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0124A7E2
No 142.827/2015-AsJConst/SAJ/PGR

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Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP
Relatora: Ministra Rosa Weber
Requerente: Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviço
e Turismo (CNC)
Interessados: Governado do Estado de São Paulo
Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL. REPARTIÇÃO DE


COMPETÊNCIA LEGISLATIVA. LEI 15.659/2015, DE SÃO
PAULO. INCLUSÃO E EXCLUSÃO DO NOME DE CON-
SUMIDORES EM SERVIÇOS DE PROTEÇÃO AO CRÉ-
DITO. COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA NORMAS
GERAIS SOBRE CONSUMO E DE ESTADOS E DIS-
TRITO FEDERAL PARA SUPRI-LAS EM LACUNAS
PREENCHÍVEIS. AMPLITUDE DA COMPETÊNCIA ES-
TADUAL EM MATÉRIA DE DEFESA E PROTEÇÃO DE
CONSUMIDORES. MAIOR RIGOR NO PROCEDI-
MENTO DE NEGATIVAÇÃO: POSSIBILIDADE. AUSÊN-
CIA DOS PRESSUPOSTOS DE MEDIDA CAUTELAR.
1. Divergência entre lei estadual e lei nacional de normas
gerais em matéria de competência legislativa concorrente
configura transgressão direta ao modelo constitucional de
repartição de competência legislativa. Precedentes.
2. A coexistência de jurisdições constitucionais admitida pelo
art. 125, § 2º, da Constituição da República não autoriza os
tribunais de justiça a apreciar constitucionalidade de leis esta-
duais ou municipais com parâmetro extraído diretamente da
CR. Precedentes.
3. A competência concorrente para legislar sobre consumo
não afasta a possibilidade de Estado, em suplementação de
lacunas, explicitar o conteúdo principiológico da Lei de
Defesa do Consumidor (também chamado de Código de
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Defesa do Consumidor – CDC, Lei 8.078/1990), a fim de


ampliar seu núcleo de proteção, desde que a lei estadual não

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divirja nem pretenda substituir a lei nacional de normas ge-
rais.
4. As normas do CDC que regulam bancos de dados e
cadastros de proteção ao crédito não são exaustivas e re-
clamam complementação que as conforme às pecu-

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liaridades locais, sem prejuízo de essa regulamentação partir
de lei federal, que não se confunde com lei nacional.
5. Não pode lei estadual afastar dívidas protestadas ou co-
bradas diretamente pela via judicial da exigência de prévia
comunicação, por escrito, da inscrição em cadastros de pro-
teção ao crédito, pois cria exceções não previstas no CDC
em campo de normas gerais relativas a consumo.
6. A dimensão territorial e populacional e o plexo de rela-
ções de consumo que se instauram diuturnamente no Es-
tado de São Paulo justificam o tratamento atribuído pela
Lei 15.659, de 9 de janeiro de 2015, aos consumidores e aos
órgãos de proteção ao crédito sediados naquela unidade fe-
derativa. Por isso mesmo, não há violação ao conteúdo jurí-
dico do princípio da igualdade.
7. Estão ausentes pressupostos de medida cautelar (fumus boni
juris e periculum in mora), sobretudo pelo caráter reverso do
perigo na demora processual, o qual justifica manutenção de
eficácia da lei paulista que amplia a proteção ao consumidor.
8. Parecer pelo indeferimento da medida cautelar.

I R ELATÓRIO

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pe-


dido de medida cautelar, proposta pela Confederação Nacional
do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), em face da Lei
15.659, de 9 de janeiro de 2015, do Estado de São Paulo, que

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“regulamenta o sistema de inclusão e exclusão dos nomes dos

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consumidores nos cadastros de proteção ao crediário”.

A lei possui o seguinte conteúdo:

Artigo 1º. A inclusão do nome dos consumidores em cadas-


tros ou bancos de dados de consumidores, de serviços de

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proteção ao crédito ou congêneres, referente a qualquer in-
formação de inadimplemento dispensa a autorização do de-
vedor, mas, se a dívida não foi protestada ou não estiver
sendo cobrada diretamente em juízo, deve ser-lhe previa-
mente comunicada por escrito, e comprovada, mediante o
protocolo de aviso de recebimento (AR) assinado, a sua en-
trega no endereço fornecido por ele.
Artigo 2º. A comunicação deve indicar o nome ou razão so-
cial do credor, natureza da dívida e meio, condições e prazo
para pagamento, antes de efetivar a inscrição.
Parágrafo único. Deverá ser concedido o prazo mínimo de
15 ([...]) dias para quitação do débito ou apresentação de
comprovante de pagamento, antes de ser efetivada a inscri-
ção do nome do consumidor nos cadastros de proteção ao
crédito.
Artigo 3º. Para efetivar a inscrição, as empresas que mantêm
os cadastros de consumidores residentes no Estado de São
Paulo deverão exigir dos credores documento que ateste a
natureza da dívida, sua exigibilidade e a inadimplência por
parte do consumidor.
Artigo 4º. As empresas deverão manter canal direto de co-
municação, indicado expressamente no aviso de inscrição, que
possibilite a defesa e a apresentação de contraprova por parte
do consumidor, evitando a inscrição indevida.
Parágrafo único. Havendo comprovação por parte do consu-
midor sobre a existência de erro ou inexatidão sobre o fato
informado, fica a empresa obrigada a retirar, independente-
mente de manifestação dos credores ou informantes, os da-
dos cadastrais indevidos, no prazo máximo de 2 ([...]) dias
úteis.
Artigo 5º. Vetado.
Artigo 6º. Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

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Sustenta o requerente inconstitucionalidade formal, por inva-

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são de competência legislativa da União para estabelecer normas
gerais sobre relação de consumo, nos termos do art. 24,V, e §§ 1º a
3º, da Constituição da República. Aduz que “os serviços de prote-
ção ao crédito têm âmbito nacional. Não estão restritos a Estados e

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aos seus domiciliados. A uniformização de suas regras impõe-se para
dar segurança jurídica a consumidores e credores de todo o país”.
Assevera que “[...] atendimento às peculiaridades locais é condicio-
nante para o exercício de competência legislativa do Estado de São
Paulo quando da aprovação e promulgação da Lei 15.659/2015,
eivando a norma de inconstitucionalidade formal por violação da
reserva constitucional de competência feita à União”.

Em despacho de 14 de abril de 2015, a relatora, Ministra ROSA


WEBER, adotou o rito do art. 10 da Lei 9.868, de 10 de novembro
de 1999. Requisitou informações da requerida e solicitou oitiva da
Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República
(peça 25 do processo eletrônico).

A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo aponta, pre-


liminarmente, que o confronto entre a Lei estadual 15.659/2015 e
a Lei federal 8.078/1990 constitui ofensa indireta à Constituição.
No mérito, defende constitucionalidade da lei, por entender não
haver sido extrapolada a competência legislativa suplementar do
Estado, por inexistir divergência entre as leis nacional e estadual
(peça 30).

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O Governador do Estado de São Paulo remeteu-se às razões

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do veto ao projeto de lei e afirma inconstitucionalidade da norma
estadual, por extrapolação dos limites da competência legislativa
concorrente, ao permitir inscrição de nome de consumidor em ca-
dastro de inadimplentes sem prévia ciência se o débito houver sido

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protestado ou cobrado em juízo, e ao criar deveres não previstos
na Lei de Defesa do Consumidor para as empresas gestoras de
banco de dados de proteção do crédito (peça 34).

A Advocacia-Geral da União manifestou-se pelo indeferimento


do pedido cautelar, por entender não evidenciada invasão da
competência da União para esclarecer normas gerais sobre proce-
dimento prévio à inclusão de dados em cadastros de proteção ao
crédito (peça 36).

A Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (PROTESE)


solicitou ingresso no processo na condição de amicus curiæ (peça
14).

É o relatório.

II PRELIMINARES

II.1 NECESSIDADE DE APENSAMENTO

Esta ação direta possui idêntico objeto ao das ações diretas de


inconstitucionalidade 5.224/SP e 5.273/SP – Lei 15.659, de 9 de
janeiro de 2015, do Estado de São Paulo –, ajuizadas pela Con-
federação Nacional de Dirigentes Lojistas e pela Confederação

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Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), am-

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bas distribuídas à relatoria da Ministra ROSA WEBER.

Em face da identidade de causa de pedir e de pedido, a fim


de gerar economia processual, deve haver apensamento desta ação
e da ADI 5.273/SP à ADI 5.224/SP, por ser esta a mais antiga, e

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julgamento conjunto de todas, na forma do art. 12 da Lei 9.868,
de 10 de novembro de 1999, sem prejuízo da possibilidade de de-
ferimento de medida cautelar em qualquer dessas ações.

II.2 COEXISTÊNCIA DE JURISDIÇÕES CONSTITUCIONAIS

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, nos casos de


tramitação simultânea de ações diretas de inconstitucionalidade
contra a mesma norma estadual, no STF e em tribunal de justiça,
tem determinado suspensão do processo no TJ, até julgamento fi-
nal da ação direta ajuizada na Suprema Corte.1

Desse modo, deve suspender-se o trâmite da ADI 2044447-


20.2015.8.26.0000, ajuizada pela Federação das Associações Co-
merciais do Estado de São Paulo (FACESP), no Tribunal de Justiça
dessa unidade federativa, com revogação da medida liminar ali
concedida, tendo em vista que o parâmetro invocado na ação es-
tadual é a repartição de competência legislativa entre os entes fede-

1 Revista trimestral de jurisprudência, v. 152, p. 371; v. 186, p. 496; v. 189, p.


1.016.

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rativos,2 matéria cuja sede é exclusivamente a Constituição da Re-

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pública.
A liminar, portanto, invade competência do STF, motivo
pelo qual deve ser revogada:

Controle de Constitucionalidade de leis locais (CF, art. 125,

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§ 2º): cabimento restrito à fiscalização da validade de leis
locais – sejam estaduais ou municipais –, em face da Cons-
tituição estadual: invalidade da disposição constitucional es-
tadual que outorga competência ao respectivo Tribunal de
Justiça para processar e julgar ação direta de inconstitucio-
nalidade de normas municipais em face também da Consti-
tuição Federal: precedentes. 3

A suspensão do trâmite da ADI ajuizada no TJSP e a revo-


gação da liminar deve ocorrer, ainda que pendente de aprecia-
ção agravo interno contra a decisão singular do relator.

II.3 VIOLAÇÃO INDIRETA AO MODELO CONSTITUCIONAL


DE REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em matéria de


competência legislativa concorrente, não conhecia ações diretas
de inconstitucionalidade fundadas em alegação de incompatibili-
dade entre leis federais de caráter nacional e leis estaduais, por
entender tratar-se de violação indireta (por norma infraconstitu-
cional interposta) à Constituição da República. Veja-se, por
exemplo, o seguinte julgado:
2 As peças eletrônicas da ação direta estadual podem ser acessadas diretamente
no site do Tribunal de Justiça ou pelo atalho < http://zip.net/bfrvgC >. Se-
nha para acesso: URN83J.
3 Supremo Tribunal Federal. Plenário. ADI 409/RS. Relator: Ministro
SEPÚLVEDA PERTENCE. 13/3/2002, unânime. Diário da Justiça, 26 abr. 2002.

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AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE –


COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE (CF,

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ART. 24) – ALEGADA INVASÃO DE COMPETÊNCIA
DA UNIÃO FEDERAL, POR DIPLOMA LEGISLATIVO
EDITADO POR ESTADO-MEMBRO – NECESSIDADE
DE PRÉVIO CONFRONTO ENTRE LEIS DE CA-
RÁTER INFRACONSTITUCIONAL – INADMISSIBI-
LIDADE EM SEDE DE CONTROLE NORMATIVO

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ABSTRATO – AÇÃO DIRETA NÃO CONHECIDA.
– Nas hipóteses de competência concorrente (CF, art. 24),
nas quais se estabelece verdadeira situação de condomínio
legislativo entre a União Federal e os Estados-membros
(RAUL MACHADO HORTA, “Estudos de Direito Constitucio-
nal”, p. 366, item n. 2, 1995, Del Rey), daí resultando clara
repartição vertical de competências normativas, a jurispru-
dência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido
de entender incabível a ação direta de inconstitucionali-
dade, se, para o específico efeito de examinar-se a ocorrên-
cia, ou não, de invasão de competência da União Federal,
por parte de qualquer Estado-membro, tornar-se necessário
o confronto prévio entre diplomas normativos de caráter in-
fraconstitucional: a legislação nacional de princípios ou de
normas gerais, de um lado (CF, art. 24, § 1º), e as leis estadu-
ais de aplicação e execução das diretrizes fixadas pela União
Federal, de outro (CF, art. 24, § 2º). Precedentes.
É que, tratando-se de controle normativo abstrato, a in-
constitucionalidade há de transparecer de modo imediato,
derivando, o seu reconhecimento, do confronto direto que
se faça entre o ato estatal impugnado e o texto da própria
Constituição da República. Precedentes.4

É certo que “nem sempre a discussão de validade de lei local


em face de lei federal se resolve numa questão constitucional de in-
vasão de competência, podendo reduzir-se à interpretação da lei fe-
deral e da lei local para saber de sua recíproca compatibilidade”.5

4 STF. Plenário. Questão de ordem na ADI 2.344/SP. Rel.: Min. CELSO DE


MELLO. 23/11/2000, maioria. DJ, 2 ago. 2002; RTJ, v. 184, p. 113.
5 STF. Plenário. Recurso extraordinário 117.809-QO/PR. Rel.: Min.: SEPÚLVEDA
PERTENCE. 14/6/1989. DJ, 4 ago. 1989; RTJ, v. 129, p. 456.

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No entanto, quando lei estadual dispõe contrariamente ou sobre

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normas próprias de lei geral, a atual orientação jurisprudencial do
Supremo Tribunal Federal considera direta a violação ao modelo
de repartição de competência legislativa traçado pela Constituição
da República, ainda que tal análise pressuponha prévio confronto

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de leis de caráter infraconstitucional:

COTEJO ENTRE LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL


E LEI COMPLEMENTAR NACIONAL – INOCOR-
RÊNCIA DE OFENSA MERAMENTE REFLEXA – A
USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA LEGISLATIVA,
QUANDO PRATICADA POR QUALQUER DAS PES-
SOAS ESTATAIS, QUALIFICA-SE COMO ATO DE
TRANSGRESSÃO CONSTITUCIONAL.
– A Constituição da República, nos casos de competência
concorrente (CF, art. 24), estabeleceu verdadeira situação de
condomínio legislativo entre União Federal, os Esta-
dos-membros e o Distrito Federal (RAUL MACHADO HORTA,
Estudos de Direito Constitucional, p. 336, item n. 2, 1995, Del.
Rey), daí resultando clara repartição vertical de competên-
cias normativas entre essas pessoas estatais, cabendo, à
União, estabelecer normas gerais (CF, art. 24, § 1º), e, aos
Estados-membros e ao Distrito Federal, exercer competên-
cia suplementar (CF, art. 24, § 2º). Doutrina. Precedentes.
– Se é certo, de um lado, que, nas hipóteses referidas no art.
24 da Constituição, a União Federal não dispõe de poderes
ilimitados que lhe permitam transpor o âmbito das normas
gerais, para, assim, invadir, de modo inconstitucional, a es-
fera de competência normativa dos Estados-membros, não
é menos exato, de outro, que o Estado-membro, em exis-
tindo normas gerais veiculadas em leis nacionais [...], não
pode ultrapassar os limites de competência meramente su-
plementar, pois, se tal ocorrer, o diploma legislativo estadual
incidirá, diretamente, no vício da inconstitucionalidade.
– A edição, por determinado Estado-membro, de lei que con-
trarie, frontalmente, critérios mínimos legitimamente veicu-

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lados, em sede de normas gerais, pela União Federal ofende,


de modo direto, o texto da Carta Política. Precedentes. 6

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Não procede, portanto, a preliminar de ofensa reflexa ao texto
constitucional, suscitada pela Assembleia Legislativa do Estado de
São Paulo em suas informações.

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III MÉRITO

III.1 PROTEÇÃO A CONSUMIDORES E COMPETÊNCIA LEGISLATIVA

O art. 24, V e VIII, da Constituição da República atribui à


União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar, concorrente-
mente, sobre produção, consumo e responsabilidade por dano a
consumidores. Seguindo o modelo de repartição de competência
legislativa traçado pelo art. 24, §§ 1º a 3º, da CR,7 compete à
União dispor sobre normas gerais relativas a consumidores e res-
ponsabilidade por dano a eles e, aos Estados e ao Distrito Federal,
dispor de forma supletiva ou suplementar sobre tais matérias, de-
pendendo da existência de lei nacional.

6 STF. Plenário. ADI 2.903/PR. Rel.: Min. CELSO DE MELLO. 1 /12/2005, un.
O

DJe, 19 set. 2008.


7 “Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar con-
correntemente sobre: [...]
V – produção e consumo; [...]
VIII – responsabilidade por dano ao meio ambiente, ao consumidor, a bens
e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico; [...].
§ 1º. No âmbito da legislação concorrente, a competência da União li-
mitar-se-á a estabelecer normas gerais.
§ 2º. A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui
a competência suplementar dos Estados.
§ 3º. Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a
competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.”

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A União, valendo-se dessa competência legislativa, editou a Lei

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8.078, de 11 de setembro de 1990 (conhecida como Código de
Defesa do Consumidor – CDC). Esta, ao dispor sobre normas ge-
rais de proteção ao consumidor e da relação de consumo, sujeita o
cadastro em bancos de dados de consumidores às seguintes regras:

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Art. 43 O consumidor, sem prejuízo do disposto no art. 86,
terá acesso às informações existentes em cadastros, fichas,
registros e dados pessoais e de consumo arquivados sobre
ele, bem como sobre as suas respectivas fontes.
§ 1º Os cadastros e dados de consumidores devem ser objeti-
vos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreen-
são, não podendo conter informações negativas referentes a
período superior a cinco anos.
§ 2º A abertura de cadastro, ficha, registro e dados pessoais e
de consumo deverá ser comunicada por escrito ao consumi-
dor, quando não solicitada por ele.
§ 3º O consumidor, sempre que encontrar inexatidão nos seus
dados e cadastros, poderá exigir sua imediata correção, devendo
o arquivista, no prazo de cinco dias úteis, comunicar a altera-
ção aos eventuais destinatários das informações incorretas.
§ 4º Os bancos de dados e cadastros relativos a consumidores,
os serviços de proteção ao crédito e congêneres são conside-
rados entidades de caráter público.
§ 5º Consumada a prescrição relativa à cobrança de débitos do
consumidor, não serão fornecidas, pelos respectivos Sistemas
de Proteção ao Crédito, quaisquer informações que possam
impedir ou dificultar novo acesso ao crédito junto aos for-
necedores.

Mesmo a simples leitura do dispositivo revela que o Código de


Defesa do Consumidor não contém disciplina exaustiva sobre a
matéria, de modo que compete aos Estados e Distrito Federal suple-
mentá-la para atender suas peculiaridades locais, desde que não in-

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gresse na disciplina própria da lei nacional sobre o tema ou dela

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divirja.

A definição do que pode ser considerado normas gerais ou


normas suplementares, para fins de repartição de competência le-
gislativa é questão tormentosa, que reclama delimitação da ou-

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torga constitucional legislativa entre os distintos níveis de poder do
modelo de federalismo brasileiro. Segundo JOSÉ AFONSO DA SILVA,
normas gerais “são normas de leis, ordinárias ou complementares,
produzidas pelo legislador federal nas hipóteses previstas na Cons-
tituição, que estabelecem princípios e diretrizes da ação legislativa
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. 8

MARÇAL JUSTEN FILHO, ao discorrer sobre a abrangência das


“normas gerais” no sistema constitucional de repartição de com-
petência legislativa, ressalta tratar-se de conceito jurídico indeter -
minado cujo núcleo de certeza positiva compreende “os princípios
e regras destinadas a assegurar um regime jurídico uniforme [...]
em todas as órbitas federativas”. 9

DIOGO DE FIGUEIREDO MOREIRA NETO condensa estudos elabo-


rados por diversos autores na tentativa de definir o que são “nor-
mas gerais” para o sistema constitucional de repartição de compe-
tência legislativa. São, segundo indica, os seguintes elementos qua-
lificadores das normas gerais:

8 SILVA, José Afonso da. Comentário contextual à Constituição. 7. ed. São Paulo:
Malheiros, 2010, p. 284.
9 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administra-
tivos. 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012, p. 15.

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Sintetizando-as, a partir dessas características, as normas ge-


rais seriam institutos que:

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a) estabelecem princípios, diretrizes, linhas mestras e regras
jurídicas (BÜHLER, MAUNS, BURDEAU, PONTES, PINTO FALCÃO,
CLÁUDIO PACHECO, SHAID MALUF, JOSÉ AFONSO DA SILVA, PAULO
DE BARROS CARVALHO, MARCO AURÉLIO GRECCO);

b) não podem entrar em pormenores ou detalhas nem,

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muito menos, esgotar o assunto legislado (MATZ, BÜHLER,
MAUNZ, PONTES, MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, PAULO
DE BARROS CARVALHO E MARCO AURÉLIO GRECCO);

c) devem ser regas nacionais, uniformemente aplicáveis a to-


dos os entes públicos (PINTO FALCÃO, SOUTO MAIOR BORGES,
PAULO DE BARROS CARVALHO, CARVALHO PINTO e ADILSON ABREU
DALLARI);
e) só cabem quando preencham lacunas constitucionais ou dis-
ponham sobre áreas de conflito (PAULO DE BARROS CARVALHO
e GERALDO DE ATALIBA);
f) devem referir-se a questões fundamentais (PONTES e ADILSON
ABREU DALLARI);
g) são limitadas, no sentido de não poderem violar a autono-
mia dos Estados (PONTES, MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO,
PAULO DE BARROS CARVALHO e ADILSON ABREU DALLARI);
h) não são normas de aplicação direta (BURDEAU e CLÁUDIO
PACHECO).10

Não há, portanto, consenso doutrinário nem jurispruden-


cial sobre o que sejam normas gerais. Há, apenas, elementos que as
identificam no contexto das regras de repartição legislativa. A
identificação das normas gerais ou suplementares deve fazer-se caso
a caso. CÁRMEN LÚCIA observa que se a lei “especializa e aprofunda
questões que são de interesse predominante e tratamento possivel-

10 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Competência concorrente limi-


tada. Revista de informação legislativa, a. 25, n. 100, out./dez. 1988, p. 145-150.

13
PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP

mente diferenciado de uma entidade federada [...], cuida-se de

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competência estadual e escapa-se do âmbito da norma geral”.11

Pondera INGO WOLFGANG SARLET que, conquanto seja vedada,


em regra, aos Estados e Distrito Federal a edição de normas gerais,
“eventual regulação em caráter geral por parte dos entes federados

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não implica necessariamente a sequela de sua inconstitucionali-
dade, designadamente no caso de a unidade federada apenas repro-
duzir o conteúdo da norma geral federal.12

A Lei paulista 15.659, de 9 de janeiro de 2015, ao porme-


norizar e suprir lacunas do CDC quanto ao sistema de inclusão
e exclusão do nome de consumidores em cadastros de proteção
ao crédito daquela unidade federativa, não dispôs, na sua maior
parte, sobre normas gerais de proteção a consumidor. Por conse-
guinte, não extrapolou os limites da competência suplementar
conferida pelo art. 24, V e VIII, combinado com os §§ 1º a 3º, da
Constituição da República.

A lei estadual não pretendeu substituir a disciplina do CDC


acerca de bancos de dados e cadastro de consumidores, mas so-
mente suplementá-la, no desiderato de ampliar a proteção do con-
sumidor em aspectos peculiares às exigências locais, considerados a
dimensão territorial do Estado de São Paulo e o gigantesco número
de pessoas que ali estabelecem, diariamente, relações de consumo.

11 Apud SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDI-


ERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2014, p. 817.
12 Idem, p. 818.

14
PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP

Estas as sujeitam a inscrição em cadastros de proteção ao crédito, a

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exigir maiores cautelas por parte desses serviços de proteção.

O art. 1º, ao estabelecer que a comunicação prévia da inclu-


são do nome de consumidor em cadastro de proteção ao crédito
ocorrerá mediante comprovação de protocolo de aviso de recebi-

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mento (AR) de carta endereçada ao consumidor, não contrariou
a disciplina protetiva do CDC, que se limita a exigir, para essa fi-
nalidade, indispensabilidade de comunicação prévia, por escrito,
sem definir a forma pela qual será feita a notificação.

A súmula 404 do Superior Tribunal de Justiça, ao preceituar


ser “dispensável o aviso de recebimento (AR) na carta de comuni-
cação ao consumidor sobre a negativação de seu nome em bancos
de dados e cadastros”, longe de infirmar a possibilidade de imposi-
ção da exigência de aviso de recebimento, vem a autorizá-la, pois a
dispensabilidade de AR decorre, precisamente, do fato de o CDC
não definir a forma pela qual deve fazer-se a comunicação prévia
do consumidor. Isso reforça a competência suplementar dos Esta-
dos e do Distrito Federal para dispor a esse respeito.

Destacam GILMAR MENDES, INOCÊNCIO MÁRTIRES COELHO E

PAULO GUSTAVO GONET – seguindo diretriz jurisprudencial do


Supremo Tribunal Federal segundo a qual, na distribuição de
competência legislativa, deve-se, em regra, prestigiar iniciativas
regionais e locais –13 a possibilidade de lei estadual, em matéria de

13 STF. Plenário. ADI 4.060/SC. Rel.: Min. LUIZ FUX. 25/2/2015, un. DJe 81,
4 maio 2015.

15
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competência concorrente, pormenorizar disciplina de normas ge-

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rais para suprir lacunas existentes na lei nacional:

A divisão de tarefas está contemplada nos parágrafos do art.


24, de onde se extrai que cabe à União editar normas ge-
rais – i.e., normas não exaustivas, leis-quadro, princípios am-

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plos, que traçam um plano, sem descer a pormenores. Os
Estados-membros e o Distrito Federal podem exercer, com
relação às normas gerais, competência suplementar (art. 24,
§ 2º), o que significa preencher claros, suprir lacunas.
Não há falar em preenchimento de lacuna, quando o que os
Estados ou o Distrito Federal fazem é transgredir lei federal
já existente. Na falta completa da lei com normas gerais, o
Estado pode legislar amplamente, suprindo a inexistência do
diploma federal. Se a União vier a editar norma geral fal-
tante, fica suspensa a eficácia da lei estadual, no que contra-
riar o alvitre federal. Opera-se, então, um bloqueio de
competência, uma vez que o Estado não mais poderá legis-
lar sobre normas gerais, como lhe era dado até ali. Caberá
ao Estado, depois disso, minudenciar a legislação ex-
pedida pelo Congresso Nacional.14

Essa perspectiva é relevante, porque fortalece o princípio


federativo e não anula a competência legislativa dos Estados –
naquilo, naturalmente, que não invada a competência da União
nem a ela se contraponha – para complementar, detalhar, por -
menorizar, aspectos e procedimentos não esgotados nas normas
gerais editadas pelo ente central.

O aviso de recebimento, ademais, constitui garantia não só dos


consumidores, mas também dos serviços de proteção ao crédito,15
14 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO,
Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. São Paulo: Sa-
raiva, 2008, p. 822-823. Sem destaques no original.
15 Súmula 369 do Superior Tribunal de Justiça: “Cabe ao órgão mantenedor
do Cadastro de Proteção ao Crédito a notificação do devedor antes de
proceder à inscrição”.

16
PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP

ao passo que a comprovação de envio de carta registrada ao en-

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dereço correto do consumidor afastar o dano moral presumido
decorrente de inscrição indevida em cadastros de inadimplentes 16
por falhas do serviço postal – o que, sem o protocolo do AR, re-
presenta verdadeira “prova diabólica”.

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Diverge, contudo, o art. 1º da Lei paulista 15.659/2015, da
garantia assegurada pelo art. 43, § 2º, do CDC, ao excetuar dívidas
protestadas ou cobradas em juízo de prévia comunicação por es-
crito de inserção do nome de consumidor em cadastros ou bancos
de dados de serviços de proteção ao crédito. A lei estadual, ao es-
tabelecer exceções não previstas na lei federal no que se refere à
exigência de prévia comunicação do consumidor, extrapolou, nesse
aspecto, a competência suplementar dos estados e incorreu em
inconstitucionalidade formal, por editar norma geral.

O art. 2º, caput, da lei paulista, ao estabelecer que a comunica-


ção deve indicar nome, razão social do credor, natureza da dívida e
meio, condições e prazo para pagamento, antes de efetivar a inscri-
ção, apenas explicita elementos que deverão estar contidos na
correspondência endereçada ao consumidor e tem por fim assegurar
o direito básico do consumidor a informação transparente (CDC,
arts. 4º, caput, e 6º, III),17 sem contrariedade à Lei 8.078/1990. Esta,
16 “O dano moral, decorrente da inscrição irregular em órgão restritivo de
crédito, configura-se in re ipsa, ou seja, é presumido e não tem carece de
prova” (Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. Agravo regimental
no agravo em recurso especial 252.027/SP. Rel.: Min. ANTÔNIO CARLOS
FERREIRA. 7/2/2013, un. DJe, 22 fev. 2013.
17 “Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo
[...] a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os se-
guintes princípios: [...].

17
PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP

ao tratar da matéria, exige que “os cadastros e dados de consumi-

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dores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de
fácil compreensão” (CDC, art. 43, § 1º).

No que diz respeito: (i) ao prazo mínimo de 15 dias para qui-


tação do débito ou apresentação de comprovante de pagamento an-

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tes de efetivação da inscrição do nome de consumidor nos cadastros
de proteção ao crédito (art. 2º, parágrafo único); (ii) à exigência de
documentos que atestem a natureza da dívida, sua exigibilidade e a
inadimplência por parte do consumidor (art. 3º); e (iii) à manuten-
ção de canal direto de comunicação indicado no aviso de inscrição
que possibilite defesa e apresentação de contraprova por parte do
consumidor antes da inscrição indevida, a lei estadual apenas supre
lacunas do CDC relativamente ao procedimento para inscrição e ex-
clusão de dados de consumidores em cadastro de inadimplentes, com
vistas a adequar o sistema às peculiaridades do Estado de São Paulo.

Além disso, “o CDC criou um microssistema próprio ao se


colocar no ordenamento jurídico como uma lei principiológica,
pelo que a ele devem se subordinar todas as leis específicas quando
tratem de relação de consumo”. 18 Embora a Lei de Defesa do
Consumidor19 se qualifique como autêntica norma de sobredi-
reito, não é microssistema isolado. Há espaço para que outras nor-
Art. 6º São direitos básicos do consumidor: [...]
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com
especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade,
tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que representam;
[...].”
18 GREGORI, Maria Stella. A responsabilidade das empresas nas relações de
consumo. Revista dos Tribunais, a. 16, n. 62, p. 165, abr./jun. 2007.
19 Como seria mais adequado denominar a Lei 8.078/1990.

18
PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP

mas jurídicas disponham sobre defesa e proteção do consumidor. A

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respeito, FELIPE PEIXOTO BRAGA NETTO sustenta que “não existe
mais ‘a fonte’; existe uma multiplicidade delas, sem que nenhuma
ocupe posição de absoluta proeminência excludente das demais”.20

A própria Lei 8.078/1990, no art. 7º, adota modelo aberto de

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interação legislativa em matéria de defesa e proteção de consumi-
dores, ao preceituar que “os direitos previstos neste código não ex-
cluem outros decorrentes de tratados ou convenções internacionais
de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de
regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas compe-
tentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do di-
reito, analogia, costumes e equidade”. Veja-se, desse modo, que a
própria lei nacional não repele a existência de legislação domés-
tica que complemente a proteção dos consumidores. Ao contrá-
rio, expressamente a acolhe.

A Lei paulista 15.569/2015, ao especificar campos da lei na-


cional de normas gerais (Lei 8.078/1990), no intuito de ampliar
defesa e proteção de consumidores, ainda que inovando na siste-
mática procedimental de inclusão e exclusão do nome de consu-
midores em cadastros de proteção ao crédito, não exorbitou os
limites da competência suplementar dos Estados e, por conse-
guinte, não invadiu competência legislativa reservada à União.

O Supremo Tribunal Federal, no que concerne à competên-


cia concorrente para dispor sobre produção, consumo e respon-
20 BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Manual de Direito do Consumidor: à luz
da jurisprudência do STJ. Salvador: JusPodivm, 2013, p. 44-45.

19
PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP

sabilidade por dano ao consumidor (art. 24, V, VIII e §§ 1º a 3º),

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tem reconhecido constitucionalidade de leis estaduais que se li-
mitem a suprir lacunas do CDC, a fim de explicitar-lhe o conteúdo
principiológico ou incrementar a proteção do cidadão consumi-
dor, sem pretender substituir ou contrariar a lei nacional:

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Ação direta de Inconstitucionalidade. 2. Decretos de caráter
regulamentar. Inadmissibilidade. 3. Não configurada a alegada
usurpação de competência privativa da União por lei estadual.
4. Competência concorrente que permite ao Estado regular
de forma específica aquilo que a União houver regulado de
forma geral (art. 24, inciso V, da Constituição). 5. Não conhe-
cimento da ação quanto aos Decretos 27.254, de 9.10.2000
e 29.043, de 27.8.2001, e improcedência quanto à Lei do
Estado do Rio de Janeiro 3.438, de 7.7.2000.21

DIREITO DO CONSUMIDOR E ADMINISTRATIVO.


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DA
LEI 12.420, DE 13.01.1999, DO ESTADO DO PARANÁ,
QUE ASSEGURA AO CONSUMIDOR O DIREITO
DE OBTER INFORMAÇÕES SOBRE NATUREZA,
PROCEDÊNCIA E QUALIDADE DOS PRODUTOS
COMBUSTÍVEIS, COMERCIALIZADOS NOS POSTOS
REVENDEDORES SITUADOS NAQUELA UNIDADE
DA FEDERAÇÃO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS.
22, I, IV, E XII, 177, §§ 1º e 2º, I e III, 238 e 170, IV, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MEDIDA CAUTELAR.
1. A plausibilidade jurídica da Ação Direta de Inconstituciona-
lidade ficou consideravelmente abalada, sobretudo diante das
informações do Exmo. Sr. Governador do Estado do Paraná.
2. Com efeito, a Constituição Federal, no art. 24, incisos V e
VIII, atribui competência concorrente à União, aos Estados
e ao Distrito Federal para legislar sobre produção e consumo
e responsabilidade por dano ao consumidor.

21 STF. Plenário. ADI 2.334/DF. Rel.: GILMAR MENDES. 24/4/2003, un. DJ, 30
maio 2003.

20
PGR Ação direta de inconstitucionalidade 5.252/SP

– O § 1º desse artigo esclarece que, no âmbito da legislação


concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabe-

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lecer normas gerais. E o § 2º que a competência da União
para as normas gerais não exclui a competência suplementar
dos Estados.
3. No caso, a um primeiro exame, o Estado do Paraná, na lei
impugnada, parece haver exercido essa competência suple-

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mentar, sem invadir a esfera de competência da União para
normas gerais.
– Aliás, o próprio Código do Consumidor, instituído pela Lei
Federal nº 8.078, de 1990, no art. 55, a estabeleceu.
4. E, como ficou dito, o diploma acoimado de inconstitucio-
nal não aparenta haver exorbitado dos limites da competên-
cia legislativa estadual (suplementar), nem ter invadido a
esfera de competência concorrente da União, seja a
que ficou expressa no Código do Consumidor, seja na le-
gislação correlata, inclusive aquela concernente à proteção
do consumidor no específico comércio de combustíveis.
É claro que um exame mais aprofundado, por ocasião do
julgamento do mérito da Ação, poderá detectar alguns ex-
cessos da lei em questão, em face dos limites constitucionais
que se lhe impõem, mas, por ora, não são eles vislumbrados,
neste âmbito de cognição sumária, superficial, para efeito
de concessão de medida cautelar.
6. Ausente o requisito da plausibilidade jurídica, nem
é preciso verificar se o periculum in mora está preenchido.
Ademais, se tivesse de ser examinado, é bem provável que
houvesse de militar sentido da prevenção temporária da efi-
cácia das normas em foco.
7. Medida cautelar indeferida. Plenário: votação unânime. 22

O parágrafo único do art. 3º da Lei paulista 15.659/2015 –


ao exigir que, no caso de erro ou inexatidão sobre o fato infor-
mado, a empresa retire os dados cadastrais indevidos, em até dois
dias úteis – não conflita com o art. 43, § 3º, do CDC, pois ambas as
normas exigem da entidade arquivista correção ou supressão ape-
22 STF. Plenário. Medida cautelar na ADI 1.980/PR. Rel.: Min. SYDNEY
SANCHES. 4/8/1999, un. DJ, 25 fev. 2000. Destaques do original.

21
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nas dos dados incorretos do consumidor, e, pela lei estadual, essa

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retirada deve ocorrer no prazo de até dois dias úteis, enquanto,
pelo CDC, o prazo de cinco dias úteis diz respeito à comunica-
ção da alteração dos dados incorretos aos destinatários.

O art. 3º, parágrafo único, da lei estadual não obriga à ex-

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clusão do nome do consumidor de cadastros ou bancos de dados
de serviços de proteção ao crédito, mas à supressão dos “dados ca-
dastrais indevidos”. Dessa forma, não viola a norma geral do art. 43,
§ 3º, do CDC e, consequentemente, não usurpa competência le-
gislativa da União.

De resto, a necessidade de complementação das normas do


CDC que regulam cadastros de proteção ao crédito foi reconhe-
cida pela própria União, no projeto de lei (PL) 836/2003, de auto-
ria do Executivo, que define marco regulatório da atividade dos
bancos de dados e serviços de proteção ao crédito no Brasil e tem
como um de seus principais objetivos reforçar as regras de respon-
sabilidade das empresas informantes e entidades arquivistas, sobre-
tudo no que tange à inclusão de informações de consumidores em
seus cadastros.23

23 Segundo a justificativa da proposição: “Este projeto de lei tem como obje-


tivo criar dispositivos que punam os responsáveis pelas informações falsas e
distorcidas sobre os consumidores e usuários que recorrem ao sistema de
crédito para alcançar seus objetivos.Visa, ainda, responsabilizar os dirigentes
do sistema de proteção ao crédito que não cumprem os prazos estabeleci-
dos por lei para a cobrança de débitos e permanência dos nomes dos fi-
nanciados em cadastros negativos ou ‘listas negras’. Em síntese, pune as
pessoas que criam constrangimento aos cidadãos de bem.” Disponível em:
< http://zip.net/bmrzS2 > ou
< http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?
codteor=128401&filename=PL+836/2003 >. Acesso em: 11 jul. 2015.

22
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O PL substitutivo aprovado pela Câmara dos Deputados, atu-

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almente em análise no Senado Federal, dispõe, no art. 6º, que a
comprovação da comunicação sobre inclusão de qualquer infor -
mação de inadimplemento em bancos de dados deve fazer-se
“por meio de postagem de aviso de recebimento ou serviço simi-

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lar”, dirigida ao endereço fornecido pelo devedor.24

Deverá ser declarada inconstitucionalidade formal, portanto,


somente do trecho “mas, se a dívida não foi protestada ou não esti-
ver sendo cobrada diretamente em juízo”, do art. 1º da Lei
15.659/2015, de São Paulo, por exorbitar a competência suplemen-
tar atribuída aos Estados e consequente invadir competência legis-
lativa da União.

III.2 PRESSUPOSTOS DA MEDIDA CAUTELAR

Não está presente, portanto, plausibilidade jurídica do pe-


dido (fumus boni juris) que autorize suspensão dos efeitos da tota-
lidade da Lei paulista 15.659/2015.

Não está presente perigo na demora processual (periculum in


mora), fundado na alegação de que, “em média, 3 ([...]) milhões de
notificação por mês, cujos custos foram multiplicados em quase 6
([...]) vezes em razão das disposições da referida lei local eivada de
inconstitucionalidade, o que impõe um ônus financeiro indevido a
milhares de empresas usuárias deste serviço em todo país”. Con-
quanto a Lei estadual 15.659/2015 onere bancos de dados, cadastros
e serviços de proteção ao crédito e congêneres sediados no Estado
24 Vide tramitação legislativa por meio do atalho na nota anterior.

23
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de São Paulo, isso se dá em contexto voltado à ampliação da defesa

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e da proteção ao consumidor. Suspensão de eficácia da lei, nessa
caso, teria consequência indesejada de suspender eficácia de normas
protetivas do consumidor, sujeito vulnerável na relação de consumo
e nas demais relações desta decorrentes.

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Está ausente fumus boni juris com referência à quase totali-
dade dos dispositivos da lei. Periculum in mora, no caso, seria in-
verso, caso houvesse deferimento de medida cautelar, pois deve
haver manutenção dos efeitos da lei, não o contrário.

IV CONCLUSÃO

Ante o exposto, opina o Procurador-Geral da República pelo


indeferimento da medida cautelar.

Brasília (DF), 28 de julho de 2015.

Rodrigo Janot Monteiro de Barros


Procurador-Geral da República

RJMB/WS/PC-Par.PGR/WS/2.044/2015

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