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Contextos Clínicos, 7(2):168-181, julho-dezembro 2014

© 2014 by Unisinos - doi: 10.4013/ctc.2014.72.05

Contribuições da Teoria Sistêmica acerca


da Alienação Parental

Contributions of the Systemic Theory about Parental Alienation

Maria Isabel Saldanha dos Martins Coelho, Normanda Araujo de Morais


Universidade de Fortaleza. Av. Washington Soares, 1321, 60811-905, Fortaleza, CE, Brasil.
isabel.martins@yahoo.com.br, normandaaraujo@gmail.com

Resumo. A Alienação Parental (AP) consiste em um conjunto de manobras


empreendido por um dos genitores, de forma consciente ou não, para afas-
tar o outro par parental da vida do filho. O presente artigo busca descrever
algumas contribuições da teoria sistêmica que podem ajudar a compreender
o fenômeno da AP, possibilitando uma visão mais contextualizada e com-
plexa dos processos familiares que implicam a configuração de quadros des-
se tipo. Dentre os conceitos analisados no artigo, citam-se: organização e es-
trutura do sistema familiar; sistemas funcionais e disfuncionais; fronteiras e
regras; padrões transacionais recorrentes e cristalizados do sistema familiar
disfuncional; alinhamento e alianças com o guardião e transgeracionalidade.
As contribuições trazidas pelo artigo propõem uma contextualização mais
abrangente da AP, através da consideração do sistema familiar como um
todo e das relações disfuncionais que os diferentes subsistemas estabelecem
entre si, as quais estão na raiz dos comportamentos que geram e sustentam
a AP.

Palavras-chave: Alienação Parental, Teoria Sistêmica, família.

Abstract. Parental Alienation (AP) consists in a group of conscious or uncon-


scious maneuvers done by one of the parents with the purpose of pushing
the other parent away from the child’s life. The current article describes the
contributions from the Systemic Theory that can help comprehend a few
phenomena from AP and contributes to a contextualized and complex un-
derstanding of the family processes that lead to this type of configuration.
The concepts analyzed in this article are: organization and structure from
the family system; functional and nonfunctional systems; barriers and rules;
repeated transitional patterns of dysfunctional family systems; the alliances
with the legal guardian; and transgeracionality. The article contributes to
a broader and contextualized view of the AP through the consideration of
the family system as a whole and the dysfunctional relations that the sub-
systems establish with each other which are at the root of the behaviors that
start and maintain the AP.

Keywords: Parental Alienation, Systemic Theory, family.


Maria Isabel Saldanha dos Martins Coelho, Normanda Araujo de Morais

Em nossos dias, têm ganhado notoriedade e Katz, 1992; Hess e Câmara, 1989; Hethering-
casos em que pais infligem um sofrimento psi- ton, 1979; McIntosch, 2003; Raposo et al., 2011;
cológico a seus filhos, envolvendo-os em suas Vandewater e Lansford, 1998; Wallerstein e
disputas pessoais, principalmente quando o Kelly, 1998). No entanto, essa temática ganhou
divórcio é litigioso e mal resolvido. Seja nos notoriedade no cenário mundial, por força do
consultórios, nas escolas, no sistema judici- impacto causado pelo pensamento do psiquia-
ário ou mesmo na mídia, esse tema tem sido tra forense norte-americano Richard Gardner
recorrente devido aos efeitos deletérios perce- (1985), que nomeou como Síndrome de Alie-
bidos em crianças e adolescentes envolvidas nação Parental (SAP) os danos emocionais so-
nas conflitivas dos pais, fato que tem exigido fridos por crianças envolvidas no processo de
maior atenção teórica e prática dos profissio- divórcio litigioso dos pais.
nais envolvidos com essa demanda. As ideias de Gardner fazem menção a um
Os profissionais que trabalham com famí- conjunto de sintomas apresentados por crian-
lias, comumente observam que, quando o siste- ças que, forçadas a tomar partido na disputa
ma familiar vivencia “crises transacionais” em dos pais, eram induzidas por um dos genitores
seu ciclo de vida, o padrão de relação entre os a odiar o outro. Dessa forma, o genitor aliena-
seus membros tende a se transformar. Os indi- dor, geralmente o guardião, envolvia o pró-
víduos podem seguir em frente, ajustando-se prio filho no drama familiar com o intento de
à nova situação, ou ficar paralisados, congela- apagar qualquer vestígio de sentimento afeti-
dos em uma estrutura (Carter e McGoldrick, vo pelo genitor alijado, quase sempre aquele
1995). O divórcio consiste em um exemplo de que não possuía a guarda dos filhos (Gardner,
crise transacional, que pode ser vivido de forma 2001, 2002a, 2002b, 2002c). Para Gardner, esses
amigável ou envolver o litígio. Quando litigio- pais manipulavam a percepção do próprio fi-
so, muitas vezes, observa-se que o casal litigan- lho, inculcando nele pensamentos e sentimen-
te, ou um dos ex-consortes que não consegue tos negativos contra um dos genitores, que
seguir em frente, busca manter uma conexão passava a ser vítima de um sentimento de hos-
com o outro, mesmo que pouco saudável, atra- tilidade da parte do filho, sem que houvesse
vés do conflito. Para tanto, chega a envolver para isso motivo justo.
os próprios filhos em suas batalhas pessoais e, Torna-se pertinente distinguir entre o que
assim agindo, termina por infligir aos mesmos vem a ser Alienação Parental (AP) e Síndrome
um grande sofrimento (Vainer, 1999). da Alienação Parental (SAP). De acordo com
As crianças envolvidas nas batalhas de pais Darnall (1997) e Fonseca (2007), a AP diz res-
que não conseguem separar a conjugalidade peito a um contexto de manobras empreendi-
da parentalidade são acometidas por um con- do por um dos genitores, de forma consciente
flito de lealdade severo, e forçadas a estabele- ou não, para afastar o outro par parental da
cer alianças com um dos genitores, vendo-se vida do filho. A SAP, por sua vez, é a conse-
obrigadas a alijar um dos pares parentais de quência desse processo e diz respeito às se-
suas vidas. Assim, vivenciam, muitas vezes, quelas emocionais e comportamentais que
uma “hemiplegia simbólica”, tal como des- geralmente acometem as crianças vítimas da
crito por Marracine e Motta (1995). Esse con- AP, as quais são levadas a romper os vínculos
ceito refere-se a um processo em que metade de afetividade com o genitor responsabilizado
de sua afetividade vai sendo amputada ou pelo fim da união conjugal, por força da in-
paralisada, à medida que tem que abrir mão fluência e de manobras do genitor ofendido.
de um de seus genitores e de toda a linhagem Dentre os comportamentos mencionados por
do mesmo. Tal situação pode comprometer a Gardner (1998, 1999a, 1999b), destacam-se:
qualidade adaptativa da criança em relação ao campanha de difamação; racionalizações pou-
meio no qual está inserida, além de privá-la da co consistentes, absurdas ou frívolas; falta de
convivência com uma parte da parentalidade, coerência; pensamento independente; suporte
sem dúvida fundamental para a sua constitui- ao genitor alienado; ausência de culpa quanto
ção psicológica saudável (Silva, 2003). à crueldade ou à exploração do genitor aliena-
Muitos estudiosos da temática do divórcio do; presença de argumentações emprestadas;
realizaram pesquisas e estudos longitudinais, e animosidade em relação a amigos e/ou famí-
buscando entender como crianças e adoles- lia do genitor alienado.
centes vivenciam e enfrentam essa fase de Richard Gardner se empenhou para que
transição, e quais as consequências advindas a Síndrome de Alienação Parental pudesse
dessa ruptura familiar para suas vidas (Costa constar no Manual Diagnóstico e Estatística de

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Transtornos mentais (DSM-IV) ou em sua edi- As ideias de Gardner geraram pontos de


ção revisada (DSM-V). No entanto, considera- vista controversos entre os estudiosos no que
se que tal desejo seria dificilmente concretiza- tange à aplicação das nomenclaturas de SAP e
do, pois suas ideias careciam de embasamento AP para descrever o fenômeno definido pelo
científico e, portanto, não seriam condizentes autor. No presente estudo, optou-se prefe-
com os rigores exigidos pela comissão de re- rencialmente pela utilização da nomenclatura
visão do DSM (Esparcia e Marin, 2009; Kaplan Alienação Parental (AP). Acredita-se que, ao se
et al., 1997). adotar o termo Síndrome de Alienação Paren-
Apesar de ter escrito inúmeros artigos sobre tal (SAP), corre-se o risco de se desconsiderar
o tema, a falta de embasamento científico para a diversidade e a complexidade inerente aos
os seus posicionamentos foi objeto de críticas comportamentos humanos, uma vez que essa
por parte dos estudiosos da área, que passa- diversidade não se condensaria na descrição
ram a olhar de forma desfavorável para a AP. de um transtorno ou de uma doença, mas sim
Apesar disso, as ideias de Gardner ganharam na consideração de um fenômeno que ocorre
respaldo mundial. No Brasil, por exemplo, en- em famílias disfuncionais e se intensifica na-
contraram fortes adeptos entre os operadores quelas que não conseguiram elaborar emocio-
do direito e as associações de pais separados, nalmente a dissolução da sociedade conjugal.
que se mobilizaram em prol da aprovação de Nesse sentido, o presente artigo tem como
uma lei que tipifica a conduta de pais que ma- objetivo descrever alguns conceitos da teoria
nipulam a percepção e o sentimento de seus sistêmica que podem ajudar a compreender o
filhos (Lei nº 12.318/2010). Gardner (1985) fez fenômeno da Alienação Parental, contribuin-
menção a um antigo fenômeno observado em do para uma visão mais complexa e relacional
famílias que atravessavam conflitos ou crises dos processos familiares que implicam a confi-
transacionais em seu ciclo de vida. No en- guração de quadros desse tipo.
tanto, o psiquiatra norte-americano, além de
não considerar os aspectos científicos de seus Família contemporânea
achados, preferiu dar ao fenômeno um enfo- e Alienação Parental
que individual, linear e causal, descartando,
sobretudo, os contornos sistêmicos que a pro- Acredita-se que a AP é um fenômeno que
blemática teria. se tornou mais evidente com o advento da
A partir do entendimento proposto pela contemporaneidade, uma vez que, antes desse
teoria sistêmica, por exemplo, verifica-se que, período, a família possuía contornos delimita-
em um sistema familiar disfuncional, podem dos e estanques. Nesse contexto até então, o
existir padrões de relacionamento cristaliza- casamento era quase indissolúvel e os papéis
dos entre alguns membros dos subsistemas sociais do homem e da mulher eram bem de-
(Minuchin, 1990; Minuchin et al., 1999). Mais finidos: ao homem caberia circular na esfera
especificamente, no caso da AP, um dos mem- pública e à mulher circular na esfera privada.
bros do subsistema filial estabelece um padrão As mudanças e transformações histórico-
de relacionamento cristalizado com outro sociais deram uma nova roupagem à família,
membro do subsistema paternal. Consequen- que seguiu se reestruturando e se redefinindo,
temente, estabelece-se um alinhamento do fi- adquirindo contornos mais fluidos e uma va-
lho a um dos pais, uma espécie de aliança com riedade de formas e modelos de estruturação
um dos genitores, capaz de fazer a criança (Ariès, 2006). Além de nuclear, passam a exis-
compactuar com o ódio/a aversão que o geni- tir famílias com múltiplos arranjos, tais como:
tor guardião sente pelo outro. Nesse sentido, as famílias monoparentais, chefiadas exclusi-
verifica-se que, bem antes de se falar em AP, a vamente por um dos pais, na maior parte das
literatura da teoria sistêmica já descrevia uma vezes, mulheres; famílias ligadas por relações
série de padrões relacionais cristalizados (ali- de afeto entre os seus membros; famílias ho-
nhamento e aliança com o guardião, coalizões, moafetivas, etc. Esse novo modelo de família,
triangulações e lealdades invisíveis, por exem- batizado de contemporânea, ou pós-moderna,
plo), os quais são bastante relevantes para se é marcado por transformações nas relações
compreender o fenômeno da AP (Minuchin, afetivo-sexuais, que foram se instalando social-
1990; Minuchin et al., 1999). Esses padrões, mente, como produto das exigências emanadas
juntamente com outros que serão elencados dos movimentos pela igualdade de direitos en-
no presente artigo, em muito se assemelham tre homens e mulheres e, sobretudo, pela mu-
ao que foi descrito por Gardner. dança do comportamento feminino. Tudo isso

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repercutiu de forma significativa nas relações Teoria Sistêmica e Alienação Parental


familiares, com reflexo em toda a sociedade,
alterando a configuração dos papéis convencio- A perspectiva sistêmica concebe a família
nais que eram atribuídos ao homem e à mulher. como um sistema aberto e dinâmico que se
Em decorrência dessas transformações socio- transforma continuamente de acordo com as
culturais, ocorreu uma reelaboração da intimi- exigências, para garantir a sobrevivência e o
dade entre homens e mulheres e a construção crescimento psicossocial de seus membros. A
de uma nova identidade do indivíduo no mun- família é um sistema aberto porque envia e re-
do moderno, o que representa a ruptura com cebe a todo instante inputs para os subsistemas
uma ordem emocional subjacente, que garantia e para o ambiente extrafamiliar. É também um
ao sexo masculino o poder no relacionamento sistema dinâmico, porque muda continuamen-
(Giddens, 1993; Roudinesco, 2002). te para se adaptar às circunstâncias históricas
Dessa forma, a contemporaneidade rede- e sociais e aos estágios de transição que fazem
finiu os papéis exercidos pelo homem e pela parte do seu desenvolvimento (Andolfi, 1980,
mulher dentro da órbita doméstica, situa- 1989; Minuchin, 1990; Minuchin et al., 1999).
ção que repercutiu nos casos de disputa de Os estágios de transição, também chama-
guarda. A guarda da criança, anteriormente dos de ciclos de vida familiar, dizem respeito
pleiteada somente pelas mães, passou a ser às mudanças que a família atravessa ao longo
pleiteada também pelos pais, que passaram a do tempo. São estágios e transições previsíveis,
reivindicar, cada vez mais, a manutenção de relacionados a idas e vindas dos membros no
um vínculo estreito com seus filhos, após a sistema, marcados por eventos, tais como, por
separação conjugal. Dessa forma, alguns au- exemplo: casamento; nascimento; educação
tores (Buosi, 2012; Dias, 2010) ressaltam que dos filhos; desemprego; novo emprego; inca-
a figura materna, detentora, na maioria dos pacidades físicas e psicológicas; saída dos fi-
casos, da guarda física do filho, quando não lhos do lar; aposentadoria; mudanças de há-
conseguia elaborar de forma satisfatória o bito e estilo de vida; divórcio; doença e morte
luto pela separação conjugal, passava a ma- de entes queridos; mudança de domicílio; e
nipular a percepção da criança, incitando-a a violência familiar (Carter e McGoldrick, 1995).
odiar e a rejeitar o próprio pai, como forma Compreender a AP a partir da perspectiva
de vingança ou retaliação. No entanto, faz-se sistêmica é entender que se trata de um fenô-
a ressalva de que o fenômeno da AP acontece meno que acontece em uma família, concebida
com ambos os genitores, de forma que tanto como um sistema dinâmico, em constante mu-
o pai quanto a mãe podem envolver os filhos dança e no qual interagem diversos subsiste-
em suas disputas pessoais e manipular sua mas (cônjuge-cônjuge; casal-filho; irmão-irmão;
percepção, colocando-se no lugar de “aliena- dentre outros). Além disso, acredita-se ser re-
dores”. Porém, é importante que se frise que levante situar a AP no momento do ciclo vital
há uma tendência na literatura de se atribuir vivido pela família. Na sequência deste artigo,
à figura feminina (mãe) o papel de alienado- busca-se apresentar seis conceitos da teoria sis-
ra. Tal realidade, por sua vez, certamente jus- têmica que estão relacionados à AP e que po-
tifica-se pelo fato de que, por muito tempo, a dem ser usados para melhor compreendê-la.
guarda era preferencialmente dada às mulhe- Busca-se, com isso, situar a AP em processos
res, consideradas mais “aptas” e preparadas familiares mais abrangentes e romper, conse-
para cuidar dos filhos. quentemente, com visões unicausais e bastante
Portanto, este artigo propõe a ideia de que simplistas sobre ela. Dentre os conceitos que se
a Alienação Parental se configura como um pretende abordar estão: organização e estru-
fenômeno relacional típico da família contem- tura do sistema familiar; sistemas funcionais e
porânea. Essa afirmação se sustenta no fato disfuncionais; fronteiras e regras; padrões tran-
de que a contemporaneidade é marcada pelo sacionais recorrentes e cristalizados do sistema
aumento da incidência de separações e divór- familiar disfuncional; alinhamento e alianças
cios, bem como por intensas transformações com o guardião; e transgeracionalidade.
nas relações e nos papéis sociais exercidos por
homens e mulheres. Dessa forma, o fenômeno Estrutura e fronteiras
da Alienação Parental tem sido relacionado à do sistema familiar
forma disfuncional manifestada por alguns ca-
sais que não conseguem separar a conjugalida- O sistema familiar possui uma organi-
de da parentalidade (Buosi, 2012; Dias, 2007a). zação e uma estrutura singular, além de pa-

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drões de interação e propriedades, capazes parentais tais como o de uma avó e uma crian-
de organizar a estabilidade e a mudança. A ça, por exemplo, podem funcionar de forma
família é constituída por subsistemas, ou mi- saudável. O sistema com as fronteiras nítidas e
crossistemas, que estão inseridos em sistemas semipermeáveis permite o estabelecimento de
mais amplos. Esses subsistemas ou subgrupos limites suficientemente bem definidos. Esses
destinam-se a preencher as necessidades do limites serão capazes de viabilizar o contato
próprio sistema. Como exemplos de subsiste- entre os membros de diferentes sistemas, pos-
mas, podem ser citados: o subsistema conju- sibilitando o cumprimento de suas funções.
gal, o paterno, o materno, o filial e o fraterno. Quando as fronteiras são difusas, ou total-
Os subsistemas estabelecem trocas dentro do mente permeáveis, os limites são praticamente
macrossistema, influenciam-no e são influen- inexistentes e o padrão de funcionamento da
ciados por este. Essas trocas ou interações po- família passa ser “emaranhado”, situação essa
dem ser realizadas entre os subsistemas, no que pode comprometer a diferenciação entre
interior da família, ou entre a família e o meio as partes ou os membros dos subsistemas. Da
ambiente e se darão nos limites de cada subsis- mesma forma, quando as fronteiras são rígi-
tema. As trocas e interações realizadas não se das, ou impermeáveis, e os limites são exces-
prendem apenas a aspectos comportamentais, sivos podem ocasionar um padrão de desliga-
podem ser de ordem emocional e psíquica. Por mento, em que os membros dos subsistemas
isso, os subsistemas são também denominados têm pouco ou nenhum contato. Além disso, o
sistemas psicodinâmicos (Bucher-Maluschke, sistema corre o risco de permanecer empobre-
2008; Calil, 1987; Minuchin,1990, Minuchin e cido, por falta de input, de informação, decor-
Fishman, 1984). rente das trocas estabelecidas com o meio (Ca-
Os subsistemas funcionam de acordo com lil, 1987; Minuchin, 1990; Minuchin et al., 1999;
características próprias, que diferem quanto à Wendt e Crepaldi, 2008).
sua natureza e funções e se vinculam a valores Quando a família não consegue gerenciar
da sociedade e à cultura na qual se inscrevem. os possíveis conflitos decorrentes das trans-
Assim, cada sistema possui uma forma pecu- formações vivenciadas em determinado ciclo
liar de estabelecer suas regras, suas fronteiras, de vida, ou em consequência da ocorrência
sua modalidade de comunicação e sua hierar- de eventos inesperados que desequilibram o
quia. Os subsistemas são separados por fron- sistema familiar pode ocorrer o envolvimento
teiras e regras, que se destinam a estabelecer dos subsistemas, exigindo que as funções de
os limites próprios, além de regular as trocas alguns componentes sejam permutadas. Nes-
estabelecidas entre os outros subsistemas. As- se sentido, as fronteiras podem se transformar
sim, o estabelecimento de fronteiras marca os de nítidas para difusas, promovendo um ema-
limites da relação estabelecida entre os mem- ranhamento nos subsistemas, tais como, por
bros dos subsistemas dentro do sistema. As exemplo, entre o subsistema parental e o filial.
fronteiras são uma espécie de contorno que Assim sendo, pode ocorrer um adoecimento
delimitam os subsistemas e possibilitam que no sistema, capaz de comprometer o processo
mantenham sua diferenciação. Essas frontei- de evolução, adaptação e transição do sistema
ras variam de acordo com cada família e de familiar ao longo do seu ciclo de vida.
acordo com a forma de funcionamento do sis- Observando-se a forma como os subsiste-
tema. Assim, as fronteiras são invisíveis como mas se organizam, pode-se entender a estru-
o vento. A principal função delas consiste em tura da família que será o reflexo dessa orga-
proteger a diferenciação do sistema, pois os nização. Por exemplo, uma mãe pode formar
subsistemas têm funções específicas e fazem um subsistema com o filho onde as fronteiras
exigências específicas. Para concretizar suas sejam difusas, o que gera emaranhamento en-
funções sem que haja a interferência indevida, tre a mãe e o filho, mas que tenha fronteiras
as fronteiras devem ser suficientemente níti- rígidas relativas ao demais subsistemas fami-
das e definidas, semipermeáveis, capazes de liares a ponto de excluir os outros membros da
garantir a diferenciação dos subsistemas e de família; ao passo que um pai pode formar um
seus membros e, ao mesmo tempo, permitir o subsistema com a filha ou o filho, excluindo os
estabelecimento de trocas com o meio, ou com demais. A forma como cada subsistema se or-
outros sistemas (Calil, 1987; Minuchin, 1990; ganiza traduz a estrutura da família (Andolfi,
Minuchin et al., 1999; Wendt e Crepaldi, 2008). 1980; Calil, 1987; Minuchin, 1990).
Quando as linhas de responsabilidade e au- A partir do que foi explicitado, deduz-se
toridade são bem delineadas, os subsistemas que a dinâmica da Alienação Parental pressu-

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põe a organização de subsistemas com frontei- sas regras. Em um sistema familiar saudável,
ras difusas entre um dos genitores e o filho e existem regras e padrões que servirão de guia
rígidas em relação ao outro genitor. Essa con- para o crescimento grupal e individual de seus
figuração passa a existir quando um dos pais, membros. O sistema familiar saudável, por-
por não definir fronteiras claras, manipula a tanto, é capaz de se adaptar a mudanças e tem
percepção do filho contra o outro, conta com liberdade para mudar.
riqueza de detalhes para a criança todo sofri- No sistema disfuncional, ao contrário, os
mento que o genitor não guardião tem causa- membros da família utilizam as regras para
do à família, estabelece com o infante um pac- manter rigidamente o seu status quo e inibir as
to de lealdade induzindo-o a se alinhar a ele e mudanças necessárias ao seu desenvolvimen-
a se posicionar contra o outro genitor. Assim, to. A fim de manter o status quo interacional,
o subsistema mãe e filho (ou pai e filho) se or- o sistema familiar não saudável, também cha-
ganiza no intuito de um dos membros do ex- mado de disfuncional, evitará a mudança em
casal excluir o outro do convívio familiar. Nos suas regras, mesmo que estas se façam neces-
casos em que se observa a presença da Alie- sárias e essenciais ao desenvolvimento de seus
nação Parental, um dos genitores inicia um membros e para sua adaptação às novas con-
jogo de manipulação objetivando afastar o ex- dições familiares (Calil, 1987; Minuchin, 1990;
-companheiro do convívio com o filho. A fim Wendt e Crepaldi, 2008; Werlang, 2000).
de manter uma relação de exclusividade com É, portanto, no sistema familiar engessado
o filho, esse genitor “aprisiona” um dos mem- e resistente à mudança, que o fenômeno da AP
bros mais vulneráveis do sistema, no caso, a pode se inscrever e se configurar em mais uma
criança (Buosi, 2012; Silva, 2003). manobra usada por um dos genitores, ou por
Além disso, no caso de um sistema familiar ambos, para se manterem ligados através do
em que se inscreve o fenômeno da AP, observa- conflito. Utilizar a criança em seus embates
se o emaranhamento de subsistemas, quando, pessoais é característica de genitores que não
na tentativa de afastar um dos genitores do sis- conseguem elaborar o término do enlace con-
tema familiar, um dos ex-cônjuges se une com jugal e seguir em frente. Um dos cônjuges em-
outros membros da família extensa, tais como, preenderá a manobra da AP, a fim de atingir o
irmãos, pais, cunhados, para empreender uma outro, que, por outro lado, revidará na mesma
campanha difamatória contra o ex-consorte. moeda. Dessa forma, o status quo do sistema
Verifica-se, dessa forma, que as fronteiras da familiar, permanecerá estanque e cristalizado,
família podem se tornar difusas, permitindo a devido ao movimento dos membros do sub-
entrada de outros membros pertencentes a ou- sistema parental para manter incólume a sua
tros subsistemas. Nesse momento, pode ocor- configuração (Vainer, 1999).
rer a mudança de função de alguns membros
do sistema familiar. Por exemplo: um avô ou
uma avó pode assumir o papel parental, e a Padrões transacionais recorrentes
mãe ou o pai pode se deslocar do seu papel e cristalizados do sistema familiar
ou função na família, deixando de assumir o disfuncional
status de pai ou mãe, para ser irmão ou irmã
do próprio filho. Conforme já mencionado, alguns eventos
decorrentes do ciclo de vida da família, tais
Sistemas funcionais e disfuncionais como o nascimento dos filhos ou o divórcio do
casal podem ser capazes de expandir as rela-
No sistema familiar, existem padrões de ções existentes entre os membros do subsiste-
interação, recorrentes e previsíveis, que se ma e de mudar a estrutura interna do sistema,
destinam a organizar a hierarquia do poder possibilitando a formação de novos relacio-
familiar, além de definir caminhos e controlar namentos diádicos ou triádicos no interior do
o comportamento dos membros do sistema. sistema familiar. No entanto, quando os rela-
Quando organizados, os padrões expressam cionamentos com alguns membros do subsis-
regras implícitas, definem expectativas e cla- tema tornam-se recorrentes, podem originar
rificam para os membros do sistema familiar padrões transacionais recorrentes e cristaliza-
o que é e o que não é permitido. Através de dos (Minuchin, 1990; Minuchin et al., 1999).
tais regras é que o sistema irá se autorregular, Autores da abordagem sistêmica obser-
se estabilizar e se equilibrar, em torno de cer- varam a existência de padrões transacionais
tas transações que serão a concretização des- recorrentes e cristalizados no relacionamento

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dos membros do sistema familiar disfuncio- que ele precisa. E procura protegê-lo e isolá-lo
nal, tais como: relacionamento muito estreito de tudo o que é ameaçador no mundo, incluin-
ou de superenvolvimento; relacionamento do o genitor alienador e a família dele.
fundido; relacionamento conflituoso; relacio- Pode ocorrer, ainda, o padrão relacional
namento vulnerável; relacionamento distante; de aliança, pois, quando empreendem mano-
rompimento; aliança; triangulação e coalizão bras de Alienação Parental, um dos genitores
(Wendt e Crepaldi, 2008); criança superprote- estabelece com o filho uma aliança. Assim, ob-
gida; figura do “bode expiatório”; competição serva-se que, nesse processo, um dos pais se
entre os pais; e coalizão cross-geracional (Gre- alinha à criança. Esta se sente comprometida
en e Framo, 1982). Compreende-se que, em com esse genitor, estabelecendo com ele uma
um processo de divórcio destrutivo, conflitu- espécie de “pacto de lealdade” que não pode
oso e litigioso, em que os pais não conseguem ser quebrado (Wendt e Crepaldi, 2008).
separar o seu papel conjugal do parental, en- A triangulação ocorre em um sistema fa-
volvendo os filhos em suas conflitivas e, nesse miliar quando os membros estão envolvidos,
sentido, empreendendo a AP, os membros do lutando em um conflito que não conseguem
sistema familiar podem desenvolver alguns resolver automaticamente e tendem a trazer
dos padrões de relacionamento transacionais para dentro deste uma terceira pessoa. Nes-
elencados acima. sa dinâmica, dois membros no sistema fazem
No padrão relacionamento muito estreito ou uma aliança e excluem um dos membros da
de superenvolvimento, ocorre uma fusão entre interação dos outros dois. Assim, quando o ca-
os membros do sistema familiar, de tal modo sal parental vivencia de forma destrutiva seus
que eles não se diferenciam; no padrão aliança, conflitos, fazendo com que o sistema familiar
ocorre uma forte ligação entre os subsistemas atinja um pico elevado de ansiedade, uma ter-
parental e filial, baseada em uma lealdade in- ceira pessoa, no caso, o filho, é utilizado (ou
visível, capaz de interferir no processo de di- triangulado) com o intuito de reduzir o nível
ferenciação entre os membros do sistema, o de tensão do sistema, tornando-o mais tolerá-
que pode ocorrer em um grau menor que o vel (Bower, 1978).
superenvolvimento; no padrão relacionamento A triangulação é o padrão relacional mais
conflituoso, verifica-se a existência de relações frequente no caso de divórcio conflituoso em
beligerantes com constantes atritos geradores que se observa a presença da AP. Nessa cir-
de ansiedade, desavenças no sistema familiar, cunstância, a criança é triangulada e cumprirá
dificuldades de comunicação, desqualifica- uma função no seu sistema familiar. Geral-
ções, desconfirmações de um dos pares paren- mente, é em nome dela que os pais se digla-
tais, podendo evoluir para casos em que haja diam em juízo, pois é em nome do melhor inte-
violência física (Wendt e Crepaldi, 2008). resse do filho que eles se mantêm ligados pelo
No caso específico da AP, observa-se que conflito e se acusam mutuamente. A criança
um dos pais estabelece um relacionamento su- procurará, dessa forma, como um mecanismo
per estreito com um dos filhos. Assim, a crian- de sobrevivência emocional, alinhar-se a um
ça passa ser uma extensão desse pai ou dessa dos pares parentais.
mãe, compartilhando sentimentos de hostili- A coalizão é um padrão relacional bem pa-
dade, ódio e mágoa em relação ao outro par recido com a triangulação, uma vez que é uma
parental, e manifestando uma percepção alte- propriedade das tríades, característica mar-
rada da realidade. Há uma indiferenciação en- cante de famílias disfuncionais. Nesse pro-
tre os membros do subsistema materno-filial, cesso, duas pessoas, que podem ser um dos
ao passo que um dos pais induz os filhos a genitores e o filho, aliam-se contra a outra no
enxergarem os fatos com as suas próprias len- sistema familiar, que, no caso, pode ser o geni-
tes. Nesse sentido, autores como Silva (2010) tor-alvo, ou alienado (Minuchin, 1990; Minu-
e Silva e Resende (2008) chamam atenção para chin et al., 1999).
o fato de que, no fenômeno da AP, um dos Nos casos em que na AP se fazem presente
genitores forma um vínculo simbiótico com a aliança, a triangulação e a coalizão, a criança
os filhos (vínculo que se baseia na relação de é induzida por um de seus genitores a odiar
dois como um só e impede a autonomia e a e a rejeitar imotivadamente o outro. A criança
independência de seus membros). Dessa for- ouve constantemente por parte da mãe/do pai
ma, para o genitor alienador, a criança é vista (geralmente o genitor guardião), coisas nega-
como uma extensão de si mesmo, esse pai/mãe tivas sobre o genitor alijado e a família dele.
torna-se, para o filho, o seu universo ou tudo O discurso de que o pai/a mãe foi o responsá-

Contextos Clínicos, vol. 7, n. 2, julho-dezembro 2014 174


Maria Isabel Saldanha dos Martins Coelho, Normanda Araujo de Morais

vel por todo sofrimento que a família viven- ade com a criança contra o outro par paren-
cia no momento é proferido muitas vezes pelo tal. Acredita-se que esse padrão relacional é o
genitor guardião e vai sendo internalizado e que mais se assemelha à descrição da AP e é
reproduzido pela criança como se dela fosse. o mais prejudicial à subjetividade e à autono-
No extremo de seu intento de destruir o víncu- mia da criança. Nesse padrão relacional, um
lo o filho com o ex-cônjuge, a mãe/o pai passa dos membros do subsistema parental (o pai
a manipular e induzir o filho a acreditar que ou a mãe) estabelece com o filho um relacio-
sofreu violência física e/ou molestação sexual. namento intenso (Green e Framo, 1982). Nos
Dessa forma, a criança passa a reproduzir até casos em que a AP se faz presente é comum o
mesmo perante o juiz os relatos de supostas genitor procurar desvalorizar e excluir da vida
agressões físicas e abusos sexuais atribuídos da criança e da família o outro par parental,
ao outro genitor (Silva, 2010). que, paulatinamente, perderá completamente
Podem existir formas específicas de trian- a importância dentro do sistema familiar. Nes-
gulação da criança com a família. Os padrões sas situações, pode ocorrer uma inversão de
relacionais descritos por Green e Framo (1982) papéis, ou seja, a criança poderá assumir o pa-
dizem respeito a formas específicas de trian- pel de pai ou de mãe para os seus próprios ge-
gulações que se assemelham a padrões relacio- nitores, que se fragilizam e utilizam o próprio
nais que ocorrem em famílias disfuncionais, filho como uma espécie de muleta emocional,
nas quais se verifica a presença da AP. descrevendo, com riqueza de detalhes, as do-
O padrão competição entre os pais pela crian- res e os sofrimentos impingidos pelo genitor
ça ocorre quando os pais competem pela leal- alijado a si mesmo, ao filho e à própria família.
dade do próprio filho, querendo que ele tome Diante da fragilidade de um dos pais, a criança
partido e escolha um dos lados para se alinhar. sai do seu papel, vendo-se obrigada a se forta-
Nesse contexto, a criança é pressionada, de lecer para cuidar de seu genitor ou genitora,
forma agressiva ou sedutora, a tomar partido tornando-se o sustentáculo destes.
no conflito conjugal de seus pais e os pais im- As definições de Green e Framo (1982)
põem que o filho seja leal a um deles. Além muito se assemelham ao conceito de lealdades
disso, induzem a criança a acreditar que, se ela invisíveis e parentalização propostos por Borzo-
se aproximar de um dos genitores, significará meny-Nagy e Spark (1984). Esses estudiosos
que estará alienada em relação ao outro. Nesse constataram que, no sistema familiar confli-
processo, é comum um dos ex-cônjuges des- tuoso, é comum que os membros estabeleçam
caracterizar a imagem do outro para o filho e entre si pactos ou compromissos de lealdades
anularem a autoridade dele perante a criança implícitas ou invisíveis. Tais compromissos
(Green e Framo, 1982). Nesse sentido, observa- podem fazer com que as crianças escolham
se que, nos casos em que a AP se faz presente, um dos genitores para se alinhar (geralmente
é comum um dos genitores exigir do filho a aquele que é percebido como mais fraco). Es-
exclusividade do afeto, induzindo-o a escolher sas crianças estabelecem com este par parental
entre um dos pais. Essa manobra polariza a uma espécie de lealdade invisível, um com-
criança e a torna “prisioneira de um dos pais promisso interno. Consequentemente, veem-
e obrigada a trair o outro” (Silva, 2010, p. 54), se obrigadas a se alinhar ao pai ou à mãe e a
situação extremamente desestruturante para apoiar aquele genitor, chegando, em alguns
seu equilíbrio psicoemocional. casos, até a cuidar deste (parentalização), as-
Nos casos de divórcio conflituoso, é muito sumindo posturas e responsabilidades que
frequente a criança ser colocada no meio dos não condizem com a sua idade. Tal fenômeno,
pais, como um troféu a ser disputado, uma por sua vez, tende a ser extremamente danoso
vez que cada genitor tenta seduzir a criança e à criança, pois esta, ao mesmo tempo em que
induzi-la a ficar do seu lado no intuito de con- se sente empoderada, não consegue dar con-
seguir o filho só para si. Tal situação é extre- ta das necessidades impostas pelos adultos e
mamente comprometedora para a criança, ao pode, pouco a pouco, perder a confiança em
passo que a submete a um intenso conflito de si mesma. Essa situação também pode gerar
lealdade, obrigando-a a escolher entre figuras na criança um sentimento de sobrepoder/ au-
fundamentais e imprescindíveis a sua sobrevi- topoder. Retirada da sua condição de apenas
vência emocional. ser criança, de seu próprio papel, ela poderá
No padrão coalizão cross-geracional rígida, desenvolver uma visão distorcida das relações
os pais buscam formar um pacto especial de de poder, podendo, inclusive, perder o respei-
aliança com o filho, estabelecendo uma dí- to por figuras de autoridade que sejam consi-

Contextos Clínicos, vol. 7, n. 2, julho-dezembro 2014 175


Contribuições da Teoria Sistêmica acerca da Alienação Parental

deradas negativas ou que por ventura venham res (Dias, 2007a; Féres-Carneiro, 2007; Fonse-
a se opor aos interesses do genitor alienador ca, 2007; Motta, 2007, 2011; Simão, 2007; Trin-
(Silva, 2010). dade, 2007) de que o tema em epígrafe pode
Entende-se que os padrões transacionais ocorrer em famílias que apresentam um pa-
elencados acima, tais como coalizão, triangu- drão disfuncional, mas que, apesar desse fato,
lação, alianças e alinhamento, presentes em permanecem ligadas e não procuram dissol-
famílias disfuncionais, ocorrem de forma mais ver o vínculo conjugal. No entanto, acredita-
intensa onde o fenômeno da AP se inscreve. se que é muito mais frequente a incidência
Nessas famílias, a AP se instala devido a um desse fenômeno em famílias nas quais um dos
desequilíbrio temporário dos pais desenca- membros não conseguiu elaborar o término do
deado pelo ódio e pelo rancor, por restos de enlace matrimonial e, devido às mágoas e aos
amor decorrentes do fato de estarem presos a rancores advindos da separação mal resolvida,
uma ruptura conjugal que não foi elaborada empreende a Alienação Parental com o filho(a)
emocionalmente por um deles. como forma de punir o ex-cônjuge, que será
Na ótica de Gardner (1985), os membros do privado de um vínculo sadio com este.
sistema familiar estão presos a padrões rela-
cionais cristalizados. Tais padrões encontram Alinhamento e alianças
espaço em um sistema familiar disfuncional e
se acirram quando esse sistema vivencia o di- com o guardião
vórcio. Nesse sentido, é importante a ressalva
de que a maioria dos autores que discorreram Embasados nos conceitos da teoria sistê-
sobre a temática da AP ou da SAP (por exem- mica, pesquisadores como Brito (2007, 2008),
plo, Dias, 2007a, 2007b; Féres-Carneiro, 2007; Cigoli (2002), Giberti (2005), Gonzalez et al.
Fonseca, 2007; Motta, 2007, 2011; Simão, 2007; (1994), Wallerstein e Kelly (1998) realizaram
Trindade, 2007) segue a linha defendida pelo vários estudos longitudinais sobre o tema
autor do conceito, Richard Gardner, compre- divórcio e suas conflitivas. Tais pesquisado-
endendo que a AP ou a SAP tendem a ocorrer res constataram que os filhos de pais que vi-
com o advento de um divórcio litigioso. É in- venciam um divórcio conflituoso costumam
teressante assinalar que esses autores não se- identificar-se com um dos genitores, chegando
guem a linha da teoria sistêmica, mas que os a manifestar sentimentos de raiva, hostilidade
seus escritos dizem respeito ao impacto socio- e desprezo em relação à outra parte parental.
jurídico das ideias de Gardner (1985). Essas crianças realizam alianças com um dos
Embora a visão acima mencionada tenda a pais e se encarregam da tarefa de ferir e impor-
ser a que predomina, em recente artigo publi- tunar o outro. Embora se tratando do mesmo
cado, Rodrigues e Ramires (2012) assinalaram fenômeno, a atitude dessas crianças foi batiza-
que a Alienação Parental “não é um processo da de diferentes formas por esses estudiosos e
que acontece somente depois de uma separa- pesquisadores do assunto.
ção conjugal, sua origem está presente antes” O alinhamento, por exemplo, que se acredita
(p. 230). Advoga-se, no entanto, que, nesse ter sido um termo emprestado da teoria sistê-
contexto, devem-se considerar múltiplas pos- mica, foi o termo usado pelas pesquisadoras
sibilidades, ou seja, nem sempre a AP ocorre Wallerstein e Kelly (1998), que realizaram um
somente após o divórcio, nem sempre antes estudo longitudinal com crianças que viven-
dele. O fato é que esse fenômeno é oriundo ciaram o divórcio de seus pais e perceberam
de famílias que não conseguiram administrar que, durante essa fase, um dos filhos se unia
bem os seus conflitos ou que possuem uma a um dos pais e empreendia ataque vigoroso
estrutura disfuncional. Defende-se, assim, que ao outro genitor. As pesquisadoras afirmaram
a AP não é propriedade exclusiva de famílias que, geralmente, os genitores que iniciavam o
que vivenciam um divórcio litigioso, mas de alinhamento eram aqueles que, após a separa-
sistemas disfuncionais que podem (ou não) ção, sentiam-se feridos, magoados, traídos, re-
implicar divórcios. jeitados, usados ou descartados pelo ex-com-
A noção de que a AP tende a ser mais fre- panheiro. As autoras constataram ainda que,
quente em sistemas familiares marcados pela embora o alinhamento fosse promovido com
crise transacional do divórcio é bastante aceita maior frequência por mães em relação a filhos
na literatura. Infelizmente, a ausência de es- menores, tanto os genitores que empreendiam
tudos sobre a temática da Alienação Parental essa manobra quanto a criança envolvida de-
talvez impossibilite a percepção desses auto- monstraram um abalo emocional considerável

Contextos Clínicos, vol. 7, n. 2, julho-dezembro 2014 176


Maria Isabel Saldanha dos Martins Coelho, Normanda Araujo de Morais

frente à conflitiva conjugal. O estudo longitu- autora referenda que, ao invés de considerar
dinal de Wallerstein e Kelly (1998) referendou os aspectos sistêmicos, socioculturais e até le-
também que o fenômeno do alinhamento se gislativos, os quais, ao longo do tempo, contri-
prolongava mais quando o genitor que deti- buíram para a existência das alianças paren-
nha a guarda empreendia junto à criança um tais, Gardner (1985) restringiu a problemática
“reforço diário” no repertório de acusações que envolve os conflitos e as relações familia-
contra o outro par parental. res pós-divórcio a aspectos individuais.
O mesmo fenômeno alianças com o genitor
guardião (conceito que também se assemelha Transgeracionalidade
ao descrito na teoria sistêmica), foi batizado
por Brito (2007) e Gonzalez et al. (1994). Brito Uma das funções do sistema familiar é
(2007) percebeu que essas alianças perdura- transmitir a seus membros uma herança, um
vam por vários anos e eram realizadas em es- legado. Tal herança pode consistir no patri-
pecial pelo filho mais novo do casal divorcia- mônio cultural familiar, que é transmitido aos
do. Já Gonzalez et al. (1994) utilizaram o Teste membros do sistema através dos tempos. Des-
Autoavaliativo Multifatorial de Adaptação sa forma, os padrões, os costumes, os segredos
Infantil (TAMAI) e o Inventário de Percepção e os mitos e, até mesmo, os problemas que de-
Parental (IPP) em seus estudos e constataram terminaram o funcionamento e a organização
que, nas situações de separação parental, os do sistema familiar em um período de tempo
filhos estabelecem alianças com o genitor podem ser transmitidos aos descendentes dos
guardião, independentemente da condição membros daquele sistema.
de gênero deste, não importando ser este a Portanto, o ser humano pode ser concebido
mãe ou o pai em questão. Nesse caso, o fa- como um produto de heranças simultâneas,
tor determinante para o estabelecimento des- que são recebidas do contexto intrafamiliar e
sa aliança é a proximidade parental e não o extrafamiliar, social, econômico e cultural vi-
papel de pai ou de mãe. Os pesquisadores gente em um determinado período. Quando
verificaram, ainda, que, no primeiro ano de ocorre um fenômeno em determinada geração
separação dos pais, os filhos apresentaram e ele é repetido nas gerações seguintes, obser-
percepções parecidas em relação aos genito- va-se a presença da intergeracionalidade. Por
res. No entanto, com o decorrer do tempo, outro lado, quando o fenômeno a ser transmi-
aproximadamente entre dois a três anos após tido situa-se em uma dimensão que transcen-
a separação, a percepção tornou-se discre- de a geração real, ou concreta, e diz respeito
pante, em favor do genitor guardião. a tudo que se organiza entre gerações e as
Outro conceito muito semelhante à di- transcende em sentido mais elaborado (mitos,
nâmica descrita pelo construto de AP é o de segredos não ditos e ritos, por exemplo), que
cisma e discórdia, propostos por Cigoli (2002) podem ser repetidos através de gerações, essa
para identificar as novas configurações re- repetição está na ordem de uma transmissão
lacionais surgidas diante de um conflito in- transgeracional (Bucher-Maluschke, 2008).
tenso entre ex-cônjuges. No cisma, acontece o Dessa forma, padrões interacionais familia-
movimento de um dos ex-cônjuges para eli- res tendem a se repetir ao longo das gerações.
minar a presença do outro no sistema fami- Um padrão geracional trazido pela família de
liar, como se nunca tivesse pertencido a este. origem pode ser repetido ao longo das gera-
Já a discórdia consiste na manobra de um dos ções subsequentes. Esses padrões podem ser
pais em usar os filhos como aliados, espiões facilmente percebidos em algumas famílias
ou como seus “porta-vozes”. em suas relações cotidianas, ou podem surgir
Sousa (2010) assemelha o fenômeno das de maneira camuflada. As repetições são algo
alianças parentais à definição da AP e criti- inerente a toda família, mantendo-a unida,
ca Gardner (2002b) pelo fato de o psiquiatra como um sistema, e provendo esse sistema de
norte-americano ter desconsiderado a exis- uma identidade específica, capaz de diferen-
tência do fenômeno das alianças parentais em ciá-lo de outros sistemas. No entanto, a repeti-
famílias que vivenciavam conflitos conjugais. ção dos padrões intergeracionais, que pode se
Para a autora, Gardner rebatizou o fenômeno dar multigeracionalmente, pode se tornar um
das alianças com o guardião com o nome de fator impeditivo de mudança e crescimento do
AP, atribuindo um enfoque individual, pato- sistema familiar, além de tornar-se um agente
logizante e reducionista a um fenômeno com capaz de manter a família em um nível disfun-
múltiplos contornos. Nesse sentido, a mesma cional (Cerveny, 1994).

Contextos Clínicos, vol. 7, n. 2, julho-dezembro 2014 177


Contribuições da Teoria Sistêmica acerca da Alienação Parental

Portanto, observa-se que a passagem pelas do divórcio conflituoso de seus genitores. Esse
diversas etapas do ciclo de vida familiar e a genitor provavelmente conviveu a vida inteira
forma de lidar com as crises não dependerão com a falta e não encontrou forma de elaborar,
somente dos recursos da família nuclear (com- de expressar a dor intensa de ter que escolher
posta por pai, mãe e filhos), mas, também, dos entre um dos pais e se colocar contra o outro.
legados familiares de outras gerações, ou seja, O conteúdo não expresso, não subjetivado,
da forma como as gerações anteriores encon- encontra, na geração subsequente, uma forma
traram soluções para resolver as mesmas crises de expressão. Por exemplo, quando esse filho
(Carter e McGoldrick, 1995; Costa et al., 2009; ou essa filha se casa e “repete” a história de
Ribeiro, 1989). Nesse sentido, não se pode du- um dos seus pais e não consegue agir diferen-
vidar de que, no sistema familiar, cada mem- te com o(a) próprio(a) filho(a), ou seja, não se
bro herde legados de suas famílias de origem. sensibiliza com a necessidade da criança e com
No caso da AP, pode ocorrer, por exemplo, o sofrimento desta mediante a separação. Sem
que um dos membros do subsistema parental se dar conta, termina por repetir o comporta-
dos pais tenha realizado a AP no filho, ou um mento alienador que um dos seus pais teve
bisavô pode ter vivenciado essa problemática. para com ele(ela), submetendo-o(a) à vivência
Assim sendo, a vivência dessa situação pode da mesma dor que outrora experimentou.
vir a se repetir nas gerações subsequentes, in-
cluindo-se numa dinâmica intergeracional ou Considerações finais
transgeracional.
Ao se fazer menção à transgeracionalidade, O presente artigo teve por objetivo apre-
é válido mencionar um conceito advindo da sentar algumas contribuições da teoria sistê-
psicanálise, mas que traz reflexos dos legados mica à compreensão do fenômeno da Aliena-
transgeracionais, a saber: a transmissão psíqui- ção Parental (AP). Para isso, relacionou seis
ca geracional. No processo de transmissão psí- conceitos - organização e estrutura do sistema
quica, os conteúdos psíquicos dos membros do familiar; sistemas funcionais e disfuncionais;
sistema familiar vertical, ou seja, os ascendentes fronteiras e regras; padrões transacionais re-
são transmitidos aos descendentes. Esse mate- correntes e cristalizados do sistema familiar
rial psíquico dos ascendentes está na ordem do disfuncional; alinhamento e alianças com o
inominado, “daquilo que não se contém, daqui- guardião; e transgeracionalidade - e descreveu
lo que não se retém. Dentre estes estão a falta, a de que forma eles se expressam em famílias
doença, a vergonha, o recalcamento, os objetos nas quais a AP se faz presente.
perdidos e enlutados” (Kaes, 1998, p. 9). Esse Entende-se que o pensamento de Gardner
mecanismo psíquico permite a vinculação do surgiu no momento em que se tornaram fre-
indivíduo ao grupo e a outros grupos em en- quentes as dissoluções das uniões conjugais,
cadeamento de gerações, que darão ao mem- a incidência do número de divórcios, as lutas
bro do sistema uma noção de pertencimento, pela igualdade entre os sexos e a busca por
permitindo que este construa sua subjetivida- uma paternidade participativa. Esses fenôme-
de através de um processo de transformação e nos sociais, que não existiam nos períodos da
criação do material transmitido. família tradicional e moderna, contribuíram
Na transmissão psíquica transgeracional, significativamente para o surgimento de dis-
observa-se que os conteúdos psíquicos dos putas entre os pais pela guarda de filhos. Tais
avós e de outros ascendentes marcaram os disputas surgem quase sempre marcadas pela
conteúdos psíquicos dos filhos e de outros des- “insanidade” temporária de alguns genitores,
cendentes. Dessa forma, os filhos receberam a envolvendo a criança em seus embates, como
herança de tudo aquilo que não está inscrito, arma para ferir o outro.
visto, ou falado, mas que foi vivido por um Os estudiosos da teoria sistêmica advogam
dos membros do sistema familiar. Assim, mes- que, em um sistema familiar disfuncional, os
mo estando resguardado pelo silêncio, esse seus componentes familiares estabelecem en-
conteúdo tende a se repetir em gerações subse- tre si triangulações, alinhamentos, lealdades
quentes. Pode ocorrer que uma mãe ou um pai invisíveis, padrões relacionais cristalizados e
que induz o filho a odiar e hostilizar o outro patológicos. Esses padrões se intensificam no
genitor e a se afastar dele e de sua família pos- momento do divórcio, sobretudo se o mesmo
sa ter vivenciado, quando criança, um proces- é conflituoso. Dessa forma, entende-se que os
so de AP em que teve que preterir a vinculação padrões relacionais estabelecidos entre pais
com o pai (ou a mãe) e a família deste depois e filhos descritos por Gardner muito se asse-

Contextos Clínicos, vol. 7, n. 2, julho-dezembro 2014 178


Maria Isabel Saldanha dos Martins Coelho, Normanda Araujo de Morais

melham a esses fenômenos relacionais. Muito é empobrecida e limitada, uma vez que carece
embora o autor em epígrafe tenha se preocu- de um olhar mais amplo e sistêmico. O pen-
pado em apenas dar um enfoque individual, samento de Gardner, além de prescindir de
patologizante e reducionista às suas ideias, rigores científicos, possui a tendência de psi-
tal enfoque não deixa de possuir, em seus quiatrizar o comportamento disfuncional dos
contornos, semelhanças com a teoria sistêmi- membros do sistema familiar que vivenciam
ca. Essas semelhanças se evidenciam quando um divórcio litigioso.
se descreve o comportamento de pais e filhos Por fim, acredita-se que Gardner parece
em processo de divórcio principalmente ao se ter desconsiderado o fato de que a experiência
fazer alusão ao alinhamento patológico esta- humana sempre será atravessada por aspec-
belecido entre a criança e o genitor guardião. tos sociais, históricos, econômicos, culturais
Analisando o pensamento de Gardner sob a e de gênero. Dessa forma, não pode ser des-
ótica sistêmica, entende-se que o autor enfoca contextualizada ou reduzida. Compreender as
que os padrões relacionais patológicos nome- relações humanas com os conflitos e as vicis-
ados por ele como Alienação Parental aconte- situdes que as envolvem demanda uma pers-
ceriam com o advento do divórcio. Na teoria pectiva complexa, ou seja, um olhar capaz de
sistêmica, pelo que se depreende, basta que contemplar os múltiplos contornos e níveis de
o sistema familiar seja disfuncional para que análise que permeiam tais relações. Ao invés
existam padrões de relacionamento cristaliza- de atentar para a relevância dessas questões,
dos e patológicos (Calil, 1987; Gardner, 1985, o psiquiatra norte-americano trabalha numa
1998, 1999a; Minuchin, 1982; Wendt e Crepal- perspectiva teórica que reduz a SAP/a AP a
di, 2008; Werlang, 2000). aspectos psicológicos, às características indivi-
Sob os matizes da teoria sistêmica, todos os duais e à problemática implicada nos litígios
membros do sistema familiar são considerados conjugais (Rodrigues e Ramires, 2012; Brito e
partícipes, autores e coautores das problemáti- Sousa, 2011).
cas surgidas no campo familiar de tal forma que Acredita-se que Gardner não se preocupou
o adoecimento não cabe a um membro apenas, em considerar a influência das dinâmicas en-
mas ao sistema inteiro. Essa seria talvez a grande volvidas no sistema familiar de cada sujeito,
contribuição do referencial sistêmico para a AP. dando prioridade ao enfoque medicalizado de
Na ótica de Gardner, o alienador é tido como um fenômeno que tem como lócus nascendi o
vilão, um alguém que sofre de um transtorno sistema familiar disfuncional. Aos psicólogos
de personalidade, ao passo que o alienado e a (clínicos ou não) envolvidos de alguma for-
criança são vistos como vítimas da “maldade” ma com a temática da AP faz-se necessária a
desse alienador. O alienado não teria contribui- compreensão dos inúmeros aspectos da dinâ-
ção alguma na manutenção do conflito (Barbosa mica familiar que estão relacionados à referida
e Juras, 2010; Sousa, 2010). Tal posicionamento temática. Uma visão mais abrangente sobre a
se contrapõe aos conceitos da teoria sistêmica, mesma, certamente contribuirá para a adoção
a qual postula que todos os componentes do de formas de intervenção mais adequadas.
sistema familiar contribuem ativamente para
manutenção de uma situação-problema. Gard- Referências
ner (1985) parece ser regido por uma lógica li-
near, ou, ainda, por um determinismo causal e ANDOLFI, M. 1980. A terapia familiar. Lisboa, Veja,
reducionista, que impossibilita que se enxergue 238 p.
cada sujeito em sua singularidade e desvaloriza ANDOLFI, M. 1989. Por trás da máscara familiar um
novo enfoque em terapia familiar. Porto Alegre,
a capacidade e as potencialidades do sistema
Artmed, 139 p.
familiar, bem como a capacidade de superação ARIÈS, P. 2006. A família. In: P. ÁRIES, História So-
(resiliência) dos indivíduos expostos à situação cial da Criança e da Família. Rio de Janeiro, LTC,
dolorosa do divórcio litigioso e destrutivo (An- p. 132-196.
dolfi, 1980, 1989; Calil, 1987; Dias, 2007a, 2007b; BARBOSA, L; JURAS, M. 2010. Reflexões sistêmicas
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Werlang, 2000).
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Observa-se que o fenômeno da AP sempre de Janeiro, Lumem Juris, p. 315-327.
existiu no campo familiar, possuindo, inclusi- BORZORMENY-NAGY, I.; SPARK, G. 1984. Invisi-
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