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20/04/2019 Povos Indígenas: Ditadura militar, uma ferida aberta na aldeia Ocoy | Brasil | EL PAÍS Brasil

BRASIL

Ditadura militar, uma ferida aberta na aldeia Ocoy


Violações sofridas pelos Avá-guarani durante a construção da usina de
Itaipu são recontadas no cotidiano da aldeia. Povos indígenas temem pelo
futuro sob Bolsonaro e planejam mobilização

Crianças da etnia avá-guarani, na aldeia Ocoy. ARQUIVO (CIMI)

BEATRIZ JUCÁ

São Paulo - 19 ABR 2019 - 16:00 BRT

As marcas deixadas pela ditadura militar ainda são uma ferida aberta na memória da
aldeia Ocoy, uma comunidade de indígenas Avá-guarani localizada em São Miguel do
Iguaçu, a quase 600 quilômetros de Curitiba, no oeste do Paraná. Há décadas, os
xeramõi — lideranças espirituais da etnia — repetem a mesma história para as novas
gerações. Nas escolas ou nas casas de reza, contam como viram suas terras serem

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engolidas pelas águas da usina hidrelétrica Itaipu Binacional, uma obra emblemática da
política desenvolvimentista da ditadura militar. Os relatos daquela época são
reproduzidos pelos mais jovens com imagens das ocas incendiadas e pressões violentas
para expulsar os "parentes" da área que seria ocupada pelo megaempreendimento. O
Governo adotou subjetivos "critérios de indianidade" para determinar quem teria direito
à terra e reconheceu apenas cinco das doze famílias da região como tradicionalmente
indígenas. O projeto desenvolvimentista, cuja construção começou em 1973, culminou
em um êxodo da etnia a outros Estados do Brasil e ao Paraguai.

"É triste quando os nossos xeramõis contam o que presenciaram,


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todo mundo fica emocionado", diz o cacique Celso Ocoy. Ao longo
dos anos, parte dos avás-guarani que emigraram voltou para as
áreas do entorno da terra tradicional, próximo ao que era o Rio
Paraná. O curso do rio foi interrompido pela obra, criando o lago
artificial Itaipu. Nas margens dele, vive esta comunidade indígena. A
Os deslocamentos
forçados de Ocoy é uma das três reservas guaranis reconhecidas pelo Governo.
indígenas na
Seus 251 hectares, porém, já não são suficientes para a comunidade
ditadura, em
imagens de cerca de 800 indígenas que vivem ali. "A gente sofre muito com o
espaço. Não tem espaço pra moradia", conta o cacique. Rodeada
por plantações de soja, a aldeia se vê espremida no território para
onde foram provisoriamente deslocados na época da construção da
usina e lá ficaram, contraindo doenças e vivendo em condições cada
vez mais difíceis. "Antes tinha ainda mato, alguma coisa para caçar.
Hoje mudou totalmente", lamenta o cacique Celso.
A bomba-relógio das
demarcações
indígenas no "Os xeramõi contam a história da nossa aldeia para os alunos porque
Governo Bolsonaro
não pode se perder o que o nosso mais velho presenciou de
violência. Levamos a história deles na nossa luta", diz o cacique. A
ditadura militar brasileira via os indígenas como empecilho para o
desenvolvimento que almejava, com a realização de grandes obras e
aberturas de estradas. Adotava uma política assistencialista aos
povos tradicionais, muitos deles incorporados na realização das
obras sob o argumento de integrá-los à sociedade. Em nome deste
'Bolsonaro: 100 dias
de guerra contra os desenvolvimento, o regime foi deixando um rastro de massacres,
povos indígenas', por doenças, torturas e remoções forçadas em comunidades indígenas
Fiona Watson
pelo Brasil. Segundo o relatório da Comissão Nacional da Verdade,

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concluído em 2014, mais de 8.000 indígenas foram assassinados no período militar


(1964-1985) — uma conta que o país ainda não conseguiu reparar.

Indígenas avá-guarani na Aldeia Ocoy. ARQUIVO PESSOAL


(CIMI SUL)

A comissão estima que cerca de dez etnias desapareceram por culpa ou omissão da
ação do Governo militar. E há casos emblemáticos de violação, como por exemplo o dos
Waimiri Atroari, que foram massacrados durante a construção da BR-174, na década
setenta. Dos 3.000 indígenas que havia antes da obra, restaram 350. Os yanomami, um
dos povos mais isolados do Brasil até hoje, tiveram suas terras invadidas por
garimpeiros no período com o aval do regime. Já os indígenas Avá-Canoeiro, do
Tocatins, foram capturado por órgãos públicos federais e expostos em uma fazenda em
um quintal cercado.

Comissão da Verdade estima a morte de 8.300 indígenas no país


durante o regime militar

Ao investigar o caso dos Avá-guarani, a Comissão da Verdade derrubou a narrativa de


que o Governo havia sido generoso ao reconhecer 251 hectares à etnia. Estudos do
Governo indicavam à época que os indígenas ocupavam apenas 34 hectares antes da

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construção da reserva, um dado considerado inverídico até mesmo por funcionários da


Itaipu ouvidos pela comissão. O relatório final reconhece que os indígenas foram alvo de
violações que envolvem um intenso esbulho de suas terras e que, no final, as
comunidades ficaram com um território bem menor do que ocupavam.

A ditadura aboliu a demarcação nas regiões fronteiriças em nome da "segurança


nacional", e os grupos de trabalho politizados sequer reconheceram os indígenas como
tais. Hoje, a usina de Itaipu desenvolve uma série de projetos de apoio à agricultura, à
pesca e à cultura dos indígenas Avá-guarani. Mas o fato é que, naquela época, em
conflito pela colonização agrícola e por Itaipu, os indígenas tiveram uma série de direitos
violados. Um ex-funcionário da usina chegou a entregar à comissão imagens nas quais
funcionários comemoravam os incêndios que causavam nas aldeias. Essas imagens, no
entanto, não foram incluídas no relatório final. "A gente sabe da história que aconteceu
aqui no oeste do Paraná. Nossos parentes foram tirados, carregados. Mandaram
embora mesmo", conta o cacique Celso.

Funcionários da Itaipu comemoram incêndio de


comunidade indígena no oeste do Paraná ACERVO
COMISSÃO DA VERDADE DO PARANÁ

Neste ano, a história recontada à exaustão nas últimas décadas pelos indígenas ganhou
uma preocupação a mais: a de que o presidente Jair Bolsonaro — o primeiro a defender
a ditadura desde a redemocratização — retome políticas que deixaram um alto custo
aos Avá-guarani. "Ter um presidente que era militar dá mais preocupação, né?", diz

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Celso. "Antigamente, a gente sofria muita violência por conta de arma de fogo e facão. O
novo governo dá medo de que isso volte, mas a gente está mais preparado que naquela
época [da ditadura]. A gente hoje luta com a caneta, pra defender nossos direitos",
afirma.

O receio que toma a aldeia Ocoy está ancorado no discurso que o presidente Jair
Bolsonaro dissemina desde a campanha eleitoral. Há uma retomada da defesa de uma
política desenvolvimentista e da posição contrária às demarcações de terras. "Vamos
integrá-los à sociedade. Como o Exército faz um trabalho maravilhoso no tocante a isso,
incorporando índios às Forças Armadas", afirmou Bolsonaro em entrevista à
GloboNews, em agosto do ano passado, antes de ser eleito. Durante a ditadura, o
Governo militar criou as chamadas Guardas Rurais Indígenas, espécie de milícias
armadas com revólveres e cassetetes responsáveis pelo policiamento nas aldeias. "Essa
foi uma experiência extremamente negativa que não só gerou mais violência como
reprodução de certos métodos internos em relação a esses grupos", avalia o procurador
Julio José Araújo Junior, que integra o Grupo de Trabalho Povos Indígenas e Regime
Militar, da 6ª Câmara do Ministério Público Federal.

O receio com o novo Governo

Indígenas avá-guarani mudam a aldeia Ocoy após


inatalação da usina de Itaipu na década de 1980 CIMI SUL

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No primeiro dia após tomar posse como presidente, Bolsonaro publicou a Medida
Provisória 870, que transferiu a Funai para o recém-criado Ministério da Mulher, da
Família e dos Direitos Humanos, além de transferir a questão da demarcação de terras
para o Ministério da Agricultura, historicamente dominado por ruralistas e alinhado ao
agronegócio. As mudanças geraram forte reação de entidades indigenistas, que acusam
as ações do Governo de inconstitucionais, além de considerarem um desrespeito à
Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que desde 2004
estabelece consulta prévia aos indígenas para alterações na política indigenista.

"Há um cheiro de que tudo parece novo, mas na verdade [essas iniciativas] tem tudo a
ver com um debate que foi derrotado depois da ditadura. Juridicamente, é um projeto
que não se sustenta", diz o procurador Júlio Araújo. Isso porque a Constituição de 1988
garantiu aos indígenas não só o direito à demarcação de suas terras tradicionais, mas
também o direito de viverem como julgarem pertinente, respeitando a diversidade de
organizações sociais nas centenas de etnias que vivem no país. Agora, Bolsonaro ensaia
retomar uma lógica integracionista já refutada pela própria carta magna brasileira. "Há
uma lógica desses governos de entender o interesse nacional como superior e capaz de
subjugar as populações tradicionais em nome de um determinado projeto de
desenvolvimento", pontua o procurador.

“Antigamente, a gente sofria muita violência. Agora dá medo de que


isso volte, mas a gente está mais preparado. A gente hoje luta com a
caneta”

Ao menos 4.000 pessoas de mais de 305 nações indígenas devem participar do


Acampamento Terra Livre na próxima semana, entre os dias 24 e 26, tradicional marcha
que neste ano protesta justamente contra as medidas anunciadas pelo Governo
Bolsonaro, entre elas o esvaziamento da Funai e a municipalização da saúde indígena, o
que Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) chama de "clara intenção de
desmontar a Política Nacional de Atenção à Saúde dos Povos Indígenas". O ministro
Sergio Moro (Justiça) já autorizou a da Força Nacional de Segurança Pública durante os
dias do acampamento, que acontece há 15 anos no mês de abril (devido à celebração do
Dia do Índio, no dia 19 deste mês).

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Mas o problema, segundo o procurador, está longe de ser exclusivo ao atual Governo. As
tensões sobre as demarcações de terras seguiram em todos os governos desde a
redemocratização, e o prazo de conclusão delas de cinco anos, presente no texto
constitucional, não foi respeitado. O temor das entidades indigenistas é de que, com o
discurso contra as demarcações, os conflitos no campo sejam acirrados e culminem em
novas mortes. Desde que a Constituição foi aprovada, há 30 anos, houve avanços em
várias pautas indígenas. As demarcações na Amazônia Legal tiveram um alcance
significativo, embora as do centro-sul do país tenham encontrado mais resistência. A
Funai, que ao longo da história teve uma posição ambivalente, conseguiu construir uma
visão sobre a política indigenista para além do assistencialismo. Mas o Brasil ainda está
longe de reparar os danos aos povos tradicionais. A Comissão da Verdade que
identificou extermínios de povos inteiros não chegou a responsabilizar culpados, mas
determinou que as investigações continuem — um desafio para um país que parece
ainda tolerante aos crimes cometidos durante a ditadura.

Adere a

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Funai · Indígenas · Centrais hidroelétricas · Ministério Justiça · Índios americanos · Ditadura Militar Brasil
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Incêndio atinge a catedral de Catedral de Notre-Dame de Paris, Museu de História Natural de NY


Notre-Dame em Paris: últimas joia do gótico europeu eternizada rejeita sediar homenagem a
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