Sei sulla pagina 1di 18

1

NO QUARTO ANO DA “DÉCADA INTERNACIONAL DE


AFRODESCENDENTES”: o que discutir nos espaços escolares sobre as relações
raciais no Brasil?

Raimunda Ferreira Gomes Coelho1

Ao longo da história, o racismo foi a justificação dos privilégios das


elites e dos infortúnios das classes subalternas. Agora ele se renova
como instrumento de dominação.
(Clovis Moura)
RESUMO

As relações sociais no Brasil construíram-se mediante princípios eurocêntricos, em que portugueses,


sobretudo, impuseram sua cosmovisão, subalternizando os povos nativos, depois, os afrodescendentes,
negando sua condição humana, escravizando-os e disseminando teorias racistas, geradoras das
desigualdades socio-raciais. Mesmo depois das lutas e conquistas, traduzidas nas leis atuais, a população
afrodescendente enfrenta obstáculos para igual usufruto dos direitos garantidos na legislação. Tal
contradição resultou, principalmente, de uma falsa democracia racial, que nega a existência do racismo,
dificultando a busca de solução para os conflitos raciais e a superação das desigualdades. Contudo, o que é
velado, ao mesmo tempo aparece desnudado na conjuntura atual, mediante manifestações racistas abertas,
repercutidas nas mídias e nos espaços públicos, atualizando a ideologia racista, associada a outras formas
de discriminação. Este trabalho resultou de interações em mesas de diálogo em eventos sobre a questão
racial e teve como objetivo analisar a importância da discussão da temática racial no ambiente escolar,
envolvendo outros sujeitos sociais, frente às tentativas de atualização das ideologias racistas e à necessidade
combate-las no momento em que ONU conclama o mundo a participar das atividades da Década
Internacional de Afrodescendentes. Adotou-se como metodologia a apresentação e a análise dos principais
pontos das abordagem, à luz das contribuições dos autores citados no texto. Ficaram evidentes a vontade e
os esforços coletivos de diferentes sujeitos, sobretudo de jovens estudantes e de educadores, no
fortalecimento da reflexão e da educação para superação dos racismos.

PALAVRAS CHAVES: Afrodescendência. Relações raciais. Espaço escolar.

INTRODUÇÃO

Segundo a Organização das Nações Unidas – ONU, a população


afrodescendente está entre as comunidades mais pobres e marginalizadas do mundo,
como mostra o alto índice de mortalidade e mortes maternas, além de acesso limitado a
educação de qualidade, serviços de saúde, moradia e seguridade social, discriminação no
acesso à justiça e enfrentamento de abordagens policial e filtragem racial alarmantemente.
Essa realidade mundial está presente na vida da população afrodescendente
brasileira, dada a forma como foram construídas as relações sociais. A partir da
colonização euro-cristã capitalista, as relações de poder se consolidaram mediante um
processo de dominação, em que os europeus, sobretudo, os portugueses, impuseram sua

1
Mestra em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da UFPI, Campus Universitário
“Min. Petrônio Portella” – Ininga –Teresina – Piauí. Integrante do RODA GRIÔ - GEAfro: Núcleo de
Estudos sobre Gênero, Educação e Afrodescendência, UFPI.
raimundagomes3@hotmail.com
2

cosmovisão, subalternizando primeiro os nativos indígenas, depois, os afrodescendentes,


classificando-os como inferiores e incapazes de conduzir suas vidas. Essa lógica serviu
de justificativa para a escravização dos afrodescendentes e implantação das teorias
racistas, que deram origem e retroalimentam os quadros de desigualdades socio-raciais.
Apesar das lutas e formas históricas de resistência ao escravismo colonial,
séculos depois da abolição e após as conquistas, traduzidas nas leis já consolidadas, a
população afrodescendente ainda é submetida a situações desumanas e enfrenta
obstáculos para o acesso igual a todos os direitos humanos, civis e sociais, garantidos na
legislação. Essa contradição foi resultante, principalmente, de uma falsa democracia
racial, que pregava e ainda prega a inexistência do racismo, dificultando a busca de
solução para os conflitos raciais existentes e para a promoção da igualdade racial.
Contudo, o que foi e ainda é velado, aparece desnudado na conjuntura atual,
através de manifestações abertas de racismo, que ganham notoriedade nas mídias,
sobretudo, nas redes sociais e nos espaços públicos. Esses fatos são preocupantes por
serem tentativas de grupos dominantes defensores das ideologias excludentes atualizarem
as formas de opressão aos povos afrodescendentes. Frente a isso, faz-se necessária a
releitura das relações sociais e compreensão dos discursos, para redirecionar as ações
educativas na perspectiva da superação de todas as formas de discriminação.
Este trabalho é resultado da participação desta pesquisadora em duas atividades.
A primeira, uma mesa de diálogo, dia 16 de fevereiro, no “I Evento de Diversidade:
Discutindo raça, gênero e etnicidade”, no Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Piauí, Campus de São Raimundo Nonato, o qual teve como atividades
palestras, minicursos, oficinas, exibição de documentários e apresentações étnico-
culturais com abordagens sobre o combate ao machismo, racismo, lgbtfobia, misoginia,
entre outras. O objetivo foi ampliar o debate sobre as temáticas mencionadas, discutindo
a diversidade na referida Instituição, como forma de apontar caminhos para inclusão e
quebra de preconceitos.
A outra atividade, realizada nos dias 20 e 21 de novembro, foi o “I
AFROsecundaristas, promovido pelo Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas
(NEABI); o Grêmio Estudantil Paulo Freire, do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia do Piauí, Campus de São João do Piauí, e o Coletivo de Grêmios Estudantis
das escolas públicas da rede estadual de São João do Piauí, em parceria com o letivo de
Juventude do Assentamento Lisboa (MST) e o Grupo Capoeira de Quilombo. O objetivo
foi construir uma consciência política e histórica da diversidade para a compreensão das
questões raciais, superação dos racismos e valorização da história dos povos africanos e
3

da cultura afro-brasileira na construção histórica e cultural brasileira, que foi negada e


distorcida. O referido evento ocorreu em dois dias, com discussões sobre racismo e
igualdade racial, por meio de rodas de conversa, exposições artísticas e uma caminhada
por ruas estratégicas da cidade.
O objetivo desta abordagem é analisar a importância da discussão da temática
racial e outras no ambiente escolar, interagindo com demais sujeitos sociais, frente às
tentativas de atualização das ideologias racistas e à necessidade se combater a
discriminação racial, dar visibilidade aos valores e conquistas da população
afrodescendente e às suas contribuições para a humanidade, como sugere a ONU, nesta
Década Internacional de Afrodescendentes, iniciada em 2015, estendendo-se até 2024.
O intuito foi registrar as experiências de formação engajada, protagonizadas
coletivamente por sujeitos sociais do espaço escolar e não escolar, como estratégias para
superação dos racismos, reeditados no contexto atual.
A importância desta abordagem está, principalmente, na sistematização de
conhecimentos produzidos de forma solidária, considerando os diferentes grupos sociais
envolvidos, cujas reflexões representam realidades e preocupações da diversidade da
população local, que tem relação com a realidade nacional e mundial.
O registro dessas atividades permitem uma síntese das discussões, a avaliação
das aprendizagens e a socialização de conhecimentos relevantes no espaço escolar, que
servirão de provocações para repensar o contexto atual de discursos racistas e as
possibilidades de superação de eventos contrários aos direitos humanos.
Adotou-se como metodologia a apresentação e a análise dos principais pontos das
abordagens, à luz das contribuições de Cunha Junior (2005; 2008), Fanon (2008), Gomes
(2005), Moura (1988;1994; 2001), Munanga (2005), Nascimento (1978) entre outros.
A abordagem está organizada em três partes, além da introdução e das
considerações provisórias. A primeira, trata dos conflitos raciais no Brasil na conjuntura
atual e contexto macro gerador dos conflitos raciais. Na segunda, trata-se das relações
étnico-raciais na escola e em outros espaços sociais, problematizando sobre os reflexos
das ideologias racistas do passado e do presente; discute-se a conjuntura atual dos
conflitos raciais como oportunidades pedagógicas para aprofundar o conhecimento sobre
as questões raciais. A última, faz a articulação das propostas dos Eventos analisados e o
que propõe a ONU, através das atividades da “Década Internacional dos
Afrodescendentes” para a superação de tais conflitos. Além disso, serão apresentadas
algumas estratégias para a construção solidária de uma cultura antirracista, considerando
os objetivos da década internacional dos afrodescendentes.
4

Os resultados evidenciaram o protagonismo dos jovens estudantes,


principalmente, os envolvidos nos colegiados, que, motivados e acompanhados por
educadores, já demonstram consciência do seu papel social na transformação das
estruturas injustas de sociedade brasileira, formadas a partir dos princípios do
colonialismo eurocentrado, racista e excludente.

NA DÉCADA INTERNACIONAL DOS AFORDESCENDENTES: persistência e


atualização dos racismos no Brasil

A conjuntura atual da sociedade brasileira apresenta sinais visíveis de que um


dos seus problemas mais graves não foi resolvido, mas repete seus rituais históricos,
ganha novos contornos e se fortalece. Trata-se do racismo, que reeditado nas mais
diferentes formas, tem avançado. Analisando-se os conflitos raciais dos últimos anos
desta década no Brasil, é possível identificar eventos racistas preocupantes, por
desafiarem até mesmo o conjunto de dispositivos legais criados, por foça das lutas do
povo afrodescendente, justamente para prevenir, coibir e combater “a discriminação
racial no mundo, em todas as suas formas e manifestações, e de assegurar a compreensão
e o respeito à dignidade da pessoa humana” (ONU, 1965).
No entanto, é preocupante se constatar que as lutas antirracistas e seus resultados
substanciais, traduzidos nos instrumentos jurídicos internacionais e nas leis nacionais
brasileiras, influenciadas por tais instrumentos não foram ainda suficientes para se atingir
nem a situação mínima deseja nas relações sociorraciais, quanto mais para a eliminação
de todas as formas de discriminação racial, preconceito, xenofobia e intolerância
correlacionada e desigualdades. Essa constatação por diferentes setores sociais,
principalmente, os que historicamente lutam na contramão do colonialismo e da
colonialidade (QUIJANO, 2010), impulsiona-os a lutarem pelo cumprimento de todos os
acordos e legislação de combate às ideologias racistas, visando garantir o reconhecimento
dos afrodescendentes como sujeitos da história e a sua participação plena e igualitária nas
vidas pública, política e econômica (ONU, 2015-2024).
A garantia dessa participação só será possível com a remoção de “todos os
obstáculos que impedem o desfrute igualitário de todos os direitos humanos, econômicos,
sociais, culturais, civis e políticos, incluindo o direito ao desenvolvimento” (ONU, 2015-
2024), o que parece desafiador, no contexto atual. Nos processos históricos caracterizados
por rupturas e permanências, o Brasil se situa hoje como uma Nação em que as ideologias
racistas, que permaneceram, fermentando-se no seio de setores conservadores, despontam
5

agressivas no ataque aos grupos sociais, entre eles, a população afrodescendente. O que
era camuflado, agora aparece manifestado explicitamente por sujeitos dos diferentes
segmentos sociais e naturalizadas por parte significativa da sociedade, de forma que
ataques partem, inclusive, de autoridades públicas, com poder político de decisão, e,
declaradamente, contra os direitos conquistados.
O cenário posto comprova a tese de Moura (1994) de que o racismo foi e continua
sendo uma arma ideológica de dominação usada pelo colonialismo europeu, que deixou
como legado a mentalidade colonial, conceituada por Quijano (2010) de colonialidade,
introjetada no pensamento brasileiro, independente da permanência do domínio
territorial e da superação do racismo cientifico. O genocídio contra a população
afrodescendente no passado escravista, denunciado por Nascimento (1978), atualiza-se,
com outros aparatos de forma mais sofisticada, disseminada através de setores midiáticos
de controle dos “herdeiros dos crimes”, que continuam no presente “a se beneficiar das
fortunas acumuladas indevidamente, sem o compartilhamento, reordenamento e
redistribuição dos benefícios com os povos prejudicados (CUNHA JR, 2005, 48).
Por isso, justifica-se a agressividade do racismo, à medida que avançam as lutas
e se definem medidas para sua eliminação. Pode-se compreender que essas medidas
promotoras da ascensão de afrodescendentes aos lugares sociais demarcados pela elite
colonizadora para si, têm relação com essa revitalização. Ao que parece, os “herdeiros
dos crimes” e “das fortunas”, tem como papel a continuidade do processo de dominação,
para isso tenta manter nos lugares sociais subalternos, o povo afrodescendente. Com as
resistências e as reinvindicações da população afrodescendente, geradoras de conquistas
gradativas e reposicionamento na escala social, as reações são previsíveis, como ocorreu
desde a organização dos quilombos e nos diferentes momentos históricos.
Ainda sobre a permanência das ideologias racistas, o pensamento de Cunha Junior
(2005), converge com a tese defendida por Moura (1994), quando afirma que,
embora nos últimos 50 anos as diversas áreas das ciências, notadamente a
biologia, se dedicaram a superar a ideia de raças humanas, esse conceito ainda
opera estragos sucessivos no imaginário social e nas representações sociais.
[...] A raça biológica está sepultada, superada como forma de pensamento, mas
os problemas persistem. Outras formas derivadas dos resquícios da raça
biológica estão ainda em evidência. Uma delas é a teoria da mestiçagem, que
parte da existência de três raças biológicas, as transforma numa raça social e
faz apologias da mestiçagem brasileira como solução de um problema social
(CUNHA JR., 2005, P.252).

Prova do que o autor problematiza é aumento assustador dos casos de racismo,


partindo de diferentes setores sociais e atingindo os afrodescendentes, que tentam acessar
seus direitos, principalmente, os que ousam ocupar espaços mais estratégicos de poder.
6

Para ilustrar os “estragos” de que trata o referido autor, serão apresentados algumas frases
e eventos racistas ocorridos nos últimos anos e que foram pontos de reflexão na
Palestra de Abertura do “I Evento de Diversidade: Discutindo raça, gênero e etnicidade”,
intitulada “Educação e relações etnicorraciais na escola”.
Para desenvolver a primeira ideia, lançou-se a questão “Como se dão as relações
etnicorraciais na escola em outros espaços sociais?”, apresentando-se frases de pichações
e outros eventos racistas de bastante repercussão nos espaços acadêmicos e nas redes
sociais, causadores de indignação e reação, sobretudo, de pessoas afrodescendentes, alvos
centrais dos ataques.
A primeira pichação analisada foi a seguinte: “Lugar de negro não é no
Mackenzie, é no presídio” (Pichação no banheiro masculino da Faculdade de Direito da
Universidade Presbiteriana Mackenzie - São Paulo, 2015). O discurso presente no texto
remete aos lugares sociais dos afrodescendentes, no imaginário de parte significativa da
sociedade brasileira, apesar de a maioria dos brasileiros não se reconhecerem racistas.
Segundo uma pesquisa do Instituto Data Popular, divulgada em 2014 pelo Centro
Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, 92% dos brasileiros acreditam que
há racismo no país, mas somente 1,3% se considera racista. Mostra ainda a pesquisa que
68,4% dos brasileiros adultos disseram ter presenciado um branco se referir a um negro
como “macaco”, sendo que apenas 12% reagiram ao fato. O referido estudo revela, ainda
que um em cada seis homens brancos não queria ver uma filha casada com um homem
negro.
Tal pesquisa só reforça a ideia da existência e a persistência de um “cinismo
étnico” que, segundo Moura (2001), permeia as relações na sociedade brasileira, de forma
que “todo brasileiro tem um discurso democrático e um comportamento racista. Ninguém
se diz racista no Brasil, mas quando a realidade étnica se apresenta, o seu comportamento
é outro e o seu discurso desaba” (MOURA, 2001, p. 1).
A proposta dessa reflexão temática logo na abertura do Evento mencionado foi
proposital, visando discutir e analisar os a permanência e avanço dos racismos no
contexto atual, bem como questionar seus mecanismos de reprodução, sendo alguns deles
o “ mito da miscigenação e da democracia racial” que “criou argumentos ideológicos
(estruturas)”, significando “elemento complicador da situação do negro” (CAVALEIRO,
2000), por evitar a análise das “formas ordenadas destas populações poliétnicas”
(MOURA 1988, p. 61), e camuflar o racismo.
7

O outro mecanismo é o silenciamento diante da questão, o qual


potencializa o racismo, já que a discriminação silenciosa vai ganhando força e oprimindo
ainda mais os afrodescendentes. Sobre isso, Gomes (2005, p.47) reforça que

Quanto mais a sociedade, a escola e o poder público negam a lamentável


existência do racismo entre nós, mais o racismo existente no Brasil vai se
propagando e invadindo as mentalidades, as subjetividades e as condições
sociais dos negros.

E isso no cotidiano escolar pode “contribuir para prejuízos na aprendizagem do


aluno negro, minar o seu processo identitário e deixar mágoas, sofrimentos, muitas vezes
não expressos”. (CASTRO; ABRAMOVAY, 2006, p. 245).
O mais preocupante na frase pichada é que foi numa faculdade de direito, espaço
de formação e, ainda mais, de preparação de agentes cujo papel é promover a justiça. Na
discussão sobre o caso de racismo em análise, destacou-se a preocupação no
pronunciamento de uma estudante afrodescendente da referida faculdade: "É difícil pra
mim, como estudante negra, desse mesmo prédio, escrever sobre essa imagem, porque
ela é a representação do pensamento racista que eu sei que passa na cabeça de muitos que
permeiam pelo Mackenzie“. (Tamires Gomes Sampaio, 1ª negra a assumir a diretoria do
Centro Acadêmico do curso de Direito da Mackenzie). O agravante é que essa pichação
não foi a única nesse sentido, mas foram expostas outras de conteúdos semelhantes,
espalhadas por outros espaços da mesma faculdade, as quais foram também objetos de
reflexão: “O Mack não deveria aceitar nem nordestinos”; “Fora PT e devolvam os pretos
para a senzala”.
As discussões em torno da temática “Educação e as relações etnicorraciais na
escola” instigou estudantes e educadores a exporem outros casos de racismos em mais
espaços acadêmicos e nos diferentes espaços sociais, ganhando destaque o racismo nos
esportes e nas redes sociais, bem acentuado nos últimos anos.
O problema do racismo no esporte, apontado por estudantes e professores, gerou,
posteriormente, uma análise da situação e se verificou que o esporte é um espaço potencial
das manifestações explicitas racismo, de injúria e discriminação racial. Conforme o
relatório do Observatório da Discriminação Racial do Futebol Brasileiro, os casos de
racismo no futebol aumentaram 85% de 2014 para 2015, enquanto as punições no
Superior Tribunal de Justiça Desportiva - STJD diminuíram significativamente; das 37
ocorrências no ano de 2015, houve apenas uma punição no Tribunal. Um agravante foi o
aumento do índice de 64% de 2016 para 2017, o Observatório.
Quanto ao racismo nas redes sociais, analisou-se o print de uma postagem numa
página de Twitter, sobre o Joaquim Barbosa, ministro do Supremo Tribunal Federal, em
8

2013: “e pensar que Lula o nomeou por ser negro, o principal atributo de sua ascensão ao
STF, agora age como preto”. O autor da frase afirmou ter pedido desculpas ao Ministro.
A questão, ao ser resolvida apenas com pedido de desculpa, concorre para a naturalização
e a manutenção do racismo.
Os eventos de racismo aqui citados sinalizam que a questão racial não é apenas
conjuntural, mas estrutural, crônica, com suas raízes na ideologia eurocêntrica, que
atribuiu aos afrodescendentes condição de existência e incapacidade intelectual
inferiores. Por isso, Moura (1994, p. 1) alerta que o racismo “transcende em muito as
questões acadêmicas, para atingir um significado mais abrangente, da ideologia de
dominação”, sendo necessário se admitir “o papel social, ideológico e político do racismo
para compreender sua força permanente e seu significado polimórfico e ambivalente.
A conjuntura atual, o avanço na conquista de direitos pelos afrodescendentes,
essas reações fazem parte das tensões raciais, por representarem certo abalo às estruturas
socias dominantes, pois, segundo Moura (1994) em determinados momentos histórico-
políticos, o racismo adquire mais vitalidade e se desenvolve com mais agressividade, no
contexto das relações locais, nacionais e internacionais. Ao que parece, o Brasil vive a
revitalização e a agressividade do racismo, após séculos lutas antirracistas.
Isso transpareceu, por exemplo, no desenvolvimento das atividades do Projeto “I
AFROsecundaristas, cujo tema “Estudantes secundaristas: a construção de uma sociedade
sem racismos é possível e urgente”, sugere uma forma de reação de jovens estudantes que
se sentem afetados pelo contexto sociopolítico em que as ideologias racistas os assustam
e os intimidam de forma impactante.
Um fato que justifica essa “urgência” na construção de uma sociedade sem
racismo é o número crescente de jovens afrodescendentes excluídos, inferiorizados e
assassinados. Segundo pesquisa realizada pelos Estudos e Políticas do Estado, das
Instituições e Democracia (Ipea), de autoria de Cerqueira; Moura (2013), com base no
Sistema de informações sobre Mortalidade (SIM/MS) e no Censo Demográfico do IBGE
de 2010, dos indivíduos que sofreram morte violenta entre 1996 a 2010, a maioria são
negros. Segundo os cálculos, mais de 39 mil pessoas negras são assassinadas todos os
anos no Brasil, contra 16 mil indivíduos de todas as outras “raças”.
No da Mapa da Violência Waiselfsz (2016), produzido pela Faculdade Latino-
Americana de Ciências Sociais (Flacso), apurando violência por armas de fogo, a taxa
de homicídios de negros aumentou 9,9% entre 2003 e 2014, passando de 24,9% para
27,4%. Assim, a vitimização negra do país, que em 2003 era de 71,7%, mais que duplicou:
em 2014 alcançou 158,9%, significando a morte de 2,6 vezes mais negros que brancos
9

vitimados por arma de fogo. A pesquisa mostra, também, que a maioria desses jovens,
entre 19 e 25 anos mortos por armas de fogo, em 2014, são de negros das periferias das
grandes cidades. É prova de que a violência tem cor, está associada ao racismo e o
principal alvo são os jovens negros em situação desprivilegiada. Por essa razão, a
preocupação dos estudantes, ao realizarem o “I AFROsecundaristas”, é pertinente e
precisa ser considerada pelas escolas, principalmente, porque apontaram a necessidade
de se trabalhar a temática racial de forma mais abrangente no currículo escolar.
Nos dois eventos, objetos de análise dessa abordagem, fez-se uma reflexão acerca
do contexto macro gerador dos racismos e das demais formas de discriminação. A
discussão, partindo da pergunta motivadora “A partir de que concepções e referenciais
foram/são construídas as relações sociais na sociedade brasileira?” foi para instigar o
pensamento sobre as vivências e suscitar as muitas histórias, que aos poucos foram se
revelando. Em seguida, a instigadora da questão expôs uma sínese das origens dos
conflitos raciais, seguida das discussões dos participantes.
A síntese se baseou em Coelho (2013), apoiada em teóricos e pesquisadores,
destacando que as relações sociais no Brasil se construíram a partir do pensamento euro-
cristão capitalista imposto pelos colonizadores, a partir de uma relação de dominação na
qual o povo europeu, intitulando-se superior, concentrou grande poder para classificar,
escravizar e explorar de todas as formas os povos não cristãos, entre eles os
afrodescendentes. Fundado nessa lógica, o colonizador criou o eurocentrismo e o
etnocentrismo, atribuiu-se o status de zona metropolitana, civilizada, tratando outras
regiões do mundo como zona colonial, não-lugar, cujos indivíduos, sendo sem alma,
“selvagem”, “receptáculo vazio”, poderiam ser escravizados (SANTOS, 2010).
Na síntese, ficou entendido que o arrojado projeto colonialista, se consolidou
mediante um aparelho ideológico bem arquitetado (MOURA, 1988), com apoio
articulado da ciência, do direito e da fé, imprimindo a inferioridade aos povos colonizados
e a todas as suas formas de existência. Além de praticar o genocídio (NASCIMENTO
1978), praticou o epistemicídio, condenando e invalidando saberes e práticas dos
afrodescendentes, de forma que, no plano individual, foram taxados como inferiores;
religiosamente, como sem almas; intelectualmente, como menos capazes; esteticamente,
feios; sexualmente, como objeto de prazer; socialmente, como sem costumes; e,
culturalmente, classificados como selvagens (SANTOS, 2007).
A síntese evidenciou a vitalidade da ideologia eurocêntrica, que, assimilada e
introjetada pela sociedade brasileira, criou a mentalidade duradoura, a colonialidade
(QUIJANO), que, auxiliada pela ideia da democracia racial e do silenciamento, continua
10

a operar, retroalimentando as práticas racistas do presente, o que justifica a persistência e


do racismo, mesmo depois do fim do domínio territorial e da escravidão oficial.
A síntese apontou o espaço acadêmico como parte integrante do aparelho
ideológico da colonização, que fundado na monocultura do saber, foi (e ainda é) espaço
de reprodução das teorias racistas e práticas de dominação e exclusão, privilegiando a uns
(eurodescendentes) e excluindo outros (afrodescendentes, principalmente), por
considerar inferiores os conhecimentos e valores desse grupo social.
Finalizando a síntese, a instigadora da discussão, enfatizou a necessidade de
reconstrução do sistema educacional brasileiro, pontuando as rupturas já ocorridas a partir
das lutas dos movimentos sociais, sobretudo, dos movimentos negros, na proposição de
politicas educacionais antirracistas, garantidas já na legislação brasileira. As
considerações finais consistiram em relembrar as conquistas e mudanças rumo a uma
educação antirracista, apesar dos desafios, destacando os eventos já referenciados como
iniciativas importantes na mobilização das escolas e da sociedade para a percepção do
contexto social permeado por conflitos raciais, entre outros, e para a reflexão sobre a
referida temática e o combate a todas as forma de discriminação racial.
Percebeu-se que os próprios estudantes reivindicam que a temática racial se faça
constar nos currículos das escolas. Nas discussões realizadas nos dois eventos, houve
engajamento e protagonismo, principalmente, se tratando do Evento “I
Afrosecundaristas” , por ter sido elaborado por estudantes dos Grêmios, envolvendo a
educação básica, em que se articularam ensino fundamental e médio. Esses processos de
formação geram consequências muito positivas, porque partem de uma necessidade
intrínseca, de uma vontade coletiva de transformação da realidade.

AS RELAÇÕES ETNICORRACIAIS NA ESCOLA E EM OUTROS ESPAÇOS


SOCIAIS: situações de discriminação como oportunidades pedagógicas
privilegiadas para discutir a questão racial

Na primeira parte desta abordagem, observou-se que o racismo persiste, avança


e se reedita, gerando situações conflituosas e opressoras. Esta parte será desenvolvida em
a partir da questão, ponto de reflexão nos dois eventos em análise, “Por que tratar das
relações etnicorraciais na escola?”, cuja intenção foi potencializar as inquietações e o
interesse dos estudantes pela temática, auxiliá-los na reafirmação das suas convicções em
defesa da construção de uma sociedade antirracista, tomando a conjuntura atual como
oportunidades pedagógicas para aprofundar o conhecimento sobre as questões raciais.
11

Como já se discutiu, o racismo no Brasil é estrutural, repassado nas relações


sociais, mas ao mesmo tempo é negado por parte da população. O contexto atual de
atualização das ideologias racistas tem seus reflexos no ambiente escolar, lugar
privilegiado para discutir a questão. São recorrentes as queixas de racismos envolvendo
estudantes entre si e até mesmo na relação professor/aluno.
Apesar desses conflitos visíveis e dos instrumentos legais determinando a
inclusão da questão racial no currículo escolar, há uma certo impasse devido alguns dos
professores não receberam na sua educação e formação de cidadãos, “o necessário
preparo para lidar com o desafio que a problemática da convivência com a diversidade e
as manifestações de discriminação dela resultadas colocam quotidianamente na nossa
vida profissional” (MUNANGA, 2005, 15). Isso se à educação eurocêntrica recebida,
cuja questão racial foi negligenciada, o que dificulta a compreensão dos processos
históricos geradores dos racismos e os leva a “reproduzir consciente ou
inconscientemente os preconceitos que permeiam nossa sociedade” (MUNANGA, 2005,
15) ou não sabermos lidar com os eventos de racismo na sala de aula de aula.
Em razão disso, os momentos de manifestação de racismo que ocorrem nos
processos educativos, por meio das interações, são tratados isoladamente, em
determinados momentos, limitando-se a pedidos de desculpas, punições e reprovações de
atitudes de pena da criança ofendida, sem o devido processo de formação que leve à
desconstrução da ideologia racista e à reconstrução de um pensamento antirracista.
Diante das manifestações de racismos nos espaços educativos, a atitude mais
acertada é analisar o caso, buscar entender as concepções dos envolvidos para ajuda-los
a refazerem a sua caminhada de formação, refletindo sobre os preconceitos já introjetados
e reorientá-los na direção de uma educação para a convivência com a diversidade.
Munanga (2005, p.15) recomenda que se aproveite as “situações flagrantes de
discriminação no espaço escolar e na sala como momento pedagógico privilegiado para
discutir a diversidade e conscientizar seus alunos sobre a importância e a riqueza que ela
traz à nossa cultura e à nossa identidade nacional”.
Por isso, o contexto de atualização das ideologias deve merecer dos espaços
educativos reação na mesma medida. Quanto mais surgirem situações de racismo, mais
frequentes e eficazes devem ser nossas ações. Assustar-se, ficar perplexo ou silenciar-se,
contribui para naturalização das discriminações e preconceito e, consequentemente,
reprodução das ideologias racistas. As relações raciais na escolas devem ser discutidas
por vários motivos, entre eles os apontados a seguir.
12

Primeiro, para recontar a história dos afrodescendentes, desconstruindo os


estereótipos negativos imprimidos a sua identidade. O propósito é romper com o
silenciamento histórico em relação às existências, saberes, resistências e feitos do povo
afrodescendente, sufocados pela ideia da democracia racial. Além disso, discutir a
abolição inacabada e a situação atual da população afrodescendente, desfazendo a ideia
de que, com a abolição e a aprovação do conjunto de legislação, o problema estaria
resolvido, para não permanecer a herança do racismo, cujos efeitos simbólicos geram
novas situações de exclusão (NASCIMENTO, 2003).
Segundo, porque se faz urgente a superação da ideia de inferioridade gerada
pelo processo de colonização ocidental que imprimiu nos afrodescendentes a
inferioridade em relação aos eurodescendentes (FANON 2008) e se promover a
construção de uma identidade afrodescendente positiva (GOMES, 2005). E isso, só se
consegue com uma prática educativa antirracista, mediada por educadores com formação
suficiente mediação de uma prática para a desconstrução dos estereótipos negativos e para
prevenção de violência contra crianças afrodescendentes.
Terceiro motivo é a necessidade de se reconhecer a significativa participação
dos afrodescendentes na construção da Nação Brasileira em todos os seus aspectos
(SILVA, 2011). Isso ainda não faz parte do currículo escolar de forma plena, visto que
conteúdos são abordados, quase sempre, em datas pontuais e ocultando, sobretudo, os
feitos e as resistências do povo afrodescendente. Conforme denuncia Coelho (2013) a
partir de depoimentos de sujeitos da sua pesquisa de Mestrado, o foco dos conteúdos
ainda é na escravidão, sugerindo passividade e inércia do grupo social afrodescendente.
O quarto motivo é a necessidade de se perceber as desigualdades sociais como
consequências dos racismos, uma vez que em todas as estatísticas, as pessoas
afrodescendentes estão em desvantagem. Entende-se que desconhecimento da história de
negação dos direitos às pessoas afrodescendentes leva setores da sociedade a não
relacionarem as desigualdades ao racismo, atribuindo ao povo afrodescendente a culpa
pela situação de desvantagem em que se encontram.
Outro motivo é para compreender que o baixo desempenho social e educacional
dos afrodescendentes “faz parte de um sistema perverso, de facetas múltiplas e de
natureza ideológica resultante do estado atual das relações intercélticas” e que “os
insucessos são programados, estão edificados numa lógica da inclusão diferenciada e
controlada dos diferentes grupos étnicos na sociedade nacional” (CUNHA JUNIOR,
2008, p. 230), e assim comprometer-se com a construção de um mundo mais justo, onde
as diferenças não sejam motivos para geração de desigualdades sociais.
13

A COSNTRUÇÃO SOLIDÁRIA DE UMA CULRURA ESCOLAR E SOCIAL


ANTIRRACISTAS E OS OBJETIVOS DA DÉCADA INTERNACIONAL DE
AFRODESCENDENTES: o que já se tem feito e se precisa fazer?

Frente à constatação da revitalização das ideologias racistas, a reação não deve


ser apenas de manifestação da perplexidade. Precisamos olhar para a história e buscar a
razão de ser dos fenômenos já mencionados para entender que o racismo colonial não
findou com a abolição oficial nem com a promulgação do conjunto de leis, mas continua
a operar, porque ficou consolidado o pensamento racista, que pode despontar e se
intensificar dependendo do momento histórico. Os grupos dominantes e os grupos sociais
historicamente oprimidos continuam em defesa manutenção das suas existências e na
disputa de poder, logo os conflitos existirão, destacando-se aqui os conflitos raciais.
Consciente dessas possibilidades históricas e preocupada com o contexto global
de persistência da discriminação racial, a Organização das Nações Unidas -ONU, vem
atuando no sentido de garantir igualdade na justiça e nos sistemas de aplicação da lei,
visando promover e defender os direitos humanos da população afrodescendente em
todos os lugares (ONU, 2015-2024). Para isso criou a Década Internacional de
Afrodescendentes, cujo Programa de Atividades fortalecerá as ações para superar os
muitos obstáculos encontrados por milhões de pessoas, em todas as regiões do mundo. A
conclamação da ONU é pertinente, principalmente, considerando o contexto atual em
que os erros terríveis do passado contra a população afrodescendente, ao que parece, estão
sendo naturalizados.
O Programa de Atividades da Década prevê ações em três eixos: reconhecimento,
justiça e desenvolvimento e incentiva os Estados a implementarem ações para proteger
grupos ancestrais da população afrodescendente. É importante que os espaços educativos
escolares e não escolares discutam e conheçam esse Programa de atividades para
desenvolver ações nesse sentido, sendo uma delas provocar o Estado, nas diferentes
esferas para “estabelecer e/ou fortalecer mecanismos ou instituições nacionais a fim de
formular, monitorar e aplicar políticas de enfrentamento ao racismo, à discriminação
racial, à xenofobia e a intolerâncias” (ONU, 2015-2024).
A preocupação da ONU com o combate ao racismos e todas as formas de
discriminação ressoar em alguns espaços educativos. É o caso das instituições promotoras
dos eventos objetos de análise desta abordagem. O “I Evento de Diversidade: Discutindo
raça, gênero e etnicidade” do Campus São Raimundo Nonato do Instituto Federal do
14

Piauí, planejou e realizou uma programação, com temática diversificada para dar conta
das inquietações do contexto atual. Ficou explícita a preocupação com a eliminação de
todas as formas de discriminação e preconceitos, pois os temas machismo, racismo,
lgbtfobia, misoginia, movimentos de resistência como o feminismo e os quilombos,
questões ligadas a inclusão de pessoas com deficiências, debates sobre indígenas no Piauí,
e África e o processo diaspórico, foram bem explorados, de forma articulada e envolvendo
professores, estudantes, pessoas da comunidade e movimentos sociais.
As referidas atividades estão em consonância com o eixo 1, nas dimensões B,
“Educação em igualdade e conscientização”, que recomenda a organização de eventos
com o objetivo de acionar um debate público e conscientização sobre a luta contra o
racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerâncias relacionadas, com a participação
de todas as partes interessadas, incluindo o governo, representantes da sociedade civil e
indivíduos ou grupos de indivíduos vítimas desses atos; e de promover um melhor
conhecimento, reconhecimento e respeito quanto às culturas, à história e às tradições da
população afrodescendente.
Quanto ao evento “I Afrosecundaristas”, com o tema geral “Estudantes
secundaristas: a construção de uma sociedade sem racismos é possível e urgente”, o próprio tema
já denota a preocupação em compreender o contexto atual das relações raciais. A justificativa
do Projeto do referido Evento aponta contradições, expressas nas estatísticas, como a
incompatibilidade entre o número o tamanho população afrodescendente e o número
reduzido de pessoas que acessam as políticas.
Ficou bem evidenciado no referido Projeto que já existe um estágio de
consciência crítica e compromisso o combate ao racismo, bem expresso nesse fragmento
do Projeto “achamos importante discutir a questão racial para nos fortalecermos e
atuarmos na defesa da promoção da igualdade racial, começando pelo ambiente escolar.
Como objetivos específicos constam: discutir a questão racial em diferentes espaços
através da diversidade de manifestações culturais, evolvendo estudantes, educadores,
comunidades, ativistas negros; destacar os processos históricos geradores dos racismos e
as lutas das pessoas afrodescendentes para a superação desse racismo, reafirmação de sua
identidade e seus valores e para a promoção da de direitos; ampliar o acesso a informações
sobre a diversidade da nação brasileira e sobre a recriação das identidades, provocada por
relações -raciais; valorizar a oralidade, a corporeidade e a arte, por exemplo, como a
dança, marcas da cultura de raiz africana, ao lado da escrita e da leitura; reconhecer os
afrodescendentes como grupo social que participou significativamente para a construção
15

da nação e de suas riquezas materiais e imateriais em todos os aspectos: sociocultural,


econômico, religioso.
A programação se desenvolveu em 2 dias, com Programas de rádio, Roda de
Conversa e Caminhada e Ato Cultural, envolvendo estudantes, professores, movimentos
Sociais. A Roda de Conversa, da qual esta pesquisadora participou, teve como tema
“Questão racial: o que já ouvimos e aprendemos e o que precisamos rediscutir e
compreender para a superação dos racismos?” Tal questão suscitou uma discussão sobre
a permanência agressiva dos racismos e seu enfrentamento, mediante processo amplo de
conscientização, que descontrua
os estigmas e os estereótipos constituídos historicamente pela maioria dos
brasileiros fazem emergir a urgência de inversão desses falsos valores, sendo
umas das múltiplas estratégias necessárias para o desmonte de linguagens, das
ações e dos pensamentos racistas (MARTINS, 2013, p. 29).

Essa “urgência“ na inversão desses “falsos valores”, mencionada por Martins


(2013) é a mesma “urgência” proclamada pelos estudantes “Afrosecundaristas”, na
direção do combate aos racismos e todas as formas de discriminação.
As experiências analisadas são respostas à última questão das conversas nos dois
eventos: “É possível construir uma educação escolar antirracista? O que fazer? Acredita-
se que é possível sim, porque a história é testemunha de que as realidades não são
estáticas. A luta do povo afrodescendente por reconhecimento de seus valores e contra o
regime escravista é exemplo disso, pois se há uma legislação robusta na garantia dos
direitos das pessoas afrodescendentes é porque mudanças ocorreram.
Um dos caminhos para a construção de uma cultura antirracista é olhar
reflexivamente para a história e identificar os problemas, as opressões como também as
lutas e resistências para, assim, continuar a caminhada.
Outro caminho é romper o silêncio e trazer à tona todas as questões envolvendo
as relações sociais, desconstruir a ideia da democracia racial, protagonizar processos
educativos para a construção da identidade afrodescendente positiva, promover uma
formação continuada consistente dos educadores, reivindicar a implementação das
politicas de promoção da igualdade racial nas diferentes áreas, fazendo que se efetivem o
conjunto de leis promulgadas neste sentido.

CONSIDERAÇOES PROVISÓRIAS
Esta abordagem permitiu refletir sobre a conjuntura atual de revitalização das
ideologias racistas e analisar a importância da discussão da questão racial no ambiente
16

escolar, envolvendo outros sujeitos sociais, na tentativa de superar o racismo, atendendo


ao chamado da ONU nesta Década Internacional de Afrodescendentes.
Constatou-se que os sinais de atualização das ideologias racistas são preocupantes,
exigindo um conjunto de ações articuladas para a continuidade dos avanços no
enfrentamento ao racismo. Observou-se que os desafios são grandes, nesse sentido,
devido o poder vitalício do racismo, que é mantido pela mentalidade (colonialidade)
duradoura construída pelo pensamento euro-cristão capitalista.
Foi possível observar que existe uma reação permanente ao enfrentamento dos
racismos desde o inicio da colonização, a partir da formação dos quilombos, perpassando
por todas as lutas ao longo da história, mostrando que o povo afrodescendente reagiu e
continua a reagir à altura das opressões sofridas e das ameaças às suas existências.
Percebeu-se que as memórias dessas lutas retroalimentam as lutas cotidianas, animando
outros sujeitos a se engajarem na defesa de uma sociedade antirracista.
Conclui-se que está havendo um esforço orquestrado no combate aos racismos, a
partir da constatação de atividades semelhantes, desenvolvendo-se em espaços diferentes,
em sintonia com as recomendações dos instrumentos jurídicos internacionais e nacionais
no combate aos racismos e na promoção da igualdade de racial, razão pela qual é possível
ter esperança de relações sociais futuras com menos racismos e mais respeito às
diferenças.

REFERÊNCIAS

ABRAMOVAY, Miriam. CASTRO, Mary Garcia (coords.). Relações raciais na


escola: reprodução de desigualdades em nome da igualdade. Brasília: UNESCO, INEP,
Observatório de Violência nas Escolas, 2006.

CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do Silêncio do Lar ao Silêncio Escolar: Racismo,


preconceito e Discriminação na Educação Infantil. São Paulo: Contexto, 2000.

CERQUEIRA, Daniel R. C.; MOURA, Rodrigo L. de. Vidas Perdidas e Racismo no


Brasil. Nota técnica, n° 10. Brasília: IPEA, 2013. Disponível em: <
http://www.seppir.gov.br/central-de-conteudos/publicacoes/pub-pesquisas/nota-tecnica-
vidas-perdidas-e-racismo-no-brasil.pdf>.

COELHO, Raimunda Ferreira Gomes. As educações escolar e social na formação da


identidade racial de jovens nos quilombos de São João do Piauí. Dissertação
(Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal do Piauí,
Teresina, 2013.
17

CUNHA JUNIOR, Henrique. Me chamaram de macaco e eu nunca mais fui à escola.


In: GOMES, Ana Beatriz Souza; CUNHA JUNIOR, Henrique (org.). Educação e
afrodescendência no Brasil. Fortaleza: EdUFC, 2008, p. 229-240.
________ Henrique. Nós, afro-descendentes: história africana e afrodescendente na
cultura brasileira. In: ROMÃO, Jeruse (Org.). História da Educação do Negro e
outras histórias. Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade.
Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade. 2005. p. 249-273)

FANON, Frantz. Pele negra máscaras brancas. Tradução de Renato da Silveira.


Salvador: Edufba, 2008.

GOMES, N. L. Alguns termos e conceitos presentes no debate sobre Relações raciais no


Brasil: uma breve discussão. In: BRASIL. Educação anti-racista: caminhos abertos pela
Lei Federal nº 10.639/03. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005.

GOMES, Nilma Lino Gomes, Intelectuais negros e aprodução do conhecimento: algumas


reflexões sobre a realidade brasileira. In: SANTOS, Boaventura de Sousa; MENESES,
Maria Paula. Introdução. Epistemologias do sul. São Paulo: Cortez, 2010.

MOURA, Clóvis. Sociologia do negro brasileiro. São Paulo: Ática, 1988.


________. O racismo como arma ideológica. Revista Princípios. EDIÇÃO 34,
ago/set/out, 1994, páginas 28-38. Disponível em:
<http://www.escolapcdob.org.br/file.php/1/materiais/pagina_inicial/Biblioteca/70_O_ra
cismo_como_arma_ideologica_de_dominacao_Clovis_Moura_.pdf>.

________.Entrevista de Clóvis Moura sobre Sociologia crítica e racismo no Brasil,


2001. Disponível em: <https://pt.scribd.com/document/325403278/An-EnTREVISTA-
Clovis- Moura-Sociólogo-Critica-cinismo-Étnico-No-País-Geral>.

MUNANGA, Kabengele. Superando o racismo na escola. 2ª edição


revisada/Kabengele Munanga, (org.).- Brasília: Ministério de Educação, Secretaria
de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade, 2005.

NASCIMENTO, Abdias do. O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo


mascarado. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.

ONU. Declaração e Programa de Ação de Durban. Disponível


em:<http://www.unfpa.org.br/Arquivos/declaracao_durban.pdf>.

ONU. Programa de Atividades da Década Internacional dos Afrodescendentes


(2015-2024). Organização das Nações Unidas (ONU). Disponível em:
<https://nacoesunidas.org/wp-
content/uploads/2016/05/WEB_BookletDecadaAfro_portugues.pdf >.

ONU. Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de


Discriminação Racial, 1965. Disponível em:< http://www2.camara.leg.br/atividade-
legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cdhm/comite-brasileiro-de-direitos-
humanos-e-politica-externa/ConvIntElimTodForDiscRac.html>.
18

QUIJANO, Anibal. A colonialidade do poder e a classificação social. In: SANTOS,


Boventura de Sousa; MENESES, Maria Paula (Orgs). Epistemologias do Sul. Cortez,
2010.

SANTOS, Antônio Bispo dos. Quilombos: Modos e Significados. Saco/Curtume, São


João do Piauí – PI, 2007.

SANTOS, B. S. Para além do pensamento abissal: das linhas globais a uma ecologia dos
saberes. In SANTOS, B. S.; MENESES, M. P. Epistemologias do Sul. São Paulo:
Cortez, 2010b, p. 31-83.
WAISELFSZ. J. J. Mapa da Violência 2016: homicídios por armas de fogo no Brasil.
Instituto Sangari, 2016. Disponível em <
https://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2016/Mapa2016_armas_web.pdf>.

http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/10/pichacao-racista-e-encontrada-em-
banheiro-do-mackenzie-em-sp.html

https://www.geledes.org.br/brasileiros-acham-que-ha-racismo-mas-somente-1-3-se-
consideram-racistas/.

http://www.espn.com.br/blogs/gabrielamoreira/637485_racismo-no-futebol-cresce-e-
punicoes-diminuem.

https://epocanegocios.globo.com/Brasil/noticia/2017/10/epoca-negocios-pesquisa-
aponta-que-casos-de-racismo-no-brasil-quase-duplicaram-em-um-ano.html

https://goias24horas.com.br/13989-post-racista-de-kid-neto-ganha-destaque-nacional-e-
vira-materia-no-estadao/

http://libra.ifpi.edu.br/saojoao/noticias/campus-sao-joao-do-piaui-comemora-o-dia-da-
consciencia-negra.
http://libra.ifpi.edu.br/saoraimundononato/noticias/campus-sao-raimundo-nonato-
realiza-i-evento-de-diversidade
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=922298024595817&set=a.42820520400510
4&type=3&theatere-diversidade

Potrebbero piacerti anche