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Quando eu era criança, cada outono meus professores tinham uma aula
para escrever e apresentar um daqueles ensaios horríveis. “O Que Eu Fiz No
Verão Passado”, completo com fotos e histórias engraçadas projetadas para fazer
uma sala de aula cheia de alunos entediados prestarem atenção.
Cada ano eu sentei e ouvi quando meus colegas na minha escola
preparatória de New York falaram sobre como eles passaram o verão nos
Hamptons ou na Flórida ou na Europa com seus pais ricos, ou au pair, ou
conforme ficamos mais velhos, namorados e namoradas. No momento em que
chegava à escola, eu ouvia as mesmas histórias chamativas uma e outra vez:
escapadas em Paris com supermodelos, festas a noite toda nas praias nas
Bahamas com rock stars – cada aluno disputava a atenção com façanhas que
ficavam mais selvagens a cada ano.
Mas a minha história era sempre a mesma. Minha mãe trabalhava como
florista, e porque a maior parte de sua renda foi para pagar por essa escola,
nunca saímos de Nova York. Em seus dias de folga passamos nossas tardes no
Central Park, absorvendo o sol.
Depois que ela ficou doente, meus verões eram passados no hospital com
ela, segurando seu cabelo para trás, quando a quimioterapia atacava seu sistema
ou passando através dos canais de televisão procurando algo para assistir.
Não eram os Hamptons. Não era Florida. Não era Europa. Mas eles eram
meus verões.
Um dos meus primeiros seis meses com Henry, no entanto, explodiu cada
único verão que meus colegas já tiveram.
— Eu não posso acreditar que você nunca tinha nadado com os golfinhos
antes, — disse James enquanto eu dirigia por uma estrada de terra áspera que
não via muita utilidade. Estávamos de volta na península superior do Michigan e
cercados por árvores mais altas do que a maioria dos edifícios. Quanto mais perto
chegávamos ao Éden Manor, maior ficava a disseminação do meu sorriso.
— Não é como se tivéssemos uma tonelada deles no rio Hudson, — eu
disse, empurrando o acelerador. Nós estávamos tão longe da civilização, que não
havia limites de velocidade, e da última vez que tinha estado por esta via, a
minha mãe tinha estado muito mal para eu arriscar tirar vantagem disso. Mas
agora, após o Conselho ter me concedido a imortalidade, a única coisa que eu
arriscava era o meu carro velho batido. Até agora, eu gostava das regalias. — Eu
estou mais impressionada com o vulcão em erupção.
— Não tenho ideia de por que ele fez isso, — disse James. — Tem estado
adormecido por mais tempo do que alguns de nós estivemos vivos. Podemos ter
que perguntar ao Henry sobre isso quando voltarmos.
— O que ele tem a ver com um vulcão? — Eu disse, e meu coração pulou
uma batida. Estávamos tão perto agora que eu quase podia senti-lo, e eu batia
meus dedos nervosamente contra o volante.
— Vulcões agem de acordo com a vontade de Henry. Se um velho dispara
assim, então algo está acontecendo. — James mordeu um pedaço de carne seca e
ofereceu-me o resto. Eu franzi o nariz. — Faça como quiser. Você percebe que
você vai ter que dizer a ele sobre tudo o que fizemos, certo?
Eu olhei para ele. — Eu não tinha planejado o contrário. Por quê? O que
há de errado com isso?
James deu de ombros. — Nada. Eu imaginei que ele não estaria muito
entusiasmado com a ideia de você passar seis meses na Grécia, com um bonito
estranho loiro, isso é tudo. — Eu ri tanto que quase saí na beira da estrada.
— E quem era esse bonito estranho loiro? Eu não me lembro dele.
— Exatamente o que você deve dizer para Henry, e nós dois vamos estar
limpos dessa, — disse James alegremente.
Foi uma brincadeira, é claro. James era o meu melhor amigo, e nós
tínhamos passado o verão inteiro juntos em turnê nas ruínas antigas, cidades
grandes e ilhas de tirar o fôlego em um dos lugares mais bonitos do mundo.
Talvez um dos mais romântico, também, mas James era James, e eu era casada
com Henry.
Casada. Eu ainda não estava acostumada com isso. Eu mantive a minha
aliança de casamento de diamante negro em uma corrente em volta do meu
pescoço, com muito medo de perdê-la para usá-la corretamente, e agora que
estávamos apenas a mais ou menos um quilometro e meio do Éden, era hora de
colocá-la de volta.
Eu lutei para passar os sete testes que o conselho de deuses me deu para
ver se eu era digna da imortalidade e de me tornar a rainha do Submundo, e
porque eu tinha ganhado – Henry e eu éramos agora tecnicamente marido e
mulher.
Com o silêncio entre nós nos últimos seis meses, no entanto, não senti
assim. Eu não tinha admitido isso para James, mas eu passei o verão olhando ao
redor na esperança de ver Henry no meio da multidão, mesmo quando não era
para estar. Mas não importava o quão duro eu olhei, eu não tinha visto nenhum
sinal dele. Concedido, metade de um ano era praticamente um piscar de olhos
para alguém que já existia desde antes do nascimento da humanidade. Mas,
certamente, um sinal de que ele sentiu minha falta não erai muito para pedir.
Durante meu inverno com ele, porém, eu tinha que brigar para cada
pequeno passo em frente. Cada olhar, cada toque, cada beijo – e se seis meses de
intervalo nos trouxe de volta à estaca zero? Ele passou mil anos lamentando sua
primeira esposa, Persephone, e ele só me conhece há um. Nosso casamento não
tinha sido o final perfeito para uma história de amor maravilhosa. Isso tinha sido
o início da eternidade, e nada sobre nossa nova vida juntos ia ser fácil. Para
qualquer um de nós.
Especialmente considerando que em cima do ajuste de casamento, eu
teria que aprender a ser rainha do Submundo, também.
E não importava quantos anos eu passei cuidando de minha mãe
morrendo, eu tinha um sentimento afundando que nada iria ajudar quando
viesse a decisão sobre os mortos.
Eu empurrei minhas preocupações de minha mente quando o portão preto
de ferro forjado do Éden Manor veio à tona. Nova York, a escola, a doença da
minha mãe, isso era o meu passado. Minha vida mortal. Este era o meu futuro.
Não importa o que tinha ou não acontecido durante o verão, eu teria a chance de
estar com Henry agora, e eu não ia perder um momento.
— Lar doce lar, — eu disse enquanto eu dirigia até o portão.
Eu poderia fazer isso. Henry estaria esperando por mim, e ele ficaria feliz
em me ver. Minha mãe estaria lá também, e eu não teria que passar mais seis
meses sem vê-la novamente. Depois de quase perdê-la, passar o verão sem a
minha mãe foi uma tortura, mas ela insistiu que este primeiro verão fosse meu, e
ela e Henry não estariam envolvidos. Mas eu estava de volta agora, e tudo ficaria
bem.
James esticou o pescoço para olhar para as árvores coloridas que
ladeavam a estrada. — Tudo bem? — ele disse para mim.
— Eu deveria perguntar-lhe isso, — eu disse, olhando para a forma como
ele batia os dedos no braço nervosamente. Ele acalmou, e depois de um momento
eu adicionei antes que eu pudesse me parar, — ele vai ficar feliz em me ver,
certo?
James piscou e disse friamente, — Quem? Henry? Não poderia dizer. Eu
não sou ele.
Essa era a última resposta que eu esperava, mas é claro que ele não ia
estar alegre. James teria sido o único a substituir Henry como o governante do
Submundo se eu tivesse falhado, e mesmo que ele não tivesse desejado, James
estava, sem dúvida machucado sobre isso.
— Você poderia ao menos tentar fingir estar feliz por mim? — Disse. —
Você não pode gastar toda a sua existência chateado com isso.
— Eu não estou chateado. Estou preocupado, — disse ele. — Você não
tem que fazer isso se você não quer, você sabe. Ninguém iria culpá-la.
— Fazer o quê? Não voltar para o Éden? — Eu já tinha passado nos testes.
Eu disse ao Henry que estaria de volta. Nós nos casamos, pelo amor de Deus.
— Todo mundo está agindo como se você fosse "ser" tudo e o fim de tudo
de Henry, — disse James. — Não é justo colocá-la sob esse tipo de pressão.
Meu Deus, ele realmente estava falando sobre não voltar.
— Ouça, James, eu sei que você gostou da Grécia, assim como eu, mas se
você acha que pode me convencer a não voltar...
— Eu não estou tentando convencer você em nada, — disse James com
firmeza surpreendente. — Eu estou tentando ter certeza de que ninguém mais
faz. Esta é a sua vida. Ninguém vai levar sua mãe longe de você agora, se você
decidir que não quer fazer isso depois de tudo.
— Não é por isso que eu vou voltar afinal, — eu gaguejei.
— Então por que, Kate? Dê-me uma boa razão, e eu vou parar.
— Eu posso lhe dar uma dúzia.
— Eu só quero uma.
Funguei. Não era nada da conta dele. Eu quase morri nas minhas
tentativas para salvar Henry de desvanecer-se, eu não iria me afastar dele por
causa da possibilidade de eu não gostar do Submundo. — Eu não sei como você
faz as coisas, mas eu amo Henry, e eu não vou deixá-lo só porque você não acha
que ele é bom para mim.
— Muito bem, — disse James. — Mas o que você vai fazer se Henry não te
amar?
Eu bati o pé no freio e forcei o carro em uma parada tão violenta que a
cabeça da marcha saiu do câmbio. O carro era um pedaço de merda de qualquer
maneira. — Isso é impossível. Ele disse que me ama, e eu confio nele para não
mentir para mim. Ao contrário de alguém que eu conheço.
Eu olhei para ele, mas sua expressão não se alterou. Com um huff, saí do
carro, xingando quando o cinto de segurança pegou no meu jeans. Depois de
minhas poucas tentativas de me soltar, James se aproximou e gentilmente desfez
para mim.
— Não fique chateada, — disse ele. — Por favor. Depois do que aconteceu
com Persephone, eu quero ter certeza que você não tem que passar pela mesma
coisa, certo? Isso é tudo. — Eu não era uma idiota. Eu sabia que uma parte de
Henry estaria sempre apaixonado por Persephone. Afinal, ele tinha perdido a
vontade de continuar depois que ela desistiu de sua imortalidade para morrer e
passar a eternidade com um mortal, e ele não teria se sentido dessa forma, se
toda a sua existência não girasse em torno dela. Mas eu poderia dar a ele a única
coisa que ele nunca teve, amor correspondido.
— Se você realmente é feliz e vocês dois se amam de forma igual, então
ótimo, — disse James. — Boa sorte para os dois. Mas se vocês não... se você
acordar um dia e perceber que está forçando-se a amá-lo, porque você acha que é
a coisa certa a fazer, não porque ele te faz mais feliz do que você já foi, então eu
quero ter certeza que você sabe que tem uma escolha. E se você quiser ir embora,
tudo que tem a fazer é dizer a palavra, e eu vou com você.
Eu corri em direção às portas da frente da mansão, puxando forte. —
Ótimo, então se eu decidir que a vida de Henry não vale a pena, eu vou ter a
certeza de que você saiba. Ajude-me com estas, sim?
James não disse uma palavra quando ele se juntou a mim e abriu as
portas pesadas, como se elas fossem feitas de penas. Eu deslizei para dentro e
forcei um sorriso, esperando ver Henry me esperando no maravilhoso hall de
entrada feito de espelhos e mármores. Mas o foyer estava vazio.
— Onde estão todos? — Eu disse, meu sorriso desaparecendo.
— Esperando por você, eu suspeito. — James entrou depois de mim, e a
porta bateu atrás de nós, ecoando através do corredor.
— Você não achou que íamos ficar aqui, não é?
— Eu não sabia que havia outro lugar para ficar. — Ele passou o braço
sobre os meus ombros, mas quando eu encolhi os ombros, ele enfiou as mãos nos
bolsos em vez.
— É claro que há algum outro lugar. Siga-me. — James me levou ao
centro do hall de entrada, onde um círculo de cristal brilhava com um arco-íris de
cores no centro do chão de mármore branco. Quando eu tentei continuar para o
outro lado da sala, ele pegou minha mão e me parou.
— Esta é a nossa parada, — disse ele, olhando para baixo.
Eu olhei para o cristal sob os meus pés, e finalmente eu vi. Uma aura
estranha, cintilante parecia emanar de onde estávamos, e eu pulei para fora do
círculo. — O que é isso?
— Henry não lhe disse? — Disse James, e eu balancei a cabeça.
— É um portal entre a superfície e o Submundo. Para sua segurança, eu
prometo. Eles são como atalhos para não ter que tomar o caminho mais longo.
— O caminho mais longo?
— Se você souber onde olhar, você poderá achar uma abertura para o
Submundo e viajar através de várias cavernas e esse tipo de coisa, — disse ele. —
Escuro, sombrio, demorado, consumidor e problemático se você estiver nervosa
sobre ter milhões de quilos de rocha pressionando você para baixo.
— Não há nada por debaixo da superfície, exceto lava e sujeira, — eu
disse, ignorando o pensamento de ser enterrada viva. — Todos com oito anos de
idade sabem disso.
— Nós somos deuses. Somos excelentes em cobrir nossas pistas, — disse
James com um sorriso de menino, e desta vez, quando ele me ofereceu sua mão,
eu peguei e voltei para o círculo.
— O que mais você é bom? — Eu resmunguei. — Transformar a água em
vinho?
— Essa é a especialidade de Xander, — disse ele. — Estou surpreso que
ele não virou o Mar Morto em uma grande festa da cerveja por agora. Deve ser
muito salgado para ele. Quanto a mim, eu posso achar qualquer coisa ou
qualquer um ou qualquer lugar que você quiser. Você não percebeu que nunca
nos perdemos na Grécia?
— Só aquela uma vez.
— Nós não estávamos realmente perdidos então, também, — ressaltou.
— Ainda. — Eu dei-lhe um olhar, e ele ficou rosa. — Eu apenas pensei
que você conhecia bem a área.
— Eu conheci, milhares de anos atrás. Eles fizeram algumas modificações
desde então. Feche os olhos. — Uma onda de energia eletrizante girava em torno
de nós, e um rugido encheu meus ouvidos. Sem aviso, o chão caiu debaixo de
nós, e eu gritei.
Meu coração saltou em minha garganta e meus olhos abriram enquanto
eu tentava me afastar de James, mas seu braço envolveu ao redor de mim como o
aço. Estávamos cercados por rocha, não, nós estávamos dentro da rocha, e
passamos por ela como se não fosse mais substancial do que o ar. A expressão de
James era tão calma como sempre, como se passando por pedra e terra e só Deus
sabe o que mais era perfeitamente normal.
Parecia durar por séculos, mas apenas alguns segundos mais tarde os
meus pés desembarcaram em terra firme. James afrouxou o controle sobre os
meus ombros, mas minhas pernas tremiam tanto que eu me agarrei a ele, mesmo
que tudo o que eu queria fazer era dar uma paulada na cabeça dele.
— Isso não foi tão ruim, foi? — Ele disse, alegremente, e eu dei um olhar
frio.
— Eu vou pegar você por isso, — eu disse. — Você não vai ver chegando,
mas quando acabar, você vai saber o que era.
— Estou ansioso por isso, — disse ele, e, finalmente, me senti firme o
suficiente para ficar sozinha. Eu mordi de volta a minha réplica quando olhei ao
redor, e as sobrancelhas se ergueram.
Nós estávamos em uma caverna enorme, tão grande que eu não conseguia
ver o topo. A única maneira que eu poderia dizer que estava sob a terra - além da
jornada angustiante que eu quase não sobrevivi - era a falta de luz solar.
Ótimo. Aparentemente Henry vivia em uma caverna.
Em vez do céu, rios de cristal corriam através da rocha, proporcionando
uma luz brilhante que iluminou a caverna inteira.
Estalagmites e estalactites gigantes se uniram em fileiras de colunas que
não poderia ter sido natural, e para meu alívio, eles formaram um caminho para
um magnífico palácio feito de rocha negra brilhante que parecia como se tivesse
crescido para fora do lado da caverna.
— Se eu puder, — disse James. — Em nome do conselho, deixe-me ser o
primeiro a recebê-la no Submundo. — Eu abri minha boca, mas antes que eu
pudesse dizer uma palavra, gritos enfurecidos de Henry encheram meus ouvidos,
e eu caí de joelhos quando o mundo ficou preto.
02
DOM
Eu não sabia muito sobre ser um deus, mas eu sabia que os deuses não
deveriam sangrar.
Eles poderiam adoecer ou ficar feridos quando adotavam corpos mortais,
por curtos períodos de tempo, como Ava tinha feito quando eu primeiramente a
conheci no Éden e como minha mãe tinha feito pelos primeiros 18 anos da minha
vida. Mas uma das vantagens principais de ser imortal é não se preocupar com
as coisas irritantes como o sangue e a morte.
— Henry! — Eu voei para o seu lado, meus dedos pairando acima do corte
em sua pele. Ele precisava urgentemente levar pontos, mas como alguém iria
supostamente curar um deus? — O que aconteceu? — Ele recuou quando eu
gentilmente baixei a gola para expor o resto da ferida. Sua camisa preta estava
molhada de sangue, e sem pedir comecei a desabotoá-la.
— Vou..Vou pegar Theo, — disse Ava, e ela correu para fora da sala, Pogo
em seus calcanhares, deixando-me para cuidar de Henry sozinha.
— Não é nada, — disse Henry, mas a tensão em sua mandíbula disse o
contrário. Uma vez que eu desabotoei a camisa, eu tirei o tecido, expondo um
corte que corria no peito e na metade de seu umbigo.
— Isso não parece como nada, — eu disse. — Deite-se. — Henry começou
a protestar, mas eu dei-lhe um olhar severo, e ele cedeu. Uma vez que ele estava
deitado de costas, eu pairei sobre ele, tentando descobrir algo que eu poderia
fazer para ajudar, mas ele não estava sangrando tanto que eu precisasse aplicar
pressão, e eu não queria machucá-lo mais do que ele já estava.
— Como isso aconteceu? Eu pensei que os deuses não deveriam se
machucar desse jeito.
— Normalmente, nós não machucamos. — Os cantos de seus lábios
levantaram, para um leve sorriso. — Você parece bem, Kate. Como foi o seu
verão?
Ele estava sangrando por toda a cama, e ele queria saber como meu verão
tinha ido. — Comparado a como o meu outono está indo? Fantástico. Eu não
posso fazer alguma coisa? Você está sangrando nos lençóis.
A cama era a última das minhas preocupações, mas foi o suficiente para
distrair Henry de fazer mais perguntas. — Minhas desculpas. Eu vou ter certeza
de limpá-lo antes de hoje à noite. Theo vai estar aqui em breve, e, ah, aí está
você.
Eu virei a tempo de ver Theo entrar. A maioria do conselho agiu como o
pessoal no Éden Manor, e Theo havia assumido o cargo de mestre da Guarda.
Segurança, eu pensei, mas quando eu o vi caminhar através da porta,
sobrepondo sobre Ava quando ela sorrateiramente entrou atrás dele, eu percebi
que o seu papel poderia ter prorrogado para além disso. Henry foi capaz de me
curar, ele tinha provado isso, mas aparentemente ele não podia curar a si
mesmo. Então, novamente, ele não deveria ser capaz de se machucar em primeiro
lugar.
— Onde estão os outros? — Disse Theo. Quando saí de seu caminho, eu
abri minha boca para perguntar quem eram os outros, mas rapidamente fechei.
Walter e Phillip, irmãos de Henry. As mesmas pessoas que eu tinha visto na
minha visão.
— Eles estão vindo, — disse Henry. Theo colocou suas mãos sobre a
ferida, e a expressão de dor do Henry relaxou. — Eles insistiram que eu viesse na
frente.
— Eles estão feridos? — Disse Theo, e Henry balançou a cabeça.
— O ataque foi principalmente focado em mim.
Eu assisti Theo ansiosamente, à procura de sinais de que o que ele estava
fazendo estava funcionando. Em primeiro eu não vi nada, mas então, depois de
alguns segundos, um brilho estranho formou entre suas mãos e a pele de Henry.
Quando ele passou as mãos sobre a ferida, a fechou, deixando para trás uma fina
cicatriz.
Essa era toda a evidência que eu precisava saber que isto não era uma
ocorrência diária. Henry não tinha outras cicatrizes.
— Pronto, — disse Theo, uma vez que ele terminou. Ele puxou um lenço
do bolso e limpou as mãos. — Eu recomendaria pegar leve esta tarde no caso de
haver qualquer dano que eu não peguei.
— Não há, — disse Henry quando ele se sentou. Ele começou a puxar sua
camisa de volta, mas ele deve ter sentido quão úmida estava, porque ele a colocou
de lado. — Obrigado, Theo. Ava. — Theo não perdeu tempo para sair, e Ava
permaneceu atrás dele, com a sobrancelha franzida de preocupação. Ela
empurrou a cabeça para Henry, e eu balancei a cabeça. Por mais que eu queria
ela por aqui, agora que Henry estava aqui, não havia razão para ela ficar.
Sentei-me na beira da cama e corri os meus dedos através da pele do Pogo
quando Henry dobrou a camisa arruinada. Uma dúzia de perguntas passou pela
minha mente, mas eu não sabia por onde começar, então deixei para ele.
Eventualmente ele teria que falar comigo, mesmo que ele não quisesse me dizer o
que realmente tinha acontecido.
Quase um minuto se passou antes que ele falasse, e nesse tempo eu tinha
enfiado as mãos entre os joelhos, nervosa demais para tentar fingir não estar. —
Você está ansiosa para a cerimônia de hoje à noite? — Ele disse, e eu o olhei
boquiaberta.
— Nós não nos vimos em seis meses, você está coberto de sangue, e é
sobre isso que você quer conversar?
Ele deu de ombros. — É tão bom tema como qualquer outro.
— Não, — eu disse, cavando minhas unhas em meu jeans. — Não é
verdade. Por que não vamos começar com a forma como você conseguiu se
machucar tão mal quando você deveria ser imortal? — Ele levantou-se e dirigiu-
se para uma porta ao lado do meu armário.
Quando ele abriu, eu vi que ele tinha um guarda-roupa dele, só que
menor e mais monocromático. Ele pegou uma camisa preta que era idêntica a
que ele tinha descartado, mas antes de colocá-la, ele se dirigiu para a outra
porta.
O banheiro.
— Eu vou ajudar você, — eu disse, pulando da cama e correndo atrás
dele. Ele não se opôs, e eu o segui em um grande banheiro decorado em preto e
dourado. Vendo uma toalha, eu peguei e abri a torneira. — Eu não esperava que
o Submundo teria encanamento.
Isso, pelo menos, teve um sorriso fraco para fora dele. — Ava pode ser
muito convincente, às vezes.
Eu limpei o sangue que manchava sua pele, tendo o cuidado de evitar a
fina cicatriz que agora corria em seu peito. Henry ficou imóvel, e quando olhei
para ele, eu vi ele olhando para mim com um olhar estranhamente suave.
— O que? — Eu disse, corando. — Tenho alguma coisa na minha cara?
— Não, — ele disse, e tão rapidamente como eu tinha notado, o olhar se
foi. — Você perguntou como eu consegui isso. Houve um problema que eu tinha
que cuidar, e enquanto há poucas coisas que podem ferir a minha família, eles
estão lá fora.
— Como o quê? — Eu disse, enxaguando o pano. A água ficou rosa
quando ela rodou pelo ralo.
— Nada que você deveria estar preocupada. — Maravilhoso.
Aparentemente, enquanto eu estava ficando bronzeada na Grécia, ele tinha
voltado para o mesmo Henry que eu conheci há um ano, em vez do que eu tinha
casado. Eu olhei para ele.
— Sério? Isso é tudo que você vai me dizer? Você prometeu que nunca
mentiria para mim.
— Eu não estou mentindo...
— Você disse que não iria manter segredos de mim, — retruquei. —
Então, qual é? Você vai me tratar como uma menina frágil que você precisa
proteger a todo custo, ou você vai me tratar como sua parceira? Porque em
algumas horas, eu vou ser a rainha deste lugar, e eu nunca vou ser capaz de
ajudá-lo a governar corretamente se você sempre manter tudo dentro. Eu tenho o
direito de saber.
Silêncio. Eu suspirei.
— Isso tem alguma coisa a ver com a Calliope?
Henry ficou tenso. — Quanto a sua mãe lhe disse?
Minha mãe sabia disso? — Nada, — eu disse, e quando eu percebi que eu
tinha que dizer a ele sobre o que tinha acontecido mais cedo ou mais tarde, eu fiz
uma careta. — Eu tive uma visão, eu acho. Eu não sei o que mais lhe chamar.
Quando James me trouxe até aqui, de repente eu vi você, Walter e Phillip
brigando, ou alguma coisa. Eu não sei o que era, mas você estava na frente do
portão, e Calliope mostrou-se atrás de você e lhe disse que era inútil, porque ele
já estava acordado.
O silêncio pareceu se estender para sempre. Não foi até que eu peguei a
toalha de novo que ele respondeu, e quando o fez, ele falou com uma estranha
calma.
— Então esse é o seu dom. Eu tinha me perguntado.
— Dom? — Minha mãe tinha mencionado a mesma coisa, mas nunca
tinha chegado a explicar.
— Junto com a imortalidade vêm certos talentos, — disse Henry. — Isso
varia de indivíduo para indivíduo, e, muitas vezes, coincide com o que nós
representamos. Por exemplo, a cura não é apenas o talento de Theo. Como o deus
da música e da poesia, ele também tem afinação perfeita.
Ele estava tentando me fazer rir. Isso tinha que ser um bom sinal. Eu
consegui um pequeno sorriso enquanto um pouco ansiedade drenava do meu
corpo. — Tenho certeza de que vem a calhar o tempo todo.
— Ele faz o entretenimento durante encontros familiares mais suportáveis.
Outro momento se passou em silêncio. Isso deve ter sido o que James quis
dizer sobre nunca se perder. A capacidade de minha mãe para trazer a vida de
até mesmo o pedaço mais negligenciado de terra, a capacidade de Henry para
viajar grandes distâncias em um piscar olhos, de que outra forma ele poderia ter
viajado através do Submundo?
— Por que eu posso ver as coisas que estão acontecendo em outros
lugares? — Disse. — Qual é a utilidade disso? Isso é suposto me deixar melhor
em decidir os destinos das pessoas?
— Sim, e vai ter outras utilizações, também. Uma vez que você for
coroada, você vai começar a desenvolver outros poderes, — disse Henry. — Eu
vou ajudá-la tanto quanto eu sou capaz, e com o tempo você vai aprender a
controlá-los.
Então, em cima de aprender tudo sobre o Submundo, eu teria que lidar
com habilidades incontroláveis, também.
Não que a ideia de ser capaz de fazer coisas divinas não era emocionante,
mas eu não gosto da ideia de ter visões, sem aviso prévio. Não quando elas me
davam uma dor de cabeça forte depois. — Quais serão as minhas habilidades?
— Eu não estou certo. As coisas que Persephone podia fazer não
necessariamente transferem para você.
Meu coração se afundou. Ao ritmo que isto ia, eu nunca iria escapar da
sombra de Persephone. — O que ela podia fazer? — Eu disse, mesmo que ela
fosse a última coisa que eu queria falar. — Ela podia ver as coisas?
— Sim. Suas habilidades eram muito como as minhas. — A sugestão de
um sorriso apareceu em seu rosto, e eu tentei me convencer de que era porque o
sangue tinha quase desaparecido. Não porque ele estava pensando nela. — Ela
podia viajar. Ela também tinha um talento para contar uma verdade de uma
mentira, e ela podia criar, como todos nós podemos.
— Criar?
Ele estendeu a mão, e um momento depois, uma flor feita de joias
apareceu na palma da mão vazia. Exatamente como as do jardim exterior. — Para
você.
Eu peguei e examinei as pétalas delicadas feitas de quartzo rosa. Situado
entre eles estavam minúsculas pérolas creme, e a haste foi feita de metal que era
mais leve que o ar. Eu toquei a flor ao meu nariz, mas cheirava a nada. Tão
impressionante como ela era, não era a coisa real.
— Meus irmãos, irmãs e eu somos muito mais poderosos do que os nossos
descendentes, — disse ele. — A cada geração, os dons crescem menos potentes.
Meu estômago agitou. Nossos descendentes, não deles. Então, novamente,
Henry sempre os agrupou juntos, como se fossem uma única entidade, em vez de
seis seres individuais. — Você... tem filhos? — Eu disse timidamente.
Era humilhante, percebendo que eu sabia muito pouco sobre ele. Depois
de estudar muito e bem no ano passado, eu sabia o que os mitos me ensinaram e
o que ele mesmo tinha me dito, mas os mitos nem sempre foram precisos, e
Henry tinha sido menos que aberto sobre si mesmo. Calliope tinha me dito uma
vez que acreditava-se que Henry nunca tinha dormido com ninguém antes de
mim, nem mesmo Persephone, mas Calliope acabou por ser menos que confiável.
— Não, eu não tenho, — disse Henry, e eu quase engasguei sugando de
volta o meu suspiro de alívio.
— Você... — eu parei, mas Henry assentiu encorajando. — Você quer um
dia? Algumas décadas ou séculos a partir de agora?
Ele me deu um sorriso pálido que não alcançou seus olhos. — Vamos ver
como você se sente depois. Eu não desejo selá-la com outra responsabilidade que
você não pediu. Agora venha, temos que prepará-la.
Eu fiz uma careta. O que isso quer dizer? Será que ele achou que eu não
queria isso, casar com ele e tudo que vinha junto com isso?
As palavras de James flutuaram de volta para mim. Esta foi a escolha que
ele tinha falado, não foi? Ele sabia que Henry estava tendo dúvidas. Ele sabia que
Henry pensava que ele era um fardo para mim, ou que eu ia puxar uma de
Persephone e deixá-lo. Pior, James tentou convencer-me.
— Você sabe que eu quero isso, certo? — Disse. — Não importa o que
alguém já disse...
— Ninguém disse uma palavra sobre isso para mim, — disse Henry. —
Mesmo sua mãe tem respeitado meus limites. Por uma vez, — acrescentou em voz
baixa. — Mas este é o início de nosso reinado juntos. Nós não precisamos tomar
essas decisões de imediato.
O nosso reinado juntos, não a nossa vida juntos. Outra distinção, mas
desta vez não foi um deslize da língua. Minha garganta apertou. — Não quando
você acha que eu poderia desistir disso de qualquer maneira, certo?
Ele hesitou. — Eu não sou o seu captor. Se você quiser sair, você pode.
— Não, você não é meu captor. Você deveria ser meu marido, — eu atirei.
— Você quer que eu vá embora? Você quer governar sozinho ou... ou desaparecer
ou o que vai acontecer com você se eu for?
Eu queria que ele gritasse comigo. Eu queria que ele estivesse lívido.
Eu queria fazê-lo sentir as emoções avassaladoras que ele provocava em
mim quando ele era assim, quando eu estava tão desesperada pela aprovação que
ele se recusava a me dar, que eu estava praticamente arrancando meus cabelos.
Em vez disso, ele me olhou com um olhar irritantemente calmo e disse
calmamente: — Eu gostaria que você nos desse tempo para nos ajustarmos a
isso. É uma vida nova para nós dois, e eu gostaria de crescer dentro dela juntos
em vez de guerra. Não há necessidade de pressa. Nós temos a eternidade.
Foi racional. Essa foi a pior parte sobre isso, eu não tinha nada para
retrucar. Ele estava sendo o maduro, dando-nos espaço para ajustar a isso, e eu
estava sendo a única que se agarrou a isso, porque mesmo que eu confiava nele
com a minha vida, eu não confiava nele o suficiente para me amar do jeito que eu
queria. E nesse momento, parte de mim o odiava por isso.
— Só me diga se você quer que eu esteja aqui ou não, — sussurrei. — Por
favor.
Ele abaixou a cabeça, como se quisesse me beijar, mas ele se afastou no
último segundo. — O que eu quero nunca deveria ditar o que você faz. Eu quero
que você seja feliz, e enquanto você estiver satisfeita, eu vou estar, também. —
Isso não foi uma resposta e ele sabia disso, mas eu esvaziei e segui Henry para o
quarto, onde ele colocou a sua camisa. Eu não queria brigar, também. Eu sabia
que as coisas não iriam ser perfeitas, e talvez a culpa fosse de James por me fazer
duvidar de Henry, para começar, ou talvez fosse os lembretes de Persephone em
todo lugar que eu olhava, mas tudo que eu queria era um pouco de tranquilidade.
Um toque. Um beijo. Uma palavra.
Algo.
Eu escovava meus dedos contra a flor de joias no bolso. Isso tinha que ser
o suficiente por agora.
— Eu presumo que Ava mostrou-lhe o armário, — disse Henry. — Você
pode escolher o que quiser para vestir, mas como a cerimônia esta noite é
considerada formal, algo mais arrumado do que você costuma preferir seria mais
apropriado.
— Certo, — eu disse suavemente. — Posso perguntar uma coisa?
— É claro.
Eu hesitei. Será que ele me ama? Ele ainda está apaixonado por
Persephone? Será que ele ainda quer que eu seja coroada sua rainha, ou eu era
simplesmente uma substituta para a minha irmã? Por que ele não veio para me
ver enquanto eu estava na Grécia com James?
Mas a coragem que tomei para me fazer essas perguntas tinha
desaparecido. Cavei fundo, tentando achar alguns restos do que eu imaginava os
inevitáveis seis meses de tensão e de solidão se eu não fizesse, mas eu vim vazia.
Cada pedaço de mim estava encharcado de medo doentio de que Henry não me
queria aqui, depois de tudo, que ele só fez isso porque a minha mãe e o resto do
conselho tinha o forçado. Que eu seria para Henry o que ele tinha sido para
Persephone: nada, exceto uma obrigação. Então eu me afastei.
— Qual vestido você prefere?
Quando Henry levou-me para dentro do armário para examinar a
prateleira de vestidos formais, peguei a mão dele, mas no momento em que o
toquei, ele se afastou. Em vez disso ele levantou o vestido prateado que eu
admirei antes. — Que tal esse? — Náusea tomou conta de mim. Talvez ele
simplesmente pegou o vestido e não tinha percebido que eu estava chegando para
ele, mas metade do tempo, ele parecia saber o movimento que eu ia fazer antes de
mim. Não importa como eu justifiquei, eu não conseguia afastar a sensação de
que ele tinha feito isso de propósito.
Mas continuando a brigar só lhe daria uma desculpa para me empurrar
para longe, e eu tive o suficiente disso por um dia. Hoje à noite, após a cerimônia,
depois de tudo resolvido, então poderíamos conversar, e eu não lhe daria a
chance de ir embora.
— Esse é bom, — eu disse, forçando um sorriso. Peguei o vestido, mas
antes que pudesse me mover em direção à tela de troca, um grande estrondo
ecoou do quarto, e eu deixei cair o cabide.
James explodiu dentro do armário, parando quando ele me viu lá com
Henry. Seus ombros caíram e todo o ar parecia deixar seus pulmões, e eu podia
jurar que vi um flash de ressentimento em seu rosto. Mas antes que eu pudesse
dizer uma palavra, isso se foi, substituído pelo mesmo vazio que tinha estado lá
antes.
— Houve outro ataque.
Henry endureceu, e qualquer esperança que eu tinha de uma tarde com
ele se foi. Ele pegou o vestido e entregou-o a mim, e um momento ele estava ao
meu lado, e no próximo ele estava no quarto.
— Diga-lhes para continuar os preparativos para a cerimônia, — disse
Henry quando ele terminou de abotoar a camisa. — James e eu voltaremos antes
de começar.
Eu olhei para ele. — Você vai sair de novo? Depois de quase sangrar até a
morte?
Seus lábios formaram uma linha fina. — É meu dever. Isso não vai
demorar muito.
— E se o que te machucou dessa vez torne as coisas ainda piores?
— Não vai, — disse Henry categoricamente. — Faça o que eu digo e não se
preocupe com isso. Voltaremos em breve. — Eu bufei indignada. Fazer o que ele
disse? Durante o meu tempo no Éden, ele deu-me ordens para me manter
segura, mas nós deveríamos ser parceiros agora. Mandar em mim não estava
bem. Se essa é a maneira que ele ia jogar, então as coisas iam ter que mudar. Eu
não era mais uma mortal indefesa. E já era tempo de nós dois começarmos a agir
como tal.
Eu não tive tempo para expressar meus protestos. James pelo menos teve
a decência de me dar um olhar de desculpas, mas a expressão de Henry estava
em branco enquanto ambos piscaram fora de vista, deixando-me sozinha no
quarto. Algo dentro de mim arrancou quando percebi que essas poderiam ser as
últimas palavras que ouvi Henry dizer, e eu apertei o vestido tão apertado que o
tecido ameaçou rasgar.
— Eu juro, — eu murmurei para Pogo, — Se qualquer um deles morrer de
forma permanente, eu não falarei com eles de novo. — Eu posso não estar no
Éden mais, mas algumas coisas nunca mudavam.
Ava me ajudou a ficar pronta, me sentado na frente da penteadeira e
passando quase uma hora fazendo o meu cabelo. Deixei-a aplicar alguma base e
batom, mas eu coloquei meu pé no chão, quando ela tentou me atacar com
delineador e rímel.
— Vamos, Kate, — disse ela com um beicinho. — Isso é uma coisa de
uma-vez-em-uma-vida. Você tem que parecer absolutamente deslumbrante, ou
então eu nunca iria me perdoar.
— Você está dizendo que eu preciso de maquiagem para ficar bonita? —
Eu disse, e seus olhos perfeitamente feitos se arregalaram.
— Não, claro que não! Eu só queria dizer, eu não quero fazer você parecer
como uma pessoa diferente. Eu só quero fazer o melhor que você pode ser.
— Será que vai fazer a diferença na cerimônia?
— Não, — ela disse com relutância, e pôs fim a isso.
Consegui manter meu pânico reprimido pela próxima meia hora ou assim,
mas quando chegou a hora para a cerimônia e Henry e James não tinham
retornado, isso começou a aumentar até que eu já não podia ignorá-lo. E se
alguma coisa tinha acontecido com eles? Como é que alguém saberia para
ajudar?
— Isso parece familiar, — disse Ava alegremente quando ela me levou
pelos corredores que se estendiam da ala privada para o que eu só poderia
assumir que era o setor público do palácio. As paredes mudaram de vermelho
para creme e dourado, e por um momento eu esqueci que estava no Submundo,
pelo menos até que passamos por uma janela com cortinas, e eu cometi o erro de
olhar para fora.
Teria sido suportável se Henry estivesse lá comigo, mas quando Ava me
parou fora de um conjunto de portas duplas que me lembraram fortemente do
salão de baile no Éden Manor, ainda não havia nenhum sinal de Henry ou
James. Pelo lado positivo, eu finalmente entendi o que Ava quis dizer com
familiar.
— Será que Henry teve o Éden Manor construído como este lugar? — Eu
disse, olhando em volta enquanto esperamos. Tudo, desde a cor do tapete e as
paredes para o caminho que Ava tinha usado para me levar daqui, me lembrou
do Éden. Não era exatamente o mesmo, mas era semelhante o suficiente para que
eu não pudesse deixar de lembrar da noite em que eu tinha sido apresentada ao
conselho quase exatamente um ano atrás.
— Algumas partes, — disse Ava. — O palácio é maior, claro, mas ele
manteve os pedaços importantes.
Pelo menos Henry nunca se perdia em sua própria casa, não importava
quantas ele tinha. — Você acha que ele vai voltar a tempo?
— É claro, — disse ela com uma atitude alegre que eu gostaria de trocar
pelo nó no meu estômago. — Ele não pode perder.
— James provavelmente se mataria para que ele não tivesse de vir. — Eu
fiz uma carranca. — Por que você acha que eles fugiram assim antes da
cerimônia?
Ava acalmou, e ela não chegou a encontrar o meu olho, ela respondeu. —
Porque é o trabalho de Henry.
— Não poderia esperar?
Seus lábios pintados puxaram para baixo em uma carranca. — Você não
pode esperar que Henry seja alguém que não é. Ele não foi casado em mil anos.
Vai levar algum tempo para voltar para ele, mas quando isso acontecer vai valer a
pena. Ele está acostumado a colocar seus deveres primeiro, isso é tudo.
Sua resposta me fez sentir como uma idiota, e o meu rosto queimou
debaixo da camada de maquiagem que ela colocou. — Ele mal me tocou, — disse
eu, brigando para manter minha voz igual. — Já se passaram seis meses, e ele
não pôde sequer me dar um beijo de boas-vindas. Eu não quero que ele mude por
mim, mas seria bom se ele pelo menos tentasse me deixasse saber que ele estava
feliz em me ver. Eu não posso... — As palavras ficaram presas na minha
garganta, e me levou um segundo para trabalhar a minha maneira de contornar o
nó que estava se formando. — Eu não posso gastar metade da minha vida com
alguém que não me ama.
— Oh, Kate. — Ava me abraçou, tomando cuidado para não estragar meu
cabelo ou maquiagem. — É claro que ele te ama. Ele nunca foi muito bom com
carinho, isso é tudo, e ele é um homem. Eles nunca são bons em perceber o que
queremos e agir sobre isso, especialmente quando estiveram sozinhos tanto
quanto Henry. Eu realmente tenho que passar os próximos seis meses tendo
certeza que você sabe o quanto ele ama você?
Eu funguei. — Não, mas seria bom se ele fizesse.
— Dê-lhe tempo, — disse ela. — Ele está provavelmente apenas nervoso
com tudo o que está acontecendo.
— O que está acontecendo? — Eu disse, tentando me afastar o suficiente
para olhar para ela, mas enquanto ela estava sendo gentil, seu aperto era
inquebrável. — O que está acontecendo com Calliope?
Ava ficou tensa. — Henry não lhe disse? — Ela disse em uma voz tímida.
— Não, e se você não disser, eu vou esfregar meu batom em todo o meu
rosto. E o seu.
Ela saltou longe de mim e estendeu as mãos, como se para afastar-me. —
Não se atreva. Eu vou atrasar a cerimônia, se tiver que contar.
— Eu acho que Henry e James já estão fazendo isso por você. — Eu cruzei
os braços. — Diga-me o que está acontecendo. Eu tenho o direito de saber.
Ela suspirou. — Você tem, mas Henry vai me matar se ele descobrir que
eu já lhe disse.
— Então eu não vou dizer-lhe que foi você.
Ava olhou em volta nervosamente e puxou um de seus cachos loiros. —
Eu só estou te dizendo isso porque Henry não está aqui para fazer isso por mim,
porque você realmente deve ouvir isso dele, — disse ela em voz baixa, mas eu
tinha certeza que ela estava me dizendo porque sabia que Henry não iria. —
Calliope escapou. Henry, papai e Phillip não estão dizendo muito sobre o que está
acontecendo, mas, bem, você viu a condição que Henry estava. Obviamente algo
ruim está acontecendo.
Algo ruim o suficiente para cicatrizar um deus. — Como é que Henry se
lesionou, te disseram alguma coisa?
— Disseram alguma coisa sobre o que?
Eu virei. James dirigiu-se para nós, o cabelo uma bagunça e seu casaco
rasgado no ombro, mas pelo menos não parecia ter qualquer sangue neste
momento.
— James! — Eu voei em direção a ele, cabelo e maquiagem que se danem.
Ele reuniu-me em seus braços e me abraçou com força, e eu ouvi o grito
estrangulado de Ava de protesto. Por ela, eu não o beijei na bochecha. — Você
está bem? O que aconteceu?
— Não foi nada, — disse ele. — Um pequeno contratempo. Tudo está bem.
— Você quer dizer que não teve nada a ver com a Calliope? — Eu disse, e
James abriu a boca para responder quando uma segunda voz interrompeu.
— Teve.
James fez uma careta, e ele imediatamente me deixou ir e deu um passo
para o lado. Henry atravessou a sala em minha direção, e ao contrário de James,
ele parecia impecável.
— Você está sangrando até a morte de novo? — Eu disse, incapaz de
manter a frieza da minha voz. Henry ou fingiu não perceber ou estava distraído
demais para se importar.
— Eu estou bem. — Ele acenou com a cabeça em direção às portas duplas
atrás de mim. — Eu vou acompanhá-la para dentro. Nós não devemos manter o
resto do conselho em espera.
Essa foi a última coisa que eu estava preocupada, mas quando Henry
ofereceu-me o braço, eu peguei. A este ritmo, era o máximo de contato que eu
teria com ele durante todo o inverno.
Ava e James passaram pelas portas, e Henry olhou para frente enquanto
esperávamos. Eu o vi com o canto do meu olho, à procura de algum sinal de que
ele tinha sido atacado novamente, mas ele estava tão composto como sempre.
Como se ter sua nova esposa dedicando sua vida a ajudá-lo a governar o
Submundo era uma ocorrência diária.
Meu peito se apertou. Eu não poderia fazer esse tipo de compromisso, se
as coisas não iam mudar. Se ele não ia confiar em mim, se ele não me queria
como sua rainha, então eu não queria fazer isso. — O que está acontecendo com
Calliope, eu tenho o direito de saber.
— Você tem, — disse ele. — Eu garanto a você, assim que nós tivermos
um momento, vou dizer-lhe tudo.
— Temos um momento agora, — eu disse. Eu não queria brigar, não à
beira do momento que a minha vida ia mudar irrevogavelmente para sempre. Mas
era exatamente por isso que eu tinha que fazer isso. — Não parece como se você
confia em mim ou, ou me quer aqui, e eu preciso saber o que você quer. E se você
não fizer isso, então não temos de fazer isso.
Henry hesitou. Eu o observei por qualquer sinal de que ele estava
pensando, mas sua expressão entregou. — Se você não quer...
— Eu quero, — eu disse, desespero agarrando dentro de mim. — Eu quero
ficar. Eu quero fazer isso. Eu quero estar com você. Eu não sei como fazer isso
mais claro. Mas eu preciso que você queira, também, ok? Por favor, me diga que
você me quer aqui para que eu possa fazer isso.
Eu esperava silêncio em troca, e quando ele não respondeu, comecei a me
afastar das portas.
A mão de Henry me parou.
— Kate, — ele disse suavemente. — Foi um dia difícil, e lamento pela
preocupação que eu a coloquei esta tarde. No entanto, não importa como as
coisas se tornem difíceis, não importa quanto tempo leve para nós dois nos
ajustarmos a esta nova vida, nunca duvide que eu quero você aqui. Você é capaz
e perspicaz, e você é mais adequada para ficar ao meu lado como minha rainha
do que qualquer mortal que eu já conheci. — Meu coração se afundou. Suas
razões eram racionais, mas não tinha coração. Se Henry teve seu caminho, eu
estava certa de que a sua rainha era tudo que eu jamais seria para ele, mas não
havia nenhum ponto em pressionar a questão. Ele me respondeu.
— Obrigada, — eu disse enquanto minha voz tremeu. Não foi o suficiente,
mas ele precisava de tempo, e eu gostaria de dar a ele.
A cerimônia estava acontecendo agora. O que aconteceria, se ele decidisse
que nunca poderia me amar mais que uma amiga, depois de tudo?
Você não tem que fazer isso se você não quer, você sabe.
Eu balancei a voz de James para sair da minha cabeça. Não agora. Não
quando eu estava prestes a fazer a única coisa mais importante que eu já fiz na
minha vida.
E não quando estávamos entrando na sala de cair o queixo que eu jamais
vi.
Ela colocava o salão de baile no Éden Manor em vergonha. Pilares de
pedra esculpida indo até o teto alto, que foi feito do mesmo quartzo que corria
pelo lado de fora da caverna, e iluminando cada centímetro do grande salão.
Janelas com pesadas cortinas em preto-e-ouro subiam muito acima da minha
cabeça, e um lustre magnífico pendurado no meio de tudo isso. Pelo menos agora
eu sabia por que o palácio era tão grande. Tinha que ser, a fim de abrigar uma
sala como esta.
O clique dos meus saltos ecoava com cada passo que eu dava em todo o
piso cintilante de mármore. Fileira após fileira de bancos enfrentava a frente,
como se Henry muitas vezes encarava uma multidão, e no final do corredor
solitário de pilares estavam dois tronos. Um deles era feito de diamante negro e
outro branco.
Esta era a sala do trono do Submundo.
Os outros membros do conselho se sentaram na primeira fila de bancos e,
felizmente, todos, exceto James, usavam roupas tão extravagantes como o vestido
que Henry tinha escolhido para mim. Pelo menos eu não teria de suportar o
embaraço de vestir demais em cima de todo o resto.
— Lembre-se de exalar, — disse Henry, seu hálito quente em meu ouvido,
e eu tremi. Ele estava certo, em algum lugar entre a entrada na sala do trono e
chegar ao final do corredor, eu tinha me esquecido de respirar.
Henry virou-nos ao redor de modo que enfrentávamos o conselho, e ele
balançou a cabeça uma vez em saudação. Eu fiz o mesmo e tentei me concentrar
em frente, certa de que se eu chamasse a atenção de alguém, meus nervos iriam
obter o melhor de mim, mas, eventualmente, eu tinha que olhar.
Minha mãe estava sentada no centro, de costas retas e os olhos brilhando,
enquanto observava. James sentou-se no final, e a maneira como ele estava
largado na cadeira, eu sabia que ele não queria estar lá. Eu não o culpava.
Todos pareciam pelo menos moderadamente interessados, mas antes que
eu pudesse absorver, Henry me encarou e estendeu as palmas das mãos para
cima. Eu hesitei, mas ele me deu um aceno encorajador, e eu tremendo coloquei
minhas mãos sobre a dele.
— Kate. — Ele falou em um tom de voz normal, mas reverberou pela sala,
Amplificada pelo poder de Henry ou a estrutura do salão ou ambos. — Como
minha esposa, você tem permissão para assumir as responsabilidades da rainha
do Submundo. Você deve governar de forma justa e sem preconceitos sobre as
almas dos que já partiram do mundo acima, e do equinócio de outono para a
primavera de cada ano, portanto, você deve dedicar-se à tarefa de orientar
aqueles que estão perdidos e proteger todos do dano além de suas vidas eternas.
— Eu não conseguia nem convencer Henry a não sair em missões suicidas. Como
é que eu ia ajudar a proteger cada alma neste lugar?
As mãos de Henry ficaram estranhamente quentes. Uma luz quente e
amarela brilhou entre as nossas, e eu mordi o interior da minha bochecha, mal
capaz de me impedir de se afastar. Levaria mais do que algumas horas para me
acostumar com esse tipo de show informal de poder.
— Você aceita o papel de rainha do Submundo, e você concorda em
manter as responsabilidades e expectativas de tal? — Disse Henry.
Eu hesitei. Isso não era por um ano ou cinco ou mesmo dez; isso era para
sempre. Eu ainda não tinha decidido no que eu queria me formar na faculdade, e
muito menos o que eu queria fazer com o resto da minha vida, mas aqui estava
Henry, dando-me uma escolha.
E por uma fração de segundo, seu olhar encontrou o meu, e eu vi o meu
Henry debaixo do deus distante na frente de mim. Seus olhos brilharam ao luar,
os cantos de seus lábios se contraíram para cima, para o mais fraco dos sorrisos
e parecia brilhar com o calor de dentro para fora. Ele estava olhando para mim
como se tivesse de volta no Éden, como se eu fosse a única pessoa no mundo, e
naquele momento, eu teria rasgado o céu e o inferno para ter certeza de que eu
nunca o perdesse.
Mas depois isso desapareceu de volta para dentro de si, por trás da
máscara que ele usava para proteger o lado dele que Persephone tinha rasgado
em pedaços, e a realidade caiu ao meu redor.
Não foi uma escolha real, não é? Tudo o que eu tinha feito desde que me
mudei para o Éden tinha sido liderado até este momento.
Henry não se casou comigo por amor, e eu sabia disso desde o início. Ele
se casou comigo porque eu tinha passado nos testes que ninguém mais tinha
passado, e porque o conselho havia me concedido a imortalidade. Eu era a única
menina que viveu tempo suficiente para tornar-se sua rainha. E se ele ficasse
assim para o resto da eternidade? E se tudo que eu sempre fui para ele era uma
amiga e uma parceira? A maneira como ele tinha estado no Éden, como ele falou
comigo até altas horas da manhã, como ele tinha me visto de uma maneira que
ninguém mais tinha, como ele arriscou sua própria existência para salvar a
minha e se eu nunca visse esse lado dele de novo?
Então, novamente, e se esta era a prova de que ele precisava de que eu
não ia deixá-lo? E se esse era o empurrão final para mostrar a ele que era seguro
se apaixonar por mim completamente?
Eu engoli. Eu já tomei minha decisão no momento em que me casei com
ele. Eu o amava, e ir embora e deixá-lo desaparecer não era uma opção, não
importava o que me custasse.
Eu poderia fazer isso. Eu tinha que fazer isso. Por Henry, por causa da
minha mãe. Por minha causa. Porque no final, sem Henry, eu não sabia quem eu
era mais, e todas as noites durante meu verão na Grécia, eu tinha ido dormir
sonhando como seria passar o resto da minha existência o amando e sendo
amada em troca. Enquanto eu lhe desse uma chance, isso poderia ser tudo o que
eu esperava que fosse. Henry valia a pena o risco.
Quando abri minha boca para dizer sim, um acidente quebrou o silêncio,
e as janelas altas explodiram, enviando pedaços de vidro voando diretamente
para nós.
04
OS TITÃS
Eu voei para o lado de Henry, com muito medo de tocá-lo, mas com muito
medo de me afastar, também. Desesperada, procurei em todos os três irmãos
qualquer sinal de que eles ainda estavam vivos, mas não vi nada. Nada de
ascensão e queda do peito, nada de balanço revelador de um pulso em seus
pescoços, exceto que aquelas eram formas mortais de julgar se alguém ainda
estava vivo. Henry e seus irmãos não eram mortais e nunca tinha sido.
E finalmente, finalmente eu vi os olhos de Henry se abrirem. Ao contrário
de Calliope, ele parecia concentrar-se diretamente sobre mim, mas se ele poderia
realmente me ver, eu não podia ter certeza. Ele não tinha me visto da primeira
vez. Então, novamente, ele tinha estado no meio de uma luta, também.
— Está tudo bem, — eu sussurrei enquanto eu tentava pegar sua mão,
mas meus dedos deslizaram através dele. — Tudo vai ficar bem. Vou me certificar
de que nada aconteça com você, eu prometo. — Ele suspirou inaudível e fechei os
olhos, e algo dentro de mim piscou. Ele tinha me ouvido, afinal? Estendi a mão
para acariciar seu rosto, parando uma fração de uma polegada acima de sua
pele. Pelo menos assim eu poderia fingir que estava tocando.
— Pai, — chamou Calliope atrás de mim, e eu me afastei do Henry para
vê-la. — Você está preparado para subjugar os outros?
Um estrondo baixo ecoou pela caverna, nenhuma língua que eu pudesse
entender, e as pedras menores no chão derraparam a poucos centímetros de
distância do portão.
— Perdoe-me, — disse Calliope, sarcasmo escorrendo de sua voz
açucarada. — Eu pensei que eu tinha acordado o ser mais poderoso do universo.
Foi mal.
No tempo que levou para piscar, um cacho de nevoeiro escorregou entre
as barras em sua direção. Calliope caiu para trás, e quase perdeu, embora eu
suspeitasse que não tinha nada a ver com a sua capacidade de se defender.
— Pare! — Ela gritou, em pânico, e satisfação surgiu através de mim. —
Você precisa de mim e você sabe disso. — O estrondo continuou, e Calliope ficou
de pé, todo e qualquer traço de dignidade se foi. — Você precisa, — disse ela, e a
incerteza em sua voz foi gloriosa. — Ninguém mais está tentando libertá-lo, e sem
mim, você vai estar preso para o resto da eternidade por essa porta estúpida.
Então você pode fazer as coisas do meu jeito, ou você pode ficar onde está. Não
importa para mim.
Claro que importava para ela, e Cronus devia saber bem, porque seus
murmúrios soavam suspeitos como o riso. Outra mecha do nevoeiro rastejou
para Calliope até que ele tinha apenas alguns centímetros de distância de sua
pele lisa. Tremendo, ela manteve sua posição quando Cronus acariciou sua
bochecha.
Tão rapidamente como ele apareceu, o nevoeiro desapareceu. Calliope
empalideceu, e por um momento eu quase me senti mal por ela. Então me
lembrei de Henry e seus irmãos presos em uma caverna a poucos metros de
distância, e qualquer gota de simpatia que eu já tive por ela evaporou.
A língua quente de Pogo contra meu ouvido me trouxe de volta à
realidade. As pedras desapareceram, substituídas pelas paredes vermelhas do
quarto, e meu estômago virou do avesso, quando o impacto total da minha visão
me atingiu.
— Mãe! — Eu gritei, chutando meus cobertores e rolando para fora da
cama. Eu aterrissei com um baque em minhas mãos e joelhos, e cada centímetro
do meu corpo gritou em protesto, mas eu me forcei a ficar de pé. Pogo correu
atrás de mim, suas orelhas alertas, e cada passo sentia como facas enquanto eu
corria para a porta, quase tropeçando na barra do meu vestido prateado.
Eu estava a meio caminho da sala do trono quando dobrei a esquina e
bati nela, e pela segunda vez em outros tantos minutos, eu esparramei no chão.
— Kate? — Minha mãe se ajoelhou ao meu lado, com as mãos pairando
como se ela não tivesse certeza se era seguro me tocar.
— Eu estou bem, — eu ofeguei. — Mãe, Henry e os outros... Calliope, ela
os tem, e Cronus...
— E ele o que? — Minha mãe empalideceu. — Você viu alguma coisa?
Eu balancei a cabeça. Tudo o que ela me disse sobre os Titãs passaram
por minha mente, deixando-me tonta. — Calliope os tem, e eu acho que... —
Minha voz ficou presa na minha garganta, e não importava quão duro eu pisquei,
eu não conseguia parar os meus olhos de encher de água.
Era realmente isso. Eles não poderiam derrotar Calliope e Cronus por
conta própria, e era só uma questão de tempo antes de Calliope matar Henry. Era
um milagre que ele ainda estava vivo em primeiro lugar.
Em voz baixa e frenética, eu retransmiti os detalhes da minha visão,
minhas palavras tropeçando e atando em conjunto, tornando muito mais difícil
para falar. — Mãe, — eu finalmente disse em voz baixa, desesperada para ela
fazer algo para consertar isso. Quando eu era uma criança, eu tinha certeza que
ela poderia fazer o impossível. Agora eu tinha certeza que podia, mas em algum
lugar profundo de mim, em uma parte que eu não queria admitir que existia, eu
sabia que não havia nada que ela pudesse fazer para que essa bagunça fosse
embora. — Ela vai deixar Cronus matá-los. — Seu rosto tornou-se duro, e por um
terrível momento eu vi o poder por trás dos olhos amáveis e bochechas rosadas
de minha mãe.
— Sofia, — ela chamou em uma voz que me sacudiu de dentro para fora.
Sofia estava ao seu lado em um segundo, e como minha mãe, qualquer
traço de bondade foi embora quando ondas de energia irradiaram de ambas. Por
conta própria, minha mãe era uma força da natureza. Com Sofia de pé ao lado
dela, eu tinha certeza de que poderia rasgar o mundo em pedaços.
— Venha, irmã, — disse minha mãe. Ela olhou para mim, e por um
momento uma gota de humanidade retornou ao seu rosto. — Cuide-se, meu
amor, — disse ela, tocando minha bochecha. Eu tremia. — E coloque um suéter.
Eu vou voltar para você assim que eu puder.
Com isso, ela e Sofia deram as mãos e, como Henry e seus irmãos saíram
em disparada para o vasto Submundo, assim como minha mãe e sua irmã, as
únicas duas sobrando que sabiam como derrotar Cronus.
Sentindo-me oca e mais sozinha do que eu já tinha antes, eu pressionei
meus lábios e me arrastei para o meu quarto para me trocar, querendo saber
quanto da minha família eu iria perder antes que tudo fosse dito e feito.
A sala do trono parecia vazia sem Henry e o resto de seus irmãos. O que
restou do conselho sentava em círculo ao lado da plataforma, as cadeiras
recolhidas de todo o palácio. Eu estava sentada num banco duro que me lembrou
do que eu tinha sofrido há seis meses, quando o conselho tinha feito sua decisão
sobre se eu gostaria de me tornar um deles. Pelo menos esse tinha sido afofado.
Ninguém tocou nos dois tronos. Um era para ser meu, mas a cerimônia
não tinha terminado, e mesmo se tivesse, eu não queria estar lá sem Henry. Eu
não estava pronta para governar sozinha, eu não tinha certeza se eu estava
pronta para governar ao seu lado. Com ele e os outros que se foram, eu não
queria pensar sobre o que iria fazer com a ordem natural das coisas ao redor do
Submundo. As almas ficariam presas no limbo até que Henry voltasse? E se ele
nunca voltasse?
Não. Eu não ia pensar assim. Tinha que haver uma maneira para que isso
funcionasse, Calliope queria mais do que vingança.
Uma sensação ruim se apoderou de mim. Ela queria algo mais do que a
vingança. Ela queria Henry e ela me queria morta.
Isso não era uma opção ainda. Mesmo se eu marchasse até ela e lhe
oferecesse o meu pescoço, não havia garantia de que iria acabar as coisas.
Cronus era mais poderoso do que eu poderia imaginar, e na minha visão ficou
claro que não importava quanto no controle Calliope fingia estar, ela não estava.
Ela não era a pessoa que iria decidir quando isto acabava.
— O que vamos fazer agora?
Minha voz ecoou no silêncio morto da sala do trono.
Tinha passado quase dez minutos e ninguém disse uma palavra, e eu não
podia mais ficar sentada lá enquanto Henry e minha mãe estavam em perigo.
— O que você quer dizer? — Disse Ella, que compartilhava uma poltrona
larga com Theo. Os dois estavam enrolados juntos como se fosse a coisa mais
natural do mundo, e eu os invejava. Eles ainda tinham um ao outro.
— Quero dizer, como é que vamos ajudá-los? — Disse. — Se a mamãe e
Sofia não puderem libertá-los, se elas... — Se elas forem capturadas também. —
O que devemos fazer?
Ella e Theo trocaram olhares, e ao lado deles, Irene suspirou. — Não há
como os ajudar, não quando Cronus e Calliope se ajudam.
Eu pisquei. Era isso? — Tem que ter algo que podemos fazer. — Eu olhei
ao redor do círculo de apoio, mas ninguém encontrou meu olhar. Nem mesmo
James. — Nós não podemos deixá-los lá. Como isso é uma opção?
— Porque qualquer outra coisa seria suicídio, — disse Dylan com um
sorriso de escárnio. — Enquanto você estava recebendo o seu sono de beleza, o
resto de nós passou sobre cada plano viável. Com Diana e Sofia, nossas opções
eram limitadas. Sem elas, não temos escolha a não ser esperar até Calliope fazer
seu próximo passo. Não podemos encará-la de frente, se você quer que haja
qualquer um de nós sobrando para lutar com Cronus quando ele descobrir uma
maneira de escapar. — Quando, não se.
— Tem que ter algo que possamos fazer.
— Elas sabiam que esta era uma possibilidade, — disse Irene. — Elas
sabiam que os nossos poderes são limitados neste reino, e elas tomaram essa
risco e nos deixaram de qualquer maneira.
A nota de dor em sua voz me surpreendeu. Será que eles pensavam que
minha mãe e Sofia os haviam abandonado?
— Além disso, — acrescentou o Theo, — ainda há uma chance de que elas
vão ter sucesso.
— E se elas não tiverem? — Eu disse. Por mais que eu queria agarrar a
esperança de que a minha mãe iria voltar com segurança, sem o resto da
intervenção do conselho, se três dos seis não poderiam suportar Calliope e
Cronus, eu não vejo como é possível que apenas duas iriam.
— Então é só uma questão de tempo antes que Cronus escape, — disse
Dylan. — Uma vez que ele consiga, ele vai destruir o mundo, destruir a
humanidade, e se tivermos sorte, nos matar rapidamente. — A temperatura na
sala do trono pareceu cair 20 graus.
— E nenhum de vocês está disposto a fazer qualquer coisa sobre isso? —
Eu disse, atordoada. — Vocês vão sentar e deixar que isso aconteça, mesmo que
ele vá matá-los de qualquer maneira?
— Não, — disse Ella bruscamente, e ela olhou para Dylan. — Se ficarmos
de fora, ele pode nos deixar em paz.
— Então você prefere perder a única esperança que você tem de derrotar
Cronus e salvar bilhões de vidas, desde que haja uma chance de que vocês serão
autorizados a viver? — Eu disse. — Isso é uma piada? — Ninguém respondeu. É
claro que não era uma piada. Estavam todos sérios, e eu não sabia o que dizer
sobre isso. Estas não eram as pessoas que eu encontrei e comecei a conhecer no
Éden.
Eles eram covardes, e a ideia de que os seres mais poderosos do planeta
poderiam deixar a humanidade morrer não faz sentido. Eles deveriam protegê-los,
não sentar e deixar Cronus matar todos.
Eu apertei minhas mãos em punhos. — Vocês me testaram por seis meses
para ter certeza de que eu era boa o suficiente para ser uma de vocês, moral e
forte o suficiente e altruísta o suficiente. E agora vocês não podem se quer ajudar
a salvar sua própria família? — Uma pequena parte de mim entendeu que deve
ter sido aterrorizante enfrentar a morte quando eles viveram por eras, achando
que nunca fariam isso. Ou, no mínimo, quando desaparecessem, seria pacífico e
sem qualquer dor. A morte era parte do ser humano, e eu não tinha esquecido o
que parecia ainda. Eles nunca tiveram a oportunidade de aprender. Mas isso não
era uma desculpa.
— Só porque você tinha que ser boa o suficiente para ser uma de nós não
significa que o resto de nós é. — Ava encarou Dylan, também, e ele pareceu
encolher-se sob a intensidade do mesmo. — Nós nunca fomos exatamente
íntegros, você sabe. Nós somos apenas bons em atuar “mais santo que tu”,
quando atende às nossas necessidades. E alguns de nós são atores melhores do
que os outros.
Eu estava de pé, e o grito de meu banco contra o piso me deu arrepios. —
Eu não me importo com o que vocês fazem. Vou encontrá-los. Vocês podem ficar
aqui e se sentar em seus traseiros durante todo o dia, ou vocês podem ajudar.
Não importa para mim. Mas eu prefiro ser rasgada em pedaços do que viver com
a culpa de saber que eu poderia ter feito algo e não fiz. — Eu não queria morrer, e
em um mundo perfeito, ninguém quer. Este não era um mundo perfeito, porém, e
eles não eram seres perfeitos. Eu não estava exatamente fazendo o mais
inteligente também, fugindo sem um plano ou uma vaga ideia de qual direção ir,
mas era melhor do que estar sentada e me deixar louca esperando por algo que
nunca poderia acontecer.
Virei em meus calcanhares e comecei a descer o corredor, ignorando a dor
na perna. Levei três passos, mas o som da voz de Irene ecoou pelo corredor.
— Espere.
Eu parei e enfrentei-os novamente, os braços cruzados com força.
— Eu não vou deixar que qualquer um de vocês me convença a desistir.
Eu não quero morrer, e eu não quero que nenhum de vocês também, mas
ficarmos sentados aqui esperando por Cronus nos transformar em churrasco não
vai fazer nada para evitar isso.
— Nós não íamos pará-la, — disse Dylan, e Ava lhe lançou um olhar. Seus
olhos se estreitaram, e ele endireitou os ombros, mas pelo menos ele não disse
mais nada.
Irene limpou a garganta. — O que meu querido irmão quis dizer é que,
enquanto somos ineficazes no Submundo, há coisas que podemos fazer na
superfície.
— Como o quê? — Eu disse cautelosamente, querendo saber se incluía
lutar por um lugar para se esconder.
— Criar uma armadilha, — disse Nicholas, o loiro grande que tinha agido
como meu guarda-costas, no Éden. Ele raramente falava, e eu tive que olhar ao
redor do círculo antes que eu percebi quem estava falando. — Há apenas tantas
saídas que Cronus pode usar se Henry... — Ele fez uma pausa, e eu sabia o que
ele queria dizer.
Se Henry não sobreviver. — Se Henry não for capaz de mantê-lo no
Submundo, — ele emendou. — Ele pode dar uma dica no início e nos mostrar o
caminho que ele pretende tomar. Poderíamos criar uma armadilha para ele, algo
para segurá-lo até que tenhamos um plano.
— Ele vai ter que abrir o portão primeiro se ele quiser alcançar a
superfície, — disse Dylan. — Eu não vejo isso acontecendo tão cedo.
Olhei para James para uma explicação, mas ele estava muito ocupado
olhando para suas mãos. — O que você quer dizer? — Eu disse. — Ele já não
passou?
Os outros deuses olharam para mim como se eu tivesse perguntado por
que um mais um é igual a dois, e minhas bochechas queimaram sob seus
olhares.
— Cronus ainda está atrás do portão, — disse Irene. — Quando ele está
acordado, ele pode alcançar os cantos do Submundo que a maioria de nós nem
sequer sabe que existem. É por isso que os outros o mantiveram dormindo esse
tempo todo. Mas o que você viu anteriormente era apenas uma parte muito
pequena dele, e se ele escapar totalmente, o dano seria catastrófico.
Todo o sangue drenou do meu rosto. — Isso era apenas uma parte?
— Como um dedinho, — disse Dylan, balançando seu dedo para ênfase. —
Você entende agora, por que nenhum de nós quer brigar com ele?
Eu entendi, e minha boca ficou seca. — Isso não muda nada.
— Não, não muda, — disse Irene. — Vamos trabalhar todos juntos para
criar uma armadilha assim que descobrirmos o ponto de saída mais próximo
possível.
— Você pode, — disse Dylan com uma carranca. — Eu não quero ter nada
a ver com isso. Eu adoro uma boa briga, mas isto é um abate.
— Oh, você vai ajudar, — disse Irene. — Mesmo se eu tiver que arrastá-lo
para lá pelas orelhas.
— E como você acha que você vai conseguir isso? — Disse Dylan.
Os olhos dela brilharam. — Você realmente quer descobrir? — Sua
expressão endureceu, e eu praticamente podia ver a fumaça saindo de suas
orelhas.
— Qualquer que seja. Pelo menos não é tão estúpido como vagar sem
rumo no Submundo.
— Sim, eu sei que é estúpido, obrigada, — eu respondi. — Eu ainda vou
tentar, e você agindo como um idiota não vai me impedir.
Eu me dirigi à saída novamente, e desta vez ninguém falou. O mais longe
que eu fiquei deles, mais tonta eu ficava. Eu poderia nunca ver qualquer um
deles novamente.
Até o momento que eu encontrasse a prisão de Cronus, poderia ser tarde
demais, e isso era se eu achasse para começar. Todo mundo que eu conhecia
poderia morrer, e eu poderia passar a eternidade vagando pelo Submundo em
busca de algo que não existia mais.
Assim que eu passei para a antecâmara, afundei no banco e coloquei a
cabeça entre os joelhos. Isso não poderia estar acontecendo. O mundo ia acabar,
a menos que alguém descobrisse um milagre, e não ia ser eu.
Dylan estava certo, eu não tinha certeza de onde eu estava indo, e muito
menos o que eu ia fazer quando eu chegasse lá. Mas quais eram as minhas
outras opções? Ficar com os membros restantes do conselho e esperar para ser
morta? Eu seria a inútil definição de uma armadilha. Eu não poderia mesmo
controlar minhas visões, muito menos qualquer poder que eu possa ter.
Eu não podia fazer nada e deixar todos os outros lidarem com a batalha.
Talvez não fosse inteiramente minha culpa, mas eu certamente ajudei a empurrar
Calliope passando seu ponto de ruptura, e eu não tinha o hábito de deixar os
outros limparem minha bagunça enquanto eu estava ao redor e observava. Nós
não tínhamos nenhuma oração para vencer sem os seis irmãos, e já que ninguém
mais estava indo atrás deles, isso me deixou.
Será que isso teria acontecido se eu tivesse mostrado a Calliope um pouco
mais de compaixão, se eu não tivesse a impedido de ver Henry pelo resto de sua
existência? Será que ela ainda teria feito isso?
Perguntar-me era inútil. Se uma das outras garotas tivesse conseguido,
Calliope teria feito a mesma coisa.
Não havia nada que eu poderia ter feito para fazer Calliope gostar de mim,
não quando ela me odiava desde o início.
Qualquer que seja o papel que interpretei em empurrá-la sobre a borda,
foi ela quem tomou a decisão de fazer isso.
Mesmo que eu soubesse disso, eu não podia evitar, mas me senti culpada.
Ouvi passos se aproximando da sala, e um momento depois, a porta abriu
e fechou. Eu não olhei para cima. Se fosse James vindo para me dizer que eu
estava cometendo um erro, ou Ava insistindo que eu não poderia dar a minha
vida para isso, eu não me importava.
Eu estava fazendo isso se eles gostassem ou não.
Alguém se sentou ao meu lado, e a mão suave em minhas costas era
inconfundivelmente de Ava. — Você está bem? — Disse ela suavemente, e eu me
endireitei, mantendo meus olhos bem fechados em uma tentativa de manter a
cabeça leve na baía.
— Sim, eu estou ótima, — eu murmurei. Sua mão parou, e eu suspirei. —
Sinto muito, é só...
— É apenas que você aprendeu que há uma boa chance de que o mundo
vai acabar, e você precisa de um momento para pensar, — disse Ava, e eu
assenti. Ela parecia estar tomando melhor agora, mas ela esteve com o conselho
antes que eu houvesse estado lá e teve mais tempo para absorver.
— O que teria acontecido se as coisas tivessem sido diferentes? — Eu
disse. — Se eu não tivesse passado no teste...
— Ela ainda teria feito isso.
Abri os olhos. James inclinou-se contra a parede, as mãos enfiadas nos
bolsos e seu cabelo uma bagunça. Foi um peso retirado dos meus ombros ouvi-lo
expressando os mesmos pensamentos que eu estava tentando me convencer que
eram verdade, e eu dei-lhe um pequeno sorriso.
Ele não sorriu de volta. — Calliope está planejando isso há muito tempo, e
uma vez que ela acordou Cronus, nada iria impedi-la. Ela quer você morta. Ela
quer todos mortos. Ela parou de pensar racionalmente muito antes de você
nascer, e nenhuma quantidade de culpar vai mudar isso. — Meu coração se
afundou. Então era isso, eventualmente, eu teria que entregar-me até ela,
independentemente de como isso acabasse. Se o conselho estava certo, se
Calliope e Cronus eram realmente imparáveis, se fôssemos todos morrer de
qualquer jeito.
Eu não queria. Cada fibra do meu ser lutou contra, e eu me senti tonta
tudo de novo, sabendo o que ela faria para mim. Mas e se essa era a única
solução? E se essa era a única maneira de convencer Calliope para ajudar a
dominar Cronus novamente? Se ela realmente lutasse com os outros na guerra
contra os Titãs, então a parte dela que se importava o suficiente para arriscar sua
própria existência pela humanidade tinha que estar em algum lugar. E não
importava quão chateada e humilhada que ela estava, talvez com a minha cabeça
em uma bandeja seria suficiente para ela mudar de ideia.
Último recurso, eu pensei. Apenas como um último recurso.
Se viesse para isso e dando a minha própria vida significava que este
pesadelo poderia acabar, eu queria ser egoísta e viver, mas eu não poderia ficar
para trás e ver todo mundo ser abatido por minha causa. Eu não tinha certeza de
qual opção era mais egoísta, mas quando se poderia estar ao meu alcance acabar
com isso, eu não iria ignorar, tanto quanto eu queria esquecer que era mesmo
uma possibilidade.
De qualquer forma, eu tinha que encontrá-la primeiro. — Como faço para
chegar lá? — Eu disse. — Para o lugar onde Calliope e Cronus estão. Eu sei que
vocês não querem que eu vá, mas...
— Você iria mesmo se eu não lhe dissesse, — disse James. — Eu não sei
onde é, honestamente. Ninguém sabe. Os deuses mais velhos podem encontrá-lo,
mas tiveram a certeza que eu não podia, e a localização foi mantida em segredo
dos outros por razões óbvias. A única pessoa que sabia onde ele estava... — Ele
parou.
— Quem? — Eu disse. — Por favor, James, eu não me importo com o que
eu tenho que fazer. Vou passear pelo Submundo inteiro, se é isso que é preciso.
— Eu sei que você vai, — disse ele com um sorriso apertado. — Isso é o
que eu amo sobre você. Mas, Kate, você tem que entender...
— O que eu entendo é que, se alguém não tentar impedi-los, Calliope e
Cronus vão rasgar o mundo, e todo mundo vai morrer, — eu disse. — Eu não me
importo com o que eu tenho que fazer. Eu vou fazer.
James suspirou. — A única pessoa que sabe onde está o portão... — Ele
fez uma pausa. — É Persephone.
06
LAGO DE FOGO
Fora de todas as coisas que eu tinha imaginado que poderia dar errado
com essa jornada através do Submundo, Cronus tentando nos parar nunca
passou pela minha cabeça.
Eu tentei trabalhar o meu caminho em torno de Persephone se recusando
a vir. Eu pensei o que fazer se não pudéssemos encontrar a caverna. E mesmo
que em algum lugar dentro de mim, eu sabia que não havia outras opções, eu
estava tentando como o inferno chegar a algo melhor do que me sacrificar.
Nunca, nenhuma vez, eu pensei que Calliope iria descobrir que estávamos
chegando e enviaria Cronus para nos parar.
Estúpida, estúpida, estúpida.
Não que houvesse muito que poderíamos ter planejado além de correr
para as montanhas, o que era exatamente o que fazíamos.
James agarrou a minha mão e nós corremos por entre as árvores, e Ava se
arrastou atrás de nós. Entre os dois, eles pareciam ter energia suficiente para
manter uma distância segura longe de Cronus.
Isso não impediu que as árvores caíssem, porém, e mais de uma vez
James me empurrou de lado uma fração de segundo antes de eu ver um carvalho
ou um bordo infundido com a mesma neblina que havia cortado minha perna.
Eu não sabia quanto tempo corremos, mas foi tempo suficiente para que
meus pulmões sentissem como se estivessem em chamas. As árvores nos deu
abrigo, mas cada vez que olhava por cima do meu ombro, Cronus parecia estar se
aproximando.
Nós não poderíamos correr para sempre, e eu tinha certeza de que James
e Ava não seriam capazes de segurá-lo tempo suficiente para chegarmos a
Persephone, também. E quando chegássemos a Persephone...
De que ajuda ela seria contra um Titã?
A floresta que nos cercava dissolveu em um deserto, e as opções de tudo o
que tínhamos antes desapareceu. Nós não poderíamos correr para sempre, James
e Ava não poderiam brigar para sempre, e Cronus claramente só queria uma
coisa.
Eu.
Toda árvore que não tinha quase batido em James ou Ava, quase me
acertaram. A primeira tinha aterrado bem onde eu estava sentada momentos
antes. E antes que Henry e seus irmãos tivessem ido após Cronus, o nevoeiro
tinha deslizado através de suas defesas e me escolhido como seu alvo.
A areia quente era difícil para correr, e o céu brilhou ao sol. Eu já estava
esgotada. Se minha perna cedesse e eu tropeçasse, Cronus iria me matar. A
única vantagem que eu tinha era fazer algo que ele não esperava.
Cavei meus calcanhares na areia e puxei minha mão das mãos de James.
Ele caiu de joelhos, perdendo o equilíbrio por não puxar-me atrás dele, e eu mexi
longe dele tão rápido quanto eu podia.
— Cronus! — Eu gritei quando eu endireitei no lado de uma duna a seis
metros de distância de onde James havia caído. Ava estava ao seu lado,
ajudando-o a se levantar, e ambos me olharam como se eu fosse uma lunática.
Talvez eu fosse. Talvez eu estivesse prestes a morrer. Mas se eu não
fizesse algo, estaríamos todos mortos, e valia a pena tentar.
Nós não poderíamos correr mais que um Titã.
A névoa ficou espessa quando diminuiu a velocidade e parecia se juntar.
Apertando os olhos na luz do sol, eu pensei que eu podia ver o contorno de um
rosto, mas o calor que irradiava da areia fez minha visão distorcida demais para
eu ter certeza.
— Você sabe quem eu sou, — eu disse, tentando parecer segura de mim
mesma, em vez de aterrorizada fora da minha mente. — E eu sei quem você é,
então vamos direto ao assunto. Você não pode me matar... ou qualquer um de
nós.
Isso foi uma mentira descarada, mas pelo menos ele pareceu fazer uma
pausa para considerar isso. O mesmo estranho estrondo que eu ouvi na minha
visão ecoou pelo deserto, e eu me tornei muito consciente do fato de que nós
estávamos em uma caverna vasta, não debaixo de um céu infinito. Se eu pudesse
voar, minha mão teria, eventualmente, tocado a pedra.
— Você precisa de nós. — Minhas palavras eram tão parecidas com as de
Calliope, que eu quase as tomei de volta, mas era a única maneira que Cronus
não ia matar-nos para se divertir. Calliope me queria morta, e ele precisava de
Calliope para abrir o portão. Mas...
Ela não sabia como.
Uma onda de confiança correu através de mim. — Calliope não sabe como
abrir o portão. Eu sei. — Poderia Cronus descobrir uma verdade a partir de uma
mentira como Henry? O nevoeiro avançou para perto de mim até que ele estava a
apenas uma respiração de distância.
Em vez de atacar, me cercou até que o calor do sol foi embora e eu não
podia mais ver o céu azul.
Eu me senti tonta, mas eu quis que meus pés permanecessem plantados
na areia. Tocá-lo, sem dúvida, significava dor lacerante, e eu não aguentava mais
do mesmo, não quando havia um longo caminho a percorrer antes de encontrar
Persephone. Eu tinha que fazer isso. Era a minha única chance. Única chance do
conselho.
— Se você deixar eu e meus amigos irmos, nós iremos até você, — eu
disse, cavando profundamente dentro de mim para achar toda a coragem que me
restava. — Quando chegarmos lá, deixe que os outros vão. Eles não podem
derrotá-lo sem Calliope de qualquer maneira. Uma vez feito isso, eu vou abrir o
portão, e você vai estar livre.
Silêncio. Sem murmuro, nem risos, nada. Nevoeiro sussurrou em meu
cabelo, e eu apertei meus olhos fechados. Eu só tinha espaço suficiente para
respirar.
— Se você me matar agora, a única pessoa que pode fazer isso é o Henry,
— eu disse, minha voz embargada. — Ele prefere destruir a si mesmo do que
libertar você. Eu sei que Calliope quer me matar, mas ela está te usando. Eu
tenho o que ela quer, e uma vez que ela não pode me matar, ela está fazendo você
fazer isso por ela, em troca de uma promessa que ela não pode cumprir. Ela não
tem ideia de como abri-lo. Ela não pode, ela não governa o Submundo. Uma vez
que eu estou morta, ela vai deixá-lo trancado na jaula, e os outros deuses
dominarão você novamente. Deixe eu e a minha família viver, e eu juro que eu
vou libertá-lo quando chegar na caverna. — Fiz uma pausa e engoli em seco. —
Eu sou sua melhor chance e você sabe disso. — Quando o espesso nevoeiro me
envolveu completamente, tudo que eu podia imaginar era Henry deitado em uma
pilha quebrado e ensanguentado na caverna enquanto Calliope ria aquele grito
feminino dela. E minha mãe era, sem dúvida, uma prisioneira agora, também. Eu
ia perder tudo se isso não funcionasse.
— Eu sei o que é estar sozinho, — eu sussurrei. — Não por... por tanto
tempo que você tem, mas eu sei o que é perder tudo o que amo. E a maneira
como os deuses te entregaram não é justo. Você foi nada, exceto bom para eles.
Você deu a eles tudo o que poderiam sonhar, e, em troca, eles te prenderam por
toda a eternidade. Não é justo. Você tem o direito de ser livre.
Isso me assustou, o quão facilmente as palavras escaparam, como se eu
realmente acreditasse nelas. Talvez parte de mim secretamente acreditava. Não
que Cronus merecia liberdade, mas eu entendia o que ele passou, de certa forma.
Eu estava com tanto medo de estar sozinha que eu tinha dado a metade do resto
da minha vida na esperança de que eu não teria que estar.
— Deixe-me ajudá-lo. — Meu coração batia forte quando o ar começou a
afinar. — Por favor. Eu quero. E talvez, talvez podemos ajudar um ao outro.
O ar virou frio quando todo o calor do deserto desapareceu, e eu tremi. Eu
mal me movi, mas foi o suficiente, o nevoeiro tocou minha pele nua, frio e sedoso
e muito mais sólido do que eu esperava. Como penas, talvez, ou neve.
Não doeu.
Em vez disso, como ele fez para Calliope, ele acariciou minha bochecha, e
através desse único toque, senti o poder além da imaginação. Não era nada como
a força que Henry e os outros tinham usado para perseguir Cronus. Era
imensurável, como se o universo inteiro fosse comprimido em um fio solitário de
neblina. Finalmente entendi porque todos tinham medo dele.
Seu toque durou meio segundo, e ele se foi antes que eu pudesse abrir os
olhos. Minha mente girava enquanto eu tentava compreender o que havia
acontecido, e apesar do sol mais uma vez bater em mim, minha pele parecia gelo.
Desabei em minhas mãos e joelhos, a areia grossa raspando minhas mãos, mas
isso não importava.
Ele me poupou.
James e Ava estavam ao meu lado em um instante. Areia voou em todos
os lugares quando Ava caiu de joelhos, e James pairava sobre mim, suas mãos
um centímetro acima das minhas costas, como se ele achasse que um toque me
faria desintegrar em cinzas.
— Você está viva? — Disse Ava com os olhos arregalados, como se ela não
estivesse disposta a acreditar. Ela pegou minha mão e segurou-a como se ela
fosse a única coisa que me ancorava a este lugar. Eu não estava tão certa de que
ela estava errada.
— O que aconteceu? — Disse James, urgência e preocupação combatendo
em sua voz. Eu tremulamente me abaixei de joelhos, mas eu não conseguia olhar
para ele. Eu não conseguia olhar para nenhum dos dois. Eu menti para Cronus e
roubei qualquer chance que James e Ava tinham de sair de lá vivos. Eu não tinha
ideia de como abrir o portão, e quando eu admitisse a verdade...
Não iria chegar a isso, pensei firmemente para mim mesma, ou pelo
menos tão firmemente quanto consegui quando meu cérebro parecia geleia. Eu
comprei-nos tempo. Qualquer coisa poderia acontecer antes de chegarmos ao
portão, se chegássemos. Nesse meio tempo, eu tinha um pouco mais de tempo
para chegar a um plano.
— Água, — eu disse, minha boca seca como o deserto em torno de nós.
Meus lábios estavam rachados, e meus músculos gritavam em protesto
toda vez que me mexia, mas eu estava viva.
Eu tremia como se eu não tivesse sentido o calor em anos e, juntos,
James e Ava me levantaram e me ajudaram em direção a um pequeno oásis.
Parecia uma imagem tão perfeita que se eu não soubesse que essa era a ideia de
alguém em um deserto em vez da coisa real, eu teria imaginado que era uma
miragem.
Nós cobrimos a distância mais rápido do que eu esperava, ou talvez o
tempo estivesse se movendo rapidamente para mim agora que eu sabia que não
tinha mais uma chance de sair dessa caverna viva.
O melhor que eu podia esperar era que os outros iriam sair antes de
Cronus ter a chance de atacar.
Eles me colocaram debaixo de um bosque de palmeiras, e encostei-me
contra uma e fechei os olhos. Eu odiava ser fraca em comparação com eles. Eles
lutaram com Cronus com apenas uma reclamação, e eu não conseguia nem falar
com ele sem me sentir esgotada.
— Diga-nos o que aconteceu, — disse James. Ele abriu um coco,
espirrando água por toda a sua camisa, mas ele não parecia se importar. Ele
mergulhou uma das metades para a piscina de água e ofereceu para mim, e as
minhas mãos tremiam quando eu peguei.
Eu bebi profundamente. A água deliciosamente fresca se espalhava
através de mim, e uma vez que eu terminei minha segunda dose, sentei-me e fiz o
inventário dos meus ferimentos. Minha perna latejava e eu estava tonta, mas
Cronus não me machucou de novo. Corri meus dedos pelo meu cabelo em uma
tentativa de penteá-lo, mas era muito de uma bagunça suada para incomodar,
então eu procurei em meu bolso por um laço de cabelo para puxá-lo para tras.
Em vez de elástico, meus dedos roçaram contra algo que parecia seda.
Não, não era seda. Uma pétala de flor. Assustada, eu puxei e segurei a flor
amarela esmagada na minha mão. Era pequena, com sete pétalas pontiagudas
que pareciam que as extremidades tinham sido mergulhadas em roxo, e,
lentamente, começou a desenrolar.
Eu nunca tinha visto nada parecido, muito menos pegado e colocado no
bolso. E estava viva, não estava morta ou esmagada como eu pensei que estava.
Em segundos, ela estava inteira e aberta, e do centro parecia uma gota brilhante
de néctar. Não poderia ter vindo a partir da superfície.
De uma das pós vida que nós passamos? Tinha que ser. Mas eu enfiei as
mãos nos bolsos na floresta antes de Cronus ter nos perseguido, e não estava lá,
então.
Eu simplesmente não havia percebido isso? Essa foi a única explicação.
Ou talvez eu estivesse atordoada demais para pensar direito.
Colocando-a de volta para a segurança do meu bolso ao lado da flor de
quartzo e pérola de Henry, o meu cabelo penteado com meus dedos e disse com
voz trêmula: — O que vocês dois... o que vocês viram?
Sem palavras Ava me ofereceu um laço de cabelo, e eu peguei. Era rosa
brilhante. — Nós vimos Cronus comer você.
— Você estava envolvida, — disse James, e ele hesitou. — Nós pensamos
que você tinha ido embora.
Olhei para a piscina clara. Meu reflexo olhou para mim, e eu me abaixei
para espirrar um pouco de água no meu rosto sujo. Eu era uma bagunça. — Eu
também, — eu murmurei enquanto eu esfregava a sujeira.
— Então por que ele não a matou? — Disse Ava. Ela segurava um coco na
mão, e um segundo depois, um canudo rosa neon enrolado apareceu de dentro
dele. Ela tomou um gole, e eu pude ver a água passar através dos redemoinhos.
Eu não respondi imediatamente. Eu tinha que dizer a verdade, mas eles
não eram estúpidos. Eles iriam ver o que eu pretendia fazer, e se James e Ava
pensavam que era tanto como considerar me sacrificar, eles me marchariam de
volta para o palácio.
Eu precisava de James para achar Persephone, e ele só me mostraria
como chegar lá se ele achasse que estaria me mostrando o caminho de casa,
também. Isso deixava apenas uma opção.
Evitar toda a verdade.
— Porque eu lhe disse que iria abrir o portão, se ele não nos prejudicasse
— disse eu.
James acalmou, e Ava deixou cair o coco. — Você fez o que? — Ela gritou.
— Você está louca? Você tem alguma ideia do que isso significa? Quando você
não libertá-lo, ele vai te matar. Você sabe disso, né?
Eu balancei a cabeça atordoada. — Então eu acho que isso significa que
temos uma quantidade limitada de tempo para chegar a outro plano.
Ava soltou uma série de palavrões e ficou de pé, passeando ao redor da
piscina. — Nós não podemos deixá-lo sair. Mesmo que ele mate todos nós, vai ser
melhor do que o que ele vai fazer no minuto em que sair para o mundo. Você
sabe disso, Kate.
— É claro que eu sei disso, — eu atirei. — Mas o que mais eu poderia
fazer? Ele iria matar todos nós, e todo mundo está muito ocupado tendo medo de
vir atrás de nós se alguma coisa der errado.
— Você deveria ter feito algo mais. Qualquer outra coisa. — O rosto de Ava
ficou vermelha, e ela fechou as mãos em punhos.
Eu nunca tinha a visto tão zangada antes. — Você não entende... não
podemos deixá-lo sair. Nós não podemos.
— Então, não vamos, — disse James. Ele gesticulou para Ava voltar a
sentar, e ela ficou lá por um momento, como se o desafiando a fazê-la, mas
finalmente seus ombros caíram e ela cedeu. — Você fez bem, Kate. Você
comprou-nos tempo. — Pelo menos James entendia.
— Eu sinto muito, — eu disse a Ava quando eu puxava as mangas. — Eu
não sabia mais o que fazer.
— Está tudo bem, — ela murmurou, e ela pegou o coco novamente para
tirar um gole saudável. — Não é como se tivéssemos um plano melhor.
— Nós temos um plano melhor, — disse James. — Encontrar Persephone
e descobrir de lá. Se alguém puder ajudar, é ela.
Ava fez uma careta, aparentemente tão feliz com o pensamento do destino
do universo descansando nas mãos de Persephone como eu estava. — Pelo menos
não temos que nos preocupar com Cronus, até chegarmos lá, eu acho.
— Exatamente. E não sei como abrir o portão ou, então, não importa o
que Kate lhe prometeu para tirá-lo de nossas costas. Vamos descobrir uma saída
para isso. — James ofereceu-nos um sorriso, e ela retornou, mas eu olhei para as
minhas mãos.
Cronus estava ficando mais forte a cada minuto, e ninguém, nem mesmo
Henry ou Walter, poderiam ganhar contra esse tipo de poder impossível. Se ele
seguisse o nosso acordo e deixasse que os outros sobrevivessem, em seguida, a
menos que eu quisesse vê-lo abater todos que eu amava, eu não teria escolha a
não ser abrir o portão.
Tudo o que eu tinha que fazer, entretanto, era convencer Persephone a me
dizer como.
Horas depois que deixamos o oásis, eu encontrei uma segunda flor,
manchado com azul, esperando por mim em uma árvore caída quando me sentei
para descansar. De primeiro o tronco estava vazio, mas quando eu baixei-me,
meus dedos escovaram nas pétalas de seda.
Não poderia ser uma coincidência, mas quem estaria deixando-me
presentes? Henry? Eu me agarrei a essa esperança, mas ele estava inconsciente.
As chances de que eram ele eram escassas.
E então meus olhos caíram sobre James, e eu fiz uma careta.
— O que? — Disse ele quando ele se inclinou contra uma árvore. Eu
levantei a flor, e ele arqueou as sobrancelhas. — Colorida. Onde você conseguiu
ela?
— Estava aqui esperando por mim, — eu disse, mas ele encolheu os
ombros com indiferença. Não era dele, afinal. Por tudo o que importava,
poderíamos estar falado sobre uma folha morta.
Henry, então. Eu aqueci com o pensamento. Ele deve ter sido capaz de me
ver na caverna depois de tudo, ou talvez ele imaginou o que estávamos fazendo.
Talvez ele estivesse tentando me dizer que estava feliz que estávamos chegando
para resgatá-lo. Só porque ele não sabia o que eu planejava fazer.
Nós continuamos, verificando constantemente sobre nossos ombros a
qualquer sinal de Cronus. Cada vez que paramos, eu encontrei uma flor nova
esperando por mim, e eu dobrei com reverência no bolso com o arco-íris das
outras, aninhadas contra a flor de joias. Eventualmente nossas pausas tornaram-
se cada vez menos frequentes, e enquanto eu sentia falta das flores, meu corpo
parou de ficar cansado, e foi mais fácil para continuar.
Eu não sei quanto tempo nós andamos. Parecia uma eternidade, embora
não poderia ter sido mais de uma semana. Minha perna doía cada vez que eu
dava um passo, mas, eventualmente, a dor desapareceu no fundo, dando-me
tempo para absorver a beleza e o horror do Submundo.
— Esta é realmente a maneira mais rápida para lá? — Eu disse quando
outro pesadelo desapareceu. Desta vez, tinha sido uma criança que estava sendo
queimada viva com uma mãe que observava, acorrentada ao chão enquanto ela
gritava, impotente para fazer qualquer coisa.
— Infelizmente sim, — disse James à medida que nos arrastamos até uma
estrada de terra íngreme. — Pena que tudo isso não aconteceu após sua
coroação. Você poderia ter nos tido lá em segundos.
— Obrigada, — eu murmurei, agarrando um galho caído para usar como
uma bengala. — Como se eu precisava de mais um lembrete.
— Você é a pessoa que perguntou, — disse James, e depois disso, eu me
recusei a falar com ele pelo resto do dia.
Agora que o perigo do ataque de Cronus tinha se dissipado, eu passei a
maior parte do meu tempo tentando descobrir a melhor forma de convencer
Persephone não apenas para nos ajudar, mas para me dizer como abrir o portão
sem Ava e James descobrirem. Eu não queria que fosse uma opção, mas era, e eu
não podia ignorar. E a maneira como ele acariciou minha bochecha no deserto...
se Cronus realmente estava disposto a me ajudar em troca de eu liberar ele,
então talvez ele pudesse ajudar a derrubar Calliope. E depois os outros irmãos
poderiam recapturá-lo.
Era instável no melhor, mas era tudo mais sobre este plano, e pelo menos
isso era melhor do que nada.
Quanto mais perto chegávamos de Persephone, mais apertado o nó em
meu peito ficava. Eu pensei em dezenas de maneiras de convencê-la a vir,
argumentos para fazê-la ver como isso era importante, mas não havia nenhuma
garantia de que qualquer coisa que eu dissesse seria o suficiente. Apesar de
tentar persuadi-la, eu também corria o risco de afastá-la.
Entre a preocupação e o estresse de tudo que estava acontecendo, eu
fiquei mais quieta, ouvindo James e Ava falarem em vez de me juntar. Quando
eles não estavam falando sobre meu acerto com Cronus, a maioria de sua
conversa centrava no que os outros estavam fazendo ou se Dylan os convenceu
de que era um desperdício de tempo. Ava estava certa de que ele não faria, James
não tinha tanta certeza, e a disputa cresceu mais e mais aquecida até que eu não
sabia se eu poderia tomar qualquer partido.
Por fim, quando parecia que nunca iríamos parar de andar e nunca iriam
parar de brigar, James levantou a mão, e Ava ficou em silêncio. Eu congelei, e
James olhou através das árvores que nos cercavam.
— O que foi? — Disse Ava em voz baixa. James acenou para nos juntamos
a ele, e eu avancei, na ponta dos pés em torno das raízes. Ele estava à beira de
uma clareira cheia de flores silvestres, e quando olhei em volta dele, eu notei uma
pequena cabana com uma nuvem de fumaça saindo pela chaminé. Feita de
madeira, em vez de tijolo, era coberta com vinhas de flores, quase fazendo com
que pareça como se levantou-se do chão.
— É linda, — eu disse, cansada. — Mas precisamos continuar... — James
cobriu minha boca com a mão, e eu automaticamente a lambi. Foi a mesma coisa
que eu tinha feito para a minha mãe sempre que ela tinha tentado me manter
quieta quando criança, mas pelo menos as mãos dela eram geralmente limpas e
não cobertas com a sujeira do Submundo.
Eu fiz uma cara e cuspi, mas eu não tive a chance de colocar nele por
cobrir a minha boca em primeiro lugar. A porta da casa se abriu, e saiu uma loira
de cabelos cacheados que parecia alguns anos mais velha do que eu. Ela era
pequena, e apesar de o sol brilhando no prado verdejante, sua pele era de
alabastro.
Ao meu lado, James franziu os lábios, e Ava soltou um suspiro suave de
desgosto que eu não entendi. A menina se ajoelhou no jardim ao lado da porta da
casa, e ela começou a arrancar as ervas daninhas enquanto ela cantarolava feliz
consigo mesma. Havia algo perturbadoramente familiar sobre a maneira como ela
se movia, e como um homem lindo de morrer saiu da casa e à luz do sol para se
juntar a ela, eu finalmente entendi.
— Aquela é...? — Eu sussurrei. James engoliu em seco, e minha
respiração engatou na minha garganta.
Persephone.
08
PERSEPHONE
Ela parecia exatamente a imagem que eu tinha visto meses atrás, exceto
que seu cabelo era da cor do trigo em vez de loiro morango. Nós não estávamos
próximos o suficiente para eu ver as sardas, mas eu tinha certeza que elas
estavam lá, também. A memória de Henry dela era perfeita.
É claro que era. O que mais eu esperava?
— E então? — Eu tomei uma respiração profunda para reduzir meu pulso
acelerado. O nó no meu peito tornou difícil para respirar. — Vamos ficar aqui
sentados e olhando, ou vamos ir dizer oi? — James não respondeu. Ele observou
Persephone com olhos grandes e arregalados, e eu não tinha certeza se ele estava
respirando, também.
Eu o cutuquei no ombro, mas ele ignorou o meu toque.
— O que está acontecendo? — Eu disse a Ava. Ela, também, estava
olhando, mas ela tinha o mesmo olhar em seu rosto que ela faz quando estava
olhando para Dylan. Ou Xander. Ou Theo.
— Eu quase me esqueci de como Adonis é lindo, — disse ela. — Nós
deveríamos ter feito dele um de nós.
Ela não teria obtido qualquer argumento fora de mim, mas um som
estranho escapou de James, quase como se estivesse rosnando. — E ter que
suportar outra loira narcisista correndo por ai? Não, obrigado.
Ava abriu a boca para responder, mas eu a cortei. — Vocês são todos
narcisistas. Vamos ou não?
Vestindo uma expressão ferida, James quebrou seu olhar, mas nem ele
nem Ava fizeram qualquer movimento em direção à casa de campo.
Com um acesso de raiva, eu pisei passado o limite das árvores e caminhei
através do prado, fazendo questão de pisar em torno das flores. Não adiantava
arriscar a ira de Persephone, antes de dizer uma palavra.
Persephone devia ter me visto, porque ela se levantou e se colocou
protetoramente na frente do homem, Adonis, aparentemente. Encaixava. Ele
parecia que tinha saído de um filme, com o cabelo longo que pendia de seus
ombros e um abdômen que colocava Henry na vergonha. Era difícil se concentrar
em Persephone com ele ali, e minha boca ficou seca enquanto eu tentava pensar
em algo para dizer.
O desejo de não fazer papel de boba na frente dele tomou conta de mim, e
eu imediatamente me senti culpada por estar tão atraída por ele. Se Persephone
era metade tão superficial como Ava, pelo menos agora eu entendi por que ela
tinha deixado Henry.
Toquei as flores no meu bolso. Agora não era o momento de começar a
pensar como ela.
— Quem é você? — Ela exigiu. Havia uma borda afiada em sua voz, que
forçou a minha atenção de volta para ela, mas o que ela poderia fazer? Me atacar
com uma erva daninha? Ela não era uma deusa mais.
— Eu sou Kate, — eu disse, segurando minhas mãos para cima, quando
eu dei outro passo em frente. — Kate Winters.
Sua expressão não amoleceu. Se nossa mãe tinha visitado ela, ou não
tinha sido nos últimos 20 anos ou ela nunca tinha mencionado que Persephone
tinha uma irmã. Parecia justo.
Ela nunca me disse que eu tinha uma irmã, também.
Eu ouvi passos atrás de mim quando Ava e James chegaram mais perto.
Mesmo que Persephone não tivesse ideia de quem eu era, com a maneira
como a boca dela ficou aberta, era óbvio que ela se lembrava.
— Hermes? — ela disse, atordoada, e então seus olhos se estreitaram
quando ela acrescentou, — e Afrodite. Sorte a minha. O que está acontecendo?
James deu um passo ao meu lado e colocou sua mão no meu ombro.
Ava permaneceu atrás de nós, e eu não a culpei. Qualquer mau sangue
que havia entre as duas, Persephone claramente não tinha esquecido, também.
— Persephone, — disse James com um aceno de cabeça duro. — Tem sido
um longo tempo.
— Não o suficiente, — disse ela, e ela pegou a mão de Adonis, os nós dos
dedos ficando brancos de sua mão. — O que vocês querem?
Nada de mais. Apenas para ela deixar o namorado perfeito e a vida após a
morte para trás para ajudar nós três a encontrar o ser mais poderoso do
universo. Possivelmente libertá-lo também, se ela não se importava muito. Engoli
em seco e abri a boca para responder, mas James chegou lá primeiro.
— Cronus acordou.
Persephone empalideceu. — Como?
— Hera, — disse James, e Persephone franziu a testa.
— É uma longa história. Nós precisamos da sua ajuda.
Persephone olhou-nos com cautela, e seu olhar permanecia em mim mais
do que os outros. — Como eu poderia ajudá-los? Eu não sou uma deusa mais.
James suspirou. — Podemos entrar?
Ela ficou tensa, e quando Adonis a abraçou protetoramente, inveja
serpenteou por mim. Qual seria a sensação de ter estes braços em volta de mim?
Não, eu tinha Henry. Talvez as coisas não estivessem indo tão bem, mas
ele era meu marido. Eu o amava. E quem mais tinha a capacidade de iluminar o
meu humor simplesmente caminhando para o quarto? Eu não precisava de
Adonis.
Mas parte de mim queria ele muito, muito mal.
— Está tudo bem, — disse ele, esfregando a curva de seu pescoço.
— Ninguém pode me machucar mais.
Eu não tinha ideia se isso era verdade, se Cronus poderia atacar os
mortos como ele nos atacou, mas isso não importava. Enquanto Cronus
mantivesse até o seu fim de nosso acordo, não iriamos vê-lo novamente até que
estivéssemos prontos. Não era um conjunto de circunstâncias muito confiável,
mas era melhor do que nada.
— Quem é ela? — Disse Persephone, acenando para mim.
James me deu um olhar de advertência, mas me adiantei antes que ele
pudesse responder. — Henry ia deixar-se desvanecer-se por causa de você, — eu
disse com mais raiva do que eu pretendia. — Ele não poderia governar o
Submundo sozinho, por isso me casei com ele. — Persephone olhou para mim
como se pudesse ver através de mim. Era irritante, mas eu segurei minha cabeça
e olhei de volta, me recusando a deixá-la chegar a mim. Ela estava sob a minha
pele já como era.
Depois de um longo momento, ela se voltou para a porta da casa e acenou
duramente para nós seguirmos. Nós três nos arrastamos atrás dela, Ava
relutantemente, e James me deu outro olhar. Eu ignorei esse também.
O interior de sua casa de um quarto era mais aconchegante do que eu
esperava. Uma centena de diferentes tipos de flores penduravam no teto,
classificadas por família e cor, e eu imediatamente me senti em casa. Quando eu
respirei o cheiro celestial, a tensão no ar parecia derreter. Minha mãe tinha feito
buquês requintados para cada ocasião, em Nova York, e pelo tempo que eu tinha
dez anos, os empresários pagavam quantias exorbitantes para um de seus
arranjos. Antes que eu fosse velha o suficiente para ter muito interesse, porém,
ela ficou doente, e depois de sua segunda rodada de quimioterapia, ela teve que
vender o negócio.
Aparentemente, o câncer não tinha ficado no caminho dela ensinar
Persephone.
Persephone gesticulou para nós tomarmos um assento em uma das duas
cadeiras na mesa, mas James foi o único que aceitou o seu convite. Eu estava ao
lado dele, fazendo um ponto para que eu não pudesse ver Adonis, e Ava
permaneceu perto da porta.
— Há quanto tempo você vem governando o Submundo? — Disse
Persephone. Ela estava no centro da sala, com a boca definida em uma linha
firme enquanto ela me observava. Era inquietante, mas pelo menos ela nos
deixou entrar.
— Eu não tenho, — eu disse. — Henry e eu nos casamos há seis meses.
Eu fui embora para o verão, e Cronus começou a atacar no dia que eu vim aqui.
Não houve tempo para terminar a cerimônia.
Persephone fez um barulho suave no fundo de sua garganta, e seus olhos
se estreitaram. — Por que você o chama de Henry? — Eu pisquei. Essa foi a
última pergunta que eu esperava.
— Pela mesma razão que você o chama de Hades, eu acho. É o que ele me
disse para chamá-lo.
— Os nomes gregos não estavam em grande estilo mais, — disse James.
— E Zeus decidiu que era melhor manter um baixo perfil depois que Roma
caiu, por isso, tivemos que nos adaptar. Eu sou chamado de James agora.
Afrodite é Ava. Hera foi inflexível sobre manter um nome grego – ela foi com
Calliope, sua musa favorita. Ele não se destaca tanto quanto o nosso. —
Persephone estava em silêncio. Adonis caiu ao lado dela e enrolou o braço em
volta da cintura dela, mas ela não se moveu. Eu não poderia olhar para longe
dela sem ser rude, então eu cerrei os dentes e tentei me impedir de deixar
escapar algo completamente inadequado.
— Parece que o mundo seguiu em frente sem mim, — disse ela com um
pequeno fungar arrogante.
— Você não deve agir tão surpresa, — disse James. Ele esticou as pernas
e tirou as botas com os dedos. Persephone torceu o nariz, mas ela não disse
nada. — Tem sido um milhar de anos. Você não iria reconhecê-lo se você for lá
em cima. — Por um momento eu pensei que eu vi um flash de pesar passar no
rosto dela, e meu estômago revirou desagradavelmente. Ela tinha decidido que
não amava Adonis tanto quanto ela pensou que ela tinha? Ava estava certa sobre
a lealdade de Persephone, e que ela tinha se cansado dele e queria seguir em
frente? Eu não podia ver como, a menos que Adonis era nada mais do que um
rosto bonito.
Um rosto muito bonito, mas ainda assim.
Eu não tive tempo para pensar sobre isso por muito tempo. Persephone
voltou-se para mim, os olhos azuis de gelo. — Então, o que, ele escolheu você
dentro de milhões de pessoas no mundo...
— Bilhões, — disse James. — Tem sido um tempo.
Persephone fez uma careta. — O ponto é. Por que você? — Parte de mim
queria evitar isso o maior tempo possível, mas ela era obrigada a fazer perguntas,
e se eu fosse honesta com ela, havia uma chance de que ela estaria disposta a
ajudar. Se ela realmente estava entediada com Adonis, talvez nós tivéssemos
sorte e ela saltaria a chance de ir a algum lugar novo. De qualquer forma, mentir
para ela ou sonegar informações não ia ajudar a minha causa.
— Eu não fui a primeira, — eu disse. — Onze meninas foram testadas
antes de mim ao longo do século passado. Calliope as matou antes que tivessem
uma chance, e...
— Hera nunca faria isso, — interrompeu Persephone. — Talvez se fosse
Zeus, mas...
— Ela é apaixonada por Henry, — eu disse. — Depois que você saiu, ela
pensou que teria uma chance, mas ele não queria estar com ela, então ela matou
a competição.
Persephone fungou. — Você sobreviveu. Você deve ser algo especial.
Aposto que Henry está apenas arrulhando sobre você. — Talvez tenha sido a
maneira como ela disse o nome dele ou o sarcasmo escorrendo de sua voz, mas
algo dentro de mim estalou. Isso era impossível. Eu não ia ficar o dia todo
explicando tudo para ela quando ela não estava ouvindo. Eu nunca iria entender
por que Henry a amava tanto, e se ela não poderia me mostrar cortesia básica, eu
não ia me incomodar, também.
— Ele só está comigo, porque eu sou sua irmã, — eu disse com
veemência. — Diana-Deméter, ela é minha mãe. Ela decidiu me ter em um último
esforço para salvar Henry porque se sentia tão malditamente culpada pelo que
você fez com ele, e ela não queria ser responsável por ele desaparecer. Ele se
casou comigo, porque ele não poderia tê-la, e eu era a melhor coisa. Obrigada por
esfregar meu nariz nisso.
As palavras saíram antes que eu pudesse detê-las, mas não havia como
levá-las de volta agora. Além disso, era a verdade.
Eu nasci para ser outra encarnação dela, para ser a versão dela que ela
não podia ser, mas agora que eu estava de pé na frente dela, eu sabia que nunca
iria chegar perto.
Ela era linda e graciosa e colocava as flores em torno de nós na vergonha,
mas ao mesmo tempo, ela estava disposta a machucar as pessoas que a amavam
por causa da sua própria felicidade.
Eu não era Persephone, e pela primeira vez desde que conheci Henry, há
mais de um ano, eu finalmente percebi que era uma coisa boa. Eu era a única
que poderia querer Adonis e dizer não.
O silêncio esmagador encheu a casa. Persephone olhou para mim, os
olhos ardendo com algo que eu não conseguia identificar, mas eu sabia que não
era bom. Ela não tinha que me dizer para sair. Girei em meus calcanhares e saí
pela porta.
A brisa soprou através do prado, e quando eu respirei fundo, o cheiro de
frésia me encheu, mas eu estava muito longe para me importar. Raiva evaporou
qualquer simpatia que eu tinha por Persephone, e eu não me importava se ela era
minha irmã. Eu nunca tinha tido uma irmã antes, e não havia necessidade de
mudar isso agora.
Eu ouvi a porta se abrir novamente e passos contra a sujeira quando
alguém veio atrás de mim. Eu continuei.
— Kate, — disse Ava. — Kate, pare.
Eu estava a meio caminho das árvores quando ela agarrou meu braço. Eu
girei, pronta para afastá-la, mas as palavras formaram um nó na garganta.
— Você sabe que não é verdade, — disse ela suavemente. — Henry não se
casou com você porque você era irmã de Persephone.
Eu tentei falar de novo, mas tudo o que saiu foi um soluço engasgado, e
minhas bochechas queimaram de humilhação. Eu mal gastei cinco minutos com
ela, e ela já tinha me reduzido a isto.
— Ela... ela é a única razão que eu tive a chance em primeiro lugar, — eu
solucei. — E amor nunca foi parte do acordo. Tudo o que eu tinha que fazer para
casar com ele foi passar, e... e isso é tudo o que eu fiz.
Ava me abraçou, e eu enterrei meu rosto em seu ombro, lutando para não
chorar mais do que já estava. Agora que a barragem estourou, no entanto, eu não
podia parar. Todas as preocupações e tensões que eu mantive engarrafada dentro
de mim desde que cheguei ao Submundo veio derramando, e onda após onda de
soluços me assaltava, roubando cada último vestígio de dignidade que me
restava.
Eu não tinha assinado para isso. Eu não queria enfrentar a minha irmã e
todas as verdades dolorosas que vieram junto com ela. Mesmo com o câncer, eu
estava feliz em Nova York com minha mãe, quando eu não sabia que eu tinha
sido sua segunda filha, uma substituta para a filha que não tinha sido perfeita.
Agora, todas as suas esperanças e expectativas pesavam sobre meus
ombros, e minha determinação rachou.
Eu não queria me casar por dever ou um acordo. Eu amava Henry. Talvez
não fosse o tipo de infinito de amor eterno que poetas escreviam e músicos
cantavam, mas ele me fez mais forte, me fez feliz, e sabendo que ele estava na
minha vida – ele me salvou, em mais de uma maneira.
E quando ele estava comigo, tudo parecia certo. Parecia real.
E, eventualmente, poderíamos chegar lá, se ele me desse uma chance. Em
vez disso, ele queria me manter no comprimento do braço, e todo o tempo eu
sofri, sabendo que eu não era boa o suficiente para ele me amar de volta.
Sabendo que eu não era Persephone.
Não era uma coisa tão boa quando eu pensava sobre isso dessa forma.
Alguém limpou sua garganta atrás Ava, e, eu olhei para cima,
reconhecendo o rosto borrado de James através das minhas lágrimas.
— Está tudo bem? — Disse ele, parecendo que não queria estar aqui. Eu
não o culpava. Eu não queria estar aqui, também.
Eu balancei a cabeça e funguei, enxugando o rosto com a manga da
minha blusa. — Desculpe. Eu só não posso, se ela vai ser assim. É ruim o
suficiente precisar dela e pedir sua ajuda. Eu não posso aguentar ela agindo
assim, também.
— Você não é nenhum prêmio para você mesma, — disse Persephone
atrás de James, e eu enrijeci. Ava colocou-se entre nós, e eu poderia jurar que
ouvi ela assobiar.
James estendeu os braços, como se ele esperava que elas precipitam-se
uma para a outra e arrancassem o cabelo uma da outra.
— Chega, vocês duas. Todas as três. Nenhum de nós quer fazer isso, mas
não importa o que nós queremos, porque se não o fizermos, Cronus e Calliope vão
ganhar. — Eu olhei para a flor selvagem a meus pés. Eu acidentalmente
esmaguei-a com o salto do meu sapato, e eu cautelosamente levantei minha
perna, como se ser gentil agora poderia trazer de volta à vida. Não foi até que a
decepção passou por mim que eu percebi que eu estava olhando para uma das
flores de Henry. Assim, ele poderia estar comigo em todos lugares, mas não aqui.
Não com Persephone.
Persephone golpeou a mão de James para o lado antes de se aproximar. —
Eu sinto muito, — ela disse, sua voz ecoando através do prado. — Não pelo que
eu disse, mas pelo que você está passando. James explicou.
É claro que ele explicou. Meu peito apertou quando outra onda de soluços
avançou, e eu cerrei meu queixo em uma tentativa de mantê-lo na baía. — Está
bem. Você não queria que isso acontecesse. — Ava saiu ao meu lado e pegou
minha mão, e isso era tudo que eu precisava para me sentir ainda mais como
uma idiota do que eu já me sentia. Cronus poderia matar a todos nós, e aqui
estava eu quebrando sobre algo que ninguém poderia ajudar.
— Tenho certeza que mamãe não queria fazer você se sentir assim,
também, — disse Persephone. — Tudo o que ela fez, arranjando meu casamento
com Hades, era tudo para mim e meus melhores interesses. Não foi culpa dela
quando não deu certo. — Não, não era, mas parecia grosseiro concordar com ela
em voz alta.
James estava certo embora. Lutar assim e deixar o ciúme atrapalhar não
ia consertar nada. Não importa como eu me sentia sobre Persephone, ou mesmo
o que ela sentia por mim. O que importava era fazer algo sobre Cronus e salvar os
outros.
Levou cada grama de força de vontade que eu tinha para engolir meu
orgulho. — Por favor, nós precisamos de sua ajuda, — eu disse. — Eu sei que
você não teve nada a ver com isso por um tempo, mas minha mãe e Henry e... e
Walter e todos, todo o resto dos seis originais, Cronus e Calliope sequestraram.
Ela está tentando descobrir como abrir o portão que está mantendo Cronus
dentro, e...
— E o que? — Disse Persephone, e eu tive uma pequena quantidade de
satisfação, ao ver seu rosto drenar de todas as cores. Removida do conselho ou
não, pelo menos ela ainda parecia se importar com eles. — Como eu poderia
ajudar?
— Você sabe onde o portão está, — disse James.
Persephone alcançou para trás dela, e Adonis estava lá em um instante,
como se tivesse surgido do nada. — Você quer que eu te leve lá? — ela disse,
incrédula. — Há uma razão que você não poder achar, James. Há uma razão para
que ninguém, só Hades e eu soubéssemos onde estava. Eu nem deveria saber, ele
só me disse caso algo acontecesse com ele.
— Algo aconteceu com ele, — eu disse. — E se não chegarmos lá antes de
Cronus decidir que mantê-los em torno não vale a pena, ele poderia matá-los ou
pior.
Persephone balançou a cabeça, e Adonis passou os braços em volta dela
de novo, enterrando o rosto em seu cabelo. — Você veio até aqui para me
perguntar se eu poderia levá-los em uma missão suicida, — ela disse. — Você não
pode enfrentar Cronus. Ele vai te matar. — Eu troquei um olhar com James, e ele
me deu um aceno de cabeça pequena.
— Nós já enfrentamos, — disse eu. — Eu acho, eu acho que ele vai nos
deixar em paz, pelo menos até chegarmos lá.
— Até chegarmos lá? — Disse Persephone, uma pitada de pânico em sua
voz. — O que quer dizer, até chegarmos lá?
— Ele está acordado o suficiente para passar uma parte de si mesmo, e
ele pode atacar de dentro do Tártaro, — disse James. — Ele atacou o palácio
antes de Kate ser coroada, e foi quando os irmãos foram atrás dele.
— Ele veio atrás de nós em nosso caminho aqui, — eu acrescentei. — Mas
eu fiz um acordo com ele, e eu não acho que ele vai nos atacar. — Seus olhos se
estreitaram, mas pelo menos ela não perguntou que tipo de acordo.
— Quer dizer que você veio aqui sabendo que um maldito Titã com contas
a acertar poderia facilmente segui-la, e essas não foram as primeiras palavras
fora de sua boca? Você o levou direto para nós?
— Ele não nos atacou desde que Kate fez o acordo com ele, — disse
James. — Você está segura.
Persephone escorregou dos braços de Adonis e começou a andar. — Você
fez isso de propósito, não foi? Se eu for com você, ele pode me destruir. Se eu não
fizer isso, ele sabe onde estou agora, e ele sabe que eu sou a única além de Henry
que sabe encontrá-lo no Tártaro, então ele pode decidir se livrar de mim de
qualquer maneira.
— Por que Cronus faria isso? — Eu bati, minha irritação voltando com
força total. Isso era muito importante para ela agir como se ela fosse a única
pessoa no universo. — Ele quer abrir a porta, e Calliope não tem ideia de como.
Ele não tem a menor chance, a menos que cheguemos lá. Enquanto você está
conosco, você está segura.
Persephone fez uma careta, e ela olhou para Adonis, que não tinha dito
uma palavra. Ele acenou com a cabeça, encorajando, e sua carranca se
aprofundou. — Você jura que ele não tem nenhuma razão para vir atrás de nós?
— Kate está dizendo a verdade, — disse James. — Se Cronus não nos
queria lá, ele teria nos matado há muito tempo.
Persephone pareceu considerar isso, e finalmente ela caminhou de volta
para a casa de campo. — Tudo bem, — ela chamou, e Adonis trotou atrás dela. —
Mas eu te juro, se algo acontecer a mim ou Adonis, eu vou...
O que ela faria, não teríamos a chance de descobrir.
Ela fechou a porta da frente, a poucos centímetros do nariz de Adonis,
mas ele não protestou. Não era de imaginar porque Persephone amava ele tanto.
Ele a aguentava.
— Então, o que, ela espera que a gente vá atrás dela? — Disse Ava com
veemência. — Porque, se esse é o caso, então podemos descobri-lo por conta
própria. Eu não estou rastejando para ninguém, especialmente não a ela.
— Ela disse que viria, — disse James. — Paciência. — Com certeza,
poucos minutos depois Persephone saiu da casa. Ela fez uma pausa longa o
suficiente para dar um beijo profundo em Adonis, e eu me virei para dar-lhes um
pouco de privacidade. Eu queria muito ser capaz de beijar Henry assim um dia,
ou melhor ainda, que ele me beijasse assim e saber que ele quis dizer isso. Mas o
mais próximo que ficávamos de Cronus, menores as chances de que isso
acontecesse se tornava.
— Vamos, — disse Persephone, e ela caminhou através do prado, jogando
uma sacola de lona sobre o ombro. — É uma longa caminhada, mas eu conheço
um atalho.
James fez um gesto para ela liderar o caminho, e nós três seguimos. Ava
arrastou em um huff, ainda de mau humor sobre a coisa toda, e eu ofereci-lhe a
minha mão. Nenhum de nós disse uma palavra, e com sorte, iria permanecer
assim até que chegássemos ao portão.
Nós estávamos andando menos de quinze minutos quando a briga
começou.
Tudo começou inocentemente. James, que parecia estranhamente
retirado, mas determinado a ser educado, perguntou a Persephone sobre como
ela e Adonis estavam indo, e por um momento realmente Persephone sorriu.
— Nós estamos bem, — disse ela. — Muito bem. Você acha que o tempo
que foi, iria ficar monótono, mas eu acho que essa é a beleza deste lugar. Tudo é
tão feliz, e não ficamos entediados um do outro ainda.
Ava bufou. — Isso é um milagre, — ela murmurou sob sua respiração.
Dei-lhe um aperto de mão de aviso.
— Se você tem algo a dizer, basta dizer, — disse Persephone. — Nós todos
sabemos que você está com ciúmes porque Adonis me escolheu ao invés de você,
mas...
Ava soltou uma risada estrangulada. — Ele escolheu você ao invés de
mim? Isso é uma piada? — Ela balançou a cabeça em descrença. — Papai me fez
te deixar tê-lo.
Eu suspirei. Era como o que tinha acontecido no Éden Manor tudo de
novo, só que desta vez Ava tinha ido atrás do namorado de Persephone, em vez do
irmão de Ella. O resultado seria o mesmo, horas e horas de briga e eu estaria
presa no meio. Pelo menos desta vez James estava aqui para ajudar.
Elas discutiram sobre isso por outra hora ou assim, e eventualmente eu
larguei a mão de Ava e coloquei-me no abraço de James em seu lugar. Ele não
poderia bloquear as suas reclamações e xingamentos, mas o peso de seu braço
sobre meus ombros ajudou a lembrar-me de que havia algo mais importante
acontecendo agora do que qual deusa Adonis amava mais.
— É por isso que você pensou que Ava não deveria vir? — Eu disse
suavemente, e James assentiu.
— Você deveria ter visto isso quando Persephone entrou para o conselho
para pedir permissão para se tornar mortal por ele, — ele sussurrou. — Foi um
banho de sangue. Ava se recusou a dar seu consentimento a Persephone mesmo
que o resto de nós tinha concordado, então, eventualmente Walter a anulou. Ele
nunca tinha feito isso antes, e ele não tem feito isso desde então. — Mesmo
Calliope, tanto quanto ela me odiava, concordou em me conceder a imortalidade.
Eu pressionei meu ouvido contra seu ombro para abafar as duas. Funcionou
marginalmente, mas a voz estridente da Ava me arrastava de volta para a
bagunça.
— O que você acha, James? — Ela disse sarcasticamente. — Quem é uma
amante melhor, eu ou Persephone?
Meus olhos se arregalaram, e eu me afastei de James, deixando o braço
cair ao seu lado. Ele virou escarlate e enfiou as mãos nos bolsos, e então...
A dor explodiu na minha cabeça, e eu gritei, tropeçando de joelhos. A
floresta caiu, e eu mergulhei na escuridão.
Apesar do meu pânico, eu sabia o que esperar. Eu ainda estava
consciente, e quando eu abri meus olhos, eu não estava mais no Éden de
Persephone. Em vez disso eu estava de volta na caverna de Cronus, e Calliope
ficou na frente de mim, mais uma vez, olhando através de mim.
— Eu vou matar ela, — rosnou. — Eu vou rasgar seu corpo em pequenos
pedaços e forçá-lo a assistir.
Assustada, eu virei para ver de quem ela estava falando, e quando eu vi
um par de olhos da cor do luar olhando para mim, meu sangue gelou.
Henry estava acordado.
09
LAÇOS QUE UNEM
Um corte corria pelo seu rosto, pingando sangue sobre a gola de sua
camisa preta, mas pelo menos Henry estava vivo. Atrás dele, minha mãe e Sofia
foram acorrentadas a Walter e Phillip, os quatro inconscientes. Eu
cautelosamente contornei Henry, preocupada que ele poderia ser capaz de me
sentir. Suas mãos estavam acorrentadas atrás das costas. Ele lutava contra elas,
mas os elos de metal foram infundidos com nevoeiro.
— Você tem mais uma chance, — disse Calliope, e ela fechou a distância
entre eles. Para seu crédito, ele não recuou. — Diga-me como abri-lo, ou da
próxima vez que você ver Kate, ela vai estar em pedaços.
Henry puxou as correntes novamente, mas a sua expressão em branco
não mudou. Calliope zombou e girou bruscamente em direção ao nevoeiro que
girava em torno do portão.
— Eu quero que você a encontre e a mate, — disse ela em voz alta
irritante. Não havia dúvida do comando em suas palavras. A caverna retumbou
com o riso cruel, e o fervor de Calliope vacilou. Aparentemente Cronus não
gostava de receber ordens.
Olhei para Henry e vi um fantasma de um sorriso nos lábios.
Será que ele sabia que eu estava lá, ou ele, também, sabia quão fútil era
Calliope mandar em um Titã?
— Eu disse saia e a encontre, — ela rosnou, mas Cronus não fez nenhum
movimento para sair. O nevoeiro enfiou através das grades do portão, e eu me
perguntei por que eles estavam ali de qualquer maneira quando ele ainda podia
sair. Talvez não todo ele, mas ele já tinha provado que o nevoeiro era o suficiente
para fazer mais dano do que o conselho poderia segurar.
Com um acesso de raiva, ela se virou e olhou para Henry novamente, e
mesmo eu consegui abrir um sorriso. Ela parecia uma criança mimada que não
tinha conseguido o seu caminho, não importa quantas birras que ela tinha
jogado.
— Eu vou fazer isso sozinha, então, — disse ela com um suspiro, e o
sorriso de Henry desapareceu. — Eles estão a caminho agora, e uma vez que ela
chegar aqui, eu vou ter certeza de que está acordado para ver o que vou fazer com
ela. Você não vai querer perder isso.
Com um aceno de sua mão, ela enviou Henry voando de volta em direção
à boca da caverna onde os outros estavam acorrentados.
Ele acertou o muro, enviando uma chuva de pedras em seu colo, e sua
cabeça caiu para frente.
Corri em direção a ele e tentei, em vão, mudar o cabelo de lado para que
eu pudesse ver se seus olhos ainda estavam abertos, mas eu era um fantasma.
Calliope não iria matá-lo. Ela não podia. Ela queria que ele vivesse para me ver
morrer, e ela não iria negar-se o prazer de vê-lo na dor como essa. De me ver na
dor.
A caverna se virou para o preto mais uma vez, e quando voltei, três pares
de olhos olhavam para mim. Ava e James estavam acostumados, mas mesmo
Persephone não parecia assustada.
Talvez eles tivessem explicado a ela enquanto eu estava fora.
— O que você viu? — Disse Ava ansiosamente.
Empurrei-me em meus cotovelos e esfreguei minha cabeça latejante. —
Calliope está tentando fazer Henry lhe dizer como abrir o portão. Ele não está
falando, — eu adicionei quando os olhos de Ava se arregalaram. — Ele não disse
uma palavra. Ela ficou frustrada e o apagou ele de novo.
— Bom, — disse Persephone. — Ele não vai dizer a ela. Ele sabe melhor do
que correr o risco.
— Eles estão todos lá, — eu disse. — Todos inconscientes. Calliope
ordenou Cronus para vir atrás de mim, mas ele recusou. — Persephone me olhou
em dúvida, mas James e Ava não questionaram.
— Isso é tudo? — Disse James. — Você viu alguma coisa?
— Eles sabem que estamos chegando, — eu disse severamente.
Nenhum deles parecia muito feliz com isso, mas ninguém disse nada. Não
foi nenhuma surpresa que Calliope sabia, não quando Cronus tinha nos caçado,
e agora isso não importa.
Eles não estavam vindo atrás de nós mais. Nós perdemos o elemento
surpresa, mas pelo menos tínhamos tempo para descobrir um plano antes de
chegarmos lá.
James me ofereceu sua mão, e eu peguei, transportando-me a meus pés.
A floresta parecia girar em torno de mim, e eu caí contra James, enquanto
recuperava o meu equilíbrio. — Seria bom se eu pudesse controlar, — eu
murmurei. — Faria isso muito mais fácil.
— Você pode, — disse Persephone. Ela se inclinou contra um tronco de
árvore casualmente, como se as pessoas desmaiassem ao seu redor o tempo todo.
— Desde que você era mortal, antes de tudo isso, provavelmente vai te levar
muito mais tempo para pegar o jeito, mas você vai ter que pegar, eventualmente.
Eu mordi de volta a minha réplica. Não adiantava dar-lhe alguma razão
para marchar de volta para Adonis. — Se você sabe como fazê-lo, então por que
você não me diz para que possamos usá-lo a nosso favor? — Eu disse através de
um maxilar cerrado.
Persephone inspecionou as unhas. — Eu vou pensar sobre isso.
James suspirou. — Persephone, por favor.
Os dois trocaram um olhar pesado, e eu fiz uma carranca. Se Persephone
sabia como controlar esse tipo de poder, então a única razão que ela tinha para
não compartilhar era egoísmo. Eu tinha suas habilidades agora, as que ela tinha
desistido, juntamente com sua família, sua mãe e tudo o que ela amava, tudo por
um cara atraente. Eu sabia por que ela não gostava de mim, mas isso não lhe
dava o direito de pôr em risco nossa segurança.
Eventualmente Persephone se empurrou fora da árvore e começou a
avançar, deixando nós três para nos recuperar.
— Tudo bem, — ela chamou em voz monótona que ralou em meus nervos.
— Eu vou ensinar a ela quando Ava admitir que eu sou mais bonita do que ela é.
— A boca de Ava caiu aberta, e ela invadiu depois dela.
— Sua pequena....
James ofereceu-me o braço, e eu balancei a cabeça. Decepção piscou em
seu rosto, mas ele não pressionou o problema, e ao invés disso ele caminhou ao
meu lado, perto o suficiente para alcançar se eu precisasse dele. Foi legal, sua
proteção, mas eu mantive meus olhos no chão pelo resto do dia.
Ele tinha dormido com Persephone, também, e nenhuma visão ia me fazer
esquecer isso.
Mesmo sem tentar, Persephone contaminou todos os aspectos da minha
vida e cada pessoa que eu amava. Como uma irmã mais nova, cujas coisas só
eram passadas a mim, tudo que eu cheirava era ela, e nada iria fazer o cheiro ir
embora.
Havia um lado positivo em estar com Persephone: nosso ambiente não
mudava, o que significava que eu não tinha que suportar ver alguém ser
torturado. Então, quando eu vi as luzes piscando de um carnaval colorido à
distância, por um momento eu pensei que tinha perdido, mas ela ainda estava lá,
pulando alguns metros à minha frente.
Uma enorme roda-gigante se erguia acima de nós, e o cheiro de pipoca
flutuava no ar, passando a cerca e para o mergulho no campo onde fizemos
acampamento. Não importava quantas vezes Persephone insistiu que estava
cansada e precisava de um tempo, eu tinha certeza que tinha escolhido o local,
por causa das luzes brilhantes e da pitada de futuro que ela nunca tinha tido a
oportunidade de ver. Não tinha sido o Éden dela antes, e era a única explicação
para por que isso estaria aqui agora. Mais do que ninguém aqui, ela sabia como
manipular a vida após a morte para ver esse tipo de coisa.
James e eu coletamos madeira desta vez, deixando Ava e Persephone
continuarem a discutir. Teria sido mais fácil deixá-lo criar gravetos para o fogo,
mas eu precisava ficar longe delas, e aparentemente ele precisava também.
Encontrei outra flor colorida situada em um bosque, e eu sorri quando eu inalei
seu cheiro de algodão-doce e a coloquei no bolso. Henry ainda estava vivo, e não
importava o quão brava Calliope ficasse ela não ia matá-lo.
Após a coleta de uma braçada de gravetos, eu permaneci perto da
bandeira que estava pendurada acima do saguão do carnaval, debatendo se devia
ou não ir para dentro. Por mais que eu não quisesse admitir, eu nunca tinha
estado em um verdadeiro carnaval antes também, e eu estava ansiosa para ver o
que era.
— Sinto muito, — disse James atrás de mim, e eu pulei de surpresa.
Alguns dos gravetos que eu reuni caíram no chão, e quando eu os peguei, James
ajoelhou-se ao meu lado para ajudar.
— Eu consigo, — rebati. James levantou-se e afastou-se, mas ele não
saiu. Em vez disso, ele esperou até que eu tinha recolhido o resto, e quando eu
me endireitei e me dirigi para outro pedaço promissor de grama alta, ele seguiu.
— Eu deveria ter dito a você sobre eu e Persephone, — disse ele. — Se eu
tivesse alguma ideia de como você se sentia sobre ela, eu teria, e eu sinto muito.
— É este o ponto em que você me diz que isso não significou nada? — Eu
disse irritada.
Ele fez uma pausa, como se estivesse escolhendo as palavras com
cuidado.
— Não, não é. Enquanto estava acontecendo, significava alguma coisa.
Agarrei os gravetos com tanta força que alguns deles quebraram.
— Você realmente precisa aprender quando é melhor mentir, em vez de
dizer a verdade.
— Não vejo por que, — disse ele. — Então, você estaria chateada que eu
não fui honesto.
Ele estava certo, é claro, mas isso não me fez sentir melhor. — Então o
que aconteceu? — Eu disse. — O que é tão apelante sobre a vaca egoísta que
tinha a metade do conselho enrolado em seu dedo mindinho?
Atravessamos o prado, nenhum de nós disse uma palavra quando o som
metálico da música do carnaval flutuou através da brisa. Os gritos de indignação
e revolta de Ava e Persephone desapareceram no fundo até que eu quase podia
fingir que éramos apenas nós três: eu, James e o elefante gigante que nos seguia.
— Nós éramos amigos antes dela casar com Henry, — disse ele,
finalmente, depois de que vários minutos passaram. — Ela e eu éramos os mais
jovens membros do conselho na época, e nos demos bem. Nós éramos próximos o
suficiente na idade que nenhum de nós tinha passado através dos ritos de
passagem que o resto deles tinha experimentado, e... — Ele encolheu os ombros.
— Foi fácil, isso era tudo.
Vi o que parecia ser um galho de árvore quebrado, e me ajoelhei para
pegar os pedaços. Ele se juntou a mim, seus olhos voltados para o chão.
— Quando seu casamento com Henry começou a desmoronar, eu estava lá
para ela, — disse ele. — Passei muito tempo no Submundo guiando os mortos
para o lugar certo, e quando ela precisava de um ombro para chorar, ela veio até
mim. — Ele hesitou. — Quando Henry ofereceu para que ela saísse por seis
meses do ano, ela aproveitou a chance, e começamos a passar algum tempo
juntos lá em cima também. Uma coisa se transformou em outra... — Ele parou, e
ele não tinha necessidade de terminar.
— Quanto tempo durou? — Eu disse quando náuseas encheram a boca do
meu estômago. James tinha sido a primeira pessoa a trair com ela. Ele era mais
próximo de Henry do que qualquer outro membro do conselho, e ele devia ter
sabido o que faria com ele, mas ele tinha feito isso de qualquer maneira. Ele
deixou Persephone usá-lo assim. Ele fez mais do que deixá-la ferir Henry, ele
tinha ajudado.
— Algumas centenas de anos, — disse ele, e ele deve ter visto a expressão
no meu rosto, porque ele acrescentou apressadamente, — Dentro e fora, e apenas
durante a primavera e o verão. Eventualmente ela conheceu Adonis, e a confusão
toda aconteceu, e eu fiquei na poeira.
— Pobre de você, — eu murmurei.
Ele esboçou um sorriso. Eu encontrei o último graveto na área imediata e,
juntos, nos levantamos. — Não, não, pobre de mim, — disse ele. — Nós sempre
fomos melhores como amigos de qualquer maneira. Além disso, fez o trabalho
com Henry estranho.
Uma coisa era se esconder por trás das costas de Henry, mas foi outro a
ter um relacionamento com sua esposa, quando ele tinha plena consciência
disso. — Ele sabia, e ele não tentou matá-lo?
— Claro que não, — disse James, rindo. Eu não vi o que era tão
engraçado. — Tudo é um segredo aberto com a gente, Kate. Você vai ver,
eventualmente.
Eu não tinha certeza do que eu queria mais, se eu conseguisse fazê-lo sair
dessa vivo, mas não importava. Eu decidi então que se eu ficasse, se Henry ainda
me quisesse aqui depois dessa confusão ser limpa, eu nunca iria traí-lo, nem
mesmo durante o verão. E, especialmente, não com James.
No entanto, eu passei todos os meus seis meses afastada com James, não
passei? O que tinha para mim foi uma ruptura com o caos com um amigo que
poderia facilmente ter sido interpretado como umas férias românticas por Henry.
Se ele realmente não tinha me verificado o tempo todo que eu estava na Grécia
com James...
Oh, Deus.
As coisas que Henry devia ter imaginado – minha mente cambaleou, e
todas as emoções que eu comecei a desenvolver por James desapareceram.
— Você sabia o que a Grécia iria parecer para ele, e você não me avisou?
James fez uma careta. — Isso não importa. Você e eu sabíamos que não
éramos nada mais do que amigos, e se era isso que Henry quis assumir...
— É claro que era o que ele assumiria! — Sem pensar, eu arremessei uma
dos gravetos em James. Ele olhou inofensivamente seu peito, mas pela primeira
vez eu não me importava com machucar. Ele era um deus. Ele sobreviveria, e não
era nada comparado ao horror e culpa e vergonha produzindo dentro de mim. —
Você fez isso de propósito, não foi? O que é, James? Você quer que ele esteja
sozinho? Você quer que ele desapareça? Você quer governar o Submundo depois
de tudo?
— Eu não fiz isso de propósito, — disse ele, inclinando-se para pegar o
graveto que eu tinha jogado. — E eu não quero machucar Henry, mas mais do
que isso, eu não quero que ninguém te machuque, também. Você tem uma
escolha. Uma escolha, Kate, que ninguém mais está apontando para você, porque
eles não veem o que Henry está fazendo para você. Ele está te machucando, e não
há nenhuma garantia de que alguma vez vai ficar melhor.
Suas palavras foram um tapa na cara, e eu engasguei com a minha
resposta. Ele estava dizendo tudo o que eu não queria ouvir. Tudo o que eu
estava tentando desesperadamente ignorar.
— Vai ficar melhor, — eu disse com voz trêmula, a fúria crescendo dentro
de mim até que eu podia sentir o gosto. — Assim que ele entender que eu não
tenho interesse em jamais estar com você, eu tenho certeza que ele vai aparecer.
Para minha imensa satisfação, James fez uma careta. — Acredite no que
quiser, mas o seu negócio com Henry é claro. Ele te tem por seis meses, não
mais. Você pode fazer o que quiser durante o verão, e ele não tem nada a dizer.
— Isso não me dá o direito de quebrar o maldito coração dele. — Eu me
afastei para acampamento. — E isso não lhe dá o direito de tentar me fazer. Eu
não acredito em você, James. De todas as coisas desagradáveis a fazer, brincar
comigo assim...
— Eu não estava brincando com ninguém. — Ele correu para alcançar, e
eu me recusei a olhar para ele. — Eu não estou fazendo isso por diversão, Kate.
Você é a pessoa que me convidou para ir à Grécia, e eu disse que sim, porque eu
gosto de passar o tempo com você. E porque eu queria ajudá-la a ver o que você
estaria perdendo se você decidisse voltar. Você não pode gritar comigo por isso –
eu me comportei. Não importa o quanto eu queria te beijar, eu nunca fiz.
— Não diga isso. — Eu me virei, e ele veio a poucos centímetros de bater
em mim. — Eu não sou Persephone. Eu não vou enganar Henry não importa que
época é, e eu não me importo quanto tempo passe. Isso não vai mudar.
— E se as coisas nunca ficarem melhores? — Disse James. — E se Henry
nunca te amar do jeito que você merece? O que aconteceu com Persephone... Eu
não quero ver você repetir seus erros. Você não deveria ter que passar por esse
tipo de dor... você ou Henry. Ele está definido em seus caminhos, e ele nunca vai
mudar. Não há vergonha nenhuma em admitir que o seu casamento não está
funcionando...
— Só porque nós temos alguns problemas não significa que ele não está
funcionando.
Ele suspirou. — Tudo o que eu estou dizendo é que você tem uma escolha,
Kate. Entenda isso, por favor, e não saia correndo na direção de Henry, porque
você acha que pode consertá-lo.
— Eu não estou, — eu rosnei. — Estou com ele porque eu o amo.
— Então, não deve ser muito difícil para você me fazer uma promessa, —
disse James. Ele era louco se ele achava que eu iria prometer-lhe qualquer coisa.
— Pense sobre a possibilidade de viver a sua própria vida em vez da vida de
Henry e o que o resto do conselho quer que você viva... e eu não quero dizer para
considerar por meio segundo. Quero dizer imaginar como vai ser se Henry nunca
te amar como você o ama. Imagine como vai se sentir voltando para casa para
uma cama fria e um marido que preferiria fazer qualquer outra coisa do que
passar o tempo com você. Porque queira ou não, se você ficar, isso é uma
possibilidade. E em troca, eu vou parar de atormentar você. — Eu abri minha
boca para dizer-lhe para ir se ferrar, mas não saiu nada. Em vez disso, meus
olhos se encheram de lágrimas, e antes que eu pudesse me parar, palavras
voaram da minha língua, emaranhadas e grossas e completamente fora do meu
controle.
— Você realmente acha que vai ser assim? Você acha que ele não me
ama?
James franziu os lábios e estendeu a mão para me tocar, mas eu puxei de
volta. — Ele te ama, mas sim, é uma possibilidade que ele nunca vai estar lá para
você do jeito que você quer que ele esteja. Há um risco de que, desta vez, você
seria Henry e ele seria Persephone.
Então, seria eu ansiando por alguém que não me queria. Eu queria
retrucar e dizer a James que ele estava errado, que eu tinha um bolso cheio de
flores para provar isso, mas eu não podia. Henry poderia enviar-me presentes o
suficiente para encher o Submundo uma centena de vezes, e nunca seria um
substituto para seu toque. Para a sensação de seus braços em volta de mim como
Adonis tinha envolvido os seus ao redor de Persephone.
— Tudo o que eu estou pedindo é que você realmente pense se esta é ou
não a vida que você quer, — disse James suavemente. — Se você decidir que não
quer, ninguém pode forçá-la. E eu não estou pedindo que você gaste sua vida
comigo, também. Eu só não quero que você esteja amarrada a alguém que não a
aprecia do jeito que você merece ser. Você deve ser a única no controle de seu
destino, Kate, não qualquer um de nós. Especialmente não Henry.
Agarrei minha pilha de gravetos para o meu peito e disse ao redor do nó
na garganta, — Ok. Vou pensar sobre isso. Mas, pare de falar assim, ok? Por
favor. Não quando Henry não está aqui para se defender.
James assentiu uma vez, e isso foi o suficiente para mim. Tomando um
suspiro trêmulo, eu me recompus e encaixei meus ombros. Henry teria uma
chance justa. Ele teria uma chance de provar que James estava errado, e quando
o fizesse, o argumento de James seria anulado. E tudo estaria bem novamente.
— Você pelo menos disse a Henry que nada aconteceu na Grécia? — Eu
disse, satisfeita que a borda em minha voz estava de volta. Eu poderia quebrar
outra vez.
Seu silêncio foi tudo o que eu precisei ouvir. Com um grito mudo, eu
marchei de volta para o acampamento, ignorando a cadeia de desculpas que
James derramou atrás de mim.
Enquanto Henry me quisesse, eu iria permanecer fiel.
Mas se ele não quisesse, se esta vida juntos fosse uma corrente para ele,
então a melhor coisa que eu poderia fazer era libertá-lo. Ao mesmo tempo, as
expectativas da minha mãe eram um fardo pesado para eu carregar, e milhares
de anos eram muito tempo para amar uma única pessoa, era perfeitamente
possível que Henry teve as mesmas reservas que o deteve. E se ele realmente
acreditava que James e eu tínhamos nos envolvido durante a nossa viagem para
a Grécia, então, essa era a primeira coisa que eu teria que consertar no momento
que eu tivesse uma chance.
De qualquer maneira, eu amava Henry. Talvez um dia ele iria acreditar
nisso.
Quando cheguei ao acampamento, eu deixei cair meus gravetos no centro
e me sentei pesadamente em um toco de árvore. James se arrastou depois de
mim, e uma vez que ele tinha arranjado os gravetos em outra tenda, ele começou
o fogo. Seria impossível dormir com os sons do carnaval no fundo, mas
Persephone não parecia precisar dele, também. Outra vantagem de morrer, eu
supunha.
Ava e Persephone continuaram a brigar, mas pelo menos Ava parecia
perceber que algo estava errado, e depois de outra rodada de retortas, ela
desistiu. Persephone tentou incitá-la, mas uma vez que se tornou claro que Ava
não estava de bom humor, Persephone sentou-se no toco de árvore ao lado do
meu e amuou.
— Quantas visões você já teve? — Disse Persephone, e os gravetos
explodiram em chamas. James agachou no chão a poucos metros de distância, e
através do fogo eu podia ver sombras nas linhas profundas gravadas em seu
rosto, fazendo-o parecer anos mais velho que ele deveria parecer.
Eu dei de ombros. — Três, eu acho. Tudo para o mesmo lugar.
— Você foi capaz de controlá-las já? — Ela disse, e eu balancei a cabeça.
— Elas acontecem em intervalos regulares?
— Não. — Eu olhava para as minhas mãos, incapaz de engolir ver James.
— Alguma vez você dormiu com Henry?
Persephone não disse nada por um momento, e quando olhei para ela, seu
rosto parecia estranhamente contorcido à luz do fogo.
— Está tudo bem, — eu disse. — Você não tem que responder. — Nossos
olhos se encontraram por uma fração de segundo, e ela se endireitou, sua
expressão suavizando.
— E você?
Eu balancei a cabeça. — Uma vez, em março. É outubro agora, —
acrescentei. — Eu acho.
Persephone puxou um de seus cachos loiros e suspirou.
— Eu costumava ser capaz de dizer. Mesmo depois que eu morri, meu
cabelo mudou de cor com as estações do ano, mas depois de um tempo ele parou.
— Ela sorriu levemente. — Está preso no verão agora. — Isso explica por que o
cabelo dela tinha uma cor diferente na reflexão de Henry.
— Qual - qual a estação que virava loiro morango? — Disse.
— Outono, — disse ela. — Ele ficava mais vermelho com o outono, e no
auge do inverno, era preto. Clareava para castanho na primavera.
Claro. James tinha me explicado que uma reflexão não era uma
representação exata do que tinha acontecido. Foi o que o criador quis. E o que
Henry queria era que Persephone estivesse sorrindo ao vê-lo cada outono.
— Eu não queria dormir com ele, — eu disse, e eu parei. — Isso soa
ridículo, não é? Parte do teste era de luxúria, e Henry tinha-me tão bem protegida
que Calliope não teve a chance de me matar, então em vez disso ela sabotou o
teste, dando-nos um afrodisíaco.
Persephone estalou a língua em desaprovação. — Você certamente já teve
uma vida difícil, não é?
— O que você quer dizer? — Eu disse cautelosamente. Ela estava sendo
sarcástica?
— Bem, eu suponho que você o ama, — ela disse, e eu assenti. — É bom
que você está lá para ele. Ele merece ter alguém que o ama. — Ela hesitou e disse
relutantemente, como se estivesse admitindo algum segredo profundo, escuro, —
eu me preocupo com ele às vezes. É terrível que a única vez que você esteve com
ele teve que ser por causa de um afrodisíaco. — Ela olhou para Ava. — Afrodite
estraga tudo.
— Não fui eu, — disse Ava, de olhos arregalados. — Eu não estava lá.
— É nomeado por você.
Eu comecei a retrucar, mas Ava bufou e permaneceu em silêncio.
Depois de um momento, Persephone gesticulou para ela com desdém.
— Independentemente disso, com o que disse anteriormente sobre a Mãe
só ter você por causa de mim, e depois de tudo isso, bem, eu imagino que não é
fácil. Então você tem a minha simpatia. — Eu não sabia o que dizer sobre isso.
Talvez depois de um dia inteiro de disputas com Ava, ela estava sem nenhum
argumento.
— Essa é a melhor coisa que você disse para mim.
— Não espere que eu vá continuar, — disse ela com um suspiro. — Para
responder à sua pergunta, sim. Uma vez.
Levei um momento para imaginar de que pergunta ela estava falando, e
quando o fiz, minha boca ficou aberta, mas nenhum som saiu. Então Calliope
estava errada, afinal.
Mesmo que eu soubesse que Persephone e Henry tinham sido casados, foi
um soco no estômago ouvir que eu não tinha sido a única de Henry. A última
coisa que eu tive que eu não tinha compartilhado com ela evaporou. Mais uma
vez, Persephone tinha chegado lá primeiro, e tudo que eu tinha eram suas
sobras.
— Foi horrível, — disse Persephone. Sua mão ficou entre nós, como se ela
pudesse sentir como eu estava chateada, mas ela a deixou cair de volta no colo.
— Foi na nossa noite de núpcias, e nós não falamos sobre isso. Só - aconteceu.
Era esperado, e nós dois éramos muito tímidos para perguntar ao outro se nós
queríamos. Nós dois assumimos.
Fiquei em silêncio. Eu não queria pensar sobre o quão mal as coisas
teriam ido para Henry e eu se não tivesse tido a faísca entre nós. Sua culpa e
raiva tinham sido ruins o suficiente na manhã seguinte.
Ava moveu calmamente para o outro lado do fogo, sentando-se ao lado de
James. Inclinaram suas cabeças juntas, e o som suave de sua conversa flutuou
em direção a nós, mas eu não conseguia entender o que eles estavam dizendo.
— Quando nós... — Eu limpei minha garganta. — Eu teria esperado se eu
tivesse a escolha. Mas eu não queria. Esse foi o ponto que eu percebi que eu o
amava, e... pelo que foi, foi bom. Foi muito bom.
— Bom, — disse Persephone distante, olhando para o fogo. — Hades
merece isso. Ele merece você.
Eu balancei a cabeça. Não importava o que Henry merecia, o que
importava era quem Henry queria, e até agora isso não parecia ser eu. — Foi à
manhã seguinte que foi tão terrível. Quando Henry percebeu o que tinha
acontecido, ele pirou. Em pânico, — eu alterei o olhar confuso de Persephone. —
Ele se desculpou e fugiu, e essa foi a última vez que o vi por dias. A única razão
que ele voltou foi porque Calliope me matou, e ele foi para o Submundo me pegar.
Persephone fez uma careta, e disse em voz baixa, — Não, não é.
— Não, o que não é? — Disse.
— Não, essa não é a única razão que ele voltou. — Ela suspirou. —
Quando consumamos nosso casamento, eu fui a única a pirar. — Ela fez uma
careta para a expressão. — Nós não tínhamos estado casados por 12 horas, e eu
já tinha corrido de volta para a Mãe. Ela me convenceu a ficar e dar-lhe uma
chance, e ela deve ter dito algo a Hades, porque nunca tentamos novamente. Eu
dormia em um quarto separado, e ele nunca pressionou o problema.
No outro lado da fogueira, James e Ava ficaram em silêncio.
— Eu sinto muito, — eu disse. — Você não deveria ter que ficar com
Henry, se você não queria.
Então foi por isso que James estava insistindo que eu reconhecesse a
minha escolha para sair, se eu não queria isso. Ele já me disse que tinha sido por
causa de Persephone, é claro, mas ouvir isso dela fez as peças se encaixarem.
James estava me protegendo o melhor que sabia, exatamente como ele tinha no
ano anterior. Quando eu pensei que tinha falhado em um teste, eu tentei sair do
Éden Manor, querendo ver a minha mãe antes de morrer.
Henry tinha me convencido. James não sabia que eu tinha ficado por
minha própria vontade, e isso tinha sido importante o suficiente para ele estragar
seu disfarce.
— Eu era jovem, — disse Persephone. — Eu achava que o amor acontecia
imediatamente. Foi a minha primeira vez vivendo sem a mãe, e eu não sabia o
que esperar. Em cima disso, estar no Submundo e longe do sol me fez infeliz. Foi
a tempestade perfeita, e infelizmente Hades e eu fomos pegos. — Ela balançou a
cabeça com tristeza. — Eu nunca lhe dei uma chance depois. Ele tentou tão
intensamente, você não acreditaria em tudo que ele fez para ver-me feliz. Mas
nunca foi o suficiente. Ele nunca foi o suficiente.
Já estava escuro. O brilho do carnaval e do lamentável fogo eram as
únicas fontes de luz, e quando eu olhei para Persephone novamente, foi difícil ver
seu rosto. — Ele amava você de qualquer maneira, porém, — eu disse. — Ele
ainda te ama mais do que qualquer coisa.
— Eu não tenho mais tanta certeza. — Ela endireitou-se e olhou para o
céu. Eu segui o seu olhar, e uma vez que meus olhos se adaptaram à escuridão,
eu vi que as estrelas não estavam em seu padrão habitual.
— Você disse que ele desceu ao Submundo por você, — disse Persephone.
— Você estava realmente morta?
Eu balancei a cabeça. — Era de noite, e eu estava em um parque que
mamãe e eu costumávamos visitar de volta para casa. Mamãe negociou sua vida
pela minha. Sua vida mortal, — eu corrigi. — Mas o corpo que ela estava usando
estava morrendo de qualquer maneira.
— Não importa, — disse Persephone. — Ele não deveria fazer isso.
Enquanto eu governei com ele, só fizemos algumas exceções, e mesmo assim
houve tantas ressalvas que ninguém nunca conseguiu voltar à superfície. Ele
violou tudo o que ele representava, desde os primórdios da humanidade para
salvar a sua vida.
Do outro lado do fogo, James pigarreou. — Ela está dizendo a verdade,
Kate, — disse ele. — Ele não deveria ter te salvado. — Ele tinha de qualquer
maneira. Sorrindo, eu passei meus braços em torno de meu corpo quando o ar da
noite fria caiu sobre mim. Eu não sabia como classificar tão longe quanto os
gestos românticos iam, mas eu tinha certeza que era pelo menos tão alto como
me dar um filhote de cachorro.
— Você pode me dizer como controlar as visões? — Eu disse a
Persephone, sentindo-me mais leve do que eu tinha desde que desci para o
Submundo. Mesmo me salvar não custou para Henry muito mais do que suas
regras e seu orgulho, Persephone pensava que era um grande negócio, e isso
importava mais para mim do que deveria ter. Ele teria feito a mesma coisa por
ela, eu tinha certeza, mas ele não tinha feito. Eu ainda tinha alguma parte dele
que ela não tinha.
— É fácil, — disse ela com um encolher de ombros. — Você tem que se
concentrar em onde você quer ir ou a pessoa que você quer encontrar.
— Você pode encontrar pessoas? — Eu disse, espantada. Persephone
concordou.
— Isso é provavelmente como você está fazendo, pensando em Henry. É
preciso prática, mas uma vez que você consegue, vai vir cada vez mais fácil.
Tente, — disse ela. — Pense em alguém que você quer ver, e deixe-se derivar para
isso.
Tão fácil como Persephone parecia pensar que era, eu não tinha ideia de
como derivar para nada. Ainda quente de descobrir que Henry tinha quebrado as
regras por mim, eu fechei meus olhos e imaginei seu rosto em minha mente, e...
Nada.
— Não está funcionando, — disse eu.
— Relaxe, — disse Persephone. — Isso não vai acontecer de imediato. —
Aparentemente, não ia acontecer. Eu tentei de novo e de novo, até que todo o
meu contentamento drenou, deixando-me com a falta deprimente de autoestima.
Minha cabeça latejava de tão concentrada, e mais que Persephone me empurrava,
mais fora do alcance parecia.
— Não vai vir naturalmente de primeira, — disse ela alguns minutos mais
tarde, o que era a coisa mais encorajadora que ela disse até agora. — Você nunca
teve habilidades antes.
Por que fazia uma diferença enorme, eu não tinha certeza, mas era claro
que eu não ia conseguir naquela noite. — Eu estou indo para uma caminhada, —
eu disse, e eu levantei. Junto com uma dor de cabeça assassina, minha perna
latejava de novo, e eu balancei. — Eu vou trazer de volta para todos alguns
algodões doces.
Abraçando-me por calor, eu fui para a entrada de carnaval. É claro que
nada disso era para ser fácil – se fosse, qualquer menina poderia ter feito isso e o
teste não teria sido necessário. Ainda assim, eu me senti como um fracasso
completo e absoluto, esgueirando, enquanto os três, sem dúvida, sussurravam
sobre como eu não poderia fazer isso.
Ressentimento surgiu dentro de mim, e eu me forcei a suprimi-lo. Não era
culpa deles que eu não podia controlar minhas visões, e se Persephone estava
dizendo a verdade, eventualmente conseguiria. Mas eu precisava agora, não dias
ou semanas ou meses no futuro. Se nós não sabíamos o que estava acontecendo
com a Calliope...
Um estrondo ecoou pela caverna. Assustada, olhei para cima em direção
ao som, e um senso de pavor encheu a boca do meu estômago.
Estrelas estavam caindo do céu.
10
FISSURA
— Kate!
A voz frenética de James subiu acima do som de rochas quebrando e
sinos tocando, e eu corri para fora do carnaval, cobrindo minha cabeça
instintivamente. O chão tremeu embaixo de mim, mas não havia sinais das
estrelas caídas.
Eu bati em James. — O que está acontecendo? — Eu disse, incapaz de
manter o pânico fora da minha voz.
— Eu não sei. — Ele passou o braço em volta de mim, e, juntos, corremos
de volta para a fogueira. — Seja o que for, eu nunca vi nada como isso antes.
As chamas do fogo balançaram com cada estalar que ecoou pela caverna,
mas as pedras não estavam pousando no prado ou na floresta ou qualquer lugar
perto do carnaval. Ava e Persephone olharam para cima, para o céu, usando
expressões idênticas de alarme. Se isso não estava acontecendo aqui, então
onde...
Sem aviso, o mundo saiu de cima de mim, e eu estava na superfície
novamente. Em vez da densa floresta que cercava Éden, eu estava em um
penhasco com vista para as águas mais azuis que eu já vi quando onda após
onda rolou para a orla branca.
James e eu só tínhamos passado alguns dias na ilha particular, mas o
antigo palácio na distância e a forte queda na água eram inconfundíveis. Esta era
a Grécia.
— Você sentiu isso? — Gritou alguém atrás de mim. — Eu disse que isso
ia acontecer. Eu lhe disse. — Dylan correu atrás de mim, vestido com bermudas
cargo e uma regata. Os outros membros do conselho, todos vestindo roupas
semelhantes a sua, agrupados em torno de algo a poucos metros de distância.
Aproximei-me mais para ver.
Eu tinha sido transportada de volta aqui de alguma forma, sem perceber?
Uma vez que eu estava perto o suficiente, eu coloquei a minha mão sobre o
ombro de Ella. Foi através dela.
Eu era um fantasma de novo, e isso era uma visão, mas não era a que eu
queria.
— Ele está quebrando, — disse Irene. Ela e vários outros estenderam suas
mãos em direção ao chão, e uma sacudida de medo percorreu minha espinha.
Eles formaram um anel em torno de uma fenda na terra. Não poderia ter
sido mais do que alguns metros de comprimento, mas tentáculos de névoa
deslizaram através dele, girando como a língua de uma cobra como se estivessem
provando o próprio ar.
Cronus.
Os membros restantes do conselho estenderam suas mãos como eles
tinham feito de volta ao palácio, e os tentáculos torceram como se eles estivessem
irritados, mas eles finalmente desapareceram de volta para o chão.
— Ele fez isso, — disse Irene, enxugando o suor da testa. — Ele está
rachando a superfície.
— Temos a certeza de que vai todo o caminho? — Disse Theo.
— Como ele poderia vir assim? — Disse Dylan.
— Honestamente, eu sou o único com metade de um cérebro aqui? —
Nicholas, o marido de Ava, deu-lhe um olhar de advertência. Dylan revirou os
olhos e chutou um pouco da sujeira de volta para a rachadura.
— Você acha que Calliope encontrou uma maneira de libertá-lo? — Disse
Ella em voz assustada que não soava como ela.
— Se ela encontrou, então isso é inútil, — disse Dylan.
— Então nós temos que assumir que ela não encontrou, — disse Irene.
Seu cabelo vermelho parecia brilhar na luz do sol, e pela primeira vez desde que
eu a conheci, estava uma bagunça. Todos pareciam desgrenhados e exaustos. —
Temos que continuar indo como planejado.
— Então Cronus pode destruir-nos logo que ele descobrir que estávamos
trabalhando contra ele? — Disse Dylan.
— Então Cronus nunca terá a chance. — Irene acenou com a mão sobre a
rachadura, e a encheu de volta com a sujeira. Segundos depois, no entanto,
começou a esvaziar como o topo de uma ampulheta quando a sujeira caiu no
Submundo.
— Ele realmente fez isso, — disse Theo, e colocou uma mão protetora
sobre as costas de Ella. — Ele tem o seu caminho para fora.
Irene fez uma careta. — Talvez sim, mas isso também significa que
sabemos com certeza onde ele vai sair, e com alguma sorte, teremos tempo para
terminar de colocar nossa armadilha.
— Colocá-la onde? — Disse Dylan. — Em volta de toda a ilha?
— Se tivermos que fazer.
Dylan gemeu e saiu, deixando os outros para moer. Xander, que tinha
agido como um dos meus guarda-costas no Éden e tinha ficado quieto até agora,
passou seus dedos através de seu cabelo. — Nós todos vamos morrer.
— Não, nós não vamos, — disse Irene. — Não, se fizermos isso direito e
trabalharmos juntos.
— E se os outros já estão mortos? — Disse Ella trêmula.
Irene estreitou os olhos, e com um gesto irritado, ela encheu a rachadura
com a sujeira novamente e virou-se. — Nós não temos nenhuma maneira de
saber, por isso temos que continuar e espero que eles não estejam. Nós não
temos uma escolha.
— Sim, nós temos, — chamou Dylan quando ele se sentou na beira do
penhasco, as pernas balançando. — Nós não tentamos lutar, e esperamos que
Cronus não nos mate, também.
Antes que alguém pudesse dizer qualquer outra coisa, a Grécia e a luz do
sol caíram, e eu mais uma vez encontrei-me na escuridão do Submundo.
— Foi Cronus, — eu disse enquanto eu lutava para me sentar. James, Ava
e Persephone, todos olharam para mim, mas desta vez eles não estavam
pairando. Nós na fogueira, e os tremores e quedas tinham parado por enquanto.
Seria apenas uma questão de tempo antes de Cronus tentar novamente, embora.
— Ele quebrou a superfície.
Ava ficou branca, e Persephone se afastou de mim.
Exatamente como Irene se afastou da prova de que Cronus estava
acelerando para a vitória.
— Quão longe é a porta para o Tártaro? — Disse James.
— Eu não sei ao certo, — disse Persephone. — Poucos dias, pelo menos.
— Nós precisamos nos mexer. — James me ofereceu sua mão, e eu peguei
tempo suficiente para deixá-lo ajudar-me. Por mais que eu queria ficar com raiva
dele, eu poderia lidar com isso quando nós voltássemos para o palácio. Se
voltássemos para o palácio.
— Os outros estão fazendo uma armadilha para ele em uma ilha, — eu
disse. — Eles estão brigando sobre isso.
— Mas eles ainda vão tentar? — Disse James, e eu assenti. — Ótimo. Pelo
menos é alguma coisa.
Nós embalamos o acampamento, e logo estávamos em nosso caminho em
direção ao local onde o céu tinha caído, Persephone caiu em passo ao meu lado.
— Você é capaz de controlar?
Eu balancei a cabeça. — Eu não tive tempo de tentar.
Ela fez um som de desaprovação na parte de trás de sua garganta, mas,
para seu crédito, ela não empurrou. — Você está definitivamente fazendo isso
inconscientemente, — disse ela. — Eu tive que trabalhar para isso, no início,
também, mas você está vendo o que você quer ver, quando quiser ver. Você
descobriu da onde o acidente veio, de qualquer maneira.
Eu não respondi. Não importa o que eu vi, isso não mudaria o que estava
acontecendo. O melhor que podia fazer era dar-nos o aviso justo, e mesmo que
não era importante, nós já sabíamos o que estávamos enfrentando. A única coisa
que poderíamos fazer, como Irene e Dylan e os outros, era tentar o nosso melhor
e esperarmos para o inferno que funcionasse.
Nós andamos por dias, mas pareciam semanas. Se eu ainda fosse mortal,
meu corpo teria estado tão dolorido que eu não teria sido capaz de me mover,
muito menos me manter com o ritmo acelerado de James e Persephone, mas eu
consegui. A cada poucas horas, outro acidente ecoaria através do Submundo,
cada vez mais alto e estimulando-me.
— É o mais fino ponto no teto do Submundo, — disse Persephone quando
nós arrastamos pela floresta sem fim. — Hades o abriu quando eles inicialmente
capturaram Cronus, e foi como eles conseguiram colocá-lo em sua prisão em
primeiro lugar. Hades deveria ter reforçado quando ele teve a chance. — Mordi o
lábio para não retrucar. Isso não foi culpa de Henry. Ele não tinha motivos para
suspeitar que um membro da sua família iria trair os outros e despertar Cronus,
e se Calliope não poderia abrir o portão sozinha, então ele provavelmente pensou
que era toda a segurança que precisava. Era, antes de Calliope ter enlouquecido.
Para a maior parte, nós caminhamos em silêncio. Mesmo Ava e
Persephone pararam de brigar, e quando tivemos que parar, era por não mais do
que alguns minutos à uma hora. Eu não precisava dormir mais, mas com o
tempo as falhas eram apenas um quilômetro de distância, tudo que eu queria
fazer era enrolar, fechar os olhos e nunca mais acordar novamente. Isso seria
exatamente o que aconteceria se Calliope tivesse seu caminho, além de um pouco
de sangue e muita dor.
Quase toda vez que paramos, houve uma flor esperando por mim, e antes
que alguém pudesse vê-la, eu coloquei-a no meu bolso com as outras. Elas
pareciam encolher enquanto seguimos, abrindo espaço para as novas, e cada
uma me deu esperança de que tudo ficaria bem. Henry e minha mãe estavam
aguentando. Eles iriam sobreviver, e uma vez que chegássemos lá, não
estaríamos sozinhos em nossa briga para dominar Calliope e Cronus.
Uma tarde, no meio da floresta, Persephone levantou a mão, e nós quatro
paramos. — Por aqui, — disse ela, apontando para a esquerda. — Estamos perto.
— Ela passou por algumas árvores até que chegou um cluster espesso de
arbustos. Agachando-se, empurrou-os de lado, revelando uma folha de rocha
negra por trás disso. A parede da caverna.
Meu coração batia forte.
— Este é o limite, — disse ela, passando a mão carinhosamente sobre a
pedra. — Deve haver uma rachadura aqui em algum lugar - Oh!
Sua mão desapareceu na rocha aparentemente sólida, mas quando ela
puxou-a de volta para fora, estava intacta. — É aqui, — disse ela. — É grande o
suficiente para nos espremer através se formos um de cada vez.
— Até onde ela vai? — Disse Ava nervosamente.
— Eu não sei, — disse Persephone. — Eu nunca tinha passado por isso.
— Ela se endireitou e limpou a sujeira fora de seu vestido. — Bem, nós estamos
indo?
Ava ligou meu braço no dela, e James olhou para nós.
— Kate, você vai ficar aqui, — disse ele.
Eu bufei. — Sim, certo.
Ele estendeu a mão para colocar a mão no meu ombro, mas eu me afastei
de seu toque. — Estou falando sério, — disse ele. — Calliope vai tentar matá-la
no momento em que ela ver você, e você vai ser uma deficiência.
Eu me virei para Ava para apoio, mas ela olhou fixamente para o chão,
mordendo o lábio inferior entre os dentes. — Você também? — Eu disse, e eu
deslizei meu braço do dela. — Então, o que, vocês acham que vocês vão lá e
salvam o dia, mas se eu for com vocês...
— Se você vier, você vai morrer, não importa o que nos acontece, — disse
James. — Você sabe disso.
— Eu fiz um acordo com Cronus...
— Você realmente acha que ele vai segurar o seu lado? — Disse Ava.
— James está certo. Calliope quer você morta, e, desde que ela possa se
concentrar nisso ela vai se distrair. Uma vez que você se foi, ela vai continuar
com seu plano, e então não há como dizer o que pode acontecer.
— Você não tem experiência, — disse James. — Sem habilidades que você
pode controlar. Se você entrar lá, a melhor coisa que poderia acontecer é Calliope
te matar rapidamente.
— Eu não vim até aqui para ficar quieta enquanto vocês são abatidos, —
Disse eu, apertando meus punhos.
— Então para o que você veio até aqui? — Disse Persephone. — Para todos
os efeitos, você é inútil, e você é inteligente o suficiente para saber disso, então,
por que você veio? A única coisa que você vai ser boa lá é morrendo... — Ela
parou, e seus olhos se arregalaram uma fração de polegada.
— Você vai oferecer a Calliope uma troca, não é? — James me deu um
olhar acusador, e a boca de Ava caiu aberta em descrença. Minhas bochechas
queimaram, mas me recusei a desviar o olhar.
— Não, — eu disse com tanta convicção como eu poderia dar, mas
Persephone balançou a cabeça de qualquer maneira.
— Você é uma idiota. Uma idiota absoluta. Eu não me importo com o tipo
de acordo que você fez com Cronus ou quão mal Calliope quer você morta. Todas
as apostas estão fora no momento em que você entrar lá.
— Se você está morta, Henry vai desaparecer, também, — disse Ava. —
Você é a única razão que ele ainda está vivo, e ele não vai ser capaz de viver com
a culpa de você morrer por ele.
— Você tem que entender – se Henry desaparecer, não vamos ter uma
chance contra Cronus, — acrescentou James. — Mesmo se eu tomar o seu lugar,
eu não sou um dos seis. Eu não tenho o poder de manter Cronus contido
enquanto ele está acordado, não como Henry pode. Nós não podemos correr esse
risco.
Meus olhos picaram com lágrimas quentes. Eu pisquei para mantê-las de
transbordarem, mas foi inútil. Limpei meu rosto e olhei para os três, raiva e
frustração fervendo dentro de mim. — Então é isso? Eu fico aqui e espero? O que
acontece se vocês todos morrerem? O que eu devo fazer, então?
— Isso não vai acontecer, — disse Persephone com uma fungada.
— Há apenas uma maneira de lidar com Calliope, e isso é dar o que ela
quer. Como não podemos entregá-la, nós vamos oferecer-lhe a próxima melhor
coisa.
— E o que é isso? — Eu disse amargamente. — Convencer Henry a amá-la
e fazê-la sua rainha em vez de mim?
Persephone bufou. — Dificilmente. Eu vou abrir o portão. — E antes que
qualquer um de nós tivesse a oportunidade de detê-la, ela piscou e desapareceu
através da parede.
11
INGRID
Desta vez, quando eu abri os olhos e vi caverna de Cronus, não era uma
visão.
Eu congelei quando peguei na cena diante de mim. Eu meio que esperava
ver o banho de sangue que Calliope havia prometido, mas em vez de mim como a
vítima, ela teria levado a sua raiva para fora em Persephone.
Mas Persephone estava no centro da caverna, completamente ilesa. Seus
olhos se estreitaram e suas mãos em seus quadris quando ela ficou cara-a-cara
com Calliope, e nenhuma das duas disse uma palavra. Por que ela não estava em
pedaços, ou pelo menos muito ensanguentada e quebrada? E onde estavam
James e Ava?
Os membros mais velhos do conselho ainda estavam acorrentados na
boca da caverna, e, tanto quanto eu poderia dizer, todos eles estavam
inconscientes. Eu só contava cinco, embora, e eu não podia ver qualquer sinal de
cabelo loiro entregando Ava.
Então eu vi Cronus. A névoa girava em torno das barras de sua jaula, e
em vez de ir atrás de Persephone, moveu-se para cima, para o teto, formando
uma piscina no topo.
Apenas alguns metros abaixo, pendurados em seus braços por tentáculos
de névoa, estavam James e Ava.
Qualquer questão se eu tinha feito ou não a coisa certa desapareceu. Na
melhor das hipóteses, Calliope iria mantê-los todos como reféns.
Na pior das hipóteses, eles seriam mortos logo que ela lidasse com
Persephone. Eu olhava, em busca de sinais de vida de qualquer um dos dois
corpos pendurados no teto. Nada.
— Eu não tenho o dia todo. — Calliope cortou o silêncio, e um arrepio
percorreu minha espinha. Seu tom de voz, garota inocente, se foi, substituído
pela voz abrangente de uma divindade, o mesmo tipo usada por Henry quando ele
estava chateado. Estava cheia de comandos e exigia respeito, e mesmo que eu
estava escondida, o desejo de obedecer correu através de mim.
— Eu não sei o que você quer de mim, — disse Persephone exasperada. O
que ela estava fazendo? — Eu já te disse que eu não estou dizendo nada a menos
que você os deixe ir. Você não pode me manter aqui, e eu estou perfeitamente
feliz andando de volta para o meu pequeno pedaço do paraíso e esquecer que algo
disso aconteceu.
Calliope xingou, e um choque de puro poder sacudiu a caverna, fazendo
um pedaço de rocha para fora da parede atrás de Persephone.
Em vez de fazer algo sensato como cair morta ou chorando em agonia,
Persephone riu. — É realmente tudo que você tem? Eu tenho a eternidade para
jogar estes jogos, mas se tudo o que você vai fazer é repetir a mesma coisa, vai
ficar tedioso rapidamente.
— Eu vou ter Cronus para matá-los um por um até que você me diga, —
disse Calliope, levantando a voz que subiu até que estalou. — Eu vou fazê-lo
lentamente, e eu vou ter certeza de que saibam que você é a responsável.
— Se você machucar um único deles, o acordo é cancelado, e você vai
estar presa cuidando de um monte de corpos flácidos para sempre, — disse
Persephone. — Tenho certeza que Cronus não apreciaria muito.
O nevoeiro atacou, mas foi direto através de seu torso, e Persephone não
vacilou. Por alguma razão, eles não poderiam machucá-la, e ela deveria saber. Foi
por isso que ela tinha entrado. Este tinha sido seu plano o tempo todo. A menos
que ela tivesse sorte.
— Você acha que eu sou idiota? — Disse Calliope, suas palavras pingando
com desprezo. — Eu sei exatamente o que vai acontecer no momento em que
remover suas correntes, e não termina bem para mim.
— Isso não vai acabar bem para você, não importa o que aconteça, —
disse Persephone. — Você conseguiu ter-se presa em uma situação impossível, e
a única pessoa que você tem que culpar é você mesma.
Calliope rosnou, e as paredes ao nosso redor tremeram. Preocupada que a
caverna inteira ia desabar sobre nós, eu dei um passo para trás em direção à
abertura na parede. Ser enterrada viva – como uma imortal, não menos – não
estava na minha lista de coisas para fazer.
Por fim, o tremor parou, e Calliope disse em uma voz tão suave que eu tive
que me esforçar para ouvi-la, — Traga-me Kate, e eu vou deixá-los ir.
— Deixe-os ir, e eu vou, — rebateu Persephone. — Perdoe-me se eu não
confio em você, mas você não foi muito confiável nos últimos tempos.
Calliope fez uma careta. — Eu não vou fazer isso, não sem Kate, e se você
não vai trazê-la para mim, então não há nenhum ponto em continuar. Ela virá
mais cedo ou mais tarde, e até que isso aconteça, eu vou esperar.
Caramba. É claro que a escolha que eu tinha feito sozinha era a única
coisa que poderia estragar plano de Persephone.
Eu avancei em direção à saída. Se eu pudesse encontrá-la antes que
Calliope me visse, então eu escorregaria para fora e esperaria por Persephone se
juntar a mim. Ingrid iria esconder-me se eu explicasse o que estava acontecendo,
e então nós três poderíamos criar estratégias. Se Persephone poderia vir dentro
da caverna, então que assim poderia Ingrid, e talvez Calliope não seria capaz de
machucá-la, também. Elas poderiam distraí-la enquanto eu libertava os outros,
e...
Um silvo de energia fez o meu cabelo em pé, e a pedra que eu tinha
escondido atrás explodiu. Eu instintivamente cobri minha cabeça e me abaixei
quando a pedra voou quebrada através do ar, mas as peças ficaram a cima de
mim, deixando meu corpo ileso.
Silêncio morto encheu a caverna.
Tudo dentro de mim gritou corra. Eu arranhei a rocha, e se eu ainda fosse
mortal, eu teria raspado meus dedos até o osso. Mas eu não podia achar a saída.
O riso mau de Calliope reverberou pela caverna, e eu parei de lutar. Era
inútil. Ela tinha me visto, e não havia como escapar agora.
— Isso não demorou muito, — disse ela em uma voz cantante. — Você
realmente não pode fazer nada direito, você pode, Kate? Você não pode sequer
correr para salvar o seu precioso Henry do jeito que você queria.
Eu apertei meu queixo e não disse uma palavra. Isso era exatamente o
que Calliope queria para me irritar. Eu não lhe daria a satisfação.
— Hera, — disse Persephone, mas Calliope levantou a mão para silenciá-
la. Persephone olhou para mim. Eu não a culpei.
— Isso certamente muda as coisas, não é? — Disse Calliope alegremente.
Ela fez sinal para eu chegar mais perto. Quando não me movi, ela fez um gesto, e
uma força irresistível me puxou em sua direção. Nenhuma quantidade de travar
meus calcanhares no chão teria feito qualquer diferença.
Eu estava apenas a alguns metros dela quando ela levantou a onda de
poder, e perdi o equilíbrio, eu caí no chão. Seu pé conectou com o meu estômago,
e todo o ar deixou meus pulmões.
— Isso é por ser tão idiota, — disse ela. — Você é patética, você sabe. Nem
mesmo é uma adversária digna. É como pegar as asas de um inseto e vê-lo se
contorcer ao redor.
— Eu não sei, — eu chiei. — Eu não sou uma puta sádica como você.
Ela me chutou novamente, e desta vez o pé conectou com o meu queixo.
Doeu, e minha cabeça chicoteou de volta, se eu tivesse sido mortal, eu tinha
certeza que teria quebrado meu pescoço. Mas ela não poderia ganhar mais
facilmente.
— Pare com isso, — disse Persephone. — Tudo o que ela fez foi passar por
um teste estúpido. Eu sei que você ama Hades, mas existem homens melhores lá
fora. Confie em mim.
— Confiar em você? — Calliope arrodeou Persephone. — Por que eu,
possivelmente, confiaria em você? Você o destruiu. Você tomou o seu amor e
empurrou-o de volta em seu rosto, como Walter fez para mim. Você não poderia
entender o que sente, sua hedionda
— Não, — eu disse, lutando para meus pés. — Ela queria ser feliz. Não há
crime nisso.
— Há, quando você quebra alguém no processo, — disse Calliope com um
grunhido. — Além disso, não é sobre isso, não mais. Henry fez sua escolha
quando ele recuou na sua punição. Você realmente acha que eu teria o
sequestrado se eu pensasse que eu ainda tinha uma chance?
— Então você vai matá-lo, porque eu decidi que você tinha que enfrentar
as consequências pelo que você fez? — Eu disse. — Você está falando sério?
Calliope apertou meu cabelo no punho e puxou minha cabeça para trás.
— Eu estou falando sério quando digo que você não vai sair daqui viva. Se
Persephone não vai me dizer como abrir o portão, então eu vou ter Henry fazendo
em seu lugar. — Do outro lado da caverna, na boca da caverna onde os outros
estavam inconscientes, o corpo de Henry empurrou para cima. Suas correntes
sacudiram e se separaram das dos outros, arrastando no chão enquanto ele
flutuava em nossa direção. Um nó se formou na minha garganta com a visão de
seu corpo ensanguentado, ainda pior do que tinha sido na minha última visão,
mas ele estava vivo. Enquanto Calliope não sabia como abrir o portão, então ela
não iria matar qualquer um de nós. Ela não podia. Henry não abriria se eu
estivesse morta.
— Acorde, — ela resmungou, e Henry abriu os olhos.
Meu coração pulou uma batida, e por um longo momento, olhamos um
para o outro. Seus olhos eram do mesmo tom bizarro de luar, mas a centelha se
foi. Eu procurei por algum sinal de que ele estava lá, qualquer indicação de que
ele poderia lutar, mas era como se ele nem sequer me visse. Ele tinha desistido.
— Henry? — Eu sussurrei, e ele piscou. — Henry, por favor... olhe para
mim.
Ele já estava olhando para mim, mas ele não me via, e eu não sabia como
pedir isso. Ele não estava lá. Seja o que for que Calliope e Cronus haviam feito
com ele, ele recuou muito em si mesmo que o resto do mundo não existia.
Calliope pegou a ponta solta de suas correntes de nevoeiro infusas e as
chicoteou em seu rosto. Engoli em seco e lutei contra ela, mas ela segurou-me
com uma força sobre-humana.
Um padrão vermelho brilhante floresceu em todo rosto de Henry, e,
finalmente, ele balançou a cabeça e voltou a si. Ele tocou seu rosto e fez uma
careta, e eu exalei. Ele estava lá, afinal.
Em vez de olhar para mim, no entanto, seu olhar focou em algo atrás de
mim, e sua mandíbula folgou. — Persephone?
Eu gostaria ter sido cortada aberto por Cronus que a experiência da dor
lancinante que veio com ouvir seu nome antes do meu.
— Olha quem decidiu se juntar a nós, — disse Calliope, puxando meu
cabelo. Henry rasgou o seu olhar de Persephone se concentrando em mim, e o
olhar no rosto dele fez meu estômago revirar. — Parece que alguém não tem um
cérebro em sua cabeça, mas isso não é surpresa, não é? Você sabe como escolhe-
las. Eu não tive que fazer uma coisa. Ambas valsaram aqui por conta própria,
praticamente embrulhadas para presente para mim.
A expressão de Henry endureceu. — O que você quer?
— Será que realmente precisamos passar por isso de novo? — Disse
Calliope. — Diga-me como abrir a porta, e, eu as deixarei ir.
— Henry, não, — eu disse. — É uma...
Calliope bateu a mão sobre minha boca. Sem pensar, lambi sua mão,
exatamente como eu tinha feito para James.
Eu teria mordido ela se eu poderia ter, mas saliva era suficiente. Ela fez
um barulho revoltado e puxou a mão, me dando tempo suficiente para terminar.
— É uma armadilha, — eu disse. — Ela não pode ferir Persephone, e ela vai me
matar de qualquer maneira.
Calliope passou a mão na minha camisa, e seu aperto no meu cabelo
apertou. — Será que isso importa? Nós dois sabemos que Henry não tem escolha
a não ser arriscar.
Eu lutei contra ela, mas não adiantou. Calliope preferia puxar cada fio do
meu cabelo do que me deixar ir.
— Por favor, — eu disse. — Henry, você não pode, não vale a pena...
— Tudo bem, Calliope, — ele disse calmamente. — Eu vou dizer-lhe como
abrir com a condição de que você deixe Kate ir primeiro.
Calliope fungou. — Dificilmente.
— Você tem que me oferecer alguma segurança, — disse Henry. — O que
vai ser?
Ela me pegou em um estrangulamento, com o braço esmagando minha
traqueia. — Você me diz. O portão ou a sua esposa bonita?
O músculo na mandíbula de Henry contraiu, o mesmo que me dizia
quando ele estava à beira da implosão. — Persephone, então, — ele disse. — Você
deixa Persephone ir, e eu vou dizer o que você quer saber.
— Feito. — Calliope acenou para Persephone sair, mas Persephone não fez
nenhum movimento para ir.
— Você é um idiota, — ela disse a Henry. — Eles não podem me
machucar, e eu não vou embora.
— Não importa para mim, — disse Calliope. — Eu fiz a minha parte do
acordo. Persephone está livre para ir, e não é minha culpa que ela não quer,
então você ainda tem que me dizer como abrir o portão. Justo é justo.
Henry ficou em silêncio, e eu abri minha boca para protestar, mas
nenhum som saiu. Calliope pensou que isso era ser justo? Liberando um Titã
para destruir o mundo por vingança, matando todos que entram no caminho dela
– o que algo disso era justo? Minha visão começou a embaçar, e eu pisei no pé
dela, mas ela mal se moveu. Eu teria dado qualquer coisa para alcançar minhas
mãos nas correntes infundidas de nevoeiro de Henry.
— Chop, chop, — disse Calliope, apertando sua mão. — Kate está
sufocando.
— Ela vai acordar no momento em que você deixá-la ir, — disse Henry
friamente, e nada que Calliope dissesse poderia coincidir com o buraco deixado
das palavras dele dentro de mim.
A sala começou a girar e pontos brilhantes apareceram na minha visão,
embora eu não tivesse certeza se era do que Henry tinha dito ou da falta de
oxigênio no meu corpo. De qualquer maneira, usando as poucas forças que eu
tinha sobrando, eu arranhei o braço de Calliope e tentei de novo e de novo
remove-la. Nada funcionou.
— Persephone, vá embora, — ele ordenou.
Ela zombou. — Eu não vou a lugar nenhum.
Poder começou a construir-se em torno dele, tão escuro e perigoso como o
de Calliope. — Você vai fazer o que eu digo e sair imediatamente. Eu sou seu rei,
e você vai me obedecer.
Persephone bufou e girou sobre seus calcanhares. — Tudo bem, — ela
disse enquanto marchava para o outro lado da caverna, onde a rachadura na
parede esperava por ela. — Veja se eu tento ajudá-lo de novo.
A tensão no ar parecia crepitar, e uma vez que ela se foi, Henry exalou e
se reorientou para Calliope. — A fim de abrir os portões, um governante do
Submundo deve voluntariamente sacrificar sangue contra cada uma das barras.
— Ele falava monotonamente, como se ele não se importasse mais, e eu não tinha
tanta certeza de que ele se importava. Calliope afrouxou seu aperto ao redor do
meu pescoço, e eu caí de joelhos. Meus pulmões sentiam como se estivessem em
chamas, e eu inalei o precioso ar frio enquanto meu corpo recuperava a sua
força.
— Interessante, — disse Calliope quando ela enrolou o final das correntes
de Henry ao redor do meu pescoço. Elas queimaram branco-quente contra a
minha pele, mas pelo menos ela não as apertou. — Parece que você tem algum
nível de inteligência depois de tudo. Devo mesmo pedir?
Por uma fração de segundo, eu pensei que eu vi uma dica de um sorriso
no rosto de Henry. Quando eu pisquei, ele se foi. — Você está me pedindo para
liberar o ser mais poderoso do universo, que, sem dúvida, causará estragos no
mundo antes de aniquilar a humanidade e matar todos nós?
— Sim, — disse Calliope, aparentemente sem se abalar com o futuro que
Henry pintou. — Em troca da vida de Kate.
— Em troca da vida de uma garota que conheci há um ano e só vi por
alguns minutos nos últimos seis meses. — Algo dentro de mim se desintegrou, e
eu me forcei a meus pés. Ele estava certo. Eu não valia a pena. Eu sabia que eu
não valia antes que ele tinha dito isso, mas de alguma forma ouvir as palavras
vindas da boca dele tornou real. Mesmo que ele me amava, eu era uma pessoa.
Eu era uma vida. Seria tolo ele abrir o portão para me salvar, não importa como
ele se sentia.
Calliope suspirou. — Você pode ter o resto deles enganado, mas eu te
conheço melhor do que você conhece a si mesmo. Seu blefe não vai funcionar.
— Quão certa você está que eu estou blefando? — Disse Henry. Calliope
não disse nada. — Muito bem. Desde que Kate insiste que você vai matá-la de
qualquer maneira, e uma vez que é claro que você não tem nenhuma intenção de
deixá-la ir, porque não te deixo com a sua recompensa e passo a oferecer outro
comércio? Vou abrir o portão para você depois que você liberar os outros. — Ele
olhou para o teto, onde James e Ava estavam pendurados. — Todos os outros.
Os olhos de Calliope se estreitaram, e ela bateu seus dedos contra sua
coxa. — Você não vai colocar uma briga por Kate, — ela disse, e Henry assentiu.
— Como eu sei que não é uma armadilha?
— Como pode ser? — Disse. — Cronus está aqui, e Kate não tem
importância para o conselho. Querendo ou não, ela vive ou morre, você terá a
vantagem. Você de todas as pessoas sabe que não podemos vencê-lo sem você.
Estou apenas pedindo que a minha família seja devolvida para que possamos nos
preparar para nos render com dignidade.
Eu não conseguia respirar, e desta vez não teve nada a ver com as
correntes que Calliope tinha em volta do meu pescoço. Henry quis dizer isso.
Estando ou não blefando antes, havia agonia em sua voz que sacudiu através de
mim como se fosse a minha dor, também. Ele sabia que era uma causa perdida.
Calliope me queria, e ele queria seus irmãos de volta. Era uma troca justa, e tudo
o que ele iria perder era uma garota que mal conhecia.
Eu estava realmente indo morrer. As incontáveis horas que eu passei me
preparando para esta possibilidade durante a nossa jornada através do
Submundo não fez nada para amortecer a realização angustiante que eu não ia
existir mais. Eu não tinha ideia do que acontecia aos deuses depois que
desapareciam, mas Persephone teve que virar mortal para se juntar a Adonis no
Submundo, eu assumi que não havia qualquer tipo de vida após a morte.
Eu não estava pronta para isso. Ainda não. Não assim.
— Henry, por favor, — eu disse com a voz embargada. Eu escovei meus
dedos contra os dele, e apesar de seu rosto de pedra, seu pomo de Adão
balançou.
Ele não olhou para mim. Eu vim aqui sabendo que isso era uma
possibilidade, que Calliope rasgar-me-ia à parte e eu nunca iria voltar para casa,
mas eu nunca esperei que Henry desse a sua bênção. Antes disso, eu tinha
conseguido segurar a esperança de que em algum lugar dentro dele, ele me
amava, mas isso tinha desaparecido agora. Junto com cada pedaço de força
interior que eu precisava para deixar Calliope roubar o resto da minha vida mais
uma vez.
— Quão tocante, — disse Calliope. — Muito bem, Henry. Você tem um
acordo.
Ela acenou com a mão, e James e Ava começaram a descer. Eu ouvi um
gemido da boca da caverna, mas antes que eu pudesse ver quem era, meu corpo
se moveu involuntariamente em direção ao portão e o nevoeiro ameaçador que
girava em torno dele. Henry se moveu, também, seus pés arrastando pelo chão.
— Por favor, não, — eu ofeguei quando tudo dentro de mim drenou,
deixando-me com nada, apenas o instinto irresistível para sobreviver. Eu
arranhei as correntes no meu pescoço, mas elas queimavam minhas mãos, e não
era de nenhum uso.
Se eu morresse na mão de Calliope ou Henry soltasse Cronus e ele me
despedaçasse por ela, eu não tinha a menor chance se Henry não ia lutar. E ele
estava abrindo o portão - ele não podia. Ele não podia.
— No momento em que você abrir, os outros vão estar acordados o
suficiente para sair, — disse Calliope. — A menos que você quer que eu mude de
ideia e os coloque para dormir novamente, eu começaria se eu fosse você.
Com a boca numa linha fina, Henry pegou um pedaço de névoa com
infusão de pedra nas proximidades. Primeiramente eu não percebi o que ele
estava fazendo, mas quando ele apertou um canto afiado contra a palma da mão
e arrastou-a para baixo, eu cobri minha boca, horrorizada.
Sangue escarlate agrupou em sua mão, e ele apertou-a contra a barra da
primeira porta, sussurrando algo que eu não podia ouvir.
— Henry. — Eu era uma bagunça soluçando agora, mas eu não me
importava. Ele iria fazer todos serem mortos. — Não faça isso. Por favor. Eu vou
fazer qualquer coisa.
Ele não fez mais do que vacilar. Quando Henry puxou a mão dele, a barra
gemeu, e dividindo a pedra no meio da marca que seu sangue fez. Calliope
pairou, vestindo um sorriso tonto, e quando sua excitação cresceu, seu domínio
sobre a corrente em volta do meu pescoço afrouxou. Esperança selvagem me
encheu quando eu escorreguei meus dedos entre meu pescoço e os elos. Nada do
que eu disse poderia parar Henry, mas se eu pudesse escapar-
— A próxima! — Exclamou Calliope.
Henry fechou os olhos e apertou a mão contra a segunda barra. Quando
também se desintegrou, eu freneticamente trabalhei em me soltar da corrente,
enquanto Calliope estava preocupada demais para notar. Seu corpo inteiro
parecia tremer de emoção, e o nevoeiro derramou para fora entre a parte aberta
da porta, tudo, menos obscurecendo Henry. Eu ainda podia ver a silhueta de
Calliope, mas mal. Ao contrário do nevoeiro nas correntes, esse não picava; como
o deserto, parecia como penas contra a minha pele.
Finalmente minha cabeça saiu do laço, e eu estava livre.
Tudo o que eu tinha a fazer era achar a saída. Se Henry continuasse a ir
assim lentamente, eu teria tempo para ajudar a libertar os outros, e talvez eles
poderiam falar algum sentido para ele.
Mas meus pés estavam colados ao chão. Não por alguma força exterior,
mas porque eu não poderia deixar Henry. Se ele parasse, Cronus iria destruí-lo.
Ele iria destruir todos nós. E eu não podia ficar parada e deixar isso acontecer.
Foi a decisão mais difícil que eu já tinha feito, mas eu fiquei.
Havia dez barras no total. Com cada uma que Henry abriu, Calliope
perdeu mais de sua compostura, até que ela soltou a corrente completamente.
Pulando para cima e para baixo, ela bateu palmas e soltou um grito estridente.
Minhas entranhas torceram em nós. Era isso.
O tempo pareceu parar, a névoa abafando tudo. E nesse momento,
quando o mundo ficou em silêncio, o som de sussurros serpenteava em minha
direção da direção da caverna.
Meu coração batia forte. Os outros estavam acordados.
Quando a rachadura da sétima ecoou pela caverna, Calliope riu
alegremente, e na neblina, alguém agarrou meu pulso. Eu lutei para quebrar o
domínio deles, mas o metal frio de um anel de casamento escovou contra a minha
pele, e eu acalmei. Henry.
O que ele estava tentando fazer? Ele tinha mudado de ideia? Ele só tinha
três barras sobrando, e seria uma questão de segundos antes que Calliope
percebesse que ele não estava fazendo o que ela queria mais. Cronus nos cercava,
e tudo o que levaria era – bem, eu não estava inteiramente certa do que, mas ele
iria matar até o último de nós se Henry renegasse.
E então ele pressionou uma corrente dolorosamente quente na minha
mão.
A silhueta de Calliope parou de se mover. — Continue, — ela exigiu. —
Posso contar tão bem quanto você.
— E se eu não quiser? — Disse Henry, uma vantagem que sua voz que
não tinha estado lá antes.
— Olhe ao seu redor, — disse Calliope. — Use seu cérebro, Henry. O que
você acha que vai acontecer? Cronus vai esmagá-lo. Ele lentamente vai moer seus
ossos em pó e pintar as paredes com o seu sangue. Ele vai fazer o mesmo com a
sua esposa, suas irmãs e seus irmãos, e uma vez que ele terminar, ele vai fazer o
mesmo para os que tiveram o bom senso de não vir. Pensando bem, seria muito
mais divertido se nós o mantivéssemos vivo para assistir a coisa toda, não é? Eu
estava pensando em fazer Walter assistir, e eu tenho certeza que ele iria gostar da
companhia.
— Eles são a sua família, também, — eu disse, a corrente queimando
minhas mãos, mas eu me recusei a soltar. Se eu não podia vê-la, então ela não
podia me ver. Ela não podia ver o que Henry tinha feito.
Cronus estava em toda parte, porém, e se ele estivesse prestando
atenção...
— Não, eles não são, — ela cuspiu. — Não mais. O conselho governou por
tempo suficiente, e eles fizeram uma paródia de si mesmos e tudo o que eu
defendo. Jogaram-me de lado, como se eu não fosse nada. Você tem alguma ideia
de como se sente? É claro que você não tem, Kate. Você ganhou. Você tem tudo o
que você queria.
Nem tudo. Eu não tinha Henry, e eu não tinha certeza de que eu jamais
iria. Mas eu mordi minha língua. A última coisa que ela precisava era de um
motivo para fundir-me em pedaços.
Sua silhueta veio à tona quando Calliope arrodeou Henry. — Você e
Walter vão sofrer a dor que vocês me fizeram passar por todas estas eras, e eu
prometo aproveitar cada momento.
Eu não podia ver o que ela fez com ele, mas Henry gritou, um som feio
torcido que me engoliu toda até que tudo deixou de existir, exceto a minha
necessidade premente de pará-la. Eu me movi para ela sem pensar. A corrente
queimando em minhas mãos, e eu balancei tão duro quanto eu poderia. Um
doente crack encheu a caverna quando conectou com a parte de trás da cabeça
Calliope, e os elos enrolaram em seu pescoço, queimando seu rosto bonito.
Eu esperava que ela gritasse ou berrasse ou brigasse de volta de alguma
forma, e eu não iria entregar a ela facilmente. Eu balancei para ela de novo e de
novo, louca com a necessidade de me certificar de que ela nunca tivesse outra
chance de machucar Henry ou qualquer outra pessoa que eu amava, mas alguém
finalmente pegou meu braço.
— Chega, — disse Henry. — Olha.
Meu coração batia forte quando eu avancei para frente, olhando através
da neblina. Agarrei a corrente, preparada para bater de novo se ela pulasse em
mim. Em vez disso, meu pé bateu em alguma coisa quente e sólida.
Calliope.
Henry colocou seu braço em volta de mim e agarrou o tornozelo de
Calliope. Olhei para seu corpo flácido, dividida entre horror e satisfação quando o
sangue escorria de um corte na bochecha.
— Saia, — ele gritou, sua voz crescendo, apesar de seus ferimentos. Um
som sibilante ecoou pela caverna, e o ar ficou tão quente que eu senti como se eu
estivesse sendo cozida viva.
Facas pequenas picaram em mim, enterrando debaixo da minha pele e se
tornando lava derretida.
Eu gritei, incapaz de lidar com a dor monstruosa espalhada através de
meu corpo. Meus joelhos cederam, mas Henry estava lá para me pegar, e suas
correntes caíram no chão. Ele não disse nada quando ele me puxou contra ele e
enterrei meu rosto em seu peito. A próxima coisa que eu sabia, as facadas foram
embora, e o ar frio me envolveu.
— Está tudo bem, — disse Henry em tom suave que eu queria ouvir tão
mal desde que pisei no Submundo. Mesmo que ele devia ter estado ferido,
também, ele correu seus dedos pelo meu cabelo confortavelmente. — Você está
segura. — A agonia da névoa penetrando em meu corpo não tinha me deixado,
mas quando eu fiquei ali tremendo, não ficou pior.
Eu abri um olho, e quando eu vi a parede vermelha, meu estômago
embrulhou. Quem Cronus matou? James? Ava? Ou ele matou Calliope por ter o
falhado?
Quando a minha visão focou, eu percebi que não estávamos mais na
caverna. Estávamos na entrada do palácio, uma com os espelhos e paredes
vermelhas, e Calliope estava deitada no tapete, sangue escorrendo da ferida na
parte de trás de sua cabeça.
Estávamos em casa.
13
SOMBRA
O ódio queimando nos olhos Calliope fez todos os ossos do meu corpo
congelar no lugar, como se ela tivesse me transformado em pedra. Eu não tinha
medo dela, não realmente, mas qualquer pessoa com um pingo de
autopreservação teria parado quando enfrentasse esse tipo de aversão.
Walter estava ao lado dela, com as mãos em seus ombros, mas não
parecia com um gesto de proteção. Ela se sentou em uma cadeira de aço, e as
bandas brilhantes ao redor de seus pulsos e tornozelos a asseguravam no lugar.
No canto, Phillip silenciosamente a encarava com os braços cruzados sobre o
peito largo, e havia uma cicatriz profunda correndo através de seu olho esquerdo.
Ele virou branco leitoso.
— Kate, — disse Walter com um aceno de cabeça.
— Oi, — eu disse, desejando que a minha voz não estivesse tremendo
tanto. — O que está acontecendo?
— Eu sinto muito em incomodá-la, mas eu tenho medo que não tenhamos
escolha. — Ele apertou os ombros Calliope, e a mandíbula dela apertou. — Parece
que Calliope se recusa a falar com alguém além de você.
Meu coração se afundou. Olhei para Henry para confirmação, e ele
assentiu duramente. — Está b-bem, — eu disse, mesmo que não estava, e eu
respirei fundo para me equilibrar. Obviamente, isso era importante. — Tudo o
que você precisar.
Uma cadeira almofadada apareceu alguns metros à frente de Calliope, e
Henry me soltou para que eu pudesse sentar. Eu me inquietei, certa de que, se
fosse no poder de Calliope, ela teria me feito explodir em chamas ali mesmo.
— Tudo bem, Calliope, — disse Walter. — Ela está aqui como você pediu.
Diga-nos o que queremos saber.
Sua voz parecia ecoar na sala simples, como se ele estivesse realmente
dezenas de pessoas falando ao mesmo tempo. Não era nada como o mesmo tipo
de tom que Calliope tinha usado na caverna. Se Walter quisesse, eu tinha certeza
que ele poderia destruir o mundo com um único pensamento. Não é de admirar
que ele tinha sido nomeado o chefe do conselho.
Calliope permaneceu em silêncio, e Walter suspirou. Era o som que um
pai fazia quando seu filho estava lhe dando o tratamento do silêncio, não o tipo
de suspiro que um interrogador fazia quando seu suspeito ficou em silencio. Por
todo o seu poder, Walter não iria utilizá-lo contra ela, eu tinha certeza disso. Ela
era da família.
Eu não sabia se eu estava bem com isso ou não. Walter tinha feito coisas
terríveis para ela, involuntariamente ou não, e ele a colocou no inferno. Mas,
assim como James tinha insistido, não a desculpava por tudo que ela tinha feito,
e Walter tinha a obrigação de garantir que nada disso acontecesse de novo. Nós
todos tínhamos.
— Por favor, fale conosco, — disse, aliviada quando minha voz ficou
estável. — O que aconteceu com Cronus, acabou, e Walter e Phillip e Henry - eles
não vão te machucar.
Eu podia sentir Henry tenso atrás de mim. Se ele tivesse o seu caminho,
ela seria uma pilha de cinzas agora.
Um sorriso lento se espalhou pelo rosto Calliope, e seus olhos brilharam
com malícia. — Você acha que isso acabou? Henry abriu sete das barras. Era só
uma questão de tempo antes que Cronus estourasse completamente de qualquer
maneira, mas agora ele estará fora no solstício de inverno. Quando ele estiver
livre, ele vai vir para mim, e ele vai destruir todos vocês por segurá-lo preso. —
Ninguém disse a Calliope que ela estava errada. Os três irmãos, todos nos
assistiam, e nenhum deles se preocupou em dizer a ela que o conselho iria conter
Cronus.
Foi porque não podiam. Cronus iria escapar de qualquer maneira, e não
havia nada que pudessem fazer para detê-lo. Por causa de mim, Cronus faria
exatamente o que ele quisesse, e sem Calliope, o conselho era impotente para
detê-lo.
Tão corajosa como eu queria parecer, todo o sangue drenou do meu rosto,
e eu cerrei as mãos no meu colo.
Henry esfregou as costas do meu pescoço, mas eu não sentia alívio de seu
toque. Tudo isso foi por nada.
— Calliope, — disse Walter suavemente. — Você sabe o que vai acontecer,
não só para nós, mas para o mundo inteiro. Cronus vai recuperá-la como sua, e
não haverá ninguém para proteger a humanidade.
Calliope fungou, mas ela não disse nada.
— Por favor, — disse Walter. — Junte-se a nós, e juntos vamos derrotá-lo
mais uma vez. Você sabe que não podemos fazer isso sem suas habilidades, e se
você fizer isso por nós, perdoaremos as vossas ofensas. Tudo que você fez será
esquecido, e sua punição será suspensa. Você será bem-vinda de volta como a
nossa rainha, e vamos colocar este incidente para trás e seguir em frente com
nossas vidas.
— E o que? — Disse Calliope, todos os sinais de sua presunção se foram.
— Kate vai viver feliz para sempre com Henry, e eu vou ter que ver você quebrar
seus votos para mim cada vez que você encontrar uma garota bonita? Não,
Walter, eu estou muito feliz onde estou. Cronus recompensa a fidelidade. Tudo o
que tenho recebido pela minha lealdade a você é um coração quebrado e enteados
bastardos.
— E onde você acha que a sua lealdade para com Cronus vai chegar? —
Eu disse. — As cinzas daqueles que a amam mais, e nada mais que solidão para
o resto da eternidade se ele não se cansar de você mais cedo. Isso é o que espera
por você, se você continuar por este caminho.
— Pelo menos terei a satisfação de saber que você está morta. Isso vai
fazer mais para me manter aquecida à noite do que você jamais terá.
— Então, essa conversa acabou. — Walter soltou para ela e disse a seus
irmãos, — O que vocês querem fazer com ela?
— Eu suponho que descobrir uma maneira de fazê-la desaparecer seria
pedir muito de você, — disse Henry friamente. — Desde a prisão que a Cronus
estará vazia em breve, talvez ela pudesse tomar o seu lugar.
— Uma ideia excelente, — disse Walter, e ele olhou para Phillip, para
aprovação. Phillip assentiu, e Walter bateu palmas. — Está decidido. Calliope terá
o lugar de Cronus, e se nós o derrotarmos, ela deve se juntar a ele em sua prisão.
Se ela decidir entre agora e depois nos ajudar a lutar, vamos reunir e decidir o
que fazer a partir daí. Você pode ir, Kate.
Eu levantei, e os olhos Calliope nunca deixaram os meus. Eu não podia
me afastar, presa entre simpatia e frustração.
Ela iria nos destruir e ela sabia disso, mas ela estava feliz em sentar e
assistir. Walter tinha oferecido a ela um caminho para sair de tudo isso em troca
de sua ajuda, e ela ainda insistiu em lutar contra o conselho, sabendo o que isso
significava.
— Você é uma idiota, — eu disse antes que eu pudesse me parar. — Você
vai apenas fazer não só o Conselho todo ser morto, mas cada ser humano,
também. O mundo vai ser um deserto, e o que acontece com você, então? Você
vai desaparecer. Você vai desaparecer com o resto de nós. É isso que você quer?
— Eu prefiro desaparecer do que passar um momento a mais na sua
presença, — disse Calliope com estranha calma, como se ela estivesse em
completo controle. Como se Henry e Walter e Phillip não estavam mesmo na sala
com a gente. — Se isso é o que é preciso para ver todos mortos, então que assim
seja. Essa é uma causa que eu estou disposta a desaparecer.
As palavras invadiram minha mente, com raiva e ardor cada centímetro de
mim, e eu tentei, em vão, encontrar as certas para dizer.
Nada no mundo iria convencer Calliope a ceder, embora. Nada, exceto-
— Então me mate, — eu disse rapidamente, antes que os irmãos
pudessem protestar. — Faça isso agora. Eu quero que você faça, se vai significar
que você vai ajudá-los a recuperar Cronus.
— Não, — disse Henry bruscamente. Seu aperto no meu ombro apertado,
mas eu o ignorei. Isto era entre mim e Calliope.
Ela riu, um som mudo escuro que estava vazio de qualquer humor real. —
Você realmente acha que isso é tudo que eu quero, — ela disse em uma voz
adocicada. — Perfeita Kate. Tão disposta a ser mártir para nada. Mas é claro que,
se a oferta ainda está aberta, —Um flash de relâmpago crepitou através dela. Seu
corpo ficou rígido e, depois de um momento tenso, ela caiu em seu assento.
Ao seu lado, Walter estalava com eletricidade.
Eu esperava que ela estivesse inconsciente, ninguém poderia suportar
esse tipo de ataque, mas segundos depois, seus gélidos olhos azuis abriram, e ela
olhou diretamente para mim. Era como se ela pudesse ver cada segredo, cada
pensamento, cada pedacinho de mim que me fazia quem eu era, e seus lábios se
curvaram em um sorriso cruel.
— Kate, — disse Henry. — Nós precisamos ir agora. — No momento em
que quebrei o contato visual, Calliope assobiou.
O som de sua voz deslizou pela sala, arrastando-se sob a minha pele e
colando-me ao chão. — Você tem a minha palavra, Kate Winters, — disse ela, e
um fio de fumaça escapou de sua boca. — Eu vou fazer com você o que você tem
feito para mim, e eu vou pegar o que você mais ama de você enquanto você está
impotente para deter-me.
Um calor estranho formigante me encheu, e havia algo ameaçador sobre
ele, como se estivesse um grau de distância de ser afiado e dor inflexível. — O
que... — eu comecei, mas antes que eu pudesse dizer alguma coisa, Henry se
colocou entre nós, e o sentimento foi embora assim que ele veio.
— Leve-a ao Theo, — disse Walter, e sem dar-me uma escolha, Henry
empurrou-me para fora da sala e bateu a porta atrás de si. Tomando meu braço,
ele correu ao longo do corredor, e eu tive que correr para me manter.
— O que está acontecendo? — Eu disse, meu coração batendo. — O que
foi isso?
— Eu não sei, — disse Henry, e ele jurou. — Eu sinto muito, Kate. Eu
disse a Walter que não era uma boa ideia, mas ele não ouve, e Phillip ficou do
lado dele.
— Não é culpa sua. — Eu fiz uma careta, e quando ele levou-me onde quer
que fosse que íamos, eu levei um inventário. Eu não sentia nada diferente. — Ela
realmente não pode me matar, certo? Nós não podemos matar uns aos outros?
— Ela não pode matá-la, mas há várias coisas que ela pode fazer a você
para fazer você desejar estar morta. — Isso não foi exatamente animador.
Viramos uma esquina, e eu acelerava para coincidir com seu passo.
— O que ela pode fazer? Eu não me sinto diferente agora. Nada dói.
— Pode não ser físico, — disse Henry. — De muitas maneiras, ela é a mais
poderosa de todos nós. Não diga a sua mãe ou a Sofia que eu disse, mas minhas
irmãs são mais poderosas do que os meus irmãos. Temos a vantagem da força
bruta, mas as habilidades delas giram em torno da própria vida.
Minha mãe amava a natureza, eu sabia disso, e ela tinha uma incrível
capacidade de crescer qualquer coisa em qualquer lugar. Fazia sentido para
quem ela era, e se o crescimento de uma árvore no meio de Manhattan contava
como um poder, era um bom de ter.
— O que você não está me dizendo?
Eu reconheci onde estávamos agora: o corredor que levava para a
antecâmara da sala do trono. — Não é uma coisa, — ele disse, segurando a porta
aberta para mim. — Apenas o que ela é capaz. Por que o dom dela é tão
importante para a captura de Cronus, e talvez por isso que ela está tão
convencida de que ele não vai prejudicá-la, é porque ela tem a capacidade de
controlar a lealdade e o compromisso.
Ela era Hera, eu me lembrava. Hera era a deusa do casamento e das
mulheres. Se aquelas eram as coisas que ela podia controlar, então...
— Você acha que ela fez algo para me fazer desleal? — Eu disse. Como se
ela poderia me fazer trair Henry?
Era isso o que ela queria dizer, dizendo que ela iria tirar o que eu mais
amava?
— Eu não sei, — disse Henry severamente, empurrando-me para a sala do
trono e através do corredor de pilares. — Há uma chance de que ela não teve
tempo suficiente para fazer tudo o que ela queria fazer, mas não vai doer verificar.
A boa notícia é que ela não a transformou em um animal.
— Ela faz isso?
— Todo o tempo. Ela favorece vacas em particular. — Bem, isso foi um
alívio, então.
Ele parou no final do corredor. Os outros membros do conselho
circulavam, falando em sussurros saturados com preocupação, e apenas alguns
olharam em nossa direção. — Theo, se puder.
Theo se separou da multidão, soltando a mão de Ella no processo.
Enquanto eu estava no Éden, eu não tinha percebido quão próximos eles eram,
mas agora eu raramente via um sem o outro. Não admira que Ella tinha sido tão
terrível, enquanto ela estava comigo e Calliope.
— Você está ferida? — Disse Theo para mim, e eu balancei a cabeça.
— É possível que Calliope fez alguma coisa para ela, — disse Henry, antes
que eu pudesse explicar. — Você se importaria de olhá-la?
Theo fez um gesto para eu sentar no banco nas proximidades. Eu fiz isso e
esperei enquanto ele estendeu as mãos, e calor dourado tomou conta de mim.
Vários segundos se passaram, e finalmente Theo se afastou, uma linha formando
entre as sobrancelhas.
— Há alguns danos superficiais da caverna, mas fora isso, não há mais
nada. Ela está bem.
— Tem certeza? — Disse Henry, e Theo assentiu. Henry se afastou de mim
e agarrou a parte de trás do banco com tanta força que a madeira se estilhaçou
sob seus dedos.
— Isso não significa que foi algo mental, certo? — Eu disse, minha voz
engatando com medo. — Ou eu vou ficar louca?
Henry não se moveu. Ao meu lado, Theo mexeu em seus pés. — É mais
provável que ela simplesmente não teve tempo para terminar, — disse ele,
olhando para Henry. — Não há nada para se preocupar até que algo aconteça.
— E quando isso acontecer? — Disse Henry perigosamente.
Theo franziu a testa, e Ella mudou-se para o seu lado para tomar sua
mão. Ele pareceu relaxar ao seu toque. — Então, nós vamos lidar com isso da
melhor maneira possível. No entanto, até sabermos que há um problema, não há
nada que possamos fazer sobre isso.
— Não, — disse Henry. — Acho que não há. — Sem aviso, ele atacou de
volta para a porta. Eu me levantei e murmurei um pedido de desculpas quando
eu passei por Theo e Ella, e eu corri atrás dele. — Henry, por favor, espere por
mim.
Antes que eu pudesse alcançá-lo, ele entrou na antecâmara e bateu a
porta atrás de si. O murmúrio na sala do trono ficou em silêncio, e uma vez que
todos perceberam o que estava acontecendo, zumbido curioso substituiu seus
sussurros, mas eu não fiquei por perto para ouvi-lo.
Corri para o corredor, mas quando virei a esquina, não havia nenhum
sinal de Henry no longo corredor. Eu me virei, me perguntando se eu tinha de
alguma forma o perdido na antecâmara, mas ela estava vazia.
Ele se foi.
15
A ERVA & A ROSA
Passei a tarde procurando a ala inteira por Henry, mas ninguém o tinha
visto. Várias das portas estavam trancadas, e eu fiz questão de evitar a que
Calliope estava por trás, mas a menos que ele estava lá ou tinha
propositadamente trancado a porta atrás dele, ele não estava na parte do palácio
que eu estava familiarizada.
No momento em que voltei para o quarto, eu meio que esperava vê-lo na
cama, esperando por mim. Em vez disso, foi Pogo que me cumprimentou com um
yip animado e abanando o rabo. Por mais terrível que eu me sentia, eu peguei
meu cachorro e abracei-o, e ele lambeu minha bochecha. Não foi o suficiente para
afastar completamente meus medos e preocupações, mas foi bom o suficiente
para mantê-los na baía por agora.
— Eu senti sua falta, — eu disse, dando-lhe um arranhão bom atrás das
orelhas. Minha mãe não estava mais lá, sem dúvida, se juntou aos outros, e eu
sentei de pernas cruzadas no meio da cama que eu deveria compartilhar com
Henry. — Espere até você ouvir sobre o mês que eu tive. — Mas antes que eu
pudesse ter outra palavra, uma familiar sensação tomou conta de mim, e eu mais
uma vez mergulhei na escuridão. Desta vez, ao invés de reaparecer na caverna
onde Cronus trabalhava para escapar de sua prisão, eu me vi de pé no meio de
uma sala mal iluminada que se estendia por seis metros em qualquer direção.
Um lado da sala não era nada, exceto uma janela contínua, que olhava
através da caverna vasta, e fogo crepitava em uma lareira de mármore em frente à
vista. Não havia cortinas, e o único mobiliário era uma poltrona branca. Henry
estava sentado nela, apertando os apoios de braços tão forte que eu temia que
fossem quebrar.
— Henry? — Sussurrei, sem saber se ele podia me ouvir ou não.
Por um momento, na entrada para o Tártaro, eu pensei que ele podia, mas
agora quando eu tentei escovar meus dedos fantasmagóricos contra os dele, ele
não fez mais do que piscar de olhos.
A porta no lado distante do quarto abriu e fechou.
Persephone preencheu através do chão de mármore, descalça e vestindo
um vestido de algodão simples. Na luz suave, ela parecia incrivelmente bonita, e
eu mordi meu lábio. Com a possível exceção de Ava, eu nunca conheci ninguém
na minha vida que tinha o poder de me fazer sentir como uma erva daninha ao
lado de uma rosa.
— Eu pensei que eu encontraria você aqui, — disse Persephone.
— Eu venho aqui para pensar, — disse Henry distante. — Eu pensei que
você estava no seu caminho de volta.
— Eu decidi ficar por pouco tempo. Vocês precisam de toda a ajuda que
conseguirem. Especialmente você. — Ela pegou a mão de Henry, a mesma que eu
tinha tentado tocar momentos antes.
— Mamãe me contou o que aconteceu. Kate está procurando por você.
Henry encolheu os ombros, e ele não se afastou. — Eu preferia não
encará-la ainda.
— Por que isso? — Disse Persephone, empoleirando-se no apoio de braço.
Exatamente a pergunta que eu estava morrendo de vontade de saber.
Por um longo momento, ele não respondeu. — Ela poderia ter morrido,
porque eu fui tolo o suficiente para colocá-la em perigo, — ele finalmente disse,
suas palavras pesadas quando elas caíram de seus lábios. — Eu não fiz nada,
apenas a coloquei em perigo desde o momento em que nos conhecemos. Eu não
posso mais fazer isso.
Foi por isso que ele fugiu? Porque ele achava que era um perigo para
mim? Algo dentro de mim se desenrolou. Isso era ridículo, e agora que eu sabia,
poderíamos conversar sobre isso. Eu poderia definir as coisas direito.
Persephone revirou os olhos, e pela primeira vez eu concordei com ela. —
O que Calliope tentou fazer não é culpa sua, e Theo disse que os testes foram
claros. Nada aconteceu com ela.
Os tendões no pescoço de Henry destacaram a tensão em seu corpo. —
Nós não sabemos ao certo. Mesmo que tudo acabe bem, eu concordei em colocá-
la nessa posição. — E eu concordei em ir. Eu não estava completamente
desamparada; Henry não entendia isso? Eu não era mortal mais. Calliope não
poderia me matar, e, eventualmente, ele tinha que reconhecer que eu não ia
quebrar se alguém respirava errado ao meu redor.
Persephone correu seus dedos através do cabelo escuro de Henry, e um nó
se formou na minha garganta. Eu não queria estar lá vendo isso, mas eu não
conseguia desviar o olhar, e eu não tinha ideia de como voltar para o meu corpo.
Vê-los agir tão próximos apesar de estarem separados por milhares de anos - me
doía. Era como se Persephone nunca tivesse ido embora, e Henry estava
simplesmente confidenciando em sua esposa sobre algo que aconteceu durante o
dia.
Esse era para ser o meu trabalho, mas eu não poderia fazê-lo quando ele
estava se escondendo de mim. Minha irmã o conhecia bem o suficiente para não
precisar procurar por horas em lugares errados, embora.
— Ela passou por muito pior ao longo das últimas semanas, — disse
Persephone. — Sua nova garota é forte, não é?
— Sim, — disse Henry. — Quando ela decide fazer algo, é impossível
mudar sua mente, as consequências que se danem.
Persephone bufou. — Parece alguém que eu conheço. Ela ama você, você
sabe. Mais do que eu já amei. — Dor apareceu no rosto de Henry, mas ela se foi
assim que veio.
— Ela não me conhece. Quando ela descobrir quem eu realmente sou, ela
vai embora.
— Assim como eu?
Ele olhou em silêncio para fora da janela.
Persephone deslizou para fora do apoio de braços e em seu colo, e ela
enrolou seus braços ao redor do pescoço dele, como se nunca o tivesse deixado.
Minha garganta apertou, e eu cravei minhas unhas em minhas mãos.
Eu não queria estar aqui. Eu não queria ver isso. Eu não me importava
quão pouco Persephone o amava, e não importava o que minha mãe ou James ou
Ava disseram. Henry ainda estava apaixonado por ela, e ele sempre a escolheria
ao invés de mim.
Quando ele abraçou-a de volta, um soluço borbulhou dentro de mim, e eu
me virei para a janela. Mesmo assim, eu podia ver o reflexo deles, e por mais que
tentasse, não conseguia desviar o olhar.
Era isso. Nosso relacionamento, nosso casamento estava morrendo antes
de ele sequer ter dado uma chance.
— Às vezes eu me pergunto como que as coisas teriam sido se eu tivesse
ficado, — ela disse. — Como a nossa vida juntos teria sido diferente se tivéssemos
tomado o nosso tempo, em vez de saltar para as coisas.
— Mais feliz, — disse Henry calmamente. — Completos.
— Talvez, — ela sussurrou. — Talvez não.
Ambos estavam em silêncio pelo espaço de vários segundos, e quando
Persephone falou de novo, ela se inclinou em direção a ele até que seus lábios
estavam centímetros dos dele. Fechei os olhos.
— Você merece alguém que combina com você, — disse ela. — O que
aconteceu entre nós não foi culpa sua. Somos duas pessoas diferentes, e não
importa o quão forte você se convenceu de que eu sou a sua primeira e única,
não significa nada quando você não é o meu.
Prendi a respiração. Ela estava fazendo isso de propósito. Ela estava
rasgando-o. Por quê? Assim, ele não estaria preso a ela mais? Para abrir espaço
para mim? Seu coração estava quebrado o suficiente como era. Como é que eu ia
achar todas as peças e colocá-las juntas novamente, se ela o quebrasse?
— Pare, — eu implorei, sabendo que era inútil. Ela não sabia o que ela
estava fazendo com ele? É claro que ela sabia. Eu conhecia Henry por um ano, e
estava dolorosamente óbvio para mim. Ela o conhecia por eras.
— Você está verdadeiramente feliz com Adonis? — Disse Henry finalmente.
Persephone sorriu levemente. — Quando eu acordo e a primeira coisa que
eu vejo é o seu rosto, eu sei que vai ser um grande dia. Isso não vai mudar não
importa quanto tempo passe.
Henry enfiou seus dedos através do cabelo dela, e Persephone não fez
nenhum movimento para impedi-lo. — Você alguma vez se arrependeu de ir
embora?
Ela não respondeu de imediato. Em vez disso, ela encontrou sua mão livre
e atou seus dedos no dele. — Às vezes. Sinto falta do sol, a coisa real, não o da
minha vida após a morte. Sinto falta da minha mãe. Eu sinto falta da nossa
família. Eu sinto falta das estações. Eu sinto falta de mudança. — Ela apertou os
lábios nos nós dos dedos dele. — Às vezes eu ainda sinto sua falta. Adonis tem
sorte. Ele é como todas as outras almas, ele não compreende plenamente o que
está acontecendo ou que o mundo ao seu redor é falso. Eu sei, e às vezes isso é o
suficiente para fazer a diferença.
Henry acariciou a bochecha dela com as costas da mão, e seus olhos
mudaram da janela para ela. Ele olhou para ela da maneira que ele me olhou a
noite em que nós dormimos juntos, e meu peito doeu. Porque eu não conseguia
acordar? — Você poderia voltar.
Persephone deu um sorriso triste. — E Kate? Você não faria isso com ela.
Eu sei que você é melhor do que isso. Você pode ter a enganado, mas eu posso
dizer como você se sente sobre ela.
Henry ficou em silêncio, e meu coração batia tão forte que eu pensei que
poderia explodir. Ele faria? Ele estava pedindo que ela voltasse como sua rainha
ou como sua esposa? Ela poderia fazer isso?
Tonta, encostei-me à janela e desejei com toda fibra do meu ser que o
vidro iria desaparecer e me deixar cair. Pelo menos assim eu não teria que ouvir
isso. Eu pensei em sair pela porta, mas se eu não poderia atravessar a janela, eu
não seria capaz de caminhar através dela, também.
— Kate é muitas coisas para mim, — disse Henry finalmente. — Mas ela
não é você.
Eu afundei no chão e abracei meus joelhos. Eu tinha feito tão bem
enganando a mim mesma que isso podia funcionar, que com o tempo e um pouco
de esforço, tudo estaria bem. Mas não podia estar.
Ele teria dito aquelas coisas se soubesse que havia uma chance que eu
poderia estar ouvindo? Claro que não. Ele não era cruel, mas eu as ouvi de
qualquer maneira.
— Hades... — Persephone se inclinou para frente e fechou a distância
entre eles, tocando seus lábios nos dele.
Meu estômago doía, e eu escondi o meu rosto em minhas mãos.
Isso não poderia estar acontecendo. Isto era um pesadelo, não a coisa
real. Eu tinha adormecido sem lembrar, isso era tudo. Eu acordaria em breve, e
quando acordasse, Henry estaria assistindo-me dormir, e ele iria pedir desculpas
por fugir. Conversaríamos, ele me beijaria, e tudo ficaria bem novamente.
Eu não sabia quanto tempo durou. Eu não queria saber, e pelo tempo que
Persephone falou de novo, eu estava quase arrancando meus cabelos. Por que eu
não poderia voltar? Que parte de mim queria ver isto tão mal que eu estava
disposta a me colocar esse tipo de agonia?
— A coisa é, eu não sou eu, também, — ela disse suavemente. — Eu não
sou a pessoa que você ama. Essa pessoa nunca existiu, e me espelhando nela em
sua mente, está destruindo você. Tivemos um bom dia juntos, e o resto foi
horrível. Eu era miserável, e pelo tempo que eu sabia que não queria ser casada
com você, você já tinha se convencido de que estava apaixonado por mim. Mas
você nunca foi. Você se apaixonou por uma pessoa que nunca existiu.
Lágrimas espirraram sobre os joelhos dos meus jeans. Em um ato de
desespero, eu belisquei o interior do meu cotovelo duro, mas eu não sentia dor.
Eu estava presa.
— Diga-me, — disse Persephone. — Foi esse o tipo de beijo que você tinha
passado os últimos mil anos imaginando? Seu coração parou? Fez a sala girar e
tudo mais desaparecer?
No tempo que levou para Henry responder, eu parei de respirar e levantei
minha cabeça. Persephone ainda estava em seu colo, e eles olhavam o outro com
tal intensidade que eu esperava que ele a beijasse novamente, mas então eu vi.
Havia uma distância entre eles agora, como se ela estivesse se afastando. Como
se ele estivesse segurando-a no comprimento do braço.
À medida que os segundos passavam, um raio de esperança se alojou
dentro de mim, e eu fiquei tremendo para me aproximar de modo que não haveria
chance de eu perder o que ele diria.
Exceto que quando eu dei um passo à frente, ele se inclinou em direção a
ela novamente, e ela não o impediu. Minha respiração ficou presa na minha
garganta quando o mundo se dissolveu em torno de mim mais uma vez, e Henry e
Persephone desapareceram.
Passei o resto da noite chorando na cama com Pogo enrolado ao meu lado.
A cada meia hora mais ou menos, ele iria acordar o suficiente para lamber meu
rosto antes de cair no sono. Eu não tive muita sorte.
Qualquer que seja a lição que Persephone tinha tentado ensinar ao Henry
deu errado, e mesmo se ela deixasse o palácio amanhã, isso não mudaria o fato
de que Henry sempre a amaria mais. Eu queria odiá-la pelo o que ela tinha feito,
mas ela não tinha sido a única a explodir em nosso casamento. Eu era a única
que tinha a procurado, e eu a convenci a entrar novamente em sua antiga vida,
apesar de saber muito bem quais poderiam ser as consequências de Henry vê-la
novamente. Tudo o que ela tinha feito era tentar desencorajar os seus
sentimentos de uma maneira torcida que falhou miseravelmente, mas ela havia
tentado.
E agora eu o perdi completamente.
O som da abertura da porta do quarto me acordou de um cochilo leve.
Pogo esticou, e quando eu me sentei, ele pulou no meu colo de barriga para cima,
aparentemente disposto a deixar-me ir a lugar algum sem ele.
Henry estava na porta, e por um longo momento, nós simplesmente
olhamos um para o outro. Seu rosto sem envelhecer estava puxado e seus lábios
virados para baixo em uma careta, e parecia que ele não tinha dormido em
semanas.
Finalmente, ele entrou no quarto e fechou a porta.
Sem chegar a me cumprimentar, ele foi para seu armário e começou a
passar através de suas roupas. Limpei meu rosto para ter certeza que nenhuma
prova da minha sessão de choro permaneceu, mas elas tinham secado por horas.
Assim que ele pegou uma camisa limpa que era indistinguível da que ele
usava, eu esperei que ele dissesse alguma coisa, mas ele sem palavras
desapareceu no banheiro como se eu não estivesse lá. Será que ele pensava tão
pouco de mim que eu não valia um Olá?
Enquanto ele se foi, eu debati se deveria ou não continuar a fingir que
tudo estava bem. A covarde em mim queria, mas eu sabia que se eu tentasse, eu
seria tão miserável como Persephone tinha sido, e eu não queria ser infeliz mais.
Eu não poderia passar minha vida esperando que ele colocasse Persephone lado e
focasse em mim invés disso.
Pelo tempo que ele saiu, eu sabia o que eu tinha a dizer.
Tudo dentro de mim lutou contra as palavras que se espalharam da
minha boca, mas eu precisava dizer isso, e Henry precisava ouvir isso.
— Eu não posso mais fazer isso.
Minha voz era apenas um sussurro, mas Henry parou a meio caminho
entre o banheiro e a porta. Ele não olhou para mim, mas as suas mãos formaram
punhos, e os tendões em seu pescoço se destacaram como eles tinham na sala
com as janelas.
Auto aversão tomou conta de mim. Eu estava fazendo a mesma coisa que
Persephone tinha feito para ele, eu estava desistindo. Antes de nós chegarmos a
ter uma chance, eu estava declarando o fim.
Não. Henry era o único que tinha desistido. Ele era o único que tinha
declarado o fim no momento em que ele se recusou a me tocar ou me tratar como
sua esposa. Ele era o único que tinha perdido nós em algum lugar, eu estava
apenas desistindo da procura, também. Não havia nada que eu pudesse fazer,
não havia palavras mágicas que eu poderia dizer para consertar tudo se ele já
tinha nos abandonado.
— Não pode fazer o quê, exatamente? — Disse Henry, e eu ouvi a tensão
em cada palavra que ele falou, como se levou um esforço monumental para
formá-las. Minhas mãos estavam suadas, e mais do que qualquer coisa eu queria
tomar as palavras de volta, pedir desculpas e implorar para ele falar comigo para
que pudéssemos descobrir isso, mas ele não ia fazer isso. E mesmo que ele
fizesse, amanhã as coisas iam voltar a isto, e nenhum de nós jamais seria feliz
novamente. Eu não poderia fazer isso com ele. Eu não poderia fazer isso comigo.
— Isso, — eu disse suavemente. — Nós. No ano passado, quando
estávamos, antes de nos casarmos, eu pensei que agora seria perfeito, e que eu
seria mais feliz do que eu já estive em minha vida, podendo estar com você.
Podendo te amar pelo resto da eternidade. Mas não importa o quanto eu quero te
amar, você não vai me deixar, e eu não posso mais fazer isso. — Henry não se
moveu. Eu queria que ele viesse para a cama, tomasse minha mão e me dissesse
que estava arrependido, que ele ia tentar com mais força, mas não o fez. Ele
olhou para a porta em vez disso.
— Posso perguntar o que precipitou esta decisão?
Lá estava ele, o elefante na sala. A coisa que eu não deveria ver. A única
coisa que mudou tudo.
— Você beijou Persephone.
De uma vez, várias emoções passaram pelo seu rosto. Vergonha, choque,
humilhação, raiva, dor – alivio? Sim, alívio, também.
— Eu não esperava que ela lhe dissesse. Eu sinto muito. — Silêncio de
morte. Fora de todas as coisas que eu pensei que ele poderia dizer, isso nunca
tinha passado pela minha cabeça.
— Essa é a sua resposta? — Eu soltei. — Que está arrependido que eu
descobri? Persephone não me disse, Henry. Foi este chamado dom. Eu estava na
sala com você. Eu vi cada maldito segundo disso. Eu ouvi cada palavra que você
disse a ela. Eu vi você fazer. — Eu pisquei rapidamente para parar de chorar
novamente, mas eu estava brigando uma batalha perdida. Ele não se importava.
Ele não iria fingir que tinha feito algo errado. — Você sabe o que James disse-me
no final do verão? Ele disse que eu tinha uma escolha, e ele foi o único que ia me
dizer sobre isso, porque todo mundo estava tão preocupado com a sua felicidade
que não deram a mínima para a minha. Eu disse a ele que eu já fiz a minha
escolha quando eu casei com você, mas ele insistia que eu esperasse. Eu não
entendi o que ele quis dizer, mas agora eu entendi.
— James. — Seu nome foi torcido e feio nos lábios de Henry. — Sim, é
claro que ele iria enganar você a se duvidar. Por razões puramente altruístas,
estou certo.
— Eu não estou duvidando de mim mesma, — eu respondi. — Eu estou
duvidando de você. Eu te dei todas as chances do mundo para me mostrar que
você me quer aqui, e você me deu nada. Você foge sempre que você acha que vai
ter que estar em uma sala sozinho comigo por mais de dois minutos. Você não
me toca, você mal fala comigo, você não me beijou desde que cheguei aqui, e
muito menos me tratado como sua esposa. Como sua igual. James me avisou que
faria algo assim, e eu fui estúpida o suficiente para insistir que ele estava errado.
Jogar James em seu rosto novamente e novamente foi cruel, mas eu não
conseguia parar. Fora de todas as pessoas em minha vida, além da minha mãe,
Henry era o único que deveria entender e me conhecer melhor, não James.
— Então talvez eu devesse deixar você e James serem um casal, — disse
Henry, e os trovões em sua voz me deram arrepios. — É isso que você quer, Kate?
Minha permissão para estar com ele? Você tem ela. Pela primavera e o verão, você
pode fazer o que quiser com quem quiser.
— E o que dizer do outono e inverno? Eu deveria sentar-me e esperar o dia
em que você decidir que você me ama?
— Eu te amo.
— Então me mostre.
— Estou tentando, — disse ele bruscamente. — Minhas desculpas se não
é bom o suficiente para você.
Revirei os olhos. — Não fazer nada nunca vai ser bom o suficiente, Henry.
Agora, de onde eu estou sentada, parece que a última coisa que você quer ser é o
meu marido. Você pode dizer que me ama tudo o que você quiser, mas se você só
age como o oposto da verdade, então eu não posso confiar em suas palavras
mais. — Minha voz falhou. — Droga, é isso como vai ser para sempre? Diga-me
agora. Salve-me da miséria, se você nunca vai olhar para mim da maneira que
você olha para Persephone.
— Eu não posso simplesmente parar de sentir algo por ela, — disse Henry
com os dentes cerrados. — Ela foi parte da minha vida por um tempo muito
longo.
— Eu sei. Eu sei que você a ama. Eu não estou pedindo para você
esquecer que ela jamais existiu, estou lhe pedindo para colocá-la no passado,
onde ela pertence, e viver o seu futuro comigo, e não um fantasma.
A garganta de Henry apertou. — Isso é o que estou tentando fazer.
— Mas você não está. — Eu corri meus dedos pelo meu cabelo, a
frustração se acumulando dentro de mim. — Henry, você a beijou.
— Ela me beijou.
— Isso não importa. — Eu bati minha mão para baixo no colchão, e Pogo
correu para debaixo do meu travesseiro. — Você não entende isso? Você queria.
Você gostou. Você queria mais uma vez quando acabou. E tudo o que ela estava
tentando mostrar a você - ela não te ama mais, você não entende isso? Eu. Eu
amo você, e você vai me perder, porque você está com muito medo ou muito –
muito desinteressado ou – eu não sei. Eu não sei por que você não vai me deixar
te amar do jeito que eu quero.
Eu esperei Henry dizer alguma coisa, qualquer coisa para me ajudar a
entender, mas ele ficou em silêncio. Descontroladamente eu procurei através de
todas as desculpas que eu tinha feito para ele desde a chegada, todas as
possibilidades que tinha me ocorrido. Qualquer coisa que explicaria o homem que
eu amava se transformando em um estranho.
A coisa que ele disse a Persephone, a razão por que ele fugiu da sala do
trono naquela tarde. — É porque você acha que Calliope vai matar-me no
momento que você deixar-se sentir algo real por mim? Porque eu sou imortal
agora, Henry. Ela não pode me matar mais.
— Cronus pode. — As palavras saíram tão sufocadas que eu quase não as
entendi, mas lá estava. Sua desculpa. Eu suavizei.
— Cronus não me matou. — Eu deslizei para a borda da cama, perto o
suficiente para ele me alcançar em dois passos, mas ele ficou parado. — Ele
caçou-nos, e quando teve a chance de me matar, ele não matou.
Finalmente Henry olhou para mim, seus olhos brilhando com a confusão,
mas eu continuei. Se eu o deixasse mudar de assunto, eu nunca seria capaz de
terminar isso.
— Você não precisa gastar todo momento me protegendo agora. Eu
deveria ser a sua parceira, e não o seu peso, e se isso é tudo que eu jamais vou
ser para você, então eu não quero mais ficar aqui. Eu quero que você me ame. Eu
quero olhar querer vir aqui cada outono. Eu quero que o inverno seja a minha
estação favorita, porque eu posso gastá-la com você. Então me diga o que vai
acontecer, Henry. Diga-me que as coisas vão ser melhores, que você não vai
pensar em Persephone todas as vezes que você me tocar. Diga-me que você vai
me amar tanto quanto você a ama, e que eu não vou passar o resto da eternidade
pálida em comparação com as suas memórias da minha irmã.
Silêncio.
— Por favor, — eu sussurrei. — Eu estou te implorando. Se você não... se
você não fizer isso, eu vou embora. E eu não quero dizer para o verão. Vou deixar
o Submundo, e eu não vou voltar.
Ele vacilou, e eu soube imediatamente que eu tinha dito as palavras
erradas, mas eu não podia tomá-las de volta agora. — Talvez seja melhor, — disse
ele. — Você vai estar mais segura na superfície, e os outros podem protegê-la.
— Eu não preciso de proteção. — Eu estava chorando de verdade agora, e
minha garganta estava grossa e minha voz estrangulada, mas eu continuei. — Eu
preciso saber que eu não vou ser infeliz pelo resto da minha vida.
— Eu não deveria ser a sua única fonte de felicidade, — disse Henry
duramente. — Se é assim...
— Não é. Você não é. Eu tenho minha mãe e Ava e...
— James, — ele terminou por mim, e eu queria dizer a ele que ele estava
errado, mas eu não queria mentir para ele. James era o meu melhor amigo. —
Sim, eu estou ciente. Eu não vou dar-lhe uma desculpa para ir embora. Se você
quiser fazer isso, então ali está a porta. Tenho certeza que James terá prazer em
ter você só para ele. Agora, se me dá licença, eu tenho os preparativos para fazer.
— Eu abri minha boca para dizer-lhe onde ele poderia enfiar seus preparativos,
mas suas últimas palavras me pegaram desprevenida.
— Preparativos para quê? O que é tão importante que você tem que sair
quando estamos no meio disso?
— Minhas desculpas, — disse ele friamente. — Eu pensei que você já
tinha feito a sua decisão de abandonar-me. — Peguei um travesseiro por trás de
mim e atirei-o para ele.
Sem mover um centímetro, ele descartou antes que estivesse a meio
caminho para ele. — Você é um idiota, — eu atirei. — Se esta é a forma como
você tratou Persephone, então você sabe o que? Eu não a culpo por te deixar. Na
verdade, ela foi uma idiota por esperar tanto tempo.
Agonia indescritível passou no rosto de Henry, e eu pus minha mão sobre
a boca do momento em que eu percebi o que eu havia dito. — Oh, Deus, me
desculpe, eu não...
— Sim, você quis, — disse ele. — Você quis dizer cada palavra. — Eu
enterrei meu rosto em minhas mãos e sufoquei um soluço de choro. Meus
pulmões queimaram, e tudo que eu queria fazer era enrolar na cama e chorar,
mas eu não podia. Não quando Henry estava aqui. Não quando ele estava
finalmente falando comigo.
— Eu odeio isso, — eu sussurrei. — Eu odeio brigar com você. Eu não
estou pedindo a lua e as estrelas, eu prometo. Eu só quero que você me ame, que
me queira, passar o tempo comigo, falar comigo.
— E você espera conseguir se comportando assim? — ele disse. — Você
acredita que dizer essas coisas para mim de alguma forma me faz esquecer das
eras que já vivi?
— Ao contrário do que? Não dizer nada? Eu tentei dar-lhe tempo. Eu
tentei arriscar a minha vida para salvar a sua. Eu tentei tudo que eu posso
pensar, mas quando você não vai nem mesmo falar comigo...
— Henry.
Eu olhei para o som da voz de Walter. Ele enfiou a cabeça na porta, e
quando ele se concentrou em Henry, ele prontamente me ignorou. Eu não tinha
certeza se estava grata ou ofendida.
— Estamos prestes a começar, — disse ele, e Henry assentiu brevemente.
Assim que a porta se fechou, Henry lançou uma respiração como se tivesse
segurando-a por séculos.
— Podemos continuar isso mais tarde, se quiser, mas eu tenho que ir
agora. Estamos planejando a batalha. — Ele hesitou. — Titãs são mais fortes
sobre os solstícios, e esperamos que Cronus vá escapar completamente em algum
momento no final de dezembro, então não há muito tempo.
Fechei os olhos. Se eu não tivesse sido estúpida o suficiente para me
esgueirar para a caverna, Persephone teria lidado com as coisas, e nada disso
estaria acontecendo. — Você se importaria se eu levasse um ou dois dias antes de
eu sair? Eu quero dizer adeus a todos.
De primeira, Henry não disse nada, mas finalmente ele assentiu. — Leve o
tempo que você precisar.
Ele estava a meio caminho da porta quando eu soltei: — Posso te visitar
algum dia?
No momento em que o levou a virar o rosto para mim de novo, eu pensei
que eu vi uma dica de um sorriso, mas ele se foi antes que eu pudesse ter
certeza. — Aconteça o que acontecer entre nós, Kate, eu sempre quero ser seu
amigo. É... — Ele fez uma pausa. — É mais do que eu tinha antes.
Mais do que Persephone tinha dado a ele. Isso me trouxe uma pequena
quantidade de conforto, embora a distância em sua voz me impedia de sorrir. —
Eu irei te ver algum dia.
— Então eu vou fazer o que puder para garantir que você não vá voltar
para um palácio vazio.
— Eu... O quê? — Ele pensou que não ia voltar? Ou ele vai desaparecer?
Morrer em batalha com Cronus? Será que isso importava? — Henry, o que você...
Antes que eu pudesse terminar, trovão ressoou na sala, e Henry piscou
fora de vista, deixando-me sozinha com medo e perguntas sem respostas. Corri
para a porta e a abri, esperando em vão que ele estaria lá, mas eu estava sozinha.
Era o fim.
16
CAMPO DE BATALHA
Fim.
GUIA PARAOS DEUSES
Zeus............... Walter
Hera............... Calliope
Poseidon............... Phillip
Deméter............... Diana
Hades............... Henry
Hestia............... Sofia
Ares............... Dylan
Afrodite............... Ava
Hermes............... James
Athena............... Irene
Apollo............... Theo
Artemis............... Ella
Hefesto.............. Nicholas
Dionysus............. Xander