Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
2005
FORMATOS DE PROGRAMAS DE TV
E SUA PROTEÇÃO: UTOPIA OU REALIDADE?
1) Introdução
Com efeito, até onde vai a idéia e começa a expressão? Até que ponto um
programa baseado nos mesmos elementos do programa de um concorrente é
uma infração e, como tal, deve ser reprimida pelos aplicadores do direito?
1
Who Wants to Be a Millionaire? já teve seu formato licenciado para emissoras de nada menos
que 106 países. Fonte: BBCbrasil.com, 12/04/2005.
2
O formato do Big Brother já foi licenciado para emissoras de 31 países. Fonte:
www.endemol.com, 02/05/2005.
1
veremos, tribunais de diversos países têm hesitado em reconhecer que
formatos de programas estão inseridos no rol das obras intelectuais legalmente
protegidas. Outros tribunais, contudo, recentemente se posicionaram de
maneira distinta, aquecendo ainda mais a já grande discussão sobre a matéria.
2
3) A definição de formato
“The programme format is much more than a mere idea for a serial
television programme. When such a “format package” is offered, in
addition to the continually improved creative concept, it also include a
tried and tested production plan. Moreover, it contains records of the
ratings among the targeted groups in the “ratings bible”. Logos,
emblems, and designs for backdrops have been drafted. Music and
sound have been recorded. Episodes have been filmed, and
excerpts can be shown as prototype. (…) All this is not a conclusive
catalogue. It is merely a list of examples of what can be contained in
such a format package when the rights to use a programme format
are offered on the international market”4. (grifo nosso)
3
empresariais...O formato de programas televisivos não é apenas a
idéia do programa, é a idéia e muito mais”6. (grifo nosso)
Apesar disso, todas os três autores são unânimes no sentido de que o formato
é um pacote, isto é, um conjunto de diversos elementos, informações e
características sobre os quais o programa se baseia e se operacionaliza. Em
outras palavras, é a estrutura que descreve e possibilita não só a efetiva
realização do programa, como também a sua própria adaptação para a
televisão.
Pela sua própria essência, portanto, os formatos não possuem uma definição
conclusiva e ostentam um universo de elementos que obviamente varia de um
programa para outro.
6
Trecho retirado da sentença proferida pela 4ª Vara Cível da Comarca de Osasco/SP, Brasil,
Caso TV Globo Ltda e Endemol Entertainment International B.V. vs. TVSBT – Sistema
Brasileiro de Televisão, Processo no. 2315/01 e 2543/01, 16/06/2003, pág. 06.
4
costas para a platéia e de frente para o apresentador e um monitor eletrônico;
um computador baseado num sistema aleatório escolhe a pergunta e a coloca
no monitor, juntamente com quatro possibilidades de resposta dentre as quais
apenas uma é correta; na medida em que o participante responde
corretamente, as perguntas vão adquirindo um grau cada vez maior de
dificuldade; da mesma forma, o participante vai acumulando cada vez mais
dinheiro, podendo chegar à cifra máxima que geralmente corresponde a um
milhão de unidades da moeda do país em que o jogo está sendo realizado;
caso o participante não saiba a resposta, ele pode, por um número limitado de
vezes, optar por não responder e simplesmente “pular” a pergunta;
alternativamente, ele pode pedir a ajuda de um grupo formado por alguns
intelectuais, de um amigo ou tentar eliminar algumas das respostas erradas por
meio de algum sistema baseado na sorte; caso o participante decida responder
a pergunta e escolha a alternativa errada, ele é eliminado e perde toda a
quantia que acumulou, o que cria o dilema entre continuar no jogo e tentar
ganhar mais ou simplesmente sair dele com o que já se ganhou; naturalmente,
a produção é toda voltada para criar um clima de apreensão; o rosto do
participante é focalizado; jingles de suspense são reproduzidos; o apresentador
pergunta reiteradas vezes se aquela é a resposta final do participante; enfim,
tudo é direcionado para aumentar a expectativa em torno do jogo e,
conseqüentemente, o grau de interesse do telespectador.
Outro exemplo interessante são os reality shows. Muitos deles são programas
que se baseiam na idéia central de isolar pessoas em um determinado lugar e
filmá-las de modo a revelar todos os conflitos e situações decorrentes daquela
convivência. Ora, ninguém dúvida que a idéia de isolar pessoas em
determinado lugar e as ficar observando é muito antiga. Existem registros, por
exemplo, de que Jean Paul Sartre já a explorou na peça teatral “Huis Clos”, em
maio de 1944.9
8
No Brasil, tal programa foi produzido e veiculado sob a denominação Show do Milhão.
9
“Théatre”, págs. 115/166, Gallimard, 1947, 150° edição.
5
Ainda assim, nos dias atuais, um programa baseado na mesma idéia de
isolamento, como Survivor10, consegue ser um verdadeiro “arrasa-quarteirão”
nos quesitos faturamento e popularidade, não se podendo questionar o
sucesso do seu respectivo formato.
Por estas razões, existe um relativo consenso de que o formato situa-se entre a
idéia e o programa propriamente dito. É mais do que a idéia, uma vez que à ela
foram acrescidos diversos elementos. E é menos do que o programa, pois
pode ser adaptado e modificado.
Feito isso, o intérprete deve analisar a parcela dos elementos que está sendo
eventualmente copiada para, depois, utilizar-se dos possíveis instrumentos
legais aplicáveis para determinar se existe ou não infração.
10
6
Em última instância, alegam eles, isto beneficia o próprio telespectador, que
tem à disposição programas de cada vez mais qualidade e uma variedade cada
vez maior de formatos que efetivamente chega à televisão.
Ø direitos autorais;
Ø concorrência desleal; e
Ø direto contratual.
7
ii) promover o desenvolvimento das artes e da ciência em busca do bem-
comum almejado pela sociedade.
Dada a importância de tais direitos, muito países chegam a incluí-los no rol dos
direitos e garantias fundamentais previstos na própria Constituição. Este é o
caso do Brasil, país cuja Constituição Federal contém o seguinte dispositivo:
(...)
11
A Convenção de Berna traz tal lista exemplificativa em seu artigo 2, item 1.
8
apropriados, devendo sua disseminação se manter livre e afastada de
qualquer tipo de restrição.
Direitos de autor, portanto, recaem não sobre as idéias e métodos em si, mas
sim, e tão somente, sobre a sua respectiva forma de expressão13. Em termos
práticos, isso quer dizer que o autor possui direitos somente sobre a específica
materialização da sua obra, não sobre a idéia, método ou conceito sobre os
quais ela se baseia.
Como conseqüência, qualquer um pode trabalhar uma idéia, sem que isso
implique em violação aos direitos daquele que primeiro a explorou. Só existirá
infração se houver reprodução, cópia ou plágio da própria forma de
expressão14.
12
Sobre o tema, vale transcrever preciosa lição de Eliane Y. Abrão, In “Direitos de Autor e
Direitos Conexos”, 1ª Ed., pág. 18, 2002: “E há um campo de verdadeira imunidade a qualquer
proteção de caráter autoral: é o das idéias, dos conceitos, dos métodos, dos sistemas, dos
cálculos. Toda obra parte de uma idéia, de um conceito, de uma sinopse, contém um método,
um cálculo. Isso é só o ponto de partida. Para se chegar à obra concretizada, há um longo
caminho a percorrer, partindo da materialização da idéia à produção da obra até a sua
disponibilização ao público. A idéia, ponto de partida, não se confunde com a obra. O resultado
sensorial dessas idéias, métodos, conceitos, isto é, a forma ou expressão fixada em base
corpórea, ou incorpórea, é que é protegida pela lei autoral, e não as idéias, os métodos, os
cálculos em si ou que nelas se incrustam. Exemplifica-se: o livro de ensino de matemática é de
criação de determinado autor, mas não os cálculos utilizados em cada exercício. O mesmo
ocorre com o livro de ficção que se utiliza do triângulo amoroso, ou das relações sociais
diferenciadas que permeiam a trama, temas de obras literárias, desde a Antiguidade até o
Terceiro Milênio.”
13
A Suprema Corte Norte-Americana decidiu: “The primary objective of copyright is not to
reward the labor of authors, but to ‘promote the Progress of Science and useful Arts’. Art. I, 8,
cl.8. (…) To this end, copyright assures authors the right to their original expression, but
encourages others to build freely upon the ideas and information conveyed by a work (…). This
principle, known as the idea/expression dichotomy or fact/expression dichotomy, applies to all
works of authorship. As applied to a factual compilation, assuming the absence of original
written expression, only the compiler’s selection and arrangement may be protected; the raw
facts may be copied at will. This result is neither unfair not unfortunate. It is the means by which
copyright advances the progress of science and art (…)”. (Feist Publications, Inc. v. Rural
Telephone Service, 499 U.S. 340, 111 S.Ct. 1282, 1991)
14
“Copyright does not preclude others from using the ideas or information revealed by the
author’s work. It pertains to the literary, musical, graphic or artistic form in which the author
express intellectual concepts. It enables him to prevent others from reproducing his individual
expression without his consent. But anyone is free to create his own expression of the same
concepts, or to make practical use of them, as long as he does not copy the author’s form of
th
expression.” (Copyright, Cases and Materials, Gorman & Ginsburg, 6 edition, pg. 12, 2002)
9
Transportando tais noções para o ramo dos formatos, torna-se absolutamente
imperativo para aqueles que defendem sua proteção provar que o formato é
mais do que uma mera idéia, método, sistema ou conceito. Do contrário, a
proteção via direitos autorais será certamente prejudicada.
Diversas são as decisões judiciais que negaram proteção autoral aos formatos
por entenderem que eles não passavam de uma idéia. No Brasil, uma das
primeiras ações do gênero foi julgada em 199515 e tratava-se de um caso no
qual a parte Autora (Sra. Marizete Kuhn) havia registrado um formato de
programa perante o órgão brasileiro responsável pelo registro de direitos
autorais.
15
Processo n° 17.289/94, 28a Vara Cível, Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro,
Juiz Jairo Vasconcelos do Cammo, sentença proferida em 30/06/1995. Decisão confirmada em
sede de apelação – Apelação Cível n° 5.731/95, 6ª Câmara Cível, Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro. Rel. Des. Mello Serra, 17/04/1996.
10
sua manifestação real, ou seja, a criação de uma nova forma de
expressá-las, perceptível aos sentidos. (...)”.
Note-se que o formato da Autora ainda não havia sido adaptado para a
televisão, o que impossibilitou o juiz de fazer uma comparação entre dois
programas completos e acabados.
Isto foi constatado pela própria FRAPA – Format Recognition and Protection
Association, que diz16:
16
General Guide to Format Protection – http://www.frapa.org/guideformatprotection.html
11
O requisito da fixação, por sua vez, resulta da necessidade de a obra ser
concretizada e resultar numa forma de expressão efetivamente materializada
em algum suporte tangível ou intangível.
Quanto mais original e criativo for o resultado, e quanto mais detalhes este
resultado contiver, maiores serão as chances de o formato se qualificar como
uma criação de espírito merecedora de proteção17.
O fato de o formato já ter sido adaptado para a televisão, aliás, pode ser
extremamente importante, pois, nesse caso, seu idealizador já poderá fornecer
a respectiva obra audiovisual como parâmetro concreto de comparação para o
julgador.
Seu programa era um talent show que possuía certas características como um
“clapômetro” para medir a popularidade do participante com a platéia; o
apresentador se utilizava de algumas frases peculiares para atrair a atenção do
público; todas elas copiadas pelo programa neozelandês que adotou, inclusive,
o mesmo título.
17
Sobre a questão, vale transcrever passagens do artigo “Europe: Protection of Businnes
Concepts”, de Knud Wallberg, in Trademark World, n° 132, 2000: “TV formats are used as
describing new entertainment programmes for television. The description then covers the
amalgamated knowledge about the editorial, scenografic, technical, economic and other
conditions, which have to be fulfilled to be able to produce such programmes. (…) The common
and characteristic feature of these phenomena is that they are not isolated subjects but, on the
contrary, products or services consisting of several different elements. (…) When assessing the
distinctiveness of a concept it must be considered whether the idea behind the concept is
original and whether the single elements in the concept are an expression of an independent
innovative effort.”
18
Green vs. BCNZ (1989) 2 AII ER 1056 ff.
12
enquadrasse em nenhuma das obras protegidas pela lei de direitos autorais
inglesa (obra dramática ou argumento literário). Em outras palavras, adotou a
linha de que o formato nada mais era do que um conglomerado de idéias e lhe
negou a respectiva proteção.
Para que o formato se enquadre como obra literária, é fundamental que ele
seja fixado por escrito, devendo necessariamente existir um roteiro ou
argumento com uma detalhada descrição dos elementos sobre os quais o
formato se baseia e se operacionaliza.
Ao mesmo tempo, como em qualquer lugar, o formato não pode ser a mera
representação de uma idéia, sistema, método ou procedimento normativo.
19
Charlotte McConnel, in “I’m a production company...get me a format right”, Copyright World,
Fevereiro/2003, pág. 22; e Ben Challis e Jonathan Coad, in “Format Fortunes: Is There Legal
Recognition for the Television Format Right?”, Music Business Journal, Agosto/2004
http://www.musicjournal.org/04formatfortunes.html.
13
Ao aplicar as disposições acima na seara dos formatos, os tribunais brasileiros
têm sido receptivos em conferir-lhes proteção, não obstante o fato de um dos
leading cases (Você Decide) tê-la negado.
20
Apelação Cível n° 60.906-4/9 – Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do
Estado de São Paulo. Acórdão proferido em 01/12/1998.
14
Outro caso extremamente importante e que só veio a confirmar esta tendência,
foi o recém-julgado Big Brother vs. Casa dos Artistas21.
Com isso, a Endemol passou a negociar com outra emissora, a TV Globo Ltda,
que adquiriu a licença. Antes mesmo do lançamento do programa, contudo, a
TVSBT lançou o programa Casa dos Artistas23, reality show do mesmo gênero
do Big Brother que, em poucos dias, se transformou na maior sensação da
televisão brasileira.
21
Processos nos. 2315/01 e 2543/01, 4a Vara Cível, Comarca de Osasco/SP. Sentença
proferida em 16/06/2003.
22
23
15
Com isso, a Endemol e a TV Globo Ltda acionaram a TVSBT alegando que o
programa exibido por esta última era um flagrante plágio do formato do Big
Brother e requerendo a cessação da veiculação do programa, além de
indenização.
16
expressamente a possibilidade de os formatos serem protegidos via direito
autoral.
É sabido que, para prevalecer numa ação que envolva direitos autorais, o autor
deve provar: i) que é titular de direitos sobre uma obra intelectual legalmente
protegida; e ii) que aqueles direitos foram de alguma forma infringidos.
24
Isso foi também foi contatado pela FRAPA: “It is obvious that the adaptation and the original
will not be exactly the same, as no imitator would be so stupid to make an identical remake. An
imitator with skill and experience will use the original format as a source of programme
possibilities. In addition, the original set of elements and their combination may have to be
varied to fit production resources, channel image, buyer preference, national television culture,
and so on. The original will not be completely imitated but rather serves as a general guide
within which it is possible to introduce various changes to the original”. (General Guide to
Format Protection – http://www.frapa.org/guideformatprotection.html)
17
O titular do formato, portanto, se vê verdadeiramente entre a “cruz e a espada”,
podendo garantir uma declaração de que seu formato é passível de proteção,
mas sem, contudo, conseguir o seu principal objetivo que é cessar a veiculação
do programa tido como infrator.
Como o sistema de direitos autorais não coíbe a mera semelhança – até para
possibilitar o livre trânsito de obras baseadas nas mesmas idéias e conceitos –,
a noção de plágio torna-se fundamental para o exame do conflito entre dois
formatos de programas televisivos.
25
Delia Lipszyc, in Derecho de Autor y Derechos Conexos. Argentina: Ediciones
Unesco/Cerlac/Zavalia, p. 567, 1993.
26
Carlos Alberto Bittar, in Direito de Autor, 4a edição, pág. 150, 2003.
27
“O verdadeiro plágio é uma ofensa ética, e não legal; é do interesse de autoridades
acadêmicas e não dos tribunais. O plágio ocorre quando alguém – um estudante apressado,
um professor negligente ou um escritor inescrupuloso – falsamente reivindica como sua as
palavras de outrem, sejam elas protegidas pelo direito autoral, ou não. No entanto, se a obra
plagiada é protegida pelo copyright, a reprodução não autorizada é também uma forma de
violação de direito autoral.” (Copyright’s Highway, Harper, Collins, Canadá, 1994, pág.12)
(grifos nossos)
28
Apelação Cível n° 1992.001.05632, Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Brasil,
4ª Câmara Cível, j. 07/04/1993.
18
Em se tratando de formatos, a deliberada intenção de cópia torna-se ainda
mais relevante porque o formato é uma obra que resulta da reunião de diversos
elementos que, se considerados isoladamente, podem não ser passíveis de
qualquer tipo de proteção29. Logo, realmente deve existir uma reprodução de
vários daqueles elementos para se caracterizar a infração.
19
O formato, portanto, foi examinado sob uma perspectiva de conjunto e não sob
seus elementos isolados, o que, de acordo com o tribunal, autorizava o
entendimento de que ele merecia proteção autoral. Isso, contudo, não
representou a vitória na ação pois, ao comparar ambos os formatos, a corte
constatou diferenças relevantes entre os mesmos e concluiu que o segundo
não era um plágio do primeiro.
20
4.2) Concorrência desleal
O raciocínio é de que se o bem não é protegido via direito autoral, ele pode ser
licitamente reproduzido. E se ele pode ser licitamente reproduzido, sua
reprodução não pode atentar contra as normas concorrenciais. Até agora, este
vem sendo o entendimento majoritário adotado pelos tribunais.
21
Um dos casos mais emblemáticos envolvendo a questão aconteceu na
Dinamarca, em 199934. A Celador, idealizadora do Who Wants to Be a
Millionaire?, licenciou o formato para a maior emissora local, a TV2, que
passou a produzir e veicular o programa naquele país.
Para que uma decisão nestes termos fosse proferida, não há dúvida de que o
fato de o Who Wants to Be a Millionaire? já estar sendo veiculado localmente,
bem como existir uma feroz concorrência entre as empresas, foi fundamental.
Isso fez com que o juiz visualizasse os efetivos prejuízos causados à licenciada
do programa original e reconhecesse que a DR adotou uma conduta anti-
competitiva ao desenvolver e veicular o seu próprio programa apropriando-se
dos elementos do programa concorrente.
Esta não foi a situação, por exemplo, do já citado caso Green vs. Broadcasting
Corporation of New Zealand. Ali, o titular do formato original veiculava seu
programa na Inglaterra e tentava impedir a produção e veiculação de um
programa com o mesmo título e características na Nova Zelândia.
A corte inglesa entendeu que este não era o caso uma vez que os programas
em questão estavam sendo veiculados em países distintos e disputando,
conseqüentemente, audiências diversas. Em seu entendimento, portanto, a
tese só poderia ser aplicada se os programas estivessem sendo veiculados no
mesmo país.
anticompetitive conduct” (Format Protection in Germany, France and Great Britain, “Economic
and Legal Aspects of International Development and Marketing of TV Formats”, p. 46/47)
34
Celador & TV2 vs. RD (UFR 1999 1762)
22
No Brasil, o instituto da concorrência desleal vem sendo cumulativamente
aplicado em todas as disputas envolvendo formatos de programas televisivos
entre concorrentes35. A lei brasileira sobre o tema (Lei n° 9.279/96) dispõe que:
O inciso XI, por sua vez, vislumbra a hipótese em que o infrator teve acesso a
informações ou dados confidenciais sobre o formato, situação que é bastante
comum nas negociações que precedem a aquisição da licença do mesmo.
Tais questões foram discutidas no já citado caso Big Brother vs Casa dos
Artistas. Como salientamos, a TVSBT negociou com a Endemol a aquisição da
35
Sobre a cumulação dos direitos intelectuais com a concorrência desleal no Brasil, é
elucidativo o comentário de Denis Borges Barbosa: “Uma questão interessante é se a
existência de direito exclusivo exclui as pretensões relativas à concorrência desleal; se o magis
da exclusividade exclui o minis da tutela à concorrência. Embora se encontrem eminentes
argumentos neste sentido, fato é que a concorrência desleal (técnica ou metaforicamente) se
acha corretamente cumulada na jurisprudência dos nossos tribunais. Tal se dá especialmente,
levando em conta os aspectos que excedem aos limites do direito exclusivo, ou como
agravante da lesão de direito abstrata.” (In Uma Introdução À Propriedade Intelectual, pág. 277,
2ª Edição, Editora Lúmen Júris)
36
Celso Delmanto, in Crimes de Concorrência Desleal, Ed. da Universidade de São Paulo, pág.
81, 1975.
23
licença do formato do Big Brother, tendo tido, com isso, acesso a diversas
informações e detalhes relativos ao programa.
Todos estes indícios foram apontados pelo juiz como provas da conduta
desleal da empresa, conforme se observa pelos seguintes trechos da sentença:
Por tudo isso, depreende-se que, numa disputa envolvendo formatos, a relação
de concorrência entre as emissoras e os indícios de que uma adotou uma
postura desleal em relação à outra, são elementos extremamente importantes
que podem, e devem, ser utilizados para tentar se coibir a prática tida como
fraudulenta.
24
idealizador do formato inicia negociações com uma produtora ou com a própria
emissora de televisão.
O contrato a ser celebrado com o possível futuro licenciado deve conter uma
cláusula de confidencialidade, de modo a garantir que as informações e o
know-how transmitidos durante as negociações preliminares depois não sejam
divulgadas ou simplesmente repassadas a terceiros, caso um contrato
definitivo não seja alcançado.
Isso evita, por exemplo, que a emissora adquira a licença do formato, receba o
know-how e, no ano seguinte, já desenvolva um programa próprio sem pagar
royalties que substitua, ou que até mesmo concorra, com o programa do
formato original.
Uma vez celebrado, o contrato faz lei entre as partes, devendo elas cumprir
todas as obrigações que assumiram, sob pena de arcar com as respectivas
multas, sem prejuízo das indenizações cabíveis.
Deve ficar claro, portanto, que o contrato não cria normas autorais ou direitos
de exclusividade, mas sim, dele podem advir obrigações que, pelo princípio da
pacta sunt servanta, a parte contratante deve respeitar.
25
Muitos são os casos envolvendo formatos que as partes litigantes tinham
algum vínculo contratual. A esse respeito, vale atentar novamente para o
emblemático caso Big Brother vs. Casa dos Artistas.
5) Conclusão
Tal proteção pode ser buscada mediante a aplicação de três institutos distintos
mas enfrenta sérios obstáculos legais. Direitos autorais não protegem idéias,
métodos ou sistemas. Do contrário, obstruiriam justamente aquilo que visam
estimular.
26
Como resultado, o maior desafio para a inserção dos formatos no rol das obras
intelectuais legalmente protegidas é provar que ele não é apenas um método,
um sistema, mas sim, uma criação original passível de proteção.
Para tanto, o formato deve possuir uma detalhada descrição e ser dotado de
um tal grau de originalidade e criatividade que efetivamente se diferencie de
todos os seus congêneres no mercado.
Na maioria das vezes isso não é fácil pois o infrator não copiará todos os
elementos, mas apenas alguns deles, tornando-se fundamental a noção de
plágio, ou seja, a apropriação indevida do núcleo representativo-intelectual da
obra.
Isso sem contar a via contratual que, se bem delineada, constitui um importante
mecanismo de proteção pelo menos em relação às partes com as quais o
titular do formato celebrou algum contrato.
Por tudo isso, concluímos que não se pode negar, de pronto, qualquer tipo de
proteção aos formatos. Muito pelo contrário. O aplicador do direito deve sempre
considerar os detalhes do caso e pode, dependendo das circunstâncias,
encontrar satisfatórias formas de proteção e afastar a respectiva violação.
A questão, contudo, não pode ser resolvida de forma exata, como uma
equação matemática, uma vez que cada formato possui suas próprias
peculiaridades, podendo o resultado certamente variar de um caso para outro.
27
BIBLIOGRAFIA
Artigos
CHALLIS, Ben e COAD, Jonathan; “Format Fortunes: Is There Legal Recognition for
the Television Format Right?”, Music Business Journal, Agosto/2004;
FRAPA – “Format Protection in Germany, France and Great Britain, Economic and
Legal Aspects of International Development and Marketing of TV Formats”;
GOUGH, Lindsay; “The drama over format rights”, Managing Intellectual Property,
Mai/2002;
MORAN, Albert; “The Wit, The Format Business: Desperately Looking For Zero Risk,
in: European Broadcasting Union”, Srategic Information Service Briefing, no. 44, Nov/
2001;
Livros
ABRÃO, Eliane Y.; “Direitos de Autor e Direitos Conexos”, 1ª Ed., 2002, Brasil;
GORMAN & GINSBURG; “Copyright, Cases and Materials”, 6th edition, 2002;
28
LIPSZYC, Delia; “Derecho de Autor y Derechos Conexos”. Argentina: Ediciones
Unesco/Cerlac/Zavalia, 1993;
ROGRIGUES, Clóvis da Costa; “Concorrência Desleal”, pág. 29, Ed. Peixoto, 1945.
29