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JOAB FERNANDES DOS SANTOS

O GRUPO DE MOGI DAS CRUZES: PRÁTICA DE MÚSICA NA


MOGI COLONIAL

UNIVERSIDADE BRAZ CUBAS


MOGI DAS CRUZES
2010
JOAB FERNANDES DOS SANTOS - RGM: 243300

O GRUPO DE MOGI DAS CRUZES: PRÁTICA DE MÚSICA NA


MOGI COLONIAL

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado à Universidade Braz
Cubas, como exigência do Curso de
História.
Orientador: Prof. Ms.: Armando de Melo
Servo Constante.

UNIVERSIDADE BRAZ CUBAS


MOGI DAS CRUZES
2010
Santos, Joab Fernandes dos
O Grupo de Mogi das Cruzes: Prática de Música na Mogi Colonial
/ Joab Fernandes dos Santos. Mogi das Cruzes: [s.n.], 2010.
64 f .; il. ; 31 cm.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação) – Universidade


Braz Cubas, Curso de História.
Orientador: Prof. Ms. Armando de Melo Servo Constante

1. Música colonial 2. Grupo de Mogi das Cruzes 3. Prática de


música em Mogi das Cruzes I. Título

CDU – Classificação Décima Universal


“A Universidade Braz Cubas não se
responsabiliza pelas informações contidas
neste Trabalho de Conclusão de Curso.
Essas informações são de responsabilidade
exclusiva do autor.”
JOAB FERNANDES DOS SANTOS - RGM: 243300

O GRUPO DE MOGI DAS CRUZES: PRÁTICA DE MÚSICA NA


MOGI COLONIAL

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado à Universidade Braz
Cubas, como exigência do Curso de
História.
Orientador: Prof. Ms.: Armando de Melo
Servo Constante.

A bancada examinadora dos trabalhos de Conclusão de Curso


em sessão pública realizada em ___/___/_____ considerou o
candidato:
......................................................................................

1) Examinador:
_______________________________________

2) Orientador:
________________________________________
Dedico este trabalho à Daiane,
minha jovem esposa, que tem
acompanhado estes anos de estudo,
dando todo o apoio para que me
mantivesse firme.
AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, pois mesmo depois de conhecer


melhor a profundidade a que o pensamento humano pode atingir, continuo a
achar ser impossível nega-Lo.
Agradeço também a minha esposa pela paciência, companheirismo e
auxílio na digitação deste trabalho.
Aos meus pais que me ensinaram a viver melhor e meus irmãos e
cunhados que me fazem viver melhor.
Aos meus amigos do curso de História que fizeram com que a vida
acadêmica se tornasse bem mais leve, e especialmente à Euzeli Piccoli, Daniele
Evangelista e Vanessa Keiko que não só integram o grupo de estudos, mas um
grupo pessoal de amigos.
Ao meu orientador professor Armando de Melo Servo Constante por
acreditar, incentivar e instruir a elaboração desta pesquisa.
Aos professores Nestor Guerra, Leandro Bassini, Ângelo Nanni e Sônia
Regina, que deixaram suas contribuições, cada qual ao seu modo, no longo e
permanente aprendizado.
Aos professores Paulo Castagna e Régis Duprat que gentilmente deram
suas opiniões sobre este trabalho e mais que isto, cederam generosamente
alguns de seus trabalhos para minha pesquisa.
Ao pessoal do Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg” pelo
auxílio e especialmente a Mirian Fukamidu que pacientemente dispôs seu tempo
para ajudar esta pesquisa.
“... que se saiba que o pouco que
aprendi até agora é quase nada em
comparação com o que ignoro, e que
não perdi a esperança de poder
aprender.”
René Descartes
RESUMO

Este trabalho trata inicialmente de como a música se fez praticar na


colônia, considerando a estrutura social e econômica à que as vilas coloniais
estavam submetidas. Isto para poder compreender em que contexto o Grupo de
Mogi das Cruzes, os manuscritos musicais mais antigos do Brasil, estava inserido.
Estas partituras encontradas em 1984 sugerem diversas explicações para um
conhecimento da atividade musical na colônia, tanto no campo do contexto
histórico quanto do musicológico. Depois, procurou-se investigar em documentos
históricos, registros que indicassem a prática de música na então Vila de Mogi
das Cruzes, para entender um pouco do cenário que faz do Grupo de Mogi das
Cruzes a expressão musical de um contexto histórico.

Palavras-chave: Música colonial – Grupo de Mogi das Cruzes – Prática de


música em Mogi das Cruzes.
LISTA DE ABREVIATURAS

ACMSP Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo


AHHIG Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”
GMC Grupo de Mogi das Cruzes
IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..................................................................................................... 11
1. A MÚSICA COLONIAL.............................................................................. 13
1.1 A Música dos Jesuítas................................................................................ 13
1.2 A Música Dentro e Fora da Igreja............................................................... 18
1.3 A Música Profana na Colônia..................................................................... 22
2. O GRUPO DE MOGI DAS CRUZES.......................................................... 27
2.1 O Achado de Mogi...................................................................................... 27
2.2 Caráter Documental do Grupo de Mogi das Cruzes................................... 28
2.3 Origem e Datação....................................................................................... 30
2.4 Autoria ou Uso............................................................................................ 31
2.5 Personagens do Grupo de Mogi das Cruzes.............................................. 34
2.5.1 Faustino do Prado Xavier........................................................................... 34
2.5.2 Ângelo do Prado Xavier.............................................................................. 35
2.5.3 Timóteo Leme do Prado............................................................................. 35
2.6 As Obras Musicais...................................................................................... 36
2.7 A Cantiga de Mogi...................................................................................... 39
3. PRÁTICA DE MÚSICA NA MOGI COLONIAL.......................................... 42
3.1 Aspectos Sociais e Econômicos da Mogi Colonial..................................... 42
3.2 A Música nas Vilas..................................................................................... 44
3.3 Música na Mogi Colonial............................................................................. 45
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................ 56
FONTES PRIMÁRIAS......................................................................................... 57
REFERÊNCIAS................................................................................................... 58
ANEXOS.............................................................................................................. 60
11

INTRODUÇÃO

A descoberta de partituras do século XVIII em Mogi das Cruzes no ano


de 1984 movimentou o meio musicológico por tratar-se dos manuscritos musicais
brasileiros mais antigos até então encontrado. Estes papéis de música foram
denominados de Grupo de Mogi das Cruzes e teve seu conteúdo estudado por
musicólogos e pesquisadores da área. Por ocasião destes estudos, foi
pesquisada alguma coisa da música em Mogi, para relacionar os aspectos
envolvidos nas partituras com o passado musical dessa cidade, que era vila
quando da produção destes papéis de música.
Ao procurar estes aspectos pôde se observar que o passado musical de
Mogi das Cruzes estava ainda atrelado a poucas informações dispostas nesses
trabalhos sobre o Grupo de Mogi das Cruzes, e em trabalhos sobre a história de
Mogi com alusões e citações à prática de música na vila. A pergunta que surgiu e
que se tornou o problema deste trabalho então, foi se era possível encontrar em
documentos, através de investigação em fontes primárias, registros da prática de
música na Mogi colonial. Apesar das dificuldades de abordagem às fontes
primárias, pela leitura paleográfica se tornar uma constante, e a busca de
bibliografia, que tem a maioria dos trabalhos ainda não publicados, encarei esta
situação como um desafio a ser enfrentado, consciente das dificuldades, mas
vibrando com cada êxito.
Deste modo procurou-se elaborar o trabalho da seguinte maneira: O
primeiro capítulo busca mostrar o contexto da música colonial, com suas
características enquanto colônia. A princípio o contato entre a música dos
colonizadores e a dos colonizados. Depois, com a estrutura colonial funcionando
a música assume estes contornos e reflete as situações e contradições de cada
vila, inclusive com a presença de música profana.
No segundo capítulo procurou-se conhecer o histórico do Grupo de
Mogi das Cruzes, bem como as discussões estabelecidas de seu conteúdo e de
seu contexto musical e histórico. Como algumas dessas discussões envolvem o
campo da musicologia, optou-se por buscar as informações em trabalhos de
especialistas para não incorrer em erros e fugir do escopo do trabalho.
12

Por fim, o terceiro capítulo tratou de investigar se as características


presentes em outras vilas coloniais poderiam se aplicar também a Mogi das
Cruzes. Buscou-se também através de documentos, registros que indicassem em
Mogi uma prática de música que contextualizasse o Grupo de Mogi das Cruzes.
13

1. A MÚSICA COLONIAL

Falar de música no Brasil, do período correspondente ao que


chamamos de Brasil colonial, requer alguns cuidados ou pelo menos algumas
considerações. Isto porque algumas generalizações podem se mostrar não muito
adequadas à realidade musical do Brasil se comparadas ao que ocorria em terras
da metrópole ou da Europa. A denominação mais conhecida, que é a música
barroca, pode não ser tão precisa por não guardar estreita similaridade com o
estilo assim designado na Europa entre 1600 e 1750. A escassez de fontes
musicais principalmente destes dois séculos (XVII e XVIII) torna difícil uma análise
mais detalhada de estilos musicais. Desta forma, pretende-se usar aqui a
expressão música colonial, entendendo ser esta apenas a designação do período
histórico abarcado e não algum estilo definido.
É necessário considerar também a estrutura social da colônia e como a
música se fez praticar em diversos aspectos da vida dos colonos. Isto implica
pensar não só na predominante música religiosa, seja dos jesuítas, da música
praticada na igreja ou também daquelas praticadas em associações leigas ligadas
às ordens religiosas tradicionais, como também da música praticada no campo do
profano, como exemplo a de índios e negros.
Pretende-se aqui conhecer algumas das características que envolvem
estas duas esferas da música colonial, que é a religiosa e a profana, para uma
melhor compreensão do conteúdo das partituras do Grupo de Mogi das Cruzes,
assunto do próximo capítulo.

1.1 A MÚSICA DOS JESUÍTAS

Segundo Mário de Andrade, a música brasileira se desenvolveu


obedecendo a evolução musical presente em qualquer outra civilização: Deus em
primeiro lugar, depois o amor e então a nacionalidade.(ANDRADE, 1975 p.19) De
acordo com o autor ainda, a colônia não superou a primeira etapa dessa
evolução: a religiosidade musical. Recuando ao início da colônia se verá que a
14

música dos jesuítas fazia jus a esta religiosidade musical, mas no sentido da obra
de catequese e dentro do contexto histórico, como instrumento de colonização.
A companhia de Jesus, fundada por Inácio de Loyola e criada
oficialmente em 1540, tinha como objetivo levar a palavra de Cristo aos pagãos.
Com a área de atuação dos jesuítas se estendendo a outros continentes, o padre
jesuíta Manoel da Nóbrega chegou ao Brasil em 1549 junto com a armada de
Tomé de Souza dando início a missão em terras brasílicas. Além do objetivo
principal, os jesuítas se dedicaram na educação da população dos novos centros
urbanos e na formação de colégios e seminários onde estabeleceram uma
primeira rede de ensino no Brasil.
Em sua atuação musical, os jesuítas perceberam o quão eficaz era a
música no possível convencimento e atração dos indígenas para as práticas da
igreja. E assim os jesuítas se ocuparam com o ensino de música tanto em língua
portuguesa como na própria língua dos índios. E isto tinha uma razão:

A antiga prática de cantar e dançar dos índios nos seus rituais cotidianos
foi utilizada para induzir, de maneira atenuada, aos novos e diferentes
símbolos religiosos trazidos pelos jesuítas. Dessa forma foi possível
enraizar no passado indígena a nova experiência proposta para o grupo.
(POLASTRE, 2008, p. 20).

Assim foi comum o ensino de canções a “curumins” em casas e aldeias


da Companhia com o objetivo de,

...substituir a tradição musical nativa, por um repertório essencialmente


cristão. Se a função das grandes cerimônias oficiadas a coro com
instrumentos era levar aos índios a exuberância do universo cristão, a
função das canções simples, normalmente cantadas nas línguas dos
próprios índios, era transmitir o significado dos principais símbolos e
mistérios cristãos. (CASTAGNA, 2004, p. 2).

O resultado disto foi que longe de existir algum tipo de intercâmbio nas
relações musicais entre indígenas e jesuítas, o que predominou foi uma
superposição de culturas, com a elevação de uma suposta cultura civilizatória
sobre a cultura indígena.
Segundo nos conta José Ramos Tinhorão, além de se fazer estas
pequenas canções nas línguas indígenas, os jesuítas também foram substituindo
os instrumentos dos índios. O que era usado até então deu lugar a instrumentos
trazidos pelos jesuítas e que modificou totalmente a estrutura natural da música
15

dos índios. Dessa forma ficou mais fácil a imposição de uma música diferente,
mais atrativa, ao que os índios estavam acostumados a cantar. Não são poucos
os relatos de padres dando conta da destreza de índios em ajuda na liturgia da
missa. Sobre este fato Tinhorão destaca:

Assim, é mais do que evidente que, se a execução musical desses


pequenos instrumentistas indígenas se fazia “com a mesma perfeição
que os portugueses”, a música que executavam nada tinha a ver com a
música de suas tribos. (TINHORÃO, 1975, p. 12).

Para Tinhorão então, operou-se um processo de “deculturação” 1, onde


a música indígena deu lugar a canções dos jesuítas em línguas indígena, para
enfim ser abolida em detrimento do uso de línguas não tupis, contextualizado com
o avanço da colonização e a progressiva extinção de índios da costa. Outros
autores defendem outras abordagens a essa questão, por não ser possível,
segundo eles, a anulação total de uma cultura.
É importante lembrar que a prática de música junto aos índios em
línguas tupi, não esteve circunscrita somente aos jesuítas. Outras ordens
aproveitaram a experiência da Companhia e em diversos lugares têm-se a
atuação de Franciscanos e uma divisão destes, os Capuchinhos registrando
informações sobre a participação de índios em sua música.
Outro importante reflexo desse ensino de música dos jesuítas encontra-
se naqueles que ficaram conhecidos como “índios músicos de Pernambuco”.
Estes índios que também foram chamados por escritos da época de
Nheengaraíbas, Tubinambás ou Tabajaras encontram-se atuantes de acordo com
os registros, pelo menos no período de 1607 a 1663, segundo nos informa Paulo
Castagna. Os índios músicos, que provavelmente aprenderam música com os
jesuítas em Pernambuco, seguiram estes na migração para o centro e norte do
país junto com os poucos índios catequizados, depois de extinta a maior parte
das aldeias da costa. Estes índios que depois de treinados praticavam música

1
Este conceito é defendido por Tinhorão, supondo justamente a substituição da música indígena
pela música cristã. (TINHORÃO, José Ramos. A deculturação da música indígena brasileira.
Revista brasileira de Cultura, Rio de Janeiro, n.13, jul/set 1972, p.9-25). Um outro conceito seria a
“aculturação”, onde em vez da substituição, se propõe a transformação da cultura de um grupo
social, através da assimilação de elementos culturais de outro grupo social.
16

religiosa portuguesa, “provavelmente em troca de pagamento, gêneros de


consumo ou até de abrigo” (CASTAGNA, 2004, p. 14).
Muitos autores do século XVII dão conta da presença destes índios
músicos não só em Pernambuco, mas viajando junto com os jesuítas para outras
regiões. Serafim Leite informa sobre um destes: Luís Figueira, que escreve ainda
em 1607 sobre os nheengaraíbas que seguiam do Pernambuco para o Maranhão.
O relato é importante também por mostrar a visão que tinham de “domesticar” os
índios, além da aceitação destes da cultura musical dos jesuítas, entendida de
música por “papel”.

São todos estes incrivelmente inclinados a cantar e dançar, e porque os


Pitiguares são nisto afamados e conosco iam alguns nheengaraíbas ou
mestres de capela desatinavam-nos que cantassem para os ensinarem;
e, fazendo revezar ora uns ora outros, cantavam dias e noites, de 24 em
24 horas, sem interromper, até não poderem falar de roucos, tendo isto
por valentia e delírios. E a nós pediram que lhes ensinássemos seus
filhos o papel (como eles dizem), querendo dizer que lhes ensinássemos
a ler e cantar o nosso canto, o que nós com facilidade fizemos para os
domesticar; mas eles mostram mui pouco talento para o nosso canto;
(LEITE Apud CASTAGNA, 2004, p.15).

Já por volta de 1656, outro autor, João Felipe Betendorf, menciona a


presença dos índios músicos de Pernambuco agora no Ceará, na Serra de
Ibiapaba recebendo o Padre Antonio Vieira:

Logo que os Padres Missionários e índios da aldêa souberam que vinha


o Padre Subprior Antonio Vieira, o foram receber ao caminho com os
Principaes com muita festa e danças dos meninos, e assim o
acompanharam até a egreja onde se repicou sino, tocando os Tabajaras
Pernambucanos suas charamellas e frautas. (BETTENDORF Apud
CASTAGNA, 2004, p.16).

Um outro aspecto importante sobre a atuação musical dos jesuítas


pode ser percebido em trabalhos acadêmicos sobre os inventários de colégios,
seminários, aldeias e fazendas dos jesuítas após sua expulsão em 1759.
Segundo estes inventários observa-se que, em colégios e seminários a presença
de instrumentos limita-se praticamente ao órgão; alguns já em desuso décadas
após a compra. Por outro lado, os inventários de fazendas e aldeias mostram uma
variedade de instrumentos que permitem estabelecer uma relação entre o uso de
diversos instrumentos e a presença dos índios. Ou seja, havia restrição de música
17

para os jesuítas fora do trabalho da catequese, seja por recreação ou pela própria
prática de música.
Um bom exemplo disso pode ser visto em São Paulo. Na igreja do
Colégio de São Paulo, Marcos Holler identifica através de documentos do Arquivo
Nacional basicamente “um órgão pequeno de três com todos os seus canudos de
estanho, em bom uso”. Por outro lado, o mesmo autor mostra que em inventário
da capela da Aldeia de Embu em São Paulo, realizado em 02 de dezembro de
1759, a cópia do Arquivo Público do Estado de São Paulo mostra os seguintes
itens:
Um órgão pequeno;
Um manicórdio;
Um baixão;
Duas harpas,
Uma caixa com vários papéis de solfa,
Duas rabecas novas com sacos de baeta vermelha, e suas caixas;
Uma rabeca com seu saco de linhagem;
Um rabecão novo com sua caixa;
[...];
Três bancos no coro; dois de espaldar, e um pequeno do órgão;
Uma caixa, em que estão nove saiotes e outros enfeites das danças dos
carjós. (Inv. Emb, 1759, f. 8 Apud HOLLER, 2005, p.63)

Segundo os responsáveis pela Companhia de Jesus, entre eles o


próprio Inácio de Loyola, embora fosse permitida a prática musical junto aos
índios, a restrição era justificada pela própria vocação dos jesuítas. É o que nos
mostra Marcos Holler ao afirmar que,

Um aspecto extremamente importante da Companhia de Jesus era sua


atuação ativa junto ao povo, em obras assistenciais e de catequese, e
segundo Loyola, a música absorveria os padres e tiraria sua atenção do
trabalho cotidiano. ...havia lugares de sobra para os que desejassem
ouvir música em um ofício, mas “aos nossos, porém, convém que tratem
do que é mais próprio à nossa vocação para a glória de Deus” (HOLLER,
2005, p.66).

Em suma, a prática de música pelos jesuítas esteve pautada


principalmente por sua atuação junto aos indígenas. Em tempos da expulsão da
Companhia de Jesus em 1759, as igrejas das principais vilas já tinham mais de
um século. E nesse entremeio a figura do mestre-de-capela se estabelecia na
atividade musical da igreja e também fora dela.
18

1.2 A MÚSICA DENTRO E FORA DA IGREJA

Pelos motivos já citados, os jesuítas não poderiam se ocupar da música


da igreja, deixando a cargo de outros a prática musical dentro das funções
litúrgicas e também fora delas. O desenvolvimento musical das igrejas coloniais
variava conforme a situação econômica local. Regiões mais prósperas nos
primeiros séculos de colonização como o Nordeste, presenciaram uma atividade
musical mais cedo que as demais. Com a economia do ciclo da cana-de-açúcar
dando condições para que muitos portugueses se transferissem para lá, a cultura
portuguesa foi sendo instalada e com isso, também a prática de música foi
assimilada conforme o gosto lusitano. Assim, foi centralizada a atividade musical
em Salvador na Bahia, Recife e Olinda no Pernambuco, e em menor escala em
São Luis no Maranhão e Belém no Pará.
Em São Paulo, “a música ocupa um espaço modesto e precário na vida
religiosa de São Paulo” (POLASTRE, 2008, p.31). Com a solicitação da
construção em 1589, a igreja matriz da Vila de São Paulo foi fundada em 1611. A
notícia provavelmente mais antiga da atividade musical da matriz é de 1649 e dá
conta de uma queixa do vigário da matriz, padre Domingos Gomes Albernaz
contra o mestre-de-capela2 Manuel Pais de Linhares:

Apareceu o padre Domingos Gomes Albernaz e por ele foi dito que não
é a serviço de Deus nem sem o ornato do culto divino que Manuel Pais
de Linhares exercitasse o ofício de mestre de capela por quanto não era
útil nem capaz servir o dito cargo por nele ser muito serviço não tendo
discípulos nem músicos para se celebrarem os ofícios divinos como é
uso e costume em todos os mestres de capela (Atas da Câmara de São
Paulo - v.5, p.372-373 Apud POLASTRE, 2008, p.32).

Manuel Pais de Linhares é, na documentação, o primeiro mestre-de-


capela da Sé de São Paulo registrado, sendo sucedido por Manuel Vieira de
Barros (1657), José da Costa Homem (1680), Manuel Lopes de Siqueira (1716-
1725), Padre Ângelo de Siqueira (1725-1734), Padre Matias Álvares Torres
(1735-1768), Antonio Manso da Mota (1768), Antonio da Costa Oliveira (1769),
2
O mestre-de-capela é o equivalente ao maestro di capella (Italiano) ou maître de chapelle
(Francês). Serve para designar o regente ou diretor de música de uma igreja, capela ou outro
estabelecimento sacro ou profano. Enquanto na Alemanha o termo era aplicado mais ao diretor de
uma orquestra particular de um príncipe, nos países latinos como o Brasil conservou-se vinculado
ao sentido eclesiástico da capela de música da catedral ou da igreja. (Enciclopédia da Música
Brasileira, 1972, p.478).
19

Antonio Manso da Mota (1774), André da Silva Gomes (1774-1806) e Joaquim da


Silva (1806).
O próprio relato do padre Domingos Gomes Albernaz mostra tanto a
escassez de músicos, como um aspecto das funções de um mestre-de-capela,
que era de formar discípulos na comunidade que auxiliassem no canto da igreja.
Além da incumbência de transmitir conhecimentos musicais aos jovens, o mestre-
de-capela tinha a função de compor para a catedral ou matriz o repertório litúrgico
a ser utilizado. Ele tinha, portanto, a tarefa de ensaiar e dirigir o coro de música e
contratar e pagar os músicos escolhidos por ele. Aliás, esta é uma questão
interessante, pois o mestre-de-capela pagava aos músicos seculares, enquanto
que a atuação musical dos discípulos funcionava como uma retribuição do ensino
de música do mestre-de-capela. Esta prática resolvia um pouco a carência de
músicos locais.
É importante dizer que não era só na música regular das matrizes que o
mestre-de-capela executava sua música. Existiam também as chamadas festas
reais. Estas eram festas religiosas celebradas dentro de domínios portugueses e
selecionadas do próprio calendário católico. Como quem contratava a música
para as festas reais era a própria Câmara local, elas aconteciam no reflexo das
possibilidades locais e de acordo com os recursos de cada vila. Dessa forma, era
possível que nem todas ocorressem regularmente todo ano, podendo haver uma
ou outra quando os recursos a permitiam. As festas reais eram normalmente
quatro (MONTEIRO, 2009, p. 84).

Corpus Christi ou Corpo de Deus: Data do século XIII e é


realizado na 5ª feira seguinte ao Domingo da Santíssima Trindade. Era
considerada como a festa mais importante da qual participavam os poderes civil,
eclesiástico e militar.
Anjo Custódio do Reino: Era celebrada no terceiro domingo de
julho, lembrando o anjo protetor do reino de Portugal.
Festa de São Sebastião: Celebrada sempre na data de 20 de
janeiro, esta festa envolvia o pedido de proteção conta epidemias.
Visitação de Santa Isabel: Era celebrada em 2 de julho e data do
século XIII. Foi adotada pelos franciscanos em 1263, e depois reconhecida pelo
Papa Bonifácio IX em 1383.
20

Um fato interessante que ocorria no provimento de música para estas


festas reais era que, se o mestre-de-capela fosse eclesiástico ele receberia
salário fixo anual da Fazenda Real e, portanto, não poderia receber do provento
da Câmara, sendo pago os músicos seculares que o acompanhassem. Quando o
mestre-de-capela fosse secular, o que não era incomum dada a escassez de
músicos, ele teria sua remuneração garantida, pois não poderiam cantar de graça.
Uma prática que foi adotada pelos mestres-de-capela no sentido de
obter melhores rendimentos, uma vez que seu salário era extremamente módico
foi de,

... cobrar pela música e pelos músicos paras as festas realizadas.


Acontece que: como os cantores e instrumentistas eram discípulos do
mestre, era seu costume utilizar o valor recebido como manutenção do
seu trabalho (POLASTRE, 2008, p.36).

Era então compensador para os mestres-de-capela manter discípulos


cantores e instrumentistas em sua música participando do maior número possível
de festas reais ou particulares, como as das irmandades e ordens terceiras.
As irmandades, que eram agremiações de leigos ou clérigos de uma
mesma classe social tinham ou uma finalidade social, como a Irmandade da
Misericórdia, ou voltavam-se para atividades religiosas e de apoio ao culto,
devotando-se a um santo específico. Temos então como exemplo a Irmandade do
Senhor Bom Jesus dos Passos cuidando da Procissão dos Passos em Vila Rica,
assim como tantas outras cuidando de missas e procissões no século XVIII
(MONTEIRO, 2009, p. 86). A música normalmente era contratada por períodos
específicos, sendo o mestre-de-capela muitas vezes o encarregado desta música.
A despeito da importância delas, as irmandades tinha sua atividade musical
limitada, como mostra Paulo Castagna:

As irmandades exerciam forte competição entre si, visando obter mais


adesões e, com isso, maior arrecadação em anuidades. Por outro lado,
as irmandades não tinham licença da Igreja para a execução de música
em quaisquer cerimônias. Pelo contrário, cada irmandade recebia
autorização para celebrar apenas algumas cerimônias do calendário
litúrgico (CASTAGNA, 2004, p.5).
21

As ordens terceiras que também eram associações de leigos, porém


sob a tutela de ordens regulares, tinha muitas vezes também o mestre-de-capela
da matriz cuidando de sua música. Muito do que se tem registrado em
documentos mostra o recebimento pelo mestre-de-capela dos proventos
destinados à música nas festas promovidas por estas ordens terceiras. A carência
de músicos fazia também o mestre-de-capela ser requisitado para festas de
igrejas de outras vilas quando se fazia necessário.
A atuação legal do mestre-de-capela estava sujeita a uma provisão
dada pelo Bispo responsável, que no caso de São Paulo foi o Bispo do Rio de
Janeiro até 1745, quando foi criado o Bispado de São Paulo. Esta provisão era
emitida a cada ano, podendo ser renovadas a cada ano o cessadas conforme a
conveniência e a determinação do Bispado (DUPRAT, 1975, p. 17). Aliás, na
relação entre o mestre-de-capela e o Bispo provedor acontecia um procedimento
que ficou marcado por seu caráter monopolizador da música principalmente no
século XVIII e que recebeu o nome de “estanco da música”. Este procedimento
consistia na cobrança por parte do mestre-de-capela da licença para outros
músicos que quisessem tocar ou cantar em regiões onde aquele era o titular do
mestrado. Ou seja, o mestre-de-capela poderia cobrar de outros músicos ou até
mesmo de outro mestre-de-capela pela música praticada em sua freguesia. Pela
concessão deste monopólio, o mestre-de-capela pagava uma pensão anual ao
Bispo. Regis Duprat que bastante estudou este assunto demonstra a situação do
mestrado na matriz de São Paulo:

Pagava-se pensão-trinta mil réis por ano-ao Bispo para ser mestre da
capela só cobrando a licença. Na linguagem do tempo: "estancar" a
música, única forma econômico-social de sobreviver profissionalmente e
apresentar um bom serviço de música na Matriz (DUPRAT, 1975, p.18).

Este pagamento em verdade era considerado irregular para as


autoridades reais, como o Conselho Ultramarino. No entanto, na prática servia
como justificativa o fato do mestre-de-capela poder assim controlar a música
praticada na comunidade, não deixando praticar música profana. Sobre o fato
deste pagamento não constar na provisão, Duprat completa:

Não constante de provisão porque é ilegal: não obstante, praticada.


Envolve-a -a prática- em manto protetor, a necessidade indiscutível,
22

legalíssima, de salvaguardar o tempo da penetração estética profana.


Aparência garantida e conforme (DUPRAT, 1975, p.18).

Um outro procedimento presente na música colonial foi o licenciamento,


que consistia em ordenar um músico através de um processo de habilitação
conduzido por um tribunal eclesiástico. A habilitação de mestre de música era
dada a um leigo permitindo-o participar do “espetáculo litúrgico”, mas sem a
garantia de ser provido como mestre-de-capela. Diósnio Machado Neto informa
que este procedimento era usual e que a grande maioria dos mestres-de-capela
de São Paulo da primeira metade do século XVIII eram “licenciados” (MACHADO
NETO, 2009, p. 43-47). No processo de habilitação o candidato deveria
comprovar além de suas habilidades musicais, a pureza de seu sangue. Ou seja,
seria investigado pelos vigários na localidade de origem do candidato se existia
nele alguma descendência com negros, mouros ou cristãos novos (judeus). Seria
investigado ainda se o candidato possuía alguma deformidade no corpo, isto
como sinais de distanciamento ou ira divina (MACHADO NETO, 2009, p. 43).
Dessa forma temos na colônia a figura do mestre-de-capela conduzindo
o processo de desenvolvimento musical dentro das igrejas e também fora dela.
Desenvolvimento este que esteve vinculado às diferenças dos centros com
grandes recursos e a situação precária das igrejas sertão adentro.

1.3 A MÚSICA PROFANA NA COLÔNIA

Com a ligação Estado-Religião predominando na vida colonial, a


condição da Igreja Católica como religião oficial permitiu uma tentativa de
controlar a música praticada fora da igreja e de se evitar seu uso dentro dela. Esta
música identificada como profana, era alvo já na legislação portuguesa. As
denominadas Ordenações do Reino eram códigos legislativos portugueses nas
quais a América Portuguesa estava sujeita. O conjunto principal de leis adotado
no Brasil foram as Ordenações Filipinas, que promulgadas em 05/06/1595
vigoraram até 01/01/1917, sendo substituídas então pelo Código Civil Brasileiro.
Nas Ordenações Filipinas encontra-se uma determinação com o título
“Dos que dão música de noite”, onde se procura evitar que pessoas cantem ou
23

toquem alguns instrumentos a porta de outras pessoas. Outra determinação


intitulada “Que os escravos não vivam per si e os negros não façam bailes em
Lisboa” vai de encontro aos escravos africanos em Lisboa, proibindo-os de se
ajuntarem e bailarem sob pena de prisão. (CASTAGNA, 1999, p.3)
Esta referência a cidade de Lisboa mostra um caráter dessas proibições
que foram aplicadas também na América Portuguesa. Aqui, os que primeiramente
sentiram essas determinações foram os índios. Não que o problema fosse sua
presença nas cidades, mas o que se queria evitar era suas manifestações
culturais no ambiente urbano. Paulo Castagna mostra um requerimento registrado
nas Atas da Câmara da Vila de São Paulo de 21/10/1623, onde se proíbe aos
índios a prática de músicas e danças na vila:

[...] E requereu mais o dito procurador, que se fizesse acordo sobre o


gentio que nesta vila fazem bailes de noite e de dia, porquanto nos ditos
bailes sucedia muitos pecados mortais e insolências contra o serviço de
Deus e bem comum, em cometerem fugidas e levantamentos e outras
cousas que não declaravam, por não ser decente, e visto o dito
requerimento, acordaram os ditos oficiais da Câmara que, antes da
missa do dia, nem de noite, não houvesse os ditos bailes sob pena do
dono do negro ou negra [refere-se aos indígenas] que for achado nos
tais bailes, pagar cem réis por cada negro ou negra que for achado, para
qual efeito serão presos e da cadeia pagará seu senhor [...]
(CASTAGNA, 1999, p.4).

Da mesma forma, quando os escravos africanos passaram a constituir


a mão-de-obra principal nos engenhos, seus costumes eram tolerados pela maior
parte dos senhores no campo, enquanto que nas festas urbanas estes costumes
eram proibidos. Para as autoridades eclesiásticas, as festas com altares e
imagens cristãs acabavam por dar lugar a batuques3 com participação de negros
e mulatos. Para dar um parecer sobre este assunto, o Bispo do Rio de Janeiro D.
Frei Antônio do Desterro emitiu uma pastoral em 11/03/1747 declarando ser
perigosa estas práticas e contra os bons costumes, ficando sob pena de
excomunhão quem participasse ou cooperasse com estas práticas.
A pastoral, que é uma carta dirigida pelo bispo aos seus diocesanos, é
um exemplo da legislação eclesiástica a que estava sujeita a música colonial.
Existia também as visitas que eram documentos decorrentes da visita realizada
em determinada paróquia por um padre visitador, e as provisões que já foram

3
Batuque se tornou uma expressão genérica portuguesa para qualquer tipo de dança de origem
africana com acompanhamento percussivo.
24

citadas nesse trabalho e serviam para prover uma pessoa em determinado cargo.
De modo mais abrangente, todo o mundo católico estava sujeito aos concílios
gerais (como o famoso Concílio de Trento), enquanto que os concílios provinciais
e as constituições eram aplicadas a bispados e arcebispados.
Esta diferença entre a proibição dos costumes dos negros nos
ambientes urbanos e sua permissão nos engenhos tem um aspecto interessante
se confrontado os motivos deste último. De modo a manter um bom rendimento
no trabalho, foi aconselhado que os negros tivessem em certos dias, algumas
horas de folga para cantar e dançar segundo seus costumes. É o que vemos na
recomendação do padre jesuíta João Antônio Andreoni, que sob o pseudônimo de
André João Antonil publica em 1711 o livro Cultura e Opulência no Brasil:

Os escravos são as mãos e os pés do senhor do engenho; porque sem


eles no Brazil não é possível fazer, conservar, e aumentar fazenda, nem
ter engenho corrente. E do modo, com que se há com eles, depende te-
los bons, ou maus para o serviço... Os domingos e dias santos de Deus,
eles o recebem: e quando o senhor lhos tira, e os obriga a trabalhar,
como nos dias de serviços se amofinão e lhe rogão mil pragas... O certo
é que, o senhor se houver com os escravos como pai, dando-lhes o
necessário para o sustento e vestido e algum descanso no trabalho, se
poderá também depois haver com o senhor...
Negar-lhes totalmente os seus folguedos, que são o único alívio do seu
cativeiro, é querê-los desconsolados e melancólicos, de pouca vida e
saúde. Portanto, não lhes estranhem os senhores o criarem seus reis,
cantar e bailar por algumas horas honestamente em alguns dias do ano,
e o alegrarem-se inocentemente à tarde depois de terem feito pela
manhã suas festas de Nossa Senhora do Rosário, de São Benedito e do
orago da capela do engenho, sem gasto dos escravos, acudindo o
senhor com sua liberalidade aos juízes e dando-lhes algum prêmio do
seu continuado trabalho. [...] (ANTONIL, 1982, p.92).

De fato, esta conduta observou-se em muitos engenhos, já que como


mostra André João Antonil a situação de proibição refletia nas próprias ações
produtivas dos núcleos de trabalho. Este relato do padre jesuíta é importante
também por informar a atuação dos negros em uma organização social permitida
pela Igreja: as irmandades. Como já foi visto as irmandades que permitiam a
associação de leigos de uma mesma classe social, foi uma forma de negros
africanos e seus descendentes participarem do que José Ramos Tinhorão chama
de,

Único setor da estrutura montada pelo colonizador branco que lhes


permitia uma abertura para participação dinâmica na vida da sociedade
colonial (TINHORÃO, 1975, p.44).
25

Temos então diversas irmandades de negros criadas a partir do século


XVII, algumas tendo como padroeiros santos de pele escura como São Benedito
e Santa Ifigênia, mas a maioria devotando-se a Nossa Senhora do Rosário que
era branca. Sob estas irmandades, os negros escravos conseguiam sair às ruas
com seus instrumentos em procissões e festas promovidas por portugueses.
Tinhorão informa, porém, que era preciso uma licença dada pelos padres da
Igreja de Nossa Senhora do Rosário a pedido dos negros das irmandades.
Como o espaço é pequeno para descrever toda, ou pelo menos, uma
parte maior da diversa música profana praticada na colônia, vale dizer que a
preocupação da Igreja voltou-se também para gêneros musicais de função
religiosa, mas sem inspiração litúrgica. A música litúrgica continha texto
oficializado pela Igreja em latim e estava presente em livros litúrgicos. Já a música
não litúrgica empregava textos não encontrados no texto litúrgico e música fora
das rigorosas normas de composição dos textos litúrgicos.
Assim, as cantigas e os vilancicos foram combatidos como “impuros” e
“profanos” do seu uso na igreja. Como mostra Paulo Castagna, por seu caráter
popular e poder atrativo sobre os fiéis, os vilancicos foram utilizados em devoções
não litúrgicas sob supervisão de religiosos. Como visto anteriormente, o mestre-
de-capela tinha a obrigação de examinar os papéis de música utilizados na
região, para evitar o uso desses vilancicos na igreja. A provisão de Francisco
Xavier da Silva no mestrado da capela da matriz da vila do Ribeirão do Carmo, e
emitida pelo Bispo do Rio de Janeiro D. Frei Antônio de Guadalupe em
21/08/1737 demonstra essa preocupação:

Mas porque, segundo o Sagrado Concílio Tridentino e Constituição [da


Bahia], somos obrigados a zelar e proibir que nas igrejas não hajam
músicas e cantares profanos e indecentes, a fim de que sejam todas
graves, edificativas e dignas do nome de louvor de Deus, mandamos ao
dito mestre da capela que todos os papeis que fizer cantar sejam com
estes requisitos e não contenham cantos ou vilancicos profanos e
indecentes e havendo de dar licença para que nas igrejas de seus
distritos cantem outros músicos, o não fará sem examinar primeiramente
os papéis, que hão de cantar em cada ocasião, e achando-os com as
gravidades sobreditas, em cada um escreverá o seu nome em
aprovação e em papel à parte dará a sua licença para aquela vez, a qual
ficará na mão do pároco da Igreja onde se houver de cantar.
(CASTAGNA, 1999, p.16).
26

Assim, a música se manifestou dentro das condições econômicas e


sociais a que cada localidade da colônia permitia. Mesmo com o predomínio da
música religiosa e o controle cultural da igreja, outras formas se expressaram no
âmbito musical, demonstrando características não tão coesas da vida colonial.
27

2. O GRUPO DE MOGI DAS CRUZES

Principalmente a partir da década de 1960, mas também com trabalhos


antecedentes a esta data, a música na colônia passou a ser mais conhecida pelos
pesquisadores e musicólogos, como visto no capítulo anterior. Até o inicio da
década de 1980, porém, as obras musicais mais antigas datavam do último
quartel do século XVIII: Padre José Maurício Nunes Garcia no Rio de Janeiro, a
Escola Mineira de Compositores, André da Silva Gomes em São Paulo, Luís
Álvares Pinto no Recife, entre outros. O manuscrito musical mais antigo até então
era o Recitativo e Ária de 1759, descoberto pelo musicólogo Régis Duprat e
atribuído ao mestre-de-capela da Sé de Salvador, Caetano de Melo de Jesus.
Em 1984, uma descoberta casual movimentou o meio musicológico
brasileiro, e recuou até a primeira metade do século XVIII a presença de fontes
musicais do passado colonial. Esta descoberta foi importante também para
confirmar e ampliar o conhecimento sobre o conteúdo e estilo da música colonial,
e aspectos da prática de música na colônia. Apoiando-se nos principais trabalhos
sobre o assunto que foram escritos por Jaelson Trindade, Régis Duprat e Paulo
Castagna, pretende-se mostrar algumas informações e considerações sobre o
Grupo de Mogi das Cruzes.

2.1 O ACHADO DE MOGI

Com o objetivo de montar um Museu de Arte Sacra ligado à Ordem


Terceira de Nossa Senhora do Carmo em Mogi das Cruzes, a Coordenação
Regional (São Paulo) do IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional4 na pessoa do historiador Jaelson Bitran Trindade recolhia em
documentos do Arquivo Histórico Municipal algo sobre a vida social e religiosa de
Mogi no século XVIII. Em 16 de março de 1984, Jaelson Trindade encontrou
semicoladas à capa e contracapa do Livro de Foral da Vila de Mogi das Cruzes,
iniciado em 11 de maio de 1748, algumas partituras manuscritas. Estas serviam
de recheio e preenchimento para a velha capa de couro do Livro de Foral.
4
Quando da descoberta, este órgão era designado como 9ª Diretoria Regional (São Paulo e
Paraná) da SPHAN/Pró-Memória. Hoje é designada como 9ª SR/SP-IPHAN
28

Após perceber a importância dos papéis de música, dada a antiguidade


do papel e a notação musical diferente, o livro foi retirado do Arquivo e entregue
ao Núcleo de Restauração da Biblioteca Municipal Mário de Andrade para o
descolamento total das partituras. Jaelson Trindade recebeu então, a colaboração
do já citado musicólogo Régis Duprat no trato do material. Este, já tinha realizado
diversas pesquisas e trabalhos sobre a música colonial paulista e os mestres-de-
capela em São Paulo.
Imediatamente, alguns dados permitiram com que os pesquisadores
estabelecessem relação entre os nomes presentes nos manuscritos e a época
abordada. O conhecimento disponível e novas pesquisas permitiram que Jaelson
Trindade comunicasse a descoberta na Revista do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional nesse mesmo ano, junto com algumas considerações sobre a música
colonial paulista e algumas características dos manuscritos encontradas na
pesquisa do agora Grupo de Mogi das Cruzes. Nesse mesmo número, Régis
Duprat em artigo realizou uma apreciação das obras representadas, destacando
sua importância e suas características.
É importante acrescentar que nessa mesma época, o historiador
Jurandir Ferraz de Campos de Mogi das Cruzes, ofereceu à 9ª DR/SP/PR-SPHAN
uma folha com as mesmas características das encontradas por Jaelson Trindade.
Esta folha assomou-se às vinte e oito encontradas, que passou a constituir-se o
Grupo de Mogi das Cruzes, os manuscritos musicais mais antigos do Brasil.
Um pouco mais tarde em 1990, o historiador mogiano Isaac Grinberg
comunicou em reportagem5 que localizara em Mogi das Cruzes sete folhas de
música relacionadas ao Grupo de Mogi das Cruzes. Esta correspondência foi
confirmada por Régis Duprat, mas estas folhas não foram cedidas pelo historiador
mogiano, que faleceu em março de 2000.

2.2 CARÁTER DOCUMENTAL DO GRUPO DE MOGI DAS CRUZES

Para os menos habituados a linguagem musicológica, como meu caso,


a designação que os manuscritos mogianos receberam desde o início pode

5
A reportagem referida é a seguinte: CAMARGO, Oswaldo de. A redescoberta do barroco. Jornal
da Tarde, São Paulo, 03 mar. 1990.
29

parecer meramente indicativa. Ou seja, Grupo de Mogi das Cruzes parece indicar
a reunião de papéis de música que foram encontrados na dita cidade. Ao estudar
um pouco mais sobre o assunto, percebe-se que a definição de grupo tem
implicações não só musicológicas, mas também implicações arquivísticas,
recorrendo ao caráter documental dos manuscritos.
A discussão sobre isso vem de encontro à diferença que existe entre
manuscrito musical e composição musical. Conforme mostrou Paulo Castagna, o
manuscrito musical é um documento, que ao servir de suporte físico à música não
possui necessariamente uma única obra e nem música de um único autor. Por
exemplo: um documento de determinada obra, se extraviado e sobrar apenas
uma parte não se constituirá ainda assim um documento? Segundo o autor, nesse
caso o documento pode ser entendido como “qualquer manuscrito, musical ou
não, que perdeu seu significado funcional e assumiu um significado histórico.” E
completa:

Por essas razões, não existe, principalmente na música religiosa, uma


necessária identidade entre composição e manuscrito musical. Em lugar
dessa identidade, é fundamental reconhecer a existência de duas
categorias arquivísticas distintas em um mesmo objeto: uma delas é o
manuscrito, o documento, o suporte físico, enquanto a outra é a
composição, a peça, a obra musical. (CASTAGNA, 2003, p. 3).

Em seu texto, Castagna reconhece três níveis básicos de organização


no plano arquivístico-musical, que ajuda-nos a esclarecer a designação dos
manuscritos mogianos. São eles:
1- Partes
2- Conjuntos
3- Grupos
A parte é um documento com música para um instrumento, uma única
voz ou conjunto de instrumentos ou vozes (naipe). Já o conjunto é uma unidade
documental onde estão todas as partes vocais e/ou instrumentais relacionadas a
uma mesma obra, elaboradas por um mesmo copista e em uma mesma época.
Por fim, o grupo é uma reunião de conjuntos que possuem a mesma música ou o
compartilhamento de obras entre si. Ele pode ser uma reunião de diferentes
conjuntos da mesma obra e elaboradas por copistas diversos, mas que foi juntado
por determinado músico ou arquivista. No caso do Grupo de Mogi das Cruzes,
30

Castagna presume a partir de investigações que as partes foram copiadas por


discípulos e juntadas em provável arquivo pelo mestre-de-capela.
Por isso o Grupo de Mogi das Cruzes foi designado dessa forma, já que
não possui caráter documental único e reúne diferentes cópias, copistas com
tipos de papel e tintas diferentes. É, pois constituído de dezesseis conjuntos de
cópias num total de vinte e nove folhas com dezesseis composições musicais 6.
Um pouco mais a frente se terá a oportunidade de conhecer tais obras.

2.3 ORIGEM E DATAÇÃO

O fato de os manuscritos mogianos terem sido encontrados como


preenchimento de encadernações não se constitui num evento isolado. Era uma
prática comum na Europa e na América a utilização de papéis velhos para aquele
fim. No caso do Grupo de Mogi das Cruzes, a renovação estilística de algumas
obras e a renovação de algumas cópias, que quando colocadas no Livro de Foral
já estavam envelhecidos, fazem supor aí a perda de sua função, e
consequentemente seu descarte para fins menos nobres.
Apesar da data do início do Livro de Foral, 1748, oferecer uma baliza
quanto a sua datação, Jaelson Trindade notou que quase todas as folhas
estavam comidas pelo bicho em algum ponto, enquanto que a capa de couro
estava na íntegra. Os nomes que estavam nas partituras – Faustino do Prado
Xavier, Ângelo do Prado Xavier e Thimóteo Leme do Prado – guiaram Trindade
para referências desses nomes em outros documentos e recuou o limite de
abordagem dos arquivos até a década de 1720.
Para um resultado melhor na datação das partituras, Jaelson Trindade
examinou também as marcas d’água (marcas do fabricante) dos papéis
encontrados nos manuscritos musicais e comparou com papéis de arquivos
paulistas datados entre 1721 e 1790. Com isso chegou ao resultado de que as

6
Em verdade, em 1984 quando escreveu o primeiro texto sobre o Grupo de Mogi das Cruzes,
Régis Duprat aludiu a cerca de 40 folhas de papel contendo seis diferentes peças religiosas e uma
profana. Sete composições, portanto. DUPRAT, Régis. Antecipando a história da música no Brasil.
Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, n 20, p.25-28, 1984. Com novas
investigações Paulo Castagna chegou ao número que foi referido no texto acima. CASTAGNA,
Paulo. Uma análise codicológica do Grupo de Mogi das Cruzes. IV ENCONTRO DE
MUSICOLOGIA HISTÓRICA, Juiz de Fora, 21-23 de julho de 2000. Anais. Juiz de Fora: Centro
Cultural Pró-Música; Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2002. p.21-71. A sugestão é
que se analisem os textos dos dois autores para uma melhor compreensão deste assunto.
31

marcas d’água correspondentes predominavam nas décadas de 1720 e 1730.


(TRINDADE, 1984, p.16). Em trabalho de 2000, Paulo Castagna ampliou as
datas-limite ao localizar algumas marcas em outros documentos, e recomendou
uma datação genérica com a expressão anterior à década de 1760. (CASTAGNA,
2000, p.36)

2.4 AUTORIA OU USO

A atribuição de autoria às músicas contidas no Grupo de Mogi das


Cruzes tem sido motivo de questionamentos nos trabalhos realizados desde sua
descoberta. Isto porque tem se levantado a discussão se os nomes presentes nas
partituras indicam os compositores ou os usuários dos papéis de música. A
dúvida é lançada inicialmente porque as partituras apresentam algumas obras
com os nomes de três personagens:

1- Bradados a 4 para Domingos de/ Ramos, e Sexta frª da/ Paixão./ De


Faustino do Prado Xavier.

Fonte: Arquivo Histórico "Historiador Isaac Grinberg"


32

2- Ex Tractatu Sancti Augustini/ De/ Angelo Prado xavier.

Fonte: Arquivo Histórico "Historiador Isaac Grinberg"

3- Tractus para Sexta frª Santa a 4/ Do uso/ De/ Thimoteo Leme

Fonte: Arquivo Histórico "Historiador Isaac Grinberg"

A questão é se o “De” representa nos dois primeiros casos acima a


atribuição da composição pelos citados ou se apenas o uso das composições
pelos citados. Já o terceiro caso acima não representa dúvidas, pois indica
expressamente a condição de usuário da composição por parte do nominado. Ela,
no entanto, reforça as dúvidas sobre os dois primeiros. Mas, veja-se como o
assunto foi tratado pelos pesquisadores que escreveram sobre o Grupo de Mogi
das Cruzes:
33

Jaelson Trindade ao apresentar a descoberta dos papéis de música em


artigo de 1984, escreve que são peças do século XVIII e, parte delas
seguramente compostas em Mogi e por dois mogianos. Depois, confirma que,

Algumas das composições traziam nome de autor – Faustino do Prado


Xavier e Ângelo do Prado Xavier – e, numa delas, vinha o nome de um
usuário – Thimóteo Leme. A maioria das composições era de caráter
sacro, feitas para ofícios da semana santa. Na falta de datação, não se
podia pedir melhor guia do que esses nomes para averiguar a época da
feitura e analisar as condições em que foram produzidas. (TRINDADE,
1984, p. 16).

Régis Duprat em artigo subseqüente na mesma revista considera a


mesma hipótese aventada por Trindade, pois para ele há pelo menos dois autores
nominalmente citados. (DUPRAT, 1984, p. 25) Mais tarde, em 1998, a
Enciclopédia da Música Brasileira na qual Duprat é um dos coordenadores,
mostra um verbete considerando a dúvida da atribuição de composição de Ângelo
do Prado Xavier:

Nesse material [os manuscritos musicais do Grupo de Mogi das Cruzes]


encontra-se um Ex tractatu Sancti Augustini, de discutível autoria de
Ângelo do Prado Xavier (1716-1769), seu irmão [de Faustino Xavier do
Prado], que em 1743 residia em Santos em 1768 morava com ele em
São Paulo. (DUPRAT apud CASTAGNA, 2000, p. 21).

Em 1999, quando da publicação do livro Música Sacra Paulista7 na qual


Duprat também foi coordenador, a obra acima foi identificada como de autor
anônimo.
Em artigo conjunto, Jaelson Trindade e Paulo Castagna começaram a
questionar a autoria das composições dos manuscritos mogianos e apontar uma
origem portuguesa para as obras. Destacaram também o fato de que alguma das
peças foram encontradas posteriormente em cópias mineiras e paulistas, sem
indicação de autoria, revelando que essas composições circularam nesses
territórios em períodos anteriores. A autoria é então tratada com reservas:
A documentação do Grupo de Mogi das Cruzes compõe-se de 29 folhas,
manuscritas por 10 a 15 copistas diferentes, três dos quais identificados
nas próprias cópias: Faustino do Prado Xavier, Angelo do Prado Xavier e

7
DUPRAT, Régis. (org.) Música Sacra Paulista. São Paulo: Arte & Ciência; Marília: Editora
Empresa Unimar, 1999. 308p. Foram incluídas nessa publicação mais três obras contidas no
Grupo de Mogi das Cruzes: Non in die festo (Bradados da Paixão de Domingo de Ramos), p.8- 16;
Domine audivi (Primeiro e segundo Tractos de Sexta-feira Santa), p.17-21; Regina cæli lætare
(Antífona de Nossa Senhora do Tempo Pascal), p.22-24.
34

Timóteo Leme que, como vimos, não são necessariamente os autores


das músicas. Por análises realizadas no papel e na caligrafia dos
originais, supomos que a maior parte dos manuscritos teria pertencido,
em data anterior a 1748, ao arquivo pessoal de Faustino do Prado Xavier
(1708-1800), mestre de capela de Mogi das Cruzes entre 1729-1733 e
cônego da Catedral de São Paulo na segunda metade do séc. XVIII.
(TRINDADE e CASTAGNA, 1996, p. 16).

Paulo Castagna em trabalho de 2000 mostrou os resultados de estudos


sobre o Grupo de Mogi das Cruzes e conseguiu identificar uma das obras, o Ex
Tractatu Sancti Augustini, como composição do frei carmelita português Manuel
Cardoso (1566-1650). Com a semelhança de outras obras de Grupo de Mogi das
Cruzes a manuscritos portugueses, Paulo Castagna indicou a inviabilidade da
possibilidade de autoria pelos mestres-de-capela de Mogi das Cruzes e sugeriu
uma origem portuguesa de tais obras. E também destacou a necessidade de uma
integração com a produção musicológica portuguesa. (CASTAGNA, 2000, p. 19-
26)

2.5 PERSONAGENS DO GRUPO DE MOGI DAS CRUZES

A despeito de toda a discussão sobre a real participação dos


personagens envolvidos nos documentos mogianos, é importante mostrar o que
já se conhece sobre eles.

2.5.1 Faustino do Prado Xavier


Faustino é o personagem mais conhecido do Grupo de Mogi das
Cruzes. Nascido na Vila de Mogi das Cruzes em 1708, teve como mãe Maria do
Prado e pai Francisco de Borja Xavier. Este tinha nascido durante a travessia de
seus pais de Portugal para o Brasil.
Faustino foi nomeado mestre-de-capela da Matriz de Sant’Ana e do
Convento de Nossa Senhora do Carmo em 1729, aos vinte e um anos de idade. E
ficou pouco tempo no cargo já que Trindade e Castagna mostram que Faustino
tinha outros planos para sua vida:

... sua meta era o sacerdócio. Nem bem passaram cinco anos, obteve o
grau de presbítero (ordens menores) e assumiu a função de Vigário
Coadjutor da igreja matriz de Mogi. Desse modo, não pôde acumular a
35

gestão paroquial com a gestão oficial da música. Logo, alegando a


"penúria de sacerdotes" na Vila, tomou "as mais ordens" e passou a
Vigário titular. Em 1736, entretanto, já se transfere para fora da
localidade. (TRINDADE e CASTAGNA, 1996, p. 3).

A partir daí Faustino serve em outras paróquias da Capitania,


aparecendo como Vigário Encomendado da Matriz da Vila e Porto de Santos em
1751. Por fim, fixa-se na Sé de São Paulo como Cônego da Catedral,
desempenhando funções eclesiásticas (inclusive como Cônego Fabriqueiro entre
1777 e 1781), falecendo em 1800. (CASTAGNA, 2000, p.39)

2.5.2 Ângelo do Prado Xavier


Irmão mais moço de Faustino, Ângelo do Prado Xavier nasceu cerca de
1716. Jaelson Trindade mostra que Ângelo deve ter saído de Mogi bem cedo,
pois na década de 1740 já estava negociando gado no sul do país, atividade
também de seu irmão Faustino. Por volta de 1767 encontra-se na Vila de Santos,
trabalhando como Escrivão da Real Fazenda. No entanto, em 1768, é preso e
arrestado de bens, cabendo ao irmão que agora era cônego da Sé de São Paulo,
socorrê-lo pagando a fiança. Depois disto, passa a viver na casa de Faustino em
São Paulo, até morrer em 1769.

2.5.3 Timóteo Leme do Prado


O terceiro nome envolvido nos papéis de música de Mogi é também
pouco conhecido. Sabe-se que foi mestre-de-capela da Vila de Sorocaba no início
da década de 1730. Jaelson Trindade e Paulo Castagna registram que Timóteo
recebe para tocar no enterro do mogiano Antônio da Cunha Gago em 1731.
Mostram também que Timóteo Leme tinha como últimos nomes Leme da Silva e
que depois mudou para Leme do Prado. (TRINDADE e CASTAGNA, 1996, p.4)
Castagna assinala que em 1772 ainda existia em Sorocaba um Timóteo Leme do
Prado, e que na Relação do Bispado de São Paulo de 1777 consta um padre com
o mesmo nome com oitenta e cinco anos de idade, já totalmente decrépito.
(CASTAGNA, 2000, p.40)
36

2.6 AS OBRAS MUSICAIS

Para não correr o perigo de cometer pequenos ou grosseiros erros


musicológicos e se lançar ao que não é da alçada deste trabalho, pretende-se
apenas informar as considerações já feitas sobre as obras contidas no Grupo de
Mogi das Cruzes, bem como sua descrição.
Uma primeira característica a ser percebida (e foi) no Grupo de Mogi
das Cruzes era a caligrafia e a notação musical diferente da linguagem musical
moderna. Este fato fez com que o historiador Jaelson Trindade, apesar de,

... não versado em linguagem musical, mas muito familiarizado com


documentos manuscritos, datar dos primeiros anos do século XVIII. Não
versado, mas informado o necessário para notar a diferença entre a
escrita clássica da música e aquela de notas brancas, quase sem barras
de separação. Tudo isso já demonstrava um significativo recuo em
relação à música pré-clássica dos compositores do último quartel do
XVIII. (TRINDADE e CASTAGNA, 1996, p. 1).

Em seu artigo conjunto de 1996, Jaelson Trindade e Paulo Castagna


relacionaram as principais características do Grupo de Mogi das Cruzes
(TRINDADE e CASTAGNA, 1996, P. 16)

1. Formação coral "a cappella", com emprego possível de um instrumento grave


(melódico ou harmônico) dobrando ou substituindo o baixo vocal;
2. Utilização do sistema modal;
3. Escrita em partes;
4. Utilização da notação mensural ou proporcional;
5. Ausência de grande parte das alterações cromáticas ou acidentes, que
deveriam ser introduzidos pelos cantores ("musica ficta");
6. Repousos por "cláusulas" ou "cadências", ou associação de ambas;
7. Utilização de valores largos (a base está nas mínimas e semibreves);
8. Pouca variedade rítmica (os valores predominantes são a semibreve e a
mínima; semínimas são incomuns e colcheias muito raras);
9. Utilização de designações renascentistas para as vozes (tiple, altus, tenor,
bassus);
10. Predomínio dos registros graves para o tiple (soprano) e o altus (contralto) e
37

dos médios para o tenor e o bassus (baixo), com maior flexibilidade para o
bassus;
11. Extensão (registro ou âmbito) reduzida das partes vocais (geralmente, de uma
quinta a uma oitava), à exceção do bassus;
12. Movimento das vozes normalmente por graus conjuntos;
13. Harmonia simples;
14. À exceção das obras ou seções polifônicas, inexistência de passagens a solo,
duo ou trio (a Cantiga Matais de incêndios é exceção);
15. Ocorrência esporádica de quintas ou oitavas paralelas;
16. Sujeição total ao ritmo do texto latino;
17. Estilo predominantemente silábico;
18. Repetições de texto muito raras;
19. Música de preocupação exclusivamente religiosa, sem a exploração de efeitos
dramáticos ou teatrais;
20. Base estética filiada às obras tecnicamente mais simples do estilo romano
contra-reformista, comum na Península Ibérica no séc. XVII;
21. Utilização de três procedimentos musicais básicos:
a) o fabordão
b) a homofonia modal
c) a polifonia

Desde os primeiros trabalhos sobre os manuscritos mogianos, foram


relacionadas quais obras estavam presentes nos papéis de música. O estudo de
Paulo Castagna em 2000 permitiu uma nova classificação para essas obras, que
dividiu o material em oito subgrupos (reunindo os que contivessem as mesmas
obras), dezessete conjuntos (reunindo as cópias de aspecto uniforme) e vinte e
nove folhas. Para tanto, Castagna elaborou o quadro abaixo que mostra a
descrição dos conjuntos de cópias com a indicação das composições presentes
em cada uma delas.
38

Quadro 1. Conjuntos e composições representadas no Grupo de Mogi das Cruzes. As indicações


referentes aos conjuntos são: código do conjunto e número das folhas no GMC; transcrição do
frontispício; indicação de copistas, local e data; partes disponíveis. As indicações referentes às
composições (sempre recuadas, na parte inferior das células) são: letra indicando a posição da
composição no conjunto; autor; incipit latino; função cerimonial.

GRUPOS CONJUNTOS E COMPOSIÇÕES


GMC 1 [C-1 - f.1] - “Bradados a 4. para Domingo de / Ramos, e Sexta fr.ª da / Payxaõ. / De
Faustino do Prado xavier.” Frontispício de Faustino Xavier do Prado, sem indicação
de copista musical, sem local, sem data: [B], sem texto aplicado à música

A - [PEDRO DE CRISTO?] - Non in die festo [Fragmento dos Bradados (Turbas)


da Paixão de Domingo de Ramos]
[C-2 - f.2-3] - “Tiple a 4 Bradados p.ª Domingo de Ramos”. Cópia (música e texto) de
[Faustino Xavier do Prado?], sem local, sem data: S
[C-3 - f.4-5] - “Altus a 4. Bradados Para Domingo de Ramos.” Cópia (música e texto)
de [Faustino Xavier do Prado?], sem local, sem data: A
[C-4 - f.6] - “Bassus a 4. Bradados Para Domingo de Ramos.” Cópia (música e texto)
de [Faustino Xavier do Prado?], sem local, sem data: B

A - [PEDRO DE CRISTO?] - Non in die festo [Bradados (Turbas) da Paixão de


Domingo de Ramos]
B - [ANÔNIMO] - Jesum Nazarenum [Bradados (Turbas) da Paixão de Sextafeira
Santa]
GMC 2 [C-Un - f.7-8] - “Altus a4”. Sem indicação de copistas, sem local, sem data: A

A - [ANÔNIMO] - Zelus Domus tuæ [Primeira Antífona das Matinas de Quintafeira


Santa]
B - [ANÔNIMO] - Incipit Lamentatio Jeremiæ Prophetæ [Primeira Lição das Matinas
de Quinta-feira Santa]
C - [ANÔNIMO] - In Monte Oliveti [Responsórios (9) das Matinas de Quintafeira
Santa]
GMC 3 [C-Un - f.9-12] - “Ex tratactu Sancti Augustini / De / Angelo Prado xavier” [ou “Ang.
Do Prado xavier”]. Cópia (música e texto?) de Ângelo Xavier do Prado, sem local,
sem data: SATB
[MANUEL CARDOSO] - Ex tractatu Sancti Augustini... Exaudi, Deus [Quarta Lição
das Matinas de Quinta-feira Santa]
GMC 4 [C-1 - f.13] - “Tiple a4. Profecias de Sexta fr.ª dapaixam 1.ª Profecia”. Cópia (texto)
de [Faustino Xavier do Prado?], sem local, sem data: S
[C-2 - f.14] - “Altus a 4. Para as Profecias de Sexta fr.ª da Paixam 1.ª profecia”.
Cópia (música e texto) de [Faustino Xavier do Prado?], sem local, sem data: A
[C-3 - f.15-16] - “Tractos para as profecias de Sexta fr.ª da Payxam. / De Faust.º do
Prado x.e[r]”. Cópia (música e texto) de Faustino Xavier do Prado, sem local, sem data:
TB

A - [ANÔNIMO] - Domine, audivi / Eripe me Domine [Primeiro e segundo Tractos da


“Missa” de Sexta-feira Santa]
[C-4 - f.17-21] - “Tractos para Sesta Fr.ª Santa a 4 / Douzo / De / Thimoteo Leme /
Ant Ant / Tractos para sexta Fr.ª santa a 4 / do uzo / Thenotio L[...]”. Cópia (música e
texto?) de Timóteo Leme [do Prado], sem local, sem data: TB

A - [ANÔNIMO] - Domine, audivi / Eripe me Domine [Primeiro e segundo Tractos da


“Missa” de Sexta-feira Santa]
B - [ANÔNIMO] - Passio... secundum Joannem [Proêmio da Paixão de Sextafeira
Santa]
C - [ANÔNIMO] - Quem quæritis? [Ditos de Cristo e Turbas da Paixão de Sextafeira
Santa]
D - [ANÔNIMO] - Heu! Heu! Domine! [Estribilho da primeira parte da Procissão do
39

Enterro de Sexta-feira Santa]


E - [ANÔNIMO] - Pupilli facti sumus [Versículos da primeira parte da Procissão do
Enterro de Sexta-feira Santa]
F - [ANÔNIMO] - Sepulto Domino [Segunda parte da Procissão do Enterro de
Sexta-feira Santa]
GMC 5 [C-Un - f.22] - “Tiple Para Sexta fr.ª”. Sem indicação de copistas, sem local, sem
data: S

[ANÔNIMO] - Jesum Nazarenum [Bradados (Turbas) da Paixão de Sexta-feira


Santa]
GMC 6 [C-Un - f.23-24] - “Tiple a4”. Sem indicação de copistas, sem local, sem data: ST

[ANÔNIMO] - Regina Cæli lætare [Antífona de Nossa Senhora do Tempo Pascal]

GMC 7 [C-Un - f.25] - “Rabeca.” Sem indicação de copistas, sem local, sem data: vl

[ANÔNIMO] - Kyrie, eleison [Ladainha (de Nossa Senhora? de Todos os Santos para
a Bênção da Água Batismal do Sábado Santo?)]
GMC 8 [C-1 - f.26] - “Tiple a duo”. Sem indicação de copistas, sem local, sem data: S[1]
[C-2 - f.27] - “Tiple 2.º a4”. Sem indicação de copistas, sem local, sem data: S2
[C-3 - f.28] - “Altus a Duo”. Sem indicação de copistas, sem local, sem data: A
[C-4 - f.29] - “Tenor a 4”. Sem indicação de copistas, sem local, sem data: T

[ANÔNIMO] - Matais de incêndios [Cantiga ou vilancico para o Natal?]


Fonte: (CASTAGNA, 2000, p.8-10)

Em sua conclusão, Castagna sugere que os papéis de Mogi, por seu


conteúdo, apontam uma origem portuguesa das composições, além de terem sido
descartadas (usadas como preenchimento da capa de couro do Livro de Foral)
por dois motivos:

Tal fragmento parece ter se originado de uma “limpeza” realizada entre


as décadas de 1730-1750, com duas finalidades básicas: 1) a renovação
estilística do arquivo; 2) a substituição das cópias em notação mensural
ou proporcional por cópias em notação moderna. (CASTAGNA, 2000, p.
59).

2.7 A CANTIGA DE MOGI

Dentre as músicas encontradas nos papéis de Mogi, uma se destaca


pela sua não total correspondência com as demais. Trata-se da Matais de
Incêndios, que é considerada uma cantiga ou vilancico e surpreende pelo seu
conteúdo ambíguo: Sagrado ou profano? O texto sem título da partitura é o
seguinte:
40

Matais de incendios meu Lindo ay Le Le


porq' hum sol me pareceis não me mateis
deyxay q eu goze essas Luzes ay Le Le
meo amor não me mateis.
Hey de chegar me aos incendios ay Le Le
inda q rayos vibreis.
Mas se a vos me chego amante ay Le Le
meo amor não me mateis.
Para abrazar coraçoins ay Le Le
as palhinhas acendeis.
O meu por vos ja se abraza ay Le Le
meu amor não me mateis.
Suspendey menino o pranto ay Le Le
mais menino não choreis.
Ora fazey me a vontade ay Le Le
meo amor não me mateis.

Matais de Incêndios

Fonte: Arquivo Histórico "Historiador Isaac Grinberg"

Jaelson Trindade e Paulo Castagna questionam se esta é uma canção


profana ou se é um vilancico de natal. Segundo os autores,

Os símbolos encontrados na Cantiga (sol, raios, luz, menino,


abrasamento, incêndios, matar, etc.) não são patrimônio da poesia
religiosa: são utilizados pela poética do Barroco em geral. Disseminados,
41

tornam-se familiares; utilizados coloquialmente, são entendidos pelo


público em geral. (TRINDADE e CASTAGNA, 1996, p. 9).

Paulo Castagna informa que a onomatopéia Ay! Lê, lê pode ter origem
em fórmulas lingüísticas africanas assimiladas na Península Ibérica no sec. XVII.
Destaca também que,

De acordo com o costume ibérico setecentista, havia espaço, nas três


missas de Natal, para que os clérigos e o povo fossem beijar a imagem
do menino na capela mór, espaço esse para o qual o Matais de
incêndios pode ter sido destinado. (CASTAGNA, 1998, p. 25).

De qualquer forma, a Cantiga de Mogi tem repertório simbólico utilizado


tanto no campo do sagrado quanto do profano e encontra referências nessas
duas esferas, valorizando ainda mais o conteúdo dos documentos mogianos.
42

3. PRÁTICA DE MÚSICA NA MOGI COLONIAL

Como procurou mostrar o primeiro capítulo deste trabalho, a música


esteve presente na colônia, mas sempre submetida às condições sócio-
econômicas de cada localidade. Dessa forma, a atividade musical pode
acompanhar o desenvolvimento das vilas, sofrendo junto com elas quando havia
ou uma crise de receita ou uma estagnação comercial. Esta atividade musical
estava sujeita também à presença de músicos que, nas precárias condições de
ensino e pratica musical das vilas coloniais, encontram-se em número pouco
satisfatório para algumas regiões.
Assim, ao procurar por indícios da prática de música numa vila como a
de Mogi, deve-se levar em conta esses aspectos sócio-econômicos a que estava
submetida a vila. Não se pretende, é claro, abarcar toda ou muita da história
musical da Mogi colonial, pois tal tarefa seria impraticável dado o tempo e o
espaço a que esse trabalho é destinado. Mas, a medida em que se puder dar
alguma contribuição para o pouco abordado passado musical dessa região, será
uma satisfação para esse autor se este texto suscitar novas abordagens ao tema.

3.1 ASPECTOS SOCIAIS E ECONÔMICOS DA MOGI COLONIAL

Sendo elevada a vila em 1611, o povoado de Mogi, que de início


recebeu o nome de Santa „Ana, incorporando mais tarde o “das Cruzes”, tem
como característica inicialmente, segundo Jurandyr Ferraz de Campos, o
isolamento:

É curioso observar que uma das características da Vila de Sant’Ana das


Cruzes de Mogi Mirim, nos seus inícios, foi o isolamento. Para Oeste, a
comunicação com a Vila de São Paulo de Piratininga, atravessando
regiões baixas e alagadiças, era bastante difícil... Ao Sul, embora
houvesse ligação com a marinha, a barreira da Serra do Mar impunha o
mesmo grau de isolamento que São Paulo; e a leste, para atingir o Vale
do Paraíba, tinha que se transpor a Serra do Tapeti, naquela época, não
sem razão, chamada de Sete Pecados Mortais. (CAMPOS, 1978, p. 20-
21).
43

Esta dificuldade não impediu, no entanto, que na primeira metade do


século XVII mogianos partissem em bandeiras, sobretudo na caça a índios. Com
o declínio dessa atividade, na segunda metade dos seiscentos, outras bandeiras
partem de Mogi a procura de metais ou a combater nações indígenas rebeldes e
quilombos. (CAMPOS, 1978, p. 25) Essas ausências acabaram por manter em
Mogi um número reduzido de povoadores, e com uma agricultura direcionada
apenas à sobrevivência. O pequeno número de casas completava o quadro de
estagnação da vila, levando o Capitão-mor da Capitania de São Vicente, Gaspar
de Souza Lisboa, em visita a Mogi em 1663, a ordenar que aqueles que tivessem
“chãos” em Mogi, construíssem suas casas no prazo de seis meses. A não
observância desta ordem poderia causar a perda dos terrenos para quem
quisesse construir. (CAMPOS, 1978, p. 25-26)
No século XVIII e o Ciclo de Ouro deram a condição à Mogi de vender
diversos produtos na beira das estradas, se valendo dos cruzamentos das rotas
que iam para as Minas Gerais e Rio de Janeiro, Santos, Goiás e Mato Grosso.
Visando o aumento da receita, a câmara interferia diretamente nesse comércio,
concedendo licença àqueles que vendiam seus produtos a miúdo, e arrematando
publicamente o contrato dos subsídios. (CAMPOS, 1978, p. 29)
Na primeira metade de 1700 a crise se bateu na Capitania de São
Paulo refletiu-se em Mogi, provocando baixas receitas nas décadas de 1720 e
1730. Com o trânsito de gado aumentando nas estradas, o comércio local
baseado nas vendas a beira de estrada voltou a se estabilizar, oferecendo
diversos gêneros de mantimentos. Aliás, também a cobrança de aluguel das
pastagens contribuiu para a receita da vila.
Depois de 1765, agricultura rudimentar deu lugar a um produto que
passou a figurar como a principal atividade econômica da vila: o algodão. E essa
produção refletiu na estrutura de Mogi, já que,

Lentamente a vila começava a tomar algum impulso, pois se em 1775


contava com uma população global de 3932 pessoas, já em 1799 estava
com total de 8155 indivíduos. Tal crescimento populacional refletiria, por
certo, a base econômica mais sólida em que se encontrava a vila.
(CAMPOS, 1978, p. 39).

No fim do século XVIII, a agricultura já mostra uma diversidade maior,


incluindo o milho, o feijão, o arroz, a farinha de pau e a aguardente nas
44

exportações. Mas, ainda nos primeiros anos do século XIX esta prosperidade
seria ameaçada, provocando mais uma estagnação econômica na Vila de
Sant‟Anna de Mogi das Cruzes.

3.2 A MÚSICA NAS VILAS

Os registros encontrados de músicas das vilas coloniais têm se


assemelhado de uma para outra, tornando possível em alguns casos uma
transposição de análise das vilas onde a prática de música ainda é pouco
conhecida. Ou seja, poderá se encontrar em documentação de Mogi semelhanças
com alguns dos exemplos citados abaixo.
Como visto anteriormente, as festas podiam ser realizadas ou não de
acordo com as possibilidades de cada vila. A situação econômica de Mogi
esboçada acima exemplifica a irregularidade de receita e consequentemente a
limitação das despesas com música. Mas não só em Mogi.
Falando sobre Mogi-Mirim e Mogi-Guaçú, Régis Duprat mostra que a
dificuldade de se exercer a atividade musical profissionalmente, levava as
autoridades a terem que solicitar os serviços musicais “quando” da realização de
festas na vila:

Providências especiais eram tomadas para a obtenção de músicos para


as festas anuais, estas só realizáveis uma vez ou outra, nas datas mais
importantes. A ausência de solicitação de vida a pequeno número de
festas impede a formação de corporação de músicos no local, criando
um círculo vicioso. (DUPRAT, 1985, p. 154).

Essa inconstância das festas reais estava relacionada à condição


econômica da vila, uma vez que era a câmara que dispendia dinheiro para a
realização delas. Outra opção de festa vista no primeiro capítulo, eram as
realizadas pelas irmandades. Pode-se observar no caso da pequena localidade
de Nazaré, perto de Atibaia:

As festividades religiosas em Nazaré eram patrocinadas, dentre outras,


pelas Irmandades do Santíssimo Sacramento, do Rosário dos Brancos e
a dos Pretos, na matriz; e na capela do Pilar, o seu protetor não
dispensava jamais as solenidades anuais de sua senhora. (DUPRAT,
1985, p. 117).
45

Também é o caso de Guaratinguetá que com uma atividade econômica


semelhante a de Mogi, mostra além de diversos registros de música em enterros,
documentos registram a presença de música nas irmandades:

Nessa documentação citam-se várias irmandades que constituíam,


certamente, um mercado natural de trabalho para músicos: Santíssimo
Sacramento, Rosário dos Pretos e Brancos e a Irmandade da Piedade,
de Lorena, localidade então integrante da circunscrição administrativa de
Guaratinguetá. Alguns anos depois, indicam-se ainda a Ordem Terceira
do Carmo e a de São Benedito. (DUPRAT, 1985, p. 73).

Pode-se considerar então que, as vilas coloniais tiveram uma


expressão musical condizente com seu contexto, e que é possível buscar através
de documentações disponíveis essa confirmação. Neste trabalho buscou-se isso
em Mogi das Cruzes.

3.3 MÚSICA NA MOGI COLONIAL

Empreender uma pesquisa sobre uma vila antiga como Mogi das
Cruzes requer no mínimo a consciência de um trabalho um pouco árduo. Ao
pesquisar música e em tempos tão recuados como o século XVIII, a empreitada
estreita ainda mais.
Primeiro porque pesquisar a música em Mogi incorre em trilhar
caminhos poucos explorados, necessitando ir a fontes primárias e dispor dos
dados já conhecidos. Depois, porque pelo próprio objetivo do trabalho, que á
encontrar registros da prática de música na vila contextualizando com as
partituras do Grupo de Mogi das Cruzes, implica no trato com fontes de escrita
difícil para um leigo. Mas o envolvimento com os documentos acabou por fornecer
uma pequena e gradual prática que se revelaram bem norteadoras no decorrer da
pesquisa. Vejamos os resultados:
Além de saber que o já citado Faustino do Prado Xavier tinha recebido
a provisão de mestre-de-capela em 1729, o historiador Jaelson Trindade já
informara que aquele tinha sucedido um tal de Tomé Pimenta de Abreu que tinha
ficado cerca de dez anos no cargo. (TRINDADE, 1984, p. 16) Portanto, recuava
pelo menos até 1719 o registro da prática de música em Mogi. A documentação
veio confirmar e melhorar essa informação.
46

O Registro de Recibos iniciado em 1715, dá conta que na festa do


Corpo de Deus, conhecida também como Corpus Christi, desse mesmo ano de
1715, já há a presença de música, pois,

Pagou-se ao Padre Vigário da missa cantada e ao Mestre de Capella


quatro mil e Réis. (AHHIG, Registro de Recibos, 1715,Cx. 07 p. 2).

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

Entendemos então que há em 1715 há um mestre-de-capela em Mogi.


O ano seguinte então esclarece a questão, se tratando da mesma festa, mas
agora nominando o mestre-de-capela:

Por dinheiro que pagou para o mestre de capella Thome Pimenta de


Abreu... para o dia do Corpo de Deos seis mil Reis. (AHHIG, Registro de
Recibos, 1716, Cx. 07 p. 5).

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

Confirmado então a pessoa de Tomé Pimenta de Abreu como o


primeiro ou um dos primeiros mestres-de-capela da vila de Mogi das Cruzes,
baseado na documentação encontrada. De novo, em 1719 o Registro de Recibos
aponta a despesa,

Por dinheiro que se deu a Thome Pimenta pela muzica da festa do


Corpo de Deos deste presente anno de mil setecentos e dezenove dês
mil e quinhentos e sessenta reis. (AHHIG, Registro de Recibos, 1719,
Cx. 07 p. 15).
47

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

Vê-se então o nome de Tomé Pimenta de Abreu ser uma constante no


pagamento da música, e como veremos a seguir, do fornecimento de cera e
incenso para as festividades. Como é o caso registrado de recibo de 1721, que
mostra o referido mestre recebendo por duas festas:

Por dinheiro que pagou a Thome Pimenta da muzica e insenço da


festividade de Corpo de Deos três mil e quinhentos e vinte reis.
E
Por dinheiro que pagou da festividade de Anjo Custodio a Thome
Pimenta e será e insenço que se pagou a dita festa muzica como consta
dos Recibos onze mil e quinhentos e vinte reis. (AHHIG, Registro de
Recibos, 1721, Cx. 07 p. 19v).

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

Como se pode observar a festa mais importante, e por isso mais


regular, era a de Corpus Christi (Corpo de Deus) onde a câmara era responsável
pelas despesas da festa, sendo registrado nestes livros ora consultado. Em 1723
a despesa para a música da festa de Corpo de Deus é de três mil e duzentos réis,
48

mesmo valor do ano seguinte. Neste ano, 1724, é registrado também o mesmo
valor para a festa de São Sebastião.
Como foi dito, as festas reais (vide 1º capítulo) eram realizadas ou não
segundo as condições da vila. Considerado isto, parece ter sido um ano bom o de
1725, já que pelo menos três das quatro festas reais foram realizadas neste ano.
Especialmente bom também para o mestre-de-capela Tomé Pimenta de Abreu,
que continua aparecendo na prática de música em Mogi e com um rendimento
melhor que em outros anos:
Por dinheiro que pagou a Thome Pimenta da muzica, será e insenço
como consta de seu recibo 9$280.
Por dinheiro que pagou a Thome Pimenta a muzica da festa de Corpo de
Deus 8$000.
Por dinheiro que recebeu mais Thome Pimenta da muzica, será e
insenço da festa de Visitação de Santa Izabel 8$000.
Por dinheiro que pagou ao Thome Pimenta para será e muzica da festa
do Anjo Custodio 8$000. (AHHIG, Registro de Recibos, 1725, Cx. 07 p.
28).

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”


No ano seguinte, 1726, também são realizadas as festas de Anjo
Custódio e Santa Isabel, mas destinando apenas três mil e duzentos réis para
cada festa. É também o último registro de música encontrado nessa pesquisa,
com a referência ao mestre-de-capela Tomé Pimenta de Abreu. Outro registro
deste ano cita o pagamento de duas missas cantadas pelo padre vigário nas duas
festas citadas acima, totalizando cinco mil, setecentos e sessenta réis.
Em 1729 se dá a provisão de mestre-de-capela a Faustino do Prado
Xavier, personagem conhecido nas partituras do Grupo de Mogi das Cruzes e que
permaneceu no cargo até 1733. Registros de recibos do ano de 1731 não
permitem concluir se tratam de Faustino, pois não trazem expresso o nome do
beneficiado:
49

Por dinheiro que pagou o padre de cantar a epistola seiscentos e


quarenta reis.
Por dinheiro que pagou ao padre que cantou o evangelho seiscentos e
quarenta reis.
Por dinheiro que pagou para a muzica da mesma festa quatro mil reis.
(AHHIG, Registro de Recibos, 1731, Cx. 07 p. 78v).

Já no começo da década de 1740, consta no Registro de Despesa do


Conselho registro sobre a festa de Corpus Christi do ano de 1742:

Consta dispender no mandado – quatro mil e oitosentos para pagamento


da muzica para a festa de Corpo de Deus. (AHHIG, Registro de Despesa
do Conselho, 1742, Cx. 13 p. 18).

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”


O ano de 1750 revela a presença de mais outros personagens
nominados na documentação, que recebem para cantar o Evangelho ou a
Epístola. No primeiro, um recibo de Antônio de Barros Machado informa a
participação do padre Pedro da Fonseca na festa do Corpo de Deus:

Recebi do procurador da camara Bento de Araújo de nove mil e


seicentos reis procedidas de esmolla do sermãm que preguei em dia do
Corpo de Deus nesta villa como também mais novecentos reis para a
esmolla do rev. padre Pedro da Fonseca por cantar o sagrado evangelho
na dita solenidade por verdade sua descarga passei este, que assinei
em 30 de mayo de 1750. Antônio de Barros Machado (AHHIG, Livro de
Receita e Despesa, 1750, Cx. 19 p. 147).
50

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

Para a mesma festa e apenas um dia depois, este outro recibo mostra o
coadjutor Francisco Mendes de Couto em condições semelhantes ao padre Pedro
da Fonseca:
Recebi do Procurador Actual da camara desta villa de Mogy das Cruzes
Bento de Araújo mil e seiscentos reis a saber novecentos e sessenta reis
de cantar a epistola... 31 de mayo de 1750. Coadjutor Francisco Mendes
de Couto. (AHHIG, Livro de Receita e Despesa, 1750, Cx. 19 p. 147-
148).

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

Recebendo dessa mesma festa de Corpus Christi de 1750, João


Domingos de Carvalho assina pela música da festa:

Recebi do Procurador Actual Bento de Araújo da Silva seis mil


quatrocentos reis dinheiro da muzica da festa de Corpus Christi e para
sua clareza este de minha letra e signal. Vila de Mogy, 24 de julho de
1750. Joao Domingos de Carvalho, o moço (AHHIG, Livro de Receita e
Despesa, 1750, Cx. 19 p. 148).
51

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

Interessante notar que nesse mesmo livro, a despesa do recibo acima


relacionado aparece também descrita na parte das despesas:

Consta mais dispender por Recibo do dito Joao Domingos de Carvalho


no dito livro dos mandados da muzica da mesma festa, seis mil e
quatrocentos reis... (AHHIG, Livro de Receita e Despesa, 1750, Cx. 19 p.
7).

Fonte: Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”

É importante dizer que o historiador Jurandyr Ferraz de Campos aponta


que em 1750-1751 celebrou-se a festa do V Centenário do Santo Escapulário de
Nossa Senhora do Carmo, onde é indicado a presença de músicos tanto na
matriz quanto no pátio. Informa também a presença nesta festa do mestre-de-
capela Bento da Costa como harpista. (CAMPOS, 2004, p.14)
Um registro também interessante é o da festa do Corpo de Deus do ano
de 1769. Em uma transcrição paleográfica, CAMPOS mostra quatro recibos de
pagamentos a músicos da referida festa:

Receby do procurador actual Antonio Jozé Monteyro, mil duzentos e


oitenta reis da muzica da festa do Corpode Deos, e por estar pago, e
satisfeito, passo o prezente de minha Letra e sinal em 28 de Mayo de
1769 annos. Estevão da costa Macedo (CAMPOS, 1993, Lâmina LXII).
52

Fonte: CAMPOS, Álbum de Paleografia Colonial Brasileira.

Receby do procurador actual Antonio Jozé Monteyro, novecentos e


secenta reis da muzica da festa do corpo de Deos deste prezente anno,
e por estar pago e satisfeyto passo o prezente Somente por mim
asignado, Mogy a 28 de Mayo de 1769 annos. Thomas Lopes Leonardo.
(CAMPOS, 1993, Lâmina LXII)

Fonte: CAMPOS, Álbum de Paleografia Colonial Brasileira.

Receby do procurador actual Antonio Jozé Monteyro, mil e duzentos e


oitenta reis da muzica e toque de estromento, da festa de corpo de Deos
deste anno e por estar pago e satisfeito paso a prezente Somente por
mim asignado Mogy 28 de mayo de 1769. Antonio de Faria Moreira.
(CAMPOS, 1993, Lâmina LXII)
53

Fonte: CAMPOS, Álbum de Paleografia Colonial Brasileira.

Receby do procurador actual Antonio Jozé Monteyro, novecentos e


secenta reis de tocar orgam na Miça cantada no dia de corpus christi e
por estar pago e Satisfeito passo o prezente de minha letra e Signal villa
de Mogy 28 de Mayo de 1769. João Pimenta de Abreu. (CAMPOS, 1993,
Lâmina LXII)

Fonte: CAMPOS, Álbum de Paleografia Colonial Brasileira.

É importante notar que as diferenças de descrição do que cada um está


recebendo, parece sugerir ocupações diferentes na música da festa. CAMPOS
comenta que estes recibos parecem indicar que Estevão da Costa e Thomas
Lopes são compositores, Antônio de Faria é compositor e instrumentista e o
último João Pimenta de Abreu indica a presença de órgão em Mogi. (CAMPOS,
2004, p. 22)
João Pimenta de Abreu é familiar, lembra o primeiro nome encontrado
nesta pesquisa como mestre-de-capela, Tomé Pimenta de Abreu. Após a suspeita
inicial sobre o possível parentesco, a confirmação veio com a pesquisa feita no
54

Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo. Ao procurar na relação de


Processos de Habilitação de genere et moribus os nomes já encontrados nesta
pesquisa, o processo de João Pimenta de Abreu foi localizado.
Este tinha iniciado o processo de habilitação em 1741, que só foi
finalizado em 1746. (ACMSP, Processo genere et moribus, estante 01, Gaveta 10,
nº135) Como visto no primeiro capítulo, este processo consistia em diversas
partes e apurava toda a vida e descendência do candidato. Foi assim que a
informação não escapou, mostrando que João Pimenta de Abreu era filho de
Tomé Pimenta de Abreu. É uma mostra de uma das facetas do ensino musical na
vila colonial, o ofício passando de pai para filho.
Apesar de nesta pesquisa não ter sido possível consultar arquivos das
irmandades de Mogi das Cruzes, o livro de Jurandyr Ferraz de Campos sobre a
ordem Terceira do Carmo ajuda a conhecer e confirmar a presença de música
nessas irmandades. No Livro de Receita e Despesa da Venerável Ordem do
Carmo do período 1764-1824, mostra a despesa em 1764 de música para a
Procissão do Triunfo de três mil e oitocentos e quarenta réis. Essa mesma
procissão destinou em 1774, uma década depois, apenas dois mil, quinhentos e
sessenta réis, um valor baixo, reflexo das condições da Ordem. (CAMPOS, 2004,
p. 23)
CAMPOS aponta em seu outro livro sobre a Vila de Mogi, a despesa em
1793 da festa do Corpo de Deus que informa a presença de Bento da Costa ainda
na função de mestre-de-capela. (CAMPOS, 1978, p. 43)
De volta a Ordem Terceira do Carmo, em 1797 e 1798 a despesa com
as festividades de Santa Tereza dispendem cinco mil réis em cada ano. Em 1801
é registrada a quantia de treze mil trezentos e sessenta réis por missa cantada no
dia de Santa Tereza:

Dinheiro para a missa cantada em dia de Santa Thereza, 13$360 (Livro


de Receita e Despeza da Venerável Ordem Terceira do Carmo de Mogi
1764-1824 Apud CAMPOS, 1993, Lâmina LV)

Fonte: CAMPOS, Álbum de Paleografia Colonial Brasileira.


55

De 1809 a 1811 o valor para a mesma festa está em seis mil e


quatrocentos réis. CAMPOS informa ainda que este valor é pago para o mestre-
de-capela Bento da Costa em 1812. (CAMPOS, 2004, p. 23)
Enfim, pode se constatar que em Mogi das Cruzes a prática de música
se deu, assim como em outras vilas coloniais, com maior ou menor incidência e
dentro das condições que a situação permitia. A importância de se achar
documentação comprovando essa prática, ajuda no sentido de mostrar que as
partituras do Grupo de Mogi das Cruzes não constituem um fato musical isolado,
mas a expressão de uma prática musical contextualizada historicamente.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Procurando concluir este trabalho, não dá para não levantar a questão


do quanto são necessárias as pesquisas sobre a música de vilas coloniais. Mogi
das Cruzes acabou sendo palco da importante descoberta dos papéis de música
mais antigos do Brasil, e por isso ganhou alguma visibilidade, estimulando
estudos sobre seu conteúdo e logo, sua história. No entanto, o terreno ainda é
fértil para pesquisas e se estas não são realizadas, uma parcela de culpa está
nas autoridades competentes que poderiam fomentar melhor o acesso e as
investigações sobre nossa cultura.
Para o pesquisador que se aventura nesse campo, pelo menos aos
iniciantes e leigos, as dificuldades podem ser um tanto desanimadoras. Mas a
perseverança ainda tem se constituído melhor remédio, na visão deste iniciante.
Superadas as desconfianças e incertezas iniciais, o resultado acaba por
surpreender este leigo. Não só esperança de dar alguma contribuição acadêmica,
como a satisfação do aprendizado e algum tipo de crescimento intelectual.
De fato, se aqui se conseguiu pelo menos localizar uma porção de
documentos que comprovassem a prática de música na Mogi colonial, imagina o
que se fará com estudos sistemáticos e pesquisa ampliada. Este pequeno
trabalho tenta humildemente pender para a corrente de estímulo a estas
pesquisas.
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FONTES PRIMÁRIAS

Arquivo da Cúria Metropolitana


- Processo de habilitação de Genere et Moribus
1741- João Pimenta de Abreu (1-10-135)

Arquivo Histórico “Historiador Isaac Grinberg”


- Caixa 05: Livro de Regimentos - 1716
Provisão de Mestre-de-capela a Faustino do Prado Xavier, p. 84.

- Caixa 07: Registro de Recibos - 1715


Diversos recibos de música.

-Caixa 13: Registro de Despesa do Conselho – 1747


Recibo de música, p. 18.

- Caixa 19: Livro de Receitas e Despesas da Câmara de Mogi – 1749-1801


Diversos recibos de música.
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REFERÊNCIAS

ANTONIL, André João. Cultura e opulência do Brasil: texto confrontado com a


edição de 1711; com um estudo biobibliográfico por Affonso de E. Taunay; nota
bibliográfica de Fernando Salles; vocabulário e índices antroponímico, toponímico
e de assuntos de Leonardo Arroyo. 3 ed., Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Ed.
da Universidade de São Paulo, 1982. 239p. (Reconquista do Brasil, nova série,
v.70)

CAMPOS, Jurandyr Ferraz de. Álbum de Paleografia Colonial Brasileira. Mogi


das Cruzes: UMC. 1993.

CAMPOS, Jurandyr Ferraz de. Santa Ana das Cruzes de Mogi. Mogi das cruzes:
UMC. 1978.

CAMPOS, Jurandyr Ferraz de. Suma Histórica da Venerável Ordem Terceira


do Carmo de Mogi. Mogi das cruzes: Murc editora. 2004. 27 p.

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Estado da Cultura de Minas Gerais, Fundação Cultural e Educacional da
Arquidiocese de Mariana, 18 a 20 de julho de 2003. Mariana: Coordenadoria de
Cultura e Artes da UNI-BH, Secretaria de Estado da Cultura de Minas Gerais,
Fundação Cultural e Educacional da Arquidiocese de Mariana, 2004. (no prelo).

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Paulo: UNESP /Instituto de Artes, 2004. Disponível em: www.ia.unesp.br
/docentes /hmb /HMB_2004 _apostila4.pdf (História da música brasileira). Acesso
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primeira metade do século XVIII. II SIMPÓSIO LATINO-AMERICANO DE
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Cruzes. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Rio de Janeiro: n.º
20, p. 18, 1984.
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ANEXOS

1- Reportagem da Revista Veja sobre a descoberta do Grupo de Mogi das


Cruzes. p. 61
2- Partituras encontradas em Mogi – Grupo de Mogi das Cruzes. p. 62-64
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