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EDUCAÇÃO DO CAMPO,
ARTES E FORMAÇÃO DOCENTE
(Volume 2)
Palmas – TO
2018
Reitor Pró-Reitora de Extensão e Cultura (PROEX)
Luis Eduardo Bovolato Maria Santana Ferreira Milhomem
330 p.:il.
ISBN: 978-85-60487-63-9
CDD 660.63
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SUMÁRIO
Prefácio 6
Introdução 18
4
6 - O instrumento pedagógico “visitas de campo” no
contexto da LEDOC-Tocantinópolis
161
Maciel Cover, Sidinei Esteves de Oliveira Jesus, Judite da Rocha,
Saulo Eglain de Sá Menezes Moraes
5
PREFÁCIO
6
reito a terra e ao conhecimento, é ofertada em um campus universi-
tário incrustado em um dos mais emblemáticos territórios rurais de
nosso país, na região conhecida como Bico do Papagaio, cenário de
intensas lutas de resistência, como a Guerrilha do Araguaia; o assas-
sinato do Padre Josimo Tavares; o extermínio de centenas de campo-
neses que não se renderam ao arbítrio do latifúndio.
Formar educadores do campo, exatamente para trabalharem
com a dimensão cultural, através do ensino da Arte e da Música, em
um território tão violentamente marcado pela dor e pela opressão
do capital é extremamente desafiador ... Pois guarda consigo a po-
tencialidade de trabalhar a formação docente a partir das dimensões
históricas contidas em tal território.
E, este livro recupera elementos importantes da história desta
região, que são entrelaçadas com a história da conquista das políticas
públicas de Educação do Campo, e como parte delas, a conquista do
próprio Curso, narrando em vários artigos os inúmeros desafios para
conquista; implantação e consolidação do mesmo, desde a elaboração
inicial do primeiro Projeto Pedagógico do Curso, passando por suas
reformulações, até a conclusão de suas primeiras turmas de egressos,
nestes quatro anos. Em cumprimento ao Edital 02/2012, da SECA-
DI, a partir do qual a UFT conquistou as vagas de docentes para
implementação do Curso, o Campus de Tocantinópolis e os bravos
docentes que lá conduziram a LEDOC neste período, garantiram os
três vestibulares com a oferta de 120 vagas cada um (2014; 2015 e
2016), e ainda a oferta de 50 vagas em 2017 e 60 em 2018, tal como
mostra o artigo de Cícero da Silva neste livro.
Ainda que tenham sido perdidas algumas batalhas em relação
às estratégias de ingresso do perfil idealizado para tal Licenciatura,
conforme destaca o texto de Miranda e Silva, o fato do coletivo de
educadores do curso, em parceria e aliança com os Movimentos So-
ciais e organizações dos trabalhadores rurais, de terem conseguido
garantir a oferta de tais processos seletivos deve ser compreendido
como grande passo para a região.
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Garantir o acesso à Educação Superior com as especificida-
des de público que tem a LEDOC, em uma região com os altíssi-
mos níveis de desigualdade social como a do Bico do Papagaio, em
um território onde existem mais de 130 assentamentos de Reforma
Agrária; onde existem cerca de 40 territórios quilombolas, além da
importante Reserva Indígena dos Apinayé (etnia que tem vários re-
presentantes no curso) já seria, por si só, uma grande vitória contra o
agronegócio, que tudo faz para excluir e eliminar tais coletivos, tidos
por estes setores somente como elementos que impedem a ampliação
da territorialização da grande capital, através da implantação de infi-
nitas monoculturas ou da criação intensa de gado.
Mas, para além deste dado quantitativo de significativa im-
portância na democratização do acesso à Educação Superior, num
território com tão fortes marcas das luta de classes entre as elites e o
povo brasileiro, pode-se perceber nos relatos dos docentes que se de-
safiaram a refletir sobre suas práticas pedagógicas nesta Licenciatura
em Educação do Campo, um forte compromisso com a classe traba-
lhadora. Há um projeto histórico em construção, ainda que perme-
ado por inúmeras contradições e desafios, tanto internos ao próprio
coletivo de docentes do curso; ao Campus; à Universidade, quanto
externo, também em nível local, estadual, regional e nacional.
Na leitura do relato destas práticas educativas, encontramos
muitos princípios que estão em sintonia com os pressupostos da for-
mação docente proposta pelo Movimento Nacional da Educação do
Campo e materializada no Projeto Político Pedagógico original das
LEDOCs. Com a intencionalidade de reafirmá-los, reconhecendo e
valorizando não só o expressivo trabalho feito pelos docentes de To-
cantinópolis, mas principalmente buscando destacá-los como fonte
de inspiração para práticas formativas em outras Licenciaturas em
Educação do Campo, é que destacamos a seguir, cinco princípios, dos
muitos que emergiram da leitura dos capítulos deste livro.
Um dos princípios da formação docente na Educação do Cam-
po requer, antes de tudo, que se tenha um profundo respeito e conhe-
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cimento da história, do contexto e das condições de produção mate-
rial da vida daqueles educadores que pretendemos formar. Em todos
os capítulos desta coletânea, os docentes que os assinam explicitam a
preocupação e o cuidado em reconhecer e compreender as condições
nas quais vivem os sujeitos que estão sendo formados por eles. Em
diversos textos, os docentes da Universidade expressam como as di-
ficuldades concretas enfrentadas pelos seus educandos foram consi-
deradas nas disciplinas nas quais relatam as práticas pedagógicas por
eles conduzidas. Os docentes da UFT foram nos apresentando como
construíram estratégias pedagógicas capazes de contribuir com a su-
peração das dificuldades encontradas pelos educadores em formação,
sob sua responsabilidade. E, esta não é uma questão menor: há um
compromisso destes docentes, expresso nesta prática: em estar atento
à realidade, à materialidade na qual se insere seu educando.
Ao contrário disto, temos visto muitos casos nas universidades
onde os docentes da Educação Superior, ao invés de se preocuparem
com estas dificuldades concretas que os estudantes enfrentam, bus-
cam simplesmente suprimi-las apenas por sua vontade, trabalhan-
do de certa forma com aquela lógica que propugna que, quando a
moldura não cabe na realidade, se corta a realidade... Contrariando
esta prática hegemônica na Universidade, ao invés de se adequar à
burocracia, buscando compreender e garantir as condições reais de
aprendizagens de sujeitos com trajetórias tão distintas, marcadas por
tantas privações e ausência de direitos, estes docentes tem consegui-
do alargar a moldura...
Parte destes desafios, que tem sido enfrentado com sucesso pe-
los docentes da UFT, nos parece estar associado a outro princípio
intrínseco à Educação do Campo, citado também logo no início de
vários capítulos deste livro: a busca do trabalho coletivo e articulado
entre docentes e entre diferentes disciplinas que ministram.
A marca da Educação Superior no Brasil, tradicionalmente,
tem sido o trabalho individualizado de cada docente, na maior parte
das vezes acompanhado de um viés competitivo e individualista. Ao
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contrário desta perspectiva, as Licenciaturas em Educação do Cam-
po têm buscado promover e cultivar o trabalho coletivo não só entre
os docentes da Educação Superior, como também entre estes e os
docentes da Educação Básica que objetivam formar.
E, nos relatos das práticas formativas apresentadas nestes tex-
tos, em diferentes momentos, os docentes da UFT elencam as disci-
plinas que foram articuladas para promover as práticas pedagógicas
que são descritas e analisadas nos textos. Este ponto é nevrálgico para
as mudanças que se quer alcançar com a formação docente proposta
na LEDOC para aqueles que atuarão na Educação Básica: educa-
dores capazes de promover e protagonizar trabalhos coletivos, onde
haja a integração dos conhecimentos, onde a Escola do Campo possa
organizar a socialização dos conteúdos que deve ensinar a partir dos
problemas da realidade, compreendidos a partir das grandes áreas de
conhecimento e das disciplinas que as contém. E, isto não se faz com
docentes que só saibam trabalhar individualmente.
O trabalho coletivo é um aprendizado... um longo aprendizado
que requer superar barreiras objetivas e subjetivas; que exige muitos
exercícios; tentativas; experiências; paciência... Não se faz com ide-
alizações e nem com romantizações. Mas, com vontade concreta de
tentar aprender a fazê-lo, de se desafiar a tanto... De superar os feu-
dos do saber, sobre os quais nos sustentamos na Educação Superior ...
E, alguns docentes da UFT, ainda que com muitas dificuldades, têm
buscado fazê-lo, nos apresentando belos resultados, como os relatos
em vários trechos desta obra.
Outro princípio fundamental da formação docente proposta
pelo projeto original das LEDOCs é a Alternância como dimensão
epistemológica, o que significa compreendê-la para além da necessá-
ria estratégia de garantir o acesso e permanência do campesinato na
Educação Superior, sem provocar seu desenraizamento das comuni-
dades rurais de origem.
Os territórios camponeses, indígenas e quilombolas, são fun-
damentais para o processo de produção do conhecimento que se pre-
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tende desencadear nas LEDOCs. Desenvolver, com estes educadores
em formação, a capacidade crítica de leitura de suas realidades com
as contradições nelas contidas, associando-as as questões regionais;
nacionais e internacionais exige densa formação teórica, apoiada em
elementos históricos, sociológicos, antropológicos, econômicos, polí-
ticos e culturais.
E, os capítulos do livro expressam que parte dos docentes da
LEDOC UFT tem clareza deste processo, construindo práticas pe-
dagógicas com esta significativa intencionalidade: garantir tempos
formativos em diferentes espaços e territórios, com ênfase à realiza-
ção de atividades formativas em locais de luta e resistência do cam-
pesinato, princípio tão necessário a todas as LEDOCs.
Um excelente exemplo desta estratégia formativa do cultivo de
diferentes tempos e espaços formativos é apresentado no capítulos
que trata das visitas de campo, relatando às idas das turmas ao Parque
Nacional Serra da Capivara, em São Raimundo Nonato – Piauí; ao
Acampamento Ilha Verde, em Babaçulândia – Tocantins, no qual se
encontra parte dos Atingidos por Barragens na região, ou ainda, a ida
à Comunidade Quilombola Mumbuca, no Parque Nacional do Jala-
pão, localizada em Mateiros – Tocantins, bem como a participação
dos educados no Encontro Estadual da Juventude Camponesa, em
Palmas – Tocantins.
O enorme esforço para articular e materializar estas visitas de
campo, dada toda a precariedade que sabemos existir hoje nas uni-
versidades públicas, expressam e reafirmam um princípio importan-
tíssimo da formação de educadores da Licenciatura em Educação do
Campo: a necessidade de vincular-se, permanentemente, o processo
de formação docente às tensões e contradições presentes nas relações
sociais, com ênfase nos territórios rurais de origem dos educandos.
Porém, para além da formação dos discentes que cursam as
LEDOCs, a Alternância tem também um papel fundamental na for-
mação de formadores: ou seja, na formação dos educadores que atu-
am nestas novas graduações. A Alternância, na Educação Superior,
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exige que os docentes que nelas atuam também possam estar nos
diferentes territórios onde vivem os educadores que querem formar.
Tal desafio exige que os próprios docentes que conduzirão esta
formação tenham, eles próprios, uma formação bastante ampliada e
complexa, o que infelizmente, não tem sido garantido aos docentes
que atuam na Educação Superior, vindos em sua maioria de uma
formação que lhes privou a possibilidade de uma visão baseada na
totalidade dos processos sociais, sendo, via de regra, restrita aos co-
nhecimentos da área de habilitação na qual se titularam. Este dado
tem exigido um esforço extra dos docentes que atuam nas Licencia-
turas em Educação do Campo, que tem buscado construir esta visão
de totalidade dos processos sociais, desafiando-se também a estar em
campo com os sujeitos, em seus diferentes territórios, objetivando
apreender e compreender criticamente a realidade na qual vivem.
O texto de Brasil e Dias traz outro testemunho sobre a impor-
tância da Alternância também para a formação dos formadores: a
imersão dos professores em cada uma destas comunidades, quer nas aldeias,
assentamentos ou colônia de pescadores tem aproximado a prática docente
do mundo real, pois dezenas de quilômetros em estradas de barro que são
percorridas pelos alunos. (...) Esse deslocamento por parte dos docentes das
salas de aula da universidade para acompanhar as atividades dos alunos
em seus “mundos reais” tem oportunizado a readequação das propostas pe-
dagógicas aplicadas ao longo de anos de docência.
Outro princípio da formação de educadores do campo e que se
faz presente com a ênfase que merece é o trabalho com a Mística no
curso de Licenciatura em Educação do Campo de Tocantinópolis.
Além de aparecer referência ao trabalho com ela em diferentes tex-
tos, o artigo “Mosaico de Saberes” traz desafiadoras reflexões sobre
como tal dimensão formativa vem sendo trabalhada nesta LEDOC,
a partir de um componente curricular específico para tal fim, intitu-
lado “Estética e Poética Camponesa”, cuja ementa, entre outros tópi-
cos, aponta para a necessidade da reflexão teórico prática sobre a cultura
campesina; sobre sua religiosidade e sobre as manifestações culturais
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que protagoniza, integradas à produção artística e a estética camponesa.
Visto ser a UFT a única das 42 Licenciaturas em Educação do
Campo existentes que tem as Artes e a Música como uma área de
habilitação específica, consideramos de suma importância à existên-
cia de um espaço permanente no currículo deste curso que se dedique
à produção e à socialização dos conhecimentos sobre esta dimensão
tão fundamental na formação dos docentes do campo e, mais, na
própria vida camponesa.
Ao tratar da experiência da oferta desta disciplina, Miranda
e Silva nos apresentam reflexões sobre os desafios enfrentados para
trabalhar a mística como uma dimensão formativa com educandos
que chegaram à LEDOC UFT sem terem vínculos com os sujeitos
camponeses e sem entender elementos centrais desta cultura. As re-
flexões e práticas que elas nos apresentam no capítulo, sobre como
vem conduzindo este desafio, trazem ricas contribuições a outros
cursos de Educação do Campo, visto ser cada vez mais recorrente
o ingresso também em outras LEDOCs de jovens que não tenham
uma vinculação anterior com o povo camponês. À priori, este não
deve ser para nós, formadores, um problema, desde que consigamos,
durante o percurso formativo destes jovens nestas Licenciaturas, cul-
tivar e construir este vínculo e este compromisso.
O capítulo vai tecendo os passos que tem se dado para a pro-
dução desta consciência e desta vinculação, com os educandos que
em tal condição ingressaram na LEDOC UFT, trazendo instigantes
depoimentos sobre a potencialidade da Mística na formação docente.
Também, em muitos textos deste livro, encontramos relatos
de práticas de outro princípio fundamental na formação docente
proposta pelo projeto original da LEDOC: formar educadores que
sejam pesquisadores, que construam durante seu percurso formati-
vo as habilidades necessárias para se tornarem capazes de inquirir
a realidade, de seguir sempre buscando mais e mais conhecimento,
objetivando intervir na realidade, na direção de sua transformação
social em busca de justiça e igualdade para todos. Ou seja, não basta
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aprender a pesquisar, mas faz-se necessário também apreender, junto
com as técnicas de pesquisa, as finalidades sociais que podem ter a
ciência e o conhecimento científico.
A concepção teórica que orienta a formação para pesquisa na
LEDOC fundamenta-se na Filosofia da Práxis, na compreensão e na
crença da potencialidade da educação crítica e transformadora para
formar sujeitos de práxis. Educadores capazes de pesquisar; de pen-
sar criticamente sobre suas próprias práticas e de voltar à teoria para
ressignificá-la, num movimento permanente de transformação.
E, este horizonte de formação se percebe em vários relatos deste
livro, tal como no texto de Bonilla, Chada e o Grupo de pesquisadoras
da comunidade, ao defenderem, em seu texto, que as práticas de pes-
quisa tenham compromisso em partir de realidades sociais; entender as
demandas comunitárias e seus processos históricos; estabelecer sempre relações
sujeito-sujeito; buscar uma unidade entre a teoria e a prática; cuidar para
que os resultados da pesquisa sejam em benefício das comunidades, entre
outros. Também se percebe esta mesma compreensão, do tipo de re-
lação teoria prática que se quer estabelecer com as práticas de pesqui-
sa participativa, nos textos sobre alternância; sobre a Mística; sobre a
Educação Musical e a Educação do Campo, entre outros, por exemplo.
Com muita coerência, esta concepção e prática de pesquisa
aparecem na formação docente nas reflexões apresentadas no capítulo
intitulado “A Viola de Buriti da Comunidade Mumbuca: a pesquisa
participativa para a compreensão da prática musical”. Neste territó-
rio quilombola, no qual residem discentes que cursam a LEDOC de
Tocantinópolis, constitui-se, em parceria com docentes do curso, um
coletivo de pesquisadores da própria comunidade, que inclusive, as-
sinam o texto citado, relatando nele diferentes repercussões positivas
que esta prática de pesquisa coletiva tem produzido na comunidade.
A partir de uma ação realizada em um dos Tempos Comunidades do
curso neste território, desencadeia-se todo um riquíssimo processo
de recuperação e valorização de práticas musicais vivenciadas no qui-
lombo, que estavam ficando esquecidas e subsumidas no processo de
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invasão cultural vivenciado no território.
Um dos preciosos resgates feitos por este potente coletivo de
pesquisadores, foi a Viola de Buriti, rico instrumento produzido pela
própria comunidade, carregado de história e memória da luta deste
povo. Entre as várias repercussões deste processo, merece destaque o
potencial multiplicador que vem tendo, ao contribuir com a constru-
ção da compreensão crítica dos sujeitos camponeses deste território
que suas variadas formas de manifestações artísticas são patrimô-
nio cultural de grande valor, que não devem ser desprezados e muito
menos ignorados pela escola, o que infelizmente, é uma frequente
prática das escolas localizadas nos territórios rurais, que ainda não se
transformaram, verdadeiramente, em Escolas do Campo.
Mas, para além da mera constatação, as estratégias pedagógicas
conduzidas por estes docentes da LEDOC de Tocantinópolis tem
se preocupado, de fato, em contribuir na construção de ações cole-
tivas de transformação. Esta é uma significativa contribuição desta
experiência de formação docente e desta prática de pesquisa: estar
formando educadores críticos, capazes de reconhecer a importância e
o valor das práticas sociais e culturais da própria comunidade campo-
nesa. O fragmento a seguir, extraído do texto citado, mostra a imensa
potencialidade desta experiência, ao destacar a importância do pro-
cesso participativo enquanto aprendizado, tanto do que o grupo tem
aprendido sobre a própria comunidade, quanto também das técnicas
e dos processos de pesquisa e conhecimentos que transcendem a sala
de aula. Por outro lado, aprendemos e passamos a valorizar nossa cul-
tura e as estratégias da educação não formal, aquelas adotadas pelos
Mestres e Mestras da Cultura Popular na transmissão de seus conhe-
cimentos para as novas gerações. O que o grupo vem observando é
que nos espaços formais de ensino os conhecimentos produzidos no
e pelo povoado não têm sido abordados e nem são considerados re-
levantes no ambiente e no contexto escolar. O que é oferecido como
referência são sempre aspectos de outras culturas. Mesmo cientes
de sua importância, o que acontece é que a forma hegemônica com
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que esses conhecimentos são transmitidos ou impostos acarretam na
desvalorização das produções dos artefatos e conhecimentos locais.
Como temos discutido no grupo de pesquisa “Acabamos achando
que o que temos não é Cultura, por não apresentar semelhança com
o que é apontado como importante nos espaços de ensino formal”.
(p. 259).
Estes processos formativos críticos vão acumulando força e ex-
periência para o questionamento das próprias escolas onde vão se
inserindo os educandos em formação nas LEDOCs, que vão am-
pliando e complexificando seu olhar sobre a enorme riqueza cultural
que a diversidade de territórios camponeses, quilombolas e indígenas
de nosso país carregam. E que tem sido violentamente engolida pela
estúpida homogeneização cultural promovida pela lógica do capital,
que necessita padronizar e transformar tudo em mercadoria.
A resistência a este processo é extremamente necessária. E o
trabalho feito com estes educadores em formação no território qui-
lombola tem alta relevância. Ao construir coletivamente um Dossiê,
para registrar no IPHAN a Viola de Buriti como patrimônio imate-
rial, a LEDOC de Tocantinópolis materializa não só uma ação sig-
nificativa para a comunidade, mas também para todo o Movimento
Nacional da Educação do Campo, ao reafirmar os sujeitos campo-
neses como detentores de um precioso patrimônio cultural capaz de
contribuir com a humanização de todos nós.
A experiência desta prática docente e da pesquisa por ela con-
duzida concretiza a concepção de práxis do livro de Vazquez citado
anteriormente, quando nos orienta: a práxis contém as dimensões do
conhecer (atividade teórica) e do transformar (atividade prática), ou seja,
teoria e prática são indissociáveis: “[...] fora dela fica a atividade teórica
que não se materializa [...] por outro lado não há práxis como atividade
puramente material, sem a produção de finalidades e conhecimentos que
caracteriza a atividade teórica” (VAZQUEZ, 1968, p. 108).
Este livro trata da reinvenção da Educação Superior... Trata
do sonho possível e construído a muitas mãos, à custa de muito san-
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gue... Custou muito, muito tempo e muita luta para o campesinato
brasileiro ter garantido seu direito de acesso a este nível educacional,
por séculos reservado somente à elite deste país... Ter camponeses,
indígenas e quilombolas cursando a Educação Superior, se formando
como docentes, e ainda mais, na área de Artes e Música, é extre-
mamente revolucionário... É afirmar estes sujeitos como sujeitos de
direitos, como portadores de toda a humanidade que cada um de nós
carrega dentro do peito...
Este livro demonstra a potencialidade formativa do projeto
político pedagógico das Licenciaturas em Educação do Campo. Res-
salta, ao mesmo tempo, os vários desafios a serem superados para a
garantia da permanência dos educandos que as cursam até o término
de sua formação na universidade. Aponta, ainda, os desafios de sua
inserção nas redes municipais e estaduais de Educação do Campo,
dada a enorme precariedade da oferta dos anos finais do ensino fun-
damental e médio no campo.
Mas, para além destes desafios e das denúncias que faz, ele tam-
bém carrega, ao mesmo tempo, importantes anúncios... Da gestação
de um novo tipo de docente na Educação Superior, que tem sido
partejado pelas mãos dos novos discentes que a luta do campesinato
brasileiro conseguiu inserir nas universidades públicas...
Que ele possa nutrir todos os leitores de esperança e de vontade,
de seguir lutando em defesa das Licenciaturas em Educação do Cam-
po; do Direito à Educação como um bem público e social, como uma
imprescindível arma para lutarmos junto com o povo camponês, indí-
gena e quilombola, pela construção de uma Pátria Livre e Soberana...
17
INTRODUÇÃO
18
cida uma relação entre a pesquisa participativa com os instrumentos
de estudos e pesquisa da pedagogia da alternância. Os resultados das
reflexões apontaram que a preparação de um roteiro predeterminado,
dificultou o diálogo e a apreensão da realidade junto às educadoras e
educadores que foram entrevistadas/os. Mas, que, sobretudo, as rela-
ções entre a pesquisa do tempo comunidade e as análises dos dados
da realidade podem proporcionar outro percurso formativo, que ela-
bora através de temas geradores e círculo de cultura um debate sobre
a formação dos professores do campo e suas práxis educativas.
O capítulo “Políticas públicas para educação do campo e for-
mação de professores”, de autoria de Cícero da Silva, é uma pesquisa
bibliográfica e exploratória, de natureza qualitativo-interpretativista
que discute aspectos da política pública brasileira voltada à educa-
ção do campo, especialmente em relação à formação de professores
do campo. O estudo apresenta discussões sobre documentos oficiais
que tratam exclusivamente de educação para os camponeses, além
de trabalhos a respeito de políticas públicas e educação do campo.
Os resultados da pesquisa mostram que a luta dos movimentos so-
ciais camponeses pela implantação de uma política pública educa-
cional que atenda aos anseios dos povos do campo alcançou avanços
importantes até 2015, como: (1) a aprovação de documentos oficiais
que garantem a execução de ações pelo Estado para essa política;
e (2) a implantação de diferentes cursos de licenciaturas em Edu-
cação do Campo para formação inicial de educadores do campo.
Apesar das conquistas obtidas, o Estado brasileiro precisa assegurar
ações capazes de promover o desenvolvimento e o fortalecimento
dessa modalidade de educação.
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Em seguida, o capítulo “Experiências dos indígenas Apinayé
do Curso de Educação do Campo – artes e música de Tocantinó-
polis no Pimi”, das autoras Mara Pereira da Silva, Milena dos San-
tos, Gracilene dos Santos e Jéssica Adriana dos Santos Silva, con-
textualiza o Programa Institucional de Monitoria Indígena (Pimi)
vinculado ao Curso de Educação do Campo – habilitação Artes e
Música da Universidade Federal de Tocantins (UFT), campus To-
cantinópolis. Os escritos possibilitam, além de conhecer o Pimi, sa-
ber um pouco da história do povo Apinayé e os sentidos atribuídos
pelos acadêmicos indígenas nas experiências vivenciadas e contadas
por eles no programa, como forma de legitimar suas falas. Por meio
desse trabalho, acredita-se que é possível colaborar na construção
de programas de monitoria que tenham como proposta a educação
voltada para o campo, especialmente, a educação escolar indígena, e
colaborar com instituições de ensino que desenvolvam a alternância
pedagógica e garantam as vozes dos sujeitos no currículo, elabo-
rando junto com eles, por meio da construção coletiva e respeito ao
outro que remetem à interculturalidade.
Na sequência, o autor José Jarbas Pinheiro Ruas Junior apre-
senta o capítulo de sua pesquisa “Padi-Música: implantação, ex-
periências e desafios na LEDOC-Tocantinópolis”, que tem por
essência apresentar as propostas metodológicas e os resultados al-
cançados pelo Programa de Apoio ao Discente Ingressante (Padi) ao
longo do primeiro semestre de 2017, expondo o projeto de implan-
tação do programa no curso de licenciatura em Educação do Campo,
atendendo a área de Música. Ao longo do texto, são apresentadas as
relações entre as políticas de ensino e assistência estudantil da Uni-
versidade Federal do Tocantins e seus desdobramentos dentro dos
programas especiais de ensino dando ênfase aos programas voltados
à iniciação docente de alunos de graduação. O autor observou os re-
sultados alcançados na LEDOC, utilizando os relatos de experiência
da equipe de tutores e os dados gerados pelo sistema de relatórios da
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Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) para dar início ao processo de
análise e, consequentemente, esboçar suas primeiras considerações.
O capítulo seguinte, “Da teoria à prática: o estágio curricular
supervisionado no curso de licenciatura em Educação do Campo
com habilitação em Artes e Música da UFT/Tocantinópolis”, de
autoria de Helena Quirino Porto Aires e Gustavo Cunha de Araújo,
trata de uma experiência realizada no estágio curricular supervisiona-
do no curso de Educação do Campo da UFT/Tocantinópolis. O es-
tágio é uma disciplina teórico-prática do processo de ensino e apren-
dizagem e constitui-se como componente curricular obrigatório
para todos os graduandos do curso de licenciatura em Educação do
Campo com habilitação em Artes e Música. Configurando-se como
vivências profissionais necessárias à formação acadêmica, destinadas
a propiciar ao graduando a aprendizagem de aspectos que contribu-
am para sua formação profissional. Em termos metodológicos uti-
lizou-se a pesquisa teórica e empírica na perspectiva da abordagem
qualitativa. Nesse sentido, o texto descreve e analisa os percursos e
desafios acerca da realização do estágio curricular supervisionado
no curso de licenciatura em Educação do Campo com habilitação
em Artes e Música, na Universidade Federal do Tocantins, campus
Tocantinópolis. Os pesquisadores concluíram que o estágio curri-
cular supervisionado vai muito além de um simples cumprimento
de exigências acadêmicas, uma vez que o estágio envolve pensar as
questões de ensino-aprendizagem e as questões próprias do meio
onde ele ocorre, pois se trata de uma prática social. Considera-se
também que o estágio possibilita a prática aliada aos conhecimen-
tos teóricos na vida dos acadêmicos de graduação, tendo em vista
ainda uma oportunidade de crescimento pessoal e profissional.
“O instrumento pedagógico “visitas de campo” no contexto
da LEDOC-Tocantinópolis”, texto dos autores Maciel Cover, Si-
dinei Esteves de Oliveira de Jesus, Judite da Rocha e Saulo Eglain
de Sá, analisa as visitas de campo como um instrumento pedagógico
21
no curso de licenciatura em Educação do Campo: Artes e Música,
da Universidade Federal do Tocantins/Campus de Tocantinópolis.
A primeira parte do texto discute questões que compõem o quadro
teórico da Educação do Campo. A segunda parte é dedicada ao tra-
balho de reflexão sobre as experiências pedagógicas. Das visitas de
campo, os limites e os aprendizados. Foram discutidas quatro visitas
de campo: 1) Parque Nacional Serra da Capivara, em São Raimundo
Nonato/Piauí, 2) Acampamento Ilha Verde, Babaçulândia/Tocan-
tins, 3) Comunidade Quilombola Mumbuca, no Parque Nacional do
Jalapão em Mateiros/Tocantins, 4) Encontro Estadual da Juventude
Camponesa, em Palmas/Tocantins. Como resultados da reflexão, os
autores afirmam que o instrumento pedagógico das visitas e viagens
de campo possibilita conhecer outras realidades, ampliar o repertório
geográfico, cultural, territorial, histórico, sociológico, antropológico e
também pedagógico dos discentes. Com base nessas experiências, os
pesquisadores denotam que a efetivação desse tipo de instrumento
pedagógico é de fundamental importância para o desenvolvimento
de uma formação integral dos educadores e educadoras do campo.
Na sequência, o capítulo “Mosaico dos saberes: a mística
dos povos do campo em um curso de licenciatura em Educação
do Campo”, de Cássia Ferreira Miranda e Edimila Matos da Silva,
apresenta uma abordagem qualitativa de uma experiência vivenciada
pelos acadêmicos da terceira turma (ingressos em 2016) do curso de
licenciatura em Educação do Campo: Artes e Música, da Universi-
dade Federal do Tocantins (UFT), campus de Tocantinópolis. As
autoras relatam e analisam uma atividade proposta com o objetivo de
trabalhar os conceitos e práticas relacionadas à utilização da mística
pelos camponeses, realizada na disciplina de Estética e Poética Cam-
ponesa. Em específico, debatem as origens do uso do termo mística e
sua apropriação pelos movimentos organizados do campo, a cultura
e identidade camponesa, as manifestações artísticas e os signos e re-
presentações presentes nas mesmas. São analisadas quatro místicas
22
criadas pelos educandos e educandas da turma e as percepções que
eles tiveram da atividade, obtidas através da aplicação de questio-
nários com perguntas abertas. O texto permite visualizar caminhos
para o trabalho da mística, enquanto conteúdo programático, nos
cursos de licenciatura em Educação do Campo ao relatar, passo a
passo, as principais escolhas realizadas e os trajetos práticos da ex-
perimentação realizada. Miranda e Silva destacam que a mística
não é uma apresentação artística por si só, mas sim um ritual, um
momento ímpar de proposição e vivência coletiva. Salientam, ainda,
o papel de força motriz desempenhado por essa atividade e, por isso,
a importância da mesma para a formação de educadoras do campo,
valorizando a cultura e a identidade camponesa, contribuído para o
empoderamento das populações campesinas.
Em seguida, no capítulo “Práticas pedagógico-musicais e in-
terações no canto coral”, de Raimundo Vagner Leite de Oliveira,
apresenta um estudo das práticas pedagógico-musicais na atividade
de canto coral e as interações entre professor e alunos, desenvolvidas
nas disciplinas de Canto Coral I e II ministradas no curso de Edu-
cação do Campo – Artes e Música da Universidade Federal de To-
cantins (UFT), campus Tocantinópolis. Para o autor, fica claro que a
interação do professor/regente não é somente com os discentes, mas
com a comunidade em geral. Apresenta que o regente da atualida-
de precisa assegurar uma aprendizagem além de elementos musicais,
sendo significativa, em que o conjunto de cantores possam vivenciar
experiências em diferentes dimensões humanas, envolvendo aspectos
físicos, intelectuais, emocionais e espirituais. O autor espera que este
capítulo possa servir de referência para discentes, docentes, pesqui-
sadores, e o público em geral, de forma a contribuir com a melhoria
da qualidade do ensino e aprendizagem da música na Educação do
Campo em diversos espaços educacionais.
No capítulo “A viola de buriti da comunidade Mumbuca: a
pesquisa participativa para a compreensão da prática musical”, os
23
autores Marcus Bonilla, Sônia Chada e o Grupo de Pesquisadoras
da Comunidade Mumbuca apresentam algumas impressões êmicas
envolvendo uma pesquisa-ação participativa realizada no quilombo
Mumbuca, região do Jalapão/TO. O mote investigativo é a viola de
buriti, instrumento musical produzido pelos mestres da cultura po-
pular na região, e o impacto que a pesquisa tem exercido na comu-
nidade e, em especial, nos próprios pesquisadores (as) em função do
empoderamento gerado no uso de suas próprias vozes na produção
textual. Para situar o trabalho, os autores fazem uma breve conceitua-
ção sobre a noção de etnomusicologia e fundamentam a metodologia
adotada: a etnomusicologia aplicada / pesquisa-ação participativa,
estabelecendo suas estreitas relações com a educação do campo.
O capítulo “Educação musical e a educação do campo: pri-
meiras aproximações...” de autoria de Anderson Brasil e Leila Dias,
os autores buscam conceber reflexões preliminares entre os saberes
presentes na Educação Musical e na Educação do Campo, discutin-
do de que forma são amalgamados os conhecimentos dos povos tra-
dicionais. Abordam-se as práticas pedagógicas da Educação Musical
diante das demandas povos do campo, em seus pleitos pessoais e em
seus contextos socioculturais. Essa tessitura teórica é estabelecida por
meio de um diálogo aproximado com outras áreas do conhecimento,
com vistas à compreensão das inúmeras maneiras de aprender e en-
sinar música na contemporaneidade.
Por fim, é apresentado o capítulo “Corpo – superfície inscrita
da educação: reflexão sobre uma experiência de ensino e pesquisa
em dança”, de Marissel Marques, ao socializar o contexto e os re-
ferenciais teóricos do processo de ensino, pesquisa e extensão dos
dois objetos em análise, que coexistiam em desdobramento: a com-
ponente curricular – Danças Tradicionais – e o projeto de extensão
– dança contemporânea e a tradição. A componente curricular tinha
o objetivo de pesquisar as danças que simbolizam ritos e celebrações
nas comunidades das estudantes, que, em geral, moram no Estado do
24
Tocantins (TO) e mediações. Também, de dar elementos conceituais
para analisar as danças no contexto educacional, cultural e estético.
Para a autora, o projeto de extensão visava, no ambiente educacional,
através da transdisciplinaridade, alcançar a conscientização, sensibi-
lidade, percepção e expressão corporal por meio de investigação das
sensações, imagens, resgate de lembranças de cada participante, ou
seja, um olhar emergente sobre si. A experiência educativa foi pauta-
da nos referencias teóricos que possibilitaram modificar o olhar so-
bre a relação pedagógica, entre estudante e docente: de vertical para
relações horizontalizadas, ou seja, entre iguais. O conhecimento foi
construído durante o caminho, partilhando o sensível através de es-
cuta sensível para se partilhar a própria vida. Foi uma busca por outra
lógica para o convívio em espaços educacionais.
Portanto, esperamos que as pesquisas aqui apresentadas e so-
cializadas possam ampliar novos estudos e debates acerca da Educa-
ção do Campo, bem como na formação de educadores e educadoras
do campo. Desejamos boas leituras a todos e a todas!
Os(as) organizadores(as).
25
1 – Educação do campo: uma
experiência metodológica na
perspectiva da alternância
1 Introdução
26
no contexto dos movimentos sociais do campo1, Pedagogia da autonomia
(1996), Pedagogia do oprimido (1987)2, e as obras que compõem o
percurso histórico do movimento por uma educação do campo (AR-
ROYO; FERNANDES, 1999; FERNANDES, 2002, CALDART,
1998; 2004), incluindo a legislação (2012)3.
Em relação à realização da pesquisa no tempo comunidade,
concorda-se com o que Brandão (1999) adverte sobre como deverá
ser o percurso da pesquisa, e que, durante seu decorrer é preciso estar
atento ao que se fala. As conversas, frases, entrevistas, discussões den-
1 A pedagogia de Paulo Freire inserida no contexto dos movimentos sociais do campo foi um dos
textos escolhidos para leitura com os discentes da disciplina História de Educação do
Campo, por tratar do tema relacionado aos movimentos sociais do campo e a educação,
em especial, educação de homens e mulheres do campo (SCHWENDLER, 2015). No
artigo, a autora trata da relação entre movimentos sociais do campo e sua relação com as
possibilidades de mudanças na sociedade, pois seria no processo de formação de lideranças
nos movimentos sociais e na base que se daria o sentido das mudanças. Para tanto, ela
apresenta uma citação de Freire (1987, p. 53), na qual ele defende a ação política com os
oprimidos: “[...] ação política junto com os oprimidos tem de ser, no fundo, ‘ação cultural’
para a liberdade, por isto mesmo, ação com eles”. Neste caso, concordo com a autora, mas,
defendo que a relação de formação política tem que ocorrer na base dos movimentos
sociais, fortalecendo desde baixo, considerando também que a formação de intelectuais
orgânicos é imprescindível para transformações políticas.
2 Obras de Paulo Freire que discutem o método do autor, teoria e reflexões sobre ensinar,
aprender e a construção do conhecimento em uma perspectiva epistemológica de temas
geradores e círculos de cultura. O autor afirma que “investigar o tema gerador é investigar,
repitamos, o pensar dos homens referido à realidade, é investigar seu atuar sobre a
realidade, que é sua práxis” (FREIRE, 1987, p. 98).
3 A legislação da Educação do Campo se refere aos marcos normativos, construções
históricas de lutas dos movimentos sociais do campo. Os documentos aqui apresentados
mostram uma política de educação específica para o campo e aparecem ordenados de
acordo com a data de sua publicação. As Diretrizes Operacionais para a Educação Básica
nas Escolas do Campo constituem-se como referência para a Política de Educação do
Campo à medida que, com base na legislação educacional, estabelecem um conjunto
de princípios e procedimentos que visam a adequar o projeto institucional das escolas
do campo às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, o Ensino
Fundamental e Médio, a Educação de Jovens e Adultos, a Educação Especial, a Educação
Indígena, a Educação Profissional de Nível Técnico e a Formação de Professores em Nível
Médio na modalidade Normal (BRASIL, 2012).
27
tro ou fora do círculo, tudo está carregado dos temas da comunidade:
sua história de vida, a vida da família em casa, na produção; as ale-
grias, a devoção, o trabalho e o ritual das festas, a luta coletiva contra
a ameaça da expulsão das terras de trabalho do camponês, as questões
dos grupos populares organizados – grupos de jovens, de mulheres,
a formação política; as questões do relacionamento das pessoas com
a natureza, as tradições da cultura, as relações da comunidade com o
poder. Assim é que se faz necessário conectar-se ao mundo do outro,
ao mundo real (BRANDÃO, 1999).
Em relação a esta experiência, os resultados apontaram que,
desde o início da preparação da pesquisa e do levantamento dos da-
dos da realidade do tempo comunidade, o processo ocorreu de forma
diferente do que propõe Brandão (1999). Foi preparado em roteiro
predeterminado, que dificultou o diálogo e a apreensão da realidade
junto às educadoras e aos educadores que foram entrevistadas/os. Por
que isso ocorreu? Porque os educadores/educadoras são contratados
do estado e não querem revelar de fato o que pensam. E, também,
porque estão cansados de dar entrevistas sem sentido.
Entretanto, os resultados das reflexões apontaram, também, que
as relações entre a pesquisa do tempo comunidade e as análises dos
dados da realidade podem proporcionar outro percurso formativo, que
elabora através de temas geradores e círculos de cultura um debate
sobre a formação dos professores do campo e suas práxis educativas.
Como elementos das experiências na disciplina, serão apresenta-
dos os tópicos que configuram as reflexões sobre a ação desenvolvida.
28
questões norteadoras tratavam: 1. Trajetória de vida; 2. O que levou
a ser educador; 3. Preparação profissional; 4. Onde estudou; 5. Como
desenvolveu sua prática docente; principais desafios do trabalho do-
cente e o que compreende por educação. A metodologia adotada
para a sistematização das experiências/pesquisa foi a apresentação
dos dados da realidade por meio de palavras geradoras e, em seguida,
a apresentação das palavras com sentidos e significados.
Com os temas geradores busca-se investigar o pensar dos ho-
mens referido à realidade, investigar sua práxis sobre a realidade. A
metodologia propõe que tanto os sujeitos da pesquisa, quanto os in-
vestigadores se façam sujeitos no processo de investigação, pois para
Freire (1987, p. 99): “quanto mais assumam os homens uma postura
ativa na investigação de sua temática, tanto mais aprofundam a sua
tomada de consciência em torno da realidade e, explicitando sua te-
mática significativa, se apropriam dela”.
Com os temas geradores cada palavra fruto do diálogo com os
educadores está carregada de sinais de experiências, lutas, trabalho,
esperança e também desesperança, vividos nos enredos da vida e suas
contradições, tanto nas questões pessoais, quanto profissionais.
Nesse sentido, adotou-se o círculo de cultura para a experiência
da exposição dos dados da realidade e reflexão sobre eles. Enquanto
círculo, tem-se o significado de que todos/todas estão à volta de um
coletivo, que busca organizar o debate, participar de uma atividade co-
mum em que todos/todas ensinam e aprendem. O coletivo é coorde-
nado por um grupo que não dirige e, a todo momento, anima e orienta
o trabalho de uma equipe cuja maior qualidade deve ser a participação
ativa em todos os momentos do diálogo, que é o seu único método de
estudo no círculo. Enquanto que o significado “de cultura” possibilita o
aprendizado individual, e o que o círculo produz são modos solidários,
coletivos, de pensar, no qual todos e todas aprenderão aquilo que cons-
troem de uma outra maneira de fazer a cultura que os faz, por sua vez,
homens, sujeitos, seres de história (BRANDÃO, 1999).
29
Sobre o círculo de cultura, a premissa é de que:
30
Figura 1.1 – Sistematização dos dados da realidade
Fonte: Acervo da autora.
31
A produção do conhecimento é pensada como um
processo de distanciamento da experiência do real
vivido. O real pensado seria construído por mentes
privilegiadas através de métodos sofisticados, distan-
tes do viver cotidiano, comum. Logo, o conhecer visto
como um processo distante do homem e da mulher
comuns, do povo comum; distante até do docente que
ensina o povo comum (ARROYO, 2013, p. 117).
32
vimento de um processo de escolarização que seja capaz de estimu-
lar atitudes e aprendizagens crítico-reflexivas. O objetivo é provocar
entre os indivíduos a construção de saberes escolares por meio da
reflexão sobre sua própria existência; e sobre o mundo em que vivem,
as relações que estabelecem, a cultura em que estão inseridos e o tra-
balho que desenvolvem. Além disso, alimentar o pensar criativo na
construção e no desenvolvimento de projetos e ações que envolvam
novas práticas sociais, produtivas e culturais, voltados à reinvenção da
existência individual e coletiva; bem como formar o hábito da análise
crítica, da autoavaliação e avaliação do processo para (re)planejar a
ação, continuamente, destacando, também, as trajetórias, dos saberes
e fazeres pedagógicos do trabalho docente.
33
um ano sem estudar, mas depois fiz o antigo magis-
tério para dar aulas. Sou licenciada em História. Não
era o que eu queria, mas, enfim, me sobrou isso (En-
trevistada, Educadora, 2017).
34
desejo de contribuir com a formação das crianças da sua comunidade,
apesar de não ter o gosto inicial pela docência. Na sua fala a seguir
pode-se observar tal fato.
35
contar suas angústias, necessidades, desejos de mudanças e também
de dizer sobre suas vidas, por isso, chama-se atenção para o fato de
como ocorre a pesquisa no tempo comunidade.
36
embate de classe entre projetos de campo e entre ló-
gicas de agricultura que têm implicações no projeto
de país e de sociedade e nas concepções de políticas
públicas, de educação e de formação humana.
37
econômica e superestrutural e também no campo ideológico; é isso
que demarca a constituição do indivíduo. Nesse caso, a consciência
de como os arranjos sociais são pactuados é que determina qual será
a forma de o homem interagirá com os demais, com o meio e, espe-
cialmente, consigo mesmo (GRAMSCI, 1999).
Assim, a proposta de formação de educadores/educadoras do
campo deve pautar-se nas mudanças do homem que transforma a
si próprio, modifica-se e, dessa forma, transforma e modifica todo
o conjunto de relações em que este é o próprio centro estruturante.
Nesse sentido, o homem é, e não pode deixar de ser, nada mais do
que o político, ou seja, homem ativo que modifica o ambiente, sendo
o ambiente o conjunto das relações de que todo indivíduo faz parte.
38
Os movimentos sociais do campo desenvolvem um importante
papel na trajetória da educação dos povos do campo, na disputa por
um projeto que reafirme a sua cultura e elabore melhores condições
de vida desses sujeitos. Tal caminhada ocorreu com mobilizações do
movimento pela educação do campo, assumindo o papel de barrar
as políticas tradicionais que têm como base o assistencialismo e as
políticas compensatórias, reafirmando a precariedade das escolas ru-
rais, com marca do atraso e do abandono da educação dos povos que
vivem em áreas rurais.
Por isso, a participação dos Movimentos e Organizações So-
ciais da classe trabalhadora e dos “de baixo” da sociedade brasileira,
para usar uma expressão de Florestan Fernandes, constituídos por
povos do campo, da floresta e das águas – tais como, os agricultores
familiares, assentados, acampados, trabalhadores assalariados rurais,
pescadores, extrativistas, comunidades tradicionais, ribeirinhos –têm
nas últimas décadas participado das disputas pelo acesso à terra e pela
defesa dos territórios e defendido a produção agroecológica como
alternativa de produção sem agrotóxico, em defesa da soberania ali-
mentar. Têm também participado das lutas por direitos à saúde, à
educação, e da conquista de políticas públicas para o fortalecimento
da base familiar, constituindo-se como sujeitos coletivos de direito e
de produção de novas formas de sociabilidades.
Essa é a base para a construção de uma educação que busca a
formação de sujeitos históricos. Nesse sentido, a educação do cam-
po nasceu demarcando uma posição no confronto e na disputa por
um projeto diferente para o campo, sendo contra a lógica do campo
como lugar de negócios, que expulsa as famílias e destrói a vida que
nele existe. Para Caldart (2016):
39
pela pedagogia do capital. Chamamos de pedagogia
socialista aos conjuntos de esforços teóricos e práti-
cos de fazer a educação dos trabalhadores na direção
de transformar radicalmente a sociedade capitalista e
construir uma nova ordem social e socialista. A mis-
são histórica central da pedagogia socialista, que se
realizada pela exigência de cada momento histórico
e de cada realidade especifica é a formação de uma
consciência de massa socialista. Em síntese, quer dizer
a consciência da necessidade de uma revolução fun-
damental, aquela que visa à transformação radical das
condições de vida da humanidade, muda a existência
industrial e política de cada indivíduo social e, con-
sequentemente como diria Marx, muda sua maneira
de ser, essa consciência é uma exigência indispensável
para que a maioria do povo se envolva na tarefa co-
letiva de sua emancipação (CALDART, 2016, s/p.).
40
jeto inclui a construção de uma escola em que o vínculo entre estudo
e trabalho se faz em direção à apropriação, em direção à ciência e do
aprendizado de relações sociais necessárias para que os trabalhadores
assumam o comando e a realização da produção social.
41
a animação para a luta. A sua materialização ocorre por meio da rea-
lização de rituais, no resgate e valorização da memória e herança dos
lutadores e lutadoras do povo. Materializa-se, também, nas músicas,
nos símbolos como a bandeira, as ferramentas de trabalho, nas pa-
lavras de ordem, no hino da organização. Para uma aluna do curso:
42
apresenta uma dimensão cultural que não deixa desanimar, mesmo
com tantos problemas e desafios que a luta impõe. A mística se ma-
nifesta na certeza da luta e da vitória; apresenta-se nas mobilizações
e busca atingir a militância para exercer a metodologia do trabalho na
esfera da produção até no cotidiano.
O conteúdo da mística expressa uma postura pessoal, com vi-
vências pautadas em valores de forma coerente no cotidiano da vida,
na luta política. É, sobretudo, nas atitudes que a mística se apresenta,
passando pela celebração coletiva e se pautando em sentimentos. A
mística deve aproximar um projeto de futuro e de presente na luta
dos trabalhadores e seu projeto de sociedade.
4 A práxis política é uma dimensão da atividade prática, que orienta e pode potencializar as
transformações na sociedade, na batalha tanto das ideias quanto da prática, significando o
exercício da práxis humana. E se constitui em uma atividade prática que baliza e orienta
transformações na sociedade, abrangendo as relações econômicas, políticas e sociais. A
práxis social, por sua vez, consiste em uma atividade de grupos e classes sociais que pode
transformar a organização e a direção da sociedade, ou mesmo provocar mudanças no
Estado, sendo essa forma de práxis a atividade política (VÁZQUEZ, 2007). Nesse aspecto,
43
a militância, para a luta da classe trabalhadora. Para Gramsci (2004),
a escola é o instrumento para formar os intelectuais de vários níveis,
compreendendo que a cultura é um dos princípios básicos do socia-
lismo. A cultura, para Gramsci, é o elemento indispensável para o
processo revolucionário, visto que a revolução é precedida de árduo
trabalho de crítica, de penetração da cultura, de novas ideias, valores;
ou seja, a cultura se constitui em um instrumento político que poten-
cializa a emancipação das classes subalternas, buscando forjar uma
contra-hegemonia na sociedade dividida em classes.
44
plica em uma concepção de homem e de mundo. Envolve, portanto,
uma postura teórica do educador/educadora. O que Freire (2007, p.
51) adverte é que “[...] o processo de orientação dos seres humanos
no mundo envolve os animais, mas, sobretudo, pensamento-lingua-
gem; envolve desejo, trabalho-ação transformadora sobre o mundo,
de que resulta o conhecimento do mundo transformado [...]”.
A partir do que salienta o autor, pode-se analisar que os seres
históricos, inseridos no tempo, movem-se no mundo e são capazes
de escolher, decidir, emitir algum tipo de valor. Apresentam, por-
tanto, uma ação humana, seja ela crítica ou não, com conteúdos e
finalidades, sem o que não seria caracterizado como práxis, mesmo
que seja orientação de mundo. Freire (2007) ressalta que, não sendo
práxis, seria ação que não levaria em consideração o próprio processo,
como também seus objetivos. Assim sendo, o autor defende a edu-
cação como perspectiva de prática para a liberdade, o oprimido terá
condições a partir dessa perspectiva, de redescobrir-se e conquistar-
-se enquanto sujeito/a de seu processo histórico.
4 Considerações finais
45
apontou que é possível uma prática de pesquisa na qual os saberes
são levados em consideração. E a reflexão promoveu possibilidades
de análise dos resultados da pesquisa, geradora de temas em que foi
possível fazer relação com a teoria do conhecimento. Seria o que Ar-
royo (2013, p. 117) chama atenção: “[...] reconhecer que todo conhe-
cimento é uma produção social, produzido em experiências sociais e
que toda experiência produz conhecimento e pode nos levar a estra-
tégias de reconhecimento [...]”.
Nesse sentido, a produção do conhecimento a partir dos dados
da realidade, portanto, dos saberes produzidos pela docência, pro-
duz conhecimentos que em uma determinada perspectiva histórica
possibilita superar segregações de experiências, de conhecimentos e
de coletivos humanos e profissionais. Reconhecer a pluralidade e
a diversidade de experiências humanas e de coletivos é, sobretudo,
perceber a potencialidade da construção de um conhecimento de
pluralidades de pensar o real.
Brandão (1999) afirma que, na pesquisa, o uso do caderno de
campo pode se relacionar na alternância com o caderno da realida-
de, os ouvidos bem atentos e o gravador disponível para gravar tudo
e não perder nenhuma informação e, sobretudo, respeitar o diálogo
com os sujeitos da pesquisa, esses são passos importantes para a pes-
quisa participante, sem, contudo, fazer questionários nem roteiros
predeterminados para a pesquisa, na qual as questões devem ser so-
bre o trabalho, a vida, experiências de vida, sobre modos de ver e
compreender o mundo, perguntas que emergem de uma vivência
que começa a acontecer ali. A partir dessas premissas e com base em
Freire (1987, p. 78), apresenta-se como pressuposto de seu método
que “o diálogo é um encontro dos homens, mediatizados pelo mun-
do, para pronunciá-lo, não se esgotando, portanto, na relação eu-tu”.
Nesse sentido, faz-se necessário rever o processo das ativida-
des do tempo comunidade, objetivando a retomada do processo de
construção do conhecimento que tenha como base um outro tipo
46
de conhecimento, que seja contra-hegemônico. Porque educar é uma
tarefa de trocas entre pessoas e que não pode ser realizada por um
sujeito isolado, não pode ser também o resultado do despejo de quem
supõe que possui todo o saber sobre aquele que, do outro lado, foi
obrigado a pensar que não possui nenhum (BRANDÃO, 1999).
Ainda em relação a esta experiência, os resultados apontaram
que, desde o início da preparação para a pesquisa e levantamento dos
dados da realidade do tempo comunidade ocorreu de forma diferente
do que propõe Brandão (1999), sobre como deveria ser a pesquisa
participante. O que ocorreu, no caso dessa experiência vivenciada pe-
los discentes do curso de Educação do Campo, foi a preparação de
um roteiro predeterminado, dificultando o diálogo e a apreensão da
realidade junto às educadoras e educadores entrevistados/as.
Por que isso aconteceu? Porque os educadores/educadoras são
contratados do Estado e não querem revelar de fato o que pensam.
Da mesma forma, as suas experiências já não querem contar, pois es-
tão cansados de responder entrevistas que muitas vezes não têm im-
portância para elas/eles. Porém, um dado chamou atenção no relato
das/dos discentes: escolher ex-professores para fazer a entrevista, isso
as/os deixou muito contentes por terem escutado seus professores e
por conhecerem de fato sobre suas histórias de vida.
Os resultados das reflexões apontaram, também, que as relações
entre a pesquisa do tempo comunidade e as análises dos dados da re-
alidade podem proporcionar outro percurso formativo, que elabora,
através de temas geradores e círculos de cultura, um debate sobre a
formação dos professores do campo e sua práxis educativa, conside-
rando que “a captação e a compreensão da realidade se refazem, ga-
nhando um nível que até então não tinham” (FREIRE, 1987, p. 96).
REFERÊNCIAS
ARROYO, M. Currículo, território em disputa. Petrópolis: Editora
Vozes, 2013.
47
ARROYO, M. G.; FERNANDES, B. M. A educação básica e o movi-
mento social do campo. Brasília: Articulação Nacional por uma Educa-
ção Básica do Campo, 1999.
FREIRE, P. Ação cultural para a liberdade. São Paulo: Paz e Terra, 2007.
48
______. Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
49
2 – Políticas públicas para
educação do campo e formação de
professores
Cícero da Silva
1 Introdução
50
situamos documentos oficiais e movimentos que reivindica(ra)m a
implantação de uma política educacional efetiva que atenda aos an-
seios dos povos do campo. Para finalizar, discorremos sobre a situação
e algumas conquistas (em diferentes níveis de ensino) no âmbito da
Educação do Campo, como a implantação de cursos de licenciatura
em Educação do Campo para formação inicial de professores que
atuam, principalmente, nos anos finais do ensino fundamental e en-
sino médio das escolas do campo.
51
po social, esse índice é três vezes maior que os registrados entre as
pessoas que vivem nas áreas urbanas.
Como não se tem cumprido o disposto no Art. 1º da LDB
9.394/96 (BRASIL, 1996), a luta principal do movimento nacional
que defende a educação do campo tem reivindicado políticas pú-
blicas que garantam o direito da população do campo à educação, e
a “uma educação que seja No e Do Campo” (CALDART, 2002, p. 18,
itálico no original). Contudo, essa lei abriu caminhos e que mais tar-
de possibilitou instituir uma modalidade de ensino que respeitasse a
cultura, a identidade, os saberes, o tempo, o espaço, os letramentos, as
características das pessoas que vivem no/do campo (SILVA, 2018),
portanto, da educação do campo.
Aludida na legislação nacional e em diversos documentos ofi-
ciais como educação rural1, a educação do campo possui uma pro-
posta teórico-metodológica própria que congrega escola, família e
comunidade nos processos de formação humana (SILVA, 2018).
Essa peculiaridade, por si só, exige que tenhamos uma concepção de
“campo” como espaço de vida, saberes, cultura e identidade próprios,
o que requer ajustes e integração da escola à vida social nesse contex-
to. Nessa concepção, o espaço social denominado campo deixa de ser
compreendido como uma extensão dos limites urbanos, notadamen-
te presente nos fundamentos da escola rural2. É importante lembrar
que não faz muito tempo que a expressão educação do campo foi
cunhada. Segundo Caldart (2012, p. 257-258), esse termo,
52
Nasceu primeiro como Educação Básica do Campo no
contexto de preparação da I Conferência Nacional
por uma Educação Básica do Campo, realizada em
Luziânia, Goiás, de 27 a 30 de julho de 1998. Passou
a ser chamada Educação do Campo a partir das discus-
sões do Seminário Nacional realizado em Brasília de
26 a 29 de novembro de 2002, decisão posteriormente
reafirmada nos debates da II Conferência Nacional,
realizada em julho de 2004 [itálico no original].
53
social, como é o caso da área educacional (SILVA, 2018). Desse
modo,
54
p. 21). Na verdade, desde a implantação dos primeiros projetos de
Educação Popular no Brasil, a negociação é complexa (BRANDÃO,
2006), mesmo dentro da própria classe social beneficiada. Ainda de
acordo com Bhabha, “O ‘direito’ de se expressar a partir da periferia
do poder e do privilégio autorizados não depende da persistência da
tradição [...]”. Em outras palavras, as lutas e articulações dos movi-
mentos sociais camponeses em defesa da Educação do Campo vão
contra as tradições impostas pelas experiências educativas típicas do
meio urbano. Estas, embora distantes dos propósitos de formação al-
mejados para a realidade das crianças e dos jovens camponeses, estão
vivas em pleno século XXI nas escolas rurais (LIMA; SILVA, 2015).
Por tudo isso, a concretização de um projeto de educação para
um grupo minoritário como os camponeses perante o Estado e a elite
dominante brasileira não é tarefa fácil, enfrenta resistência e embates,
já que envolve disputas e relações de poder (NASCIMENTO, 2009a;
CARDOSO FILHO; SILVA, 2017). Entretanto, trata-se apenas da
efetivação (na prática) de uma conquista de direito e cidadania já
previstos em nossa Constituição Federal de 1988 e na LDB/96.
Ao se encontrarem em condições de acesso à educação, parece-
-nos que, para muitas pessoas detentoras do poder político e econô-
mico, os camponeses estariam ganhando empowerment3, no sentido
do termo empregado por Freire e Shor (2003), ou seja, essa classe
social teria mais autonomia de decisão e responsabilidades diretas
quanto à educação que almejam. Depreendemos que Freire e Shor
empregam o referido termo relacionando-o ao poder da classe social,
e não à perspectiva individual ou comunitária. Significa dizer que
o empowerment “indica um processo político das classes dominadas
que buscam a própria liberdade da dominação, um longo processo
histórico de que a educação é uma frente de luta” (FREIRE; SHOR,
3 Advertimos o leitor que esse termo apresenta várias interpretações e empregos por alguns
autores. Mas, neste estudo enfatizamos o sentido empregado na obra de Freire e Shor
(2003).
55
2003, p. 138). E a classe social a quem a Educação do Campo foi
pensada é constituída pelos camponeses.
Podemos afirmar, assim, que devido à natureza de sua mate-
rialidade, como a origem (ou raiz), a educação do campo exige ser
pensada e estabelecida tendo sempre como referência norteadora três
pilares fundadores: Educação – Política Pública – Campo (CAL-
DART, 2008). Para a autora, é a relação estreita que esses termos re-
presentam que constitui a novidade histórica do fenômeno batizado
de educação do campo. Como podemos depreender, um projeto de
educação para o campo deve contemplar em seu escopo a cultura dos
povos do campo, o saber popular, a filosofia de vida, os espaços, os
tempos e as experiências dos sujeitos de tal contexto social. Na pró-
xima seção, discutiremos a política pública para educação do campo.
56
Em um trabalho no qual o financiamento da educação básica
é abordado como política pública, Martins (2010, p. 499) afirma que
“[...] as políticas contêm tanto normas que geram ou reconhecem di-
reitos, como atos que os concretizam”. Por isso, a efetivação de ações
direcionadas às políticas públicas depende de decisões administrativas
do gestor público e são disciplinadas por princípios legais. Isso porque
são diferentes setores sociais que o Estado precisa garantir sua assistên-
cia, a exemplo do financiamento da educação. Nessa perspectiva,
57
recentemente na gestão do MEC/Secadi, os rumos de tal política
para essa modalidade de educação são incertos, podendo inviabilizar
a continuidade de ações que visam à democratização da educação
formal aos camponeses brasileiros.
Como defende Arroyo (2011, p. 15), precisamos de
58
Com a publicação da Resolução, há um documento legal que
orienta claramente as unidades educativas do campo na organização
do Projeto Político-Pedagógico (PPP), considerando que este docu-
mento deve ser construído de modo que contemple a realidade, as
especificidades e os interesses dos povos que vivem no e do campo.
Dessa maneira, os conteúdos, as práticas didático-pedagógicas, os es-
paços e tempos formativos poderão ser mais apropriados à formação
dos estudantes camponeses, o que de certo modo possibilita tornar as
aulas mais proveitosas. Por outro lado, pode contribuir para reduzir
o grande número de evasão e reprovação, situações muito recorrentes
em escolas situadas no campo.
Além dessa e de outras resoluções sobre educação do campo,
durante o segundo mandato do governo Lula foi sancionado o De-
creto n. 7.352, de 04 de novembro de 2010, que dispõe sobre a polí-
tica de Educação do Campo e o Programa Nacional de Educação na
Reforma Agrária (Pronera). No artigo 2º, estão prescritos os princí-
pios “norteadores” da Educação do Campo, a saber:
59
por meio de projetos pedagógicos com conteúdos cur-
riculares e metodologias adequadas às reais necessida-
des dos alunos do campo, bem como flexibilidade na
organização escolar, incluindo adequação do calendá-
rio escolar às fases do ciclo agrícola e às condições
climáticas;
V - controle social da qualidade da educação escolar,
mediante a efetiva participação da comunidade e dos
movimentos sociais do campo (BRASIL, 2010).
60
Além disso, questões como: um currículo específico, respeito
à identidade cultural, organização pedagógica em tempos e espaços
formativos diferentes, dentre outros aspectos, estão previstos no PNE
para que a Educação do Campo aconteça. O PNE ainda prevê “a ofer-
ta de programa para a formação inicial e continuada de profissionais
da educação” (BRASIL, 2014), o que é de fundamental importância
para o fortalecimento da educação do campo. Contudo, as mudanças
na política pública nacional de educação preocupam, inclusive, quanto
ao cumprimento das metas estabelecidas no PNE para atender as de-
mandas das escolas do campo. A seguir, veremos que o Pronacampo é
uma ação voltada para a formação de professores das escolas do campo.
4 O Pronacampo e a implantação de
licenciaturas em Educação do Campo para
formação inicial de professores
61
de acesso à educação a jovens e adultos do campo por meio da rede
pública de ensino e com uma organização curricular que respeite as
especificidades do campo; e (2) a construção de um Plano Nacional
de Formação dos Profissionais da Educação do Campo.
Esses dois programas nascem de uma problemática ligada
entre si, que, para implementar a inserção dos camponeses no sis-
tema público de ensino, requer uma organização curricular e me-
todológica condizente com a realidade do campo. Desse modo, é
fundamental que tenhamos profissionais preparados e capazes de
contribuir com a formulação de tal organização curricular e me-
todológica.
Considerando tal demanda, por meio de comissão instituída
pelo Grupo Permanente de Trabalho de Educação do Campo da
(antiga) Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Di-
versidade (Secad) e participação de representantes de movimentos
sociais do campo, o MEC convidou algumas Instituições Federais de
Ensino Superior (IFES) em 2006, visando à instalação de um curso
de graduação em licenciatura em Educação do Campo (CALDART,
2011). Por acumularem experiências com a formação de professores
do campo e envolvimento em projetos de gestão em parceria com
atores sociais do campo, as IFES contempladas para o desenvolvi-
mento de quatro projetos-piloto do curso foram: Universidade de
Brasília (Unb), Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universi-
dade Federal de Sergipe (UFS) e Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG). Hoje, essas IFES já formaram algumas turmas.
Após a implantação das turmas dos projetos-piloto em 2007,
o MEC criou o Programa de Apoio à Formação Superior em Li-
cenciatura em Educação do Campo (Procampo). Caldart (2011, p.
128) lembra que o objetivo desse programa era apoiar a implantação
de licenciaturas em Educação do Campo a partir do lançamento
de editais (anualmente – 2008, 2009) de convocação às IFES no
intuito de que apresentassem projetos visando à criação de novos
62
cursos, conforme parâmetros estabelecidos na primeira proposição
(dos projetos-piloto). Em 2010, existiam 21 (vinte e uma) turmas
de licenciatura em Educação do Campo instaladas em algumas uni-
versidades públicas do Brasil.
Além disso, nos últimos 15 (quinze) anos, pesquisadores vin-
culados a diferentes universidades realizaram estudos que estão con-
tribuindo significativamente para o fortalecimento da educação do
campo no Brasil (MOREIRA, 2000; QUEIROZ, 2004; RIBEIRO,
2008; NASCIMENTO, 2009a; SILVA, 2018). Tal constatação fica
evidente com a formação de educadores do campo a partir da adoção
de experiências formativas para o meio rural advindas dos princípios
teórico-metodológicos da Pedagogia da Alternância (PA).
Ao utilizar a Pedagogia da Alternância como alternativa à
formação para os camponeses (em nível básico e superior), criam-
-se condições para que tais atores em processo de formação tenham
acesso à universidade e, ao mesmo tempo, contribua para a perma-
nência deles junto à família, à sua cultura e às atividades recorrentes
no campo (MOREIRA, 2000; SILVA; ANDRADE; MOREIRA,
2015). De acordo com Ribeiro (2008, p. 30),
63
“unidade conceitual e metodológica” de prática educacional que fa-
voreça a permanência dos povos do campo onde vivem.
No ano de 2012, em atenção às reivindicações dos camponeses
a respeito da educação, o Governo Federal deu sequência às ações de
apoio à política de formação de professores (para atuação nas escolas
do campo nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio)
conforme previsto no Decreto n. 7.352/2010 (BRASIL, 2010). Por
meio do Edital de Seleção n. 02/2012 - Sesu/Setec/Secadi/MEC de
31 de agosto de 2012, o MEC,
64
apoiar a implantação de 40 cursos regulares de licen-
ciaturas em Educação do Campo, que integrem en-
sino, pesquisa e extensão e promovam a valorização
da educação do campo, com no mínimo 120 vagas
para cursos novos e 60 vagas para ampliação de cursos
existentes, na modalidade presencial a serem oferta-
das em três anos (BRASIL, 2012, grifo no original).
65
de cursos de graduação específicos em educação do campo nas diversas
áreas do conhecimento de universidades públicas das diferentes regi-
ões brasileiras (SILVA; ANDRADE; MOREIRA, 2015), dentre eles
o da Universidade Federal do Tocantins (UFT).
A UFT apresentou projeto e foi contemplada com a implanta-
ção de 02 cursos de licenciatura em Educação do Campo: Códigos e
Linguagens – Artes e Música, um vinculado ao Campus de Tocanti-
nópolis e, outro, ao Campus de Arraias. Segundo Silva et al. (2017),
no primeiro processo seletivo (2014-1) esses dois cursos ofertaram
240 vagas, sendo 120 para Tocantinópolis e 120 para Arraias. As
aulas dessas primeiras turmas tiveram início no primeiro semestre de
2014. Nos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018, foram realizados novos
processos seletivos (específicos) para ambos os cursos e o número de
alunos aumentou significativamente, como mostra a Tabela 2.1.
Cursos de Licenciatura em
2014 2015 2016 2017 20184
Educação do Campo / UFT
Campus de Arraias 120 120 120 59 -
Campus de Tocantinópolis 96 103 83 44 54
Total 216 223 203 103 54
Fonte: elaborada pelo autor com base nos dados da pesquisa.
4
Devido ao curso do Campus de Arraias possuir calendário diferente do curso do Campus
de Tocantinópolis, até o dia 05 de junho de 2018 não havia dados disponíveis sobre
matrículas de alunos ingressantes em 2018 no Curso de Arraias.”, que aparece no final da
página 73 mas que deve ser inserida na página (67).
66
39 discentes vinculados à primeira turma da licenciatura em Educa-
ção do Campo, Campus de Tocantinópolis, concluíram o curso. Tal
número é bastante significativo, pois os egressos poderão atuar nas
escolas do campo do Tocantins e de outros estados brasileiros. Sem a
criação das mais de 42 licenciaturas por meio do Pronacampo – nas
diferentes regiões do país – isso não seria possível, uma vez que hoje
esses cursos possuem milhares de alunos, o que pode ajudar a reduzir
o déficit de educadores nas escolas do campo no futuro. Evidente-
mente, é o resultado de uma política pública que, se mantida pelo
poder público, poderá fortalecer a educação do campo em todo o
território nacional.
5 Conclusão
67
dos mais de 42 cursos de licenciatura em Educação do Campo pelo
MEC/IFES tal como proposto originalmente no Edital n. 02/2012
(BRASIL, 2012), tanto nos aspectos políticos, ideológicos, culturais
e econômicos, visando a garantir o acesso e a permanência dos dis-
centes na universidade.
Precisamos de uma modalidade de educação que prepare pro-
fissionais para o campo e que pensem/vejam “o campo” sob outra
lógica de formação, diferente da educação rural. O campo precisa de
advogados, médicos, professores, agrônomos, administradores, entre
outros profissionais, mas formados não na perspectiva dos moldes
capitalistas; espera-se que entendam o campo, sua história, sua rea-
lidade sociocultural. Por sua vez, os movimentos sociais devem con-
tinuar lutando pela educação do campo de que tanto os camponeses
necessitam. Caso contrário, a educação praticada no campo terá ape-
nas caráter de escolarização, e não de formação de atores sociais com
uma identidade camponesa.
REFERÊNCIAS
68
BRASIL. Lei n. 13.005, de 25 junho de 2014. Aprova o Plano
Nacional de Educação – PNE e dá outras providências. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2014/
Lei/L13005.htm>. Acesso em: 16 set. 2017.
69
______. Licenciatura em Educação do Campo e projeto formati-
vo: qual o lugar da docência por área? In: CALDART, R. S. et al.
(Orgs.). Caminhos para transformação da escola: reflexões desde
práticas da licenciatura em Educação do Campo. São Paulo: Expres-
são Popular, 2011. p. 127-154.
70
IBGE. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E
ESTATÍSTICA. Indicadores sociais municipais: uma análise dos
resultados do universo do Censo Demográfico 2010. Rio de Janeiro:
s/n, 2011.
71
QUEIROZ, J. B. P. Construção das escolas família agrícolas no
Brasil: ensino médio e educação profissional. 2004. 211f. Tese (Dou-
torado em Sociologia). Universidade de Brasília, Brasília, 2004.
72
3 – Experiências dos indígenas
Apinayé do curso de Educação
do Campo – Artes e Música de
Tocantinópolis no Pimi
1 Introdução
73
permite ao educando vivenciar processos formativos na universidade
e em sua comunidade. Os autores Roberto García-Marirrodriga e Pe-
dro Puig-Calvó (2010), consideram a alternância pedagógica, como
um momento em que se valoriza a formação continuada, fazendo um
elo entre a escola e o meio que o sujeito vive. Nesse sentido, o Curso
de Educação do Campo da UFT vem tentando fazer essa ligação
entre a universidade e as comunidades onde moram os estudantes do
curso, acreditando na emancipação dos sujeitos que vivem e moram
no campo, no caso dessa pesquisa, os estudantes indígenas.
A abordagem teórico-metodológica utilizada foi a pesquisa
autobiográfica cuja fonte incide sobre a entrevista narrativa. Segundo
Abrahão (2004, p. 203) “nesta tradição de pesquisa, o pesquisador
não pretende estabelecer generalizações estatísticas, mas, sim, com-
preender o fenômeno em estudo, o que lhe pode até permitir uma
generalização analítica”. Assim, pretendemos compreender os senti-
dos que os indígenas Apinayé, acadêmicos do Curso de Educação do
Campo- Artes e Música atribuem ao Pimi.
Ao utilizar a técnica da entrevista narrativa o pesquisador tam-
bém estará trabalhando com as histórias de vida dos entrevistados,
conhecendo melhor o contexto social, cultural e econômico e, prin-
cipalmente, quais sentimentos que aquele indivíduo possui quando
está narrando determinado assunto. Portanto, essa fonte de coleta de
informações possibilitou aos alunos indígenas evocar processos for-
mativos ocorridos no programa Pimi e configurar tais processos no
ato de narrar a continuidade de sua formação agora na universidade
e em um futuro próximo.
A técnica das entrevistas narrativas é importante porque sem-
pre surgem elementos que muitas vezes não estavam previstos pelo
entrevistador. Portanto, é de fundamental importância frisar que “a
entrevista narrativa busca romper com a rigidez imposta pelas en-
trevistas estruturadas e gera textos narrativos sobre as experiências
vividas” (WELLER; OTTE, 2014, p. 16).
74
A entrevista narrativa segundo Muylaert et al. (2014, p. 194)
“[...] pode suscitar nos ouvintes diversos estados emocionais, tem a
característica de sensibilizar e fazer o ouvinte assimilar as experiên-
cias de acordo com as suas próprias, evitando explicações e abrindo-
-se para diferentes possibilidades de interpretação”. Ao contar sua
história de vida, o indivíduo compartilha com os outros as suas ex-
periências, sejam elas consideradas positivas ou traumáticas. Nesse
aspecto, a memória é fundamental na tentativa de reconstrução do
passado, a partir do olhar sobre o presente. Contudo, ao trabalhar
com entrevista narrativa o pesquisador está sujeito a conhecer as his-
tórias de vida do entrevistado, principalmente, porque ele é uma fon-
te de informações que exige do entrevistador tempo para adquirir os
dados que almeja. No caso desse estudo, o objetivo foi adquirir as in-
formações experienciadas sobre o Pimi, a partir do olhar dos próprios
participantes do programa, graduandos da etnia Apinayé.
2 Os Apinayé
75
O nome dos apinayé tem várias designações. Os autores Ladei-
ra e Azanha (2003) explanam que o nome Apinayé ou Apinajé não
foram os próprios indígenas que se denominaram assim. Com isso,
podemos compreender que não partiu de uma mitologia dos Api-
nayés, mas, mesmo assim, hoje eles se autodenominam dessa forma,
ficando conhecidos por todos como Apinayé ou Apinajé. No vocábu-
lo Timbira Oriental, o sufixo yê/jê corresponde à coletividade.
No livro “Os Apinayés” de Curt Nimuendajú (1983) percebe-
-se que o nome da comunidade apinayé foi citado primeiramente na
forma de pinarés e pinagés. O autor explica que existem outros nomes
além do Apinayé dentro das próprias tribos como exemplo, entre os
Timbira Orientais, e que pode significar “canto” ou “pontal”, Apinayé:
“ôd”, “ôdo”; Timbira Oriental: “hot”, “hôto”, aludindo às sedes no pon-
tal formadas pelos rios Araguaia e Tocantins. Para ele, “os próprios
Apinayé usam a forma “ôti” para Pontal Grande; os outros Timbira
usam “hôti Ahôtiyé”. Os Kayapó setentrionais, porém, referem-se aos
Apinayé, usando o termo “Ken-tug”, que significa “pedra preta” ou
“serra negra”’. Nimuendaju (1983), salienta que os apinayés falam que
seu povo é uma subdivisão das tribos Timbira do leste do Tocantins.
Nas falas do autor não é visto nada sobre a possível habitação de ou-
tras pessoas nessas terras antes dos Apinayés, com exceção dos índios
Morcegos, sendo eles uma lenda mitológica (NIMUENDAJU, 1983).
Por outro lado, para Ribeiro (2015), os povos Apinayés se auto-
denominam “Panhii”, palavra utilizada por povos indígenas para que
possam reconhecer outros povos indígenas que, assim como eles, lutam
para que a sua cultura se mantenha viva e para manter uma oposição
“nós/outros” aos “cupên” (homens brancos). O termo “Panhii” não so-
mente é utilizado pelos Apinayés, mas também pelos Povos Timbira.
Além dessa questão do nome, outro fator bem presente entre
os Apinayés é a batalha pelo território. Ao longo de sua história,
eles são reconhecidos por sua força, e por serem índios guerreiros
que sempre tiveram que lutar por suas terras, Segundo Alburquerque
(2007, p. 202):
76
Na região do Araguaia, os índios habitavam as duas
margens, desde São João até a aldeia Cocal Grande.
Porém, as lutas com os “civilizados” fizeram com que
os Apinayés se concentrassem às margens do Tocan-
tins. Na medida em que a área indígena era invadida
por fazendeiros e povoados, os índios migravam das
aldeias, muitas vezes para trabalharem para os fazen-
deiros, outras tantas porque estes se aproximavam
tanto das aldeias que os Apinayés não tinham como
sobreviver com o que sobrava das terras que lhes eram
retiradas. Apesar disso, os Apinayés resistiram às in-
vasões, cada vez maiores, apegando-se à sua cultura e
ao seu território.
77
3 O Programa Institucional de Monitoria
Indígena (Pimi)
78
A função desses encontros consiste em compreender as difi-
culdades apresentadas pelos alunos, procurando ouvir o outro por
meio do diálogo étnico cultural, valorizar as experiências indígenas
e os conhecimentos acadêmicos, procurando solucionar problemas e
criar oportunidades e facilidades ao indígena para sua inserção na so-
ciedade. Ao se referir à concretização de um diálogo étnico-cultural
Bergamaschi (2008, p. 7) entende que ele depende do “reconheci-
mento do outro como interlocutor legítimo, embasando a interação
no respeito a esse outro com o qual nos dispomos a dialogar”. Para a
autora, “o respeito aos povos indígenas supõe conhecê-lo, a fim de re-
conhecê-lo nos seus modos de viver”. Nesse sentido, o Pimi procura
fortalecer a cultura indígena e buscar elementos para que continuem
na universidade, aproximando as práticas acadêmicas das suas reali-
dades, sem que se perca o contato com a sua comunidade.
Desde os primeiros contatos, estratégias foram desenvolvidas
para ajudar os alunos nas suas dificuldades dentro da universidade,
dentre elas, o acompanhamento desses alunos no tempo universi-
dade e no tempo comunidade em suas respectivas aldeias, em sua
formação por alternância (GIMONET, 2007, p. 16). Nos encontros
são registradas as presenças/ausências dos alunos atendidos nas ati-
vidades como forma de acompanhar o interesse ou desinteresse deles
pelos encontros que podem ser inviabilizados por diversos motivos:
problemas pessoais, familiares, financeiros e outros.
O Pimi busca os ideais de uma educação defendida por Paulo
Freire (2010), que parte da necessidade da formação do sujeito em
sua totalidade e a partir da sua realidade. Assim, esta nova concepção
de educação, concebe o ser humano como único, como sujeitos iden-
titários, que possuem uma forma de ser, pensar e agir moldada pela
interação com outros sujeitos, também proprietários de identidades
particulares construídas de acordo com o próprio meio social que
estão inseridos (SOUSA; SANTOS, 2016, p. 01). Nesse sentido, a
participação de jovens e adultos indígenas em projetos de educação
79
escolar indígena permitirá a comunicação e trocas de saberes entre os
conhecimentos escolares e tradicionais, bem como entre as gerações,
garantindo a voz dos sujeitos no currículo, promovendo a intercultu-
ralidade. O termo “intercultural” é definido como o “que envolve duas
ou mais culturas diversas entre si” (ABRAHÃO, 2012, p. 60).
Na perspectiva intercultural e de acordo com Fleuri (2003, p.
52) “os educadores e educandos não reduzem a outra cultura a um
objeto de estudo a mais, mas a consideram como um modo próprio
de um grupo social ver e interagir com a realidade”. Esse diálogo pro-
picia o respeito aos saberes tradicionais, inclusive, no que determina a
legislação sobre a prerrogativa dos povos indígenas e no que se refere
à participação nas tomadas de decisão sobre as prioridades de desen-
volvimento. Conforme o Art. 27 da Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT) de 1989, sancionada pelo Decreto
Presidencial n. 5.051, de 19 de abril de 2004 (BRASIL, 2004):
80
nas suas dificuldades de inserção na universidade acadêmica e difi-
culdades de aprendizagens em disciplinas, tornando o meio acadêmi-
co um espaço de diálogos de saberes e construção de conhecimento.
Dessa forma, buscando compreender a importância desse pro-
grama no cotidiano acadêmico dos alunos indígenas, foi realizada a
pesquisa autobiográfica “como modo de revelar e desvelar situações
cotidianas de sujeitos implicados em seus espaços pessoais e profis-
sionais” dos entrevistados (SOUZA, 2014, p. 40).
A pesquisa autobiográfica analisa as modalidades em que os
indivíduos e, por extensão, os grupos sociais trabalham e incorpo-
ram biograficamente os acontecimentos e as experiências de apren-
dizagem ao longo da vida (DELORY-MOMBERGER, 2008). De
acordo com Souza (2007), as pesquisas como fontes autobiográficas
conferem um estatuto teórico-metodológico para uma compreensão
das práticas educativas e escolares. Assim, as narrativas de alunos in-
dígenas do curso de Educação do Campo de Tocantinópolis sobre as
suas experiências vivenciadas no Pimi se inscrevem em uma perspec-
tiva da educação escolar indígena.
A entrevista narrativa, segundo Jovchelovitch e Bauer (2002, p.
93) “tem em vista uma situação que encoraje e estimule um entrevis-
tado [...] a contar a história sobre algum acontecimento importante
de sua vida e do contexto social”. A técnica não prende o entrevistado
em uma única questão, ela o deixa à vontade, possibilitando que con-
te sua história de vida significativa com o contexto social, neste caso,
o Pimi, até chegar ao que lhe foi perguntado.
Vale ressaltar que, ao utilizar a entrevista narrativa, o entre-
vistador precisa ter cuidado com as formas de linguagem utilizada
com o entrevistado, pois não se deve falar com outra forma a não ser
de acordo com o grau de falar do entrevistado. No caso da entrevis-
ta com os indígenas Apinayés, foi utilizada uma linguagem simples,
pois os mesmos não compreendem muito bem a língua portuguesa
e o diálogo é o elo entre entrevistador e entrevistado, “as narrativas
81
combinam histórias de vida a contextos sócio-históricos, ao mesmo
tempo em que as narrativas revelam experiências individuais e po-
dem lançar luz sobre as identidades dos indivíduos e as imagens que
eles têm de si mesmo” (MUYLAERT et al., 2014, p. 4).
Entretanto, não foi estruturado um questionário de perguntas.
Foi lançada uma pergunta geradora inicial: “Conte-nos sobre as suas
experiências vivenciadas no Programa de Monitoria Indígena”. No
caso da educação musical “a pesquisa autobiográfica em educação
musical se inscreve na condição humana de um sujeito que conta,
por meio de sua relação com música, o que ele é, ou poderá vir a ser”
(ABREU, 2014, p. 75). Portanto, ao contar sobre as suas experiências,
os estudantes atribuem significados ao que o Pimi teve, tem e poderá
ter em suas vidas.
Ao fazer as análises das histórias coletadas por meio das entre-
vistas narrativas, partimos da ideia de Schütze (2013) em encadear
passos para esse tipo de análise. O 1º passo consiste na transcrição
detalhada das narrativas, que foram divididas entre as autoras do tra-
balho. As narrativas foram agrupadas por temáticas para posterior
cruzamento dos dados. Portanto, ao analisar algumas falas percebe-
mos que os entrevistados não se prendem somente na pergunta que
lhe foi feita, eles trazem um contexto e explicam a importância do
programa nas suas vidas acadêmica, das dificuldades, sonhos e obje-
tivos futuros ao estarem na universidade.
82
aceitabilidade, de admissibilidade, de credibilidade, e que se faz por
meio da negociação direta com os outros (POLLAK, 1992, p. 6)”.
Sendo assim, ao contar sua história de vida, o indivíduo, compartilha
com o outro suas experiências vividas, sejam elas boas ou ruins. Neste
aspecto, a memória é de essencial valor para essa reconstrução do
passado, a partir do presente. Nessa mesma perspectiva, Pollak (1992,
p.4-5) ressalta que,
83
ências vivenciadas no programa, de certa forma, os levam a fazer uma
leitura sobre as suas histórias de vida.
Participaram da pesquisa oito (8) acadêmicos indígenas que
frequentam o curso de Educação do Campo – com habilitação em
Artes e Música do Campus de Tocantinópolis, da etnia Apinayé e
de aldeias diferentes como: Cocal Grande, São José, Pintada, Boi
Morto, Patizal e Furna Negra.
As narrativas de experiências vivenciadas no Pimi, autobio-
grafadas pelos acadêmicos indígenas da UFT, foram apontadas em
diversas situações cotidianas de sujeitos implicados em seus espaços
pessoais e sociais. Além de remeterem a situações que direcionam a
construção de projetos de si, como concluir um curso superior, le-
cionar e outros, todos os entrevistados falaram da importância que o
programa Pimi possui nas suas vidas acadêmicas e das dificuldades
que possuem na universidade.
Os estudantes indígenas relataram a importância da monito-
ria no auxílio ao uso do computador. O uso do computador é um
dos desafios enfrentados pelos estudantes indígenas ao adentrarem
na universidade, fato que é evidenciado nas narrativas dos alunos.
Segundo Delma, a única mulher Apinayé que frequenta o curso, o
Pimi é muito importante na vida acadêmica dela, principalmente,
pela dificuldade que ela tem em manusear o computador e o progra-
ma possibilitou que aprendesse. Para a colaboradora, “eu to gostando
muito da monitoria é importante para nos indígenas, é que a gente
tem muita dificuldade pra aprender a mexer computador por isso,
que nós precisamos de ajuda, nós precisamos também de ajuda pra
aprender mexer com o computador”. Além do domínio do uso das
tecnologias, outro desafio abordado por Delma é a dificuldade com
o manuseio da língua portuguesa, então o programa acaba sendo um
espaço para esclarecimento de dúvidas, pois para ela, eles não falam
bem o português e o compreendem pouco: “a gente não fala bem o
português, mas entende um pouco o português a gente entende algu-
ma coisa, muito não, mas um pouco”.
84
A escrita como um dos desafios dos povos indígenas na educa-
ção foi apresentada por Bonin (2008); para o autor, como as popula-
ções indígenas têm suas culturas baseadas na oralidade, ao chegarem
às escolas se deparam com a “escrita como código a partir do qual a
escola institui verdades e conhecimentos” (BONIN, 2008, p. 96). Re-
cordamo-nos dos alunos indígenas em uma reunião do Pimi falando
que, muitas vezes, não compreendem o que o professor fala em sala
de aula, não entendem o que é preciso fazer com o material entregue
e, por outro lado, são incompreendidos por alguns educadores que co-
bram nas apresentações de trabalhos a se expressarem de uma forma
acadêmica. Essa incompreensão, muitas vezes, também eles percebem
por parte dos colegas de classe e outros servidores da instituição.
O colaborador Márcio considera a monitoria importante para
ajudá-los na realização dos trabalhos. Ele narrou o seguinte:
85
nidade”. Para Sérgio, a monitoria sempre lhe ajuda nos trabalhos e é
muito boa.
Durante a narrativa, Delma relatou seus sonhos para projetos
futuros que é ser professora na sua aldeia e ajudar seu povo:
86
Sobre a língua Sergio diz o seguinte: “a minha dificuldade é...
falar na língua portuguesa é... Muito difícil para nós indígena estar
falando, mas estou aprendendo um pouco”. Para Célio, “Estou fa-
zendo o curso de Educação do Campo agora. Eu estou no segundo
período... Eu entrei na faculdade. É... muito difícil para mim mais eu
estou aprendendo um pouco a língua portuguesa”.
Além do Pimi, a colaboradora Delma considera o curso de
Educação do Campo muito importante para os indígenas, pelo fato
de proporcionar aprendizado aos estudantes e possibilitar a alternân-
cia pedagógica vivenciando momentos na universidade e em suas al-
deias. Nessa direção, assim narrou a colaboradora:
87
pensamento pelo fato que os educadores do curso procuram em suas
aulas valorizar tanto o conhecimento acadêmico como o empírico,
considerando as realidades das comunidades principalmente indíge-
nas, camponeses e quilombolas.
Em relação às dificuldades enfrentadas pelos alunos indígenas
Márcio da Aldeia Pintada narrou o seguinte:
88
nhece que o estudo pode melhorar a qualidade de vida sua e de sua
família, além de obter novos conhecimentos.
Outro colaborador que narra a sua dificuldade em chegar à
universidade pela falta de transporte é Sérgio, pois ele não tem moto.
Mas o que Sergio apresenta de novo em sua fala é a dificuldade que
enfrentou ao chegar ao primeiro dia na universidade:
5 Considerações finais
89
melhor forma de trabalhar com os indígenas, quais as suas necessi-
dades e dificuldades. Auxiliá-los nessas tarefas precisa que o monitor
tenha boa vontade e disposição para ajudá-los. Ser monitor indígena
é também uma missão social. Por meio das narrativas dos estudan-
tes indígenas, podemos perceber que a monitoria indígena alude em
compreender a aprendizagem como um procedimento contínuo e
ainda solicita um diagnóstico cuidadoso do aprender em suas etapas,
a fim de se compreender novas ideias e valores para que a monitoria
possa funcionar.
O curso de Educação do Campo com sua proposta de ensino
é bastante importante para a preservação da cultura e identidade,
porém, acreditamos que ainda necessita de mudanças para que possa
contemplar todas as necessidades de seus alunos indígenas, necessi-
dades essas que foram citadas nas narrativas dos estudantes.
Contudo, na perspectiva de compreender a importância que o
programa Pimi possui na vida acadêmica dos indígenas apinayé da
cidade de Tocantinópolis, foi realizada essa pesquisa autobiográfi-
ca, utilizada como fonte para coleta dos dados a entrevista narrativa,
em que nos foi possibilitado conhecer não somente a relevância do
programa para esses estudantes indígenas, também aspectos de suas
histórias de vidas.
Projetos de vida para o futuro também foram elencados como
é o caso de Delma, que ao relatar sobre seu sonho de ser professora
a sua fala juntamente com a expressão do seu rosto mostraram a sua
determinação em continuar a estudar para ajudar a sua comunidade.
Na pesquisa realizada foi possível conhecer um pouco da histó-
ria do povo Apinayé, mas, principalmente, a trajetória e as dificulda-
des que enfrentam os acadêmicos indígenas do curso de Educação do
Campo. Percebemos que o programa Pimi é de fundamental impor-
tância na vida acadêmica dos estudantes, auxiliando em suas ativida-
des e trabalhos acadêmicos. Em suma, apreendemos que programas
criados para o ensino e aprendizagem de educandos na Universidade
90
ou em outras instituições de ensino contribuem para direcionar um
dos focos da formação: que a vida-formação de jovens esteja cada vez
mais implicada com o social.
Referências
91
BERGAMASCHI, M. A. (Org.). Povos indígenas e educação.
Porto Alegre: Mediação, 2008.
92
JOVCHELOVITCH, S.; BAUER, M. W. Entrevista narrativa. In:
BAUER, M. W; GASKELL, George (Orgs.). Pesquisa qualitativa
com texto, imagem e som: um manual prático. Petrópolis: Vozes, 2002.
93
SOUZA, E. C. Diálogos cruzados sobre pesquisa (auto)biográfica:
análise compreensiva-interpretativa e política de sentido. Revista
Educação, Santa Maria, v. 39, n. 1, p. 39-50, jan./abr. 2014.
94
4 – Padi-Música: Implantação,
experiências e desafios na LEDOC-
Tocantinópolis
1 Introdução
95
partir das ações esperadas conforme a resolução que aprovou sua
regulamentação dentro da instituição.
Dedicamos ainda, neste texto, um espaço para expormos os pa-
râmetros que nortearam a proposta pedagógica do programa para as
disciplinas de Música e seus desdobramentos dentro do curso de licen-
ciatura em Educação do Campo (LEDOC) a partir do relato de expe-
riência do grupo de tutores. Parte dos dados e informações que serão
apresentados foi colhida junto à Pró-reitoria de Graduação (Prograd).
Estes estão em fase inicial de processamento, logo não apresentam ain-
da uma visão profunda, detalhada e qualitativa a qual gostaríamos de
apresentar, mas consideramos útil como primeiro esforço de reflexão
àquilo que foi desenvolvido com toda a equipe envolvida.
96
a síntese de seu projeto formativo, a UFT assume o compromisso e a
responsabilidade social de torna-se, dentro deste prazo,
97
da permanência e do êxito dos estudantes, na perspec-
tiva da inclusão social, da produção do conhecimento,
da melhoria do desempenho escolar e da qualidade de
vida. Elas são destinadas a estudantes regularmente
matriculados na instituição e tem ações articuladas
com pró-reitorias afins (PDI 2016-2020, p. 97).
98
dução do conhecimento e qualidade de vida aos agentes envolvidos.
Dentro dessa perspectiva, vinculando políticas de ensino e assis-
tência estudantil, os cursos de graduação da UFT devem prezar pela
99
O Programa de Formação Docente Continuada (Profor) é um
programa destinado aos docentes da Universidade Federal do To-
cantins voltado para a progressão de carreira. Ele foi concebido como
um programa permanente que pretende “contribuir para a difusão de
uma prática pedagógica reflexiva, a partir da construção de um diálo-
go aberto e profícuo entre docentes, acadêmicos e a gestão do ensino
superior na UFT” (site). O programa foi instituído na UFT em 2014,
a partir da pauta inaugurada pelo I Seminário de Estudos Pedagógi-
cos e Institucionais (2010) que teve por objetivo “introduzir a temá-
tica da formação docente continuada e sua importância, a partir do
fortalecimento dos cursos de graduação e da valorização da dimensão
interdisciplinar” permitindo que o cotidiano acadêmico pudesse ser
exposto e debatido (site).
Dessa forma, o Profor tornou-se “parte integrante da política
educacional da instituição, bem como uma atividade acadêmica volta-
da para a progressão na carreira docente”. Objetivos do programa são:
100
O Programa Institucional de Monitoria (PIM) “contempla ativi-
dades de caráter didático-pedagógico, desenvolvidas pelos alunos da
graduação e orientadas por professores, que contribuem para a for-
mação acadêmica do estudante” (site). Objetivos do programa são:
101
os programas CAPES que estão relacionados à Educação básica, ga-
rantindo o uso de espaços de uso comum entre as licenciaturas exis-
tentes em todos os campi da UFT articulando conhecimento e asse-
gurando uma formação interdisciplinar”. São objetivos do programa:
102
abordagem inter(trans)disciplinar. Em cada grupo, que inicia com
um número de estudantes sobre a supervisão de um professor tu-
tor responsável pelo desenvolvimento de atividades extracurriculares,
destinadas a complementar a formação acadêmica a fim de propiciar
a qualidade dos cursos de graduação.
O Programa de Mobilidade Acadêmica (PMA) tem por objetivo
possibilitar aos estudantes de graduação das Instituições Federais de
Ensino Superior (IFES) conveniadas cursarem parte das disciplinas do
currículo de seu curso em outra instituição. O programa visa estimular
a relação de reciprocidade em cursos de graduação de IFES brasileiras.
O Programa de Consolidação das Licenciaturas (Prodocência) é
uma ação da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ní-
vel Superior (Capes) com intuito de fomentar a inovação e elevar
a qualidade dos cursos de formação de professores voltados para a
Educação Básica. “Criado em 2006, o Prodocência financia projetos
voltados para a formação e o exercício profissional dos futuros docen-
tes, além de implementar ações definidas nas diretrizes curriculares
da formação de professores para a educação básica” (site). São obje-
tivos do programa:
103
O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid)
é uma iniciativa do Ministério da Educação, executado pela Coorde-
nação de aperfeiçoamento de pessoal de nível superior (Capes) e “tem
por finalidade fomentar a iniciação à docência, contribuindo para o
aperfeiçoamento da formação de docentes em nível superior e para a
melhoria da qualidade da educação básica pública brasileira”. O Pibid/
UFT é composto por 22 subprojetos, que tem período de execução
2014 e 2018 de acordo com edital da Capes n.º 061/2013. O Programa
é executado em parceria com as redes municipal e estadual de educação
do Estado do Tocantins. São objetivos do programa:
104
O Programa de Apoio ao Discente Ingressante (Padi) foi criado
pela Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) da UFT, no ano de 2015,
através da resolução n.º 18 do Conselho Superior de Ensino, Pes-
quisa e Extensão (Consepe). O programa visa “auxiliar os estudan-
tes ingressantes que estejam matriculados no 1º e/ou 2º período(s) e
àqueles reprovados nas disciplinas básicas curriculares”. São objetivos
do Programa:
I - Ampliar o atendimento aos alunos ingressantes na
Instituição proporcionando-lhes suporte didático, no
sentido de minimizar deficiências de conhecimentos
básicos necessários às disciplinas introdutórias dos
cursos de graduação;
II - Propiciar ao tutor discente a oportunidade de en-
riquecimento técnico e pessoal, por meio do desen-
volvimento de atividades acadêmicas, permitindo-lhe
ampliar a convivência com outras pessoas do meio
universitário;
III - Contribuir para a redução do índice de reprova-
ção, retenção e evasão na UFT;
IV - Promover a democratização do ensino superior,
com excelência.
105
No campo das licenciaturas, a UFT dispõe de importantes
programas de ensino que permitem ao discente vivenciar o processo
de iniciação docente - supervisionada e/ou tutoriada - ainda duran-
te a graduação (Life, Prodocência, Pibid). Estes programas ainda
não foram implantados na LEDOC.
3 Regulamentação do PADI
106
Depois de selecionados, cada aluno-tutor pode atender um
grupo de no mínimo 05 (cinco) e no máximo 15 (quinze) tutorados
por semestre. Podem se candidatar ao programa alunos de gradua-
ção e pós-graduação regularmente matriculados na UFT; os alunos
devem apresentar coeficiente de rendimento acadêmico igual ou su-
perior a 7,0 (sete) nas áreas de conhecimento da tutoria pleiteada;
ter concluído 50% da carga horária do respectivo curso, incluindo as
disciplinas do 1º período; o aluno-tutor deve ter disponibilidade de
12 (doze) horas semanais para as atividades do programa e, preferen-
cialmente, estar em situação de vulnerabilidade socioeconômica.
107
Tabela 1 – Vagas de tutoria oferecidas pela UFT – Padi 2017
CAMPUS ÁREA Nº DE GRUPOS TOTAL
Biologia 1
Física 1
História 1
Araguaína Matemática 1 7
Língua Portuguesa 1
Química 1
Sociologia 1
Matemática 1
Arraias 2
Língua Portuguesa 1
Biologia 1
Gurupi 2
Química 1
Filosofia 1
Miracema 2
Língua Portuguesa 1
Biologia 1
Filosofia 2
Física 1
Palmas 10
Matemática 2
Língua Portuguesa 2
Química 2
Biologia 1
História 1
Porto Nacional 4
Língua Inglesa 1
Língua Portuguesa 1
Língua Portuguesa 1
Tocantinópolis 2
Sociologia 1
Ampla
1 1
concorrência
Fonte: Edital Prograd nº12/2017.
108
Depois de avaliado e aprovado pela comissão pedagógica, de-
mos início à execução do projeto começando pela seleção dos tutores,
a fim de implantar o Padi na LEDOC-Tocantinópolis. Foram sele-
cionados 05 (cinco) tutores bolsistas e 02 (dois) tutores voluntários
para o desenvolvimento das atividades.
A proposta estabeleceu duas metas para o primeiro semestre
de atividades: 1) reduzir o número de reprovações nas disciplinas de
Fundamentos da Notação Musical e Teoria e Percepção Musical II
(disciplinas ofertadas no semestre 2017.1); 2) promover o acompa-
nhamento regular e sistemático aos discentes dentro do contexto da
alternância pedagógica.
Uma estratégia adotada pela equipe do Padi-Música foi a fre-
quência dos tutores nas disciplinas que ofertaríamos o acompanha-
mento. A proposta era garantir a divulgação constante das ações do
Padi entre os alunos ingressantes e promover a interação e o estreita-
mento de afinidade entre tutores e alunos, com objetivo de diagnos-
ticar mais rapidamente os conteúdos deficitários nos ingressos. Essa
estratégia foi posta em prática com base no baixo índice de procura
dos alunos às monitorias às quais tivemos a oportunidade de orientar
no semestre letivo de 2016.2. Do nosso ponto de vista, a ação parece
ter sido positiva, pois houve adesão significativa dos alunos ingres-
santes aos grupos de acompanhamento pedagógico do Padi.
Um fato que vem sendo diagnosticado pelos professores que
ofertam as disciplinas de música no curso é que muitos alunos que
ingressam na LEDOC não possuem contato com conteúdos musi-
cais durante sua formação estudantil ou em espaços de ensino não
formal ao longo de sua trajetória. Aos ingressos, o estudo regular de
conteúdos musicais trata-se de uma novidade ao darem início à gra-
duação. Tais conteúdos estão dispostos ao longo da matriz curricular
do curso e exigem do discente sua preservação teórica e prática.
Outro fator que vem sendo diagnosticado, com base nos rela-
tos avaliativos citados, observava-se a dificuldade de compreensão e
109
fixação dos conteúdos ministrados pelas disciplinas Fundamentos da
Notação Musical, Teoria e Percepção Musical, História da Música
Ocidental e História da Música Popular Brasileira. Somou-se a este
diagnóstico a falta de acompanhamento pedagógico sistêmico dado
à alternância pedagógica3. Dessa forma, a ação do grupo de tutores
foi orientada para produção de atividades didático-pedagógicas com
linguagem clara e objetiva com aplicação em aulas, jogos, brincadei-
ras e exercícios que se enquadravam no conceito de Teoria Aplicada.
Para contextualizar a situação ao leitor, explicamos: tradicio-
nalmente, as graduações que ofertam cursos de Música seguem o
caráter conservatorial. O que isso significa? Para o ingresso na gra-
duação exige-se que o candidato já possua o conhecimento elementar
de uma série de conteúdos específicos. O processo de ingresso nessas
instituições se dá através de um exame de habilidade específica que
visa verificar o grau de destreza entre habilidades e competências exi-
gidas aos moldes tecnicistas, europeus, de perfil conservatorial. Não
obstante, esse processo exclui uma gama de saberes culturais e limita
o acesso daqueles que têm interesse pela área.
Cabe ressaltar que o acesso aos estudos musicais geralmente é
ofertado por cursos/escolas particulares, sendo poucos os espaços que
são geridos pela esfera pública nessa área de conhecimento. Logo,
muitos candidatos não se veem na condição de atender às exigências
solicitadas pelo processo e desistem, ou são considerados “não aptos”
pelo sistema de ingresso. Diante desse quadro, a política de acesso à
graduação na licenciatura em Educação do Campo se dá de forma
democrática à área, não exigindo do candidato tal teste de habilidade.
Essa opção, porém acompanha seus desafios.
110
O leitor poderia até se perguntar: por que não adotar um teste
de conhecimento musical como forma de ingresso aos candidatos da
LEDOC com intuito de avaliar o grau de conhecimentos musicais
e, por consequência, reduzir números de reprovações no início da
graduação? Bem, acrescentaremos mais algumas informações sobre
o contexto.
1) O corpo discente do curso é plural. Contamos com indí-
genas da etnia apinayé, quilombolas de comunidades do Jalapão e
Cocalinho, assentados da reforma agrária, e outros povos campesinos
oriundos da microrregião do Bico-do-Papagaio, localizada ao norte
do estado do Tocantins. Todos eles possuem culturas musicais muito
interessantes, diversas e que não partem do estudo musical da tradi-
ção ocidental.
2) Em nosso curso, o percentual de ingressantes que cursaram
o Ensino Fundamental e Médio na rede pública de ensino é de 100%
(cem por cento)4. Nesse grupo estão inseridos, também, indivídu-
os que passaram pelo processo de alfabetização tardia, estudantes da
EJA e aqueles que não frequentavam instituições de ensino a mais de
10 anos. Adiciona-se a este quadro que a maioria das escolas da Rede
Pública de ensino não tem a música como disciplina em seu currículo
dada a carência de profissional habilitado na área. Cabe ressaltar que,
mesmo esta linguagem artística sendo inserida no currículo escolar,
inicialmente pela Lei n.º 11.769/2008 e mantida após a atualização
da Lei de Diretrizes e Base (LDB) pela Lei n.º 13.278/2016, em
vigência, a maioria das escolas da rede não a oferta, dada a carência
de profissional habilitado na área. Logo, como exigir um teste de
habilidade específica nessas circunstâncias?
Outro diagnóstico que procuramos fazer para a submissão da
proposta ao Padi está sintetizado abaixo de forma quantitativa (Ta-
4 Essa informação foi extraída do último levantamento socioeconômico feito pelo Serviço
de Apoio as Políticas Estudantis (Sape) do campus de Tocantinópolis
111
bela 2)5. O quadro apresenta as seguintes informações: a disciplina, o
ano e o semestre de oferta; total de alunos matriculados na disciplina;
o índice de reprovação na disciplina e; o índice de alunos aprovados
com média 5,0 < 7,0. O recorte foi dado apenas às disciplinas que
compõe o primeiro ciclo de conteúdos teóricos em música – Funda-
mentos da Notação Musical, Teoria e Percepção Musical I e Teoria
e Percepção Musical II – em período anterior a implantação do Padi
na LEDOC-Tocantinópolis.
112
Índice de
Número de
Índice de aprovados
Disciplina Ano/semestre alunos
reprovação com média
matriculados
5,0 < 7,0
Fundamentos da
2015.2 56 26.8% 39%
Notação Musical
Fundamentos da
Notação Musical 2016.1 45 17.7% 18.9%
(Turma A)
Fundamentos da
Notação Musical 2016.1 40 27.5% 17.2%
(Turma B)
Teoria e Percep-
2016.1 40 17.5% 18.2%
ção Musica I
Teoria e Per-
cepção Musica I 2016.1 10 60% 0%
(Turma especial)
Teoria e Per-
cepção Musica I 2016.2 36 25% 0%
(Turma A)
Teoria e Per-
cepção Musica I 2016.2 29 20.7% 0%
(Turma B)
Teoria e Percep-
2016.2 37 65.5% 90%
ção Musica II
Fonte: Sistema de secretaria acadêmica da Prograd.
113
grupo de tutores. Adotamos como metodologia a apresentação dos
conceitos teóricos, seguidos, imediatamente, de sua prática musical,
seja por exercícios de percepção musical ou por execução vocal.
Como o processo foi posto em prática? Durante os encontros,
cabia ao tutor trazer à memória dos alunos o conceito apresentado
durante a disciplina. Feita a exposição do conceito teórico, o próxi-
mo passo era realizar práticas musicais com intuito de consolidar o
conceito. O objetivo era muito simples: garantir a experiência e a
repetição prática, permitindo a fixação associada pela práxis.
Com o desenvolvimento dessas propostas e metodologias ex-
pressas, esperávamos obter os seguintes resultados:
114
Tabela 3 – Cronograma de atividades desenvolvidas pelos tutores do PADI –
março – novembro de 2017.
Mês Ação Professor-Tutores Ação Tutor-Alunos
Reunião de planejamento:
1) Levantamento dos conteúdos a se-
rem ministrados pelos tutores du-
rante o semestre;
2) Construção do plano de atividades
com os conteúdos e ações a serem
Março ministrados nos encontros;
3) Pesquisa e seleção de jogos musi-
cais (on-line) para prática da teoria
e percepção musical;
4) Pesquisa, seleção e produção de jo-
gos e brincadeiras musicais com ma-
teriais descartáveis e de fácil acesso;
115
Mês Ação Professor-Tutores Ação Tutor-Alunos
Reunião de planejamento semanal
1) Seleção dos jogos e brincadeiras
musicais que se aplicam ao conteú-
do ministrado; Encontros semanais
2) Produção de exercícios para apostila para aplicação
Maio
para disponibilizar em redes sociais das ferramentas
utilizadas pelos alunos; pedagógicas.
3) Exposição dos relatórios semanais
de conteúdo ministrado e experiên-
cia de tutoria.
116
Mês Ação Professor-Tutores Ação Tutor-Alunos
117
Mês Ação Professor-Tutores Ação Tutor-Alunos
Encontros semanais
para aplicação
das ferramentas
Novembro Produção e entrega do relatório final. pedagógicas.
Encerramento das
atividades.
Fonte: Padi-Música, 2017.
118
Pelo menos uma vez ao mês os tutores eram designados para
lecionar um conteúdo musical específico durante as reuniões de acom-
panhamento pedagógico. Com isso, eles realizavam sua auto-avaliação
sobre sua conduta e domínio do tema e recebiam o retorno dos demais
colegas sobre a clareza e objetividade da linguagem que estava sendo
utilizada durante a exposição dos conteúdos.
Para a produção de exercícios e do material didático a ser utili-
zado pelo Padi-Música, no segundo semestre de 2017, trouxemos aos
membros do grupo a proposta de ofertarmos um curso de capacita-
ção para operação de um software específico de edição de partitura.
A proposta foi bem recebida pela equipe, pois tinha o objetivo de ins-
trumentalizar os tutores para a produção de seus próprios exercícios e
suporte pedagógico nas aulas.
O curso foi ofertado de forma concentrada, aproveitando o perí-
odo de férias acadêmicas do curso de Educação do Campo. As ativida-
des duraram duas semanas, e contaram com 10 encontros, computan-
do 40 horas de duração. Com isso, os tutores adquiriram os comandos
básicos do software, garantindo-lhes o domínio da escrita a partir da
transcrição de músicas com as especificidades propostas pela atividade.
6 Esta avaliação corresponde ao período de atividades realizadas entre março e junho de 2017.
119
Para efeito de conhecimento sobre o formulário de avaliação,
seguem as questões que foram respondidas pelos tutores:
120
• Melhorar a relação com os alunos do curso.
• Desenvolver atividades didáticas que pudessem ser apli-
cadas durante o período de estágio.
• Perceber que os alunos se tornaram mais participativos
nas aulas.
• Perceber o aprendizado pessoal sobre os conteúdos.
• Ver o sucesso dos tutorados após as avaliações.
• Perceber o avanço de desempenho nos conteúdos das
disciplinas.
• Perceber o reconhecimento do trabalho pelos demais co-
legas de curso.
• Perceber que houve redução no índice de reprovação das
disciplinas de música por conta do nosso trabalho.
121
Maycom Cléber:
122
entrega dos tutorandos que participaram do programa
nesse primeiro semestre. Na sala de aula pude desen-
volver atividades variadas, como por exemplo, o jogo
dos sete erros, onde escrevemos uma pauta musical
no quadro, constavam sete erros, e os alunos deveriam
encontrar os mesmos. Desenvolvemos muitas brin-
cadeiras relacionadas aos conteúdos estudados em
sala de aulas, o que, de certa forma, contribuiu para o
avanço do aprendizado dos tutorandos.
Poliana Oliveira:
Tássia Cipriano:
123
Renata Cipriano:
Renata Lima:
124
pedagógicas com os conteúdos foi permitindo o cumprimento de um
dos principais objetivos do programa: promover a iniciação docente.
5 Considerações finais
125
A respeito do objetivo I, destacamos que o atendimento foi
realizado semanalmente, de segunda à sexta-feira, de forma cons-
tante e ininterrupta durante todo o ano de 2017. Foram realizados
atendimentos durante o período de alternância – período em que
os alunos da licenciatura em Educação do Campo retornam às suas
comunidades para o desenvolvimento de atividades.
Sobre o objetivo II, o relato de experiência de nossos tutores
aponta para o desenvolvimento pessoal que todos destacaram em
seus depoimentos enquanto membros participantes do programa.
Todos ressaltaram a importância do programa para seu desenvolvi-
mento profissional, sentindo-se mais seguros em lecionar conteúdos
relativos com temática em música no contexto de sala de aula.
Quanto ao objetivo III destacamos abaixo o quadro que traduz
a ação do programa dentro da LEDOC-Tocantinópolis (Tabela 4).
No objetivo IV, acreditamos tê-lo alcançado no momento em
que demos aos alunos ingressantes da LEDOC a garantia de que ao
longo de todo semestre letivo o acompanhamento de qualidade, atu-
ante e sistemático com material sobre os conteúdos estivesse sempre
ao alcance dos ingressantes.
126
Sobre a Tabela 4 gostaríamos de comentar alguns dados ex-
postos. O baixo índice de aprovação para a turma especial de Teoria
e Percepção II justifica-se pela não adesão dos alunos ao programa,
mesmo diante dos insistentes convites e anúncios feitos durante o
período letivo.
Sobre a turma de Fundamentos da Notação Musical, em aná-
lise ao número percentual de reprovação apenas 1 (um) aluno foi re-
provado por não alcançar o conceito mínimo. Os demais reprovados
não a concluíram em virtude do elevado número de faltas, configu-
rando desistência da disciplina. Segundo o grupo de tutores essa foi
a turma que melhor acolheu o programa.
Em análise aos dados coletados sobre a turma de Teoria e Per-
cepção Musical II tivemos um índice moderado de adesão ao pro-
grama, entretanto, sobre o percentual de reprovados, 2 (dois) alunos
reprovaram pelo alto índice de infrequência e 7 (sete) por não al-
cançarem o conceito mínimo necessário para aprovação. No levanta-
mento feito com base na lista de presença preenchida pelos partici-
pantes do Padi, constatou-se que os alunos reprovados não aderiram
ao programa.
Dessa forma, acreditamos estar contribuindo na formação dis-
cente dos alunos da LEDOC, sedimentando os conteúdos transmi-
tidos em sala de aula, e contribuindo para permanência dos ingres-
santes na graduação a partir das orientações políticas de ensino e
assistência estudantil da Universidade.
Visto que a LEDOC funciona em regime de alternância peda-
gógica, o acompanhamento constante promovido pelos tutores con-
tribuiu de alguma forma para um ganho de carga horária extra que
permitiu aos alunos tutorados minimizar possíveis perdas de conteú-
dos elementares apresentados em sala pelo professor regente.
A adaptação às condições da alternância ainda estão no foco
de nossa atenção tendo em vista que ela é um dos maiores desafios
às metodologias empregadas ao ensino de música e às dinâmicas do
127
programa. Em alguns casos, a alternância pedagógica tem sido aponta-
da como um possível fator para a perda de rendimento e foco acadêmi-
co nos estudos em música, já que as disciplinas exigem prática constan-
te e sistemática. As reflexões continuam e visando superar limitações,
almejamos melhorar os resultados alcançados rumo à excelência.
REFERÊNCIAS
128
PIBID. PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSA DE
INICIAÇÃO À DOCÊNCIA. Disponível em: <http://ww2.uft.
edu.br/ensino/graduacao/programas-institucionais/13040-pibid-pro-
grama-institucional-de-bolsa-de-iniciacao-a-docencia>. Acesso em:
20.12.2017
129
PROGRAD. PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO.
130
5 – Da teoria à prática: o Estágio
Curricular Supervisionado no curso
de licenciatura em Educação do
Campo com habilitação em Artes e
Música da UFT / Tocantinópolis
1 Introdução
131
giando, geralmente não conseguem fazer a articulação dos elementos
teóricos apreendidos na universidade com as várias situações encon-
tradas no contexto escolar (gestão escolar, planejamento, avaliação,
indisciplina, evasão, reprovação, didática, recursos materiais e huma-
nos) entre outros fatores da organicidade do trabalho pedagógico,
tornando assim a teoria distante da prática.
Em se tratando do estágio curricular supervisionado no curso
de licenciatura em Educação do Campo com habilitação em Artes
e Música, essa situação se torna mais preocupante, pois a maioria
das escolas públicas nas regiões atendidas pelo estágio (conveniadas
com a UFT) no Estado do Tocantins, não dispõem de profissionais
habilitados nessas áreas e, além desse problema, a disciplina de Arte
acaba servindo também como complemento de carga horária para
professores, embora nessa disciplina sejam trabalhados os conteúdos
de música, teatro, dança e artes visuais; já a disciplina de música pra-
ticamente não existe nas grades curriculares (Estado do Tocantins),
apenas em algumas (poucas) escolas de ensino integral no Estado.
Diante desse cenário é perceptível que não é possível compreender o
processo de ensino e aprendizagem como um todo em sua formação.
A esse respeito, Pimenta (2010) adverte que o processo educativo é
mais amplo e complexo.
Nesse sentido, este texto tem como objetivo descrever e ana-
lisar os percursos e desafios acerca da realização do estágio curricu-
lar supervisionado no curso de licenciatura em Educação do Campo
com habilitação em Artes e Música, na Universidade Federal do To-
cantins, campus Tocantinópolis.
2 Encaminhamentos metodológicos
132
teórica e empírica na perspectiva da abordagem qualitativa. A pes-
quisa teórica, segundo Demo (2000, p. 20) é “dedicada a reconstruir
teoria, conceitos, ideias, ideologias, polêmicas, tendo em vista, em
termos imediatos, aprimorar fundamentos teóricos”. Ainda sobre a
pesquisa teórica, Demo (1994) complementa:
133
Supervisionado – elaborados pela equipe do colegiado do referido
do curso, com o objetivo de identificar elementos acerca do estágio
supervisionado, bem como aspectos sobre a formação de educadores
e educadoras para atuação em escolas localizadas no campo.
Outro instrumento utilizado para coleta de dados foi o uso de
entrevistas semiestruturadas com 8 (oito) discentes que concluíram
as etapas do Estágio I, II, III e IV no referido curso. A escolha dos
discentes se deu por meio do critério de assiduidade nas aulas ao lon-
go da realização dos estágios. O roteiro da entrevista foi constituído
a partir dos debates teóricos e literaturas estudadas durante as aulas
com os discentes, buscando problematizar algumas questões em tor-
no do percurso e desafios encontrados para a materialização e efeti-
vação dessa disciplina, bem como a percepção deles no que concerne
à importância do Estágio Curricular Supervisionado para a formação
de educadores e educadoras do campo. As entrevistas foram gravadas
em áudio, transcritas posteriormente e, por fim, analisadas.
É importante ressaltar que as falas dos entrevistados foram or-
ganizadas da seguinte forma: entrevistado A (2017); entrevistado B
(2017); entrevistado C (2017); entrevistado D (2017); entrevistado E
(2017); entrevistado F (2017); entrevistado G (2017); entrevistado I
(2017), com o objetivo de preservar seus anonimatos e o atendimento
à ética na pesquisa em ciências humanas. Contudo, para análise das
entrevistas e, devido a extensão do texto, foram selecionados alguns
trechos significativos das falas desses estudantes para dialogar com
autores que discutem a temática em questão.
134
Ensino Profissional. Os estágios eram voltados para preparar o estu-
dante para atuar em indústrias, no comércio ou no campo. Os alunos
tinham nesses lugares uma oportunidade de colocar em prática o que
aprendiam teoricamente nas escolas técnicas.
Cabe destacar que os estágios supervisionados no Brasil surgi-
ram concomitantemente ao desenvolvimento industrial no país, prin-
cipalmente a partir dos anos de 1930. Isso fez com que a educação
brasileira fosse reformulada, pois, não bastaria apenas ter cursos secun-
dários e superiores para formar as “elites”, mas, também, eram neces-
sários cursos profissionalizantes para atender as demandas do processo
de industrialização, que necessitavam de mão de obra qualificada.
Contudo, foi a partir da LDB n. 5.692/71 que os estágios su-
pervisionados se tornaram relevantes na educação, pois, com o Pare-
cer CFE n. 45/72, os estágios se tornaram obrigatórios para as ha-
bilitações profissionais técnicas dos setores primário e secundário da
economia, saúde entre outros.
135
Lei, em seu artigo 36, ressalta a importância de se compreender o
significado das ciências, das letras e das artes. É nesse sentido que o
conceito de estágio supervisionado se amplia, ao aliar as dimensões
do social, do profissional e do cultural.
O Parecer CNE/CEB n. 35/2003 chama a atenção ao fato de
que o estágio supervisionado não é e não deve ser considerado “pri-
meiro emprego”. Mas, sim, uma atividade curricular da escola, um ato
educativo, que proporciona ao estudante, em processo de formação,
conhecer a realidade do mundo do trabalho, se identificar com a sua
escolha profissional.
O estágio supervisionado também é ressaltado pelas novas
Diretrizes Curriculares Nacionais para as licenciaturas no Brasil,
Resolução n. 2 de 1° de julho de 2015. Em seu capítulo V, que
diz respeito à “Formação Inicial do Magistério e para a Formação
Continuada”, define que deverá ser dedicado ao estágio supervisio-
nado 400 horas na área de formação e atuação na educação básica,
para cursos com no mínimo 3.200 horas de trabalho efetivo. Vale
lembrar que o estágio curricular supervisionado é obrigatório nas
licenciaturas e que os docentes que atuam de forma regular na edu-
cação básica, poderão solicitar redução de no máximo 100 horas da
carga horária do estágio.
A Lei Federal n. 11.788, de 25 de setembro de 2008 (BRA-
SIL, 2008), dispõe sobre o estágio de estudantes, alterando a LDB
n. 9.394/96, e enfatiza que o estágio supervisionado pode ser obriga-
tório ou não, conforme diretrizes curriculares do curso de graduação
que o aluno está cursando e do projeto pedagógico do curso. Além
de proporcionar ao estudante um aprendizado das atividades profis-
sionais, um olhar crítico sobre o mundo do trabalho leva o discente
a descobrir e a compreender os diferentes desafios encontrados na
profissão. Contudo, assim como as Leis anteriores, esclarece que o
estágio supervisionado não gera vínculo empregatício.
136
Art. 1o Estágio é ato educativo escolar supervisionado,
desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à pre-
paração para o trabalho produtivo de educandos que
estejam frequentando o ensino regular em instituições
de educação superior, de educação profissional, de en-
sino médio, da educação especial e dos anos finais do
ensino fundamental, na modalidade profissional da
Educação de Jovens e Adultos (BRASIL, 2008).
137
Com efeito, o estágio curricular supervisionado se constitui em
uma experiência com dimensões formadora e sociopolítica, que pro-
porciona ao estudante a participação em situações reais de trabalho.
Além disso, consolida a sua profissionalização e explora as compe-
tências básicas indispensáveis para uma formação profissional ética
e corresponsável pelo desenvolvimento humano e pela melhoria da
qualidade de vida.
138
eles, no sentido de colher assinatura dos diversos profissionais – dire-
ção das escolas, professores de Arte, professores orientadores do es-
tágio, direção do campus da UFT – que são exigidos nos formulários.
Outro desafio enfrentado pelos alunos foi a realização do está-
gio na disciplina de Arte, que acontece somente uma vez na semana,
às vezes coincidindo com feriados. E quando esses dias são feriados
ou quando acontece algum evento na escola, é impossibilitada a rea-
lização do estágio, demandando mais tempo para a sua efetivação no
tempo comunidade. Nesse sentido, o colegiado do curso de Educação
do Campo reorganizou o espaço entre o tempo universidade e tempo
comunidade, deixando um tempo maior nesse último para facilitar a
realização do estágio.
Nesse sentido (BARREIRO, 2006, p. 60) ressalta:
139
5 O estágio curricular supervisionado no
curso de licenciatura em Educação do Campo
com habilitação em Artes e Música da UFT/
Tocantinópolis
140
tempo universidade e a outra no tempo comunidade. Na universida-
de, a parte de orientação foi trabalhada por uma equipe de professores
do curso de Educação do Campo de várias áreas do conhecimento
por meio de textos teóricos a respeito do estágio curricular super-
visionado, como de Pimenta (2010), por exemplo, com o objetivo
de proporcionar aos acadêmicos uma compreensão maior acerca da
importância do estágio para a formação de professores.
Além de apresentar aos acadêmicos as Diretrizes Curriculares
do Estágio Supervisionado do curso de Educação do Campo, foi tra-
balhada com eles também uma oficina ministrada pela técnica admi-
nistrativa da Central de Estágio do campus no que concerne aos pre-
enchimentos dos formulários, sendo uma parte teórica em sala de aula
e outra prática no laboratório de informática do mesmo campus. No
tempo comunidade, os acadêmicos realizaram a observação da gestão
escolar e de regência de sala de aula nas séries finais do ensino funda-
mental e ensino médio na disciplina de Arte, em suas comunidades
de origem de acordo com as orientações dadas pelos professores que
acompanharam o estágio. Posteriormente, foram socializados e entre-
gues os relatórios dessa observação em outro tempo na universidade,
pelos estudantes.
Sobre essa parte de observação, Pimenta (2010) pontua que a
aproximação do estagiário com o professor auxilia o discente a verifi-
car como são conduzidas as aulas, o que pode proporcionar também
o conhecimento a respeito da identidade do que é ser professor ao
longo da carreira docente.
Estágio Curricular Supervisionado II – Fase de execução:
prática de sala de aula nos anos finais do ensino fundamental. São
propostas ações para a prática e o aprofundamento do processo de
construção do conhecimento. É a fase da elaboração do planejamen-
to a partir de propostas de ações para a prática que será vivenciada
na unidade escolar em questão, durante esse período. O professor
orientador de estágio assumirá papel preponderante nesta fase, fun-
141
cionando como observador, orientador e facilitador do processo de
crescimento do estudante, mediante acompanhamento e avaliação
dos trabalhos “in loco” e encontros mensais no tempo universidade,
nos quais, além de se discutir a prática vivenciada pelos alunos, serão
também propostas ações de reencaminhamento da prática (ação /
reflexão / ação), dentro das 90horas previstas para estas etapas.
Essa etapa de estágio se deu também em dois momentos: na uni-
versidade ocorreu a orientação aos acadêmicos sobre a elaboração do pla-
no de aula para as séries finais do ensino fundamental e outro momento
ocorreu nas escolas de suas comunidades, referente à execução da pro-
posta do estágio em sala de aula. Vale destacar que esse último momento
foi acompanhado pelos professores orientadores do estágio.
Estágio Curricular Supervisionado III – Fase de execução:
prática de sala de aula no ensino médio. São propostas ações para
a prática e aprofundamento do processo de construção do conheci-
mento. É a fase de construção do planejamento a partir de propostas
de ações para a prática que será vivenciada na unidade escolar em
questão, durante esses períodos. O professor orientador de estágio
assumirá papel preponderante nessa fase, funcionando como obser-
vador, orientador e facilitador do processo de crescimento do estu-
dante, mediante acompanhamento e avaliação dos trabalhos “in loco”
e encontros mensais no tempo universidade, nos quais, além de se
discutir a prática vivenciada pelos alunos, serão também propostas
ações de reencaminhamento da prática (ação / reflexão / ação), dentro
das 120 horas previstas para esta etapa.
Estágio Curricular Supervisionado IV– Neste estágio foi
elaborado e desenvolvido um projeto de extensão com a participação
da comunidade. Constitui-se o momento que culminou com o tér-
mino do estágio, dentro das 135 horas previstas para esta etapa.
Esta última etapa do estágio, que também aconteceu nesses
espaços citados anteriormente, foi bastante profícua: as outras três
etapas possibilitaram aos acadêmicos fazer um diagnóstico da temá-
142
tica em suas comunidades, para então se elaborar e desenvolver um
projeto que envolvesse a comunidade escolar e local no sentido de
contribuir e aproximá-las.
Vale mencionar que todas as etapas de estágio curricular super-
visionado realizado pelos acadêmicos foram trabalhadas em dois mo-
mentos: tempo universidade e tempo comunidade. Nesse sentido, o
estágio curricular supervisionado realizado nessa perspectiva da alter-
nância possibilita uma formação condizente com a proposta do curso.
Entrevistado A (2017):
Significa observar e anotar tudo em uma unidade
educativa para depois fazer a sua análise de como está
ocorrendo o ensino em uma determinada escola.
Entrevistado B (2017):
Antecipar um aprendizado e experiências pedagógi-
cas realizados de forma prática na escola, indo ao en-
contro do que é diferente da teoria, enquanto ainda se
está na universidade.
143
Entrevistado C (2017):
É um meio de aproximação entre o aluno e o profes-
sor, dessa forma torna o aluno com mais facilidade
para desenvolver suas competências cognitivas e atua-
ção dentro das atividades em uma escola da comuni-
dade ou fora.
Entrevistado D (2017):
O estágio é uma preparação para que possamos apren-
der e planejar nossas aulas de acordo com a necessi-
dade dos nossos alunos, na qual irei atuar como futura
educadora do campo, somando conhecimentos junto
aos discentes para viver no meio social.
Entrevistado E (2017):
É o acompanhamento do professor na prática do alu-
no como docente, que resultará numa troca de conhe-
cimento entre ambos.
Entrevistado G (2017):
No meu modo de pensar é uma preparação e adap-
tação.
Entrevistado H (2017):
É uma preparação para se tornar professor, é quando
a gente vive um pouco do que vem futuramente na
minha profissão.
Entrevistado I (2017):
Significa colocar em prática o aprendido na teoria
aproximando o profissional em formação da sua fu-
tura profissão.
144
O estágio supervisionado é um espaço imprescindível
na formação do educador. Lócus apropriado onde o
aluno desenvolve a sua aprendizagem prática, o seu
papel profissional, a sua responsabilidade, o seu com-
promisso, o espírito crítico, a consciência, a criativida-
de e demais atitudes e habilidades profissionais espe-
radas em sua formação (UFT, 2013, p. 108).
Entrevistado A (2017):
O estágio é de grande relevância no processo educa-
tivo da formação de professores, pois temos a oportu-
nidade de analisar o que dá certo e o que não dá certo
dentro da sala de aula e, dependendo da metodologia
do professor, o aluno pode aprender ou não
Entrevistado C (2017):
Sim, pois é através desse primeiro contato que a pes-
soa irá ter uma aproximação direta com as realidades
corriqueiramente que uma escola do campo tem.
145
Entrevistado F (2017):
Bom, o estagiário enquanto a sua atuação e sua for-
mação quando se atua em escola do campo, o sujei-
to tem que ter a sensibilidade de buscar conhecer as
necessidades e realidade do espaço que deseja atuar.
Se o estagiário conseguir obter essas características no
decorrer do seu estágio, será capaz de ver e perceber
que essa será uma disciplina importante tanto em sua
atuação futuramente enquanto professor quando para
a escola e os sujeitos ali inseridos.
146
Entrevistado A (2017):
Foi uma experiência muito boa, mas ao mesmo tempo
percebe-se o quanto a disciplina de Arte ainda hoje é
desvalorizada em nossas escolas e tida como a disci-
plina “mais fácil” tanto para professores como para os
alunos.
Entrevistado D (2017):
Devido não ter materiais pedagógicos na escola dificul-
ta muito a aprendizagem dos alunos nesta disciplina.
Entrevistado H (2017):
A minha experiência dentro estágio na disciplina de
Arte foi gratificante, pois pude perceber com mais
clareza que arte é mais do que eu imaginava, pois
achava que artes era só desenho e pintura e, dentro
do curso Educação do Campo, tive a oportunidade
de aprender que a arte está envolvida no nosso coti-
diano. Foi uma experiência muito interessante, pois
percebi que apesar dos professores que lecionam não
são formados na área mas, os conteúdos das aulas são
muito bons e melhor ainda foi sentir que estávamos
preparados para dar aquela aula.
Entrevistado I (2017):
A experiência de estagiar na disciplina de Arte foi
muito enriquecedora por me fazer valorizar as outras
linguagens e ao ver os alunos olhando com um olhar
diferente para as novas abordagens trabalhadas em
Arte, foi uma experiência única e recompensadora.
Entrevistado C (2017):
Uma experiência bastante agradável, só não foi me-
lhor, pois a bagagem que tinha em mãos não era o su-
ficiente para ter me sentido mais confiante, ainda sim
fiz um trabalho excelente com conclusão. Contudo, de
certa forma, o pouco de experiência que já tinha em
sala de aula, ainda que não foi na disciplina de Arte,
mas deu pra conciliar um pouco do conhecimento que
147
adquiri na formação básica com as experiências vivi-
das no cotidiano.
Entrevistado F (2017):
Foi uma sensação cheia de expectativas... Não pos-
so falar que foi boa ou ruim, foi um aprendizado de
oportunidades, pois foram experiências em que pude
conhecer o que desconhecia em que a realidade e a
necessidade da disciplina de Arte e artes visuais na
escola são bem visíveis, devido aos poucos materiais
didáticos para se trabalhar com a disciplina de artes
visuais, fazendo com que os profissionais venham tra-
balhar mais a teoria e pouca a prática, enfim foi um
aprendizado com novas ideias futuras de trabalhar a
disciplina.
148
preender o mundo; uma análise crítica da sociedade,
que nela intervém com sua atividade profissional; um
membro de uma comunidade científica, que produz
conhecimento sobre sua área e sobre a sociedade.
Entrevistado A (2017):
É um ponto positivo, pois no tempo comunidade
temos a oportunidade de colocar em prática tudo o
que aprendemos no tempo universidade. E a partir
daí podemos frequentar o local do estágio para poder
estagiar e anotar tudo que for relevante.
Entrevistado B (2017):
Um ponto positivo foi essa troca de experiência entre
acadêmico e escola, pois é fundamental na construção
de um bom profissional.
Entrevistado C (2017):
Positivo, pois dá tempo pra realizar o estágio sem
atrapalhar as aulas na Universidade.
Entrevistado D (2017):
No meu ponto de vista foi um ponto positivo, por-
que essa questão da alternância é o tempo que a gente
localiza a escola para estagiar de acordo com a dispo-
nibilidade do professor atuante na disciplina, pois a
mesma só tem uma aula semanal.
Entrevistado E (2017):
Positivo, pois o discente tem mais tempo para prepa-
rar os materiais para desenvolver o estágio.
149
Entrevistado F (2017):
Penso que a proposta do curso de alternância é um
ponto positivo, pois essa divisão de tempo entre co-
munidade e universidade serve como um meio de
preparação e elaboração dos conteúdos a serem mi-
nistrados no estágio.
Entrevistado G (2017):
Positiva, nós alunos temos pouco tempo, mas a alter-
nância possibilita organizar nosso tempo, e isso é algo
maravilhoso.
Entrevistado H (2017):
Bastante positivo, pois assim dá tempo para fazer o
estágio com calma.
Entrevistado I (2017):
Se o calendário for construído pensando no tempo ade-
quado ao desenvolvimento do estágio com todos im-
previstos suscetíveis, o estágio do curso em alternância
não prejudicará o estágio em nada, portanto, positivo.
É nesse viés que a alternância deve ser pensada para além de uma
proposta metodológica de ensino, visto que a dimensão da ação e da
150
reflexão acontece por meio do diálogo, em que o processo de ensino e
aprendizagem busca a transformação da realidade (FREIRE, 1987).
No entanto, ao serem questionados como os estagiários veem
a teoria e a prática para realização do estágio, assim se posicionaram:
Entrevistado A (2017):
Na teoria precisa mais de organização para facilitar a
nossa observação, pois sempre no estágio ficam muitas
dúvidas, principalmente no preenchimento das fichas.
Entrevistado B(2017):
Ambas têm algo em comum: o planejamento. A di-
ferença é: a teoria não é flexível... só a prática, tudo
pode mudar.
Entrevistado C (2017):
Na teoria parece um pouco difícil e complicado, mas
quando me sentei com as professoras regentes das Es-
colas que estagiei, que uma foi na escola do Ensino
Fundamental e a outra do Ensino Médio... quando as
professoras me mostraram os conteúdos que as mes-
mas estavam trabalhando, logo pensei que não iria dar
conta, só que quando fui pra prática, descobri que não
era tão complicado.
Entrevistado E (2017):
De forma contundente, sem a teoria a prática fica im-
possível de ser realizada com sucesso.
Entrevistado G (2017):
Muito boa... entender algo e depois executá-lo nos permi-
te atingir a excelência ou aproximar o máximo da mesma.
Entrevistado H (2017):
A teoria nos dá o suporte para trabalharmos na sala
de aula e nos ajudar em muitas situações, nos dando o
conhecimento necessário para resolver os problemas
que aparecem na hora da prática.
151
Entrevistado I (2017):
A teoria e a prática se completam para a profissiona-
lização em qualquer área e não seria diferente na for-
mação do profissional professor, portanto necessária.
Alguns alunos demonstraram a importância da teoria para a práti-
ca da docência no estágio realizado nas escolas. Outros alunos deixaram
claro que a teoria se mostra um pouco mais complexa que a prática do
estágio. Contudo, a maioria está em consonância ao dizer que tanto a
teoria quanto a prática são indissociáveis e fundamentais para o exercício
da docência na disciplina de Arte nas escolas pesquisadas.
Outra questão levantada foi a respeito da avaliação que eles fi-
zeram dos professores / orientadores do curso de Educação do Campo
frente à organicidade do Estágio. Suas respostas foram as seguintes:
Entrevistado A (2017):
O professor é ótimo para explicar as coisas para os
seus alunos e também está sempre disponível para
atender os discentes que precisam de alguma ajuda.
Ele é um excelente profissional e realiza o seu traba-
lho com honestidade e respeito.
Entrevistado B (2017):
É boa no sentido administrativo, e de orientar quanto
às dúvidas, mas deixa a desejar no sentido de ir
acompanhar os educandos, mas essa é uma questão
que pertence ao corpo docente do curso não só aos
professores frente à organização do curso, exemplo
disso foi o último estágio realizado na Aldeia São
José, acompanhado pelo professor responsável.
Entrevistado C (2017):
Na minha visão e experiência de estagiário, foi o me-
lhor estágio, pois estou convicto que o meu orientador
participou das mesmas experiências que eu ou parte
dela, enquanto ambiente, no sentido de socialização.
152
Entrevistado D (2017):
A minha avaliação seria 8, não pelo fato de não ter
feito um trabalho perfeito, mas pelo simples fato de
que cada um dos professores pareciam estar bem ata-
refados com outras atividades, dentro e fora da Uni-
versidade, isso também foi despertando uma falta de
interesse da parte dos alunos.
Entrevistado A (2017):
Sim, pois ao longo deste curso tive a oportunidade de
conhecer melhor sobre a educação do campo, apesar
de morar na zona rural não tinha essa visão de hoje,
pois havia muitas coisas presentes ao meu redor que
eu não percebia e, isso com certeza, me faz sentir mais
confiante para atuar em sala de aula.
Entrevistado C (2017):
Sim, preparadíssima, tanto que deixei meu número
de contato na escola que estagiei do ensino médio, de
aviso, na ausência de um professor, pode me chamar
para substituir.
Entrevistado D (2017):
Sim, porque dentro do curso tive várias experiências
para levar para a prática educacional, para contribuir
na formação dos discentes do meu município.
153
Entrevistado E (2017):
Sim, porque pude entender as demandas que o cam-
po nos oferece como educador, tendo em vista que o
campo é um setor defasado por falta de recursos, e
o curso oferece o suporte necessário no preparo do
docente que atuará nesse setor.
Entrevistado A (2017):
Em 1° lugar devido à faculdade não possuir um local
apropriado para a gente permanecer durante as aulas;
[...] e o último é porque devido à gente vir de uma
escola aonde os professores não exigiam e não cobra-
vam tanto da gente... passei por muitas dificuldades
quando cheguei aqui na universidade em relação aos
trabalhos propostos.
Entrevistado C (2017):
Um pouco foi pela questão da alternância, pois tinha
vez que quando estávamos no TC, algumas das esco-
las já estavam de férias ou mesmo em greve, sendo as
estaduais. Outra questão foi das fichas para realização
do Estágio.
Entrevistado D (2017):
A maior dificuldade foi a falta de material pedagógico,
e o fato dos alunos não darem valor a essa disciplina.
Entrevistado F (2017):
Continuo ressaltando a falta de comunicação entre
154
universidade e escola, devido o difícil acesso à escola,
porém no primeiro momento fui barrada no portão
da escola, pois segundo o diretor era preciso um do-
cumento que liberasse o devido acesso à escola e sala
de aula... precisava conseguir na Diretoria Regional
de Ensino de Araguaína... depois de uma semana de
correria e espera a questão foi resolvida. No segundo
momento, no decorrer do meu estágio pude perceber
a falta de interesse por parte dos alunos quando se
referia à disciplina de Arte, pois no horário das aulas
a maioria dos alunos queria ir embora, pois queriam
mesmo era só fazer um trabalho e entregar na próxi-
ma aula, e por fim, o horário das aulas que por ser à
noite a disciplina era ministrada por último, sempre
nas segundas-feiras e sextas-feiras, o que dificultava
muito a compreensão e o entendimento dos alunos
fazendo com que os mesmos perdessem o interesse
pela disciplina de Arte.
Entrevistado H (2017):
Primeiramente a duração das aulas que é de quarenta
minutos... achei o tempo muito curto para desenvol-
ver tudo que é proposto para a aula, e segundo a falta
de material para fazer uma aula diferenciada também
pesou bastante.
O que se percebe com as falas dos entrevistados é que esses
desafios e dificuldades são de naturezas diversas, podendo ser insti-
tucionais – tanto da instituição formadora como da escola-campo;
relacionados aos professores; relacionados aos alunos, dentre outros,
com destaque para burocracia da entrega e preenchimento da quan-
tidade de fichas/formulários para iniciarem e concluírem o estágio
curricular supervisionado, sendo esses obrigatórios pela própria uni-
versidade.
155
7 Considerações finais
156
cação do Campo são adequadamente preparados para se tornarem do-
centes para atuarem no contexto do campo? Essas são apenas algumas
questões que surgiram ao longo do desenvolvimento desta investigação
e que se entende serem necessárias socializá-las neste estudo.
Diante disso, para que o estágio se realize a contento, faz-se
necessário muito compromisso de todos os sujeitos envolvidos nesse
processo, principalmente das instituições de ensino envolvidas. As-
sim, para superação desses desafios enfrentados no curso de licencia-
tura em Educação do Campo, da UFT / Tocantinópolis, demanda
a elaboração de uma proposta de estágio conjunta entre as institui-
ções formadoras e as escolas, no sentido de garantir ações que ve-
nham atender aos diversos sujeitos, principalmente os da Educação
do Campo. Sobre isso, Pimenta (2010) acrescenta que os estagiários
consideram que é urgente a necessidade de parceria mais ativa e efi-
caz entre as instituições formadoras (universidade e escola) sobre a
reestruturação do estágio e da forma como é concebida a disciplinas
nos cursos de licenciaturas no Brasil, o que, de fato, entende-se não
ser diferente nos cursos de Educação do Campo.
É possível dizer, portanto, que as transformações socioculturais
e econômicas ocorridas no final do século XX ocasionaram mudan-
ças profundas e significativas no mundo do conhecimento, deman-
dando, assim, por profissionais altamente qualificados e com múl-
tiplas habilidades (ALVES; BARBOSA; DIB, 2016), em especial
no que se refere à Educação do Campo, que possui características
que precisam ser compreendidas pelos educadores que atuarão nesse
contexto. Dessa maneira, é fundamental ao professor a habilidade
de compreender a realidade na qual está inserido e a atuar de modo
efetivo na transformação do profissional atual e na devida formação
do educando para o futuro.
Assim, espera-se que esta pesquisa possa contribuir para am-
pliar as discussões a respeito da formação de professores e do estágio
curricular supervisionado nos cursos de Educação do Campo, bem
157
como instigar mais estudos sobre esse tema em pesquisas científicas,
com o objetivo de contribuir para a produção de conhecimento na
área, ainda incipiente no Brasil.
REFERÊNCIAS
158
______. Parecer CNE/CEB n. 35/2003. Dispões sobre as normas
para a organização e realização de estágio de alunos do ensino mé-
dio e da educação profissional. Brasília: MEC/CNE/CEB, 2003.
159
PIMENTA, S. G. Estágio e docência. 4. ed. São Paulo: Cortez,
2010.
160
6 – O instrumento pedagógico
“visitas de campo” no contexto da
LEDOC-Tocantinópolis
Maciel Cover
Sidinei Esteves de Oliveira Jesus
Judite da Rocha
Saulo Eglain de Sá Menezes Moraes
1 Introdução
161
alidades, ampliar o repertório geográfico, cultural, territorial, histórico,
sociológico, antropológico e pedagógico dos discentes. Com base nes-
sas experiências, denotamos que a efetivação deste tipo de instrumento
pedagógico é de fundamental importância para o desenvolvimento de
uma formação integral dos educadores e educadoras do campo.
As visitas de campo têm se demonstrado um instrumento pe-
dagógico importante, na medida em que coloca os discentes e os do-
centes em contato com diferentes realidades, tanto no mundo rural
quanto em outros espaços. Tal possibilidade permite vivenciar expe-
riências e construir aprendizados de outra maneira, além da leitura e
do debate de textos em sala de aula.
A diversificação de estratégias pedagógicas, bem como o exer-
cício da interdisciplinaridade no contexto da educação do campo
(MIRANDA; COVER, 2016), configuram um quadro característico
desse campo de conhecimento. A discussão sobre as visitas de campo,
que faremos neste capítulo, pretende ampliar o debate e a construção
de aprendizados para fortalecer este tipo de prática pedagógica.
162
do campo, reivindicada pelas famílias camponesas, revelava a necessi-
dade de formação de professores para atuarem nas escolas do campo.
Diferentes iniciativas dos movimentos sociais foram desenvolvidas
na formação de professores em nível de magistério na década de 1990
e, posteriormente, em nível superior, em parcerias com universidades
públicas e comunitárias.
A pressão dos movimentos sociais gerou a criação de políticas
públicas de formação de professores para o campo. Exemplo disso é
o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) e,
ultimamente o Programa de Apoio a Formação Superior em Licen-
ciatura em Educação do Campo (Procampo), voltados para a forma-
ção de professores e professoras para atuação nas escolas do campo.
O curso de licenciatura em Educação do Campo: Artes e Mú-
sica iniciou suas atividades na Universidade Federal do Tocantins
no ano de 2014, com oferta de 120 vagas, como apontava o edital
do Procampo, nos campus universitários de Arraias e Tocantinópo-
lis. Novas ofertas de 120 vagas foram realizadas em 2015 e 2016.
Em Tocantinópolis, no ano de 2017, foram ofertadas 50 vagas e, em
2018, foram ofertadas 60 vagas.
Este curso é mais uma iniciativa de Educação do Campo no
estado do Tocantins, que se soma a outras experiências que vêm sen-
do desenvolvidas como as Escolas Famílias Agrícolas, experiências
de formação de movimentos sociais, frentes de educação de jovens e
adultos com o Programa Saberes da Terra, formação de professores
específicas em redes municipais e estadual. A criação do curso, como
aponta Oliveira (2016), é uma continuidade de ações oriundas dos
movimentos sociais e sindicais do campo, como também das insti-
tuições públicas de ensino.
Especificamente no norte do Tocantins, como apontam Jesus e
Gubert (2016), as Escolas Família Agrícola e o Instituto Federal do
Tocantins de Araguatins, desenvolvem ações tendo em vista atender
demandas da juventude rural, no entanto,
163
mesmo com algumas estruturas de escolas ligadas à
realidade do campo em funcionamento, a situação vi-
vida por milhares de famílias campesinas na peregri-
nação pela busca da educação no norte do Tocantins
é bastante caótica. Todos os anos milhares de famílias
amargam essa triste situação – crianças, jovens e ado-
lescentes são obrigados a deixar suas origens, cultura e
costumes para irem em busca de estudos nos centros
urbanos ( JESUS; GUBERT, 2016, p. 138).
164
dades de extensão universitária. O tempo comunidade é um tempo/
espaço onde:
165
co, no sentido do deslocamento dos discentes e docentes nesses espaços,
como também um movimento epistemológico, de reconhecimento des-
ses diferentes campos de saberes e também de questionamento mútuo.
Um dos elementos que constituem essa particularidade do cur-
so de Educação do Campo é o uso de alguns instrumentos da peda-
gogia da alternância. Os instrumentos utilizados na pedagogia da
alternância são diversos. Quadros et al. (2007) ao analisarem as casas
familiares rurais relata que elas possuem instrumentos pedagógicos
como: o Plano de Estudo, o Caderno de Pesquisa, o Caderno de
Acompanhamento sócio-profissional, os Estágios, a Avaliação do
Processo Formativo, as Visitas de estudo, o Caderno Didático, a Visi-
ta de Acompanhamento familiar. Silva (2011) faz uma contundente
análise sobre o Caderno da Realidade, como sendo um instrumento
pedagógico. Aires (2016) discorre reflexões a partir de uma Escola
Família Agrícola. Além da alternância pedagógica de espaços / tem-
pos (tempo universidade e tempo comunidade), outros instrumentos
pedagógicos são utilizados, como as visitas e viagens de campo.
166
do Ceffa – Centro Familiar de Formação por Alternância; CFMs –
Casas Familiares do Mar; CFRs – Casas Familiares Rurais; Ecors
– Escolas Comunitárias Rurais e as EFAs – Escolas Famílias Agríco-
las, na consolidação de tal pedagogia. Bernartt e Pezarico (2011), ao
discutirem referencias teóricos-metodológicos da pedagogia da alter-
nância, observam as experiências das Casas Familiares Rurais – CRF,
ao se referirem as visitas de campo explicam que:
167
campo, no interior de diferentes disciplinas e semestres. Neste ca-
pítulo, refletiremos sobre quatro viagens de campo, a citar: 1) Par-
que Nacional Serra da Capivara em São Raimundo Nonato/Piauí, 2)
Acampamento Ilha Verde, Babaçulândia/Tocantins, 3) Comunidade
Quilombola Mumbuca, no Parque Nacional do Jalapão em Matei-
ros/Tocantins, 4) Encontro Estadual da Juventude Camponesa, em
Palmas/Tocantins.
168
Uma forma de realizar a apresentação de fenômenos
naturais é utilizando, como recurso didático, aulas de
campo em ambientes naturais, principalmente aque-
les que são encontrados espacialmente próximos aos
alunos por sua facilidade e pela possibilidade dos
alunos possuírem experiência prévia com o ambiente
objeto de estudo.
169
Figura 6.1 – Rochas sedimentares com sítios arqueológicos
Fonte: Kennedy M. da Silva (2016).
170
fósseis arqueológicos. Tudo que foi visto e coletado durante a aula de
campo, pelos acadêmicos e professores, foi acrescentado aos estudos
realizados em sala de aula.
171
parte dos feirantes foi muito positiva. A visita à feira durou cerca de
uma hora.
Em seguida, nos dirigimos até o Acampamento Ilha Verde, que
está localizado a 10 km da sede do município, nas margens do lago.
Chegamos ao acampamento por volta das dez horas da manhã. No
primeiro momento, os estudantes ficaram livres para conversar com
os moradores da localidade. Algumas pessoas do acampamento pre-
pararam o almoço para nossa delegação de visitantes e logo depois
da refeição foi realizado um momento de diálogo coletivo, debaixo
das árvores, espaço onde acontecem as assembleias dos acampados.
Havia cerca de trinta pessoas do acampamento que contaram a his-
tória da retirada das famílias de seus locais de moradia e trabalho,
pela construção do lago da hidrelétrica, e de sua organização e re-
sistência na montagem do acampamento.
Os estudantes fizeram perguntas, tomaram notas e fizeram
algumas atividades práticas junto às famílias. A interação com os
acampados foi positiva, proporcionando uma experiência de aprendi-
zados sobre a luta pela terra e as consequências dos grandes projetos
de desenvolvimento como as hidrelétricas para as populações locais.
Alguns estudantes avaliaram o quanto se aprende com a teoria e a
prática, como citaremos nos relatos de alguns:
172
para mim é uma grande contradição (Estudante 1 -
Avaliação sobre a viagem de Campo).
173
rados pela construção das barragens, aliado ao déficit na formação e
informação do que vai acontecer com as pessoas que vão ser atingidas
durante e pós-construção.
Nossa leitura foi feita com olhar especial sobre as consequên-
cias maléficas que a barragem proporciona à vida das famílias. A falta
de uma política específica para a população atingida torna necessário
divulgar com clareza os direitos dos atingidos por barragens em bus-
ca da não violação dos direitos e do respeito pela vida e acreditamos
que e educação tem um papel essencial nesta luta (CPT, 2011, p. 08).
É necessário pensar outro modelo de desenvolvimento de ma-
neira que leve em consideração o ser humano, o meio ambiente onde
vivemos, e que a preocupação não seja somente o lucro que um grupo
de empresas obterá sobre a exploração de um bem que a natureza
nos presenteou, e que se não cuidarmos isso irá proporcionar graves
problemas para as futuras gerações, além de acarretar prejuízos nas
condições de educação e saúde da população. Rocha (2012) coloca
que é necessário pensar sempre no alicerce, em uma concepção am-
pla de defesa da terra, da vida, onde as dimensões sociais, biológicas,
psicológicas e ambientais sejam valorizadas. Além disso, afirma que:
174
suas terras, casas que perdem os seus trabalhos de onde tiram o sus-
tento de sua sobrevivência que é luta ampla pela defesa da vida e de
uma educação e produção para todos. Esse conjunto de aprendizados
demonstra o potencial pedagógico das visitas de campo.
175
Na aula de campo no Parque Estadual do Jalapão, alguns ele-
mentos foram observados pelos alunos, com mais atenção, os ferve-
douros, as áreas de veredas, rios, igarapés, e as dunas. O contato com
as dunas, representado na Figura 6.2, foi de grande importância, pois
possibilitou a análise, a partir do contato com o objeto, para entender
como os fenômenos naturais contribuem para o embelezamento da
paisagem.
176
local. Vale destacar que nessa comunidade moram alguns dos acadê-
micos do curso de Educação do Campo, do campus de Tocantinópo-
lis, e nessa comitiva, a nossa guia naquele momento era uma filha da
comunidade e também aluna do mesmo curso. Essa parceria permi-
tiu um rico contato com a comunidade e com os elementos naturais
e culturais de todo o parque.
Nesse sentido, todas as atividades ali realizadas gerou uma ex-
periência impar, que permitiu aos alunos novos horizontes para pro-
duzir pesquisa e melhorar a aprendizagem. Aos professores, novos
materiais serão objetos de análises na sala de aula, para que todos,
alunos e professores, tornem-se capazes de atuar para poder contri-
buir com a preservação do meio ambiente e das culturas dos povos,
no Jalapão e em qualquer outra parte do espaço geográfico.
1 O evento foi organizado pelos seguintes movimentos sociais: Movimento dos Atingidos
por Barragens (MAB), Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM),
Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado do Tocantins (Fetaet), Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), povos indígenas, Movimentos Quilombolas,
Associação Tocantinense de Agroecologia e Cáritas.
177
legação de 35 estudantes, contemplando as diferentes turmas. Essa
viagem de campo, também foi organizada como Projeto de Extensão,
para atender aos seguintes objetivos:
178
5 Considerações finais
Referências
179
ARROYO, M. G.; CALDART, R. S.; MOLINA, M. C. (Orgs.).
Por uma educação do campo. Petrópolis: Vozes, 2004.
180
OLIVEIRA, U. F. Percurso metodológico para construções identitá-
rias na formação de professoras e professores do campo no norte do
Tocantins: reflexões a partir da experiência com o curso de licencia-
tura em Educação do Campo com habilitação em Artes e Música,
da UFT, Campus Tocantinópolis. In: SILVA, C.; MIRANDA, C. F.;
AIRES, H. Q. P.; OLIVEIRA U. F. (Orgs.). Educação do campo,
artes e formação docente. Palmas/TO: EDUFT, 2016, p. 105-122.
181
7 – Mosaico dos saberes: a mística
dos povos do campo em um curso
de licenciatura em Educação do
Campo
1 Introdução
182
O curso exerce um papel fundamental na linha de frente da
formação superior em licenciatura em Educação do Campo por ser,
juntamente com o curso de mesmo nome da UFT, campus de Ar-
raias, o único do País com habilitação específica na área de Arte.
Existem outras universidades que trabalham na área de Códigos e
Linguagens, mas que englobam, além da Arte, as outras áreas desse
campo do saber, como a Língua Portuguesa, a Língua Estrangeira,
a Literatura e a Educação Física. Sendo assim, embora se diferen-
ciando em algumas abordagens, esses cursos têm um pioneirismo na
formação em Arte do campo.
A análise em questão está relacionada à prática da mística na
disciplina intitulada Estética e Poética Camponesa (EPC), sob a
responsabilidade da Profa. Cássia Miranda. No semestre letivo em
questão, 2017.2, a disciplina contou com a participação, enquanto
monitora, da educanda cursista do sexto semestre do curso, Edimila
Matos da Silva, que participou desse mesmo exercício com sua turma
no semestre letivo 2016.2. Para embasar este estudo, utilizamos uma
abordagem qualitativa da experiência vivenciada por nós e pelos edu-
candos, utilizando a observação e a aplicação de questionários com os
participantes para nos amparar no debate. A disciplina é obrigatória
e está situada no quarto período da grade curricular.
No Projeto Político Pedagógico do Curso (PPC) (UFT, 2016),
a disciplina manifesta em sua ementa a seguinte indicação de aborda-
gem: “Mística e movimento social: conceitos e práticas. Constituição
do imaginário social sobre o homem/meio rural. Abordagem cinema-
tográfica quanto ao homem/meio rural. Cultura campesina. Folclore,
religiosidade e manifestações culturais. Arte e estética Camponesa”
(UFT, 2016, p. 59). Pela ementa é possível constatar que se trata de um
momento de troca de saberes acerca do universo camponês, das crenças
e manifestações culturais artísticas dos homens e mulheres do campo.
É uma continuidade da disciplina de Estética e Filosofia da Arte, tam-
bém sob a tutela da referida educadora, direcionada especificamente
183
para abordar as manifestações artísticas dos povos do campo, suas cul-
turas, seus signos e suas representações, abordando as formas que os
indivíduos do campo retratam a si e aos outros por meio da música, do
teatro, da dança, das artes plásticas, da literatura e do cinema.
Se tratando de uma valiosa fonte de pesquisa, as manifestações
artísticas nos trazem informações únicas que nos permitem aproxi-
marmos das subjetividades presentes em diferentes culturas. Nesse
sentido, é necessário pensarmos no conceito de cultura. Conforme
Geertz (2008) pontua, a cultura é um conjunto de significados nem
sempre fáceis de identificar e está relacionada à forma como os ho-
mens e mulheres dão sentido às coisas em seu mundo. Como eles es-
tão em constante transformação, a cultura também acompanha esse
movimento, sendo muito dinâmica.
Seguindo a reflexão a respeito da temática, Thompson (2011, p.
173) assinala que “a cultura de um grupo ou sociedade é o conjunto
de crenças, costumes, ideias e valores, bem como artefatos, objetos e
instrumentos materiais, que são adquiridos pelos indivíduos enquan-
to membros de um grupo ou sociedade”. Sendo assim, as manifesta-
ções artísticas constituem um espaço ímpar no qual esses conjuntos
de significados de determinados grupos se manifestam e dão sentido
às experiências, contribuindo para a construção e fortalecimento do
imaginário coletivo. O imaginário tem um papel fundamental, pois,
184
O estudo da arte dos povos do campo ainda é um campo cien-
tífico pouco trabalhado no Brasil. Isto se dá devido a diversos fatores
que vão desde as tendências históricas dos caminhos da ciência, até
interesses políticos e econômicos. No entanto, já há um número consi-
derável de pesquisadores se dedicando a essa seara. A arte é um campo
do conhecimento extremamente importante para a formação do ser
humano, pois possibilita a reflexão e a descoberta de outras formas de
ler a si e ao mundo. De acordo com Miranda e Cover (2016, p. 37-38),
185
Tendo sua origem atrelada à religiosidade, a gênese da utiliza-
ção mística pelos povos organizados do campo tem uma forte influ-
ência da ligação desses movimentos com a Igreja Católica e a Igreja
Luterana que serviram de apoio e fomento das lutas camponesas em
sua reorganização após o período ditatorial. Quando nos referimos a
movimentos camponeses organizados, destacamos para esta análise,
o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), por ser
um entre os mais numerosos, mais organizados e mais representati-
vos do Brasil.
A inspiração de matriz religiosa pode ser percebida na fala
de João Pedro Stédile (STÉDILE; FERNANDES, 2012, p. 132),
membro do MST:
186
um dos pilares do mesmo. Roseli Caldart et al. (2013, p. 352) pontua:
187
A escola em seu cotidiano procura fazer o contra-
ponto pela discussão sobre cultura e sobre a lógica da
indústria cultural, mas também pela busca de outras
possibilidades de fruição e produção da arte, de ativi-
dades lúdicas, de internacionalização do tempo livre
para vivências de relações humanizadoras. O desafio
permanente é ir construindo dia a dia, a partir de no-
vas relações sociais, uma cultura de luta pela trans-
formação do modo de produção capitalista. [...] Isso
implica que um tipo de sociabilidade musical, sensual,
afetiva, culinária e estética possa ser promovida de
maneira saudável entre os jovens, entre todos nós. [...]
A mística integra em nosso método pedagógico a in-
tencionalidade do trabalho nessa dimensão de convi-
vência (CALDALT et al., 2013, p. 344-345).
188
social. Além dessas personalidades, a atividade de Tempo Comuni-
dade dessa disciplina orienta que os educandos realizem entrevistas
com pessoas que considerem importantes para suas comunidades –
realizando uma interdisciplinaridade com as disciplinas de História
de Vida, Movimentos Sociais e Cartografia Social. Quanto à impor-
tância da interdisciplinaridade no curso é importante pontuar que:
189
Universidade, contando com a participação das demais turmas do
curso vivenciando a atividade e, após a mística, a turma ia para a
sala de aula para fazer uma avaliação da atividade e prosseguir com
o seminário.
Essa é uma das atividades que busca garantir uma espécie de
alternância pedagógica entre o tempo comunidade e tempo univer-
sidade, no intuito de se aproximar dos conceitos da pedagogia da
alternância. A pedagogia da alternância propõe a divisão do ensino
em distintos tempos-espaços que se relacionam e constroem o saber
em diálogo. Essa proposta surgiu voltada para as especificidades pe-
dagógicas dos povos que vivem do campo cujas necessidades incluem
contextos que devem levar em consideração, entre outros aspectos,
os momentos de trabalho na terra, de convívio em comunidade e os
momentos em sala de aula.
Para tal atividade, além da divisão em tempos – tempo esco-
la/universidade e tempo comunidade, é necessário pensar em ins-
trumentos de registros e avaliativos que efetivem o diálogo entre os
tempos-espaços para que não se perca de vista a intencionalidade
pedagógica dos mesmos. Conforme Silva (2011, p. 34) pontua, os
instrumentos “favorecem a participação ativa dos jovens [e adultos],
situando-os na função de atores das atividades, bem como da cons-
trução do seu próprio conhecimento a partir de sua realidade e das
experiências do cotidiano”. Levando em consideração esses aspectos,
a proposta de trabalho aqui apresentada é fruto da tentativa de pro-
por um formato de instrumento de diálogo entre os tempos-espaços
formativos.
Devido ao contato anterior com místicas realizadas pelos co-
legas de curso, e em eventos vinculados à Educação do Campo, os
educandos e educandas iniciam a disciplina ansiosos por compreen-
derem melhor do que se trata e de como se faz uma mística. Por exis-
tir lacunas no processo de seleção para o ingresso no curso, entram
vários discentes não oriundos de áreas rurais. Esse fato faz com que
190
as realidades sejam muito distintas entre os que vivem na cidade, os
residentes no campo que não estão engajados em movimentos sociais
e os residentes no campo que militam nesses movimentos. Para esses
últimos, a mística, a priori, não causa estranhamento. No entanto, as
primeiras reações dos educandos que vivem na cidade é de incom-
preensão, recusa e distanciamento. É necessário um trabalho voltado
para a sensibilização e a conscientização da importância que tem para
um curso desse perfil, o processo de empoderamento da mística para
seu futuro enquanto educadores e educadoras dos povos do campo.
Por se tratar de um curso de artes, alguns aspectos relacionados
ao bom andamento das atividades são destacados, tais como postu-
ra da voz, posicionamento corporal, estratégias de organização dos
participantes, mecanismos de som e luz, cenário e figurino, atuação,
entre outros. Esses elementos auxiliam tecnicamente os educandos a
criarem uma mística mais de acordo com a intencionalidade plane-
jada por eles. Exemplos de deslizes muito comuns que prejudicam o
bom andamento das místicas pode ser o caso de se utilizar um tom
de voz muito baixo ou passar uma mensagem corporal diferente da
mensagem oral. Esse tipo de fator altera a compreensão e pode fazer
com que os participantes não envolvidos com a elaboração da mística
percam o interesse naquele momento, visto que a fé cênica, isto é, a
crença na cena, se perde.
Embora essas questões sejam consideradas e trabalhadas na
disciplina, não se perde de vista o fato de que a mística não é uma
apresentação artística por si só, ela é um ritual, um momento especial
onde há participantes que estão propondo aquele momento e partici-
pantes que estão compartilhando aquela vivência, não sendo aqueles,
necessariamente, artistas por formação:
191
no praticar das ações que visam às transformações
pretendidas. A persistência na busca de alternativas
para as situações que aparecem esgotadas, o ânimo
para enfrentar os sacrifícios e a esperança relacionada
à coragem e à indignação aprofundam ainda mais o
mistério de não se saber decifrar os fundamentos das
manifestações de vontade de fazer e sentir cada ato
(BOGO, 2016, p. 44).
192
picia ao movimento construir “no seu fazer elementos comuns de uma
identidade política camponesa, os quais são elencados propositalmente
pelos criadores da mística direcionados aos seus pares”. Com relação à
abordagem desses elementos, realizada nas manifestações artísticas do
MST, Stédile (STÉDILE; FERNANDES, 2012, p. 133-134) ressalta:
193
2.1 A mística em movimento
194
postura e se desculpa com sua esposa.
A cena termina com os demais integrantes do grupo entran-
do em cena exclamando frases em defesa da igualdade de gênero
e de profissões não valorizadas. Entre as frases citadas, destacamos
algumas: “sou brasileira de nascimento, sou estudante”; “quero ser
livre, assim como meus pensamentos, quero mudança”; “quero salá-
rio igualitário, quero andar de cabeça erguida diante de todos, sem
medo”; “sou profissional, sou mãe, sou pai, sou do lar”; “sou eleitora e
tenho o poder de mudar o que não creio ser correto” “elas não podem
ser estupradas, nem violadas, muito menos abusadas por ninguém”.
A temática escolhida estava sendo intensamente discutida pe-
los alunos da turma na disciplina de Seminário Integrador IV. O de-
bate sobre as questões de gênero, em especial a opressão vivida pelas
mulheres, se deu devido à constatação feita por alguns educadores e
educadoras de episódios em que alguns discentes demonstraram uma
postura machista com relação às suas colegas e em relatos sobre as
mulheres de suas vidas. Provavelmente, a abordagem feita pelos(as)
docentes que conduzem a disciplina (entre os quais, inclui-se uma
das autoras deste capítulo) foi proveitosa na medida em que, ao se-
rem desafiados a escolher um tema de seu dia a dia para expor e pro-
por um momento especial de reflexão – uma mística – os educandos
e educandas trouxeram à tona essa temática.
Quando questionados(as) quanto aos motivos que os levaram à
escolha dessa temática, um dos educandos salienta: “mostrar a reali-
dade da dona de casa, pois foi um tema que ultimamente foi bastante
discutido, tentando mostrar o trabalho e as atividades feitas diaria-
mente”. Vários discentes destacaram em suas respostas que esse tema
é bastante familiar visto que vivenciam a situação apresentada na
“própria pele” ou na situação de algumas mulheres de suas famílias.
A segunda mística, A luta dos trabalhadores rurais, tinha como
personagens trabalhadores da roça, quebradeiras de coco babaçu
(palmeira típica da região do Bico do Papagaio, localizada ao norte
195
do estado do Tocantins), pistoleiros, um latifundiário e uma narrado-
ra. O cenário estabelecido foi a de um território agrário cujas terras
improdutivas pertenciam ao latifundiário. Os elementos utilizados
traziam à cena o ambiente da roça, com enxadas, pás, machadinhas e
porretes (instrumentos utilizados na quebra do coco), cofos (cestaria
confeccionada com a palha da palmeira do babaçu) e cachos repletos
de coco babaçu. A cena demonstra os trabalhadores acampados em
um dia harmônico de trabalho.
A seguir o latifundiário, ao ver a posse de suas terras na mão
de outros, contrata homens armados para expulsar da terra os tra-
balhadores(as) que lá estavam. Os (As) trabalhadores(as), que já ha-
viam sido ameaçados(as) pelo latifundiário buscam alternativas para
o impasse e, sem possibilidade de manter seu sustento em outro lo-
cal, indignados com a injustiça, resolvem permanecer na ocupação.
O clímax da cena se estabelece no confronto entre os pistoleiros e
os trabalhadores e trabalhadoras, culminando no assassinato de dois
deles. A cena encerra com a narradora lendo um texto que relembra
o histórico da luta pela terra no Brasil e o sacrifício de tantos cam-
poneses e camponesas em busca de uma terra para viver e trabalhar
acompanhada de fundo pela música Pra não dizer que não falei das
flores, de Geraldo Vandré.
O grupo que escolheu a temática mais voltada aos conflitos re-
lacionados à luta pela terra não tem nenhum integrante que trabalhe
diretamente com a terra, tendo eles uma vivência mais urbana. Esse
fato nos chama atenção visto que houve a opção por representar uma
realidade diferente da vivida por eles. A justificativa da escolha do
tema, pontuada por uma das educandas é: “escolhemos uma temática
que melhor representasse a vida das referências que estudamos”. Esse
fato pode indicar que o trabalho na disciplina de EPC, relacionado à
compreensão da vivência dos povos do campo, aos aspectos relacio-
nados à cultura e à poética camponesa estão sendo assimilados pelos
educandos e educandas. Além disso, aspectos relacionados à estética
196
da mística, sendo vista como não só, mas também, como uma obra
de arte, devem ser destacados visto que esse grupo foi o que mais
utilizou adereços, figurinos e cenário que se destacam como símbo-
los importantes que retratam o imaginário dos povos do campo: “O
imaginário trata de um conjunto de sinais que emergem da realidade
vivenciada por determinado grupo. Cada período e cada grupo cons-
troem seu imaginário, isto é, o conjunto de representações que dão
sentido à sua realidade” (MIRANDA, 2014, p. 41). Pensando nisso, o
grupo conseguiu manifestar uma realidade que não é a sua, mas que
foi assimilada pela construção coletiva através dos estudos, debates e
trocas de saberes promovidos pelo curso.
Essa mística provocou muitos comentários entre os colegas
da turma, principalmente quando questionados com relação a sen-
timentos e sensações que a mística provocou neles. Uma das edu-
candas pontua a “sensação de luta e de que ainda temos muitas bata-
lhas pela frente, no momento que aconteceu a mística eu lembrei do
quanto aquelas pessoas que foram assassinadas sofreram fisicamente
e psicologicamente em prol de políticas públicas e direitos que hoje
nós usufruímos”. Outra educanda também ressalta a dedicação e o
martírio daqueles que tombaram nas lutas camponesas: “leva a pen-
sarmos mais sobre a vida do camponês. Questões sobre identidade,
cultura, momentos que nos levaram a refletir sobre os autores que
morreram por causas trabalhistas, faz com que façamos mais por esse
povo que desde os primórdios tem lutado por igualdade de direitos”.
A identificação não só pelos alunos residentes na cidade, mas tam-
bém, por aqueles que vivem no campo: “me identifiquei um pouco
com a apresentação das quebradeiras de coco e os homens mortos.
Aquilo ali acontece também com os povos indígenas”.
Na mística Pedagogia Tradicional x Pedagogia Libertadora os
personagens são um professor da pedagogia tradicional, um educa-
dor da pedagogia libertadora, os educandos e educandas e uma nar-
radora. A cena inicia com o professor conferindo os cadernos das
197
alunas, desqualificando seus trabalhos e apontando seus equívocos de
maneira vexatória. Depois, as alunas começam a questioná-lo acerca
da pedagogia libertadora, de Paulo Freire. Os questionamentos são
respondidos com descaso e frases como “Paulo Freire é seu pai?’’,
“Paulo Freire não paga meu salário”, “Ele veio dar aula pra vocês
aqui?”, “Paulo Freire não tem nada a ver com o meu trabalho”.
As alunas exclamam frases inspiradas nos princípios de uma
educação libertadora, retirando-se da sala de aula. O professor deter-
mina que estão todas reprovadas e desiste de dar aula para aquela tur-
ma. Em seguida, a turma retorna as atividades com um novo docente.
Este se mostra acolhedor, dedicado, atencioso e respeitoso com as
alunas, procurando conhecer suas realidades e propor novas formas
de ensino. Trata-se de um educador adepto à pedagogia libertadora.
Todas saem da aula realizadas, satisfeitas com a nova forma de apren-
der e ensinar proposta pelo educador.
A narradora entra em cena e propõe ao público que pense, com
base em suas vivências e na cena representada, que tipo de educador
ele quer se tornar. Ela aborda as dificuldades e as especificidades dos
educandos e a importância do educador enquanto agente responsá-
vel, em parte, pelo futuro daqueles que cursam suas aulas e conclui
a mística com o seguinte questionamento: “Então nós como futuros
educadores temos que nos fazer essa pergunta: Que tipo de educador
nós queremos ser?”.
A temática abordada por esse grupo destaca um dos principais
compromissos de nosso curso, o de educar para a liberdade, para o
empoderamento, para a autonomia, em diálogo estreito com a obra
do pedagogo Paulo Freire. Os educandos e educandas colocam em
seus questionários relatos de terem sido vítimas de uma educação
tradicional, com professores opressores: “a maioria dos alunos sofre-
ram opressão por parte dos professores durante o ensino fundamen-
tal”; “me comoveu, pois eu já vivencie situações opressoras enquanto
estudante”. Essa temática refletiu um dos maiores desafios da prá-
198
tica docente e demonstrou ser uma preocupação dos integrantes do
grupo quando finalizaram sua ação propondo o questionamento aos
demais quanto ao futuro educador que eles se tornarão ao final de sua
formação universitária.
A última mística recebeu o título de Os indígenas. É importante
ressaltar que essa mística foi elaborada pelos educandos e educandas
indígenas da etnia Apinayé, com o apoio da monitora da disciplina
e das monitoras do Programa Interinstitucional de Monitoria In-
dígena (Pimi). Esse apoio é imprescindível visto que temos muitas
dificuldades com nossos(as) discentes indígenas, principalmente,
relacionadas à diferença linguística. Muitos(as) deles(as) chegam ao
curso com poucas noções da língua portuguesa e o desafio princi-
pal é a comunicação entre eles(as) e os(as) docentes e entre eles(a)
e seus(as) colegas. As leituras propostas também são um grande
desafio para eles(a). Nesse sentido, o Pimi tem desempenhado um
papel fundamental garantindo a inclusão dos(a) indígenas que estão
cursando um curso em uma língua que não é a sua língua materna,
advindo desse fato muitos obstáculos a serem vencidos.
A mística começa com uma mulher precisando de ajuda, pois
seu bebê está passando mal. A primeira pessoa que ela procura é o Pajé
de sua aldeia. Este examina a criança, realiza seu ritual de cura, benze
a criança e canta para ela, realizando um pequeno ritual. Por fim, o
pajé aconselha a mulher a ir à Secretaria Especial de Saúde Indígena
(Sesai) procurar um médico. O médico recomenda que ela aguarde,
um carro que pegará ela e o bebê e os levarão para o hospital. O pai da
criança chega da caçada e, não encontrando sua família, vai procurar o
Pajé para ter notícias. Depois, ele vai procurar sua família na Sesai que
informa que ela foi transferida para a cidade de Araguaína/TO, cerca
de 150 km de distância da cidade de Tocantinópolis/TO.
Ele pede ajuda para que consiga ir até sua mulher e sua filha,
pois está muito preocupado, a Sesai informa não ter condições de
realizar seu pedido e indica que ele procure a prefeitura do município.
199
Ele vai até a Prefeitura, no centro da cidade, e recebe outra resposta
negativa, também sob alegação de falta de recursos. A Prefeitura diz
que quem tem que cuidar desse tipo de demanda é a Fundação Na-
cional do Índio (Funai).
O pai se dirige à Funai para pedir ajuda e é informado que
não há verbas e que o órgão não pode fazer nada para lhe ajudar.
Sem ter mais a quem recorrer, o pai retorna para a aldeia. Por coin-
cidência, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) acaba de che-
gar lá e, conversando com o homem e vendo sua necessidade de
encontro com a família, vai com ele até a Sesai e questiona o órgão
sobre a informação de não haver verba disponível. A Sesai justifica
que no momento que o homem foi lá não havia verba e que após a
sua saída uma verba surgiu. Com o acompanhamento do Cimi o pai
finalmente consegue a passagem para encontrar a sua família. Após
essas cenas, todos os integrantes do grupo se reúnem cantando e
dançando em comemoração à melhora de saúde da criança.
A mística foi realizada na língua portuguesa e na língua Api-
nayé. Os momentos de conversa entre os personagens indígenas
como a mãe e o pajé, o pai e o pajé e o canto ao final da cena, foram
em sua língua materna. Já as conversas que aconteceram com os ku-
pén – homens brancos ou, como preferem utilizar os alunos indígenas
de nosso curso, os não índios –, nos órgãos públicos representados,
acontecem em língua portuguesa. Os discentes envolvidos na monta-
gem da mística justificam sua escolha pelo tema: “é mostrar a realida-
de do povo indígena do campo, é mostrar que passamos por isso, que
ficamos dependendo dos órgãos públicos, do município”; “mostrar a
negação dos direitos indígenas pelos órgãos públicos e governamen-
tais”; “o critério foi com que nós mostrássemos que os índios não
estão de boa nesse mundo capitalista. E que os índios precisam de
mais apoio e orientação diante dessas coisas”; “para mostrar que os
órgãos nos jogam para outros órgãos, como saúde joga para Funai e
Funai para Prefeitura”. Um dos integrantes destaca: “eu já passei por
200
isso, é a realidade do povo indígena do Brasil”. Esse descaso com a
saúde das populações indígenas é fundamental, visto que há muitos
relatos de indiferença e maus tratos por parte daqueles que deviam
servir aos interesses indígenas.
3 Considerações finais
201
A força, a luta, a união, a justiça, a igualdade de direitos, a edu-
cação libertadora, o acesso à terra, entre outros, são temas muito pre-
sentes no cotidiano do curso, tanto em abordagens em sala de aula
quanto fora dela, o que pode ter servido de inspiração para os edu-
candos e educandas na concepção de suas místicas.
A atividade foi relatada pelos discentes como “desafiadora”,
“importante”, “difícil” e “boa”. As discentes relataram gostar de as-
sistir e debater as místicas de seus(as) colegas, propondo sugestões e
novos olhares das ações apresentadas. A mística possibilitou a apren-
dizagem e a compreensão das questões camponesas através de uma
vivência que vai além da objetividade dos acontecimentos, que busca
tocar cada indivíduo de maneira única e profunda.
Entre as dificuldades apontadas está a necessidade de alguns
educandos e educandas de receberem um formato fechado de místi-
ca, um modelo, um passo a passo, o que não é conveniente ao proces-
so de criação dessa atividade. A mística foi abordada em momentos
anteriores ao Mosaico dos Saberes na disciplina com a proposição de
textos e debates sobre seus aspectos teóricos, destacando sua origem,
significado, principais formas, relevância para os povos do campo,
entre outros aspectos.
Foram apresentados exemplos de místicas e trabalhados as-
pectos relacionados à concepção artística da mesma. Foram anali-
sadas obras de arte visual, de música, de teatro criadas pelos povos
do campo na tentativa de fazer com que o universo camponês na
arte pudesse ser melhor compreendido. No entanto, entendemos que
uma “fórmula pronta” prejudicaria a intencionalidade, tanto didática,
quanto poética, pois a mística é um momento de criação coletiva, de
movimento, de manifestação de sensações e sentimentos. Qualquer
tentativa de engessar a mística poderia acabar totalmente com sua
essência e potência.
202
Referências
203
MIRANDA, C. F.; COVER, M. Universalização de saberes: abor-
dagens interdisciplinares na licenciatura em educação do campo.
Revista Congreso Universidad, Cuba, v. 5, n. 3, p. 33-48, 2016.
204
8 –Práticas pedagógico-musicais e
interações no canto coral
1 Introdução
205
dagógico-musical do regente que atua como educador musical nas
atividades de canto coral.
Das expressões musicais, o canto coral é, de todas, a mais aces-
sível (ROBINSON; WINOLD, 1992). Estudos feitos na Austrália
mostram que a instrução musical ajuda a desenvolver habilidades
como proficiência motora, mentais, audição, percepção, matemática,
leitura, compreensão e interpretação de textos ( JUNKER, 2013a).
Há um enorme interesse acadêmico pela formação de coral por de-
senvolver vários aspectos nos participantes como físico, moral e social
(CARTOLANO, 1968, apud JUNKER, 1999, p. 66). Portanto, é
necessário expandirmos nosso olhar para a prática do canto coral,
“tanto para as diferentes maneiras de cantar como para os aspec-
tos socioeducativos do coro” (CHIARELLI; FIGUEIREDO, 2010;
DIAS, 2008 apud DIAS, 2012, p. 136).
A prática de canto coral se dá em diversos espaços, como nos
conservatórios, nas escolas de ensino básico, em projetos sociais, em
universidades, em igrejas, empresas, ONG’s e outros espaços infor-
mais. A prática coral, não subsiste sem a figura do regente que exerce
o papel da regência (técnica) de uma determinada peça e também de
educador (educação musical). Nesse sentido, trataremos neste capí-
tulo apenas das práticas pedagógicas em um coro universitário em
um curso de licenciatura.
Os regentes atuam, em sua maioria, também como professores
( JUNKER, 2013b). Esses regentes na sua prática se deparam com
questões além da regência, o que já requer muito estudo. A prática
da regência vai além da respiração, afinação, calistenia2 e sonoridade.
É necessário um olhar pela subárea da Educação Musical; o regen-
te precisa atuar como professor/educador musical. Segundo Souza
(2009) há “a necessidade de um alargamento da concepção de cantar,
de flexibilidade necessária para se trabalhar um repertório que atenda
206
às demandas dos coristas e o repensar a respeito das dimensões so-
ciais que revestem as práticas corais.”
Neste estudo, as práticas pedagógico-musicais na atividade de
canto coral e as interações que se dão entre os envolvidos na prática
pedagógica do coro emergem como o foco central das minhas preo-
cupações científicas. Busquei compreender, nesta pesquisa, as práti-
cas pedagógico-musicais e como se dão as interações que vão sendo
construídas nas dinâmicas das práticas pedagógicas utilizadas na dis-
ciplina de Canto Coral I e II do curso de licenciatura em Educação
do Campo, com habilitação em Artes e Música da Universidade Fe-
deral do Tocantins (UFT), em Tocantinópolis/TO.
Para responder a essas questões, elaboramos os seguintes
questionamentos: Quais foram as dificuldades encontradas pelos
alunos para a aprendizagem dos conteúdos? Quais práticas peda-
gógico-musicais do coro foram eficientes para a aprendizagem? As
práticas pedagógico-musicais conduziram ao estabelecimento de
aproximações entre indivíduos e ao desenvolvimento da capacidade
de convivência dos alunos? Que relações são construídas na prática
coral? Como essas relações acontecem? Qual proposta pedagógica
ideal para o ensino da música na Educação do Campo?
Diante dessas questões fica evidente a responsabilidade do re-
gente não somente nos aspectos estéticos da realização sonora, mas
também em relação aos aspectos educacionais. O regente da atuali-
dade precisa assegurar uma aprendizagem além da musical, deve ser
uma aprendizagem significativa, na qual os coristas, coralistas, enfim,
os cantores possam vivenciar experiências em diferentes dimensões3.
É preciso que os regentes antecipem tais questões relacionadas
aos aspectos educacionais e saibam que a atividade de canto coral
precisa também estar ligada às vivências de cada um do grupo. O
olhar pelo viés da subárea da Educação Musical, pelo regente, fará
207
que ele concilie a prática musical, pensada também como muitas ve-
zes em uma formação musical, com a formação integral do indivíduo.
Pretende-se com isso fazer com que haja uma experiência prazerosa
que valorize a identidade, a cultura e os gostos, promovendo assim
um convívio significativo entre todos os envolvidos. É importante,
portanto, conhecer o contexto dos envolvidos.
Pretendeu-se investigar as práticas efetivas de aprender e en-
sinar na disciplina de canto coral para contribuir com a melhoria da
educação do campo. Usamos os diários de bordo para averiguar opi-
niões dos discentes, o qual, de acordo com Porlán e Martín (1997),
é um guia que serve para reflexão sobre a prática, e a partir daí, o
professor tomará decisões sobre seu processo de evolução das práticas
pedagógicas.
Os fatos ocorridos nos processos de ensino-aprendizagem pre-
cisam ser registrados no diário de bordo (FALKEMBACH, 1987),
pois é nesse momento de escrita que os alunos refletem sobre a aula,
anotando o ocorrido a partir de sua ótica. O diário de bordo é um
recurso metodológico no qual se distinguem as problemáticas (POR-
LÁN; MARTÍN, 1997). O professor conseguirá identificar proble-
mas e solucioná-los a partir das análises de acordo com realidade do
envolvido. A problemática pode ser algo simples ou complexo desde
uma circunstância, uma ocasião ou um planejamento. O objetivo foi
usar os diários de bordo como ferramenta metodológica para analisar
o aprendizado de alunos da disciplina Prática Coral I e II.
As atividades que fizeram parte do diário de bordo dos alunos
foram: Problematização da aprendizagem nas aulas expositivas mi-
nistradas pelo professor da turma; Discussão de materiais didáticos
e metodologia; Descrição das atividades experimentais realizadas na
sala de aula. Como critério, para escolha dos sujeitos, selecionamos
os alunos assíduos.
A gênese dessa pesquisa nasceu a partir da busca por compre-
ender a importância da prática pedagógico-musical e as interações
208
(professor e alunos, entre alunos – os alunos na maioria são campo-
neses) nesse contexto. Dessa forma, chegamos ao próximo passo, que
foi, através dos dados obtidos, alcançar os objetivos da pesquisa.
O camponês, por direito, deve ter sua educação a partir do seu
mundo, ou seja, da sua realidade (LEITE, 1996; FERNANDES,
2002, apud NASCIMENTO 2005). É importante, portanto, com-
preender e assegurar a formação humana e a sustentabilidade dos
sujeitos do campo (LIMA, 2012). Nascimento (2005) relata que para
o Procampo4 são exigidos alguns critérios que devem prever a criação
de condições teóricas, metodológicas e práticas para que os educado-
res em formação possam tornar-se agentes efetivos na construção e
reflexão do projeto político pedagógico das escolas do campo.
A prática de ensinar música em diversos contextos é tratada
por Louro e Souza (2013). Esses autores buscam discutir práticas
efetivas do ensino da música em cada contexto, e exemplificam tam-
bém o meio acadêmico. Há uma ligação evidente sobre a teoria do
cotidiano e a educação a partir do contexto do indivíduo que para a
educação do campo se configure como o mundo do camponês. Esses
construtos convergem para a importância do contexto local, da sua
cultura, e dialogam com estudos de Swanwick (2003) que afirmam
que a música do cotidiano dos alunos deve ser aproveitada, valorizada
e utilizada na sala de aula.
No artigo Canção Regionalista Tocantinense: delimitação de
um estudo sobre música popular e identidade, Oliveira (2011) trata
das discussões sobre identidade cultural no âmbito acadêmico, for-
necendo um quadro teórico abrangente para situar as contribuições
da música regional. Essas discussões nos possibilitam um olhar mais
reflexivo sobre esse fundamento. Oliveira (2008) e Ramos (2003),
na mesma perspectiva, tratam sobre memórias e identidade cultural
tocantinense. Penna (2012, p. 48-49) ressalta a importância da recria-
209
ção da própria música. Segundo a autora, a educação musical aborda
a escrita tradicional ao passo que a musicalização aborda o “fato so-
noro em si”. Importante notar a esse respeito que:
210
cedor dos infortúnios que imperam na sua região, cidade e escola.
Assim, a partir de suas ações como docente poderá refazer, reinventar,
e recriar uma educação que funcione para o contexto onde vive.
Destacaremos, neste capítulo, as práticas pedagógico-musicais
no canto coral, e as novas sociabilidades a partir do convívio no coral.
2 Desenvolvimento
211
é formar profissionais capazes de dirigir e gerir processos educativos
escolares e comunitários e atuarem em áreas específicas do conheci-
mento”. Essa finalidade está em acordo com o objetivo do curso de
licenciatura em Educação do Campo com habilitação em Artes e
Música de Tocantinópolis que é:
212
ensino médio (MIRANDA; COVER, 2016, p. 88).
O curso está organizado em três núcleos que são: a) Núcleo
Comum com conteúdos voltados para formação geral do educador;
b) Núcleo Específico relacionado às artes visuais e música; c) Núcleo
de Atividades Complementares de extensão, pesquisa, monitorias,
estágios, viagens de campo e participação em eventos (MIRANDA;
COVER, 2016, p. 90). Em Tocantinópolis a carga horária total do
curso de Educação do Campo com habilitação em Artes e Música é
de 3.300 horas. As disciplinas do ciclo básico totalizam 1.785 horas,
enquanto que do ciclo profissional 900 horas. As atividades comple-
mentares 210 horas e os estágios curriculares supervisionados 405
horas (UFT, 2016, p. 17). As disciplinas oferecidas ao longo do curso
são: Fundamentos da Notação Musical; Teoria e Percepção Musical
I e II; Prática Coral I; Prática Coral I e II; História da Música Popu-
lar Brasileira e Instrumento Eletivo I-VII e disciplina do quadro de
optativas Musicologia e Etnomusicologia.
Prática Coral não é uma disciplina optativa, mas sim discipli-
na obrigatória. As disciplinas de Prática Coral I e Prática Coral II,
foco deste capítulo, são oferecidas respectivamente no 3º e 4º se-
mestre. Essas disciplinas têm por objetivo desenvolver a prática da
música vocal em conjunto, desenvolvendo no aluno alguns aspectos
do canto como a respiração, afinação, qualidade sonora e expressi-
vidade em grupos.
Com a I e II Conferência Nacional “Por uma educação básica
do campo”, em 1998 e 2004 se originaram os documentos mais im-
portantes sobre o movimento que são as coletâneas “Por uma Educa-
ção do Campo” que, ao lado das obras de Caldart, Arroyo e Molina
(2009), têm se constituído nas principais referências teóricas da Edu-
cação do Campo (NASCIMENTO, 2010). É importante conhecer
como se deu a construção do conhecimento da Educação do Campo
e suas pedagogias para elaborarmos qual prática será efetiva para o
ensino da música neste contexto (SOUZA, 2006).
213
Assim, a Educação do Campo, com suas singularidades, de-
vem ser pensadas a partir do mundo, do contexto, do lugar de onde
vivem. Queiroz (2017) corrobora esse pensamento quando diz que
educação musical é cultura. É a partir dos conceitos, especificidades
e pedagogias da educação do campo que devemos estar atentos sobre
os fatores que envolvem nossas práticas de ensinar música, sobretudo
pelos sujeitos envolvidos e suas culturas.
O professor / regente deve, portanto, compreender a im-
portância do que o aprendiz já sabe. (AUSUBEL, 1968, p. 6 apud
CESAR, 2011, p. 75). Penna (2012, p. 48-49) ressalta a importân-
cia da recriação da própria música, ou seja, da música do contexto
do aluno. Essa recriação, segundo a autora, é uma forma ou meio
de possuí-la ativamente. A autora explica que a educação musical
aborda a escrita tradicional ao passo que a musicalização o “fato
sonoro em si”.
Bezerra Neto (2013) traz outra proposta, ressaltando que há a
necessidade do homem do campo ter a mesma formação adequada
e de qualidade do homem da cidade. É importante essa discussão
(trataremos mais adiante) para que o leitor possa visualizar todo o
contexto educacional por óticas diferentes. Para esse autor, não cabe
à educação do homem do campo ser a partir de seus saberes como
ressaltam os pesquisadores Penna (2012) da Educação Musical e
Nascimento (2010) da Educação do Campo, por exemplo.
O processo de ensino-aprendizagem se torna uma relação com-
plexa diante do exposto acima, pois envolve pessoas, e por isso a ética
é importante, especialmente para quem forma pessoas, o professor, e
no nosso caso, o regente. Cabe trazer aqui o texto do autor Sloboda
(2008, p. 257) que diz “todo desenvolvimento humano envolve algu-
ma forma de construção a partir daquilo que já é presente”. Portanto,
a educação deve “partir” do contexto, dos saberes do indivíduo. Esses
saberes servirão como ponte para novos conhecimentos.
Não discordamos totalmente de Bezerra Neto (2013). É claro
214
que o homem do campo deve ter a mesma formação de qualidade, mas
sem perder as suas raízes, suas características, sua cultura. Concorda-
mos com Queiroz (2017) e Sloboda (2008), pois é a partir do que já
sabem, ou seja, sua cultura que devemos pensar a educação (musical).
O que já sabem são suas músicas (gostos musicais), seus costumes,
suas crenças, suas culturas. Portanto, o gosto musical, segundo Pinhei-
ro (1997, apud, OLIVEIRA, 2014, p. 19) “é diretamente influenciado
pelo ambiente, familiar, cultural e social em que vivem”.
É imperativo que deixemos um importante questionamento a
esse respeito: Por que se formam mestres e doutores (saem da acade-
mia) que pesquisam saberes de comunidades, por exemplo, quilom-
bolas e indígenas, mas não se aceitam esses saberes como adequados
e de qualidade?
215
Administrar a rotatividade dos volantes sem interferir
em seus projetos de trabalho, tanto nas questões de de-
senvolvimento musical dos coristas quanto na prepara-
ção de um repertório consistente para as apresentações
públicas que comumente ocorrem ao longo do ano.
216
como os processos educativos musicais. Quanto aos outros dois mo-
mentos, caberiam outros estudos que exigiria outras estratégias de
pesquisa e que não é o nosso foco.
Cabe destacar a importância do currículo relacionado ao ensi-
no da música no Brasil por pesquisadores como Esperidião (2012),
Barbeitas (2002) França (2006), Vieira (2001) e Pereira (2012; 2013;
2014). O imenso território e as características de cada região trazem
à tona as questões relacionadas ao conteúdo a ser ensinado (QUEI-
ROZ, 2017). A questão do currículo em música está em debate pelos
educadores da subárea da Educação Musical, pois perceberam que
existem características divergentes em cada país.
No caso de países extensos como o Brasil as expressões cul-
turais são distintas, pois possuem características específicas. Como
exemplo, no Tocantins, devido à sua extensão, é possível encontrar-
mos diversas manifestações artísticas e folclóricas como: Cavalhadas,
Congo ou Congadas, Festa de Nossa Senhora da Natividade, Festa
do Divino Espírito Santo, Festejos de Nossa Senhora do Rosário,
Folia de Reis, Os Caretas, Roda de São Gonçalo, Sússia e Jiquitaia
(PORTAL TOCANTINS, 20017) além das manifestações dos in-
dígenas Apinayé e comunidades quilombolas.
Com essa preocupação os autores Vieira (2001), e Pereira
(2012; 2013; 2014) verificaram o modelo conservatorial / habitus
conservatorial, nas universidades que é “permanência de práticas tra-
dicionais típicas dos Conservatórios de Música nas instituições con-
temporâneas de Ensino Superior” (PEREIRA, 2013, p. 225).
Se pensarmos que essas universidades estão preparando profes-
sores sem a devida preocupação com a diversidade cultural do país,
como esses professores resolverão os problemas encontrados em sala
de aula sem a devida preparação sobre a educação musical a partir
da cultura local? Prioriza-se a formação de performances de alto ní-
vel, quer sejam instrumentistas, cantores, regentes, ou compositores
(VIEIRA, 2001, p. 21) o que não apresentaria nenhum problema se
217
os professores fossem formados para lecionarem em conservatórios.
No entanto, esses futuros professores estarão na linha de frente das
escolas com sujeitos de diversas culturas. Portanto, como trazer um
currículo conservatorial para uma realidade totalmente diferente?
Pereira (2014, p. 91) deixa claro sua preocupação referente à forma-
ção de professores. O autor relata que os “currículos parecem des-
considerar a realidade musical das escolas e, principalmente, de seus
alunos” (PEREIRA, 2014, p. 91) e isso torna-se, a longo prazo, um
problema sério visto que estes formarão outros estudantes sem con-
sideração pelas culturas locais.
É preciso um olhar atento do professor/regente do curso de
Educação do Campo com habilitação em Artes e Música da UFT,
campus de Tocantinópolis, para esse fenômeno. Deve ser um olhar
de um professor da subárea Educação Musical, com bastante cautela,
um olhar analítico, pois se trata de formar futuros professores que
formarão outros alunos.
O curso em questão habilita em Artes e Música. Ambas estão
inseridas em na grande área Linguística, Letras e Artes (CGEE, 2015,
p. 25). A Música se desenvolve em consonância com as demais áreas
do conhecimento e isso tem favorecido a produção do conhecimento
(DEL-BEN, 2001). Para Queiroz (2017, p. 163) “a educação musical
está em constante processo de mutação, ora mantendo e incorporando
traços culturais consolidados, ora redefinido e transformando sua prá-
xis a partir do diálogo com tendências, questões, problemas e necessi-
dades do mundo atual”. Fica claro que a interação do professor/regente
não é somente com os docentes, em muros fechados da universidade,
mas com a comunidade em geral, o saber e a cultura.
O coro tratado aqui é formado por alunos / cantores inscritos
na disciplina Prática Coral I e II do campus de Tocantinópolis. As
aulas acontecem pela manhã, geralmente uma vez por semana das 8h
às 12h. São sessenta e dois inscritos na disciplina. Sete são indígenas
do grupo étnico Apinayé. Do total de alunos inscritos, quarenta e
oito são assíduos, isso representa 77,28%.
218
Segundo o Projeto Pedagógico do Curso o objetivo geral da
disciplina é “ampliar os recursos da voz cantada em grupo, desenvol-
vendo conhecimento sobre técnica, saúde e entonação vocal através
do estudo das particularidades básicas do Canto Coral”. Os especí-
ficos são: “desenvolver o canto em grupo; realizar o estudo do reper-
tório através do kit de ensaio; entender como se dá a organização do
coral bem como a formação de diversos grupos vocais” (UFT, 2016).
Com base nos objetivos, dividimos a aula em três momentos: intro-
dução, preparação técnica e desenvolvimento (MATHIAS, 1986, p. 28).
Seguindo o esquema de ensaio de Mathias (1986) fizemos algumas modi-
ficações devido a particularidades do coro, conforme quadro abaixo6.
219
Na introdução, optamos por reforçar os estudos teóricos, de
leitura musical, uma vez que 98% dos alunos nunca tiveram conta-
to com o ensino da música antes de entrar na universidade. Zander
(2008, p. 159) diz que “a leitura musical é um imperativo e não de-
veria nunca ser deixada de lado”, é uma “necessidade”. Por esta razão,
trabalhamos a leitura musical no início das aulas de canto coral.
No segundo momento, acontece a preparação psicológica para
o ensaio (no esquema de Mathias essa preparação seria no primeiro
momento) e musical “para um melhor rendimento na realização do
repertório” (MATHIAS, 1986, p. 28). Na preparação técnica faze-
mos os exercícios de calistenia, “que são os exercícios de aquecimento
corporal e alongamento, de respiração e relaxamento físico e desa-
quecimento, e aquecimento vocal” ( JUNKER, 2013a, p. 85).
E por fim, o terceiro momento, o desenvolvimento. É nesse
momento que acontece o ensaio das obras: peças novas; peças a se-
rem trabalhadas no intuito de juntar as vozes, efeitos sonoros, etc.; e
a interpretação.
220
Porém, como o foco se trata de interações pedagógicas, des-
tacarei as falas a respeito desse tema. A esse respeito os mais expe-
rientes destacaram a importância da metodologia usada nas aulas de
canto coral. “A forma como o senhor ensina é maravilhosa” disse o
decana (aluno 1) do grupo, sobre as várias atividades propostas para
o entendimento do assunto. Outros dois alunos, 3 e 4, disseram estar
motivados, pois a forma como eram passados os conteúdos, “só não
aprendia quem não quisesse”. O feedback dos alunos foi muito impor-
tante para sabermos como as atividades estavam sendo assimiladas,
percebidas. Pois, muitas vezes “não vemos as coisas como são, mas
como somos” (DEMO, 2012).
As aulas se mostraram atrativas, apesar das dificuldades, pois a
grande maioria ainda não haviam tido aulas de música, menos de 5%
tocavam algum instrumento. A aluna 5 expõe a seguir suas observa-
ções a esse respeito:
221
que: A10: “a metodologia de ensino foi muito bem articulada” segundo
ele, para um melhor rendimento, os alunos deveriam fazer os exercícios
propostos em suas casas para que as aulas fossem mais bem aproveitas.
Importante destacar que esses discentes / coristas irão para as
escolas futuramente. O fato da socialização não é somente pessoal,
mas uma prática docente, como um estágio. Eles se reúnem e ensi-
nam, dão dicas para o colega e isso se configura como aprendizagem.
Sobre isso, Dias (2012) diz:
222
aluna 4 disse que, apesar de não estarem prontas, “o resultado, até o
momento, foi melodias sendo executadas por nós maravilhosamente.
Apesar de não está concluída, estamos no caminho certo, e acredito
que realizaremos um excelente trabalho juntos”.
223
indivíduos. O autor diz que o termo “encontro” é bem apropriado.
São nesses encontros, ou interação focalizada, que inevitavelmente
as pessoas interagem, trocam informações e se comunicam. Há uma
cooperação entre os indivíduos.
As interações nas atividades de canto coral – quer sejam em
projetos em empresas, igrejas, em universidades como atividades de
extensão ou disciplinas – já fazem parte da metodologia de ensino7
desde a parte de preparação técnica. Na preparação técnica há exercí-
cios, dinâmica de grupo, que chamamos de desenvolvimento huma-
no. Tais exercícios contribuem para um bom relacionamento entre
todos do grupo (MATHIAS, 1986; ROCHA, 2004, p. 168). Nesse
sentido, Dias (2012, p. 135) diz que,
224
entre alunos e alunos, e entre alunos e professores de forma mais
aproximada dentro da sala de aula. Em uma das aulas/ensaio, um
dos alunos indígenas pediu-me um momento, após a aula. O mesmo
falou-me o quanto estava feliz pelas aulas de Prática Coral e queria
mostrar-me umas de suas composições. Ocorreu também que três
alunos após o término da aula, contaram-me sobre sua paixão pela
música, sonhos a respeito da profissão e suas experiências. Com o
tempo, a partir das interações na sala de aula, os laços de amizades
surgiram. Isso ocorre, porque segundo Bauman (2003, apud DIAS,
2012, p. 136):
225
2.4 Quais são os aspectos mais importantes
desenvolvidos por meio da prática do canto coral?
226
quanto as qualidades que moldam a personalidade, o que evidencia a
importância dessa atividade.
Retomando, de acordo com Cartolano (1968, p. 22-23, apud
JUNKER, 1999, p. 109) os aspectos desenvolvidos pela atividade
canto coral são: físico, que são desenvolvidos nas atividades de res-
piração; moral, a partir das próprias canções aprimorando o senso
estético; social, onde o respeito é ensinado. Todos esses aspectos são
desenvolvidos na disciplina Prática Coral I, e II: as atividades de res-
piração são feitas com o objetivo de resolver problemas técnicos de
cada peça; o aspecto moral é exercitado no momento que valoriza-
mos aquilo que o discente já sabe, sua cultura, seu gosto musical. É
uma decisão conjunta. O aspecto social é bastante enfatizado logo no
início da atividade onde explicamos que o canto é coletivo, não há es-
trelismo, o sucesso é coletivo. Nessa atividade ninguém é melhor que
ninguém; dependemos um do outro para alcançarmos os objetivos.
3 Considerações finais
227
A atividade de canto coral conduzira ao estabelecimento de
aproximações entre indivíduos e ao desenvolvimento da capacidade
de convivência dos alunos. Isso pode ser comprovado em todos os
momentos da aula, desde a parte introdutória, preparação técnica, até
o desenvolvimento através da aprendizagem colaborativa.
Sem dúvida, a questão mais complexa de responder foi a respeito
da proposta pedagógica ideal para o ensino da música na Educação do
Campo. A esse respeito, penso que este trabalho na verdade trata-se de
uma contribuição aberta ao diálogo. No entanto, acredito que a educa-
ção musical deve seguir os pensamentos de autores que veem a música
sendo cultura (QUEIROZ, 2017), que a música deve ser ensinada a
partir daquilo que o indivíduo já sabe (SLOBODA, 2008), e que o
gosto musical é de forma diretamente influenciado pelos ambientes
cultural, social e familiar em que vivem (PINHEIRO, 1997).
Esta pesquisa é um breve panorama e é propício porque alarga o
espectro de pesquisas para esse campo tão novo e cheio de possibilidades.
Souza (2014) sugeriu “inventariar um catálogo de temas para investiga-
ções” para a Educação Musical. Pensando em temas do nosso contexto,
alguns exemplos poderiam ser: a música quilombola, a música na etnia
Apinayé e a música nas cidades da região do Bico do Papagaio.
Fica evidente tamanha a responsabilidade do regente não so-
mente aos aspectos estéticos da realização sonora, mas também em
relação aos aspectos educacionais. O regente da atualidade precisa
assegurar uma aprendizagem além da musical, deve ser uma apren-
dizagem significativa, n qual o conjunto de cantores possa vivenciar
experiências em diferentes dimensões8.
Esperamos que este capítulo possa vir a servir de referência para
discentes, docentes, pesquisadores, e o público em geral, de forma a
contribuir com a melhoria da qualidade do ensino e aprendizagem
da música na Educação do Campo em diversos espaços educacionais.
228
REFERÊNCIAS
229
Goiânia: Abem, 2010.
230
JUNKER, D. B. A importância do canto coral. In: Convenção
Internacional de Regentes de Coros. Anais... p. 15-18. Brasília, jul./
ago., 1999.
231
MIRANDA, C. F.; COVER, M. Interdisciplinaridade e licenciatu-
ra em Educação do Campo. In: SILVA, C. et al. (Orgs.). Educação
do campo, artes e formação docente. Palmas/TO: EDUFT, 2016,
p. 87-104.
232
de um estudo sobre música popular e identidade. In: XXI Congres-
so da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Músi-
ca. Anais..., Uberlândia, 2011.
233
turais/>. Acesso em: 23 ago. 17.
234
Música, 9, Rio de Janeiro. Anais..., p. 80-86, Rio de Janeiro, 1996.
235
9 – A viola de buriti da comunidade
Mumbuca: a pesquisa participativa
para a compreensão da prática
musical
1 Introdução
236
quisadores envolvidos, que teve como mote investigativo a viola de
buriti e o relato dos mesmos sobre o impacto da pesquisa sob a ótica
da própria comunidade.
Para situar o trabalho, apresentaremos inicialmente uma breve
fundamentação teórica sobre a Pesquisa Participativa, a Educação do
Campo e a Etnomusicologia Aplicada.
A especificidade desse trabalho situa-se em uma área de pes-
quisa conhecida por Etnomusicologia Aplicada / Participativa. Por
não ser familiar aos estudos em Educação do Campo, apresentamos
inicialmente a noção sobre Etnomusicologia Aplicada, demonstran-
do sua estreita relação metodológica com a Educação do Campo,
incluindo as impressões dos pesquisadores sobre o processo da pes-
quisa participativa, enquanto pesquisadores-pesquisados da própria
comunidade. Ao final, apontamos os primeiros resultados do traba-
lho de campo realizado, que fará parte do dossiê que o grupo vem
elaborando para atender à principal demanda comunitária e geradora
dessa pesquisa: a inscrição da viola de buriti como patrimônio ima-
terial junto ao Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional
– IPHAN.
A “viola de buriti” ou “violinha de vereda”, como também é co-
nhecida, é um instrumento produzido e usado nas práticas musicais
desse povoado. Tem como matéria-prima de sua construção o talo da
palmeira do buriti (Mauritia Flexuosa), planta muito abundante na
região, sobretudo nas áreas conhecidas como “veredas”, pelos mora-
dores locais, justificando seu apelido carinhoso. O uso desse instru-
mento relaciona-se também com as práticas musicais ancestrais desse
povoado, instigando os pesquisadores e pesquisadoras a fazerem um
mapeamento dos seus principais tocadores, sua abrangência e suas
possíveis origens na região.
A prática musical assume diversos significados a depender do
contexto em que ocorre e aqui está sendo considerada:
237
como um processo de significado social, capaz de
gerar estruturas que vão além de seus aspectos me-
ramente sonoros, embora estes também tenham um
papel importante na sua constituição [...]. A execução,
com seus diferentes elementos (participantes, inter-
pretação, comunicação corporal, elementos acústicos,
texto e significados diversos) seria uma maneira de
viver experiências no grupo. Assim, suas origens prin-
cipais têm uma raiz social dada dentro das forças em
ação dentro do grupo, mais do que criadas no próprio
âmago da atividade musical. Isto é, a sociedade como
um todo é que definirá o que é música. A definição
do que é música toma um caráter especialmente ideo-
lógico. A música será então um equilíbrio entre um
“campo” de possibilidades dadas socialmente e uma
ação individual, ou subjetiva (CHADA, 2007, p. 127).
238
Figura 9.1 – Pesquisadores (as) /acadêmicos (as) da Educação do Campo, violeiros
e futuros (as) tocadores (as) nas “veredas”, em trabalho de campo na Comunidade
Quilombola Mumbuca, em Mateiros, região do Jalapão/TO.
Fonte: Foto e acervo de Marcus Bonilla.
239
Nosso olhar, como não poderia ser diferente, é pelo viés da
Educação do Campo, ou seja, vem carregado de um forte caráter
de valorização humana nos processos de pesquisa, além de um po-
sicionamento político em prol das causas camponesas e dos grupos
minoritários. Como já vem sendo demonstrado em outras publica-
ções (BONILLA; CHADA, 2017; BONILLA; SILVA; CHADA,
2017), a metodologia que adotamos nos processos de pesquisa foi
a Etnomusicologia Aplicada / Participativa, por sua estreita relação
com as práticas da Educação do Campo. Antes de entrarmos nas
concepções êmicas, e considerando que esse livro está voltado para a
área de Educação do Campo, vale fazer uma breve conceituação e es-
tabelecer os limites de abrangência sobre a área da Etnomusicologia
e sobre a metodologia adotada.
A Etnomusicologia é uma área dos estudos em Música que se
situa em uma região interdisciplinar e transdisciplinar, envolvendo
áreas como a Musicologia e a Antropologia, com limites tênues en-
tre elas. O grande desafio da Etnomusicologia talvez seja o de rela-
cionar Música, um subsistema, com todos os outros subsistemas da
Cultura, na busca de um entendimento do que ela possa representar
para o ser humano que a produz e explicar a conexão entre Música
e seu contexto sociocultural, com base nos processos cognitivos do
ser humano e de sua experiência social. A Etnomusicologia não se
ocupa apenas do estudo da Música, mas também do ser humano
que faz a Música. Assim sendo, são de fundamental importância
para esses estudos as relações dos elementos cognitivos e sociocul-
turais que determinam a relação da Música com o seu contexto, a
inserção da Música nas diferentes atividades sociais e os múltiplos
significados decorrentes dessa interação.
Alguns autores, referência na área, tratam esses estudos com
outros nomes, como no caso de Kerman (1987), que a chama de
“Musicologia cultural”, ou Alan Merriam (1964), como “Antropo-
logia da música” e, em um sentido muito próximo do nosso enten-
240
dimento, Seeger (2015), que a denomina de “Antropologia musical”
– as “performances musicais criam muitos dos aspectos da cultura
e da vida social [...] examina a maneira como a música faz parte
da própria construção e interpretação das relações e dos processos
sociais e conceituais” (p. 14-15). Partindo desse entendimento, esse
trabalho foca principalmente na importância que os instrumentos
musicais desempenham nos processos culturais e de vida nas práticas
musicais desse povoado.
Na grande área da Música, a Etnomusicologia, em especial,
tem adotado posturas metodológicas mais vanguardistas, com base
em opções de pensamentos pós-modernos, como no caso da apro-
priação da pesquisa aplicada, participativa, pesquisa-ação, entre ou-
tros nomes. Essa metodologia, ou metodologias, rompem alguns pa-
radigmas, até então, intocados das ciências, tais como a “neutralidade
científica”, assim como desmistifica a hierarquização existente entre
o conhecimento “científico” e o conhecimento “popular”:
241
vimentos da cultura popular na década de 1960, nos traz os ques-
tionamentos dos manifestos da época em relação à neutralidade,
apontando que é justamente com a interação entre as pessoas, com
diferentes concepções e culturas que o conhecimento pode ser criado
a partir da realidade. Em relação aos conhecimentos populares, o au-
tor nos apresenta princípios equânimes:
242
que os conhecimentos de uma pesquisa participante
devem ser produzidos, lidos e integrados como uma
forma alternativa emancipatória de saber popular
(BRANDÃO; BORGES, 2007, p. 55).
243
Brasil como os de Angela Impey (2002), com o processo de empo-
deramento cultural / musical de comunidades tradicionais rurais em
Northern Kwazulu-Natal, na África do Sul e os estudos de Catheri-
ne Ellis (1994) que incluiu tanto pesquisadores acadêmicos quanto
os próprios aborígenes nos processos da criação do Centro de Estu-
dos Aborígenes de Música – CASM, da Universidade de Adelaide,
na Austrália.
No Brasil, o pesquisador Samuel Araújo e o grupo de pesquisa
Musicultura foram pioneiros na área de Etnomusicologia Aplicada
com trabalhos de empoderamento cultural e musical na favela da
Maré, no Rio de Janeiro, atuando com os pesquisadores da própria
comunidade no mapeamento do material sonoro de diferentes re-
giões desse complexo (ARAÚJO; MUSICULTURA, 2006; CAM-
BRIA, 2008).
Essa metodologia tem se ampliado bastante nas últimas déca-
das no Brasil. Podemos citar vários trabalhos, tais como o desenvol-
vimento do projeto Arte em toda parte, em Belém do Pará (CHADA
et al., 2015). Ainda o registro das músicas dos povos Timbira em ar-
quivos de áudio armazenados na cidade de Carolina/MA, com apoio
de ONG Indigenista. Esse material foi idealizado e protagonizado
por grupos indígenas dessa etnia, distribuídos pelos Estados do Ma-
ranhão, Pará e Tocantins (TYGEL, 2008).
O projeto Encontro de Saberes, desenvolvido em sete Univer-
sidades brasileiras, contou com a contratação de Mestres da Cul-
tura Popular, entre eles, da Congada de Moçambique e de gêneros
tradicionais performáticos do Pará (CARVALHO et al., 2016). No
Recôncavo Baiano encontramos também importantes trabalhos nes-
sa perspectiva participativa, como o de Doring (2015; 2016) e o de
Marques (2008a; 2008b), trabalhos etnomusicológicos e de Educa-
ção Musical. Há ainda muitos outros trabalhos que utilizam-se de
diferentes tipos de metodologias participativas primando pelo prota-
gonismo e interesse dos diferentes grupos humanos envolvidos.
244
Diante dessa breve revisão bibliográfica, percebemos que a
adoção desse tipo de metodologia já é amplamente utilizada em di-
ferentes áreas, sobretudo nos estudos com música, assim como bem
aceita em certos ambientes acadêmicos e, pelo nosso entendimento,
é uma importante ligação da Etnomusicologia com a Educação do
Campo, o que nos ampara para justificarmos o uso dessa metodolo-
gia como a principal ferramenta desta pesquisa.
Fazendo um breve histórico, a pesquisa nasceu a partir de con-
tatos estabelecidos nos tempos comunidade, realizados no povoado
Mumbuca, uma das etapas da pedagogia da alternância2, adotada no
curso de Educação do Campo. Esse contato inicial foi fundamental
para se estabelecer uma relação de confiança mútua entre o pesqui-
sador externo, na ocasião docente do curso, e os pesquisadores da
comunidade, discentes desse curso.
A partir desse contato, a ideia da pesquisa foi amadurecendo
entre os envolvidos, até a primeira reunião com os representantes,
lideranças e mestres da cultura popular desse povoado ocorrida em
fevereiro de 2017. Nessa ocasião, criou-se um grupo de pesquisa para
uma ação participativa, envolvendo não apenas os discentes já cita-
dos, mas também outros pesquisadores do povoado interessados.
Conforme descrito em Bonilla, Silva e Chada (2017), o acordo
com a comunidade, estabelecido nesse encontro, se deu nos seguintes
termos:
a) O registro das produções musicais da comunida-
de de forma escrita (partitura), por entender de se
tratar simbolicamente da “linguagem dos brancos”.
Esse registro poderá trazer benefícios futuros, seja
245
por facilitar a publicação dessas obras em forma-
to de livro (songbook), como pela segurança jurídica,
possibilitando o registro de direitos autorais junto à
Biblioteca Nacional. [...]. b) Realizar a inscrição do
instrumento produzido pela comunidade, a viola de
buriti, junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e
Artístico Nacional – Iphan, como patrimônio cultural
imaterial, assim como a solicitação de fomento para a
manutenção do mesmo na comunidade. Esse trabalho
está sendo o principal foco da pesquisa, por demandar
maior empenho de todos os pesquisadores, e está sen-
do construído de forma coletiva com a aplicação do
Inventário Participativo (IPHAN, 2016), fornecido
pelo instituto, e que contará com dossiês e um docu-
mentário. c) Apoio e fomento acadêmico para os (as)
pesquisadores (as) da comunidade. Existe o enten-
dimento entre as partes envolvidas de que essa pes-
quisa deve contribuir para a ampliação da formação
acadêmica dos (as) pesquisadores (as) da comunidade.
Isso está acontecendo, tanto na prática do trabalho de
campo quanto na produção de artigos em parcerias
com o grupo ou parte dele.
246
a inserção dos pesquisadores nativos em diálogo está-
vel e mutuamente reflexivo com membros da acade-
mia possui potencial para transformar profundamente
não somente o produto gerado, mas os processos de
produção e as instituições envolvidas (MUSICUL-
TURA, 2010, p. 164).
247
sas canções tem como guia a improvisação sobre os acontecimentos
do cotidiano e as situações vivenciadas pelas pessoas envolvidas.
Um dos aspectos mais importantes da Roda Chata está no
registro das histórias, dos acontecimentos e dos fatos ocorridos na
comunidade em forma de Música, mediados pela improvisação nos
versos, e sua consequente consolidação nas letras das canções. Trata-
-se de uma das principais ferramentas da comunidade para a ativa-
ção e perpetuação da memória coletiva entre os mais velhos, e como
método de transmissão – pedagogia para educação dos mais novos,
visto que esses encontros envolvem todas as gerações. Vale lembrar,
que a forma escrita em papel usada no “mundo dos brancos”, sempre
foi uma realidade distante, sobretudo para as lideranças e os anciões
do povoado. Infelizmente, devido a uma série de questões culturais
e religiosas ligadas à comunidade, essa prática tem se tornando cada
vez mais rara, com sérios riscos de extinção.
O contexto no qual o grupo realiza a sua prática musical tam-
bém interfere no processo de criação e transmissão musical, bem
como a maneira de sentir e reagir dos participantes. Encontramos
suporte para tais afirmações em Merriam (1964, p. 184), quando
aborda a questão de aceitação e rejeição das cantigas por parte dos
participantes, bem como as técnicas de composição:
248
mente intensa, a transposição, e a composição vinda
da idiossincrasia individual. A composição de textos
é tão importante quanto a estrutura sonora. A com-
posição envolve aprendizado, está sujeita à aceitação
ou rejeição pública, e é, portanto, parte do processo de
aprendizagem que contribui, por sua vez, para os pro-
cessos de estabilidade e mudança (tradução nossa)3.
249
logo, os resultados não foram disponibilizados nem discutidos entre
a autora e a comunidade.
Para Freire (2014), a construção do conhecimento acontece na
dialogicidade entre os sujeitos envolvidos e a realidade. Em um texto
específico sobre a pesquisa participativa, Freire nos coloca que “sim-
plesmente, não posso conhecer a realidade de que participam a não
ser com eles como sujeitos também desse conhecimento que, sendo
para eles, um conhecimento do conhecimento anterior” (FREIRE,
1981, p. 35).
Acreditamos que a inobservância dessa relação pode acarretar
algumas armadilhas, e cair no que Geertz (1989), apropriando-se de
um termo de Gilbert Ryle, denominou de “descrição superficial”, ao
descrever a complexidade de interpretar o significado de uma simples
“piscadela” em um contexto de campo, em oposição a uma “descrição
densa” desejável.
Entre os membros da comunidade Mumbuca, a Roda Chata
acontecia com certa regularidade durante as colheitas de alimentos
até o ano de 2004, quando foi realizada pela última vez. Em 2010,
para fins da gravação de um documentário (MEDINA, 2010), al-
gumas partes da brincadeira foram recriadas com um caráter dife-
renciado do que acontecia até o ano de 2004. Essa diferenciação se
deu principalmente por duas razões: 1 – por ter sido feita no próprio
território da comunidade e não nas roças (arroz, feijão ou mandioca)
e 2 – por ter envolvido pessoas de fora da comunidade, tais como
turistas, pesquisadores e os próprios produtores do documentário.
Sobre esse segundo aspecto, é importante pontuar novamente que,
para eles, a Roda Chata somente é entendida como tal, quando é
feita por e para o povoado, e não acontece com a presença de turistas
ou pessoas de fora da comunidade. Porém, foi na ocasião da grava-
ção desse documentário que a pesquisadora que tratou sobre a Roda
Chata esteve na comunidade e fez seu trabalho de campo. Em sua
dissertação, podemos observar algumas críticas sobre a legitimidade
250
da manifestação que causou descontentamento entre os membros da
comunidade, como na seguinte afirmação:
251
Parece que estamos em uma fase, na qual uma pesqui-
sa não deve ser pensada ou realizada sem uma efetiva
discussão de seu contexto e seus objetivos com aqueles
sujeitos, diretamente envolvidos naquela pesquisa, o
que traz a necessidade de pensar também em ques-
tões como responsabilidade social, ética e outros te-
mas e fomentar efetivamente propostas colaborativas
(LÜHNING, 2014, p. 16).
4 Foi produzido outro artigo coletivo com críticas específicas a estes trabalhos citados,
porém o mesmo encontra-se ainda em avaliação para possível publicação.
252
De volta à questão da viola, atualmente o toque da viola de
buriti é o mais praticado em momentos especiais, tais como na Festa
da Colheita5, e também durante as cantorias tradicionais nas noites do
mês de julho, ao redor da fogueira. Por outro lado, alguns músicos do
povoado realizam apresentações e fazem shows com a viola de for-
ma independente, em locais fora da comunidade. O artista de maior
projeção da comunidade, Maurício Ribeiro, por exemplo, nos anos de
2015 e 2016, excursionou por todo o Brasil pelo projeto Sonora Brasil
– violas brasileiras, produzido pelo Sesc, divulgando o instrumento
em cerca de 130 cidades espalhadas por todos os estados brasileiros
(SESC, 2015).
A utilização da viola de buriti nas práticas musicais da Comu-
nidade Mumbuca é significativa, simbolizando a sua cultura, seus so-
nhos, ideais, o esforço coletivo, marcando a sua existência. Através da
prática musical, a comunidade compartilha vivências e experiências
que se multiplicam e se imprimem no modo de ser do grupo. Assim,
as ideias e os conceitos expressos musicalmente podem ser interpre-
tados de acordo com o sistema cultural no qual se inserem.
A Música, nesse contexto, é interpretada como um sistema de
representações que fornecem explicações sobre como o grupo pensa
a si próprio e o mundo que o rodeia, como também uma forma de
identificação étnica entre indivíduo e grupo. Como linguagem dotada
de alta expressividade, “símbolo não consumado”, como a vê Susan-
ne Langer (1989, p. 238), a música reflete melhor que qualquer outra
linguagem as nuances afetivas dos indivíduos e dos grupos que a pra-
ticam. Através da observação da prática musical é possível identificar
paralelos entre as manifestações expressivas e as respectivas estruturas
253
sociais, sendo a representação musical uma leitura das questões sociais.
O sistema musical reflete, assim, o sistema cognitivo dos participantes,
seus sentimentos, suas experiências culturais, além de suas atividades
sociais, intelectuais e musicais.
Outro aspecto observado é sobre a importância do processo
participativo como aprendizado, tanto do que o grupo tem aprendido
sobre a própria comunidade quanto também das técnicas e dos pro-
cessos de pesquisa e conhecimentos que transcendem a sala de aula.
Por outro lado, aprendemos e passamos a valorizar nossa cultura e as
estratégias da educação não formal, aquelas adotadas pelos mestres
e mestras da cultura popular na transmissão de seus conhecimentos
para as novas gerações.
O que o grupo vem observando é que nos espaços formais de
ensino os conhecimentos produzidos no e pelo povoado não têm sido
abordados e nem são considerados relevantes no ambiente e no con-
texto escolar. O que é oferecido como referência são sempre aspectos
de outras culturas. Mesmo cientes de sua importância, o que acontece
é que a forma hegemônica com que esses conhecimentos são trans-
mitidos ou impostos acarretam na desvalorização das produções dos
artefatos e conhecimentos locais. Como temos discutido no grupo de
pesquisa “Acabamos achando que o que temos não é Cultura, por não
apresentar semelhança com o que é apontado como importante nos
espaços de ensino formal”.
Outro aspecto interessante dessa metodologia que viemos ado-
tando a partir da realização desse trabalho é o de despertar o pensa-
mento crítico no sentido de questionar o eurocentrismo normativo
dos conteúdos escolares hegemônicos, adotados também nas escolas
da região, inclusive durante a nossa própria escolarização, mesmo que
agora estejamos na condição de pesquisadores. Nesse sentido, o desa-
fio maior que enfrentamos é o da desconstrução desse tipo hierárqui-
co de seleção de conteúdos, passando a valorizar e entender também
o legado histórico deixado pelos antepassados da comunidade.
254
A partir dessa pesquisa, começamos por valorizar os processos
históricos e culturais do uso e da produção da viola de buriti, que
estamos entendendo que vai muito além do objeto em si, tratando-se
de um legado cultural que passa a ser explorado e apropriado pelos
próprios moradores. A viola de buriti na comunidade está e sempre
esteve viva. Carrega consigo alegria, companheirismo, histórias, vi-
tórias e valores, trilhando seu caminho junto a um povo resistente e
forte. Sentimo-nos instigados a entender os processos que fizeram
com que essa viola chegasse à nossa geração, e assim poder contribuir
para a sua preservação.
O processo da pesquisa participativa sobre a viola de buriti,
mesmo que ainda em andamento, já trouxe alguns ganhos para a co-
munidade, confirmando a tese de que com esse tipo de metodologia
os processos são mais importantes que os objetivos. Destacamos aqui,
principalmente, a produção acadêmica envolvendo os membros da
comunidade em publicações escritas recentemente, como no caso de:
Bonilla, Silva e Chada (2017); Bonilla, Chada e Mumbuca (2017),
além do texto que originou essa publicação, Bonilla et al., (2017).
Publicações essas que estão qualificando o dossiê participativo ne-
cessário para o registro na viola junto ao Iphan, conforme o desejo
da comunidade.
Por outro lado, a comunidade vive um momento de exposição
midiática em decorrência da gravação de uma novela que é exibida
em horário nobre por uma emissora de televisão com projeção nacio-
nal, envolvendo histórias e personagens dessa comunidade. Diante
disso, o registro das partituras das músicas produzidas pelos artistas
do povoado se faz urgente e necessário, sobretudo porque algumas
dessas músicas fizeram parte da trilha sonora da telenovela. É o caso
da obra Tradição do Jalapão, cujos versos acompanham e ilustram po-
eticamente a leitura desse capítulo, composta pelos mestres Arnon
Tavares e Maurício Ribeiro e pela discente do curso de Educação do
Campo e pesquisadora desse projeto Sirlene Matos da Silva. Para
255
ilustrar esse capítulo, colocamos no apêndice o registro da partitura
musical dessa obra, representando o seu contorno melódico e rítmico.
Como pesquisadores, pesquisadoras e membros da comunida-
de, temos a certeza de que essa pesquisa, mediada pela metodologia
da pesquisa-ação participativa/ Etnomusicologia Aplicada, está con-
tribuindo para a valorização da viola de buriti, o que é importante
e tem trazido benefícios para os moradores do povoado. O registro
coletivo desse texto, somados aos registros que sempre tivemos da
tradição oral e dos já “eternizados” nas músicas da comunidade, re-
presentam um ganho simbólico e de empoderamento dessas pessoas
diante das constantes ameaças a seus patrimônios imateriais.
Referências
256
BONILLA, M. F.; SILVA, A. C. M.; CHADA, S. M. M. A violi-
nha de buriti da comunidade Mumbuca: por uma etnomusicologia
participativa. In: VI SIMA – Simpósio Internacional de Música na
Amazônia. Anais..., Macapá, UFAP, 2017. (no prelo)
257
CAMBRIA, V. Novas estratégias na pesquisa musical: pesquisa
participativa e etnomusicologia. In: ARAÚJO, S.; PAZ, G.; CAM-
BRIA, V. (Orgs.). Música em debate: perspectivas interdisciplina-
res. Rio de Janeiro: Mauad X: FAPERJ, 2008, p. 199-211.
258
______. Pedagogia do oprimido. 58. ed. Rio de Janeiro/ São Paulo:
Paz e Terra, 2014.
259
______. Educação comunitária como prática de etnomusicologia
aplicada: reflexões sobre uma experiência no Recôncavo baiano.
Revista USP, São Paulo, n.78, p. 130-138, junho/agosto, 2008b.
SEEGER, A. Por que cantam os Kisêdjê. São Paulo: Cosac Naify, 2015.
260
______. Pedagogia da alternância: prática de letramentos em uma
escola família agrícola brasileira. 2018. 232f. Tese (Doutorado em
Letras). Universidade Federal do Tocantins, Araguaína, 2018.
261
APÊNDICE
Partitura da música e letra de Tradição do Jalapão. Composta
por mestres da comunidade e uma acadêmica/pesquisadora da Edu-
cação do Campo, todos moradores da comunidade Mumbuca.
262
10 – Educação Musical e a
Educação do Campo: primeiras
aproximações...
1 Introdução
263
A verdadeira EM1 humanística (aquela preocupada
com o crescimento do indivíduo como um todo) está
ligada ao ensino da música como prática humana di-
versificada. Do confronto entre os significados cultu-
rais e ideológicos de culturas musicais não familiares,
surge a oportunidade de conhecer a diferença e de
descobrir que o que parece natural e comum pode não
ser (LAZZARIN, 2006, p. 129).
1 Educação Musical.
264
sicalmente, em um diálogo vital com os valores e elementos funda-
mentais da vida” (ELLIOTT, 1995, p. 308).
Também, há que considerarmos a prática musical como um fe-
nômeno com diversas imbricações, como um fato social total. Mar-
cel Mauss explica que para interpretar um fato social como total, é
imprescindível “ponderar a conduta das pessoas como um todo e não
dividida em faculdades”, vinculando “o físico, o fisiológico, o psíquico
e os aspectos sociais” do indivíduo (MAUSS, 2003, p. 23). A música
também está permeada de diversos aspectos culturais. Paulo Freire de-
fende uma extensão humanística que transcende diversas dimensões:
265
subjetividade, demandando um engajamento na busca de diversas
teorias, diferentes metodologias, abertura a distintas crenças e aos
diferentes valores que são dados pelos indivíduos. Sobre isso, Jorgen-
sen expõe sua opinião:
266
O protagonismo dos movimentos sociais camponeses
no batismo originário da Educação do Campo nos
ajuda a puxar o fio de alguns nexos estruturantes desta
“experiência”, e, portanto, nos ajuda na compreensão
do que essencialmente ela é e na “consciência de mu-
dança” que assinala e projeta para além dela mesma
(CALDART, 2014, p. 259).
267
A educação do campo representa a quebra de um paradigma
que permitia entender o campo como algo ligado ao atraso, à subcul-
tura, à visão hegemônica de que o moderno é mais avançado (CAL-
DART, 2004). Essa democratização de saberes e acesso a recursos
permite não só inclusão, mas estabelece a possibilidade de se pensar
políticas públicas voltadas à especificidade do campo e às suas popu-
lações. Essa democratização é descrita por Arroyo, Caldart, Molina:
268
simples, dentro das quais pelo fio dos anos a menina
camponesa aprende com a mãe, até as relações com-
plexas de uma equipe estável de trabalho ritual, por
toda a parte, onde se quer que sujeitos sociais troquem
bens e serviços, há também trocas de símbolos atra-
vés dos quais entre si eles se ensinam-e-aprendem.
(BRANDÃO, 1983, p. 100).
269
cação popular, haja visto, o objeto deste texto não se dedica a isso,
mas queremos avultar a costura existente entre a educação musical e
esses fenômenos educacionais que atentam para diferentes contextos,
diferentes sujeitos, pensando no ensino e na aprendizagem a partir
de um modelo alternativo, parcial ou totalmente distinto daquele que
existe, como descreve Streck (2006).
Este formato de educação que considera o saber do povo nasce
também do inconformismo como descreve Gadotti:
270
metodologias, mas recursos diferenciados.
O ingresso de alunos no curso se dá pelo vestibular. As vagas
são distribuídas por meio de quatro maneiras: o Sistema Universal, o
Sistema de Cotas para Etnia Indígena, Sistema de Cotas para Quilom-
bolas e o Sistema de aplicação da Lei n. 12.711/2012, devendo o aluno
optar por um desses sistemas.
As aulas são feitas na perspectiva da pedagogia da alternância,
ou seja, o período de aulas em sala é intercalado com as demandas
pessoais do aluno tais como realização da colheita e a atenção para
as criações de animais ou outras obrigações com o sustento familiar,
tendo sido esta proposta metodológica pensada por camponeses na
França em 1935. A alternância atende atualmente também à dimi-
nuição do deslocamento que leva muitos alunos a gastarem a maior
parte do dia no caminho de ida e volta para a escola, evitando tam-
bém que esses alunos necessitem viver em centros urbanos em função
dos estudos. A experiência é um dos pilares básicos de formação den-
tro desta proposta pedagógica como nos esclarecer Gimonet:
271
O conhecimento se dá por meio do exercício, no qual o acom-
panhamento permite o monitoramento, e uma vez monitorado e
provocado, o aluno é levado à reflexão, podendo sistematizar o seu
tempo e a prioridade dada a cada elemento dentro do seu processo
formativo.
272
Assim, cada uma dessas comunidades demanda não só práti-
cas pedagógicas apropriadas a cada contexto, mas também recursos
específicos que permitam o transporte a regiões de difícil acesso para
o atendimento aos alunos e às suas famílias. Algumas aldeias ficam
sem acesso no período de chuvas e não podem ser alcançadas nem
mesmo com veículos especiais com tração nas quatro rodas. Seriam
estas especificidades geográficas a maior preocupação?
A maior parte dos educadores do campo não fala o idioma dos
indígenas e alguns indígenas, embora falem o português, se expressam
com limitações. Além da dificuldade de comunicação, percebe-se, ao
longo dos anos, a necessidade de se levar em conta o capital cultural3
desses alunos. Em uma mesma sala, alguns deles têm dificuldades
primárias de escrita. Muitos não possuem em suas comunidades in-
ternet, ou sequer um computador de uso comunitário.
Há alunos com as mais díspares características culturais, esco-
lares e geográficas, o que nos lembra Boaventura Sousa Santos quan-
do diz que: “a inclusão tem sempre por limite aquilo que exclui”. O
autor esclarece que:
273
Uma história de vida é algo vivo, um trabalho sempre
em evolução, onde os narradores enquanto caminham,
analisam a imagem do seu próprio passado, pois a his-
tória é aberta, provisória e parcial; muda tanto quando
a quantidade de tempo, isto é, a experiência acumula-
da pelo narrador e da mesma maneira com a qualida-
de do tempo, ou seja, os aspectos por este privilegiados
durante a narrativa, concluindo que nenhuma história
é contada duas vezes de forma idêntica e cada história
que ouvimos é única (PORTELLI, 2014, p. 298).
274
contextos socioculturais e aos processos de interação
social que lhes deram origem. Em outras palavras, o
olhar antropológico é relativizador, porque considera
que todas as práticas culturais são particulares e, por-
tanto, igualmente relevantes (ARROYO, 2000, p. 16).
275
horas de deslocamento, repartida em caminhadas sob o sol escaldan-
te e poeira vexante?
Esse deslocamento por parte dos docentes das salas de aula
da universidade para acompanhar as atividades dos alunos em seus
“mundos reais” tem oportunizado a readequação das propostas peda-
gógicas aplicadas ao longo de anos de docência.
276
A busca por atender aquilo que é mais premente para
o aluno pode nos conduzir a caminhar diante de no-
vos conhecimentos, questionar nossas capacidades e,
mais que isso, pode nos conduzir novamente ao desejo
de aprender [...] Articular os conteúdos musicais às
competências pedagógicas exige de nós muitas vezes
a desconstrução de paradigmas, para a percepção das
particularidades existentes na área, para que possamos
superar a simples transmissão de conteúdos e me-
todologias, fortalecendo assim não só a nossa práxis
docente, mas a Educação Musical como área de co-
nhecimento (BRASIL, 2015, p. 8).
277
A necessidade de uma formação que se relacione com as de-
mandas pessoais do aluno pode permitir a continuidade desse novo
formato pedagógico, ingressando e conduzindo a posteriori seus futu-
ros alunos por essa mesma prática.
278
O ensino para os povos do campo traz a necessidade de com-
preender que o conhecimento está além da disciplina e do currículo,
além das nossas “caixas” educacionais. A relação com esses povos nos
mostra o trabalho como essência, o trabalho que produz conheci-
mento, produz arte e vida. Por muitas vezes nos perguntamos: temos
sido capazes de perceber, por exemplo, o discurso que está embebido
nos cantos das quebradeiras de coco? Somos capazes de ler além do
evento musical? Será que o tempo e o valor que os povos do cam-
po estabelecem para os elementos do seu dia a dia nos modificam e
nos sensibilizam enquanto docente? Será que conseguimos situar o
trabalho dentro da perspectiva desse povo? Saviani nos ajuda acerca
dessa relação do trabalho com o homem:
279
como o lavar das roupas, o quebrar de coco, os aboios, as colheitas e o
plantio. O repertório deve acolher as canções que descrevem os ele-
mentos da cultura regional tais como os rios, o boi-bumbá, os mitos
e as lendas, entre os outros.
A partir desses cantos, entender juntos os conteúdos musicais
ali presentes tais como forma, célula rítmica, linhas melódicas e har-
mônicas das canções. Também trabalhar com brinquedos e objetos
sonoros, pequenos instrumentos de percussão, sem esquecer de con-
tar com o poder criativo de cada educando, para que ele possa inserir
suas ideias em todos esses encontros.
O ensino de instrumento, especificamente, pode ser pensando
dentro dos princípios rítmicos e harmônicos presentes em matrizes
encontradas em quilombos, com canções demarcadas por claves rít-
micas em compassos compostos. O imaginário sonoro das florestas e
chapadas pode ser reproduzido por meio da construção de instrumen-
tos sustentáveis, que utilizam sementes e outros recursos da natureza.
7 Considerações finais
280
Assim, em virtude desse encontro entre a educação do campo e
a educação musical ser algo sobremodo recente, diferentes desdobra-
mentos pedagógicos e culturais são discutidos e repensados diante de
cada novo encontro, diante de cada nova comunidade, onde, de fato,
o caminho nos ensina a caminhar.
REFERÊNCIAS
281
MOLINA, M. (Orgs.). Por uma educação do campo. Petropolis:
Vozes, 2004, p. 147-158.
282
GUISO, A. Práctica social popular referente y contenido de la
educacion popular. Contexto e educação, Ijuí, ano 6, n. 23, jul./set.
1991.
283
QUEIROZ, L. R. S. Educação musical e cultura: singularidade e
pluralidade cultural no ensino e aprendizagem da música. Revista
da Abem, Porto Alegre, v. 10, p. 99-107, 2004.
284
11 - Corpo – superfície inscrita da
educação: reflexão sobre uma
experiência de ensino e pesquisa
em dança
Marissel Marques
1 Introdução
1 Ainda que, nos encontros, tinha discente do sexo masculino, utilizo a flexão de gênero
feminina “das discentes” como forma de abrangência universal, ou seja, para me referir
tanto ‘as participantes’ quanto ‘aos participantes’. Assim farei ao longo de todo o texto para
tais designações de gênero conforme a necessidade.
285
optativa “Danças tradicionais” e no projeto de extensão “Dança con-
temporânea e a tradição”, ambos coexistiram em desdobramentos.
A licenciatura em Educação do Campo tem como área de co-
nhecimento Artes e Música. O objetivo do curso é uma formação con-
textualizada com a cultura, as lutas sociais e com o campo brasileiro2.
A componente curricular, por sua vez, tinha o objetivo de pes-
quisar as danças que simbolizam ritos e celebrações nas comunidades
das estudantes, que, em geral, moram no Estado do Tocantins (TO)
e mediações. Também, de dar elementos conceituais para analisar as
danças no contexto educacional, cultural e estético.
Os ritos recuperam o sagrado, fazem parte de rituais, os quais
são imersos em um universo simbólico de determinada tradição. As-
sim também as celebrações e festividades possuem caráter religioso
ou pagão, são bens simbólicos que definem a cultura de uma região
ou comunidade (IPHAN, 2016). Entende-se cultura conforme defi-
ne Rios (2014), como processos sociais contínuos.
As celebrações e festividades são promovidas por diversos mo-
tivos: religiosos, lazer, datas especiais para família, para grupo que
compartilham identidade social, datas comemorativas para cidade e/
ou país. A exemplo dessas datas, a tradicional Festa Junina acontece
em todo o país no mês de junho.
Algumas celebrações estão relacionadas aos ciclos produtivos,
como a festa da colheita do capim dourado, que acontece em setem-
bro no Jalapão (TO). E ainda há as que celebram momentos espe-
ciais da vida de uma pessoa ou da família, como o casamento. O ritual
do corte de cabelo para o povo Apinayé, o qual celebra o nascimento
e a morte. A festa de São Gonçalo para os pagadores de promessas,
dentre outras3.
Algumas das danças desses ritos e celebrações trazem uma
286
persistência de traços, relativo ao plano do sagrado, oriundos da an-
tiguidade. Apresentam unidade mais profunda com a vida. Ainda
que, ao longo do tempo, o ritual tenha se reconfigurado, alterado sen-
timentos, sentidos e construções, para Garaudy (1980), esses traços
conectam-se com as danças pagãs da Idade Média.
No Brasil, as danças dessas linhagens são chamadas de danças
brasileiras, tradicionais, típicas, folclóricas, profanas, culturais, étnicas
ou populares. Foram chamadas de Danças Dramáticas por Mário de
Andrade (1966).
Paralelamente ao ensino, desenvolvi um projeto de extensão
intitulado “Dança contemporânea e a tradição”, que pretendia atra-
vés da transdisciplinaridade capacitar as estudantes a construírem re-
presentações de mundo com olhar estético-corporal.
O estudo corporal, no projeto de extensão, visava a estudar os
movimentos e suas qualidades em relação ao espaço, tempo, peso, flu-
ência, espaços articulares, apoios, resistência, oposições e direções ós-
seas, eixo global, com base nos teóricos Laban (1978) e Viana (2005).
Esses princípios foram experimentados em laboratórios de
improvisação, na proposição de uma dança autoral (intérprete-cria-
dora), que privilegia a expressão corporal, ou seja, ações expressi-
vas-comunicativas da cultura corporal, essencialmente subjetivas
(ESCOBAR, 1995).
Este processo visava, no ambiente educacional, a alcançar
conscientização, sensibilidade, percepção e expressão corporal por
meio da investigação das sensações, imagens, resgate de lembranças
de cada participante. Em outras palavras, é uma busca por um olhar
emergente sobre si.
A seguir, mais alguns detalhes do contexto e dos referenciais
teóricos do processo de ensino, pesquisa e extensão.
287
2 Proposta pedagógica da disciplina
optativa “Danças tradicionais” e do projeto
de extensão “Dança contemporânea e a
tradição”
288
tados nos estudos da dança contemporânea (LABAN, 1999; VIA-
NA, 2005) e possíveis reflexões socioculturais dessas manifestações
culturais. A carga horária total foi de 60 horas. Será chamado de
segundo momento.
289
formalismo excessivo, a rigidez das definições e o ab-
solutismo da objetividade comportando a exclusão do
sujeito levam ao empobrecimento (MORIN; FREI-
TAS; NICOLESCU, 1994, s.p.).
290
A transdisciplinaridade entende que a realidade é multirreferen-
cial e complexa. Isso implica em ter como pressuposto uma estrutura
aberta, descontínua, com base em diversas camadas da mesma reali-
dade, a ser considerada a partir de cada indivíduo e de seu estado de
percepção. Só assim é possível entender que existem diferentes formas
de se compreender o conhecimento. Não só o fluxo de informação
que atravessa as diferentes camadas da realidade, mas que resulta dos
diferentes estados de percepção. E, da mesma maneira, o fluxo de cons-
ciência que atravessa esses diversos estados (NICOLESCU, 2001).
A transdisciplinaridade é um novo modo de pensar a cultura, a
ciência, a consciência e a relação com o outro. O interesse está nas re-
lações que se criam a partir das dinâmicas geradas simultaneamente
pelas realidades plurais, ou seja, multidimensionais.
291
A domesticação do corpo, segundo Foucault (2014), refere-se
a um conjunto de dispositivos reforçados pelo status quo, reiterada
através da disciplina, referente às regras e normas de conduta, a qual
controla o tempo e o espaço do indivíduo, restringindo assim os mo-
vimentos.
Nessa perspectiva, entende-se que o adestramento escolar pre-
para os alunos não só para um ‘correto agir’ na escola, relativo às atitu-
des predeterminadas, que seria sentar, calar e obedecer. Mas também,
quando adulto, cumprir uma jornada de trabalho de 8 horas diárias
nas cidades. No campo, essa jornada, muitas vezes, mostra-se ainda
mais severa, com carga horária longa e com movimentos repetitivos,
como nas fábricas, a exemplo o trabalho das quebradeiras de coco6.
Ainda que a indisciplina seja verificada na escola, existem di-
versos mecanismos de punição, assim como para qualquer trabalha-
dor que rompe com a ordem natural de respeito às regras e à hierar-
quia social. Via de regra, ambos são rotulados como ‘não adaptados’
ou ‘problemáticos’, geralmente, são punidos7.
O agenciamento escolar disciplinador inviabiliza o desenvol-
vimento holístico do indivíduo. Nas salas de aulas, observam-se as
carteiras ordenadas em fileiras, semelhante à formação militar, um
olhando para a nuca do outro, o que dificulta o contato entre as pes-
soas (CAPECCHI; GOMES; MARQUES, 2017). Esse mecanis-
mo funciona como disciplinarização dos corpos, consequentemente
do comportamento.
Na licenciatura, com as estudantes da componente curricular,
dialogamos sobre o tema através do artigo A educação e a fábrica de
corpos: a dança na escola, da docente da Faculdade de Educação (Uni-
camp), Márcia Strazzacappa. Nesse artigo, a autora compartilha a
6 Ver o filme “Raimunda quebradeira de coco”. Direção: Marcelo Silva. Duração: 52 min.
2007. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=m26P_NZx1C4>. Acesso
em: 28 nov. 2017.
7 Foucault discute sobre as relações de poder no livro Microfísica do poder, de 1979.
292
experiência dela com a dança no espaço escolar. Ela defende que o
movimento do corpo, na escola, é uma moeda de troca à imobilidade
imposta, que funciona como punição.
Entre nós, os relatos apresentaram as dificuldades de se expres-
sar corporalmente, relacionadas à timidez para algumas, para outras,
a um tipo de bloqueio, que foram revelados em conversas. Mas tam-
bém eram evidenciados na resistência para participar das dinâmicas
e dos jogos propostos. No aborrecimento, quando solicitado a sentar
no chão para alongamentos. Na falta de vontade e de energia para
criar, brincar, relacionar-se e se envolver nas atividades. Para algumas,
era coisa chata.
Romper com esses condicionamentos, mover aqueles corpos
anestesiados e passivos, não foi tarefa fácil. Foi necessário insistir para
que saíssem de trás da carteira, assim como fazê-las refletir coleti-
vamente sobre os temas. Um dia, uma estudante disse, impetuosa-
mente, que eu fazia muitas perguntas. Questionei sobre isso: como
deveria fazer? A resposta foi: “Dar aula.”
Subentende-se dessa resposta que a didática que recorri, basea-
da na pedagogia da educação nova, a qual incentiva o desenvolvimen-
to das aptidões à invenção e à iniciativa e substitui o conceito estático
de ensino por um dinâmico (COLEÇÃO EDUCADORES, 2010).
Também, na relação dialógica de Freire (1996). Ambas as perspecti-
vas não são sinônimo de ‘dar aula’. E que existe uma forma padrão de
‘dar aula’, que, sem dúvida, segue a pedagogia tradicional.
Na pedagogia tradicional, o professor ocupa o centro da relação
pedagógica (VEIGA, 2005). Ele é mais importante que o aluno, já que
detém o conhecimento e o transmite a eles. Recorre à disciplinariza-
ção como método de controle da sala, que garante a atenção, o silêncio
e a ordem. Assim, os alunos devem seguir atentamente a explicação do
professor. Nesse sistema de ensino não se forma nem para a reflexão,
nem para a crítica da sociedade. Tampouco para que o aluno alcance à
autonomia, pois ele é visto como um ser receptivo e passivo.
293
Freire (1996) chama esse modelo de ensino tradicional de ‘edu-
cação bancária’, que concebe relação pedagógica hierarquizada, re-
produtiva, autoritária, portanto, impositiva e repressiva.
Na perspectiva filosófica de Foucault (2014), a disciplinariza-
ção é uma tática astuta da política que não só atravessa a pedagogia,
a medicina, o militarismo e a economia como também abrange todo
o corpo social. A tática se caracteriza como técnicas que podem ser
consideradas minuciosas e, muitas vezes, íntimas, pois atuam sobre o
corpo do indivíduo. O corpo é considerado um objeto e alvo de poder.
Segundo Foucault (2014), a disciplinarização é um adestra-
mento sobre um corpo analisável e manipulável, o qual é submetido
às transformações e aperfeiçoamentos, assim como a ideia da “natu-
reza-máquina”, que consiste na dominação da natureza através da
metodologia científica, na qual o homem se vê separado da natureza
e esta é decomposta em peças.
Diante disso, há uma transposição dessa ideia para o corpo, um
‘corpo-máquina’, chamado por Foucault (2014) de ‘corpo dócil’. A
relação feita pelo autor está entre a docilidade e a utilidade do corpo
para o sistema de produção econômica. Neste esquema, o homem
passou a ser instrumento ou ‘homem objeto’, por isso pode ser con-
trolado e aprimorado com vista a ser mais produtivo.
O mecanismo de coerção sobre o corpo é ininterrupto. Tem a
finalidade de domesticá-lo. Está implantado nos processos das ativi-
dades sociais e físicas, que determina ao máximo o espaço, o tempo
e o movimento de cada corpo. Esses processos de disciplinarização,
normatização e punição são aspectos interligados e interdependentes
no campo social, com repercussões nas grandes instituições do Esta-
do, que desenvolveu um complexo campo de saber-poder (BRAN-
CO, 2015).
Deleuze observando Foucault em sua atividade de leitor, frente
a esse tema, posiciona-se da seguinte forma:
294
Foucault situou as sociedades disciplinares nos sécu-
los XVIII e XIX; atingem seu apogeu no início do
século XX. Elas procedem à organização dos gran-
des meios de confinamento. O indivíduo não cessa de
passar de um espaço fechado a outro, cada um com
suas leis: primeiro a família, depois a escola (“você
não está mais na sua família”), depois a caserna (“você
não está mais na escola”), depois a fábrica, de vez em
quando o hospital, eventualmente a prisão, que é o
meio de confinamento por excelência (DELEUZE,
1992, p. 219).
295
já tivemos mais envolvimento. Elas interpretaram os personagens.
Para se realizar um trabalho pedagógico com a dança é ne-
cessário o consentimento da estudante. Contudo, nem todo estilo
da dança segue esse princípio. Pois, algumas se utilizam do mesmo
princípio supracitado, ou seja, são processos de domesticação e do-
minação do corpo, que priorizam a execução de movimentos corretos
e perfeitos dentro de um padrão técnico imposto, que gera a com-
petitividade entre praticantes e a valorização de um corpo ideal em
detrimento dos outros.
Tomemos por exemplo à dança clássica – o balé –, que tornou
a técnica um fim em si mesma, até se consolidar em uma linguagem.
Bailarinos são diferenciados pela padronização dos movimentos e
habilidades, a Ópera de Paris difere-se do Balé Imperial Russo, am-
bas são notórias instituições de balé.
Segundo Cavrell (2015), a produção de corpos homogêneos
resulta de treinamento e estética de escolas e instituições, que funcio-
na como um chancela de qualidade. A autora relaciona essa padroni-
zação de corpos à teoria foucaultiana:
296
marcar as posições de cada um que dançava. No centro, estava o Rei
e os lugares eram definidos pela posição social.
O Balé de Corte, subsequente o Balé Clássico8 eram compre-
endidos com dança erudita. Ambas desejavam se afastar de tudo que
caracterizava o popular, haja vista que as manifestações culturais co-
existiam marginalmente.
Sucessivamente ao desenvolvimento da técnica, o proscênio
possibilitou de maneira mais evidente essa divisão. Os espetáculos
sacralizaram a dança, tornando ainda mais evidente o lugar de cada
um. Todavia, gradativamente, o aperfeiçoamento da técnica passou
a separar os amadores dos profissionais, não mais a posição social
(CRAVELL, 2015). No palco, os que tinham permissão para dançar,
o corpo de baile – bailarinos profissionais – e na plateia, os demais,
que contemplavam, os que não dançam.
De forma esquemática, poderia dividir o campo de estudo da
dança entre o erudito e o popular. Sendo que durante os séculos XIX
e XX, a dança erudita seguia a arte europeia, que oscilava entre dois
conceitos em tensão: clássico e romântico. O primeiro refere-se ao
Renascimento, que se fundamenta em princípios ligado à arte gre-
go-romana. O segundo, sobretudo, relacionado ao modelo de arte
cristã da Idade Média, que revela o sagrado. Refere-se ao Barroco
(ARGAN, 1992).
Na dança erudita europeia, desse período, por sua vez, trazia
cruzamento desses dois conceitos nos balés de repertório. Os valores
clássicos se exprimiam nos exímios bailarinos, visto que já havia se
consolidado a técnica, ou linguagem do Balé Clássico, que tem como
características movimentos harmoniosos, simetria, linhas, equilíbrio,
dentre outras.
Por outro lado, no enredo, ainda que tratasse de mitologia, visa-
va mostrar elevação espiritual através dos movimentos leves, ou sem
8 Para saber sobre a história da dança ver Garaudy (1980) e Cravell (2015).
297
esforço aparente, tendo como consequência, além do domínio corpo-
ral, o uso da sapatilha de ponta e a indumentária, principalmente a
saia feita com tule, chamada de tutu (CRAVELL, 2015).
Em decorrência disso, na atualidade, no Brasil, em escolas e
grupos de dança, trazem como sinônimo de dança a técnica do balé,
que por sua vez é sinônimo de treinamento de passos fixos e imutá-
veis (MARQUES, 1980).
Partindo do exposto, só é possível pensar em uma educação
corporal propedêutica e prospectiva, que significam, respectivamente,
conhecimento básico e ver o futuro.
No componente curricular, com intuito de percorrer outros ca-
minhos, pelos quais se pudesse refletir e combater a disciplinarização
dos corpos e o modelo academicista da dança, e ainda visualizar ou-
tros modos de conceber a educação formal, partimos das referências
básicas de Maturana (2002), que apresento algumas ideias a seguir
e Nicolescu (2001), que esteve intrinsecamente permeando todo o
processo através do conceito transdisciplinar.
O título do livro de Humberto Maturana (2002) ilustra as
ideias que ele defende: “Emoções e linguagens na educação e na po-
lítica”. O autor defende que a emoção e a linguagem estão estrita-
mente relacionadas à educação e à política. O que contrapõe os ideais
iluministas forjados nas relações sociais, pelas quais se fundamenta
na razão. Portanto, a razão é a liga de todo o mecanismo que justifica
a estrutura social até hoje, tanto para a exploração do ser humano
quanto da natureza.
Maturana parte da premissa: o ‘humano’ se constitui entre o
racional e o emocional através da linguagem, “[...] todo sistema ra-
cional tem um fundamento emocional [...]” (MATURANA, 2002,
p. 15). Ele defende que sem esse entendimento não é possível criar
outras formas de convívio na sociedade.
O autor propõe que as emoções são disposições corporais, que
interferem no domínio das ações. Esse fenômeno é próprio do rei-
298
no animal, no qual nos encontramos, no entanto, nós as justificamos
através da linguagem. Em outras palavras, toda ação está carregada
de emoção, ainda que seja defendida como racional. Ou ainda, toda
ação surge de uma motivação emocional, sendo assim, instintiva. A
violência, por exemplo, surge de um sentimento de raiva; a disputa,
da ameaça. Já, o carinho e a delicadeza são frutos do respeito, do afeto
entre as envolvidas.
A filosofia de Maturana sugere que só é possível outra socie-
dade, mais harmoniosa, se baseada no amor. Para ele, essa palavra se
afasta da carga emotiva, romantizada e teológica. O amor é sinônimo
de respeito na convivência, “[...] a coexistência na aceitação do outro
como legítimo outro na convivência” (2002, p. 34). Pois, interações
baseadas na obediência, na exclusão, na negação, no preconceito não
são sociais, mas sim, antissociais. Nas palavras do autor:
299
Desse modo, entende-se que todo processo educacional é pros-
pectivo – relativo ao futuro. Pois, está subentendido que, nas relações
pedagógicas, há uma determinada formação de um indivíduo em
uma determinada sociedade. Assim, há, na educação, um projeto de
nação (LUCKESI, 2013). Segundo Campos e Reis (2006, p.8) “O
processo educativo é um ato político, uma ação que resulta em rela-
ção de domínio ou liberdade entre as pessoas.” Compreendido que a
escola, é uma “[...] instituição/produto histórico e social que só pode
ser considerada dentro da totalidade em transformação da qual faz
parte (ESCOBAR, 1995, p. 92).”
Nessa perspectiva, se a educação está baseada na competitivi-
dade, atual modelo social, no que tange a meritocracia, a educação se
constitui na exclusão. Pois, na competição, há sempre um derrotado,
portanto, só existe na negação do outro.
Se a educação for baseada na obediência, tem como pressupos-
to uma relação hierarquizada, em que um é superior ao outro. Sendo
assim, o aluno é dominado pelo professor, que usa sua autoridade
para subjugá-los, similar a relação de patrão / empregados, marido /
esposa.
Ambas as perspectivas, competição e obediência, formam es-
cravos, pois se apropriam e reproduzem a cultura do patriarcado, na
qual a forma normal de viver tem como base os verbos de ação: dis-
putar e dominar – o tempo todo – entre todos. Também em relação
à natureza.
Todavia, refletir sobre essas conjecturas apresentadas, nas práti-
cas pedagógicas, com o intuito de transformá-las, requer relações ho-
rizontalizadas, baseadas nos verbos: respeitar, aceitar, criar, cooperar,
dialogar. As práticas pedagógicas são propícias para se experimentar
novas formas estéticas sociais, pautadas no respeito ao outro na con-
vivência, ou seja, num exercício contínuo para se alcançar o amor,
conforme sugere Maturana (2002).
300
4.2 Construção de um roteiro dramático
301
5 Pesquisa de campo
302
Via de regra, a herança cultural é transmitida de maneira oral.
Portanto, trata-se de um ensino informal. Está no alcance do espectro
da cultura, que é conjunto das atividades humanas que possuem signi-
ficados e valores para “um grupo ou comunidade”. Ela não é estática,
aliás, está em processos sociais contínuos. É resguardada pela Consti-
tuição Federal Brasileira de 1988, no Art. 215, § 1.º e § 2.º que seguem:
303
culturais que são interconectados entre processos históricos situados
e evento efêmero, mas que não se esgotam neles mesmos (RAPOSO,
2010). Pois, resguardam laços e traços da sua origem.
Embora, nem todo evento atrelado às antigas manifestações
representem resistência social que integram a comunidade, dado que
a cultura também faz circular capital, na esfera da produção de even-
to, mais próximo da ideia da sociedade do espetáculo (DEBORD,
1997; MASCARENHA, 2003).
O escopo do projeto foi conhecer os aspectos históricos e es-
téticos das danças tradicionais. O instrumento de pesquisa utilizado
pelas estudantes foi o inventário participativo do Iphan (2016). Essa
ferramenta fomenta o protagonismo do integrante da comunidade
para inventariar, descrever, classificar e definir o que lhe afeta na re-
alidade que o cerca.
O inventário foi uma ferramenta adequada para se promover
à educação patrimonial associada à cidadania e à participação social
das estudantes em suas comunidades. Esse estudo possibilitou a elas
classificar essas manifestações como patrimônio cultural ou não.
O patrimônio cultural se constitui por elementos da cultura
que se transmite às próximas gerações, pois interliga as pessoas. É
algo coletivo, considerado pelos membros da comunidade como “tão
importantes para o grupo que adquirem o valor de um bem – um
bem cultural – e é por meio deles que o grupo se vê e quer ser reco-
nhecido pelos outros” (IPHAN, 2016, p. 7).
Através desse inventário, a estudante pode descobrir, docu-
mentar o repertório de referências culturais da comunidade dela.
304
ma e que reaproximam os que estão longe, para que
se reviva o sentimento de participar e de pertencer a
um grupo, de possuir um lugar. Em suma, referências
são objetos, práticas e lugares apropriados pela cul-
tura na construção de sentidos de identidades, são o
que popularmente se chama de raiz de uma cultura
(IPHAN, 2016, p. 8).
305
das sensações, imagens, resgate de lembranças, com foco nos proces-
sos de conscientização, sensibilização, percepção e expressão.
Para tanto, os encontros visavam desenvolver um processo cria-
tivo pautados no convívio da pluralidade, no campo do sensível, do
imaginário e do criativo, enquanto se promovia a partilha e a vivência
de saberes oriundos da nossa corporeidade.
Visava a uma educação integral, pois valorizava a experiência
autêntica da corporeidade através do reconhecimento de si nas ações.
Destarte, as vivências dos laboratórios se mesclavam às histórias pes-
soais, memórias, imagens, num mover-se para ressignificá-las, ou
seja, em processos de recriar, ao ponto de aproximá-las de uma pro-
dução artística em dança.
Também foi introduzido no processo aspectos coreográficos e
fatores de composição, com a finalidade de convergir entre a dança
contemporânea e as danças tradicionais.
306
desse modo, meio para conhecimento de si através da observação e da
consciência dessa totalidade. Esse processo é um movimento de in-
trospecção, a qual é instrumento de meditação, sendo assim, possibi-
lita um entendimento mais profundo de si e visão interior enquanto
une o indivíduo com a espiritualidade.
Para Boal (1996, p. 26) “o teatro nasce quando o ser humano
descobre que pode observar-se a si mesmo: ver-se em ação”. Afirma
que o ser humano é o único animal que consegue ver-se numa simu-
lação. Ele cria uma tríade para traduzir essa ocorrência o “EU obser-
vador, EU em situação, e o NÃO-EU, isto é, o OUTRO.”
O dançar com a potência de estar consciência de si, recebe
o adjetivo de ‘sagrada’, pois é um rito que penetra nos fenômenos
psíquicos e processos mentais, sendo esses: percepção, imaginação,
memória, emoções, desejos, intuição, sentimentos, espiritualidade,
crenças, dentre outros. Ao passo que torna o incompreensível, aquilo
que foge a razão e o indizível, o que não se explica através da lingua-
gem - gesto, expressão corporal.
É necessário se estender ao sistema de interioridades para
acessar uma ação carregada de intencionalidade, em que há relações
das partes entre si e de cada parte com o todo. Contudo, não é
necessária sistematização desse conhecimento do corpo para fazer um
movimento simples. Tanto menos, entendimento racional do processo
que integra esse sujeito complexo, em que uma ação gera suas próprias
interpretações a partir da subjetividade. Pois, é um processo que surge
intuitivamente, mas próximo da sabedoria dos antigos.
Para Deleuze (2012), tais interpretações são criadas ao acaso,
por meio da criatividade, que faz associações entre o conjunto das
potencialidades do humano.
O conhecimento do corpo, nesse caso, é entendido como pro-
cessualidade para se adquirir algo que enriquece o indivíduo em sua
complexidade. O conhecimento com o fim de contribuir para a sig-
nificação mais aprofundada da vida.
307
Para Teixeira (2010, p. 37) o conhecimento é visto “[...] no sen-
tido espiritual, no sentido humano, no sentido de uma vida cada vez
mais larga, mais rica e mais bela, em um mundo cada vez mais adap-
tado, mais propício, mais benfazejo para o homem”.
Nas civilizações antigas, a dança era expressão de vida, estava
ligada às experiências vitais da sociedade e do indivíduo como: amor,
guerra, colheita, religião. Para Garaudy (1980), a dança era expressão
corporal, na qual organizava os movimentos do corpo em sequên-
cia significativas. Também organizava a vida em comum, quando era
união com o outro, tornava-se um rito social.
Nas danças sociais, os grupos compartilham os costumes, as
leis, os trajes e a linguagem. Bejárd (GARAUDY, 1980) as chama
de profanas. Essas danças possuem não só o elemento sagrado, mas
também a magia, que emerge da energia do fazer coletivo e carrega
um potencial de transformação da matéria.
É possível relacionar os movimentos sincronizados, que criam
partituras ritmadas, tão somente à necessidade de expressão cultural
e identitária de um grupo, mas também ao esforço das ações coletivas
de trabalho, quando se quer alcançar um objetivo em comum.
O segundo caso é exemplificado por Garaudy (1980) com o
trabalho dos marinheiros, quando içavam velas e davam voltas nos
cabrestos do barco. Da mesma forma os ferreiros, quando malhavam
juntos um mesmo ferro. O autor também relaciona a dança social
ao trabalho na agricultura, em que, para torná-lo mais eficiente, os
trabalhadores coordenavam os movimentos manuais para debulhar o
trigo e para fazer o vinho, os pisadores, os pés:
308
O autor descreve essa gênese mítica da dança social a partir das
ideias do artista Ted Shawn (1891-1972), que defendia que o teatro
nasceu daquela. A defesa se embasa em aspectos geométricos da ar-
quitetura do local em que se realizava o trabalho e nos lugares ocu-
pados. Ao centro, aquele que realiza a ação. Os substitutos ficavam
sentados em bancos de pedras à volta dos lagares. Outros, na segunda
fileira acima. E, mais outros acima. Todos participavam do rito, dos
cantos, da possessão divina.
309
sequentemente, o protestantismo também a rejeitou. Sendo banida
da espiritualidade cristã ocidental, desde o século XII, sobreviveram
apenas as ‘danças macabras’, em uma época de fome e peste. Voltou
a florescer no Renascimento, quando o dualismo cristão e os valores
mundanos foram ressignificados (GARAUDY, 1980).
Tal dualismo – corpo x alma – até os dias de hoje, fundamenta a
perseguição e o preconceito às práticas de religiões oriundas de outros
princípios, como o candomblé e a umbanda. Ambas de matrizes afri-
canas, as quais ainda se apoiam na dança como forma de religar-se aos
deuses, não apenas essa manifestação, mas todas as expressões artísticas
desse povo, de acordo com o pensamento de Garaudy (1980, p. 20):
310
Quando se aborda conteúdos míticos, pode-se re-
afirmar e respeitar universos plurais significativos e
retomar experiências individuais. Informações como
cantos, danças e matrizes da tradição de uma cultura
possibilitam comunicação e compreensão da estrutura
de vida dos seus povos, bem como constituem uma
arte arraigada e que, ao mesmo tempo, pode levar à
transcendência em nossa sociedade contemporânea,
tão carente de mecanismos que propiciem esse “trans-
cender” (SANTOS, 2008, p. 3).
311
intuito de fundamentar e mediar os encontros, de modo que tam-
bém se respeite o referencial cultural das estudantes e os critérios que
as levam às escolhas pessoais. Entende-se por encontro o tempo de
convivência e espaço benfazejo para se criar, considera-se como um
espaço de experimentações. Segundo Gomes (2015, p. 5),
312
inscreve algumas marcas, deixa alguns vestígios, alguns efeitos.”
Quando Agamben (2009) apresenta o pensamento de Aristó-
teles sobre um modo de pensar sentindo, entende-se que: o pensar
não se dissocia do existir e esse do sentir. Ele entende o viver, quando
no coletivo, como um compartilhamento da experiência da existên-
cia. Tornando-se assim uma política da amizade:
313
julgado como ingenuidade, sob o ponto de vista de uma ideia ilhada,
que não dialoga com a contemporaneidade.
Contudo, subentende-se dessas ideais que em uma comunida-
de humana que “toma parte no mesmo” é uma partilha sem objeto:
314
saram a ensinar outras lições, para além da necessidade de se enten-
der a linguagem não verbal e os conceitos de dança contemporânea,
mas algo relacionado a lição de conviver em harmonia
Na licenciatura da Educação do Campo, essas proposições
subverteram a ideia travestida de profissionalismo na educação, de
um profissional de formalidades, de postura rígida, sério, indiferen-
te, superior ou mesmo reificado para criar outra lógica, pautado na
relação educativa entre iguais. Diante disso, considero que este lugar
da prática docente sensível é uma conquista diária e para toda a vida.
REFERÊNCIAS
315
BRANCO, G. C. Michel Foucault: filosofia e biopolítica. Belo Ho-
rizonte: Autêntica, 2015.
316
ESCOBAR, M. O. Cultura corporal na escola: tarefas da educação
física. Motrivivência, Santa Catarina, n. 8, p. 91-102, 1995.
317
grama de Pós-graduação Ensino, História e Filosofia da Ciência e
Matemática, UFABC. Santo André, 2016.
318
arte e antropologia. São Paulo: Hucitec, 2010, p. 19-49.
319
TEIXEIRA, A. 2010. A pedagogia de Dewey. In: John Dewey. Do-
mínio Público. Disponível em: <http://www.dominiopublico.gov.br/
download/texto/me4677.pdf> . Acesso em: 07 jun. 2018.
320
Informações sobre organizadores
e colaboradores da coletânea
321
Cícero da Silva – Doutor e mestre em Letras: Ensino de Lín-
gua e Literatura (Universidade Federal do Tocantins/UFT).
Licenciado em Letras - Português, Inglês e respectivas litera-
turas (Fundação Universidade do Tocantins/Unitins). Profes-
sor Adjunto da Universidade Federal do Tocantins, atuando
no curso de licenciatura em Educação do Campo: Artes e Mú-
sica, campus de Tocantinópolis. Líder do Grupo de Estudos
e Pesquisas em Educação do Campo (Gepec/UFT) e editor-
-assistente da Revista Brasileira de Educação do Campo/UFT.
Tem experiência na área de Linguística e Educação do Campo
e atua, principalmente, nos seguintes temas: ensino de língua
portuguesa, gêneros do discurso, material didático, práticas de
leitura/escrita, práticas pedagógicas em Educação do Campo
e Pedagogia da Alternância. E-mail: cicolinas@yahoo.com.br
322
ensino de arte, educação de jovens e adultos, formação de profes-
sores, história em quadrinhos e letramento estético. É professor
da Universidade Federal do Tocantins, no curso de Educação do
Campo com habilitação em Artes e Música, líder do Grupo de
Pesquisa em Artes Visuais e Educação - GPAVE/UFT/CNPq,
e editor-chefe da Revista Brasileira de Educação do Campo, da
qual é fundador. Orcid: http://orcid.org/0000-0002-1996-5959
E-mail: gustavo.araujo@mail.uft.edu.br
323
Helena Quirino Porto Aires – Doutoranda em Educação
pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Mestra
em Educação pela Universidade Federal do Tocantins (UFT).
Licenciada em Pedagogia pela Fundação Universidade do To-
cantins (Unitins). Licenciada em Biologia e Especialista em
Gestão Pública pela (UFT). Professora do Magistério Supe-
rior no Curso de licenciatura em Educação do Campo (UFT).
Tem experiência em ensino da educação básica, educação su-
perior, educação à distância e gestão escolar. Área de interesse:
educação no campo, pedagogia da alternância, práticas pedagó-
gicas, formação de professores e políticas públicas. É integrante
do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação do Campo
(Gepec/UFT). E-mail: hequirino.uft@mail.uft.edu.br
324
Judite da Rocha – Mestra em Saúde Pública, pela ENSP-
-Fiocruz. Especialista em Energia e Sociedade no Capitalismo
Contemporâneo pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento
Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(UFRJ). Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de
Goiás (UFG). Atualmente, é militante e articuladora do Mo-
vimento dos Atingidos por Barragens e monitora da Associa-
ção Nacional dos Atingidos por Barragens, além de professora
no curso de Educação do Campo com habilitação em Artes e
Música da UFT/Tocantinópolis. Tem experiência na área de
enfermagem, com ênfase em Enfermagem de Doenças Conta-
giosas. Professora do saberes da terra e Pronera.
E-mail: juditemab@gmail.com
325
Mara Pereira da Silva – Mestra em Música pela Universi-
dade de Brasília (UnB). Licenciada em Música pela Univer-
sidade do Estado do Pará (Uepa). Especialista em Educação
do Campo, Agroecologia e Questões Didáticas pelo Institu-
to Federal do Pará (Ifpa). Membro do Grupo de Estudos e
Pesquisas em Educação do Campo (Gepec-UFT). Membro
do Grupo de Pesquisa Territórios Indígenas e Etnoenvolvi-
mento (Ifpa). Membro do Grupo de Pesquisa em Educação,
Trabalho e Formação Humana (Gefor-Unifap). Membro do
Grupo de Pesquisa Educação Musical Escolar e Autobiografia
(Gemab-UNB). Membro do Grupo de Pesquisa Gabinete de
Investigação em Educação Musical (Giem-UFT). Integran-
te do Conselho Editorial da Revista Brasileira de Educação do
Campo (UFT). Atualmente, é docente do curso de licenciatura
em Educação do Campo - Artes e Música da UFT e coor-
dena o Programa Institucional de Monitoria Indígena (Pimi)
vinculado ao Curso de Educação do Campo - Artes e Música,
de Tocantinópolis. Tem experiência na área de Educação Mu-
sical, atuando nos seguintes temas: Educação Musical Escolar
Indígena (Emei), educação musical e pesquisa autobiográfica,
experiências musicais, ensino de música em escolas da educa-
ção básica, música e interculturalidade.
E-mail: maramusic.uft@mail.uft.edu.br
326
professor assistente do curso de licenciatura em Educação do
Campo da UFT. Desenvolve pesquisas nas áreas de etnomu-
sicologia, pesquisa-ação participativa, práticas musicais, ensino
de música e educação do campo.
E-mail: marcusbonilla@mail.uft.edu.br
327
Raimundo Vagner Leite de Oliveira – Foi professor na Uni-
versidade Federal do Tocantins – UFT, campus de Tocantinó-
polis. Atualmente, é mestrando em Música pela Universidade
de Brasília (UnB). É especialista em Educação Musical pela
Ucam/Prominas, e graduado em Música pela UnB. Integra
os grupos de pesquisa em Educação do Campo (Gepec), da
UFT; e Educação Musical Escolar e Autobiografia (Gemab),
da UnB. Tem vasta experiência na área de artes, com ênfase
em educação musical, lecionando em diversos espaços como
escolas, igrejas, projetos sociais e em conservatório de música.
Participou de diversas edições do Curso Internacional de Ve-
rão da Escola de Música de Brasília (Civebra), considerado o
maior da América Latina e o quarto do mundo em ensino e
aprendizagem musical. Nesse importante evento, estudou: re-
gência orquestral com o maestro Ricardo Rocha, regência de
banda sinfônica com o maestro Roberto Farias e regência coral
com o maestro Lincon Andrade; Grande Coro (baixo); além
de estudar musicoterapia aplicada ao canto, entre vários outros
cursos. E-mail: raimundo.vagner@mail.uft.edu.br
328
educação popular, nova cartografia social, povos e comunidades
tradicionais. E-mail: rejmedeiros@mail.uft.edu.br
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Sônia Chada – Iniciou seus estudos musicais na Escola de
Música da Universidade Federal do Pará, integrando, poste-
riormente, como oboísta, a Orquestra Jovem e a Orquestra
Sinfônica, o Madrigal e o corpo docente dessa universidade.
É licenciada em Música e bacharel em oboé. Mestre e douto-
ra em Música, Etnomusicologia pela Universidade Federal da
Bahia (UFBA). Fez estágio Pós-Doutoral realizado no Pro-
grama de Pós-Graduação em História Social da Amazônia.
Atualmente, é professora Associada 4 (Cursos de Graduação
e Pós-Graduação) da Universidade Federal do Pará (UFPA).
Atua principalmente nos seguintes temas: etnomusicologia,
cultura musical paraense, percepção musical e execução musi-
cal. E-mail: sonchada@gmail.com
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