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/ Dejair Dionísio - Ancestralidade Bantu na Literatura Afro-brasileira: reflexões sobre o romance Ponciá Vicêncio

Ensaio (/literafro/resenhas/ensaio) Última Atualização: 15 Janeiro 2019 Acessos: 1111

Ancestralidade Bantu na Literatura Afro-brasileira: reflexões sobre o romance Ponciá Vicêncio de Conceição Evaristo

Margarete Aparecida de Oliveira*

Pedro Henrique Silva**

Menosprezado pelos primeiros pesquisadores que se debruçaram nos estudos das etnias africanas, o povo
banto1 foi considerado por muito tempo como uma etnia inferior aos outros povos integrantes da diáspora negra
nas Américas. Contudo, esse grupo legou um vasto repertório cultural que traz consigo as marcas de uma tática
de resistência construída no campo do inimigo. Como se pode notar em festejos como o Congado2 e o
Candombe,3 além de outras marcas bantas no palimpsesto rizomático em que consiste a cultura brasileira, e
que estão no (in-)consciente dos autores e autoras da literatura afro-brasileira, dentre os quais cabe desatacar a
mineira Conceição Evaristo. Assim, mesclando “história não-oficial, memória individual e coletiva com invenção
literária” (DUARTE, 2007 apud DIONÍSIO, 2013, p.26), Conceição Evaristo traz em seu projeto literário traços de
sua ancestralidade, sendo o labor criativo entrecortado por experiência e vivência cultural.

Atento a esse aspecto das obras da autora, Dejair Dionísio construiu seu estudo Ancestralidade bantu na
literatura afro-brasileira: reflexões sobre o romance Ponciá Vicêncio de Conceição Evaristo. O volume apresenta
um expressivo trabalho de pesquisa, em que apresenta e interpreta os elementos de ancestralidade e de
religiosidade banto presentes no romance.

O livro analisa a relevância da obra de Conceição Evaristo e a sua relação com a produção canônica e literária
brasileira na especificidade afro, investigando a questão da herança simbólica da ancestralidade. Destacam-se
nessas análises dois aspectos de grande relevância na pesquisa. São eles: a) observação sobre a existência de
um narrador que se manifesta como um arauto de sua etnicidade; e b) a verificação das ocorrências referentes à
oralidade e à relação com sua herança pelo viés do pensamento banto.

O romance pode ser entendido a partir do papel do arauto da comunidade afro-brasileira, remetendo à fala dos
griôs que, com sua poesia oral, constroem os elos das correntes que ligam as comunidades tradicionais
africanas ao cotidiano brasileiro. É o caso da personagem Nêngua Kainda, contadora de estórias e porta-voz da
tradição. Outro personagem de destaque é o Nkise – nome das divindades banto, semelhantes aos orixás do
povo nagô – Angorô: credita-se a essa divindade, a aparência da cobra-coral, devido ao fato de as cores que o
representam serem parecidas com as do réptil em questão e simbolizarem a transformação, o contato do mundo
terreno com o espiritual e remeterem, também, ao arco-íris.

De acordo com o pesquisador, Conceição Evaristo agrega à sua literatura a figura do arauto, interpretada como função socializadora. Assim, a escritora torna-se
tradutora de uma cultura e produz uma literatura engajada, vital por dois vieses: o seu suplemento afro, mas contextualizado e recuperando elementos banto. O
arauto anuncia as boas novas e é o símbolo do fio condutor que mostrará o caminho que a personagem percorrerá em busca da sua herança.

Dividido em três capítulos, o livro de Dejair Dionísio apresenta, no primeiro, um histórico da “Literatura Negra ou Afrodescendente”, abordando e apresentando dados
referentes ao tema, bem como as diferentes conceituações dos dois termos. No segundo, é feita uma discussão acerca da escravidão no Brasil e suas
consequências, seus levantes mais importantes, e os acontecimentos que culminaram com o seu fim. E no terceiro, “Das águas, ao céu, ao barro: a escravidão vista
de dentro”, o autor busca relacionar Ponciá Vicêncio com outras obras consultadas para a confecção desta reflexão, analisando as trajetórias dos personagens e
suas relações com a criação do mundo, com a morte, com a ancestralidade, com as perdas ocorridas no decorrer da narrativa e com o destino da protagonista, sob o
ponto de vista do pensamento banto.

Sobre a “Literatura negra ou Afrodescendente”, o primeiro ponto a ser analisado é a questão de que os conceitos que caracterizam, instituem e constituem tal
produção passam, necessariamente, pela revisão e desconstrução do conceito de uma identidade nacional única, até porque, segundo o próprio autor, ela não está
ligada aos conceitos considerados clássicos de nacionalidade. Dessa forma, contesta o argumento de que nossa literatura é uma só – brasileira – não sendo
necessário demarcar territórios específicos, quer sejam eles étnicos, de classe ou gênero, fragmentando o corpo de nossa tradição literária.

Mas, na verificação da representatividade do negro em nome desta pseudo-univocidade literária, o que se vê é o obscurecimento da sua produção literária,

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construída e inscrita nas margens do tecido social e cultural. (DIONÍSIO, 2013, p. 15).

Outro aspecto discutido neste primeiro capítulo é o suplemento afro que, conforme o autor, se caracteriza por algo que vai além de complemento, não se referindo a
complementar algo que já foi feito em termos de análise e crítica literária produzidas na Literatura Brasileira, mas, sobretudo, o fato de que a condição de suplemento
é necessária para trazer a diferença, afirmar a voz e dar visibilidade a algo que está na obscuridade. É destacado também que a necessidade de abordar a produção
estética diferenciada dos padrões do cânone tornou-se essencial, no momento em que é imprescindível discutir a identidade cultural.

No capítulo intitulado “A Escravidão”, o pesquisador faz um levantamento histórico desse processo na Antiguidade, onde ela acontecia “pelos e para os mais diversos
motivos, era generalizada entre todos os povos, independentemente de qualquer relação racial”, passando pela escravidão indígena na América espanhola até a
escravidão indígena e africana no Brasil, suas consequências, e os acontecimentos que culminaram no seu fim.

Em “Das águas, ao céu, ao barro: a escravidão vista de dentro”, Dejair Dionísio, explora as trajetórias dos personagens e suas relações com a criação do mundo,
com a morte, com a sua ancestralidade, com as perdas ocorridas e com o destino da protagonista, segundo o ponto de vista do pensamento banto. Para ele, a obra
retrata a condição socioeconômica e geográfica dos afrodescendentes no Brasil ao trazer os dramas pessoais de Ponciá, “mergulhada em uma comunidade
quilombola, com particularidades que rememoram África” (DIONÍSIO, 2013, p. 56). A narrativa de Conceição Evaristo trata de mostrar o quanto Ponciá se parece
com o seu avô Vicêncio, pois desde menina ela apresenta os trejeitos do velho, anunciando assim a importância da memória familiar contida nessa similaridade, que
segundo Dejair:

A presença do barro, do Angorô, da cobra coral, dos objetos de artesanato, do conhecimento passado pela sua mãe, pela ausência de nome, marca o enredo e a
trama do texto. O seu mergulho nas histórias contadas por Nêngua Kainda, arauto de sua comunidade afrodescendente, a amarração que essas narrativas
memoriais terão com a sua percepção de mundo e o dialogismo entre essas reflexões, nos servirão de suporte para apontar caminhos para a compreensão de sua
busca em encontrar o seu destino e a sua ancestralidade (DIONÍSIO, 2013, p. 58).

Dejair Dionísio nos mostra que a busca valorativa do afrodescendente é nítida dentro da narrativa. Reconhece-se, assim, no seu meio; faz buscas em sua memória
para descobrir-se enquanto ser que é o reflexo da tensão e do devir dessa narrativa, tornando Conceição Evaristo o arauto atual dessa comunidade. Nas culturas
modernas africanas, a narrativa oral foi inserida na literatura produzida pelos poetas, contistas e romancistas comprometidos com a luta de libertação do domínio
europeu. Serviu como palavra conscientizadora para o povo, foi arma e estratégia de luta. No Brasil, encontramos, sobretudo na voz dos afrodescendentes, uma
narrativa que rememora África, denunciando sua condição de vida. Essa condição étnica e oral está representada pelo arauto. Isso é percebido, no texto de Ponciá
Vicêncio, quando o narrador, ao citar a figura do arauto, assinala: “Nêngua Kainda, aquela que tudo sabia, mesmo se não lhe dissessem nada”.

Em relação à morte presente em no romance, o pesquisador ressalta que aparecem situações que vão desde “o assassinato, à tentativa de suicídio, do aborto
espontâneo e do genocídio, este sendo citado em relação à escravidão” (DIONÍSIO, 2013, p. 62). O trabalho analisa com profundidade as várias perdas de memória
e de identidade da personagem que acontecem ao longo do romance, como a morte do avô, do pai, dos sete filhos, levando-a a afastar-se de si mesma, como
resultante desses abalos emocionais, ausências e vazios. Dessa forma, aparece logo no início do texto o primeiro drama de Ponciá: a sua família carrega o
sobrenome “Vicêncio”, que provém do antigo senhor, dono da terra e proprietário dos escravizados, explicitando, assim, a ausência de nome de família como
indicador da ausência de cidadania. O autor nos mostra que, neste caso, Conceição Evaristo recupera a história dos vencidos a partir desse primeiro drama: a
ausência de sobrenome denunciando a “libertação” ocorrida no país.

Em relação ao Angorô, o crítico destaca que o lugar dos ancestrais é a água, onde vivem e exercem o seu axé, o seu nguzo (força vital). Quem os conduz a esse
caminho é o barqueiro, que seria o mesmo ente que une Ponciá e seu destino. “Como não é possível chegar a Mzambi sem utilizar-se de seus intermediários, os
nkises são a representação desse caminho”. (DIONÍSIO, 2013, p. 77).

O Angorô seria o barqueiro4, aquele que guiará Ponciá pelo caminho já que “lá fora, no céu cor de íris, um enorme angorô multicolorido se diluía lentamente,
enquanto Ponciá Vicêncio, elo e herança de uma memória reencontrada pelos seus, não se perderia jamais, se guardaria nas águas do rio”. Dejair complementa:

O hábito dos mortos que menciona a tradição congolesa é que eles devem seguir o itinerário do Sol. Na concepção daqueles, o movimento circular do Sol parte do
fundo do oceano passando sobre nossas cabeças. É como se fosse uma enorme cobra que, tocada pelos raios solares, emitisse uma variada gama de cores, muito
parecida com o arco-íris, que passasse sobre nossas cabeças. O mundo pareceria a eles como se fosse uma grande montanha cercada por muita água. O homem
vive no alto dessa montanha e, de lá, poderia ver o Sol e levantar-se das águas e, ao retornar, mergulhar nelas – ou seja: reencontar os seus mortos. Nesse aspecto,
Angorô se faz presente nas opções tomadas por Ponciá. (DIONÍSIO, 2013, p. 77).

O autor cita Nei Lopes (2005), que relata a crença no arco-íris como uma serpente das profundezas que vai beber água no céu. Ele é a representação de Angorô, o
que controla o bom tempo. E nos dias de sol, o Nkise se transforma em arco-íris e sobe ao céu. Ponciá “juntava, então, as saias entre as pernas tampando o sexo e,
num pulo, com o coração aos saltos, passava por debaixo do angorô. Depois se apalpava toda.[...] Passara rápido, de um só pulo. Conseguia enganar o arco e não
virara menino.” (EVARISTO, 2005, p. 9). A representatividade do nascimento, da vida e da morte (do nascer, do viver e do morrer) está simbolizada e apontada pelo
pesquisador:

O fio, da vida, representado no enredo, na trama, na tessitura do texto, estaria representado pelos momentos em que, depois da saída da comunidade em que
viviam, tanto a mãe Maria Vicêncio, quanto Ponciá e seu irmão, Luandi Vicêncio, retornaram para encontrar os seus. (DIONÍSIO, 2013, p. 78).

Dessa forma, o livro de Dejair Dionísio tem seus méritos por desprender um pensamento crítico em uma linguagem simples e cuidadosa num texto sem arestas
acadêmicas. Ao estudar a ancestralidade, questão cara às comunidades de matriz africana, o pesquisador reforça os elos que unem os afro-brasileiros à terra de
seus ancestrais. Com isso, ele desfia o texto, buscando perceber as artimanhas do fazer literário de Conceição Evaristo, em um romance que reafirma as raízes
ancestrais abafadas pelo discurso hegemônico.

Referências
DIONÍSIO, Dejair. Ancestralidade bantu na literatura afro-brasileira: reflexões sobre o romance “Ponciá Vicêncio” de Conceição Evaristo. Belo Horizonte: Nandyala,
2013.

DUARTE, Eduardo de Assis. Por um conceito de literatura afro-brasileira. In: DUARTE, Eduardo de Assis; FONSECA, Maria Nazareth Soares (Org.). Literatura e
afrodescendência no Brasil: antologia crítica. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2011, vol. 4, História, teoria, polêmica.

EVARISTO, Conceição. Ponciá Vicêncio. Belo Horizonte: Mazza, 2003.

1 Foi escolhida a forma “aportuguesada” por partilharmos do raciocínio do pesquisador Nei Lopes que em seu Dicionário Banto do Brasil registra o termo dessa

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maneira. Sobre isso, o autor diz: “se em português nunca se diz, por exemplo, ‘vou estudar o deutsche sprachen, ou o english, ou o français’ por que dizer ‘a línguia
oxi-ronga, o povo ba-ronga’ etc?”. (LOPES, s.d., p. 17).

2 O termo “Congado” tem sua origem em “Congada” que - conforme está registrado no Dicionário Banto do Brasil de Nei Lopes - possui o seguinte significado: “s.f.
Dança dramática afro-brasileira (BH). De ‘congo’ (reunião de congos)”. (LOPES, s.d., p. 91).

3 “s.m.(1) Batuque, dança de negros (BH).[...] (3) Uma das guardas da fraternidade de N.S. do Rosário e dos Santos Pretos, que só toca em casa de reis congos,
durante grandes ocasiões (SAM). Do quimbundo Kiandombe, negro.” (LOPES, s.d., p. 70).

4 Vale ressaltar que nesse ponto esse Nkise se assemelha ao barqueiro Caronte, da Mitologia Grega, responsável por transportar os mortos para o Hades, o mundo
inferior semelhante ao inferno da Mitologia Judaico-cristã.

* Margarete Aparecida de Oliveira é mestranda em teoria da literatura e literatura comparada pela faculdade de letras da UFMG e pesquisadora do NEIA/UFMG.

** Pedro Henrique Souza da Silva é graduando da faculdade de letras da UFMG; bolsista de iniciação cientifica pelo Probic/FAPEMIG e pesquisador do NEIA/UFMG.

Texto para download (/literafro/arquivos/resenhos/ensaio/ConceicaoEvaristo-Ancestralidadebantunaliteraturaafrobras.pdf)

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