do prestamista sob a terraultrapassava
em 100% a produção
-anualna planíciede
caução? Ou ainda, que os camponeses pobres da provínda de Shansi Chengtu. E na província de Honan, o mesmo autor descobriu um
usem este amargo provérbio:«Nos bons anos, o proprietário tem casoem que as requisiçõesmilitares do exército do Kuomintang fo-
as colheitas que para ele crescem nos campos; nos maus anos, tem ram /#iZ z,fazes
i per/ares ao impôs-to sobre a terra. Isso envolvia um
o dinheiro que para dle cresceem casa»(") significado muito preciso:os camponesesnão perdiam apenasa terra,
No decurso da guerra, as quatro famílias procuraram chamar a si os seus alimentos e o seu vestuário; deviam ainda vender as suas
os consideráveislucros realizadospela usura. Os bancosagrícolas, mulheres e os seus filhos, como concubinas ou servos, aos cobradores
e sobretudo as cooperativasrurais«estatais», que, antes da guerra, de impostos e aos oficiais encarregados das requisições (").
não tinham adiantado mais do que 15 % das somas emprestadas aos Embora 0 7 0do Ze exp/opçãopredominante na agricultura fosse
camponeses, passaram a fornecer 80 %. Estas cooperativas empres' o da pequena produção, a contínua expropriação dos pequenas campo-
Lavam o dinheiro -aos chefes de -aldeia e aos pequenos proprietários neses,por efeito das muito elevadas taxas da rend-a,da usura e dos im.
postos, levou à concentração da pmpriedade nas mãos dos <<notáveis>>
fundiários, que, por sua vez, o emprestavam ao camponês.Tal c(ymo
na célebrecaricaturado tempo da guerra dos camponeses,
a arren- das aldeias, dos usurários e dos comerciantes-usurários-«como.Mo-
datário era o.único a suportar o peso de todas estas belas instimições rei». Não é raro -encon-traiprol)rietários possuindo20 000«mou»
(1300 ha) ou mais. 10 % da população agrícola da China -- «senho-
que o esmagavame o competiam à revolta.
O carácter exorbitante dos impostos já por muitas vezes fora res» e camponeses ricos -- possuem 55 a 65 % das terras. Na pro-
víncia de Shansi, 0,3 % das famílias possui 25 % das terras. Na de
posto em relevo. Através da história da China, são inúmeros os
exemplos de insuportáveis sistemas de impostos que levamm os Chekiang, 3,3 % das famílias possuem metade das terras, enquanto
que 77 % dos camponeses pobres apenas possuem 20 % das terras.
camponeses'à revolta .("). Mas nunca este sistema tixüa sido for-
E no Kwangtung, aonde 2 % das famílias possuem 53 % das terras,

:,.;i=H;Ü8€DGa;93;E
tbe ChinesaRepolütion»,P. 3.
(") CBi#a Ha#dóooê», p. 200 e 204
(") Belden,op. cif., pp. 157 e 158.

38 39
revelou-sefatal em todos os planos. Militarmente, alongouem ex
tremo as linhas de comunicaçãodos exércitos governamentaise con-
duziu ao seu isolamento e ao seu cerco total, longe dos censos de
reabastecimentoe dos centros vitais da China central. Politicamente,
obrigou o PC chinês a proclamar a reforma agrária para obter o apoio
activo do campesina-to.E socialmente,provocou a indignada hosti-
lidade desse mesmo campesinato pelos vexames e represálias que
Ihe foram infligidos e desencadeou assim sublevações em tal escala
A derrocada de Tchang Kai-chek que a queda do Kuomintang se tornou inevitável.
Em vão os conselheirosamericanos,incluindo o próprio general
Wedemeyer, desaconseham Tchang Kai-chek a operação mandchú,
propondo-lhe a prévia consolidação das suas posições na planície
do Norte ('9). O marechal via-se obrigado a tentar a sua sorte, tal
como tinha sido obrigado a sabotar o acordo com Mao Tse-tung.
Tch.angtinha utiLzado com êxito esta táctica para esmagara
revolução de 1927. Mas as forças revolucionárias eram então pouco
numerosas e estavam isoladas. Agora, estendiam-se por todo o país.
Foi por isso que em 1927 a acção-relâmpagoduma força concentrada
permitiu o esmagamento sucessivo dos principais centros revolucio-
nários, enquanto que, vinte anos mais tarde, essamesmaforça con-
centrada se viu ultrapassadapor todos o lados pela extensão das
sublevações.
A princípio, a acçãodo marechalpareciaobter sucesso.Em 23 de
Maio de 1946 as forças governamentais apoderaram-seda importante
cidade de Tchang-chung, na Mandchúria; os comunistas foram obri-
gados a levantar o cerco a Tatung, importante centro de comuni-
caçõesna província de Shansi. Em 10 de Outubro, as tropas gover-
namentais tomaram Chi-Feng, último centro comunista importante
na província de Jehol, bem como a grande cidade de Kalgan. Em No-
vembro ocuparam a cidade de Tanghua, na Mandchúria, e, final-
mente, em Março de 1947 ocuparam Yenan, que tinha sido a capital
camunísta durante a guerra com o Japão.

(") «U.S. reZafío s wifó Cbí a», pp 131 e 132


(B) Belden, OP. cjf-, pp' 149 e 150

40
l
PC chinês. É certo que essadiferença existiu e que, conforme as re-
Estes rápidos êxitos só foram possíveis porque o comando comu-
gras fundamentais da arte militar, os chefes comunistas procuraram,
nista evitou deixar-se arrastar para grandes acções.As tropas comu-
nistas retiraram sistematicamente das cidades para o campo, conten-
acimade tudo, destruir o inimigo ("), ao passaque os generaisdo
Kuomintang procuravam ocupar as grandescidades.Mas estasdife-
tavam-se com cortar as linhas de comunicação entre os cen-tios urba-
rentes estratégicasreflectem as diferenças de estrutura dos dois exér-
nos ocupados pelas tropas governamentais e em sujeitar estas a cons-
citos e a diferença da sua função social. Como exército de conser-
tantes esca.ramuças.
Se bem que no princípio de 1947 as tropas do
vação social, arras:bandoconsigo uma coorte in-terminável de para-
Kuamin-gang ainda conservassem superioridade numérica de dois
sitas, vivendo à custa do país e universalmentedetestada,perdendo
para um, e aindamaior superioridade
em armas,a imobilizaçãode
constantemente forças quando em manha por efeito das deserções
importantes contingentesdo Kuomintang, utilizados como guarni-
ções das cidades, fez pender rapidamente a vantagem de iniciativa
e por falta de desvelo;coroadodasbasesde apoiono sul e, por isso,
obrigado a agrupar-se à volta dos campos de aviação para receber
para as tropas comunistas.
Essa iniciativa foi utilizada pelos comunistas numa manobra o seureabastecimentopor via aérea-- o exército de TchangKai-chek
audaciosa, plenamente coroada de êxito. Os exércitos do general era pesado, estático, e cingido ao terreno, via-se espicaçadocons-
11 comunista Liu Po-cheng, a partir de posições em Shantung, perto tantemente pela guerrilha e cada vez mais exposto à desmoraliza-
do mar, marcharamem direcçãoà provínciade Honan, na China ção. Como exército de revolução social, procurando conscientemente
central, separando as forças governamentais que tinham conquistado captar a simpatia dos camponeses pela partilha das terras e dos s/ocas
Yenan a oeste, das principais forças do Kuomintang na região de de víveres("), capazde dividir-se em inúmerascolunasque, no de-
Suchow-Nanquim. As forças do general Liu atingiram o Yangtzé e curso da marcha, se tornariaim exércitos, engrossadospelos campo-
começarama atravessa-loem Junho de 1947. Foram seguidaspor nesesem revolta; sem trem nem bagagense limitandc-se a um abas-
outras forças comunistase uma nova frente foi aberta pelas tropas tecimento dos mais frugais de acordo com a populaçãocuja região
comunistas sobre as duas ilhotas do Yangtzé na China central. Ao atravessa-- o exército de Mao Tse-tung era duma mobilidade ex-
mesmo temi)o, Liu prosseguiu na su'amarcha e, no Outono de 1947, trema, que a força do inimigo não conseguia fixar, utilizando com
acabou por estabelecer o seu quartel general nas montanhas entre uim -sucessosempre renovado a táctica da infiltração e vendo o seu
Nanquim e Hankow, no próprio coraçãodo Kuomintang,de onde moral elevar-se a cada novo êxito e a cada nova expansão das suble-
foram dirigidos, em 1948, os ataquesdecisivoscontra as forças vações camponesas. Qualquer que fosse a estratégia de Tchang, a
governamentais ("). Assim começou 'a desenhar-se a grandiosa ma- guerra civil estava antecipadamente perdida para ele
nobra de cerco, que, em 1948, iria isolar e destruir o grupo de tr(4)as A par e passoque as operaçõesmilitares se alargavama um nú-
do Kuomintang na batalha de Suchow. mero crescentemente elevado de províncias e cantões, alargavam-se e
No entanto, seria injusto reduzir o sucessodas manobrascomu- acentuavam-se tanmbém as sublevações dos camponeses, que tinham
nistas e o malogro das 'manobras governamentais apenas à diferença hesitado até ao Verão de 1946. Nesse momento, após imescs de hesi-
de capacidadeestratégicaentre os generaisdo Kuomintang e os do

(') Directivas militares dadaspor Mao Tse-tung no seu discurso do Natal


(") Belden, OP. cfí., pp. 360 e 361-- O relatório das operaçõestnilitares de 1947 -- Belden, op. cií., p. 132.
baseia-se essencialmente nos telegramas de A. Steele para o«New Ym& HeraZd
(") Belden, op. cif., pp. 361 e 381.
TtibwHe>».

43
42
A derrocada já não podia tardar: mas os comunistas tinham com-
preendido que a vitória mais fácil e mais esmagadoranão era a que
se obtinha no campo de batalha, mas sim a que se ganhavasobre o
espírito e os coraçõesdo exército adverso.A partir de 1948 concen-
traram todas as suas forças na desagregação dos exérci:tos governa-
mentais. A estrutura democráticado seu exército, a ausênciade pri-
vilégios dos oficiais, os cuidados dispensados aos seus soldados, as
atençõescom que foram tratadas os prisioneiros,tudo isso prepa'
rou uma inversão radical da -situação.Já profundamente desmorali-
zados. os oficial-s de TChang Kai-chek brutalizavam os seus próprios
soldados desde os primeiros revezes militares, tal como o regime de
Tchang Kai-chek esmagara os seus próprios camponeses. Milhares de
feridos foram abandonadas sem assistência; centenas de milhares de
soldados,desprovidos de alimentação e de vestuário, nem sequercon-
tinuavam a receber o seu soldo (''). Foi sobre estes destacamentos
que os comunistas concentraram os seus esforços, esforços de con-
fraternização.A partir de Maio de 1947, a imprensa informava que
destacamentos especiais de «vigílância>> deviam impedir as deser-
ções maciças das tropas governamentais ]la Mandchúria (") . Em Ja-
neiro de 1947, toda a 27.' divisão, equipada pelos aimericanas,se
tinha passadopara o campocomunista ("). Um ano mais tarde, este
movimento tornou-se irresistível. Em Setembro de 1948, Tsinan,
capital de Shantung, foi conquistada graças à deserção das tropas do
general que defendia a cidade. No mesmo mês e ao mesmo tempo
que outros centros, a importante cidade de Kaifeng também se
rendeu. Em algumas semanas,Tchang Kai-chek perdera três exér-
citos e 300 000 homens. A situação dos seus melhores exércitos na
Mandchúria tornou-se insustentável. Cercadosem Tchangcllung, o
40.' e o 7.' exércitos governamentais perderam em algumas semanas
13 000 soldadose oficiais passadospara o campocomunista,e depois
renderam-sequase scm combate. Em Chinchow, uma outra cidade
=:::==:=='5'=:;:i3a:» =:;=r',;.
'..".",''», ''' (") «Tóe Tjmelap, 20.11.48
(n) «New Yor& linaZd I'ribune», 8.7.47 m as linhas em (") «Nele Z#rcóer ZeÍfz/mg», 27.6.47
(") Belden, oP. cif, P..406 (") Belden, op. cif., p. 351
dez dias, em Outubro de 1948.
4j
44
r
[ 2 Natureza .e perspectivas da China
de Mao Tse-tung
Em l de Outubro de 1949, da Porta da Paz Celeste em Pequim,
Mao Tse-tung proclamou a República Popular da China.-- As ope-
rações militares não estavam terminadas nesta data. Cantão, metró-
pole da Chinameridional,só caiu 15 dias mais tarde; Chungking
foi ocupadano fim de Ou-tubro, e Kunming, capital da última pro-
víncia do sudoeste a ser libertada; o Yunan foi tomado em 10 de
Dezembro. No entanto, é sem dúvida do l.' de Outubro que data
a constituição dum novo poder central em toda a China, no qual o
PC chinês desempenha um papel importante.
Mao Tse-tung proclamou a República Popular da China em nome
dum pré-Parlamento,o ConselhoConsultivo Político do Povo, reu-
nido em Pequim de 21 de Setembro a l de Dezembro e que adoptou
um programagovernamentale uma Constituição Provisória. Era um
organismo nomeado de cima pelo PC chinês, pelas diferentes organi-
zaçõesde massaque ele controlava, bem como pelos outros partidos
políticos que participavam no governo. É de facto uIHâg/úmdeco//-
gação--cujo nome oficial é Conselho Central do Governo do Povo--
que administra hoje a China. Este governo presta periodicamente
contas, não ao Conselho Consultivo Político do Povo,, organismo
complicado com os seus 576 membros, mas ao Comité Nacional
desseConselho, composto de 149 membros. Mao Tse-tung, que é
simultaneamentepresidente da República, presidente do Conselho
Governamental Central do Povo e presidente do Comité Nacional
do Conselho Consultivo Político do Povo, reúne assim nas suasmãos
todos os poderes legislativos e -executivos da República popular.
O actual governo de coligação não representa um simples ornato
destinado a enganar o público. Dentre os partidos políticos que parti-
cipam)t
na coligaçãoao lado do PC chinês,dois devem ser conside-
rados como verdadeiros representantes de classes sociais diferentes
do proletariado
e do campesinato
pobre.A l,iga Democr.í/ica
da
China, interditada pela ditadura de Tchang Kai-chek em 13 de Ou-
tubro de 1947, agrupa numerososprofessores,sábios e intelectuais

47
46
que as antigas relaçõesde propriedade. Existem .4ssociúçõesCam-
ponesas, que contam dezenas de milhares de camponeses, que exe-
cutam a reforma agrária e estão localmente investidas de todo o
poder. Os comités populares, a princípio verdadeiros órgãos revolu-
cionários do campesinatoinsurrecto, desenvolvem-sena China cen-
tral e meridional, aondea reforma agrária apenascomeça;sãocons-
tituídos em metadepor membros(incluindo o juiz principal e os
juízes assistentes) omeúdoi pelas autoridades do distrito, e no res-
taHte por uma série de membros eleitos pelos organismos camponeses
de base ("). Começamtambém a ser eleitos os organismossuperio-
res (autoridadesde distrito e de cantão).É só quandose atinge
o nível de província que se encontram autoridadesexclusivamente
nomeadas de cima, e o mesmo acontece também quanto aos imuni-
cípios das grandescidades, directamentedependentesdo poder cen-
tral. Do ponto de vista formal, o Estadopopular chinêssurgecomo
uma democraciaagrária coroada por uma ditadura política exercida
principalmente pelo PC.

A luta contra o caos económico

No momento da constituição do governo central do povo, a der-


rocadado poder do Kuamintang tilüa desenvolvidoem extremo to-
dos os factores de decomposição económica que caracterizavam a
autoridades.
sociedade chinesa desde há várias décadas. -- A inflação galopante
fazia furor.-- A troca tinha substituído o comércio.A indústria

::==lCEiSHall EI
estava paralisada. As classes médias estavam arruinadas. As relações
entre as cidades e os campos achavam-se interrompidas. As forças
produtivas tinham caído em ruínas. As inundações,a fome, e as epi-
demias acumulavam as devastações no caminho de retirada dos exér-
(") mean.Jacques Brieux:«La Cói#e d# Rácio aZlsme a# ComWnisme», citos de Tchang Kai-chek.
Dos três objectivos fundamentais da revolução burguesa a atin-
gir na China -- solução da questão agrária, eliminação da influência

(") <rNemCói#e N'e s J4geqr», 26.7.50,P. 2


de 21.10.50.
49
início, que limitou fortemente os estragosda inflação. Em vez de
impar um curso oficial ao <KYenMin-Pao» (dólar do povo) e provo-
car assim a acentuada ruína de todos os que recebiam ordenados fixos,
o governo chinês aplicou a isca/a móue/ a todos os salários, ordenados
e contas bancárias.Foi criada uma «unidade paritária», designada
por F. E. N., igual ao preço médio por grossode 3,6 kg (6 catties)
de arroz ou de milho nas seis maiores cidades da China("). O poder
de compra da maior parte da população urbana, expresso nesta
<<unidadepari-teria», encontrou-se desde logo estabilizado, permitindo
as-simuma primeira reactivaçãocomerciale industrial que limitou
os efeitos da inflação e da especulação.
Depois, o governo empenhou-se em reduzir radicalmente o
dé//file orçamem/a/,por três meios: primeiro, pela centralizaçãodos
impostos.Por um lado, isso eliminava dum só golpe a principal fonte
da corrupção sob o regime do Kuomintang,- que consistia em que o
proprietário fundiário, ele mesmo as mais das vezes cobrador de im-
postos na aldeia, não pagava taxas e fazia desaparecer nos seus pró-
prios bolsos a maior parte dos impostos arrancadas aos camponeses.
Por outro lado, isso restabelecia ao mesmo tempo a fgzzaZdade/isca/
da cidade e do campo, criando numerosas sobretaxas sobre os produ-
tos de luxo(vinhos, licores, cosméticos,cigarros de luxo, etc., one-
rados de 60 a 120 %). Em segundo lugar, pela realização de impor-
tantes lucros nas grandes empresas industriais, comerciais e bancá-
rias do Estado. Em terceiro lugar, pela emissão dum empa:éstimo
forçado, chamado«Empréstimo da Vitória», que, não sem brutali-
dade frequente("), era arrancado pelos funcionários comunistas
aos meios possuidores das cidades e dos campos. Como os rendimen-
tos normais do Estado cobriam já 80 % das despesas(contra 33 %
em 19491), este empréstimo absorveu por sua vez perto de 2/5 do
deficit restante, devendo o lesto ser coberto pela emissão de novas
notas (").

(" )«Problàmes Economia es», 25.4.5Q.


(") Discurso do vice-presidente Liu Shao-chi, op. c;ff
(") «Proa/erres Eco omlgzref», 25.4.50.
(") «praz'ZêmeJ Eco omígz/es», 14.10.50.

jo
Cantão de 13 de Março a 13 de Abril, 25 % em Hankeu sobre o
preço do arroz, etc. (").
A contenção da inflação criou as condições preliminares à reac-
tivação industrial. Mas apenas as condições preliminares: porque
toda a herançado passadocontinuava a exercer forte peso sobre a
vida económica da China. Uma grande parte da utensilagem industrial
continuava inutilizada. Mesmo na Mandchúria, onde a reactivação
pede efectuar-seum ano mais cedo, a pmdução indu-strial no fim
de 1949 atingiu apenas29 % do nível de 1943 (';). Foi lentamente
que as forças produtivas recuperaram, favorecidas contudo e desde
logo pela restauração da agricultura, do sistema de transportes e,
sobretudo,do primeira ano de verdadeirapaz interior que a China
conheceu depois de meio século.

A estrutura da indústria e do comércio

A luta vitoriosa contra a inflação não constituía somente uma


condição prévia e indispensável à reactivação industrial na China;
tinha ta-mbémpermitido ao governo central modifica-r sensivelmente
as relações entre o sector estatal e o sector privado na indústria e,
sobretudo, no comércio.
Ao decretara expropriação
semindemnização
do«capital buro-
crático>>pertencente às quatro famílias monopolistas da grande bur-
guesia chinesa("), o Conselho Consultivo Político do Povo deu em
Setembrode 1949 ao Estado o domíMo das posições-chave
da ccch
comia nacional. Se bem que as opiniões variem acercado peso exacto

(")«Proa/êmer Eco#omig es»,20.6.50: a maior parte dos relatórios sobre


a China, reproduzidos por esta revista editada pela«Dacwme /a/ia Fr faísca»
são da autoria do conselheiro comercial da Fiança na China.
(") Relatóriode Kao Kang, chefedo governoda Mandchúria,ao l.' Con-
gressodo PC mandchúde 13 de Marçode 1950,in«l«z sff a/fa i féria re e
Cbize», ll, («l.a Docamentalion h'atiçaise»).
(") Ver a l.' parte do nosso artigo,«Q /rfême l fer //o a/ea», Maio/
/Julho 1950.
luiuç.(oí) «New Cbi#a NewJ z4ge#Cy»,20.9.50.

j2
r'
inflação significou também a paragem da caçaaos produtos de toda
do sector estatal na economia, o peso deste sector, segundo as ava-
a espécie
e o restabelecimento
do funcionamento
dasleisdo mer-
liações mais moderadas, representa, nos (diferentes ramos industriais cado. Viu-se então que em numerosas firmas tinha havido uma falsa
da China a sul da GrandeMurcha:
prosperidade devida a compras especulativas no período inflacionista;
as suasvendasbaixaram bruscamente.Viu-se também que nume-
Metalurgia: 60 %
rosas firmas tinham abandonado todo o cálculo de produtividade
Indústria petrolífera: 53 %
durante o período em que«tudo se vendia»; houve também entre
Têxteis:55 %
elas muitas interrupções do trabalho. Foi encerradogrande número
Indústria imecânica: 70 %
de fábricas,especialmente
em Xangai, aondede 4671 fábricasl:e-
Indústria eléctrica: 62 %
censeadasem 41 ramos, 3205 estavamem funcionamento em Abril,
Indústriacimenteira:37'Zo
de 1950,o que correspondia
a umaparagem
de 30% (").
Indústria química; 89 '%o(")
Finalmente, as mudançassociais verificadas no país tinham con-
duzido a uma redistribuiçãodo poder de compraque tornavadesa-
A comissãode inspecçãodo Nordeste, enviada à região da Mand-
dequada a estrutura da indústria das grandes cidades do litoral. Esta
chúria por burgueses de Xangai após a libertação da cidade, calculou
indústria estavade facto voltada em primeiro lugar para a satisfação
em 87,5 % o peso do sector estatal na indústria. Para o conjunto da
das #ecesiid des de Zwxodas antigas classespossuidorase não para
China, é' certo que o capital nacionalizadorepresentaentre 2/3
a satisfação das necessidadesda imensa população camponesa da
e 4/5 do capital industrial. Para apreciarestesnúmeros no seuJusto China (9'). Foram ainda mais importantes as modificações de estru-
valor, é no entanto preciso ter em conta que a indústria chinesa não
tura do comércio,provocadaspela luta do governocontra a inflação.
produz mais do que 10 % do rendimento nacional anual do país Já em 1940, na Mandchúria, 34 % do comércio de retalho e a maior
As medidastomadasno prindpio de 1950 para lutar contra a
parte do comércio grossista passaram para os armazéns e coopera-
inflação provocarama ruína de numerosasempresasindusuiais pri-
tivas do Estado ('o). Para combater eficazmente a inflação, o governo
vadas Antes de mais, o empréstimo forçado foi com frequência im-
tomou, no princípio de 1950, uma série de -medidasde grande alcance.
posto sem ter em atenção as possibilidades reais de tesouraria. De-
Em 14 de Março foram criadasseis empresascomera/afsZo Ef/aZo
pois, a nova legislaçãoem vigor obrigou as empresasindustriais a
para controlar o conjunto do comércio dos produtos alimentares,do
continuar a pagar o salário dos seusempregadose operários, mesmo
sal, do carvão e dos materiais de construção, assim como dos pro-
quando a produção se encontrava parada. Seguiu-sea bancarrota dutos agrícolase de diversasmercadorias.Foram estabelecidasfiliais
em Xangai, aonde o bloqueio nacionalistade numerosasfirmas, so-
destas empresas centralizadas em todas as grandes cidades e provín-
bretudo estrangeiras, -tinha interrompida o abastecimento de ma-
cias; entre as suas atribuições figurava a de dirigir o comércio de
térias primas a numerosasindústrias("). Além disso, a pa'agem da Estado e o direito de«dar di] ectivas à'scompanhias comerciais pri-

(') Tsu Ti-tsín: «lz uie eco omig e de ZaCófne», livro baseado nas esta- (w)«l.a sif afia / /érre re e Cóf#e»11,p. 28.
(') Discursode Líu Shao-chido l.' de Maio de 1950,1oc,cit
tísticas)de 19 designadamente«Nele Ziircóer Zelf##g», l.l0.49 e «l# Soir», (") Relatório de KacbKang, loc, cit.
2.9.50,etc.

j4
são o início dum novo <<rumo ao camponês rico e ao campo» e a aber-
vadascom vista a estabilizaros mercadoslocais>>("') Por efeito
destas -medidas, a rede de armazéns do Estado e das cooperativas
tura duma enérgicaluta para compressãodas despesasdo Estado,
nomeadamentepela desmobilização duma grande parte do exército.
alargou-se rapidamente. Em Agosto verificava-se a eústência de
Esta nova política não tardou a produzir os seusdeitas. O Es-
38.000 cooperativas com 20 milhões de membros, um quarto das
tado passou enormes encomendas à indústria privada, que des-
quais apenasna Mandchúria. Num ano, o número dos seussócios
pertou a olhos vistos do seu marasmo, e à qual concedeugenerosos
passou, na China setentrional, de u-m para seis milhões, e quatro mi-
lhões de novos sócios fomm recrutados na China oriental(":). créditos. A produção de artigos de algodão, na indústria privada de
Xangai, aumentou de 70 % de Março a Agosto; a indústria privada
Ao mesmo tempo, o governo tinha estabelecido sociedades comer-
do papel sextuphcou a sua produção ao mesmo intervalo (:"). O nú-
ciais para o controle do comércio externo, que representavamuma
a no caminho do estabelecimento dum monopólio deste comér- mero de armazénse bazaresdo Estado foi reduzido e não se Ihe per-
mitiu vender mais do que seisdiferentes produtos (:"). A iniciativa
cio. De facto, este monopólio foi estabelecido para um certo número
privada foi encorajada mesmo no domínio da exportação; na Mand-
de produtos: as cerdasde porco, o óleo abrasivo,as pelese os mi-
chúria, o Estado abandonou o monopólio de exportação dos óleos
nerais ("').
No entanto, a estatizaçãocompleta dos meios de produção in- de soja, do algodão e dos óleos de amendoim, anteriormente esta-
dustrial exige um certo nível de desenvolvimentodas forças p'odu- belecido, e fez até revender por firmas privadas, contra comissões
de la 5 %, os produtos para a exportaçãocujo monopólio tinha re-
tivas para corresponder a um critério de eficácia económica.. Foi o
servado ("'). Ao mesmo tempo, foram estabelecidasestreitas relações
que tinha compreendido a direcção do PC chinês desdeantes da con-
entre os dirigentes comunistas da economia e os representantes da
'uista do poder: não tinha, por isso, visto nesse nível de desenvol-
vimento das forças produtivas chinesasa razãopor que, na sua opi' burguesiaindustrial e comercial.No princípio de Junho de 1950,
reuniu-se em Pequim uma conferência dos principais chefes da in-
dão, o socialismo não podia ser directamenteconstruído, e se tor-
nava necessáriopassar, antes disso, por um período misto, semi- dústria privada. Foram ostensivamenteadoptadas,com grandepubli-
cidade, propostas feitas pelo sector privado, como a interdição da
-estatal semi-capitalista, designado por«nova democracia»? O go-
venda de certos produtos pelos armazénsdo Estado ("'). No seu
verno cllinês pareceu mesmo assustado com os resultados radicais da
sua luta contra a inflação. A partir da reunião do Comité Central já citado relatório, Tchen-Yun, presidente da comissãofinanceira e
económica do governo chinês, declarou explicitamente:
do PC chinês, no prindpia de Junho, alguns dias antes da sessãodo
Comité Nacíona[do Caxi«]ho Consultivo Político do Povo, Mao Tse-
Na China, país mal explorado do ponto de vista indu'serial,
-tung deu o sinal de alarme e esl)oçouhabilmente a atirada sdb a
fama duma vadadeira N. E. P. A palavra de oMem des'taN. E. P., o desenvolvimento da indústria e as inversões de capitais nos ra-
mos industriais realizadasdurante um longo período pela iniciativa
retomada mais amplamente nos relatórios ao Comité Nadonal da
C. C. P., é a do«reajustamento das relaçõesentre o sector estatal
e o sector privado na economia».Os dois principais co'soláriosdisso ("' )«Tbe limes», 7.6.iO --«New Cbi#a Naus Agency», 2].1Q.5Q.
(:") Relatório de. Tdien.Yun perante o(bmité Nacional do CCP, em
15.6.50.(«1,dsifm/io i /érfezlree# Cói#e») 1, p. 25.
('")«Pfob/amei Economíg#es», 13.6.50.
(1' ) «Pfoblàmes Ecofiomiq&es», 5.1.2.5ç).
('") «New Cói#a Newi .Agency», boletim de 15.8.50.
(:") «New Cói#a Nemr .4ge#cy»,boletim de 5.6.50
('n)«Pfob/êles Eco#omlg#eJ», 5.12.50.

j6 j7
privada nacional, serão úteis tanto ao Estado como ao povo uma
O prosseguimento da reforma agrária
vez que se revistam dum carácter progressivo. Se bem que o
Como já dissemos, a nova política económica inaugurada por
capital comercial chinês seja causa de inflação nas grandes cida-
des, reconhecemosque a China é um vasto país no qual a pe- Mao Tse-tung em Junho de 1950 contém um «rumo em direcçãoao
camponêsrico». No seu discurso de l de Maio de 1950 atrás citado,
quena produção dispersa desempenhaum papel predomTante
Liu Chão-chi já critica a forma brutal como os quadros comunistas
e que é inevitável a existência de comerciantesprivados.(Rela-
tório de Echen-Yun ao Comité Nacional do C. C. P., <<Asituação impuseram o empréstimo forçado aos camponesesricos. Mas o ver-
interior da China», 1, p. 24). dadeiro problema levantado por esta fracção exploradora dos campos
chineses revestiu-se duma forma aguda quando o governo preparou
A fim de evitar que esta recuperação da indúsuia e do comér- a continuação da reforma agrária a sul do Yangtzé, aonde -tinha sido
cio privadas reproduza a breve prazo o caosde que o país mal aca- suspensaem 1949. A forma como foi abordada e executada esta re-
bava de sair, foram tomadas medidas de organização da vida econó- forma agrária é altamente característica da etapa transitória que
mica que representam o primeiro esboço duma futura planificação- atravessa hoje a China e dos elementos contraditórios canudos na
Em meadosde Judo de 1950 teve lugar uma pri'moira conferência p(iHtica do seu Partido Comunista.
nacional da indústria pesada, que elaborou uma série de«números A direcçãodo PC procurou adiar tanto tempo quanto possível
de controle»para certosramosde indústria, tais comoos do aço, a execuçãoda reforma agrária na China meridional, e isso tanto por
do ferro, da indú-stría mecânica e da indústria química. O objectivo razões económicas como por razões palítícas. Do ponto de vista da
fundamental desta conferência foi o de orientar o desenvolvimento produção, a reforma agrária provoca, inevitavelmente, que mais não
da indústria chinesade forma a modificar a sua estrutura essencial- seja por uma colheita, dificuldades suplementaKS derivadas das per-
mentecolonial de produtora de matérias-primas("'). A incorporação turbaçõesde toda a espécieque origina nas aldeias.Do ponto de
da indústria privada nesta planificação operou-sepela distribuição vista dum movimento revolucionário que se bate pelo poder, essas
de encomendasdo Estado. Estas medidas foram reforçadaspela deci- dificuldades não podem ser consideradas senão como incidentes ex-
são do governo regional da Mandchúria("') no sentido de introduzir traordinários da revolução; na história, nenhuma revolução pede
um:adistribuição planificada e unificada de dez matérias-primas essen- realizar-sesem provocar um certo recuo temporário das forças pro-
ciais a fim de evitar intemlpções sazonaisda pl:odução,sobretudo nas dutivas. O PC chinês encontra-sena situação única de /ef' já co#g#fs-
minas de carvão ("'). Embora a-sautoridades chinesas insistam ins- faZo o poder no momento em que a revolução que exprime ainda
tantemente na necessidade de«não exagerar as possibilidades de não se efectuou na maior parte do território nacionall Os fins pri-
planificação na actual etapa» (:"), é claro que se trata duma série mordiais que ao PC chinês se põem são de naturezaeconómicae já
de experiênciasque servirão para facilitar a preparaçãoduma plani- não social; trata-sede vencer a fome e a inflação e, nesta via, tudo
ficação nacional no momento oportuno. o que leve à reduçãoda produção agrária, mesmosó quanto a uma
co[heita,parece-]henefasto. Este ponto de vista não se limitou a
Ctn) «New Cój a Nemr J4gecy», 21.3.50. pesarmuito no atraso e nas hesitaçõescom que Mao Tse-tung deci-
('el) Existem actualmenteseis regiões administrativas e urna região autó- diu desenvolver a reforma -agrária na China meridional. Imprimiu
noma da Mong6hainterior, cada qual datadade governoregional.
tambémo seucunho às modalidadesde que se revestiu estarefomia
('el)«New China Naus J4ge#cy», l0.3.50.
(iu) «NemCói#aNem.4ge#cy»,21.8.50,P 7. agrária quando finalmente decidida.

j8
Colocando-seassimnum ponto de vista económicoem face do sente actividade desde o fim da guerra no continente ("'). Retirar-
problema agrário,, a direcção do PC chinês optou, ao mesmo tempo -lhes o terreno debaixo dos pés por meio da reforma agrária era
e de forma muito explícita, por uma orientaçãopolítica e social de- decertoum importante objectivo que o PC visava atravésdesta polí-
terminada. O desejo de «li-mirar a fractura», de <<man-ter
um máximo tica. E a existência duma vel:dadeirapressãocamponesapara obter
de estabilidade nos campos», vai contra as aspirações e os desejos a reforma foi francamente reconhecida por fontes comunistas auto-
dos camponeses pobres, que aguardam desde há décadas a sua liber- rizadas ("3).
tação do jugo dos proprietários, dos usurários e dos cobradores de
A fim de preparar a reforma e fazer os camponesesaguardarem
impostos. Ora, como já tínhamos indicado, a burguesia cita(fina re- até após a primeira colheita de 1950, o governo publicou a partir
presenta, na China meridional, o elemento predominante entre os de 28 de Fevereiro de 1950 certas <<directivassobre a diminuição da
proprietários fundiários de numerosas províncias -(":). No entanto , taxa de arrendamento e sobre a cobrança das contribuições em espé
a actual orientação do PC chinês é a dum «bloco>> com essa <<burgu- cie nas zonas recentemente libertadas (::'). Segundo essas directivas,
sia nacional», cujos representantes têm a-ssentoao lado dos dirigentes diversas reduções da taxa de arrendamento seriam decididas pelas
comunistasno governo central da China popular. A reforma agrária diferentes autoridades regionais e provinciais; na região da China
no Sul ameaçavapois atingir essebloco na suaprópria base.A preo- oriental, a limitação a 35 % do máximo da colheita camponesatinha já
cupaçãode não desfazer prematuramente esta aliança pesou sem dú-
sido decidida algumas semanas antes ("' ) . Paralelamente, o governo
vida em muito no atraso com que a reforma agrária foi executada
no Su]
U
estava antes de mais preocupadopor que não diminuissem os seus
próprios rendimentos. Cama certos proprietários fundiários já não
No entanto, razõesque eram em definitivo dominantes, obriga- ousavam reclamar dos camponeseso montante da renda, encontra-
ram o PC chinês a efectuar essareforma; os factores que tinham feito vam-se sem meios para satisfazer as suas obrigações para com o Es-
atrasara suaexecuçãoinfluíram finalmente e sobretudona .suafomla
tado ("'). Por isso as directivas em questão insistiam por que as
de aplicação. Sem reforma agrária no sul da China, parte mais rica e rendas fossem pagas regularmente e por que os proprietários e cam-
mai-s avançada do país, nenhum mercado nacional unificado podia
ponesesliquidassem as suas contribuições. De facto, as directivas
ser criado para os produtos industriais e todos os planos de indus- prescreviamque <<onúmero dos sujeitos ao pagamentodas contri-
trialização do país falhariam. Por outro lado, a não prosseguir com
buições em espécie não será inferior a 90 % do total da população
a reforma agrária no Sul, o PC arriscava-sea perder o apoio do cam- rural».
pesinato meridional no preciso momento em que começava a abrandar
A Lei da ReformaAgrária,anunciada
pelo discursode Mao
o entusiasmoinicial doscamponeses
do Norte pelareformaagrária
Tse-tung de 7 de Junho de 1950 perante o CC do PC chinês
ali realizada. As próprias relações de forças no governo ver-se-iam
(<<100000 quadros estão prontos a iniciar a reforma agrária nas re-
modificadas, a seguir tal evolução; a burguesia teria readquirida con-
fiança no seu futuro, -tanto económicacomo politicamente, e o Sul
tornar-se-ia a base de operaçõesda contra-revolução. De facto, é nesta (":) Ver declaração governamental difundida pela«Nem Cói#z Nemf
parte do país que os bandos pro-kuomintang mantiveram uma inces- '4ge#y», 6.12.50
(:::) «l,a si/ úffo l /éfie re e/ Cófne», 11, p. 20
(t")«La sifwafiofz{Kfétie&reef} Cb{»e»,1, p. 9.
("') Ver a l parte deste artigo('«Q friême l /er a/fo#aZe», Maio/Julho (::') <#l,cz
slf fio i fériez/re
e Cóie»,11,p. 15
de 1950.
ÇI' } <<1.a
sitaation itt êrieare en Cbine», p. 9.

60 6]
piões recém-libertadas»), foi apresentada por Liu Shao-chi em 14 tempo, sem lhes dar remédio, os desvios e a desordem... A rea-
de Junho ao ComitéNacionaldo ConselhoConsultivoll)olíticoe lização pelo governo duma política de manutenção das explora
adoptadafinalmente em 28 de Junho de 1950. Tanto o texto deste ções dos camponeses ricos permitirá neutralizar estes no seu con
discurso como o da Lei explicam as importantes limitações da re- junto e assim será passível proteger melhor os camponesesmé
forma, que já resumimos na fórmula «rumo em direcção ao camponês dios e fazer desapareceruma agitaçãoinútil entre os campone
rico», e que implicam um importante passo atrás em relaçãoà exe- ses...» (Jóia.).
cuçãoda refomia agrária na China setentrional. Liu Shao-chideclarou:
E, para o casodestas advertênciasnão pareceremainda suficien
«Quando da nforma agrária em numerosasregiões da China temente claras, eram acompanhadasduma clara ameaça:
do Norte, de Chantung e da Colina do Nordeste, no período com-
<.Se,em certas regiões, surjam desvios e uma certa desordem
preendido entre Julho de 1946 e Outubro de 1947, as massas
quando do início da reforma agrária, desvios e desordem esses
camponesase os nossos militantes rurais nãa puderam ( 1) se-
que não sejam susceptívei:sde ser rapidamente liquidados, será
guir as directivas publicadasem 4 de Maio de 1946 pelo Comité
necessário suspender a realização da reforma agrária nessas re-
Central do PC chinês, directivas que pediam para considerar
giões a fim de corrigir essesdesvios.. .» ('Jóia.,).
como invioláveis, no essencial,a terra e os bens dos campone-
sesricos bem como dos grandesproprietários fundiários.»(«Para É óbvio que tanto o discursode Liu Shao-chicomo, de resto,
uma paz duradoura...», 21.6.1950). o texto da Lei da Reforma Agrária, diziam claramente que todas as
empresascomerciaise industriais pertencentesaosproprietários fun-
Ao mesmo tempo, explica que o PC se via obrigado naquela diários, aos burgueses citadinos e aos camponesesricos deviam per-
épocaa tolerar os<<excessos>>
para obter o apoio da populaçãopobre
das aldeia.s: manecerintactas. De modo nenhum se punha a questãoda anulação
das (lívidas e hipotecas, que, na China meridional mais do que noutro
lado, constituíam o elemento determinante da miséria do camponês
«... autorizámosos camponeses a requisitar as terras e os
pobre. De resto, a lei mantinha as modalidadesessenciaisquanto à
bens excedentáriosdos camponesesricos e a confiscar todos os
aplicaçãoda partilha das terras, que já estavaem vigor quandoda
bens dos grandesproprietários fundiários, para atenderem certa
reforma agrária no Norte: as terras confiscadasentrarão na posse
medida às necessidades dos camponeses necessitados, para con-
da associaçãocamponesa e serão distribuídas <<dumaforma racional,
seguir a participação dos camponesescom maior entusiasmo re-
uniforme e equitativa aos camponeses
pobres que possuempouca
volucionário na guerra popular de libertação.» (Ibid).
ou nenhuma terra e àqueles privados de outros meios de produção».
Impedir a confiscaçãodas terras não era somenteuma necessi- Os animais de tracção e o'sinstrumentos de trabalho são confiscados
dade económica; era ainda um meio de limitar a actividade revolucio- em conjunto com as terras. As grandes florestas, obras de irrigação,
nária das massas rurais: terras virgens de larga extensão, marinhas de sal, 'minas, lagos, ribei-
ras e portos serão nacionalizadas. As grandes plantações de árvores
«Se os camponesestamaH a iniciativa de começara reforma de chá, campos de amoreiras, etc., já em exploração segundo os mé-
agrária, é preciso dissuade-los disso. . . não se deverá deixar esta- todos de grande cultura, poderão em certos casosser nacionalizados.
belecer a desordeme também não se deverá tolerar pof muito Finalmente, o conjunto desta reforma agrária limitada, aplicar-se-á

62 63
gradualmente neste Inverno, no ano seguinte e até em 1952. É de Ao mesmo tempo e só eln relação a esta província, os campo-
sublinhar que em certas províncias onde a«simbiose>>dos antigos neses pobres assinalavamexistir 1 020 000 ha de terras não regis-
quadros pro-Kuomintang com os quadros comunistas se encon-tra tadas, dos proprietários fundiários e camponeses ricos, sobre as quais
mais adiantada (Yunnan, Szechuan, etc.) a reforma se transfere estes não pagavam taxas. Pode-se apostar que estas diferentes trans-
para 1952 (:''). formações «agitaram>>não pouco as aldeias do Hupei, quaisquer que
Examinaremos mais adiante as consequênciaseconómicasdesta tenham sido os desejos de Liu Shao-chi.
reforma; mas as consequênciaspolíticas e sociais são claras. Dese-
jando-o ou não, o governo vê-se obrigado a instalar uma verdadeira
cZz/a/idade
do poder na China meridional. No plano da província e
A classe operária e a «nova democracia»
do distrito, a maioria dos antigos quadros pemianece; no plano local,
os seus inimigos de classe, os ca'mponesespobres das .4ssociaçõei
Foi com o apoio do campesinatoque o PC chinêspede conquis-
camPOasas,ameaçamtomar de facto todo o poder na execuçãoda
reforma agrária. É em vão que o governo central se esforçapor im- tar o poder e é por isso que a generalização
da reformaabra-riaera
pedir na actual etapa o desenvolvimento da luta de classe nos cam- inevitável. Mas que aconteceuquando os exércitos camponesesen-
pos. Contra a sua vontade, esta luta de classe manifesta-se em todas traram nas grandescidades indus-amaisda China oriental? Para dar
as regiões da China. No próprio momento em que Liu Shao-chi se a esta pergunta a resposta conveniente, é preciso compreender que
pronunciava contra toda a «agitação inútil» entre os camponeses, esses exércitos camponeses foram dirigidos por um partido que
a Nem CÓ/ma Ne i .4gemcy comunicavano seuboletim de ll de tanto pelo seu programa e as suasperspectivaspolíticas, como pela
Junho de 1950 que os camponeses
da província de Hupei tinham tradição, a consciência e a têmpera dos seus quadros -- não tinha
impôs:to uma transformação radical da estrutura das contribuições : brotado do campesinatomas tinha sido e continuavaa ser, após cerca
de três décadas,o porta-palavra do proletariado chinês. Este partido
antet'iormen,te
batia-se, sem dúvida, pelo bloco das «quatro classes», pronu'nciava-se
o conjunto dos proprietários pagava 3,2 % a favor duma colaboraçãocom a «burguesiaindustrial» e tinha cons-
os camponeses
ricos pagavam7,9%
tituído um governo de coligaçãocom os representantesdesta última;
os camponesesmédiospagavam29 %
mas, ao mesmo tempo, afirmava que <<aclasseoperária se tinha tor-
os camponesespobres pagavam 61 %
nado a classedirigente da nação>>
e que não havia mais do que uma
em' 1950 questão de tempo para que a construção duma sociedade socialista
o conjunto dos proprietários paga 50 % pudesse ser iniciada na China.
os camponesesricos pagam 25 % Estes aspectos contraditórios da política do PC chinês reflectem-se
os camponeses médios pagam 15 % fielmente na sua'atitude em relação aos operários e nas reacçõesdo
os camponesespobres pagam 8 % proletariado a seu respeito. Por um lado, desde a sua entrada nas gran-
des cidades,o Exército de Libertação do Povo promete a protecção
("') Texto da reformaagrária(«l,ú iff f/o i/zféfie re de Z Cóf#e»,l, completa da propriedade privada. Reprime todas as tentativas dos tra-
PP. 11-14. balhadorespara criar por sua própria iniciativa essa<'grande:subver-

á4
5
são» anunciada pelo -PC chinês (:"). Mas, ao mesmo tempo, levanta arruínam certas firmas estrangeiras(:"). No entanto, em certas cida-
toda a restrição à acçãoreivindicativa e favoreceo rápido ascensodo des, e em especialmesmo em Xangai, estasvantagenssão neutrali-
movi:mento sindical, que subverte radicalmente as relaçõesde forças zadasem larga medida pelo angustiante crescimento do desemprego
entre patrões (chineses e estrangeiros) e operários. Interpretando à Num proletariado industrial de 1 200 000 pessoas em Xangai,
letra os dirigentes do PC, que falavam do <<papel
dirigente da classe 350 000 aparecem sem trabalho em Dezembro de 1949 -- Janeiro
operária», os operários receberam, com a chegada dos exércitos de 1950 ("'). A evacuaçãoduma parte das hdúsuias de Xangai e
comunistas,um imenso impulso para a sua luta, para a sua organi- a consequentedispersão do proletariado de vanguarda desta cidade,
zação e para o desenvolvimento da sua consciência de classe. Decep- não deixam com certezade se reladonar com o receio sentido pelos
cionadosdepois a breve trecho pela atitude passivados dirigentes dirigentes do PC chinês perante esses militantes, muito conscientes
comunistas a seu respeito, assumiram uma atitude de prudente expec- dos seus especüicas interesses de classe.
tativa para com o regime, atitude que todos os observadoresactual- Contudo, a preocupaçãodo PC em não alienar dum só golpe a
mente confirmam ("'). simpatia ou mesmo a benevolência dos trabalhadores, pareceter sido
As duas mais importantes concessõesque os operáriosobtiveram bastantegrandepara evitar, durante o primeiro período apósa cons-
do novo poder foram o estabelecimentoduma verdadeiraescalamó- tituição do governo central popular, qualquer medida esbarrando
vel baseadano poder de compraexpressoem espécie,e a promul- frontalmente cam o proletariado. SÓquando este governo se sentiu
gação das primeiras leis sociais de higiene e de seguras, geralmente firmemente instalado no poder, após ter conseguido estabilizar a
impostas em todas as fábricas. O resto, conquistaram-no eles pró- moeda,é que começoua tornar rígida a suaatitudeem relaçãoà
prios por meio duma acçãoreivindicativa das mais tumultuosas. classeoperhia. Li Li-san fala de reivindicaçõesexageradas
dos ope-
Assim, as estadsticasoficiais registam,em Xangai, 9027 conflitos rários, da necessidade
de trabalho entre Maio de 1949 e Maio de 1950 ("o). Vingando-se
das suas humilhações e misérias passadas,os trabalhadores de Xangai « . . . de rectificar(o hábito) dos operários que consiste em se
11 fazem-se am part:ocularpagar enormes retroactivos de salários que ocuparem exclusivamente dos seus interesses individuais sem
ter em conta os interessesgerais... de rectificar (o eno) dos ope-
("') Na entanto, o número de casosde intervenção terrorista anta-operária, rários que reivindicam de forma exagerada,inadmissível,unica-
dos quais tiiüa sido assinaladoum exemplo na nossa imprensa como tendo-se mente no seu interesse individual.»(Discurso pronunciado em
produzido em Tien-Tsin, prece estritamente limitado e a sua responsabilidade 8 de Março de 1950 na primeira conferênciade directoresdos
cabe plausivelmente a chefes núlitares brutais, mais do que às directivas do PC. Bureaux do Trabalho da China.«A situação interior da China»,
Foi aí que mais claramente se pede exprimir a natureza camponesado exército.
P 37)
("') Nomeadamente: Jean-JacquesBrieux, em«l.a Cóf e d Nafta /fome
a Coram leme»(p. 392), fala claramenteda «Impor /af;dada»,actual do
govemo junto do operários.O que é tanto mais de notar pois o autor subs- (") O «Nega Z#rcóef Zeii g», de l.l0.49 desaeve com melancolia como
creve em geral todas as teses de propaganda do PC cllhês e revela forte influên- os operários e empregadosdos consuladosgerais americano e britânico em
cia do estalinismo em todas as suas opiniões sobre o movimento operário e Xangai utilizaram semelhantes 'métodos de chantagem'.
sobre o mamismo. (:") LÍ Lí-san indica o número total dos operários em Xangai num afago
(:") Relatório do adjunto do presidente do município de Xangai(o pró- reproduzido pela #tNem Cói Naus .4ge#cy», de 22.9.50. O número dos desem-
prio presidente é um antigo operário da Renault) em«l«i ii/ f/o / féria fe pregados é deduzido com base nas estatísticas de emprego publicadas em
ãe J CÓj//e»,11,P. 23. «La sitwaticn ineérietite de !a Cbine», \l, p. 25.

66 67
Estas observações, retomadas por outros chefes governamentais, <<Quandoda sua criação, todo o novo sindicato deve inscre-
conduziram à formação de«comissões consultivas do Trabalho e do ver-se na C. G. T. chinesa... para que, após estudo e aprovação,
Capital», que generalizaram o sistema da «arbitragem obrigató- a C. G. T. peça o seu registo ao governo popular do lugar em
ria (:';) . Estas comissõesnão concedem aos operários qualquer di- que se estabeleça... Qualquer outro agrupamentoque não seja
reito de gestão ou de controle da indústria privada, permitindo sobre- constituído em conformidade com as disposições(previstas)não
tudo a aplicação de medidas tendentes a aumentar a produção. pode ser considerado sindicato nem gozar dos direitos previstos
No entanto, as decisõesnão podem ser tomadassenãode comum por esta ]ei(«A situação interior da China», p. 32).
acordo e, no caso de decisões importantes, todo o pessoal da empresa
deve ser consultado.Na prática, esta medida, no quadroda nova Assim se estabelecede (Factopara o PC chinês, que controla a
política económica inaugurada por Mao Tse-tung após Março de 1950, C. G. T., um monopólioabsolutode rejeiçãoou ilegalizaçãode qual-
instaura o princípio de <<produzir primeiro, reivindicar depois>> na quer sindicato que não declare estar de acordo com tal ou tal aspecto
indústria privada chinesa e representa para o movimento operário da sua política operária; isto demonstraclaramenteque a direcção
um sério recuo em relação com o ascensodo movimento reivindi- do partida teme reacçõespossíveisneste sentidoda parte da classe
cativo que se fizera sentir da Primavera de 1949 até à Primavera operãna.
de 1950. Na indústria nacionalizada,que ocupa a maior parte do prole-
Todavia, no já citado discurso de Li Li-san, em que este se esforça tariado industrial, foram criados conselhosde empresas.Ao contrário
com grande reforço de argumentos demagógicos por implantar a da teoria estalinista em vigor tanto na URSS coma nas «democracias
ideia de que um aumento da produção industrial privada serve o inte- populares», com excepção da Jugoslávia, não foi contudo subscrita
resse comum dos operários e dos capitalistas, o orador insiste cons- pelos comunistas chineses a nefasta legenda da <<identidadede inte-
tantemente na legitimidade duma certa luta reivindicativa limitada, ressesentre a direcçãodas empresas(nacionalizadas)e os trabaha-
por parte dos operários: doreP>.No citado relatório de Li Li-san, é explicitamente declarado;

«... O Bureau do Trabalho não poderia, bem entendido, «Nas empresasdo Estado deixou de haver conflitos de classe,
eliminar radicalmente os conflitos existentes entre o trabalho e mas outros conflitos, parciais ou gerais, subsistemainda... Há
o capital. Com efeito, enquanto existam capitais privados, os con- quem negue a existência dessesconflitos e considere que o chefe
flitos hão-de subsistir entre o capital e o trabalho. . .(É preciso) de oficina agindoem nome do Estado torna as suasinstruções
generalizaro sistemados contratos colectivos,etc.» (Ibid., p. 37). equivalentes a uma lei ou a um regulamento a que ninguém pode
opor-se...Este ponto de vista é falso...». (Op. cif. p 37).
Da mesmaforma, a nova lei sindicalreflecte os elementoscon-
traditórios destapolítica operária do PC chinêsna actual etapa.A lei E o Hesi=o autor, especialistaem questõesoperáriasno PC chi.
reconhece,pela primeira vez na China, o direito à organizaçãosin- nês, num artigo comentandoa lei sobre os sindicatos escreve:
dical de todos os assalariados,incluindo os empregadosdo Estado.
Mas, ao mesmotempo, limita a conquista desta nova liberdade sin- «Em todas asempa'esas
do Estado, a política(a seguir)deve
dical pela cláusula seguinte: consistir em ter em conta os interessespúblicos e privados, e os
sindicatos têm o dever de proteger os interesses das massastra-
(::')«N'em Cój#aNewf J4ge#cy»,
12.5.50. balhadoras». (Nem Cói a Ne i .4gency, 9.7.50).

68
Esta concepção intermédia entre a concepção leninista e a con- A burocracia soviética e a Terceira Revolução chinesa
cepção estalinista burocrática exprime-se muito claramente através
do estatuto dos conselhos de empresas, que, segundo a Constituição Parecepois assenteque o PC chinês, sobre um certo número
Provisória, possuem um«direito de controle sobre a produção», mas de problemas de orientação política e organizacional, não captou ou
que, na prática, não têm mais do que uma função consu'luvae são imitou simplesmente as <<soluções»e as instituições da burocracia
presididos pelo director da empresa. Os comunistasjugoslavos dizem estalinista na URSS, mas que se esforçou por elaborar concepções
a este respeito: próprias em correspondência cam a sua experiência. De facto, a vitó-
ria que Mao Tse-tuna obteve sobre o apodrecidoregime de Tchang
<<
. . .A República popular da China começou a introduzir, ape- Kai-chekdeve-seem larga medida ao facto do PC chinês,já antes
nas nas empresas nacionalizadas, conselhos operários e comités da guerra, se ter ocupado em elaborar uma lílüa de orientação polí-
de gestão. O sistema de gestão na República popular da China tica própria, parecendoter deixado de ser orientado por directivas
é realmente um compromisso entre o princípio soviético de direc- vindas do Kremlin.
ção administrativo-burocrática e o princípio de Marx<Kas fábricas A concepçãofundamental da política do PC chinês está elabo-
aos operários».O comité de gestãoé dominado pelo director. rada no livro de Mao Tse-tuna Noz/ú Democracia, publicado em 1940
e este possui poderes mais largos e mais decisivos do que os num momento em que as relaçõesentre Moscovo e Yenan estavam
órgãos eleitos pelos colectivos operários.»(Dr. Jovan Djordjevic: interrompidas. O artigo de Chen Po-ta celebrandoa contribuição de
<<Novo sistema de gestão...», in Nem yz/gos/az/ l,am, N." 2-3, Estaline para a vitória da revolução chnesa e publicado por oca-
1950, P. 27). sião do 70.' aniversário da «Pai dos Povos», surgecomo uma afronta
pública quando candidamente diz :
Outras fontes jugoslavasindicam mesmo'que uma revista sovié-
tica teria censurado a legislação chinesa sobre os conselhos de em- «Foi só após o movimento de reelaboraçãoideológica de 1942
presa por ser demasiado<<liberal». Por sua parte, o chefe do governo que as numerosasobras de Estaline sobre a China foram sis-
regional da Mandchúria,Kao-Kang,referiu que em certas fábricas tematicamente editadas pelo nosso partido... Muitos dos cama-
os sindicatosteriam tendênciaa substituir-seinteiramente aosdirec- radas do nosso partido que, na prática, dirigiram a revolução
tores, o que marca ui= tútido impulso para a gestãooperária pura chinesa, nunca tinham tido ocasião de fazer um estudo sistemá-
e simples("'). Entre todas estas tendências contraditórias, o PC chi- tico da.snumerosasobras de Estaline sobre a China. Entre eles,
nês esforça-se por manter uma posição intermédia, apoiando-se sobre estava o camarada Mao Tse-tung.» (Chen Po-ta: «Estaline e a
a c]asse operária para contratar a burguesia e limitando a acção ope- revolução chinesa», in China Weekly Review, 21-1-1950).
rária para poder, na etapa actual, continuai: a colaborar com o capi-
tal privado. Na realidade, enquanto que os novos estatutos e o novo programa
do PC chinês, adoptados em Maio de 1945, nem sequer mencionam
o nome de Estaline("'), declaram explicitamente que a base pro-

("') Reproduzido em Lin Shao-d)i: <KO# /óe Par»» (For(#E l,a#gwagei


('"\«Lú siMatio i ÉérieHre de ia Cbine», 11, p. 9. Premi, Pegziim.), 1950, pp. 155 e 204.

70 71
gramática deste partido é representada pelo«marxismc»leninismo>> iniciavam a marcha para ocupar rapidamentetoda a China setentrio-
e pelo pensamento de Mao Tse-tung. Dificilmente se pode conceber nal, quando da derrocada japonesa no Verão de 1945, Estline concluía
que vários dos actuais dirigentes do PC chinês, que, ou participaram de súbito um acordo com Tchang Kai-chek que reconhecia o seu
intimamente da direcção do partido durante a grande revolução governo como o único governo legal da China, acordo esseque atirava
de 1925-1927, ou depois disso permaneceram longo tempo no estran. de costas os comunistas chineses! (:") Não podem esquecer que no
genro, ignorem o real papel desempenhado pela direcção da Inter- início da guerra civil em 1945-1946, o Kremlin ajudou Tchang
nacional Comunista, e mais especialmente por Estaline, na organi- Kai-chek, ao instalar na Mandchúria os funcionários do Kuomintang
zação da grande derrota. Nos seus escritos oficiais, prosseguem a e ao prolongar, a pedido expresso do generaHssimo chinês, a sua
tradição inaugurada pelo estalinismo fazendo de Tchen Du-siu, secre- ocupação dos centros mandchús até à chegada de reforços naciona-
tário-geral do PC cllinês de 1921 a 1927, o bode expiatório de todos listas; que, quando da evacuaçãode Harbine pelas tropas russas,
os erros oportunistas cometidoscom basenas directivas do Kremlin. estas levaram com elas os funcionários do Kuomintang, odiados pelo
Mas não podem ignorar que uma semanaantes de Tchang Kai-chek povo, entregando-os em segurança em território nacionalista ("').
começar o massacre dos comunistas em Xangai, Estaline declarava Não podem também esquecerque, na vésperada grandeofensiva
num discurso em Moscovo: para libertar toda a planíciesetentrionalda China, Estalinelhes
aconselhou não atacar as grandes cidades mas continuar a luta de
«Tchang Kai-chek submete-seà disciplina, o Kuomintang guerriha. Não podem esquecerque a burocraciasoviética,quando
é um bloco, uma espéciede parlamento (1) revolucionário, com da sublevaçãopopular na província de Sin-Kiang, ajudou Tchang
uma direita, uma esquerda e os comunistas. Porquê, dar um golpe Kai-chek a dissolver o novo poder insurreccional e restabeleceuno
de Estado? Porquê, correr com a direita quanto temos a maio- poder uma parte dos antigos senhoresfeudais por meio dum governo
ria (!) e a direita nos dá ouvidos? Tchang Kai-cheknão tem pro- de coligação, que o povo foi obrigado a derrubar uma segunda
vavelmente simpatia pela revolução, mas dirige o exército e não vez("'). Belden afirma mesmo ter ouvido declarar a numerosos
pode fazer outra coisa ( !) do que dirigi-lo contra o imperialismo.» comunistas, que, na URSS, os camponeses são os <<servosdo Es-
(Citação segundo Harold lsaacs: «The Tragedy of the Chinese tado>>(:"). O exemplo jugoslavo mostra-nos quanto estas experiên-
Revolution», Londres 1938, edição Secker e Warburg. -- lsaacs cias são importantes na determinação do curso ulterior da revolução
conta-nos como este discurso foi suprimido das publicações ofi- chinesa, ainda que os comunistas chineses, na etapa actual, evitem
ciais na URSS depois dos acontecimentos terem infligido um tão delimitar-se publicamente do Kremlin.
cruel des'mentido a Estahne. . .). Contudo, não seria de esperar sem surpresa, no Jluturo imediato,
uma ruptura entre Pequim e Moscovo. Poderosasforças subjectivas
Aqueles dirigentes não podem deixar de saber, se se dedicarem e objectivas tornam seme]hante ruptura ainda muito improvável.
ao estudo de todas as obras de Estaline sobre a China, que, durante
anos, a direcçãoda Internacional Comunista tinha defendido uma
posição diametralmente oposta àquela que eles próprios tinham ela- (:") Belden,«Cói sóaêesfóe mor/d», Harper & Brothers, N. lorque
1949,P. 69.
boradoa partir de 1940,ou seja,a da impossibilidade
de realizar (:") lbfd, P. 375.
a revoluçãodemocrática-burguesa
na Clhinasob a direcçãoda bur- (:") Boletim de Tanjug, de 1.4.50.
guesia. E não podem sobretudo esquecer que, no momento em que (:") Belden, op. c/f., p. 68.

72 73
Tanto na sua forma como na sua substância,a intervenção da buro- Enquanto os chinesesmantiverem o controle principal do mo-
cracia soviética na China é diferente da que exercia no<<glacis» vimento comunista numa série de paísesasiáticos (Vietnam, Malá-
europeu. Ao contrário das sociedadesmistas constituídas pelo sia, etc.) e se encontrarempor este facto em conflito directo com o
Kremlin na Europa oriental, todas elas significando a simples explo- imperialismo,serãolevados a manter estreitasrelaçõescom Kremlin.
ração de instalações industriais e da mão-de-obra, já existentes devido Enquanto o imperialismo mantiver a Cana sob um bloqueio de facto
à burocracia soviética, as sociedadesmistas fundadas na China (socie- no que respeita às principais matérias-primas e utensilagem ditas
dade petrolífera sino-soviética, sociedadesino-soviética para a explo- «estratégicas»,a ajuda económica,ainda que restrita, que possam
ração de metais não ferrosos e raros no Sinkiang, sociedadesino- obter da URSS parecer-lhes-á tanto mais apreciável. E, sobretudo,
soviética de aviaçãocivil) implicam um real investimento de capitais enquanto não surgirem forças revolucionárias indepentes do Kremlin,
por parte da URSS e favorecem assim o desenvolvimento das forças como um factor de importância]la Ária ou fora dela, o PC chinês,
produtivas, objectivo N.' l dos comunistas chineses ("'). E se o tra- tirando por sua vez conclusões da actual evolução do caso jugoslavo,
tado sino-soviético concluído por Mao Tse-tuna em Moscovo, após só com extrema prudênciaesboçaraum movimento de ruptura com
laboriosas negociaçõesque provam a independência de espírito dos o Kremlin.
chineses, impõe à República popular da China o pagamento duma Mas, a longo prazo, serão as forças sociais da revoluçãochinesa
indemnização à URSS pelas construções ao longo do caminho.de-ferro e não as considerações .políticasou económicasdos seusdirigentes,
chinês de Tchangtchun, de PoltcbArtur e de Dalny, o regressoà China que decidirão sobre as relaçõesentre Pequim e Moscovo. O desen-
destes enclaves soviéticos representa uma satisfação, como se diz expli- volvimento da burguesia rural; as eventuais dificuldades de abas-
citamente no acordo,<<dahonra nacional e da dignidade nacional do Kcimento em utensilagem industrial; a modificação eventual das
povo chinês».(":). Moscovotirou certasconclusõesda ruptura do relaçõesde força internacionaisem favor do imperialismo;a apa-
PC jugoslavo e esforça-se por não irritar os comunistas diineses, rição de tendências direitistas e capitulantes no PC chinês, pode-

adoptandouma atitude condescendente


em questõessecundárias.No riam provocar, em condições de fraqueza e de passividadeprolon-
entanto, a desconfiança que o Kremlin sente a respeito de Pequim gadas do proletariado, uma inversão da política externa chinesa.
A hipótese, ainda não excluída, duma tentativa do Kremlin para che-
teH a suaconfirmaçãono facto dos fornecimentos
de materialde
gar a um acordo com o State Department nas costasda China, pode-
guerra moderno, designada'mente aviões de reacção, parecer serem
ria agir no mesmo sentido. Contrariamente,um novo desenvolvi-
feitos em condiçõestais que essematerial permanecesob controle
mento da revolução chinesa, o reforço do movimento operário, o
soviético; parece,de resto, que os russospuderam estabelecerbases
esboçoduma orientação à esquerdado PC, o favorável desenvolvi-
militares no Sin-Kiang (:").
mento das forças revo]ucionáriasmundiais e, em primeiro ]ugu, na
índia, no Japãoe na Europa ocidental,poderiampõrmítir numa
("') Boletim da«New Cói Ne i 4ge#cy», de 2.10.50. etapa ulterior uma ruptura«sobre a esquerda>>do comuúsmo chinês
ÇXK
\«Post tire pBix dutabte, tour %ne dêmocfatie poPKlaite», 'L525Q. com o Kremlin. Para se realizarem, as duas eventualidadesexigem,
("') Ver as rwelaçõesde Cyrille Kanw, in «Tóe Recorda», 26. 9. 50 e
no entanto, uma ruptura do novo equihbrio entre as classestal como
lO.l0.50, dtadaspor«lz Vâi/é» n.' da l.' quimenade Nov.' de 1950.Ver
também artigo de C. Su]zberger(«Nem yoré rímel», 26.5.50) e Eric ]hwnton, se apresentahoje na China, equilíbrio sobre o qual o PC chinês
«Daily Telegrapb», 19.6.5Q. assentou o seu .poder.

74 7j
O PC chinês e a natureza da revolução chinesa nadarque este bloco só se desfez sob a pressãodas massas,que, em
1946, tinham por si mesmo começado a dividir as terras sem esperar
Este equihbrio não é apenaso produto fortuito do processohis- pelas directivas do PC ("'). Contudo, a nova apreciaçãopelos diri-
tórico na China. Foi conscientementepreparadodurante longos anos gentesdo PC chinês sobre a natureza da revolução chinesa, tinha
pelo PC deste país, no decursoda suaevoluçãoideológica,que Ihe entretanto feito progressos. A partir de 1940, no seu livro .4 Nopcz
fez reconsiderar os problemas fundamentais da revolução chinesa. Democracia, publicado sob forma impressa alguns meses antes do
Resumindo as experiênciaspassadasda revolução e da guerra livro .4 Cifra/égiú da gzlerra repor cio#ária(que apareceu em Março
civil, Mao Tse-tung escreveu no Outono de 1936 um pequeno vo- de 1947), Mao caracteriza esta revolução como segue:
lume intitulado 4 es/ra/éguada guerra reco/wcíom.ír/ú a Cói#a, no
<<Estaetapa da revolução chinesa. . . pelo seu carácter social,
qual, sem se basear numa análise marxista das relações de classe na
é uma revolução democráticaburguesadum novo género; não é
sociedadechinesa, mas partindo unicamente das lições empíricas das ainda a revolução socialista do proletariado, mas constitui já uma
passadaslutas, chega à conclusão seguinte, que representa uma revi- parte da revolução socialista mundial do proletariado... Esta
são completa das concepçõesestalinistas sobre a China: primeira etapa não pode ser a edificaçãoduma sociedadebur-
«O inimigo da revolução não só foi o imperialismo como
guesacom hegemonia das classescapitalistasna China, mas é a
também o regime da grande burguesia, aliada aos grandespro- criação de uma nova sociedade democrática, efectiva, pela união
prietários fundiários. A burguesianacional tinha-setornado o das diversas camadas revolucionárias da China.. . ("').
prolonga'mento da grande burguesia, deixando o PC chinês con-
duzir sozinho a revolução. O comando completo entre as mãos E alguns anos mais tarde, falando perante o Vll Congressodo
do Partido comunistafoi a condiçãoprimordial parapoder con- PC chinês, Liu Shao-chi exprimiu-se mais claramente ainda:
duzir a guerraa bom termo.»(l,ú sfra/égfede /a g erre rez'o-
/#/io a/re e# Cóine, Pauis 1950, Éditions sociales,p. 33). « .. porque as forças motoras fundamentaisda revolução
chinesa são as massasdo povo, com o campesinato como força
principal e o proletariado como direcção,a revoluçãochinesanão
Na mesma obra, Mao insiste no papel apagado, secundário, que
pode ser nem uma revoluçãodemocrático-burguesa do antigo
o proletariado pode desempenhar na revolução chinesa e chega à
conclusãode que é impossíveluma vitória revolucionáriana China tipo, nem uma revoluçãoproletáriasocialistade tipo novo...
Nesta revolução, as principais forças motoras são o proletariado,
sem uma guerra vitoriosa dos exércitos cam-poneses dirigidos o campesinato e a pequena burguesia.» (Liu Shao-chi: <<Onthe
pelo PC.
party», op. clf., p. 37).
Este livro de Mao teve, nessetempo, uma edição de apenasalguns
exemplares e em nada influenciou no imediato a estratégia do par- FinalmenEe, inflectindo post factum o desenvolvimentoda cam-
tido. Muito pelo contrário: em 1937,Mao formou um «bloco»com panhamilitar vitoriosa, o C. C. do PC chinêsdefiniu assima natu-
o Kuomintang contra o imperialismo japonês, no qual abandonou reza da Terceira Revolução chinesa
abertamentetoda a luta pela reforma agrária nas regiõeslibertadas.
Até hoje, foi impossível citar uma só vantagem desta coligação co'm ("') Belden, op. cif., p. 169.
os proprietários fundiários da China setentrional.Deve-seainda assi- ("') Reproduzido por J. J. Brieux, ap. cif. p. 329

76 77
«A Ditadura Democrática Popular, conduzida pela classe Muitas razõespermitem esperar um desenvolvimento semelhante.
operária e baseadana aliança dos operários e camponeses,requer Mais do que qualquer outro partido comunista,o PC chinêsfoi obri-
que o Partido Comunista da China una secamente toda a classe gado a manter uma estrutura menos burocrática e menos centrali-
operária, todo o campesinato e a 'inteligentsia' revolucionária. zada, a manter um metabolismo constante entre as preocupaçõese
como forças dirigentes e como forças fundamentais desta dita- aspirações das massas e as suas próprias. A situação objectiva na
dura.» (New China News Agency, 29.3.1949). qual se encontrou, impeliu-o por esta via(igualitarismo, frugalidade) .
Os quadros do partido foram educadosnum espírito espartana;du-
Foi partindo desta concepçãoque os exércitos dirigidos pelo rante anos viveram na base duma disuibuição igualitária de víveres
PC se ]ançmamem 1947 para a vitória, impulsionadospor uma for- e vestuário. No seu já citado relatório, Liu Shac-chiconta que em
midável vaga de insurreições camponesas.Realizar completamente 1945, em metade das aldeias das regiõeshb@tadasnão existia um
as tarefas da revolução burguesa pela conquista do poder pelo Par- só membro do PC! (p. 75) . Como, pois, nestas condições, -realizar a
tido Comunista, e sem iniciar qualquer uma das tarefas da revolução reforma agrária sem pemiitir um desenvolvimento relativamen-te livre
proletária, ta] foi o programa do PC chinês, que ]he permitiu concluir da iniciativa das massas?A imensidadedo continente chinêse a ex-
vitoriosamentea primeira etapa da revolução.Esta vitória só foi trema densidade da sua população de nenhum modo permitem o rá-
possível porque o PC se tinha praticamentelibertado da ideia esta- pido estabelecimento dum controle burocrático sobre as massasdes-
linista da realizaçãoda revoluçãoburguesaem bloco, com direitos pertas. O formidável poder deste despertar dos camponeses,das mu-
iguais, ou ]nesmo sob a hegemonia da burguesia«nacional». lheres libertadas pelo novo código do casamento, dos jovens, con-
Mas uma vez o poder conquistado, surgiram os limites próprios frontados finalmente com a esperançadum futuro, das massasávidas
deste programa. O PC quer construir uma economia cal)italista de ensino e de cultura("'), tomam tanto mais difícil essecontrole.
«democrática», mas uês quartos da indústria encontram-se antecipa- Não é também senão a expressãodesta situação objectiva que Liu
damente nacionalizadas. Quer custar durante uma etapa a luta con- Shao-chi traduz, ao apresentar os estatutos do PC no seu Vll Con-
tra a burguesia«nacional», mas a realizaçãoda reforma agrária no gresso, quando sucessivamente afirma a sua«fé na autodeterminação
Su[ co]ocaconstantemente
esta luta na ordem do dia. Quer evitar do povo», (p. 56 op. cff. ) rejeitando fada a ideia de que «os qua(iras
momentaneamentetoda a planificação, mas quanto mais se mostra decidemde tudo» e insistindo mesmo nos direitos das minorias no
ser imensa a tarefa de indusuializar o continente, mais a planifica- interior do partido, visto a maioriapoder enganar-se
quandodos
ção se revela como o único meio de atingir aqueleobjectivo. Quer debates políticos! (pp. 83-84, op. c&.). Em 1945, havia já muito
deixar a via livre à acumulação do campesinato rico nos campos, tempo que não se tinham ouvido semehantesobservaçõesvindas
mas, em que Ihe pese, a luta de desse reacende-semais vigorosa- dum partido ligado a Moscovo. Estas observaçõesnão têm, por certo,
mente do que nunca. Toda a lógica da situação impõe as conclusões mais do que um valor formal. Em 1931, e sobretudo em 1937, por
da teoria trotskista da revoluçãopermanente.O actual equiH6rio ocasiãode duasviagens à direita, a direcçãodo PC chinêsorgaM-
de forças não pode deixar de ser passageiro.Num futuro próximo, zna violentas campanhascontra o trotskismo contra-revolucionário.
o PC deverá decidir-se a acentuar a luta contra a burguesia urbana Mas Be[den re]ata como um jorna] comunista das <<regiões
libertadas»
e rural apoiando-se no proletariado e nos camponeses pobres, se não critica mesmo publicamente as demasiado moderadas directivas na
quer capitular perante a enorme pressãoburguesaque prepara o
início da <<prosperidade>>
rural. Saberá o PC chinês fazer esta escolta? ("') Cona.Belden,op. clf

78 79
r

grandescentros proletárias, o mesmoComité Central fez uma resc»


aplicação da reforma agrária. (OP. ci/. P. 503). E todos os observa-
dores são unânimesem assinalaro extremo «liberalismo» actual do luta viragem na suaatitude acercada importânciarelativa da classe
operaria:
poder comunista, os estreitos limites de toda a repressãopolítica, a
ausênciade controle de tipo estalinista sobre as forças revolucioná- «Por efeito da desproporçãoentre as forças popularese as
rias no campo. Casa se mantenha atento à voz das massas,não é de do inimigodesdeo revésda GrandeRevolução de 1927até
nenhum modo de excluir uma nova viragem do PC à esquerda.Se agora,o centrode gravidadeda luta revolucionária
do l)ovo
deixar de escutar esta voz, a sua burocratização e a sua orientação chinês foi o sector rural, acumulando forças rurais para cercar
à direita significarão, na próxima etapa, um rumo co /ra as massas. e tomar as cidades.. . O período em que este processode trabaho
Para avaliar da probabilidade de semelhanteviragem à esquerda, foi adoptado está agora terminado. .. O centro de gravidade do
não se deve perder de vista o facto de que a direcçãodo PC chinês, trabalho do Partido deve ser posto nas grandescidades("').
contrariamente a certas afirmações, nunca cessou de se considerar
Esta viragem teve a sua condusãa lógica na suspensãode todo
como uma direcção pro/etária. É exacto que o partido se como)õeduma o recrutamento camponêspara o Partido Comunista, que deve con-
esmagadoramaioria de elementos da pequena burguesia rural. O seu sagrar-sedoravante à conquista dos operários industriais. Serãomui-
rápido crescimento(30 000 membroscm 1937, 1 200 000 em 1945, tas as dificuldades a vencer nesta via, enquanto a direcção do partido
4 milhões actualmente) implica um nível ideológico extremamente não tiver mais nada para oferecer aos operários além da perspectiva
baixo. Mas no Vll Congresso,quando o partido se encontrava ainda dum aumento de produção. Também neste plano uma futura viragem
afastado das cidades, os seus dirigentes não cessaram de insistir sobre à esquerda responderia às preocupações essenciais dos dirigentes
o carácter proletário do partido, sobre a necessidade de fazer assimilar comunistase só ela permitiria assegurarao partido a sua força no
a ideologia proletária pelos membros não proletários; inscreveram proletariado.
mesmo nos estatutos condições de adesão diferenciadas para os ope-
rários, os camponeses pobres,os camponeses médios e os intelec- Para onde vai a China?
tuais, etc., tornando mais difícil a entrada no partido à medida que
as condiçõesde existência se afastam das do proletariado ("'). No A primeira etapa da revolução chinesa concluiu-se com o derrube
entanto, um certo número de camponesesricos conseguiuinfiltrar-se do poder de Tchang Kai-chek.Realizou a maior parte das tarefas
da revolução democrático-burguesa, designadamente a emancipação
no partido e fazer desviara linha de classenas aldeias;pelassuas
do domínio imperialista(se bem que o capital estrangeironão tenha
directivas de 22 de Fevereiro de 1948, acercada l:eforma agrária e
ainda sido expropriado) e a unificação nacional. Ainda não resolveu
da reorganização e depuração do partido nas regiões inicialmente
a questão agrária, na medida em que isso exige, no Sul, a expropria-
libertadas, o Comi;téCenüal reagiu violentamente contra aquelepe-
ção da burguesia urbana e, sobretudo, a anulação das dívidas e hipo-
rigo ("') . E logo que o Exército .de Libertação se aproximou dos tecas. Para dar uma resolução definitiva à questão agrária e assegu-
rar a vitória definitiva e a consolidaçãoda revolução,a próxima etapa

("') Liu Shao-chi: «O// fbe Púrfy>ü


('") Resolução
adoptadapelo C. C. do PC cl)mêsem Março de 1949
("') Citado em: <?Ledéz;eZoppeme
f do Coram///zisme
e Cóí#e»,11,p. 28 «Nem Cój#a», 29.3.49.
(editado por «l"z Doc:z/me fúfio# /raaçafsaü, 29.6.50.

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80 6
deveria iniciar a fundo a solução das tarefas proletárias, certas das pede comprar em 1950 nove mihões de fardos de algodão contra
quais desde agora se encontram esboçadas.É por isso que a China três milhões em 1949 e 0,8 milhões em 1947 (antesda reforma).
atravessa ainda uma/aie /ra sifória entre a queda do antigo regime A causa do malogro de todas as revoltas agrárias do passado --a
e o estabelecimento
definitivodo novaregime.Poli/icme fe, um necessidadede esmagaro campesinato sob um fardo de impostos para
gopermoope ária e campomésmantém ainda uma coligação com cer- construir um aparelho estatal centralizado -- parece estar ultrapas-
tos elementos da grande burguesia. A aliança entre o proletariado sadana China popular graças à eliminação da corrupção e aos costu-
e o campesinatoé, no Norte, a aliança revolucionáriacom o campe- mesfrugais dos novos dirigentes, à auto-administraçãolocal e, sobre-
sinato pobre; no centro, a aliança com o campesinatorico; e, no Sul, tudo, ao desenvolvimento das forças produtivas.
a aliança com os elementoscifúdí os exp/or Zo/'ei, que dominam a SÓquando a reforma agrária estiver concluídaem toda a China
agricultura. A dualidade de poder existente à escalade aldeia, repto' e surgir uma nova diferenciação das forças sociaisna aldeia com base
duz-se assim à escala nacional, pela oposição ente diversas zonas e, na concorrênciae acumulaçãoprivadasde milhõesde pequenasem-
no interior do próprio governo, pela presençade ministros burgueses presasrurais no conjunto do país, é que o regime de Mao Tse-tuna
nas suas fileiras.
enfrentará o seu primeiro e significativo teste. Restam-lhe vários
O futuro da China é, em primeiro lugar, o futuro de 90 milhões anos de pausa antes dessa primeira crise, pausa durante a qual se
de exploraçõesagrícolas(:"). Na medida em que a reforma agrária tratará de desenvolvera indústria, elevar o nível de vida e de cons-
atinge o seu termo, este futuro imediato mestra-se brilhante. Sob o
ciência e organização do proletariado. Do sucesso atingido nestes
antigo regime, a renda e os impostos,para não falar dos juros, dos dois domínios,bem como da ajuda que a revoluçãointernacional
empréstimos e outros encargos suplementar'es,absorviam em gera]
poderá prestar à China, depende a sorte futura da revolução chi-
ao camponês mais de 50 % da sua coheita; em certas regiões prós- mesa
peras, essa percentagem atingia 'mesmo 75 % (:"). Hoje, o imposto
absorveem média 17 % dos rendimentosrurais; este imposto é A vitória de Mao Tse-'tungabalouas basesdo domínio secular
fixado com base num rendimento médio por superfíciee o aumento do imperialismo na Ária. Ao expulsar do Yangtzé em 1949 a tiros
do rendimento reduz proporcionalmente a contribuição('"). De de canhão o navio .4me/6ysf de Sua Majestade e ao e)apulsar depaís,
pronto, o campesinatochinêsvê o seupoder de compra consideravel- em 1950, a orguhosa armadatanque da Coxeiado Norte, o Exército
mente aumentado,e a indústria, com destaquepara a dos têxteis, vê popular chinês inverteu as relações de forças -sobre as quais o mundo
abrir-se para ela um mercadoilimitado. Na Manddlúria, aonde a capitalista assentava desde há um século. Vingou assim as vítimas da
reforma agrária foi concluída mais cedo, o campesinatocontribuiu insurreiçãodos Tai-Pinge dos Boxers,os operáriosde Xangai
no total com2,3 mihões de toneladasde produtosalimentares em de 1927, os camponeses
do Kiangsi e os milhõesde outrasvítimas
1949, contra 8 milhões sob o antigo regime ("'). Por conseguinte, da selvajaria imperialista na Ásia. Doravante, a China deixará de evo-
luir sob o signo do banditismo e do ópio; a indústria moderna
poderá avançar ah a passos de gigante e os seus passos ressoarão como
(:") Segundo estatísticas de 1934, reproduzidas em «l# déz;e/oppame#f
do coram isme e Cóf#e», 11, p. 45. UH dobre fúnebre aos ouvidos dos industriais de Manchester, de
('")«Q friême l rer#df/o#aZe», n.' de Maio/Julho 1950
('" ) «New Cbi]za News AgeKc]»...
("' ) «New China Netos Agetlc)». .. ('') 22.9.50

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Bombaim e de Osaka(:"). Não é apenaspor meio das forças levo
lucionáriasque liberta em toda a Ásia que a revoluçãochinesamina
o domínio mundial do imperialis'mo; desfecha também um golpe
fatal nas bases de existência económica que esse domínio mantém
2 MAO TSE-TUNG NA REVOLUÇÃO CHINESA

nos países atrasados e subdesenvolvidos.


Os operários dos paísescapitalistas avançadosda Europa e dos P. ROUSSET

Estadas Unidas, assim como os proletários do Japão, das Índias, Cei- 10 de S,etembro de 1976
lão e Indonésia não têm por missão imitar a via sinuosaao longo da
qual Mao Tse-tuna,após vinte e três anos de sofrimento das massas
populares do seu país, conseguiu abater finalmente o inimigo. Para
eles. a via de Lenine continua tanto mais na ordem do dia quanto
é certo que a força revolucionária das massascrescecontinuamente
à escalamundial, e que golpes decisivose uma estratégiaaudaciosa
permitem, como em Ou-tubro de 1917, a.lcançaruma rápida vitória. A agonia do império chinês entregue à capacidadedos imperia-
Mas não alcançarãoessavitória se não forem capazesde fazer sua, listas, a impotência da revolução burguesa de 1911 para realizar a
sem nenhum sectaris'mae sem reservas derivadas do oportunismo reforma agrária e libertar o país, o caos engendrado pelos senhores
e dos erros da direcçãodo PC chinês, a causa da grande revolução de guerra, tal foi o pano de fundo da infância e juventude de Mao
chinesa,que, para um quarto da humanidade,entoou e entoara du- Tse-tung, nascido em 1893 em Hunas du-ma família de camponeses
rante longos anos a Carmag#o/e do povo em armas e a ]lfarse/óescz pobres. Seria demasi-ado longo relatar aqui as suas desavenças com
dos trabalhadores. seu pai, que entretanto cedo enriqueceu, ou as peripécias da sua vida
escolar e depois a de estudante pobre. Simplificando, Mao muito
cedo se interessou pela sorte da China, participando da efervescência
intelectual reformista e modernista criada pela<<importação»na
China das ideias ocidentais. «Neste /empa, dirá ele a Snow(:),
«o mea espíritoera uma curiosatüstura de liberalismo,de retor-
mismo democrático e de socialismo utópico. . . Era francamente anti-
miZI/ans/a e a/ /i-/mperla/is/ú». Em 1917 funda a <Ksociedade
de estudo
do mundo novo». Em 1919, em Pequim, aondeé ajudantede biblicH
tecário, participa no movimento estudantil de 4 de Maio contra o
tratado de Versailles,que transferiu para os japonesesos privilé-
gios alemãesna China.(bmeça a iniciar-se no manismo, que aparece
("') Facto altamente característicoda transformação da China: deixaram na China trazido pelo ecodas salvasde Outubro, e funda em 1920
de ser as matériasprimas e passarama ser produtos gemi-acabadose tecidos de
algodãoque estãohoje à cabeçadas exportaçõesde Tientsin, primeiro porto
da Chia («Pfoó/êmef Eco#omfgwes», 5.12.50). (:)«Étoile rouge sur la China», ed. Stock, p. 126

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uma sociedadede estudosm-ar'xistas,
iniciando ao mesmotempo um Pela suaparte, Mao tinha sido encarregadode dirigir «a insurreição
trabalho de organizaçãoda classeoperária. Em 1921 pmticipa no da colheita do Ou-tona». Batido e afastadodo <<bureau>>político do
congresso de fundação do Partido Comunista Chinês. PCC pelos seusdesacordos,retira-se com os restos do seu exército
para as montanhasde Chiangkhan, aonde se esforça por preservar
o que resta do PCC e do seu exército, enquanto que o Koaiintem
Com o Kuomintang continua a preconizar uma política desastrosanas cidades,que con-
duzirá, em 1930-31, à eliminação completa da classeoperária como
Este mini-grupúsailo (57 membros em 19211 ) não tai.dará a im- força revo]ucionária. Foi da berro/a de ]927 g e asco o maalsmo.
plantar-se solidamente na classe operária, que Mao organizará em Embora Mao não seja capaz de realizar uma análise global do esta-
Xangai, no Hunan... Mas o PCC, jovem e inexperiente, será cons- linismo e das suasrepercussõe.s
na China, se continua fiel à teoria
trangido a subordinar-se às directivas da lll Internacional estali- da revolução por etapas, tira contudo de 1927 um certo número de
nista, e em 1923 concluirá uma aliança semprincípios com o Kuo- lições que não esquecerámais: compreendeu que é preciso desconfiar
mintang, partido nacionalistaburguês, que conduzirá à derrota da dum Koumintang traidor, que é preciso preservar a autonomia polí-
revolução chinesade 1926-27. Durante esseperíodo, Mao mostra-se tica e organizacional do partido comunista e construir uma relação
fervoroso partidário da colaboração com o Kuomintang, no qual de forças política e mi]itar que assegureao P(]C a direcção do pro-
a-ssume responsabilidades desde 1923. A acreditar-se em Schram (:), cessorevolucionário. Compreendeu também que é preciso desconfiar
será um dos últimos a romper com ele. Mas terá tido ocasiãode se das directivas do Komintern por tanto tempo quanto estas estejam
iniciar na campanhajunto da classeoperária e de descobrir, em 1925 em contradiçãocom os interess-es da evolução chinesa.Do fundo
e 1927, o potencial revolucionário que o campesinato representa. dos campos,reconstrói u-m exército em todas as suas peçase asse-
A despeito do seu entusiasmo pelo movimento camponêsdo Hunan, gura asbasesde apoio para reiniciar a conquista da China aos naciona-
ser-lhe-á necessário inclin-ar-se ante as directivas do Komintern, cujo listas. E recusa-sea caucionar a política do PCICnas cidades, (pre-
objectivo n.' 1, não obstante o anticomunismodo Kuamintang, será parar a insurreição) de facto,( recusando lançar o seu exército contra
até ao último minuto o de não assus'tar o aliado :burguês. Changsaapós um primeiro revés) quando não muito explicitamente.
Em 1931, é fundada a República soviética do Kiangsi, de que é pre-
sidente,e que pretende um <<governo
operário e camponês».Os co-
Da derrota de 1927 à República do Kiangsi: munistas apoiam-se numa reform'a agrária, primeiro radica, depois
«Uma faísca pode lançar o fogo -emtoda a planície» moderada,visto o cerco nacionalista lhes interditar permitirem-se
o «luxo>>
de alienaro campesinato
médioe rico.
Em Agosto de 1927, a classe operária foi massacrada por Tchang No entanto,, é indispensável evitar de pensar que Mao, em 1927,
Kai-chek e o PCC dizem-ado.
No entanto, o Komintern lança--se
numa terá optado deliberadamente pelo campesinato, desprezando a classe
política de assaltoàs cidades,tão criminosaa)mo a precedenteque operária. Foi a denota da coheita do Outono e as suasdivergências
terminou em Dezembro pelo esmagamento da Comuna de Cantão. com o partido nas cidades que o forçaram a ter de viver por longo
tempo nu'ma posição Ze reco/o. É só depois de 1931 que deixará de
(')«Mao Tse-tung», de Schram, Colecção U. haver outra soluçãopara a China além duma revoluçãoem que o

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proletariado estará ausente.Mas a referênciaao proletariado será tos, Mao teve que luta:r contra uma ala do partido que preconizava
sempre mantida. a -política de<<porta fechada», contra o acordo com o Kuomintang
Em 1935, são obrigadas a evacuar o Kiangsi após ter repelido (da qual são pouco conhecidas as posições), mai após-ie /amóém â
por quatro vezesas tropas nacionalistas.Assim se iniciará a l.paga subordinação para e simples ao governo central. A.s concessõestEm
a4úrcBa,que os conduzirá para o ShensiNorte, numa derrota militar limitesl Isso permitiu que a China não tenha sido uma Espinha, que
transformadaem vitória política e durante a qual Mao tomará a o PCC tenha podido alcançar uma audiência sem precedentes e tenha
cabeça do partido. podido, após um período de confusas negociações com o Kuomintang,
recomeçara guerra civil em 1947 com uma relação de forças que
Ihe permitiu instaurar em 1949 a República Popular da China. Con-
Da frente unida antijaponesa tra a vontadede Estaline e os acordosde Yalta, que, apósa vitó-
à República Popular da China ria de 1945, .dividia o mundo em «zonas de influência».

A partir de 1931, o Japão empenhou-senuma política de ane-


xação da China. O PCC, mal -seestabeleceuno Shensi Norte, fez uma
Mao e o rumo sinuoso da revolução chinesa
viragem total em relação ao peHodo do Kiangsi e propôs uma frente
unida tão ampla quanto possível(com a única exclusãodos pro-japo-
Não é este o lugar para fazer uma análise exaustiva da concepção
neses).É que, segundoMao -- que redigirá em 1937 o seu famoso revolucionária de Mao, da sua referência ao marxismo, etc. . . Mas,
ensaio«Dú co /radição»-- a contradiçãoprincipal deixarade ser
resumindo, deve.-sedizer que dirigiu a revolução chinesa contra a
entre o proletariado, o campesinato e as classes possuidoras, mas
vontade de Estaline e que o fez desde 1927. Não houve, como é
entre o«povo» chinês e o Japão. Conclui-se, não sem dificuldade,
claro, uma ruptura política clara e nítida, mas antes uma prática da
um acordo com o Kuoúnintang na base de concessõesrecíprocas. Pela
revólüção margi#aZme#/e ao es/aZI esmo e co /ra ei/e. Marginal-
sua parte, o PCC renunciaà reforma agrária(limitada a uma redução
mente, porque Mao não renunciara às suas teses fundamentais; con-
das taxas de renda e de aluguer) e subordina formalmente o seu
exército e o -seugoverno ao exército de Tchang Kai-chek. tfa ele, porque fará passaros interessesda China à frente dos da
Será isso um oportunismo sem limites? Não se pretende justi- URSSe porque de facto inflectirá a«teoria>>estalinistada revolu-
ficar os exagerosdireitistas deste peHodo, o regressode Mao à ne- ção por etapas no sentido de uma espécie de leninismo abastardado.
cessidadeduma etapa democrática burguesa em retrocessosobre a Até, se se quiser, praticando uma política de aliança de classesem
República do Kiangsi(.4 Napa De/#oc/ária, 1940), que transfere para se enfeudar à burguesia nacional, Mao retoma a política definida
um futuro indeterminado a revolução socialista.Mas é preciso tef por Lenine em 1920 para uso dos paísescoloniais, em vez do <(men-
presente o contexto nacional e internacional no qual o P(=C ope- chevismo» de Estaline: Mas em todo o caso, leninismo abastardado,
rava, bem como um certo número de Jlactos:o acordo com o próprio parque Mao não evitará os «excessos»oportunistas (na teoria e na
Tchang Kai-chek e não apenascom a burguesia nacional, foi imposto prática) já referidos. A concepção maoísta da revolução nasceu da
pela URSSno seguimentodo incidentede Sianem 1936 (Tchang, derrota de 1927 e do contexto específico que esta derrota criou.
feito prisioneiro por dois das seus generais, em vez de ser executado, Anecessidade de contar desdelogo com assuaspróprias forças, aliada
foi libertado sob pressão de Moscovo. . .) A acreditar em certos tex- à ausência
total, em Mao, dum internacionalismo
teoricamente
fun-

88 89
damentado, explica<<o rumo sinuoso da revolução». Explica também reunidos por Hu Chi-shi( ') . Para ele (e essa preocupação aparecia
por que a sua teoria revolucionárianão é exportáve]ta] qual, salvo já em 1955) trata-se de evitar no máximo as distorsões entre o desen-
para provocar catástrofes (Indonésia) . volvimento da agricultura, da indústria ligeira e da indústria pesada,
de não sacrificar tudo a esta última. Trata-se também de não ter por
exclusiva preocupação a rentabilidade económica, mas de encaminhar
«Como Yukong moveu as montanhas» paralelamente a expansão das forças produtivas e a transformação
das relações sociais, criando as necessárias estruturas (as comunas
«Nós somos pobres e estamos«em branco». «Pobres», porque populares) e apoiando-se numa intensiva mobilização das massas.
não temos muita indústria e porque a agriculttlra não se encontra O Grande Salto em Frente, lançado em 1958, será a primeira
também muito desenuoluidaentre nós; «em branco», qual tombade tentativa de pâr em prática estapolítica. Seráum fracasso,por razões
papel ürgem, porqtle o nosso nível cubura! e cietttÍtico não é ele- que seria demasiadolongo evocar aqui, e provocará a primeira crise
oado. Mas os <<pobres»aspiraxtla fazer a reuoltlçao e a tornar-se grave do partido, saldando-sepelo expulsão de Peng Te-huai(que
fortes. Uma folha em brancoé exactamenteo que se precisapara em 1959 fez uma virulenta crítica ao Grande Salto), mas também
começar a escrez,era».
(Abril de 1956, «As 10 grandes relações»). por uma certa marginalizaçãode Mao no partido, em proveito da
linha«moderada» de Liu Shao-chi. É que uma mobilização sem pre-
Mal é possível no quadro deste artigo acompanhartodas as eta- cedentes da população não bastava para ultrapassar as contradições
pas da carreira de Mao após a tomada do poder, a não fazer uma aná- inerentes ao atrasoda China, sobretudo depois de se ter retraído a
lise aprofundada da <<lutaentre as duas vias», que se tornou intensa ajuda soviética em 1960. Para contrabalançar os efeitos sociais(dife-
no partido a cadaperíodocrítico, e que nos é ainda em muito des- renciações sociais no campo e na classe operária, fonnação duma
conhecida. Parece mais interessante tentar fixar a problemática <<burocracia»de tipo«estalinista» completamente isolada das mas-
maoísta da transição para o socialismo, na medida em que pretendia sas.. .) e políticos da linha «moderada», tanto como para «retomar
evitar os piores«erros» da experiência soviética. o poder» no partido e no Estado, Mao não cessaráde lançar cam-
panhas políticas de desigual amplitude, antes e depois duma das suas
mais arriscadastentativas de voltar a impar a sualinha política, que
foi a Revolução Cultural.
Marchar sobre os dois pés,
põr a política no posto de comando

Confonne confessa,Mao não é um economista.É isso sem dú- Mao, o partido, a burocracia e as massas
vida que explica o seu«desdem» pelas condiçõesobjectivas e o
Para conduzir favoravelmente a sua tentativa de romper com o
extraordinário voluntarismo que informa a sua tentativa de cons-
«.modelo»soviético, Mao pretendeu praticar sempre a <<linhade
truir o socialismo «mais depressa, melhor e mais economicamente».
massa».Para nós, não se trata de fazer da China, como proclamam
A partir de 1956, no rasto do XX Congressodo PC russo,Mao en-
trega-se a uma análise crítica, parcial mas virulenta, do modelo sovié-
tico, cujos eixos principais serãodesenvolvidos nos textos de 1958-60, (')«Mao et !a construction du socialismo», ed. Seuil

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os devotos do maoismo, um modelo de democraciaproletária, mas cZ//íd ra do pro/efúr/ído, e a tentativa maoísta está repleta de con-
a preocupaçãode Mao om não se isolar das mas-sas,
é real e fundada tradições explosivas. Trata-se mais dum modo diferente de domínio
am razõesde váriasordens: político pela burocracia do que dum antiburocratismo consequente.
-- Exi'ste, de certo, a história da revolução chinesa: a burocracia
chinesa, ao contrário da burocracia estalinista, não se erigiu em para-
sita sobre as conquí-stassociaisduma revolução vitoriosa. Os comu- Das Cem Flor.es à campanha anta-Teng
nistas chinesesfizeram a revolução,e, para fazê-la,tiveram que ope-
rar uma mobilizaçãoem profundidade das massascamponesase, por ]àm 1956 Mao lança a palavra de ordem:«que cem flores .desa-
isso, de «escuta-las»até um certo ponto. brochem, que cem escolasrivalizem». Trata-se de fazer aderir ao
-- Existe também, e isso é flagrante nos textos de 1956, o espec- partido os intelectuais e os partidos democráticos,de tentar impedir
uma excessivaburocratização.Levantou-se um coro geral contra o
tro da insurreição húngara: Mao analisa-acomo uma insurreição con-
tra,revoluçionária, mas compreendeu o perigo que existe em seisaiar
partido, traduzido tambémnuma vaga de grevesoperárias.Não se
demasiado das massas, quer exercendo sobre elas demasiado forte deve temer as perturbações,dirá Mao, que redige em 1957 o seu
ensaio salte «A justa solução das contradições no seio do povo».
pressão económica para atender às necessidade de acumulação e cons-
Mas as Cem Flores depressamurcharão.sobo golpe repressivodo
trução da indústria pesada,quer multiplicando os privilégios mate-
riais da burocracia. <<movünento
de rectificação>>
de 1957. Que outracoisapodefazer
um partido que quer lançar lastro sem tolerar os órgãos de uma real
-- Existe a já evocadanecessidade de mobilizar ao máximo a
democraciaproletária? Num contexto muito diferente, a Revolução
força do trabalho, concedendoaos trabalhadoresum mínimo de di-
Cultural depressa se extinguirá perante esta mesma insolúvel contra-
reito de intervençãona gestãoda empresaou da comuna,promo- dição. Mao lança-aem 1966 para reassugurara sua posição no par-
vendo uma politização(muito contraditória) das massas, em vez de
tido, sujeitando-o a um curto-circuito pelo recurso a uma campanha
pâr o acento sobre os estímulos materiais.
de massaque não -tardaráa transbordar em larga escalados objecti-
-- Finalmente, existe a maneira maoísta de usar do seu pres- vos iniciais. A classeoperária pi:ecipitar-se-ána brecha aberta para
tígio junto das massaspara fazê-las intervir nos assuntos internos fazer valer as suas próprias reivindicações económicas e políticas.
do partido.
E, a partir de 1967, a burocracia cerrara fileiras. Mao declarara serem
De tudo isto não seconclui que Mao tenhasido um grandedes- os quadros bons, ou relativamente bons em 90 %, e tentará que o
truidor da burocracia, pois demasiados factos existem que atestam alvo seja limitado ao máximo. Serãoconstituídos comités revolucio-
o contrário, mas que tentou, pelos mais diversos rodeios(planificação nários, comprometidos entre as duas fracções que entre si disputam
maleável e descentralizada,.autonomia relativa das províncias e. até o poder sob a arbitragem do exército, e serãonecessários
dois longos
certo pon'to, das unidades de produção, politização das massase anos para <<restabelecer a ordem». Seria inútil reduzir a Revolução
<<democraciaproletária» mínima. . .) evitar a constituição duma buro- Cultural unicamente-àluta pelo poder no seio do partido, luas, no
cracia de tipo clássico,fundada no atraso, no isolamento, na incultura que respeita ao nosso propósito, é indispensável ver que aquele mo-
das massas,nos«imperativos» do desenvolvimento económico. Mas vimento revelou, ao mesmo tempo, o que separa Mao de Estaline
a mobilização permatleMe das massaspara objectivos económicos ozi ( não se imagina este correndo o ri-scode fazer intervir na cena polí-
políticos não é o exercício da democracia operaria nas estr&tutas da tica os estudantes e a classe operária, ainda que esta -setenha arrogado

92
essedireito -- e o que o separaduma concepçãomarxista-revolucio- se desvaneceram e se reduziram a uma pemianente preocupação de
nária da ditadura do proletariado. Assim, Mao teve o cuidado de se mobilizar as massas pelas razões que já enumerámos, sem nunca hes
assegurar do exército antes de lançar a Revolução Cultural. Confessou mnceder os meios de tomarem nas suas mãos a gestãodo Estado
a Show que era partidário, nessaépoca,do«culto da personalidade» chinês.
em dose maciça, o que é uma esquisita maneira de pennitir às mas- Querendo apoia:r-sede fonna voluntarista sobre a«pobreza» e a
sas tomarem nas suas próprias mãos os assuntos que hes respeitam. «brancura»da China, Mao -esbarroucom contradiçõesque o con-
Deste modo, a eleição de delegados<<segundo
os princípios da Co- texto internacional, o isolamento da China e a sua relação cam o mar-
muna de Paras»,será substituída pelos comités revolucionários. Após xismo revolucionário o impediam de ultrapassar...
a RevoluçãoCultural, Mao evitarápois correr o risco dum trans.
bordamento globalmente antiburocrático das massas(tanto durante
a campanhacontra o direita burguês em 1975 como canela Teng
Siac-pinoem 1976).

E em jeito de conclusão

Este rápido relanceda trajectória de Mao não pretende ser um


balanço global do maoismo. Por isso, observe-sesomente: Mao abriu
a primeira brecha importante na hegemoniaestalinista sobre o movi-
mento operado internacional. Após a tomada do poder, tentou re-
solver à sua maneira a quadratura do círculo, que consiste em pre-
tender construir o socialismo num país atrasadoe isolado sem contar
com o desenvolvimento da revolução mundial. Gonsti:uir o socia-
lismo em autarquia 'tem como corolário inelutável a subordinação dos
interesses da revolução mundial aos interesses de Estado da .China.
e basta lançar um olhar, mesmo superficial, sobre a política externa
da China para disso nos convencermos.E isso tanto mais que Mao
não deixou de pensar em termos especificamente«chineses».No
plano da política interna, tentou um desenvolvimentomais harmo-
nioso da economia, o que esbarrou com dificuldades intransponíveis
(de onde a necessidadede lutar incessantemente contra os apologistas
da ala «direitista», mas também de transigir com ela). Animava-o.
enfim, a vontade inegávelde travar o desenvolvimento«natural,.da
buroüacia, mas, não :tenda nunca encarado o desenvolvimento de
órgãos duma real democraciaproletária, as suas tentativas dgressa

94 9j
3 A REVOLUÇÃO CHINESA SEGUNDO MAO

s. s. wu
15.:deS:etembrode .1976

Na sua obra«O l)apel do indivíduo n-ahistória», Plekhanov es-


creve:«A grandeza dum personagem histót'ico não reside no carácter
pardculâr que poderia assumir um acontecimentohistórico sob a in-
fluência dos traços próprios dessepersonagem, mas no facto de possuir
traços particu[ares que ]he permitem satisfazer da melhor maneira
as necessidades da sociedade e da época em 'que vive».
Mao Tse-tung representa precisamente esse tipo de grande perso-
nagemhistórico, pois foi sob a suadirecçãoque o PCC desmantelou
o Kuomintang, repeliu o imperialismo para fora da China e eliminou
os restos do feudalismo, completando assimas tarefas da revolução
burguesa.Foi também sob a sua direcçãoque viu o dia o processo
de colectivizaçãoda agriculturae de socializaçãoda indúsuia. No
entanto, foi precisamente quando Mao tentou«inflectir de maneira
particular um grandeacontecimentohistórico» e quis«fazer parar
e mudar o curso natural da história» (segundo os termos usados por
Plekhanov) , que a grandeza da sua personagem se diluiu numa evo-
lução social e histórica anónima. Quando do apelo lançado por Mao
em 1949, milhares ou mesmo milhões de pessoasestavam prontas
a segui-]oe a arriscar a própria vida para ]he corresponder.Contudo,
em 1976, o apelo dos «anui-direitistas>> dirigidos por Mao teve a -sua
conclusão na manifestação da praça Tien An Men. Quando da sua
morte, em 9 de Setembro de 1976, a personagem histórica de Mao

97
7
Tse-tunatinha há muito deixadode existir. O Mao que tinha acom- a classeoperária des-sacidade, espinha dorsal do proletariado chinês,
sacrificado nas aras da linha oportunista da Internacional Comunista,
H panhado e guiado as grandes convulsõessociais e políticas já não
existia para a história e a !morte de Mao abriu a perspectivaduma já então muito comprometida na via da estalinização.A vaga reaccio-
outra convulsão Mstórica. nária rolou rapidamente através das principais cidades chinesas.
Os trabahadoresforam em toda a parte perseguidos,presose mas-
sacrados.O movimento operário foi desmanteladoe a segundarevo-
1. As .causas da vitória lução chinesa esmagada.
A forte concentração
da classeoperáriaurbanaé um dos fac-
tores de força do proletariado. No entanto, é estemesmofactor que
O PCC tomou o poder em 1949 sob a direcçãode Mao Tse-tung.
Esta vitória da 3.' revoluçãochinesanão só apanhouEstaline de explica o rápido declínio do movimento operário durante os períodos
surpresa como também surpreendeu os trotskistas chineses. A que de reacção. Por outro lado, a dispersão do campesinato constitui uma
foi devida essa vitória? Uma das explicações propostas no seio do das suasfraquezas decisivas, tanto no plano social como no político.
Mas é este mesmo factor que permite ao movimento camponês manter
movimento trotskista foi a de que se tratava do resultado dum con-
uma certa continuidade em período de declínio. É essetraço do mo-
curso de circunstâncias em nada dependendo da acção de Mao
Tse-tung. É certo que tais factores representam também um papel
vimento camponês,
combinadocom a incapacidade
do Kuomintang
na história. No entanto, tentar explicar um acontecimentocom a am de unificar o país em 1927(onde se mantém a poder dos senhores

plidão da vitória da revoluçãochinesapartindo exclusivamente,


ou de guerra locais), que permite que os facasda segundarevolução
chinesa continuem a ressoar nos campos, mesmo depois do esma-
mesmo essencialmente,de circunstâncias conjunturais, minimiza ine-
vitavelmente e nega, no limite, a existência da dinâmica social em gamentodo movimento operário urbano e quando a tendênciageral
era de declínio e de contra-revolução. A repercussão da segunda
acção por detrás do super'6cial facto acidental e das formas subjec-
tivas que dirigem e canalizam essadinâmica. A maneira adequada revolução chinesa nos campos permitiu assegurar a continuidade
entre esta e a terceira revolução chinesa.E é Mao Tse-tung, mais
de formular a questãoé a seguinte: qual a política seguidapelo PCC
que Ihe permitiu centralizar e acumular as gigantescasforças em do que ninguém,quem mantémesselaço de continuidade.
No princípio de 1927, após um inquérito dum mês sobre a 'si-
jogo, ganharo apoiodo proletariadoe do campesinato
e, depois,
tuação do campesinato na província de Hunas, Mao escrwia:
obter uma vitória social, política e militar?
<<Arevolução nacional requer uma grande mudança nos campos-
A revolução de 1911 não provocou essa mudança e daí o seu fracasso.
Esta mudança desenvolve-se presentemente e é um factor importante
A dinâmica revolucionária nos campos
para o êxito da revolução». Decerto que, em si mesma,estacondu-
Ao aplicar a política estalinista do«bloco das quatro classes>>,
ção não tem nada de extraordinário. Lenine e Trotsky escreveram
o PCCI abandonou ao Kuomintang todos os ganhos da segunda revo- abundantementesobre a importância da aliança entre operários e
lução chinesa dos anos 20, adquiridos ao preço do -sanguedos traba- camponeses,
e Trotsky, em particular,acentuouo caráctercentral
lhadores e camponeses. Uma vez usurpadas essa-saquisições, o da reforma agrária no processo da revolução permanente. Contudo,
Kuomíntang voltou-se contra o PCC pela violência. O golpe montado para o PCC dos anos vinte, esta conclu-sãode Mao era significativa
por Tchang Kai-chek em Xangai em 12 de Abril de 1927 despedaçou porque expressava a redescoberta duma verdade esquecida. Duas

98 99
razõesprincipais podem explica-la. Desde logo, para manter a sua
Na sua obra«Porque motivo pode existir na China o poder ver-
aliança com o Kuomintang durante o período de 1925-27, o PCC
melho»,Mao acentuaque «o Exército Vermeho actual... é uma
tinha limitado o desenvolvimento
do movimentocamponêse, em cisão do exército Revolucionário Nacional que recebeu uma formação
particular, do movimento camponêsarmado. Disso resultou que a política democrática e sofreu a influência das massas operárias
maioria da direcçãodo PCC considerou que Mao propunha apoiar e camponesas».A existência deste núcleo de Exército Vermelho
as sublevações camponesas. Depois, mais importante ainda, os mem-
proletarizadofoi um importante factor da capacidadedo PCC para
bros do jovem PCC consideravam em geral, conscientementeou não,
resistir ao atraso ambiente do meio camponês,ao iniciar a constru-
que a Revoluçãode Outubro era o único modelo válido de devo-
ção dum exército camponês. Para mobilizar os camponeses e manter
ção. Partindo da correcta compreensãode que o proletariado é a o Exército Vermelho, o PCC devia consolidar as basesrevolucioná-
classe motora duma aliança entre operários e camponeses,conside-
rias. Tal era possível devido«aos diferentes modos de exploração
ravam como confusão estratégicaque a tomadado poder -sedesen-
económica locais(a economia chinesa não era uma economia capi-
volveria primeiro nas cidades através de insurreições operárias, como
talista unificada) e às diferençasentre si das regiõesdominadaspelo
condição prévia do desenvolvimento da revolução através do campo.
imperialismo. Os repetidos conflitos e as guerras opondo diversas
Existia pois forte tendênciapara dar prioridade ao trabalho nascida-
regiões brancas permitiram estabelecer o regime vermelho entre os
des, a tal ponto que o movimento camponês era por isso negligenciado
regimes brancos à escala duma ou de várias pequenas localidades. ..
ou mesmo ignorado. Essa concepçãomecanicista era partihada pela
Enquanto estivermos convencidos que os conflitos e as guerras entre
direcçãocentral do P(]C,(que rejeitavaa propostade Mao para
regimes brancos irão continuar, o nascimento, existência e desenvol-
«impelir o partido a formular uma nova política para com o movi-
vimento das regiõesvermelhasnão devem ser postasem dúvida.»
mento camponês») e pelos trotskistas cllineses .
Mas Mao não tinha perdido de vista a perspectivaa longo prazo:
Em Outubro de 1927, Mao reagrupou o que restava do exército
«a questão de saber se um regime soviético de operários, campone-
vencido após a«insurreição da colheita de Outono» e estabeleceu
sese soldadosconseguirásubsistir a longo prazo, será determinada
uma base revolucionária em Chiang Kan Shan. A partir desse mo-
pelo desenvolvimento da situação revolucionária no conjunto do
mento, o principal campo de actividadede Mao situou-senos meios
país. Se esse desenvolvimento tiver lugar, o regime vermelho das
rurais. Não obstante uma política oportunista a vários respeitos, o
pequenaslocalidadespode então existir a longo prazo. E será uma
PCC conseguiu, sob a direcção do grupo de Mao Tse-tung, ganhar
das forças que contribuirão para a tomada do poder no conjunto do
o apoio dos camponesespobres e médios inferiores, graçasà política
país. Caso contrário, e se a situação revolucionária estagnar durante
de refonna agrária do Partido. Se até então esta força gigantesca não
um período relativamentelongo, como, por exemplo, o período
tinha papel político independente, iria tornar-se, -sob a direcção do
1905/1917 na Rússia, então o-sregimes vermelhos não poderão so-
PCC, o factor social decisivo da terceira revolução chinesa.
breviver a longo prazo».
A estratégiaglobal de Mao para a revoluçãoencaravao cerco
A última razãoinvocadapor Mao para explicara existênciados
das cidades pelo campo e o desencadeamento
duma guerra revolu-
regimes vermelhos nos campos era«a força do PCC e a justeza da
cionáriaconduzidapor um exército camponês,a fim de tomar o
sua política». Não explicava exactamente o que entendia por isso,
poder. Esta estratégiarepresentavao apogeuda prática empíi'icade
mas quem quer que examine de maneira objectiva este problema tem
Mao. Donde vinha a força do Exército Vermelho? É aí que se en-
que admitir que a questão chave era a aplicaçãoda reforma agrária.
contra a chave que pennite explicar a vitória.
A política agrária do PCC mudou por várias vezes, oscilando da es-
]00
zoz
O cerco das cidades pelos campos era uma nova estratégia revo-
querda para a '=lireitae inversamente.Mas nunca o PCC deixou de
lucionária após a Revolução de Outubro. A base desta estratégia era
confiscar as terras dos camponesesricos. O PCC também nunca in-
a seguinte: visto o desenvolvimento desigual do movimento operá-
tenompeu a aplicaçãoda reforma agrária. O conteúdo essencialdesta
rio nascidadese do movimentoagrárionoscampos(ena medida
política era a confiscaçãodas terras dos proprietários fundiários e a
sua distribuição aos camponesespobres e aos operários agrícolas. em que não abandonassea sua independência política), o PCC estava
em situação de estabelecer à partida as bases revolucionárias nos cam-
A política definida em relaçãoaos ricos e médioscamponeses mu-
dou de quando em quando, masa linha fundamental continuou a ser pos, de aplicar a reforma agrária, de consolidar o seu papel de diri-
gente entre os camponesespobres, de armar o campesinato e de, em
a perspectiva de ganhar a maioria do campesinatoe de interditar o
desenvolvimento do campesinato rico. seguida, utilizar a força social decisiva deste último a fim de tomar
Quais foram os efeitos da reforma agrária no campo,nos luga- o poder de Estada.Esta estratégiaera viável, a despeitodo facto de
res em que a grande maioria da populaçãose compuiüa de campo- dois perigos permanentesa espreitarem: em primeiro lugar, o PCC
nesespobres e médios? Pode-secitar aqui a opinião dum historiador arriscava-se a ver romper-se o elo que o ligava à classe operária;
do Kuomintang:«Após a distribuição das terras, o PCC fez todo o depor-s, arriscava-se a sofrer um processo de erosão e de adaptação
possívelpor mobilizar a força de trabalhode toda a áreacircun- à consciência
atrasadado campesinato.
Na medidaem que o PCC
dante, velhos e novos, mulheres e crianças, com o fim de assegurar fosse capaz de resistir a estes dois perigos, a estratégia de Mao per-
a produção. Os camponesessentiam-sefelizes por obter terras. Foi manecia praticável. Independentemente da maneira pela qual Mao
assim que, inconscientemente, todos os operários agrícolas se encon- formulava a sua linha, a aplicação desta com êxito demonstra que o
traram sob o controle do PCC. Os camponeses não só asseguravam PCC foi na realidade dos factos capaz de resistir àquelesdois perigos
a produção como se distavam no Exército Vermelho em período e o crédito deste sucessodeve atribuir-se principalmente à direcção
de insurreição. . ..Todos os objectivos da política do PCC se encon- maoísta.
travam então atingidos. A revolução agrária tornou-se assim o en-
godo e a armadilha dos camponeses».(WangJi-men, <<Históriado
Partido Comunas-taChinês», Hong-Kong, 1974). Estaline e Mao
Pode-seresumir de modo mais positivo a descriçãodeste pro-
cessoda maneira seguinte: nessaépoca, a reforma agrária aprovei- Importa notar um outro importante factor para a vitória da ter-
tava aos pequenos camponeses, aos camponeses médios e aos operá- ceira revolução chinesa: Mao não seguiu, em dois pontos essenciais,
rios agrícolas, libertando-os do jugo da antiga sociedade.Em contra- a política preconizada por Estaline. Trata-se do carácter da segunda
partida, os camponeses aceitavam a direcção do PCG e seguiam a sua aliança entre o PCC e o Kuomintang(no decurso da segunda guerra
política. A função do poder soviéticoconsistia pois, ao nível econó- mundial) e da política a seguir pelo PCC após a guerra.
mico, em aplica a reformaagráriae, ao nível político,em ganhar
Em Julho de 1935, quando do 7.' Congressoda Terceira Inter-
o campesinato e centralizar mihtalmente as forças revolucionárias nacional, Estaline pâs oficialmente termo à sua orientação ultra-
dos camponeses
pobres e dos operáriosagrícolas.Foi disso que a esquerda do«terceiro período>>e fez a viragem à direita, em direcção
estratégia de Mao de cerco das cidades pelos campos extraiu a sua
à política das frentes populares. Os resultados foram desastrosospara
força. Sem reforma agrária teria sido impossível concentrar a força
a quase totalidade dos partidos comunistas que aceitaram e aplica-
dos camponesesem todo o país.

102
ram esta política. O PCC, contudo, não só escapouao desastre como e dos juros». Estas reivindicações, combinadas com a capacidade
se viu finalmente vitorioso. Porquê? de resistênciaefectiva do PCC à agressãojaponesa,permitiram-he
Sob a dhecção de Mao o PCC conseguiu manter a independência ganhar um apoio entusiástico das massasatravés do país. A aliança
das suas próprias forças armadas e aplicar esta consigna de Mao: de tipo frente popular foi assim transformada numa frente baseada
«O Partido Comunista deveria recorrer sempreà suaprópria orien- nas massas.É esta transformação que explica como o PCC pede au-
tação positiva, rigorosamente correcta, antijaponesa, antitraidora, e mentar as suas forças durante aquela aliança, não só em termos abso-
à acção disso decorrente, a fim de conquista a hegemoniano seio lutos mas também em relação ao Kuomintang. Estaline atacouesta
da frente antijaponesa». Durante o período em que mantevea sua orientação de Mao na aliança como um desvio de esquerda,enqu-anta
política de frente com o Kuomintang no decursoda guerra sine-japo- que os trotskistas chinesesviram aí uma traição de direita, sem com-
nesa, o PCC não recuou perante a formação de«slogans» tais como preender,quer uns quer outros, o conteúdo real da transformação
<<VivaTchang Kai-chek». Mas, ao mesmo tempo, Mao Tse-tung fez que se realizava.
observar que«ainda que possa juntar-se à luta antifeudal e anti- Isto não quer dizer que a direcçãomaoísta não tenha cometido
imperialista em certas drcunstâncias históricas, a burguesia deverá, sérios erros, ou que a vitória do PCC compense todas as suas faltas
por efeito das suasprópriasfraquezase num outro contextohistó- políticas. Mas a crítica da política do PCC deve partir da constatação
rico, oscilar e trair esta luta. A história chinesa demonstrou já essa fundamental que os erros não impediram a vitória, o que significa
lei. A lüstória determinou pois que não é através duma direcção bur- que os erros devem ser avaliados à luz da vitória, sobretudo se se
guesa mas forçosamente através da direcção do proletariado que a tomar em conta o facto das tão desastrosas consequências que a frente
missão de revolução democrática anta-imperialista e antifeudal poderá popular teve em quasetodo o movimentocomunistainternacional.
ser cumprida na China.. . Ou o pmletariado seguiráa via burguesa, No fim da segundaguerra mundial, a China não se encontrava
ou a burguesia seguirá o proletmiado. Esta questão da direcção revo- na esfera de influência da União Soviética. A política de Estaline pre-
lucionária na China é o factor determinanteda vitória ou da derrota conizavaa formação dum governo unificado])CGKuomintang, livre
da revolução». E acrescenta:«A nossa orientação política indepen- para aceitarque o PCC abandonassetoda uma parte das suasforças
dente e a nossasólida unidade estão ao .serviçodo único fim de atrair mi[itares. No entanto, Mao não seguiu esta linha. Como fez observar
mihões de pessoasà Frente do Povo, Resistirao Japão». mais tarde,«a revolução chinesa alcançou a vitória voltando as costas
Assim, a segundaaliança do Kuomintang e do PCC foi qualita- às vontades de Estaline. (Ele) 'interditou a revolução'... Se tivés-
tivamente diferente da primeira no sentido de que o PCC conservou semosseguido
o métodode WangMing,ou sejao de Estaline,a
a sua independência política, militar e organizacional. Além disso, revolução chinesanão teria tido êxito. Mesmo quando esta triunfou,
durante o período de aliança, o PCC desenvolveucom sucessoas Estaline assegurava que era falsa».(Intervenção na Conferência de
suas bases em numerosas províncias. Alargou pois gradualmente a Chengdu,Março de 1958, «Mao Tse-tung, textos 1949-1958, edição
situação de dualidade de poder através do país. Ao mesmo tempo, do Cera,p. 485).
Mao lançou um apelo para a criação duma«assembleia popular real- No imediato após-guerra, a política do Kuomintang consistiu
mente representativa e a adopção duma constituição realmente demo- em apoiar-sesobre os imperialistaspara recuperaras regiõesque
crática». Socialmente,o PCC preconizou«a melhoria dos salários tinham sido ocupadaspelos japoneses,e em preparar uma ofensiva
dos operários, camponeses e soldados empenhados na resistência aos geral contra o Exército Vermelho. Mao fez efectivamente apelo à
japoneses...,a aboliçãode taxasexcessivas
e a reduçãodasrendas formação dum governo unificado, mas não esqueceu as experiências

104 10j
da segunda revolução chinesa. Pelo contrário, estava pronto a lançar revolução. Escreveu por exemplo: <<Numerosos camaradas levan-
na batalhao Exércitode Libertação
do Povo,com a forçade taram já a questão d-anatureza e do futuro da República Democrá-
910 000 homens, uma miHcia de 220 000 homens e forças de auto- tica da China. Responderemosque a sua naturezade classe-sebaseia
defesareunindo10 milhõesde homens-- tudo o que tinha sido na aliança de todas as classes, mas que o seu futuro pode ser não capi-
posto de pé durante a guerra -sho-japonesa.Em 9 de Agosto de 1945 talista porque a nossa República da China é construída no processo
Mao deu ordem ao 8.' exército de marcha,ao novo 4.' exército e às de conclusão da tarefa de resistência nacional sob a direcção do pro-
outras forças populares para atacar em toda a parte, e sempre que letariado e dentro do novo contexto internacional(a vitória do socia-
possível, os ocupantes que recusavam render-se, para eliminar a sua lismo soviético e a aurora da revolução mundial). Portanto, segundo
força logística, para capturar as suas armas e bens, para ampliar com as condiçõessociais, a República Democrática em geral não ultrapas-
o maior vigor as regiões ocupadas e para organizar forças militares. . ., sou a natureza do Estado burguês. No entanto, de acordo com as
para organizar imediatamenteum exército clandestinoe preparar condições políticas concretas, deveria tornar-se um Estado baseado
um levantamento armado.»
na aliança do proletariado, do campesinato e da burguesia. Existe
l Em 10 de Agosto de 1945, Chu Teh, comandanteem chefe do pois a possibilidade de desenvolvimento capitalista, como fica aberta
Exército Vermelho, ordena a ofensiva gera. Esta política tinha por a possibilidade de transformaçãocompleta sobre eixos não capita-
fim alargar a situação de dualidade de poder. A palavra de oi:dem listas. O partido proletário chinês deve fazer o seu melhor para lutar
do governo unificado não era concebida senãocomo meio de ajudar por esta segunda possibilidade».
o desenvolvimento da situação de dualidade de poder. No momento Após a terceira revolução chinesa, foi instaurada a«Ditadura
decisivo, Mao desobedeceu abertamente às ordens de Estaline, não Democrática do Povo». Segundo a definição de Mao, o papel desta
só recusando obediência a Tchang Kai-chek(como Esta]ine ]he orde- ditadura era o seguinte:«Forjar uma frente única do proletariado, do
nara) mas indo mesmoaté a denuncia-locomo inimigo do povo. campesinato, da pequena burguesia nacional, a representar a base
Se Mao tivesse realmente alimentado ilusões ao nível do governo uni- necessária
à criaçãodo Estadoda Ditadura Democráticado Povo,
ficado, a revoluçãoteria muito bem podido falhar nessemomento para fazer surgir desta frente uma aliança do proletariado e do cam-
decisivo.
pesinato sob a direcção do proletariado.» Em ligação com esta linha,
o PCC reunia, em Setembro de 1949, a Conferênciaconsultiva do
povo chinês. Em Setembro de 1954 os t'epresentantesdas quatro
2 Mao e a Revolução P-ermanente classesparticipavam lla l .' Assembleiapopular nacional.
Na prática, por detrás desta forma de regime, era o Partido Co-
A teoria de Mao sobre a Nova Democracia mostrava claramente
munista que detinha a hegemonia. De resto, Mao admitiu-o mais
que era favorável à revoluçãopor etapas.Mas é por igual claro que, tarde:«A diferença no nossopaís entre os sovietesda União Sovié-
no decurso da terceira revolução chinesa, Mao seguiu empiricamente tica e a Assembleia popular nacional apenasexiste ao nível da deno-
a via da revolução permanente. Como explicar esta evolução, cuja
minação. Ambos são órgãos representativos. Na nossa Assembleia
política e expressão teórica eram contraditórias? popular nacional encontram-se representantes da burguesia, aqueles
Antes de mais, é preciso notar que Mao, tendo vivido a segunda que romperam com o Kuomintang bem como outras personalidades
revolução chnesa, a reforma agrária e os regimes vermelhos nos democráticas. Todos aceitam a direcção do Partido Comunista, ainda
campos,não podia ignorar a questão da evoluçãonão capitalista da que alguns tenham tentado, mas em vão, fomentar perturbações».

106 107
Mao conclui pois que a RevoluçãoDemocráticaPopular fundada em política precedente.Depois de ter instalado uma ditadura do prole-
1949 era«fundamentalmenteidêntica à forma de ditadura do prole- tariado deformada, o P(]C confiscou os bens dos capitalistas«com-
tariado instaurada na Rússia com a Revoluçãode Outubro». E isso pradores», ou seja, de 80 % do capital fixo das empresas indus-
era verdade, apesar do carácter deformado da ditadura do proleta- triais e de transportes. A produção das empresas passou a estar so-
riado estabelecida
na Chinaem 1949. bre controle estatal. Noutros domínios, a gestãoconjunta do Estado
Porque foi a burguesia incapaz de <<fomentar perturbações>>? e da iniciativa privada já tinha sido posta em prática desde 1949.
Desde logo, porque a terceira revolução chinesa não apenas destruirá O resultado da aplicação de todas estas medidas foi que, enquanto
militarmente o Kuomintang como destruirá também politicamente a em 1949 a parte do PNB industrial da indústria privada se elevava
burguesia chinesa como dasse. Depois do Kuomintang e a bur- a 55 %, essa percentagem baixaria para 28,7 % desde 1951. No
guesia terem abandonadojuntos o continente, o que restavada bur- decurso desses anos, diversas campanhas como os <<três anta» e os
<<cinco anti>> foram dirigidas contra o poder económico comercial,
guesia reconhecia-seincapaz de se unificar e de centralizar politica-
financeiro e social da burguesia. Estas campanhasprovocaramuma
mente as su-asforças. A destruição do exército do Kuomintang e a
dissoluçãodo seupartido,coma desintegração do aparelhode Es- aceleração do processo de nacionalização da indústria. Foi nesse con-
tado do Kuomintang, não deixaram subsistir nenhumaestrutura texto que o PCC revelou a sua linha geral e preparou o l .' plano quin-
política susceptível de permitir à burguesia o exercício do seu domí- quenal, que iniciou de modo activo o processo de socialização.
nio sobre as massaschinesas.Depois, a terceira revolução cl)mesa Em 1961 Mao comentava assim a natureza do período transi-
expulsou o imperialismo instalado na China. Dava-seassimum golpe tório:«E incorrecto pensarque, depois da libertaçãode todo o país,
decisivo no que restava da burguesia. A política de<<contenção» a fase inicial da revolução era essencialmentedemocrático-burguesa
(como o bloqueio da China) que foi a seguir aplicadapelo imperia- e que só com o tempo se desenvolveria uma revolução socialista».
lismo mundial, enfraqueceu ainda mais essa burguesia, privando-a Empírico, Mao reconhecia a forma tomada por esta transformação
das suas ligaçõescom o capital e os mercadosinternacionais.Final- socialista. Escrevia em 1958: <<Sobrea revolução ininterrupta, a
mente, a base social da democracia nos campos foi destruída econo- nossa resolução é uma sucessãode revoluções, A partir de 1949,
micamente pela reforma agrária, pelo desenvolvimento das coope- desde que tomámos o poder em todo o país, pusemos em execução
rativas, pela colectivizaçãoe intervençãodirecta e forte do novo go- a reforma agrária antifeuáal. Com o fim da reforma agrária come-
verno ao nível dos bancos, da finança, do comércio externo, das rela- çou a cooperativização da agricultura. Esta foi depois seguida da
ções capital-trabalho, das relações produção-comercialização, bem transformação socialista do comércio privado, as três grandes tMns-
como pelas relações entre comercializaçãoe troca. Estas medidas formações socialistas, uma revolução socialista dos meios de produção
atiraram a burguesia para uma posição de impotência e de passivi- e do sistema de propriedade que estavam fundamentalmente termi-
dadetotais. Em última análise,a importânciae a paralisação
polí- nadasdesde 1956. Foi então que se seguiu, no dtimo ano, a revo-
tica da burguesia exprimia a sua fraqueza social e económica. lução socialistanas frentes política e ideológica.»
Representaria
a linha geral de transformaçãosocialista,apre- Mas Mao não conseguiu teorizar esta transformaçãoem termos
sentada pelo PCC em 1952, uma viragem na política do partido cujo marxistas. Para ele, a revolução ininterrupta representavamais do
resultado teria sido o abandonoda teoria da revolução por etapas, que a ordem e as formas de transformaçãoque tinham tido lugar
substituindo-a pela revolução permanente? No que respeita às me- durante o processo da terceira revolução chinesa. Qu-ais são pois os
didas práticas, esta <(novalinha geral>>era de facto a continuação da mecanismospelos quai-sas formas e a ordem desta transformação são

108 109
determinadas, e até que ponto esta própria transformação é imposta Este erro reflecte o empirismo histórico de Mao. E também ilustra
pela necessidade histórica? Se assim é, quais são as implicações polí- o seu pensamento político, que nunca assimilou o conceito mar-
ticas e estratégicasque disso decorrempara o Partido Comunista xista segundo o qual a passagem do capitalismo ao sociaHsmo deve-
durante este período? Quais as fraquezasfundamentaisda teoria ria necessariamente
ser um processomundo-al
e orgânico.É aí que
da Nova Democracia? São estas as mais importantes questões teó-
se deve procurar a origem da sua teoria do socialismonum só país,
ricas suscitadaspela terceira revolução chinesa, questões cuja impor- o socialismonacional, e o seu rumo subjectivo quanto à construção
tância Mao não conhecia.É por isso que a sua concepçãoda revo- do socialismo.
lução inintenupta permaneceu empírica e nunca foi teoricamente
A noção do socialismo num só país, desenvolvida por Mao,
formulada no sentido mamista do termo.
encontra-setalvez expressa de maneira ainda mais esquemáticana
frase seguinte:«Mesmo quando cheguemosa instaurar o comu-
nismo, desde que os Estados imperialistas subsistam, a existência
3. O socialismo segundo Mao do Estado contínua a ser necessária».Por outras palavras, segundo
Após o refluxo da onda revolucionáriana Europa, o centro Mao pode-senão só chegar ao socialismomas até ao comunismo
de gravidade da revolução mundial deslocou-se para os países antes que a revolução mundial esteja vitoriosa. Além disso, a socie-
dade comunista pode acomodar-secom um aparelho de Estado.
subdesenvolvidosdurante um período bastante prolongado. Foi
esse desvio da revolução mundial que permitiu a Mao concluir Esta noçãodo comunismonum só país representaa versão extrema
empiricamente que a revolução estalada mais facilmente nos países da teoria do socialismonum só país.
atrasados do que nos países capitalistas avançados. Cometeu o erro É neste quadro geral que Mao concebeu a construção duma
de tomar esta conclusãocomo uma lei histórica geral e agravou-o sociedadesocialista como processo puramente nacional.«A orien-
em seguida ao afirmar que os países subdesenvolvidos chegariam tação correcta (na construção do socialismo -- S. S. Wu) está em
mais depressaao socialismo do que os países avançados.Nas suas que cada país faça o seu menor, não dependasenãode si e tente
notas da Economia Política da União Soviética, escreveu:«Lenine realizar essa tarefa independentemente, na medida do possível. Mas,
escreve, "para os países atrasados a transição do capitalismo ao em prindpio, não se deve depender dos outros nem realizar senão
socialismo será mais difícil". No presente, parece que esta obser- aquilo que o poder ser. Deve-se,em particular, desenvolvera agri-
vação é errada. É forçoso constatar que a transição do capitalismo cultura por todos os meios. Depender de outros paísesno que res-
ao sociaHsmo se torna tanto mais fácil quanto a economia é atrasada; peitaà alimentação,
é muito perigoso».
A expressão«muito
peri-
a dificuldade não é maior. Quanto mais o povo é pobre, mais aspira goso» reflecte a amarga experiência do próprio Mao, constrangido
ao socialismo».É evidente que Mlao confundia dois problemas dis- a depender da União Soviética quando se encontrava cercado pelo
tintos: por um lado, o do papelde ponta que pode representara imperialismo. Foi precisamenteesta experiênciaque o levou a for-
revolução colonial em certas situaçõeshistóricas específicase, por mular a sua política de auto-suficiência.Concebidacomo manobra
outro lado, o da transformação socialista dos países subdesenvol- táctica numa situaçãodifícil, esta política podia justificar-se de ma-
vidos. Partindoda verificaçãoque a revoluçãotinha estaladonos neira conjuntural. Mas transforma-laem orientaçãogeral para a
países atrasados antes de estalar nos países avançados, Mao concluía construção do -socialismo implicaria a rejeição da transformação
que os paísesatrasadosatingiriam o socialismoantes dos outros. socialista concebida como processo mundial. Esta generalização
apresenta um carácter extremamente reaccionário de que a política o processode mecanização
e de electrificaçãorural, de industriali-
externa de Pequim é uma das mais recentes manifestações. zação comunal, de industrialização nacional, bem como o da pro-
Mao tinha compreendido
que as formas da antigaChina esta- moção do nível cultural, educativo e técnico do povo. Calculámos
vam submetidasàs relaçõesde produção dominantes e à exploração que a produção de aço poderia atingir 50 milhões de toneladas após
imperialista. A revolução chinesaera pois uma tentativa de elimi- quatro anos. Forneceremos às comunas um milhão de toneladas no
nar os obstáculosà libertaçãodas forças produtivas.da China. As próximo ano, dois milhões de toneladas no ano seguinte e três milhões
novas relações de produção criadas por esta revolução eram mais de toneladas um ano depois. Com estes seis milhões de toneladas
avançadasdo que as forças produtivas reais, o que é uma contradição de equipamentoem aço e em material, as comunaspoderãoprova-
pi:esente em todos os países subdesenvolvidos aonde a revolução velmente completar a mecanizaçãoda agricultura. A nossa produ-
proletária triunfe. Para os mandstas-revolucionários,
esta contradi- ção será pois suficiente para a industrialização comunal dentro de
ção encontra a sua solução última na vitória da revolução à escala quatro, cinco, seis ou sete anos. Isso não é, decerto, mais do que a
mundial. Para M-ao,no entanto, a soluçãopodia ser encontradano primeira etapa,que será seguida duma segundae duma terceira eta-
próprio interior da China. A principal força motriz deste processo pas, permitindo atingir a verdadeira construçãodo socialismo(o que
devia ser a vontadesubjectivae voluntaristada população.Logo, significa que se deverá contar com quinze a vinte anos ou mais)».
«desdeque as comunastenham atingido uma força económicareal, Mao definia esta perspectiva em 1959. Dezassete anos passados,
é possível realizar a propriedade comunal completa. O sistema de nem mesmo a propriedade comunal foi atingida, sem falar da indus-
propriedade de todo o povo pode então ser realizado. Precisaremos rtialização e da mecanização comunais.
pmvavelmente de dois planos quinquenais para lá chegar. Não se Não pretendemos por isso condenar a colectivização agrária e a
deverá mostrar demasiada pressa. É isso precisamente o que se formação das comunas populares antes que sobrevenha a vitória da
contém na resolução de Pitaiha (de 29 de Agosto de 1959 ) . «Serão revolução mundial. Efectivamente, a colectivizaçãoda agricultura é
precisos três ou quatro, cinco ou seis anos ou mesmomais. Preci- UH dos fundamentos da ditadura do proletariado durante o período
saremos de atravessar então várias fases de .desenvolvimento para de transição,porque sem ela não existe ponto de partida dos países
que, após quinze anos, vinte anos ou mais, as comunas socialistas atrasados para o desenvolvimento em direcção ao socialismo. A colec-
se tornem comunas comunistas». Na mesma exposição Mao pros- tivização da agricultura no período transitório é duplamente signi-
seguia esta intervenção por estas palavras:«Foram precisos quatro ficativa. Desde logo, lança as bases do progresso das forças produ-
anos, de 1953 a 1956, para passardas equipasde entreajudaàs tivas no quadro das froneiras nacionais. Depois, representauma
cooperativas avançadas,que percorreram várias e diferentes etapas. orientação táctica sem a qual a transição para relações de proprie-
Serão talvez precisos quatro anos ou mesmo mais para passar da dade socialista dos bens de produção não pode prosseguir até à
propriedade colectiva das cooperativas superiores à propriedade vitória da revolução mundial. Neste sentido, a colectivizaçãotrans-
colectiva das comunas. Serão talvez precisos cinco, seis ou sete anos, borda do quadro das fronteiras nacionais. Mao não teve em conta
durante os quais devemos evitar todo o passo apressado.Trata-se esta última consideração e acreditou que o socialismo poderia ser
de promover o nível de produção das equipas pobres para que atin- instaurado na China na medida em que a colectivização agrária
jam o das equipas ricas. Devemos definir um meio para aí chegar. fosse executada correctamente. E isso por sua vez dependia essen-
Como a comuna é extensae compostade numerosa-s equipasde pro- cialmente da mobilizaçãoda vontade revolucionária da população.
dução, teremos necessidadedum período mais longo para concluir É neste sentido que a sua prática se fundava no subjectivismo.

IÍ2
8
A concepção
da ditadura do proletariadoformuladapor Mao médiosdo partido, hábitos que nãa podem ser prontamenteeli-
mostrou-se igualmente impregnada de empirismo. Não foi através minados».
da experiência do movimento operário internacional, da Comuna de Nessa época, a experiência do sistema soviético saído da Revo-
Pauis,da Revoluçãode Outubro, etc., que Mao chegouà ideia da lução de Outubro estava ainda fresca no espírito de Mao, que, por
ditadura do proletariado.Foi muito mais através da sua própria isso, podia desvendar de maneira rigorosa as contradições ligadas
experiência dos regimes soviéticos nos meios rurais chineses durante à construção dum sistema soviético nos campos em confronto com
os anos trinta e quarenta,combinadacom a sua compreensão da o atraso do campesinato. Mas é também claro que Mao não com-
caricatura do praletaríado que então existia na União Soviética sob preendeu que os sovietes eram a expressão mais acabada do movi-
Estaline. mento operário russo autónomo, que o sistema soviético era cons-
A partir de 1928 Mao submeteu ao Comité Central do P(1)(:um truído de cima para baixo pelo próprio movimento operário. Mao
11 i:elatório descrevendoas suas experiênciaspráticas na organização via os <<sovietes>>
camponesesprincipalmente como uma criação do
dos regimes soviéticosno campo.«Os sovietes existiam a todos os partido.
H Mveis -- escreve -- mas frequentemente apenas no papel. Quanto A partir de 1934, Mao discute acercada questão dos sovietes
a uma luz bastante diferente: «A democracia dos sovietes foi am-
às massas operárias e camponesas, e até membros do partido, a sua
maioria não compreendia o significado dos sovietes. Em numerosos pliada, mas deve-senotar que em numerososlugares é ainda muito
insuficiente. A luta contra o burocratismo deve ser desencadeada
locais; a Assembleia representativa dos operários, camponesese
soldadosnão existia. A nível de aldeia, de região e até de distrito, com vigor, mas os obstáculosque existem entre os sovietese as
os comités executivos dos sovietes são eleitos pelas massasduma massasdevem ser eliminados. Estes obstáculossão a burocracia e
ou dou-tra maneira. Mas as reuniões de massa são mal organizadas. o autoritarismo. Aqueles que trabalham em favor do socialismode-
Não há discussão real, não há formação política e estas reuniões são veriam aplicar as tarefas dos sovietes com base na mobilização e na
facilmente dominadas por intelectuais ou oportunistas. Não podem persuasãodo povo. Não deveriam usar métodos coercivos e autori-
compreender o que é um soviete, nem que a Assembleia represen- tários. Devuiam dar atenção a cada reivindicação e proposta do
tativa dos operários,camponesese soldadosé a autoridade suprema, povo, e não ignora-las».Desdeentão,Mao deixade pâr o acento
enquanto que o Comité executivo não passa dum órgão adminis- sobreo facto de o soviete ser a autoridade supremaque exprime a
trativo que funciona fora das sessõesda Assembleia reprêgentativa: vontade das massas.O soviete é antes concebido como sendo a van-
Está aí o pior erro no que respeita ao aparelhopolítico das regiões guarda das massase preocupa-se com fazer-lhes representar o seu
fronteiriças. Noutros locais, as Assembleiasrepresentativasexistem papel de vangu:ardade maneira não burocrática.
mas não -são consideradas mais do que organismos ad õoc, desti- Esta concepçãodo sistema soviético viu-se ainda reforçada pela
nados a eleger os Comités executivos qué centralizam o poder após estratégia seguida pelo P(llC durante a terceira revolução chinesa.
as eleições, sem mais se falar das Assembleias. A organização sovié- O próprio movimento operário não des'efnpenhou qualquer papel
tica real existe, mas é a excepção.Deve-seisso ao facto de l)ropor- independentena tomada do poder, visto que as cidadesforam cer-
mos uma propagandae uma educaçãoinsufidentes acercados so- cadas pelo campa. O PCC penetrou nas cidades como libertador
vietes,concebidoscomo novo sistemapolítico. Deve-seisso aos dos .trabalhadores,
que não tinham por: si próprias criado sovietes
maus hábitos ditatoriais e autoritários herdados da período feudal como expressão suprema da sua independência. O PCC foi pois
e ainda enraizadosna consciênciadas massase até na dos quadros assimlevado, muito naturalmente, a representarum papel <oubsti-

ÍZ4
tucionista» na ditadura do proletariado, papel que tinha, além disso, 4. Mao e a Revolução Cultural
a vantagem de corresponder ao modelo já existente nos campos.
É neste sentido que a ditadura do proletariado na China foi defor- A Grande Revolução Cultural foi o mais relevante aconteci-
mada desde a sua aparição; é neste sentido que o Estado operário mentopolítico depoisda tomadado poder em 1949. Quais os mo-
chinês foi deformado desde a nascença. tivos que levaram Mao a desencadeá-la?
Deste ponto de vista, a defesapor Mao das basesda democracia Temos desde já que compreender a natureza da tendência diri-
chinesaexprimiae justificava,no plano teóricoe ideológico,o ca- gida por Liu Shao-chi.No fundamental, este representaa corrente
rácter deformado da ditadura do proletariado, no qual o partido direitista no seio do PCC durante o período transitório, dito da
se tinha substituído à classe operária para dirigir o país. O carácter «Nova Democracia». Já esboçámoso processo de revolução perma-
reaccionário desta posição não se revelou totalmente enquanto a nente seguido pelo PCC. Mas este, educado na base pragmática da
classe operária se manteve dócil e não desafiou a função dirigente teoria maoísta da <<NovaDemocracia», ter-se-á mostrado apto a
do partido, reivindicandoa aplicaçãodirecta do seupróprio poder. evaluir no sentido duma política de revolução permanente tão facil-
11 Quando dos acontecimentos de Janeiro de 1967 em Xangai, durante mente como o pragmático Mao? Não se chocada a antiga linha
a RevoluçãoCultural, Mao discorreu assim:«Se Xangai e todo o política do PCC com a nova linha, que a contradizia?
l
país se transforma em comunas,que deverá fazer o partido?, em Desde 14 de Junho de 1950, quando da segunda sessãodo pri-
que se tardará então?Como os comitésse compõemde membros meiro Conselho nacional da Conferência consultiva política, Liu
e não membrosdo partido, onde situaremosnóso partido?Con- Shao-chi tinha declarado:«A política que seguimos visando preser-
tudo, o partido é necessários. . . O partido deve existir nas comunas. var a economia dos camponeses ricos não é decerto temporária.
Poderá a comuna substituir o partido?» O sentido desta mensagem Trata-seantesduma política a longo prazo. Isso significaque a
é claro. A acçãodos trabalhadorese dos estudantesde Xangai, lan- economia dos camponeses ricos será mantida durante todo o período
da Nova Democracia.A economiado campesinatofico só deixuá
çada na construção das suas próprias estruturas de tipo soviético
de ser necessáriaquando as máquinas puderem ser utilizadas nos
de cima para baixo, representavaum verdadeirodesafioà própria
campos de maneira extensiva, quando as herdades colectivas pude-
existência do partido; o sistema das comunas tenda a ultrapassar
rem ser organizadase a transe)rmaçãosocialista puder ser aplicada
o poder concentradodo partido. Ora, na medida em que o mono-
nos campas.Mas isso não será realizado a não ser dum futuro rela-
pólio do poder pelo partido e a existênciada burocraciadeviamser
tivamente longínquo».(«Obras Escolhidas», Liu Shao-chi, edições
preservados, a democraciaoperária não podia ser autorizada a expri-
chinesas). Em Junho de 1956 explicava ainda: «Certos camaradas
mir-se a não ser pela forma e com os limites decididos pelo partido. são de opinião que a colectivização poderia ser realizada nos campos
Portanto, sob o ângulo sociológico,a prática de Mao da ditadura do por meio das equipasde entreajuda, das cooperativase das equipas
proletariado tiiÜa certa afinidade com a concepçãoda prática esta- de substituiçãopara as culturas. Isso não é possível.Trata-sede
linista. Mas os dois sistemasdiferem quanto à sua formaçãohis- alucinaçõessobre o socialismo, e isto é falso.»(«Assuntos da Revo-
tórica. O de Estaline, foi imposto como reacçãoà Revoluçãode lução Cultural na China Gomunista», publicações thing Pao, vol. l,
Outubro, assentando pois sobre uma classe operária passiva ou hostil, p. 284 -- Hong Kong, 1971). No que respeita à questão da macio:
ao passo que o de Mao tinha nascido da revolução e, por essefacto, nalização da indústria, Liu, ainda em 1957 era favorável ao desen-
beneficiava até certo ponto das relações fraternais com as massas. volvimento espontâneo do capitalismo: <<Aexistência duma parte

Z]7
nação do enfraquecimento da sua posição na direcção do partido
de indústria capitalista, de comércio e de fábricas clandestinas deve-
ria ser tolerada a fim de lhes permitir preencher certos vazios que
com o facto da sua confiançano movimento de massas.Tentou
ainda existem (na economiasocialista)» (obra cit-ada). assimlibertar a energiacriadoradas massase dirigi.la contra a
fracção inversa.
No fundo, Liu Shao-chi mantinha-se vinculado à antiga linha
À partida, a RevoluçãoCultural pareci'adesenvolver-se
con-
e preconizava sempre a sua aplicação. Estava pronto a fazer conces-
sões tanto aos camponesesricos como ao desenvolvimentocapita- Jlorme as previsões de Mao. Armadas destas novas perspectivas, as
massasretomaram confiança, esperança e militantismo. Submeqi-
líst.a espontâneo. Esta tendência, Cuja natu-reza direitista era evi-
dente, diferia da de Mao. Quando do <<grande salto em frente>>, ram o partido e mesmo o aparelho militar, aplicando severosgolpes
de 1958, a tendênciade Liu não entrou em conflito aberto com a à fracçãode Liu Shao-chi.Mas o movimentode massafoi bem
mais longe do que o prwisto por Mao. O objectivo da luta mos-
viragem à esquerdaefectuadapor Mao(devido sem dúvida à com-
trava ser finalmente determinado pela profunda hostilidade das
binação de diversos factores: o grande prestígio pessoal de Mao, o
massasem relaçãoà burocracia, pelo seu desejo de desforra e von-
desenvolvimento relativamente favorável da colectivização agrária
tade de resistir abertamente.Quanto mais se desenvolviamas ini-
-- que contrastava com os resultados apagados da colectivização
na URSS -- e o prometedor futuro da transformação socialista da ciativasdas massas,mais as massasentravamem luta, mais data
se tornava o carácter antiburocrático do movimento de massa.Se
indústria e do comércio). No entanto, Liu tinha reconhecidoa exis-
é certo que, no fim, mesmo a Jlracçãomais esquerda dos Guardas
tência de divergências:<<Desenvolveram-se no seio do nossopartido
Vermehos continuava a evocar o pensamento de Mao Tse-tung,
debates sobre os problemas levantados pelo<<grande salto em
nem por isso, na sua essência, esse movimento era menos uma ne-
frente» e pelas comunaspopulares... Acerca das questõesda tran-
sição para o socialismonos domínios da indústria e do comércio, gaçãode Mao em particular e da burocraciaem geral.
Quando em:Janeiro de 1967 os -trabalhadorese estudantesde
teve lugar um debate no seio do nosso partido, reflectindo os diver-
Xangai tentaram instaurar o seu próprio poder, a confiança e a paciên-
sospontos de vista na matéria».Mas as divergênciasentre as duas
tendências não se limitavam apenas ao problema da orientação cia de Mao a respeitodo movimentode massaesgotou-se
rapida-
mente. Para Mao, as massastinha:m ultrapassado os limites fixados.
económica. Mao insistia na manutenção dum laço privilegiado en-
E foi sem nenhuma hesitação que então escolheu o campo da buro-
tre as massas
e a burocracia.
Desejava
quea políticado partido
fosse aplacadapelas massasatravés de campanhasde mobilização, de cracia.Pela primeira vez trairia abertamentea revoluçãoante as mas-
sas revolucionárias. Es-ta'traição foi decisiva para o futuro de Mao.
11arma a não depender. exclusivamente de castas sociais específicas
compostaspor peritos e tecnocratas.Por isso, as divergênciasentre Com a maturaçãoda consciênciarevolucionáriadas massas,a sua
as duas tendênciasmanifestaram-see evoluíram em todos os domí- imagem legendária ia progressivamente esvaziar'se do seu conteúdo.
nios: ensino, ideologia, filosofia, artes e literatura. Em certos ca- A Revolução Cultural, desencadeadapor Mao, üiíü-a permitido ao
sos, estes conflitos tiveram implicações políticas. povo chinês reviver palidcamente. Desde que esta perspectiva seabriu
Neste sentido, a RevoluçãoCultural foi um combate de grande o impulso das ünassasexerceu-se,ainda que inconscientemente,no
envergadura entre as duas tendências, que, nesse processo, aumen- sentido duma uluapassagem do maoismo.
taram o seu grau de organizaçãoe de coesão,e se transfomlaram
em fracçõesdurante o pr(%uiocurso da RevoluçãoCultural. Mao
Jloi compelido a desencadeara Revolução Cultural devido à combi'

Z]8
5. O fim da era de Mao praçaTien-men em 5 de Abril de 1976 é uma demonstraçãoflagrante
desta tendência his.tónica.
Com base em que elementosse poderá declarar que o fim da era Nestecontexto, a morte de Mao permitirá às massasromper mais
de Mao se aproxima?Em primeiro lugar, precisamosde definir o facilmente com o maoismo. Qual será, no entanto, o impacto ime-
sentido que se dá à <<erade Mao». Não se trata unicamente de a carac- diato da morte de Mao sobre a actual -situação política chinesa?
terizar quer como um período de transformações revolucionárias É claro que a luta de fracçãono interior do partido serápor issopro-
quer como um período de degenaescênciaburocrática. Essaera reco- fundamente afectada.As declaraçõesde unidade por ocasiãoda morte
bre um processo histórico durante o qual as«Três Grandes Revo- de Mao não eram, semdúvida, senãoa expressãoduma trégua tem-
luções» se combinaram segundo um esquemaespecífico sob a direc- porária entre as duas fracções.As profundas divergênciasque exis-
ção de Mao, que constantementeoscilava entre os dois eixos con- tem entre a fracção maoísta e a fracção direitista não podem desa-
traditórios do estalinismo e do marxismo-revolucionário. Além disso, parecer com a morte de Mao. Pelo contrário, as lutas redobrarão.
11 essaépoca reflectia uma conjuntura histórica, na qual -- a imaturi- E isso tanto mais que a fracção maoísta podia tomar iniciativas e
11 dade política da classe operária chinesa, combinada com a estagnação lançar ofensivas, tirando proveito do facto que o próprio Mao era,
mundial -- o PCC criou uma estrutura burocrática e instaurou um ao mesmo tempo, a cabeçada sua fracção e o árbitro supremo da
Estado operário deformado desde a origem. Essa época viu, por fim, luta no interior do partido. A fracção direitista era pois sempre cons-
o crescimento social da burocracia e a afirmação progressiva da cons- trangida a recuar e a defender-se. A fracção maoísta não poderá con-
ciência dos seusinteressespróprios, como viu a oposiçãode Mao a tinuar a empregar as mesmastácticas, agora que Mao morreu. A frac-
esta evoluçãoparticular da burocracia.Fai pois um período de con- ção direitista não se manterá mais na defensiva de forma permanente.
flito entre Mao Tse-tung e o curso natural da evolução social da burch A força tornar-se-ádaqui para diante o factor decisivo.
cracia. É aqui que se vê desenhar-secom a máxima clarezao rumo Duma maneira geral, a luta fraccionar pode evoluir segundo
subjectivo de Mao a respeito da construção do sodalismo. Essa três vias:
época culminou com a RevoluçãoGultural, no sentidode que foi
durante este período que o maoismofoi apercebidopelo povo como 1) pode suceder que se exprima essencialmente como luta pelo
a única via possível para o socialismo.Por paradoxo, é precisamente poder interno no partido, tendo como resultado a depuração
a Revolução Cultural que marca o -princípio da desintegração da dos opositores pela fracção vitoriosa devido à ajuda da má-
era .lnaolsta. quina burocrática;
O significadoessencial do fim do períodomaoístaé pois o se- 2) pode também arrastar a mobilização-total ou -parcialdo exér-
guinte: dada a falênciae a futilidade do rumo subjectivistade Mao cito e da milícia e tomar a forma duma luta violenta;
na construção do socialismo e devido à sua derradeira escolha da 3) é possívelque se alargueà mobilizaçãodo próprio movimento
ddesa dos próprios fundamentosdo sistemaburocrático, está-seno de massas.
presente,pela primeira vez no sentido histórico do termo, numa
situação em que o maoismo já não coincide com a tendência progres- Se a luta se limitar às estruturas internas do partido, a fracção
sista e revolucionária das massaschinesas.Estas procuram agora a maoísta estará em desvantagem. Por outro lado, os maoístas têm
via da sualibertaçãofora da orientaçãomaoístae opondo-seobjec- boas razõespara desconfiar duma tentativa de resolver o conflito por
tivamente ao esquema maoísta. A manifestação que teve lugar na meio dum apelo ao movimento de massa;a sua experiênciada

]20 ]21
Revolução Cultural: ensinou-lhes a prudência nesta matéria. Esta fracciond se arrastarápor longo tempo e tomaráformas mais agudas.
hesitação já se revelou em certas ocasiões. A fracção maoísta não adop- As condições objectivas tornar-se-ão -a-ssimmais favoráveis ao desen-
tará pois a terceira solução a menos que seja constrangida a isso. volvimento dum autêntico movimento de massas antiburocrático.
O facto da fracção maoísta se limitar, desdehá vários anos, a consoli- A história confirmará, em última análise, que a morte de Mao
dar a força da milícia leva a pensarque será pela segundasolução Tse-tung coincidiu com a abertura da Revoluçãol)olítíca na China.
que fhalmenté se decidirá. Além disso, se a luta chegar a englobar
as mas-sas, a milícia constituiria um veículo social útil à fracção
maoísta para procurar mobilizar e armar aquelesque entre as massas
a apoiam.
Para a fracção direitista, a melhor solução seria sem dúvida -a
de limitar a luta ao seio das estrutu-rasdo aparelho -dopartido. Por
outro lado, a sociedadeno -seuconj-untosó superficialmentese res-
sentiria duma tal luta. Apesar dum sector não desprezível da popu-
lação aumentar ilusões sobre a fracção direitista, esta sentir-se-á
menos 'tentada a utilizar activamente o apoio das massas,porque o
desenvolvimento da luta nesta base envolve o cisco de ser posto em
causao conuato social exercidopelo partido.
Pode-se pois concluir provisoriamente que as duas :Fracções,em
função da sua avaliação da relaçãode forças existente no seio do par-
tido, no exército e nas milícias, utilização as tácticas seguintes:

-- a fracção maoísta tentará reforçar a milícia, que controla, divi-


dir e neutralizar o exércit(i e cha.mar a si -tantos postos quanto
possívelno seiodo -aparelho
de Estadoe do partido;
---.a fracção direitista tentará, por sua vez, dividir e neutralizar
a milícia, dominar o exército e alargar as suas posiçõesno
aparelhode Estadoe do partido.

O período que imediatamente-seaproxima sofá assinaladopor


uma luta intestina no partido, no exército, no Estado e nas milícias.
Mas esta evolução desenvolver-se-ánum quadro bem mais vasto,
em que a entradaem cenado movimento'de massarepresentaráum
importante papel. A si-tuação modifica-r-se-á radicalmente caso se
desenvolva uma mobilização antiburocrática. Paralelamente, o con-
tro[e g]oba] da burocracia irá enfraquecer, tanto mais que a luta

222 ]23
4 A TRAJECTÓRIA
DO MA01SM0

ROLANDLEW
Fevelreiro de 1974

O texto que se segue,apresenta-se


essencialmente
coma uma
introdução a um debate necessáriosobre a revolução chinesa e o
maoismo. É deliberadamente que este artigo abrange, num número
restrito de páginas, um vasto panorama -- necessariamente super-
ficial -- da trajectória do maoismo. O seu objectivo principal é esti-
mular uma discussãorompendo com os esquemasjá feitos: conhece-
.se a identificação do maoisma ao estalinismo, conhece-se também
a apologia feita a esta corrente como sendo um equivalente do leni-
nismo na segunda metade do séc. xx. A primeira qualificação passa
por cimada essência
do maoismo:fez a revolução,
logo não
pode ser estalinista pois, o estalinismo é, no seu aspectomais pro-
fundo(marxista-revolucionário) contra-revolucionário. Asegunda
apreciaçãoatribui-lhe um mérito que não tem: é verdade que
o maoismo nos ensinou muitas coisas sobre a revolução e sobre o
que se chama«a revolução na revolução»: a transiçãopara o socia-
lismo; mas também nos informa sobretudo sobre o que pode sepa-
rar uma correntea que chamamos -- provisoriamentee à falta de
melhor --«um antiburocratismo burocrata», de uma corrente auten-
ticamente revolucionária e pmletária. Entendemo-la como uma cor-
rente que reúne em si mesma,a exigênciada revoluçãosocialista
(e não do socialismo consumado) no próprio país e da revolução
mundial, concebida não como UHâ incantação mágica mas como uma

22j
r'

necessidade estratégica de se conseguir a transição para o socialismo -- e elas são numerosas -- com tais raciocínios, fica-se pelos esque-
o menosdeformadamente possíve].Por outro lado, a génesee a his- masfeitos ú prior/ sobre a realidadetão rica da China. É estaa razão
tória do manismo continuam a levantar problemas práticos e teó- porque começamos com um estudo sobre o maoismo que, mesmo
ricos bastante complexos. Aqui, traçámos um esboço sumário da tra- limitado, tenta romper com as apreciaçõesestereotipadas;e, embora
jectória maoísta, agarrando não só um número de dados conhecidos este trabalho se mantenha bastante descritivo na sua generalidade,
como distanciando-nos
de certas concepções
correntes.Este estudo tenta todaviadar elementospara uma discussãoaberta.Senos re-
genético, este. encaminhamento do maoismo, diferenciam-se duma cusamos ao anátema ou -àglorificação indiferenciados, se, por outro
análise materialista da revolução social. Esta pesquisa para atingir o lado, toda a experiência revolucionária deve ser compreendida em cada
seu objectivo, devia apoiar-se na compreensão da situação económica, uma das suas implicaçõesmais paradoxais, e finalmente, se o mar-
da trajectória das classes, da inserção da China no mercado knundial. xismo é um guia para a acção, mas em que a acção -subentendeque se
das forças políticas activas, etc.: incontestavelmente, só uma tal aná. compreende o que se faz, é pois chegada a ocasião de se abrir um
lise poderia restituir toda a dialéctica ao processo da revolução debate sobre a revolução chinesa que ponha à prova o conjunto da
chinesa.Este trabalho, no entanto, não passa de um projecto, ou análise marxista-revolucionária. Em nossa opinião, um debate rigo-
melhor, de um desejopiedoso. roso. necessitade análises a vários níveis. As duas questõesmais
Mas, a nossainvestigaçãojustifica-sesob um outro ponto de gerais e também as mais estimulantes referem-se, por um lado, à re-
vista. Até agora, as relaçõesentre maoismo e revolução chinesa lação do maoismo com o estalinismo, e por outro, à pmblemádca
-- para não falar do problema«maoismo e marxismo>> a que já nos de transição para o socialismo. Para a primeira questão damos alguns
nos referimos atrás-- incidiam sempre sobre petições de princí-
pios: para uns, o maoismoconstitui a única via revolucionária adap- dele um oposicionistairredutível do Kuomintang.Quaisquerque sejamas
tada à China; para outros, o maoismo é um «acidenteda história» suas ambiguidades e hesitações, o PCC é o lugar da revolução: nesse caso esta-
ou ainda, o maoismo teria sido «forçado» a fazer a revolução (con- mos longe do estalinismo. Quer isto dizer que o maoismo é autenticamente
cepção do centtÍsHO maoísta)('). Quaisquer que sejam as diferenças Mamista-Revolucionário? De modo nenhum! A sua ruptura(distância) é radi-
cal face às concepçõesmatxístas-revolucionáriasque integram a p«spectíva da
revolução mundial, a análise da degenerescênciaestaliniana,a luta de classesà
( +) Sobre«centrismo maoísta» há muito a dizer. Uma concepção que é escalamundial, etc. Sem falar de tudo o que existe de diferente entre o poder
correntemente utilizada pelas marxistas-revolucionários é a do P(]C/arçudo a burocrático do PCC sobre as massase uma democraciaproletária. O PCC era
fazer a revolução.Aqui, convémesdarecer:o PCC é estalinimo?Sê o é. nessa altura -- antes de 1949 -- umã corrente empiricamente revolucionária?
é contra-revolucionáriasNesse caso, não teria havida revolução. A prova é É o outro ponto de vista da <ecentrismo
maoísta».Nada dissol É um p111lglo
fácil de demonstrar:quemfez a.rwolução?Massascamponesas
que-- admi- revolucionário chinês divorciado de um projectolevolucíogá4q mundial. Mas
tamos -- arrastaram o PCC. Mas, que massas camponesas? Sem dúvida, as mas- para a China, a partir de 1927, o maoismo como comenteque pmgressivamente
sas que foram dinamizadas, radicalizadas, revolucíonarizadas por mais de dcz vai don)mando o partido -- ao mesmo tempo que desenvolve a sua própria coe-
anos de prática do PCC( 1937-1949) como, por exemplo, o campesinata pobre rência-- torna-seo centro dum projecto revolucionária-- a longo prazo-- mas
do Norte. Pe/o co /faria onde o PCC não tem ou nunca teve iMluência. não que consegueos meios para a sua revolução(a independência do partido, o exér-
existe a revolta de massasde camponesespobres(mas explosõesde cólera muito cito vermelho, etc.) ao mesmo tempo que evita comprometer o seu sucesso
pontuais). Por outras palavras,foi a PCC que fez das massascamponesasuma futuro. Pode dizer-seque a sua recusade subordinaçãoao Kuomintang é a
força revolucionária; todavia podemos admitir que as massas:demo final da d)ave da sua política revolucionária. Isto obriga-o a apoiar-se-- ou pêlo menos
revolução (coma em todas as revoluçõesl). É este processo de rwoludonari- tende para isso -- em vastas massasde camponesespobres e a preparar-se para
zação do mundo camponês que determina a natureza e o lugar do P(;C e faz .iúrentar o Kuomintang: o resto virá depois..

]26 127
se mostra simultaneamenteem toda a sua amplitude e com todos
elementos de resposta, e reservamos a segunda questão para um
os seus limites.
outro estudo.
A um nível mais específico, é necessário compreender como os
Era impossívelcompreendê-lo
em 1949 ou mesmoem 1955.
Em 1958, no início do «grande salto em frente» desenham-se
certos
instrumentos marxistas-revolucionáriospermitem explicar esta revo-
aspectos importantes, mas é incontestavelmente a <<revolução cul-
lução inesperada. No texto, indicamos efectivamente que a aplicação
tural,» e suas consequências que permitem que se faça o balanço do
da teoria da revolução permanente não deixa de levantar problemas
maoismo na prática antes que se inicie a era do pós-maoismo.
delicados. Acontece o mesmo com a problemática de uma revolu-
ção proletária sem proletários e de um partido de vanguarda
totalmente substítucionista. A questão da burocracia na revo-
O X.' Congresso do PCC
lução e durante o período de transição, encontra igualmente uma
alguns .elementos acerca da trajectória do maoismo
explicaçãodiferente na China. Será necessáriovoltar a estas ques-
tões e a algumasoutras de modo mais profundo e avaliar bem qual C) X.' Congressodo PCC que se efectuou em fins de Agosto
é o objectivo destas discussões. de 1973 numa espécie de <<quaseclandestinidade», caracteriza-se
É inútil insistir quanto à importância dos problemas levantados além disso pela sua espantosabrevidade: cinco dias contra várias
com a construçãodo socialismona China: encontram-seno âmago semanasem 1969, no IX.' Congresso, ou mais de um mês em 1945.
de numerosos debates da extrema-esquerda. Mas não há a certeza, Marca uma ruptura com um hábito de conclaves muito espaçados
existe mesmo a dúvida, de que os termos em que seprocessam estes no tempo;apenas um poucomaisde quatroanoso separado
debates estejam sempre bem definidos. A propósito, o conceito de IX.' Congresso ao passo que este se realizou treze anos após o VIII.',
revolução proletária deveria ser precisado, indicando bem tudo o que vinte e quatro anos após o VII.' (1945) e quarenta e um anos após
pode significar uma revolução proletária feita por proletários e para o VI.' (1928). Quatro congressos em mais de quarenta anos abran-
proletários que vão dirigir conscientementeo seu Estado, e distin- gendo o período posterior à derrota da revolução de 1925-1927 até
guindo-a de todas as várias formas de substituições. à conquista do poder após vinte e dois anos de guerra civil, e os pri-
Também seria indispensável um melhor esclarecimentodo signi- meiros vinte anos da República Popular da China: uma história
ficado do conceito estaliniano e maoísta de<<construção do socia- grandiosa mas sinuosa.
lismo num só país», na segunda metade da século xx, confrontando-o Podemos<airar>>deste congresso elementos importantes apesar
l
com a lógica estalinianado mesmonome na URSS masque funcio- do 'número reduzido de informações. Mas para isso, é preciso for-
nou num contexto diferente nos anos de 1920 e 1930: ambosrom- mular um conjunto teórico, articular uma compreensãomarxista do
pem radicalmente com a concepçãolenini-sta da revolução mundial. maoismo, corrente dominante do comunismo cllinês há várias deze-
nas de anos.
Convém dizer que, em relaçãoa esteprogra:mao texto presentenão
passa de um esboço modesto: a discussão bem como a prática Dentro desta óptica, o X.' Congressoé apenaso ponto culmi-
marxista-revolucionária devem permitir ir mais longe. nante da trajectória maoísta. O itinerário deste permite-nos com-
Uma última razão e não das menores, explica o que a seguir escre- preender as virtualidades bem como os limites desta corrente e por
seu intermédio, compreenderas particularidades e os problemas da
vemos: vê-sehoje claramenteque, com a <Krevolução
cultural>>e
<<após-revoluçãocultufal>>(o X.' Congressodo PCC), o m-aoismo China de hoje.

129
9
l A génese do maoismo .Boukharine, os comunistas deviam subo,rdinar-se e transformar-se
na <<ala
esquerdadi-sciplinada>>
do Kuomintang,e, destemoda, re-
O -maoismo nasceu e emergiu a partir da contra-revolução de 1927
nunciar à sua autonomia e a um projecto próprio (').
e como resposta a esta. A segunda revolução chinesa (1925-1927)
O período revolucionário de 1925 a 1927 vê a burguesianacio-
permitira um desenvolvimentoprodigioso do jovem partido comu- nal e a sua organização,o Kuomintang, transformar-senuma força
nista chinês, constituído em Julho de 1921 com 57 membros ape-
repressiva e de regressão que se alia às forças sociais <<feudaís»mais
nas. Esta pequena formação tornou-se num curto espaço de tempo
reaccionárias, como é o caso dos proprietários de terras. Tchang
a força hegemónica da classe operária (:). O proletariado estava for-
Kai-chek, o dirigente do Kuomintang desde a morte de Sun Yat-sen
temente concentrado dm algumas grandes cidades (Xangai, Tient-
sin, etc.) mas era reduzido no seu número: dois ou três milhões de em 1925, voltou-se contra os seus aliados da véspera, o PCC
-- era membro de honra do executivo da Terceira Internacionall --
operários numa população de cerca de 400 milhões de indivíduos,
essencialmente camponeses. e começou a esmaga-los. É conhecido o sangrento episódio de Xangai,
Sob o impulso da Terceira Internacional e, apesardas reticên- imortalizado por Malraux no seu livro .4 Coma/ç o Hz/mamã.

cias dos militantes mais importantes, como o secretário-geralChen Mal preparado politicamente para esta viragem tanto em orga-
Du-tsiou, o PCC tinha ligado o seu <<destino»
desde 1924 ao nização como sob o aspecto militar, estando cada vez mais sujeito às
Kuamintang('), o partido criado por Sun Yat-sen e considerado como directivas(sob coacção)da Internacional comunistaque o obrigava a
representante da burguesia nacional ('). Para a corrente Estaline- manter a sua aliança com a «ala esquerda»do Kuomintang, o PCC

(:) Assim, em Janeiro de 1925, na véspera do surto revolucionário, o Esquematicamente, a posição de 1920 dava o papel revolucionário domi-
PCC no seu 4.' Congresso
conta com 995 membros.No Outono dessemesmo nante às burguesias nadonais mas insistia na autonomia dos PC e dentro do
ano atinge 10 000 membros.Na Primavera de 1927, no seu apogeu,o partido quadro da revoluçãomundial crescente( 1920) e da existênciado Estado ope-
tem perto de 60 000 membros dos quais 60 % são operários. rário, previa a possibilidadede um transcresdmentosocialista(a revoluçãosocia-
(') É em 1922, com Lenine, que é proposta a adesãodo PCC ao KMT lista no Ocidenteaceleravaum processode passagem
da revoluçãoburguesaà
por parte de Sneevliet(que foi mais tarde trotsquista) e é aceite pela Interna. revolução proletária no Oriente).
cional comunista, na linha das teses de Lenine da segundo congressomundial Em 1927-1928,face à derrota de 1927, Trotsky varou(ou menor gene-
da 1. CI.sabre a aliança(e não subordinaçãol) com a burguesia nacional. Em ralizou) à teoria da revolução permanente: sendo a burguesia incapaz de realizar
1924, 4 anos após o segundo congressoe num contexto não de surto revolucio- as tarefas que ]he competem,o pro]etaúado deve e pode tomar o seu lugar
nário mas de estagnaçãoou mesmode recuo, a adesãoadquhiu um sentido dife- (arrastando o campesinato): a natureza da futura revolução cllinesa deve ser
rente: o de subordinaçãodo PCC ao KMT e, de um modo geral, da subordi- uma revolução socialista que se encaixa numa revolução burguesa.
nação dos interesses revolucionários chineses aos do Estado operário russo já Mas, é bom insistir no facto de que, de 1920 a 1927(até à destruiçãodo
bastante degradado burocratícamente.
KMT de esquerda),é uma teoriada revoluçãopor etapasque Trotskyapoia
Não é a decisãode 1922--eln nada estaliniana-- que se condenamas (pelo menostacitamente,na falta de objecçãoformulada). O ponto de oposição
sim a subordinaçãodo PCC à burguesia durante um período de surto revolu- com Esta[ine.Boukharine insere-se na defesa da concepção leninista da auto-
cionário, em que o PCC já se tornara uma força considerávele até hegemónica nomia do partido comunista.
no seio da classeoperária.
(') Supondo que o Kuomintang nunca foi um pmtido da burguesia, o
(') As concepções de Lenine sobre a revolução colonial(as teses do se- que duvidamos. O Kuomíntang é antes um conglomerado de forças sociais que
gundo congresomundial da 1. C. em 1920) aceitespor Trotsky, em 1927-1928 tem tendênda para reunir em si o conjunto das forças sociais dominantes
à luz do balanço da revolução chinesa, mereciam um estudo detalhado. incluindo principalmenteos proprietários de temas.

130
perdeu durante o ano 1927, o essencialdas suasforças, da sua influên- revolucionáriosna defensiva. E, para o maoismo nascente,em fins
cia sobre a classeoperária e, o que é mais importante, o princípio da de 1920, a melhor defesaconsistia em se refugiaram nas basesver-
implantação no seio do campesinato. melhas -- sovietes camponeses enquadrados pelo PCC -- e em orga-
O movimento comunista é afastadodas cidadese já não conse- nizarem um exército e uma guerrilha vermelhos.Estes sovietesde-
guirá reconquistar uma influência sobre a massados trabalhadores viam servir de ponto de partida para a reconstruçãodo movimento
dos grandes centros urbanos antes de 1949 ('). comunista na China.
Ao princípio,o «maoismo»
é apenas
a tentativade salvaros
«restos>>do partido, abandonando as cidades e refugiando-se na
imensidão do campo chinês. Além disso, Mao propôs que se desse 2. De Kiangsi à Longa Marcha
apoio ao campesinato pobre, a classe mais miserável, mais oprimida
da sociedade chinesa. Os anos de 1927 a 1937, período durante o qual se afirma a
A escolha era apenas muito parcialmente teórica (com base num corrente maoísta, são também anos difíceis para o PCC. É com
estudo do papel decisivo do campesinato pobre e no seu extraordi- dificuldade que sobrevive aos erros dos quadros pró-soviéticos e
nário potencial revolucionário)mas devia, sobretudo, permitir a também às tentativas cada vez mais vigorosas, de destruição por
sobrevivência do movimento comunista cruelmente dizimado, dando- parte do K. M. T. e isto, num período em que a relaçãode forças
.Ihe novamente um meio de acção. (militar, etc.) está manifestamente a favor da contra-revolução.
Ao contrário da direcção estaliniana pró-soviética -- Li Li-san, A União Soviéticacontinuavaa impar dirigentesao partido bem
depois Wang Ming --, esta orientação resultava de uma compreensão como a sua linha urra-esquerda de 1928-1929 a 1934. Consistia esta
exacta dos efeitos da contra-revolução de 1927 (;) : esta colocava os em lançar o partido comunistaao assaltodas cidadescom as suas
forças esqueléticas, e durante o período de desordem e recuo geral(').
(') É esta umâ das dificuldades na aplicação <lpura>>
da teoria da revo- Resultado: nas cidades o partido é reduzido à mais completa clandesti-
lução permanente, a que nos refairemos mais adiante. Tlotsky insiste inúmeras
vezesno papel indispensáveldo partido proletário e da classeoperária das cida-
des fisicamente presente na luta. É uma das razõesporque tinha grande descon- e liquidação dos proprietários de temas) demonstrou uma compreensão
bastante
fiança,(mas não necessmiamenteum repúdio! ) pelo PCC dos anos 1930, sem nítida da intensidade do recuo. Nesses anos a radicalismo de Mao explicava-se
operários(e influência sobre a classe operária das cidades), e com uma pela procura de apoio entre o campesinatopobre, mas não se identificava ao
grande maioria camponesa.Ao fim e ao cabo, para Trotsky o PCC coma o fisco esquerdismo aventureirista que predominava dentro do PCC.
de se dissolver no seio do campesinatoe, como não podia existir um partido (') Paradoxo e drama do período: Chiu Caiu-pai, dhigente em 1927, é
puramente camponês(é um dos fundamentos da teoria da revolução perma- criticado pelo seu aventureirismo(de facto, o de Estaline) . Li Li-san, seu suces-
nente), teca tendênciapara incarnar os interessesda contra-revolução(na con- sor( 1928-1930)é atacadopor esquerdismomas o seu substituto Wang Ming
dição de se manter puramente camponêscomo é óbvios). ( 1931-1935) impõe por sua vez uma linha aventureírista urra-esquerda. A liiüa
(') Mao, em 1926-1927,em contacto com o campesínatopobre do Hunas aventureiristade 1927 foi imposta por Moscovo para se livrar da antiga linha
em revolta, defendia um programa agrário radical(a realizar tanto pelo KMT de direita. De 1928 a 1935 a Internacional comunista conhece o seu período
como pelo PCC). Em 1927,é-he difícil constatar o recuo do movimento cam- urra-esquerdaque é imposto a todas as secções.É por essarazão que Li Li-san
ponês: ele tinha-se encarregadoda insurreição camponesachamada«ceifa de e gang Ming ao atingirem a direcção do PCC e aiticando o aventureirismo
Outono» que se revelaria desastrosa,E, organizandoem 1928-1929(no primeiro (real) do seu prednessor, vão por sua vez aplicar uma política bastante seme-
soviete do Chingkangshan) uma política agrária muito radical(expropriação lhante

]32
nidade. Em contrapartida, nos sovietes vermelhos do Sul, consolida- Durante todos estes anos de tensões, (1927-1937), o maoismo
se um poder comunista que se apoia no campesinato pobre e orga- estrutura-see a sua originalidade afirma-se("). Fazem-seas escolhas
niza um exército vermelho que irá resistir a quatro ataquescadavez essenciais: o partido comunista trabalha quase exclusivamente no
mais fortes, por parte do K. M. T. mas que sucumbira ao quinto seio do campesinato, o qual constitui um coITo militante e activo,
ataque. Durante as quatro primeiras ofensivas, Mao dirige o soviete (é a <<revolucionarização»)
e fundamenta a sua prática na reforma
do Kiangsi, mas durante o quinto, é afastado pela direcçãopró-sovié- agrária.
tica. De qualquermodo,a dimensãoda ofensivamilitar do K. M. T. Por outro lado, o partido conservou apenas ligações episódicas
tornava insustentável até ao fim a situação do movimento comunista com as cidades, e mais coLn a pequena burguesia das cidades do que
no Kiangsi. Durante estes anãs, Mao, quadro médio do partido, com o proletariado ("). Desde então, o PCC dedicou-seà tarefa ex-
exerce uma autoridade puramente regional no Soviete do Kiangsi traordinária sem precedentesde conduzir com exclusão das cidades
é na verdade,a realidadeessencial(') do comunismochinêsno prin- e do proletariado, um trabalho no seio do campesinatopobre e mé-
cípio do ano 1930. Luta contra os ataquesvirulentos da direcção dio, socialmente pequeno-burguês, impregnado de tradições ances-
do partido que, por não poder sobreviver em Xangai, é obrigada a
refugiar-se em Kiangsi em 1931-1932. Esta mesmadirecção que quer ('o) Há duas razões essenciaisque parecem explicar porque razão Mos-
covo aceitou a hegemonia de Mao sobre o partido, apesar da descoMiança
procurar protecção em Mao, acusa-o de um desvio pequeno-burguês.
para não dizer mais, com que este último era consideradoergueas altas esferas
Ao fim e ao cabo, acusam-node ser totalmente não.marxista:acusa- da l.C.(+). Em primeiro lugar,o P(.E que no prindpio dos anos1930era
ção das mais gravesque poderia implicar a sua exclusão. provavelmente a secção mais importante da 1. C.(falava-se de 300 000 mem-
Apesar disso, aproveitando-se dos erros dos seus adversários. bros por volta de 1930-1932)transforma-seem 1934-1935num pequenopntido
nomeadamente acerca da condução militar da quinta campanha, con- que se refugia no Norte numa região desértica-- e não tem quasenenhum inte-
resse por Estaline(ainda por cima as comunicações são muito difíceis!) : ou
seguereforçar a sua autoridade sobreo partido. Mas estenão é mais
Mao ou um outro qualquerl... Em segundolugu, e principalmente a viragem
do que um exército derrotado:é esteo sentidoda gloriosaodisseia da 1. C. de 1935 em direcção às frente populares corresponde-- em apnência --
da <<longatnarcha»('). Mao e os que escaparamchegam ao norte ao apelo à«frente unida>>de Mao. É verdade que para Mao em 1935-1936 se
untava de«frente unida na base» não com a Kuomintang(como tal) e não
(Shensi) e criam aí um pequeno soviete que virá a ser o ponto de
partida real da força renascentedo partido. como o preconiza a l.C. a frente unida na cúpula; e além disso Mao nunca
se pâs em questãoabandonara independênciado partido e do Exército velme-
melho. Todavia, Moscovo conegueimpÕEa <çfrenteunida» com o Kuomintang
(quandodo incidentede Sian), mas nuncachegaa conseguirsubordinaro
(') Existiam ousas bases vermelhas, nomeadamente o Shensi(ao Norte) : PCC a Tchmg Kaí-chek.
é aí que Mao sevai refugia apósa longa marcha,bem como o sovietede Ouhan. (") Sejamos mais precisos: o PCC nunca desertou completamente das
Mas estesdois sovietesnão têm nem a importâncianem a coerênciado de cidades.Mas a sua influência sobre a classe operária era inisória. Parece
Kiangsi.
que, para a direcção maoísta não havia qualquer esperançade reactivar
(') Mas Mao e o PCC conseguhãofazer de uma fuga desvairada(«a longa a actividade do proletariado. Ponto de vista que não pareceter sido partilhado
marcha»)um mito, e isto na épocada longa marcha.Esta odisseiairá excitar por todos os quadros do PCC... A influência do PCC foi maior sobre a pe-
a imaginaçãode uma parte da juventudechinesae dar um novo brilhmtismo quena burguesia das cidades,embora tivesse sido limitada. Além disso,os inte-
ao PCC. Foi com bastante consciênciaque Mao fez deste novo mito uma máquina lectuais que conquistaram saíram das cidades e foram enviados para as zonas
de propaganda extraordinária e muito eficaz: na terminologia maoísta é trans- vermelhas dos campos.
formar uma coisamá(a derrota) numa coisa boa!
(') Internacional Comunista. (N. do T.)
orais, tudo isto com u-m número reduzido de quadros comunistas, O partido comunista é pois, pela sua inserção no campesinato,
de formaçãomarxista muitas vezeslimitada. O próprio Mao, pos- uma estrutura <<autoritária», u'm poder hegemónico de quadros
suía uma cultura marxista rudimentar mas tinha grande capacidade marxistas, que lutam dura e incansalvelmente contra os desvios pe-
para encontrar práticas -- e para as teorizar -- adaptadas às formas queno-burgueses
do meio em que funcionam, para manter uma coe-
particulares de combate do comunismo chinês("). são marxista, uma visão de conjunto da revolução chinesa. Rejeitava
A actividade do partido centralizou-seprimeiramente, sobre a a visão parcelardo mundo camponês,voltado sobre si mesmoe uni-
reforma agrária e depois, após 1937, -sobrea organizaçãodo com- camente preocupado com as suas reivindicações agrárias e mostrava
bate antijaponês. E, sempre, sem parar, o PCC manifestou a sua von- uma indiferença senão mesmo hostilidade em relação à cidade: o
tade de trabalhar, formar, modificar, revolucionarizar o corpo social, mundo rural estava tradicionalmente alheio ao problema do desen-
e deste modo torna-lo apto a realizar a grande obra de construção volvimento industrial e à unificação nacional (").
do socialismo na China(o que não estavade modo nenhum dentro <<Alinha de massas>>
vai caracterizar as relações do partido com
dos objectivos do campesinatochinês, mesmo o mais pobre). o mundo camponês:o partido dirige e o partido, quer dizer, a
O PCC realizou assimum fenómenode s#ós/!/ irão; uln partido direcção do partido -- mas mantém obstinadamente raízes profundas
no seio das massascamponesas.Escuta-sesem nunca subordinar o
substituiu uma classeausente,o proletariado,e faz com que uma
fracção de classe-- apoiando-se numa dinâmica revolucionária real -- seu projecto às pressões do ambiente. Pode mesmo opor-se ao desejo

o campesinato pobre, <<represente»


o papel revolucionário essencial. do campesinatopobre recriando, após 1937, a reforma agrária, sem
contudo chegar a romper os elos com a sua base social. Exercício
Isto foi possível graças ao controlo cegado havido sabre a direcção
sempredifícil que o levou, mesmo contra sua vontade, a enfra-
do movimento, e pelo constante enquadramento da sua base social.
quecer as suas ligações com as populações pobres com as quais fatal-
«ideologicamente» estrangeira para não dizer tendencialmente hostil
mente deverá procurar reconciliar-see que con-seguirápois de outro
ao proletariado.
modo, não teria havido uma revolução chinesavitoriosa!
Pode até falar-se de uma d p/a szlós//f /ção se tivennos em conta
Esta original relação de hegemonia sobre as massas,consciente-
a substituição de todo o partido -- de maioria camponesa-- por um
mente assumida, mas não explicitamente reconhecida, é a fonte e a
núcleo reduzido de quadros comunistas que personificava a direcção
chave para se compreender as particularidades do«burocratismo
e era o garante da linha proletária. E na cúpula, com um papel caris-
maoísta». Este diferencia-se profundamente da burocracia tradi-
mático, encontramos Mao. Com as suasfunções e teorizações, repre-
senta a própria figura do comunismo chinês.
(") Convém insistir neste assunto: o campesinato cllinês -- mesmo po-
bre -- não é uma força revolucionária em si mesma.É um corpo modalhetero
(") Não vamos tratar aqui sistematicamenteda questão da estrutura géneo atravessado por impulsos diversos, por vezes muito conservadores. A prova
maoísta(«o pensamentode Mao>>).Pareceincontestávelque Mao possuía mais evidenteque a sua revolta não era em si mesmarevolucionáriaé dada
UH projecto próprio antes de possuir os meios conceptuaispma o teorizar e de pelo estudo dos movimentoscamponeses nas regiões(numerosas)em que o
Ihe dar uma estrutura relativamenteortodoxa. Incontestavelmente.
de 1927 PCC não tinha qualquer acção; e, por outro lado, pelos esforços gigantesca
a 1936-1937, o maoismo conseguiu a sua estruturação e coerência, pois as teo- que o partido teve que fazer, lá onde ele estava,para enquadrare revolucio-
rizações só começam a partir de 1935 e principalmente de 1937 a 1940. Cf. artigo narízar o que não era um potencial mas sim, uma prova: o mundo milenarista
<<Omaoismo à conquista do poder( 1937-1945)» em l.# Repõe def P#7s de l,'Er/, camponês... Cf. L. Branco,«Les paysans et la révolution: China, 1919-1949»,
Bruxelas,n.' 2, 1947. 1968, Politiqae étrangàre,n.' 2.

136 137
r

cional que surgirá após 1949, bem como, e é importante, da buro- ção»(:'), tendentesa integrar nas estruturas de organizaçãoe polí-
cracia privilegiada originária do PCC que se irá formar em força após ticas do PCC os pequen(pburgueses das cidades e os sectores do cam-
a vitória de 1949 e na sua continuidade. pesinatopobre e médio, e por vezes até rico, que se tornam a unir
em grande número, ao movimento comunistaapós 1937.
O importante era lutar contra os «desvios»nacionalistas(:'),
as influências burguesas ou pior «feudais», até mesmo contra o re-
3 A «Frente unida antijaponesa» gionalismo ou o localismo (o espírito «aldeão») : tudo desvios liga-
dos à base social «deformada» do partido (provavelmente composta
A invasão maciça dos japonesesem 1937 rematando um período
por maisproprietáriosdo que operários(!) masprincipalmentecam-
de conquistaparcial, tomou o aspectodefinido da última conquista
ponesespobres e médios e quadros intelectuais). Fizeram-seestas
colonial possíveldo último imperialismoexistentena cenahistórica. rectificaçõesem prol de uma forte centralizaçãodo partido, consi-
O PCC vai centralizar a -suaprática dentro do quadro da«frente derado como o garante da ortodoxia marxista, no sentido maoísta.
antijaponesa»(PCC e Kuomintang) e submeteras outras tarefas Isto acentuouo carácterautoritário do partido, limitou o controlo
às exigências desta frente. Deste modo, vai moderar o seu programa das massas sobre a direcção do processo revolucionário. Na medida
agráio e renunciar à<<guerrarevolucionária agrária» que caracteri- em que estas eram formadas por pequeno-burgueses a pressão que
zava o seu combate de 1927 a 1937. exerciam-só podia coincidir muito parcialmentecom o projecto
Em contrapartida, os comunistas esforçaram-se por aparecer como proletário-marxista do PCC.
os defensores mais consequentes da nação chinesa face a um invasor Mas o partido, incapazde controlar de perto a extensãocampo-
com comportamentos assassíniosa maior parte das vezes.Deste modo nesa e desejosode favorecer as iniciativas bem como a criatividade
o PCC reconstituiu em pouco tempo uha força considerávelmas das massas,concordou numa -autonomiaa nível local. A este nível
concentrada em certas partes do território, essencialmenteno norte. assiste-seà transformação e revolucionarização da vida social, à ger-
De partido reduzido a algumas dezenas de milhares de membros minação de uma nova sociedadeque rompe com os «desvios»da vida
antes de 1937, e contmlando uma população de dois milhões de social tradicional (:'). Este fenómeno atingiu enorme importância
habitantes numa região demasiadodesértica(o Shensi), conseguirá
instalar o poder nos campos-- mas não nas cidades-- habitadas (") Deste modo, o grande«movimento de rectificação»,(o <(Chefe
feno»)
de 1942 a 1944, é também a última etapa importante da maoização do partido.
por várias dezenas de milhões de camponeses,para organizar um (") Comopor exemplo--Chang Kuo t'ao entre ouros-- quefmiam da
partido de um milhão de membrose finalmente, recriar tlm exército luta antijaponesa um fim em si mesmo.
e uma milícia numerosa. (") Isto é muito claro se compararmoso período de 1937 a 1941 do
Também é bem sucedidona sua tentativa de exercer uma in- Shen.Kan-Ming(a zona do Yenan) e posterior. De 1937 a 1941 esta região,
fora do campo de batalha, vê constituir-se uma adlninisuaçãomuito bem orga-
fluência sobre sectoresda pequena-burguesiadas cidades mas falhou nizada; assiste-sea fenómenos de cenUalização e ao desenvolvimento de uma
ao restabelecer-se no seio da classe operária. Na verdade, o carácter burocracia. Mas, depois de 1941 a situação degrada-se(ruptura do PCE com
o KMT, bloqueio dos Japoneses), e volta-se a uma estrutura mais descentra-
proletário do partido e da seu projecto é constantementerecordado
lizada, menosburocrática; e, a iniciativa das massasestimuladadesempenhade
com força, mas na ausênciareal da classeoperária, é apenasmantido novo um papel essencial.E o mais importante é que, nas outras regiõesonde
e com dificuldade, por uma série de«movimentos de rectifica- a situação nunca eteve estabilizada,não podia haver uma burocracia pesada.
nos momentosdo surto revolucionário (após 1945), quandoo movi- 4. A vitória de 1949
mento de massasfez transbordarpara a «esquerda»o PCC. Mas,
fora destesperíodose nomeadamente em Yenande 1937 a 1945. A sociedadechinesa saiu da guerra ein plena crise: uma derro-
o PCC mantém a suahegemoniasobre a vida do soviete, e no seio cada económica evidenciada por uma gigantesca inflação; uma misé-
do partida, a direcção -- e mesmo na cúpula, o presidente Mao -- ria camponesaacrescidade um vasto espoliamento das terras por
dominava sem divisões a actividade da organização(:'). parte dos <<landlords>>(proprietários de terras), uma expropriação
Em resu'mo, podemos caracterizar este período de 1937 a 1945 da própria burguesia pelo «capital burocrático>>representado pelas
da seguinte maneira: o nacionalismo do PCC deu-lhe uma força con- quatro famílias (Tchang Kai-chek, parentes e aliados).
siderável e por vezescolocou-o no sentido oposto à sua base social, A partir de 1946, uma extensa insurreição camponesa que se
mesmo que ele nunca tivesse renunciado por completo às reivindi- alastrapelo norte do país, forçou o PCC a radicalizar o seuprograma
cações sociais, moderadas e mesmo limitadas, mas -suficientes para agrário mas também he deu os meios de alcançar a sua vitória. Na
que se mantivessem os elos com o campesinato pobre (:'). E, no fim Primavera de 1946, deu-se a ruptura entre o PCC e o Kuomintang
da guerra, o comunismo chinês pareceu aos olhos de grande parte e é a guerracivil. O partido comunistaapoiando-sena insurreição
das massas, capaz de resolver os problemas da sociedade chinesa. camponesa e também impulsionado por ela, e ainda aproveitando
a derrocadaeconómicae social da sociedadechinesa,fez da terceira
revoluçãochinesa a primeira vitoriosa. Este rápido sucessoresultou
da qualidade do seu exército: qualidade política e militar mas, social-
mente. o Exército Vermelho constituía também o destacamentode
um processorevolucionárioem marcha.
(") O PCC estabeleceu a distinção entre a iniciativa das massas indis- No prosseguimento da revolta camponesa, os exércitos comu-
pensávelpara aumentar a produção,para lutar contra os Japoneses...,e o pro- nistas desceram do norte e, em pouco tempo, conquistaram as vas-
jecto global que está sempre e exclusivamente nas mãos da direcção do partido. tas regiões do centro e do sul (") (e mesmo no norte, a Mandchúda).
A autonomialocal não é contraditória à centralizaçãodentro do partido. Aliás, de 1937 a 1949, a teorizaçãoe a práticamaaistadistingui-
O projecto «político» está concentrado em mãos pouco numerosas: a direcção
do Partido. Autonomia quer dizer autonomia da actividade revolucionária. m,s ram-sepor aspectosde princípios bem como por uma grandefaci-
não do projecto. O que não quer dizer que certossectoresdo partido não lidade de aplicação.
tenham aplicadouma linha diferente da direcção: daí os movimentosde rec- A autonomia do partido e do exército face ao Kuomintang, a he-
tificação.
gemonia do partido sobre os sovietes, transformados em <cregiões
(") Cf. o debate introduzido, nomeadamente por Ch. Johnson e segundo libertadas>>após 1937, estâvaH dependentes de princípios estrita-
o qual o PCC só venceuidentificando-sacom o nacionalismosem que o seu
sucessotenha algo a ver com a questãosocial. Hoje, para a maioria dos auto- mente aplicados.Também foi clara a atitude do PCC sobre a ques-
res é evidente que a questãosocial não foi(e não teria podido ser!) abandonada tão da <lideologia>>
proletária, até mesmoe principalmente na ausên-
pelo PCC. Sem satisfazerum mínimo(«a programa agrário moderado») das
exigênciasdo campesínato
pobre e médio era impossívelmobiliza-lo.O P(X; (") Elemento importante e subestimado: a vitória do PCC é em parte
aprendeuo à sua própria custa ao limitar consideravelmente.em certos momen- uma conquista: a maior parte da população chinesa, até 1949, não conhece
tos, a aplicaçãodo«programa moderado»: foi obrigada a voltar rapidamente quase nada da actividade comunista. Assim, para o campesínato do Sul coma
a um programa agrário mais radical. E, depois de 1945, o radicalismo do cam- para os operários de todas as cidades, é um universo desconhecido que aparece
pesinato em diversas regiões da China, obrigouo a retomar um programa radical. simultaneamente com o exército vermelllo. ..

14Z
cia de operários. Toda a especificidade, e também as hesitações do japonesa, um programa moderado, essencialmentecentrado sobre a
maoismo aparecem no texto mais importante e mais incompreendido diminuição da taxa da usura e da renda. Mas, após 1946, sob pres-
desteperíodo: «A nova democracia».Na versãooriginal (1940), Mao são das massascamponesasem agitação, o PCC radicalizou o seu
apresenta o dilema: ou Tchang Kai-chek cumprirá as suas tarefas programae voltou a uma enérgica distribuição das terras. Mas con-
(nomeadamente na luta antijaponesa) e nessa altura, apoia-lo-emos tinuou a ter uma atitude«utilitária» visando essencialmente con-
ou de outro modo, nós (PC) pegaremosna deixa-- e a prática do seguir o apoio do campesinato ou, rigorosamente, evitar confrontos
PÇC mostra que foi para esta alternativa que Mao se preparou. com o mesmo.Deste modo, a partir de 1947, o norte foi cenário de
Tanto mais que no mesmo texto encontramos uma concepção uma redistribuição radical das terras e desencadeamentode uma luta
sem equivalentena Internacional Comunista desta época,e que faz severa contra os proprietários de terras; mas, no centro e sobretudo
lembrar Leníne anteriormente a 1917: a revolução chinesa certa- no sul, foram aplicadas outras políticas mais moderadas: algumas
menteque é burguesamas no contextoda revoluçãoproletáriae vezes, os comunistas apoiaram-se nos camponesespobres e médios
aliás é garantida pela existência da URSS, no exterior, e pela activi- e noutros sítios, nos camponesesricos.
dade do PCC no interior das fronteiras; por outras palavras Mao A naturezada revolução vitoriosa de 1949 pode resumir-seda
tinha muito poucas ilusões sobre a burguesia e preparava uma revo- seguintemaneira: trata-se de uma revolução proletária não pela na-
lução burguesa conduzida pelas comunistas.Mas, 1917 mostrava e tureza das classes sociais que actuam, mas pelo conteúdo marxista-
1949 iria confirmar que, num tal contexto era uma revolução pro- .proletário, incarnado por um partido comunista que mobiliza, iEn-
letária que surgia. pulsiona e por vezes canaliza as massas camponesas cuja situação
Aliás, houve por regra uma grande brandura na aplicação da linha: miserável condensa os problemas da sociedade chinesa do século xx.
as aproximações das diferentes classesou fracções de classes estavam Sob :a direcçãode Mao, o PCC para dinamizar o seu projecto,
dependentesda táctica, embora se mantivessem subordinadas ao pro- tornou-selocal de uma dupla substituição (assumidaquanto à signi-
jecto político dominante,à procurada contradiçãoprincipal e do ficação mas não quanto aos seus efeitos): substituição do proleta-
aspecto.principal da contradição e, antes de mais, ao desejo de uni- riado, a classerevolucionária da sociedadeburguesa, pelo campesinato
ficar sob a bandeirado partido, o máximode forçassociais.Mas, pobre, circunstancialmente revolucionário no âmbito do agravamento
o apoio essencial,o derradeiro e o único verdadeiro recurso do PCC da situação, e substituição da classepelo partido que actua em meio
estavarepresentadopelo potencial de revolta do campesinatopobre. não proletário sem perder a sua orientação marxi-sta;mas, para isso,
Para este, a questão essencial residia na posse da «terra»: tornar-se deve adaptar a sua estrutura organizacional a novas relaçõesesta-
pequeno proprietário, evitar a usura ou pelo Enenos,pagar a renda belecidas com as massas. O espaço de todas as transformações
através de taxas moderadas(no casode trabalhar a terra alheia) eram -- mesmo que limitado -- da sociedade chinesa só podia ser revo-
estas as motivações fundamentais do mundo camponês. lucionário. E assim, todas as reformas mesmo restritas (como uma
Sobre a questão agrária, as posições do PCC foram pragmáticas refonna agrária moderada) exigiam que se fosse mais longe, sob pena
e variáveis, por vezesaté dúbias. À fase do radicalismo agrário -- no de tudo ser posto em questão e de se chegar a uma regressão completa.
tempodo sovietedo Kiangsi(") -- sucedeu-se
durantea luta anti- Mas o comunismo chinês após 1927, define-se também pelas
suas ligações particulares com o estalinismo: simultaneamente, sub-
(n) .E mesmo durante o período do Chingkangshan(1928-1929), o radi-
calismofoi ainda maior: não só se expropriaram proprietários de terras e cam- missão e oposição de facto. Sob a direcção de Mao -- mas este levará
poneses ricos, mas também os liquidavam fisicamente muitas vezes. anosaté se impar como dirigente do partido o partido tanto esteve

242
na dependência da URSS como completamente exterior a ela. Deli- as premissas da sociedade capi-taiis-tacdtapultando a revolução bur-
beradamente, a corrente Mao não rompeu com a União Soviética, guesa.
país considerado como bastião socialista, apoio evelltual e seguro à Assumindo conscientemente as suas tarefas e indo) até ao extremo
acção dos revolucionários (em vão!) e o único modelo acessívelde das exigênciasrevolucionárias, para lá do quadro burguês, o PCC
desenvolvimento económico acelerado, o país que personificava o realizou a terceira grande revolução da história. Quaisquer que se-
horizonte intransponível dos quadros comunistas,na falta de outra jam as indecisões, as ambiguidades e astúcias do programa, as subti-
alternativa aceitável. O papel exemplar da URSS e do seu chefe Esta- [ezas-- a ausência do pro]etariado, a luta nacional sup]antando o
line foi constantemente lembrado e enaltecido, mas a prática do PCC combate social -- o movimento comunista chinês realizou o seu pro-
e mesmo a teoria, êm menor escala,afastaram-sedo plano estaliniano. jecto de organizaçãocomunista-proletária, o único a fazê-lo jun-
Consciente da-s responsabiHdadesda Internacional Comunista, tamente com o PC jugoslavo e vietnamíano, de todos os partidos
na derrota de 1927 e portanto de Estabne, o PCC (Mao) recusou-se ligados ao estalinismo.
111
a seguir as directivas da Terceira Internacional que, ao fazerem pres-
são, após 1937, para uma nova subordinação ao Kuomintang teriam
levado .à mesma catástrofe de 1927.
5 Os primeiros tempos da construção
O PCC seguiu então uma via autónoma, concentrando os seus do socialismo
esforços no campesinato, pondo de parte a classe operária mas dis-
pendendo uma enorme energia -atrabahar, a revolucionarizar as mas- Os primeiros anos-- pelo menosaté 1952 -- processaram-se
sob
sas camponesas.Os comunistas conseguiram fazer libertar as enor- o signo da «nova democracia» ( " ) . Mais exactamente deveria dizer-
mes potencialidades deste mu-ndo camponês, transformando-o numa -se, a coberto, pois de facto, assistiu-seà ins'üauraçãorápida e determi-
1! verdadeira«bomba atómica>>social que .acaboupor incendiar toda nada da ditadura do proletariado, personificada na hegemonia abso-
a sociedade chinesa. A libertação dos camponeses, a divisão da terra, tuta do PCC.
embriões do poder político popular, representavam a negação da De facto, a partir de 1950, a reforma agrária foi generalizada,
China antiga, ditatorial e das suasclassessociaisamedrontadasou mas com certa prudência: as regiões recentementeconquistadas onde
reaccionárias . . .
Por outro lado, uma foi:ça deveria retomar o lugar da burguesia
lução permanente -- aqui respeitada muito rigorosamente -- a ditadura pro-
decadente e realizar a tarefa inacabada: a revolução proletária ocupou letária foi-se estendendoa pouco e pouco sobre a legalidadeburguesa,já muito
o lugar, ultrapassou o reduzido horizontal burguês(") e organizou fraca em 1949. A reforma agrária veio quebrar o poder dos proprietários de
11 terras, isto é, o principal pilar da conta-revolução. A nacionalização da pro-
priedade burocrática(isto é, das empresas expropriadas por Tchang Kai-chek
(") Os comunistas cllineses atacmam após 1949-- 10 anos depoisl --
e seus seguidores), a partir de 1949-1950, colocou nas mãos do Estado, uma
os que teriam querido pâr uma «muralha da China>>entre a revoluçãobur- parte importante da indústria chinesa. Assim, rapidamente, de usurpação em
guesa e revolução proletária. Mas, é indiscutível que durante muito tempo, a
usurpação, a legalidade burguesa foi mmpida: praticamente, dois ou três anos
prática do PCC e ainda mais a sua teoria, foram ambíguasa este respeito.
após a proclamação da «R. P. C.», nada mais restava da«neodemocracía» que,
O próprio Mao, tinha acentuadoa necessidade de um longo período de neo-
no entantodevia durar dezenasde anos.Desforrade um processade revo-
democracia,isto é, de poder proletário(no que respeitaaa PCC) conduzida lução permanente inelutável sob todos os aspectos ideológicos...
uma revolução burguesae, após anos(ou dezenasde anos) entrar-se-iana fase
(") Oficialmente, é só a partir do Vlll congresso do PCG, em 1956,
socialista. Mas, segundo o prognóstico de Trotsky sobre o processo de revo-
que se fala de revolução socialista... em 19491

144
10
existia um campesinato passivo foram progressivamente arrastadas Depois e principalmente, a construção económica provinha de
na via da reforma agrária. Pelo contrário, Qoutros lugares assistiu-se uma interiorização bastante próxima do modelo de desenvolvimento
ao ajustamentode contas: o «nova mundo», o dos calmponeses
po- económico da URSS: prioridade para a indústria pesada, investi-
bres procedeu à liquidação de proprietários de terras e o PCC teve mento muito limitado na agricultura("), apelo aos especialistasso-
que utilizar toda a suaautoridadepara reduzir a carnificina(noutros viéticos e crescimento de uma nova burocracia que acumula privilé-
lugares, ao -contrário, incitou os camponesespobres à acção). gios importantes pelo menos em comparação com a pobreza da popu-
Em 1951-1952, organizaram-se depurações e os antigos explo- lação dlinesa.
radores foram expropriadosnas cidades,ao mesmotempo que se Esta burocracia era em grande parte formada por quadros do
procedia a prisões e à liquidaçãodos oposicionistas,na maioria bur- P(]C mas não exclusivamente. A nível nacional, nomeadamenteele-
gueses,mas tambémda esquerda.A maioria das empresasforam mentos da antiga burocracia do Kuomintang continuavam a exercer
nacionalizadas; no entanto, os antigos proprietários receberam como os 'seus cargos. Do mesmo modo nas empresas, antigos capitalistas
compensação, uma renda em {bnheiro, e muitos continuaram como reconvertidos em directores bastante bem remunerados exerciam uma
directores ou especialistas. influência corrupta na maior parte das vezes.
No seu conjunto, menos de três anos após a proclamaçãoda Mas, precipitando-se sobre estas Camadas,os quadros do partido
república popular, a antiga estrutura social da China foi abalada e e aderentes,após 1949, detinham o poder; assim o partido passou
foram apresentados (") ao «Estado operário», sólidos fundamentos de uh milhão de membros em 1945 para três milhões em 1949 e
justificando a apreciaçãode«construção do socialismo>>
e não de mais de 10 milhões em 1960 -(28 milhões em 1973): dez anos após
«neo-democracia». Mas nos campos ficou-se pela redistribuição das a fundaçãoda«RPC» a grande maioria dos membrossãorecém-che-
terras, apesarda introdução prudente e em escalareduzida da coope- gados da vitória!
rativa agrícola. Interiorizando o modelo estaliniano e afastando-sedo igualita-
No seu todo, o poder que se constituiu era semelhanteao das rismo da tradição maoísta, a que se chamou «Yenan Way>>("), a
«democracias populares» da Europa oriental. Em primeiro lugar, República Popular transformou-se rapidamente num Estado operá-
pela fidelidade à política estrangeirada URSS a China, alvo dos rio profundamente deformado no aspecto burocrático: deformação
objectivos agressivos do imperialismo americano não pl)dia passar e não degenerescência
-- a gradaçãoé importante!
sem o apoio militar, diplomático e sobretudo económicoda URSS. Com efeito, o PCC que lutou duramente durante vinte e dois
Vemos isso na guerra da Coxeia: segundo contam os Chineses a China anos de guerra civil, durante este mesmoperíodo e sobretudo após
fora obrigada a seguir as:aspimçõesde Estaline no momento da rup- 1937, trabalhou profundamente e mobilizou vastas massascampo-
tura com a URSS. nesas.Não podia ser um simplesdecalquedo PC. da União Sovié-
tica que, há dezenas de -anospara cá perdeu o essencial das suas raízes

(") Hoje, os Chineses ainda defendem a concepção da revolução por


etapas: até 1952, a«neodemocracia» e seguidamente, a etapa socialista(o prin- (") Todavia, nota-se uma diferença notável da URSS desde o prindpio:
cípio da transiçãopara o socialismo).Mao desenvolveráuma teoria da «revc- nunca foi posto em questão limitar o nível de vida(muito baço) do campesi-
lução permanente»(a putir de 19i8) mas distingui-la-á de Trotsliy, insistindo nato, mas pelo contrário, favoreceu-seum aumento, mesmolimitado e muito
sobre as etapas separadas, e acentuando a permanência do processo revolucio- progressivo do seu nível de consumo(e cultural).
nário durante o socialismo. (") Cf. M. Seldene o seu livro interessante:Tóe yma W (1971).

247
no seio das massaspopulares. Além disso, Mao era o quadro menos vindicado como uma contribuição essencialpara o marxismo: o pen-
assimilado ao estalinismo. O presidente do PCC(") adquiriu uma samento de Mao Tse-tung.
É indiscutível que o investimento maoísta no campo da constru-
desconfiança para com Estaline, avivada por dolorosas experiências.
ção do socialismo marcou o prolongamento, a generalizaçãodos prin-
Do mesmo modo, desde os primeiros anos da R. P. C. que ele come-
çou a defender concepções autónom.as acerca dos meios de constru- cípios e das práticas comunistas de 1927 a 1949, inauguradapor
Mao e, nomeadamente, a «liiüa de massas».
ção do socialismo. As -:diferenciaçõesvão-se acentuar rapidamente
Resultado: a oposição entre duas formas de burocracia: por um
em relação ao «modelo» ortodoxo soviético (") .
lado, o burocratismo rnaoista original -- a relaçãoautoritária sobre
Pode afirmar-seque, a partir de 1950, o maoismocomo teoria e
as massas camponesas e pequeno-burguesas citadinas por parte de
prática, como relaçãoparticular do PCC -àsmassasinvestiu massiva-
um partido que mantém a -sua«identidade>> proletária -- e por outro
mente na esferada construçãodo socialismo.Podemospâr datas; lado, o novo burocratismo-- não inteiramente novo: ainda existem
1955 para a agricultura com a generalizaçãodas cooperativasque se germens no período de Yenan --, baseado nas privilégios materiais,
realizou independentemente da mecanização;ao contrário dos esque- muito afastado das massas,mantendo elos de ligação «difíceis>>com
mas estalinistas ("), 1956 data do texto '4s dez gra Zes clarões e, so- a velha burocracia ainda existente e até !nesmocom ex-capitalistas.
bretudo 1958, o ano do «grandesalto em frente>>,
que, além dos seus Pelo contrário, o burocratismo maoísta(nunca reconhecidocomo
aspectos circunstanciais encarna os traços largos do modelo maoísta tal!), para concretizaro seu projecto de transformaçãoprofunda da
de desenvolvimento socialista. Anteriormente, o lnaoismo repre- sociedadee das <<mentalidades»,
necessitade uma estreitaligação
sentavauma via revolucionária para se fazer a revolução,uma mar- com as massas.Recusaou limita bastante a concessãode privilé-
cha adaptadaàs condiçõesespecíficasda China, eln ruptura com as gios -- no espírito de Yenan -- incompatíveis com a pobreza da
directivas estalinianas. Esta orientação impulsionada e teorizada por China, e ainda mais, fonte de degenerescências. Também insiste sobre
Mao, constituiu o corpo teórico e prático do PCC sendodepois rei- uma certa iniciativa e criatividade da populaçãoe mostra-sebem
conscienteda impossibilidade de dirigir com eficácia, e de modo cen-
tralizado, o continente cHnês. A intervenção de Mao manifestou-se,
(") Quando nos referimos a Mao, é evidentepara nós que o dirigente
do PCC está influenciado-- influenciando(instrumentalizandchinstrumenta- em primeiro lugar, no problema da colectivizaçãoagrícola: isto é,
lizado) --por vastos sectores do partido. E, através deste e para lá deste, face ao grupo social camponês,maioritário na sociedadechinesae
é toda a sociedadechinesarevolucinoáriaque exerce os seusefeitos e pressões que o partido conheciaperfeitamente por nele ter exercidouma prá-
sobre a Unha do partido; sendo por ua vez transformada pela acçãodo partido: tica sistemática
du-untemaxi de vinte anos.Foi a referência
à
dialéctica complexa entre as pressõesheterogéneasde uma sociedadedinâmica
<<Yenan Way», à sociedadede 1937 a 1949 que serviu de protótipo
e a força hegemónicaparcialmente autonoinizada(o partido).
à construçãode uma nova China: modelode relaçãobastanteiguali-
(') Desde 1920 até aos nossosdias, o PCC é atravessadopor diferentes
correntes. E, é evidente que o estalinismo marcou e transtnitiu sempre uma tária, com a presençade uma fraca burocracia; mas, -acimade tudo,
forte influência sobre o quadros comunistas.Por outro lado, dentro do partido a existênciado movimento comunista que deve a sua hegemoniaao
existiram sempre quadros estritamenteestaliníanos(muitas vezes desconfiados
perante as inovações maoístas l )
(") Por outras'palavras, a relaçãosocial: a cooperaçãoé mais importante (") Consenso, mas taalbém dinamização das massas,é esta a diferença
do que a mecanizaçãoe o aumenta da produção(embora esta não seja posta marcantecom o estalinismoque se apoia(se assim se p(xle chamar)na pas-
de parte). É de /acto, a ruptura decisiva com o estalinismo... sividade da dasse operária e do campesinato...

148 149
apoio popular ("). E este incontestável acordo por parte das massas Através das «comunaspopulares»,Mao tentou acabarcom a separa-
é resultado da osmose partido-população e teve o seu fundamento ção cidade-campo,trabalhador manual -- trabalhador intelectual e
na dinamização
do mundocamponês
e consolidou-se
no contributo industrializar os campos(tentativas de altos fornos) e criar unidades
real<<material-espiritual>>:elevação do nível de vida, realização de produtivas bastante autónomas. Esta mobilização das ma-ssassuben-
novas dimensões de vida e memória da luta contra o invasor japo- tendiaa acçãode um partido recitandorelações
com o povo.Deste
nês. . . Em resumo, trata-se de um acordo assente no esforço inces- modo, assiste-seao delineamento da conjunto de uma problemática
sante para mobilizar o povo e não perder a audiênciado mesmo: maoísta de transição para o socialismo.
condiçãoa prior'f, indispensável
para dar impulsoà práticano seio Antes de 1958, a via maoísta concentra-sesobrea colectivização
das massas.
rápida da agricultura. Esta foi um êxito incontestável.Abas, foi um
A colectivização (1955-1956) foi apenas o ponto de partida. dos grandesméritos do PCC não ter cometido os erros de Estaline
Em 1956, na época da desestalinização,Mao começou a explicitar na política agrícola.Na China, ao contrário do que aconteceuna
as diferenças com o mode]o soviético. E]n 1957, Mao lançou o movi- URSS, a colectivização fez--sesem tensões muito grandes.A lém disso,
mento<<dascem flores», que para a épocaera como um fenómeno a produção agrícola aumentou e o nível de vida dos camponeses subiu
de liberalização,dentro da linha da desestalinização
masque repre- o que tornou as ma:smas camponesas favoráveis ou pelo menos neutras
sentava mais provavelmente uma maneira de<<activar» sectorespas- face ao novo regime (:'). Mas, quanto ao resto, era cópia do modelo
sivos dentro das cidades e principalmente os intelectuais. O resultado russo. Assim, após a morte do ditador soviético em 1953 -- que
foi diferente: assistiu-sea uma verdadeirarevolta destesúltimos, ao tinha grande desconfiança pelo PCC -- as relações sino-soviéticas
aparecimento de uma oposição de direita no seio destes, oposição atingiramo auge.O primeiro plano quinquenalfoi um tnero decalque
liberalizadora, hostil ao PCC. Em escala mais reduzida, -surgiram dos seushomólogossoviéticose foi até realizado(com êxito) com a
tensõesentre a classeoperária e as críticas contra a burocracia e os ajuda soviética em material e técnicos: a produção industrial dupli-
novos privilegiados encontrarameco dentro dos sectoresda po- cou em cinco anos.
pulação. Por seulado, em 1956 e 1957 (no seutexto Da /zli/a io/ ção
Este movimento inesperadofoi rapidamente quebrado. Mao e a das co /radlções o seio do poz,o) formulou uma nova orientação:
direcçãodo PCC justificaram a repressãoinsistindo no aspectodirei- fazia a análisedas «contradições»e das tensõesdo período de tran-
tista das críticas. Daí tiraram conclusõessobre a impossibilidade de sição. Por outras palavras, ele apreendia-- e é a grande diferença
mobilização dos intelectuais como tais, e oi:tentaram-senuma outra das concepções estalinianas -- a especificidade de um período de
direcção:dar de novo vida ao projecto da <KYenan
Way».
1958 é na verdadeo ano decisivo: Mao lançou «o grande salto
(") Outra diferençapara com a URSS;desdeos primeirosanosdo re-
eu frente», o seu primeiro grande esforço sistemático na construção
gime, o nível de vida no campo(desde 1950 devido a uma colheita média em
de um socialismo «à cllhesa» (que também comporta princípios uni- comparaçãocom a má de 1949) e denso das cidades e fora dos anos catastró-
versais).Era também a tentaçãoe, mesmomais, a esperançade uma ficos(1960-1961) não haverá regressão.O efeito benéfico do novo regime
espéciede caminhomaiscurto para atingir o comunismo.Organi- fez-se sentir imediata e praticamente de maneira contínua. É uma das
zaram-segrandesmobilizaçõesde massas,o PCC mobilizou com explicaçõesdo vastoconsentimentoà volta da regime(ou pelo menos,de Mao)
e que nuca uma diferença com a URSS que levou 10 anos a alcançaro nível
grande intensidade -- a mãc-de-obra desempregada no quadro de um de 1913; e, onde, após 1928, o nível de vida das massascamponesasfoi sensi-
investimento trabalho (para realizar pequenose grandes trabalhos). velmente reduzido, a favor de uma intensa acumulação socialista».

]jo
transição rico ein contradições antigas e novas. Também determinava <<Ogrande salto em frente>>pâs em evidência a originalidade e
que não podia haver um caminho obrigatório(portanto -- implici- também os limites do maoismo. O objectivo real nunca foi realmente
tamente-- não havia <<modelo soviético») que garantisseo dever discutidoao nível das nnassas
ou mesmode todo o partido; nem
socialista e mais tarde (1962), acrescentoua ideia essencialda exis- mesmo é evidente que tenha sido claramente compreendido por nu-
tência de uma luta de classes,que -tem como objectivo o caminho merosos quadros dirigentes.
para o socialismoou o retorno ao capitalismo("). O relativo insucessoilustrou (") o deficiente domínio por parte
Em 1958 -- completado o primeiro plano quinquenal -- a nova do PCC no que respeita aos elementos da construção do socialismo,
fase de desenvolvimentobaseou-seem novos princípios, não só de o que Mao reconheceuem 1959; por outro lado, mostrou que o pro-
retorno ao espírito de Yenan mas um prolongamento das reflexões jecto implicava um voluntarismo utópico.: realizar o comunismo em
teóricas de Mao (de 1956 a 1958), e nas práticas no mundo cam- poucos anos (incompreensãodo que é o comunismo?). Acima de tudo
ponês: é <<o grande salto em frente>> chave da compreensão do eram postas em evidência as formas de autoritarismo de Mao e de
maoislno, os últimos quinze anos da «República Popular da China>> todos os -quadros do partido encarregados da aplicação das decisões
e antesde maisa «Revolução
Cultural». do partido. Estes pressionaram as massasa fazer esforços sobre-huma-
nos fazendo-asantever,em troca de dois ou três anosde suor, um
futuro resplandescente.
(") Aqui, também seria necessárioum longo estudo para caracterizar a Os esforços não foram completamente aceites de boa vontade,
concepção maoísta do capitalismo(que iria pâr a dano a sua visão do«social
mais em muitos casosimpostos sendo as directivas aplicadascneca-
imperialismo») do socialismo e do comunismo. Capitalismo, socialismo e comu-
nismo têm em Mao um sentido bastantediferente do que possuemna litera- nicamente; falou--sede resultados assombrosos,infelizmente fanta-
tura marxista. Assim, capitalismo tem fortes canotações com«desigualdade» sistas. O partido organizou campanhas de esclarecimento entre as
(creice#re,) e por outro lado, comunismoé consideradocomo uma etapa, entre massas, mas estas não participaram na elaboração ou na decisão do
outras, da humanidadefutura. O retomo ao capitalismo na URSS estáportanto «grande salto em frente». Para além disso, o aparelho económico
ligado ao retorno a uma desigualdadecada vez maior; e, por outro lado, se
(e estatístico) revelou-'semal preparado para novas tarefas. Assistiu-
em 1958, na época do <<grandesalto em frente>>se acreditou ser possível atingir
se assima uma certa debandada:foi necessáriorecuar e até renun-
o comunismo dentro de alguns anos é porque este era considerado como muita
mais relativo, menos grandiosodo que na literatura mamísta dássica. ciar à dispendiosaexperiênciade <<altosfornos rústicos>>.Os exces-
O mesmo acontece com a caracterizações<(fascistas...» Pode parecer aber- sos, mais do que os próprios princípios do<<grande salto em frente>>
rante classificar a URSS como um país fascista, nazi... (cf. Mao num texto e a precipitaçãoburocráticafizeram que a maior parte do projecto
e 1964 )
abordasse.O recuo precoce, a regressão económica dos anos que se
A URSS em troca, recebe, se o podemos assim chamar, o último <(pre-
sente de Estaline». Com efeito, a 1.C. estaliniana não só foi capaz de carac- seguiram levaram a um relativo abandono das concepçõesde Mao
terizar rigorosamente o nazismo após a sua chegada ao poder. O nazismo foi e à ascensão de Liu Chão-chi, Teng Hsiao-ping(secretário-geral do
sempre identificado como uma ditadura violenta dos <cgrandesmonop6hos» partido), etc
e em consequênciatinha conotaçõescom todas as ditaduras violentas e ferozes.
É esta caracterização difusa que explica -- sem a justificar -- a identificação
URSS = ditadura feroz = nazismo. A «ignorância» estahúana age como um (") Os princípios do«Grande Salto em Frente>>bem como a teoria da
bumerangue a 30 anos de distância. Mas, é evidente que vai levantar o prcb <<revoluçãopermanente» são enunciados por Mao no texto essencial de Janeiro
blema da <dgnorância maoísta», isto é, do<cmarxismo maoísta» e dos seus 1958, os <<sessenta
pontos>>(não publicado) e retomados por Liu Chac-chi, em
limites Maio de 1958, na segunda sessão do Xlll Congresso do P(IX;, referência Schram.

lj2
r
Daí em diante, mas secretamenteao princípio, vão aparecendo -- através da concretização numa<<figura humana gloriosa>> --
correntes opostas no seio do partido, com mais ou menos acui- a problemáticada revoluçãochinesa.Dizer que Mao é uma figura
dade, segundo os períodos. cmismática não remete apenas nem essencialmente ao culto do seu
pensamento mas ao funcionamento do PCC e às suas relaçõescom
F as massas.
6. Mao e o PCC
A glorificaçãode Mao, é o poder que se atribui a um homem
para que exerçano seio do partido e da sociedadeuma intervenção
O lugar especial que Mao ocupa no partido explica o seu papel que pode ser particularmente autónoma. Expliquemos melhor: o
bem como a sua actuação.
maoismo constituiu.se em oposição à ortodoxia estaliniana numa
Para o PCC Mao apresenta-sesob diversos aspectos.Por UH
relação feita de silêncio, de aceitação aparente e de rejeição dissi-
lado, é o dirigente histórico que suporta o pesoe a glória de nas pio- mulada. A autoridade conquistada por Mao em 1930 é mais a con-
res condições -- após duas derrotas em que teve uma responsabili-
sequênciados eiras dos seus adversários do que uma grande convic-
dade limitada, em 1927-1934-- ter dirigido o partido e tê-lo con-
ção na verdade do <<maoismo nascente>>.
duzido -- após vinte e dois anos de guerra civil -- até à vitória de
A hegemonia do maoismo, considerada como a expressão teórica
1949, depois de um longo caminhode lutas, no interior do partido,
e prática da via chinesa,.nuncaestá garantida mas semprea ser re-
mas principalmente à escalada China. Para isso, pâs à prova a sua
conquistada. Defender o seu poder, autorizar o seu próprio culto
intuição, prudência, flexibilidade mas também energiae determi-
nação. E antes de mais, não teve receio de assumir e mais tarde de é contribuir para que se estabeleçaa suapropna legitimidadee,
principalmente, permitir a continuidade da mesma.
teorizar uma nova via de trabaho dentro do campesinato, afastada
da ortodoxia estaliniana. A ascensãodo movimento comunista facilitou a paralela ascen-
Por isso, ele é incontestavelmenteuma espéciede Lenine chinês, são do seu dirigente mas evitou também que se ;servissedo seu
cuja autoridade é universalmente reconhecida, teorizada e glorificado peso carismáticopara pr«luzir desordensno partida. Não se pas-
sará o mesmo em 1949 e a revolução cultural mostrará que ele l)ode
dentro do partido ("). Esta estatura produz uma figura carismática
servir-se conscientemente da -suaautoridade como de uma ferramenta
que reforçou a sua imagem e autoridade. Além dis.se,tornou-se o
lugar geométrico de equiHbrio do partido, e através deste e às ve- que é essencialpara as suasI'elaçõescom o partido e as massas.
zes por cima deste, das classesem que o PCC se apoia(campesinato O impacto de Mao também é favorecido pela importância que o
e classeoperária). presidente do PCC as-sumena combinação social operários-campone-
Deste modo, ele aparececomo o centro de unificação das cor- ses-intelectuaissobre a qual se fundamenta a <<R,P. C.». A trajec-
rentes do partido. Apreender o papel especial de Mao, é entrever tória do comunismo vai refractar-se na pessoado dirigente que pas-
sou da classeoperáriapara o campesinatoe volta à classeoperária
e às cidades sem abandonar a sua ligação com o mundo camponês.
(') Ainda que nãa se deva subestimar as reticências para com o«presi- Esta oscilaçãode suporte social que não evita as tensõesmas 'que
dente», existente enfie muitos quadros. Muitos comunistas importantes são
maoístas que se reagruparam muitas vezes com sinceridade outras por neces-
escapaàs rupturas com um ou com outro dos grupos sociaismais
sidade.Mas a impossibiHdadede constituir uma corrente abertamenteanti- importantes da sociedadechinesa é Mao que a representa e é simul-
l maoista, confirma o papel «quase-bonapartista>>
de Mao. taneamente o seu garante. É pois indispensável para a unidade do
partido e do país: por isso, nunca a sua autoridade foi posta ein Mao identificava então cada vez anaiso aumentodos privilégios
questão mesmo -que, de/ac/o, tenha sido algumas vezes limitada.
e das desigualdades a um poder burocrático, divorciado das massas
Miasestaunidadedo partido à volta de Mao e a existênciade
e representativodo modelo soviético: indicou objectivos existentes
um grande acordo por parte das massaspor vezespassivo ou reti- dentro do partido designados para representarem os elementos mais
cente mas muitas vezesactivo foram postas em questãocom «o grande favoráveis à restauração <<capitalista>>(isto é, a uma desigualdade
salto em frente». Este fez com que surgissembrechasno seio do cada vez maior numa sociedadeem vias de industrialização).Na me-
partido e pâs em evidênciaos conflitos de correntesbem como os dida em que uma parte importante dos quadrosdo partido -- que
interesses contraditórios que atravessam o comunismo chinês e que compõemessencialmentea nova burocracia privilegiada, se opõem
reflectem mais ou menos activamente a dinâmica complexada se ou se afastam dos «princípios>>do <<grandesalto em frente», vão apa-
ciedade (")
recendo as brechas. Mao já não era apenas o 'dirigente incontestado
Para Mao, mantinham-seválidos os princípios do«grande salto mas personificavauma linha -- nem sempre muito nitidamente ma-
em frente» -- para lá das decepções-- a fim de se evitar aquilo a nifestada-- que não podia certamenteser destruídamasque era
que ele virá a chamar o processo de degenerescência«à soviética» possível circunscrever: esta diferenciação é o ponta de partida para
(«o retorno ao capitalismo»). Mas ele devia recuar e dar um tempo a «Revolução Cultural».
de pausa para voltar de novo e melhor à carga. De facto, após 1960 Depois do «grande salto em frente», Mao já não é apenaso diri-
a China afastou-secada vez mais dos princípios dos«grande salto em gente unificador que não se pode dispensar luas passaa ser o porta-
frente»; dentro de certos limites, voltou-se ao modelo soviét CO(na). vós de uma corrente muito difusa e implícita de início, que tende
a destacar-sedos outros projectos que percorrem o PCC. Para Mao,
há nomes que simbolizam as tendências adversárias(tendências não
o Assim existem as pressõesdo campesinato:tendências para o reap-
reconhecidas pelos protagonistas designados): Peng Tehuai, Liu
arecimento de um campesinatorico, tendência para o abandonodo campo e
pam a emigraçãopara 8 cidade,incapazde acolhere du trabalho aos habitantes Chão-chi, Peng Cheng
do campo, tendênciapara segregarnovas«élites», etc. Ao Divã das cidadã, Oposiçãode facto queremosnós dizer: tanto Mao como os seus
pressõesliberBlizantes(no ponto de vista burguês) por parte de sectoresintelec. «adversários>>
não reconheciam abertamente a existência de tensões
duais, e piindpalmente uma nova dinamizaçãoda classeopaária que se toma dentro do partido. À medida que a sua autoridadecarismáticase
a fiasse motora do desenvolvimentosocialistae que auge não só aumentosde
revelou insuficiente para impar a sua orientação, Mao fez com que
se constituísseuma fracçãoorgânica e decidiu-sea deixar o partido:
foi a Revolução cultural (").
nem mesmo o poder.do partido, mas as suasformas burocráticas: em suma,os
seus aspectos despóticosl ' ''--'
próxima do modela soviético.. .(principalmente na indústria) . Resta saber se
hoje, os princípios estão mais bem respeitados...
Cf. Bettelheim, Charriêre e Marchsio: z4 co s/r ção do socialismo a
Cóf#a,Maspero, 1965; e Bettelheím: Rez/oJção c#/f ra/ e orgúefzúçãof#d#s-
friaJ a CÓ/mú, Maspero, 1973.
(') O balanço do desenvolvimento socialista põe em evidência os valo-
res adquiridos do regime, as suasfraquezase esclmeceo fundo da<<Revoluçãa
Cultural». Globalmente a China teve um desenvolvimento rápido mas em«dentes

lj7
7. 1960-1965
em frente» e de desenvolverrapidamente a economia.O sentimento
de unidade do apareço era tão grande que existia UM consensoabso-
A interrupção da experiênciado«grande salto em frentel> pro- lutamente geral face à URSS: todos os dirigentes, mesmo os que se-
longou-se por UHa tendência determinada num retorno ao modelo
guiam mais à risca o modelo soviético, deram o seu acordo à ruptura
soviético, à reorganizaçãode uma planificação.bastantecentralizada. e à necessária demarcação que levava inevitavelmente à polémica
à extensão do sistema de prémios às fábricas e comunas populares, pública, e à afirmaçãodo novo papel que a China possuíacomo polo
ao aumento do pedaço de terra individual, tudo isto acompanhado <<revolucionário» ("). .;.
por um aumento das desigualdadessociais e do poder da burocrada: Perante esta situação complexa, Mao como bom estratega teceu
CUvamente o projecto maoísta estava comprometido. uma rede de relações, alianças, conivências que Ihe vão permitir lan-
Este período (1960-1965) assistea um enhaquecimentodo poder çar uma (#ensivadentro e contra o partido. Em particular, estreitou
real de Mao(mas não da sua autoridade) em proveito de dirigaltes mais os elos privilegiados que tinha com Lin Pião, chefe do exército,
como Liu Chão-chi e Teng Hsiao-ping, e -auma luta dissimulada onde isto é, a fracçãomaisdisciplinada,mais homogénea
do partido,e
os objectivos estavammal delineados.As directivas de Mao eram na também a mais fácil de maoizar intensamente.Além disso, se Lin
realidademais contornadasdo que, efectivamente,combatidasde Pião não foi provavelmente o«mais próximo companheirol>de Mao,
te. O caso mais flagrante reporta-se à série de medidase anti- como ele próprio proclamava durante a revolução cu'rural, durante
maJidas na «campanha de educação socialista» (1963-1965). Isto quarenta anos e muito particularmente em períodos difíceis foi um
diz respeito não a um nítido afrontamento quanto à lilüa, mas à apoio constante,um aliado de sempre para o presidente Mao, mesmo
antes de este ser presidente.
emergênciade um projecto em parte implícito, o de Mao, face à lch
tina burocrática. Esta, confiante do seu poder julgava incarnar todo O dirigente chinês lançou sondagens e avisos, em especial o céle-
o partido, indusivamenteMao, e ignoravaa nova trajectóriadeste. bre «não esqueçama luta de classes>>
no lO.' Plena de Setembro
de 1962. Também tentou exercer a sua influência sobre a juven-
Acima de tudo estava profundamente convencida que a sua direcção
e orientação eram susceptíveisde reparar os erros do«grande salto tude. .. mas chegou ao limite da sua acção.Compreendeu também a
intensidadedas resistênciase a força das incompreensões
bem como
a inércia dentro do partido tendo sido sensibilizado pela grandeza
do processo de burocratização à «soviética»: burocracia que se carac-

(") A ruptura dos anos 1960 está em embrião desde a instaumção da


«R. P.C.» e mesmo a longo prazo, desde a emergência do maoismo nos anos
de 1930
3

A<<campai)hade educação socialista» é a última tentativa, antes de«Revo-


lução cultural de Maol>para se voltar a impar um curso maoísta(após avisos
e comunicações feitas à juventude) : em vão! Com efeito, o aparelhodo partida
alterava as imposições.Em Janeiro de 1965, Mao decidiu eliminar a última
série de imposições(«os 23 pontos») desta campanhaao mesmo tempo que
Líu Chão-chi
comoo confessou
maistendea E. Snow:daípor diante,a luta
tornou-se <(pública»,saiu fora da convivência retrata da direcção do partido.
terizava pelo rompimento com as massas,tendênciapara acumular capitalista>>). Tratava-se de voltar aos grandes princípios -- mas adap-
privilégios, nilmero exagerado,numerosostraços de ineficácia e mais tados -- do <.grande sa]to em frente», de se recanci]iar com a linha
geralmenteo seu elitismo ("): o inverso da «Yenan Way», a mais de massasque implica uma relaçãoautoritária e de direcção(muitas
próxima e constante referência maoísta. vezes sob uma forma paternalista) ("), mas também precisade um
A nível da planificação, antes da Revolução cultural, predomi- enraizamento dos quadros no seio das massas(«escuta-lase mostrar
nava uma industrializaçãodemasiadocentralizada,ainda que em a sua aptidão para as dinamizar»). É um projecto que se acompanha
menor grau do que a economiasoviética. Principalmente era difícil de uma diminuição das desigualdades -sociais e que tende para acabar
para não dizer impossível, desenvolver a economia chinesa autono-
com a separaçãocidade-campo(descentralizaçãoe hdustriahzação dos
mamente, o que levanta o problema da ajuda exterior. Mas em campos), sem esquecer o aumento do nível de vida (dando nova vida
que condições?E o mercadomundial não vai pâr em risco a constru- a um artesanato gemi-industrial local. . .) elevar os conhecimentos
ção do socialismo na China? Sãoestes alguns dos dilemas-- entre culturais mas mais em extensão (para as massas)do que em qualidade
outros -- e questões que se põem em vésperas da Revolução cultural,
(fazer obras-primas) e esforçando-se por acabar com a tradicional
entre 1960 e 1965. A respostadada foi um retorno prudente às separação manual-intelectual(« o desprezo confucionista pelo traba-
«normassoviéticas>>
mas com UH aumentoconsideráveldo papel lho manual») : um gigantesco programa de transformação da socie-
desempenhado pela agricultura. Com a Revolução cultural Mao
dade pondo a política num lugar de comando: importância da finali-
optou por uma outra vida.
dade da sociedade e não efectivamente das percentagens de aumento
anual do lucro...

8 Por não conseguir impar esta orientação através de uma acção


A {.R-evoluçãocultural»
directa dentro de um partido imen-samentecristalizado e burocrati-
zado ("), Mao rodeou a -questão e impulsionou em primeiro lugar
A«Revolução cultural>>define-see adquire todo o seu signifi-
cado à luz das tensõese problemasda sociedadeChinesae dos seus operações tácticas subtis, incompreendidas pelos sectores do apa-
reflexos nas lutas no seio do partido e da sua direcção. Surge com relho visado. Consolidouos seusapoios,principalmentedentro do
toda a sua complexidade como a última feafú/iz,a sfs/emZ//ca do exército que, sob o impulso de Lin Pião, desencadeoua partir de
madismoem investir de novo sobrea suaprópria basee com os seus 1964, uma campanhade m-aoização(são os princípios do l.iz/r/#Bo
pressupostos o campo da construção do socialismo e assim dar res- yer e/õo), que veio também a favorecera ascen-são do chefe do
exército.
posta às exigências ÍBtensas do período(outras exercem os seus
efeitos mas não são nitidamente identificadas). No fim de 1965,Mao, atravésde uma críticacultural, lançouum
Para isso, era indispensávelque Mao, antes de mais reconquis- ataque exemplar contra certos dirigentes, mas não aos mais impor-
tassea totalidade do poder, afastasseum certo número de quadros tantes: foi Peng Chefe,presidente da câmara de Pequim, membro
que simbolizam (como Liu Chão-chi) a linha que ele rejeita. («a via
(") A rejeição,não da burocraciaem si mesma,mas de urna burocracia
(") O«paternalismo» embora autoritário é no entanto diferente do eficaz e demasiado cara, é um dos pontos comuns entre Mao e Chou En lai(por-
deito//fmo que adstia em certas fábúcas e comunaspopulares. Cf. textos dos taDto <<burocrata>>por excelência!).
«guardas vermelhos», op. cif. (") Teng To autor de críticas contra Mao
b
160
11
r'
do gabinetepolítico e do secretariado
o visadopor intermédiodo O partido, garante da via para o socialismo acabou por se identificar
seu subordinado Teng-to ('). na pessoade Mao. Além disso a firmeza da posiçãode Mao tinha
Desde que a corrente de Mao foi reforçada dentro do partido a ver paradoxalmente, com a impossibilidade dos seus«adversários>>
(Peg Chen foi eliminado a partir da Primavera de 1966), a revolu- atacarem de frente(e para muitas mesmo faltava a vontade de o faze-
ção cultural alargou-se. Uma série de dirigentes «maoistas>>emer-
rem!), e com a incapacidade dos burocratas <<instalados>>
imaginarem
giram e ocuparamo primeiro plano: quasetodos foram sendoelimi- a possibilidadede recorrerem às massase as distúrbios que se se-
nados pouco a pouco como urra-esquerdistas.
guiriam.
A reunião plenária do partido em Agosto de 1966, consagrou
Facto digno de nota: ao princípio, nenhum dirigente de primeiro
uma vitória de Mao mais formal do que real. Deste modo, o apelo
plano intervem ou seja,porque como no casode Ceou En-lai. são
às massascontido na resolução final e a institucionalização dos
«protegidos>>e postos fora de causa tendo como única tarefa a manu-
<.guardasvermelhos», deu novo impulso à <<Revolução
cultural» e iria
tenção da estrutura do Estado ou como no caso de Liu Chão-chi, serão
fazer ultrapassar o quadro atribuído pelo «centro» (a direcção
futuras vítimas. Par outro lado muitos outros quadrosde primeiro
maoísta)("): toda a sociedadechinesavai entrar em «transe», t(idas
plano hesitaram e manifestaram uma grande incompreensão, reagindo
muitas vezes com um conservadorismo exagerado. as brechas sociais se vão alargar brutalmente...
As massas que se activam são formadas de início e essencialmente
O reforço da fracçãoMaa, que se apresentoupublica-mentee sc
por jovens estudantes, do liceu e universitários: os «guardas ver-
situou como corrente à «esquerda>>estava dependentedo papel ca-
rismáticodo seuanimador.Um culto da suapersonalidade,
cuidado- mehos», cuja grande mobilização deu à«Revolução cultural» asPecfoi
samentemantido veio facilitar também a tarefa do presidente do PCC. de uma revolução antiburocrática que não poupa ninguém com excep-
O carisma transformou-se num certo tipo de relação com as mas- ção de. . . Mao. Os<<gua-rdasvermelhos» tinham di-sponibilidades de
sas que dava possibiEdade de deixar passar um discurso muito sim- tempo ("), mas viviam principalmente nas escolas e nas faculdades,
ples e mobilizar vastos sectores à volta de uma temática elementar ("). no meio das contradições da sociedade:eram sujeitos a um ensino
elitista, selectivo, concebido como fonte de privilégios e ainda mais
como um distanciamentodo mundo camponês.Além disso titüam
(') Sabe-seque Mao nas suasentrevistascom E. Sn(w(1970) insistiu
na funçãodo«culto da personalidade>>
ein relaçãocom a pesquisade um con- que enfrentar o problema dos mercados insuficientes, o risco do de-
senso amplo«massa-dirigente»(Mao). semprego ou da desclassificação(por falta de empregos qualificados,
(') A resolução do«plenário de Agostos pelas suas ressonâncias revo- disponíveis...).
ludonárias e igualitárias e principalmente pelo apelo directo às massasé a pmva Aliás, este grande número de «guardas wrmelhos» demasiado
mais manifestada diferençaentre Mao e Estaline-- e isto em dois sentidos:
1) Mao não teve medo de apelar apta as massasao passo que Estaline vida no jovens para terem conhecido as misérias do passadoconsideravam
pânico de uma subida ao poder por parte destas; 2) por outro lado. Mao estava mínimos as conhecimentos do presente e não se satisfaziam com a
convencido que podia controlar, canalizar o movimento das massas.No que
teve razão:mesmoque os excessosnão tivessemido maislonge que a destruição
das bases burocráticas(mesmo nó sentido específicoda burocracia maoísta) do (') Por outras palawas: a sua actividade devia perturbar o menos pos-
regime. Ao passo que na Rússia estaliniana, uma subida por parte das massas sível a produção...
só teria sido capaz de varrer a burocracia russa, verdadeira sanguessuga agarrada (") Embora pareçaque a proclamaçãoda comuna seja de facto o primeiro
às costas do proletuiado soviético. acto de recuperaçãodo movimento da classeoperária de Xangai em revolta...

162 163
nova <<miséria»: a de uma sociedade hierarquizada, burocrática, re- os dirigentes: para a direcção maoísta era mais u-maquestão de <<refor-
pressiva .
mar>,o partido e eliminar um número r'estrito de quadros do que de
Mao ,que semeara
a agitaçãoentre a juventude,serviu-sedeste uma subversão geral da sociedade. Além disso, a direcção estava domi-
potencial como massamanobrável para acentuar as transformações nada pelo espectro da ruptura da unidade do país por aquilo que se
no seiodo partido.Maso carácKrincontrolável
e, durantecerto chama <(oespírito das montanhas», os poderes regionais, as diques
tempo, incontrolado, da mobilização deu lugar a perturbações dentro locais, sem falar das pressões das minorias nacionais: perigos reais
da sociedade
chinesa,bloqueandoa estruturado Es-tado
e parando existentes neste verdadeiro continente .recentemente unificado. ..
mesmo parcialmente a actividade do partido. Daí, resultou também
Além disso, ter de novo o controlo do :movimentodevia servir
mas muito provisoriamenteuma política <(deesquerda>>
no plano para atenuar a desordem dos quadros do partido muitas vezesdes-
internaciona[ -- puramente verbal, é certo -- e que os Chineses qua-
tituídos e outras, humilhados publicamente. Também era necessário
lificaram mais tarde como «urra-esquerda».
quebrar com as correntes antiburocráticas embrionárias e muito radi-
Por seu lado, outras forças sociais vão tomando iniciativas e
calizadas que não personalizavam apenas uma revolta mas também
defendendo reivindicações próprias, por vezes contraditórias entre
uma nova consciênciarevolucionária. O centro dirigente e principal-
si; opondo-se algumasvezes, aos «gua«]as vermelhos». Des'te modo,
mente Chu En-lai, desejavamalém disso limitar a confusão a nível
a classe operária de Xangai entrou em greve geral, inciddindo económico. Em resumo, face -a um-a situação que representava uma
as suas exigências sobre aumento de salários; e, em Janeiro-Feve-
vitória do coerenteMao bem como uma ultrapassagemà sua es-
reiro de 1967, pegando numa palavra de ordem da célebre reso-
querdaque fundamentalmenteiria pâr em causaa hegemoniaautori-
lução do congressode Agosto de 1966, organizou a <<Comu.nade
tária do partido -sobre as massas na sua variante maoísta, a equipa
Xangai>>em comparação com a Comuna de Paria ("). Por seu lado,
dirigente da«Revolução cultural>> começou a diferenciar-se: a sua
o campesinato começou a agitar-se mas com menor intensidade: o
ala dominante (Mao) tentava mais controla-r da que quebrar o movi-
partido consagroumuito da suaenergiaa evitar agitaçõesno seio
mento, ao passo que outros ( a chamada «urra-esquerdo») a faziam
do campesinãto, em parte por recear riscos económicos. Também aí
avançar,mas sem um projecto muito coerente; outros ainda, ( Chu
o poder burocrático, demasiado minucioso e muitas vezes ineficaz.
foi posto em causa. En-lai) ocupavam-se
principalmentecom a sobrevivência
e a conti-
nuidade do regime.
Face aos excessoscada vez mais intensos que não respeitavam
A intensidade da <<Revoluçãocultural» levou dois anos a ser
qualquer <<valorestabelecido»,Mao com a ajuda do exército come.
assimilada:desdeo início de 1967 até ao IX congresso
em 1969.
çou a refrear o processo
e depois,poucoa pouco,não semdificul-
Chu En-lai -- criticado pelos «guardas vermelhos>>mas eficaz-
dades con-sideráveis,conseguiu recupera-lo e encaminha-lo. A direc-
mente apoiadospor Mao -- desempenhouum papel importante na
ção maoísta não estava à espera de tão grande revolta nem do seu
carácter desardeira. estabilização da situação mas menos do que Lin Pião que, simulta-
neamente ao comando do exército exercia uma influência preponde-
Principalmente «o centro>> manifestou a sua inquietação perante
rante e via a sua autoridade atingir o auge: conseguiumesmouma
a quasetotal destruiçãodo partido e a crítica mordazde qua-setodos
autonomia de acção(que já s-etinha antes manifestado ao preparei
a edição do #?l,iz,rl õo VermeZóo») atingido uma estatura acima do
(') O «centro>> no sentido maoísta de unificador e centralizador. <<comum»,um pouco à Mao...
]64
16j
O<<centro» deu impulso aos«comités revolucionários» que per- exprimia o receio que a equipa dirigente tinha em ver as estfuturas
sonificavam a«Revolução cultural» na sua continuidade e nas suas do poder revolucionarizadas,e não apenasreformadas; para os sec-
formas imâis controladase que, aliás, representavamum equih- tores mais radicalizadas, não se tratava de ter bons ou maus quadros
brio de forças: os«G)mités revalucionários>>eram formadospor mas sim romper com a relação hierárquica dirigente-dirigido.
uma tripla aliança: por um lado o exército elemento preponde- Aliás, a classeoperária dos anos de 1960 era muito diferente da
rante de início, por outro lado,os antigosquadrosdo partido que o PCC encontrou ao entrar em 1949 nas cidades: passiva e indo-
«retratados» ou recuperadas, e por fim, novos elementos «esco- lente nessa altura, e pelo contrário, desenvolta, activa, consciente
lhidos» da«Revolução cultural». A superioridade do exército -- isto da sua força em 1967, ela multiplicava as reivindicações a diferentes
é, da fracção armada do PCC, o sector mais coerente e mais discipli- níveis: exigênciade um salário mais elevado, crítica do despotismo
nado, o mais próximo dasconcepçõesmaoístas-- sobre os comi-tés, da fábrica(contra os regulamentos de trabalho, nocivos e repressi-
6)i muito forte de início, na medida em que os quadros eram contes- vos) os sindicatos,simplescorreia de transmissãoeram postosem
tados e os novas elementos muito inexperientes. causa... A politização desta classeoperária bem como a dos estu-
Os«Comités revolucionários>>eram distintos das anteriores dantesdeixou incidir os seus efeitos sobre a«Revolução cultural»
tentativas de criação de <<comunas».E, mais ainda, opunham-se
e passou-lhe o seu dinamismo.
a todas as tentativas de formação e legitimação de novas formas Mas, a dificuldadedestasforças sociaisradicalizadas
em
de poder proletário, como as que proliferaram durante a<cRevo-
propor um projecto global unificador, o aspectodispersoe con-
lução cultural». Des-te modo, a«comuna de Janeiro>>de Xangai, fuso das iniciativas e principalmente a credulidade num <<maoismo»
transformou-se rapidamen-te (Fevereiro de 1967) em «primeiro
mal determinado--masque dava a Mao uma grandemargemde
comité revolucionário»,que levou mesesa impar a suaautoridade
manobra, sem falar da intervenção centralizada, sistemáticae coe-
sobre uma classe operária e «guardas vermehos» demasiado rebeldes.
rente do exército -- permitiam que o centro <<maoista>>assimilasse
O vigor dos ataques do «centro» (") contra os inúmeros <<des-
vios>>-- além do receio do desmoronamento da sociedadechinesa a «Revoluçãocultural>, e a repusesseno caminho devido. Os «Comi-
tés revolucionários>>
representaram a codificaçãoda nova ordem.
Para que tivesseêxito esta operaçãode recuperação
do poder,
(') O debate sobre o maoismofoi muitas vezesenegrecidocom a identi-
o centro <(maoísta»suprimiu numerosos quadros <'novos»da «Revo-
ficação lesuita: deformação bwocrática = estalinismo. É esquecer que a dege-
nerescênciaestaliniana está situada num período e num contexto bem preciso lução cultural», conservando apenas os -mais inofensivos.
(o da revolução russa isolada...). E, embora o estalinismo tenha degradado Atacando deste modo a <<ultra-esquerda»,o centm não se conten-
quase todo o movimento comunista mundial durante várias dezenasde mos. tou em lançar um certo número de quadrosà opinião pública mas
surgiramformas específicasde deformaçõesdenso de um contexto e num pe- indicou principalmente as fronteiras do antiburocratismo dentro da
ríodo completamenteDavas.Mesmoum país como a Albânia lefethdcbse e enal-
tecendo a estalinismo,não tem nem os meios nem a possibiEdadepara se dar <IRevolução
cultural». Na célebrecarta de Mao a sua mulher, de
ao luxo de ter um«estalinismo autêntico»; e, pua a CI)ina ainda é muito mais Agosto de 1966, mas publicada em 1972, este mostrava-secons-
verdadeiro.
É por estarazãoque é importanteapresentar
a espedficídade
da ciente dos limites de uma vitória possível da <<esquerda»:que a carta
construção socialista neste país. Especificidade que resulta simultmeamente
seja de 1966 ou 1972, pouco importa, o essencial é que estabelece
de uma problemáticaUniversal(a planificação,etc.) de respostasparticulares
li.mitos à <<Revolução cultural» (subentendendo que Lin Pião os
bem como de condições«locais»(as relaçõesentre as classes,as pressõesexte-
riores, etc.). excederá...)

166 ]67
])e 1967 a 1969, ano do IX Congresso, processou-se uma reor- ao partido e, as discordâncias ou discussões silenciosas ou violentas
ganização lenta, difícil mas sistema:dca: preparação trabalhosa dos são dissimuladas no exterior, obscurecidas e revestidas de uma ter-
«Comités Revolucionários» provinciais (no fim de 1968 a China minologia para iniciados, bastante desconhecidapara a maioria dos
estará completamente coberta dos«Comités revolucionários). O pro- Chineses.Além disso, o simplismo dos sloga#i da«Revolução cultu-
blema não estava apenas na dificuldade de assimilar e l)or vezes ral» não facili-tava as verdadeiras discussõesreservando-a'spara o ser-
mesmo acabar com um processo revolucionário autónomo. mas ralho (') comunista. Problemas tão essenciais como o crescimento
também na necessidade de evitar um retorno ao passado; tra- agrícola, a pressão demográfica, a planificação centralizada ou descen-
tava-sede deixar passarpelo menos uma parte do projecto tralizada, semfalar da política estrangeira, das relaçõescom o imperia-
maoísta: praticar novas formas de ensino que não estabeleçam lismo e o «campo socialista», não fazem parte de uma confrontação
novos privilégios mas que estejam estreitamente ligados à produção, com as massas. Estas só estão relacionadas através dos efeitos da esco-
acabar com a tradicional separaçãotrabalho manual-intelectual e a lha. Aliás, é incontestável que, uma planificação descentralizada,uma
nível económico, favorecer um crescimento mais equilibrado, indus- industrialização do campo subentendem uma actividade e uma auto-
trializar simultaneamente a cidade e o campo procurar o máximo de nomia relativas(um enquadramento menos cerrado) maiores do que
autonomia para as unidades de produção(a cidade no campo, o campo as antigas orientações o que supõe uma outra relação com as massas:
na cidade. . .), acabarcom uma hierarquia empedernida, ineficaz e favo aí reside o sentido profundo da «Revolução cultural». Mas isto não
tecer uma ci:iatividade por parte das massas.E, fora deste conjunto, o muda a estrutura das relaçõesdominantes-dominados.
. . e por isso,
partido devia, dentro de uma coerência maoísta, conservar o seu poder o maoismo aparece como uma forma específica de burocratismo (").
dirigente, e mesmo no sector da política estrangeira não devia(nunca) O IX Congressopreparado a partir de 1967, teve lugar em Abril
de 1969. O conclave do partido estereotipou a situação tal como
discu-dr publicamente as opções do partido. A prova não se fez es-
ela emergia do seu curso tumultuoso e muitas vezes imprevistas
perar: se, na Primavera de 1967, durante alguns meses,a política
da <<Revoluçãocultural».
estrangeira escapou a Chu En-lai, a reacção foi Muito viva, os pro-
Mao era efectivamenteo grandevencedormos com o apoio
tagonistasdesta política, não só foram afastadosdo partido como
essencialdo exército que desempenhavaum papel considerável.O seu
até chegaram a ser presos: a política es:trangeiraera«coutada» da
elite dirigente do partidos
chefe, Lin Pião foi nomeadoúnico sucessorde Mao.(Hoje diz-se
mesmo que ele se impôs a si próprio como único vice-presidente).
E, depois e é importante, toda a coerênciado projecto maoísta Elementos novos ma-snão os mais radicalizados,entram para a
nunca chegou a ser discutida (ver a propósito as discussões dos qua- direcçãodo partido(comitécentrale bureaupolítico) e algunsdos
dros dirigentes durante a <<Revo]uçãocu]tura]», a sua confusão. a
incompreensãoperante os silêncios, as fra-sesenig-máticasdo presi-
dente, sem falar das vagas instruções. . .). (+) Local fechado, reservado apenas a alguns privilegiados, ou o nome
dado a esses mesmos privilegiados. (N. do T.,)
O peso da<<realidadeobjectiva>>pesa sobre as orientações do ("),Reflexo, pois está ligada à estrutura da sociedadecllinesa de 1920:
regime, muito mais do que se poderia imaginar tendo em conta o país essencialmenteagrícola, mas com vastos territórios que podiam, pela me-
«voluntarismo maoísta». Mas estas dificuldades raramente são objecto nos por um certo tempo, acoher um«poder soviético».Por outro lado, havia
a impossibilidade de manter uma actividade real nas cidades e por fim, era
de debates evidentes, realmente compreensíveis para as populações
preciso ter em conta a derrota de uma modernizaçãodo país orientada pela
e classes relacionadas. As opções são debatidas nos círculos restritos burguesia.

168
r
antigos dirigentes criticados encontram-sede novo na dil=cção. De formada pelo estalinismo,que, pelo contrário se opas -- de facto --
facto, o IX Congresso confirmou um compromisso: as viragens na a este, mas que não tinha outros horizontes nem outras perspectivas
política externa em 'ligação com a instabilidade das disposições internacionais que não fosse as da URSS estaliniana.
de cúpula,vão rapidamentepor em questãoo equilíbrio frágil do A fraca bagagemmarxista da corrente Mao -- e sobretudo do
IX Congresso.
próprio Mao -- a juntar à separaçãofísica do proletariado a partir
de 1927, (encaixadonas cidades...) e o resto do mundo, vinha blo-
quear qualquer pos'sibilidade de assimilação da experiência revo-
9 A política externa chinesa lucionária manista. A degenerescênciaestaliniana acabou por isolar
os revolucionários dentro do seu próprio país. Se acrescentarmos que,
A política externa da <<República
Popular da China», para lá das
para os revolucionários chineses o seu país é um mundo em si mesmo,
aparências,caracteriza-sepor uma grande unidade, desde 1949 até herdeiro de uma vasta civilização, muito antiga e que têm estado e
aos nossosdias. Na Primavera de 1967, com excepçãode alguns me-
estão ainda mais preocupados com a unificação do continente chinês
ses-- período em que a política externa escapou bastante aos diri-
do que com o lugar que ocupam num processorevolucionário mun-
gentes do partido -- as relações com o mundo do comunismo chinês
limitaram-se ao domínio exclu-uivodas cúpulas do partido. dial, podemoscompreendera ruptura com a categorialeninista da
revolução mundial, concebida como dialéctica de um processo revo-
O que condicionaa acçãointunacional do PCC é uma dialéctica
lucionário global, com os seusaltos(revolução) e baixos(contra-revo-
entre a visãodo mundo(e o projectoespecífico)do maoismoe as
pressõesque este mundo exterior exerce sobre a China. lução) com os seuspontos fortes e fracos, com as suasetapascruciais
(como por exemplo, a importância essencial da revolução alemã após
Explicitamente e, num resumo esquemático do que atrás se disse;
a Primeira Guerra Mundial)...
ao princípio (nos anos 1920 e 1930), o que está em jogo é a relação
particular com o estalinismo, sendo este concebido como a expressão Aliás, esta estratégia nunca fez parte nem do maoismo nem da sua
do domínio do movimentocomunistamundial por parte da buro- prática. Foi a compreensãodos erros do partido em 1927, a exta'aor-
cracia da URSS. Esta exerceuinfluência sobre a China através da dinária intuição do papel -a desempenharpelo campesinatoe pelos
sua acção no PCC que sofreu as consequências catastróficas das direc- sovietes(a importância dos podereslocais) que determinaram a con-
tivas da Terceira Internacional. duta de Mao e introduziram uma trajectória específicaque é simul-
Apesar da derrota de 1927, atribuída a Estaline e depois do desa- taneamente reflexo(") e reordenação do-s entraves que pesam sobre
parecimento da oposição de direita(que se juntaram ao Kuomintang o comunismo chinês.
ou desapareceram na natureza. . .), e excluindo a oposição de esquerda
(que, aderiu muitas vezes ao trotsquismo como o ex-secretário-geral (').O problema é mais complexo: é diferente propor <la construção do
do partido Chen Du-tsiou), o PCC foi ocupado em massa,por qua- sodalismo num único país»... quando se está s6 e quando são vários na posse
dms estalinianos, principalmente a partir de 1930 com a chegada do mesmoprojecto.Sob ponto de vista ideológico,pode-sedesqualificaras
dos«28 bolcheviques» à direcção do partido. outras iniciativas e encontrarão-nos sós(ou quasel Albânia, Vietnam...) mas
sob o ponto de vista de realidade é outra coisa. É certo que o projecto esta-
Estes aplicaram mecanicamentea-sinstruções da Internacional liniano! era inealizável, mas era coerente e crível embora catastrófico para o
estaliniana e impediram que fos-sefeito qualquer balanço o que deu movimento comunista mundial. Hoje, não se passa o mesmo.Se a China é fas-
origem a novas catástrofes.O maoismo é uma corrente que não foi cinante, não pode, no entanto, exercer o mesmodomínio sobre o movimento

]70 17Z
Tudo isto constitui o âmago da visão <<maoista>>
(que não é evi- sendo o«inimigo principal»:<<inimigo principal» para a China, mesmo
dentementea do solitário Mao!), que é u.mapercepçãoespecíficado que generalizemospara todo o mundo.
processo da revolução chinesa ma.s desprovida de concepção plane- Durante vinte anos, até ao fim de 1960, o maior perigo era re-
tária e que, a]ém disso, int«ioriza lugares comuns estalinianos: ao presentadopelo imperialismo americano. Lutar contra este adver-
contrário de Lenine, sob a influência da ]nternaciona] estaliniana. sário -- que impunha o bloqueio da China, a isolava diplomatica-
a visão do mundo e a prática do partido referem-se sempre à China. mente e ameaçavamilitarmente -- implicava uma viragem à esquerda,
Raciocinando desta maneira dentro do enquadmmento chinês o apoio às lutas revolucionárias, às vezes puramente verbal mas in-
(na verdade imenso!), submetidos à concepçãointernacional de Esta- consequente outras vezes(ajuda às guerrilhas no sudeste asiático e
line, interiorizando o modelo da construção do socialismo num só
noutros lugares).
país, os comunistaschinesesno fim de 1950, chegarama substituir Uma vez concluídaa ruptura com a URSS, estatornou-serapida-
de facto, a construçãodo socialismona URSScomo objectivo a atin- mente o adversário número um, por uma espantosa <<deformação
gir, pelo da pária chinesa.Esta transformaçãoé uma espéciede san- perceptiva»bem elucidativa das teorizaçõesmaoístasque, incapaz
ção do estalinismo cujo egoísmonacional e a atitude de grande po- de caracterizar a natureza da URSS designou a mudança com os pio-
tência só vinham facilitar atitudes semelhantes,princit)almente num res qualificativos, mais ricos em ressonânciasdramáticasdo que em
país tão grandecomo é a China e que concretizaráuma revolução demonstrações rigorosas e convincentes : «social-imperialismo», «fas-
autóctone.
cismo»,«burguesia vermelha>>...
E, quando o dinamismo da China a fez seguir um caminho novo
Neste contexto, os dirigentes procuraram e encontraram UMa
em relação à URSS caminho representado pelo maoismo e pelo seu
situação de compromisso com«o tigre de papel>>da véspera, a Amé-
projecto -- e cuja autonomização foi ainda consagrada pela ruptura
sino-soviética -- a China considerou-se então como o único bastião rica (de Nixon), dentro do quadro de uma política direitista (subor-
revolucionário a preservar, como já havia sido necessáriodefender dinação da ideologia aos interesses do Estado cHnês), que capitula
a URSS,pátriado socialismo.
Umamesmalógicaconduza uma do ponto de vista da revolução -mundial mas que é fértil em suces-
mesma política: a defesa exclusiva das interesses chineses levou à con. sos diplomáticos. Desde então pede ver-se como a política de es-
fusão entre política de Estado e atitude do comunismo chinês(do querda de 1950 e princípios de 1960 foi mais a resultante da hos-
tilidade americana e do isolamento da China(e da sua relativa
partido) e é semprea defesado Estado que tem a prioridade, mesmo
que verbalmente sejam os princípios ideológicos que sejam postos dependênciafaceà URSS)do que do desejorevolucionáriodos diri-
em primeiro lugar. genteschinesescada vez menosinclinados para u'm verdadeiro pro-
É a razão porque se pode dizer que não há política de direita ou selitismo e que, de qualquer forma compreendem mal a-srealidades
de esquerda do maoismo na sua essência,mas sim práticas de esquerda da luta de classesmundial(menos por desconhecimento do que por
ou de direita, conforme o que se considera -- no momento -- como emprego de esquemasestereotipados): paradoxo revelador do
maoismoque se demonstrou criativo para a China e por outro lado
tão crítico face a esquemasesteriotipados que Ihe quiseram impârl
comunista como o estalinismo: o seu projecto não tem, nem a credibilidade,
A diplomacia chinesa, pelo contrário, atingiu uma superioridade es-
nem a coerênciado seu homólogo soviético e principalmente porque entretanto
surgiram outros horizontes, outras alternativas.E depois, os dissaboresdo pas- pantosaao nível do jogo político plan-etáriono que respeitaà rela-
sado ensinaram -- pelo menos um pouco -- os revolucionários do mundo. ção de forças de Estado para Estado.

272 173
No seu todo, as flutuações da política chinesa são determinadas Por ou-tro lado, pode dizer-se que as coacçõesobjectivas se fize-
pelas eleitas(e não pela compreensão) da luta de classes à escala ram de novo sentir: o .receio da regressão económica, a obsessão
mundial, pela possibiHdade(oudificuldades?)em manter, durante da ameaça soviética -- e a extensão do dispasítivo militar soviético
mais ou menos tempo, os actuais <<elos»com os Americanos, pelo na fronteira russo-chinesa-- é certo que não foram feitas para i:edu-
desencadear ou não desencadear das lutas revolucionáriasvitorio- zir a apreensão;de um modo geral, os problemas complexose difí-
sas nas novos países subdesenvolvidos ou nos países imperialistas ceis de um processo de domínio social da sociedade chinesa(relações
e, am última análise,pela-svariaçõesdo poder burocrático sob uma entre classes,importância da agricultura e as pressõesdo campesi-
ou outra forma na China: pela sua capacidade ou falta de capacidade nato que nem semprelevam ao socialismo,as tra(tiçõesa reftea-
rem, etc.) tudo isto teve o seu peso nas opções do pós <<Revolução
para estabilizar mais ou menos tempo o seu regime.
cultural>> e provocou rupturas importantes a nível da direcção.
Neste momento, os revolucionáriosdo mundo nada têm a espe-
Assim, a morte<<místeriosa>>
de Lin Pião, a violência das acusa-
rar -- e os Chinesesnão lhes dão qualquer ilusão -- senão punha-
ções contra ele e contra Chen Pota -- outro dirigente da«Revo-
ladas pe]as costas como um Cei]ãa, Bang]a-])esh. Por vezes a China
lução cultural>> e o número 4 do partido no IX Congresso-- e,
mantém (provisoriamente?!)uma ajuda revolucionária, mas quando
simultaneamenteà eliminação de Lin Pião, a de meia dúzia de
se-trata do seu interesse de Estado(principalmente à volta da China).
membros do Bureau político essencialmente ,militares, atestam a
fragiHdade do compromisso de 1969. Além disso, a crise, a crise
que o X Congresso tentou resolver, esclareceu as incertezas do
10. 0. X Congresso maoismo. Este sentiu-se na obrigação de apelar para as massas
durante a«Revolução cultural>>o que provocou a confusão en-
O X Congressoadquire todo o -seusignificado confrontado com
tre a maior parte dos quadros do partido. Mas o «centro maoísta»
o conjunto dos elementos acima descritos: concretiza a vitória e os
ultrapassado pela dimensão do movimento, começou a refreá-lo e me-
limites do maoismo. O condave do partido remata a«Revolução teu-seem compromissos.Então Mao, fez grandesesforçospara mo-
cultural>>no sentido de Mao modificandoa relaçãode forçasno dificar de novo o equiHbrio, mas de -modomais controlado, princi-
interior do partido: tudo o que estiverdemasiadolonge ou fora do palmenteapósa crisebrutal de 1970-71,a «conspiração>>
de Chen
quadro prescrito é combatido. Assim é varrido a tentativa de hege- Pata e de Lin Pião e a morte deste último. (Associaram-seestas duas
monia do exército(exército-partido) sobre o conjunto do partido e personagens mas parece que elas representavam duas concepções
da sociedade. Ta'mbém é rejeitado tudo o que se identificar -- com opostas: como é hábito foi aplacado o sistema da amálgama).
ou sem razão como expressãoreal ou bode expiatório -- com os ex- Por outras palavras,dentro do quadro da <<linha
de massas»,o
cessos da «Revolução cultural» («a urra-esquerda»). Por outras pa- ponteiro dirige-se para o lado controlado: directiva de cima para baixo
lavras, tudo o que comprometera estabilidade(que ultrapassao com (talvez?) informação (deformada) das massas da nova orien-
quadro da reforma) da sociedade constit-uída (os partidas partído- tação.Face à crise de direcçãoque seguiu(e reflecte) as tensõesda
massa), e que puser em risco a destruição da unidade do país, é «Revolução cultural», o maoismo acaba por mostrar que as suas rela-
reduzido a llada». Isto implica que o partido(mais ou menos ções com as massas (inclusive a massa dos membros do partido) são
«reformado>>)retome a direcçãode tudo e dirija a:smassascom fir- de comando,de autoridade.Os elos renovadoscom as massas,é a
meza <<Revaluçãocultural»; o autoritarismo é o pós «Revolução cultural>, . . .

174 Í7j
r
Este desejo de controlo acérrimo explica a brevidade do Con- recomeçada)de uma élite dirigente mesmo saída das massaspro-
gresso, anteriormente todo preparado. O tom estalhiano das acusa- letárias.
ções contra Lin Pião e Chen Pota: espião, agente do Kuomintang, Além disso,a política estrangeira(inseparável
da sua política
trotsquista. . . aparenta um exorcismo, bloqueando qualquer hipótese de partido) é a de uma grande potência que está limitada apenas pelo
de discussão e questões legítimas: velhos dirigentes do partido, re- facto de ainda não possuir os meios(económicose militares) para
cormndo à conspiração e à tentativa de assassinato?! E isto após se emprenhar numa tal política; o internacionalis-mo proletário, é
dezenasde anos de actividadeno partido, muito perto do presidente es-tranho à sua prática, excepto nas palavras. A <<real-politik» tão
a[heia ao leninismo, condiciona presentemente as actos dos seus
Mao (Chen Pata foi durante muí-to tempo o secretário de Mao) l
Entes dois líderes em decadência foram os principais animadores dirigentes.
Uma novadirecçãose fomla a pntir do congresso:assegurara
da «Revolução cultural» e aqui reside o problema: como <<destruir
sucessão
de Mao. Chu En-lai tem incontestavelmente
um papel des-
a sua mputação» sem pâr em questãoo<<Revoluçãocultural» e sem
tacável dentro do novo Bureau político(depois de Mao, claro) sólido,
acentuar a incerteza dentro do partido? O que será de um tal partido
sobretudono casode Mao morrer -(ou de Chu En-lai).
e para onde irá a China...?
A promoção de jovens dirigentes atesta a importância dada ao
No fim do XI Congresso
Mao é maisdo que nunc-ao dirigente
retorno ao poder por parte de quadros de origem operária que devem
incontestado, mas será um verdadeiro vencedor? Os perigos de dege-
tomar o lugar dos militares. E este fenómeno dá-seao nível dasdi-
nerescênciaà soviética(«a via capitalista»)foram eliminadosou ape- recções dos <<comitésrevolucionários»: assiste-se ao retomo maciço
nas afastados?É possívelacreditarque o partido de Chu En-lai dos antigos quadros e à chegadade jovens dirigentes(ex?) operários,
-- ou de outros eventuais sucessoresmenos gloriosos -- está prepa-
fazendo em parte desaparecer os chefes militares.
rado para novas «Revoluçãocultural». Em que medida o «Estado ope- Quadros muito antigos e gloriosos mas bastante inactivos devido
rário» chinês é capaz de responderaos vastíssimosproblemasque se à idade, como os marechais Chu Te e Liu Po-cheng, o presidente
Ihe põem: não apena'sas dificuldades económicas de um país que fica interino da república, o venerável Tong Pi-wou, encontram-seno
pobre mas também as pressõesdo imperialismoe mais geralmente bureau político.
do mercado mundial, o peso da demografia, etc.? O partido(a buro- Ali, <<funcionam»a título simbólico como garantesda continui-
cracia) pode manter a sua hegemonia sobre a sociedade chinesa em dade -maoísta,por não poderem ser s-ubstituídospor outros quadros
que base e com que espécie de relação com as massas? com o mesmo peso his-tónico mas de idade menos canónica. Man-
A China apresenta incontestavelmente originalidades muito váli- têm-se na direcção porque do ponto de vista maoísta são bastante
das no domínio da construção do socialismo(tais como a descentra- seguros, após as «desventu-ras» com Liu Chaochi e depois Lin Pião
lização, a industrialização do campo . ), mas está mais do que nunca e são desprovidosde ambição-- são todas três octogenáriosavan-
afastada de uma democracia proletária. Não que seja necessário çadosl
subestimar as dificuldades consideráveis levantadas pela constituição De um modo geral, os acontecimentos
dos últimos anose o
de uma tal democracia nas condições da China (atraso, peso do cam- X Congresso, mostram os limites do <1-maoismo>>como concepção
pesinato, proletariado há muito tempo passivo. . .), mas o essencial nova de cons:trução
socialista (-sedermos a socialismonão só uma
é tender para uma sociedadeque favoreçaa autonomia,a tomada definição económica e de ditadura da proletariado mas se incluirmos
do poder real pelo proletariadoe não a selecção(perpetuamente
e também a <<democracia proletária generalizada»!)

176 177
12
Limites também, os existentes nas tentativas do «centro maoista>> Mais uma vez, parece que Mao tentou evitar os«demónios» que
para evitar processosde degenerescência
burocrática: as relaçõescom para ele são unl desenvolvimento da desigualdade, e segundo este
as massas são mais do que nunca burocráticas, de autoridade e sub- ponto de vista, o após«Revoluçãocultural>>adquirira o aspectode uma
missão; o partido manda em tudo e aportoda a parte. E, se incon- restauração, com o aumento da desigualdade, e o aparecimento de um
testavelmente as desiguald-adessociais forem reduzidas, se o partido novo fosso entre o partido e as massas.Esta mini-revoluçãocultural
renovou os elos com as massas, nenhu-ma segurança ou forma de ins- será mais eficaz que a primeira? Duvida-se. E a presença simultânea do
tituição que exptjma Qpoder directamente proletário foi estabelecida: apelo às massase do controlo intenso atesta uma vez mais a ambi-
actualmente,
acentua-se
o poder do partido (o que significa,não o guidadee os limites do maoismo.Mas as massas
acabarão
por agir
esqueçamos,direcçãode cúpula restrita do partido). de um m(üo autónomo; terão aproveitado as lições da«primeira
E, segundoo próprio ponto de vista de Mao não existe qualquer Revolução cultural», ou pelo contrário assistimos a ajustamentos de
elemen-to significa'tive que dê garantias contra uma degenerescência contas no seio da burocracia?
do partido e do Estado. Basta ler as entrevistas, notas oficiosas, A falta de informações não nos pennite determhá-lo mas a res-
as reflexões reservadasa círculos restritos. .. para notar um certo posta é essencial para o (uturo do socialismo chinês.
ceptismono velho líder no declínioda suavida. Efectivamente,
se
Lin Pião era apenas um <.aventureiro» (!) e se tornou o delfim de
Mao e não foi«corrido>> segundo a versão dicial, graçasà autoridade
de Mao, o que é que se passará após o desaparecimento do dirigente?
Não é verdade que o projecto maoísta está na sua grande parte con-
centradona pessoa,na subjectividade, no cariz do <<glorioso
presi-
dente»? Segundoo ponto de vista maoístae l)ara numerososqua-
dros do partido, estaquestão gamo algumasoutras, deve ser posta
com acuidade sobre um fundo de incerteza. A cerimónia expiatória
do X Congresso está longe de poder resolver esta questão, como -mui-
tas outras . . .
E, se olharmos para os recentes acontecimentos, nomeadamente
a campanha anta-Confúcio o problema está longe de ter desapare-
cido. Fala-sede <ínovarevolução cultural» mas evita:se todos os
excessose, principalmente, como muito bem assinalouK. S. farol
evita-se o emprego de alvos demasiado ténues: :o que tin'ha sido in-
terpretado no início da <«Revolução
cultural» como um direito: de
atacar todos os -quadrosdo partido. Os dois alvos actuais são Clara-
mente indicados: Confucius, morto há mais de dois mil anos e per-
sonalizando(com razãoou semela) tudo o que é retrógradoe o
defunto Lin Pião, as-sociado
ao primeiro como símboloreaccionário:
dois mortos, assimnão há perigo (espera-se)
de ataqueao partido.

.278 279
B% 1 0 MAOISMO POSTO À PROVA

J. MARIEVINCENT
29 de Setembro de 1976

Como corrente política, o marxismo sempre se distinguiu pela


sua vontade de estabelecer estreitos contactos com as massas.Quando,
após a derrota da segunda revolução chinesa, (1927) Mao Tse-tung
se impôs pouco a pouco como dirigente do partido, foi porque, con-
trariamente aos dirigentes formados em Moscovo no serralho do
Komintern estalinizado, soube tecer laços sólidos com as massas
camponesas. E se o P(-)C, a seguir, Desistiu a todas as campanhas de
exterminação organizadaspor Tchang Kai-chek e finalmente triunfou
du-madversário financiado e poderosamentearmado pelos Estados
Unidos, foi exactamenteporque se fez eco das aspiraçõese das ex-
periências da imensa maioria camponesa. Neste sentido, o maoismo
não pode ser confundido com o estalini-smo,que se afirmou contrário
às massasoperárias e camponesas numa fase de refluxo da revolução.

Escutar as massas

No entanto, este apego à <<linhade massa» não é tão puro e isento


de escórias como parece à primeira vist.a. Com efeito, no decurso
dos seus mais decisivos anos de formação, recebeu u.m certo cunho
estalinista,tanto na suateoria como na suaprática política. No par-
tido, regido por um centralismo de factura burocrática, não existe

281
debate democrático para sancionar ou ultrapassar as divergências, as experiências e as improvisações arrojadas, contra todas as rotinas
mas sim afrontamentos subterrâneos entre bandos, que terminam, e todos os canservantis-mos.
O maoismo autêntico, o de Mao e dos
o mais das vezes,por decretosdo chefe do partido. Disso resulta seus imediatos seguidores-- não ignora que um partido no poder
que as massas não podem ser chamadas a dar a sua opinião sobre a depressa é atacado de esclerose e perde a capacidade de compreen-
orientação a seguir, como não podem exercer controle sobre a activi- der o que se passaentre as massas.O seu objectivo principal será,
dade da organizaçãorevolucionária. O único meio que resta à sua por conseguinte,encontrar uma prática política que não impeça e,
disposiçãopara se manifestar é o de retirar ou dar o seu apoio ao pelo contrário, permita a expressão do descontentamento das massas
partido. Não há dúvida que Mao insistiu muito junto dos comu- para além da cortina burocrática, sem,claro está, pâr em causao
l nistas sobre a necessidade de se manterem à escuta das massas e de monopólio do partido sobre a política. É mais vantajoso conhecer
procederem a minuciosos inquéritos, mas mesmo a 'maior atenção as massas,para tornar o partido -maiseficazna mobilizaçãodas mas-
dos militantes nessesentido não substitui verdadeiramentea expres- sas(reformando-o, se necessário).
são e a auto-organização directas dos oprimidos. Por isso, não há que
estranhar ao ver-se o PCC cair pouco a pouco num populismo pater-
nalista: é o partido que pensa pelas massas,lhes impõe viragens estra- As massas vão demasiado longe
tégicas e tácticas de frequente carácter oportunista, e fá-lo com muito
boa consciênciavisto que os militantes se senteme se pretendem O apogeu do inaoisma foi evidentemente a Revolução Cultural,
como depositários das perspectivas proletárias fren-te às massas cam- tanto devido ao vigor do apelo -à-smassasque caracterizou os inícios
ponesas atomizadas. desta, como pela força das críticas antiburocráticas que se desenvol-
O êxito da revoluçãode 1948-1949em nada mudou, no funda- veram sob instigação do próprio «grande timoneiro». Mas, muito
mental, este estado de coisas:.Bem ao contrário, a distância entre o precisamente, este pon:to cimeiro é rapidamente seguido duma queda
partido e as massasalargou-seem função da burocratização,arrastada significativa. Para os maoístas, as massasvão demasiadolonge nos
pelo exercício incontrolado do poder. Tendo faltado, por razõesdi- seus ataques contra a burocracia e os seus privilégios, dão prova,
versas, o contrapeso proletário,(entre outras, repressão do Kuomin- nos principais centros industriais, duma demasiadogrande capacidade
tang e dos japoneses)o partido sentiu-semais do que nunca inves- de iniciativa, mostram-s-e excessivamente irreverentes em relação aos
tido duma missão histórica única e encarregado da transformação dogmas melhor estabelecidos. É bem por isso que a esquerda não
social, em vez e no lugar das massas.Ao mesmo tempo, a amplitude enquadrada em breve será golpeada e as greves condenadascom a
dos pmblemas a resolver, como a reestruturação e modernização dos maior severidade.A constituição dos comités revolucionários,assen-
campos e, paralelamente, a indusuialização e transfoi'mação do mundo tes oficialmente sobre a tripla aliança do partido, do exército e dos
urbano, obriga-o a procurar obter a mais activa participação das mas- rebeldesrevolucionários, terá então como objectivo essencialreaver
sas rurais e urbanas na vida económica e social. O poder maoísta o controle da população e repor os Guardas Vermelhos no recto ca-
apr'ementa-sepois como uma prática política que tenta resolver a qua- minho da disciplina. O movimento de massadeve, em su-ma,redu-
dratura do círculo -- ou seja,obter a mais efectiva mobilizaçãodas zir-se a um- meio útil de pressão para desalojar os quadros políticos
massas, sam lhes conceder o direito de se exprimirem de forma au- incapazes de seleccionar ao 'uivo os novos elementos -susceptíveis de
tónoma ao nível político. É o que Ihe dá o seu carácter contrastante melhor enquadrar e dirigir as massas.Os afrontamentos,as apaixo-
e imprevisível, e a aparênciaum tanto enganadorade apreciar muito nadas discussõesda Revolução Cultural, desembocam assim numa

]82
conclusão à primeira vista inesperada, mas profundamente lógica
para quem se coloca no ponto de vista 'maoísta:para evitar ser
ultrapassado pelas massas,é preciso inseú-las num sistema ainda mais
aperfeiçoadode controle e de endoutrinamento ideológico sob o signo
do pensamentode Mao Tse-tung.O apelo qua-selibertário de 1936
à revolta e à rebelião, transforma-senuma cadeiade exorcismos.de
denúnciase de condenações que não está tão afastadacomo i«ó dos
processos de feitiçaria, contra os «agentes» omnipresentes, embora
disfarçados, da restauração do capitalismo.

A sombra de si própria A POLITICA EXTERNA


É tudo isto que explica que a corrente maoísta já não seja hoje
mais do que a sombra de si própria. Receia agora em demasia os mo-
DA CHINA
vimentos de massapara poder jogar com eles, como fez- feiasCem
Flores à Rwolução Cultural. E quando procede a grandescampa-
nhas, como a que desencadeouem 1974 contra Confúcio e Lin Pião.
rodeia-se de todos as cuidados para antecipadamene banir toda a
possibilidade de expressão herética e assim evitar qualquer surpresa
desagradável.É ainda de notar que issonão a colocou ao abrigo dum
importante movimento de greves -- bem como duma contestação
política não desprezível.De resto, verifica-se que o ulterior movi-
mento de estudoda ditadura do proletariado( 1975)evita cuidado-
samente preconizar a denúncia ou o acto de acusaçãodos dirigentes
do partido. Parafazer frente ao ascensodos burocratasde tipo clás-
sico, e porque deixaramdeteriorar as suasrelaçõescom as mas-
sas, as maoístas já não dispõem pois senão de armas muito embotadas :
a denúncia dos bodes espiatórias, os apelos ao igualitarismo, as injú-
rias cont-raa <<viacapitalista». O facto de hoje Mao estar morto não
tem peso significativo, e o maoismoortodoxo entrou irremediavel-
mente na via do declínio porque não soube ser aquilo a que pre-
tendia, ou seja, uma crítica de esquerda ao estalinismo.

184
l A TEORIA DOS «TRÊS MUNDOS»

PIERRE ROUSSET

13 de Outubro de 1976

O alcancemundialda Devolução
chinesafoi imenso;agiutanto
sobre as relaçõesde força internacionais, estimulando as lutas de
libertação, como sobre o movimento operário, quebrando definitiva-
mente o monolitismo estalinista. Por forma desigual segundo os pe-
ríodos, e apesar do oportunismo da sua orientação, -adirecção maoísta
impôs-se pouco a pouco na arena mundial como uma alternativa de
esquerda à direcção soviética. Mas o fim da Revolução Cultural
anunciou o rápido dedínio desse papel do partido comunista chinês
e preparou o lançamento, pela direcção maois-ta,duma nova política
de consequências profundamente contra-revolucionárias.
A diplomacia chinesa forma sistema. A sua coerência é dema-
siado grande para poder ser reduzida a uma sucessãode«erros inlle-
lizes» devidos à«ignorância» pelo PCC das condições concretas exis-
tentes nos outros países e continentes. E contudo é essa ainda a
<<explicação» avançada por certo número de correntes de extrema-
esquerda,que se recusama fazer uma critica radical da direcção
maoísta.
Esta diplomacia não é também obra exclusiva duma ala da buro-
craciachinesa.
Foi a do conjuntodo grupodirigente,de Mao a
Chu En-lai, de Teng Hsiao-ping ao <cgrupode Xangai>>,talvez com
excepção de Lin Pião.

187
De resto, a direcçãochinesa nem faz mistério das modificações O terceiro-mundismo e o messianismo, já presentes no período
introduzidas na sua orientação, nem da sua coerência. Foi até expâ- anterior, ganham uma nova dimensão. O que é bom para a China
las na tribuna da ONU, em Abril de 1974, pela voz de Teng, ao (entenda-se: para a bu-rocracia chinesa) é bom para a revolução
tempo no auge da glória. O abandonodas a-nterioresanálisesé cla. mundial.
lamente afirmado. Para Pequim, o «campo socialistn>e o <lcampo
ocidental>>deixaram de existir. Doravante, a cena mundial divide-se
em <<três mu:ndos». O pri-meiro é o das <<duassuperpotências»: os Do Paquistão a Angola
EUA e o <<social-imperialis,mo>>
soviético.
Pouco a pouco, as análises ir-se-ão precisando e a balança deixará Infelizmente não se trata apenasde discursos; todas as implica-
de estar equilibrada entre os dois: os EUA são um imperialismo em ções práticas da mudança de orientação são extraídas em Pequim.
declínio, enquantoque <moutro>>é uma crescenteameaça.Por con- É em 1971 que tais implicaçõesclara-mentese revelam.A China
sequência,a luta prioritária à escalamundial é hoje a luta contra apoia a ditadura de Yahia Khan, cujas tropas massacramos benga-
o<<hegamonismo» e sobretudo o combate contra a influência sovié- las sublevados, e, ao mesmo tampo, abandona um movimento de liber-
tica. Nesta luta, a força motora é a do terceiro mundo: os paísesditos tação nacional às suas direcções bu-rguesas.Dá aberta-mentecober-
em vias de desenvolvimento, seja qual for o seu regime social. tura ao esmagamento da organização.IVP da extrema-esquerda,

Existe UD <<segundo mundo», que é o dos países <<in;termédios>>
muito dura repr'essãodo movimento de massapelo governo(fingalês.
da Europa ocidental e oriental, bem como o Japão. Estes podem ser Mao não hesita, enfim, em convidar Nixon a visitar Pequim como
preço do seu reconhecimento internacional, sem pâr a suspensãoda
trazidosà luta contrao hegemonismo.
A -suaimportância
é tanto
escaladados EUA na Indochina como condição prévia para a nor-
maior qua-nto esta região do mundo -- a Europa -- é o lugar privi-
malização -das relações diplomáticas. Deste made, a direcção maoísta
legiado do afrontamento soviético-americano,de que surgirá pro-
vavelmente a terceira guerra mundial. assestaráum severo golpe ao -movimento anti-guerra nos EUA e aju-
dará objectivamente o imperialismo a prosseguir na sua política de
Apesar de discretas referências, a análise em termos de relações
genocídio. Foi a primeira vez na história que o regime chinês tomou
de forças entre classesé afastadaem proveito duma análise em ter-
tais medidas. E estas ampliam-se. Em África, a diplomacia chinesa
mas de relaçõesde forças entre Estados. O movimento operário oci-
acusaum4 ampla viragem que a levará a saudar o esmagamentodo
dental é ignorado: é «revisionista». O movimento de libertação na-
movimento operário sudanêse a concedero seu apoio à FNLA e à
cional, como movimento militante, apaga-sepor si mesmo ante os
governos. UNITA -em Angola. Da Europa à Ária, Pequim apela ao reforço
dos pactos militares anti-soviéticos, aplaudindo cada discurso de
O dogma da «não ingerência nos assuntos dum outro país», <<guerrafria» dum general ocidental.
adquire agora um conteúdo muito prece:se:os })ovos têm o direito A <<nãoingerência>>sofre notáveis entorses, quando chefes de
de decidir do regime socialda sua escolha.Trata.r--se-á
de ora em fila da oposiçãoda direita na Alemanhae na Grã-Bretanhasãocon
diante com os governosdo Terceiro Mundo como autênticos porta- virados, tão oficialmente quanto possível, a visitar Pequim.
palavra da sua população. Nestas condições, o pior ditador torna-se Se a direcção chinesa continua a apoiar certos movimentos revo-
necessariamente«progressista>>e«anta-imperiali-sta», qualificativo lucionários na Ária do sueste, por outro lado abandona abertamente
que até ao Sha do Irão acabade ser atribuído. os combatentes do Dhofar no sul da Arábia, apesar dos compromissos
r

anteriormente assumidos.Finalmente, a República popular terá sido, gar contra a influência soviética -- com todas as consequêncas con-
com a Roménia, o único Estado operário a nãa romper as relações tra-revolucionárias que uma tal orientação implicam.
diplomáticas com o Chile de Pinochet. Não será antes do dia em que a pressão das mobilizações de
A diplomacia chinesa nunca foi propriamente anti-inWerialista. massafaça irrupção até ao domínio reservadoda política estrangeira
Sempre fez prevalecer a defesa dos interesses nacionais. Durante longo -- como durante a Revolução Cultural que os fundamentos desta
tempo,o«espírito de Bandung>>
-- ou seja,a defesado neutralismo política poderão ser seriamente abalados. E sê-lo-ão tanto mai's quanto
no terceiro mundo -- terá feito figura de doutrina oficial. A viragem for grande o eco das mobilizaçõesde massana Europa ocidental e
dos anos 1970-1971terá sido preparadae grandementefacilitada na Ásia oriental.
pelos limites programáticosdo partido comunistacllinês. Mas nem
por isso deixou de ser clara e profunda. Exprime-se tanto na orien-
tação oficial como nas medidas concretas tomadas por Pequim.
Esta viragem explica-se pela conjunção de -três factores : a lógica
do conflito sino-soviéticotal como é entendidaem Pequim; a mu-
dança havida na política americana na Ária após a ofensiva do Tet
em 1968 no Vietnam, que levou Washington a abandonara sua
política de i-solamentoda China, permitindo pela primeira vez. que
a República popular tenha podido esperarfazer-sereconhecerpelos
paísescapitalistas; e, finalmente, o endurecimento da burocracia chi-
nesa logo após a Revolução Cultural.

Após a morte de Mao

A viragemtanto sancionaa evoluçãointerior da RPC-- modi-


ficação das ligações da ala maoísta do aparelho com üs massas, na
conta-nuidade do esmagamento das<esquerdis-tas» da Revolução Cul-
tura» -- como as alterações operadas na situação mundial.
Política de burocraciano seu conjunto, poucashipóteseshá de
a ver profundamente codificada após a morte de Mao Tse-tung.
Os seus exageros,que custaram caro a Pequim, como os casos
do Chile e de Angola, serão talvez aballdonados. A intensidade da
confrontação com Moscovo pode também variar.
Manter-se-á essencialmente diplomacia do Estado, orientada para
a formação de blocos contra o«hegemonismol>-- e em primeiro lu-

190
2 A GRANDE VIRAGEM À DIREITA

C. ROSSI

A política externa chinesa conheceu, desde o fim da guerra da


Coreia, três etapas distintas:
Durante os .anos50 uma estratégia de«coexistência pacífica»
e apoio aos regimes burgueses pretendidos progressistas do -terceiro
mundo, de que a conferência de Bandung(com Nasser, Nehru,
Soekarno,Chu En-lai) é exemplo bem conhecido:esta estratégia
não se distinguesubstancialmenteda da URSS.Na conferênciade
Genebra sobre -a Indochina (1954) os dois Estados <<socialistas»
desempenham um papel<Kmoderador>>junto das revolucionários
vietnamitas. Segundo o <<Times>>
de 25/7/1954, «memlxos da dele-
gaçãodo Vier.minh declararam abertamente que a pressão de Chu-
En-lai e de Molotov forçou o seu país a aceitar menos do que ele
teria podido obter aqui». (Ver: Jean Lacouture e Ph. Devillers,
<<DaGuerra Francesa à Guerra Americana», Ed. du Seuil, pág. 334.)
-- No decursodos anos60 a polémica sinc»soviéticae a Revolução
Cultu;ralvão provocaruma significativaviragemà esquerda.Sem
abandonar o apoio a regimes ditas«nacional.democráticos» do Ter-
ceiro Mundo -- com os resultadoscatastróficosque se conhecemna
Indonésiaem 1965--, a China vai criticar as capitulaçõesda URSS
faceao imperialismo americanoe vai apoiarpolitica e materialmente
vários movimentos revolucionários ou anta-imperialistas no mundo.
Apesar de certos aspectosnegativos -- a recusa de uma frente única

19j
13
com a URSSem apoio à luta dos vietnamitas (ver a crítica de Che lado, estapolítica vibrou um grave golpe a grandenúmero de mc-
na carta à Tricontínental em 1967)-- esta política terá resultados vimentos revolucionários armados, apoiados materialmente pela
favoráveis à escalainternacional: ruptura do monolitismo estalinista, China nos anos'60, que foram militarmente enhaquecidosou obri-
clima mais receptivo às críticas de esquerda à política oportunista gadosa procurar fontes de abastecimentoexclusivamente da parte
da URSS, estimulando a emergênciade novas vanguardasrevolu- da URSS, com todas as consequências negativas duma tal dependên-
cionárias. Este curso de esquerdada política externa chinesavai atin- cia unilateral(Camarões, Eritreia, Dhofar, Angola, etc.).
gir o seu ponto culminante durante a RevoluçãoCultural. Segundo Examinemos, continente por continente, os factos e os malefícios
Kostas Mavrakis (antitrotskista profissional e apologista <<pró-chi- da política externa chinesa.
nês>>),naquele momeJato<<ogrupo esquerdista 516, que se tinha apo-
derado da direcçãodo Ministério dos Negócios Estrangeiros,tinha
inutilmente degradado as relações com certos países asiáticos. . . O Mi- 1. Ária
nistério, dirigido pelos esquerdistas, teria por outro lado lançado
um ultimato à Grã-Bretanha acerca da repressão em Hong-Kong>>, O primeiro sintoma evidente da nova linha chinesafoi a crise
(K. Mavrakis: A Política Internacional da China, em <<Tel-Quel». do Paquistãoem 1971. Faceà revolta do povo bengala,oprimido pelo
n.' 50. Verão 1972 pág. 63). É -tambémna épocada Revolução Cul- regime militar reaccionário e pro-imperialista do Paquistão(o general
tural que a Chinaapoiaráo movimentode Mlaioem 1968em Valia Khan) , a China vâi apoiar sem hesitação o governo paquis'ga-
Fiança, etc... nês. Enquanto as tropas governamentais executavam massacns e acti-
Após um período transitório de um ou dois anos inicia-se vidades inauditas contra os camponeses, os operários e os estudantes
cerca de 1971 «a grande viragem à direita>> cujo conteúdo e signi- revoltados, em Chittagong, em Dacca e por todo o Bengala, Ceou
ficado vamos examinar detalhadamente.Esta coincide evidentemente En-lai enviava uma mensagemao ditador Yahia Khan(publicada
com alteraçõesinternas: a eliminaçãoda«esqueJ:da»do bureau polí- no <KPakistan Times>> de 13 de Março de 1971) que declarava:
tico do Partido ComunistaChinês (PCC); primeiro a destituição de «VossaExcelênciae os dirigentes das diferentes regiõesdo Paquis-
Chen Po-ta, presidentedo Grupo Central da RevoluçãoCultural tão têm levado a cabo um importante e útil -trabalhopara preservar
(acusado agora de ter sido desde sempre um <<elementodo Kuomin- a unidade do Paquistão e impedir a evolução para u'ma secessão.»
tang anticomunista,um agentedo inimigo») e seguidamente
a de Na guerra interburguesa indo-paquistanesaque se seguiu, ver-
Lin-Pião, que provavelmente pretendia continuar a orientação do -se-áa burocracia soviética a apoiar o governo indiano e a burocra-
período de 1966-1969, ou seja, a luta contra o imperialismo ameri- cia chinesa a apoiar o regime paquistanês.Esta será a primeira vez,
cano como inimigo principal. depoisda vitória da Revoluçãochinesade 1949,que a suapolítica
Esta viragem tem consequências colossais à escala internacional. externa coincide com a dos Estados Unidos. Com efeito, Nixon
Facilita consideravelmente o jogo do imperialismo americano, que apoia também o Paquistão (membro do pacto anticomunista CENTO)
manobra habilmente no quadro d-a nova «diplomacia triangular». e envia um destacamentoda 7.' esquadraao golfo de Bengalapara
Na realidade,toda a relaçãode forçasa nível internacionalé par- intimidar a índia e a URSS.
cialmente subvertida pela nova política chinesa, sem a qual, por exem- É interessante acrescentar que, numa dedaração posterior aos
plo, seria difícil imaginar as insolentes ameaçasactuais do imperia- acontecimentos,o novo presidente paquistanês, o <<amigoda China>>
lismo americano eln relação à revolução indo-chinesa. Por outro Bhutto, vai lastimar-seamargamente
da insuficiênciada intervenção
americanacontra a <<ameaça
comunista>>
ao Paquistão: «Os países naike e o seu exército, com helicópteros, aviões, munições, arma-
mentos e dinheiro, os governos dos EUA, da URSS, da índia, do Pa-
membros do CENTO e da OTASE deixaram-se adormecer enquanto
o nosso país era desmembradapela violência... Não intervieram, a quistão, da Jugosláviae... da China (cf. Fred Halliday, A Insurrei-
despeito dos tratados que previam uma tal intervenção em caso de ção Ceilanesa,«Les temps Modernes» n.' 306, Jan. 72. Ver igual-
agressãocomunistn>.(Le Mande 27/1/72). É claro que estaposição mente o artigo de G. Fontaine: «Wijeweera condenado a prisão per-
do Governo da China Popular não tinha estritamente nada a ver com pétuas»(INPREGOR n.' 18, 31 de Jan. 75). Em fins de Abril de
os interesses das massaspopulares do Bengala do Paquistão, da índia 1971, a China popular concedeu ao governo cingalês um emprés-
timo semjuro de 25 milhões de dólares. Para bem explicar o signi-
ou da China, nem com a luta contra a reacção e o imperialismo.
A única e exclusiva motivação foi <co interesse de Estado>> chinês, ficado político deste gesto, Chu En-lai enviou à senhora Bandaranaike
a saber, a aliança da burocracia de Pequim com o Paquistão contra uma carta declarando: «agrada-nosconstatar que, graças aos esforços
a índia, decorrendo
dos conflitosfronteiriçossino-indianos
dos de V. Excelência e do governo cingalês, a situação caótica criada por
anos 60. O facto --invocado pelos epígonos maoístas na Europa um punhadode indivíduosque se intitulam <«Guevaristas»
e em
de qu-e a direcção do Movimento Nacional Bengalaera burguesa cujas fileiras se infiltravam espiões estrangeiros, foi dominada. (. . .).
No interesseda amizadeentre a China e o Ceilão e tomando em con-
(Mujibur Rahman) não justifica absolutamenteem nada a política
chinesa. A tarefa do Estado chinês deveria ter sido a de .ajudar os sideração as necessidades do governo cingalês, o governo chinês
revo[ucionários benga[is a pór-ie à cúóeça do ]üopime#/o de ],ióer- aceita fazer um empréstimo sem juros, a longo prazo, de 50 milhões
/anãomacio a/ que era a expressãoprofunda e legítima das massas de rupias, em divisas estrangeiras convertíveis (.. .) Quanto a qual-
populares do Bangla-desh; deste modo teria sido possível arrancar quer outra ajuda material, queiram fazer-nos saber sedela têm neces-
a luta de libertação bengali à influência da burguesia hindú. sidade», (publicado no «Ceylan Daily News» de 27 de Maio de 1971,
O caso do Ceilão, igualmente em 1971, foi ainda mais grave e tradução francesa em «Tempo Modemes>>de Jan. 72 pp. 1024-25).
Com este gesto um novo passo estava dado na viragem da polí-
revelador do que o do Bengala.:Em Abril de 1971, em réplica a uma
\Xcadúnesa. pela primeira uez desde o estabelecimento da República
provocação policial, a organizaçãoda juventude revolucionária, JVP,
solidamente implantada no campesinato, vai defender-se em nome Popular da China esta apoiada activamente um governo burguês na
do socialismo contra o governo burguês da Senhora Bandaranaike repressão dam mouinzento teuolucianário .
(governo no qual participam igualmente o PC pro-soviético e os rene- É interessante estudar as <<justificações» a-presentadaspelos escri-
gadosdo trotskismo da LSSP). A repressãoserá brutal, com mas- bas pró-chineses a propósito deste espantoso acontecimento. Segundo
sacres e execuções sumárias (oito mil segundo René Dumont) e K. Mavrakis, a JVP era uma organização «blanquísta e aventurei-
14 000 prisões. O tenente-coronel cingalês Gyril Ranatunga, for- rista» que não .mereciao apoio da China. «Não é por acasoque ela
mado pela academiamatar britânica de Sandhurst, justificou a morte se reclamavade Guevara». (K. Mavrakis, A Política Internacional
dos prisioneiros com o argumento seguinte: «Tirámos demasiadasli- da China,«TEL QUEL», Verão/72 p. 72). Infelizmenteisso não
ções do Vietname e da Malária. Devemos destrua-los completamen-te>> explica o motivo pelo qual a RP da China não somentese absteve
(Internacional Herald Tribune de 20/4/71). de apoiar a .IVP mas apoiou activamente o governo burguês no seu
Eln torno do governo burguês de Ceilão, na sua guerra de ex- esforço para esmagara rebelião. Segundo a <<lógica>>
de Mavrakis,
termínio contra os jovens revolucionários, constituiu-se uma <<Santa a RP da China teria podido assimapoiar também o governo de Bar-
Aliança» Internacional sem precedentes. Apoiaram a Sr.' Balldara- rientos em 1976 contra o <<aventuleiro guevarista>> Ernesto Che

196 ]97
Guevara. É necessário levar a crédito de Mavralds que, apesar 11/4/73). É inútil acrescentar que esta manobra chinesa, como o
da sua boa vontade em engolir qualquer patrallha de origem chi- sublinha o correspondente do «Le Monde» em Tóquio, «desconser-
nesa, não pode deixar de esboçarum pequeno gesto de repug- tou seriamente» a oposição de esquerda japonesa que se preparava
nância perante a carta de Chu En-lai(da qual não contesta a auten- para lançar uma dura ofensiva contra o tratado de segurança.Inútil
ticidade) : <<Emboraesta mensagem seja justa quanto ao fundo, po- acrescentar
tambémque o imperialismodos EUA, para o qual
demos interrogar-nos sobre a sua oportunidade, dada a exploração o tratado com o Japãoasseguraas principais basesdo seu dispositivo
que dela foi feita.» (lófcZ. p. 73). militar, aéreo e naval no Pacífico, aprecia imenso este apoio ines-
No plano do servilismo incondicional Mavrakis foi batido por perado...
André Pommier, da revista estahno-maoísta <<Communisme»,que O casotailandês é mais grave, na medida em que toca de perto
apresenta,entre outros, o seguinteargumento: <<Apósa insurreição, os problemas da revolução indochinesa. O ministro dos Negócios
um bando de corvosabateu-sesobrea ilha, à cabeçado qual se en- Estrangeiros da República Democrática do Vietname denuncia, num
contravam os russos, ávidos de influência e de bases no Oceano índico. telegrama de Bangkok, a presença americana na Tailândia, e nomea-
Era crucial para todos os povos desta região proceder de modo a im- damente a utilização de bases para o abastecimento dos exércitos de
pedir que eles aí se encrustassem.Se a China mantém boas relações Saigãoe Phnom Pena, e o abastecimentodos mercenáriosestrangei-
com o governo de Bandaranaike é porque isso preserva a neutra- ros no Lhos. Ora, em Janeiro de 1975, Chu En-lai, recebendoo gene-
lidade da ilha, tão cobiçada.»(A. Pommier,A Política Externa da ral Choonhavan,ministro dos Negócios Estrangeiros tailandês,
China, «Communisme>>n.' 2 Jan.-Fev. 1973 p. 92). declara-lhe que a China desejava que os EUA mantivessem efectivos
O interesse desta tese é que ela corresponde provavelmente à militares na Tailândia... pois a Rússia poderia intensificar as suas
verdade. Um dos motivos da intervenção chinesa foi o de contrariar actividades no Oceano índico!(declaração, não desmentida, do
à influência soviéticae de impedi.]a de se«encrustar». Tornando-se porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros tailandês, «Le
ela própria corvo, arrancaaos rapinantes,vindos do Kremlin, o mo- Monde» de 16/1/75 ) . Aliás, o Centro Nacional de Es'tudantesda Tai-
nopólio da carcaça.. . Isto é importante e tornar-se-á a partir de 1971 lândia protestou contra<<o apoio chinês à continuaçãoda presença
um dos eixos centraisda política chinesa:tentar, em todo o lado e mili-tar dos EUA na Tailândia, sob o pretexto de conter a expansão
por qualquer preço, contrariar a influência soviética. Este raciocínio militar russa na região». (Cf. «Voice of the Nation», Bangkok,
vai empurrarinevitavelmente
a diplomacia
da RP da CURApara lO/1/1975). Seria extremamente difícil mostrar uma maior indi-
uma orientação cada vez mais abertamentepro-americana,de que ferença pela revolução indochinesa,cujos interessesvitais são assim
os exemplos mais significativos na Ásia são o Japão, a Tailândia e sacrificados no altar das obcessões anta-soviéticas da diplomacia
o Irão. chinesa.
No decurso de conversações com o sr. Takeo Kimura, personagem A<<concidência» com a política americana é igualmente impres-
importante do partido governamental conservador do Japão, e se- sionante em relação ao Irão. O regime do Xá é uma das ditaduras
guidamente com o sr. Nakasone, ministro japonês da Indúsuia, Chu mais bárbaras do mundo. A sua polícia política, a Savak, organizada
En-lai insistiu no facto de que, na situação actual, a manutenção da e treinada por especialistas americanos, prende e tortura sistemati-
tratado de segurançanipo-americanoera«inevitável» para o Japão. camente os oposicionistas. Existem milhares de prisioneiros políticos,
Declarou igualmente que a protecção atómica americanaera neces- dos quais mais de 200 foram fuzilados por ordem do Xá. (Sobreas
sária ao Japão, não contra a Colina, mas contra a URSS. («Le Monde>> torturas atrozesdos militantes e militantes revolucionários,ver a
obra: «Petróleo e Violência, Terror Branco e Resistência no Irão»>. locutores que Pequim aprovava a participação do Irão no pacto im-
ed. Anthropos, 1974). A sua política exterior é a dum policia do perialista CENTO. («Le Monde» 7/10/73).
imperialismo que se encarregade manter a ordem na região do Golfo. É a esta luz que é necessárioler uma pequenanotícia, bastante
O Xá proclama-o de resto muito explícita e orgulhosamente. incrível, publicada no«Pekin Information>> sob o título: Irão, um
Por exemplo, numa entrevista à revista «Newsweek»de 1973, Sua tema inquietante: a Influência Soviética no Médio Oriente. Eis
Majestade Imperial declarava:<<A Europa ocidental, os EUA e o algumas passagens desse texto; «durante a sua visita aos EUA, o
lapão consideram o Golfo Pérsico como fazendo parte integrante Xá do Irão confirmou em 25 de Julho último, numa conferênciade
da sua segurançasem contudo estarem à altura de asseguraressase- imprensa, que o Irão desejava ainda adquirir aos EUA caçasbom-
gurança. É o que nós fazemospor eles». Tem o mesmo som a entre- bardeirospara fazer face aos novos modelos de Mig soviéticos..
vista do pi:imeiro-miústro do Irão dada a Eric Rouleau:«Esta rota O Xá declarou na conferência de imprensa que o Irão estavapronto
marítima é muito importante para vós, os ocidentais... No vossoe a ir em auxílio dos paísesdo Golfo Pérsico, bem como do Paquis-
no nosso interesse, oferecemos aos nossos vizinhos o nosso apoio tão, se eles fossem atacados. Na véspera, na cerimónia de boas-vindas
no caso de desejarem reprimir os movimentos subversivos teleguia- efectuada pelo presidente Nixon na Casa Branca, o Xá do Irão disse,
dos do esuangeiro. A seu pedido, o sultanato de Oman beneficia na suas resposta, que o seu país estava determinado a tornar-se
largamente da nossaajuda militar para reprimir a rebelião do Dhofar». o guardião da paz e do equihbrio na vasta região situada entre o Mé-
(«Le Monde», 7/10/73). dio Oriente e o Sul Asiático. Sublinhou que o Irão desejavapreservar
a sua independênciae a sua soberania». («Pekin Information»,
Na reaHdade,a política de <<guardião
e protector» do Golfo Pér-
n.' 31, 6/8/73, p. 20).
sico, que se arroga o Xá, insere-sena nova estratégiade Kissinger
Maravilhas da<<diplomacia triangular»: a China e os EUA apoiam
dos <<sub-imperialismos>>
enquanto escalasregionais do imperialismo
americano:O Irão no Próximo Oriente, o Brasil na América La- amboso papelde<Kgualdãoda paz e do equjHbrio>>
do Xá e a sua
luta contra a«influência soviética». Inútil sublinhar o significado
tina, etc. . . Esses factos são bem conhecidos, mas é necessário reme-
concretodeste papel«pacificador»: o envio de milhares de solda-
mora-los brevementepara os confrontar com a política chinesa.
dos iranianos, tanques e aviões (comprados aos EUA) para defender
A partir de 1971 começa uma espectacular aproximação sino-
o sultão de Oman contra a guerrilha vermelha de Dhofar.
iraniana. Em Agosto de 1971 é publicado um comunicado conjunto É importante constatar que não se trata, da parte da burocracia
que declara:«o Governo da RP da China apoia firmemente a justa dlinesa, de simples declarações protocolares, para uso exclusivamente
luta do governo imperial do Irão pela salvaguardada sua indepen- diplomático. Es/a z;/regemfem co iegz/é cfai práticas extremamente
dência nacional, da sua soberania e da protecção dos seus recursos cancxetas: o corte do apoio militar e material à Frente de Libertação
nacionais>> («Le Monde», 2/12/71). Durante um banquete em de Oma#. SegundoEric Rouleau, o ministro chinês dos Negócios
Téhérão, em 16 de Junho de 1973, o senhor Chi Pena-fei, ministro Estrangeiros, senhor Chi Pena-fei, teria declarado durante a sua
chinês dos Negócios Estrangeiros, fez d elogio da«política de inde- estadia em Téhérão em 1973 que a CI)ina não mais alimenta a re-
pendência» do soberano, considerando <<necessárioe compreensível» volta de Dhofar. («Le Monde» 7/10/73). O que é aliás confirmado
o reforço do potencial miHtar iraniano destinado,segundodeclarou, por uma entrevista do próprio Xá, que proclamava com satisfação
a combater a «subversão» e o «expansionismo» das superpotências. que a China cessou<<inteiramente»
de ajudar a Frente de Libertação
Em privado, o Senhor Chi Peng-fei teria asseguradoaos seusinter- (entrevista com A. Fontaine, «Le Monde>>25/6/74).

200 20]
Serão económicos os motivos desta política oportunista e con- loções camaronesasno Camarão, etc. . . Finalmente, apoiou em Angola
tra-revolucionária da burocracia chinesa em relação ao Irão? Tratas- o movimento anticapitalista mais progressista, o MPLA (Movimento
se-á de absorver os fabulosos biliões de petro-dólares do Xá? Popular de Libertação de Argola).
Em Novembro de 1974 uma delegação económica chinesa con- Os anos70 vão trazer uma mudançaradical.Ao nível dos go-
duzida por Li Chiang,ministro do ComércioExterno, visitou efec- vernos. a burocracia chinesa não vai abandonar a sua clientela habi-
tivamente o Irão para negociarinvestimentosiranianos na indústria tual. Mas «alarga>>
consideravelmente o seu leque. É a reconciliação
petrolífera e petroquímica chinesa («Le Monde» 3/12/74). Dito surpreendente com Mobutu, o assassino de Lumumba e Mulele, o
isto, parece-nosque não é a este nível <<materialistavulgar» que se homem chave do imperialismo norte-americano em África. Num dis-
situa a motivação principal da política da burocracia chinesa.Volta- cursode boas-vindas
por ocasiãoda visita de Mobutu a Pequim,
remos a isso. Teng Hsiao-ping saúdaa contribuição do presidente do Zaire <<àluta
É neste quadro de conjunto que se insere a visita de Nixon à unida do terceiro mundo contra o hegemonismo»e a sua coragem
China (Fevereiro de 1972), manifestaçãoespectacularde uma apro- em «desafiar o despotismo das superpotências». («Pekin Infor-
ximação que, na realidade, era já visível desde 1971. É difícil ava- mation>> n.' 51, 23/12/74).
liar exactamente as consequênciaspolíticas desta operação,mas é Quanto a Ahidjo, instrumento fiel do neocolonialismo francês,
evidente que contribuiu para a vitória eleitoral de Nixon em 1972. assassino de Ouandié e de mihares de revolucionários camaroneses,
Restam ainda, na política chinesa da Ásia, alguns elementos da também foi triunfalmente recebido em Pequim pelo Presidente Mao
antiga orientação anta-imperialista radical: o Cambodja e a Coxeia e por Chu En-lai, que declarou:<<o governo e o povo chinêses sentem
principalmente. A ajuda chinesa ao FUNK foi sem dúvida uma con- admiração pelo sucessoobtido pelo governo camaronêsem matéria
tribuição decisiva para a luta dos revoluconáriosKhmers, que não de política tanto interna como ex'terna...»(«Pekin Information»,
deve ser subestimada.Todavia, tem-se o direito de perguntar, com n.' 13, de 2/4/73). Enfim, ainda em 1971, Mao recebiao Imperador
inquietação, se estes aspectos progressistas da política da China serão baile Selassié,essedespota feudal duma era já passada.O «Renmin
no futuro suprimidos pelo desenvolvimento acelerado da<<grande Ribau>>saúda a contribuição de Sua Majestade <<paraa promoção da
viragem à direita». Deic7e/á, pode-sedizer que o apoio chinêsà pre- causada unidade anta-imperialistada África e da Ásia»(«Pekin
sençaamericana na Tailândia tem consequências/or/eme /e mega/iz/i Information», n.' 42, 10/10/71). Como se o Imperador da Etiópia
para a luta revolucionáriano Cambodja,na medidaem que as bases não fosse precisamenteum dos mais segurosaliados do imperialismo
americanasna Tailândia são z/ ?adas pr/ ciPais Piasde aó ifec// e /o americanoem África.. . Mais uma vez, não se trata nestes três casos
do exército fantoche de Lota No1. de vãs palavras e de vénias diplomáticas. Todo o apoio político, ma-
terial e militar à UPC do Camarãoe à Frente de Libertação da Eri-
treia foi cortado pela China a partir de 1971 (sobre o fim do apoio
2. África aos combatentes da Eritreia, cf. <<LeMonde», 23/6/72).
Mas é o caso do Sudão em 1971 o mais revelador da viragem
Durante os anos 60, a China Popular apoiou em África regimes chinesa na África. Relembremos rapidamente os acontecimentos.
<<nacionalistasde esquerda», como o da Tanzânia, da Somália, etc. Em Julho de 1971 houve uma tentativa de golpe da ala esquerda
Ajudou também movimentos de guerrilha contra regimes fantoches do exército, apoiada pelo PC sudanês (um dos mais fortes na África).
pro-imperialistas: Movimento de Mulele no Congo, a União das popu- O general reaccionárioNemeiry conseguiu(com a ajuda do Egipto

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de Sadat) esinagai a rebelião . Centenas de comunistas são presos veitou-se da sua vitória para alargar a repressão às massas». A con-
e massacrados.Os principais dirigentes do PC, entre os quais o seu clusãoque se impõe com uma evidênciacartesianaé pois a seguinte;
secretário-geralMahjoup e o secretário-geralda CGT sudanesaShafei os chineses«preferem claramente>> um regime sanguinário que re-
El-Sheikh, serão enforcados, num clima de terror branco e de caça prime as massas,sab a única condição de que se oponha ao«social-
js 'bruxas.
-imperialismo»,quer dizer, à URSS. Seria impossível fazer mais ex-
Ora, a burocraciachinesavai apoiar incondicionalmenteo regime plicitamente abstracção dos interesses das massas e do critério de
de Nemeiry, denunciandoa tentativa falhadade Julho como uma classe numa política que se pretende «marxista» e <<leninista»...
manobra da URSS <<porintermédio dos seus agentes no Sudão».
O exemplo mais recente de«convergência objectiva» sino-ameri-
(<cLeMonde», 25/12/73). Quando da suavisita à China em Dezem-
cana em Á11rica,é Angala. O futuro da ex-colónia portuguesa está a
bro de 1971, o general Hassan Abbas, vice-presidente do regime decidir-seneste próprio momento. O menosque se pode dizer é que
militar sudanês, agradeceu calorosamente ao governo chinês o «seu a China colaborara muita eficazmente na montagem duma solução
apoio económico e militar». («Le Monde», 20/12/71). A firmeza pró-americana.Depois de ter apoiado, juntamente com a URSS, a
anticomunistade Nemeiry viu-se rapidamenterecompensada. No ala esquerda do nacionalismo Angolano, o MPLA, durante os anos 60,
decurso do ano de 1971, os EUA abriram ao governo sudanêsum a China mudou de posição progressivamentecomeçandopor apoiar
crédito de 18 milhões de dólares, a Inglaterra um crédito de 25 mi- a Unita de Jonas Savimbi e em seguida aJl?NLA de Holden Raberto.
lhões de dólares, o Fundo Monetário Internacional(controlado pelos Ora, Holden, amigo íntimo de Mobutu, está, desde o princípio dos
EUA) um crédito de 40 milhões de dólarese... a China Popular um anos 60, em relação estreita com o imperialismo americano. Des-
crédito de 80 milhõesde dólares.(«Le Monde», 18/2/72). cobriu-se a presença a seu lado de«conselheiros americanos», in-
Na realidade, Mahjoub estava longe de ser um <<agentede Mos- cluindo oficiais que serviram no Vietname do Sul. Aliás, numa decla-
covo». Várias vezes tinha mosuado a sua independência(relativa) raçãoa um jornalistafrancêsem 1970, denunciava
o MPLA como
em relação à direcção burocrática soviética, recusando dissolver o PC
«camunista>>e la-sentava que «os países ocidentais» tivessem «caído
sudanês(segundo o modelo egípcio defendido pelo Kremlin), cri- na armadilha deste movimento». (Cf. Basal Davidson, <<Angola no
ticandoa ajudaeconómica
da URSSao regimereaccionário
de centro das Tempestades>>
Maspero, 1972, pp. 222-236).
Abboud,etc.(Ver a esterespeitoHenri Rouleau,<KSudão,
os coro- Em Dezembro de 1973, Holden Roberto é convidado a ir à
néis sem os camaradas», «Le Monde», 18/2/72 e «Zur Lage in Sau-
China. Quando regressa a Kinshasa, declara que«tinha sido estabe-
dan», Rate Presse Korrespondenz, 1971, 5 Jg, P. 8/10) . Para a polí-
ledda uma convenção de cooperação entre as au'taddades chinesas e
tica chinesa isto era um aspecto <<secundário».Face ao «perigo sovié- a FNLA («Le Monde»,26/12/73). Em fins de 1974,duzentosins-
tico>>ela vai ligar-se aos carrascosdo comunismo sudanês.
trutores chineseschegam ao Zaire para treinar o exército de reserva
É muito esclarecedor examinar as embaraçadas justificações dos da FNLA, estabelecidoem território do Zaire, contribuindoassim
ideólogos maoístas europeus sobre este sinistro episódio. Para Kostas
para reforçar este movimentopro-imperialistae contrariandoa
Mavrakis«a vitória dos golpistasteria significado simplesmenteque <<influência soviéticm>, pretensamente incarnada pelo MPLA. Se An-
o Sudão cairia sob a influência do social-imperialismo. Os chineses
gola se tornar uma semicolónia do imperialismo norte-americano
preferiram manifestamentea fracçãodo exérdto que queria salva-
que está avidamente interessado nas fabulosas riquezas minerais
guardar a independênciado país». (Mavrakis, op. citada p. 71). Ao do país Kinssinger poderá agradecerao timoneiro Mao a preciosa
mesmo tempo, Mavrakis é obrigado a reconhecer que «Nemery apro- ajuda prestada numa situação difícil. ..
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3. AméricaLatina Governo. Aliás, a embaixada chinesa, fechou as suas portas em San-
tiago, e recusouem geral acolher militantes perseguidosque pro-
Nas preocupações político-diplomáticas de Pequim, a América curavam asilo.
Latina pesa menos do que a África ou a Ásia. Mas a tendência fun- Mas há melhor. Em Outubro de 1973 algumassemanasdepois
damental é a mesma. Eis, por exemplo, o que aparece em entreli1lha do golpe de Estado multar e da bárbara repressãoque se abateu so-
no «Pekin Information>> em 1973: «agênciasde informação ociden- bre o povo chileno, o Comité Executivo da UNESCO adoptou por
tais, citando a 5 de Setembrorevelaçõesfeitas por um porta-voz do unanimidade uma resolução exprimindo a sua profunda inquietação
departamento da Defesa norte-americana,relataram que uma esqua- sobre os acontecimentos do Chile. Dois países se abstiveram de votar
dra soviética composta por um«destroyer». um cruzados, um sub- estar resolução:os EUA e... a China. («Le Monde», 16/10/73).
marino nuclear e um barco de abastecimen-ta,
iniciou manobrasno É de referir, por outro lado, que o l.' comentário publicado na im-
mar das Caraíbas... A presençano hemisfério ocidental de forças prensa chinesa depois do golpe de Estado, fala de <Kforçasreaccioná-
aéreas e navais soviéticas portadoras de armas nucleares, bem como rias do interior como do exterior», mas abatem-se
de mencionaro
a utilização de basesmilitares nessaregião, constituem UH2 ameaça papel do imperialismo dos EUA no assunto. É apenasem Janeiro
para a paz e a segurançana América Latina». («Pekin Informa- de 1974 que o «Diário do Povo», rompendo um silêncio de vários
tion, 24/9/1973). É lamentávelconstatarque este texto, com o mesessobre o Chile, revelou aos seusleitores a«ingerência do impe-
comentário final, parecedirectamenteextraído de uma brochura de rialismo>>
no denube de Allende. Contudo, o artigo sublinha ime-
propaganda dos Serviços de Informação dos Estados Unidos: a diatamente que o imperialismo norte-americano perde rapidamente
<<ameaça
soviética» contra a América Latina, etc. Quais são as bases terreno na América Latina e que o principal perigo vem desdeagora
militares da região em questão? Trata-se de uma referência transpa- da URSSI («Le Monde», 21/1/74).
rente a Cuba. Estará a China Popular pronta a apoiar o imperia-
lismo norte-americano contra Cuba, essebastião de influência «social.
-imperialista» russa no hemisfério ocidental? 4. Europa
A ambiguidade da política externa de Pequim na América Latina
manifestou-se espectacularmente na altura do derrube de AJlende A partir de 1971, a China começaa desenvolvero tema da Eu-
no Chile. Ao mesmo tempo que denunciava o golpe de Pinochet, ropa (capitalista) unida e oposta às «superpotências». Todavia,
(carta de Chu En-lai à senhoraAllende,etc.), a Chinafoi, com a assiste-se
cada vez mais a um deslize para a doutrina duma Ez/rapa
3.omêúa, o único Estado operário a não romper as relaçõesdiplomá- atlida, associada aas EUA contra o «social-imperialismo russo».
fjcas com o #oz'o regime. As autoridades chinesas despediram fria- Desde 1972, os dirigentes chineses aconselhamdiscretamente os seus
mente o embaixador de Acende na China,<<no seguimento de uma interlocutores europeus a manterem as tropas americanasno con-
nota recebida do ]lovo governo restituindo-o das suas funções». tinente. <<PekinInformation>> publica sem comentário as declarações
(«Le Monde>>, 12/10/73). Acrescentemos que a China não tem por <<atlantistas>>
dum lorde reaccionárioinglês; «Lorde Chalfont criti-
princípio manter relaçõesdiplomáticascom todos os países,sem cou a ideia segundo a qual toda a ameaça militar teria desaparecido
ter em conta os seus governos. Por exemplo, não tem relações diplo- da Europa ocidental, e que, por consequência,todas as tropas ame-
máticas com Portugal: antes de 1974, devido à sua política colonia- ricanas poderiam ser repatriadas e a NATO dissolvida. . .» («Pekin
lista, e actualmente, segundo parece, devido à presença do PCP no Information», 6/8/73, p. 21).
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Paralelamente, Pequim desenvolve as suas ligações com certos É importante examinar também as «aplicações>> da orientação
regimes, digamos não muito democráticos, mas oferecendo garantias chinesapelos seusfiéis discípulos da Europa. Uma br(xhura recente
sérias quanto ao anta-sovietismo.Em Maio de 73, Makarezos. vice- do<<Hlumanité Rouge», a principal seita maoísta em Fiança, denuncia
-primeiro-ministro da Grécia dos coronéis fascistas, visita a China. a burguesiafrancesaporque esta tende para a capitulaçãoface à
Na ocasião do clássico banquete diplomático, o sr. Li Hlsien-nien. URSSI Eis alguns extratas des-tetexto memorável: <<Aburguesia
vice-primeiro-ministro chinês, felicitou-se por esta visita que tinha imperialista não resistirá até ao fim. Por várias vezesjá, não reagiu
«aumentado a nossa compreensão mútua (!) e a nossa amizade (1)». quando das incursões dos submarinos soviéticos nas águas territo-
(«Le Monde», 25/5/73). Onde se encontra o terreno comum para tariais (aindahá um mêsem Brest)... Com foda cer/eza,Bá #ma
esta «compreensão>>e«amizade»? Segundo Alain Bouc, o correspon-
tettdência para o compromisso em relação ao social-imperialismo, na
dente sinófilo do«Le Monde» em Pequim, é evidente que a Gré- Z'#rgz/ef! imporia/is/ú /ramcesa.. .» (Vigilância contra o Perigo Social-
cia ocupa uma posiçãoestratégiasemigual para observar,mesmo
-Imperialista Soviético na Europa, «Humanité Rouge», p. 27, subli-
para controlar a expansão marítima soviética no Mediterrâneo».
nhado no original). A mesma brochura denuncia também a agitação
Será pela mesma razão«estratégica>>que a China tem relações dplo- no seiodo exércitofrancêsdos«revisionistasmodernose dosseus
máticas com a Espanta franquista? Seja como for, o«Diário do
lacaios tratskistas,que utilizam o movimento dos recrutas... para
Povo». publica nessa ocasião, ll de Março de 1973, um relance his-
tórica sobre a Espanhaem que«esquece»de mencionaro carácter expandir as ilusões sobre o desanuviamento, para empurrar o nosso
país para a submissãoface ao social-imperialismosoviético».(IZ'jd.
fascista do regime e mesmo a guerra civil de 1936-391 As relações
p. 29). Ver igualmentea brochura intitulada <<OSocial-Imperialismo,
entre Pequim e Madrid são tão cordiais que, quando da execução
de Carrero Branco por revolucionários bascos, o sr.(]ú Peng-fei, perigo principal na Europa», <<lliumanitéRouge», 1974, p. 19:
ministro dos Negócios Estrangeiros, dirigiu-se à embaixada espanhola <<Osdirigentes trotskistas propagam perigosasideias pacifistas nomea-
em Pequim para«exprimir a sua simpatia» às autoridadesfran- damente quando encorajam a objecção de consciência e outras posi-
quistas!(«Le Monde»,24/12/73). ções antimilitaristas, aparentemente justificadas pela luta contra o
O episódio mais recente desta«linha europeia» de Pequim foi exército burguês, para enganar os jovens intelectuais». Acrescente-
o convite para ir à China -- depois do sr. Heath, chefe dos conser- mos, a título de comentário, que este delirante grupúsculoestalíno-
vadores britânicos -- ao sr. Strauss, campeão da guerra fria, nacic- -maoístagoza de um total apoio político da parte da China Popular,
nalista alemão ferrenho, furioso anticomunista, partidário da linha como mostram os artigos do«Humanité Rouge>>regularmente publi-
dura contra os operários grevistas e estudantes contestatários. Rece- cadosem <<Pekin
Iníormation» (o último em 13/1/75).
bido com todas as Lonas por Mao e Chu En-lai, o sr. Straussouviu
com prazer os generaischinesesexplicarem-üe: a«segurmça da Eu- -- Qual é a lógica e significado da«grande viragem à direita>>?
ropa só pode ser assegurada pelo apoio militar dos EUA». («Le
Monde»,15/1/75). Comentáriode K. S. Karol, amigoum pouco No começo do processo podia-se crer que se tratava de uma vira-
decepcionadoda China:«só se pode admirar a despreocupaçãodos gem essencialmente diplomática, tendo por fim permitir o acesso da
chineses face às repercussões que têm, no seio do movimento operá- China à ONU. No entanto, a sequênciados acontecimentosmostrou
rio europeu, os seus abraços a Franz Joseph Strauss e aos seus seme- bem que o fenómeno tinha implicaçõesmuito mais profundas e sé-
lhantes.(«Nouvel Observateur»,lO/12/75) rias, indo muito além das exigênciasda diplomacia da ONU.

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14
A doutrina chinesa oficial que serve de justificação ideológica ao livro de Noam Chomski sobre os banhos de sanguemade in USA.
à sua política externa, é a dos <<trêsmundos»: as «superpotências» S6 se pode negar esta evidência situando-se num ponto de vista total-
(URSS e EUA), o <<campo socialista>> (China e Albânia) e as <<zonasin- mente diferente do do proletariado internacional. Este outro ponto
termédias>>(Europa e Terceiro Mundo); ou ainda, na nova versão de de vista é o da «razãode Estado>>
chinesatal como a burocraciade
Teng Hsiao-ping, o <<hegemonismo» (URSS e EUA), os países desen- Pequim a concebe. Para esta, a URSS é o inimigo principal do Estado
volvidos (Europa e Japão) e os países em vias de desenvolvimento da chinês,porque é Moscovo que ameaçaa China com uma intervenção
Ária, da África e da América Latina. No entanto, estadoutrina não cor- militar. É a partir deste .ponto de vista estreitamente nacionalista
responde rigorosamente à política chinesa real. A coerência da orien- que foi determinadauma política externa que tem pouco a ver com
tação internacional da China só pode ser explicada, na nossa opinião, a luta de classes no mundo.
por uma outra concepção,bipolar, onde existe,por um lado, o«social- A ameaçada burocracia soviética em relação à China Popular,
1! -imperialismo>>(URSS) como inimigo principal, e por outro lado, é real ou imaginária? Não há dúvida -quea política soviética em rela-
o resto do mundo (incluindoos EUA). SÓ-apartir destadualista ção à China nos anos 70 (e antes!) foi tão oportunista, direitista e
<<visãodo mundo>> cada vez mais abertamente expressa pelos diri- contra-revolucionária como a da direcção chinesa. A burocracia so-
genteschineses,é que se pode apreendera unidade da sua política viética apoiou incondicionalmentea burguesiahindu contra a CI)ina
na África, na Europaou na AméricaLatina. Popular.
«A URSSsocial-imperialista(ou 'social-fascista)
é o inimigo prin- Por ouço lado, fez aberturas em direcçãoà Formosa.Um artigo
cipal: esta fórmul:anão deixa de lembrar-nosdes-agradavelmente
o difundido no boletim da AgênciaNovosti (n.' 44 Outubro de 1973)
«terceiro período» do Comintern estalinista (1929-33). A social- sublinha com complacência«a estabilidade da situação económica e
.democracia,qualificada de social-fascista,era o inimigo principal, política de Taipan» e«o reforço consideráveldas posiçõesinter-
sendo os nazis e os fascistaspura e simplesmente considerados sem nacionais da ilha enquanto unidade independente»(«Le Monde»,
importância, pouco perigosos, ou «secundários». Os resultados ex- 2-3/12/73). Enfim, a URSS recusou-sedurante muito tempo a
traordinários disso conhecem-se:triunfo do hitlerismo na Alema- apoiar o PUNK no Cambodja por causa das simpatias pro-chinesas
manha, agressãonazi contra a URSS depois de Hitler ter-se apoderado de Shihanouk. Até agora, mantém uma embaixada junto do regime
de toda a indústria de guerra do continente europeu; a diferença re- apodrecido fantoche de Lon No1. Por outro lado, o Kremlin acumulou
side no facto de que a política estalinista do <<terceiro
período>>cor- tropas perto da fronteira chinesa e proferiu ameaçasbelicosas a res-
respondia a uma viragem<<burocrática de esquerda», enquanto que peito dos diferendo.sterritoriais entre os doi'spaíses.Há portanto um
a versão chinesados anos 70 se insere no quadro da«viragem à di- «núcleo racional» nos receios chineses, mas tudo parece indicar que
reita>> acelerada. tais receios são desmedidamente empolados pela burocracia maoísta.
Para quem é a URSSo «inimigo principal>>?Para o povo vietna- É improvável que a burocracia soviética se comprometa na aventura
mita? Para as massasdo Chile? Para os trabalhadoresde Portugal? suicida que constituiria uma guerra com a China.
A história dos últimos trinta anos mostrou que o imperialismo ame- No entanto, seja«o perigo soviético>>real ou não, serve de fun-
ricano é o adversário mais poderoso e mais bárbaro que o proleta- damento,de postuladobásicoda política externada Chinadesde
riado internacional teve de enfrentar desdea queda dos regimes fas- 1971. Esta subordinaçãototal dos interessesdo proletariado inter-
cistas, o responsáveldeste imenso <Carchipelbloodbath» (arquipé- nacional à «razãode Estado» dum país que se considera a <<pátriado
lago <cbanho
de sangue»)da qual J. P. Fayefala na suaintrodução Socialismo», não é um fenómeno novo. Foi desde sempre a essência

2]0 2]Í
da política estalinistada URSS.A orientaçãoda burocraciachinesa
e a da burocracia soviética de hoje derivam logicamente da doutrina
do «socialismo num só país». Nos dois casos, o «interesse nacional»
-- tal coma a burocracia o entende-- é o único critério da política
3 DO CHILE A PORTUGAL:
A POLÍTICA INTERNACIONAL DA CHINA
exteno:r.
r

Os militantes revolucionários sinceros dos países coloniais e LIVRO MAITAN


semicoloniais ou das metrópoles imperialist-as, que simpatizam com 20 de Setembrod.e1975
a «via chinesapara o socialismo>>
ou com o «pensamentode Mao
Tse-tung» criticando con-tudo a actual orientação externa da China,
devem levar as suas conclusões até ao fim. A revolução é um todo
indivisível. Não se pode ser marxista-leninista em relação às massas
chinesase oportunista ou contra revolucionário em relaçãoao pro-
letariado bengali, cingalês, sudanês,ou seja, internacional. É evi-
dente que a actual política estrangeirafoi decidida nas costas das As posições adoptadas pela China face à situação portuguesa,
massas chinesas. Coincide com o regresso em força dos elementos as declaraçõessobre Angola, o acolhimento reservado a uma dele-
«direitistas», eliminadosdurante a RevoluçãoCultural, sob a pressão gação do governo chileno, a apresentação das credenciais por parte
das Guardas Vemiehos: Tens Hsíao-pinge companhia. É a expres- do embaixadorLi Lien-pi às autoridadesda CEE vieram trazerde
são dos interessese concepçõesde uma camada burocrática, ainda novo, ao movimento operário e à extrema-esquerda,em particular,
menoscristalizada,como casa:a, do que a da URSS, mas cuja orien- o problema da política internacional da direcçãochinesa.A iminên-
tação escapaa todo o controle verdadeiramente democrático da parte cia da visita a Pequim de uma delegaçãobastanterepresentativade
dos trabalhadoreschineses.A RevoluçãoCultural mostrou a especi- industriais italianos e o receio de que dela resultassealgumadeda-
fidade da direcção chinesa em relação à burocracia soviética dege- raçãopouco agradável para os operários comprometidos na luta pelo
nerada. A burocracia externa dos anos 70 está em vias de mostrar renovamento de contratos, são provavelmente elementos suplemen-
os limites dessa especifidade. tares que levaram l,o//a Co f;##ú a abordar directamente esta ques-
tão na reunião de Setembro do seu comité nacional.
A posiçãodefinida num relatório publicado pelo diário l.of/ã
Co f/ zlú de 18 de Setembro, caracteriza-sepor um lado, pela cons-
tataçãode certos dadosde facto e pela lembrançade que a organi-
zação-sedissocioupor várias vezes das posiçõesmais difíceis de
digerir e, por outro lado, por uma tentativa de interpretaçãoe justi-
ficaçãoque lembramo estilo de certos amigosda URSSdos anos
30 e 40 que sempre dispuseram da interpretação apta a satisfazer
as exigências palacianas menos grosseiras. Todavia, estamos de acordo
com l,of/a Com/i##úacercada utilidade de um debate mais vasto à
volta das questões ligadas à política da direcção chinesa e à definição

2]2 213
de uma estratégia diferente; pelo nosso lado, achamosútil retomar pós-revolucionária, com base nas relações de produção e propriedade
uma série de temas sabre os quais os militantes revolucionários deve- estabelecidaspela revolução de Outubro, e por esta mesma razão
riam reflectir criticamente. está interessada na manutenção destas relações. Daí a luta contra
as tendênciaspara a restauraçãodo capitalismo sobretudo no mo-
mento em que estascomeçama constituir uma real ameaçae não
Os dois «super-imperialismos»:uma teoria falsa apenasuma tendênciapotencial. Daí o seu interesseem se opÕEà
expansãodo imperialismo e em apoiar as forças sociais e os movi-
Na raiz teórica das posições chinesas encontramos a teoria se- mentos em luta contra o imperialismo bem como os países onde a
gundo a qual a URSS seria uma potência imperialista ou mais pre- revolução ou os processos estrutumlmente revolucionários levaram
cisamente social-imperialista. São principalmente os maoístas, os ao derrube do sistema capitalista.
menos ortodoxos que sublinham esta especificidade de«social-impe- O caso de Cubo é em si mesmo convincente. A burocracia sovié-
rialismo» de modo a seremultrapassadasas dificuldades que decor- tica nadafez para que a revoluçãotriunfasse,o -PCcubano,no pe-
rem do facto incontestávelde que a política da URSScomporta mo- ríodo pré-revolucionárioapoiou por várias vezesBaptista e só numa
tivações e posiçõesque muito dificilmente se identificam com as do segundafase se ligou à luta de Fidel de Castra e do seu movimento.
imperialismo americano(l.of/ú Co // #a, refere-sea isso, por exem- Mas, quando surgiu em Cubo um Estado operário no qual foram
plo, a propósitodasposiçõesrespectivasda URSSe dos USA so- expropriadasnão só as empresasdos imperialistascomo as da pre.
bre Angola). Não obsta que, segundoos dirigentes chineses,a ana- tensa burguesia nacional, a direcção da União Soviética teve inte-
logia ou melhor, a identidade se faça essencialmentecom a natureza resse eni :que os Estados Unidos não atacassem Cuba, para reinstaurar
de classe.O facto de que, na maior parte do tempo, sobretudona o velho regime e, para tal, deu a sua ajuda económicae militar.
propaganda corrente, se substitui este elemento pelo conceito nada No caso do Vietname impõe-se que se façam análogas considerações.
científico de <<grandes
potências>>ou de «superpotências» ou de país A URSS não interessavam que os acordos de Genebra fossem pelo
de primeira categoria em oposição aos países de segunda ou terceira ar nem que os revolucionários vietnamianos respondessemàs novas
categoria, diferentes das <<superpotências»,
nada altera na sua subs-
operações dos imperialistas e dos seus fantoches com um recrudes-
tância. Para os chineses a identidade consiste, em última análise,
cimento da luta armada. Fez o possível por impar compromissos
no facto de que a URSS é capitalista como o são também os Estados
tornando mais difícil, especialmentenos momentos cruciais, o tra-
Unidos.
balho da direcçãovietnamita (a partir de 1971,, pelo menos,isto é
A dificuldade reside na compreensão da natureza duplamente con-
válido também para a China). No entanto, durante o conflito a
traditória da casta dominante da União Soviética. Esta casta impôs-se
URSS esteve ao lado do Vietname a quem assegurou uma ajuda anili-
às massas operárias e camponesas, destruiu pratica-mente a democra-
tar consistente-- mesmo que, em certos aspectostenha sido tar-
cia soviética impondo a sua própria ditadura. Na intenção de sal-
dia --. E, durante muitos anos, o Vietname foi o epicentro do afron-
vaguardara suaprópria dominação
e a suaprópria condiçãoprivi-
tamento entre classesà escalamundial: as tomadasde posição não
legiada operou e opera, em linha geral, a favor de um s/a/# galo
internacional subordinando a esta exigência os interesses do movi- podiam pois ser determinadas por considerações tácticas, por inte-
mento operário e revolucionário mundial. No entanto, esta casta teve resses conjunturais ou secundários mas sim l)ela natureza de classe
origem e manteve-se no quadro de uma sociedade de transição das forças em questão.

2]4
2]j
Quanto à natureza das estruturas sócio-económicas-- donde a tas dos EstadosUnidos -- que, consequentesna aplicaçãode certas
análise deve partir evidentemente -- a definição da URSS como premissas(falsas) chegaram à conclusão de que o capitalismo foi
Estado operário, isto é, Estado onde existem relaçõesde produção também instaurado na China.
colectivistas e não relaçõesde tipo capitalista burguês, é confirmada
por um dado de facto actual cuja importância não pode ser subesti-
mada. Há ano e meio que todo o mundo capitalista é abaladopela A URSS«inimigo principal»: as implicações práticas
crise económica mais grave que existiu desde a grande depressãodos
anos trinta. Para os marxistas, não existem dúvidas de que, funda- A primeira implicação anaHtico-política das teses dos dirigentes
mentalmente, esta crise não se deve a factores conjunturais ou par- chinesesé a situaçãomundial ser interpretada muito mais como re-
ciais ou a maus funcionamentos que ponham em destaqueos econo- flexo do conflito entre as duas«superpotências>> do que como o desen-
]nistas e os políticos da burguesia mas sim ao próprio mecanismo volvimento da crise do sistemacapitalista internacional e o confronto
do sistema, às suas contradições intrínsecas e também que a amplitude entre forças sociais antagónicas. As fronteiras de classe aparecem
e profunddadedo fenómenoestãoligadasà crise de conjuntodo senão mesmo abolidas, pelo menos atenuadas e esfumadas. Isto nota-
imperialismo à escalamundial. A recessãonão entra na China: não -se mais ainda através das tomadas de posição práticas do que atra-
porque a economia chinesa fosse mais desenvolvida que as outras vés da análise: e tanto mais nitidamente na medida em que os diri-
ou tivesseatingido um nível superior de consolidação(emrelação gentes chineses já não usam um sinal de igualdade absoluta entre
aos países capitalistas é o contrário que é verdade) mas porque a a União Soviética e os Estados Unidos. Segundo eles, são am-
revolução estabeleceurelaçõesde produção qualitativamente diferen- bas <<superpotências>>imperialis-tas, mas a URSS é denunciada
tes, de tipo colectivista. Mas a URSS também não é invadida pelo como a mais agressivae perigosa: «Ao passo que uma das super-
ciclone. Dar-se-á atenção a este facto inelutável e serão compreen- potênciascontinua a avançar a outra reagrupaas suasforças e marca
didas as razões estruturais do mesmo? Ou ficar-se-á à espera que o passo>> («Pekin Information», 32, 1975, p. 8); «Nesta luta de
o Betteheim de serviçoinvente uma outra explicaçãoadaptadaàs morte, a União Soviética dá provas de um espírito agressivo enquanto
novas circunstândas? os EstadosUnidos es-tãona defensiva». (Id. p. 9); <<Oque prega a
Quando se desenvolveua polémica sobre o pretenso restabele- paze a segurança
com mais calor é precisamente
o que colocaos
cimento do capa:talismãna URSS nos anos 60, os agrupamentossobre povos do mundo, particularmente os da Europa, sob a ameaçamili-
os quais mais se insistia eram os de -quea URSSes-tavainserida no tar flagrante»(declaraçãode Tens Hsiao-ping em Pauis).Donde se
mercado mundial capitalista, que desenvolvia cada vez mais .trocas conclui -- utilizalado a terminologia maoísta-- ser, a URSSactual-
com os países capitalistas, que mandava construir fábricas por capitalis- mente, o<<inimigo principal».
tas estrangeiros, que havia recorrido a empréstimos estrangeiros, etc. Dali resultam as posições de Pequim face à Europa, Mercado
Nessa altura explicámos porque razão estes elementos não eram Comum e NATO e .sabre .a Conferência de Hlelsínquia.«A China
decisivos para a definição da natureza social da União Soviética. De -- disse Teng Hsiao-pino -- apoia finnemente a União da Europa
qualquer forma, hoje a China faz exactamentea mesmacoisa e, em ocidental».«Depois da fundação da C.E.E. -- declarou por sua vez
larga escala. O que pensam os maoístas, sejam eles dogmáticos ou o ministro do ComércioExterno Li Kiang quandoda assinaturado
sofisticados? Talvez já tenham tido a intenção de seguir a via já tra- acordo sabre as relações entre a China e a C.E.E. -- acentuou-se a
çada por determinadas seitas -- como por exemplo, alguns ex-maoís- tendência dos países europeus para a unidade. Faca à intervenção e

2]6 2]7
à pressão sem tréguasexercidasdo exterior, resistiram firmes para de Franz Josef Strauss -- que, como é evidente, oferece garantias
salvaguardar a soberania e independência. Foi este um factor positivo na medida em que denuncia sem falhas a«superpotêncía>>moscovita
de evoluçãointernacional». («Pekin Information», 20, 1975). Pouco e todas as suas manobrasenganadorasl-- tenha sido recebido por
depois a imprensa chinesa comentava favoravelmente a vitória do diversas vezesem Pequim com um aperto de mão afectuoso por parte
<<sim»quando do referendo sobre o Mercado Comum na Grã-Breta- do«grande timoneiro»!
nha denunciando a hostilidade da URSS ao Mercado Comum: As implicações práticas lógicas da teoria do social-imperialismo
<<AComunidade europeiafoi criada com o objectivo preciso de se e do inimigo principal levam a estes resultados: e é inútil procurar
opor à expansãodas superpotênciase salvaguardaros direitos polí- encontrar justificação. l,of/ú Co#íi z/a explica que a China se serve
ticos e os interesseseconómicosdos Estadosmembros»(«Hsinhua», dos convites a homens como Strauss como«provocação e condicio-
ed. inglesa, 18 de Junho). Portanto, o Mercado Comum não é uma namento». De qualquer forma, trata-se de um condicionamento -- dos
expressãoda tendência para a concentraçãodo capital, não é uma governos social-democratas, centro direita ou centristas -- sob um
associação entre imperialistas(as potências europeias mesmo que ponto de vista da direita ao passoque a«provocação»,admitindo
não sejam «superpotências» continuam sempre imperialistas!) mas que ela existe, não atinge nem os imperialistas americanosnem os
é uma espéciede instrumento de legítima defesados Estadosdonde Europeus mas, no caso de Strauss, atinge a classeoperária e os revo-
muito simplesmente se faz desaparecera natureza de classe! Análogo lucionários da Europa ocidental que vêem ser acolhido com todas
raciocínio é válido para a NATO cujo eventual enfraquecimento os as honras, em Pequim, aquele que consideram, muito justamente,
Chineses deploram abertamente («Pekin Information», n.' 33, 1975) como um dos seus inimigos mais perigosos.
ao ponto de sugerirem que o reforço da unidade europeia não deve Na medida da sua influência política real -- e vemos em que sen-
implicar necessariamente
a retirada das tropas americanasda Europa tido ela tinha uma-- a tese da URSS de«inimigo principal» vai
(discussão entre Tens Hsiao-pino e Giscard d'Estaing). privilegiar um dos dois<K
super-imperialismos»,
vai concentraro ata-
Quanto à conferência de Helsínquia para lá das suas implicações que contra Mascava, e dar patentes de defensores da independência
intrínsecas, deu oportunidade a um teste particularmente interessante. aos mais conservadores representantes da burguesia europeia. A pro-
Com efeito, nuncatinha sido tão claro o facto de a crítica chinesa pósito, dissemos que esta última proposição tem igualmente as suas
não se referir a ter havido compromisso com o imperialismo(dei- origens numa concepçãoradicalmente errada do papel<<anti-imperia-
xemos de parte os fantasmasde l,of/ú Com/i#z/aque, afirma que, em lista» dado à burguesiadita nacional, concepçãoque teve e tem im-
determinados aspectos a política chinesa parece animada pela von- plicações ainda maiores no caso dos países coloniais e neocoloniais.
tade de combater um <<compromissohistórico à escala mundial»).
Pelo contrário, a URSS é denunciadapois, por detrás da fachada
calma e das declaraçõespacíficas ela desenvolvia uma política agres- Os dirigentes chines-ese as lutas
siva contra a Europa pt'eparando uma guerra(ver a título de exem- na Europa ocidental
plo, <<Hsinhua»,ed. inglesa, 13 de Agosto 1975). Não é de admirar
que, para apoiar uma -tal tese a imprensa chinesa não hesite em tirar Uma concentração exagerada sobre o tema da luta entre as duas
partido do testemulüo de jornais conservadoresde toda a Europa, superpotências faz passar para segundo plano as contradições estru-
desdeo Neue Zürcher Zeitung a Die Telegraf e The Guardian. Não turais -- sociais e políticas -- que actuam de maneira particular-
é de admirar que uma figura da reacçãointernacional como é o caso mente agudana Europa ocidental no período actual. É verdade que

2]8 2]9
de tempos a tempos, aparecem em publicações chinesas, análises Portugal»(«Hsinhua», 18 de Agosto). E isto, na altura em que a
11 -- sumárias, pelo menos -- sabre a ci:ise e o desemprego bem como contra-densiva moderada estava em pleno desenvolvimento no de-
informações das greves nos diferentes países. Mas, voltamos a re- curso da qual os reaccionáriose os fascistasassaltavamas sedesdo
peti-lo: é acentuadaa luta entre as superpotências,como por exem- PCPI Sobre os acontecimentosde Março não houve mais do que
plo, em Portugal. O facto de muitas vezesse utilizarem citações de uma dezenade litüas insignificantes e apenas uma curta informação
jornais obscuros de grupos maoístas «nacionais» não menos obscuros. sobre as eleiççõesde Abril(sem referência ao PCP nem à extrema-
nada altera, pois o objectivo da direcção chinesa é apoiar as suas esquerda). Quantos aos acontecimentos do l.' de Maio, sobre os quais
próprias tesesatravésdos depoimentosfiéis dos seusadeptos. num sentido ou noutro toda a imprensa internacional -sepronunciou,
Mas existe um outro aspectodo problema. Os dirigentes chineses, não houve nem uma única palavra. Em compensaçãoo boletim lon-
de há 15 anos para cá, fazem um esforço enorme de propaganda, drino deu uma vasta informação sobre uma manifestação organizada
divulgando boletins semanais e diários em diferentes línguas. O mais pelo PCP-ml da Grã-Bretanha.
difundido é<<Pekin Information» cuja função é dar a conhecera Nas raras informações consagradas a Portugal, o tema predomi-
todos os problemas teóricos e políticos da própria China e dos outros nante foi a denúncia dos perigos da penetração do«social-imperia-
países. Pois bem, no ano que decorre (até ao n.' 37 de 15 de Setem- lismo>> soviético a propósito do qual as agências noticiosas chinesas
bro de 1975) num país como a Espalha, só apareceuuma curta in- não hesitaram em utilizar os mesmo argumentos utilizados pelos jor-
formação sobre uma série de greves, sem qualquer referência à situa- nais ocidentais mais reaccionários retomando a acusaçãogeral -- de
ção política em geral. Num outro país-chavecomo a Itália foram carácter policial -- de «pescar em água turvas>>(«Hsinhua» 16 de
publicadas três notícias mas só uma pode ser considerada como tal, Junho). De momento, não existem elementos suficientes que permi-
(sobre a greve de 23 de Fevereiro) ao passo que as outras informavam tam julgar em que medida a UR.SSteria procuradofazer valer a pró-
sobre uma visita da organizaçãodos comunistas marxistas-leninistas pria influência, directamente ou através do PCP, a quem assegurou
de Itália dirigida por Osvaldo Peste e sobre uma repetição de um até aqui, uma cobertura ideológico-propagandista oficialmentesem
artigo do <<NuovaUnità>> intitulado <<A URSS, principal perigo resuições.A hipótese mais provável é que os dirigentes foram sur-
para a paz na Europa».Nem <<PekinInformation» nem o boletim preendidos pelo 25 de Abril e principalmente pelos acontecimentos
diário mais importante, o de Londres, publicaram uma única linha seguintes e que, enquanto esperavam uma definição mais exacta,
acerca de um acontecimento como as eleições de 15 de Junho. Em tiveram que recorrer à política tradicional de ajuda e reforço de um
Pequim, parece que se torna mais importante fazer propaganda a Partido comunista que aliás tinha dado provas repetidas de rigo-
favor da minúscula seita de Osvaldo Pescedo que analisar o facto rosa ortotoxia. Simultaneamente, tentaram utilizar de modo opera-
do ])CI ter obtido mais de ll mihões de votos nas eleiçõesl cional a maior<<ortodoxia>>
de Cunhal num sentido polémico contra
Desde Março que Portugal é, sem dúvida alguma, o epicentro partidos comunistascomo o PCI e PCE consideradosem Moscovo,
das lutas revolucionárias e operárias na Europa. Parece que, na como demasiado <<independentes».Pelo menos por agora, não consta
China, ainda não se aperceberamdisso. As agênciasnoticiosas chi- que a URSS tenha intervido de maneira diferente nos desenvolvi-
nesas não falam das diferentes organizações operárias portuguesas, mentos internos portugueses,nem que tenha tido uma influência con-
excepto o patético PCP-ml mas referem-sea um órgão autorizado sistente.Seguidamente,quisemossublilüar que a URSS pode ser
dos maoístassuíços,Oc/ocre, através do qual ficam a saber que favorecidacom o enfraquecimento que a crise portuguesarepresen-
<<aofensiva do social-imperialismo soviético é o principal perigo para tou para o imperialismo ocidental e para a NATO, não vemos

220 22]
r'
porque razão a classe operária e os revolucionários deveriam lamen- agente do «inimigo secundário» e expressão possível da burguesia
tar-se com este enfraquecimento, como parecem que o fazem os diri- nacional disposta a bater-se pela independência coQtra o social-impe-
gentes de Pequim mesmo que neste caso não o declarem abertamente. rialismo --, é perfeitamente legítimo fazer o que certas organizações
Pelo contrário, é um facto que o imperialismo americano e no maoístasportuguesasfizeram e não podemoslivrar-nos do problema
plano político mais ainda talvez os imperialismos europeus, mano- falando de loucura ou recorrendo a epítetos difamantes.
bravam e manobramdesesperadamente em Portugal, intervindo com Se elas quisessem tirar as consequências de uma teoria que con-
ameaças, bloqueios, pressões, acções de tipos diferentes incluindo tinuam a defender, se quisessemser consequentescom as suaspre-
actos terroristas com o objectivo fundamental de bloquear e deste missasteórico-analíticas gerais, os camaradas de l,oÉfa Comfim#a,coma
modo abafar a luta revolucionária;fazer-sesilêncio à volta disto todos os que aceitam as teses do PC chinês, deveriam, na Itália, pâr
e apontar os canhõescontra a União Soviética só serve para favo- em pé de igualdadeo PCI e a democraciacristã, ambospartidos bur-
recer muito concretamenteos reaccionáriose agredir a revolução guesesligados a uma superpotência imperialista ou ainda, mercê da
portuguesa. lógica do inimigo principal, concentrar o alvo contra o PCI, favore-
Em Portugal, o maoísmofavorecido pela degenerescência buro- cendo pelo menos, objectivamente, a democracia cristã. Sabemos
crática e oportunista do PAUS e do PCP conseguiu realizar o que muito bem que todos os militantes recusariamfirmemente uma tal
não tinha conseguido nos outros países europeus que atravessaram orientação. Mas, se assim é, porque é que não se vai reflectir na base
uma crise revolucionária, isto é, criar organizações bastante consis- de uma concepçãoe de uma análiseque tem implicaçõestão aber-
tentes que estejam à medida não só de reproduzir os textos escc- rantes? Porque razão não procuram verificar teoricamentea con-
]hidos ou as variaçõessobre estes textos mas igualmente, traduzir sistência científica de certos conceitos em relação a problemas cuja
na prática uma orientaçãodeterminada.É por estarazãoque a aná- soluçãoé fundamental para definir de modo não contingente a sua
lise da política de certasorganizaçõesportuguesasconstitui um teste própria posiçãodentro do quadro e da dinâmicada luta do movi-
importante. mento operário internacional.
As organizações que aplicaram com a mais ortodoxa referência
aos dirigentes chineses,a concepçãodas duas superpotênciaschega- Holden coberto :e Pinochet
ram a apoiar as manifestaçõesde Soares,a blazerbloco com os sociais-
democratas em inúmeros sindicatos, a considerar como revolucio- A política chinesanão é menosnociva no que se refere aos paí-
nárias as mobilizações reaccionárias no Norte e a participar no ataque ses coloniais e neocoloniais que representam o principal centro de
contra as sedesdo PCP, aberraçõesde<<maoistas» entre aspasou interesse para os dirigentes chineses.
<<pretensos» maoístas?Não, são maoístasque aplicam de maneira No passado, não faltam exemplos manifestos, principalmente a
consequentea teoria com que muitos se divertem semterem a cora- partir da reviravolta assinaladapela visita de Nixon a Pequim. Basta
gem de a .provaremcientificament-ee ainda menos,delatirarem todas lembrar o apoio à ditadura militar do Paquistão que praticava o geno-
as implicaçõespráticas. Se a URSS é uma potência imperialista ou ddio em Bengala,a amizademanifestadapara com Nemeiry no mo-
melhor, o inimigo principal, se o PCP não passade um agente da mento em que assassinavaos sindicalistas e os comunistas sudane-
URSS, se, acrescentamos -- o eixo estratégico da luta no período ses, pior ainda, o apoio e as felicitações (numa carta escandalosa de
actual é a independência nacional contra as dua.s superpotências, Chu En-lai publicada nos diários de Colombo e nunca desmentida)
então, é lógico que se namore e estabeleçaacordos com o PSP -- ao governo de Sirina Bandaranaike que massacravaum movimento

222 223
r
revolucionário de jovens camponeses,estudantese intelectuais, lan- A verdade é que, tanto no subcontinente indiano, como no Su-
çando em campos de concentração, sem julgamento, perto de 20 000 dão, em Angola como no Chile, a política chinesalonge de ser carac-
militantes ou suspeitosde o serem.O episódioda visita a Pequim, terizada por desvios episódicos ou contradições pouco compreensivas,
por parte de uma delegaçãodo assassinoPinochet, quando do 2.' ani- respondea uma lógica de conjunto, a lógica que já sublinhámosnas
versário do [[ de Setembro,fez ]embrar, por outro lado, uma outra outras partes do mundo. Fazendo desaparecerou diluindo o mais
página negra da política dos dirigentes de Pequim que não hesitaram possível as diferenças qualitativas baseadasno critério de natureza
em manter boas relações com a ditadura militar mais sanguinária de classe e elevando a um critério supremo as diferenças de interesse
da América Latina, ao contrário do que faziam, não só a União So- reais ou potenciais e as divergências que daí decorrem em relação
viética, como os diferentes governos burguesespreocupados em não às duas «superpotências»,os dirigentes chinesesprocuram de ma-
sefazerem desacreditaraosolhos da opinião pública de cada um deles. neira indiscriminada, convergências,acordos, alianças com as bur-
A posição tomada face a Angola não é menos eloquente. Em guesiasque se pretendem nacionais e com os respectivos governos
princípio, um Estado ou um partido operário pode desejara unidade mesmo que sejam conservadores e reaccionários. A especificação
de diferentes movimentos que se batem pela independênciacontra segundo a qual a URSS é o inimigo principal, faz o resto: em oposi-
o imperialismoe, num determinadocontexto,pode não estar de ção à URSS tudo é considerado lícito, desde as relações amigáveis
acordo com uma prferência pelo apoio político e material. Mas, em com o Xá da Pérsia às felicitações, quando da repressãoa Ceilão,
primeiro lugar, a China não foi neutra, na imedidaem que, durante e as visitas de amizadedos reaccionárioschilenos.
um certo período ajudou militarmente a FNLA, no próprio momento Talvez se pudesse pen:sarum pouco ingenuamente que na Amé-
em que esta demonstravaa sua orientação neocolonial. Em segundo rica Latina pela menos, a qualificaçãode inimigo principal, cairia
lugar, a interpretação segundoa qual a guerra civil teria sido pro- sobreos EstadosUnidos. Mas, não é o caso.O exemplochileno de-
vocadapela URSScomo o repetiram por várias vezesas fontes ofi- monstra-o. O governo de Allende, sem ser um peão do«social-impe-
ciais chinesas,é falsa e abertamentemistificadora («Pekin Informa- rialismo» tinha certamentemelhoresrelaçõescom a URSS do que
tion», n.' 31 e 36 de 1975).A lógica de classedo conflito angolano com os EUA. Foi precisamente por isso que, quando o regime caiu,
está escondida e falsificada. Uma vez atingido o estada de indepen- Pequim não se associou à campanhainternacional de denúncia do
dência(mesmo que falte ainda alguns mesespara a sua realização golpe de Estado e, pelo contrário, apressou-sea explorar as margens
efectiva) a luta teve de transportar-se do terreno anta-imperialista de manobraabertasa fim de se aproveitar do enfraquecimentodas
para o terreno da luta entre as classesindígenas.Sem querer atribuir posiçõesdo <<inimigoprincipal». Haverá um único revolucionário,
a quem quer que seja, diplomas que ninguém parece ambicionar, não UH Único militante do movimento operário chileno que, estqa dis-
se pode negar que o MPLA tenha as posiçõesmais avançadase posto a aceitar ou a justificar um tal calculismo, uma tal política?
exprime as pressõesdas massasque não querem ver roubada a sua
vitória, contra os colonialistas, pelas camadasindígenas dominantes
Tirar as conclusõesgerais
ou por operações neocolonialistas; começaram, principalmente em
Luanda, a organizar-sedemocraticamentepela base, ao passoque o Neste momento, é possível tirar algumas conclusões. As teorias
FNLA reagrupa atrás de si, tanto as camadasricas <<nacionais>>
como e as interpretações dos dirigentes chineses -- intrinsecamente erró-
os candidatos a ela e goza do apoio de Mobutu, sem falar dos favo- neas-- têm implicações práticas nefastas que se podem sintetizar
res dos EUA. da seguinte maneira:

224 22j
15
-- no jogo político internacional, concentrando o fogo contra nos países em que actuam e que, pelo contrário, vêem os, dirigentes
a URSS, cobrem as responsabilidades do imperialismo americano faci- de Pequim dar preferência a personalidadese a grupos ridículos e
litando objectivamente a sua acção; sem consistência alguma.
-- as orientaçõesda China em relaçãoà Europa ocidental e as Mas, trata-se apenasde demonstraçõese de uma utilização pouco
escolhaspolítico-diplomáticasque daí resultam favorecema burgue- lucrativa dos fundos do Estado cllinês? Não, aqui também há uma
sia nos paísesdo MercadoComum; as iniciativas dos seusgovernos lógica. É a lógica de quem quer estabelecer relaçõesde subordinação
e dos seus políticos mesmo que reaccionários são apresentadas muitas incondicional, que exige a ortodoxia mais rigorosa, a adaptaçãoauto-
vezes sob um aspecto favorável; mática a todas as viragens sejam elas estratégicasou tácticas. Por
a mesma tendência actuou nos países coloniais e neocoloniais outras palavras, a relação que os dirigentes chineses estabelecem
particularmente em situações críticas em que se torna necessaria- é eminentemente burocrática. Reservar páginas e páginas às activi-
mente imperioso uma nítida posição de classe. dades de grupos inexistentes, a citações de jornais que apenas pre-
Afirmar, comoo fez l,oáfaCo /i #a, que a«escolhachinesase tendem enviar para Pequim o eco do que ouviram em Pequim, e
processanum plano diferente e distinto daquele em que se processa nada dizerem sobre as lutas dos revolucionários e dos partidas comu-
o compromisso das forças revolucionárias na luta de classesde cada nistas de paísescomo Portugal, Espalha, Fiança e Itália, significa
país», é um piedoso eufemismo, é uma justificação temerosa. As posi- exprimir da maneira mais paradoxal um critério que se encontra na
ções chinesas e as acções dos que se inspiram nestas posições estão base das posições da burocracia chinesa, tal como aconteceu no tempo
em contradiçãocom os interessesda classeoperária.Memo que de Estaline e como ainda hoje acontece na base das posições da burc-
ponhamosde parte a prova teórica, Portugal, o Cale, Angola, Cei- cracía soviética; a subordinação às exigências próprias da burocracia
lão, etc. mostram-no de maneira irrefutável. as exigênciasda luta de classesoperária mundial.
As relaçõesque os dirigentes dlineses mantêm com o movimento Voltamosa repetir: só os que se queremenganara si próprios
operário e em particular com a extrema-esquerdados outros países ou enganar os outros, podem apresentaras coisas como se se tra-
são em si mesmasum elemento significativo. Segundo l,o//a Con/i#wa, tassem de casos particulares, de desvios episódicos. Toda uma série
a China utilizava «como provocaçãoos partidos marxistas-lenhístas de acontecimentos, de tomadas de posição nos momentos cruciais,
europeus inexistentes excepto quando se fala das suas viagens a Pe- indicam que se trata de uma linha de conjunto. hlesmo os que aplau-
quim». Mas contra quem é que se voltará esta provocação? diram e apoiaram a direcção cl)mesa, na esperançaque ela actuasse
Certamente que não é contra os imperialistas; este muito sim- como uma direcção revolucionária abrindo novas perspectivasao
plesmente não dão atenção a operaçõesdeste género na medida em movimento operário internacional, deveriam sentir a necessidade
que elas, segundoo seuponto de vista, são desprovidasde qualquer imperiosa de reflectir a fundo sobre a sua natureza.
sentido. Contra os «sociais-imperialistas»?
Mas os dirigentes sovié- As conclu:sões que l.of/ú Co // zra tira das suas considerações
ticos só têm a ganhar com tais demonstraçõesque só vêm valorizar empíricas sobre a política chinesa, são, pelo menos objectivamente,
de novo o seu comportamento e principalmente os partidos comu- pessimistas:«O problema que existe hoje é o de contar com as suas
nistas sobre os quais têm influência. A provocação deveria atingir próprias forças -- para a esquerda revolucionária europeia e mais
os militantes e os grupos que interpretaram de maneira favorável a directamente para a esquerda revolucionária mediterrânica -- e saber
pretensarevoluçãocultural, que considerama China como um dar na prática e na teoria a resposta concreta ao desafio contido nas
<<pontode referência>>
necessário,
que adquiriram um certo crédito posições dos camaradas chineses: será possível fazer a revolução nesta

226 227
região, libertandc-se da tutela do imperialismo americano sem cair E, mais ainda. SÓuma miopia política ou a adesãoa um esquema
sob o colàrolo do social-imperialismo»? cujo erro ou cujo carácter extremamente equívoco evidenciámos,
A opção de contar com as próprias forças comporta -- quer quei- podem levar a traduzir este dilema nos seguinte termos: ou na órbita
ram, quer não queiram-- uma renúncia pela qual é evidenteque dosEUA ou na órbita da URSS.Pelo contrário,é precisodizer cla-
se pagaum preço.Vale a penacitar o exemplodo MIR chilenoque ramente que uma transformação estrutural qualitativa da economia
suportou a marca de uma concepçãosemelhantedurante os anos da em Espanta, em Fiança ou na Itália tornariam possível e reais não
Unidade popular, em que não ultrapassou um internacionalismo geral, só os projectos de colaboração como os de verdadeira integração
uma referência global a juba, não assegurandouma posição precisa económicacom a Europa de Leste e com a própria União Soviética
face aos problemas cruciais do movimento operário internacional. (sem excluir como é evidente, as relaçõescom a China). Se tiver-
Deste modo, na prática, foi atenuada ao máximo, a compreensão mos presente as dificuldades que a burocracia soviética teve para
concretado facto que a luta no Chile era parte integrante dum con- impar a sua hegemoniaa paísescomo a Checoslováquiae a Polónia
texto mundial no seiodo qual actuavamforçase tendênciasdesti- e senos lembrarmosda derrota de Estaline ao tentar submeterum
nadasa influenciar, de uma maneiraou de outra, a própria situação pequenopaís como a Jugoslávia, compreendemosque não será tão
chilena(e teria sido mesmoisso se a experiênciativessecontinuado fácil ao <oocial-imperialismo>>
anexarpaísescomoa Fiançaou a
ou se se tivesse chegado ao estabelecimento de um Estado operário) . Itália en] relações de subordinação.
Entre estasforças, enconuava-seem primeiro lugar, o imperialismo Deixemos uma tal hipótese à propaganda e aos fantasmas cre-
americano e as burguesias «nacionais>>latino-americanas, mas havia puscularesdos reaccionários.Para nós o contrário é mais provável,
igualmente a burocracia soviética e, embora em menos quantidade, ou seja, que uma revolução e o princípio da edificação socialista num
a própria burocracia chinesa, para não falarmos da influência con- país de elevadonível económicoe cultural e com um movimentoope-
traditória exercida pela direcção cubana. rário organizado e politicamente amadurecido, teriam repercussões
Nesta fase e mais do que nunca, uma luta revolucionária não muito grandes na Europa oriental e na pr(5pria URSS. Isto poderia
pode vencer sem ter uma dimensão internacional. Isto é tanto mais constituir um factor decisivo para o desbloqueamentode uma situa-
válido não tanto para a «zona mediterrânica» não muito bem defi- ção de paralisia que se perpetua mas que, no entanto contém -- as
nida, mas para a Europa ocidental que, de futuro, atingiu um grau experiências de 56 na H.ungria e na Polónia, de 68 na Checoslováquia,
de interdependência económica, social e política, significativo. Uma de 1970 de novo na Polónia, mostram-no-- contradiçõesenormes,
revoluçãovitoriosa num país europeu como a E-spanha,a trança ou susceptíveis de precipitar explosões.
a Itália achar-se-iaimediatamente confrontada, em primeiro lugar, Em lugar de «contarmoscom as nossasprópriasforças»para
com opções económicas drásticas, na impossibilidade de encarar a asseguraro desenvolvimento de uma experiência ao abrigo das ten-
concentração autárquica de um novo «socialismo num único país>>. dências que actuam nos outros países do mundo, devemos apoiar-nos
Não menos do que para a dinâmica política, a dinâmica económica simultaneamente nas nossas próprias forças e nas dos outros, na inde-
iria apresentar a alternativa: ou alargamento da revolução ou o seu pendência dialectica de umas e de outras, numa perspectiva global
abafamento ou a derrota. E, será muito difícil obter uma solução em que os elos são indissolúveis e tendem a tornar-se cada vez mais
positiva se esta perspectiva não for posta claramente desde o princí- estreitos.'
pio, se o movimento operário europeu e internacional não souber Não queremos acrescentar mais um problema, mas não podemos
preparar-se para um tal acontecimento. deixar de o mencionar: não é talvez ser realista pensar que uma revo-

228 229
lução num país europeu tem um impacto sobre a própria classeope- as variantes do processorevolucionário podem ser imprevisíveis se
rária americana, criando assim um obstáculo suplementar à actuação os modos e ritmos de construção podem variar ao máximo, se o dever
do imperialismo? dos revolucionáriosé o de apreenderem,para lá das formas contin-
gentes e das aparências deformadas, os elementos substanciais dos
processos, não serão, possíveis, as vias <<privadas>>,
as excepções, os
Uma «polarização infecunda»? resumos, as <<originalid4des», nem no que respeita ao papel de força
motriz hegemónicaque só pode ser preenchido pela classeoperária,
<<Desenvolver
a iniciativae o debatesobreestetemacrucial nem no que respeita à necessidadede organização da própria classe
(o que mencionámos da perspectiva revolucionária para a Europa) operárianum partido revolucionáriode tipo leninista.Não com-
-- escrevel,o//a Co#//#z/a -- é um dever tanto mais importante para preender isto, significa não ter reflectido o suficiente sobre o drama
a esquerdarevolucionáriana Itália -- a mais solidamenteligada à chileno nem sobre a situação portuguesa ainda em curso
realidade e às lições da luta de classes-- em direcção a uma esquerda Voltamos a repetir que o debate é necessário.Deve ser pontual,
europeia com tendência para a concretização de uma polarização infe- verdadeiro e sem exclusividades.A ninguém servirá a utilização de
cunda entre uma corrente <<marxista-leninista»e uma corrente «trots- fórmulas de <<exorcista>>
como a da «polarização infecunda>>que teria
kista». aparecido na esquerda revolucionária europeia. Se existe a fobia das
É de facto importante desenvolvero debate acercade todos os siglas, das denominações,punhámo-las de parte: discutimos proble-
temas a que o texto de l.o//a Co //#zla faz referência. Poderíamos mas e concepçõesque correspondem a estes problemas e que estão
acrescentar outros temas àqueles a que já nos referimos. É apenas na base das diferenças políticas e organizacionais. As posições <<mar-
necessário lembrar a problemática que a experiência portuguesa xistas-leninistas», ou -melhor, maoístas, são uma realidade que não
apresentou, de uma actualidade escaldante, isto é, a pl:oblemática das desaparecerãoassim tão depressa: ou seja porque 'têm matrizes histó-
forças motoras de uma revolução socialista, dos seus instrumentos, ricas que, em certas condições tendem a ser r'evitalizadas(dogma-
dos modosde conquistado poder. tismos, sectarismo, aventureirismos, etc.) ou, ainda mais, porque
É um facto que, durante todo um períodocrucial(um pouco são alimentadas,directamente ou indirectamente, pela força represen-
menos agora) a extrema-esquerdaitaliana retomou as ilusões que tada pela direcçãodo Estado chinês com todo o prestígio que ela
existiam na esquerda portuguesa acerca do papel de garante do pro- conserva. As posições trotsquistas são uma outra realidade que nin-
cessorevolucionário qua o MFA teria desempenhadoe sobre a pos- guémpode contestar e que l.o//ú Co fi #a como os outros devem
sibilidade dos garantesserem, em particular, alguns dos seusporta- aprender a analisar e a julgar segundo as suas capacidades intrínsecas
-vozesmais barulhentos, que concediamas entrevistas mais«avan- e de acordo com o que elas são efectivamente, sem argumentos tác-
çadas», recebendo em troca saudações entusiásticas. Não se tratava ticos enganadores,sem pretensas distinções entre interlocutores con-
de UH simples erro de análise mas de um erro radical de concepção. siderados mais ou menos válidos em função da sua influência actual.
Por outras palavras, imaginava-sedelegar o papel de força motriz Apenas é necessário acrescentar que as posições dos partidos comu-
da revoluçãoe de insnumento-guiada revoluçãoa uma outra força nistas que continuam a representar uma comente internacional do
que não fosseo proletariado e que não era nem poderia ser um par- movimento operário não podem ser apenasdifamadasde maneira
tido revolucionário. A experiência demonstrou rapidamente -- mas desenvolta, devem ser contestadas nas suas matrizes teóricas e estra-
infelizmente à custade uma grave paragemda revolução-- que, se tégicas e ser denunciadas nas suas implicações práticas.

2j0 23Z
l,o//a Co /i #a parece estar a sugerir uma iniciativa da esquerda vocos, as ambiguidades, as ilusões (pensemos no PSI que, no dia
revolucionária italiana que poderia opor-se à tendência para a«pola- seguinteà l Guerra Mundial adere à lll Internacional e vota num
rizaçãoinfecunda».Não existe dúvida algumapara nós, que a ex- congresso,a ditadura do proletariadol); is'to veio retardar as clarifi-
trema-esquerda italiana ganhou títu]os que ]he permitem fazer- cações necessárias, as tomadas de consciência necessárias dos mili-
se escutar e que viveu uma experiênciasobre a qual os mili- tantes da vanguarda e constituiu assim um obstáculo à construção
tantes de outras países, provavelmente de 'todas as tendências de um partido revo]ucionário]eni-nisto.Até o processode reflexão
não reflectiram ainda o bastante.Esta experiênciapode ajudar a crítica iniciado peld PCI a partir de 1956, original no seugéneroe
compreendermais a fundo, mais concretamentetoda uma série de em avanço em relação a todos as outros partidos comunistas dos paí-
problemas, sem ter necessariamente que se encontrar soluções«novas>> sescapitalistas, foi pesado em consequênciasnegativas que, 20 anos
ou particulares.E, na afirmaçãode l.o//a Coma/z#ú
parece-nosaliás depois, ainda continuam a pesar. Com a adopçãoparalela de uma
encontrar uma nota de particularismo senão mesmo de messianismo linha cada vez mais «constitucionalista», <(gradualista»,alimentou
nacional que, independentemente dos que o subsecreveram, se liga uma forte corrente crítica de direita do estalinismo, corrente que é
a uma tradição que apenaspode ser consideradacomo parcialmente hoje largamente maioritária entre os quadros do Partido. Paralela-
positiva. mente, e justamente por causa desta involução acentuada,devido a
O movimento operário italiano teve, em épocasdiferentes, sinais esta tendência para a social-democracia, atirou na direcção do esta-
que o tornaram distinto do movimento operário dos outros países linismo ortodoxo, do neo-estalinismoe do maoismo,muitos dos que
da Europa ocidental. O PSI dos dois primehos dez anos tinha um não queriam aceitar uma perspectiva reformista.
lugar particular no quadro da segundaInternacional, tal como o seu A extrema-esquerda
deve pois interrogar-sese, o que forma as
continuador teve em relação à social-democraciaeuropeia após a suas particularidades constitui efectivamente um título de superio-
queda do fascismo. O PCI pode igualmente reivindicar, não sem ridade em relação ao resto da extrema-esquerda europeia como resul-
Jlundamento, uma fisionomia<<nacional» própria que o caracteriza. tado da experiência vivida dentro da crise social e política mais longa
Mesmo o fenómeno do PSIUP dos anos 60, talvez não tivesse tido da Europa capitalista. Ela deve analisar esta'sparticularidades de
um verdadeiro equivalenteem qualquer país. Estas particularidades maneiracrítica, igualmenteà luz do passadodo movimentooperário
fizeram com que o movimento operário italiano se salvasse,durante italia-no, apercebendo-sedas ambiguidades e das contradições. Ela
a primeira guerra mundial, de uma capitulação tão vergonhosa como deve possuir uma óptica internacional cada vez maior o que signi-
a que atingiu a grandemaioriado movimentooperáriode muitos fica ter conhecimento de todas as tendências internacionais, definir-
outros países,bem como impediram o PSI de se associarà social- -se relativamente aos grandes problemas do movimento operário no
.democracia nas operações reaccionárias da chamada guerra fria. Do mundo inteiro.
mesmo modo, as particularidades do PCI permitiram que se redu- Trata-se de uma necessidade teórica inevitável, de uma exigência
zisse a duração e intensidade das devastaçõesestalinistas mais clás- política concreta
sicase se ultrapassasse,num certo momento, as formas mais infru-
tíferas de condicionamento por parte da burocraciasoviética.Toda-
via, estaspendênciastiveram como contrapartida, o desenvolvimento
e a consolidação de posições centristas, ecléticas, intermediárias de
diferentes tipos e em épocasdiferentes. Isto, veio facilitar os equí-

232 23j
PARA ONDE VAI A CHINA?
l A CHINA...
E A CRISE DO MUNDO CAPITALISTA

ROLANDLEW
Junhode 1975

O «continente» chinês é, sob o ponto de vista económico. um


enormeenigma. Sabe-seque os chinesesdeixaram praticamentede
fornecer dados estatísticos económicos detalhados ou dados sobre a
população de há 15 anos para cá, a partir da decepção do<<grande
salto em frente». A única fonte estatísticaconhecidaé a relativa ao
comércioexterno. Tudo o mais é larga especulação,ou melhor valor
provável, ou ainda pior, pressentimento em que a apreciação ideo-
lógica introduz numerosas deformações.
Assim, continuam a não ser conhecidos os efeitos do<<grande
salto em frente» (1958-1960).O valor da amplitudedo recuo
(algum) é objecto de discussões controversas e de numerosos exa-
geros. E, trata-se de acontecimentos datados de há 15 anos; agora,
saber o que se passa neste momento...! Um gosto pelo segredo es-
conde os suces'sose diHcu'Idades(principalmente estas) da República
Popular. As incertezas das estatísticas chinesas (reais neste país-
continente) derivam de uma propensãoburocrática para a dissimu-
lação, pí'eço pago pelos demasiados exageros do passado(os à)jec-
tjvos agrícolasespan'rasos
anunciadospara 1960 não são atingi-
dos-- e longedisso...hoje).
Pode então, proceder-sede outra forma efectuando uma con-
frontação dupla: a das tendências da economia chinesa em relação
ao mundo capitalista ambiente e, por outro lado, o que a China pode
<<representar>>
para este mesmo universo capitalista.

237
Breve balanço da economia chinesa 1952 é o ano de referência: a economiaexcedeue chegoumesmo
a ultrapassar a sua capacidade de produção dos melhores anos ante-
A população chinesa é objecto, no Ocidente, de investigações riores a 1949. De passagem,digamos que 1952 correspondea 1927
dignas de Sherlock Holmes, ma-sde um Holmes nos seus dias maus: na URSS: dois anos depois do estabelecimentodo novo regime, a
mais policial e procurador que detective... Quantos chinesesexis- situaçãoeconómicaanterior restabeleceu-se
na China, contra 10 anos
tem? Com efeito, ninguém o sabe. Racionalmente uns 800 milhões na URSSo que contougrandemente
na apreciação
do novo poder
pelo menos, e provavelmente não-mais de 900 milhões (alguns auto- por parte das massas.Do mesmo modo, a situação agrícolamelhorou
res anglo-saxões,mais maldosos, falam em mais de mil milhões, nú- ligeira mas significamente, a pa'tir de 1950.
mero exagerado):uma imprecisãode 100 milhões, duas vezes a Para o primeiro plano quinquenal 1953-57 (decalcadodo modelo
população da Fiança, não está nada mail . .. soviético) a numeração oficial dá uma média de crescimento indus-
Mesmo os dirigentes chinesesignoram, provavelmente, o número trial de 19 % ao ano: 140 % em 5 anos (as fontes allglo-saxónicas
real da sua população. Asshn Li Hsien-nien, vice-primeiro-ministro, falam de 14 a 19 %). Um crescimento muito importante mas com
decla:uva em 1971: <<Nãoexistem estatísticas precisas sobre essa um ponto de partida baixo.
matéria. Os responsáveisdo departamento de manutenção falam em Os números oficiais recentes os de Chu En-lai na Assembleia na-
800 milhões. Outros funcionários fala-m de 750 milhões apenas, cional popular de Janeiro de 1975 -- os primeiros números oficiais
enquanto o Ministério do Comércio (interno) insiste nos 830 mi- de há 15 anospara cá-- dá para o período de 1964-74 (10 anos)
lhões. Por outro lado, o departamento de planificação insiste num uma progressão de 190 % o que corresponde a uma taxa de aumento
número inferior a 750 milhões>>(:). Quer dizer, mais de 808 mihões de mais ou menos 10 % ao ano. Números elevados, se nos lembrar-
de incertezasl O que deve levar-nos a ter maior prudência no trata- mos que a<<revoluçãocultural>>está incluída nesseperíodo que foi,
mento dos números.
segundo os peritos, fonte de regressão mais ou menos importante.
Resumindo:uma imensapopulação(com uma taxa de cres- Estes números são demasiado recentes para poderem ter sido con-
ci'mento ainda mais importante, da ordem dos 2 % ao ano), que é testados no Ocidente. Sê-lo-ão desta vez com moderação, pois
necessárioalimentar, dar alojamento e a quem é preciso fornecer os após a visita de Nixon a Pequim, os valores dos «peritas» america-
bens de consumo; uma imensidadeque é, sem dúvida, a maior difi- nos aproximaram-se dos dados oficial-s -- ou oficiosos -- chineses.
culdade para uma rápida subida do nível de vida e para as profundas É ainda um dos milagres ideológicos da coexistência pacífica. Assis-
transformações sociais, mas que por outro lado, proporciona um tir-se-á talvez a outros(no sentido inverso) se as relaçõesse d9:e-
enorme potencial de trabalho. norarem . . .
Fica o «grande salto en] frente>>:dois anos de crescimento espec-
tacular, 1958-59 (à volta de 30 %), depois uma descida,resultante
O balanço industrial
dos insucessosagrícolas,da retirada dos peritos soviéticos(1960),
Existem duas séries de números oficiais: o balanço do primeiro dos excessos do <<grandesalto em frente», da sua impreparação, etc.
plano quinquenal(1953-57)e da última década(1964-74).Falta sem que tenha sido possível situar a importância efectiva de-cadaum
o desconhecido do <<grandesalto em frente>> e suas consequências. destes elementos.
(') Citado em«People's Republic of China: An economic assessment», Grosso modo, o crescimentoindustrial a longo prazo é pelo me-
Joint EconomicCommíttee,
Congrésd the U.S. 1972,p. 37. nos de 8 % ao ano(número do economistaamericanoField, para

2j8 239
1952-71, -número que, segundo parece, subestima o crescimento real),
O balanço da agricultura
e mesmo de 12-13 % segundo os números oficiais. Média que esconde
Embora favoráveis(-mesmo muito favoráveis em relação ao pe-
profundas diferenças: «pontas» de crescimentode mais ou menos
30 'Xo e anos de regressão.
ríodo anterior a 1949) os resultadosagrícolassão modestosnum
duplo sentido: as exigênciasde alimentar o povo e as possibilidades
Globalmente, a capacidadeindustrial da China, hoje enz dia,
ainda limitadas de emprego industrial tendem a manter a grande
deve ser de 10 a 15 vezessuperior à dos melhoresanos do antigo
maioria da população na condição rural(mais de 80 %, proporção
/exime ú /odor a ]949 (herança de certo modo modesta, mas não
bastante semelhante à de antes de 1949).
insignificante).
Para além disso a taxa de crescimento agrícola não ultrapassa
A China popular cria um grande leque industrial enquanto que
muito a taxa de crescimentodemográfico.Há um índice muito pre-
a sua basede partida se limitava a algunsfactores(têxteis, car-
ciso da modéstia dos resultados: para a produção cerealífera (80 %
vão, etc.).
Produção para alguns sectores
da produção agrícola), os chineses usam o ano de 1949 como ponto
(estimativas oa números oficiais) de referência. Sobre esta base indicam um aumento de 140 % da
produççãode cereaisde 1949 a 1974, a comparar com os 60 % de
i9j2 l i9j7 l ]96j 1970-73 aumento da população no mesmo período. Infelizmente, a escolha
do ano 1949 não faz grande sentido: foi o último ano da guerra civil,
Carvão (milh. de tch
u-m ano catastrófico sob o ponto de vista agrícola. Se nos referirmos
lados) 66 130 220 ü 400 milhões de toneladas (73) aos anos médios anteriores a 1949, ou a 1952 (um bom ano agrícola)
Aço (milh. de tone- a situação torna-se diferente.
ladas ) 5,35 ll 25-27(73)
Petról. bruto (milh.
(Números ofidais)
de ton.) 0,4 1,5 8 50 (1973); Ü 65 (1974)
Ü 80 (1975) 1952:t 150 milhões de toneladas de cereais
Cimento (milh. ton.) 2,86 6,86 11 1) (1972) 1974 J= 260 milhões de toneladas de cereais
Adubos químicos 0,2 0,8 5,7 24,8(1973) 1949 108 milhões de toneladas de cereais
Máquinas ferramen-
tas (M. de unid.) 7,5 28,4 7j (1971);110(1973)
Em relaçãoa 1952, o crescimentonão vai além de d: 70 % de
Tractores (milhões
de udd.) -- l 2i l 3s(i97i) crescimento (os «peritos>>anglo-saxões dão percentagens mais baixas),
Bicicletas (milhões em comparaçãocom um crescimentodemográficada ordem de 50
unid.) 0,8 1,5 3,65 (1971) a .60 %. Não é de desprezarmas ficamos próximos de um mínimo
Rádio (milh. unid.) 0,295 i,5 l io (i97i) tradicional, quer dizer, de 280 a 300 quilos por ano e por habitante,
Relógios (milh. de
1 3,5/4(1972)
contra uma toneladanos EUA(uma parte considerávelda qual
bMões de m.) ... l
Tecidos de algodão
servepara a alimentaçãodas animais,quer dizer, para a produção
mihões de m.) .. 3,83 5,05 5,40 8,50(1970) de carne). Os 300 quilos por cada habitante na China são compa-
Electricidade (bi- ráveis aos números da índia capi'taoista,que ultrapassam difícil-mente
liões de KW) 7.2 19,3 42 75/80(1 72)
os 200 quilos.
101(1973)
241
240 16
A produção agrícola é incontestavelmente um ponto fraco da é, pelo menos, devido tanto ao aumento dos preços como ao volume
economia chinesa, um fardo e um desafio muito difícil de aceitar. das transacções.
O que explica a prioridade dada a este sector desde há cerca de Embora em 1960 dois terços do comércio se dirigissem ainda
15 anãs, em contraste com a tradição estalinista e numa louvável para os <<países
socialistas» (e um terço para o mundo capitalista)
preocupação de conhecimento e compreensão das contrariedades que a proporçãoinverteu-sea partir de 1964(no -seguimento
do con-
decorrem do atraso do país e da quantidade da população a ali- flito sino-soviético).Em 1973, 1,7 mil milhões de dólaresdo comér.
mentar. cio da China dirigiam-separa o «campo socialista>> (e a China .tinha
com estes países uma balança comercial beneficiária desde 1956),
e 8,170 mil mihões de dólares,para os paísescapitalistas(com um
O comércio externo déficite de 370 milhões de dólares).

Dois factos dignos de nota: por um lado, a importânciaque o Principais sectoresdo comércio externo chinês em 1972
comércio adquiriu nestes últimos anos na actividade económica, o
que explica o seu rápido crescimeJato
e, por outro lado, a mudança Im?wtações Exportações
de orientação deste comércio desde há 15 anos: do <<camposocia- Cereais.... . . ' -'.. 335 milhões $ Produtos alimentares . . . 920 milhões $
lista>>para o mundo capot-alista.
É este aspectoque torna a China Fa:ro e aço 485 milhões $ Matérias-primas brutas
sensível -- pelo menos, em certa medida -- aas efeitos da crise. Máquinas e tas e combustíveis ... 620 mihões $
equipamentos 535 milhões $ Têxteis ......'.......'..... 450 milhões $
Com um comércio externo que ronda 3 a 4 -mil milhões de dóla-
Produtos quími Vestuário ......-'''..... 250 milhões $
res nos anos50 e 60 e exportaçõesque sobemou ultrapassamas cos 330 milhões $
importações, a China era uma nação comercialmente débil. O comér-
cio externo evoluiu da seguinte maneira:
Estes dados referem-se -às opções económicas do Es-todo operário
4,290 mil mihões de dólmen
chinês burocratizada. O terceiro lugar para os cereais nas importa-
1970
1971 4,720 mil milhões de dólares ções e a importância das compras de adubos químicas (180 cnilhões
1972 5,920 mil mihões de dólares de dólares em 1972) atestam a l)rioridade do sector agrícola. Para
1973 9,870 mil milhões de dólmen
o período de 1969-74, as compras de trigo, atingiram anualmente
3 a 6,5 milhões de toneladas(este último número refere-sea 1973-74,
Calcula-se que, em 1974, esse comércio atinja 13/14 mil mi- dos quais 4 milhões dos Estados Unidos). Fala-se mesmo da compra
lhões de dólares. Triplicou portanto em 5 anos. Mas, mesmo com de um total de 7,6 milhõesde toneladasde cereaispara 1973.
o número de 14 mil milhões de dólares, a China é uma naçãomedia- Embora estas compras repres'entemapenas 3 % da produção
namentecomercial(a Bélgicaultrapassa,em 1974, ü 30 mil milhões local, revelam a persistênciade algumasdificuldades agrícolase de
de dólaresapenaspara as exportações;a Alelnanha,outro país ex- alguns problemas relacionado-s com o abastecimento das cidades.
portador, aproximou-sede 100 mil milhões de dólares). Cona4,895 mil As importações de máquinas e de equipamen-totiveram um lugar
milhões de dólares de exportaçõesem 1973, a China faz figura de mais importante. Se em 1959 representavam47,5 % do total das
pequenoexportador. Tanto mais que o crescimentodos últimos anos importações,em 1962, com 120 milhões de dólares,não representam

242 243
mais do que l0,5 '%üdo seu total. Mas em 1971, com 495 milhões meiros mesesde 1974. Em 1973, os EUA venderam produtos no
de dólares, subiram a 22,5 % do total das importações e este número l valor de 690 Knilhõesde dólares e compraramà China 64 milhões
elevou-se bastante desde então. de dólares(o trigo é um dos produtos mais importados pela China).
Sobretudo depois de Dezembro de 1972, a China lançou-se na Em 1974, as vendas americanasatingiram 1,1 bilião de dólarese as
compra de grandes fábricas (ditas com <<chavena mão>>) , o que cor- comprasnão ultrapassaram100 milhões de dólares; no entanto, pa-
respondea um objectivo duplo: adquirir uma tecnologiade ponta, rece que as exportaçõesamericanastendem a diminuir para metade
realizar os objectivos do plano. Desdehá muito tempo que a China em 1975. A China assinou.como Japão 15 contratos de campus de
se esforça por combinar uma tecnologia avançada,uma tecnologia fábricas,dos quais 13 unidadespetroquímicos.Por seulado, a China
média e ainda técnicas artesanais ou semi-industriais, polítca assu- começou a vender petróleo(cuja produção regista uma subida espec-
mida pelo atraso do país, embora apontando o caminho para uma tacular; 50 milhões de toneladas em 1973, 100 milhões em 1976)
modernização. modestamente ainda: 1,2 milhões de toneladasem 1973, 4 milhões
Por outro lado, para atingir os objectivos do plano, principal- em 1974, 8 a 10 milhões em 1975, com tendênciasa aumentar.Ven-
mente os objectivos agrícolas, foi necessário desenvolver a produção das que se efectuam sobretudo com o Japão. O petróleo que repre-
de adubos químicos. Como o rápido crescimento interior não foi su- sentava apenas 3,3 % das exportações chinesas para o Japão, repre-
ficiente, a China -encomendou ao estrangeiro, em 1972-73, dez gran- sentajá 25 % em 74 e semdúvida tenderá a subir em 75. Apesar
des fábricas de adubos químicos. Este aspecto da sua política comer- disso, o comércio com o Japão revelou um défice para a China de
cial é importante.O simplesfacto da China comprarcaro(ao preço 300 milhões de dólares; com os EUA o défice em 1974 era de l bi-
do mercado mundial) estas fábricas, mostra a urgência da República lião de dólares. Este défice da balança comercial, que em 1974 atin-
Popular em atingir o objectivo fixado, quer dizer, um verdadeiro giu mais de l bilião de dól-ares,já não pode ser compensado
pela
«arranque» agrícola. entrada de divisas graças às transferências efectuadas pelos chineses
Pelos imperativos do seu desenvolvi-mento, a China é obrigada do ultramar. O governo chinês começou a ter necessidadede recor-
a voltar-se para o mercadocapitalista internacional começandojá a rer a pagamentos diferidos, isto é, ao crédito capitalista, embora
sofrer algumas consequências. prudentemente.
Desde finais de 1972 a 1974, a China comprou por 2,8 biliões Apoiando-se nas entradas de divisas provenientes do petróleo,
de dólares fábricas e material tecnológico, equivalentes a 35 empre- os chinesespodem utilizar o crédito (sob a forma de crédito a curto
sas totalmente equipadas. As principais encomendas foram feitas prazo -- 5 anos em geral). É preciso dizer que a recusa tradicional
ao Japão (800 milhõesde dólaresBum total de 2,2 biliões em do crédito, no desejo louvável de independência, foi levado muito
1973-74), à Fiança (560 milhões de dólares) e à Alemanha ocidental longe: o monopólio estatal sobre o comércio externo rigorosamente
(295 milhões de dólares). aplicado, a recusa de qualquer investimento estrangeiro na China,
A Grã-Bretanha teve, sobretudo, encomendas importantes de mes;monuma base mista, são uma protecção suficiente. E as lamú-
aviões 7'riZemf. rias dos capitalistas face à rigidez do sistema económico chinês atesta
O lapão é por conseguinte,o primeiro fornecedorcomercialdo a eficáda da protecção.
conjunto da RepúblicaPopular da China com 2 biliões de dólares Mas os progressosdo comérco externo chinês não são um fim
em 1973 e 3 biliões em 1974. O comércio com os EUA, que aumen- em si. Ligam-se a objectivos precisos como já o diss-emosatrás. Depois
tou bastante em 1973, aumentou 300 % no decurso dos seis pri- de cinco anos de crescimentodeste comércio(espectacular a partir

244 24j
Y'
de 1973), os chinesesdeixaram de encomendarequipamentos e fábri- mais ainda, pernicioso, pois enfraquecea Europa capitalista face à
cas. É provável que se tenham fornecido do suficiente para cobrir URSS. E sabe-setodo o valor que os dirigentes da burocracia chi-
os objectivos do plano actual ( 1971-75). Além disso, são plrecisos nesadão a uma Europa capitalista forte e unida. O que fez delesos
alguns anos para assimilar novas tecnologias(para a compreender e mais acérrimosdefensores-- os únicos que o fazem com energia--
sobretudopara -areproduzir e para não dependerdo exterior para da unidade europeia e do Mercado Comum. É o apelo à unidade eco-
p6-la a funcionar e abas'tecer-sede peças sobresselen'tes) . Quanto nómica, política e ao reforço militar do mundo capitalista europeu
às importações de trigo a-mexicano,parece que estão em vias de dimi- que vem de Pequim.
nuir radicalmente.
No entanto, ao lermos a imprensa chinesa oficial vemos que a
É com o quinto plano (1976-80) que se poderá descobrir as ten- crise está eminente. Mas, à força de preverem sempresituaçõesca-
dênciasa longo prazo. Uma coisa é certa: a China entregou.sea tastróficas os dirigentes chineses(e russosl) deixaram de acreditar
objectivos económicos ambiciosos. Sem voltarmos ao período do nisso (rebater e recear esta crise). A uma visão oficial tradicional-
primeiro plano e do «grande salto em frente», onde existiam alvos
mente esquemática corresponde uma percepção oficiosa de um uni-
precisos (no espaço de 15 anos ser capaz de alcançar a Grã-Bretanha,
verso ocidental talvez frágil -mas não ameaçado nem pelas derroca-
a terceira potência industrial da época), trata-secontudo de atingir
das económicas nem pela subversão social, salvo a subversão repro-
em menos de trinta anos o nível das maiores potências económicas.
vada dos PC <<àportuguesa>>-- portanto pelo <<social-imperialismo»--
Isso vai implicar um crescimentoimportante, mais elevado do que
objecto do receio comum dos Chineses e dos Americanos. Na verdade
na última década. Como irá esta opçção ser combinada com a primazia
do político, com as inúmeras «revoluções culturais>> previstas? Isso a história não chegou ao fim dos seus paradoxosl Esta espantosa

não está indicado. Mas é evidente que existe um compromisso de distorção, este objectivo a curto prazo, favorece o capitalismo oci-
envergadura quanto ao futuro do regime, das suas formas de domí- dental, num passo difícil, o que se não esperavada parte da China
nio social, e das suas relações com o mundo. <<revolucionária».E não falamos no apoio eleitoral aos piores reac-
cionários do género do dirigente democrata-cristão alemão M. Strauss
acolhido com todas as honras de um chefe de Estado digno de rece-
O mundo capitalista e a China ber as confidências do «grande timoneiro». ..

A nível da percepçãoda crise por parte da China, nadaé mais


claro. Um facto pareceser provável: os dirigenteschnesesnão O escoamento de mercadorias chinesas
apreendem os aspectosparticulares da crise. No período actual, mais e a crise capitalista
exactamente, caracterizado pela procura predominante das alianças
e contra-alianças de Estado, o inimigo número lé a URSS Que pode representar a China para o mundo capitalista em crise?
(a URSS pois este país é conhecido como um imperialismo dinâ- No fundo bem pouco, sob o ponto de vista comercial,pelo menos
mico, ascendente,
e para além disso,vivendo na fronteira em con- a curto prazo, e portanto para estacrise. Seis ou sete mil milhões de
traste cam o imperialismo americano,de certo modo forte, masenve- exportaçõespara a China, das quais 80 % são oriundas das países
lhecendo e talvez mesmo em declínio). A crise económicado Oci- capitalistas é pouca coisa e contudo é já produto de um aumento
dente capitalista toma-se desde então, um fenómeno secundárioou considerável. A capacidade de absorção do mercado chinês é limitada

246 247
e regulamentada(emfunção do plano e de certas urgênciasagrí- lidas apenasIhe custavam345 milhõesde dólares,masem 1973,
colas). tinha que pagar 840 milhões de dólarespor 7,7 milhões de toneladas.
Mas, é verdadeque se não devepâr de parte qualquermercado Somasgastas em resultado de dificuldades ou da insuficiência da
principalmente as poucas firmas em que se realizaram vendas im- agricultura chinesa e não de um desejo de uma situação melhor:
portante, como por exemplo a firma Kellog (EUA) que, em 1973, para a economia chinesa estas são despesas lateralmente extraordi-
obteve dois contratos de 205 milhões de dólares ou o grupo francês nária:s.

Technip e Speichem,que concluiu em Setembro de 1973 um con- A subida de preço do petróleo funciona em sentido inverso. Um
trato de 300 milhões de dólares para uma empresa petroquímica. autor(') tentou avaliar as possíveis entradas de divisas resultantes
Mas, só algumasfirmas é que beneficiaramdessescontratos (no das exportações chinesas de petróleo. Em 1975 e 1982 segundo esse
total para 1973, 1246 milhões de dólares e 747 milhões de dólares autor japonês,a China poderia vender 137 milhões de toneladasde
para os 8 primehos mesesde 1974). Em relaçãoàs dificuldades do petróleo o que Ihe importaria em 27,2 mil milhões de dólares.Estes
capitalismo foi inisório. Beneficia mais a China com a tecnologia dois números são bastante arbitrários (dependemdas possibilidades
que adquiredo que ganhao Ocidentecom as vendasque realiza. de venda e do próximo preço do petróleo, ambos incertos). Mas
Tanto mais que os Chinesesfarão enormesesforçospara dominar eles indicam possíveis entradas importantes que ajudariam ao finan-
as tecnologias,para as reproduzirem e até mesmopara serem eles ciamento dos próximos planos quinquenais que, precisamentevão
próprios a melhora-laspara dependeremo menospossível dos futu- implicar rápidos ritmos de crescimento.
ros fornecimentos. Pelo menos foi a opção escolhidas A crise provoca um outro efeito: a concorrência internacional
Deste modo, o comércio com a China ameaçacontinuar a ser o leva à diminuição dos produtos chinesesexportados.Ora, precisa-
que foi desde o século XIX: o Eldorado prometido que se revela mente, depois de 1973, a China tinha aumentadoos seus preços
decepcionantena prática. Comprar tecnologias, cereais,vender o seu que, deste modo se aproximavam dos preços correntes do mercado
petróleo, é a pior hipótese provisória(espera-se) para a China. mundial. Pareceque, na conjuntura política da época(empurravam-
A Chinavisa a autonomiaeconómicapara não dizer a autarquia. -se uns aosoutros para reconhecerema China, para seremos pri-
meirosconvidadosa ir à China e a receberas confidênciasdo«presi-
dente>>),e apostandonum comércio mundial em contínuo desenvol-
A China e a oscilação dos preços vimento, os Chineses pensavam encontrar um comprador. Acima de
no mercadomundial tudo, contavam com a boa vontade -- principalmente política --
dos Japoneses.
Todavia o Ocidente, obriga a China a suportar à sua maneira No entanto, foram estesúltimos que mais nitidamente se recusa-
as crises e irregularidades. Não esqueçamosque a subida de valor ram. O Japão duramenteatingido pela crise obrigou os Chinesesa
do comércio externo é em parte resultante da inflação. Por outras diminuírem o preço do seu petróleo que é mais caro do que o do
palavras,é devido à inflação que a China deve consagraruma parte seu concorrente indonésio(pois é facturado em Yuan chineses e não
maior dos seus lucros (na verdade crescentes) à compra de uma em dólares em vias de desvalorização).
É possívelque, tendo em
mesmaquantidadede produtos.É bastantenotório no que respeita
à compra de cereais: em 1966, a China comprou 5,6 milhões de tone- (:) Tatsu Kamlara:<<Thepeuoleum indusuy in China», em The China
ladas por 400 milhões de dólares; em 1972, 4,8 milhões de tone- Quarterly, Dezembro 1974, p. 719.

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r
conta um transporte menos demorado, os Japonesestenham feito e 60 fosse mais importante do que o da China. Consequentemente,
um bom negócio.Os Chinesesforam obrigadosa ceder; as nego- uma relação de forças económicas(mas também de tecnologia indus-
ciações foram difíceis segundo parece, e os Japoneses ameaçavam trial e militar principalmente em relaçãoao EUA) que só ia dar des-
parar com as importações de petróleo. Vê-se que estamoslonge do vantagensà China. Este país embora, progredindodepressa,man-
fim de 73, na épocado bloqueio árabe!O que implica uma relação tinha-se a grande distância do mundo capitalista desenvolvido (bem
de forças que apesarda crise, estálonge de ser a favor da China. como do seu ex-aliado, actualmente inimigo: a URSS).
Mais ainda: a China procura não só tecnologia mas também os ce- Hoje, na fase lenta de um menorcrescimentodo capitalismoe
reais indispensáveis. E depois, a'sboas relações, é certo, mas <<business no momento em que a China continua a apostar num desenvolvi-
is business>>(:)! Em relação aos produtos têxteis que representam mento rápido(mais rápido -- segundo parece -- que o da década
alguns 25 a 30 % das exportações chinesas, os seus preços de venda que acaba de terminar), esta situação de atraso persistente pode in-
na feira de Xangai, em ]lins de Março de 1975 eram inferiores em verter-se e a China poderia começar a compensar o seu atraso. O es-
40 % aos de um ano mais cedo. Em contrapartida a República Popu- forço no sentidode dominaruma tecnologiade vanguardavai no
lar da China conseguiu manter preços praticamente duas vezes mais mesmo sentido.
elevados para os seus fornecimentos de víveres e de serviços em O que significa que, a's relações de forças isto é, a pressão
Hong-Kong, que se elevaram ao total de 6 mil milhões de dólares do mercado mundial capitalista, as obrigações militares, diplomáticas
de Hong-Kong em 1974. e principalmente a da«norma mundial», insidiosa, no -sentidodaquilo
que está ao nível do consumoagrícola,dos bens, dos serviços,de
um país desenvolvido -- poderiam tornar'se -menos desfavoráveis.
A evolução das relações de forças Não é necessáriosubestimar a tensão insustentável -- a prazo -- num
país como a China onde a população agrícola seria a grande maioria,
A evoluçãodo capitalismo,pelo contrário,põe a nu um facto vivendo em condições difíceis e onde várias centenas de milhões de
até agora descuidado e que está em oposição com o que acima foi dito. agricultores não produziriam mais do que algum-smilhões dos seus
Se compararmos o desenvolvimento económico da China em rela- homólogosamericanos.É essauma base muito limitada para a cons-
ção ao da URSS dos anos 30 e do mundo capitalista da época -e de trução do socialismo.E seja qual for a valorização que os dirigen-
hoje, um facto nas salta à vista; a URSSnão só progrediu depressa tes chineses dêem à sua situação actual, eles estão bastante conscientes
em absoluto(sob o ponto de vista industrial) mas o seuprogresso do carácter insuficiente, necessariamente passageiro do estado actual
foi tanto mais notório quanto a produção do mundo capitalista a-m- da sua economia.
biente em crise («a grande crise») foi pelo menos estacionária senão Sob este ponto de vista-- diferente do seu interessea curto
mesmo em regressão. prazo, enquanto que exportador -- a diminuição do crescimento do
Em contrapartida, o desenvolvimento económico chinês proces- capitalismoé uma boa coisa para a China. Bem melhor seria eviden-
sou-seface a um mundo capitalista em plena expansão.Se, por exem- temente, um socialismo europeu e americano que ajudariam a China,
plo, compararmosa China com o seu vizinho capitalista japonês,é m'as isso. . .
provável que o crescimento económico deste último nos anos de 1950 Para que a China atinja os resultados ambicionadose legítimos
a que se propôs -- que os dirigentes propuseram às massasmas que
(') Em inglês no texto.«Negócios são negócios». (N. do T..) tem provavelmente a simpatia destas--, é necessárioque o mundo

2j0 2j]
ambiente não evolua muito depressa(e, se possível, não progrida
mesmo nada).
Toda estadiscussão
especulativatem um âmagoque os diri-
gentes chineses em primeiro lugar -tendem a esquecer. A autarquia
2 A LUTA POLÍTICA APÓS A MORTE DE MAO

económica, o «socialismo num só país» -- pobre de aumentos -- é,


LIVRO MAITAN
mais do que nunca impossível. A experiência da China após a da
Rússia, comprova-o. E isto a um nível duplo. Os países atrasados 14 de Setembrode 1976
não podem aceder a um estado económico muito desenvolvido -- sem
que este desenvolvimentonão implique coacçõese pressõessobre
as massas-- se não se apoiarem nas forças produ-uvasdos países
mais desenvolvidos. Mas, a autarquia <<socialista»
é impossível, sobre-
tudo porque o mundo ambiente capitalista exerce as suas pressões
que obrigamou a u'm isolamentoface ao mundoexterior, isto é, a
autarquia na penúria persistente, ou a uma abertura e, então é difícil A morte de Mao suscitou reacçõesque, noutros tempos, teriam
de controlaro que se importa; máquinase/ou um outro sistema pareddo paradoxais.O principal representantedo capitalismo ame-
social? É certo qua se está longe, com -aChina que se protege com ricano referia-se-lhe como«desaparecimento trágico>>e os seuscola-
êxi-to, pagando caro o que importa mas, de momento, apenas em dóla- boradores nãa ocultaram as suas preocupações. Em Moscovo, publi-
res. Mas, qual o futuro? E depois,a degenerescência
não está tam- camente e por forma indecorosa, manifestou-se satisfação e espe-
bém numa transição para o socialismo«num só país» cujas parti- rança. Estas reacçõesestão em relação evidente com a linha de polí-
cularidadessão as de um poder burocrático que defendeos seus tica internacionalque Mao tinha adoptadonos últimos anãsda sua
privilégios? vida. No fim das anos 50, acusouos burocratasdo Kremlin de capi-
tular ante o imperialismo americano.Depois, escolheuuma posição
de equilíbrio entre as duas<<supel:potências»,para adoptar final-
mente a tese do <Ksocial-imperialismo>>
como inimigo principal. E disso
tirou todas as consequências:desde censurar os capitalistas ociden-
tais por não se armarem suficientemente e por serem demasiado con-
ciliadores cam Moscovo, até aos passosde valsa com os Fanfani e os
Strauss.
Contudo, a figura de Mao foi contraditória. A avaliação histórica
do seu papel não pode deixar de evidenciar essadimensãoessencial
da sua abra.

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Y'
do nosso século. Mas, depois de já ter introduzido certas concepções
Uma figura histórica sob o signo da contradição e métodos de gestão burocrática nas zonas libertadas e de ter pro-
Desde 1927, fazendo -àsua maneira o balanço da derrota da re- cedido a uma estalinizaçãodas estruturas do Partido, uma vez che-
gado ao poder presidiu a um processorelativamente rápido de buro-
volução de 1925-27, Mao tomou uma posiçãocrítica perante a linha
cratizaçãodo novo Estado operário. Dado o seu papel de primeiro
imposta à China pelo Komintern estalinista e esboçouposiçõesque
se diferenciavam das da direcção do Partido. No entanto, absteve-se plano e o seu prestígio, toda a tentativa de o ilibar desta responsa-
de contestarabertamente
a ortodoxiado estalinismo,fazendosuas bilidade e de a fazer recair sobre os outros dirigentes, apenaspode
certas concepções estalinistas e pondo em execução métodos de orga- ser apologético.Todavia, é certo que, a partir dum dado momento,
nização e direcção fundamentalmenteburocráticos. Sem deixar de começoua alarmar-secom o que ele próprio definiu como um«pro-
propagar ideias mais ou menos clássicassobre o papel primordial cesso de alienação>>na relação com as massas. Durante um período
da classeoperária, pressentiu a importância fundamental do papel que viu amadureceremprofundas e múltiplas tensões,tomou a ini-
que devia representar o campesinatono contexto específicoda China ciativa da chamada <<Revolução Cultural», apelando para as massas
dessa época e, designadamente,na perspectiva duma guerra prolon- mais ainda do que noutras ocasiões,para as massasestudantis pri-
gada. Por diversas vezes defendeu posições ainda mais à direita do meiro e depois também camponesase operárias, ainda que fazendo-o
que as dos outros partidos comunistas.Não só preconizou, mas até com uma maior reticência.
seguiu uma política de colaboração com o Kuomintang de Tchang Proclamouque as massasdecidem de tudo. Mas, na realidade,
Kai-chek, e, durante a 2.' guerra mundial e o período imediato, pro- construiu e a seguir reconstruiu, na fase final da «Revolução Cultu-
curou um compromissocom o velho ditador. Documentosameri- ral», um aparelho centralizado e tendencialmente monolítico, baseado
canospublicadosjá nos anos50, confirmamque, seo acordonão se num paternalismoautoritário que culminou no culto da persona-
realizou, isso se deve à recusade Tchang Kai-chek. Mas apesarda lidade. Apoiou a necessidadeduma luta intransigente contra o im-
vontade de colaboraçãoe de compromisso, Mao nunca cedeu, de perialismo. Durante alguns anos, criticou severamentea política de
facto, num ponto essencial.Não renunciou à independênciado seu Moscovo perante a burguesia de diversos paísescoloniais e neocolo-
exército, que em nenhuma ocasiãodissolveu e integrou no exército niais. Mas apoiou sem reservas a colaboraçãocom a burguesia, que
do Kuomintang, mesmo quando havia convergência de luta contra conduziu à trágica derrota do partido comunista indonésio e à para-
as forças armadasdo imperialismo japonês. No momento decisivo lisia dos seuspartidáriosno Paquistãoe no Bengalaocidental.Mais
do novo ascensorevolucionáriodasmassas,posto frente a uma esco- tarde, após 1970, pâs-seao lado do governo do Ceilão quando em-
lha inelutável, tomou a cabeça da insurreição camponesacontra as
penhado numa repressão feroz, esquivou-se a qualquer condenação
classesdominantes e o apareço do Kuomintang. Não atendeu aos
da ditadura de Pinochet e adoptou uma hipócrita posiçãode equi-
consehos de Estaline, convidando-o a concluir a todo o preço um
líbrio na guerra civil de Angola. Quis apresentar-secomo o inspi-
acordo com Tchang Kaí-cllek, e conduziu o Exército Vermelho à
rador da luta contra a burocratização,por ele próprio considerada
conquistado poder.Dez anosmais tarde, chamoua si o papelde como uma restauraçãocapitalista. Mas, para além das críticas e dife-
porta-voz da crítica de esquerda à política dos dirigentes do Kremlin
renciaçõesde prática, considerou Estaline até ao fim como um grande
e dos diversos partidos comunistas.
revolucionário e como um dos mais importantes teóricos do mar-
Durante 40 anosMao esteveà cabeçadum partido que dirigiu xismo.
uiDâ revolução socialista que foi um dos acontecimentosmaiores
2jj
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l
Mais do que qualquer outra, a figura de Mao reflectiu, de ma- E necessáriolembrar certos traços específicos do modo de direc-
neira concentrada e quase simbólica, as contradições de toda uma ção -maoístae do seu exercício do poder, sensivelmente diferentes dos
impostos por Estaline na URSS nos anos 30 e 40. Esse modo de
época histórica. Lenine desapareceu da cena poucos anos após Outu-
bro. Passouà história como o dirigente da l.' RevoluçãoSocialista. agir pode sintetizar-seno esforço de manter laços mais directos e
Trotsky, vencido por efeito das relaçõesde força do período em que mais vivos com as massase até de recorrer à intervenção das pró-
prias massas-- mais ou menos controlada e canalizada-- nas fases
conduziu a luta contra a burocracia, tornou-se o símbolo da defesa
particularmente difíceis.
intransigente das conquistas da Revolução. Estaline, figura apagada
antes de Outubro, tomou dimensõeshistóricas como protagonista Primeiro para resistir, depois para conquistar a vitória numa
guerra revolucionária ásperae prolongada, Mao teve não só que se
da contra-revolução burocrática. Como já vimos, Mao foi, ao mesmo
apoiar sobre as massasmas também-que apelar para a suaparticipa-
tempo, o principal dirigente duma revolução e o primeiro respon'
ção activa. Por forma análoga, teve que procurar obter uma certa
sável da degenerescência burocrática do Estado operário saído da
imobilização das massas quando empreendeu -:xhficar uma sociedade
Revolução. Como dirigente da revolução vitoriosa, contribuiu para
nova partindo de basesmaterialmente ainda mais atrasadasdo que
infligir uma derrota histórica ao sistema imperialista mundal. Ao as da Rússiade 1917 e tendo que fazer faceà sabotagemdo impe-
mesmo tempo, porém, não abandonou a concepçãoestalinista do rialismo. Eis porque, am certos períodos e apesar da degenerescência
socialismo num só país e da subordinaçãoaos interessesdo seu Es- burocrática,existiu na China o que S. S. Wu definiu, com certa -apro-
tado dos interesses da luta revoluci(Daria das massas mundiais.
ximação, como uma «democracia horizontal» (ou seja, um certo grau
de autonomia de decisão, a nível local, na escolhadas formas de apli-
cação das orientações gerais definidas pela cúpula). Assim se explica
Um papel insubstituível porque, em certos momentos, Mao e outros dirigentes se voltaram
para as massasa fim de sair de situaçõesconflituosasou de paralisia
O desaparecimento dum homem que teve uma tão grandeim- no seio da direcção do Partido.
portânciana história da China contemporânea,
representaincontes- Tiveram naturalmente o cuidado de sempre arranjar as coisas
tavelmente um elemento de ruptura destinado a provocar desequilí- de modo a dar um quadro preciso aos movimentos que suscitavam,
brios bastante profundas. para poder canaliza-la. A experiência dos últimos mesesde 1966 e
No momento da morte de Estalhe, os marxistas-revolucionários dos primeiros mesesde 1967 demonstraram-no,ao contrário de toda
sublinharam o papel essencial que a sua personalidade tinha desem- a interpretação justificadora. Mal alguns sectoresde massashaviam
penhado quanto a assegurarcerta coesãoda castaburocrática e quanto começado a agir segundo a sua própria dinâmica, perseguindo objec-
ao funcionamentodos mecanismos de direcçãodo Estadoe do Par- tivos que não eram os previstos peia direcçãomaoísta,logo estanão
11
tido. Sob diversospontos de vista, o papel de Mao foi ainda mais hesitavaem recorrer não só a uma espéciede terrorismo ideológico
l decisivo. Tal como Estaline, manteve reunida a camadaburocrática maciço, mas mesmo e em ú]tima instância à repressão(]embremo-nos
dominante e figurou como o único possuindo a autoridade neces- que foi jus-ta-mentea provocação de tais situações de tensão e de ex-
sária para dizer a última palavra quando dos mais graves conflitos. plosão que levou Mao a apoiar-se no exército, que assumiu durante
Porém, o <<bonapartismo>> de Mao não se exercia apenas no interior um certo tempo uma funçãode primeiro plano). Tudo isto não
da burocracia mas também sobre a sociedadeno seu conjunto. obsta a que, na <<sistema»
de Mao, seja diferente o papel reservado

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17
às massas,e que solicite da parte delasuma participaçãomais activa contrascom visitantesestrangei-ros,
tanto Mao como Chu En-lai
do que na épocade Estaline e post-estalinista.O facto de temasdemo- sempre insistiram sobre o atraso e a pobreza persistentes na CI)ina.
crático-revolucionários e igualitários terem sido avançadospor várias Há que lembrar que, após as violentas poléiúcas com a URSS
vezes não podia ficar sem consequências, apesar do carácter essen- nos anos 50 -sobre a sua política de crescentes relações econóiúcas
cialmente táctico e instrumental de tais apelos. De facto, ajudavam com paísescapitalistas, a China passou a seguir cada vez mais sis-
objectivamente as tendências das massase dos seus sectores mais tematicamente a mesma via, não só procurando alargar as trocas
maduros a fazer sentir a sua presençae a dar um conteúdo ehctivo comerciais mas também comprando, aos paísesocidentais e ao lapão,
à<<democraciahorizontal>>admitida pelo grupo dirigente. máquinas e até complexos indusuiais inteiros. Em dado momento
Semelhante prática de exercício do poder e um tal método de no entanto, essapolítca esbarrou com a exigência, apresentadacomo
direcção, exigiam um chefe carismático,dotado do prestígio neces- norma pelos dirigentes chineses,de não se endividatem para com
sário para mobilizar as massasnos momentosdecisivose para impor, l o -estrangeiro.A confirmar-se esta atitude de forma rigorosa, a sua
sem perda de tempo, a disciplina e o«retorno à normalidade», exi- consequência seria UH afrouxa-tnento e não uma aceleraçãodos ritmos
gência esta essenciale ainda mais importante do que o era a posi- de desenvolvimento industrial, pelo menos em certos sectores. Uma
ção de Estaline no sistemade gestãoburocráticado poder imposto política de auto-suficiência tendencialmente autárquica, pode ser uma
na URSS. Neste sentido, Mao de nenhuma maneira pode -sersubsti- escolha obrigatória em certas circunstâncias, mas, a longo prazo,
tuído. A suamorte introduz um elementode desequiHürio,por assim terá consequências muito negativas(não esqueçamos que, durante
dizer<<estrutural», no sistema político cl)mês. alguns anos, a China -teve que, silmultaneamente, fazer face ao blo-
queio ou semiblaqueio persistente dos imperialistas e à aberta sabo-
tagem dos burocratas de Moscovo). A julgar pelas alusões contidas
Tensões na sociedade chinesa em certas polémicas,esteproblema já se pâs de forma conflituosa
no seio do grupo dii'agente. É muito provável que se ponha de futuro
Para poder adiantar hipóteses sobre os desenvolvimentospos- por forma ainda mais viva, se bem que o desenvolvimentodas ex-
síveis na China depois de Mao, é necessáriolembrar, sumariamente portações de petróleo possa atenuar essa contradição.
e a título indicativo, algumasdas tensõesque subsistemao nível Algumas rápidas consideraçõesacercada agricultura. A própria
estrutural e político. Com efeito, essastensõesnão foram elimina- Chia maoístanão pede subtrai-se ao dlema enfrentadopelas socie-
das pela <<Revolução Cultural». Durante o período que se he se- dades de transição burocratizadas que se têm desenvolvido a partir
guiu concmtizaram-se mesmo certas delas. dum baixo nível de desenvolvimento(factor que não pode ser esque-
Segundoos dados oficiais, no decurso dos últimos anos a econo- cido, ]nesmoque pese a certos neo-utopistas).Uma primeira opção
mia chinesaregistou sucessosque não são contestadospelos peritos consiste, após as reformas radicais da primeira fase e por um período
das mais diversasorientações.Mas globalmente,e durante um longo indeterminado, não em aceitar a sobrevivência de relaçõesnão colec-
período, os ritmos de desenvolvimento mantêm-se relativamente tivistas, mas antes relaçõesintermédias entre uma agricultura parce-
limitados. Isso não só significa que os níveis absolutosatingidos são ]izada ou de modo cooperativo e uma agricultura colectivista, com
ainda modestos,mas também que em certos sectoreso desnível entre as consequêndas económicas e os riscos sociais decorrentes. Uma
a China, a URSS e certos países capitalistas, não diminui e até ameaça outra opçãoconsisteem forçar o ritmo da colectivização,
com
aumentar. É significativo constatar que, quando de numerosos en- abstracçãoem larga medida das possibilidades reais de mecaniza-

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ção, correndo o risco de rupturas dramáticas com as largas massas
r dade e o campo,com febres-sosnão autor:içadosà cidade.Há o risco
camponesas, e, em última análise,de repercussõesprejudciais para de se criarem deste modo camadasde jovens desenraizados,privados
a própria produção. Este problema, que nunca foi resolvido, esteve de uma inserção estável na sociedadee, por isso, tentados a move-
na base das escolhas cruciais nos campos, desde o lançamento maciço rem-se à margem desta. Segundo certas interpretações cujo funda-
da cooperativização a meio das anos 50, até à tentativa acentuada- mento não podemos controlar, situaçõesdeste género estariam na
mente voluntarista das Comunas Populares de 1958 e às rectificações base do aumento da criminalidade que se teria verificado recente-
ulteriores. Par um lado, com referência aos númerosoficiais, os mente em certas cidadese de que a própria imprensaoficial fez
ritmos de desenvolvimento da produçção agrícola mantiveram-se sem- menção.
pre moderados, o que é .tanto mais grave quanto é certo que a China Uma série de problemas e de tensões colocam-se a um nível mais
registaum importantecrescimento
populacional.
Por outro lado, directamente político. A análise dos marxistas-revolucionários pâs à
os camponesestendem a dispensarmais tempo e esforçosà suapro- . luz, desdeo início, o facto do E:atadooperário cllinês se caracterizar
dução individual clo que à produção colectiva. As consequências pela ausência dum tecido de organismos de democracia proletária do
fazem-se sentir ao nível económico geral primeiro, e ao nível social tipo soviético, e mesmo pela existência duma certa perenidade dos
depois,na medida em que é inevitável que subsistame até que se aparelhos de administração pre-existentes(a nefasta influência deste
aprofundem, nas condições actuais, as diferenciações entre as diver- último elemento foi denunciada pelos próprios maoístas durante as
sas camadas de camponeses. polémicas de 1966/67) . Além dos organismos locais, a Constituição
A par com os problemas postos pelas dficuldades do desen- chinesa previu a eleição de uma Assembleia Nacional Popular, que
volvimento económicoe em particular pelos problemasda agricul- deveria ser a verdadeira depositária do poder. Mas na prática, quando
tura, certos índices mostram-nos que uma série de tensões sociais se reuniu, a Assembleia não teve outra função senãoa de registar
continua a manifestar-see mesmo a agravar-se.Para dar ulm só as decisões tomadas fora dela, ou seja, nos organismos dirigentes
exemplo, produziram-sedificuldades e contradições a partir dum do Partido(não esqueçamos
que a concepção
maoístaatribui ao Par-
certo momento,quandose tratou de integrar asnovas geraçõesno tido uma função de controle e de direcção absolutos, análoga à con-
tecido económico. Surgiram então desequilíbrios devido, por um cepção em vigor post-Estaline) . Dada a impassibilidade prática, para
lado, ao peso por enquanto limitado da economia industrial e urbana os organismosdirigentes restritos, mesmotomados em sentido lato,
e, por outro lado, em consequência do acesso maciço à instrução (que, ou seja, incluindo todas as suas diversas articulações, de verdadei-
convém lembrar, é uma das principais conquistas da revolução). ramente decidirem de todos os problemas que $e põem a um país
A existência de tais problemas manifestou-se, por exemplo, quando imenso e tão povoado como a China, subsiste objectivamente certa
das polémicas respeitantes aos«jovens instruídos>>enviados ou reen- margempara o exercícioduma«democraciahorizontal». Por outro
viados para trabalhos rurais. De momento, trata-sede sectoresrela- lado, tendem a constituir-se poderes regionais ou locais, relativa-
tivamente pequenos,mas que, apesar de tudo, contariam cerca de mente autónomos. Disto resulta uma situação de instabilidade, plena
12 milhões de jovens,segundoos númerosapontadosno artigo de de conflitos.Na realidade,por diversasvezes-- e não só no mo-
Wu, já citado. Estes jovens nem sempreaceitamde bom grado a mento mais dramático da cri-sede 1966/67 -- as massastentaram
sua deslocação para o campo, aonde as condições de vida são em ge- dar conteúdosmais concretosà«democracia horizontal». No seio
ral mais duras e aonde raramente são acohidos com entusiasmo pelos da burocracia desenvolveram-se tendências centrífugas. As repetidas
camponeses. Constatam-se assim movimentos pendulares entre a ci- polémicas contra personagens que se teriam tornado culpados de

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v'
criar <<lehlosindependentes>>tomam ju-stamente por alvo tendências de restrições à ajuda militar aos combatentes vietnamitas -- retardou
deste tipo. consideravelmenteo 1lim da agoessãoimperialista.
A política internacional concentra, por igual, um potencial de Em segundolugar, a política do grupo dirigente de Pequim sacri-
tensãono próprio seio da burocraciae, com mais forte rmão, entre ficou, em reverência a interesses diplomáticos, aliás di-scutíveis, as
a burocracia e as massas.A morte de Mao poderá constituir um esti- exigências da luta da classe operária e dos movimentos anta-imperia-
mulante suplementar para realizar um balanço de cuja necessidade lista's de diversos países. Consequentemente, não só provocou a
o grupo dirigente certamentejá se apercebeu.Durante todo um pe- perda de prestígio duma direcção que apareceradurante numerosos
ríodo, e ainda agora, a afirmaçãoduma completa autonomia em rela- anos como a protagonista duma revolução vitoriosa, como também
ção à URSSfoi pmveitosa para a burocraciachinesa,tanto no plano facilitou uma regressãoreaccionáriaem diversospaíses,bem como
interno como perante importantes sectoresdo movimento comu- as manobras de várias burguesia-s ditas nacionais. Em última análise,
Msta. Também a polémica contra as du.as<<superpotências»
produziu esta política encontrou-se mesmo em oposição às legítimas exigências
l
alguns frutos diplomáticos e políticos, na anedidaem que pede cor- de defesa do Estado operário chinês.
responder aos interessesde certas burguesias«nacionais» e de certos Depois, no que respeita aos partidos comunistas, o balanço não
Estadas bem como às aspiraçõesde certo número de movimentos deixalugar a dúvidas.A forçade atracçãodo PCCdecresceu
cons-
tantemente após alguns sucessosobtidos na fase inicial do conflito.
de paísescoloniais, que, compelidosa procurar a«amizade» da
A sua esfera de influência encontra-seactualmente reduzida, mais
URSS devido às necessidades da luta contra as potências imperia-
listas, tiveram ocasião de realizar amargasexperiênciasde«colabo- do que nunca anteriormente. Nos próprios movimentos de cxtrema-
-esquerda, para cuja criação a crítica chinesa e a <<RevoluçãoCultural>>
ração» com os dirigentes do Kremlin.
tinham contribuído, por vezes de forma decisiva, os defensoresin-
Mas após quase dois decénios, impõe-se um balanço mais geral,
condicionais das posições de Pequim pertencem cada vez mais à cate-
como mais particularmente se impõe um balançoda linha dos últi-
goria dos paranóicospolíticos, enquanto que tendênciasmais crí-
mos anos, fundada sobre o pressuposto de que o«social-imperialismo»
ticas e mais sofiscadasse sobrepõem(o que se reflecte na mi-
é o inimigoprincipal.Ora, não existemquaisquerdúvidasde que, séria das delegaçõesdos diversos PC-ml recebidasem Pequim e
se a existência do triângulo Washington-Moscovo-Pequim prestou,
cuja existência com frequência é ignorada nos seuspróprios países).
sucessivamente, serviços tácticos conjuntural-s a cada uma das partes, Tarde ou cedo, porém, uma contradição fundamentalsurgirá,
o benefício maior foi globalmente favorável ao imperialismo ameri- sob forma mais ou menos aguda,para além do balançode quinze
cano. Tomando apenascomo exemplo o episódio central dos dez anos e das dificuldades conjunturais. Quaisquer que sejam as diva-
últimos anos,o conflito sino-soviéticonão impediu a derrota impe- gações teóricas maoístas ou as 'mistificações da propaganda, a natu-
rialista no Vietnam. Mas não se deve esquecerque a própria acui- reza social da URSS é análoga à da China e qualitativamente dife-
dade do conflito sino-soviéticoampliou:amargemde manobrada rente da do.sEstadosUnidos e dos outros paísescapitalistas.Este
Casa Branca e do IÀentágono. De várias documentos ressalta, de ora facto contradiz a tese do«social-imperialismo>> inimigo principal, e
avante, que um dos mais importantes elementosque impeliu Johnson mais ainda as suas implicações práticas. O facto de, por diversas
a lançar-sena aventuraindo-chinesafoi a convicçãode não ter que vezes, opositores caídos em desgraça serem acusados de desejar um
fazer face a uma frente única dos principais Estados operários. Não compromisso com os «social-imperialistas» e de ser seus agentes,
resta qualquer dúvida que essadívi-são-- tal como o longo período (sendodifícil dizer, nos mais dos casos,em que bases)demonstra

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que não se trata de especularsobre o futuro mas de compreender dois últimos anos, várias manifestações mostraram claramente que
o significado de confrontaçõesque já se produziram no grupo di- a situação de novo se apresenta movediça. Ainda em Cantão, houve
rigente. manifestaçõesde soldados licenciados e várias greves espontâneas.
Em Hlang Tcheu, as greves tiveram um tal alcanceque foi requisi-
tada a intervenção da tropa. A manifestação da praça Tien-An-Men,
Movimentos de massa e tendências na burocracia de 15 de Abril último (1976) pode ter sido o lugar de manobras da
tendência Teng-H'siao-ping, como pretendem as fontes oficiais, e ter
Todo este potencial de conflitos poderá actuar a dois níveis, no por origem conflitos interburocráticos. Mas, pelas suas proporções
período que se avizinha, e isso tanto mais que já se manifestou ou -- dezenas de milhares de participantes -- e pela sua dinâmica, ex-
que se manifesta a uma escala-sempremais vasta. prime, em última análise, uma explosão crítica espontâneaem opo-
Em primeiro lugar, as gerações que surgiram e amadureceram l sição ao grupo dirigente do Partido e do Estado.
após 1949 são as que prevalecem-de ora avante. Para as antigas gera- Que irá pas-sar-se
no próximo período? Não é fácil dar uma res-
ções, o ponto de referência essencial tendia a ser a condição da socie- posta, pelo menos na base das raras informações de que dispomos.
dade pre-revolucionária. Por difícil que seja a situação,quaisquer que A batalhano interior da burocraciaserámuito dura. O próprio pro-
sejam os erros e crimes cometidos pelos burocratas, as contradiçções blema da sucessão .põe-se em -termos dramáticos. Não se trata ape-
da nova sociedadepareceminsignificantes quando comparadascom a nas de designar o sucessorde Mao, mas de preencher todos os vazios
opt'estão da antiga China. Para as novas gerações, as conquistas da provocadospelos falecimentos e pelas liquidações políticas nos di-
revolução constituem um ponto de partida para o futuro. A sua ati- versos níveis da direcção(o caso do Comité Permanente do Bureau
tude será, e éo já, determinada pela capacidadeou incapacidadede Político, reduzido a duas ou três unidades,é quaseum símboloduma
resposta da sociedade de transição às suas exigências e pelos progres- instabilidade mais geral). O facto do comunicadoda morte de Mao
sos constantes que tenham lugar em todas os domínios. Em segundo -- e seria interessante conhecer os organismos que o aprovaram --
lugar, não -sóad nível da direcçãocentral mas a todos os níveis do conter ataquesviolentos e repetidos não só contra os«desviacionis-
Partido, vem-seproduzindo ou está em vias de se produzir, sempre tas>>do passado mas também contra a mais recente vítima, Teng
mais rapidamente, um processo de substituição. Os dirigentes e os Hsiao-ping, é indicação segura duma situação de persistente tensão
quadros «históricos» desapareceme são substituídos por dirigentes e de receios do grupo vencedor dos afmntamentos dos primeiros
e quadrosque já não poderãoreclamar-se
do pKstígiode protago- mesesdeste -ano (1976). É provável que o primeiro «round» venha
nistas da revolução. Serão julgadas na base do seu comportamento, a terminar por uma soluçãode compromisso.De resto, a própria
do seu sucesso ou insucesso actuais. escolha de Hua Kuo-feng representa uma solução deste tipo.
Finalmente, Mao desapareceuda cena num momento que, longe Ein termos mais gerais, não há dúvida que a tendência mais di-
de ser de estagnação ou de desmoralização das massas, se caracteriza rectamente representativa do aparelho se encontra objectivamente
por uan reascenso da combatividade e d-asensibilidade política, e pela reforçadapela morte de Mao, o único que o podia contrariar com
reaparição de quadras críticos, capazesde tomar iniciativas corajosas. sucesso. Apareceu como mais conservadora durante :a «Revolução
Os primeiros indícios de novos fermentos surgiram já em 1973. Por Cultural», sendo Liu Shao-chi e Teng Hlsiao-ping os seus represen-
exemplo em Cantão, onde, além de outros acontecimentos,circula- tantes eminentes. Pede refazer-se -apósa derrota, e um outra Mao
ram textos de crítica antiburocrática. Mas, sobretudo no decurso das não poderá -ser criado artificialmente.

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O reforço duma tal tendênciaseria, sem qualquer dúvida, apre- Komintern ou do Kominfonn. Muito pelo contrário, retiraria a Mos-
ciado por todos os que aspiram a defender, consolidar ou aumentar covo toda a possibilidadede impor de novo o seu controlee hege-
privilégios, e em primeiro lugar pelos escalõesmais altos da buro- monia, e aumentaria,em geral, o prestígio e a força de atracçãode
cracia. Mas poderiam também inclinar-se a seu favor algumas cama- todos os partidos comunistas.
das de quadros intermédios: aqueles que, de facto, têm os laços mais A morte de Mao abrirá seguramenteum novo capítulo, ainda
reais com as massas,mas que, justamente por isso, tiveram com fre- que pareça ocioso fazer previsões sobre as tendênciasque prevale-
quência que sofrer as consequênciasde certas viragens bruscas e fo- cerão nas próximas fa'ses e sabre as formas específicas que assumirá
ram directamentetomadospor alvo das grandes«campanhas
de a crise do si-stemaburocrático. As massascllinesasentraram num novo
rectificação», quando não se lhes reservou diliberadamente o papel períodode actividadee de reflexãocrítica. As batalhasque irão
pouco invejável de bode expiatório. Podem poi-ssenta a compreen- travar terão provavelmentepor objectivo a melhori.ado nível de
sível necessidade de se subtrair ao regime de duche escocês e de vida, a redução das desigualdades e o exercício efectivo da democracia
f
gozaremdum período de maior tranquilidade. Por último, uma ten- operária. E situar-se-ãonuma perspectiva mais geral da luta antí-
dência deste tipo poderia procurar assegurar-seum certo sucessotem- burocrática.
porada mediante uma série de concessõesde tipo«kruchtcheviano>>, Nessas batalhas, os quadros formados durante estes anos poderão
em direcção a certos sectores do campesinato(a referência a fazer sentir o seupeso.Não é de esquecerque dezenasde milhares
Kruchtchev é puramente indicativa, visto que as condiçõesexisten- de quadros atingiram a maturidade durante a fase mais viva da crise
tes na agricultura soviética quando da .morte de Estahne eram sen- de 1966-67. A coberto da mistificação do grupo dirigente, essesqua-
sivelmente diferentes das que existem actualmente na China). dros empenharam-seem lutas de dinâmica antiburocrática e criaram
A maioria dos comentadores perguntam.se se o após-Mao se carac- formas de organização
variadas.Em certos casos
-- a literatura a
terizará por uma viragem das orientaçõesda política internacional esse respeito encontra-se desde agora largamente difundida -- fize-
da China. Já nos referimos aos problemas que se levantam Hestedo- ram-se esforços de crítica global e de generellização teórica extrema-
mínio, às tendênciasque no passadose manifestaram entre o l)róprio mente interessantes. Os protagonist-as destes acontecimentos foram
grupo dirigente, e às condiçõe.s que acabarão por se manifestar. batidos quando da última fase da «RevoluçãoCultural>>.Foram
Sem nos entregarmos a especulações,podemos avançar a hipótese mesmo por vezes agredidos e em geral marginalizados. Foi inevitável
de que tarde ou cedo se produzirão mutações. Mesmo hoje, há darem-se fenómenos de desmoralização. Mas hoje renovaram-se as
já pressões que se exercem nesse sentido. En-tre outros, Moscovo condições duma retomada de actividade desses quadros. São eles que
teria interessenuma acalmia, mesmaa curto prazo, como o confir- poderão dar a sua contribuição, tanto mais importante quanto o
mam as reacçõesà notícia da morte de Mao. Toda uma série de par- desaparecimento de Mao -tenderá a eliminar a principal obstáculo
tidas comunistas,incluindo os mais importantesno plano interna- à sua compreensão da natureza do regime e da sua direcção, desa-
cional, é partidária não só duma acalmiamas até duma aproxima- parece'mento esseque torna inoperanteo mito dum Mao porta-ban-
ção e duma recomposiçãoda frente dos <<partidos irmãos»: desde deira da luta antiburocrática, ao qual continuavam a agarrar-se.Por
o PC vietnamita até aos mais autorizados representantes do<<euro- outras palavras, podem evitar tornar--se,objectivamente, os instru-
comunismo», sem excluir o PC cubano, apesar da sua actual situação mentos da luta duma fracção da burocmcia contra uma outra e, por
internacional. Todos estão convencidosde que uma evolução positiva uma ligação mais directa às massas,desempenharum papel de pri-
em nenhumcasopoderia reproduzir um monopólio análogoao do meiro plano na luta contra a burocracia no seu conjunto.

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3 A CHINA DEPOIS DA MORTE DE MAO

FRÉDERICCARLIER
14 de Janeiro de 1977

Na noite de 6 para 7 de Outubro último, os soldadosde elite


de gang Tuna-bsinassaltaramama casada citltt4rade Peqaimottde
estavam reunidos ttitlta dos T7zaisaltos dirigentes chineses. Os sol-
dadosda guarda presidettcial pretlãeram, entre outros, Cbiamg.Cbitlg,
Watlg liang-wen, Cbatig CLUB-cbiao e Yao Wen-)aan, os quatro
7xembros do <<grt4pode Xattgai».
Metros dum mês após a morte de Mao Tse-tutig,,os partidários de
Hwa Kuo-tens neutralizauam a tracção do aparelho mais próxima
ão «grande timoneiro>> e tornavam-se senhores da direcção do partido
por nzeio dama «reuoluçao de palácio», sem qt4e os traball)a(lares
chineses reaÚssem. A campanha cotttra o <<battdodos quatro>>podia
col%içar.
Três meses após esta tomada do poder, parece-nos necessário
fazer o ponto da situação na China. Qual a natureza dos atroTlta-
mentos nas prooítzcias cbittesas e das oposições à nooa direcção?
Em qae medida esta é hegemónica e cottsegüiti estabilizar a sua
posição? Também lhos parece importante estudar as nooas orienta-
ções ecollónticas e politicas qae começam a ser adiantadas, pro-
curando uer em qae medida constituem ama ruptura radical em rela-
ção às orientações anteriores.

269
l Três meses de campanha.e de depuração contra importantes greves da cidade de Hangchow eram atribuídas aos
os partidários do «Bando dos Quatro» «quatro», courto propósito de «sabotar>>a produção. Enquanto que
gang }iung.hen era enviado àquelacidade para tentar, -semêxito,
A partir dos dias seguintes à prisão do «grupo de Xangai>>, as convenceros trabalhadoresa retomar o trabalho, e que Tens Hsiao-
cidades chinesas apresentavam-se revestidas de cartazes denunciando -ping se tinha visto obrigada a enviar o exército para«restabelecer
todos «os crimes>>
possíveise imagináveisdos «quatro»e organi- a ordem». Estas informações -- de que os «quatro>>terian) impedido
zavam-se manifestações gigantescas para saudar a vitória de H.ua a difusão, dizem as autoridades -- lançou contudo intensa luz sobre
Kuo-feng. A vitória parecia total e a depuraçãopodia começar.Uma os antagonismos
que existiam na China antes mesmoda morte de
circular convidavaa populaçãoa«denunciar espontaneamente»
as Mao. Para além da unidade de fachada da direcção, desenrolavam-se
partidários dos <<quatro>>a todos os níveis. Alguns destes eram- arras- violentos afrontamentos entre fracções rivais pelos postos de poder
tados até às <<reuniõesde luta>>para aí fazerem a sua «autocrítica» em certas províncias, sobretudo qu-andoda campanha contra Teng
perante as massas. Hsiao-ping
Conquanto a direcção pareça ter hoje a situação «sob controle»,
deve no essencial ter em conta, na aplicação do seu programa, essas
A resistência nas províncias
disposições diferenciadas. Se os dirigentes hoje no poder não parecem
Contu-do, apesar dos ape]os lançadas para«uma disciplina abso- divididos sobre as questõesfundamentais, como era antes o caso,
luta em todo o país» e duma campaiüa de denúncia conduzída<<sob podem existir divergências sobre questões secundárias,tai-s como
It a direcção exclusivadas autoridadesdo partido», a escut.âdas esta- os ritmos de mudança de orientação, a amplitude e os meios de depu-

ções de rádio provinciais demonstravaprontamente a importância ração,sem falar das rivalidades de tipo pessoal entre as diferentes
das resistênciasem numerosasprovíncias. O exército tinha que in- c[ãshoje no poder. É -semdúvida nestequadro que se levantamas
11 questões das nomeações para os postos de direcção do Partido e do
tervir no <<sector
contaminado»da província de Fukien e de resta-
belecer a ordem nas empresas,escolase edifícios admiMstrativos. Estado ao mais alto nível, vagos por malte ou depuração, que nunca
No espaçode algum-s dias, as estaçõesde rádio faziam-seeco de foram preenchidos, bem como o casodo regressode Teng HsiacPping
<<perturbações>>acompanhadas de afrontamentos armados na maioria No princípio de Novembro, numerososcartazesem Xangai anun-
das províncias chinesas. Teriam também sido necessárias instruções ciavam essas nomeaçõespara os principais postos do Estado.
especiais do comité central, acompanhadas provavelmente da acção Li Hsien-men era nomeado primeiro-monstro. Logo que tapados, rea-
do exército, para repor a ordem em Shansie topei, aonde seencontra pareciam mais numerosos no dia seguinte. As autoridades desmen-
a cidadede Paoting. tiam a notícia. No princípio de Dezembro,a reunião do comité per-
Além disso, transformando em boa uma «má coisa», a publici- manenteda Assembleia Nacional não tornara pública qualquer no-
dade dada pelos organismos de propaganda a essas«perturbações» meação. Apenas o ministro dos Negócios Estrangeiros era afastado.
permitia tornar crível o risco de guerracivil, a que o presidenteHua No entanto,tinha figurado nos cartazesde Xangai comopromovido
Kuo-feng fazia alusão, caso os«quatro» tivessem tomado o poder. ao«bureau» político. Estes acontecimentos só podiam explicar-sepor
E isso ao mesmo tempo que se afogavao peixe por meio de um amál- desacordosno seio da equipa dirigente, não hesitando alguns, como
gamacom actosde banditismoou com afrontamentosde diversas em Xangai, em tomar iniciativas para <<forçara mão» aos seuscon-
naturezasque teriam decorrido em data anterior. Por exemplo,as tráditores.

270 27]
Do «contra revolucionário» ao «respeitado camarada» e as massaschinesas,bem cama a relação entre o campesinatoe a
classeoperária e ainda as questões do emprego, do nível de vida dos
É provável que a chave destes desacordos se encontre na questão trabalhadores e do grau de importânci'a dos privilégios burocráticos.
do regressoou não de Teng. E se sim, em que posto? Questão deli- É por isso que as divergênciasno seio do apareço não cessaramde
cada para a nova direcçãoque, no entanto, fez todo o possível para girar à volta da questão do V.' plano quinquenal e da sua aplicação
redourar o brasão deste «antigo partidário da restauraçãodo capi- nestes últimos anos.
talismo», apresentado hoje como um dirigente que cometeu «erros>>. É em Janeirode 1975 que Chu En-lai, na ausênciade Mao
Com efeito, a suaimagem de marcasofreu devido à <<campanha anti- Tse-tuna, apresenta à Assembleia nacional o V.' plano quinquenal.
direitista» lançadana imprensaapós a morte de Chu En-lai, e a vira- Este propõe-seelevar a China«às primeiras fila-s do mundo» antes
gem não pode ser feita com demasiadarapidez para evitar o enjoo do ano 2000, por meio -- diz agora a imprensa chinesa -- da <<mo-
dos quadros intermédios. Porém, quaisquer que sejam as posições dernização
completada suaagricultura,
da suaindústria,da sua
actuais e pessoais do novo presidente a este respeito, as pressões a defesa nacional, da-ssuas ciências e da sua tecnologia». Este plano,
lavar do regressode Teng acentuam-se,e a grandemaioria dos qua- resultado provável dum compromisso no seio da direcção, é de facto
dros reagrupados à volta de Hua é partidária do antigo vice-primeiro- posto em causadesdea morte de Chu En-lai quando do lançamento
ministro. A tal ponto que, na cidadede Cantão,apareceramabun- da campanha contra Teng Hlsíao-pino. Este último é atacado por ter
d-antes cartazes exigindo o«reexame» do seu caso e pedindo o re- insi-stido na consigna «de unidade e de estabilidade», por ter pro-
gresso à direcção do «mais intransigente opositor do bando dos posto a instauração de «normas e regulamentos disciplinares» nas
quatro>>. empresas, etc.
A aparição de cartazese bandeirolas na capital, pedindo o re-
gresso ao trabaho do <<respeitado
cam-atadaTeng>>mostra que no
seio da direcção foram vencidos todas os obstáculos à reabilitação «Revolução» ou produção?
do «pequeno Teng».
Mas, como real teórico e chefe de fila da fracçãono poder -- para De facto, censurava-se Teng, nomeado vice-primeiro-ministro
que posto poderáser nomeadoTeng, e qual a política que deverá nessamesma Assembleia, que aceitou o plano quinquenal, por pedir
aplicar? os meios necessáriosà aplicaçãodo plano. Antes de tudo, ordem
nas empresas, aumento de poderes dos especialistas, maior concen-
tração nos probletnas da produção em vez de constantemente falar
2 Na primeira fila do mundo no ano 2000? em <uevolução»,
e alargamento
do sistema
de ensino,queforma
muito poucos especialistas,bem como do departamento de inves-
As querelas apamntementebizantinas sobre a interpretação da tigaçãoe, finalmente,au-mento
da importaçãode tecnologiaestran-
fórmula <<fazera revolução e estimular a produção», ocultam diver- geira.
gências fundamentais entre a-sduas fracçõesda burocracia cl)mesa Após a destituição de Tens, a campanha contra as tendências
quanto ao desenvolvimento económico a pâr em prática. Num estado à <<restauração
do capitalismo», que se entendia aquele encarnar,
operário, essasdivergênciassão predominantementepolíticas. Com foi acompanhada dum silêncio quase total acerca dos objectivos do
efeito, delas dependem diferentes relações entre a camada burocrática V.' plano quinquenal.

272 27j
r
Hoje, a nova direcção censura o «bando dos quatro>>por ter privados <<fornecemum quarto das produções agrícolas recebidas
sabotadoa produção ao dar de facto a primazia à directiva <'façam pelo departamento do comércio» e a«realidade objectiva>>não per-
a revolução, a produção seguir-se-á», atacando aqueles que -seocupa- mite fazer desapareceresta produção mercantil sem baixar a pro-
vam da produção e procuravam estabelecer um plano de racionali- duçãoe, logo, sem repor em perigo toda a economiachinesa.Re-
zaçãode economia,bem como aquelesque procuravam melhorar o conhecendo igu-aumentea extensão dos mercados livres no campo,
nível de vida das'massas(pelo desenvolvimentodos incentivos mate- pronunciou-se-pela sua manutençãona etapa actual de desenvolvi-
riais). Esta última crítica feita de forma m'aisdiscreta. mento do país. Aonde«se chegou a eliminar os mercados abertos ao
Trata-se pois agora de <crecuperaro atraso>>produzido pela ar livre, viu-se aparecerem mercados clandestinas que favoreceram
<<sabotagem>>
dos «quatro», <<s:is:tematizando
as nQmlas e os regula- os especuladores», disse, criticando o «bandodos quatro» por ter
mentos racionais, melhorando o trabalho de contabilidade económica, atacadoestasinstituições sob pretexto de que reflectiam tendências
reduzindo os custos de produção, aumentando a acumulaçãode fun- capitalistas.
dos, procedendo a inovações técnicas e a unia revolução técnica, pro- O vice-primeiro-ministro pâs também em causa as indústrias
movendo a emulaçãosocialista,elevando a produtividade do traba- chinesasdo ferro e do aço,pelainsuficiênciada suaproduçãodevida
lho e realizando o trabalho económico com crescente cuidado». à <<sabotagem e às interferências do bando dos quatro», que tinha
Se a directiva «tomar a luta de classes par eixol> se mantém, afectado o progresso da mecanizaçãoagrícola. Pediu que se fizesse
bem como a necessidade de «fazer a revolução», o acento desloca-se uma«corrida contra-relógio» para recuperar o tempo perdido. Com
claramente e passaa ser posto sobre o esforço produtivo necessário, efeito, se para o desenvolvimentoda indústria chinesaa agricultura
como o mostrou a conferênciasobre a agricultura de Dezembro é essencial -- 700 mihões de camponeses nela trabalham -- esta não
último. pode mais progredir sensivelmentesem mecanização,
e daí a im-
portância, entre outros factores, do novo«salto em frente» previsto
no domínio industrial.
A mecanização da agricultura
3 Um novo salto em frente na indústria
O vice-primeiro-ministro Chen Yung-kuei, antigo camponêsda
brigada modelo de Tchai, indicou no seu relatório cama objectivo <(Qüecem flores riuaLizem,qae cem flores desabrochem»
tios
da mecanização de base (o plano previa a mecanização total) da agri- domínios culturais e científicos, mas em«ardem e disciplina» e res-
cultura em 1980: <<devemos
passardo estádio da exploraçãoem pe- peito pelo podervigente-- tal é a nada politica.
quena escala com tracção animal, ao da exploração mecanizadaeln
grande escala». Em função deste objectivo, deve ser elaborado pelos Para fazer da China<<um poderoso país socialista moderno»,
órgãosdo Estadoe os comitésdo partido a todosos escalões
um para realizar a mecanizaçãoda agricultura, é necessárioum novo
calendário preciso até 1985. «-saltoem frente». Na etapa do desenvolvimento económicoda China,
Lembrando a necessidadede participação dos quadros na produ- este crescimentoindustrial aceleradopassapor uma ruptura com as
ção, o vice-primeiro-mini-soro pronunciou-se no sentido de <<permitir concepçõesmaoístas anteriores. É esseo sentido do V.' plano quin-
e encorajar o desenvolvimento das ocupaçõesfamiliares, sob condi- quenale dos objectivos fixados para o último quarto do século, que
ção de ser dada prioridade à economiacolectiva». Os pequenoslotes hoje retoma a nova direcção chinesa.

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l
Este modelo de desenvolvimentoeconómicopode ser ilustrado tição necessitaque uma parte importante da produçãoseja trans-
formada em capital a investir nessessectores,mesmoque isso faça
pelo i/ogaa <<contarcom as suas próprias forças», posto em destaque
correr o risco de acentuar um certo desequilíbrio com as pequenas
após a ruptura sino-soviética.Tendo em conta a imensidadedo país
unidadesde produção.Mas é sobretudonecessáriocriar os meios
e o baixo númerode quadros,tratava-se,esquematicamente,
de uti-
duma melhor planificação assim como formar os especialistascapazes
lizar ao máximo o trunfo da abundante mão-de-obra, utilizando as
de dominar a tecnologia importada. O que implica uma remodelação
ellergias produtivas na agricultura, mas também na indústria pelo
do sistema de ensino e de investigação.
desenvolvimento
de pequenasunidadesde produçãoao nível das
Após a conferêncianacional sobre a agricultura, outras conferên-
comunaspopulares. Às comunas e províncias cabia dar a máxima
cias nacionais sobre a indústria devem ter lugar antes de meados
tensão à autonomia económica. Este sistema implicava uma larga
de 1977, para distribuir e planificar os objectivos do V.' plano. Tive-
descentralização ao nível das decisões económicas com apelo à mobi-
veram já lugar conferências pi'eparatórias em relação com os sectores
lização da população.
petrolíferos e petroquímicos, que atingiram as mais altas taxas de
Iniciado de maneiraanárquicano momentodo«grande salto crescimento nestes últimos anos.
em frente» de 1958, este sistemaorientava-seno sentido duma
mais harmoniosa relação futura entre as mais importantes indús-
trias. Outra das razõesdeste modo de desenvolvimentoera a inca- A remodelação do sistema de ensino
pacidade das cidades em proporcionar emprego ao excesso de mão
O sistema de educação posto em prática após a Revolução Cur-
.de-obra proveniente dos campos.
ral, com vári-asflutuaçõesposteriores,é um dos sectoresem que a
crítica aos <<quatro»se mostra mais virulenta. Os <<quatro>> teriam
impelido os estudantesa criticar os seusprofessorese a considera-los
Reorientar os objectivos da industrialização
como força de restauração (do capitalismo); chamavam «medidas de
repressão» aos regulamentos das escolas e opunham-se ao ensino de
Efectivamente os anos que se seguiram à Revolução Cultural
todas as «teorias de base». Com receio de ser atacado, ninguém ousava
estimularam,semdúvida sob a pressãode Chu En-lai, um início de
dedicar-sea investigaçõescientíficas. <<Ostempos eram verdadeira-
reorientação com o desenvolvimento de ralhos económicos de ponta,
mente difíceis para nós>>,afirmavam os professores durante uma
nomeadamente
pela aquisiçãode instalaçõesindustriais e de tecno-
assembleia de luta. Para além dos exageros deste tipo, o problema
logia estrangeiras: no domínio do petróleo, da siderurgia e das indús-
é real
trias químicas em particular.
É nos bons resultadosdessessectores,onde a produtividade do Após a RevoluçãoCultural, a universidadeabriu-selargamente
trabalhador é de 15 a 25 % superior à das pequena-s
unidadesde pro- aos operários e camponeses, mas se a pressão ideológica do«grupo
de Xangai>>impedia um retomo ao sistema elitista e de quase man-
dução, que, além disso, com frequência não funcionam a plena capa-
darinato no ensino que reinava anteriormente, obstava também ao
cidade, que se baseiaa nova direcção para se lançar numa importação
desenvolvimento de estudos superiores muito especializados e tra-
maciça de instalações e tecnologia estrangeiras, limitada apenas pelas
vava consideravelmenteo sector da inv-estimação.
Foram assimpro-
disponibilidades do país em divisas. Trata-se de desellvolver, pela
vavelmente perdidos várias anos, enquanto que a China carece de
importação de grandesunidades produção, os sectoresmineiros, de
quadros qualificados.
indústria pesadae de indústria de ponta (petroquímica). Esta orien
277
276
O tom mudou nos últimos tempos. Tanto a imprensa como outros mais sórdidos insultos. Este tipo de <<campanha>>é flagrantemente
sectores, chamam à ordem, a um maior respeito pelos intelectuais revelador do modo de domínio burocrático existente na Colina,da
e professores, à supressão das constantes críticas dos professores ausênciade real democraciaoperária pela qual os trabalhadores pode-
pelos seus alunos, etc. riam tomar conhecimento das diferentes posições em presença, e não
da sua caricatura pela fracção no poder, e escolher tomando eles pró-
prios as deck-iões.Aqueles que hoje descobremo n)ecanismodestas
De novo as «cem flores,? «campanhas de denúncia>> quando é utilizado contra o <<grupo de
Xangai», têm tendência a esquecer que os mesmos métodos foram
É neste quadro que se pode compreendera reapariçãona im- já antes utilizados contra a fracção hoje no poder por aquelesque
prensada palavra de ordem«que cem escolasrivalizem e que cem neste momento disso sofreria as consequências.
flores desabrochem»,aplicadadesta vez ao domínio cultural e sobre-
Vimos, contudo, que as divergênciasentre as suasfracçõessão
tudo científico. -- Se, no segundo, a<<libertação»pode ser real como
único meio de desenvolver as actividades científicas sem submissão reais e profundas. Para além dos diferentes projectos económicos,
a um estreito controle dos comités do partido, a liberalização no domí-
admitindo que os <<quarro>> tenham um, as divergênciastêm por
objecto os diferentes modos de domínio da camadaburocrática, o
nio cultural arrisca-sea ser bem mais limitada. Servirá provavelmente
seu alargamento e a sua estabilização.
para a batalha -políticacontra os<<quatro»,permitindo que obras
Com efeito, a fracção maoísta opunha-se, à sua maneira, à ruptura
intei-ditadas após a Revolução Cu1ltural reapareçam e melhore a qua-
dos laços cojn os operários e ca-mponeses
chineses,tecidos durante
lidade de certos espectáculos,mas em caso nenhum levará a repor
a rwolução chinesa.
em causa o «realismo socialista>>e a «arte proletária».
Para mais, está absolutamenteexcluído que esta «liberalização» Daí as diferentescampanhas
visandoevitar a estabilização
eo
se estenda ao domínio político, cama foi o caso quando da prece- excessivo alargamento dos privilégios da camada burocrática. Estes
dente campanhadas <<cem
flores>>
em 1956/1957: a explosãode laços, possíveis porque, contrariamente à burocracia soviética, a direc-
descontentamentoseria demasiadoimportantes Ora, a vontade da çãochinesadirigiu um processorevolucionário,eramo único meio
direcção é de assegurar-se a ordem e a di'sciplina mais absolutas possí- de fazer face às t.areias de desenvolvimento económico do país. Care-
vel, para semanter no poder e realizar os 'seusobjectivos económicos. ciam de que o antagonismo entre as massas e os <(quadros>>se man-
tivesse em limites excluindo explosões antiburocráticas, como as
que puderamter lugar nos .E)aíses da Europa de leste.No entanto,
4. A desmaoização os matei-stas
não podiam luta:r pelo único meio capazde impedir o
perpétuo renascimento e alargamento das tendências à estabilização
Uma tentativa de estabilizaçãoda camada burocrática
duma camada burocrática: a democracia operária, u-m real poder
dos trabalhadores tomando na-s suas pr(5prias mãos o exercício do
O«grupo de Xangai>> é hoje acu-sapo, tal como Liu Shac-chi,
Lin Pi;aoe Tens Hsiao-ping(para-sófalar dos mais conhecidos)o poder em todos os domínios. A repressãocontra o movimento dos
Guardas Vermelhos e dos trabalhadoresrebeldes, que tendia a pâr
faltam antes deles, de ter querido <<restauraro capitalismo». E a cam-
panha de denúncia das massas populares prossegue, amalgamando em causa o exercício do poder exclusivamente pelos dirigentes,
mesmo maoístas, é disso a prova.
divergênciaspolíticas reais, contra-verdadesflagrantes e mesmo os
279
278
Daí a combi:naçãoentre uma direcção, decerto paternalista mas O objectivo prioritário, com o uso dos meios apropriados,é pois
sem parelha, ao nível de todas as decisões importantes, e a manu- o de evitar toda a actividade autónomadas massascllinesas.Os ope-
tenção duna certa<<democracia na base» aa nível das comunas popu- rários devem l)roduzir, eis o telha dominante da direcção. Para tomar
lares e das empresas,respeitando sobretudo às questõesligadas à todas as decisões políticas e económicas lá estão os especialistas.
produção e à realizaçãodo plano.<<Democracia>>
permitindo a manu- Donde decorre logicamente o alargamento do leque de salários, a
tençãoduma certa pressãocontra os quadroscom tendênciaa auto- extensão de diversos prémios e estimulantes materiais, a dhecção
nomizar-se e constituindo uma arma contra as tendências<<direitistas». sem partilha nem crítica da parte dos trabalhadorese dos quadros
A Revolução Cultural -mostrou em que era insolúvel a contra- nas empresas (rege-as e regulameiatos tradicionais).
dição que implicava este sistema. Todavia, Mao não deixou de se É também o que explica que a direcção procure apagar todo o
manter na linha dos expedientesquanto ao problemada democra- vestígio da Revolução Cultural. Se os trabalhadores podiam parti-
cia operária, afirmando que seriam precisas«várias revoluçõescul- cipar da direcção das pequenas unidades de produção, não podem
turais». Mas esta não se repetirá. Pelo contrário, os anos que se segui- dominar os grandescomplexos modernos, que devem ser confiados
ram mostraram a que ponto a fracção maoísta estava isolada no apa- a especialistas,retribuídos em função da sua importância. Não resta
relho que largamentese constituiudesdea tomadado poder e no dúvida que esta orientação vai no 'sentido dum aumento dos privi-
seio do qual as tradições revolucionárias se esbateram, pelo menos légios materiais dos burocratas,<<políticos e técnicos>> misturados.
para aqueles que conheceram este período, mas também no seio das Privilégiosgarantidospela repressãode toda a tentativade oposi-
massas, lembr.idas do desfecho da Revolução Cultural, mesmo quando ção por parte dos trabalhadores,para o que a experiênciade Hua
as lições desta apenassão extraídas por uma vanguardanumerica- Kuo-feng, à testa do ministério da Segurança, não será inútil. Con-
mente limitada. solidar a camada de burocratas, caracterizada pela sua instabilidade
crónica nos períodos precedentes,e alargar os seus privilégios ma-
teriais, tal é o programa da nova direcção. A sua aplicaçãodepende
Ordem e disciplina fundamentalmente
da capacidade
dos trabalhadoreschinesese das
oposições antiburocráticas para a isso fazer frente.
Estas são as razões fundament-ais que expbcana a vitória dos par-
tidários de Hua Kuo-feng e põem a claro a nova política da direc-
ção. O primeiro objectivo, como a imprensa o testemunha, é o res- 5 A caminho de novas confrontações?
tabelecimentoda <<ordem», da «disciplina>>
da «unidadeem torno
da direcção»,tanto no interior como no exterior do partido. Não Estabilização improvável da oposição antiburocrática
se pode deixar de ser impressionadopelas acusaçõeslançadascon-
tra o <<bandodos quatro», acusados a tropel das violências da Revo- Foi com certo alívio que largas fracções das m-essas
chinesas sou-
lução Cultural, das grevesque surgiram na China nos últimos anos, beram da prisão do<<grupo de Xangai». Com efeito, após vários
numa palavra, do conjunto das actividadesautónomasdas traba- anos em que as duas fracções da burocracia se afrontavam .atravésda
lhadores chineses, reivindicativas ou políticas. imprensa e no seio do aparelho sem os trabalhadores poderem inter-

280 281
T
vir, a apresentação do <<grupo de Xangai>> como um <<bando>>
de geiro, torna-se pelo menos difícil a possibilidade de oferecer uma
ideólogos anivistas pode despertar ecos na população em relação a contrapartida ao esforço pedido. Tal como é provável que a agres-
essesquadros que acederamaos postos de mais alta responsabilidade sividade ideológica tenderá a diminuir a par e passoque prossigaa
na base do movimento da Revolução Cultural e que, depois, redu- depuraçãocontra os<<qua-tro»,também neste domínio se exclui que
ziram a sua luta aos limites do aparelho. a direcçãose oriente no sentido duma 'm.aiorliberdade de discussão
Mas a «campanha de crítica» que torna responsável o <<bando e de expressão política.
dos quatro» pelo conjunto de revezes dos passados anos e pelas taras
burocráticas do regime, em particular no que respeita às questões
de edificação económica e, por isso mesmo, da elevação do nível Duma certa confiança à hostilidade
de vida da população,pode dar de novo um capital de confiançaà
nova direcção. Direcção esta que avança a <<estabilidade>>
e afirma Por consequência,
o <<capital
de confiança>>
de que pode gozar
a actual direcçãocorre o risco de se esboroarrapidamente à medida
querer atacar de frente as ta-telas do desenvolvimento económico.
que os trabalhadores experimentem, na prática, as consequências
da nova orientação, após terem feito a experiência da direcção exer-

Uma trégua para a direcção chinesa cida nos últimos anos pelo grupo de Xangai. A incapacidadeda nova
direcção em responder às aspirações das massas pode transforma-r
Se o campesinato pode sentir-se satisfeito com o «realismo» da rapidamente a confiança posta nesta direcção para realizar as mudan-
ças esperadas,numa hostilidade declarada contra o conjunto da buro-
nova direcção, que não se propõe lutar, muito pelo contrário, contra
cracia uma vez dissipadas as ilusões.
a extensão dos lotes individuais e a manutenção dos mercados
As consequências podem ser explosivas, se se considera o calmi-
<(livres», se os sectores universitários da investigação ou, em menor
nho percorrido pela classeoperária chinesadesde a RevoluçãoCul-
grau, os dos intelectuais e da cultura vêem com prazer desenhar-se
tura[. Pe]a primeira vez mobilizada quando da Revo]ução Cu]tura],
uma certa <<liberalização»,
o factor essencialna base do qual os tra-
estamaturaçãoda classeoperária traduziu-seem particular pela im-
balhadores ajuizarão da nova direcção reside na sua capacidade em
portante vaga de greves de 1974-1975 visando a satisfação das rei-
permitir um crescimentodo nível de vida e em manterou alargar vindicações salariais, das quai-s a mais conhecida é a greve que abalou
as liberdade políticas, acompanhadasdum enquadramento ideoló-
Hangchow. Notam-se por igual os ecos dessa actividade em várias
gico menos estrito.
províncias chinesas nos últimos anos, particularmente no último ano
Sobre estas duas questões não parece que a direcção possa satis- através das greves que afectaram os caminhos-de-ferro chineses. Diga
fazer as aspiraçõesdos trabalhadores.Com efeito, se os objectivos o que disser a direcção, essesmovimentos desenrolaram-sena sua
económ-icespassam por uma mobilização da população e uma inten- maior parte independentemente das actividades do<<grupo de Xan-
sificaçãodo trabalho, dificilmente permiti-rãoaplicar uma parte sen- gai». Mostraram que os trabalhadoresnão estão dispostosa supor-
sível do sobre-produtoà memoriado nível de vida. Como este se tar sem contrapartida os sacrifícios pedidos, sobretudo se paralela-
destina a ser reinvestido na edificaçãode novas e importantes uni- mente se as-ristea um alargamento dos privilégios materiais dos
11 dades de produção e na compra de fábricas e de tecnologia no estran- quadras.

282 283
Uma corrente antiburocrática
o país. É essa,por exemplo« a luta que conduziu Chen Wu-lien, à
frente duma organizaçãode Guardas Vermelhos e de trabalhadores
Os relatos das estações de rádio acerca das <<perturbações>>
mos-
«.rebeldes>>
durante a Revolução Cultural, ao declarar;
tram por igual a persistênciana China, a partir do movimento dos
<<Guardas Vermelhos», du.macorrente antiburocrática que não ces- «A sociedadedescobriu bruscamente que, sem os burocratas,
sou de manifestar-se quando das diferentes campanhas políticas lan-
não só continuava a viver como continuava ]llesino melhor; que
çadas pelas diferentes fracçõesno poder. Isso explica as condignas se desenvolvia mais depressae até mais depressae mais livre-
muito estritas lançadas quando da campanha contra Teng Hsi-ao-pino,
mente. Melhor ainda, o entusiasmo pela produção e o espírito
ou na campanhasobrea interdiçãode estabelecerligações,de for- de iniciativa da classeoperária foram largamente libertados. Pela
mar grupos de controle, etc. Evocandoapenasdois exemplos,foi primeira vez tinham a impressãode trabalhar para si próprios».
no decurso da campanhacontra Lin Pião que foi afixado em Cantão
o <<dazibao»de Li Yi-she, que cona-titui a mais vigomsa crítica do
sistema burocrático jamais feito na China após a Revolução Cultural.
Também em i de Abril último, entre os cartazesafixados em louvor
de Chu En-lai e atacandovelada:menteo«grupo de Xangai», figuram
os«dazibaos» e poemas de conteúdo claramente antiburocrático.
Os testemunhos de antigos Guardas Vermelhos refugiados em
Hong Kong para escaparàs perseguiçõesde que sãaalvo os que pro-
curam organizar-separa lutar contra os burocratasno poder, confir-
mam a subsistência de grupos oposicionistas, decerto com frequência
confusos mas que não cessaramde combater a opressão burocrática.
Os eixos de luta desta corrente, que aparecempor vezesespon-
taneamente quando dos movimentos de massa, convergem à volta
do combate pelo respeito da legalidade socialista, ou seja, da liber-
dade de opiniões para o conjunto das correntes no seio do PCC ou
fora dele,ou da suadirecção,do fim da censurae da repressãodos
oposicionistas,da libertação dos prisioneiros políticos e, sobretudo,
da possibilidade dos trabalhadores exercerem um real controle sobre
o Estado chinês e de elegerem os dirigentes. Esta luta combina-se
com a que é dirigida contra o conjunto dos privilégios burocráticos,
aos quais os trabalhadoresse mostram Kalmente sensíveis.
SÓa capacidade destascorrentes antiburocráticas darem, na luta,
uma alternativa política às das diferentes fracçõesda burocracia pode
desembocar num Estado eJn que os trabalhadores dirijam realmente

284
28j
4 O REGRESSO DE TENG HSIAO-PING

S. S. Wu
Janeiro d:e 1977

Em 1977, na sequênciada eliminaçãodo «bandodos quatro», a


China evoluirá para<<aGrande Paz e a Ordem», tal como foi prome-
tido publicamente l)or Hua Kuo-feng, o novo dirigente coroado da
China.A promess-a
de Hua representa,por um lado, a ten-cativa
de
obter o apoio da burocracia e, por outro lado, a própria confiança
e esperança das massas. Sem esses dois requesitos o sucessor de Mao
estará conden'ado ao malogro. A direcção de Hua impôs-se, ao formu-
lar o juramento«de Ordem e de Paz», quatro tarefas prindpais:
aprofundar a denúncia e a crítica do«bando dos quatro», reforçar
a construção do partido, elevar o nível da economia nacional e esti-
mular as campanhaspara <Kestudar
a teoria política».

As quatro tarefas de Hua


O reforço da campanha oficial contra o«bando dos quatro>>
reveste-se, ao mesmo tempo, de aspectos organizacionais e políticos .
O scu fim primordial é desagregam efectivamente a velha fracção
maoísta para que es;tanão possa mais aspirar à reconquista do poder
político e à suainllluênciano partido e no aparelhode Estado,ou
junto da população. O simples facto de se desenvolver semelhante
campanhaindica que a burocracia ainda consideraa«núcleo duro»
maoísta como representandoum perigo potencial. Visto ser impos-

287
sável elimina-lo completamente dum só golpe, torna-se necessário que contrarie uma elevaçãorelativa do nível de vida, suscitarápelo
menos uma ferir/é c/a pas'diva ( pm exemplo: redução da produção
promover uma campanha sis-temát:ica.As formas desta serão deter-
nas fábricas e nas comunas popuílares, o que de resto já aconteceu)
minadas pelas condições objectivas específicasde cada etapa. No en-
e talvez mesmoactiva. E-staüüima não (daria apenasdificuld'artes
tanto, a campanhacontra o <<bando
dos quatro» tem uma função
adicional: ao lança-la, a b.utocracia cria uma certa margem de mano-
económicasmas tambémWlíticas para a burocracia.Não é senão
um exemplo desta resistência activa -- que já se manifestou -- a cola-
bra; com deito, -acusaro «bando dos quatro» de abusosburocráticos,
gem de cartazesmurais em Xangai, por jovens intelectuais, denun-
(denunciados pelas próprias massas) diminui a responsabilidade do
ciando a obrigação dos jovens se deslocarem para o campo.
próprio sistema burocrático.
O quarto aspecto da presente política de Hua Kuo-feng -- a cam-
A campanhapara o reforçoda construçãodo partido não tem
panha maciça para estuda a telha política -- tem por fim absorver
apenas carácter ritual. Os elementos da burocrada resl)tender-lhe-ão
c canalizar as inidativas já tomadas pelas massas.Esta opção está
positivamente, embora pór diferentes razões.Os problemas com que
a burocracia deve confrontar-se-- instabilidade da direcção, des- já varada ao malogro na medida em que, a longo prazo, as reivindi-
11 cações avançadas pelas massas colidem com o pMprio sistema buro-
centralizaçãoprovocada pelo fosso aberto entre os diligentes cen-
11 crático. É contudo importante a adol)çãode uma td orientação; in-
trais e os aparelhoslocais e provinciais, desequilíbrioentre o partido
dica que a burocracia não se sente capaz de pâr fim ao movimento
e o exército, e, mais importante ainda, enfraquecimentodo controle
111 burocrático sobre a sociedade no seu conjun-to -- são de importância de massaspela aberta utilização -daforça e da violência. Tentará país
canalizaro movam-en:ta
nascente,renunciandoa utilizar a força, a
vitall para todos os elementosdo aparelho, qualquer que seja a sua
menos que a isso :acabepor ser obrigada.
posição na batalha fraccionar.
Embora a direcçãoHua Kuc-feng seja incapazde formular os
A opção -- ou antes, a esperança-- de desenvolver a economia,
meiosconcretospara atingir os objectivospor ela própria fixados,
representa hoje a terceira prioridade para a burocracia. Os seus re-
sublinhou no en-tantocorrectamente as ques'tões-chaveque actuall-
sul-tados -terão eleitas e consequências de grande importância não
mente edis'temna China. Infelizmente para Hua e companhia, há
só para o aparelho maspara toda a sociedade.De resta, este é um
poucasprobabilidades de que possamresolver essesproblemas na
dos temas que mais atrai o interessedas massas.Neste domínio, a
quadro do sistemaburocrático. De facto, apesarda quedado«bando
direcçãoHua confirma e amplia a política das<Kquatromoderniza-
dos quatro>>e da espectaculm afinnação de Hua como dirigente, não
ções>>,
elaborada inicialmente por Chu En-lai.
há nenhuma indicação duma es'tabilídade palhica efectiva na China
Segundoesta política, a economiadeveráobter ajuda técnica
do após Mao.
e científica da parte dos países imperialistas. O desenvolvimento
Ao passo que a era maoísta da revolução chinesa se desintegra
industrial deve ser acelerado, mas a própria burocracia nunca indicou
rapidamente -- mesmo mais depressa do que esperávamos -- não
claramente a que ri;tmo este cnscimento industrial -- que se funda
é seguida dum período marcado por uma nova direcção estável.
na exportação de pr(xlutos agríc(lias -- deverá efectuar-se. Permanece
O afastamentodo«bando dos quatro» nem pâs Jlimà lu-tafraccional
por igual imprecisa a relação entFe o crescimento económico e a ele-
nem instaurou a unidade do partido e do .aparelho de Estado. O nú-
vaçãodo nível de vida das massas.A burocraciaterá 'aquium dos
deo maaista no seio d-opartido fai sepmado dos seus dír'agentese ins-
11 seus principais problemas. P-natoque as massasnão se encontram
piradores políticos, mas estes esitãolonge de se encontrarem desprcH
nem desmoralizadas nem estritamente connclladas, um orientação
vidas de qualquer poder. Mantêm posiçõesno partido e no aparelho
de desenvolvimento acdórado( especialmenteno sector industrial )
289
288 19
r
de Estado e, com a sua base de massasainda presente embora enfra- na presença de diversos«visitantes estrangeiros» quanto à direcção
quecida, conseguiram suscitar resis'tênciasnuma dúzia de províncias cdlectiva. Por ou:tro lado, paralelamente aos rumores e especulações
pelo menos. acercado :regresso
de Teng, a campanhade <<crítica
de Teng>>
foi
Inclusivamentenas cúpulasdo aparelho,não se verificou uma reafimlada. Seguidamente,a situação ainda mais se complica devido
recomposição harmon'iosae uma regularização da direcção. O espec- a avolumar-seo prestígio e a imagem -deChu En-lai, nome em geral
tro de Teng continua a planar sobreHua. O papel do exército avan- ligado ao de Teng.
tajou-se de novo. Os postos chave que este ocupou nos caminhos-de- Pode-sechegar a esta conclusão: lllua Kuchfeng conquistou :a
.ferro são disso a expressão clara. Mas, antes de tudo, as massascome- sua posição devida, não a fortes apoios fraccionais, mas, a va-
çam a ilibertar-se da confusão e das hesitações criadas pelas opções gas ligações com uma ou outra fracção. O grassa da burocracia,
políticas do Outono e Inverno. Visto itodos estesfactores, o período unida à volta da necessidade de esmagar o<Kbando dos quatro»
futuro -seráincerto para a burocracia. Seria pois prematuro caracte- luas dividida sobre outras questões, julgou poder dispor duma maior
riza a era que se abre como sendo a de Hua. Esta precária situação latitude para dominar as consequênciasda pulga colocando Hua nesse
111 deve ser :atribuída a dois fenómenosdistintos mas ligados entre si: posto. Agora, controlado o«núcleo duro» do sadismo, -- pelo me-
111 a crise da direcção e a do contrate burocrático. nos nas altas esferas da aparelho -- Hua surge decidida a conservar
e consolidar as suasposições.É -ajudadoneste esforço pala convic-
ção da burocracia, no seu conjunto, de que -seriaperigoso mudar de
A crise da direcção dirigente supremo alguns meses apenasapos 'a malte de Mao.
Ao mesmo tempo, Teng permanece nas ]lileiras, sustentado por
O aspecto mais impressionante da crise da burocracia chinesa sectores não desprezíveis da burocracia, que dispõem dum apoio efec-
reside na ausência duma nova direcção .díspond-oda inteira confiança tivo entre as massas.
do aparelho e de autoüdade sobre o mesmo, bem como dum mínimo Este último factor pâs na ordem do dia a possível reinstalação
l de autoridade entre asmassas.Mesmo na cúpula, falta coerência polí- de Teng, reclamada pelas massasnas ruas de Pequím. A perspectiva
tica e organizacional.A equipa Hua Kuc-feDEnão está.aindaestabili- do r(W'essa de Teng 'levanta uma séHe de problemas à burocracia.
zada. Foi aceite pelo partido -- ou mais exactamente, por impor Se o seu regresso se confirma, qual será o futuro de flua? Consi-
tan-tescamadase sectoresdo partido -- como a única equipa nansi- derando a sua nova popularidade, deveria Teng ficar sob as ordens
tória válida, pelo menosde momento.Por consequência,
es;tadirec- de Hua? Aceitariam os quadras do pmtido e a burocracia, semmesmo
ção -- incluindo Hua -- encontrará algumas dificuldades em asse- falar nas massas,uma tal hierarquia? Além disso, se Hua baixasse
gurar a sua permanência. na escala hisrárquica, como se deveria explicar isso aos quadros do
Todo o debate à volta da posição de Teng Hsiao-ping se revela partido e às massas?Para a própria burocracia, o destino pessoal
desde logo significativo desta realidade. Durante os últimos meses de Hua é bem menosempa'tange
do que o destin'odo prestigiado
de 1976 foi publicamente encaradoo po-ssívelregi'essadeste a um aparelho. Uma mudança brusca n-a (h'ecção cen:trai intensiÉicaria
posto de primeira importância. No entanto, parececerto que impor- inevitavelmente es'se declínio.
tantes divisões subsistem no seio dos órgãos centrais da burocracia Evidentemente,Hua explora a fundo este estadode coisase es-tá
quinto ao fu-turode Teng.Por um lado, Hua foi avançadocomo actualmenteem Vias de bons(lidar uma equipa à volta da sua per-
sucesso de Mao. Isso cona:radiz
as declarações
de Li Sin-lin, feitas sonagem,quer dizer, não apenasligada à orientaçãogeral de Teng
11
290 29]
r
e Chu En-lai mas determinada a defender as suaspróprias posições
tese de reocupar o centro da cena no apare]ho, e que, a longo prazo,
ou a opor-se ao regresso de Teng. Tudo isto implica que se anunciam a sua única alternativa é a de capitular ou perecer, podem no en-
realinhamentos futuros no seio das forças antimaoistas, que se tinham tanto ter sempre uma influência significativa sobre os desenvolvi-
unido e agido em conjunto para derrubar o«bando dos quatro», mas
mentos políticos, antes de serem completamente eliminados do apa-
que, agora, se opõem en'tre si.
relho ou totalmente domesticados. Foi muito enérgica a resistênd-a
Um dos mais recentes índices deste desenvolvimentoreside na
dos maoístasà puü'ga,pelo menosem qua'tro províncias; em certos
forma como o regresso de Teng !é preparado. As declarações oficiais casos, as estações de radiodifusão proa'inciais referiram mesmo si-
descrevem desde agora o <<probiemaTeng>>como uma«contradição
tu'açõesde<<guerracivil». Mas o que é ainda mais significativo é que
no seio do povo» e já não como <<umacontradição antagónico», o que
as fontes oficiais admitiram que essas sublevações, desencadeadas
poderá ser um-aforma de preparar o regressode Teng com um mí-
pelas maoístas, não foram completamente esmaga-das. Visto que os
nimo de agitação.
maoi-smasinstalados na cúpula do aparelho foram liquidados e que
a burocracia é capaz de controlar os wentuais maoístas existentes
nas camadasmédia-sdo aparelho, é provável que aquelasperturbações
A crise do controle burocrático tenham sido organizadaspelas quadros inferiores do partido e do

11 Mas a crise de direcção no seio da burocracia é simplesmente um


sintoma do problema mais grave da crise do controle dessa buro-
cracia sobre a sociedadeno seu conjunto. Mesmo antes da expulsão
Estado, bem como pelos quadros locais rearu'lados pelos m:aoistas
durante os últimos dez anos. A resistência organizada destes maoís-
tas representa o aspecto mais perigoso da si-tuaçãopara a burocracia,
mas é preciso sublinhar também que existe uma larga camadade
de Teng da direcção,na vésperada m-anifestação
de 5 de Abril de
quadras simpatizantes do<<bandodos quatro», que, se não resistiram
111 1976, e até antes da purga do <<bando
dos quatro», essecontrole abertamente, recusaram por igual tomar parte activa na aplicação
tinha já sido feri:ámen'te abalado, por um lado, por severas batalhas
das ordens dos novos dirigentes, o que enllraqueceainda o controle
fraccionãis, e, por outro, devido a uma profunda desmoralização burocrático global.
dos quadros locais do partido. A burocracia está decerto consciente que a liquidação de todos os
Em primeiro ]ugm, a destabilização da direcção central reduz
inaoistas «puros>>e seus simpa.tirantes é pN-condição para o 'resta-
inevitavelmente a eficácia e o funcionamen-tode toda a estutu.ra
belecimento do controle burocrático e dum certo grau de unidade.
burocrática, o que, par sua vez, sacavao controle social. Quanto
Porém, 'a pfimei-ra consequência duma tal purga seria o enfraqueci-
mais a política do partido se mantém imprevisível e sujeito aos ca-
men-todo aparelhono seuconjunto; por consequência,
os novosdiri-
pachos da luta ílraccionalna cúpula, mais difícil se torna, para os gentes vão certamente pesar cuidadosamente os riscos de semelhante
milhares de quadros locais, tomar iniciativas politicas, manter com acçãoantesde a pâr em prática.Os maoístascon-tinuama repre-
aquela as suas ligações e o seu controle sobre as massas. Vê-se, por
sentar uma força centrífuga, enquanto que a fraqueza geral da buro-
igual modo, aumentadaa possibilidadedas massastomaremini- cracia impede que sejam completamenteliquidados. Es-ta situação
ciativas.
é evidentementetempmária, mas o controle burocrático não pode
A m'anutenção em funções de quadros maxis'tas, apesar da pulga
ser consolidadose tal si'tuaçãonão se modificar.
do «bando dos quatra>>,agudiza ainda mais esta situação. Se é ver-
O facto do exército ter ddo que assumir o controle das princi-
dade que os madistas <<puros>>
não têm praticamente nenhuma hipó- pais estaçõesferroviárias do país, comprova o grau de erosãodo
292
293
r
contlüle burocrático. ]sso mostra que as ligaçõesda burocracia cen- No entanto, este novo ascensodo movimento de mass:as
está longe
tral com certasu:egiõesforam destruídas.Isso significaque o acés- de significar matu-raçãopolítica, se bem que o movimento revolu-
cimo de poder do exército -- ou uma partilha limitada das tarefas cionário aí possa encontrar a sua origem. Por exemplo, um dos
entre o partido e o exército, ou um aumentodo poder do exélrito <<slogans>>
cen'oraisdo movimento limo-ta-sea reivindicar o regresso
sobre o aparelhocivil. da burocracia-- fará com que a burocracia de Teng l:lsíao-pino.Teng é consideradocomo uma vítima da re-
tenha que suportar os efeitos duma maior descentralização,l)em como pressão que se seguiu à manifestação de 5 de Abril. Desde então,
sobreposições adm'inistraçivas e certa confusão; as consequências as massasmani1lestamuma forte adesão ao antigo dirigente. Têm
políticas de semelhante situação dependerão da extensão e da dura- mesmoa ilusão que Teng poderia melhorar as suascondiçõesmate-
ção do acréscimo
de poderdo exército. riais de vida. Isso significa 'tambémque a burocracia,como tal, não
Neste contexto geral, não seria de surpreender que tenham lugar foi posta em causa salvo pelos elementos mais politizadas .
desenvolvimentos políticas-regionais au'tónomos num futuro pró)elmo, Mas a natureza das actuais ilusões difere graijdemente das ilusões
o que ainda acentuada as dificuldades da burocracia para consolidar depositadas em M:ao, como, por exemplo, prevaleciam na época da
o seu p(xler. <<Grandesalto em fren'te». As massas deixaram de se submeter cega-
mente às ordens da burocracia. Apesar das suasilusões, exprimem
já reivindicações
e desejosclarosquantoà/w'ma de organizara nova
O movam.ento de massas sociedade.O único asl)Cotoque continua a ser vago é o que respeita
111 à maneira de realizar es-sesdesejos. O dado mais prometedor do mc-
11 A crise de -direcção no aparelho e a crise geral da burocracia vimento de massasé a reivindicação da democracia socialista. Se 'bem
11 combinaram-se com a reaparição das massasna cena política, embora que a concepção dominante de democracia socialista não seja idêntica
111 sem atingir o nível previsto. A última inici'atavade massassignifi- à dos marxistas-revolucionários, contém no entanto, elementosimpor-
cativa foi a manifestaçãode 5 de Abril de 1976 na praça Tien-An-Men, tantes. Estes -atacariam os próprios fundamentos da burocracia, desde
em Pequim. No seguimento das prisões efectuadasdurante e após que as massaslutem pela sua realização: liberdade de expressão,liber-
a maMfestação e depois de caracterizada esta como contra-l'evalu-
dade de imprensa, ]ibei:dadede reunião, liberdade para o próprio
cianária, com o afastamen'tode Teng das estruturas dirigentes, as povo escolher os seus diúgentes políticos.
massa-s mantiveram-se em sllêndo. Contrariamente às especulações
A convicção das massas quanto à democracia sociali-sta traduz-se,
mais corren'tes,quer a malte de Mao quer o banimento do«bando dos
de forma explosiva, na r'eivindicação de suprimir a caracterizaçãode
quatro» não reactivou o movimento de massas.Esta reserva,um tanto
contra-revolucionária
atribuídaà manifestação
de 5 de Abril. Ao
sui:preendente visto as condições favoráveis para as mas'sas fazerem
reclamar isso, as massas reivindicam de facto que a burocracia aceite
ouvir a sua voz, não foi tanto o resultado de Ilusões promdamente
e reconheça o valor do movimento de massas em si mesmo. Caso a
enu'aizadasa respeito de Hua Kuo-feng mas aíltes manifestações duma
burocracia acede a es'ta reivindicação, as massasobterão de certo
atitude prudente, atentista, por parte das massas.Após 'três meses
modo ]uz verde para disferir golpes à burocrach quando disso sintam
sem nenhuma mudança e mesmo sem nenhuma promessa significa-
necessidade.Caso a burocra-ciarejeite essareivindicação, o seu afron-
tiva da parteda burocracia-- em particu-larno que nspei:taà situa-
tamento com o -movimento de massaspassará então à ordem do dia.
ção política e social da população -- as massas reapareceram subi-te-
mente e uma vez mais nas ruas de Pequim. Para a burocracia, a escolhaé das mais difíceis.

294
29j
r
No entanto,vis-too impactoe a força da manifestação
de 5 de
Abril, é improvável que as massas decidam muito simplesmente
abandonar essa reivindicação, ou pâ-la em surdina, caso a burocracia
tente evitar dar uma respostaclara a es-terespeito. Isto implica que,
duranteo próximoperíodo,a questão
da caracterização
do 5 de
Abril -- manifestação
revolucionáriaou contra-revolucionária
-- per-
manecerá sendo um ponto de ]iricção entre a 'burocracia e o movi-
mento de massas.De modo nelüum é de excluir que o üMversário da
manifestação,5 de Abril de 1977, se torne um momento importante
desse afrontamento, caso a burocracia não dê uma respostae não
consiga suscitar a esperança no seio do povo.
Até agora, a crise mais séria da burocrata afirmou-se durante DOCUMENTOS
a RevoluçãoCultural e imediatamente
após.Mas em vista da der-
rota do movimento de massas,a burocraci-a.foi capaz de restabelecer
a sua coerênciae de consolidar a sua ordem. Actualmente está de
novo em crise, mas desta vez vê-se perseguida pêlo espectro do mo-
vimento de massas.Os futuros hstoriadores irão certamenterelacio-
nar isso cam a manifes'raçãode 5 de Abril de 1976. Desdeentão, a
história política da China deixa de ser apenasa da burocracia para
se tornar também, e acima de tudo, a da luta entre as massase a buro-
cracia. É um combate que continuará até à vitória final das massas
sôbre a burocracia.

296
l TEXTOSDE MAO

11 Relatório sobre o inquérito feito no Hunan


acerca do movimento camponês
Encarregado no princípio de 1927 de«i#g#frirÀ$ .sobre o movi-
mento camponês, Mao entusiasmar-se-á incondicionalmente ante a
11 amplitude da organização e das conquistas camponesas: «Dz/ra#fe
quarenta anos, o Dr. Satt Yat Sen consag'ow todas as suas forças à
revolução nacional; aquilo que quis mas não pede realizar, fizeram-no
os campottesesem alguns meses. Trata-se de &ma extraordinária
i)roera manca realizada atê agora, nem em qt+arenta altos neta mesmo
lto decursode mitétüos».çhüo dum «júbilo poucocomum»,M.ao
tenta convencer o Ê'CC e o Kuomintang de esqu-arda a encabeçar
este mov\mento. e.Todos os camaradasrevolucionários devem tomar
partido por esta sublevação, de contrario a swa posição é a da contta-
.repolwção». Os camponeses cometam excessos? Vamos lál «.4 rez;o-
lwçãonão é nem am jatitat de gala, nem tina obra literária, nem um
desenho,nem um bordado: ttão pode realizar-secom idêtttica ele-
gância.. . A revolução é uma sublevação, wm acto de violência, pelo
g a/ ma c/arie dera óú o#fra». Neste quadro, os excessos são justi-
ficados e necessários.Basta ver a organizaçãoe as conquistasdas
lutas camponesaspara disso se ficar convencido, e Mao passa-a-s
em
revista, elogiando o poder das associaçõescamponesasdirigidas pelos
canganeses pobtu. «É absolt+tamentetlecessátio que o papel diri-
gente nas uniões camponesascaiba aos campottesespobres. Rect+sar

299
recottbecer o papel dos campot2esespobres, é rectlsar recottbecer a 1) A sociedade cbittesa; 2) A família Zbao, da raa Na)nana,
reuolt4çao.Ataca-tosé atacara revolução.Muitos dos seusactos, qua- em Cbattgsba;3) A família Wa..., a família do marido que eta
yecu,sa'oa.
lificados como ' excesso dara}2te o período da acção reuolaciotiâria,
hão toratn no tatzdo mais do que ilha necessidade da rePotuçãm>. Estes .três factores cotttitairam três fortes arames que se podem
(«Oez/z,resCÃoisies» vol. 1, p. 21). imaginar como formando uma espéciede gaiola triangular. Uma uez
apertada entre estes três arames, bem podia procurar a uiva por todos
os meios. Não tittba possibilidadede viver. O contrário da vida, é
Uma faísca pode incendiar a planíci,e a morte, e a meninaZbao fede pois que morrer.
O incidente de ottteM era importante. Deu-sedecido ao ignó-
l <íNa etapa actual, a revolução é democrática e não socialista; a
bil sistema dos casamentos negociados, devido às trevas do sistema

11 tarefa inzediata do partido (. . .nas grandes cidades) consiste na luta


pela coTzqaista
das massase não na organizaçãoimediata da ittswr-
social, à negaçãoda uotttade individual e à aasêttciade liberdade de
escolher o seu próprio marido. É preciso esperar que aqueles qae
reição. . . Assentar o partido na base proletária, criar células de em-
presa do partido tios centros importantes, tais são actualmente,do pelo tacto se interessem,o comentemsob todos os aspectose defett-
ponto de vista da organização,
as tafetásimportantesdo partido. dam a bottta du.marapariga qtle sotrett o martírio da morte Tetacausa
Mas, ao mesmo tempo, o desenuoluimettto da Luta no campo, a cria- da liberdadede escolhera quem amar... Se fazemoscampanhaem
ção do poder uernzelbosobre pequenosterritórios, a formaçãodo tapar da reformado casanzettto,
bâ antesde mais qt&edemolir as
Exército Vermelho e a extensãodas suas fileiras, são as principais st&perstições a respeito do casamento e, em primeiro lugar, a crença
coltdições requeridas para aladas'e acelerar o ascetlsoreuolacion&io. qae os casamelttossão predestinadospelo acaso.. .».
É pois errado fenutlciar à tuta nas cidades; ?lhas,tza minha opittião, 1931 : decreto sobre o ca-samento durante a República de Kiangsi.
l
todo o membro do partido que receasse uer as forças camponesas <<Sob
o domittio tetüal, o casamento
etttreo homeme a mtttber
11 24ttrapassaras forças da classe operária em prejuízo da revolução, ê uma itistit ição bárbara e desamatta. A aWessao e os sotrimetttos
11 laborada em erro, porque, tta Cbitta semicoLonial,a revolução só pode suportados pelas mtitberes são maiores do qae os experimentados
111 malograr-se se a IHta camponesatot privada da direcção dos operá-
Fetos bometts. SÓ a oilória dos operários e camponeses, seguida dos
111 rios, e não poderia sofre.r pelo tacto dos campottesesse tornarem, du-
primeiros passosl)ara a libertação económicados homens e das mu
rante a lata, mais fortes do que os operários.»
111 úberes,traz uma mKdattça ao carácter da relação do casamento entre
11 Janeiro de 1930 o homem e a mulher, que se tonta livre. Presentemente, nas reÚões
soviéticas. . . o casamettto deve ser concluído seguttdo o princípio da
lipte escolha.
Todo o si.stema
tet4daldo casamento
é abatido,in-
Mao e a libertação das mulh.eres cluindo o poder dos pais sobre os filhos, o aso do constfangjmetito
e o carácter de comln'a e penda do acto do casamento
1919: o suicídioda meninaZhao.
No etltanta, no momettto em que acabanzde ser libertadas do
«A ideia original da meninaZbao seriaa de procurara morte?
iügo feudal, as mulheres suportam ainda pesados«battdicaps» (como
Pelo contrario, era a de procurar a vida. Se afinal a menina Zbao
o dos pês ligados) e tan7bêmainda ttão obtiueranzun?acompleto itt-
procaroa antes a tnofte, toi porque as circunstânciasa isso a forçaram;
30Í
300
dependêttcia económica. Portanto, tlo que respeita ao divórcio, é pre- Sobre a frente unida antijaponesa
ciso defender os interesses da mt4lbef e atribuir ao homem a maior
parte das obrigações e das responsabilidades qae o divórcio implicai> E viva o Kuomintangl
Extrato duün texto que Mao l:edigiu em Outubro de 1938 sobre
o Éimdo período«rosa»da colaboração como Kuamintange que
O burocratismo entendeu não dever inserir nas «Oeuvres Choisies»= «O Kaomzi#/amg
e o PC sãoo ttindamento da frente tzacionalunida antiiaponesa,mas,
«É preciso combater o burocratismo nos organismos dirigentes destesdois partidos, é o Kuominta?t&que ocupa o I' lugar...
e no interior dos qt4adros dirigentes, em todos os escalões. Em muitos O K«omiHtang tem uma história gloriosa, compreettdendo designa-
organismos de base e em numerosos quadros de base matiitestam-se damente o derrube dos Oittg..., a grande reuotação dos anos
«t«.'m.«t. te«ó«,.«: d. «t«it«ism. i«f«.ção à, l.i: . ". 1926-1927(sic!). Role, dirige de nodo a grandeguerraatitilaponesa.. .
reg,filamentos. A aparição e o desetiuoLuimento destes te?zómettossão Com a zítiica condição de apoiar até ao tim a guerra de resistência
inseparáveis do burocratismo de qae dão praça os wganismos e os e . t««te c.m««,,p''i'-:' p""- q"' «,â b,üba«teo t«t«.o do
quadros dirigentes. K omf#/ú#g. . .» (in «Mao Tse-tu.ng», de Schram, colecção U, p. 268).
Tomemos o caso do Centro: muitos quadros dirige»tes em nume- Texto de circunstância, contraditado decerto pelos factos, mas
rosos departamentosdão-se ainda por satisfeitos com permattecef que no entanto indica a amplitude do oportunismo de Mao nessa
nos organismos a rediÚr decisões e a lançar directivas. Pteocupam- época (tratava-se, apesar de tudo, dum relatório ao Comité Central
se apenas com repartir o to'abalbo e tzão em conuioer com os escalões do PCC).
de base, para esttldar a sittlação e cotitrotá-la. A consequêttciadisso Mas...
é que a sua direcçãose atestacom frequência das massase da reali- Mas as lições de 1927 não foram esquecidas: «Eifzz /irão, pagzz
dade, e qae surgem numerosos e sério! problemas ligados ao seu tra- com o nossosangtle,ensittou-tiosque a falta de um sólido núcleo
balho. Se queremosrealizar a edificaçãonacional em larga escala,ê de forças reüotucionárias leda a .reuott4çãoao malogro. Agora as
necessário que uttrapassemos o burocratismo e qae t'los ligtlemos coisas são diferentes: temos ia um poderoso partido comunista, um
estreitamente às massaspoptllates. Os quadros dirigentes centrais poderoso E)cércita VertneLho, e também as bases de apoio des.te
e locais devem frequentar os escalõesinteriores e controlar o traba- exército. Contudo, deoenzosdar provas de maior igilância, porque
lho. Desde que os quadrosdirigentes ultrapassemQ burocfatismo, os os imperialistas japonesese Tcbang Kai-cbek recorrerão por certo
tetlómettos negativos do atltotitarismo e da i7itracção às leis e regu- a toda a esi)éciede actosde intimidaçãoe de corrtlPção,a toda a
lamentos que se notam nos escalõesinteriores, poderão ser etimi- espécie de manobras entre os diversos agrupamentos. . . Os comu-
llados. Quando lide.rios corrigido estesdefeitos, não bâ dúvida que nistas deixaratvzde ser crianças,sabenzo que devem fazer e como
a edificação planificada do país se realizará com sucesso.» se comportar com os seus aliados.»
Isso passava-se
em 1935 (táctica da luta contra o imperialismo
(Directivas do presidente Mao Tse-tuna por ocasião da 4.' ses- japonês). Em 1936, Mao vê impar-se-lhe a aliança com Tchang e
são do l.' ConselhoNacional da AssembleiaCon-sultivaPolítica não apenas com a burguesia nacional. Submete-se (conforme acima).
Popular-- 1953). Mas, se estigmatiza a política da «pa/'/a /ecóadú»(dos opositoresà

302 303
colaboração) , não esquece que«ai co cessõei /ém /imi/es». .A mamw-
professores t{ ti crsitários. São professores toda a vida, até os cabelos
tettção da direcção do PC sobre a Redão especial e sobre o Exército
se lhes tornarembrancos.O mesmosucedecom os operáriase os
Vermelho,e a manütetlção
da indepettdência
do partido e da sua
camponeses.nadará provnoção quando haja um posto pago por
liberdade de critica nas suas relaçõescom o Kt+omitltang, constituem
nzorte.}b
esseslimites, qae não ê permitido transpor. Fazer concessõessigni-
(Intervençãona conferênciados secretáriosdos comitésprovin-
fica da facto tazê-lasdos dois lados: o Kaomititang renuticiará à sua
ciais e municipais, 1957.)
política de guerra ciuit, ãe ditadura e de não resistênciaao inimigo
exterior, e o PC rettattciatá a fazer uma politica qae deixe subsistir
o antagonismoetttre os dois poderespolíticos.. . Qualificar isso de
capitulação do PC seria simplesmente.. . ama pérfida calúnia. Çhs As perturbações
tarefas do PC na resistência, Maio de 1937). Não voltará atrás nisso,
Nuns pais de 600 milhões de habitantes, pouco pesamalgumas
a despeito da precedente citação.
E em 1945: pettz&rbações.São como a chapa qae cai do cêa ou o desejo da viúva
Mao, .no texto«Do governo de coligação»,entrega-sea uma crí- de voltar a casar-se: tzão se pode nada cotztra isso!
tica virulenta da atitude do Kuomintang ao longo de toda a guerra; A greve dos operários, a greda dos esttldantes, as l)edições:tudo
justifica a insubordinação do PCC:«Fe//zme#/e ão os deixámos isso esta mais ou lnettos legalizado Beta constituição, que de testo
st+bmetere cottseruámosintacta pata o podo chinêsama parte do ttão prevê a proibição dessesactos. É por isso qt&erecomendo: l ', não
seü terrã*tório, bem como m açército qae luta beroicamettte contra et&corajar esse género de acções; 2', se as pessoas fazem grade para
o invasor. Não deterá o podo cbitlês felicitar-se por esta desobe- apoiar pedidos, qziaisqaer que sejam os motivos, justificados au ttão,
diência?» recomendo deixa-las tazê-ta. Aos pedidos justificados, pode-se cor-
E trata de preparar-separa recomeçara guerra civil, conquanto responder cota modificaçõesou emettdas; aos pedidos não iustiti-
faça recair a sua responsabilidadesobre o Kuomintang. cados, deve-se responder também por meio de aepticações. Se os pro-
fessores querem estabelecer cot2trouérsia, é preciso cottceder-lhes a
pataüra pois é patenteando as contradições que as soluções partem
O problema dos quadros ser achadas. Nãa se deve hostilizar as pessoas para as tedtlzi ao silên-
cio, tal como seria também uma cobardia tudo admitir (.. .).
«Não se taz mais do qae elevar os quadros a níveis mais altos. D«.«te d« - «i«t' "-: «.m., '"ça. m«i«,."t.: «ctiti«-
U«.« «* p.'"'":dos, «'i' '"""t««. . ta«. q«. i«süfiq«. a: s«: tidos: deve-se organizar em cada prouíttcia assembleias de. massas,
modaspromoções.Neste ponto, temos cometido erros. Agora, apenas reuniões de discussão e sessõesde debate, para qae as discussões e
se poder transferir quadros parti ttípeis mais baixos. Não mais serão as conttouêrsias possam desenvolver-se em todos os sentidos e ao
autorizadas promoções. Poucas pessoasbastam nos postos de direc- mais alto ponto. Ver-se-á então quem vence. Mas o trabalho de pre-
ção, porque ai apenasse trata de reãigjr artigos e fazer telefonemas. paração é indispensáoel. Os opositores poderiam rebelar-se fortes
O Estado é um instrumento da luta de classes.Deve ser dirigido nas pequenas sessõesnuas de todo impotentes nas grattdes reuniões.
por am pequetzo grupo. Se todos os 600 milhões de chineses se tot- Visto desejarem a grande democracia, agjremos de acordo com eles.
nasset7to Estado, que poderíamosnós fazer? É inútil promover os Se querem fazer ruído, podem tazê-to. Ao contrario, o sea forçado
304
20
silêncio ser-tios-ia muito prejudicial. É preciso que um odor se exame Carta de Mao Tsetung a sua mulher Chiang Ching,
para se saber se é agradâuet oa tardo. Também a sociedade se com-
prometerianum processo
de desagregação.
Lutaremospot atrair a Recebi a taa carta de 29 de ]anbo; é preteriuel que protongues
maioria para a ttossa cansa. Quando a maioria considerar a opinião a tua permanêttcia aí por mais algatts dias, como o propuseram os
dos nossos opositores como de odor fétido, estes ficarão isolados. camaradas Weit (Wen-po) e Cben (Pi-sien). Este mês espero visi-
Não te7zbamreceio por se criarem perturbações. Quanto mais tantes estrangeiros, por duas vezes: após estas recepçõesdar-te-ei o
perturbaçõesse criem, melhor para nós. É muüiplicando as pertur- resto do mea programa de viagem. Depois de ter dei)GadoWoulin,
baçõesqüe se chegaratitialmente a fazer qualquer coisa de bom c tto dia 15 de ]anbo z2ttin?o,pipo mais de dez dias naTlzacauertta, aqui,
de pálido. Dessemodo se aprende a distingair o qüe ê justo do qae no Oeste: a bem dizer ia não estou muito ao corrente da actualidade.
o tzão ê. Q.ualquer qüe seja a forma qae tome a desordem, não deve- Hâ dez dias que estot&em Pa)unbot4angbo,desde28 de lt+nbo;
mos por isso ter receio. Q.canto mais receamosos fantasmasmais todos os dias leio os meus dossiers,é reatmet?temuito, muito interes-
depressaestes se aproximam de nós. Mas não se deve também dar sante. Dentro de sete ou alto amas,«wm grande caos no reitto>>uai
tiros: isso em momento nenbut77pode ser bom. de ttouo metamorfosear-se
ntlma «grandeordemno reino»: e então,
Não é possiuel qae as perturbaçõesse getleralizema todo o país. dam salto, os «diabos com chifres e os espíritos das serpentes>>
sairão
C)s abcessos tebentarão aonde boüuer pas ou micróbios (. . .) Perante de si próprios. Estão detefmittados Feto carácter da classea qwe per-
as perturbações ia criadas, os sectetariados dos comités regionais tencem e não podem agjt dot+tro modo.
devem, cada um por sua parte, convocar reattiões tegiotlais e os res- O poder central pressiotta-me,
porque quer publicar o discurso
ponsâueisdevem ia possuir tina formação ideotógjca e moral. Q.uem do mea amigo (Lin Pião); ooa dar o mea acordo para que o ponham
se cotztenta aFeItascom ter uma carreira tranquila e, por receio, recua em circulação lta base.
perante qualquer incidente, seta obrigado a permanecer tta detensiua O discursa aborda especialmente o problema dum golpe de Es-
perdendo toda a itticiatiua. Começaráa setttir o seu c&ebro parali- tado; nuttca li uma exposiçãocano a sua.Fiquei com algumasdú-
sado e acabara por fado admitir. vidas perante alguns dos seuscometttários. NaHca acreditei qae estes
Qae medida tomar quanto aos renegados?Seta necessário,sem peqt+enosbufos que eu escteoi cotttiuessem um tal poder espiritual.
excepção,expulsa-losdo partido? Na 7ninbaopinião, não se deve Quando eLeos líder elevado às nauens, o pais inteiro não tardará
tlsar apressadamente da expulsão ou da execução (saldo no que res- a fazer o mesmo. É tão esçageradocomo <KamaWatlg Po oferecendo
peita aos contra-revolucionárioscriminosos). Pode-seutiliza-!os atum os melões que venderia e dos quais cantaria ela própria os louuotes».
certo trabalho oti seruit-se deles como exemplo para d educação pro-
letária. Serão,é certo, privados dos direitos civis. Tomar medidas
simplistas a seu respeito é não recotibecer o princiHo da unidade Empurram'me para o Mont-e --
ãos confrarias.
Liang entre os rebeldes
Não ê bo n punir ncecatando-os, colocando-os sob detet&ção ot{
nzesmosob ui tangiaqtlandose trata de pessoascomoXiao ]un oa Eles empurram-me para o «Monte-Liang» (entre os rebeldes).
Ding Litzg. ])eue-se apetzasagarra-los pelas suas «pequei\as tranças», sem dúvida, ttão poderei recusar-lhes o meu assentimento. Ser abri
ot4 seja, pâr a nu os setasdefeitos para os desacreditar completamente gado,numa questão duma importância extrema, a da+ o seu assenti
lta sociedade. mettto contra a sita própria com)acção,eis o que natica IHe titiba acon-

306 307
tecido .em toda a mitiba ida; isto eqaiuale üerdadeiramettte a ter que Tornei-me exorcista do partido
agir cobra a nossaprópria vontade!]uang Cbingda dinastiaCbin,
opunha-se a Litt gang: quando (jaan) toi de Lo)and a Cbengkao, Em hiato, na conferênciade Peq&im,nãa mt4doude estilo: os
observou: <çÉsomente porque não bâ mais homens extraordinários bornaise as revistas tilizaram as piores expressões,ainda as mais
110muttdo que am homem perfeitamente uutgar (como ele) pode impressionantes; eleoaram-meliteralmente às ttüuens, como sendo
adquirir prestígio».Ottttora Lou Siutt corrigiu os seuspróprios etz- a marauitba das maravilhas; não me Testada outra cotação senão
súios. O meu setttimento assemelha-se
ao seu. Gosto da saa franqzieza retHgiar-4e tlo Monte Liang. (como rebelde). Adiuitlbo as suas
e da sua verticalidade.Ele diz: <<
Quando 77zd.
dissecoa mim próprio, uerdüdeiras intenções: para abaterem os diabos, querem assegurar-se
sou sempre mais rigoroso do qt+equantia disseca os outros». do auxílio de Cbang Kuoei, (o exorcista). Tornei-me o Cbatz8.Kuoei
Depois de alguns passosem falso, eu próprio me conzpotteisem- do partido comunista do século XX. Mas no geral, as coisas têm tett-
pre deste modo. Mas os camaradas nunca acreditarão. Sinto-me seguro dência a torna-se no seu contrário: quandonzaisse elevaalguém
de mim próprio, e no etttantotenhoalgumasdúvidas.Qaatldoera às nuvens, mais dera é a sua queda. Qae importância teria tido isso,
ttouo, disse uma uez: «Espero tirmemetzte uiuer duzetz:tosanos e per- alias: não é possível aniquilar a matéria, mas apenas fragmenta-la.
correr três mil milhas como wm rio veloz». Era perdadeiyanzenteHma
afirmação de suficiência um pouco exag,grada.E t?o entanto, não dei-
xada de setttir dti idas no meu íntimo. Sempre pensei que o macaco Se Marx -e Lenine foram traídos
se toro?auaRei supremo qaattdo ia não bacia tigres tias montanhas.
Também eu me tornei Rei supremo, mas em contrapartida não l)a Existettz no muttdo inteiro mais de cem partidos: a süa maioria
Ttissoqualquer compromisso, l)orqt+etenho também em mim qaal- ia ttão crê tio marxismo-leninismo. Se Hatx e Lenine foram ia traídos
qtler coisa do tigre que domina o resto. Por outro lado, tenho tam- por eles, l)orqt+e,e ainda com mais razão, hão o seremosnós? Creio
bém em mim qualquer cosa de macaco,qae ê secutidâria.Citei um que também ta devias aprotattdar esta questão e não deixar que a
dia algumas frases da carta de Li Kou ãa dinastia dos Han a ]t4ang ui.tótia te suba à cabeça.Devias reflectir com frequêncianas tt+asfra-
Cbing: «O qae se ergue nas alturas é fácil de quebrar, o qae tem um quezas, erros e defeitos. Quantas vezesnão abordei ia este problema
brilho magnífico é fácil de sujar. É cada uez mais raro assemelhar-se contigo,aittda em Abril te falei dele, ent Xangai.
à tteue branca da Primaueta, é difícil agir de acordo com o bardo du7wz Aqaito qüe acabode escrevermaisacimaassemelha-seam pouco
nome cêtebre>>.
Estas duas Últimasfrases aplicam-sea mim por com- de mais a anl pessimismo sombrio, ttão têm os elementos antipartido
pleto, ti-as ttuma sessãodo Co zi.té permane12tedo «bwreaa» político dito a mesma coisa? Penso que algumas fórmulas não são completa-
do Comité cetttral. met2te satisfatórias, quero dizer, na utilidade qae elas podemt ter para
É precioso um homem conhecer-sebem. Ent Abril deste ano, mim. Eles queremderrubar o partido e a mim, pessoalmente.
Esta
declarei na conferência de H.ang-cbowqae não aprouaua as fórmulas a diferença entre mim e a clique tzegra.

utilizadas Feto mea amigo, mas para quê? Não setpiu de nada. Qüe não se publiqziem estas tittbas, sobretudo atestemomento.
11 Todos os etemetttosde esqaei'dase exprimem deste modo. Se isto
tosse publicado, dar-lhes-lamas um bambode água fria, o que repre-
sentaria am apoio aos direitistas. A nossatarefa actual consiste em
abater, em parte, (na totalidade é impossível) os elementosde di-

308 309
Feitano partido e no paisinteiro: ao tim de seteoa oito anos,pode-
T (uma tal tetttatiua) estaria condenada à morte a breve prazo, porqac
remoslançar ama modacampattbapara varrer os diabos com chifres todos os teuolaciottâriosqHe representamo bem-estarde mais de
95 por cettto do podo ttão o permitiriam. Nesse momento, os direi-
e os espíritos das serpentes, e mais tarde, será preciso rec07neçarva-
tistas poderiam explorar as minhas palavras para tomarem o poder.
rias Deles. Etn que altura poderão estas linhas ser publicadas? É difí-
A esquerda uçptorara, por sea turno, algz+masoutras das mitibas pa-
cil de dizer, para ]â, porque ttão agradariam nem à esquerda nem às
?massas. lavras para se organizar, e a direita seta derrubada. A Grande Revo-
lução Cultural actual é tema grande manobra autêntica. Em certos
distritos (coma na cidade de Peqaim) as teuoluciotiátios retomata7n
a direcçãono espaçoduma noite; em vários locais(críticos),(tais
A direita irá -explorar as minhas palavras.
cano a attiuersidade
de Pequime a universidadede Tsitigbaa),em
breve atrancánzos as «raizes entrelaçadas e os ramos emaranhados».
É possiuet qae o momento propício sana depois ãa mitllla morte,
Quanto mais a direita é arrogante em certas coisas,mais a sua
quandoa direita líder tomado Q poder. Q.üeas pubtiqaementão,
derrota é cruel, mais vida se torna a esquerda.É uma manobraaçe-
tranquilamente! A direita irâ explorar as mittbas palavraspara hastear
cMada aa niuet nacional; todos, a esquerda,a direita e o centro hesi-
aetinitiuamente a bantieita negra, o qae não lhes trata a felicidade.
tante e instável, dela retira'ão lições úteis. E eis o resultado:«O tt+-
Desde qae o império toi derrubado na Cbitia, em 1911, a reacção
taro ant&tzcia-se
brilbatlte, mas a Tida esta semeadade citadas»; estas
piãopodeficar por muito tempotlo poder.Tcbang,
Kai-cbekmati-
teue-sedurante Dóriosdecéttios,mas desde que o povo se revoltou duas afirmações continuam a ser pálidas.
toi derrubado. Tcbang Kai-cbek uçptoroa a contia7içaqaeSun Yat-sen
8 de Juba de 1966
Lbedada, abrit{ uma academiamilitar em Wbampoa,e reattiu à sua
uotta uma série de reaccionários;a classedos proprietáriosfundiá-
rios e ãos compradores apoiou-o, e opuseram resistência às e9çperiên-
cias reuotuciottátiasdo partido comunista. Foi assim qae ele conse-
guiu manter-se tranquilamente tto poder durante tlm certo tempo.
Eln trinta altos,tzuncaconseguiaunificar o país.Após a lata entre
o partido comunista chinêse o Kuomititan&, a Ittta entre o Kaomin-
Eange os Setibofesda guerrade todas as tendências,a guerra sino-
laponesa e, para acabar, a mottstruosa guerra civil que durou qt+atro
anos, ete t&giu pata um atquipêlago-

mas será derrubada

Se alguma uez a China se deixasse surpreender por tlm golpe de


Estado anticomunista da direita, posso predizer com segurançaque
os direitistas não teriam ama vida tranquila. Muito prouauelmettte

310
a-B l CHINA: ENTREVISTA COM UM GUARDA
Ú l VERMELHO(')

-- Em que circuttstâncias ê que se it+ntou aos guardas vermelhos?

1966 foi um ano importante para a China. No período que pre-


cedeuJunho de 1966, a atmosfera política estava muito tensa no país.
Sentíramosque estavapara breve uma explosão.Na Escola Superior
de Pequim, alguns estudantes tinham-se declarado Guardas Verme-
lhos sob a palavra de ordem:«Temos razão em revoltarmo-nos.
Os GuardasVermelhosde Junho representavamuma tentativa
de pensar de forma autónoma. O nosso nível político era muito
baixo e não íamos muito longe. Fazíamosapenascartazesmurais
condenando a secção do partido da escola. Eu sempre tinha
afirmadoqueo directorda escola.era realmente
inútil, do que
de resto toda a gente tinha consciência. Estava lá -sóporque era mem-
bro do Partido. Era um superburocrata,que comia à parte, não só
de nós estudantes,mas mesmodo resto dos professores.Enquanto
nos obrigava a participar no treino físico, -tinhao hábito de se manter
à distância, abrigado debaixo de uiM guarda-chuva.Era muito auto-
ritário. Em Junho de 1966, denunciámo-lo através de cartazes em
termos bastante apaixonados. Recuperámos também algumas das

(+) Entrevistapublicadano diüio parisiense<IRouge»,


14 e 15.10.76,rea-
lizada em Abril de 1973 em Cantão.
7
espingardas guardadas na escola e escondemo-las.Havia entre 20 O meu isolamento começou a decrescer e os estudantes puseram-
a 30 espingardas na escala, mas que estavam sob o controle dos filhos -se de novo a falar comigo, mas a escolacontinuava sob o controle
dos soldadosdo EPL(Exército Popular de Libertação)que também dos elementosconservadores
(os filhos dos saldadosdo EPL). De
estudavam na escola superior. Agosto a Outubro, a 'maioria dos guardasvermehos começoua rea-
Em Junho, as secçõesdo 'Partido foram derrubadasem quase grupar-se.
todas as escolas.Durante u-mcurto período elegemosa administra- Em Outubro, parti para Pequim para observar a origem da Re-
ção. Foi por isso que Liu Shau-chi enviou os seus grupos de trabalho volução Cultural, e aí fiquei três dias. Vi cartazes mas não vi Mao,
para restabelecerema ordem. Os grupos de trabalho proclamavam encontrei outros jovens como eu e regressei a Cantão. Viajei com
o seu apoio à Revolução Cultural mas na verdade reprimirem-nos centenasde guardas vermelhos, gratuitamente, de comboio, de barco
e advertiram-nos de que era necessárionão combater a secçãodo Par- e de camião. Foi uma experiência fantástica ver o país desta temia,
tido. Em vez disso, tentaram desviar a nessa cólera para cima dos Sentido-nos a-ssimrealmente livres, sem nenhuma resuição e junta-
professores que não estavam no Partido e foi no seguimento de ins- mentecom outros jovens discutimos plenamenteem liberdadecoisas
truções suas que muitos professoresordinários foram insultados e sobre as quais nunca tínhamos reflectido no passado.
humilhados. A nossa espontaneidade foi quebrada. Quando regressei, formei imediatamente uma secçãode guardas
Tudo isso me enfureceu e fiz um cartaz a condenara intervenção vermelhos na nossa escola e denominámos o nosso grupo de«O Leste

dos grupos de trabalho, tratando-os, a eles e à secção do Partido, de é uma Comuna Vermelha». Ele juntava uma quarentena de estudantes

gamgsfefs. Nessa altura, o grupo de trabalho incitou os estudantes no princípio.


a atacarem-mee a denunciarem-mecomo direitista. Eu, expliquei-me,
mas durante os debates, mantivemm me amordaçado e com os braços
-- O qae ê qae vocês discutiam no «O Leste é uma Comutza
atados atrás das costas. De Julho a Outubro estive completamente
Vermelha», e quais as acções que impnlsionaram?
isolado na minha escala e os estudantes puseram-me de quarentena.
Em Agosto, era evidente que Mao se queria desembaraçarde Liu,
-- A ç)cimeira acção que levámos a cabo foi a destruição dos
mas este último era muito poderoso no a4)arelhodo Partido e Mao
dossiers da nossa escola porque era-m utilizados para vigiar os estu-
não estava capaz de -ajustar as contas com ele passando pelas estru- dantes. A secção do Partido, quando não estava satisfeita com um
turas do Partido. Decidiu também a utilização das massasfora do estudante abria um dossier -sobreele que puíia vir a ser utilizado
Partido para derrotar Liu. Um movimento de massasestudantil era contra ele.
nesse momento reprimido pelos grupos de trabalha de Liu Shao-shi. Por exemplo, dossiers desse género podiam vir a ser utilizados
Se Mao não tivesse apoiado a luta dos guardas vermelhos,teria sido
para impedir as dissidentesde entrar na Universidadee servir de
vencido. Assim, em Agosto, Mao aunciava os 16 pontos da Revolução obstáculo se eles procurassem trabalho. Os dossiers eram uma arma
Cultural e os guardas vermelhos foram oficialmente reconhecidos. importante confia nós. Depois de controlar os dossiers,li o meu e
Este acto parecia apoiar os guardas vermelhos de Junho como autên- foi dificilmente que me recoíüeci no que ele dizia sabremim. Tor-
ticos revolucionáriose encorajava-nosa combater a«restauração do námos públicos as dossiers, expusemos as suas mentiras e mostrámos
capitalismo >>
. que os burocratas do partido não eram senão um bando de mentirosos.
O que é que, por exemplo, estadaescrito no seu dossier? Em Janeiro de 1967 em Xangai os trabalhadorese os estudantes
tomaram o poder. Em alguns dias, a mesmacoisa sucedeuem Cantão
Não me recordo dos termos exactos, mas o sentido geral era: e noutros lados.
<<esteestudante é instável. É um antipartido, um elemento direitista.
Deveria ser vigiado cuidadosamente.Ocupar-sedele logo que o movi-
l mento recua».
-- O que se passou enl Capitão? Como é qae <ttolxatan} o poder>>?
Mas l)ara continuar: a nossa segundaacção foi a libertação dos O que é que nzadou?
professores presos nos estábulos onde eram guardados e acabei ime-
diatamente com os castigosexercidos sobre outros estudantes. Omi- -- Pusemossimplesmente a administração de Cantão sob o nosso
zámos meetings de massase encorajamos os professores para que controle. Os burocratas estavam em debandada e fugiram. Ocupámos
eles participassem. Trouxemos também os burocratas do Partido aos os quartéis generaisdo partido e forçamos os bumcratas a cederem-
meetings de massas. Não os atacámos fisicamente, mas colocámos- -nos o poder e a anunciar nas ruas e na imprensa que nós, FBV
.lhes muitas questões sobre o seu passado. Estavam em pânico e ten- (FracçãoBandeiraVermelha) detenhamoso poder. Eu era o respon-
diam a confessar tudo.
sável pela administração de certas escolas.Nas escolasos estudantes
elegeramos seus próprios representantespara os dirigir.
Continuemos. Nas fábricas os trabalhadores elegeram os seus
11 -- O que é que pensavam de Mao ttessa altura?
proprios delegados para dirigir a fábrica. Acontecimentos semelhantes
tiveram lugar nas redacções dos jornais. Mas nós éramos muito inex-
Adorávamo-lo, sobretudo eu. Porquê? Porque era uma ini-
ciativa de Mao que tinha acabadocom o meu isolamento e me tinha perientes.Tomando o poder não tínhamosnenhumaideia do que
iríamos fazer ou de quais as implicações que isso tilüa. A democra-
libertado. Titüa-nos dado uma nova oportunidadede viver, e deve
cia dos trabalhadoresda Comuna de Paria, os Sovietes,nada disso
compreender que mesmo uma rotura com a rotina representava um
grande passo em frente para nós. Pode imaginar o impacto que ela significava qualquer coisa para nós. A luta tinha-nos levado avante,
teve em nós todos. Como nós o vimos, Mao representava-nos nas mas não tínhamos nenhu-madirecçãoreal, politicamente sólida para
esferasdirigentes onde defendia as nossasacçõese nas encorajava. dirigir o nossoavanço.É por isto que, no interior da FBV, não se
levantaram discussões senão sobre questões administrativas relativas
ao exercício do poder. lsta dar-nos-áideia do baixo nível de cons-
-- Como se desenuoluea a !wta em 1967? ciência política.

--O período de Janeiro a Junho de 1967 marca o apogeu da


luta pelo poderentre o povo e os burocratas.No final de 1966 a -- Quattto temPO durou esta situação?
burocracia do partido estavaprestesa -afundar-se.A aliançade Mao
connosco tinha-se pasto à esquerda, e o nosso principal objectivo -- Com o poder consolidadoa partir do início de 1967, Mao
era Liu Shaa-chi.Miaso nosso conflito cam a burocrada a 'todos os começou a separar-se de nós. Ele queria que a luta acabassee come-
níveis, tinha também oó/ec/iz,amem/e tomado a trajectória política çou a manobrarcontra nós. Quando üsitou Xangaí, criticou os cama-
conflituosa com Mao.
radasde lá por se terem autodenominadode Comuna, e exphcou-

3]6 3]7
T

.lhes que Comuna significava uma estrutura onde a base dominava. Os dirigentes do Partido que organizarama repressãoeram opo
Disse que isso mostrava que eles não queriam aceitar o papel diri- sitores de Lin Pião. Também, a partir de Fevereiro de 1967, a inter-
gente do partido, afirmou-hes que este papel era necessárioe pediu- venção do exército desenvolveu-se e continuou até que eles resta.
belecessama situação.
.lhes que mudassem o seu nome para <KComitéRevolucionário». Foi
então que ele formulou a ideia de <(triplaunião»: noutras palavras,
-- Havia, nessa altura, dúvidas sobre o papel de lado?
que o poder revolucionário devia ser exercido pelos quadros revo-
lucionários (a Partido), os quadros militares (o EPL, Exército Popu-
-- Não, soubemosque Mao hesitara sobre a questãoda utili-
lar de Libertação) e representantes das massas (uma concessão tem-
zaçãodas tropas até Setembrode 1967, onde pâs todo o seupeso
porária). O Processo pelo qual os maoístas depuseram o poder nas
em favor da Revolução.
mãos do Partido e do exército foi posto em andamento.
11
Assim, o exército«juntou-se>>à Revo]uçãoCu]tura] para estabi-
lizar a situação. No fim de Fevereiro houve reconti:os entre unia;artes
-- Q.fiando compreenderam que a Repotwção Cultural titlba
do exército e os guardasvermelhos. acabado ?

-- Em Setembro de 1967 reentrei na minha escola e soube que


-- O que aconteceu em Cantão e qwata possaprópria experiência? o antigo director tinha regressado. Entretanto, a atmosfera estava
abalada e ninguém tinha realmente abandonado. Devia mencionar
Depois de tomar o poder e estabelecera Comuna,descobri- que em Agosto de 1967, tinha havido buscasde armaspor todo o
mos que os burocratas estava-mcombinadoscom a exército. Alguns país e muitos de entre nós tínhamos roubado armas. Nessa altura,
tinham fugido para o exército e procuradoprotecçãocontra nós. Isto tinha havido l)nuca resistência a estas acções,mas em Abril de 68,
deu-nos
a consciência
de quetínharmos
de lutar tambémcontrao tentámos de novo e então, o exército disparou e muitos camaradas
exército. Entretanto em Pequim, um certo número de drigentes do foram mortos.
Partido começaram realmente a alarmar-se e a opor-se a Maa por Em Judo de 68, o exércitomarchousobreas escolase asfábri-
causa da sua incapacidade em controlar a situação. Começaram (sob cas e dispersou os guardas vermelhas. Formaram (bmités de Túpla
o controle discreto de Chu En-l-ai) a reprimir o movi'mento em Pequím Unidade mas não eram senão fantasmas. A situação a partir daqui
através da força militar. ficou ba.soante difícil.

Era um enorme encorajamentopara a burocracia à escalanacio-


nal, e os burocratas começaram a reaparecer, a ligar-se ao exéKito e
a reprimir os grupos dissidentesem todo o país. Em muitos lugares, -- O que se passou consigo? Abandonou Cantão?
utiEzaram a força, -masnão em Cantão. Prenderam muita gente, proi-
biram a FBV, restabeleceramo controle militar e retomaramo poder. -- De Novembro de 1968 a Agosto de 1971 fui enviado para
Através de uma informação que circulou a nível das bastidores, sou- trabalhar numa fazenda. Durante dois anos, trabalhei no Mopei e
bemosque Lín Pião se tinha aposto a estasacções,mas não fora tido um ano em Cantão.Nós estávamostodos insatisfeitose Mao estava
em conta. constantemente a atacar em privado. Sentíamos ter sido traídos...

11
Mas nessaaltura discutíamosmuito. Tentánaoselaborarnovas teo-
rias e novos conceitos para tentar analisar o que não tinha funcionado
bem. Juntei-me a um grupo no Mopei que se chamava <<UniãoProle-
tária do Hunas». Eles tinham escrito uin certo número de documen-
3 CONTRASTEDEDUASVIAGENSA CANTÃO

tos criticandoMao e a burocracia.Era um desenvolvimento


espon-
tâneo. Nem eles, nem eu, tínhamos lido qu-alquer escrito de Trotsky,
mas as nossas ideia-ssobre a burocracia eram muito semelhantes às
suas. Tivemos muitas discussões, mas em 1971 sentimo-nos muito
desmoralizados porque muitos de nós compreenderam a enormidade
das tarefas com as quais estávamos confrontados.

-- É por isso qae decidit{, dei)çar a Cbitia?


Durante as minhas duas viagens, vi a mesma cidade, as mes-
-- Não exactamente.Um certo número de entre nósfoi forçado ]nas pessoas e os mesmos amigos, mas retirei delas impressões con-
a fugir por razões políticas. Primeiro. os nossos grupos foram des- traditórias.
cobertos e muitos camaradaspresos. Estávamos todos com medo. Quando da minha primeira estadia, a China inteira estava tomada
Mas em segundolugar, queria ler e escrever,o que se tornara impos- de espanto pela manifestação da praça Tien An-men de 5 de Abl:il(:)
l sível na China, a neblina da ortodoxia caindo de novo e engolindo e por manifestações semehantes que ocorreram noutras cidades.
todo o país neste género de ignorância particular que é a caracterís- Em Cantão, pareceu-me que a burocracia, em vez de responder pela
tica dos paísesburocratizados como a China. Finalmente, unuitos dos repressão, ficou completamente atordoada. Um dos meus mais anti-
meus camaradas, completamente desesperados, suicidaram-se na pri- gos conhecimentos,que é quadro médio numa unidade industrial e
são para não revelar os nomes dos outros. É por i-ssoque alguns de membro do partido, explicou me que, por detrás da manifestação,
11 nós se decidiram a abandonarCantão e por estarazão nadámosaté estava um«complot» contra-revolucionário. No entanto, logo cor-
Hong Kong. rigiu dizendo que isso não implicava que todos os manifestantes
eram tnaus ou mal-intendonados. Perguntei-lhe: que género de acção
ireis empreender na vossa unidade? Hesitou um momento e acabou
pot tespotide!-me: tudo o qae nós podemos fazer ê seguir a tittba

(') Por ocasião do funeral de Chu En-lai, uma multidão de manifestantes


ocupou em 5 de Abj:íl de 1976 a pmça Tien-An-Men- Os manifestantesaiti-
cavam por vezes violentamente a direcção d)mesa e Chiang Ching em parti-
cular. Ainda que a manifestação tenha provavelmente sido organizada pelos
partidáúos de Teng lisiao-ping, nela se exprimiram claramente certas criticas
andburocráticas. A manifestação foi reprimida pelos maoístas e Teng lisiacbping
hí «depurado» pouco tempo depois.

320 321
21
gelamda direcção. Nada faremos, e de tacto ê impossiuet fazer seja seguidos por grandes massas. Um deles explicou-me que ou, se faria
o gz/e/or, excep/o exp/!car.» Certa vez, distraiu-se e disse-me que o silêncio ou haveria uma explosão. Penso que isso corresponde à
teria participado na manifestação se então estivesse em Pequim. verdade. Porque, antes da manifestação de 5 de Abril, a maioria dos
A atitude simpáticada massade pessoasexprime-semais aber- dlineses mostrava-semuito calma. Ao contrário da primeira, falei
tamente. Num restaurante, ouvi dizer a um operário de meia idade: muito nestareunião.Não podia, claro está, dizer-lhesque era
«Mes}7zoque tenha baoido tln? punhado de cotttra-reuolüciottârios trotskista. Mas, nessasintervenções, desenvolvi as nossasposições.
maTtobraizdopor trás desta manifestação, as pessoas que neta parti- Expliquei-lhes que, em Hong Kong, existia uma organizaçãodenomi-
ciparam fizeram-no com total inocência e as suas reiuitzdicações eram nada Liga Marxista Revolucionária, e expus-lhes as suas posições
/ s/l/Iradas.a9 No mesma restauraDte as pessoas reagiam sorrindo e sobre a China, as suas reacções a respeito da manifestação de
aprovando discretamente com um aceno de cabeça. Ninguém deu Tieng-An-Men. Ficaram surpreendidos em saber da existência dum
sinal de protesto ou desacordo. tal movimentopolítico em Hong Kang; disse-lneum delesque, em-
A reacçãodos jovens estudantese operários que encontrei, era bora não o conhecessesuficientemente, essemovimento deveria poder
mais agressiva. ])isseram me que, após manifestações, era frequente falar às largas massas na China, se para isso tivesse ocasião. Deu-me

11 haver reuniões informais de jovens estudantes e operários para dis-


cutir problemas sociais e políticos da sociedade. Ellectivamente, eu
muita satisfação ouvi-lo dizer isto.
Mas quando lhes fiz várias perguntas sobre as lutas de fracções
próprio participei em duasdessasmanifestaçõespolíticasinformais. no seio do partido comunista chinês, vi que alimentavam ainda certas
Foí um prima meu quem me conduziu à primeira dessasreuniões. ilusões a respeito da fracção conservadora, personificada no falecido
As oito pessoas presenteseram alunosliceaisde 14 a 18 anose a Chu En-lai. Isso apresentou-sedmecomo uma aguda contradição:
reunião foi muito espontânea. Abordaram,se várias questões e, sem como era possíveloporem-seà burocraciacomo tal e, ao mesmo
chegar a uma clarificação total, pas-fava-se a outra questão. No en- tempo, alimentarem a esperança de que a situação forçosamente mu-
tanto, uma coisa era certa: todos eram favoráveis à manifestaçãoe daria se a fracção conservadora chegasseao poder? Durante o meu
consideravam os manifestantes como uma vanguarda heróica. Ao regressode comboio a Hong Kong, reflecti a esterespeito.A frac-
mesmo tempo, voltavam a pâr em causa a burocracia e o estrangu- ção maoísta ocupou o poder e as massaspuderam julga-la. Alguns
lamento que ela impunha -à sociedade.O mais jovem dos rapazes adiam-na ineficaz e mesmo htoleráwl. Mas a fracção conservadora
disse: «Pensoqtle não bâ nenbtlmaobjecçãoa pâr a que o nosso país não foi totalmente posta à provamPensei que era mesmo necessário
é muito burocrático. O único problemaé o de saberconto nos desem- fazerem as massas durante um certo período a experiência desta frac-
Z'arúçarepzosdffio.aü Decerto, desta reunião nada saiu, mas mostrou ção conservadora,antes de se afastaremdela. Vi reforçada esta
que os jovens estãodespertandopara a política. No entanto, impres- minha ideia quando da minha segundaviagem no princípio de
sionou-me a segunda reunião, da qual participaram onze pessoas. Novembro. As massas esperam melhoramentos após a morte de
A maioria era de trabahadores duns 20 anos e alguns adolescentes Mao e a queda do «óamdo dos gz/ú/f'aP.Pensam que agora, a
dos liceus. Exprimiram a sua hostilidade à burocracia, chamando-a linha Chu En-lai, sem Chu En-lai, vai ser aplacada. As massas
<rz/za oua c/asse.repressiva.aP
Mesmo na minha presença,não escon- não dão a Hua Kuo-feng a importância que a imprensa procura
deram o seu inconformismo e a .suahostilidade. Alguns explicaram atribuir-lhe; consideram a orientação que ele representa como
que era preciso aguardarum momento favorável para tomar uma importantee esperançosa.
O meu primo disse-medestavez:
iniciativa contra a burocracia. Mas que, então, seriam certamente <<Deacordo, agora uão agir melhor. }lâ mt4ito temPO qae deue-

j22 32j
ríamos estar desembaraçadosde Cbiang Cbing. Dever-se-iafecon-
d#z/r Te#g à d/facção.»Voltei a encontrar os mesmosjovens ope-
rários e estudantes. Mas desta vez não encontrei vestígios da :hostili-
dade que tinham manifestadopara com a burocracia.Estão fasci-
nados pela mesma ilusão. Um deles, disse-memesmo:«Nos próximos
seis mesesbaterá modificaçõesimportantes em benefício do polo
e da Sociedade.»A atnplitude e profundidade desta esperança,ou
menor, desta ilusão, era desconhecidadesde a RevoluçãoCultural.
Quando levantei a questão, responderam-mesem mesmo reflectir:
<<Tettdepaciêttcia, as coisas üão mt+dar pata melhor». Ãas auxlo disse-
me: «Ninguém ousará enganar-nos de nodo»
Num certo sentida, os dirigentes da fracçãomaoístanão são tra-
tados de maneira justa pelas massas.Esta-snão se limitam a censurar- ÍNDICE
.hes o ter traído o povo quando da RevoluçãoCul-rural,mas cen- Pág.
suram-lhes todos os erros e todos os males que derivam da estrutura
burocrática.Odeiam verdadeiramente
os maoístas,a um ponto que Introdução, E. iWa#deJ 7

nunca antes tinha imaginado. E parece que a burocracia explora este


fenómeno. Nas escolas, nas fábricas e em todas as estruturas de base, EVOLUÇÃO E TKAJECTÓKIA
explica-se às massas que os lnaoistas são os responsáveis por todos DA CHINA POPULAR
as males. Não se hes fala ainda de mehoramentos. Mas as massas
1 --Origem e evolução da Terceira Revolução Chinesa, E. iW de/ 13
são levadas a pensar que haverá modificações, e aguardam-nas. O pro- 2 -- Mao Tse-tungna RevoluçãoChinesa,P. Rowsief 85
cesso de politização iniciado, estaca e retrocede. Durante a viagem 3 --A Revolução Chinesa segundo M.ao, S. S. W'z/ 97

de regresso a gang Kong, senti-me muito decepcionado.Mas penso 4 -- A trajectória do Maoismo, Ro/a#d l,ew 125
5 -- O Maoismo posto à prova, J. itfarfe Vi celzf 181
que o povo deve fazer a experiência da nova direcção. SÓdepois os
trabalhadores compreenderão que apenas podem contar consigo pl:ó-
prios e não sobre seja quem for óo seio da burocracia. POLÍTICA EXTERNA DA CHINA
1--A teoria dos três mundos, P. Ro iief ... ... ... ... ... ... 187
2--A grande viragem à direita, C. Rossi ... ... ... ... ... ... 193
3 -- Do Chile a Portugal: A política internacional da China, l.iz/fo .ã4di/a# 213

PARA ONDE VAIA CHINA?


1-- A China e a crise do mundo capitalista,Ra/a#dl.em 237
2 -- A luta política após a morte de Mao, Lírio .Mai/a 253
269
3 -- A Colina depois da morte de Aaao,Frederfc C#r/ier
4 -- O regressode Teng llsiao-ping, S. S. W'z/ 287

324
DOCUMENTOS

Pág.

1 -- Textos de Mao 299


2 -- Enuevista com um Guarda Vermelho 313
3 -- Contrastes de duas viagens a Cantão 321

Este livro foi composto e impresso


na Sociedade Industrial Gráfica
Telles da Salva,Lda., para Edi-
ções Antídoto e acabou de se im-
primir no mêsde Marçode 1977

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