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FACULDADE DE BELAS-ARTES
Dissertação
Mestrado em Anatomia Artística
Especialização em Ilustração Científica
2015
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE BELAS-ARTES
2015
RESUMO
Desde o período clássico que os monstros têm sido dignos de admiração e receio. Os
gregos valorizaram-nos inventando novas raças que viviam a distâncias longínquas, no
Oriente. Foram elaborados relatos de viajantes, moralistas e religiosos a seu respeito,
sempre com a preocupação da sua veracidade. Santo Agostinho tentara provar a sua
existência, classificando-os como maravilhas e centrando a sua preocupação em impedir o
corrompimento da alma, negando uma relação evidente entre os nascimentos monstruosos
e um castigo divino. Os monstros apresentam por isso dois aspetos distintos e polémicos
quanto à sua origem: um que remete para os nascimentos monstruosos, encarados como
presságios, e outro sobre a existência de raças fabulosas em lugares remotos. No entanto,
em termos estruturais, estas criaturas fantásticas apresentam organizações compositivas
relativamente finitas, sem grandes disparidades em termos de estrutura. Com o passar das
épocas, para além do seu papel intimidador, os monstros foram sendo observados como
curiosidades científicas e por último, como divertimento em situações como os freakshow,
ou atualmente, em várias indústrias, destacando-se a cinematográfica e a dos videojogos.
Foram selecionadas duas criaturas provenientes do conhecido videojogo World of Warcraft,
da empresa Blizzard: o Orc e o Ciclope que serão posteriormente analisadas de acordo com
uma perspetiva científica, onde com base nas suas características físicas será elaborada uma
análise comparativa referente a diversas anomalias (prognatismo, acromegalia e ciclopia)
existentes, bem como comparações com outros animais.
Palavras-Chave:
Since the classic era that monsters have been both the subject of worship and fear. Greeks
used to valorize them making up new races which lived in faraway lands, in the East. There
were traveler’s reports made up, from a moralist and religious point of view, always with
veracity in mind, where anatomical weird beings were described. Saint Augustin tried to
prove their existence, classifying them as wonders and focusing on stopping the idea of the
corruption of the human soul by denying their relation between monstrous births and
divine punishment. Monsters present then two distinct aspects when it comes to their
origins: one that pushes back to monstrous births, seen as omens, and other that points to
the existence of fantastic races in faraway places.
However when it comes to structure these fantastic beings display finite compositions, not
looking too different from each other. With the passage of time, besides their fearful role,
monsters were being observed as scientific curiosities and at last, as recreation subjects,
first in freak shows, now in several industries, being the most well know the
cinematographic industry and the videogames one. Two creatures from the world known
videogame World of Warcraft from Blizzard Entertainment were selected to be analyzed
from a scientific point of view, were based on their features, there will be a comparative
analysis with diverse anomalies and diseases (prognathism, acromegaly, cyclopia) existent ,
as well as comparative anatomy with other animals.
Key Words:
Esta dissertação não seria possível sem o importante contributo de várias pessoas que me
ajudaram ao longo deste período. Em primeiro lugar quero agradecer ao orientador e
Professor Doutor Henrique Costa, pela paciência e por todo o apoio referente ao dominio
visual e também teórico da dissertação.
Em segundo lugar, a um grupo de Professores que foram incansáveis e de extrema
importância relativamente à parte cientifica da dissertação: à Professora Doutora Isabel
Ritto, pelo seu importante apoio, ao Professor Doutor Ivo Furtado pela simpatia e
preciosa ajuda e também, à Professora Doutora Graça Pires, sempre disponível no que
fosse preciso.
Em terceiro lugar, agradeço àqueles que acompanharam todo o desenrolar deste processo,
animando-me e ajudando-me, em especial à Joana Geraldes.
Por último, mas não menos importante, um agradecimento profundamente especial
dedicado aos meus pais, à minha familia, pelo seu enorme apoio e motivação, e também ao
Tiago. Por todos os motivos e mais alguns, esta dissertação é dedicada a eles.
M. Inês Garcia
Monstros: A ciência do mito e a sua utilidade nos videojogos
Faculdade Belas-Artes de Lisboa: Mestrado em Anatomia Artística- Especialização em Ilustração Científica. 2015
ÍNDICE
Índice de Imagens
Introdução 1
A) Objetivo 3
B) Metodologia 3
I. Uma Breve História Sobre os Monstros 4
1. As origens dos monstros e a sua divulgação no mundo Ocidental 5
1.1. Literatura sobre monstros- folhetos de cordel, bestiários e narrativas 8
de viagens
1.2. Preocupações cristãs acerca dos monstros e da sua existência 13
II. Anomalias e Mutações 18
2. O corpo monstruoso: teorias para o seu surgimento 19
2.1. Os Primórdios da obscura origem: Idade Média 20
2.2. Grandes Inovações: A Teoria da Preformação 28
2.3. Tipologias Monstruosas 33
III. A Utilidade dos Monstros 38
3. A descoberta dos monstros enquanto utilidade científica, lúdica e 39
contemporânea
IV. Análise dos Monstros: Orc e Ciclope 45
4. Orc: Etimologia 46
4.1. Características do Orc segundo J.R.R. Tolkien 47
4.1.2. Videojogos 48
O Orc no Universo dos jogos de tabuleiro e videojogos
4.1.3. World of Warcraft 49
4.1.4. Warhammer 53
4.1.5. Anomalias Anatómicas 54
Prognatismo- Considerações anatómicas: Origens e definições
4.1.6. Proporções da Face 59
4.1.7. Proporções alteradas 63
4.1.8. O prognatismo nos símios 66
4.1.9. O porquê de ser desproporcional: Acromegalia 67
I
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Monstros: A ciência do mito e a sua utilidade nos videojogos
Faculdade Belas-Artes de Lisboa: Mestrado em Anatomia Artística- Especialização em Ilustração Científica. 2015
4.2.3.1.2. Gronn 79
Conclusão 99
Bibliografia 102
Anexo de Imagens 113
II
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Monstros: A ciência do mito e a sua utilidade nos videojogos
Faculdade Belas-Artes de Lisboa: Mestrado em Anatomia Artística- Especialização em Ilustração Científica. 2015
ÍNDICE DE IMAGENS
Fig. 4 Ambroise Paré, Figura de uma porca marinha. Imagem retirada da obra
PARÉ, Ambroise, -On Monsters and Marvels. Chicago: The University of
Chicago Press, LTD, 1982, página 115.
Fig. 5 Ambroise Paré, Figura de um monstro com duas cabeças, uma feminina e
outra masculina. Imagem retirada da obra PARÉ, Ambroise, -On Monsters
and Marvels. Chicago: The University of Chicago Press, LTD, 1982,
página19.
Fig. 7 Ambroise Paré, Figura de um porco com cabeça, mãos e pés de um homem
sendo o restante de porco. Imagem retirada da obra PARÉ, Ambroise, -On
Monsters and Marvels. Chicago: The University of Chicago Press, LTD,
1982, página 70.
III
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Monstros: A ciência do mito e a sua utilidade nos videojogos
Faculdade Belas-Artes de Lisboa: Mestrado em Anatomia Artística- Especialização em Ilustração Científica. 2015
Fig. 12 “ O Homem com cara de cão” (The Dog Faced Man) Poster de um Freak
Show Victoriano [s.d]. Imagem retirada do Website “Encyclopaedia
Britannica”. Disponível em: <URL
http://www.britannica.com/topic/sideshow>.
IV
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Monstros: A ciência do mito e a sua utilidade nos videojogos
Faculdade Belas-Artes de Lisboa: Mestrado em Anatomia Artística- Especialização em Ilustração Científica. 2015
Fig. 21 Representação do crânio do Orc, visto de frente (A) e visto de perfil (B).
Original da autora, ilustração digital, 2014.
V
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Monstros: A ciência do mito e a sua utilidade nos videojogos
Faculdade Belas-Artes de Lisboa: Mestrado em Anatomia Artística- Especialização em Ilustração Científica. 2015
VI
M. Inês Garcia
INTRODUÇÃO
Tal como o título desta dissertação nos indica, o tema aqui apresentado prende-se com o
universo dos monstros: analisando a sua génese histórica nos domínios dos mitos, da arte,
da ciência e da sociedade e tendo posteriormente, uma abordagem mais contemporânea
da aplicação dos monstros, como figura principal no universo audiovisual e nos
videojogos.
Sempre atual, o monstro apresenta constantemente uma aparência disforme que é sempre
um território fértil de analisar e comparar em termos científicos, através do estudo de
determinadas anomalias existentes. Desta forma, foram por isso escolhidos de entre tantos
possíveis, duas versões de criaturas do universo do conhecido videojogo World of
Warcraft, da empresa americana Blizzard: o Orc e o Ciclope, fazendo-se uma análise da
sua história, mitologia, surgimento e finalmente, uma análise cientifica das suas
características físicas, comparadas com anomalias presentes em humanos e animais,
acompanhadas por diversas ilustrações realizadas pela autora.
Assim, para além desta situação referida, a escolha desta versão para uma análise mais
detalhada assenta em duas razões. A primeira por questões sociais: este videojogo é um
fenómeno mundial de popularidade, pois o jogo foi lançado a 23 de novembro de 2004 e
chegou a ter mais de 12 milhões de subscritores1 ativos e passados quase dez anos após o
seu lançamento, contínua com 7,6 milhões de subscritores2 e a segunda devido ao facto
da versão adotada ser a que mais se presta a este tipo de análise comparativa.
1
Os subscritores são jogadores que se registam para jogar. Neste tipo concreto de jogo é necessário pagar
uma mensalidade.
2
Estes dados foram confirmados através do website Statista. com.
1
M. Inês Garcia
Numa segunda fase, como já foi indicado, far-se-á uma análise de duas criaturas do
universo do World of Warcraft: o Orc e o Ciclope.
No caso da primeira criatura, veremos que é bastante divulgada nos universos ficcionais,
tais como o universo de Tolkien, conhecido pela sua saga literária, (e posteriormente
cinematográfica), Senhor dos Anéis e Hobbit, e ainda, nos universos dos videojogos e
jogos de tabuleiro. Será contextualizado de acordo com a sua origem, (como surgiu e em
que universos é mencionado) e posteriormente é feita uma descrição acima de tudo física
da personagem de acordo com os universos onde se encontra.
2
M. Inês Garcia
A) OBJECTIVO
B) METODOLOGIA
Como metodologia foi escolhida numa primeira etapa de desenvolvimento fazer-se uma
abordagem histórica dos monstros, (como surgiram e em que épocas), tentando
compreender como despontaram estas criaturas fantásticas, sob que pretextos, e ainda
compreender como é que esta temática se disseminou para outras áreas tais como a
literatura ficcional, a arte, a ciência e também o lazer.
Numa segunda fase analisar-se-á estas personagens fictícias, do ponto de vista anatómico
e científico, justificando a sua aparência por analogia a um universo de anomalias e
malformações, (que existem não só no ser humano como também em outros seres vivos,
tais como os símios, aqui abordados como termo de comparação), sustentadas não só por
conversas com jogadores veteranos (o que ajudou a uma maior compreensão sobre o
universo do videojogo em questão) como também por ilustrações que clarifiquem toda
esta análise.
3
M. Inês Garcia
CAPÍTULO I
4
M. Inês Garcia
No período clássico, o povo grego enalteceu os monstros na sua mitologia, bem como o
medo que despoletavam, porém, também os pensaram através da imaginação, inventando
raças monstruosas e animalescas que supostamente viveriam a grande distância, no
Oriente, mais concretamente na Índia. Os gregos foram portanto um dos povos
responsáveis pela ideologia ocidental e da “aparência” que a Índia teria.
No início do século IV a.C. foi criado um estudo especial sobre a Índia publicado por
Ctesias de Knidos (400 a.C.), médico da corte de Artaxerxes Mnemom da Pérsia. Graças
a esta obra, a Índia foi conotada como “Terra das maravilhas”, pois Ctésias recolheu
algumas histórias fabulosas desde o tempo de Homero, acrescentando também o seu
contributo: descreveu serpentes com asas de morcego, escorpiões alados de tamanho
extraordinário, pessoas cujos calcanhares estão virados para frente, com os dedos e dorso
dos pés virados para trás, homens sem boca que viviam do olfato, pessoas com orelhas
de cão, com um olho apenas na testa e ainda os hiperborianos, que conseguem viver mil
anos.
O médico povoou a “Terra das maravilhas” também com pigmeus, (que lutavam com
garças), ciápodes, (um povo que tinha apenas um pé e uma perna muito largos, o que lhes
permitia não só deslocarem-se de forma extremamente rápida, como também utilizar o
seu enorme pé para a proteção dos raios solares), cinocéfalos, (homens com cabeça de
animais, nomeadamente de cães, que ladravam em vez de falar), pessoas sem cabeça, que
tinham o rosto entre os ombros, entre outras criaturas fantásticas. Relatava ainda que em
determinadas partes da Índia3 existiam gigantes e noutras zonas, homens com caudas
enormes, como as dos sátiros.
3
Muitas das criaturas relacionadas com o monstruoso provém do Oriente, mais concretamente da Ásia,
precisamente pelo facto de ser praticamente desconhecida e por isso, despoletar um enorme fascínio. De
acordo com o pensamento clássico e medieval, e por ser misteriosa, distante, e, por conseguinte também
por ser caracterizada por uma cultura diferente, a Ásia representava o cenário ideal para as mais variadas
lendas.
5
M. Inês Garcia
Fig. 1. Sebastian Münster, “Illustrations of monstrous humans from Cosmographia”, xilogravura, 1544.
Esta ilustração representa diversas criaturas “monstruosas”. Da direita para a esquerda: ciápode, ciclope,
gémeos siameses, indivíduo com a cara entre os ombros (em inglês denomina-se “blemmye” e não possui
tradução para português) e cinocéfalo.
Todas estas crenças deram então origem a uma vasta tradição literária4 e um dos seus
iniciadores foi Hecataios de Mileto, atravessado os textos de Ctésias e ainda a obra de
Mégasteno (cerca de 290 A.C), geógrafo, cujo relato se manteve indisputado durante 1500
anos. Por sua vez, estes citaram compilações de outros autores tais como Homero,
Heródoto, Plínio, Estrabão, Solinus e Diadoro da Sícilia, fabricando-se uma panóplia de
imagens relativas a seres que habitavam quase exclusivamente o Extremo Oriente, mais
concretamente a Índia5.
4
Na obra clássica Metamorfoses de Ovídio existe também um importante contributo relativamente à
mitologia grega, tal como o nome indica, são descritas bastantes personagens que se transformam em
diversos elementos (homens que se transformam em rios, flores, rochas, deuses que se transformam em
pássaros, ninfas em sons, entre outros.). Nesta obra, os deuses transformam os homens para que possam
provar a sua superioridade perante mortais e eles próprios de forma a realizarem os seus desejos e sonhos.
Existem diversas variações de transformações quer em mamíferos, aves, plantas, pedras, criando-se assim,
os chamados híbridos.
5
A religião hindu é particularmente rica em criaturas hibridas, tendo como exemplo o deus Ganesh (ou
Ganesha) o senhor dos começos e do conhecimento, que é representado com quatro braços e cabeça de
elefante e o deus Brahma, criador do universo, que também é representado com quatro braços, quatro
cabeças e pele vermelha.
6
M. Inês Garcia
Mas, como era impossível realizar uma expansão geográfico-etnológica, (que permitiria
um maior conhecimento sobre estes temas), esta situação fez com que os autores clássicos
se limitassem a transcrever de forma fiel, os clássicos relatos sobre a Índia. O que fez com
que o conhecimento helenístico e romano se baseasse principalmente nas obras de Ctésias
e Megásteno.
No Ocidente medieval acreditava-se que existiam raças residentes nos confins da terra,
(sendo esta povoada por cristãos e pagãos), que se desconhecia serem humanas ou
animalescas, estas criaturas eram denominadas de raças fabulosas do Oriente.
Durante os séculos VII e X dá-se uma viragem das preferências estéticas e intelectuais,
nos domínios da Hispânia, Ilhas Britânicas e Itália. A Europa vive assim os “séculos
obscuros” em termos de estilo, que de acordo com Umberto Eco se denomina estética
hespérica. Nesta época, ocorre também o declínio da agricultura, êxodo das cidades,
queda das construções romanas tais como aquedutos e estradas. Em suma, vive-se um
clima atribulado onde os monges, poetas e miniaturistas representam o mundo como uma
selva escura habitada por monstros e atravessada por caminhos labirínticos. Nesta época
o que se apreciava era o gigantesco e o desmedido.
Assim, até ao século XVI as alterações sofridas não foram muito significativas, apenas se
procederam a pequenas mudanças, representativas do espírito de cada época. Os relatos
exerciam um poder inebriante e sedutor, conquistando os cartógrafos, viajantes místicos
e verdadeiros, (tais como Marco Polo), moralistas e religiosos, (tais como Santo
Agostinho). Assim, neste rol de povos e raças atrás referidos, estavam registados
testemunhos de viajantes que alegadamente, avistaram esses seres estranhos, como os já
descritos ciápodes, pigmeus, ou ainda outras espécies hibridas descritas por Ctésias.
7
M. Inês Garcia
questão do infinito ainda não havia irrompido, produzindo a partir da sua presença, a ideia
de um Cosmos sem centro e sem margens”6.
No que diz respeito ao desenvolvimento temático existia uma predileção pela narração
concreta dos acontecimentos que ilustravam uma determinada ocorrência, sendo comum
a frequência de redundâncias, estereótipos e repetições que pretendiam reforçar a
afirmação da veracidade das informações narradas, bem como a bestialidade das criaturas
e consequente malvadez.
6
Tucherman, Ieda (1999) Breve História do Corpo e de seus Monstros. Lisboa: Veja, p. 110.
8
M. Inês Garcia
De acordo com a autora Ana Margarida Ramos, os monstros destes folhetos são em
síntese os “nossos” monstros do quotidiano, através de uma tradição cultural antiga que
frequentemente associa a estes acontecimentos as dificuldades que o herói tem que
enfrentar e vencer para reclamar a glória e imortalidade. Mas o convívio prolongado com
o monstruoso poderá apresentar consequências, na medida em que o mesmo se torna
familiar. Para isso, os narradores dos vários textos insistem repetidamente na sua
descrição e credibilidade, pois cada vez se torna uma tarefa mais árdua assustar os
homens, porque a realidade tende a ultrapassar a ficção8.
Contudo, ainda não foi descoberto qual a forma de introdução reciproca entre a cultura
profana e a mitologia religiosa. Sabe-se no entanto que a primeira foi fortemente
influenciada pela segunda. No plano da cultura elitista da Idade Média originaram-se
canções de gesta e bestiários como obras não sagradas.
7
Os folhetos de cordel ou literatura de cordel é um género literário popular por volta do século XVIII que
tinha origem em relatos orais e posteriormente era impresso em folhetos, com recurso a ilustrações por
método de xilogravura. O nome tem origem na forma como os folhetos eram tradicionalmente expostos
para venda: pendurados em cordas, cordéis ou barbantes. As temáticas eram variadas: desde acontecimentos
históricos (guerras, naufrágios, morte de reis), a relatos que descrevem fenómenos naturais (cometas,
inundações, tempestades, erupções vulcânicas, etc.), a milagres e vidas de personagens célebres (santos,
reis, criminosos, heróis) e ainda relatos que davam conta do surgimento de monstros ou seres estranhos,
entre outros. Estes documentos tinham como principal objetivo proporcionar entretenimento e fornecer
informação ao leitor sobre os mais diversos assuntos e temas. É ainda de sublinhar o cariz depreciativo que
este género encerrava pois era aplicado a obras de qualidade literária questionável ou inexistente.
8
Ramos, Ana Margarida (2008) Os Monstros na Literatura de Cordel Portuguesa do século XVIII. Lisboa:
Edições Colibri: Instituto de Estudos de Literatura Tradicional, p. 130.
9
M. Inês Garcia
9
Os bestiários são tratados em prosa ou em verso que remontam à época clássica greco-latina e com grande
sucesso na época medieval. Desenvolveram-se mais especificamente em Inglaterra e também em França.
Nestes tratados eram descritas características físicas e costumes dos animais (verdadeiros ou fantásticos),
sendo posteriormente atribuídos diversos significados alegóricos ou morais. Podem também ser
considerados como importantes tentativas científicas de catalogação dos diferentes tipos de espécies
animais. De acordo com a autora Angélica Varandas do Instituto de Estudos Medievais da Universidade
Nova de Lisboa refere no seu artigo “ A Idade Média e o Bestiário”, o bestiário «organiza-se em torno de
pequenas narrativas que descrevem várias espécies animais, com propósitos morais e didácticos. Neste
sentido, cada uma dessas narrativas é composta por duas partes distintas: uma parte descritiva de sentido
literal (a descrição, proprietas ou naturas) e a sua moralização e interpretação teológica de sentido
simbólico-alegórico (também designada como moralização, moralitas ou figuras)».
10
Cit. Por, Ramos, Ana Margarida (2008) Os Monstros na Literatura de Cordel Portuguesa do século
XVIII,p. 106.
10
M. Inês Garcia
É frequente a narrativa de viagem ter uma ligação com a novidade, que desempenha um
papel de destaque e ainda possuir um gosto por relatos que ultrapassam a realidade vivida.
11
Ibidem, p. 107.
12
Ibidem, p. 112.
11
M. Inês Garcia
Deste modo, a viagem serve o maravilhoso, pois pressupõe uma partida para o
desconhecido e para a aventura e é esta via que potencializa a via para o maravilhoso.
13
Esta gravura é um ícone de um dos fenómenos mais célebres de produção e difusão do mito: um exemplo
que sintetiza o fascínio pelo monstruoso exótico e a curiosidade científica, proporcionando à ilustração um
impacto cultural descrito em relatos, cuja transmissão acarreta as mais variadas lendas, ou seja um
verdadeiro elemento de bestiário. Para a elaboração da imagem, Dürer não viu o animal in loco e orientou-
se por relatos epistolares, fontes literárias (alegoria do rinoceronte) e imaginação começando por produzir
um desenho (atualmente no British Museum) e de seguida, a célebre gravura. Curiosamente, uma vez que
não tinha referências reais, o modelo da tartaruga ajudou-o a transformar em couraça a pele do animal, para
assim, imprimir a expressão e perceção documental enfatizando o pseudo naturalismo científico da imagem,
criando assim um híbrido entre fantasia e naturalismo cientifico, típico de uma expressão renascentista.
Para além de todas as lendas e alegorias associadas, o rinoceronte é ainda associado a um animal mítico
célebre no imaginário medieval e renascentista: o unicórnio. Em termos históricos, a chegada do animal a
Lisboa causou polémica e curiosidade não só em Portugal como no resto da Europa, devido ao aspeto
exótico do rinoceronte. Era um animal enorme com uma pele espessa e rugosa que formava três grandes
pregas que lhe conferiam a aparência de uma armadura. Em 1515, o rei D. Manuel I, decidido a obter o
apoio do Papa Leão X na sequência dos crescentes sucessos dos navegadores portugueses no Oriente e
também com o interesse de consolidar o “Prestigio internacional do reino” ofereceu o rinoceronte que partiu
numa nau de Lisboa. Porém ao largo de Génova surgiu uma violenta tempestade que afundou a nau e
consequentemente, a morte de toda a tripulação incluindo o rinoceronte, preso por amarras. Foi possível
recuperar o corpo do animal e, D. Manuel I ao saber da notícia mandou naturalizar (empalhar) o animal e
enviar novamente para o Papa, que infelizmente, não teve tanto sucesso como seria de esperar. Para mais
informações consultar o website TORRE DE BELÉM, artigo O Rinoceronte e ainda a monografia Rhinos
are Coming simultaneous exhibitions of printmaking & printmaking instalation, Brazil, Poland, Portugal
& South Africa editada pela Faculdade de Belas-Artes de Lisboa, com a coordenação do Professor José
Quaresma.
12
M. Inês Garcia
Segundo José Gil, os monstros existem para mostrar aquilo que nós, seres humanos,
poderíamos ser, os limites da nossa humanidade. Não são nem seres mitológicos, nem
santos, nem raças étnicas de infiéis que veneram deuses ilusórios. De acordo com as
crenças dos sarracenos16 na Idade Média, a perspetiva das raças monstruosas centrava-se
na representação dos seus corpos, (sendo que a questão da deformidade não contribuía
para a compreensão das suas práticas- a cabeça de animal de um cinocéfalo não explica
nada relativamente à sua sociedade, é apenas um traço comportamental) e esta visão era
absorvida pelo cristianismo da época17.
14
Na óptica de A.M. Ramos, este tipo de textos tem uma classificação difícil. Pois situam-se numa fronteira
ténue entre o literário e o não literário e simultaneamente, refazem práticas narrativas ancestrais e
tradicionais, fixas no discurso oral.
15
Ibidem, p. 115.
16
A definição de Sarraceno era uma das designações equívocas que os cristãos da Idade Média tinham para
denominar os árabes ou os muçulmanos. O termo surgiu na Antiguidade e até ao século III d.C designava
uma tribo que habitava no Sinai (península do Sinai) ou, mais especificamente, as populações que viviam
em áreas de deserto na província romana da Arábia Pétrea (província fronteiriça do Império Romano) ou
na sua vizinhança, no noroeste da península arábica e norte do Sinai. As palavras “islão” e “muçulmano”
só foram introduzidas nas línguas europeias no século XVII. De acordo com o filósofo e antropólogo
Youssef Seddik (1943), «os homens não muçulmanos, que, durante séculos após o surgimento do Islão,
não tinham o direito de se nomear árabes, chamavam então a si próprios "sarracenos" ou "pagãos».
17
Gil, José (2006) Monstros. Trad. José Luís Luna. Lisboa: Relógio D’Água Editores, p. 28.
13
M. Inês Garcia
Mas, Santo Agostinho parece adotar uma certa postura de ceticismo face à existência dos
monstros: “ não é necessário acreditar em todos estes géneros humanos que se diz
existirem”18. Esta afirmação parece estranha vinda de alguém disposto a acreditar em
factos insólitos e maravilhosos, mas de facto existem razões sólidas para a rejeição das
raças monstruosas e o santo subjuga sempre os acontecimentos de acordo com a
conveniência dos textos sagrados.
Não existem apenas preocupações de ordem teológica, mas também da ordem de uma
visão da realidade que se produz e para a qual Santo Agostinho contribui com a sua
vontade de absorver os saberes antigos, no conhecimento que o texto bíblico sugeria ao
mundo.
18
Cit. Por, Gil, José (2006) Monstros, p. 29.
19
Cit. Por, Gil, José (2006) Monstros, p. 30.
14
M. Inês Garcia
se de uma anomalia leve, mas não podemos ser tão tolos que pensemos que
Deus se enganou no número dos dedos, embora nos escape a razão do
fenómeno!”20.
Remata ainda o final com uma certa descrença: “Por isso, parece-me que o modo mais
cauteloso de resolver a questão é o seguinte: ou o que foi escrito acerca destes povos é
falso ou, se é verdadeiro, não se trata de homens; e se se trata de homens, provêm de
Adão”21. Assim, de acordo com o santo, a incompreensibilidade do nascimento
monstruoso, (que não é nenhuma repreensão divina), não tem uma relação com as raças
fabulosas ou seja, uma não explica a outra, mas confirma que a primeira tem uma razão
de ser, apesar não ser muito entendida.
Gil defende que existe um patamar de estranheza das formas corporais que define a
identidade humana. E em Santo Agostinho está presente a incerteza dogmática
relativamente à alma humana, sendo esta posta em dúvida pela monstruosidade de certas
raças. O santo refere que as “diferenças” dos monstros face aos humanos se encontram
no corpo normal, cristão, onde se instala a alma humana.
O Santo defendia ainda a beleza dos monstros por serem criados por Deus e
conjuntamente, esforçou-se para disciplinar a interpretação alegórica das Sagradas
Escrituras, lembrando ser necessário intuir um sentido espiritual para além do literal. Era
necessário possuir uma enciclopédia que informasse sobre o significado alegórico de
todas as coisas. Foi desta maneira que nasceram os bestiários moralizados, onde cada ser
real ou irreal se agrupava a um ensinamento moral.
20
Cit. Por, Eco, Humberto (2007) História do Feio, p.114.
21
Ibidem, p. 114.
15
M. Inês Garcia
A alma aloja-se no corpo, e é do corpo que se deve tratar pois é nele que surgem as
anomalias, que podem ser perigosas por contaminar o homem, (torná-lo animal, misturar
os géneros, etc.), e ao contaminá-lo podem corromper a alma, correndo o risco de se
extinguir. Assim, deve diminuir-se a aberração corporal e consentir que os monstros
disfrutem do estatuto de mirabilia22 da Natureza. A Natureza na Idade Média é dividida
em dois espaços diferentes, o da ordem sagrada ou profana e o do maravilhoso,
desconhecido e inesperado.
Desde o início que o mundo cristão utilizou os monstros como forma de definir a
divindade. Segundo Dionísio Areopagita:
22
Mirabilia ou maravilha englobam acontecimentos mais ou menos estranhos a descrições invulgares.
Geralmente encontram-se nos roteiros ou crónicas de viagens e peregrinações ao Oriente.
23
Cit. Por, Eco, Humberto (2007) História do Feio, p. 125.
16
M. Inês Garcia
Por conseguinte, e apesar de acusar algum ceticismo, Santo Agostinho atribui aos
monstros um estatuto próximo de mirabilia, proporcionando a oportunidade de serem
integrados no cristianismo. Ao semear a dúvida acerca das raças monstruosas, e
simultaneamente aceitando-as mediante determinadas circunstâncias, Agostinho liberta-
as da objetividade que possuíam deste a tradição greco-latina, tornando-as apetecíveis
para interpretações do ponto de vista simbólico.
As raças fabulosas pertencem a um outro tempo que foge à época cristã: no caso das
raças fabulosas do Oriente existe uma composição de três tipos de questões que se
interrelacionam: o conceito de Natureza e do espaço, a ideia de tempo, a visão, o corpo e
a alma do homem. Assim, o fator insólito destas raças aparece como um agente de
transformação, marcando a diferença entre sistema atual e anterior.
Todavia, José Gil questiona o aparato em torno das raças e não dos nascimentos
monstruosos, justificando essa decisão através da própria definição do homem enquanto
espécie natural criada por Deus, não se tratando somente de um acontecimento
contingente, como sendo supostamente a existência dos monstros individuais.
17
M. Inês Garcia
CAPÍTULO II
ANOMALIAS
E
MUTAÇÕES
18
M. Inês Garcia
A especulação sobre a origem dos monstros no que diz respeito à ciência, sempre foi um
assunto interessante. As literaturas sobre monstros foram ao longo dos tempos, e com
especial enfoque na Idade Média, um enorme sucesso comercial, atingindo uma maior
fama com o aparecimento da imprensa. Os folhetos sobre monstros eram vendidos em
qualquer lugar e “monstros reais” eram exibidos diante de multidões sequiosas em feiras
nas cidades, no campo e até nos palácios de reis e nobres.
Este “fascínio mórbido” não tinha limites e o conceito de “monstro” permaneceu vago
durante muito tempo. Para além dos espetáculos de feiras, foi florescendo um interesse
crescente em termos científicos para a justificação da origem de tais estranhas formas de
vida. Acumularam-se diversos estudos sobre estas criaturas extraordinárias desde a
Renascença até à Revolução Científica, originando um número ilimitado de debates
académicos consecutivos ao longo dos anos.
24
Correia, Clara Pinto (2003) Os Monstros de Deus: A Humanidade e as suas lendas: do espermatozoide
ao verme. Trad. Cristiana Vieira.Vila Nova de Famalicão: Quasi, p.40.
19
M. Inês Garcia
Fig. 5. Ambroise Paré, Figura de um monstro com duas cabeças, uma feminina e outra masculina.
“ (…) De vez em quando, Deus diverte-se a enviar um monstro- se não for para
mais nada, será apenas para nos lembrar do Seu poder absoluto e da Sua
vigilância constante do nosso comportamento”25.
25
Cit. Por, Correia, Clara Pinto (2003) Os Monstros de Deus,p. 57.
26
Correia, Clara Pinto (2014) A Hipótese da Boneca Russa: A Revolução Científica e o Primeiro Conceito
de Genética. In: Incomunidade, Porto: Ed. 27 Out. 2014. [Consult. 22 Nov.2014]. Disponível em: WWW:
<URL http://www.incomunidade.com/v27/art_bl.php?art=10>.
20
M. Inês Garcia
De acordo com o filósofo José Gil, no que diz respeito à conceção que a Idade Média tem
da teratologia28 existem dois aspetos distintos: um que remete para os nascimentos
monstruosos, encarados como presságios, portenta, e o outro que se confina à aceitação
da existência de raças fabulosas nos confins da terra29. Estas duas crenças30 não se
misturam e desvinculam questões no âmbito da existência dos monstros e na indagação
se estes serão realmente presságios.
Porém, a autora Ieda Tucherman defende que os monstros não podem ser pensados dessa
forma, pois o presságio tem uma temporalidade própria e efémera que existe apenas
durante o tempo de transmissão da sua mensagem.
Gil distingue ainda os povos fabulosos das imagens fantásticas que frequentemente são
identificadas como figuras mitológicas de animais monstruosos consequentes da junção
de várias espécies, tais como os centauros. O monstro apresenta por isso, características
fora do contexto, sendo considerado como um paradigma real/irreal.
27
Idem.
28
A teratologia, (do grego teratos que significa “monstro” em junção com logos que significa “estudo”), é
o estudo dos processos biológicos referentes às causas para o desenvolvimento e nascimento anormal, ou
seja, é uma parte da medicina que estuda as malformações, neste contexto, os monstros.
29
Gil, José (2006) Op. Cit., p.27.
30
Vislumbra-se nos nascimentos o elo possível entre os portenta incarnados nos nascimentos monstruosos
e os povos orientais.
21
M. Inês Garcia
social: existe uma profunda e inegável relação com o olhar. Este fascínio visual relaciona-
se com a superabundância de realidade que o monstro nos oferece ao olhar.
José Gil defende que as raças monstruosas não são figuras simbólicas de uma mitologia
definida, (seja ela cristã ou pagã), nem simples casos insólitos, pois quando as anomalias
são físicas a descrição assume um papel praticamente objetivo, como se o corpo
monstruoso anulasse a função simbolizante. Existe um exagero da realidade na ideia de
monstruosidade relativamente ao indivíduo comum, havendo uma diferença maior em
relação à raça monstruosa.
É então concebida uma realidade acrescida demonstrando que a sua “essência” provoca
um paradoxo. Assim, a sua recusa supõe a afirmação da essência oposta conduzindo a
uma asseguração da sua existência: “o «excedente» de realidade do monstro torna-se o
«excedente lógico» da sua impossibilidade empírica”31.
31
Gil, José (2006) Op. Cit., p 51.
32
De forma a clarificar esta afirmação, em termos anatómicos as monstruosidades são malformações
anatómicas incompatíveis com a vida. Tomando como exemplo os casos dos gémeos siameses, se as
alterações físicas apresentadas forem compatíveis com a vida estamos perante um caso de malformação. Se
não forem, e por isso resultem em nados-mortos configura-se a presença de uma monstruosidade. Desta
forma, em termos de ciência anatómica, os monstros são uma realidade desprovida de vida e traduzida pelos
humanos numa representação mental imortal, num universo imaginário.
33
Idem, Ibidem.
22
M. Inês Garcia
Mas o filósofo vai mais longe defendendo ainda que o monstro nada simboliza em si
próprio, constituindo uma deformação física que integra um limite do simbólico e da
simbolização. Então, as raças fabulosas não são apenas simbólicas nem apenas reais, mas
conjuntamente simbólicas e reais, adquirindo uma função múltipla, que permite refletir
sobre a humanidade, permanecendo sempre anómala, conservando a dúvida referente a
essa mesma humanidade. O mundo monstruoso não é nem barbárie nem inferno e não
contesta nenhuma representação em particular, mas sim ao próprio mundo como palco de
habitação do homem racional e mortal.
Na opinião de Ana Margarida Ramos, ainda na Idade Média, existem duas teses principais
para a ocorrência de nascimentos monstruosos: a diabólica e a naturalista. A primeira
atribui à progenitora a culpa pelo que sucedeu, como já foi descrito, acrescentando ainda
que a mãe teria praticado relações sexuais com o diabo sob algumas das suas formas. Na
segunda tese, existe uma diferenciação entre os diferentes tipos de monstruosidade, por
excesso ou defeito, que eram atribuídos a uma quantidade excessiva ou escassa de
esperma. Para além disto, também não eram excluídas as conjeturas de atos sexuais com
animais, quando o recém-nascido evidenciava similitudes com alguma espécie em
concreto34.
34
Ramos, Ana Margarida (2008) Op.Cit., p. 100.
23
M. Inês Garcia
Fig. 6. Imagem pertencente a Ambroise Paré e aos seus estudos referentes à temática dos nascimentos
monstruosos. Aqui vemos retratado uma mulher grávida de múltiplas crianças.
Segundo Ambroise Paré, as causas para estas manifestações divinas têm que ver com a
ira de Deus. Estes prodígios são fruto da sua vontade para nos alertar dos infortúnios com
que somos ameaçados. Para este autor, existem treze causas para os nascimentos dos
monstros, sendo elas:
Paré concorda igualmente com a teoria de que os monstros têm origem nos apetites
excessivos das grávidas, (entre os quais o incesto e o canibalismo), pois é “uma coisa
brutal e obscena ter relações com uma mulher enquanto ela expia os seus pecados” e é do
35
Cit. Por. Tucherman, Ieda (1999) Breve História do Corpo e de seus Monstros, p. 117-118.
24
M. Inês Garcia
Esta convicção teve origem em Hipócrates e prosseguiu até ao século XVIII. Defendia-
se também na época que uma anomalia física de um feto era causada pela leviandade
moral da progenitora. Para sublinhar esta conceção atente-se na afirmação de Pierre
Boaystuau:
Os corpos dos monstros eram também considerados como somas excitantes de partes
interessantes, uma espécie de «manta de retalhos». Estas somas de partes anatómicas
aberrantes eram fisiologicamente viáveis por estarem vivos o que comprovava o enorme
poder de Deus. Pois tal como afirma o anatomista francês du Verney “ a análise dos
monstros revela a riqueza dos Mecanismos do Criador…a regularidade da irregularidade
aparente”38.
36
Correia, Clara Pinto (2003) Op.Cit., p.58.
37
Ibidem, p. 118.
38
Correia, Clara Pinto (2003) Op.Cit., p.63.
25
M. Inês Garcia
Fig. 7. Ambroise Paré, Figura de um porco com cabeça, mãos e pés de um homem sendo o restante de
porco.
Há ainda autores que consideram o aparecimento dos monstros como algo sobrenatural,
insólito existindo diversas interpretações face ao seu nascimento, tais como a
interpretação de Jean Céard que identificou a existência de três tradições na interpretação
do nascimento de monstros: a primeira defende a ocorrência de monstros e outros
fenómenos como tendo uma origem sobrenatural, sendo acompanhados por transgressão
moral e presságios de castigos divinos39. Pois a etimologia da palavra monstro aponta
nesse sentido: em latim monstrum advém da palavra monere que significa avisar. Esta
interpretação foi bastante utilizada como arma política e moral durante o período da
Reforma Protestante, tendo depois enfraquecido a partir dos finais do século XVII.
Para além desta interpretação, segundo José Gil, existe uma tendência em muitos autores
que associaram a etimologia da palavra “monstro” com monstrare, traduzindo-a por
“mostrar”, ou até por “indicar com o olhar”, que etimologicamente, “monstrare significa
muito menos «mostrar» um objecto do que «ensinar um determinado comportamento
(…)»”40.
Para Émile Benveniste, monstrum deve ser entendido como um conselho, um aviso dado
pelos deuses, sendo que estes se exprimem recorrendo a prodígios: uma advertência
divina que toma o aspeto de um objeto ou de um ser sobrenatural. Fortunio Liceti
39
Costa, Palmira Fontes da (2005) O Corpo Insólito: Dissertações sobre Monstros no Portugal do século
XVIII. Porto: Porto Editora, p. 3.
40
GIL, José (2006) Op. Cit., p.73.
26
M. Inês Garcia
acreditava que os monstros são “sinais que pressagiam de algum modo coisas vindouras:
mas é por serem como são que a sua novidade e extravagância nos fazem considerá-los
com admiração, surpresa e espanto e cada um os mostra reciprocamente.”41
Este fenómeno característico dos monstros proporciona uma verdadeira vocação para a
representação. E novamente de acordo com o filósofo José Gil, existe na imagem
monstruosa uma maior realidade do objeto, com mais detalhes do que uma imagem
vulgar. Está-lhe inerente uma excedência absoluta de substância: o excesso de realidade
confere-lhe a certeza da sua existência e apesar da sua etimologia, o monstro mostra mais
do que aquilo que é visto.
41
Cit. Por, GIL, José (2006) Monstros, p. 74.
42
TUCHERMAN, Ieda (1999) Op. Cit., p. 109.
27
M. Inês Garcia
No que diz respeito à área das Ciências Naturais, a Revolução Científica no século XVII
foi marcada com a introdução do microscópio como instrumento indispensável de
trabalho, para estudar o «mundo vivo». Após um período pouco assinalável de cerca de
cinquenta anos de estudo, as mentes e a tecnologia evoluíram de modo a possibilitar uma
disseminação de publicações inéditas, realizadas por naturalistas tais como o inglês
Robert Hooke, ou o italiano Marcello Malpighi, entre outros. Estes estudos causaram
grandes polémicas: não só um grande impacto religioso diante da comunidade letrada da
época como também um início de vias de trabalho sedutoras. Pois descobriu-se todo um
complexo universo a uma escala diminuta: este foi o mote para que os naturalistas se
libertassem de toda a opressão Aristotélica, mencionada anteriormente.
43
GIL, José (2006) Op. Cit., p.79.
44
Em meados do século XVII, o padre cartesiano Nicolas Malebranche no seu tratado La Recherche de la
Vérité, a par das descobertas microscópicas da época e da Teoria da Preformação, defende que durante os
28
M. Inês Garcia
Fig. 8. Ambroise Paré, Figura de uma criança monstruosa, proveniente da falta de sémen em quantidades
apropriadas.
Foi nesta linha que o médico francês Nicolas Andry, um espermista convicto, justificou
o desenvolvimento de monstruosidades: “ Se ocorrerem tentativas simultâneas para entrar
no ovo, os vermes tornam-se enraivecidos e lutam entre si, partindo e deslocando os seus
membros e, consequentemente, dando origem a monstruosidades”46.
seis dias da Criação, Deus ao criar cada organismo de espécie animal ou vegetal, vai encaixando-os nos
seus órgãos genitais, em tamanhos mais ou menos diminutos, exatamente como numa boneca russa. Todos
os organismos das gerações posteriores que viveriam até à denominada «conflagração final», que assinaria
o fim do mundo, pois assim toda a vida destinada a existir à superfície da Terra seria criada de uma só vez,
num ato único. No nascimento, a criatura teria já os seus próprios órgãos sexuais e dentro deles estariam já
guardados os organismos das gerações seguintes e assim sucessivamente.
45
Curiosamente, o termo «espermatozoide» só foi criado no século XIX pelo Cientista Karl Ernst Van Baer
(1792- 1876).
46
Correia, Clara Pinto (2003) Op.Cit., p. 15.
29
M. Inês Garcia
No entanto, esta teoria era dramaticamente imperfeita e a ideia de que Deus “permitia que
coisas pérfidas acontecessem” estava instalada. O sacerdote francês Nicolas Malebranche
defendia que os monstros eram fabricados pela imaginação materna durante a gravidez,
justificando que a mente materna incutia todo o tipo de informações no cérebro do feto
indispensáveis para a sobrevivência. Ainda seguindo a linha deste autor, a ocorrência
fortuita de nascimentos monstruosos resulta de Deus ter:
No entanto, esta teoria sugeria uma visão estática do mundo, tornando problemática e
polémica a compreensão do aparecimento de novas formas no munto natural dos quais os
monstros eram o exemplo mais emblemático- os monstros eram de facto um desafio
epistémico à teoria.
A origem dos monstros era por isso um problema de justificação para a Preformação, pois
desta forma, os preformacionistas tinham que admitir que se os monstros eram formados
por acidentes, então existia lugar para que ocorressem acasos no complexo programa de
desenvolvimento divino. Mas, isto levanta uma questão pertinente: porque criaria Deus
organismos disformes, que na maioria viviam tão pouco tempo? Shirley Ann Roe no seu
livro “Matter life and Generation” vai mais longe questionando o porquê de Deus criar
pessoas cruelmente deformadas, se era, supostamente, uma entidade boa?48
47
Correia, Clara Pinto (2003) Op. Cit., p.46.
48
Cit. Por, Correia, Clara Pinto (2003) Os Monstros de Deus, p. 52.
30
M. Inês Garcia
O cientista Albrecht von Haller, (1708-1777), para além da sua obra multifacetada em
diversas áreas desde a ciência à literatura e filosofia, interessou-se também no problema
da origem dos monstros. Defendia que toda a construção de um corpo correspondia a uma
ideia singular do criador. Desta forma, o surgimento de monstros não se tratava de um
erro da natureza mas sim da capacidade de Deus para criar vários tipos de criaturas50.
Haller analisou diversos casos de monstros mencionados na literatura médica, acabando
por sistematizá-los de acordo com uma origem por germes monstruosos ou por causas
acidentais, sendo algumas delas:
49
Costa, Palmira Fontes da e Cardoso, Adelino (2010) Corpo, Poesia e Afecto em Albrecht von Haller.
Lisboa: Edições Colibri, p. 59.
50
Idem, p.66.
31
M. Inês Garcia
III. Não é rara a transposição de partes para as quais nenhuma força externa
pode ser concebida como causa. Com alguma frequência, é todo o sistema das
vísceras que parece ter mudado de lugar em todo o corpo, de modo que as partes
direitas se encontram à esquerda.
IV. Encontram-se várias vezes as partes juntas através de uma arte que nenhum
acidente fortuito poderia explicar (…)
V. Não é raro que no feto apareçam partes novas que se desviam da fábrica
originária, as quais não podem ser criadas a partir da alteração de outras partes
ou de um acidente. Isto é testemunho de que estas estruturas existem desde o início
no feto, de modo que não resultaram de um acidente mas foram formadas pela
indústria do Criador. (…)
VII.(…) A estrutura interna dos monstros encontramos vários que respondem a
uma lei preestabelecida. Eles indicam manifestamente um fim e causas orientadas
em relação a este fim. 51
Tal como defendia Winslow, Haller concorda que algumas formações podem ser melhor
justificadas com recurso aos acidentes. A união é possível e é difícil de estabelecer os
limites onde terminam o poder das forças atuantes52 no feto. O cientista defende ainda o
desempenho dos monstros como instrumentos do conhecimento, sublinhando a evidência
de que o Iluminismo, a ciência e a religião ainda estavam intimamente interligadas.
Nesta época havia portanto, uma grande polémica em torno da origem dos monstros,
surgiam assim duas grandes hipóteses para existência de monstros reais: a existência de
germes monstruosos originais e/ou serem concebidos pelo Criador. Atualmente é fácil de
compreender que tudo isto era fruto da pouca compreensão anatómica e genética, mas no
século XVII havia maiores limitações. Lemery apontou precocemente ser essa a razão
para a incompreensão dos monstros: pois os limites do conhecimento anatómico da época
eram impeditivos para a compreensão.
51
Idem, p. 66-67.
52
A estas ditas “uniões” incluem-se as adesões de vísceras, fetos com ânus fechado ou uretra disfuncional,
fetos com a vagina sem abertura ou com o intestino reto fechado, fetos com dedos sem separações e ainda
fetos unidos pelo dorso.
32
M. Inês Garcia
O traço mais marcante na figura dos monstros imaginários é o seu aparecimento a partir
de hibridizações de espécies com diferentes naturezas. Tanto podem ter natureza divina e
humana como humana e animal. O conceito de corpo humano configura-se com uma
estrutura diferente, produzindo os monstros teratológicos ou fabulosos. Não é a simples
oposição que marca a diferença entre os homens e os monstros, mas sim um complexo
sistema de aproximação e distanciamento, de misturas e de hibridização. Desta forma, as
descrições dos monstros não são feitas a partir da carência dos elementos, mas do
cruzamento natural entre ambos, que observando através do “prisma antropológico,
representam o desregramento da cultura, como o contacto direto, sem as mediações rituais
e sacrificiais entre os homens e as divindades”54.
53
Correia, Clara Pinto (2003) Op. Cit., p. 51.
54
Tucherman, Ieda (1999) Op. Cit., p.100.
33
M. Inês Garcia
Por conseguinte, nem a divindade nem o animal são os limites do humano. O monstro
apresenta-se no limite do humano, interno e produtor de figuras estranhas que
questionamos serem humanas ou não.
Cada tipologia exibe uma forma de alteração específica relativamente à regra, seja por
aumento ou redução, adição ou subtração. Para além da questão anatómica, existem
outros aspetos a ter em conta tais como alterações alimentares, genéticas ou de habitat.
Contrariamente ao que se possa pensar, não existe uma grande diversidade de formas
monstruosas, e as várias classificações de monstros mostram muitas semelhanças entre
si.
Gil defende que as alterações se prendem com faltas essenciais, modificações dos órgãos
entre si, aumento ou redução, substituição de um elemento habitual por um insólito,
mistura de reinos, mistura ou dissociação dos sexos, hibridez e animalidade forte. Já
Claude Kappler relaciona o monstruoso com uma oposição relativamente à regra
considerando também a falta de algo essencial, alteração de órgãos entre si,
desproporcionalidade ou enormidade física, inserção de um elemento singular em vez de
um comum, fusão entre os diferentes reinos naturais, mistura ou separação de géneros
sexuais, casos variados de hibridismo, entre outras características55.
55
Cit. Por, Ramos, Ana Margarida (2008) Os Monstros na Literatura de Cordel Portuguesa do século
XVIII, p. 118-119.
34
M. Inês Garcia
José Gil também concorda com o facto de todas estas tipologias terem em comum a ideia
de que a organização compositiva do monstro não é totalmente ilimitada como já foi
anteriormente descrito:
“ Um monstro não é não importa o quê: não existem raças de homens com o
rosto nas costas, mas existem raças com o rosto no peito; não há monstros com
quatro orelhas ou olhos na nuca; (…) qualquer explicação para justificar as
malformações das raças do Oriente a partir de malformações naturais (…) não
alcança necessariamente o seu objectivo por vários motivos: porque há muitas
malformações monstruosas biológicas que não estão representadas nessas
raças; porque incluem, em contrapartida, um determinado número de
monstruosidades que não são biológicas (em particular, o cruzamento entre
espécies humanas e animais); e, finalmente, porque este tipo de explicação não
dá conta do factor principal, a saber, o motivo que levou «a imaginação» a fixar
certas malformações biológicas, e não outras, nessa teratologia fantástica das
raças humanas”56
56
Gil, José (2006) Op. Cit., p.139.
57
Ibidem, p. 141.
35
M. Inês Garcia
Fig. 10. Hartmann Schedel (1440-1514), ilustração da Crónica de Nuremberga representando uma criatura
com quatro-olhos.
O autor Massimo Izzi considera ainda, para além da origem limitada de formas, que as
espécies monstruosas mais antigas possuem três categorias: monstros por defeito, por
excesso e monstros duplos ou compostos. No primeiro grupo estão contidos os monstros
com carências de alguma parte ou dimensões diminutas, no segundo grupo estão aqueles
que possuem elementos em excesso ou de grandes proporções e por fim, no terceiro grupo
estão os seres compósitos ou híbridos. Este autor assevera também que qualquer uma das
classificações terá sempre que se basear em critérios anteriormente esclarecidos, assim,
uma classificação dos monstros deve “basear-se na identificação de processos de
58
Mais uma vez na opinião de José Gil, esta era a verdadeira preocupação de Santo Agostinho: povos que
não possuíam alma e viviam como seres racionais.
59
Ibidem, p. 148.
36
M. Inês Garcia
construção do monstruoso, válidos para diferentes épocas e culturas, e não nas formas
concretas e específicas de cada um dos monstros (…) ”60.
Ieda Tucherman acrescenta ainda que os monstros podem ser divididos em duas
categorias gerais: as raças monstruosas e os monstros individuais, sendo que os
individuais podem ser considerados como reais, por possuírem deformações ou
malformações. Para os outros a autora apelida de “monstros imaginários” por serem
originados pela fabulação sem correspondência no mundo real. A autora refere-se ainda
aos “monstros de maldade” que remetem para o senso comum metaforizado, tais como
por exemplo a figura de Hitler na sociedade61.
60
Cit. Por, Ramos, Ana Margarida (2008) Os Monstros na Literatura de Cordel Portuguesa do século
XVIII, p. 120.
61
Tucherman, Ieda (1999) Op. Cit., p. 97.
37
M. Inês Garcia
CAPÍTULO III
A UTILIDADE
DOS
MONSTROS
38
M. Inês Garcia
Tiveram uma enorme adesão na área da alquimia, pois simbolizavam os vários processos
para a obtenção da Pedra Filosofal ou o Elixir da Juventude. E assim deste ponto de vista
pareciam maravilhosamente sedutores aos apaixonados pelas artes ocultas. Com o
decorrer do tempo esta atração pelo maravilhoso lendário evoluiu dando lugar à
curiosidade pelo interessante científico, realizando-se expedições por lugares
mencionados pelos medievais.
Foi a partir da Renascença que estas criaturas adquiriram um estatuto de objeto desejável
nos gabinetes de curiosidades. A sua raridade em junção com as emoções que arrancava
do espectador conferia-lhes um lugar central nas coleções. É nesta época que se assiste a
um grande desenvolvimento das coleções de história natural, que deixaram de ser
exclusivamente posse da nobreza alargando-se a médicos, farmacêuticos, membros do
clero e comerciantes.
Ao estarem presentes nestas coleções, havia uma certa homogeneidade das criaturas que
eram observadas pelo olhar científico. Generalizou-se a sua presença em teatros
anatómicos ao longo dos séculos XVII e XVIII surgindo cenários povoados de fenómenos
insólitos.
Como afirma William Hunter, em termos científicos, a existência dos monstros é útil
para o estudo das irregularidades que surgem, constituindo um desafio à teoria:
39
M. Inês Garcia
Para além da sua função científica, os monstros apresentam uma componente lúdica, de
entretenimento, sendo expressamente abordada em algumas narrativas, surgindo
temeroso e imponente para alguns leitores, e divertido para outros63.
62
Cit. Por, Costa, Palmira Fontes da (2005) O Corpo Insólito: Dissertações sobre Monstros no Portugal
do século XVIII, p. 3.
63
Realcemos a opinião de Umberto Eco que defende que foi a partir da Renascença que o monstro assumiu
uma função amistosa, devido à sua “impressionante fealdade”.
40
M. Inês Garcia
Desde a Antiguidade os monstros ou freaks são exibidos e tal como noutras práticas
pagãs, foram revividos na Europa durante a Idade Média. Inicialmente eram exibidos nas
cortes restritamente mas posteriormente, coube à Igreja a difusão desta prática por alegar
ser um “fator didático”, o que resultou num aumento de audiências pois eram exibidos
em “dias festivos e sob solo sagrado”64.
Este fenómeno de exibição dos monstros e de tudo o que seria considerado bizarro teve a
sua plenitude nos locais destinados ao comércio como entretenimento da população
atingindo o auge no século XIX. Feiras famosas tais como a Bartholomew fair, (suspensa
em 1840), centralizavam num único espaço atrações que permaneciam visíveis durante
um ano inteiro, sendo que naquela época o gosto por monstruosidades era quase um
vício.65
64
Tucherman, Ieda (1999) Op. Cit., p. 120.
65
Esta situação irá sofrer importantes mudanças no século XX. Com a invenção do cinema dar-se-á uma
diminuição de interesse pelo circo-show, assumindo-se como o lugar do espetáculo por excelência e
posteriormente, com a televisão.
66
Ibidem, p.130.
41
M. Inês Garcia
Umberto Eco defende que a atração do homem pelo monstruoso não é um fenómeno
recente nem exclusivamente literário, nem social ou cultural, pois abarca diferentes
estratos sociais e grupos etários bem como níveis culturais e escolares67. O autor
prossegue afirmando que a narrativa de horror remonta ao romance “gótico” do princípio
do século XIX anglo-saxónico, correspondente ao período romântico. Assim com esta
constatação, Eco justifica este gosto pelo horror com base em relações culturais e
históricas precisas para explicar o gosto pelo grotesco em determinados momentos da
História da Humanidade.
Desta forma, “o gosto pelo horrífico apareceria como manifestação de um público saciado
de qualquer excitação, cumulado nos seus desejos de bem- estar económico, que por isso
procura o divertimento em regiões mais insólitas”68. Eco menciona este facto como
justificativo de causas de natureza sociológica, e ainda sublinha que o gosto pelo horror
corresponde a uma espécie de fuga para o diferente, quase no sentido exótico que não
seria preocupante e sim apenas liberatório, entendido como efeito catártico.
Assim, Umberto Eco considera o monstro como uma criação humana que representa e
simboliza “a violação das leis, o perigo, a ameaça, o irracional e o não dominável, sendo
o monstro, por isso, uma projeção fantástica de todos e cada um destes conceitos,
acalmando as angústias que dominam os homens”69.
Cada época histórica propõe uma teoria ou causa para a ocorrência de monstros e como
já foi referido, existem várias informações recorrentes e repetidas não sendo uma área
muito criativa. O grego Aristóteles também se interessou por eles e em simultâneo
investigou algumas explicações existentes. Na sua opinião, os monstros eram lusus
67
Os monstros não são apenas uma temática literária do século XVIII, nem contemporânea, aliás não são
de todo exclusivos do campo literário, pois atingem com uma grande projeção outras áreas culturais, como
é o caso da pintura, escultura, cinema e videojogos. E neste último domínio, os monstros e a consequente
exploração das suas variações tem-se revelado bastante rica, seja em parâmetros artísticos ou comerciais.
68
Ramos, Ana Margarida (2008) Op. Cit., p. 104.
69
Ibidem, p. 104.
42
M. Inês Garcia
naturae, piadas ou brincadeiras vindas da natureza, como tal, não deviam ser encarados
com horror mas sim com divertimento.
Sempre existiu uma crença e respetiva demonstração, não só nos textos sobre o
pensamento ocidental, como na organização de espetáculos que dão a ver a
monstruosidade, os shows, permanecendo ao longo dos tempos a vontade de marcar a
diferença.
Fig. 12. “ O Homem com cara de cão” (The Dog Faced Man) Poster de um Freak Show Victoriano [s.d]
um dos grandes atrativos das feiras. Todo o seu corpo era coberto pelos compridos, a origem deste
peculiar aspeto deve-se a uma doença existente denominada de hipertricose.
70
Tucherman, Ieda, Op. Cit.1999,p. 124.
43
M. Inês Garcia
Tal como também sucedeu no passado, atualmente esta temática tem proliferado bastante,
estando presente em muitas áreas, quer seja no cinema, na banda desenhada, nas
exposições de arte, jogos de computador e ainda em brinquedos, entre outros. Os
monstros têm também surgido nas revistas científicas, bem como em laboratórios, e em
programas educativos. “ Vivemos uma espécie de banalização desta nova associação com
a ciência, basicamente através da manipulação genética, uma “contracção do domínio da
anomalia”71.
Com esta “explosão” de seres monstruosos na contemporaneidade, parece que já não tem
o mesmo efeito assustador que tinham no passado, tal como Tucherman sustenta, isso
poderá dever-se ao facto de não termos uma configuração tão fechada para o mesmo, “na
qual estabeleceríamos a nossa imagem, do nosso próprio corpo, e que os fixaria na
absoluta e apavorante diferença”72. No entanto, se eles provocam interesse, é pelas
questões contemporâneas que implicam, sendo que as suas figuras poderão ser a chave
para recolocar constantemente a indagação acerca da humanidade do homem. Ieda
conclui ainda que os monstros existem como demonstração do que podíamos ser e não o
que somos, indagando sobre a questão, “até que grau de deformação, (ou estranheza),
permaneceremos humanos?”73.
Atualmente, a categoria dos freaks é flexível no sentido de acolher novas formas ditas
aberrantes, englobando homens e mulheres tatuados, representações étnicas, tais como as
mulheres da tribo Padaung (vulgarmente denominadas de mulheres-girafa), entre outras
tradições que envolvam alterações físicas. (ver Anexo de Imagens, Fig., 1 e 2.)
71
Ibidem, p. 97-98.
72
Ibidem, p. 98.
73
Ibidem, p. 101.
44
M. Inês Garcia
CAPÍTULO IV
ANÁLISE
DOS
MONSTROS:
ORC E CICLOPE
45
M. Inês Garcia
4. Orc: Etimologia
Conforme indicação dos dicionários de inglês arcaico, o registo da palavra Orc surge
como uma derivação do latim Orcus, sinónimo de ogre ou demónio infernal. Orcus era
uma divindade do submundo da mitologia romana, também conhecido como Plutão, e
igualmente encarado como um espectro, (daí a sua designação de criatura infernal nos
dicionários). Assim sendo, tal como os submundos estão imbuídos de conotações
negativas e aterradoras, também estas criaturas passaram a carregar essa herança.
Pressupõe-se que a palavra Orke ou Ogre tenha surgido na língua inglesa através de
contos de fadas europeus, escritos por Charles Perrault, (que se baseava muito nos contos
italianos sobre ogres de Giambattista Basile e Giovanni Francesco Straparola, que ao
escreverem no dialeto de Nápoles utilizaram variantes da palavra ogre tais como huorco,
huerco, uerco e até mesmo orco). Orco, palavra italiana, representava um gigante ou
monstro, uma criatura peluda com presas semelhantes às de javali, humanoide e capaz de
74
John Ronald Reuel Tolkien, (1892-1973), foi um grande estudioso da língua inglesa, especializado em
inglês antigo. Foi professor da sua especialidade na Universidade de Oxford. Para além disto. Lutou ainda
na Primeira Guerra Mundial, onde começou a escrever os primeiros ensaios que estiveram na origem das
suas obras mundialmente famosas: o Hobbit, (em inglês The Hobbit, 1937) e a saga Senhor dos Anéis, (Lord
of the Rings, 1954-1955). Ambas são passadas numa era pré-histórica numa versão inventada do nosso
mundo que Tolkien denominou de Terra-Média, (Middle-earth). Neste universo fantasioso existem Elfos,
Anões, Trolls, Orcs (ou Goblins), Hobbits e seres Humanos.
46
M. Inês Garcia
Tolkien expressou ainda o desejo de alterar a forma como a palavra era escrita de Orc
para Ork, existindo exemplos dessas tentativas em alguns dos seus escritos mais atuais.
No entanto esse desejo não foi levado avante, pois nunca foi detetado nas suas obras
publicadas.
Estes seres são representados de várias formas na cultura popular, (fantasia literária-
cinematográfica e videojogos), sendo que o seu aspeto é marcadamente grotesco com
traços faciais característicos de símios, javalis e de algum gigantismo. A sua pele em
termos de coloração apresenta um leque de tons que vão desde a cor verde aos tons
castanhos, cinzentos e vermelhos. São muito possantes e vigorosos, (comparativamente
aos Humanos nos universos fantasiosos), sempre acompanhados de outros animais que
lhes servem de montada tais como o javali, o lobo ou outras criaturas fantásticas.
Segundo Tolkien, os Orcs são humanoides com tamanhos e formas variadas, menos altos
do que a raça humana. São descritos como sujos e feios, com braços e pernas longas
fortes, possuindo presas grandes e algumas zonas da sua pele negras, quase como se
tivessem sido queimadas. Carnívoros por natureza, comem todo o tipo de carne incluindo
a humana, chegando em alguns casos a praticar atos canibais (ver Anexo de Imagens, Fig.
4).
47
M. Inês Garcia
Em alguns documentos de Tolkien existem referências aos Orcs como tendo a largura do
corpo superior à dos humanos, pele grossa, boca grande e os olhos situados
profundamente nas órbitas, (versões degeneradas do povo Mongol, numa espécie de
referência entre a relação dos povos europeus e os seus invasores). O Orc é geralmente
descrito como uma criatura repugnante, viciosa, mordaz e com algum engenho.
Os Orcs possuem qualidades guerreiras e, no caso da obra deste autor, são liderados pela
vontade dos Senhores do Mal. Na sua obra, o Orc é utilizado como soldado, uma espécie
de peão para os vilões da trama. Comunicam entre si utilizando Blackspeech, (discurso
negro), a linguagem que as forças de Mordor utilizam entre si.
4.1.2. Videojogos
Desde a publicação das obras de Tolkien que os Orcs se tornaram elementos de ficção
quase sempre presentes na fantasia e nos jogos de Role-Playing Game75. Por volta dos
anos 80 outro arquétipo da criatura foi introduzido, pelo conhecido jogo de guerra de
miniaturas de tabuleiro Warhammer Fantasy Battle mais conhecido por Warhammer.
A versão da criatura introduzida pelo universo Warhammer tornou-se tão popular que
passou a ser utilizada como cânone em outros tantos universos de fantasia, outros jogos
do mesmo género e ainda na esfera dos videojogos, como é o caso do universo World of
Warcraft e outros posteriores.
75
RPG, em português “jogo de interpretação de personagens”, é um género de jogo em que o jogador
assume o papel da personagem, criando narrativas. O jogador escolhe a personagem e pode fazê-la evoluir
a diferentes níveis, tais como estatuto e habilidades, consoante a progressão na história. Neste tipo de jogos
existe um sistema de regras predeterminado onde os jogadores podem atuar livremente, as suas escolhas
determinam a direção que o jogo vai tomar. Assim, um RPG é um tipo de jogo mais colaborativo e social
do que meramente competitivo, pois raramente tem vencedores ou perdedores. Os RPG’s não limitam o
jogador a um enredo específico.
48
M. Inês Garcia
4.1.3.World of Warcraft
49
M. Inês Garcia
Sob o controlo da Burning Legion a Horda (aliança dos clãs de Orcs, em inglês Horde),
massacrou outras raças que existiam no seu planeta e foram misticamente transportadas
para o planeta Azeroth, (equivalente ao planeta Terra), onde serviram como a primeira
força de embate da Burning Legion na conquista deste lugar. Após duas guerras
devastadoras a Burning Legion desistiu momentaneamente de conquistar Azeroth e
deixou os Orcs para trás livres do seu controlo, para serem capturados pela raça humana.
Assim, os Orcs foram utilizados como escravos ou gladiadores até que um jovem Orc
chamado Thrall os libertou de toda a sua culpa relativamente às ações que cometeram
enquanto eram controlados pela Burning Legion. Thrall formou uma nova Horda baseada
nos princípios da força aliada à honra, com o objetivo de reconquistar a sua nobreza
antiga.
Os Orcs machos são mais altos que os homens quando estão na posição vertical, em pé,
medindo cerca de dois metros (ver Anexo de Imagens, Fig. 27). Já as Orcs fêmeas são
ligeiramente mais altas que uma mulher normal e são mais esguias que os Orcs machos,
embora sejam igualmente musculadas. As presas das Orcs fêmeas são menores que as dos
machos, parecendo muitas vezes caninos exagerados em vez de presas. As fêmeas Orc
são conhecidas muitas vezes pelos seus penteados exóticos (ver Anexo de Imagens, Fig.
6).
50
M. Inês Garcia
Em termos socioculturais, a sua sociedade sempre foi caracterizada por estilos de vida
difíceis e duros, o que os tornou algo pragmáticos, não hesitando em matar em caso de
perigo para o seu clã ou família. Todos os Orcs (não interessando o seu tamanho, género
ou posição social), são vistos como capazes de “carregar o seu próprio fardo”, dado que
a fraqueza é vista como um defeito grave numa sociedade com um estilo de vida difícil.
Assim, a união é vista como algo relevante pois a fraqueza de um elemento pode
contaminar todos os outros pondo em perigo uma sociedade baseada no contributo de
todos.
Cada clã tem uma personalidade diferente e uma forma própria de resolver as situações76.
Qualquer Orc preza a honra acima de tudo, quer seja para o seu clã, para a Horda no geral,
76
Tendo como exemplo o clã Frostwolf, cuja compaixão e misericórdia são vistas como inigualáveis nos
outros clãs, ou o clã Warsong um pouco mais violento vivendo num estilo de sociedade semelhante à
espartana apostando na capacidade de cada enquanto guerreiro como sendo o fator mais relevante.
51
M. Inês Garcia
ou para si mesmo. A hospitalidade77 é por exemplo, uma das maiores honras que um Orc
pode conceder a um estranho. Não existe descriminação na sua sociedade quanto ao
género, sendo as fêmeas capazes e livres de praticar qualquer ofício que desejem, tal como
os machos, mesmo como guerreiras (ver Anexo de Imagens, Fig. 7 e Figs.15 e 16).
Os Orcs neste universo são de certa forma comparáveis aos povos vikings que assolavam
a Europa, e que eram, de certa forma, considerados como inferiores pelos restantes povos
europeus pois falavam uma língua diferente, e vestiam roupas diferentes (ver Anexo de
Imagens, Fig. 7 e 8). A visão que era tida sobre estes povos era preconceituosa pois
embora vivessem de forma diferente, dado a sua cultura, estes eram também portadores
de tecnologia avançada como por exemplo se provou pelas suas capacidades de
navegação.
Fig. 15. Representação de um Orc com trajes típicos de guerra. Original da autora, 2015.
77
Do ponto de vista dos humanos neste universo os Orcs são vistos como inferiores em intelecto, (o que
não corresponde à verdade), como selvagens malévolos, prontos a qualquer momento a dizimar os
humanos, enquanto estes apenas tentam sobreviver num local estranho às suas origens.
52
M. Inês Garcia
Estas criaturas fantásticas são também abordadas noutro tipo de jogos e universos tais
como o universo de Elder Scrolls, (onde os Orcs são parentes longínquos dos elfos,
mantendo no entanto, o seu instinto selvagem de combate), o jogo Magic: The Gathering,
(um jogo de cartas colecionáveis com duplo formato: físico e virtual onde os Orcs são
descritos como guerreiros covardes que se aproveitam dos goblins), o videojogo Might
and Magic, (aqui os Orcs são descritos como humanoides musculados de cor laranja,
criados através da junção de sangue de demónio com carne humana para serem utilizados
como tropa de choque no caso de uma invasão demoníaca) e o universo Heroscape, (onde
os Orcs são azuis com presas proeminentes e chifres saídos do mento e da face. São
ligeiramente mais pequenos do que os humanos, exceto os membros de elite da sua
sociedade, que são do tamanho semelhante aos humanos) (ver Anexo de Imagens, Figs.
18,19 e 20).
4.1.4. Warhammer
Em termos anatómicos, neste universo o Orc não é mais alto do que os humanos, devido
à sua semelhança com os símios, com braços e tronco largos, adota uma postura mais
encurvada (ver Anexo de Imagens Figs. 22 e 23). O seu crânio é corpulento com um
pescoço projetado para a frente, as arcadas supraciliares são volumosas o que confere aos
seus olhos um aspeto encovado na profundidade da órbita (ver Anexo de Imagens Fig.
21). A sua pele é verde e espessa, (funcionando como uma mais-valia em termos de
resistência à dor).
Neste universo os Orcs não são muito inteligentes mas possuem alguma audácia e astúcia.
A sua cultura e sociedade privilegia questões ligadas à guerra, bem como a necessidade
53
M. Inês Garcia
Como já foi anteriormente descrito, o Orc do universo Warcraft apresenta uma aparência
semelhante à humana, mas com uma musculatura muito mais proeminente. Neste capítulo
em concreto, analisaremos a cabeça e o corpo do Orc onde iremos encontrar uma
mandíbula procidente, de que sobressaem dentes de grandes dimensões.
54
M. Inês Garcia
A palavra prognatismo significa projeção (pro) dos maxilares, existindo tanto no maxilar
superior como na mandíbula, (fazendo-se habitualmente referência ao prognatismo
mandibular). A isto foi acrescentada a palavra grega gnatos que significa “osso do
queixo”, “queixada” ou mandíbula, precisamente pelo maior impacto visual que o
prognatismo mandibular provoca.
O Orc que apresenta este tipo de mandíbula possui um lábio inferior mais procidente que
o superior (levando a que haja eversão do lábio) e consequentemente, um mento
volumoso e proeminente, o que dá ao indivíduo um aspeto sempre zangado, (contribuindo
assim para as suas expressões quase sempre ameaçadoras), em alguns casos uma
aparência dura de guerreiro /lutador. Esta particular caraterística de aparência dura, de
guerra, pode ter sido uma das razões para que o Orc fosse representado como prognata,
precisamente porque a sua função está estreitamente ligada à violência e a um estilo de
vida mais difícil80.
78
Henriques Garcia, Inês; Ritto, Isabel; Álvares Furtado, Ivo; Cruz, Tiago (2015), Mitologia, Ciência e
Videojogos: como surge um Orc. Archives of Anatomy- Official Journal of the Portuguese Anatomical
Society (SAP/AAP), Vol.3, Nº1, p. 17.
79
O prognatismo manifesta-se nestas duas formas devido a questões genéticas, resultantes dos casamentos
entre parentes de dinastias europeias. Esta anomalia era particularmente evidente na dinastia de Habsburgo,
em concreto nos reis Carlos V Sacro Imperador Romano-Germânico e Carlos II de Espanha. Porém o
prognatismo manifestou-se igualmente em outros monarcas precisamente devido a estas uniões
consanguíneas.
80
Henriques Garcia, Inês et al. (2015) Op. Cit., p.18.
55
M. Inês Garcia
Fig. 16. Representação de um Orc com uma expressão tipicamente ameaçadora. Original da autora, 2015.
Os indivíduos prognatas apresentam por isso um perfil de aspeto côncavo, pouco estético
para ambos os sexos. E tal como afirma o autor J. P. Boléo Tomé:
81
Boleo-Tomé, J. (1997) Anomalias da classe III : prognatismo. Lisboa : [s.n.], 1997. Tese de
doutoramento em Medicina Dentária (Cirurgia Oral), apresentada à Universidade de Lisboa através da
Faculdade de Medicina Dentária,p. 7.
56
M. Inês Garcia
As manifestações clínicas de prognatismo são várias: Possui uma oclusão com mordida
aberta invertida82 ou cruzada, uma má-oclusão83 da classe III de Angle84 uma alteração
do perfil com avanço anormal da região da sínfise mandibular, um aumento da dimensão
linear côndilo-gnation (ponto mais anterior da mandíbula), um aumento da dimensão da
linha de projeção do plano mandibular (que corresponde à linha que segue o bordo
inferior da mandíbula) e ainda a presença de um ângulo mandibular mais obtuso85.
De acordo com vários autores, a origem desta anomalia é discutível, podendo ser
resultado de diversos fatores: doenças hereditárias, disfunções mastigatórias, posições
incorretas, traumatismos, entre outros, pois trata-se de uma perturbação do
desenvolvimento. A fala e a respiração são prejudicadas devido à alteração de posição
relativa das arcadas dentárias (má-oclusão), da língua e dos lábios e da sua dinâmica
respetiva. A mordida aberta invertida, associada à frequente incapacidade de oclusão
82
Denomina-se Oclusão dentária à forma como os dentes se relacionam entre si. Idealmente, deve existir
um contacto equilibrado e centrado dos dentes superiores com os inferiores quando os maxilares se
aproximam ou durante a mastigação. A mordida aberta sucede quando os dentes de ambas as arcadas não
estão em contacto entre si, havendo um espaço entre eles.
83
A má-oclusão dentária sucede quando existe um mau posicionamento dos dentes em oclusão. Pode levar
a uma alteração das funções dentárias bem como em alguns casos, à disfunção têmporo-mandibular, (que
é uma alteração resultante do funcionamento anormal da musculatura da mastigação, ou da articulação
têmporo-mandibular- ATM).
84
Edward Hartley Angle, (1855-1930), dentista americano apelidado como o pai da ortodontia americana.
Criou o termo “má-oclusão” para se referir a anomalias de posição dentária e classificou várias anomalias
de dentes e maxilares. Angle descreveu três tipos básicos de má-oclusão representando alterações na
dimensão ântero- posterior. Melhorada posteriormente, a sua classificação ainda hoje é utilizada.
85
Ibidem,p.2.
57
M. Inês Garcia
No caso das doenças hereditárias tais como síndromes e anomalias específicas existem
alguns tipos em que o prognatismo é uma consequência, tais como a microssomia
hemifacial, síndrome de Treacher Collins, síndrome de Crouzon, síndrome do Nevo
Basocelular, ou ainda a Acromegalia.
Para além de ser inestética, esta deformidade afeta a relação entre os dentes superiores e
inferiores, havendo um desalinhamento entre eles, sendo por isso denominada de má-
oclusão ou má mordida, de onde resulta uma relação incorreta com a articulação têmporo-
mandibular e um mau condicionamento dos tecidos moles da orofaringe. Esta situação
afeta por isso a mastigação, fonação e respiração.
86
O laterognatismo costuma estar relacionado com o prognatismo, sendo que, as queixas mais frequentes
por parte dos pacientes são de um “queixo torto”, ou “boca torta”.
87
O tratamento do prognatismo é descrito como prática há pouco mais de um século. Especula-se que
poderá ter sido o cirurgião americano Simon Hullihen o primeiro a publicar o procedimento do seu
tratamento em 1849.
58
M. Inês Garcia
Os seres humanos89 são naturalmente assimétricos e uma possível correção desse facto
não é esteticamente aceitável. Nem sempre as “medidas ideais” são uma característica de
atratividade. Desde a época Clássica que sempre existiu uma busca constante pelas
“proporções ideais”, tão trabalhadas desde os primórdios clássicos por nomes como
Policleto na Grécia Antiga até ao apogeu renascentista com Miguel Ângelo, Leonardo da
Vinci ou Dürer.
Com base nos seus escritos, acredita-se que para da Vinci a face é dividida em três partes,
(superior, média e inferior), o espaço compreendido entre o mento e a base do nariz é a
terça parte da face, e é igual ao comprimento do nariz e da fronte. Para além disso
Leonardo contribuiu ainda com uma conclusão bastante inédita para a época: situa os
olhos no plano médio horizontal da cabeça afirmando que “do canto interior do olho ao
topo da cabeça é tão longe como de um [canto do olho] à parte debaixo do queixo”90.
88
Atlas Da Saúde [s.d] Prognatismo Mandibular, In Atlas Da Saúde [Consult. 22 Jun. 2014]. Disponível
em: WWW: <URL http://www.atlasdasaude.pt/publico/content/prognatismo-mandibular>.
89
Como o Orc é uma criatura de traços humanoides, será aqui efetuado um paralelismo em termos
proporcionais com o ser humano.
90
Ramos, José Artur (2010) Retrato : o desenho da Presença. Lisboa : Campo da Comunicação, p. 127.
59
M. Inês Garcia
Embora a divisão da face feita em três partes seja dominante, existem descrições de
divisões do rosto por quatro partes91, tais como nas proporções de Vitrúvio. De acordo
com o autor Artur Ramos, a proporção da cabeça calculada através da divisão em três ou
quatro partes é a mais divulgada:
Foi graças a estes estudos que surgiu a cefalometria93. Porém é curioso notar que a
avaliação das proporções esqueléticas não é equivalente (se for considerada uma divisão
91
No entanto, todas estas teorias apresentam problemas, mas como afirma Ramos, de uma maneira geral
todas as teorias se completam e reforçam, aceitando sempre a colocação dos olhos no plano médio.
92
Ramos, José Artur (2010) Op. Cit., p. 161.
93
A cefalometria é uma ciência que estuda as dimensões do crânio e da face. Em odontologia tem que ver
com determinadas combinações de medidas angulares do complexo craniofacial. Recorre-se a esta ciência
para avaliar o crescimento e desenvolvimento craniofacial de forma longitudinal, bem como no diagnóstico
para tratamentos ortodônticos.
60
M. Inês Garcia
da face em terços iguais) à proporcionalidade facial dos tecidos moles. De acordo com
J.P. Boléo Tomé: “ O estudo estético não é comparável e muito menos sobreponível ao
estudo matemático ou geométrico da face. Por isso, pode-se afirmar que, quando existem
diferenças significativas entre os dados colhidos pela análise cefalométrica e os obtidos
pela observação clínica, é esta que deve prevalecer e não aquela”94.
94
Boleo-Tomé, J. (1997) Op. Cit., p. 46.
61
M. Inês Garcia
Na Figura 19, são apresentados estes e outros pontos importantes tais como a Glabela (G)
que é o ponto mais saliente da zona entre as sobrancelhas e corresponde à glabela óssea
do osso frontal; o Nasion (N); o Orbitale (Or) que é o ponto mais inferior do rebordo
inferior da órbita, é idêntico ao orbitale ósseo; o Subnasale (sn); o Pogonion (pg), ponto
mais anterior da linha média do mento, localizado na superfície da pele, em frente do
ponto ósseo idêntico da mandíbula; o Gnation (Gn); o Mento (me) e finalmente, o Gonion
(go) que consiste no ponto mais externo do ângulo mandibular.
Estão ainda representados na Figura 19 outros pontos tais como a Espinha Nasal Posterior
(Pns), a Espinha Nasal Anterior (Ans), o Subespinale (A) que é um ponto de maior
concavidade entre a espinha nasal anterior e o processo alveolar, o Supramentale (B) que
é um ponto de maior concavidade entre o osso alveolar e o Pogonion, o Porion (Po) que
é o ponto mais superior do meato acústico externo; e finalmente a Sela (S), um ponto que
corresponde ao centro geométrico da sela túrcica, no osso esfenoide, (é o ponto médio
considerando o maior diâmetro horizontal).
62
M. Inês Garcia
Num indivíduo prognata existem traços que chamam de imediato a atenção, tais como: a
relação inversa das duas arcadas dentárias, com uma posição variável da mandíbula em
relação à maxila. Porém, podem existir outras possibilidades tais como um prognatismo
simples, (representado na Figura 20- A com as arcadas dentárias no mesmo plano
horizontal), um prognatismo com supra-oclusão, (Figura 20- B onde os incisivos
inferiores se podem sobrepor aos incisivos superiores), ou um prognatismo com infra-
oclusão, (Figura 20- C onde o plano dos incisivos inferiores se afasta do plano dos
incisivos superiores).
95
Existem ainda outras referências tais como a linha Sn (sela-nasion), linha Na (nasion- subspinale), linha
Sna (posição ântero-posterior da maxila em relação à base craniana), o ângulo Snb (sela-nasion-
supramentale) e o ângulo Anb (que indica as relações ântero-posteriores da maxila com a mandíbula).
63
M. Inês Garcia
Fig.21. Representação do crânio do Orc, visto de frente (A) e visto de perfil (B). É de notar não só a
deformidade dento facial como as grandes presas e também as proporções alteradas no osso nasal e
craniano diminuto. As presas implantam-se na mandíbula num plano anterior ao dos dentes, o Orc
apresenta por isso incisivos iguais aos humanos. Original da autora, ilustração digital, 2014.
64
M. Inês Garcia
Com o evidente avanço da mandíbula, parte integrante do terço inferior da face, surge
uma aparente redução do terço médio da mesma. Para além das alterações esqueléticas,
os tecidos de revestimento sofrem também transformações na sua configuração:
dependendo da capacidade de abertura ou encerramento da boca e da funcionalidade
orofacial global, os tecidos envolventes tomam um maior ou menor volume e expressão
dinâmica.
Fig. 22. Representação do tegumento comum de um Orc, visto de frente (A) e visto de perfil (B).Original
da autora, 2015.
65
M. Inês Garcia
O prognatismo nos símios é referido para esta dissertação porque existem traços seus
semelhantes na criatura abordada. Comparativamente aos seres humanos, os símios
apresentam um tipo de prognatismo “facial”, onde a face se projeta num plano anterior
ao da parte superior do crânio, consequentemente, o prognatismo bimaxilar nos símios é
muito mais acentuado, tornando-se claro o motivo para a comparação com o Orc96 (ver
Anexo de Imagens, Fig. 25).
Assim sendo, nos símios o prognatismo vai-se acentuando quanto mais velho é o animal,
no decurso do crescimento, havendo um maior desenvolvimento facial relativamente ao
desenvolvimento craniano. Em termos comparativos, o menor grau de prognatismo nos
símios é sempre superior relativamente ao Homem, sendo que, são os chimpanzés os mais
semelhantes ao Homem por se apresentarem menos prognatas. Os babuínos apresentam
um maior prognatismo bimaxilar, tendo uma forma pontiaguda na face, semelhante ao
focinho de cão (ver Anexo de Imagens, Fig. 26). No Orangotango, o prognatismo
bimaxilar é também bastante considerável, e os seus incisivos atingem o triplo do volume
relativamente aos incisivos humanos. Possui ainda outras características tais como: uma
grande obliquidade da face em relação ao crânio, (muito acentuada no símio e pouco no
Homem) e ainda um grande volume da face em relação ao crânio, (no caso do Homem o
volume da caixa craniana não é ultrapassado).
Em termos de dentição, os dentes dos símios são muito maiores, comparativamente aos
humanos: os chimpanzés por exemplo, possuem caninos afilados e pronunciados que são
usados em mecanismos de defesa. Nenhum símio possui mento.
96
Henriques Garcia, Inês et al. (2015) Op. Cit., p.19.
66
M. Inês Garcia
Como já foi mencionado, em termos de aparência os Orcs são humanoides com uma
mandíbula procidente. Mas, para além destes traços físicos óbvios, esta criatura é bastante
larga, musculada e com as extremidades claramente desproporcionais relativamente ao
resto do corpo, tendo já sido descrito que esta criatura padece de uma
desproporcionalidade no maxilar inferior: uma anomalia denominada de prognatismo.
Ora para além desta característica anómala, o Orc apresenta ainda outra: as extremidades
desproporcionais que curiosamente, podem ser comparadas com uma doença, a
Acromegalia.
Esta doença é provocada na maior parte dos casos, pela existência de um tumor
hipofisário benigno, do tipo adenoma; as células afetadas pelo tumor deixam de responder
a regulações hormonais normais, segregando a hormona de crescimento em quantidades
exageradas. Consequentemente é produzido um estímulo hormonal excessivo em todo o
organismo, provocando o crescimento atípico dos ossos e do tecido conjuntivo em idade
adulta97.
97
Medipédia (2014) Gigantismo e acromegalia, In: Medipedia.Pt [Consult. 25 Fev. 2015]. Disponível em:
WWW: <URLhttp://www.medipedia.pt/home/home.php?module=artigoEnc&id=251>.
67
M. Inês Garcia
Nestas situações, as hormonas libertadas fazem com que o indivíduo adquira um aspeto
diferente em termos de proporções: a mandíbula aumenta de tamanho, as arcadas
supraorbitárias tornam-se salientes, bem como a face, nariz, orelhas, lábios e língua. A
fronte torna-se mais proeminente, o maxilar mais espesso e protuberante e as mãos e pés
bastante largas, (os ossos das mãos e pés aumentam o seu diâmetro de tal maneira que
dão a aparência de que os dedos são curtos). Esta hormona provoca ainda outras
repercussões tais como a alteração da pele que se torna espessa, dura, seca e enrugada,
bem como outras consequências a nível de órgãos mais profundos: macroglossia,
hipertrofia da faringe e laringe o que provoca uma voz gutural. Aumenta a massa óssea,
há espessamento da pele, existindo também hiperhidrose (causando mais suor)98.
98
Para mais informações consultar o website Medipédia artigo Gigantismo e acromegalia.
68
M. Inês Garcia
Fig.24. Tegumento comum do corpo de um Orc. Onde se podem notar as principais características
descritas da doença acromegalia, a saber: mandíbula procidente, mãos e pés bastante largos, ou seja, as
extremidades da criatura.
Por outro lado, existe também uma doença muito semelhante: esta sim, capaz de provocar
um crescimento em altura excessivo. As diferenças entre a acromegalia e o gigantismo
prendem-se apenas com a fase em que sucedem: no caso do gigantismo, o início das
alterações do excesso da hormona de crescimento sucede na infância, (antes da puberdade
69
M. Inês Garcia
Nos Orcs existe também a possibilidade de gigantismo, e dado que numa cultura em que
a força física é considerada essencial, quem possui dimensões maiores é visto como
venerável e geralmente exibe uma melhor condição física, ao contrário do caso humano
em que o gigantismo ao provocar uma altura superior à que o corpo humano está
habituado, cria fragilidades a nível ósseo e articular, dado que o peso suportado tende a
ser excessivo.
Por conseguinte, apesar de na fantasia ter conotações ligadas ao poder, os pacientes que
na realidade sofrem de tumores na hipófise durante a vida adulta ou infância sofrem de
graves problemas, podendo sucumbir ainda muito jovens na ausência de cuidados
especializados. Têm frequentemente fortes enxaquecas, diminuição da acuidade visual,
dores nas articulações, desenvolvem uma elevada pressão arterial, diabetes, problemas de
coração, doenças pulmonares e quase sempre também padecem de problemas
psicológicos devido às alterações físicas de aparência.
Em termos genéticos, e de acordo com Matt Kaplan, autor do livro The Science of
Monsters existe uma probabilidade destes genes serem hereditários pois alguns
indivíduos carregam este gene anormal, mas nem todos desenvolvem um tumor na
hipófise. A razão dos genes tornarem alguns indivíduos gigantes é ainda desconhecida,
mas o resultado torna claro que os gigantes humanos existiram através da história, e
enquanto os próprios gigantes são frequentemente estéreis, os seus irmãos, que carregam
o gene e não desenvolvem o tumor, têm o potencial genético para “criar gigantes”, se
tiverem uma grande prole. Atualmente já é possível diagnosticar de forma rápida e eficaz
estes pacientes devido ao historial genético dos familiares e também com a possibilidade
de destruição precoce dos tumores, bem antes de provocarem qualquer tipo de alterações.
70
M. Inês Garcia
Muito provavelmente, a equipa que desenvolveu a versão desta criatura para o jogo World
of Warcraft poderá ter tomado em atenção todas estas particularidades, (mandíbula
saliente, extremidades desproporcionais, pele mais endurecida), para o desenvolvimento
da sua versão do Orc. Apesar de constituir apenas uma suposição é perfeitamente clara e
plausível que se aproveitem todas estas características que fazem muito sentido para o
monstro em contexto: todas elas lhe atribuem um semblante ameaçador, imponente e
guerreiro.
Devido ao meio em que estas criaturas subsistem na fantasia (um meio hostil, desolado,
com condições climatéricas extremas) organizando-se em clãs e tribos, torna-se
necessário que desenvolvam todas estas características físicas descritas, bem como
possuam um porte imponente para estarem aptos a desempenhar funções que permitam a
sua sobrevivência no meio (como por exemplo a caça, a recolha de recursos escassos:
madeira, minerais, água) em grandes quantidades de forma rápida e eficiente. Existe
também a necessidade de proteger a sua comunidade de outras criaturas selvagens que
possam pôr em risco a sua continuidade. Pode ser feito aqui um comparativo com a
subsistência de tribos nas regiões mais agrestes de África, em que os indivíduos mais
fortes atingem uma posição superior (como por exemplo a tribo africana Massai e os
Zulus)99.
99
Henriques Garcia, Inês, et al. (2015) Op. Cit., p. 22.
71
M. Inês Garcia
Na mitologia, (embora a sua origem seja bastante controversa), os ciclopes podem ser
divididos em dois grupos: os ciclopes de primeira geração, (antigos), e os ciclopes da
nova geração, (mais recentes). Relativamente à sua origem, estes seres são organizados
em três espécies diferentes: os Urânios, (filhos de Úrano e Gaia), os Sicilianos (filhos de
Posídon) e os Construtores, que procedem de Lícia.
Os Urânios pertenciam aos titãs e eram três irmãos: Arges, Estéropes e Brontes, (filhos
de Úrano e de Gaia102), estes ciclopes são considerados como os mais antigos, tendo sido
posteriormente, assassinados pelo deus Apolo103. São abordados na célebre obra,
Teogonia de Hesíodo (aproximadamente entre os séculos VIII e VII a.C.), onde surgem
100
Do grego Κύκλωψ, que significa "olho redondo".
101
Hesíodo (2005) Teogonia, Trabalhos e Dias. Trad. Ana Elias Pinheiro e José Ribeiro Ferreira. Lisboa:
Imprensa Nacional- Casa da Moeda, p.45.
102
Em traços gerais, de acordo com a lenda quando nasceram os «mais temíveis filhos», o seu pai Úrano,
(o Senhor dos Céus), aprisionou-os no interior da Terra, em Tártaro (personificação do Mundo Inferior),
com os seus outros irmãos Coto, Briareu e Giges, (gigantes de cem braços e cinquenta cabeças). A sua mãe
Gaia, enraivecida, incita os seus filhos a ajudar os titãs, (também seus irmãos), a tomar o trono do pai,
governante dos céus. A vitória é alcançada, mas os ciclopes são enviados novamente para Tártaro. Será
Zeus, (assim como Posídon e Hades) a libertar os ciclopes com o intuito de os ter como aliados na guerra
contro Cronos e os titãs. Como bons ferreiros, serão estas criaturas a forjar os raios e relâmpagos, como já
foi referido, assim como um tridente para Posídon, (capaz de provocar terríveis tempestades), e o Elmo do
Terror para Hades, (que lhe conferia invisibilidade). Os ciclopes foram por isso considerados ministros de
Zeus e seus ferreiros permanentes.
103
Asclépio, filho de Apolo, através de inúmeros estudos conseguiu ressuscitar os mortos e para que isso
não causasse desequilíbrio na ordem do mundo, Zeus decidiu aniquilá-lo. Enraivecido com a decisão de
Zeus, Apolo decidiu matar os ciclopes. Porém especula-se de que não foram os ciclopes a morrer, mas sim
os seus filhos.
72
M. Inês Garcia
descritos como “em tudo semelhantes aos deuses,/mas tinham um único olho no meio da
testa”104 e ainda que “em todas as suas obras havia força, violência e perícia”105. Os
ciclopes tal como todos os descendentes da Terra eram monstruosos. De acordo com este
autor, estas criaturas eram muito fortes e manhosas, incitando o ódio ao próprio pai 106,
(Úrano).
Na Odisseia, (ca. VIII a.C.), apesar das súplicas de Ulisses para que o ciclope Polifemo
aceitasse com hospitalidade a sua vinda e a dos seus companheiros, a criatura temível
devora dois dos homens de Ulisses. Desta feita, o herói, famoso pela sua astúcia, (pois foi
o autor do cavalo de Troia), inebriou o ciclope e com a ajuda dos seus homens, trespassou
um tronco de oliveira em chamas no olho do monstro adormecido. A injúria foi tão
extensa e profunda, que nem Posídon a pode curar109. Homero não especifica se todos os
ciclopes tinham apenas um olho, mas Polifemo, o principal entre eles, é o único descrito
dessa forma. (ver Anexo de Imagens, Fig. 30).
104
Hesíodo (2005) Op.Cit., p.45.
105
Idem, Ibidem.
106
Hesíodo assumiu que estes versos representavam as atitudes sociais consideradas normais na sua era
face às crianças doentes de deformidades congénitas.
107
Homero (2003) Odisseia. Trad. Frederico Lourenço. Lisboa: Livros Cotovia, p. 148.
108
Idem, Ibidem.
109
O monstro não teve salvação devido ao facto de ao se apresentar, Ulisses ter-se intitulado de “Ninguém”.
Assim sendo, ao ser interpelado por outros Ciclopes, Polifemo respondia sempre que fora Ninguém a
injuriá-lo, claro que foi desacreditado por todos pois «Se na verdade ninguém te está a fazer mal e estás aí
sozinho, /não há maneira de fugires à doença que vem de Zeus».
73
M. Inês Garcia
Na obra Metamorfoses ( lançado Ca. VIII d.C.) de Ovídio surge-nos igualmente o Ciclope
Polifemo que, antes do encontro com Ulisses, apaixona-se por Galateia uma divindade
marítima filha de Nereu e Dóris que vivia na Sicília. Porém esta nereide rejeita o amor do
ciclope em detrimento de um jovem pastor, Ácis, filho de Fauno e de uma ninfa do
Simeto: «Por outro lado, eu suportaria melhor ser desprezado por ti,/ se fugisses a todos;
mas por que razão escorraças o Ciclope,/ e, ao mesmo tempo, amas Ácis e Ácis preferes
a meus abraços?»110 .Quando Polifemo os encontra juntos, num ímpeto de ciúmes esmaga
Ácis com uma pedra: «O Ciclope vai atrás dele. Arranca parte de uma montanha/ e
arremessa-a contra ele; e embora apenas a extremidade do pedregulho mal o tenha
atingido, esmagou Ácis todo.»111
110
Ovídio (2010) Metamorfoses. Trad. Paulo Farmhouse Alberto. Lisboa: Livros Cotovia, p. 334.
111
Ibidem, p. 335.
74
M. Inês Garcia
Por volta do século V a.C., o ciclope volta a surgir desta vez numa obra com o seu nome,
Ciclope da autoria de Eurípides112. Porém, aqui o ciclope é caracterizado como uma
criatura mais agradável e menos brutal, com um certo ar burguês, filho de Posídon e da
Ninfa Tossa, (pertencentes por isso ao grupo da nova geração de ciclopes, os Sicilianos).
Eurípides vai mais longe do que Homero quando defende que a ilha onde o ciclope foi
encontrado por Ulisses era a Sicília e menciona que a caverna onde ele vivia era no
famoso vulcão Etna: «atiraram-nos sobre esta rocha do Etna, de onde os ciclopes
homicidas de um só olho, filhos do deus do mar, habitam em cavernas solitárias»113. Em
traços gerais, a tragédia grega não altera o argumento do mito, mas sim a causa para a
cegueira de Polifemo. O ciclope surge neste drama satírico como uma representação da
vida natural e simples, onde o costume e as leis não têm lugar114.
O célebre Polifemo foi bastante representado na arte grega figurando nas pinturas em
vasos, esculpido em bronze ou gravado no mármore, por vezes a atirar pedregulhos ou
em agonia enquanto Ulisses o feria com estacas em chamas no seu único olho, para tentar
escapar da ilha dos ciclopes (ver Anexo de Imagens Figs.28-31). Homero não identifica
a ilha onde estas criaturas viviam, no entanto, Ovídio defendia que esta raça mirabolante
vivia nas escarpas do Etna na Sicília.
112
Este autor foi sem dúvida beber influências na Odisseia.
113
Eurípides (1991) Tragedias I: El Cíclope- Alcestis- Medea-Los Héraclidas- Hipólito- Andrómaca-
Hécuba. Trad. Alberto Medina González e Juan Antonio López Férez.Madrid: Editorial Gredos, p. 112.
114
Ibidem, p. 104.
115
De acordo com o que é mencionado no Website Myth Index, esta lenda parece ser uma mera invenção,
pois não possui uma explicação histórica nem geográfica. Pois as muralhas ciclópicas terão sido
provavelmente construídas por uma civilização mais antiga.
75
M. Inês Garcia
No ano de 77 a.C., Plínio, o Velho terminou a sua obra Historia Naturalis. Plínio povoou
a Índia e a Etiópia com uma autêntica trupe de raças fabulosas, desde os cinocéfalos, às
criaturas sem cabeça com olhos nas omoplatas, aos pigmeus, entre outros, (ver capítulo
I- Uma Breve História sobre os Monstros). Este foi o início de uma longa tradição de
raças fabulosas que perdurou durante sensivelmente quinze séculos.
Os escritores cristãos adotaram esta tradição, tendo sido alvo de diversas teorias tais como
as de Santo Agostinho sobre a origem e descendência destas raças, (ver capítulo I- Uma
Breve História sobre os Monstros). Já na Idade Média, os ciclopes permaneciam
inalterados nos manuscritos e monstruários tais como o De Naturis Rerum de Thomas de
116
Cantimpré . Porém, apesar de toda a teorização, estas criaturas eram também
prenúncios para maus augúrios.
116
Thomas de Cantimpré, (1201-1272), também conhecido como Thomas Cantimpratensis, entre outros
nomes, era um escritor medieval, pregador e teólogo. Foi professor de filosofia e teologia, tendo viajado
pela Alemanha, Bélgica e França. O seu mencionado manuscrito De Naturis Rerum, é uma compilação de
todo o conhecimento no âmbito da história natural da época, incluindo o que atualmente se denomina como
antropologia, zoologia, botânica, mineralogia, astronomia, astrologia e meteorologia. O seu intuito era criar
um texto que servisse como uma introdução às “ciências naturais”, para uso dos pregadores e outros
eclesiásticos.
76
M. Inês Garcia
É no século XIV que é por fim estabelecido que os ciclopes são descendentes de Caim e
Can, (filho de Noé). Com o tempo, o ciclope começa a “diminuir”, torna-se mais pequeno
e menos selvagem, aproximando-se novamente das suas origens enquanto criatura
fantástica.
4.2.2.Teorias Adversas
Á primeira vista, poderá ser óbvia a ligação entre os ciclopes narrados nas epopeias,
histórias, lendas e outros contos, com a doença ciclopia. No entanto, existe alguma
polémica neste domínio.
Outros autores afirmam que a origem destas criaturas se deve aos fósseis de animais
encontrados. De acordo com o paleontólogo Othenio Abel (1914), os elefantes anões pré-
históricos, com o dobro do tamanho de um crânio humano, foram encontrados por todo o
Mediterrâneo pelos gregos. A sua larga cavidade nasal no crânio poderá ter sido
interpretada como uma órbita enorme. Os restos mortais de um elefante pigmeu no
período glaciar na Sícilia, Palermo e Trapani podem ter dado origem à ideia do fabuloso
ciclope gigante. O ciclope era também conhecido na Ásia, sendo que o seu olho aqui
poderia remeter para fósseis de anfíbios e répteis e o polémico terceiro olho poderia estar
rudimentarmente presente na glândula Pineal do Homem. Porém esta explicação é
falaciosa pois as figuras mitológicas gregas possuíam um único olho.
77
M. Inês Garcia
Por conseguinte, supõem-se que existam duas teorias para o surgimento dos ciclopes. A
primeira é que os escritores gregos estavam possivelmente familiarizados com a
deformidade humana, e Homero com a sua história sobre Polifemo, e mais tarde o poeta
árabe que escreveu Sinbad, o marinheiro, influenciaram os escritores medievais. Na Idade
Média não havia qualquer dúvida sobre o facto de os ciclopes viverem em zonas
desconhecidas da Ásia e África. O lugar onde os Monuculi viviam foi descrito na
Cosmographia Universalis de Sebastian Münster,
78
M. Inês Garcia
harmonia facial também pode ser justificada pelo simples motivo de já estar comprovada
a tendência clássica para a idealização dos retratos.
Porém, paira ainda a questão do ciclope grego ser «gigante». Esta característica pode ser
justificada pelo simples facto de que esta criatura mitológica era antagónica aos heróis,
desta forma a única maneira de tornar um ser humano de estatura normal mais feroz é
precisamente aumentar-lhe a escala, o que aliada à sua peculiar fisionomia facial era um
desafio perfeito para o protagonista da história.
4.2.3. Videojogos
4. 2.3.1.2. Gronn
Neste universo os ciclopes não existem tal como nos mitos clássicos, mas sim adaptados
às criaturas Gronn, Ogron e Ogre. Estas raças partilham o mesmo percurso evolutivo, no
entanto os primeiros, (Gronn) são pertencentes a um clã de gigantes, nos seguintes
(Ogron), existe um elo de ligação com os Ogres e estes últimos são a raça que mais se
assemelha aos conceitos mais tradicionais da mitologia e do cinema.
Os Gronn são criaturas ciclópicas gigantescas (ver Anexo de Imagens Fig. 27)
pertencentes ao imaginário do universo Warcraft, estando particularmente presentes na
mais recente expansão do referido videojogo denominada de Warlords of Draenor. Estas
criaturas habitam Draenor, um planeta selvagem desprovido de áreas de urbanização e
com uma consequente vida selvagem extensa. Os Gronn, cuja descendência provém de
gigantes de pedra117 que serviam como guardiões da natureza, geralmente habitam em
áreas montanhosas ou áridas, regiões vulcânicas ou grutas de grandes dimensões. A
fisionomia desta criatura é caracterizada por ter os membros superiores exageradamente
117
De acordo com Kappler, as criaturas hibridas para além de serem junções entre vários animais, poderão
também ser entre animais, minerais ou plantas. Esta ligação com a natureza remete para o mito da “Terra
Mater” em que a Terra é considerada uma mãe fecunda e tudo o que produz é orgânico e animado, «não só
homens e plantas, como também pedras e minerais». As pedras são assim consideradas os “embriões da
terra”.
79
M. Inês Garcia
grandes, (sendo por isso justificados com a doença Acromegalia- ver capítulo 4.1.9. O
porquê de ser desproporcional: Acromegalia), com apenas três dedos, espigões e
protuberâncias rochosas a sair das suas costas, que percorrem inclusivamente o seu
crânio, pois este contém protuberâncias na parte posterior.
Fig. 27. Representação da criatura ancestral da qual provém o Gronn. Esta criatura rochosa denomina-se
Magnaron. Original da autora, 2015.
Esta criatura gigantesca (ver Anexo de Imagens, Fig. 27) contém apenas um olho de cor
amarelada no centro da sua face, sendo consequentemente a ciclopia a sua característica
mais individualizada comparativamente a outras criaturas de dimensões semelhantes.
Esta raça é muitas vezes utilizada como “máquina viva de guerra” pelos seus
descendentes evolutivos, os Ogres. Os Gronn que ainda não atingiram a idade adulta são
denominados de Gronnling e são muitas vezes utilizados como montadas. A evolução
dos Gronn ao longo dos tempos é caracterizada pela sua humanização em termos de
morfologia e fisionomia, adquirindo paulatinamente uma aparência mais humanoide.
80
M. Inês Garcia
Os Ogron conservam a maior parte das características dos seus parentes Gronn,
(nomeadamente na cabeça com a ciclopia e o prognatismo), mas embora não sejam
criaturas manifestamente inteligentes, denotam uma certa capacidade de comunicar
através de uma linguagem comum às outras criaturas, tais como os Orcs e os Humanos.
A nível social estes seres estão ao serviço dos seus parentes Ogres que, sendo
consideravelmente mais inteligentes, os dominam dado que os Ogron são demasiado
81
M. Inês Garcia
limitados para se imporem e recorrerem à força física contra os seus superiores. Os Ogron
são por isso considerados como o elo perdido entre os Gronn e os Ogres.
4.2.3.1.4. Ogres
Os Ogres são criaturas menos robustas do que os seus semelhantes evolutivos: menos
musculados e com um abdómen proeminente. Ao contrário dos seus parentes, não
possuem a ciclopia como característica permanente em todos os espécimenes, desta forma
esta característica comum em outros, torna-se rara no Ogre. Em termos de traços gerais,
as características mais marcantes ao nível da face é o prognatismo e a existência de um
chifre que emerge do topo do seu crânio.
82
M. Inês Garcia
Os ogres são descritos como criaturas maiores do que os humanos mas não tão grandes
como os seus parentes evolutivos mencionados anteriormente (ver Anexo de Imagens,
Fig. 27). Inicialmente, eram escravos ao serviço dos Gronn, no entanto facilmente se
libertaram por demonstrarem maior engenho e inteligência.
83
M. Inês Garcia
Fig. 31. Representação de um Ogre Magi. Original da autora, ilustração digital, 2015.
118
Este termo é baseado nos Ogres dos jogos de computador e tabuleiro da série Dungeons and Dragons.
A maioria destes ogres que nascem com duas cabeças sofrem de ciclopia numa delas- uma herança dos seus
antepassados Gronn e Ogron, e em alguns casos, a segunda cabeça tem uma personalidade própria, (esta
característica é utilizada como elemento humorístico, quando surgem discordâncias entre uma cabeça e a
outra).
84
M. Inês Garcia
A etimologia do termo Ogre deriva, tal como a do Orc, do deus etrusco Orcus, (consultar
capítulo III- Orc: uma definição). Existem também outros autores que defendem que a
palavra Ogre deriva de Hongrois, (húngaro), pois estes eram vistos pelas culturas
ocidentais como monstruosos.
Estas duas criaturas surgem regularmente como antagonistas, sem grandes capacidades
intelectuais, sendo apenas possuidoras de imensa força bruta.
No jogo Warhammer, os ogres são influenciados por uma certa estética mongol,
utilizando um tipo de magia inédita conhecida como Gut-magic ou em português, Magia
das Tripas/Intestinos, cujos feitiços conjurados dependem do que o utilizador tenha
ingerido. Estes ogres são carnívoros, comem qualquer tipo de carne sendo inclusivamente
canibais. São apresentados perante as outras raças como mercenários de modo a serem
pagos para praticar o que mais lhes satisfaz: a violência.
Em Final Fantasy, o ogre surge como uma das primeiras personagens musculadas e
peludas que tinha como tática de combate a força bruta e contra-ataques sem grandes
preocupações com a técnica ou a forma como essa força era aplicada (ver Anexo de
Imagens, Fig. 33).
85
M. Inês Garcia
Finalmente, no universo de Heroes of Might and Magic, (ver Anexo de Imagens, Fig. 34).
os ogres são descritos como criaturas que se subdividem em vários tipos: os ogres
comuns, (criaturas lentas que empunham machados e mocas, com grande durabilidade e
resistência), os ogres guerreiros, (que se destacavam pelo seu intelecto superior ao normal
e se associavam com povos bárbaros autoproclamando-se lordes, adotando armaduras de
aspeto oriental) e por último, os ogres Magi, (que eram vistos como génios, que se
dedicavam ao estudo da magia e se apresentavam como xamãs ou feiticeiros das suas
tribos).
“corpo bem constituído e organizado enquanto que a cara era horrível. No meio
da sua cara, no lugar do nariz, existia uma massa de pele semelhante a um pénis
119
Baljet, B.;Van Der Werf, F.; Otto, A.J. (1991) Willem Vrolik on cyclopia. Documenta
Ophthalomologica, Kluwer Academic Publishers p. 356.
86
M. Inês Garcia
ou uma pera. Por baixo uma massa quadrada de aspecto avermelhado onde se
conseguia observar um par de olhos unidos, semelhantes a olhos de galinha”120.
Embora a criança tenha morrido à nascença é descrita como tendo o tamanho de uma
criança de dez anos, (o que invoca em certa medida o legado dos ciclopes gigantes). Liceti
descreve ainda outro caso de ciclopia desta vez em gémeos siameses121. Os seus crânios
estavam unidos de modo que os fetos estavam de costas um para o outro, tendo as mesmas
características que o primeiro caso descrito pelo autor.
No primeiro caso, existe uma aproximação de uma união variável das órbitas e dos seus
conteúdos, com os ouvidos posicionados corretamente, enquanto, no segundo caso, existe
uma aproximação da união do ouvido externo e do ouvido médio na linha média, redução
ou ausência da mandíbula e por vezes, aproximação ou fusão das órbitas ou das estruturas
oculares. Neste período, foi Willem Vrolik na Holanda, quem mais estudou a
malformação e reuniu diversos exemplares humanos e animais com esta malformação.
120
Leroi, Armand Marie (2005) Mutants: On the Form, Varieties and Errors of the Human Body. London:
Harper Perennial, p.71.
121
Note-se que estas duas características de gémeos siameses e ciclopia são uma combinação de
deformidades raríssima e até questionável, mas neste caso estão bem fundamentadas com provas
apresentadas no relatório médico do caso.
122
Étienne Geoffroy Saint-Hilaire, (1772-1844), foi um naturalista e zoólogo francês. É considerado como
o fundador da teratologia, (ramo da medicina que estuda as malformações congénitas).
87
M. Inês Garcia
O seu filho, Willem Vrolik (1801-1863), também se formou como Doutor em Medicina
em Utrech, e posteriormente, foi nomeado professor extraordinário de Anatomia e
Embriologia na Universidade de Groningen. Durante a sua estadia em Groningen, Vrolik
interessou-se pela teratologia, pois na Colecção Camper123 havia muitas espécies com
malformações congénitas.
Vrolik tencionava publicar um documento sobre essas espécies, mas infelizmente a sua
estadia em Groningen foi breve demais para a tarefa. No entanto, o seu interesse não
esmoreceu e durante a sua passagem por Amesterdão em 1834, publicou um documento
sobre a ciclopia denominado “ A natureza e origem da ciclopia”. Neste documento o autor
dá uma definição de um ciclope: «Ciclopes são monstros cujos órgãos do olfato e visão
estão malformados de tal modo que o primeiro ou está em falta ou não está presente no
sítio habitual, e o segundo é mais ou menos presente de uma forma singular»124
O seu documento de 1834125 foi a base para um capítulo do manual sobre Anatomia
Patológica e ainda para a elaboração de várias gravuras representativas do normal e
anormal desenvolvimento do homem e dos mamíferos. São mais de 100 gravuras com
descrições em latim e holandês que ilustram vários tipos de ciclopia (ver Anexo de
Imagens Fig. 37). Nessas gravuras surgem ciclopes humanos, porcos e cordeiros, onde
surge a ciclopia combinada com outras anomalias da cabeça.
123
Durante a sua estadia em Groningen como docente, Vrolik estudou o Gabinete do zoólogo Petrus
Camper.
124
Baljet, B.; Van Der Werf, F.; Otto, A.J (1991) Op. Cit., p.357.
125
Cujo nome original é « De vrucht van den mensch en van de zoogdieren afgebeeld en beschreven in
hare regelmatige en onregelmatige ontwikkeling».
88
M. Inês Garcia
Neste documento Willem discute as teorias que existiam na época sobre as malformações
congénitas nos séculos precedentes e as suas conclusões apresentadas têm que ver com
estudos científicos onde observou que os ciclopes são malformações que podem ser
diferenciadas em fases distintas. Assim, dividiu os ciclopes em cinco tipos principais.
O tipo 1, onde os olhos não são visíveis externamente. Por vezes o nariz está
completamente ausente e outras, surge um tronco, um género de “tromba” na posição do
nariz. O tipo 2, onde está presente um único globo ocular externo, onde por vezes, surge
por cima da órbita, a aparência de um nariz externo com a forma de uma tromba. O tipo
3, apresenta um único olho presente, mas internamente são dois, por vezes com uma
tromba ou sem ela. O tipo 4 apresenta olhos separados distintamente, por vezes fechados
na mesma órbita ou separados com uma espécie de barreira, tendo por cima uma tromba
dobrada. E finalmente, o tipo 5, cuja tromba é direcionada para baixo e suportada por um
«tubo» de osso, com uma forma mais «natural». O olho é às vezes único e outras vezes
duplo.
Vrolik classifica os recém-nascidos humanos com ciclopia da sua coleção com o tipo 1,
e os restantes 19 espécimenes de outros mamíferos com os tipos de 2 a 5. Ao observar os
fetos em frascos da sua coleção, Vrolik reconhecem que alguns casos eram mais severos
do que outros, sendo que uns tinham apenas uma órbita dentro da cavidade ocular
enquanto outros tinham duas visíveis. Alguns tinham um nariz enquanto outros não.
89
M. Inês Garcia
Fig. 32. Representação de um feto que de acordo com Willem Vrolik possui ciclopia do tipo 1 onde os
olhos não são visíveis e com um proboscídeo externo. De acordo com a ciência atual é descrita como
holoprosencefalia alobar. Original da autora, ilustração digital, 2015.
A classificação de ciclopes nestes cinco tipos, teve origem neste estudo e também em
muitos relatos literários. Vrolik concluiu que a natureza desta anomalia era baseada no
desenvolvimento pobre do órgão olfativo, bem como o da visão. Afirmando que:
126
Baljet, B.; Van Der Werf, F.; Otto, A.J. (1991) Op. Cit., p.358-362.
90
M. Inês Garcia
Willem Vrolik estudou bastante sobre esta deformidade, tendo publicado um trabalho
sobre este assunto entre 1844 e 1849 denominado de Tabulae ad illustrandam
embryogenesin hominis et mammalium tam naturalem quam abnorme (Gravuras que
demonstram o desenvolvimento normal e anormal tanto em homens como mamíferos).
Este trabalho está também enriquecido com várias gravuras que descrevem fetos (tanto
humanos como animais), que em vez de possuírem dois olhos, têm apenas um, localizado
no meio da testa. Para além de toda a pesquisa, Willem criou também uma “coleção” sua
com cerca de 24 espécimenes: 8 leitões, 10 cordeiros, 5 humanos e um gato bebé, todos
com a mesma condição, variando os graus de gravidade (ver Anexo de Imagens, Fig. 37).
De acordo com Geoffrey, foi Vrolik que «batizou» estas criaturas com o nome de uma
das criaturas mais temidas da mitologia grega: o ciclope.
A ideia de que a ciclopia faz parte de um espectro de anomalias foi introduzido por
Geoffroy Saint-Hillaire. O sistema de classificação deste autor, (que dividiu os defeitos
faciais em duas famílias: ciclocefalia e otocefalia), foi adotado e modificado em 1934 por
Wright e os seus associados. Estes autores elaboraram um esquema de classificação para
a síndrome ciclopia-otocefalia. Numa primeira instância, classificaram uma série de
defeitos associados à mandíbula e numa segunda, colocaram uma série de pré-maxilares
e associaram os defeitos.
91
M. Inês Garcia
Fig. 33. Representação de um feto que de acordo com Willem Vrolik possui ciclopia do tipo 3 ou 4, com
um aparente único globo ocular externo, sendo que internamente são dois podendo ter probóscideo ou não.
De acordo com a ciência atual é descrita como holoprosencefalia lobar. Original da autora, ilustração
digital, 2015.
De acordo com o oftalmologista William Stewart Duke Elder, (1898-1978), a ciclopia faz
parte de uma anomalia que não envolve exclusivamente os olhos mas também a parte
interior do cérebro e as estruturas mesodérmicas situadas na linha média. A ciclopia
verdadeira ou a fusão completa de dois globos é muito rara, o mais comum é suceder uma
fusão parcial em que algumas, ou todas as estruturas oculares são combinadas num único
globo ocular- esta situação pode ser denominada de sinoftalmia.
92
M. Inês Garcia
A principal característica física externa de um feto com ciclopia é o seu olho único,
desenvolvido de forma irregular durante a gestação. No entanto esta particularidade
expande-se, constituindo uma deformidade profunda que chega até ao interior do crânio.
Todos os vertebrados possuem um cérebro com dois hemisférios, no entanto, os fetos
ciclópicos não. Em vez de possuírem dois hemisférios cerebrais, dois lobos oculares e
dois lobos olfativos o seu lobo frontal está fundido num todo. Este desenvolvimento
anómalo, incompatível com a vida, traduz-se assim numa monstruosidade.
127
De acordo com o website do Portal de Codificação Clínica e dos GDH, a Holoprosencefalia é um
transtorno caracterizado pela falha de desenvolvimento do Prosencéfalo, (lobo frontal do cérebro do
embrião), que dá origem aos hemisférios cerebrais, telencéfalo, diencéfalo e bolbos olfativos. Esta doença
é causada pela ausência de divisão do lóbulo frontal do cérebro do embrião para formar os hemisférios
cerebrais bilaterais, o que causa defeitos no desenvolvimento da face e estrutura e funcionamento do
cérebro.
93
M. Inês Garcia
separar-se, consistindo numa classe intermédia) e a lobar (onde existe uma clareza notável
na separação dos hemisférios do cérebro, sendo por isso a classe menos grave. Em alguns
casos de holoprosencefalia lobar o cérebro do indivíduo pode ser quase normal (ver
Anexo de Imagens, Fig. 36).
De facto, segundo o autor Armand Marie Leroi, esta má formação cerebral tem uma
prevalência de 1 em cada 16.000 mil recém-nascidos128 e geralmente o feto morre alguns
dias após o nascimento, por mau funcionamento do cérebro e/ ou dificuldades na
respiração devido à rinocefalia.
De acordo com o Guia Ilustrado das malformações do Sistema Nervoso Central, uma
publicação do EUROCAT, (European Surveillance of Congenital Anomalies),
combinada com a Acção dos registos de projectos de Anomalias Congénitas e Gémeos, a
ciclopia é vista como uma falta congénita dos bolbos olfactivos, a holoprosencefalia,
sendo que esta anomalia não é uma única malformação, mas um grupo de desordens129.
128
Leroi, Armand Marie (2005) Op. Cit., p.73.
129
Cit. Por, Baljet, B.; Van Der Werf, F.; Otto, A.J. (1991) Willem Vrolik on cyclopia, p. 364.
94
M. Inês Garcia
Fig. 34. Representação de um feto que de acordo com Willem Vrolik possui ciclopia do tipo 1 onde os
olhos não são visíveis e com um proboscídeo externo. De acordo com a ciência atual poderá ser descrita
como holoprosencefalia eventualmente semilobar. Original da autora, ilustração digital, 2015.
Na opinião do professor Armand Marie Leroi, autor do livro “Mutants: On the Form,
Varieties and Errors of the Human Body”, para além de relativamente comum, esta
deformidade ocorre de uma forma relativamente fácil: por exemplo os fetos de um peixe
tornam-se ciclópicos se forem aquecidos, arrefecidos, irradiados, privados de oxigénio,
expostos a éter, acetona, álcool, sal de mesa, entre outros. Nos anos 50, uma epidemia de
cordeiros ciclópicos nos Estados Unidos foi causada devido ao gado se roçar em lírios de
milho, (uma planta dos prados subalpinos cujas folhas são concentradas em alcaloides
tóxicos). No caso humano, as grávidas diabéticas tem 200 vezes mais probabilidade de
dar à luz fetos com ciclopia, tal como as mães alcoólicas130.
Porém, Leroi afirma que, a maioria dos casos não é consequente do comportamento das
progenitoras durante a gestação. Mutações em pelo menos quatro a no máximo doze
genes humanos causam holoprosencefalia. Um destes genes contém uma proteína
denominada de «ouriço sónico», (em inglês «Sonic the Hedgehog»131). Este gene nos
130
Leroi, Armand Marie (2005) Op. Cit, p. 73 e 74.
131
Esta proteína tem esta denominação pois nos anos 80, quando uma mosca-da-fruta mutante teve as suas
larvas apresentava as costas cobertas com pústulas. «Ouriço» foi o nome atribuído, precisamente pela sua
95
M. Inês Garcia
O professor explica ainda que o facto de esta deformidade ter apenas um hemisfério
cerebral é relevante. Pois quando o lobo frontal se forma no embrião é algo unitário, uma
continuação do tubo neural, que apenas mais tarde se divide em dois hemisférios. Esta
divisão é induzida precisamente por este gene do «ouriço sónico», que tal como outras
moléculas sinalizantes, é um morfogénio. Durante o desenvolvimento cerebral, esta
molécula surge numa pequena porção da mesoderme, mesmo abaixo do lobo frontal, filtra
tecido e em seguida divide o cérebro em dois. Este processo é básico na formação dos
olhos. Mas, mesmo antes da sua formação, existe uma zona dedicada no lobo frontal às
ligações oculares. Esta zona é conhecida como o «campo ocular» e originalmente surge
como uma banda que atravessa o lobo frontal até ser dividida pelo gene do ouriço em dois
campos mais pequenos em cada um dos lados do crânio. Mutações ou químicos que
inibam esse gene previnem que isto suceda, o que dá origem a um único e monstruoso
olho no crânio de um feto132 (ver Anexo de Imagens, Fig. 38).
Para além disto, este gene fornece-nos mais do que a divisão cerebral. Algumas
experiências em ratos, onde este gene está completamente ativado, fazem com que surjam
com corações, rins e intestinos malformados: são quase sempre nados-mortos e não têm
patas. Os crânios e focinhos contém deficiências mais do que ciclópicas, dando origem a
cabeças deformadas sem olhos, boca ou nariz, o que sugere que este gene esteja presente
na formação de várias partes do corpo e em vários locais durante a formação craniana.
semelhança. Curiosamente, este nome também se deveu ao facto de possivelmente o seu autor gostar muito
de videojogos do famoso ouriço Sonic.
132
Ibidem, p. 75.
96
M. Inês Garcia
Fig. 35. Representação de um feto que de acordo com Willem Vrolik possui ciclopia do tipo 1 onde os
olhos não são visíveis e com um proboscídeo externo. De acordo com a ciência atual poderá ser descrita
como holoprosencefalia eventualmente alobar ou semilobar (dependendo do cérebro). Original da autora,
ilustração digital, 2015.
A face de um embrião é formada a partir de cinco proeminências que por sua vez se
fundem umas com as outras. Duas dão origem à mandíbula, outras duas ao maxilar
superior e por fim, a última forma a fronte, o nariz, a testa e o lábio superior. Estas cinco
proeminências segregam a proteína que este gene contém, e que por sua vez controla o
crescimento e a geometria da face, (mais precisamente a sua largura). Este gene define os
espaços entre orelhas e até mesmo as narinas. Esta informação é conhecida devido ao
estudo efetuado em galinhas com excesso do gene sónico, que fez com que tivessem faces
demasiado largas. Em casos extremos, este excesso faz com que as estruturas se
dupliquem causando até o aparecimento de bicos lado a lado. Algo semelhante pode
também acontecer nos humanos: algumas malformações genéticas relacionadas com esta
situação são caracterizadas por olhos demasiado afastados, uma condição anteriormente
referida: o hipotelorismo, causado por uma mutação no gene sónico, limitando as suas
capacidades. Os pacientes com casos extremos desta deformidade remetem para a
situação das galinhas com dois bicos, devido às enormes cavidades nasais que possuem,
ou até mesmo em casos mais raros, duas pontas do nariz ou dois narizes.
97
M. Inês Garcia
Um pouco à semelhança do que foi teorizado para a anterior criatura Orc, no caso dos
ciclopes a equipa do World of Warcraft poderá ter tido atenção a todas estas
características (neste caso a existência de um único olho aliada às outras duas
características já descritas no Orc: prognatismo e extremidades desproporcionais-
acromegalia/gigantismo) para a criação dos diferentes tipos de ciclopes existentes no
videojogo). Embora sejam apenas conjeturas, são perfeitamente plausíveis através das
comparações já referidas no decorrer do capítulo (de salientar as referências ao crânio de
elefante e aos fetos ciclópicos) e tal como no caso do Orc, todas estas características lhe
atribuem uma fisionomia ameaçadora e imponente.
98
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CONCLUSÃO
Foi feito um enquadramento dos monstros na sociedade: enquanto peças utilitárias para a
ciência, divertimento social nas feiras de freakshows e uma breve constatação desta
temática no universo contemporâneo.
99
M. Inês Garcia
Conforme os universos, a aparência destas criaturas vai divergindo, e por uma questão de
interesse intelectual e estético, optou-se por selecionar a versão do referido videojogo,
mais ainda porque é aquela onde mais se exaltam as características aqui abordadas e
analisadas.
Assim sendo, para uma melhor compreensão desta dissertação, estas deformidades reais
foram explicadas, de acordo com as suas origens e inerentes problemáticas, aplicando-se
posteriormente às criaturas fictícias. Como as personagens em questão tem influências
em alguns animais devido a algumas características físicas que apresentam, foi ainda
realizada uma pequena pesquisa relativamente à fauna animal.
Vistas como algo negativo e de mau presságio, as anomalias sempre foram conotadas
com aspetos negativos. É por isso curioso observar como algo tão “maligno” é fonte de
inspiração para criaturas tão singulares e tão adoradas quer nos tempos antigos, quer nos
contemporâneos.
100
M. Inês Garcia
101
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112
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ANEXO DE IMAGENS
A)
Fig.1. Da esquerda para a direita: Robert Waldlow era conhecido como o homem mais alto de toda a
história médica. Cresceu até aos 2,67 m de altura. Grady Stiles, o rapaz lagosta, apresentou-se na Feira
Estadual de Indianopolis a 29 de Agosto de 1925. Imagens retiradas da monografia Freaks Aberracções
Humanas: A exploração de fenómenos físicos humanos em circos e espectáculos itinerantes da autoria de
Akimitsu Naruyama.
Fig. 2. Da esquerda para a direita: A famíla Sander, conhecida também por família com pele de leopardo.
Afirmavam ser oriundos de Madagáscar. Na aristocracia birmanesa as mulheres com os pescoços mais
compridos eram consideradas as mais belas. Todos os anos se adicionavam mais braceletes douradas.
Estas duas irmãs trabalhavam para o Ringling Brother’s Circus nos anos 30, sendo uma atração muito
popular na época. Imagens retiradas da monografia Freaks Aberracções Humanas: A exploração de
fenómenos físicos humanos em circos e espectáculos itinerantes da autoria de Akimitsu Naruyama.
113
M. Inês Garcia
Fig. 3. Orc do universo de William Blake. Imagem retirada do website “These Fantastic Worlds”.
Fig. 4. Orcs do universo de Tolkien. Imagens retiradas dos Websites “Gamefaqs.com” e “Wikia”.
114
M. Inês Garcia
Fig. 5. Três colorações de Orc no universo Warcraft: verde, castanho alaranjado e vermelho. Imagens
com diferentes proveniências. Da esquerda para a direita: imagem sem autor retirada do website
“Battle.net”; Peter Stapleton, Garrosh Hellscream- Wow, retirada do website “Deviantart.com” e
finalmente, imagem sem autor de ecrã de loading do jogo World Of Warcraft, retirada do website
“Wowwiki.com”.
Fig. 6. Orc fêmea com diferentes tipos de penteado. Imagem retirada do website “Ign”.
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Fig. 7. Representação de uma Orc Fêmea com um traje guerreiro de inspiração xamanística. Original da
autora, ilustração digital, 2015.
Fig. 8. Outra variante de traje guerreiro Orc. Original da autora, ilustração digital, 2015.
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Fig. 9. Diferentes tipos de expressões do Orc. Original da autora, ilustração digital, 2015.
Fig. 10. Um dos vários tipos de acampamentos Orcs. Original da autora, ilustração tradicional com
tratamento digital, 2015.
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Fig. 11. Um dos vários tipos de acampamentos Orcs. Original da autora, ilustração tradicional com
tratamento digital, 2015.
Fig. 12. Um dos vários tipos de acampamentos Orcs. Original da autora, ilustração digital, 2015.
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Fig. 13. Um dos vários tipos de acampamentos Orcs. Original da autora, ilustração digital, 2015.
Fig. 14. Habitat das criaturas Ciclopes. Original da autora, ilustração digital, 2015.
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Fig. 15. Diferentes tipos de armas utilizadas pelos Orcs. Original da autora, ilustração tradicional com
tratamento digital, 2015.
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Fig. 16. Armas utilizadas por Orcs e também por Ogres. Original da autora, ilustração tradicional com
tratamento digital, 2015.
Fig. 17. Orcs do universo Dungeons and Dragons: Orc Shaman e Orc Mauler. Imagens retiradas do
Blogue “Dietermiller” e do website “trollandtoad.com”.
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Fig. 18. Orcs do universo Elder Scrolls. Imagens retiradas do Website “UESP”.
Fig. 19. Orcs do universo Heroscape (à esquerda) e Magic the Gathering (à direita). Imagens retiradas do
website “dakkadakka” e “ atomicmall.com”.
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Fig. 20. Orcs do universo Might and Magic. Imagem retirada do website “might and magic.ru”.
Fig.21. Pormenor da cabeça da versão do Orc em Warhammer. Imagem da autoria de Ted Beargeon
retirada do website “Polycount.com”.
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Fig. 22. Comparação de postura entre a criatura fantástica Orc e um Gorila, (Gorilla beringei beringei).
Imagem da direita retirada do Blogue “ Witty Nity”.
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Fig.24. Esquema representativo de um tipo de prognatismo com supra-oclusão. Existe dificuldade por
parte do indivíduo em manter o encerramento labial. Também é visível o aparente desaparecimento do
terço médio da face em detrimento do avanço do terço inferior. Imagem retirada da Tese de
Doutoramento de José de Paiva Boléo Tomé, Anomalias da classe III.
Fig. 25. Comparações entre o crânio de um Gorila (A) com o de um Orc (B) e respetivos tegumentos
comuns. Original da autora, ilustração digital, 2015.
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Fig.26. Três crânios de símios, onde se pode observar os tipos de dentição relativamente semelhantes
entre si. É de realçar a presença dos grandes caninos especialmente na figura B. Da esquerda para a
direita: Crânio de Gorila (Gorilla gorilla- A), crânio de Babuíno (Mandrillus sphinx- B) e crânio de
chimpanzé (Pan trogludytes- C). Imagens retiradas do Website “Boneclones.com”.
Fig. 27. Tabela de escalas aproximadas de todas as criaturas abordadas na dissertação comparativamente
à altura média de um humano (A). Os monstros estão assinalados respetivamente: B) Orc; C) Ogre; D)
Ogron; E) Gronn e F) Magnarozn. Infografia realizada pela autora, técnica digital, 2015.
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Fig. 28. Odysseus & Polyphemus, [pintor desconhecido],pintura em cerâmica, ca. 530 - 510 a.C .
Pertencente ao período Arcaico. British Museum, Londres. Representação numa ânfora de Ulisses
(Odisseus) a ferir Polifemo. O gigante é representado com cabelo abundante e um único olho. Imagem
retirada do Website “Theoi Project: Greek Mythology”.
Fig. 29. Polyphemus e Odysseus, [autor desconhecido],mosaico, ca. 320 A.D. Pertencente ao período
romano. British Museum, Londres. Representação de Ulisses a oferecer vinho a Polifemo. O gigante
encontra-se sentado na sua caverna junto de ovelhas, nesta versão, surge com três olhos. Imagem retirada
do Website “Theoi Project: Greek Mythology”.
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Fig. 30. Cabeça de Polifemo. Helenístico tardio ou Romano. ca 150 a.C . Imagem retirada do Website
“THE MFA TOUR”.
Fig. 31. Johann Heinrich Wilhelm Tischbein, Polyphemus, 1802. Landesmuseum Oldenburg.
Representação de um Ciclope. Existem duas gerações de ciclopes na mitologia grega. A primeira geração
possui três irmãos: Brontes (trovejador), Estéropes (criador de luz ou flashes) e Arges (Iluminador), que
nasceram da união de Gaia (Titã que representa a terra) e Uranus (Titã celeste). A segunda geração
descendeu de Posídon e o ciclope mais infame era Polifemos da Odisseia de Homero. Imagem retirada do
Website “ Monstropedia”.
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Fig. 32. Ciclopes do universo Dungeons and Dragons. Imagens retiradas dos websites “ Rpg Miniatures”
e “ Forgotten Realms”.
Fig. 33. Ciclope do universo Final Fantasy. Imagem retirada do website “ Ffxiv Wiki”.
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Fig. 34. Ciclope do universo Heroes of Might and Magic. Imagem retirada do website “ Heroes
Community”.
Fig. 35. Ciclopes do universo Magic the Gathering. Imagens retiradas dos websites “ Magic Spoiler” e “
Magic Madhouse”.
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Fig. 36. Secções axiais através de ressonância magnética craniana de pacientes com Holoprosencefalia,
distinguidas por tipo. Da esquerda para direita temos os vários tipos: alobar, semialobar e lobar. Imagem
retirada do artigo “ Holoprosecephally: A Guide to Diagnosis and Clinical Manegement”, p. 459.
Fig. 37. Ciclopia em animais. Na figura A em carneiros e na figura B em porcos. Imagens retiradas do
documento “Willem Vrolik on cyclopia”, p. 360 e 362.
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Fig. 38. Feto com ciclopia. Fotografia da autora. Cortesia da Faculdade de Ciências Médicas de Lisboa,
2015.
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ANEXO DE IMAGENS
B)
2015.
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