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Instituto Superior de Ciências e Tecnologia de Moçambique

Escola Superior de Direito

Direito Constitucional I

Texto de Apoio

Tema I

Introdução ao Direito Constitucional

1. O facto politico e o Estado

O fenómeno ou facto político apresenta duas faces, uma ontológica e a outra


deontológica.

Como realidade ontológica, o fenómeno político é um mero facto que acontece


numa sociedade.

Como realidade deontológica, o fenómeno político apresenta-se revestido de


certos valores que permitem formular juízos sobre a sua fundamentação.

Já sabemos que o facto político é uma actividade humana relacionada com a


aquisição, manutenção e o exercício do poder político e que ele ocorre no Estado ou
sociedade política.

O Estado é definido como um povo baseado num território no qual institui, por
autoridade própria, um poder político (relativamente) autónomo.

A análise desta definição revela os elementos ou condições de existência do


Estado: (i) o povo (ii) o território e (iii) o poder político.

No entanto, o Estado pode ser visualizado sob duas perspectivas básicas:

 Como Estado- Poder – poder político manifestado através de órgãos,


serviços e relações de autoridade.

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 Como Estado-Comunidade – sociedade constituída por seres humanos, na
qual se exerce um poder para a realização de fins comuns.

Estas duas perspectivas são incindíveis, apresentando-se como “duas faces da


mesma moeda”. E unidade do Estado-Poder com o Estado-Comunidade apresenta-se
como uma unidade jurídica, isto é, uma unidade assegurada por normas jurídicas.

2. O Estado e o Direito

O Direito é uma ordem normativa composta por normas jurídicas gerais,


abstractas, obrigatórias e assistidas de protecção coactiva, que regulam a vida do homem
nas suas relações sociais. E a norma jurídica é uma regra de conduta imperativa, geral e
abstracta, imposta de forma coerciva pelo Estado.

A relação entre o Estado e o Direito pode ser compreendida de múltiplas formas.

Antes de mais, é preciso considerar que o nascimento de um Estado revela-se


sempre como um fenómeno jurídico, porquanto é o Direito que conforma os elementos
(ou condições de existência) do Estado. Com efeito, a pertença de uma porção do
território a um Estado depende de normas jurídicas – normas do Direito internacional; a
pertença do indivíduo ao povo de um Estado depende também do Direito expresso em
leis de nacionalidade, sendo esse Direito que transforma os homens em cidadãos; as
condições de acesso ao poder político e do respectivo exercício são igualmente
estabelecidas pelo Direito.

O exercício do poder político não se baseia no uso da força. A autoridade dos


governantes em concreto deve ser uma autoridade constituída por um conjunto de
normas jurídicas fundamentais e estas normas formam a Constituição.

O Direito cria direitos e obrigações nas relações entre indivíduos e entre estes e a
comunidade. O direito de mandar que assiste os governantes e o dever de obediência que
vincula os cidadãos são estabelecidos por normas jurídicas.

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O Direito vincula não apenas os indivíduos mas também o Estado e suas
instituições, cujas actividades devem ser realizadas em conformidade com princípios e
regras jurídicas.

Assim, o Direito confere segurança às relações entre os cidadãos e entre estes e o


poder político.

Todos os regimes e sistemas políticos, em qualquer época e lugar, foram ou são


definidos e legitimados por valores e princípios jurídicos.

A sujeição do Estado ao Direito é a base do Direito Público que inclui o Direito


constitucional.

O Direito Público – conjunto de normas jurídicas que se destinam a proteger o


interesse geral (critério dos interesses).

Direito Público – Direito do Estado e das outras pessoas colectivas públicas


(critério da posição dos sujeitos).

Direito Privado – conjunto de normas que se destinam a proteger os interesses


particulares (critério dos interesses).

Direito Privado – Direito dos particulares (critério da posição dos sujeitos).

3. Direito Constitucional

O Direito Constitucional é a parcela da ordem jurídica que regula o Estado


(Eatado-Comunidade e Estado Poder).

O Direito Constitucional – conjunto de normas fundamentais que define:

 A Estrutura, os fins, os órgãos, as funções e os actos Estado;

 A posição dos indivíduos e os grupos uns perante os outros;

 A posição dos indivíduos e os grupos uns perante o Estado-Poder.

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4. Direito Constitucional ou Direito Político

 Direito político – normas que regulam directa e imediatamente o Estado,


constituindo, por isso, o seu estatuto jurídico ou o estatuto jurídico do
político.

 Direito Constitucional – normas que revestem a forma de Constituição.

A designação “Direito Político” reduz o âmbito deste ramo do Direito à:

 organização e limitação do poder político;

 disciplina do Estado-Poder, afastando para outras áreas do Direito tudo


quanto respeita ao Estado-Comunidade.

Mas este entendimento não é pacífico, porque não pode existir:

 estatuto do poder político sem estatuto da comunidade política com a qual


esse poder está relacionado;

 limitação da autoridade dos governantes sem consideração da liberdade


dos governados.

A Constituição é, ao mesmo tempo, Constituição política e Constituição social.

Por isso, neste curso prefere-se usar a designação de Direito Constitucional em


vez de Direito Político.

5. Direito Constitucional e ordem jurídica do Estado

O facto político tem a ver com a sociedade política como um todo e, neste
sentido, abrange, coordena e sintetiza a pluralidade de grupos, interesses e situações.

Por isso, o Direito Constitucional, como regulador do político, é considerado


tronco da ordem jurídica do Estado, o tronco donde derivam os ramos da grande
árvore que corresponde a essa ordem jurídica.

A Constituição estabelece os pressupostos de criação, vigência e execução das


normas do resto do ordenamento jurídico, determinando, de forma ampla, o conteúdo das
normas do restante ordenamento jurídico.

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A Constituição é o elemento de unidade do ordenamento jurídico do Estado e,
nesta conformidade, impede:

 o isolamento do Direito Constitucional;

 a existência isolada de outras parcelas de Direito umas em relação às


outras.

Além de regular os órgãos do poder, a Constituição contém princípios gerais de


diversos ramos de Direito, nomeadamente, Direito Penal Direito Processual Penal,
Direito da Família, Direito do Trabalho, Direito Tributário, Direito Financeiro, Direito
Económico, Direito Administrativo.

Através dos princípios, a Constituição se reflecte em todo o ordenamento


jurídico do Estado.

Não obstante, cada um dos ramos do Direito desenvolve um conjunto de preceitos


e princípios próprios, tendo em conta as situações particulares da vida social que
pretende disciplinar.

Mas os preceitos e princípios de cada ramo de Direito não devem nunca


contrariar a Constituição.

No Direito Constitucional apenas cabe aquilo que se relaciona com a


estruturação da comunidade e do poder político e que possui significado político
imediato.

Fica, assim, excluído do Direito Constitucional tudo que respeita aos


particulares, aos grupos, e aos poderes sociais não políticos

6. Os grandes capítulos do Direito Constitucional

 Direito Parlamentar – conjunto de regras respeitantes à organização e ao


funcionamento do parlamento;

 Direito Eleitoral – conjunto de normas que reguladoras das eleições


políticas (a capacidade eleitoral activa e passiva, o recenseamento, o

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sufrágio, o apuramentos dos resultados eleitorais e o contencioso
eleitoral);

 Direito Constitucional da Economia ou Constituição Económica –


conjunto de normas que definem a organização e o funcionamento da
economia como uma das dimensões da comunidade política.

 Constituição financeira – conjunto de normas que regulam a actividade


financeira do Estado.

 Constituição Social – conjunto de normas que estabelecem os direitos


sociais dos cidadãos.

 Direito Constitucional processual – relativo à fiscalização jurisdicional ou


jurisdicionalizada da constitucionalidade das leis através de um órgão de
competência concentrada (Tribunal Constitucional ou “órgão homólogo)
com o seu processo próprio.

Estes grandes capítulos do Direito Constitucional são preenchidos por


normas formalmente constitucionais e depois por normas de outras categorias que
complementam aquelas.

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Tema II

A Constituição como fenómeno jurídico

1- Constituição: definição e classificações

1.1. Conceito de Constituição

1.1.1. Constituição - sistema de normas jurídicas fundamentais reguladoras da


convivência social numa comunidade constituída sob a forma de Estado.

1.1.2. Perspectiva material - Constituição definida tendo em conta o objecto, o conteúdo


ou a função das normas que a integram.
1.1.2.1. Constituição em sentido material - consiste no estatuto jurídico do Estado,
ou no estatuto jurídico do político. Com a Constituição se estrutura o Estado e o
Direito do Estado
1.1.2.2. Poder constituinte material – poder do Estado de se dotar de estatuto
jurídico próprio; poder de auto-organização e de auto-regulação do Estado segundo
uma ideia de Direito. É um poder originário que exprime a soberania do Estado
na ordem interna.

1.1.2.3. Normas materialmente constitucionais

 Normas sobre a organização do Estado, principalmente, as disposições que


especificam quais os órgãos supremos do Estado, como são instituídos,
quais as suas tarefas e competências de regulação, como procedem e
colaboram;
 normas fundamentais sobre a posição dos cidadãos no Estado, com
especial relevância das que se referem aos seus direitos e liberdades
fundamentais.

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 princípios jurídico-políticos fundamentais e determinações dos fins do
Estado em que radicam estas disposições organizatórias e garantias
jurídicas.

1.1.3. Perspectiva formal - Constituição definida tendo em conta a posição das suas
normas em face das demais normas jurídicas e modo como se articulam e se recortam no
plano sistemático do ordenamento jurídico.
1.1.3.1. Constituição em sentido formal - complexo de normas formalmente
qualificadas como constitucionais, situadas no topo da hierarquia do ordenamento
jurídico estatal e revestidas de força jurídica superior em face de quaisquer outras normas
existentes no ordenamento jurídico.

1.1.3.2. Poder constituinte formal – faculdade do Estado de atribuir a forma


constitucional e força jurídica superior a determinadas normas do ordenamento jurídico.

1.1.3.3. O conceito formal de Constituição:


 Pressupõe uma especificação de certas normas no contexto da ordem
jurídica;
 Significa que a Constituição deve ser entendida como um sistema
normativo merecedor de relativa autonomia;
 Acarreta uma consideração hierárquica ou estruturada da ordem
jurídica.
1.1.3.4. Supremacia da Constituição formal
 Formal – a Constituição vincula o poder político quanto aos
procedimentos e formas de actuação.
 Material – A Constituição vincula o poder político quanto ao
conteúdo intrínseco dos actos que pratica.

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1.1.3.5. Constituição formal primária – normas que são primária, directa e
imediatamente obra do poder constituinte formal.
1.1.3.6. Constituição formal complementar – normas anteriores ou posteriores
pertencentes ao mesmo ordenamento jurídico ou provenientes de outro ordenamento que
recebem da Constituição formal primária a força de normas constitucionais.
1.1.4. Constituição em sentido instrumental – o documento escrito onde estão inseridas
as normas constitucionais
 Em sentido amplo – todo e qualquer texto constitucional, seja ele definido
material ou formalmente, seja único ou plúrimo.
 Em sentido restrito – o texto denominado Constituição ou elaborado como
Constituição e carregado de força jurídica específica de Constituição formal.

1.2- Classificações materiais das Constituições

1.2.1. Constituições normativas, nominais e semânticas (KARL LOEWENSTEIN)

a) Constituições normativas
 As suas normas dominam o processo político;
 O processo do exercício do poder se adapta às normas constitucionais e a
elas se submete;
 Limitam efectivamente o poder político.

b) Constituições nominais

 Não conseguem adaptar as suas normas à dinâmica do processo


político e, consequentemente, carecem de realidade existencial;
 Têm por finalidade limitar o poder político, contudo não conseguem
realizar tal finalidade.

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c) Constituições semânticas

 Formalizam a situação do poder político existente em benefício


exclusivo dos detentores de facto desse poder;
 Servem para estabilizar e eternizar a intervenção dos dominadores de
facto na comunidade.

1.2.2. Constituições estatutárias ou orgânicas

a) Constituições estatutárias ou orgânicas e Constituições programáticas,


directivas ou doutrinais
 Ocupam-se, principalmente, do estatuto do poder, dos seus órgãos e da
participação política dos cidadãos;
 Centram-se na forma e no sistema de governo;
 Não se preocupam com o sistema económico e social.

b) Constituições programáticas, directivas ou doutrinais

 Além da organização política, estabelecem programas, directrizes e


metas para a actividade do Estado no domínio económico, social e
cultural.

1.2.3. Constituições simples, complexas ou compromissórias.


 Critério de classificação: unidade ou pluralidade dos princípios
fundamentais enformadores da Constituição material.
a) Constituição simples – caracteriza-se pela unidade e harmonia intrínsecas de
princípios fundamentais.

b) Constituições complexas ou compromissórias – caracterizam-se por conterem dois


ou mais princípios fundamentais originariamente não harmonizáveis, mas passíveis de se
serem harmonizadas na prática, aquando da sua aplicação, por via de interpretação.

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O carácter simples ou compromissório de uma Constituição depende:
 Dos circunstancialismos da sua formação, da sua aplicação e das suas
vicissitudes.
 Da ausência ou da presença de um conflito de fundamentos de legitimidade ou de
projectos de organização colectiva que as normas constitucionais tenham de
ultrapassar através duma plataforma de entendimento.
 Do modo como é encarada a integração política.

2. Constituição em sentido material e pluralidade (simultânea ou sucessiva) de


Constituições materiais
O conteúdo da Constituição se relativiza para estruturar qualquer regime político,
entendido este como cada concepção básica dominante em cada Estado sobre a
comunidade e o poder, os fins prosseguidos por este poder e os meios de que o mesmo se
serve.
Assim a cada regime político corresponde uma determinada ideia de Constituição em
sentido material. A Constituição de qualquer Estado distingue-se da Constituição de outro
Estado em função do regime político que adopta. Por isso mesmo a mudança de regime
político determina a mudança de Constituição em sentido material.

A pluralidade de Constituições materiais depende também dos seguintes factores:


 Forma de Estado – modo de o Estado dispor o poder político em face de outros
poderes de igual natureza (coordenação ou subordinação) e quanto ao povo e ao
território.
 Forma de governo – forma de a comunidade política organizar o seu poder e
estabelecer a diferenciação entre governantes e governantes, a partir da resposta
aos problemas de legitimidade, de liberdade, de participação ou de unidade ou
divisão de poderes.
 Sistema de governo – sistema de órgãos da função política e estatuto dos
governantes.

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 Forma institucional – expressão institucional ou simbólica da representação ou
chefia do Estado (monarquia ou república).
O conteúdo essencial da Constituição em cada Estado e em cada tempo se traduz em
princípios jurídicos específicos, explícita ou implicitamente, e esses princípios abrangem
também a forma de Estado, a forma de governo, o sistema de governo, e a forma
institucional. O conjunto destes princípios consubstancia a Constituição material.

Assim, Constituição material é:


 Conjunto de princípios fundamentais estruturantes e caracterizantes de cada
Constituição em sentido material positivo.
 Manifestação directa e imediata duma ideia de direito que se impõe numa dada
colectividade, seja pelo consentimento, seja pela adesão passiva.
 Resultante primária do exercício do poder constituinte material.
 Expressão máxima da vontade popular livremente formada em democracia.
 Aquilo que permanece enquanto mudam os preceitos e as regras através das
sucessivas revisões ou por outras formas de vicissitudes.

3. Características da Constituição em sentido formal

3.1. Intencionalidade na formação: significa que as normas formalmente


constitucionais:
 São decretadas por um poder que se define com vista a esse fim;
 Na sua origem, são normas de fonte legal e não consuetudinária ou
jurisprudencial;
 São normas que exigem um processo específico de formação, embora não
exijam necessariamente um processo especial de modificação;
 Gozam de estatuto ou de um regime imposto por tais características e pela função
material genética ou conformadora que servem.
 Consideração sistemática a se
 Força jurídica própria

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CONCEPÇÕES GERAIS SOBRE A CONSTITUIÇÃO

1. As grandes correntes doutrinais

a) Concepções jusnaturalistas
 Constituição como expressão e reconhecimento em cada sistema
jurídico de princípios e regras de Direito natural, sobretudo, os que exigem o
respeito pelos direito fundamentais das pessoas.
 Constituição como meio de subordinação do Estado a um Direito
superior e, de tal modo que, juridicamente, o poder político não existe senão
em virtude da Constituição.
b) Concepções positivistas
 Constituição como lei, definida pela forma, independentemente de
qualquer conteúdo axiológico e, havendo entre a lei constitucional e a lei
ordinária uma relação lógica de supra-ordenação.
 Constituição como conjunto de normas decretadas pelo poder do
Estado e definidoras do seu Estatuto.
c) Concepções historicistas
 Constituição como expressão da estrutura histórica de cada povo e
referente de legitimidade da sua organização politica.
 Constituição como lei que deve reger cada povo, tendo em conta as
suas qualidades e tradições, a sua religião, a sua geografia, as suas relações
políticas e económicas.
d) Concepções sociológicas
 Constituição como conjunto ou consequência dos mutáveis
dos factores sociais que condicionam o exercício do poder.
 Constituição como lei que rege efectivamente o poder
político em certo país, por virtude das condições políticas e sociais nele
dominantes.

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e) Concepções marxistas
 Constituição como super-estrutura jurídica da organização
económica que prevalece em qualquer país.
 Constituição como um dos instrumentos da ideologia da
classe dominante.
 Constituição socialista como Constituição-balanço e
Constituição-programa.
f) Concepções institucionalistas
 Constituição como expressão da organização social, seja
como expressão das ideias duradouras na comunidade política, seja como
ordenamento resultante das instituições, das forças e dos fins políticos.
g) Concepções decisionistas
 Constituição como decisão política fundamental, válida só
por força do acto do poder constituinte, e sendo a ordem jurídica
essencialmente um sistema actos preceptivos de vontade, um sistema de
decisões.

h) Concepções da filosofia dos valores


 Constituição como expressão da ordem de valores que lhe é
anterior, por ela não criada e que vincula directamente todos os poderes do
Estado.

i) Concepções estruturalistas
 Constituição como expressão das estruturas sociais
historicamente situadas.
 Constituição como estrutura global do equilíbrio das
relações políticas e da sua transformação.

2. ALGUMAS TEORIAS DA CONSTITUIÇÃO

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2.1. Teoria de FERDINAND LASSALE

LASSALE parte da necessidade de distinguir entre Constituições Reais e


Constituições Escritas para concluir que:
 Averdadeira Constituição de um país reside sempre e unicamente nos
factores reais e efectivos de poder que dominem nesta sociedade.
 A Constituição escrita, quando não corresponda a tais factores, é por estas
afastada.
 Nessas condições, ou é reformada para ser posta em sintonia com os factores
materiais de poder da sociedade organizada, ou esta sociedade insurge-se
usando o seu poder inorgânico, para demonstrar que é mais forte, deslocando
os pilares em que repousa a Constituição.
 Os problemas constitucionais não são primariamente problema de direito mas
de poder.

2.2. Teoria de HANS KELSEN

Para Kelsen:

 O Direito é uma ordem normativa, cuja unidade baseia-se numa norma


fundamental, e isto porque o fundamento de validade de uma norma apenas
pode ser a validade de outra norma superior.
 Há uma estrutura hierárquica de diferentes graus do processo de criação do
Direito que desemboca numa norma fundamental que é a Constituição, a qual
deve ser entendida em dois sentidos:
o Jurídico-positivo
 A Constitução representa o escalão de Direito positivo mais
elevado e é a norma ou conjunto de normas jurídicas através
das quais se regula a produção de normas jurídicas gerais.

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 A produção de normas jurídicas gerais reguladas pela
Constituição tem, dentro da ordem jurídica estadual, o carácter
de legislação.

o Lógico-jurídico – a Constituição consiste na norma fundamental


hipotética, pois, como norma mais elevada, ela tem de ser pressuposta,
não podendo ser posta por uma autoridade cuja competência teria
ainda de se fundar numa norma ainda mais elevada.

2.3. Teoria de MAURICE HAURIOU

Segundo Hauriou:
 O regime constitucional, que é a ordem essencial da sociedade estatal no seu
livre desenvolvimento, determina-se pela acção de quatro factores: o poder, a
ordem, o Estado e a liberdade.
 O Poder é, simultaneamente, o fundador e organizador da
ordem.
 O Estado é a forma aperfeiçoada da ordem.
 A liberdade é tanto a causa como o fim dessas acções e da
criação dessas formas.
 Uma organização social torna-se duradoura quando está instituída, isto é:
 Por um lado, quando o poder de governo se pode subordinar à
ideia directora que existe nessa organização social desde o
momento da sua fundação, através do equilíbrio de órgãos e de
poderes.
 Por outro lado, quando esse sistema de ideias e de equilíbrio de
poderes foi consagrado, na sua forma, pelo consentimento dos
membros da instituição e do meio social.
 As formas jurídicas empregadas na organização do Estado em vista da
liberdade são, por ordem histórica:
 As instituições costumeiras.

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 O reino da lei com valor constitucional.
 As Constituições nacionais que aparecem em finais do século
XVIII a par do princípio da soberania nacional.
 Uma Constituição nacional é o Estatuto do Estado (considerado como
corporação ou associação) e dos seus membros, estatuto que é estabelecido em
nome da nação soberana por um poder constituinte e por uma operação
legislativa de fundação segundo um processo especial.
 A Constituição compreende:
 Constituição política – que versa sobre a forma geral do Estado e
sobre os poderes públicos.
 Constituição social – que tem por objecto primacial os direitos
individuais que também valem como instituições jurídicas
objectivas.

2.4. Teoria de CARL SCHMITT

SCHMITT distingue quatro conceitos básicos de Constituição:

 Conceito absoluto – Constituição como um todo unitário.


 Conceito relativo – Constituição como uma pluralidade de leis
particulares.
 Conceito positivo – Constituição como decisão de conjunto sobre o modo
e a forma da unidade política.
 Conceito ideal – Constituição assim chamada em sentido distintivo e por
causa de certo conteúdo.
Uma Constituição é válida porque resulta de um poder constituinte e se estabelece
por vontade desse poder constituinte (significando vontade uma dimensão do Ser como
origem do Dever Ser).
A Constituição (em sentido positivo) surge mediante um acto do poder
constituinte.

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O acto do poder constituinte não contém em si quaisquer normas, mas sim, a
totalidade da unidade política considerada na sua particular forma de existência, por ser,
precisamente, o único momento de decisão.

O acto do poder constituinte constitui a forma e o modo da unidade política, cuja


existência é anterior.
A Constituição é uma decisão consciente que a unidade política, através do poder
constituinte, adopta por si própria e para si própria.
A essência da Constituição não reside numa lei ou numa norma, reside, sim, na
decisão política do titular do poder constituinte (o povo na democracia e o monarca na
monarquia).

2.5. Teoria de HERMANN HELLER

A Teoria de Heller define consiste especificamente:

 Primeiro, em definir a Constituição como totalidade, baseada numa


relação dialéctica entre normalidade e normatividade.
 Segundo, na procura da conexão entre a Constituição enquanto ser e a
Constituição enquanto Constituição jurídica normativa.

A Constituição do Estado não é processo mas produto de processo; não é


actividade, mas forma de actividade; é uma forma aberta, através da qual passa a
vida em forma e forma nascida da vida.

A Constituição permanece através da mudança de tempo e pessoas, graças a


probabilidade de se repetir no futuro o comportamento que com ela está de
acordo.

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Tema III- Formação da Constituição e o Poder Constituinte

1. Poder constituinte material e poder constituinte formal

A formação da Constituição não se dá de modo instantâneo, ela implica um


processo no qual é possível destacar vários momentos diferentes.
Neste processo é preciso diferenciar: (i) o factor determinante da abertura de cada
era constitucional (i) a entidade que determina o conteúdo fundamental de cada
Constituição e (ii) o órgão que elabora e decreta a Constituição formal.

a) O factor determinante da abertura de cada era constitucional


Este factor consiste na ruptura com a situação ou com o regime político vigente
num país, através duma revolução ou de outro meio.
Por exemplo, Moçambique esteve, durante cerca de cinco séculos, sujeito à
soberania do Estado Português, numa situação de dominação colonial. A ruptura que se
verifica em relação a esta situação – e que atinge o seu auge na assinatura dos Acordos de
Lusaka entre a Frente de Libertação de Moçambique e o Estado português, em 7 de
Setembro de 1974 – pode ser considerada como o factor que determinou a abertura da era
constitucional que culminou com a aprovação da Constituição da República de
Moçambique, na Praia do Tofo, em 20 de Junho de 1975.
b) A entidade determinante do conteúdo fundamental de uma Constituição
Trata-se da entidade – força política ou social, movimento militar ou popular,
monarca ou outro órgão ou grupo – que toma a decisão de acabar com a ordem
constitucional anterior, assumindo a responsabilidade histórica daí decorrente.
É o caso, por exemplo, da Frente de Libertação de Moçambique que, em 1962
tomou a decisão histórica de lutar, de forma organizada e consequente, contra o domínio
colonial de Portugal sobre Moçambique, tendo para o efeito desencadeado a luta armada
de libertação nacional, em 25 de Setembro de 1964.

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A entidade determinante do conteúdo fundamental da Constituição pode adoptar
duas atitudes possíveis: (i) elaborar e decretar, ele própria, a Constituição formal ou (ii)
convocar ou estabelecer uma assembleia ou outro órgão a fim de elaborar e decretar a
Constituição.
O exemplo do primeiro caso verificou-se em Moçambique, onde a Frente de
Libertação de Moçambique encarregou-se de elaborar e decretar a Constituição da
República Popular de Moçambique, através do seu Comité Central. O Mesmo já não
aconteceu, por exemplo, em Portugal, onde o Movimento das Forças Armadas que
provocou a derrocada do regime fascista, através do golpe de Estado de 25 de Abril de
1974, endossou a responsabilidade de elaborar e decretar a nova Constituição a uma
Assembleia Nacional Constituinte.1
Neste último caso, órgão que elabora e decreta a Constituição formal deve ser fiel
à ideia de Direito ou aos valores fundamentais que correspondem à ruptura, não podendo
agir em sentido contrário a essa ideia de direito, sob pena de provocar nova ruptura e de
se transformar em entidade originária de uma Constituição material diferente.
Quando a ideia de Direito é democrática e a Constituição é aprovada pelo povo
(directamente ou através de assembleia representativa), o órgão que elabora e decreta a
Constituição formal tem uma legitimidade que deriva, só por si, da constituição material
ou que se confunde com esta. Nos restantes casos, há uma necessária mediatização entre
a Constituição formal e a legitimidade do órgão da Constituição, ou, por outras palavras
entre a legitimidade do poder constituinte material e a legitimidade do poder constituinte
formal.
Mesmo nos casos em que a ideia de Direito é de democracia pluralista, o órgão
encarregado de fazer a Constituição formal não goza de liberdade total, porquanto,
embora esse órgão não fique vinculado estritamente a um determinado e único sistema de
direitos fundamentais, de organização económica, de organização política, ou de garantia
da constitucionalidade, está sujeito a um limite que se traduz na necessidade de coerência

1
Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo I, 7.a Edição, Coimbra Editora, 2003, Pág. 332:
“Das proclamações (...) do Programa do Movimento das Forças Armadas logo constou o anúncio público
da convocação (...) de uma Assembleia Nacional Constituinte, eleita por sufrágio universal, directo e
secreto, segundo lei eleitoral a elaborar pelo futuro Governo Provisório.”.

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com o princípio democrático e da sua preservação. Não pode, em consequência, aprovar
uma Constituição que se desvie do princípio democrático.
A vinculação necessária do órgão do poder constituinte formal ao poder
constituinte material não dispensa a elaboração da Constituição formal nem reduz a sua
importância, pelas seguintes razões:
a) Na era da civilização da lei escrita e do constitucionalismo, não se pode
considerar que a vida colectiva esteja regulada juridicamente pelo facto de existir apenas
uma ideia de Direito ou um conjunto de princípios, porque o estatuto jurídico do Estado
exige sempre uma Constituição formal.
b) A ideia de Direito, esteja ou não definida de forma mais ou menos clara, carece
sempre de ser interpretada, concretizada e convertida em regras de comportamento e de
relação entre o Estado e os cidadãos e entre os futuros órgãos do poder político, e estas
regras compõem a Constituição formal.
c) Até a decretação da Constituição formal, os órgãos de poder são provisórios ou
transitórios e a validade ou eficácia dos actos de decisão política praticados por esses
órgãos está condicionada a futura confirmação ou convalidação.
d) O Direito ordinário criado entre o momento da ruptura da ordem anterior e o da
entrada em vigor da nova Constituição formal – porque está ou se pressupõe que está de
acordo com a nova ideia de Direito – não pode ser submetido a tratamento igual ao do
Direito criado no regime precedente, não obstante somente a nova Constituição é que
representa o novo fundamento do ordenamento jurídico.
e) O poder constituinte ou a soberania do Estado não se manifesta apenas no
momento inicial ou no primeiro acto do processo constituinte, nem apenas momento final
de decretação da Constituição formal. Esse poder manifesta-se na conexão de todos os
actos constituintes e no conjunto de todos os órgãos que intervêm nos mesmos.
Do exposto resulta que o poder constituinte material – poder de auto-organização
e de auto-regulação do Estado segundo uma certa ideia de Direito – e o poder constituinte
formal – poder de decretação de normas com a forma e força jurídica próprias das normas
constitucionais – representam duas faces da mesma realidade, ou dois momentos que se
sucedem e complementam.

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Trata-se, pois, de um mesmo poder constituinte que, no primeiro momento, é
somente material e que, no segundo momento, é, ao mesmo tempo, material e formal.

Assim, a relação entre o poder constituinte material e o poder constituinte formal


pode ser definida da seguinte forma:
a) O poder constituinte material precede o poder constituinte formal do ponto de
vista lógico e cronológico ou histórico.
 Precede-o logicamente, porque a ideia de Direito precede a regra de
Direito, a legitimidade precede a legalidade.
 Precede-o cronologicamente, porque o processo constituinte se desdobra
sempre em dois tempos. O primeiro em que se verifica o triunfo de certa
ideia de Direito ou o nascimento de certo regime político e segundo em
que se formaliza essa ideia de Direito ou esse regime político.
b) O poder constituinte material envolve o poder constituinte formal, porquanto:
 Da mesma forma que a Constituição formal contém uma referência
matéria, o poder constituinte formal cria um conteúdo materialmente
valorável.
 O poder constituinte formal complementa e especifica a ideia de
Direito, e através dele se declara e se firma a legitimidade em que se
baseia a nova ordem constitucional.
c) O Poder Constituinte formal confere estabilidade e garantia de permanência e
de supremacia hierárquica ou sistemática ao princípio normativo inerente à Constituição
material.
 Confere estabilidade, porque a certeza do Direito exige o estatuto da
regra.
 Confere garantia, porque apenas a Constituição formal protege o poder
constituinte material – ou o resultado da sua acção – contra as
vicissitudes da legislação ordinária e da prática quotidiana do Estado e
das forças políticas.

22
2. O poder constituinte material originário
O poder constituinte material (na sua expressão inicial e mais elevada de poder de
auto-ordenação) caracteriza-se por ser de exercício raro, contudo permanece latente em
toda a existência do Estado e predisposto a emergir a actualizar-se em qualquer momento.
Com efeito, uma comunidade política só adopta uma nova Constituição em
momentos de viragem histórica nos quais é possível ou se impõe escolher um novo rumo.
Tais momentos especiais não podem ser previstos nem catalogados a prior, sendo
apenas possível apontar os seus resultados típicos:

a) Formação de um novo Estado como resultado de:


 Passagem a Estado de colectividade preexistente.
 Vicissitudes do Estado em que uma colectividade pré existente esteja
integrada (desmembramento, secessão ou agregação com outros
Estados).
b) Restauração da existência do Estado (em condições semelhantes às da sua
anterior existência) ou restauração da efectividade da soberania (a seguir a uma ocupação
do território).
c) Transformação do Estado no confronto com outros Estado em virtude de:
 Modificação da soberania (sujeição ao regime de protectorado, ou a
sua cessação, incorporação ou desincorporação de confederação).
 Perda ou aquisição de soberania internacional (integração em Estado
federal ou união real ou secessão).
 Alargamento ou diminuição significativa da comunidade ou do
território.
A formação de um novo Estado, seja qual for a sua causa, nunca é um facto
natural ou extrajurídico. A formação do Estado de per si um acto jurídico, porquanto:
a) Sempre apela para um princípio jurídico que o justifique (por exemplo o
princípio da autodeterminação dos povos).
b) Implica sempre uma concepção de Direito dominante (por exemplo a
concepção do Direito natural), ou uma vontade de Direito inovatória.

23
A formação ou o nascimento de um Estado coincide com a sua primeira
Constituição, porque é nela onde serão expressar as representações particulares do
conceito de Estado.
A constituição mais originária do Estado é a do seu nascimento, porque é ela que
configura, de modo concreto, o povo, o território e o poder político do Estado e chama a
si a ideia de Direito dominante no meio social.
No entanto, a afirmação anterior já não é válida quando se trata de transformação
da soberania ou do território, na medida em que, neste caso, prevalece sempre o
princípio da continuidade do Estado. Mesmo assim, a nova fase histórica do Estado
que decorre da transformação de seus elementos tem de apoiar-se numa ideia ou num
projecto que qualifique a alteração ocorrida.
Na formação, na restauração ou na transformação do Estado o conteúdo da nova
ideia de Direito não é separável do próprio poder político em si, mas na mudança de
regime ocorre a substituição da ideia de Direito. Por isso, a mudança de regime associa-se
mais ao fenómeno de sucessão de regimes políticos do que às vicissitudes do Estado.
Tendo em conta o seu grau de profundidade, a mudança de regime pode equivaler
à destruição ou à supressão:
a) Destruição quando a mudança de regime implica o desaparecimento tanto a
Constituição como o poder Constituinte em que se baseava.
b) Supressão quando na mudança de regime implica apenas o desaparecimento
da Constituição, mas permanecendo o poder constituinte.
A mudança de regime político tem revestido frequentemente os seguintes
modalidades de revolução ou de transição constitucional:
a) Revolução – foi considerada, até aos séculos XII e XIII, principalmente na
óptica do direito de resistência colectiva ou rebelião; como uma forma extrema de
resistência contra os governantes.
A partir dessa época, e sobretudo por causa da Revolução francesa de 1789, a
revolução passou a ser encarada não como uma mera substituição de um governo por
outro mas principalmente como criação duma nova ordem e este facto tem a ver com a
prevalência de formas modernas de legitimidade legal racional sobre as formas
anteriores de legitimidade tradicional.

24
Mais tarde, a Ciência do Direito veio a reconhecer na revolução um fenómeno
constituinte (gerador de Constituição) ou um acto normativo objecto de estudo ex
professo.
Com efeito, a revolução não é triunfo da violência, mas sim o triunfo de um
Direito diferente ou de um diverso fundamento de validade do sistema jurídico positivo
do Estado. A revolução não é antijurídica, é apenas anticonstitucional por oposição à
anterior Constituição e não em face da Constituição que com ela vai surgir.
A ruptura com o ordenamento jurídico em vigor só é possível pela presença de
novos valores, princípios e critérios que afectando os anteriores vêm legitimar o acto
revolucionário e desencadear efeitos normativos múltiplos e extensos e susceptíveis de
adquirir uma dinâmica própria.
A revolução pode assumir uma das duas formas:
 Golpe de Estado quando o seu autor é um governante em funções (um
titular do poder constituído que usurpa o poder constituinte).
 Insurreição ou revolução stricto sensu quando o seu autor é um
grupo ou movimento vindo de fora dos poderes constituídos.
Em qualquer das hipóteses e independentemente dos respectivos objectivos
políticos ou políticos e sociais, a revolução rompe a ordem constitucional para a refazer
de imediato, fundando de novo o sistema jurídico estadual.
b) Transição constitucional (passagem sem ruptura, mudança na continuidade ou
reforma política stricto sensu) distingue-se da revolução pelo seguinte:
 Na revolução verifica-se uma necessária sucessão de Constituições – material
e formal – , pois a ruptura com o regime anterior determina logo o nascimento
de uma nova Constituição material, seguida, a médio ou a longo prazo, de
uma Constituição formal.
 Na transição constitucional ocorre sempre um dualismo, na medida em que,
enquanto se prepara a nova Constituição formal subsiste a anterior a termo
resolutivo.
 Na transição constitucional pode acontecer que mesmo órgão funcione
simultaneamente como órgão do poder constituído à luz da Constituição

25
vigente e como órgão de poder constituinte para a constituição que vai
substituir a anterior.
 A transição constitucional pode ocorrer por via da revisão constitucional e
nela observam-se as competências e as formas de agir instituídas

4. Constituição e soberania do Estado


Quando um Estado surge de novo, é restaurado, ou sofre uma transformação
radical da sua estrutura, aparece dotado duma Constituição. Esta pode ser uma
Constituição material a que se segue uma Constituição formal ou uma Constituição
material já acompanhada de Constituição formal.
A referida Constituição material exprime, directa e imediatamente, a soberania
que o Estado assume ou reassume nesse momento. Contudo no caso em que a
Constituição material e a Constituição formal surgem ao mesmo tempo, a Constituição
formal pode corresponder a uma de três hipóteses:
a) Constituição decretada pelos novos órgão estatais que pode ser provisória ou
definitiva.
Constituição coincidente no essencial com a Constituição da comunidade política
pré-existente (colónia autónoma, território sob mandato ou tutela).
c) Constituição dimanada de entidade externa (outro Estado ou Organização
Internacional) e destinada a vigorar com o acesso à soberania (ou à independência) do
novo Estado – heteroconstituição. São exemplos algumas Constituições ou as primeiras
Constituições dos países da Commonwealth aprovadas por lei do parlamento britânico,
nomeadamente Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Jamaica e Maurícias.
Uma heteroconstituição tem como título de legitimidade, desde o momento da
aquisição da soberania, não a autoridade que a elaborou mas sim a soberania do novo
Estado. Até a independência o fundamento de validade da Constituição estava na ordem
jurídica donde proveio, mas com a independência esse fundamento transfere-se para a
ordem jurídica local que passa a estar investida de poder constituinte.

26
5. Do poder Constituinte material ao poder constituinte formal
Não costumam ser frequentes as situações em que as Constituições material e
formal surgem em simultâneo. As situações mais frequentes são aquelas em que, a seguir
ao exercício do poder constituinte material, se abra um processo complexo e longo
tendente a preparação e a redacção do texto da Constituição formal.
Este processo não decorre de modo arbitrário, ele carece de ser regulamentado.
No caso da revolução e devido a ruptura que se verifica, tal processo implica
ainda uma organização provisória do Estado até a entrada de funcionamento dos órgãos a
serem instituídos pela futura Constituição formal.
Ao conjunto de normas que tem a dupla finalidade de definir do regime de
elaboração e aprovação da Constituição formal e de estruturar o poder político no
interregno constitucional chama-se pré-Constituição ou Constituição provisória ou
ainda Constituição revolucionária.
As normas da Constituição provisória, em virtude da sua função, adquirem valor
reforçado em confronto com as outras normas, não podendo ser alteradas ou derrogadas
por normas posteriores que não tenham valor idêntico.
A Constituição provisória contrapõe-se à Constituição definitiva ou de duração
indefinida para o futuro, como pretende ser a Constituição que é produto final do
processo constituinte.
A Constituição provisória deve, igualmente, distinguir-se do fenómeno da
entrada em vigor provisoriamente de determinados princípios ou normas constitucionais
formadas durante o processo constituinte e deve distinguir-se também da subsistência
provisória de normas constitucionais anteriores não contrárias aos novos princípios
constitucionais.
É exemplo recente de pré-Constituição a Constituição provisória da África do Sul
aprovada no World Trade Centre, em 1993, no culminar de negociações que envolveram
todos os partidos políticos sul africanos desde 1991. A Constituição definitiva da África
do Sul veio a ser aprovada em 1996 e teve de ser confrontada com a Constituição
provisória pelo Tribunal Constitucional.

27
6. Os tipos de actos constituintes

Factores determinantes da variação do processo Constituinte:


a) Forma de Estado (unitária ou federal).
b) Tipo de legitimidade que pode ser:
 Legitimidade democrática
 Pluralista
 Totalitária.
 Representativa (apenas)
 Representativa com variável semidirecta.
 Legitimidade monárquica

Os diversos tipos de actos constituintes


Atendendo aos factores retromenciados, os actos do processo constituinte podem
revestir os seguintes tipos:
a) Actos constituintes unilaterais singulares quando resultam de um único
órgão ou sujeito.
b) Actos Constituintes unilaterais plurais quando consistem na soma ou
resultam de actos parcelares provenientes de dois ou mais órgãos da
mesma entidade titular do poder constituinte.
c) Actos constituintes bilaterais ou plurais quando resultam dum acordo de
vontades entre dois ou mais sujeitos ou entidades.

Actos constituintes unilaterais singulares


Os actos constituintes unilaterais singulares verificam-se em Estado unitário ou
em Estado federal fictício (ou unitário de estrutura federal) e assentam ora no princípio de
legitimidade monárquica ora no princípio de legitimidade democrática (com ou sem
pluralismo).

28
Os actos deste tipo poder revestir as seguintes formas:

a) Outorga da Constituição pelo monarca (França em 1814 e Portugal em


1826).
b) Decreto do Presidente da República ou de outro órgão do poder executivo
(Brasil em 1937).
c) Acto de autoridade revolucionária ou de autoridade constitutiva do Estado
(Moçambique e Angola em 1975).
d) Aprovação por assembleia legislativa ordinária ou comum dotada de
poderes para o efeito (URSS em 1977).
e) Aprovação por assembleia formada especificamente (mas não
necessariamente apenas) para esse efeito, chamada assembleia
constituinte (Portugal em 1976).
f) Aprovação por assembleia eleita simultaneamente como assembleia
constituinte e como assembleia ordinária (Brasil em 1988).

Actos constituintes unilaterais plurais


Os actos constituintes unilaterais plurais verificam-se também em Estado
unitário, assentam todos na legitimidade democrática (com mais ou menos pluralismo),
combinando, de certa maneira, institutos representativos e de democracia directa ou
semidirecta.
Este tipo de actos pode assumir as seguintes formas:
a) Aprovação por referendo, prévio ou simultâneo da eleição da assembleia
constituinte, de um ou vários princípios ou opções constitucionais e, a
seguir, a elaboração da Constituição de acordo com o sentido da votação
(Grécia em 1974 aquando da decisão sobre monarquia ou república).
b) A definição por assembleia representativa ordinária dos grandes
princípios, a elaboração de projecto de constituição pelo Governo e a
aprovação final por referendo (França em 1958).
c) A elaboração por assembleia constituinte, seguida de referendo (França
em 1946 e Espanha em 1978).

29
d) A elaboração por órgão provindo da Constituição anterior, com
subsequente aprovação popular (França em 1799, 1801 e 1804).
e) A elaboração por autoridade revolucionária ou órgão legitimado pela
revolução, seguido de referendo (Portugal em 1933, Cuba em 1976, Chile
em 1980, Turquia em 1982).

Actos constitucionais bilaterais ou plurilaterais


Os actos constitucionais bilaterais ou plurilaterais verificam-se em Estado
composto, designadamente, o Estado federal e compreendem as seguintes formas:
a) A elaboração e a aprovação da Constituição por assembleia representativa,
com a sujeição à sanção do monarca (Noruega em 1814, França em 1830 e
Portugal em 1838).
b) Aprovação da Constituição por assembleia representativa, seguida de
rectificação pelos Estados componentes da União (Estados Unidos da
América em 1787).

As constituições aprovadas nestas condições são pactícias, na medida em que


implicam, no primeiro caso, um pacto entre a assembleia (ou o povo) e o Rei ou entre o
órgão (ou poder federal) e os Estados-membros da união, no segundo caso.

7. Os limites materiais do poder constituinte


O poder constituinte é logicamente anterior e superior aos poderes constituídos (o
legislativo, o executivo e o judicial).
Os poderes constituídos são enquadrados pela Constituição quer formal quer
materialmente.
Enquadra-os formalmente porquanto esses poderes não podem ser exercidos fora
do âmbito da Constituição.
Enquadra-os materialmente porque as decisões e as normas que resultam desse
exercício não podem contrariar o sentido normativo da Constituição.

30
Contudo, o poder constituinte não equivale a um poder soberano absoluto nem
equivale à capacidade de dar à Constituição todo e qualquer conteúdo, sem atender a
quaisquer princípios, valores e condições.
O poder constituinte está sujeito a limites materiais que podem ser:
transcendentes, imanentes e, em certos casos, heterónomos.
a) Limites transcendentes (dirigidos tanto ao poder constituinte quanto ao
poder constituinte formal) são os que, precedendo e impondo-se à vontade
do Estado (ou do povo em poder constituinte democrático) e demarcando
a sua esfera de intervenção, provém de imperativos do Direito natural, de
valores éticos superiores ou de uma consciência jurídica colectiva. Entre
os limites transcendentes destacam-se os que se prendem com os direitos
fundamentais imediatamente conexos com a dignidade da pessoa humana
(v.g. o direito à vida e à integridade física e moral, a liberdade pessoal, a
liberdade de crenças, a igualdade perante a lei).
b) Limites imanentes (específicos do poder constituinte formal) estão
ligados à configuração do Estado à luz do poder constituinte material e
compreendem os limites que se reportam à soberania do Estado e, por
vezes, à forma de Estado, assim como os limites concernentes à
legitimidade política em concreto.
c) Limites hetrónomos (dirigidos tanto ao poder constituinte material como
ao poder constituinte formal) são os provenientes da conjugação com
outros ordenamentos jurídicos.
 Limites heterónomos de Direito internacional – referem-se a
princípios, regras ou actos de Direito internacional, donde resultem
obrigações para todos os Estados ou para certo Estado.
 Limites heterónomos de Direito interno – referem-se a regras de
Direito interno, quando o Estado seja composto ou complexo e, por
conseguinte, tenha de ser complexo o seu ordenamento jurídico.

Fonte: Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo II, Almedina,


Coimbra Editora, 2003.

31
TEMA V- MODIFICAÇÃO E SUBSISTÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO

1. As modificações constitucionais em geral

1.1. Modificabilidade e modificações da Constituição.


Normalmente as Constituições são feitas com a pretensão de serem definitivas,
isto é, sem duração prefixada. Contudo, qualquer Constituição está sujeita a modificações
durante a sua vigência.
As modificações visam:
 adaptar a constituição às circunstâncias e aos novos tempos
 acorrer a exigência de solução de problemas que podem nascer até da
aplicação da própria Constituição.
São, de entre outros factores que ditam a modificação das Constituições:
 a tensão entre a Constituição e a realidade constitucional
 a necessidade de efectividade.
Fica, assim, assente que a modificação das Constituições, ainda que variável
quanto à frequência, extensão e o modo como se processa, é um fenómeno inevitável da
vida jurídica.
Uma maior flexibilidade interna da Constituição pode ser condição da sua maior
perdurabilidade e de sujeição a modificações menos extensas e menos graves.
Mas os factores decisivos da perdurabilidade e do grau das modificações da
Constituição são:
 a estabilidade ou a instabilidade política e social dominante no país;
 o grau de institucionalização da vida colectiva que se verifica no país;
 a cultura político-constitucional;
 a capacidade de evolução do regime político.

32
1.2. Modificações da Constituição e vicissitudes constitucionais

1.2.1. Vicissitudes constitucionais


Entende-se por vicissitudes constitucionais quaisquer eventos ou
acontecimentos que se projectem sobre a subsistência da Constituição ou de algumas
das suas normas.
As vicissitudes constitucionais podem ser classificadas segundo cinco
critérios:
a) O modo como se produzem
 Vicissitudes expressas – a modificação constitucional produz-se
como resultado de acto a ele especificamente dirigido. Aqui fica
alterado o texto da norma constitucional.
 Vicissitudes Tácitas – a modificação constitucional é um resultado
indirecto, uma consequência que se extrai a posteriori de um facto
normativo historicamente localizado. Aqui o texto permanece,
modificando-se apenas o conteúdo da norma.

b) O objecto, isto é, as normas constitucionais afectadas.


 Vicissitudes totais - atingem a Constituição como um todo, afectando
todas as normas constitucionais ou os princípios fundamentais da
Constituição.
 Vicissitudes parciais - atingem apenas parte da Constituição e nunca
os princípios definidores da ideia de Direito que a caracteriza.

c) O alcance, isto é, situações da vida e os destinatários das normas


constitucionais postos em causa pelas vicissitudes.
 Vicissitudes de alcance geral e abstracto - afectam todas as situações
de idêntica ou semelhante configuração e todos e quaisquer
destinatários que nelas se encontrem.

33
 Vicissitudes de alcance concreto ou excepcional- afectam situações
concretas, verificadas ou a verificar-se e alguns dos destinatários
possíveis abrangidos pelas normas.

d) As consequências sobre a ordem constitucional


 Vicissitudes que não colidem com a integridade da ordem
constitucional e sobretudo com a sua continuidade e que
correspondem a uma evolução constitucional.
 Vicissitudes que colidem com a integridade da ordem
constitucional e que correspondem a uma quebra de continuidade, a
uma ruptura.

e) A duração dos efeitos


 Vicissitudes de efeitos temporários – suspensões da Constituição lato
sensu.
 Vicissitudes de efeitos definitivos - todas menos a suspensão parcial
da Constituição.

1.2.2. Os diversos tipos de vicissitudes constitucionais

a) Revisão constitucional (revisão em sentido próprio) - é a


modificação da Constituição expressa, parcial, de alcance geral e abstracto e,
por natureza, a que traduz mais imediatamente um princípio de continuidade
institucional.
A revisão constitucional visa:
 A auto-regeneração e auto - conservação, isto é, a eliminação das
normas da Constituição que já não se justificam do ponto de vista
político, social e jurídico.
 A adição de elementos novos que revitalizam a Constituição e, as
vezes, consagração de normas preexistentes a título de costume
constitucional ou de lei ordinária.

34
A revisão constitucional é a modificação da Constituição nos termos
nela própria previstos, ou, na falta de estatuição expressa sobre o processo, nos
termos que decorram do sistema de órgãos e actos jurídico-constitucionais.
A revisão constitucional pode operar-se tanto através da inserção da
modificação directamente no próprio texto constitucional ou através da
aprovação, para o efeito, de uma lei constitucional autónoma.
A revisão constitucional propriamente dita é normalmente uma
modificação parcial. Nas hipóteses da chamada revisão total, trata-se
verdadeiramente de transição constitucional.
A revisão total, como verdadeira e própria revisão constitucional, só existe
quando se pretende renovar um texto constitucional na totalidade sem a mudança
dos princípios fundamentais que o enformam.
A revisão total só pode de ser da Constituição instrumental e não da
Constituição material.

b) Derrogação da Constituição (ou quebra ou ruptura material) – aproxima-se


da revisão constitucional e com ela pode agrupar-se um conceito de revisão lato sensu ou
de reforma constitucional, na medida em que, mais frequentemente, se opera através de
um processo idêntico ao da revisão strito sensu.
O resultado da derrogação diverge com o da revisão constitucional, porque
consiste na adição não de uma norma geral e abstracta mas de uma norma geral e
concreta e, por vezes, de uma pretensa norma individual.
A derrogação determina uma excepção, temporária, ou pretensamente definitiva,
em face do princípio ou da regra constitucional.
A derrogação é a violação, a título excepcional de uma prescrição legal-
constitucional para um ou vários casos concretos, quando isso é permitido por uma lei
constitucional, ou resulta de um processo prescrito para as modificações da Constituição.
É a modificação da Constituição levada a cabo por meio de processo de revisão que se
traduz na excepção a um princípio constitucional ou na regulamentação de um caso
concreto.

35
As normas constitucionais derrogatórias de princípios constitucionais podem ser
criadas:
 Por via de revisão ou por via de acto análogo
 Pelo poder constituinte originário (auto-rupturas constitucionais, segundo
certos autores).
No entanto a legitimidade das normas constitucionais derrogatórias tem sido
contestada, por se considerar que a sua admissibilidade incontrolada pode descambar em
manipulações constitucionais conducentes a um conglomerado de rupturas que se podem
traduzir numa outra Constituição substancialmente diferente da Constituição desenhada
pelo poder constituinte.

A posição de Jorge Miranda relativamente às normas constitucionais excepcionais


é a seguinte:
 O problema das derrogações originárias se reconduz ao problema das normas
constitucionais inconstitucionais;
 As derrogações supervenientes de princípios fundamentais devem ser tidas
como inadmissíveis e inconstitucionais;
 As derrogações de regras que não sejam princípios fundamentais parecem
admissíveis.

c) As Modificações tácitas da Constituição


 O costume constitucional praeter e contra legem (vide matéria sobre as
fontes das normas constitucionais)

 A Interpretação evolutiva da Constituição


A interpretação da Constituição deve ser evolutiva, tendo em conta a necessidade
de adaptar o sentido das normas interpretadas a dinâmica da realidade na qual se
pretendem aplicar.
Mas a admissibilidade da interpretação evolutiva da Constituição não deve
legitimar a eliminação de normas constitucionais.

36
A interpretação evolutiva deve ser feita de forma que, preservando o espírito da
Constituição, se revitalize as suas normas.
A eliminação das normas constitucionais pode ocorrer, no limite, por virtude do
costume constitucional e não por virtude da actividade do intérprete.

 A revisão indirecta
É uma forma particular de interpretação sistemática e consiste no reflexo
sobre certa norma da modificação operada por revisão directa.
A revisão indirecta ocorre quando o sentido de uma norma não objecto de revisão
constitucional vem a ser alterado por virtude da sua interpretação sistemática e evolutiva
em face da nova norma constitucional ou da alteração ou da eliminação da norma
preexistente.

d) Vicissitudes constitucionais com ruptura na ordem jurídica


São as alterações constitucionais em sentido estrito e podem ser totais ou parciais.
 Revolução - É uma ruptura da ordem constitucional

 Ruptura não revolucionária (também designada por ruptura parcial)


Consiste na modificação da Constituição sem a observância das regras
constitucionais respectivas. É uma ruptura na ordem constitucional.
A ruptura não revolucionária não põe em causa a validade em geral da
Constituição; continua a reconhecer o princípio de legitimidade no qual assenta a
Constituição; apenas lhe introduz um limite ou o aplica de novo por forma originária.

f) A transição constitucional
É a passagem de uma constituição material a outra com observância das formas
constitucionais, sem ruptura.
Aqui muda a Constituição material mas permanece a constituição instrumental e,
eventualmente, a Constituição formal.
A transição constitucional pode ser operada através de:

37
 Processo de revisão e neste caso pode constar de preceitos constitucionais
expressos. Trata-se dos casos das Constituições que estabelecem um regime
de revisão dos seus princípios fundamentais.
 Processo geral de revisão constitucional, verificados certos requisitos para a
remoção de princípios fundamentais ou para a substituição de regime político.
É o que acontece quando pelo processo de revisão se arredam limites
materiais, explícitos ou implícitos, equivalentes a tais princípios.

g) Desenvolvimento constitucional
Ocorre através da combinação de várias vicissitudes como a interpretação
evolutiva da Constituição, revisão constitucional, e costume secundum, praeter e contra
legem.
O desenvolvimento constitucional não comporta a emergência de uma
Constituição diversa, apenas traz a reorientação do sentido da Constituição vigente.
h) Suspensão da Constituição
É a não vigência durante certo tempo de algumas normas constitucionais,
decretada por causa de certas circunstâncias.
A suspensão tem grande interesse no domínio dos direitos liberdades e garantias,
susceptíveis de serem suspensos, mas nunca na totalidade, por declaração do estado de
sítio, de emergência, ou de outras situações de excepção.

2. Rigidez e Flexibilidade Constitucionais


Tendo em conta a sua modificabilidade, as Constituições têm-se classificado em
rígidas e flexíveis.

i) Constituição rígida - a sua revisão exige a observância de uma forma


particular distinta da forma seguida para a elaboração das leis ordinárias.
ii) Constituição flexível - o processo da sua revisão é idênticos ao processo
da criação das leis ordinárias. A lei de revisão constitucional é aprovada
segundo um processo idêntico ao da aprovação da lei ordinária.

38
Uma Constituição cuja fonte é a lei, tanto pode ser rígida como pode ser flexível.
Uma Constituição consuetudinária é necessariamente flexível

A rigidez constitucional é corolário da adopção duma Constituição em sentido


formal, pois a força jurídica das normas constitucionais liga-se a um modo especial de
produção e as dificuldades postas a aprovação de uma nova norma constitucional impede
que a Constituição possa ser alterada em quaisquer circunstâncias, sob a pressão de certos
acontecimentos ou que possa ser afectada por oscilações ou invasões da situação política
Mas a faculdade formal de revisão se destina a impedir que a Constituição seja
flanqueada fora das regras que prescreve.
A rigidez nunca poderá ser tal que impossibilite a adaptação a novas exigências
políticas e sociais.

3. A revisão constitucional e o seu processo

3.1. Diversidade de formas de revisão constitucional

No geral as constituições regulam a sua própria revisão, contudo as formas de


revisão são múltiplas e variáveis.
Os mais importantes critérios de classificação das formas de revisão
constitucional são as seguintes:
a) A forma de Estado

 Estado simples – a revisão constitucional depende de um só aparelho


de órgãos, porque aqui existe só um aparelho de órgãos de soberania.
 Estado composto – a revisão implica a colaboração entre os órgãos
próprios do Estado Composto e os dos Estados componentes, os quais
possuem o direito de ratificação ou de veto quanto às modificações a
introduzir na Constituição.

39
b) A Expressão de legitimidade - A Constituição deve consagrar uma forma de
revisão de harmonia com a expressão de legitimidade que pode ser, por
exemplo, democrática, monárquica, ou a combinação de ambas.

c) Identidade entre os processos de criação primitiva e de revisão da


Constituição – o processo de revisão pode ou não ser idêntico ao primitivo
processo de criação da Constituição. Se é uma assembleia legislativa ordinária
a deter a faculdade de revisão, exerce-a, na maioria parte das vezes, com
maioria qualificada ou com outras especialidades.
É bastante rara a eleição duma assembleia ad hoc de revisão constitucional.
d) O sistema político – O modo de revisão reproduz o sistema político, sendo
diferente, nomeadamente em sistemas:

 Pluralista, com livre discussão e garantia da participação da oposição e


em sistema de partido único;
 Democrático e em sistema autocrático;
 De divisão de poderes e em sistema de concentração de poderes;
 De predominância de assembleia ou de chefe do Estado.

A intervenção dos parlamentos, seja para decretar a revisão, ou para desencadear o


respectivo processo ou para propor a outro órgão é uma constante.
A intervenção do chefe do Estado é mais intensa em monarquia (sanção real da lei de
revisão) do que em república.

e) Democracias representativas – a revisão é feita por um órgão representativo,


uma assembleia política representativa que pode ser uma assembleia em funções ao
tempo da iniciativa do processo de revisão ou uma assembleia especial.

f) O tempo de revisão – a revisão pode ser feita a todo o tempo, verificados


determinados requisitos ou apenas em um certo tempo.

40
g) Limites circunstanciais – impossibilidade de revisão da Constituição em
situações de necessidade correspondentes ou não a declaração de Estado de sítio ou de
emergência ou noutras circunstâncias excepcionais.

e) A iniciativa - normalmente a iniciativa cabe ao órgão com competência para


fazer a lei de revisão ou a quaisquer dos seus membros.
f) Forma - regra geral a revisão está sujeita a uma forma imperativa tem de se
enquadrar em determinada tramitação fixa. Mas pode a Constituição prever
mais de uma forma em razão da iniciativa ou oferecer ao órgão competente
para desencadear o processo a escolha entre mais de um processo.

Bibliografia: Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo II.

41
ISCTEM
DIREITO CONSTITUCIONAL I

TEMA V- MODIFICAÇÃO E SUBSISTÊNCIA DA CONSTITUIÇÃO


(Continuação)

3.2. Principais formas de revisão constitucional no âmbito da legitimidade


democrática

Nos Estados onde impera a legitimidade democrática as formas de revisão


constitucional podem ser resumidas da seguinte forma:
3.2.1. Revisão por processo apenas de democracia representativa
a) Por assembleia ordinária
 Segundo processo legislativo comum
 Segundo processo legislativo especial
 Renovada para efeito de revisão
b) Por assembleia especial
3.2.2. Revisão por processos de democracia representativa e de democracia
semi-directa, cumullativamente.
a) Por votação em assembleia representativa, com referendo possível.
b) Por votação em assembleia representativa, seguida de referendo
necessário.

4. Sistemas de revisão em Direito comparado


O estudo comparativo de Constituições (vigentes e não vigentes) de vários países
permite estabelecer oito principais sistemas de revisão constitucional.
4.1. Revisão pela assembleia ordinária, segundo o processo legislativo ordinário.
4.2. Revisão pela assembleia ordinária, com a maioria idêntica à requerida para a
aprovação das leis ordinárias, mas com especialidade de outra ordem (v.g. o tempo, a
iniciativa de revisão).

42
4.3. Revisão pela assembleia ordinária com maioria qualificada (vg. de dois terços
ou mais de todos os deputados).
4.4. Revisão pela assembleia ordinária, renovada após eleições gerais
subsequentes a uma deliberação ou decisão de abertura do processo de revisão, e com ou
sem maioria qualificada.
4.5. Revisão por assembleia ad hoc, isto é, por assembleia eleita especialmente e
só para fazer revisão, a qual se pode designar de Convenção.
4.6. Revisão por assembleia ordinária (ou, eventualmente, por assembleia de
revisão) susceptível de sujeição a referendo.
4.7. Revisão por referendo que incide sobre o projecto elaborado pela assembleia
ordinária ou sobre a lei de revisão carecida de sanção popular.
4.8. Revisão peculiar das Constituições federais, em que acresce à deliberação
pelos órgãos do Estado federal a participação dos estados federados, por via
representativa ou de democracia semidirecta, a título de ratificação ou de veto resolutivo.

O primeiro sistema corresponde às Constituições flexíveis e os restantes às


Constituições rígidas.
Em princípio, a cada Constituição corresponde um sistema de revisão, contudo
pode verificar-se que uma mesma Constituição consagre mais de um sistema em razão do
objecto, ou seja uma forma menos agravada para a revisão de certo tipo de normas e uma
forma mais agravada para a revisão de outro tipo de normas.

5. Requisitos de qualificação da revisão constitucional


Para que um determinado acto jurídico seja considerado como de revisão
constitucional é imprescindível que o mesmo contenha os elementos específicos da
revisão, os quais são estabelecidos expressamente pelas Constituições.
Reportando-nos à nossa Lei Fundamental, podemos descortinar os seguintes
elementos que os actos de revisão constitucional devem preencher:
a) A intenção ou causa da revisão – para que haja revisão constitucional
tem de se manifestar a intenção ou finalidade de substituir ou aditar
normas formalmente constitucionais (art. 296, n.º 1 CRM).

43
b) O órgão competente – compete exclusivamente à Assembleia da
República aprovar leis de revisão constitucional, estando afastada a
hipótese de revisão por Decreto-Lei do Governo (art. 179, n.º 2, al. a)
CRM).
c) O tempo de revisão ou a competência em razão do tempo – a Assembleia
da República só pode exercer o poder de revisão constitucional decorrido
o prazo de cinco anos sobre a entrada em vigor da última lei de revisão,
salvo assunção de poderes extraordinários de revisão aprovada por maioria
de três quartos dos deputados em efectividade de funções (art. 293 CRM).
d) A normalidade constitucional – a Assembleia da República não pode
aprovar qualquer alteração da Constituição durante o período da vacatura
do cargo de presidente da República (art. 157, n.º 1 CRM), assim como
durante a vigência do estado de sítio ou de emergência (art. 294 CRM).
e) A maioria de revisão – as alterações da Constituição têm de ser
aprovadas por maioria de dois terços dos deputados da Assembleia da
República (art. 295, n.º 1 CRM).
Os elementos acima descritos são verdadeiros requisitos de qualificação da
revisão constitucional, consequentemente, a sua falta torna o acto juridicamente
inexistente como lei de revisão.

6. Limites materiais da revisão Constitucional

Algumas Constituições, além de definir as formalidades da revisão constitucional,


dispõem expressamente quanto ao conteúdo da revisão, limitando a liberdade dos órgãos
competentes relativamente à modificação de certas matérias constitucionais. Nisto
consistem os limites matérias da revisão constitucional.
O conteúdo destes limites variam é muito variável consoante a variedade das
Constituições, podendo incidir, nomeadamente, sobre a independência e a soberania do
Estado, a unidade e a integridade do território, a forma do Estado, a forma e o sistema de
governo, o princípio da separação de poderes, o princípio democrático, o princípio do
Estado de Direito, os direitos liberdades e garantias fundamentais dos cidadãos.

44
Independentemente da sua variedade, todos os limites materiais de revisão
constitucional visam salvaguardar certos princípios fundamentais em face do poder de
revisão.
As Constituições moçambicanas de 1975 e de 1990 não estabeleciam
expressamente limites matérias de revisão constitucional. No entanto, há que observar
que a doutrina e a jurisprudência têm sustentado a existência, em qualquer Constituição,
de limites materiais implícitos decorrentes de princípios constitucionais, do sistema
político e da forma de governo consagrados na Constituição.
A Constituição de 2004, diferentemente das Constituições que a precederam,
consagra no art. 292, n.º 1, uma longa lista de matérias que devem ser respeitadas pelo
poder de revisão constitucional. Note-se que

45
TEMA VI - ESTRUTURA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

1. Os princípios e a sua função ordenadora

No senso comum, quando se fala em Direito, a ideia que logo aparece relaciona-se com
os diplomas normativos (v.g. as leis, os decretos os regulamentos). No entanto, a nossa
experiência mostra que tais diplomas normativos são constantemente aprovados,
publicados e revogados pelos órgãos competentes do poder e, consequentemente não
pode, de forma isolada, justificarem a permanência, a coerência e a consistência do
ordenamento jurídico.

Existe algo de específico e de permanente no sistema jurídico que permite explicar e


fundar a validade e a efectividade de todas e cada uma das suas normas.

O Direito não é mero somatório de regras avulsas, produto de actos de vontade ou mera
concatenação de fórmulas verbais articuladas entre si.

O Direito é ordenamento ou conjunto significativo e não conjunção resultante de vigência


simultânea.

O Direito implica coerência, consistência e projecta-se em sistema.

O direito é unidade de sentido, é valor incorporado em regra

Esse ordenamento, esse conjunto, essa unidade, esse valor projecta-se ou traduz-se em
princípios, logicamente anteriores aos preceitos.
Os princípios são parte integrante do Direito; fazem parte do ordenamento jurídico.

46
Os princípios não se contrapõem às normas; contrapõem-se aos preceitos

As normas é que se dividem em normas - princípios e em normas – disposições

A Função ordenadora dos princípios

A função ordenadora dos princípios revela-se:

i) Em momentos revolucionários (particularmente nítida e forte) onde a


mudança incide directa e principalmente nos princípios nos quais se traduz a
nova ideia de Direito.

ii) Em momentos de normalidade estabilidade institucional

a) Acção imediata: enquanto directamente aplicáveis ou directamente


capazes de conformarem as relações político-constitucionais.

b) Acção mediata (nos planos interpretativo, integrativo e prospectivo)

 Critérios de interpretação: a interpretação dos preceitos


constitucionais deve ser feita necessariamente em conjugação com
os princípios constitucionais.
 Critérios de integração: a integração das lacunas da Constituição
deve ser feita de modo a explicitar as normas que o legislador
constituinte não quis ou não pôde exprimir cabalmente.
 Elementos de construção e qualificação: os conceitos básicos de
estruturação do sistema constitucional aparecem estreitamente

47
conexos com os princípios constitucionais ou através da
prescrição de princípios.
 Função prospectiva, dinamizadora e transformadora: pela sua
maior generalidade ou indeterminação, admitem concretizações,
densificações e realizações variáveis alicerçando a interpretação
evolutiva.
 prospectivo

Classificação de princípios constitucionais

Segundo G. Canotilho

i. Princípios jurídicos fundamentais:


princípios fundamentais historicamente objectivados e progressivamente
introduzidos na consciência jurídica geral e que encontra uma recepção
expressa ou implícita no texto constitucional.
ii. Princípios políticos constitucionalmente conformadores
Princípios constitucionais que explicitam as valorações políticas fundamentais
do legislador constituinte
iii. Princípios constitucionais impositivos
Princípios que, no âmbito da Constituição dirigente, impõem aos órgãos do
Estado, maxime o legislativo, a realização de fins e a execução de tarefas.
iv. Princípios-garantia
Princípios que estabelecem garantias directas para os cidadãos.

Segundo J. Miranda

i. Princípios constitucionais substantivos (válidos por si mesmos, reflectem os


valores básicos a que adere a Constituição material)

48
a) Princípios axiológicos fundamentais (correspondentes aos limites
transcendentes do poder constituinte): proibição da discriminação,
inviolabilidade da vida humana, integridade moral e física das pessos, a
liberdade de religião e de convições, a não retroatividade da lei penal
incriminadora, a dignidade social e do trabalho, o direito de defesa dos
acusados.

b) Princípios político-constitucionais (correspondem aos princípios


imanentes do poder constituinte e aos limites específicos de revisão
constitucional): reflectem as grandes marcas e direcções caracterizadoras
de cada Constituição material diante das demsis (princípios democrático;
princípio representativo; princípio republicano; princípio da
constitucionalidade; princípio da separação do poder).

ii. Princípios constitucionais adjectivos ou instrumentais (sobretudo de alcance


técnico e complementares dos primeiros) – Princípio da publicidade das
normas jurídicas; princípio da fixação das competências dos órgãos
constitucionais pela norma constitucional; princípio da tipicidade das formas
das normas.

A sede dos Princípios

Os Preâmbulos Constitucionais

Classificação das disposições constitucionais

Classificação das disposições jurídicas em geral (também aplicável às disposições


constitucionais)

49
Quanto ao objecto ou conteúdo

i. Normas de regulamentação e normas técnicas


 possuem um sentido específico de regulamentação

 dão enquadramento técnico legislativo às normas de regulamentação (ex.


as definições legais e as regras de qualificação).

ii. Normas autónomas e normas não autónomas

 Possuem um sentido completo e valem por si (contém todos os elementos de


uma norma jurídica)
 Não possuem um sentido completo, valem apenas integradas ou conjugadas
com outras (falta-lhes a previsão e a estatuição).

iii. Normas prescritivas e normas proibitivas (imperativas ou injuntivas) VS


Normas Permissivas
 Prescritivas - prescrevem um determinado acto ou comportamento
 Proibitivas: Vedam um determinado acto ou comportamento.

iv. Normas primárias e normas secundárias ou sancionatórias

 Primárias –dispõem sobre as relações e as situações da vida


 Primárias – estabelecem garantias do cumprimento das normas primárias,
nomeadamente sanções.

v. Normas inovadoras e normas interpretativas


 Inovadoras - introduzem uma modificação na ordem jurídica
 Interpretativas – definem o sentido e alcance de outras normas.

vi. Normas directas e normas derivadas

50
 Inovadoras _ são apreensíveis directamente nas disposições expressas
 Encontram-se implícitas noutras normas (Interpretação enunciativa).

Disposições do Direito transitório material: normas temporárias destinadas a


estabelecer o regime jurídico correspondente à passagem do regime até então
vigente para o regime novo decretado

Quanto às suas relações

i. Normas gerais e normas especiais


 Gerais- constituem um regime regra ou dispõem para a generalidade dos
casos.
 Especiais: sem contrariar o regime regra, adaptam as normas gerais a
circunstâncias particulares (D. Civil VS D. Comercial).

ii. Normas de Direito comum e normas de direito particular


 De Direito comum –correspondem a princípios gerais ou a excepções a esses
princípios ( as normas especiais são desenvolvimentos diferenciados de um
só princípio. As normas excepcionais assentam em princípios antagónicos
dos adoptados pelo ordenamento jurídico).
iii. Normas materiais e normas remissivas – consoante enceram em si a
regulamentação o a devolvem para a regulamentação constante de outras
normas.
iv. Normas exequendas e normas de execução – cnsoante a sua execução
depende de outras ou tem por objecto dar execução a normas pré-existentes.
v. Normas principais e normas subsidiárias – consosnte se aplicam por si
próprio ou se aplicam apenas na falta de normas que especificamente se
ocupam das relações ou situações.

51
Classificação específica do Direito Constitucional

i. Normas constitucionais materiais (grosso modo, normas primárias) –


reflectem o núcleo da Constituição em sentido material, a ideia de direito
modeladora do regime ou da decisão constituinte (normas dos princíupios
fundamentais)
ii. Normas constitucionais de garantia (grosso modo, normas secundárias) –
estabelecem os modos de assegurar o cumprimento da Constituição perante o
Estado (normas sobre a fiscalização da constitucionalidade).
iii. Normas constitucionais de fundo – respeitantes às relações entre a sociedade e
o Estado ou ao estatudo das pessoas e dos grupos dentro da comunidade
política (normas sobre os direitos fundamentais)
iv. Normas orgânicas – definidoras dos órgãos do poder, da sua estrutura, da sua
competência, da sua articulação recíproca e do estatututo dos seus titulares.
v. Normas processuais ou de forma – relativas aos actos e actividade do poder,
aos processos jurídicos de formação e expressão – vontade necessariamente
normativa e funcional.
vi. Normas constitucionais preceptivas – as de eficácia incondicionada ou não
dependentes de condições institucionais ou de facto.
vii. Normas constitucionais programáticas – as que dirigidas a certos fins e à
transformação não só da ordem jurídica mas também das estruturas sociais e
da ordem constitucional, implicam a verificação pelo legislador, no exercício
de um verdadeiro poder discricionário, da possibilidade de as concretizar.
viii. Normas constitucionais exequíveis por si mesmas – aplicáveis só por si, sem
necessidade de lei que as complementem.
ix. Normas não exequíveis por si mesmas – as carecidas de normas legislativas
que as tornem plenamente aplicáveis as situações da vida.

52
x. Normas constitucionais a se – contêm uma específica regulamentação
constitucional seja a título denormas materiais, seja a título de normas de
garantia.
xi. Normas constitucionais sobre normas constitucionais – reportam-se a outras
normas constitucionais para certos fins (disposições sobre a revisão
constitucional).

53
Normas Preceptivas e Normas Programáticas

A diferença entre as normas preceptivas e as normas programáticas não reside na


natureza nem no valor jurídico.

Quanto a natureza – são ambas normas jurídico-constitucionais em sentido material e


em sentido formal.

Quanto ao valor – tanto umas como outras possuem força jurídica superior em relação
às normas do Direito ordinário.

A diferença reside:

 Na estrutura
 No grau de realização e de efectividade.

As normas programáticas caracterizam-se por:

 serem de aplicação diferida e não de aplicação ou execução imediata(


eficácia diferida);
 explicitarem comandos–valores em vez de comandos – regras;
 conferirem flexibilidade ou elasticidade ao ordenamento constitucional
(dimensão prospectiva);
 ter como destinatário primordial o legislador que deve ponderar quanto ao
tempo e aos meios disponíveis para lhes conferir plena eficácia
(discricionariedade do legislador);
 não poderem ser invocadas pelos cidadãos imediatamente após a entrada e
vigor da Constituição, pedindo aos Tribunais a sua aplicação.

54
 aparecerem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou
parcialmente indeterminados (indeterminação).

Normas exequíveis e normas não exequíveis por si mesmas

(Distinção das normas preceptivas e normas programáticas)

As classificações das normas constitucionais em preceptivas e programáticas;


exequíveis e não exequíveis por si mesmas são distintas, embora se sobreponham
parcialmente.

Interacção das normas com a realidade constitucional = critério básico de distinção


entre normas preceptivas e normas programáticas.

Capacidade conformarem ou não imediatamente por força própria realidade


constitucional.

Completude ou incompletude das normas = critério básico de distinção entre as


normas exequíveis e as normas não exequíveis por si mesmas.

Desdobramento nas normas não exequíveis:

 Um comando que substancialmente fixa certo objectivo, atribui certo direito ou


prevê certo órgão;
 Um segundo comando, explícito ou implícito, que exige do Estado a realização
desse objectivo, a efectivação desse direito ou a constituição desse órgão, através
de normas que estabeleçam os mecanismos e os instrumentos adequados a tal
efeito.

A norma não exequível por si é identificada pela a necessidade de complementação por


normas legislativas para que realize a sua finalidade específica.

55
Sobreposição parcial entre classificações “normas preceptivas e normas
programáticas” e “normas exequíveis e não exequíveis por si mesmas”.

 Todas as normas exequíveis por si mesmas podem considerar-se preceptivas.


(NEPSM = NPTVAS)
 Mas nem todas as normas preceptivas são exequíveis por si mesmas. (NPTVAS //
NEPSM)
 As normas programáticas são (quase) todas normas não exequíveis por si mesmas.
(NPG = NNEPSM)

Comparação entre:
 Normas programáticas e
 Normas preceptivas não exequíveis por si mesmas

Características comuns.

 Relevância específica do tempo;


 Autolimitação quanto a eficácia plena;
 Necessidade de concretização e não apenas de regulamentação legislativas.

Características distintivas

 As normas preceptivas não exequíveis por si mesmas:


o Exigem apenas a intervenção do legislador, actualizando-as ou tornando-
as efectivas.
o Dependem apenas de factores jurídicos e de decisões políticas

56
 As normas programáticas:
o Exigem regulamentação legislativa acrescida de providências
administrativas, assim como operações materiais.
o Dependem ainda e sobretudo de factores económicos e sociais.

Classificação alternativa derivada da sobreposição parcial das classificações

i. Normas preceptivas exequíveis por si mesmas


ii. Normas preceptivas não exequíveis por si mesmas
iii. Normas programáticas

Força jurídica das normas programáticas e das normas preceptivas não exequíveis
por si mesmas

Aspectos comuns

i. Sua consideração na interpretação das restantes normas que sem elas teriam
alcance diverso;
ii. Sua contribuição para a integração de lacunas através da analogia;
iii. Ainda que tenham um conteúdo primário sempre prescritivo e não
proibitivo, elas adquirem um duplo sentido:
a. Proibitivo ou negativo
- proibindo a emissão de normas legais contrárias.
- Proibindo a prática de comportamentos que impeçam
a produção de actos por elas impostos.
b. Daqui inconstitucionalidade material em caso de violação.
iv. Fixam critérios ou directivas para o legislador ordinário nos domínios sobre
que versam. (o afastamento desses ceritérios determina
inconstitucionalidade material por desvio de poder).

57
v. As normas legais que as concretizam não podem, pura e simplesmente ser
revogadas, retornando-se à situação anterior. Tal equivaleria a retirar
supervenientemente a norma constitucional a exequibilidade adquirida.

Aspectos diversos

Normas preceptivas não exequíveis por si mesmas

i. determinam a cessação da vigência, por inconstitucionalidade superveniente,


das normas legais anteriores que disponham em sentido contrário.
ii. Obrigam o legislador a editar as necessárias normas legislativas destinadas a
conferir-lhes exequibilidade no prazo que estabeleçam (inconstitucionalidade
por omissão se tal não ocorrer)

Normas programáticas
i. Determinam a inconstitucionalidade superveniente das normas legais
anteriores descrepantes, mas apenas a partir do momento em que seja possível
receberem exequibilidade.
ii. Determinam a inconstitucionalidade por omissão apenas a partir do momento
em que seja possível a sua exequibilidade.

Classificação das disposições constitucionais

Classificação das disposições jurídicas em geral


(também aplicável às disposições constitucionais)

Quanto ao objecto ou conteúdo

vii. Normas de regulamentação e normas técnicas

58
 possuem um sentido específico de regulamentação

 dão enquadramento técnico legislativo às normas de regulamentação (ex.


as definições legais e as regras de qualificação).

viii. Normas autónomas e normas não autónomas

 Possuem um sentido completo e valem por si (contém todos os elementos de


uma norma jurídica)
 Não possuem um sentido completo, valem apenas integradas ou conjugadas
com outras (falta-lhes a previsão e a estatuição).

ix. Normas prescritivas e normas proibitivas (imperativas ou injuntivas) VS


Normas Permissivas
 Prescritivas - prescrevem um determinado acto ou comportamento
 Proibitivas: Vedam um determinado acto ou comportamento.

x. Normas primárias e normas secundárias ou sancionatórias

 Primárias –dispõem sobre as relações e as situações da vida


 Primárias – estabelecem garantias do cumprimento das normas primárias,
nomeadamente sanções.

xi. Normas inovadoras e normas interpretativas


 Inovadoras - introduzem uma modificação na ordem jurídica
 Interpretativas – definem o sentido e alcance de outras normas.
xii. Normas directas e normas derivadas
 Inovadoras _ são apreensíveis directamente nas disposições expressas
 Encontram-se implícitas noutras normas (Interpretação enunciativa).

59
Disposições do Direito transitório material: normas temporárias destinadas a
estabelecer o regime jurídico correspondente à passagem do regime até então
vigente para o regime novo decretado

Quanto às suas relações

vi. Normas gerais e normas especiais


 Gerais- constituem um regime regra ou dispõem para a generalidade dos
casos.
 Especiais: sem contrariar o regime regra, adaptam as normas gerais a
circunstâncias particulares (D. Civil VS D. Comercial).

vii. Normas de Direito comum e normas de direito particular


 De Direito comum –correspondem a princípios gerais ou a excepções a esses
princípios ( as normas especiais são desenvolvimentos diferenciados de um
só princípio. As normas excepcionais assentam em princípios antagónicos
dos adoptados pelo ordenamento jurídico).
viii. Normas materiais e normas remissivas – consoante enceram em si a
regulamentação o a devolvem para a regulamentação constante de outras
normas.
ix. Normas exequendas e normas de execução – cnsoante a sua execução
depende de outras ou tem por objecto dar execução a normas pré-existentes.
x. Normas principais e normas subsidiárias – consosnte se aplicam por si
próprio ou se aplicam apenas na falta de normas que especificamente se
ocupam das relações ou situações.

Classificação específica do Direito Constitucional

60
xii. Normas constitucionais materiais (grosso modo, normas primárias) –
reflectem o núcleo da Constituição em sentido material, a ideia de direito
modeladora do regime ou da decisão constituinte (normas dos princíupios
fundamentais)
xiii. Normas constitucionais de garantia (grosso modo, normas secundárias) –
estabelecem os modos de assegurar o cumprimento da Constituição perante o
Estado (normas sobre a fiscalização da constitucionalidade).
xiv. Normas constitucionais de fundo – respeitantes às relações entre a sociedade e
o Estado ou ao estatudo das pessoas e dos grupos dentro da comunidade
política (normas sobre os direitos fundamentais)
xv. Normas orgânicas – definidoras dos órgãos do poder, da sua estrutura, da sua
competência, da sua articulação recíproca e do estatututo dos seus titulares.
xvi. Normas processuais ou de forma – relativas aos actos e actividade do poder,
aos processos jurídicos de formação e expressão – vontade necessariamente
normativa e funcional.
xvii. Normas constitucionais preceptivas – as de eficácia incondicionada ou não
dependentes de condições institucionais ou de facto.
xviii. Normas constitucionais programáticas – as que dirigidas a certos fins e à
transformação não só da ordem jurídica mas também das estruturas sociais e
da ordem constitucional, implicam a verificação pelo legislador, no exercício
de um verdadeiro poder discricionário, da possibilidade de as concretizar.
xix. Normas constitucionais exequíveis por si mesmas – aplicáveis só por si, sem
necessidade de lei que as complementem.
xx. Normas não exequíveis por si mesmas – as carecidas de normas legislativas
que as tornem plenamente aplicáveis as situações da vida.
xxi. Normas constitucionais a se – contêm uma específica regulamentação
constitucional seja a título denormas materiais, seja a título de normas de
garantia.
xxii. Normas constitucionais sobre normas constitucionais – reportam-se a outras
normas constitucionais para certos fins (disposições sobre a revisão
constitucional).

61
Normas Preceptivas e Normas Programáticas

A diferença entre as normas preceptivas e as normas programáticas não reside na


natureza nem no valor jurídico.

Quanto a natureza – são ambas normas jurídico-constitucionais em sentido material e


em sentido formal.

Quanto ao valor – tanto umas como outras possuem força jurídica superior em relação
às normas do Direito ordinário.

A diferença reside:

 Na estrutura
 No grau de realização e de efectividade.

As normas programáticas caracterizam-se por:

 serem de aplicação diferida e não de aplicação ou execução imediata(


eficácia diferida);
 explicitarem comandos–valores em vez de comandos – regras;
 conferirem flexibilidade ou elasticidade ao ordenamento constitucional
(dimensão prospectiva);
 ter como destinatário primordial o legislador que deve ponderar quanto ao
tempo e aos meios disponíveis para lhes conferir plena eficácia
(discricionariedade do legislador);
 não poderem ser invocadas pelos cidadãos imediatamente após a entrada e
vigor da Constituição, pedindo aos Tribunais a sua aplicação.

62
 aparecerem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou
parcialmente indeterminados (indeterminação).

Normas exequíveis e normas não exequíveis por si mesmas

(Distinção das normas preceptivas e normas programáticas)

As classificações das normas constitucionais em preceptivas e programáticas;


exequíveis e não exequíveis por si mesmas são distintas, embora se sobreponham
parcialmente.

Interacção das normas com a realidade constitucional = critério básico de distinção


entre normas preceptivas e normas programáticas.

Capacidade conformarem ou não imediatamente por força própria realidade


constitucional.

Completude ou incompletude das normas = critério básico de distinção entre as


normas exequíveis e as normas não exequíveis por si mesmas.

Desdobramento nas normas não exequíveis:

 Um comando que substancialmente fixa certo objectivo, atribui certo direito ou


prevê certo órgão;

 Um segundo comando, explícito ou implícito, que exige do Estado a realização


desse objectivo, a efectivação desse direito ou a constituição desse órgão, através
de normas que estabeleçam os mecanismos e os instrumentos adequados a tal
efeito.

63
A norma não exequível por si mesma é identificada pela a necessidade de
complementação por normas legislativas para que realize a sua finalidade específica.

Sobreposição parcial entre classificações “normas preceptivas e normas


programáticas” e “normas exequíveis e não exequíveis por si mesmas”.

 Todas as normas exequíveis por si mesmas podem considerar-se preceptivas.


(NEPSM = NPTVAS)
 Mas nem todas as normas preceptivas são exequíveis por si mesmas. (NPTVAS //
NEPSM)
 As normas programáticas são (quase) todas normas não exequíveis por si mesmas.
(NPG = NNEPSM)

Comparação entre:
 Normas programáticas e
 Normas preceptivas não exequíveis por si mesmas

Características comuns.

 Relevância específica do tempo;


 Autolimitação quanto a eficácia plena;
 Necessidade de concretização e não apenas de regulamentação legislativas.

Características distintivas

 As normas preceptivas não exequíveis por si mesmas:

64
o Exigem apenas a intervenção do legislador, actualizando-as ou tornando-
as efectivas.
o Dependem apenas de factores jurídicos e de decisões políticas

 As normas programáticas:
o Exigem regulamentação legislativa acrescida de providências
administrativas, assim como operações materiais.
o Dependem ainda e sobretudo de factores económicos e sociais.

Classificação alternativa derivada da sobreposição parcial das classificações

iv. Normas preceptivas exequíveis por si mesmas


v. Normas preceptivas não exequíveis por si mesmas
vi. Normas programáticas

Força jurídica das normas programáticas e das normas preceptivas não exequíveis por si
mesmas

Aspectos comuns

vi. Sua consideração na interpretação das restantes normas que sem elas teriam
alcance diverso;
vii. Sua contribuição para a integração de lacunas através da analogia;
viii. Ainda que tenham um conteúdo primário sempre prescritivo e não
proibitivo, elas adquirem um duplo sentido:
a. Proibitivo ou negativo
- proibindo a emissão de normas legais contrárias.

65
- Proibindo a prática de comportamentos que impeçam
a produção de actos por elas impostos.
b. Daqui inconstitucionalidade material em caso de violação.
ix. Fixam critérios ou directivas para o legislador ordinário nos domínios sobre
que versam. (o afastamento desses ceritérios determina
inconstitucionalidade material por desvio de poder).
x. As normas legais que as concretizam não podem, pura e simplesmente ser
revogadas, retornando-se à situação anterior. Tal equivaleria a retirar
supervenientemente a norma constitucional a exequibilidade adquirida.

Normas preceptivas não exequíveis por si mesmas

iii. Determinam a cessação da vigência, por inconstitucionalidade superveniente,


das normas legais anteriores que disponham em sentido contrário.
iv. Obrigam o legislador a editar as necessárias normas legislativas destinadas a
conferir-lhes exequibilidade no prazo que estabeleçam (inconstitucionalidade
por omissão se tal não ocorrer)

Normas programáticas
iii. Determinam a inconstitucionalidade superveniente das normas legais
anteriores descrepantes, mas apenas a partir do momento em que seja possível
receberem exequibilidade.
iv. Determinam a inconstitucionalidade por omissão apenas a partir do momento
em que seja possível a sua exequibilidade.

Capítulo II

Interpretação, Integração e Aplicação

66
Problemática da Interpretação Constitucional

Necessidade da interpretação constitucional

A interpretação constitucional constitui a ponte de passagem da leitura política,


ideológica ou simplesmente empírica para uma leitura jurídica do texto constitucional

Através da interpretação, tendo em conta a letra e o espírito, se descobre o sentido da


norma.

Variação da relevância da interpretação constitucional

 Ordenamentos de tipo judicialistas como os anglo-saxónicos


 Constituições com dispositivos amplos e elásticos
 Constituições regulamentárias
 Atitude cognoscitiva vs atitude voluntarista perante a Constituição
 Fiscalização da constitucionalidade, sobretudo jurisdicional
 As posturas perante as diferentes orientações de juristas e filósofos

Consciência do interesse específico da interpretação constitucional

Aparece com maior clareza:


 com a superação da crença liberal no imediatismo da constituição formal;
 quando se passa da exegese e do positivismo para o esforço de construção
dogmática dos sistemas constitucionais
 quando os progressos da teoria interpretação jurídica em geral se fazem sentir no
campo da interpretação constitucional.

67
Dificuldades (factores de perturbação) no campo da interpretação constitucional

 Variedade de normas constitucionais quanto ao objecto e quanto à eficácia


 Indeterminação ou incompleição de muitas das normas constitucionais ou da sua
linguagem
 Proximidade dos factos políticos (rebeldia dos factos políticos perante os quadros
puramente lógicos da hermenêutica
 Influencia da ideologia ou da pré-compreensão de cada intérprete
 Os diferentes critérios por que se movem os órgãos políticos, órgãos
administrativos e órgãos jurisdicionais e as possíveis atitudes dos seus titulares
 A origem compromissória de certas constituições marcadas por princípios
diferentes.

A interpretação constitucional

Tem a mesma natureza da interpretação que se realiza noutras áreas do Direito:

 Está estreitamente conexa com a aplicação do Direito;


 Não se destina à enunciação abstracta de conceitos;
 Destina-se à conformação da vida pela norma
 Comporta especialidades e não desvios aos parâmetros gerais.

A interpretação constitucional deve:

 Ter em conta os condicionalismos e fins políticos inelutáveis e irredutíveis;


 Visar os preceitos e princípios jurídicos que lhes correpondem;
 Ter em conta a realidade constitucional, tomando-a como sujeita ao influxo da
norma e não como mera realidade de facto;
 Racionalizar sem formalizar

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 Estar atenta aos valores sem dissolver a lei constitucional no subjectivismo ou na
emoção política;
 Fazer-se mediante a circulação norma – realidade constitucional – valor.

Directrizes da interpretação constitucional

i. Apreensão da Constituição como um todo, na busca de unidade e harmonia de sentido

O Princípio da interpretação das leis conforme à Constituição

Significado: No caso de normas polissémicas ou plurisignificativas, deve dar-


se preferência à interpretação que forneça um sentido conforme com a
Constituição.

Dimensões:
a) Princípio da prevalência da Constituição – de entre várias possibilidades de
interpretação , só deve escolher-se a que não seja contrário ao texto e ao
espírito das normas constitucionais.
b) Princípio da conservação das normas – uma norma não deve ser declarada
inconstitucional, quando observados os fins da norma ela pode se interpretada
conforme a Constituição.
c) Princípio da exclusão da interpretação conforme a Constituição, mas contra
lege – o aplicador duma norma não pode contrariar a letra e o sentido desta
norma através duma interpretação conforme a Constituição, mesmo através
desta interpretação consiga uma concordância entre a norma
infraconstitucional e as normas constitucionais.

Interpretação autêntica

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Sentido geral: interpretação feita pelo órgão da qual emanou um determinado acto
normativo (ex: o sentido duma lei é fixado autenticamente por outra lei; um
regulamento com equivocidade de sentidos é interpretado por outro regulamento.

Interpretação autêntica da Constituição


Quando uma nova lei, através do processo de revisão constitucional
estabelecido, esclarece o sentido de alguns preceitos contidos na
Constituição.
Exclui-se, no âmbito constitucional, qualquer interpretação autêntica
feita pelo legislador ordinário.

Integração das normas constitucionais

Ocorre quando se descobre uma lacuna constitucional autónoma, isto é, quando


determinadas situações:

a) que se devem considerar constitucionalmente reguladas;


b) não estão previstas;
c) e não podem ser cobertas pela interpretação, mesmo extensiva de preceitos
constitucionais, considerados na sua letra e no seu espírito.

Portanto:
Lacuna constitucional autónoma (lacuna de regulamentação) surge quando se
constata a ausência na Constituição formal de uma disciplina jurídica, mas que pode
deduzir-se a partir do plano de regulamentação da Constituição e da teleologia de
regulamentação constitucional

As lacunas autónomas distinguem-se de:

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a) lacunas constitucionais heterónomas – resultam do não cumprimento de
ordens de legislar e das imposições constitucionais concretamente
estabelecidas na Constituição.

Estas lacunas são inconstitucionais, porque traduzem a violação de imposições


constitucionais constantes da Constituição.

b) Integrações correctivas – fundadas na ideia de a regulamentação


constitucional ser, do ponto de vista político, incompleta, errada ou carecida
de melhoramento.

As integrações correctivas significam a usurpação inconstitucional do poder


constituinte pelos concretizadores das normas constitucionais.

Métodos de integração da Constituição

As lacunas de regulamentação podem ser:

a) Lacunas ao nível das normas – quando um determinado preceito


constitucional é incompleto, tornando-se necessária a sua complementação a
fim de poder ser aplicado.
b) Lacunas de regulamentação – quando não se trata da incompletude da norma
mas duma deterninada regulamentação em conjunto.

O método de integração das lacunas de regulamentação é a analogia (legis ou juris).

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APLICAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS NO TEMPO

Superveniência de Normas Constitucionais

Fenómenos Jurídicos decorrentes

a) Acção da Constituição nova sobre a Constituição anterior

Revogação global ou caducidade

b) Acção de normas constitucionais novas, provenientes de modificação


constitucional, sobre as normas constitucionais anteriores
Revogação individualizada

c) Acção de Constituição nova sobre normas ordinárias anteriores não


desconformes com ela
Novação

d) Acção de normas Constituicionais novas sobre normas ordinárias anteriores


desconformes
 Caducidade por inconstitucionalidade superveniente

Otros fenómenos juridícos decorrentes da superveniências de normas constitucionais

a) subsistência de normas constitucionais anteriores


 Recepção material

b) subsistência de normas ordinárias anteriores contrárias às novas normas


constitucionais com força de normas constitucionais.

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 Constitucionalização e recepção material

c) subsistência de normas constitucionais anteriores com força de normas de direito


ordinário
 Desconstitucionalização

Direito Constitucional novo e Direito constitucional anterior

1. A revogação global (ou de sistema) da Constituição anterior

A Constituição nova revoga, na globalidade, a Constituição anterior, porque:


a) em cada país e em cada momento somente pode existir uma Constituição em
sentido material e em sentido formal; somente pode pravalecer uma certa ideia de
Direito.
b) .O acto constituinte tem como finalidade específica substituir a ordem
constitucional criada a partir de acto constituinte anterior por uma ordem
constitucional diferente.

2. A revogação parcial ou individualizada

a) ocorre em casos de modificação parcial da Constituição


b) resulta, de nomeadamente, da revisão constitucional, que é uma modificação
constitucional na especialidade.

3. A recepção material

a) consiste da continuação da vigência de normas constitucionais anteriores,


mantendo esta qualidade, mas a título secundário.
b) Assim, a par das normas constitucionais que são expressão directa da nova ideia
de Direito (núcleo da Constituição formal), perduram por referência a estas
outras normas constitucionais.

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4. Caducidade (revogação consequente)

Traduz-se na cessação automática da vigência das normas que tenham sido objecto de
recepção material e/ou formal por uma constituição anterior que é revogada por força
da entrada em vigor duma nova Constituição

5. Desconstitucionalização

consiste na subsistência de normas constitucionais anteriores, passando da categoria de


normas constitucionais para a categoria de normas de direito ordinário.

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