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Resenha
Birman, J. (2014). O Sujeito na Contemporaneidade. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira.
Caroline Barros Amaral1, Erico Bruno Viana Campos
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Contato: caroline.barros.amaral@gmail.com
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afastando-se cada vez mais de uma de que este apresenta uma configuração de
possibilidade de ligação com a alteridade: criação artística, que produz uma ruptura
[...] se o sujeito atado na dolorida posição com a realidade da percepção visual. Essa
solipsista não pode fazer qualquer apelo vivência noturna se tece de maneira que uma
ao outro, é o desalento que se impõe como
pathos, destinando-o então a paralisia. Em série de imagens, de forma mais ou menos
contrapartida, o desamparo como correlato que concatenadas, se apresentam no sonho; ora
é da experiência do sofrimento, possibilitaria
ao sujeito movimento desejante, que seria a fora de lugar, ora transfiguradas. A experiência
condição primordial para a simbolização e onírica, fantasiada, apresentada como uma
temporalidade. (Birman, 2014, p. 9)
percepção subvertida pelo desejo, permite que
É necessário fazer algumas pontuações ela seja analisada como categoria de espaço,
acerca da citação acima. Essa posição a mesma categoria de análise da percepção
dolorida, do sujeito perante a dor, é fruto objetiva.
de um intercâmbio entre a especificidade
A interpretação dos sonhos permitida
da modernidade – à medida que o sujeito
pela evocação do sonhador inscreve as imagens
deve aparentar o sucesso a todo custo, e da
oníricas em uma sequência e ordenação. Assim,
especificidade dessa experiência –, na qual
a pontualidade das imagens que se apresentam
o sujeito fecha-se em si. Dessa maneira, é
ao ser se transformam em uma sequência
possível compreender o movimento realizado
regulada pela temporalidade. A partir da
no livro, de constante diálogo entre a expressão
evocação temporal, o sonho se inscreve
subjetiva e a expressão cultural.
como subjetivação e suas interpretações
como procedimento fundado nos registros da
narração e do discurso. Segundo o autor,
Espaço/tempo
[...] a temporalização é o correlato das formas
de simbolização que marcam a produção do
A categoria espaço ganha cada vez
sonho. [...] [a temporização] seria a condição
mais predominância na atualidade e no de possibilidade dos processos de simbolização
presentes no sonho, inscrevendo este então no
psiquismo do sujeito contemporâneo, o que registro da representação-coisa, ao passo que
Birman demonstra por meio da interpretação a espacialidade se evidencia pelos signos de
percepção. (Birman, 2014, p. 21)
dos sonhos e pesadelos na vida dos indivíduos.
Como mostra o autor, existe na história do O pesadelo, por outro lado, seria
Ocidente um apelo à interpretação de sonhos marcado pelo páthos terror, como desejo que se
como uma ferramenta de entendimento do realiza de forma direta e brutal: um conjunto
sujeito, seus impasses, seus desejos. de imagens, tal qual o sonho, embora pontual
O sonho é descrito por Freud (1900) e iriante, que fazem o sonhador acordar de
como uma experiência psíquica regular sobressalto. Isso indica que a categoria de
que, tal qual o lapso, o chiste, o ato falho, é tempo é suspensa, restando somente a questão
uma modalidade de realização de desejos espacial. Expandindo o pensamento do autor,
inconscientes. A diferença que existe entre é possível compreender também o pesadelo
essas modalidades e o sonho reside no fato que se manifesta como compulsão à repetição
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a partir do mesmo movimento de suspensão primordial em sua teoria, pois é por intermédio
do tempo em detrimento da imagem, visto que deles que Birman (2014) irá nomear o mal-
se trata da repetição incansável de uma mesma estar da contemporaneidade. Birman (2014) é
imagem em uma tentativa de simbolização. categórico: o sujeito da atualidade padece de
dor, e não de sofrimento, e esse é seu maior
Na modernidade, é possível identificar
mal.
a importância que o sonho possuía no
desvelamento da subjetividade. No entanto, A dor é uma experiência subjetiva na
na contemporaneidade, há um deslocamento qual o subjetivo fecha-se em si mesmo, como
da categoria do sonho para a categoria da um caranguejo esconde-se em sua concha. O
dor. Como veremos mais a frente, a dor é o mundo não lhe interessa, não existe lugar para
mal-estar principal dessa era, de forma que o nenhum outro diante do seu mal-estar, nada
pesadelo, como experiência de negatividade, pode ajudá-lo. A dor torna o sujeito solipsista,
de desligamento, de espacialidade, ocupa uma preso em um pesadelo, um trauma sem qualquer
posição em destaque em relação ao sonho. vislumbre de uma possível significação. O
A interpretação dos sonhos oníricos, tão sujeito é, então, tomado por um excesso que
teorizada por Freud em seu desvelamento, não possui circuito pulsional para descarga, de
perde sua posição na compreensão do sujeito forma que ele será descarregado como ação
e da cultura, sendo enevoada a categoria ou intensidade, como veremos a seguir. Não
temporalização. apenas impossibilitado de representar seu mal-
estar, as condutas sociais da nossa sociedade
Por meio desse percurso,
iminentemente narcísica impede que ao menos
compreendemos a relação entre o sonho, o
haja a tentativa de colocar a dor em palavras,
pesadelo e o sujeito contemporâneo, implicação
vocalizar o que atormenta sua existência, pois
de uma perda de potencial de simbolização. A
a insuficiência e a abertura ao outro danificam
percepção é do registro de uma apresentação:
a subjetividade idealizada autossuficiente.
apresentação de uma imagem, de um espaço;
já a temporalidade permite uma representação O sofrimento, por outro lado, trata-se
do objeto e a ligação com a alteridade. de uma experiência eminentemente alteritária:
o outro e o diferente estão sempre presentes e
escutam o apelo do sofrente. Sofrer significa,
Dor/sofrimento necessariamente, ligar-se ao outro. De acordo
com o autor,
Nos capítulos iniciais da obra
resenhada, o autor se ocupa em descrever
o mecanismo do sonho e pesadelo, não Na experiência da dor, o sujeito sem abertura
especificando diretamente como o pesadelo e para o outro fica entregue ao desolamento,
não tendo possibilidade de realizar uma
a dor estariam relacionados para além de uma subjetivação possível para aquela experiência.
perda do potencial de simbolização. Contudo, Entregue ao seu solipsismo, o sujeito definha
na sua auto-suficiência, que o paralisa quase
a dor e o sofrimento ocupam um papel que completamente. Seriam essas a posição e
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Referências
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