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Nos últimos anos, tem se tornado cada vez mais freqüente o apelo ao caráter
multidimensional da pedagogia, como campo de conhecimento, e, por conseguinte, a
reivindicação de seu alcance a diversas esferas da prática social. Cada vez mais ganha
relevo o discurso que busca apontar e justificar a ampliação dos espaços de atuação
profissional do pedagogo, para além do ambiente escolar e da chamada educação
formal2. Celebra-se o surgimento de novas necessidades formativas e a abertura de
novos âmbitos educativos, com a conseqüente assunção de novos papéis e funções por
parte do profissional da pedagogia, na ocupação dos espaços criados pela emergência de
novas demandas educativas na sociedade. É assim, por exemplo, que tem sido destacada
a presença deste profissional nas empresas, envolvido em tarefas de seleção e
treinamento de recursos humanos e no desenvolvimento de competências profissionais
requeridas pelos processos de reestruturação do trabalho e da produção. Igualmente,
aponta-se a presença do pedagogo nos meios de comunicação, atuando em atividades de
consultoria na formulação de campanhas informativas e materiais de conteúdo
educativo. Da mesma forma, assinala-se a participação do profissional da pedagogia, no
campo da assessoria educativa a atividades desenvolvidas por movimentos sociais,
organizações não governamentais, instituições públicas, etc. Mais recentemente, a
emergência de experiências educativas em modalidades não presenciais, especialmente
aquelas mediadas pelas novas tecnologias, tem sido apontada como mais um espaço que
se abre ao exercício profissional do pedagogo.
Com este pequeno texto, pretendemos levantar algumas questões para discussão,
a partir de inquietações suscitadas pela suspeita de que, em alguns casos, ao lado deste
alargamento do campo de exercício profissional do pedagogo, possa estar se operando
uma redução teórico-conceitual da pedagogia que, limitada a uma dimensão meramente
técnica e instrumental, coloca-se a serviço dos interesses do mercado e dos processos
3 Conforme registra documento conjunto das entidades (ANPED, ANFOPE E CEDES) sobre projeto de
resolução do CNE que institui diretrizes curriculares para o curso de pedagogia, a partir de dados de
pesquisa de Roselane Campos, UDESC, apresentados no XII Encontro Nacional da ANFOPE, 2004.
na construção do conhecimento necessário à formação dos profissionais que irão atuar
nos diversos espaços que se abrem à pedagogia.
É também nesta direção que Libâneo (1996, 1998; 2002) destaca, como um dos
fenômenos mais significativos dos processos sociais contemporâneos, a ampliação do
conceito de educação e, por conseguinte, a diversificação das atividades educativas, o
que, por sua vez, conduz a uma diversificação da ação pedagógica na sociedade. Nas
mais variadas esferas da prática social, e sob diferentes modalidades de educação
(informais, não-formais e formais), “amplia-se a produção e disseminação de saberes e
modos de ação (conhecimentos, conceitos, habilidades, hábitos, procedimentos, crenças,
atitudes), levando a práticas pedagógicas” (LIBÂNEO, 2001, p. 153-154). Evidencia-se,
pois, pela diversidade de práticas educativas em desenvolvimento no presente contexto
4 Ultrapassa os limites deste texto a descrição deste vertiginoso processo de mudanças. De um modo
geral, como apontamos em outro trabalho (FONSÊCA, 2000), pode-se destacar, como elementos
marcantes desse cenário, a crescente dinâmica de integração econômica, proporcionada pela globalização
dos mercados e do sistema produtivo; a velocidade da difusão de informações e imagens, provocada pela
revolução na informática e nas comunicações; e a reorganização da base técnica da produção, como
conseqüência do emprego de novas tecnologias e novos processos de organização do trabalho. Tais
elementos sobressaem-se nesse cenário de transformações, afetando amplos setores da vida social.
e com vistas a diferentes objetivos, a presença de uma ação pedagógica intencional na
sociedade. Assim, a contemporaneidade, ao revelar amplos campos de atuação
pedagógica, configura-se como uma “sociedade pedagógica”, na expressão de Beillerot
(1985), tomada de empréstimo por Libâneo (2002, p. 70).
6 Transcrevo aqui palavras do Professor Tarso Bonilha Mazzotti, em comunicação pessoal ao autor,
através de e-mail, a propósito de discussão sobre o projeto de resolução encaminhado pelo CNE (2005),
instituindo as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Pedagogia.
aplicacionismo e o imediatismo constituem as racionalidades orientadoras do trabalho
educativo. A prática educativa, nesta direção, passa a ter como objetivo a produção de
aprendizagens úteis, cujo propósito é o da adaptação e do ajustamento do indivíduo às
contingências que lhe são impostas pela conjuntura em que o mesmo está situado,
sobretudo aquelas determinadas pelo contexto econômico. Assim, o trabalho
pedagógico passa a ter como finalidade buscar a eficiência e a eficácia do processo
educativo, fundado nos princípios da racionalização e da produtividade, tendo em vista
as exigências e demandas dos setores produtivos. Nesta perspectiva, a tarefa educativa
subordina-se a uma lógica economicista que, no atual contexto de hegemonia do
neoliberalismo, tem como objetivos atender às necessidades do mercado. Dentro desta
lógica, a naturalização das práticas, como referência única para a formação docente,
constitui uma tendência que, como alerta Davini, põe em risco o próprio futuro da
formação, na medida em que toma a prática como realidade transparente e não como
objeto de análise crítica, esterilizando, assim, o potencial transformador da prática e
reforçando tendências conservadoras (DAVINI, apud SUDBRAK, 2004).
A partir deste entendimento, a prática educativa, qualquer que seja o âmbito sua
realização, não pode ser compreendida exclusivamente em sua dimensão instrumental,
desconsiderando o seu sentido ético e sua intencionalidade política. O trabalho
educativo fundado na ética e na perspectiva da emancipação humana não pode, como
adverte Therrien, “privilegiar ou restringir-se a posturas profissionais de uma razão
meramente tecnológico/instrumental que enaltece os meios em detrimento dos fins, e
nem a uma racionalidade que isola o sujeito na sua consciência e intencionalidades
desvinculadas de sua condição de humano com humanos” (2004, p. 9). O trabalho do
pedagogo como profissional da prática educativa, onde quer que ele atue, será sempre
impregnado de intencionalidade, “pois que visa a formação humana através de
conteúdos e habilidades de pensamento e ação, implicando escolhas, valores e
compromissos éticos, ao mesmo tempo em que procede a transformação pedagógico-
didática dos conteúdos da ciência ou técnica que ensina” (FORUMDIR, 2003, p. 4).
É nesta direção que chamamos a atenção para a necessária cautela com respeito
às formas pelas quais vem se dando o alargamento do alcance da pedagogia e a
ampliação dos espaços de atuação do pedagogo, em diferentes campos da vida social.
Tal ampliação, ao lado das políticas atuais de formação destes profissionais, parece se
subordinar a uma lógica procedimental e técnico-profissional, assentada na
racionalidade instrumental como vetor para a formação e atuação do educador. Desta
forma, cabe-nos a tarefa de traduzir e compreender este novo processo em curso,
buscando, como observa Kuenzer, “elucidar a quem ele serve, explicitar suas
contradições e, com base nas contradições concretas dadas, promover as necessárias
articulações para construir coletivamente alternativas que ponham a educação a serviço
de relações verdadeiramente democráticas” (1999, p. 166). Neste contexto, se a
presença do pedagogo, como articulador de processos educativos em diferentes âmbitos
da prática social, se dá pelo reconhecimento de sua contribuição na construção de um
conhecimento emancipatório, que favoreça o estabelecimento de relações solidárias e
humanizadoras, devemos trabalhar na direção da consolidação desta presença e no
aprofundamento da contribuição que pode oferecer. De outra forma, se as funções que
se atribuem a este profissional forem as de conduzir processos de ajustamento do
indivíduo a uma ordem que subordina o ser humano aos interesses exclusivos da
racionalidade econômica, estaremos diante de um desvirtuamento do papel da
pedagogia, o que requer de nós a responsabilidade da denúncia, do questionamento e da
crítica, na perspectiva de resgatá-la como “uma ciência para o homem” (CAMBI, 1999,
p. 643). Afinal, no contexto da sociedade contemporânea, marcado pelas restrições à
autonomia do sujeito diante das relações do poder, da vigilância das ações individuais,
da burocratização, da racionalidade instrumental, da subjugação da subjetividade, a
pedagogia, como assinala Libâneo, “precisa reafirmar seu compromisso com a razão,
com a busca da emancipação, da autonomia, da liberdade (...) uma pedagogia para
emancipação precisa continuar apostando na possibilidade do desenvolvimento de uma
razão crítica precisamente como condição para desvelar as restrições à autonomia no
contexto do mundo moderno” (2002, p. 87-88).
REFERÊNCIAS:
GAUTHIER, Clermont et alli. Por uma teoria da pedagogia. Ijuí: Editora Unijuí,
1998.