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ANALISANDO DISCURSOS

ANÁLISE TEXTUAL PARA PESQUISA SOCIAL

NORMAN FAIRCLOUGH
2003
2
EQUIPE DE TRADUÇÃO
COORDENAÇÃO
JOSENIA ANTUNES VIEIRA

RONALDO LIMA VIEIRA


FRANCISCA CORDÉLIA OLIVEIRA DA SILVA

ALESSANDRA MARQUES ÂNGELO


CANDICE APARECIDA RODRIGUES ASSUNÇÃO
CARLOS TOBIAS DA SILVA
DÉCIO BESSA
EDGLEUBA DE CARVALHO QUEIROZ DE ANDRADE
ELDA IVO
ELIANE FERREIRA DE SOUSA
HARRISON DA ROCHA
JARDÉLIA MOREIRA DOS SANTOS
JANAÍNA DE AQUINO FERRAZ
JOANA DA SILVA ORMUNDO
LUIZA HIROKO YAMADA KUWAE
MARIA RAQUEL APARECIDA COELHO GALAN
MIRELLE APARECIDA RODRIGUES ASSUNÇÃO
SIBELLE LETÍCIA RODRIGUES DE OLIVEIRA BIAZOTTO
WALKYRIA WETTER BERNARDES

ANALYSING DISCOURSE
TEXTUAL ANALISYS FOR SOCIAL RESEARCH
NORMAN FAIRCLOUGH

FIRST PUBLISHED 2003


BY ROUTLEDGE
II NEW FETTER LANE, LONDON EC4P4EE

SIMULTANEOUSLY PUBLISHED IN THE USA AND


CANADA BY ROUTLEDGE
29 WEST 35 TH STREET, NEW YORK, NY 10001

ROUTLEDGE IS AN IMPRINT OF THE TAYLOR & FRANCIS GROUP


3

© 2003 NORMAN FAIRCLOUGH

TYPESET IN PERPETUA BY
KEYSTROKE, JACARANDA LODGE, WOLVERHAMPTON
PRINTED AND BOUND IN GREAT BRITAIN BY
MPG BOOKS LTD, BODMIM.

ALL RIGHTS RESERVED. NO PART OF THIS BOOK MAY BE REPRINTED OR REPRODUCED OR UTILISED IN ANY FORM OR BY ANY
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ISBN O-415-25892-8 (TBK)


ISBN 0-415-25893-6 (PBK)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO...............................................................................

PARTE I

ANÁLISE SOCIAL, ANÁLISE DO DISCURSO, ANÁLISE TEXTUAL

2. Textos, Eventos Sociais e Práticas Sociais.................................

3. Intertextualidade e Pressuposição...........................................

PARTE II
4

GÊNEROS E AÇÃO

4. Gêneros e Estruturas Genéricas...............................................

5. Relações de Significado entre Frases e Orações

6. Sentenças Simples: Tipos de troca, fun funções dos atos de fala e disposição
gramatical..........................

PARTE III

DISCURSOS E REPRESENTAÇÕES

7. Discursos........................................................................................

8. Representação dos Eventos Sociais........................................

PARTE IV

ESTILOS E IDENTIDADES

9. Estilos

10. Modalidade e Avaliação.............................................

CONCLUSÃO................................................................

GLOSSÁRIO.......................................................................
5
1. INTRODUÇÃO

Este livro foi escrito com dois tipos de leitores em mente. O primeiro, dos estudantes e
pesquisadores de ciências sociais e humanas, que têm pouco conhecimento em estudos da linguagem
(como a sociologia, a ciência política, a educação, a geografia, a história, a administração social, os
estudos da mídia, os estudos culturais e os estudos de gênero).O segundo, dos estudantes e
pesquisadores que estejam se especializando em língua/linguagem.
As pessoas que trabalham em diversas áreas das ciências sociais são, com freqüência,
confrontadas com questões sobre língua, e, freqüentemente, trabalham com materiais de linguagem,
como textos escritos, conversas, entrevistas e pesquisas. No entanto, conforme indica minha experiência
em ensino de análise do discurso (como a que tive com o programa de pesquisa da Faculdade de
Ciências Sociais da Universidade de Lancaster), há uma grande incerteza sobre como analisar material
de linguagem. Eu acredito que, com freqüência, os estudantes que fazem pesquisa na área de ciências
sociais sentem a necessidade de obter informações mais detalhadas sobre o instrumental de análise de
linguagem. Geralmente, para esses estudantes, a leitura de livros de lingüística é algo desencorajador, o
que se deve ao fato de que a maior parte da lingüística contemporânea é bastante imprópria para os
propósitos desses estudantes (especialmente a ‘lingüística formal’, que aborda aspectos abstratos de
linguagem humana e tem pouco a oferecer em análises sobre o que uma pessoa diz ou escreve). Este
livro propõe fornecer um instrumental de análise da linguagem falada ou escrita. Pretende-se que este
livro seja útil às pessoas envolvidas com as ciências sociais e humanas, com pouca ou nenhuma
formação em estudo de língua, de modo a apresentar um caminho com sugestões sobre como
desenvolver análises de língua, e, possivelmente, buscar melhorar as pesquisas que tenham alguma
relação com as ciências sociais.
Este livro também pode ser visto como uma introdução às análises sociais de fala e escrita para
pessoas que já possuem alguma formação em análises de linguagem. Importantes movimentos em
direção à análise social da linguagem têm surgido nas diversas disciplinas da Lingüística contemporânea
- a sociolingüística e a análise de discurso são áreas que têm sido transformadoras e reveladoras nesse
campo. No entanto, há ainda duas limitações que, neste livro, eu desejo começar a corrigir. A primeira
se refere aos temas e tópicos que interessam a pesquisadores sociais têm sido tomados superficialmente.
A segunda consiste em que a exploração desses temas pela literatura existente na área de análise
lingüística vem apresentando um alcance limitado. Meu objetivo, neste livro, é mostrar de que forma um
conjunto de análises lingüísticas pode ser usado para investigar diversos temas de interesse dos estudos
sociais.
Eu imagino que este livro pode ser usado de vários modos. É satisfatório o grau de utilidade
deste como um material para estudantes universitários e estudantes de pós-graduação em departamentos
de ciências sociais. Outra utilização para esta obra é como um instrumento que possa ser usado por
profissionais fora do contexto acadêmico, ou por estudantes de pesquisa e acadêmicos em ciências
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sociais e ciências humanas que estão procurando uma introdução socialmente-orientada à análise da
fala e escrita de uma língua.
Visto que é provável que os leitores variem consideravelmente quanto ao grau de familiaridade
dos conceitos e categorias que eu apresento como pesquisa social e discurso e análise de texto, eu incluí
glossários de termos-chave e pessoas-chave (pag xxx), além de referências às fontes às quais eu me
referi no texto principal do livro. Os termos que estão inclusos nos glossários aparecem em negrito,
quando da primeira vez que aparecem no texto.

Análise Social, Análise de Discurso, Análise de Texto


Eu considero este livro uma extensão de um trabalho de análise de discurso que eu publiquei
previamente e que apontava uma análise lingüística mais detalhada de textos (Chouliaraki e Fairclough
1999, Fairclough 2001b, 1992, 1995a, 2000a). Minha abordagem sobre a análise de discurso (uma
versão da ‘análise de discurso crítica') é baseada na suposição de que a língua é uma parte irredutível da
vida social dialeticamente conectada a outros elementos de vida social, de forma que não se pode
considerar a língua sem levar em consideração a vida social. Portanto, a análise e a pesquisa sociais
sempre devem levar em conta a língua. (Relações dialéticas serão explicadas no capítulo 2.) Isso
significa que um modo produtivo de fazer pesquisa social é feito por meio da linguagem, usando alguma
forma de análise de discurso. Com essa afirmação, não pretendo reduzir a vida social à língua, tampouco
afirmar que tudo é discurso. No entanto, baseio-me na idéia de que o estudo de discurso é uma estratégia
analítica entre muitas e, no fato de que, freqüentemente, faz sentido usar análise de discurso junto com
outras formas de análise, como por exemplo, a etnografia ou as formas de análise institucional.
Há muitas versões de análise de discurso (o Van Dijk, 1997). Uma divisão principal é feita entre
as abordagens que incluem análise detalhada de texto (veja abaixo o sentido no qual eu estou usando
este termo), e as que não o fazem. Eu usei o termo “análise do discurso orientada textualmente” para
distinguir a divisão anterior da posterior (Fairclough, 1992). A análise de discurso em ciências sociais
tem sido, em geral, fortemente influenciada pelo trabalho de Foucault (Foucault 1972, Fairclough 1992).
Cientistas sociais que trabalham nessa tradição geralmente dão pouca atenção às características
lingüísticas de textos. Minha própria abordagem da análise do discurso se baseia em tentar transcender a
divisão entre os trabalhos inspirados por teorias sociais que não cuidam de análise de textos e os
trabalhos que buscam focar os textos e que não tendem a ficar presos em assuntos teóricos sociais. Essa
divisão não é, ou não deveria ser, um sim ou um não. Por um lado, qualquer análise de textos se mostra
relevante em situações nas quais as ciências sociais têm de se conectar com perguntas teóricas sobre
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discurso (por exemplo, os efeitos de discurso socialmente ”construtivos”). Por outro lado, nenhum real
entendimento dos efeitos sociais de discurso é possível, se não olharmos de perto como são esses efeitos
quando as pessoas falam ou escrevem.
Assim, análise de texto é uma parte essencial de análise de discurso, mas a análise de discurso
não é só a análise lingüística de textos. Eu vejo a análise de discurso como algo ”que oscila” entre um
foco em textos específicos e um foco naquilo que eu chamo de “ordem de discurso”, que é a
estruturação social de uma língua/linguagem e sua parceria com determinadas práticas sociais. A análise
de discurso crítica está relacionada à continuidade e à transformação em um aspecto mais abstrato, em
um nível mais estrutural, como acontece em textos em particular. A ligação entre essas duas
preocupações está no modo em que textos são analisados em um discurso crítico. A Análise de texto não
é vista como análise lingüística, pois inclui o que eu chamei de “análise interdiscursiva”, quer dizer, ver
os textos como discursos, gêneros e estilos que se articulam. Eu explicarei isso mais completamente no
capítulo 2 (veja Fairclough 2000a).
Meu foco neste livro está na análise lingüística de textos. No entanto, eu gostaria de
deixar claro que este não é apenas mais um livro sobre análise lingüística de textos, mas parte de um
projeto mais amplo que propõe desenvolver a análise de discurso crítica como um recurso para análise
social e para pesquisa. O livro pode ser usado sem referência àquele projeto mais largo, mas eu gostaria
que, pelo menos, os leitores estivessem atentos a isso, mesmo se não quiserem contribuir com isso. Eu
incluo um manifesto breve para o projeto mais amplo no término da Conclusão. Alguns leitores podem
desejar ler esse manifesto, que apresenta uma abordagem mais ampla do tema tratado neste livro, a partir
deste ponto (pág xxx).

Terminologia: Texto, Discurso, Língua


Eu usarei o termo “texto” em um sentido bastante amplo. Textos impressos e escritos, como
listas de compras e artigos de jornal, são “textos”, mas cópias de conversas e entrevistas (faladas)
também o são, assim como programas de televisão e páginas na Internet. Nós poderíamos dizer que
qualquer exemplo de linguagem em uso é um “texto”. Entretanto, até mesmo essa definição é muito
limitada, visto que textos como programas de televisão não envolvem apenas a língua, mas também
imagens visuais e efeitos de som. O termo “língua” será usado em seu senso mais habitual, isto é, para
significar linguagem verbal - palavras, orações, etc. Nós podemos falar de “língua” de um modo geral
ou de idiomas e línguas particulares, como inglês ou swahili. O termo discurso (ao qual a análise de
discurso se refere amplamente) sinaliza a visão particular de idioma em uso ao qual eu me referi acima,
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isto é: como um elemento da vida social que é fortemente conectada a outros elementos. Mas,
novamente, o termo pode ser usado em um sentido particular, como pode ter um sentido geral, abstrato.
Assim, eu irei me referir a um “discurso particular”, como o discurso político de “Terceira Via”
chamado de “New Labour” (talvez neste ponto precisemos de uma nota do tradutor explicando que New
labour é o partido político de Tony Blair e que foi chamado de New labour depois de uma reforma do
partido, antes chamado labour. Agora, depois da cisão, os radicais são chamados de old labour e os de
Blair de new labour. Além disso é preciso dizer que ‘labour’ é o partido dos trabalhadores inglês)
(Fairclough, 200b).

A Linguagem no Novo Capitalismo


Os exemplos que eu uso ao longo do livro estão particularmente focados na mudança social
contemporânea e, especialmente, nas mudanças no capitalismo contemporâneo e o seu impacto em
muitas áreas da vida social. O conjunto de mudanças ao qual eu estou me referindo é, variavelmente,
identificado como “globalização”, ”pós-modernidade”, “modernidade tardia” “sociedade de
informação”, “economia de conhecimento”, “novo capitalismo”, “cultura de consumo”, e assim por
diante (Segurou et al, 1999). Eu usarei o termo novo capitalismo para me referir à mais recente de uma
série histórica de re-estruturações radicais pelas quais o capitalismo manteve sua continuidade
fundamental (Jessop, 2000). O motivo por que decidi focalizar esse tópico se baseia no fato de que
muitas pesquisas sociais contemporâneas estão relacionadas à natureza e às conseqüências dessas
mudanças. E, muito simplesmente, porque nenhuma pesquisa social contemporânea pode ignorar estas
mudanças, elas têm tido um efeito penetrante em nossas vidas. Um motivo mais específico para
focalizar o novo capitalismo é o fato de que esse tema vem se tornando uma área de pesquisa importante
para a análise de discurso crítica. Há um website dedicado ao assunto (http://www.cddc.vt.edu/host/lnc)
e, recentemente, o periódico Discurso e Sociedade dedicou uma edição especial sobre o tema (13 (2),
2002). Eu deveria acrescentar, no entanto, que o termo ”novo capitalismo” não insinua um foco
exclusivo em assuntos econômicos. As transformações do capitalismo têm ramificações ao longo de
toda a vida social, e, como tema de pesquisa, o “capitalismo novo” deveria ser interpretado, em sentido
amplo, como o que concerne ao modo como essas transformações repercutem na política, na educação,
na produção artística e em muitas outras áreas da vida social.
O capitalismo tem a capacidade de superar crises por meio de autotransformações periódicas
radicais, de forma que a expansão econômica possa continuar. Uma transformação desse tipo está
ocorrendo agora. O novo capitalismo vem se instaurando, em resposta a uma crise no modelo pós-
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segunda guerra mundial, também chamado de “Fordismo”. Essa transformação envolve tanto a
reestruturação de relações entre o domínio econômico, o político e o social (um exemplo é a
mercantilização de campos como a educação, que ficou sujeita à lógica econômica de mercado), quanto
a reescala de relações entre os diferentes níveis de vida social: o global, o regional (por exemplo, a
União Européia), o nacional e o local. Os governos, em diferentes escalas, sociais democráticos e
conservadores, agora aceitam essas mudanças como um mero fato da vida (apesar de ter sido um “fato”
produzido, em parte, por acordos governamentais) e que tudo tem de se curvar à lógica emergente de
uma economia globalizadora dirigida pelo conhecimento. Esses governos abraçaram ou, pelo menos,
ajustaram-se ao “neoliberalismo”. Neoliberalismo é um projeto político elaborado para facilitar a
reestruturação e a reescala das relações sociais conforme as demandas de um capitalismo global
desenfreado (Bourdieu 1998). Esse projeto político tem sido imposto às economias pós-socialistas, como
(alegadamente) o melhor meio de transformação do sistema, renovação econômica e reintegração à
economia global. Isso levou a ataques radicais à previdência social universal e à redução das proteções
contra os efeitos de mercados com os quais os estados de bem-estar proviam as pessoas. Também
conduziu a uma divisão crescente entre ricos e pobres, aumentando a insegurança econômica e a tensão,
até mesmo para a “nova classe média”, bem como a uma intensificação da exploração do trabalho. A
ênfase desenfreada em crescimento também apresenta grandes ameaças ao ambiente. Essa nova ordem
também produziu um imperialismo novo, no qual agências financeiras internacionais, sob a tutela dos
EUA e seus aliados ricos, impõem, indiscriminadamente, a reestruturação dos sistemas nacionais a
países menos afortunados, o que, às vezes, tem conseqüências desastrosas (como o que ocorreu com a
Rússia). O problema não é a intenção de aumentar a integração econômica mundial, mas a forma
particular com que isso tem sido imposto e as conseqüências particulares (por exemplo, a má
distribuição de renda) que inevitavelmente a acompanham. Tudo isso resultou na desorientação e no
desarmamento de forças econômicas, políticas e sociais comprometidas com alternativas radicais e
contribuiu para um fechamento do debate público e um enfraquecimento da democracia (Boyer e
Hollingsworth, 1997, Brenner, 1998, Down e Streek 1997, Jessop 2000).
Os leitores acharão no Apêndice um conjunto de textos que eu usei para fins ilustrativos ao longo
do livro. Em geral, eu selecionei esses textos com base na relevância dos mesmos em várias questões de
pesquisa que vêm sendo levantadas em uma gama de disciplinas desde o início da transformação do
novo capitalismo. Em alguns casos, eu tomei exemplos de pesquisas anteriores para tentar mostrar como
a abordagem adotada neste livro poderia aprimorar os métodos atuais de análise.

A Abordagem em Análise de Texto


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Meu ponto de referência principal dentro da atual literatura sobre análise de texto é a
Lingüística Funcional Sistêmica (SFL), uma teoria lingüística e um conjunto de métodos analíticos
particularmente associados a Michael Halliday (Halliday, 1978, 1994). Em contraste com a tradição de
Chomsky, mais influente dentro da Lingüística, a SFL está profundamente preocupada com a relação
entre a língua e outros elementos e aspectos de vida social, e seu ponto de vista a respeito da análise
lingüística de textos sempre é orientada ao caráter social dos textos (fontes particularmente valiosas
incluem: Halliday 1994, Halliday e Hasan, 1976, 1989, Hasan 1996, Martin 1992, o Van Leeuwen
1993, 1995, 1996). Essa postura faz da SFL um valioso recurso para análise de discurso crítica, e, de
fato, grandes contribuições para análise de discurso crítica se desenvolveram a partir da SFL (Fowler et
al. 1979; Hodge e Kress, 1988, 1993; Kress, 1985; Kress e van Leeuwen, 2001; Lemke, 1995;
Thimbaut, 1991).
No entanto, as perspectivas de análise de discurso crítica e SFL não coincidem integralmente,
devido à diferença entre as perspectivas dessas escolas (para um diálogo crítico entre os dois, veja
Chouliaraki e Fairclough 1999). Há a necessidade de desenvolver abordagens de análise de texto por
meio de um diálogo transdisciplinar com perspectivas sobre linguagem e discurso imersos na teoria e
pesquisa social para desenvolvermos nossa capacidade de analisar textos como elementos do processo
social. Uma abordagem transdisciplinar à teoria ou ao método analítico é uma questão de trabalhar com
categorias e lógica ou, por exemplo, com teorias sociológicas para desenvolver uma teoria do discurso e
métodos para analisar textos. Inevitavelmente, esse é um projeto de longo prazo, iniciado de um modo
modesto nas discussões deste livro, como na que trata de “cadeias de gênero” (capítulo 2),
”dialogicidade” (capítulo 3), “equivalência e diferença” (capítulo 5), e a representação de tempo e
espaço (capítulo 8). O trabalho de Van Leeuwen sobre representação (ao qual me referi acima) também
pode ser visto como uma análise de texto que desenvolve esse modo de transdisciplinaridade. Outra
preocupação que eu tive é tentar fazer as categorias analíticas tão transparentes quanto possíveis para
análise social de discurso, afastando-me da terminologia técnica de lingüística, que freqüentemente é
proibitiva.
Eu também deveria mencionar brevemente a análise do corpus, mas eu não lidarei com isso neste
livro (De Beaugrande, 1997; McEnery e Wilson, 2001; Stubbs, 1996). O tipo de análise de texto
detalhada que eu introduzo é uma forma de análise social “qualitativa”. Esse é um ‘trabalho intensivo’ e
pode ser produtivamente aplicado a amostras de material de pesquisa em lugar de grandes corpos de
texto, embora a quantidade de material que pode ser analisada dependa do nível de detalhe: análise
textual pode focalizar apenas alguns elementos dos textos ou muitas características simultaneamente. No
entanto, como argumentam De Beaugrande (1997) e Stubbs (1996), essa forma de analise qualitativa
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pode ser suplementada por “análises quantitativas” oferecidas pelo corpus lingüístico. Os materiais
disponíveis (como Wordsmith, do qual eu faço algum uso em Fairclough, 2000b) permitem, por
exemplo, identificar as ‘palavras-chave’ de em um corpo de textos e investigar padrões distintos de co-
ocorrência ou colocação entre palavras-chave e outras palavras. Esse método tem algum valor, embora
limitado, motivo por que é necessário complementá-lo com uma análise textual qualitativa mais
intensiva e detalhada.
De fato, a análise de discurso crítica pode lançar mão de uma vasta gama de abordagens de
análise de texto. Eu decidi dar ênfase, neste livro, à análise gramatical e semântica porque acredito que
esta é uma forma muito produtiva de análise de textos e porque é difícil que os pesquisadores que não
têm um arcabouço em lingüística tenham acesso a esse conhecimento. Há outras abordagens mais
familiares e mais acessíveis à análise de texto (análise de conversação é um exemplo bom) a respeito das
quais eu não tratei neste livro (para uma avaliação, veja Titscher et al. 2000). Isso não significa que
essas abordagens não podem ser citadas em análise de discurso crítica. Pelo contrário, eu fiz algum uso
delas em publicações anteriores (Fairclough 1992, por exemplo).

Temas de Pesquisas Sociais


Cada capítulo do livro tratará de um ou mais temas de pesquisa social, conforme eu mostrarei no
início de cada um deles. O propósito será mostrar quais aspectos específicos da análise de textos podem
ser usados para pesquisar o tema ao qual o capítulo se refere Os temas incluem: o governo, ou a
governança, de sociedades do novo capitalismo, o hibridismo ou o obscurecimento de limites sociais
como uma característica daquilo que alguns teóricos sociais chamam de “pós-modernidade”, mudanças
no “espaço-tempo” associadas à “globalização”, conflitos pela hegemonia de determinados discursos,
aos quais se pretende conferir o status de universal, apesar do fato de os mesmos serem discursos e
representações específicas, ideologias, cidadania e espaço público, mudança social e mudança em
tecnologias de comunicação, a legitimação de ações e ordens sociais, os tipos de papéis (a palavra em
inglês aparece como character. È preciso ver como foi traduzido no apêndice para que fique coerente.)
dominantes na sociedade contemporânea (inclusive o gerente e o terapeuta), ‘informalização’ social e a
abolição de hierarquias públicas (Todos os termos em negrito aparecem no glossário).
Da perspectiva de um cientista social, o conjunto de temas abordados e os teóricos e
pesquisadores aos quais eu recorri parecerão discrepantes. Embora eu tenha selecionado temas e fontes
que, na minha opinião, seriam úteis para tratar o tema da linguagem no novo capitalismo esses
elementos deveriam ser vistos mais como ilustrativos do meu objetivo geral: refletir sobre como a teoria
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social pode informar a análise de texto e como a análise de texto poderia aprimorar a pesquisa social.
De certo modo, a diversidade de fontes e temas é vantajosa, pois pode ajudar a demonstrar que a relação
entre análise de texto e pesquisa social, que tenho defendido, não é limitada a teorias particulares,
disciplinas ou tradições de pesquisa em ciências sociais. Apesar de eu haver escolhido focalizar o tema
de pesquisa da linguagem no capitalismo novo, minha escolha não deveria levar a insinuar que análise
textual só é pertinente à pesquisa social orientada a esse tema. E claro que um único livro não pode
mostrar todas as áreas de pesquisa social que poderiam ser aprimoradas por análise de texto.
Eu utilizei o trabalho de vários teóricos sociais. Novamente, devo alertar que essa seleção de
fontes não deveria, de forma alguma, ser considerada exaustiva ou exclusiva. Os teóricos que escolhi são
aqueles com os quais achei que seria frutífero conduzir um diálogo ao trabalhar com a análise crítica de
discurso. De uma forma ou de outra, todos esses teóricos levantam questões sobre linguagem e discurso,
apesar de nenhum deles utilizar os recursos para uma análise detalhada que, como eu sugiro, podem
enriquecer esses projetos teóricos e pesquisas associadas. Veja o glossário dos principais teóricos sociais
aos quais eu me refiro.
Uma discussão sistemática da relação entre análise de discurso crítica e teoria social que pode ser
vista como um complemento a este livro se encontra em Chouliaraki e Fairclough (1999). Esse trabalho
inclui uma grande discussão a respeito da relação entre a análise de discurso crítica e as principais
teorias sociais às quais eu recorro aqui, bem como um relato detalhado da análise de discurso crítica. Em
Fairclough (2000b), os leitores encontrarão uma grande aplicação da análise de discurso crítica em um
caso particular: a linguagem do governo do “trabalho novo” (uma melhor tradução seria ‘o novo partido
dos trabalhadores inglês’), no Reino Unido.

Efeitos Sociais dos Textos


Textos como elementos de eventos sociais (ver capítulo 2) têm efeitos causais, isto é, produzem
mudanças. Em um primeiro contato, os textos podem provocar mudanças em nosso conhecimento (nós
podemos aprender coisas novas a partir deles), nossas crenças, nossas atitudes, valores e etc. Os textos
também têm efeitos em longo prazo. Pode-se dizer, por exemplo, que a experiência prolongada com
propagandas contribui para moldar as identidades das pessoas como “consumidoras”. Os textos também
podem iniciar guerras, contribuir com mudanças na educação, mudar relações industriais e muito mais.
Seus efeitos podem incluir mudanças no mundo material, como mudanças em modelos urbanos, ou
arquitetura e design de tipos específicos de prédios. Em síntese, textos podem ter efeitos causais e
mudar as pessoas (crenças, atitudes e etc), ações, relações sociais e o mundo material. Faz pouco
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sentido estudar a linguagem no novo capitalismo se nós não pensássemos que os textos têm efeitos
desse tipo, e efeitos em mudanças sociais. No entanto, conforme argumentarei adiante, posso dizer que
esses efeitos são mediados por produção de sentido.
Nós precisamos, contudo, esclarecer de que tipo de causalidade estamos falando. Não é uma
simples causalidade mecânica. Nós não podemos, por exemplo, afirmar que características específicas
dos textos provocam, de modo automático, mudanças no conhecimento ou no comportamento das
pessoas, ou ainda efeitos na área política e social. Tampouco é a causalidade o mesmo que regularidade:
pode não haver um padrão regular de causa e efeito, mas isso não significa que não haja efeitos causais.
Textos podem ter efeitos causais sem serem necessariamente regulares, pois muitos outros fatores no
contexto determinam quais textos particulares têm tais efeitos e que variedade de efeitos o texto pode ter
- por exemplo, o ponto de vista de diferentes intérpretes. (Fairclough et al. 2002)
As ciências sociais contemporâneas têm sido fortemente influenciadas pelo ‘sócio-
construtivismo’, que define o mundo como socialmente construído. Muitas teorias sobre o
construtivismo social enfatizam o papel dos textos (língua e discurso) na construção do mundo social.
Essas teorias tendem a ser mais idealistas do que realistas. Um realista diria que, embora aspectos do
mundo social sejam, definitivamente, socialmente construídos, depois de construídos, esses aspectos se
tornam realidade que afetam e limitam a construção textual (ou discursiva) do social. Nós precisamos
distinguir construção de “construal” (essa palavra aparece assim, eu não tenho idéia de como pode ser
traduzida), o que os construtivistas sociais não fazem: nós podemos construir textualmente (representar,
imaginar e etc) o mundo social, porém, os efeitos de nossas representações, ou ”construals”, depende de
vários fatores contextuais, incluindo a realidade social já existente, quem a está construindo, etc. Assim,
nós podemos aceitar uma versão moderada que afirma que o mundo social é textualmente construído,
mas não uma versão extremista (Sayer 2000).

Ideologias
Um dos efeitos causais dos textos, que tem se constituído em preocupação central para a Análise
Crítica de Discurso, são os efeitos ideológicos –os efeitos dos textos em inculcar e sustentar ou mesmo
mudar ideologias (Eagleton, 1991; Larrain, 1979; Thompson, 1984; van Dijk, 1998). Ideologias são
representações de aspectos do mundo que podem ser mostradas para contribuir para o estabelecimento,
manutenção e mudança das relações sociais de poder, dominação e exploração. Essa visão ‘crítica’ de
ideologia, vendo-a como uma modalidade de poder, contrasta com várias visões ‘descritivas’ de
ideologia como posições, atitudes, crenças, perspectivas, entre outros, de grupos sociais sem referência a
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relações de poder e dominação entre tais grupos. Representações ideológicas podem ser identificadas
em textos (Thompson 1984 glosa ideologia como ‘significações ao serviço do poder’), mas ao dizer que
as ideologias são representações que podem ser mostradas para contribuir para as relações sociais de
poder e dominação, eu estou sugerindo que a análise textual precisa ser tratada, nesse respeito, em
análise social que considera os corpos dos textos nos termos de seus efeitos nas relações de poder. E
mais, se as ideologias são representações, em princípio, elas também podem ser ‘postas em ação’ nas
encenações sociais, e ‘inculcadas’ nas identidades dos agentes sociais. As ideologias também podem ter
uma durabilidade e estabilidade que transcenda textos individuais ou corpos de textos –em termos das
distinções que eu explicarei no capítulo 2, elas podem ser associadas com discursos (como
representações), com gêneros (como encenações) e com estilos (como inculcações).
Tomemos um exemplo: a forte alegação de que na nova economia ‘global’, os países precisam
ser altamente competitivos para sobreviver. Essa idéia pode ser encontrada, explicitada ou subentendida
em vários textos contemporâneos. Ela também pode ser vista (e percebida sua associação com o discurso
neo-liberal) em uma encenação. Por exemplo, ‘novo’, mais ‘business like’ (tenho dificuldade de traduzir
essa expressão, ela diz respeito ao modo como os discursos fazem analogia com o empreendedorismos
das negociações mercadológicas. Parece que mesmo em português a expressão inglesa já está
consagrada.) são formas de administrar organizações como universidades e inculcar os estilos de
gerenciamento, evidentes em vários textos. Nós somente podemos chegar a um julgamento sobre o
propósito ideológico de tal alegação, olhando para os efeitos causais em que ela se manifesta, em
particular nas áreas de vida social (exemplo, se as pessoas acreditam que os países precisam ser
altamente competitivos para sobreviver), e perguntar se eles e suas encenações e inculcações contribuem
para a manutenção ou mudança das relações de poder (por exemplo, tornando os empregados mais
dóceis às demandas dos gerentes). Perceba que mesmo se nós chegássemos à conclusão de que tal
alegação é ideológica, isto não a tornaria, necessariamente ou simplesmente, uma inverdade: nós
podemos, por exemplo, argumentar que as relações econômicas contemporâneas realmente impõem
grande competição, embora se deva ressaltar que isto não é a inevitável ‘lei da natureza’. Embora isso
seja geralmente representado como sendo, ele é, na verdade, o produto de uma ordem econômica
particular que poderia ser mudada. Eu retornarei à discussão das ideologias no capítulo 3, com respeito
às suposições ideológicas, em particular, e no capítulo 4, com respeito à argumentação.

Texto, Significado e Interpretação


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Uma parte daquilo que se convenciona na abordagem dos textos como elementos de eventos
sociais é o fato de que nós não estamos apenas interessados nos textos, mas também em um processo
interativo de produção de significado. No caso conversação face a face, o texto é uma transcrição do que
se diz, e alguém pode perceber, com certo grau de variação, a produção de significado ao observar como
os participantes respondem um ao outro em cada turno da conversação. Vejamos um exemplo (Cameron
2001):

1. Cliente: Uma dose de Guiness (cerveja preta), por favor.


2. Garçom: Quantos anos você tem?
3. Cliente: vinte e dois
4. Garçom: Certo, já estou indo buscar.

Nos turnos 2 e 3, o atendente do bar e o cliente estão, de modo interativo, demonstrando que há
critérios subentendidos, quando se faz uma ordem de bebida alcoólica em um bar, isto é, que o cliente é
(nesse caso na Grã Bretanha) uma pessoa com mais de 18 anos. O cliente na fala 3 mostra sua intenção
em estabelecer essa idéia com o seu texto e o atendente tem como proposta resolver e esclarecer uma
certa dúvida. O cliente é capaz de compreender a intenção do balconista com a pergunta, que se mostra
relevante para aspectos que se referem a direitos legais, mas também a uma relação entre a pergunta e
reposta.
Esse exemplo sugere que há três elementos analiticamente distinguíveis: a produção do texto, o
texto propriamente dito e a recepção do texto. A produção do texto coloca em foco os produtores,
autores, falantes e escritores. A recepção do texto coloca em foco a interpretação, os intérpretes, os
leitores e os ouvintes. Na história recente das teorias do significado, foi dada a primazia a diferentes
pontos de cada um desses três elementos: primeiro, a intenção, a identidade etc do autor, em seguida, o
texto em si e, por último, o aspecto interpretativo do leitor e do ouvinte. No entanto, parece claro que os
sentidos são produzidos ao longo da interação: devemos levar em conta a posição institucional,
interesses, valores, intenções, desejos, etc. dos produtores, a relação entre os elementos em diferentes
níveis de texto, a posição institucional, conhecimento, propostas e valores, etc. dos receptores. É muito
difícil ser preciso quanto aos processos envolvidos na produção de sentido pelo motivo óbvio de que
essa produção ocorre nas mentes das pessoas, e não há caminho direto para acessá-la. Quando passamos
do diálogo falado para, por exemplo, os textos publicados, os problemas se tornam compostos porque
nós perdemos o momento da negociação do sentido no diálogo, o qual, pelo menos, nos forneceria
alguma evidência de como as coisas são intencionadas e interpretadas. Além do mais, o texto publicado
16
pode ser recontextualizado em vários processos diferentes de produção de significado e, também,
contribui para a distorção do significado, porque está aberto à interpretações diversas.
Está claro no exemplo que a produção de significado depende de não só o que é explícito em um
texto, mas também o que está implícito –aquilo que é suposto. Assim, nós poderíamos dizer que a
pergunta do Garçom de bar no turno 2 supõe que só podem ser servidas bebidas alcoólicas se os clientes
forem maior de idade. O que é ‘dito’ sempre em um texto ‘supõe’ algo que não está dito claramente,
mas há uma inferência, assim parte da análise de textos tenta expor uma idéia implícita. (veja capítulo
3).
Interpretação pode ser vista como um processo complexo com vários aspectos diferentes. Em
parte, a interpretação é uma questão de entendimento -entendimento do que expressam as palavras,
orações ou extensões mais longas de texto, do que os falantes ou escritores querem dizer (o que envolve
atribuições problemáticas de intenções). Porém, em parte, a interpretação também é uma questão de
julgamento e avaliação, por exemplo: julgar se o que alguém diz é sincero ou não, sério ou não, julgar se
as alegações das pessoas, quanto ao que está implícito ou explícito, são verdades; julgar se o que as
pessoas dizem ou escrevem estão de acordo com os dados sociais, institucionais etc, relacionando com o
contexto onde a fala ocorre ou como essas relações se mistificam. Além disso, há um elemento
explicativo para a interpretação –geralmente, nós tentamos entender por que as pessoas falam ou
escrevem de determinada maneira, ou mesmo, tentamos identificar causas menos imediatas. Tendo dito
isso, é claro que alguns textos passam por uma gama muito maior de trabalho interpretativo do que
outros: alguns textos são muito transparentes, outros mais ou menos opacos para os mesmos intérpretes;
interpretação é, às vezes, fácil e efetivamente automática, enquanto outras vezes é altamente reflexiva,
envolvendo muita trabalho de pensamento elaborado sobre o seu significado, ou por que alguma coisa
foi dita ou escrita de determinada maneira.(essa frase em verde aparece assim no final do parágrafo na
página 11. Além de ser uma repetição do que havia sido dito anteriormente, ela está totalmente
deslocada. Sugiro que seja suprimida. Ronaldo).
O foco deste livro é bastante específico: analisar textos com uma visão de seus efeitos sociais
(discutidos abaixo). Os efeitos sociais dos textos dependem da produção de sentido. Poderíamos dizer
que os efeitos sociais de textos são gerados pela produção de sentido, ou melhor, que os sentidos têm
mais efeito do que os textos em si. Porém, um recurso necessário para qualquer conhecimento de
produção de sentido é a capacidade de analisar textos de modo a jogar luz sobre o processo de produção
de sentido, e a minha prioridade neste livro é fornecer tal recurso. Assim, eu não desenvolverei aqui um
curso completo sobre o processo de produção de sentido, embora minha abordagem pressuponha uma
necessidade de tal conhecimento. Entretanto, os textos são analisados dinamicamente, ou seja,
17
procuraremos analisar como agentes fazem ou ‘texturizam’ textos, estabelecendo relações entre seus
elementos. Isso significa que minha abordagem nesta obra, de análise textual, moverá em direção à
produção de textos, mais que em direção à recepção e interpretação de textos. Espero, entretanto, que o
que foi dito anteriormente tenha deixado claro que eu não subentendo nenhum tipo de reducionismo de
recepção ou interpretação.
18
2. TEXTOS, EVENTOS SOCIAIS E PRÁTICAS SOCIAIS

Temas de análise de texto

Principais tipos de significado: ação, representação, identificação


Gêneros, discursos e estilos
Cadeia de gêneros e cadeia de textos
Mistura de gêneros
Análise interdiscursiva

Temas de pesquisa social

Estrutura e agência
Estrutura social, prática social, evento social
Dialética do discurso
Globalização e novo capitalismo
Mediação
Recontextualização
Governância
Hibridismo e ‘pós-modernismo’

Textos são vistos neste livro como partes de eventos sociais. Uma das maneiras pelas quais as
pessoas podem agir e interagir no curso de eventos sociais é pela fala ou pela escrita. Não são os únicos
meios. Alguns eventos sociais têm caráter altamente textual, outros não. Por exemplo, embora a fala
certamente faça parte de uma partida de futebol (ex: um jogador pedindo a bola), é um elemento menos
importante, a ação preponderante é não-lingüística. De modo oposto, a maior parte da ação em uma
palestra é lingüística - o que o palestrante diz, o que está escrito em resumos e folhetos, as anotações
feitas pelos ouvintes. Mas, nem mesmo uma palestra é totalmente lingüística – nela está incluída
também performance corporal assim como lingüística, e pode envolver ação física como a utilização de
projetores etc.

No capítulo 1, discuti os efeitos causais dos elementos textuais e dos eventos na vida social. Mas
eventos e textos também têm causas – fatores que causam com que um texto em particular ou um tipo de
texto tenha suas características intrínsecas. Podemos, grosso modo, distinguir dois ‘poderes’ causais que
moldam textos: de um lado, a estrutura e a prática social; de outro, agentes sociais, ou seja, as pessoas
envolvidas nos eventos sociais (Archer 1995, Sayer 2000). A observação para que tenhamos cautela
acerca da causalidade se aplica também aqui: não estamos falando de simples causalidade mecânica ou
presumindo regularidades previsíveis.
19
Neste capítulo, focalizarei a relação entre textos, eventos, práticas e estruturas sociais, depois
de alguns comentários preliminares sobre agência de participantes em eventos, um tema ao qual
retornaremos, especialmente no capítulo final. Grande número de temas de pesquisa social é relevante
neste contexto, e me referirei particularmente a: economia política do novo capitalismo (Jessop 2000),
teorização do discurso dentro de uma filosofia de ciência ‘realista crítica’ (Fairclough, Jessop and Sayer
2002), teorias de globalização (Giddens 1991, Harvey 1990) e mídia/midiatização (Silverstone 1999);
pesquisas na mudança entre governo e ‘governança’ no novo capitalismo (Bjerke 2000, Jessop 1998,
forthcoming a); o conceito de ‘recontextualização’ desenvolvido por Bernstein na sua sociologia
educacional (Bernstein 1990), e o trabalho sobre o ‘hibridismo’ ou obscurecimento de fronteiras que
alguns teóricos sociais associam com ‘pós-modernidade’ (Harvey 1990, Jameson 1991). Também
discutirei os conceitos de ‘gênero’ e ‘discurso’, os quais têm recebido grande atenção na pesquisa e na
teoria social (‘gênero’, nos estudos sobre mídia, ‘discurso’ especialmente nos trabalhos de Foucault).

Textos e agentes sociais

Agentes sociais não são ‘livres’, são socialmente restritos, mas suas ações não são na totalidade
socialmente determinadas. Os agentes têm seus próprios ‘poderes causais’ que não são reduzíveis aos
poderes causais das estruturas e práticas sociais (para uma visão do relacionamento entre estrutura e
agência, veja Archer 1995, 2000). Agentes sociais tecem textos, configuram relações entre elementos de
textos. Há limitações estruturais nesse processo – por exemplo, a gramática (natural) de uma língua
permite certas combinações e ordenamentos de formas gramaticais e não outras (ex.: ‘but book the’ não
é uma sentença do inglês - ‘o mas livro’ não é uma sentença do português); e se o evento social é uma
entrevista, há convenções de gênero que a organizam. Mesmo assim, os agentes sociais têm grande
amplitude de liberdade na composição (texture: tecitura) dos textos.

Tomemos o seguinte extrato do Exemplo 1 (veja Apêndice, pág. XXX) como paradigma. O
gerente está falando acerca de ‘cultura’ de pessoas na sua cidade natal de Liverpool:
“Eles são totalmente desconfiados de qualquer mudança. Totalmente desconfiados de qualquer
pessoa que queira ajudá-los. Imediatamente pensam na exploração. Também foram educados
para acreditar que é inteligente “levar vantagem sobre os outros”. Então todos fazem isso. E as
linhas de demarcação que os sindicatos têm permitido impor nessas áreas, por causa disso, as
tornam totalmente inflexíveis ao ponto de serem destrutivas. Sei disso. Posso ver”.
“E como isso se relaciona ao que está acontecendo aqui?”
“Bem, eu ia dizer, como se muda esse tipo de cultura negativa?”
20
Note, em particular, a relação semântica estabelecida entre ‘cultura negativa’ e ser ‘totalmente
desconfiados’ de mudança, ‘pensam na exploração’, tentando ‘levar vantagem sobre os outros’, ‘linhas
de demarcação’, ‘inflexíveis’ e ‘destrutivas’. Podemos ver isso como a tessitura de uma relação
semântica de ‘metonímia’, i.e. a relação entre o todo (‘cultura negativa’) e suas partes. Nenhum
dicionário identificaria tal relação semântica entre essas expressões – a relação é construída (tecida) pelo
gerente. Podemos atribuir essa construção de significado ao gerente como agente social. E note o que a
tessitura de significado envolve aqui: colocação de expressões existentes em uma nova relação de
equivalência como co-instâncias de ‘cultura negativa’. O significado não tem uma presença preexistente
nessas palavras e expressões, é um efeito das relações que são organizadas entre elas (Merleau-Ponty,
1964).

Eventos sociais, práticas sociais, estruturas sociais


Voltaremos à agência mais tarde, mas quero focalizar, no momento, a relação entre eventos
sociais, práticas sociais e estruturas sociais. A abordagem reflete o trabalho recente feito em colaboração
com teóricos sociais do discurso numa filosofia de ciência ‘realista crítica’ (Fairclough, Jessop e Sayer,
2002).
Estruturas sociais são entidades muito abstratas. Pode-se pensar em estrutura social (tal como
uma estrutura econômica, uma classe social, uma sistema de castas, ou uma língua) como algo potencial,
como um grupo de possibilidades. No entanto, a relação entre o que é estruturalmente possível e o que
realmente acontece, entre estruturas e eventos, é bastante complexa. Essa relação é mediada – há
entidades organizacionais intermediárias entre estruturas e eventos. Vamos chamá-las de ‘práticas
sociais’. Exemplos disso seriam práticas de ensino e práticas de administração escolar. Práticas sociais
podem ser tidas como meios de controlar a seleção de certas possibilidades estruturais e a exclusão de
outras, e a retenção dessas seleções no decurso do tempo, em áreas particulares da vida social. Práticas
sociais são estabelecidas em rede de maneira particular e cambiante – por exemplo, recentemente houve
mudança na maneira como práticas de ensino e pesquisa são conectadas em rede com práticas de
administração em instituições de educação superior, uma ‘administralização’ (ou mais genericamente
‘marquetização’, Fairclough, 1993) da Educação Superior.

A linguagem (e mais amplamente ‘semiosis’ - ‘semiótica’, incluindo, por exemplo, significação e


comunicação por meio de imagens visuais) é um elemento do social em todos os níveis.
Esquematicamente:
21

Estrutura social: línguas


Práticas sociais: ordens de discurso
Eventos sociais. textos

As línguas podem ser consideradas dentro da estrutura social abstrata a que estava me referindo.
Uma língua define um certo potencial, certas possibilidades e exclui outras – algumas maneiras de
combinar elementos lingüísticos são possíveis, outras não (ex.: ‘the book’ é possível em inglês, ‘book
the’ não é). Mas textos como elementos de eventos sociais não são simplesmente os efeitos dos
potenciais definidos pelas línguas. Precisamos reconhecer entidades organizacionais intermediárias de
um tipo lingüístico específico, os elementos lingüísticos de redes de práticas sociais. Vou chamá-los de
ordens de discurso (veja Chouliaraki e Fairclough, 1999; Fairclough, 1992). Uma ordem de discurso é
uma rede de práticas sociais no aspecto lingüístico (da língua). Os elementos de ordens de discurso não
são coisas como nomes e sentenças (elementos de estruturas lingüísticas), mas discursos, gêneros e
estilos (vou diferenciá-los em breve). Esses elementos selecionam certas possibilidades definidas pelas
línguas e excluem outros – eles controlam a variabilidade lingüística para certas áreas da vida social.
Então ordens de discurso podem ser vistas como organização e controle social da variação lingüística.
Há mais um ponto: conforme nos movemos de estruturas abstratas para eventos concretos, torna-
se cada vez mais difícil separar linguagem de outros elementos sociais. Na terminologia de Althusser,
linguagem se torna cada vez mais ‘superdeterminada’ (‘overdetermined’) por outros elementos sociais
(Althusser e Balibar, 1970). Então no nível de estruturas abstratas, podemos falar mais ou menos
exclusivamente acerca de linguagem – mais ou menos, porque teorias ‘funcionais’ da linguagem vêem
até mesmo gramáticas de línguas como socialmente moldadas (Halliday, 1978). O jeito que defini
ordens de discurso torna claro que, nesse nível intermediário, estamos tratando com uma
‘superdeterminação’ muito maior da linguagem por outros elementos sociais – ordens de discurso são a
organização e o controle social da variação lingüística, e os seus elementos (discursos, gêneros, estilos)
são, correspondentemente, categorias não puramente lingüísticas, mas que fazem o corte através da
divisão entre linguagem e ‘não-linguagem’, entre o discursivo e o não-discursivo. Quando chegamos aos
textos como elementos de eventos sociais, a ‘superdeterminação’ da linguagem por outros elementos
sociais torna-se massiva: textos não são apenas efeitos de estruturas lingüísticas e de ordens de discurso,
são também efeitos de outras estruturas sociais, e de práticas sociais em todos os seus aspectos, de
maneira que se torna difícil separar os fatores que modelam textos.
22

Práticas sociais
Práticas podem ser vistas como articulações de diferentes tipos de elementos sociais associados
com áreas particulares da vida social – a prática social de ensino em sala de aula na educação britânica
contemporânea, por exemplo. O ponto importante acerca das práticas sociais da perspectiva deste livro é
que elas articulam o discurso (enquanto linguagem) juntamente com outros elementos sociais não-
discursivos. Podemos ver qualquer prática social como uma articulação destes elementos:

Ação e interação
Relações sociais
Pessoas (com crenças, atitudes, histórias etc.)
O mundo material
Discurso

Então, por exemplo, ensino de sala de aula articula conjuntamente meios particulares de uso da
linguagem (tanto por parte dos professores como dos alunos) com as relações sociais de sala de aula, a
estrutura e o uso da sala de aula como espaço físico e assim por diante. As relações entre esses diferentes
elementos da prática social são dialéticas, conforme argumenta Harvey (Fairclough, 2000a; Harvey,
1996a): Essa é uma maneira de apresentar o fato aparentemente paradoxal de que, embora o elemento
discursivo de uma prática social não seja o mesmo que a sua relação social, por exemplo; cada um, em
um sentido, contém ou internaliza o outro – a relação social é em parte de natureza discursiva, o discurso
é em parte relação social. Eventos sociais são causativamente moldados por redes de práticas sociais –
práticas sociais definem maneiras particulares de ação, e embora os eventos reais possam, mais ou
menos, diferir dessas definições e expectativas (porque eles perpassam diferentes práticas sociais e
também por causa dos poderes causativos dos agentes sociais), eles ainda são, em parte, moldados por
práticas sociais.

Discurso como elemento de práticas sociais: gêneros, discursos e estilos


Podemos dizer que discurso figura de três principais maneiras na prática social. Figura como:

Gênero (modos de agir)


Discursos (modos de representar)
Estilos (modos de ser)

Uma das maneiras de agir e interagir é por meio da fala ou da escrita, assim discurso figura
primeiramente 'como parte da ação'. Podemos distinguir diferentes gêneros como diferentes maneiras de
23
(inter) agir discursivamente – entrevista é um gênero, por exemplo. Em segundo lugar, o discurso
figura nas representações que sempre são partes de práticas sociais – representações do mundo material,
de outras práticas sociais, representações próprias reflexivas da prática em questão. A representação é
claramente substância discursiva e, podemos distinguir diferentes discursos, que podem representar a
mesma área do mundo de diferentes perspectivas ou posições. Note que 'discurso' está sendo usado aqui
em dois sentidos: abstratamente, como um substantivo abstrato, com o significado de linguagem ou
outros tipos de semiose como elemento da vida social; mais concretamente, como substantivo contável,
com o significado de maneiras particulares de representar parte do mundo. Um exemplo de discurso no
último sentido seria o discurso político do 'Novo Trabalhismo1', como oposto ao discurso político do
“velho” 'Trabalhismo', ou o discurso político do 'Thatcherismo' (Fairclough, 2000b). Em terceiro lugar e
finalmente, discurso figura conjuntamente com expressões corporais ao constituir modos particulares de
ser, identidades sociais ou pessoais particulares. Chamarei o aspecto discursivo desse item estilo. Um
exemplo seria o estilo de um tipo específico de gerente – seu modo de utilização da linguagem como
recurso para identificação pessoal.
Os conceitos de 'discurso' e 'gênero' em particular são usados em uma variedade de disciplinas e
teorias. A popularidade do 'discurso' na pesquisa social é devida em grande parte a Foucault (1972).
'Gênero' é utilizado em estudos culturais, estudos da mídia, filmografia, entre outros (veja Fiske 1987,
Silverstone 1999). Esses conceitos estão presentes em várias disciplinas e teorias, e podem operar como
'pontes' de uma para as outras – como foco para um diálogo entre elas, mediante o qual perpectivas de
uma podem abrir o desenvolvimento de outras.

Textos como ação, representação, identificação


As abordagens 'funcionais' da linguagem enfatizam a 'multifuncionalidade' dos textos. A
Lingüística Sistêmico-Funcional, por exemplo, afirma que os textos têm simultaneamente as funções
'ideacional', 'interpessoal' e 'textual'. Isto é, os textos simultaneamente representam aspectos do mundo
(o mundo físico, o social e o mental); interpretam as relações sociais entre participantes de eventos
sociais e as atitudes, desejos e valores dos participantes; de modo coerente e coesivo conectam partes de
textos, e conectam textos com seus contextos situacionais (Halliday, 1978, 1994). Ou melhor, as pessoas
fazem tudo isso no processo de construção de significados nos eventos sociais, que inclui produção
(tessitura) de textos.

1 Há necessidade de criar uma nota do tradutor par explicar o conceito.


24
Também verei os textos como 'multifuncionais' nesse sentido, embora de maneira bastante
diferente, de acordo com a distinção entre gêneros, discursos e estilos como as três principais maneiras
em que o discurso figura como parte da prática social – modos de agir, modos de representar, modos de
ser. Ou, usando outras palavras: a relação do texto com o evento; com o que há de mais amplo no mundo
físico e social, e com as pessoas envolvidas no evento. No entanto, prefiro falar sobre três principais
tipos de significações e não de funções:

Principais tipos de significação textual


Ação
Representação
Identificação

A representação corresponde à função 'ideacional' de Halliday; Ação se aproxima de sua função


'interpessoal', embora a ênfase maior seja no texto como modo de (inter)agir em eventos sociais, e possa
ser visto como que incorporando Relação (representando relações sociais); Halliday não diferencia uma
função separada para identificação – a maior parte do que eu incluo como Identificação está na função
'interpessoal' de Halliday. Não faço distinção de uma função 'textual' separadamente, antes a incorporo
com a Ação.
Podemos ver Ação, Representação e Identificação simultaneamente em textos inteiros e em
pequenas partes de textos. Tome como parâmetro a primeira sentença do Exemplo 1: 'A cultura em
negócios de sucesso é diferente daquela existente em negócios malsucedidos'. Aqui temos a
representação do relacionamento entre duas entidades – 'x é diferente de y'. A sentença também é (Ação)
uma ação, que implica uma relação social: o gerente está dando ao entrevistador informação, dizendo
algo a ele, e isso implica, de maneira ampla, uma relação social entre alguém que sabe e alguém que não
sabe – as relações sociais desse tipo de entrevista são uma variante específica disto, relações de alguém
que detém conhecimento e opiniões e alguém que as está inquirindo. Informar, avisar, prometer,
advertir, entre outros, são modos de agir. A sentença também é (Identificação) uma promessa, um
comprometimento, um julgamento: ao dizer 'é diferente' em vez de 'talvez é diferente' ou 'pode ser
diferente', o gerente está se comprometendo intensamente. Focalizar a análise de textos na interação de
Ação, Representação e Identificação traz uma perspectiva social para o âmago do texto, para o seu mais
afinado detalhe.
Há, como tenho indicado, uma correspondência entre Ação e gêneros, Representação e discursos,
Identificação e estilos. Gêneros, discursos e estilos são, na ordem, meios relativamente estáveis e
duráveis de agir, representar e identificar. São tidos como elementos de ordens de discurso no nível da
25
prática social. Quando analisamos textos específicos como parte de eventos específicos, estamos
realizando duas tarefas interconexas: (a) olhando-as em termos dos três aspectos do significado: Ação,
Representação e Identificação e como são realizados nos diferentes traços de textos (vocabulário,
gramática, etc); (b) estabelecendo a ligação entre o evento social concreto e a prática social mais abstrata
ao perguntar que gêneros, discursos e estilos estão ali delineados, e como os diferentes gêneros,
discursos e estilos se articulam no texto?

Relações dialéticas
Até o momento tenho escrito como se os três aspectos do significado ( gêneros, discursos e
estilos) fossem bastante separados, mas a relação entre eles é mais sutil e complexa – é uma relação
dialética. Foucault (1994: 318) faz distinções muito semelhantes aos três aspectos do significado, e ele
também sugere o caráter dialético da relação entre eles (embora não use a categoria de dialética):
“Esses sistemas, na prática, originam-se de três grandes áreas: relações de controle sobre as coisas, relações de
ação sobre outros, relações consigo mesmo. Isso não significa que cada uma dessas três áreas é completamente
estranha às outras. É sabido que controle sobre as coisas é mediado por relações com outros; e relações com
outros, por sua vez, requerem relação da pessoa com a própria pessoa, e vice-versa. Mas temos três eixos cuja
especificidade e cujas interconexões precisam ser analisadas: o eixo do conhecimento, o eixo do poder, o eixo da
ética... Como somos constituídos como sujeitos do nosso próprio conhecimento? Como somos constituídos como
sujeitos que exercem ou se submetem a relações de poder? Como somos constituídos como sujeitos morais de
nossas próprias ações?”

Há muitos pontos aqui. Primeiro, as várias formulações de Foucault apontam para a


complexidade dentro dos três aspectos de significado (que correspondem aos três 'eixos' de Foucault): A
Representação tem a ver com conhecimento e por meio dele 'controle sobre coisas'; a Ação está
relacionada, de modo genérico, com a relação com os outros, mas também' com a ação sobre os outros' e
com o poder. Identificação se liga com as relações com a própria pessoa, ética e 'assuntos morais'. Essas
várias formulações apontam para a possibilidade de enriquecer o nosso entendimento de textos mediante
a conexão dos três aspectos do significado com uma variedade de categorias nas teorias sociais. Outro
exemplo pode ser contemplar Identificação como algo que traz o que Bourdieu (Bourdieu and Wacquant
1992) chamou de 'habitus' das pessoas envolvidas no evento para consideração na análise de texto, ou
seja, suas disposições personificadas de ver e agir de certos modos baseados na socialização e
experiência, que é, em parte, disposição de falar e de escrever de certo modo.
26
Em segundo lugar, embora os três aspectos do significado precisem ser distinguidos para
propósito analítico e, nesse sentido, são diferentes uns dos outros, não são distintos, não são totalmente
separados. Devo dizer, de maneira diferente da de Foucault, que eles são dialeticamente relacionados, i.
e. há um sentido em que cada um 'internaliza' os outros (Harvey, 1996a). Isso é sugerido nas três
questões no final da citação: todos os três podem ser vistos em termos de relação envolvendo as pessoas
no evento ('sujeitos') – suas relações com o conhecimento, com os outros (relações de poder), e consigo
mesmo (como 'sujeitos morais'). Ou podemos dizer, por exemplo, que Representações particulares
(discursos) podem desempenhar de modo particular Ações e Relações (gêneros), e apontar modos de
Identificação (estilos). Fica assim esquematicamente:

Dialética do discurso
Discursos (significado representacional) interpretados em gêneros (significados
acionais)
Discursos (significado representacional) apontados em estilos (significados
identificacionais)
Ações e identidades (incluindo gêneros e estilos) representados em discursos
(significado representacional)

Ilustrativamente (Exemplo 14) uma sessão de 'avaliação de treinamento', pode ser vista como
incluindo um discurso de avaliação (ex: um modo particular de representação de um aspecto das
atividades do corpo docente universitário), mas também especifica como o discurso deve ser
interpretado em um procedimento de avaliação que é formado por gêneros como a entrevista de
avaliação, e sugere modos associados de pessoas se identificarem dentro de estilos ligados à avaliação.
Então podemos dizer que discursos de avaliação podem ser dialeticamente 'internalizados' em gêneros e
estilos (Fairclough, 2001a). Ou, de outra maneira, podemos dizer que tais gêneros e estilos pressupõem
representações particulares, extraídas de discursos específicos. Essas discussões são complexas, mas o
ponto principal é que a distinção entre os três aspectos do significado e entre gêneros, discursos e estilos
é uma distinção analítica necessária que não as impede de 'fluirem' umas nas outras de várias maneiras.

Mediação
A relação entre textos e eventos sociais é freqüentemente mais complexa do que eu indiquei até
agora. Muitos textos são 'mediados' pela 'comunicação de massa', ou seja, instituições que 'fazem uso da
tecnologia de produção de cópias para disseminar a comunicação' (Luhmann, 2000). Elas envolvem
mídias como impressoras, telefone, rádio, televisão, Internet. Em alguns casos – mais obviamente o
27
telefone – as pessoas são co-presentes no tempo mas distantes no espaço, e a interação é de um a um.
É o mais próximo da conversação normal. Outros são bem diferentes da conversação normal – um livro
impresso é escrito por uma pessoa ou por um pequeno número de autores, mas lido por um número
indefinido de pessoas dispersas no tempo e no espaço. Nesse caso, o texto conecta eventos sociais
diferentes – o ato de escrever o livro por um lado, e os muitos e vários eventos sociais que incluem ler
(olhar, contemplar, referir a etc.) o livro – uma viagem de metrô, uma aula na escola, uma visita a uma
livraria, e assim por diante.
Mediação, de acordo com Silverstone (1999), envolve o 'movimento do significado' – de uma
prática social a outra, de um evento a outro, de um texto a outro. Conforme está implícito, mediação não
envolve apenas um texto individual ou tipos de texto, é em muitos casos um processo complexo que
abarca o que chamarei de 'cadeia' ou 'redes' de textos. Pense, por exemplo, em uma história no jornal. Os
jornalistas escrevem os artigos dos periódicos com base em uma grande variedade de fontes –
documentos escritos, falas, entrevistas, etc –, os artigos são lidos por aqueles que compram o jornal e
podem evocar uma variedade de outros textos – conversações sobre as notícias, se a história for
importante pode ser que apareça em outros noticiários e até mesmo na televisão, e assim por diante. A
'cadeia' ou 'rede' de textos nesse caso, então, inclui variado número de diferentes tipos de texto. Há uma
relação bastante regular e sistemática entre alguns deles – por exemplo, jornalistas produzem artigos
com base em fontes de maneira um tanto regular e previsível, transformando os materiais da fonte de
acordo com convenções bem estabelecidas (como no caso de transformar uma entrevista em uma
reportagem).
As sociedades modernas complexas envolvem a formação em rede de diferentes práticas sociais
através de diferentes domínios ou campos da vida social (ex: a economia, educação, vida familiar) e
perpassam diferentes escalas da vida social (global, regional, nacional e local). Os textos são uma parte
crucial dessas relações em rede – as ordens do discurso associadas com redes de práticas sociais
especificam relações particulares em cadeias e tessituras entre tipos de textos. As transformações do
novo capitalismo podem ser vistas como transformações no encadeamento de práticas sociais, que
incluem transformações em ordens de discurso, e transformações em cadeias e tessituras de textos, e em
'cadeias de gêneros' (veja abaixo). Por exemplo, o processo de 'globalização' inclui a capacidade
reforçada para que certas pessoas possam agir e moldar as ações de outros em distâncias espaço-
temporais consideráveis (Giddens, 1991; Harvey, 1990). Isso depende parcialmente de processos mais
complexos de mediação textual de eventos sociais, e relações mais complexas de encadeamento e
tessitura entre diferentes tipos de texto (facilitados por novas tecnologias de comunicação,
28
principalmente a Internet). E a capacidade de influenciar ou controlar processos de mediação é um
importante aspecto do poder nas sociedades contemporâneas.
'Cadeias de gêneros' têm significação específica: são diferentes gêneros que se ligam com
regularidade, envolvendo transformações sistemáticas de gênero em gênero. Cadeias de gêneros
contribuem para a possibilidade de ações que transcendem diferenças no espaço e no tempo, unindo
eventos sociais a práticas sociais diferentes, países diferentes, tempos diferentes, facilitando a
capacidade reforçada para 'ação à distância' que tem sido considerada um traço definidor da
'globalização' contemporânea, e, dessa maneira, tem facilitado o exercício do poder.

Cadeias de gêneros
Os extratos do exemplo 3 (tirados de Iedema, 1999) dão uma noção de uma cadeia de gêneros. O
exemplo se relaciona a um projeto planejando a renovação de um hospício. Os extratos são de uma
entrevista com o 'arquiteto planejador' responsável por fazer um relatório escrito com base em consultas
entre 'acionistas' do projeto, a partir de uma reunião com os 'acionistas' e de um relatório. O que
acontece é que os acionistas estão escolhendo entre as possíveis maneiras de tocar o projeto, e
procurando argumentos fortalecedores de sua escolha para colocar no relatório. A reunião de acionistas
e o relatório escrito são elementos da cadeia de gêneros nesse caso.
A análise de Iedema mostra duas coisas: em primeiro lugar, que a linguagem da reunião de
acionistas é 'traduzida' para a linguagem do relatório de modo bastante sistemático – uma tradução que
reflete a diferença de gênero. Em segundo lugar, que, no entanto, essa tradução é - antecipada na própria
reunião – diferentes contribuições em diferentes estágios (representadas nos extratos) começam o
processo de tradução, levando-nos à linguagem do relatório. Participantes da reunião ajudam na
construção de uma lógica bem argumentada e formal do relatório – uma característica do gênero
relatório oficial.
No extrato 1 da reunião, vemos a característica de informalidade de tomada de decisão de tais
encontros conforme o gerente de projeto enumera argumentos em favor da opção preferida. No extrato
2, o 'arquiteto planejador' começa a construir a lógica do relatório, embora ainda de maneira
conversacional e pessoal que interpreta as razões dos acionistas para dar suporte a opção preferida (ex.:
'Acho que estávamos felizes, essa é a razão porque a solução encontrada foi surpreendente'). O extrato 3
dá um importante impulso rumo ao relatório ao transformar os argumentos para a opção em discurso
indireto (ex.: 'o que você está dizendo é que a opção D é preferida porque é a mais compacta...') Veja o
capítulo 3 acerca do discurso indireto. Finalmente, o extrato do próprio relatório mostra uma lógica
29
impessoal na qual os conectores lógicos (ex.: 'This means' (isto significa), 'a solução', 'desta maneira')
estão prioritariamente localizados no início das sentenças e cláusulas ('tematizados' em uma
terminologia que introduzirei mais tarde). Esses comentários na lógica do argumento ilustram como ao
se movimentar ao longo de uma cadeia de gêneros, uma transformação específica na linguagem se
impõe.
Podemos também ver o Exemplo 1 como parte de uma cadeia de gêneros. É um extrato de uma
entrevista etnográfica entre um pesquisador acadêmico e um gerente de negócios. O exemplo é tirado de
um livro cujo gênero principal é análise acadêmica. Além do mais, há um apêndice ao livro contendo
'Um Esquema de Competências de Gerenciamento' produzido, para a companhia pelo autor, com base
em sua pesquisa, um gênero de educação gerencial. Podemos assim ver a entrevista etnográfica como
parte de uma cadeia de gêneros. Mais especificamente, pode ser vista como um artifício de gênero para
ter acesso à linguagem de gerenciamento prático, parte de uma cadeia de gêneros que a transforma na
linguagem da análise acadêmica, e, por sua vez, transforma-a na linguagem do gerencialmente
educacional – uma linguagem que entra para a governânça de organizações empresariais. Essa maneira
de descrever salienta a significação das cadeias de gêneros na rede de práticas sociais (nesse caso,
pesquisa acadêmica e empresarial) e em ação através de diferentes redes de práticas sociais.

Gêneros e governância2
Gêneros são importantes para a sustentação da estrutura institucional da sociedade
contemporânea – relações estruturais entre governo (local), comércio, universidades, mídia etc.
Podemos pensar em tais instituições como elementos da engrenagem da sociedade de governância
(Bjerke, 2000), e em tais gêneros como gêneros de governância. Estou utilizando o termo 'governância'
aqui em um sentido bastante amplo para qualquer atividade dentro de uma instituição ou organização
direcionada para regular ou gerenciar alguma outra (rede de) prática(s) social(ais). A crescente
popularidade do termo 'governância' está associada com uma busca por maneiras de gerenciar a vida
social (freqüentemente chamada de 'rede', 'sociedade' etc.) que evitam tanto os efeitos caóticos do
mercado como da hierarquia dos estados. Embora, como Jessop aponta, governância contemporânea
pode ser vista como uma combinação de todas essas formas – mercados, hierarquias, redes (Jessop
1998). Podemos contrastar gêneros de governância com 'gêneros aplicados (experienciais) (practical
genres) – grosseiramente, gêneros que se apresentam fazendo mais do que gerenciando o jeito que as
coisas são feitas. Pode parecer a primeira vista surpreendente ver a entrevista etnográfica do exemplo 1

2 Ver se este é o termo mais adequado, por se tratar de um neologismo.


30
como gênero de governância, mas o fato de classificá-la assim torna-se mais claro quando colocamos
a entrevista etnográfica, como a do exemplo, em uma cadeia de gêneros. Isso mostra de maneira
relativamente concreta o que é discutido mais abstratamente – a extensiva incorporação da pesquisa
acadêmica em redes e processos de governância.
Os gêneros de governância são caracterizados por propriedades específicas de recontextualização
– a apropriação de elementos de uma prática social dentro de outra, colocando a primeira no contexto da
última, e transformando-a de maneira específica no processo (Bernstein, 1990; Chouliaraki e Fairclough,
1999). A 'Recontextualização' é um conceito desenvolvido na sociologia da educação (Bernstein, 1990)
que pode ser frutiferamente operacionalizado, trabalhado, dentro de discurso e análise textual. No caso
do Exemplo 1, as práticas (e linguagem) de gerenciamento são recontextualizadas (e assim
transformadas) dentro de práticas acadêmicas (e de linguagem), que, por sua vez, são recontextualizadas
dentro de empresas na forma de educação gerencial. Por exemplo, a conclusão para o argumento do
gerente na entrevista ('qualquer negócio tem de manter confiança em todos aqueles com que se relaciona
se pretende sobreviver') é recontextualizado na análise acadêmica como evidência de que gerentes
apreciam a necessidade de 'confiança e reciprocidade', que conforme sugerido pode ser interpretado
como 'uma forma de prática na qual há reconhecimento de ambos os lados como sujeitos
interdependentes'. Uma diretriz no “Esquema de Gerenciamento de Competências” formula tal
interpretação como: 'Bons gerentes são sensíveis às atitudes e sentimentos de todos aqueles com quem
trabalham; tratam os outros e suas idéias com respeito; ouvem cuidadosamente as idéias e pontos de
vista dos outros, trabalhando ativamente para extrair contribuições positivas de todos.' É claro que a
diretriz está presumivelmente baseada no que muitos gerentes disseram, e não apenas na assertiva desse
trecho. Mas podemos representar esse fato como um movimento de apropriação, transformação e
colonização – uma terminologia que focaliza as relações sociais de poder na governância das quais essas
recontextualizações fazem parte.
Os gêneros de governância incluem os gêneros promocionais, gêneros que têm o propósito de
'vender' produtos, marcas, organizações ou indivíduos. Um dos aspectos do novo capitalismo é a imensa
proliferação de gêneros promocionais (veja Wernick, 1991) os quais constituem uma parte da
colonização de novas áreas da vida social em mercados. O Exemplo 2 ilustra isso: dentro do novo
capitalismo, cidades e estados precisam se promover para atrair investimentos (veja a seguir 'mistura de
gêneros' para discussão deste exemplo).
Outro ponto a ser notado em relação ao Exemplo 1 é que o movimento da fala gerencial na
entrevista etnográfica para 'Um Esquema de Competências Gerenciais' é um deslocamento do nível local
para o global. Podemos ver a tão chamada 'globalização' na realidade como uma questão de mudança
31
nas relações entre diferentes escalas da vida e da organização social (Jessop, 2000). Então esse é um
movimento em 'escala', no sentido de que a pesquisa em uma organização de negócio específica leva a
preceitos (ex: 'Bons gerentes procuram e criam oportunidades, iniciam ações e querem assumir “a
primeira posição no jogo”) que podem ser aplicados a qualquer organização comercial em qualquer
lugar do mundo. E, na verdade, os recursos para educação gerencial produzidos por acadêmicos entram
no circuito internacional. Os gêneros de governância têm, mais amplamente, essa propriedade de ligar
diferentes escalas – conectando o local e o particular ao nacional / regional / global e geral. Isso indica
que gêneros são importantes para sustentar não apenas as relações estruturais entre, por exemplo, o
mundo acadêmico e o mundo dos negócios, mas também escalonar relações entre o local, o nacional, o
regional (ex.: União Européia) e o 'global'. Então mudanças de gênero são pertinentes para
reestruturação e reescalonamento da vida social no novo capitalismo.
O Exemplo 3 é ainda outra ilustração: a reunião de acionistas é um evento local, no entanto, um
dos efeitos da sua recontextualização em um relatório é a mudança para uma escala global – tais
relatórios filtram o que é específico de eventos e situações locais em um movimento para uma lógica
impessoal que pode acomodar um sem fim de eventos e casos locais específicos. Os relatórios podem
assim circular nacionalmente, regionalmente (ex: dentro da UE) e globalmente, e dessa maneira fazer a
ligação entre o local e o global. Parte do efeito da 'filtragem' conforme nos movimentamos ao longo da
cadeia de gêneros recai sobre o discurso: discursos que se concentram em um gênero (ex: reuniões)
podem ser 'filtrados' no deslocamento para outro (ex: relatório), de maneira que a cadeia de gêneros
opera como agente regulador para selecionar e privilegiar alguns discursos em detrimento de outros.
Muitas ações e interações nas sociedades modernas são 'mediadas' dessa maneira. A (inter)ação
mediada é a 'ação à distância', ação que envolve participantes que estão distantes um do outro no tempo
e/ou no espaço, que dependem de alguma tecnologia de comunicação (impressora, televisão, Internet
etc.). Os gêneros de governância são essencialmente gêneros mediados especializados em 'ação à
distância' – os dois exemplos anteriores envolvem mediação por impressão, um livro acadêmico e um
relatório escrito. Aquilo a que nos referimos usualmente como 'mass midia' é, pode-se arguir, uma parte
do aparelho de governância – um gênero de mídia como noticiário de televisão recontextualiza e
transforma outras práticas sociais, tal como política e governo, e, por sua vez, é recontextualizada em
textos e interações de diferentes práticas, incluindo, crucialmente, a vida cotidiana, para a qual contribui
moldando a maneira como vivemos, e os significado que damos às nossas vidas (Silverstone, 1999).

Mistura de gêneros
32
A relação entre textos e gêneros é potencialmente complexa: um texto pode não 'estar' em um
único gênero, talvez seja uma 'mistura' de gêneros. O Exemplo 2, o caráter promocional do Budapest
Sun em língua inglesa para a cidade húngara de Békéscsaba, é um exemplo de mistura de gêneros
(gênero híbrido). Como eu disse antes, um aspecto das transformações associadas com o novo
capitalismo é que cidades e estados individuais (mais propriamente do que apenas governos nacionais)
agora precisam ativamente se promover e 'vender' sua imagem, como neste caso. Essa mudança na
relação entre cidades e corporações empresariais envolve uma cadeia de gêneros – uma cadeia que liga
os gêneros do governo local com gêneros empresariais, nos quais textos como o do exemplo 2 são um
elo mediador crucial. A mudança se manifesta parcialmente na emergência de um novo gênero dentro da
cadeia de gêneros, através da mistura daqueles existentes. Podemos ver que o gênero nesse caso é uma
mistura do traço do artigo jornalístico, propaganda corporativa (estendida para o governo local), e
panfleto turístico. Esse hibridismo é imediatamente evidente no layout e na organização da página: as
manchetes ('Festival town flourishes' – 'A cidade do festival floresce') e a citação da fala do Prefeito da
Cidade em negrito no pé da página são características de artigos de jornais; as três fotografias na parte
superior da página podem ser encontradas em panfletos turísticos; mas o estilo de fotografia do Prefeito
na parte inferior da página é o de propaganda corporativa. Outras características da combinação dos três
gêneros incluem: alternância entre discurso indireto e citação ou representação indireta das palavras de
fontes importantes como o Prefeito (característica de artigos de jornal); a predominância da promoção
pessoal na avalição positiva própria (ex: 'A capable workforce, improving infrastructure and flexibel
labour is readly availabe' – Uma força de trabalho capaz, infraestrutura avançada e trabalho flexível
estão prontamente disponíveis) nas citações (características de propaganda corporativa); uma descrição
de Békéscsaba no relatório que é tematicamente organizado de acordo com as convenções da literatura
de turismo (edifícios, praças etc. de valor arquitetônico e histórico, localização geográfica, vida cultural
etc.).
Um gênero dentro da cadeia entra, caracteristicamente, em relações tanto 'retrospectiva' como
'prospectivamente' com gêneros que o 'precedem' e 'seguem', as quais podem progressivamente levar a
hibridização do gênero através de um tipo de assimilação aos gêneros precedentes e subseqüentes. Nesse
caso, a incorporação da propaganda corporativa para um gênero de autoridade local podem ser vistos
como uma forma de interdiscursividade prospectiva - a autoridade local antecipando as práticas do
comércio que espera que sua publicidade atinja. Outro exemplo bastante difundido é a
'conversacionalização' de vários gêneros tais como conversas de rádio ou (broadcast news) – elas
assumem certas características da linguagem de conversação dentro de contextos (antecipados) em que
33
são ouvidas ou assistidas (tipicamente em casa). (Veja Scannell, 1991 a respeito desse aspecto da
história da conversação de broadcast).
Um grande número de pesquisadores e teóricos sociais tem voltado a atenção para as maneiras
em que as fronteiras sociais são ofuscadas na vida social contemporânea, e para as formas de
'hibridismo' ou mistura de práticas sociais daí resultantes. Isso é visto majoritariamente como traço da
'pós-modernidade', que escritores como Jameson (1991) e Harvey (1990) vêem como faceta cultural
daquilo que estou chamando de novo capitalismo. Uma área da vida social em que o hibridismo tem
recebido atenção particularmente intensa é a mídia – os textos de comunicação de massa podem ser
vistos como operadores do ofuscamento de fronteiras de várias maneiras: fato e ficção, notícias e
entretenimento, drama e documentário, e assim por diante (McLuhan, 1964; Silverstone, 1999). A
análise do hibridismo interdiscursivo nos textos providencia um recurso potencial valoroso para
fortalecer a pesquisa baseada nessas perspectivas, oferecendo um nível detalhado de análise que não
pode ser conseguido com outros métodos.

Uma abordagem relacional à análise de textos


Adotarei uma visão relacional dos textos, e uma abordagem relacional para a análise de textos.
Estamos interessados em vários 'níveis' de análise, e com as relações entre esses 'níveis'.

Estruturas sociais
Práticas sociais
Eventos sociais
Ações e suas relações sociais
Identificação de pessoas
Representação do mundo
Discurso (gêneros, discursos, estilos)
Semântica
Gramática e vocabulário
Fonologia/grafologia

Podemos distinguir as relações 'externas' e 'internas' de textos. A análise das relações externas de
textos é a análise de suas relações com outros elementos de eventos sociais e, mais abstratamente,
práticas sociais e estruturas sociais. A análise das relações de textos com outros elementos de eventos
sociais inclui análise de como eles figuram em Ações, Identificações, e Representações (a base para
diferenciar os três principais aspectos de significado de texto). Há outra dimensão para as relações
'externas' que trataremos no capítulo 3: relações entre um texto e outros textos externos a ele, como
34
elementos de outros textos são incorporados 'intertextualmente' e, como esses textos podem ser 'textos
de outras pessoas', como as vozes de outros são incorporadas; como outros textos são referenciados,
compreendidos, dialogados, e assim por diante.

A análise das 'relações internas' dos textos inclui:


 Relações semânticas
Relações de sentido entre palavras e expressões mais longas, entre elementos de orações, entre
orações e entre sentenças, e entre porções maiores de texto (Allan 2001, Lyons 1997).
 Relações gramaticais
São as relações entre 'morfemas' em palavras (ex: 'sick' e 'ness' em 'sickness' – 'bom' e 'ade' em
'bondade'), entre palavras e frases (ex: entre o artigo definido 'a', o adjetivo 'velha' e o nome 'casa'
em 'a velha casa'), entre frases dentro de orações (veja os capítulos 6 e 8), e entre orações e
sentenças (ex: as orações podem ser paratática e hipotaticamente relacionadas (veja o capítulo 5)
– isto é, ter status gramatical igual, ou em relação de subordinação ou coordenação (Eggins 1994,
Halliday 1994, Quirk et al. 1995).
 Relações de vocabulário (ou 'léxico')
São relações de colocação, isto é, padrões de co-ocorrência entre itens do vocabulário (palavras
ou expressões). Por exemplo, 'trabalho' se relaciona com 'na direção de' e 'de volta para' mais do
que com 'fora do' nos textos do partido 'New Labour' de Blair na Inglaterra, enquanto que em
textos mais antigos do partido o padrão era inverso – 'na direção do trabalho', 'de volta ao
trabalho', 'fora do trabalho' (Fairclough, 2000b; Firth, 1957; Sinclair, 1991; Stubbs, 1996).
 Relações fonológicas
Relações da linguagem falada, incluindo padrões prosódicos de entonação e ritmo; relações
grafológicas na língua escrita – ex.: relações entre diferentes tipos ou tamanhos de fontes no
texto escrito. Não tratarei de relações fonológicas ou grafológicas neste livro.

Relações internas são, na terminologia clássica, tanto 'relações in praesentia' como 'relações in
absentia' – relações sintagmáticas, e relações paradigmáticas. Os exemplos que acabo de dar são de
relações sintagmáticas, relações entre elementos que estão na realidade presentes no texto. As relações
paradigmáticas são de escolha, e chamam a atenção para relações entre o que realmente está presente e o
que poderia estar presente, mas não está – 'ausências significativas'. Isso se aplica a diferentes níveis – o
texto inclui certas estruturas gramaticais, um vocabulário determinado, determinadas relações
35
semânticas, determinados discursos e gêneros; talvez tenha incluído outros, que eram possíveis e
disponíveis, mas não selecionados.
O nível do discurso é aquele no qual as relações entre gêneros, discursos e estilos são analisadas
– eu as chamo de relações 'interdiscursivas'. O nível do discurso é intermediário, um nível que medeia
entre o texto per se e seu contexto social (eventos, práticas e estruturas sociais). Discursos, gêneros e
estilos são elementos de textos e são também elementos sociais. Nos textos eles são organizados em
relações interdiscursivas, relações nas quais diferentes gêneros, discursos e estilos podem ser
'misturados', articulados e tecidos de maneira particular. Como elementos sociais, são articulados de
maneira particular em ordens de discurso – os aspectos lingüísticos de práticas sociais nos quais a
variação lingüística é socialmente controlada. Esses itens fazem a ligação entre o texto e outros
elementos do social, entre as relações internas do texto e suas relações externas.
As relações entre os níveis do discurso, da semântica, da gramática e do vocabulário são de
'realização' (Halliday, 1994). Isto é, relações interdiscursivas entre gêneros, discursos e estilos são
realizadas como relações semânticas, que são realizadas ('formalmente') como relações gramaticais e de
vocabulário.
36
Resumo

Temos visto que os textos são partes de eventos sociais moldados por poderes causais das
estruturas sociais (incluindo línguas) e práticas sociais (incluindo ordens do discurso) de um
lado, e agentes sociais de outro. Há três principais aspectos de significado nos textos: Ação e
Relação Social, Representação, e Identificação, que correspondem a categorias de Gêneros,
Discursos e Estilos no nível das práticas sociais. Esses aspectos do significado e essas categorias
são analiticamente separados, mas não são distintos – são dialeticamente relacionados.

As seções centrais do capítulo nos mostram que:


As formas de ação e interação em eventos sociais são definidas por suas práticas sociais e as
maneiras pelas quais são agrupadas em cadeia.
As transformações sociais do 'novo capitalismo' podem ser vistas como mudanças na maneira de
formar redes de práticas sociais e assim mudanças nas formas de ação e interação, que inclui
mudança de gênero. Mudança de gênero é uma parte importante das transformações do novo
capitalismo.
Alguns gêneros são relativamente 'locais' em escala, associados com redes de práticas sociais
relativamente delimitadas (ex.: dentro de uma organização como uma empresa comercial).
Outros são especializados em (inter)ação relativamente 'global' através de redes, e para
governância.
Mudança de gêneros é mudança na maneira como diferentes gêneros são combinados, e como
novos gêneros se desenvolvem mediante a combinação daqueles já existentes.
A cadeia de eventos pode envolver uma cadeia ou rede de textos diferentes e interconectados
que manifestam uma 'cadeia' de diferentes gêneros. As cadeias de gêneros são significativas
para relações de recontextualização.
Um texto ou uma interação não está 'em' um gênero exclusivo – é provável que envolva uma
combinação de diferentes gêneros, hibridismo de gêneros.
Finalmente, consideramos uma visão relacional dos textos e da análise textual, em que as
relações 'internas' (semânticas, gramaticais, lexicais (vocabulário)) dos textos são conectadas
com suas relações 'externas' (a outros elementos de eventos sociais, e a práticas e estruturas
sociais) por intermédio da mediação de uma análise 'interdiscursiva' dos gêneros, discursos e
estilos, aos quais são atraídos e articulados.
37
3 - INTERTEXTUALIDADE E SUPOSIÇÃO

Questões de análise textual:


Intertextualidade e discurso relatado
Pressuposição e implícito
Dialogismo

Questões de pesquisa textual:


Diferença textual
Hegemonia, o universal e o particular
Ideologia
O âmbito público

Ao final do capítulo 2, eu fiz uma distinção entre as relações ‘externas’ e ‘internas’ do texto, e
me referi, rapidamente, ao aspecto das relações ‘externas’ de textos, as quais serão consideradas neste
capítulo: relações entre um texto com outros textos ‘externos’ a ele, fora dele, embora, de alguma forma,
presentes nele. As relações ‘intertextuais’ de um texto. Para tanto, devo considerar intertextualidade num
sentido bastante amplo. Na acepção mais comum do termo, intertextualidade é a presença material de
outros textos dentro de um texto – citações. No entanto, há várias outras maneiras, menos evidentes, de
incorporar elementos de outros textos. Por exemplo, se pensamos em um discurso relatado, escrito ou
pensado, é possível não só citar o que já havia sido dito ou escrito em outros textos, mas também
resumi-lo. Essa é a diferença entre o que tem sido chamado ‘discurso direto’ (que deve fazer citações do
que foi escrito e acarreta pensamentos, como também a fala – ex. ‘ Ela disse: “Eu me atrasarei”) e
formas do ‘discurso indireto’ (ex. ‘Ela disse que se atrasaria’). Aquele alega reproduzir de fato as
palavras usadas, enquanto este não; um resumo reformula o que havia sido dito ou escrito de fato. O
discurso relatado, escrito ou pensado, atribui o que é citado ou resumido às pessoas que disseram,
escreveram ou pensaram o texto original. Elementos de outros textos, no entanto, podem também ser
incorporados sem atribuição alguma. Desse modo, intertextualidade refere-se a uma gama de
possibilidades (ver Fairclough, 1992; Ivanic, 1998).
Porém, eu vou relacionar suposição com intertextualidade. Eu uso o termo genérico ‘suposição’
para abarcar termos de teor implícito que, geralmente, são distinguidos na literatura da Lingüística
Pragmática (Blakemore, 1992; Levinson, 1983; Verschueren, 1999) como pressuposições, implicações
ou acarretamentos lógicos, além das implicaturas. Minha questão fundamental são as pressuposições,
mas eu gostaria de discutir brevemente essas distinções no final do capítulo. Textos fazem suposições
38
inevitavelmente. Tudo que é ‘dito’ em um texto, é ‘dito’ numa relação de contraste com o ‘não-dito’,
mas tomado como dado. Como na intertextualidade, suposições conectam um texto a outros, a um
‘mundo de textos’, como poderia ser dito. A diferença entre suposições e intertextualidade é que elas –
as suposições-, geralmente, não são atribuídas ou atribuíveis a textos específicos. É muito mais uma
questão de relação entre o texto e o que foi dito, escrito ou pensado em outro lugar, com o ‘outro lugar’
deixado vago. Se, por exemplo, eu tivesse começado este livro com o enunciado ‘As relações
intertextuais de um texto constituem parte significante dele’, eu estaria supondo que textos são relações
intertextuais, comprometendo-me com o texto como algo que já havia sido dito ou escrito em outro
lugar, e com a crença de que os possíveis leitores já ouviram ou leram isto em outro lugar. Eu não faço
referência aqui a nenhum texto ou conjunto de textos específicos, mas, sobretudo, ao mundo dos textos.
Ambos, intertextualidade e suposição, podem ser vistos como alegações por parte do ‘autor’ –
alegando que o discurso relatado foi realmente dito, que o material suposto já havia sido realmente dito
ou escrito em outro lugar, que os interlocutores de fato já haviam ouvido ou lido isso em outro lugar.
Tais alegações podem ou não ser relevantes. As pessoas podem, por engano, por desonestidade ou por
manipulação, fazer tais alegações implícitas - asserções podem, por exemplo, ser manipuladas como
suposições; declarações podem ser, erroneamente ou desonestamente, atribuídas a outros.
Este capítulo vai tratar particularmente de três temas em pesquisa social. O primeiro é a
‘diferença’. Um aspecto importante nas transformações recentes na vida social é a diferença social, a
saliência de identidades sociais particulares (seja em relação às mulheres, às lésbicas, aos grupos
étnicos, entre outros) tem se tornado mais evidente (Benhabid, 1996; Butler, 1998; Fraser, 1998). Por
exemplo, a política ‘universal’ anteriormente representada pela classe social tem sido substituída por
lutas baseadas nos interesses e identidades de grupos particulares. Meu propósito é sugerir um amplo
modelo para lidar com diferentes orientações, em textos que podem ser usados como recurso para
desvelar caminhos nos quais a diferença possa ser acentuada, negociada, colocada entre parênteses ou
mesmo suprimida (eu devo referir-me particularmente à questão da ‘esfera pública’.) O segundo tema
conexo é: o universal e o particular (Butler, Laclau e Zizek, 2000). O assunto aqui é como particulares
passam a representar os universais – como identidades, interesses e representações particulares
investem-se de certas condições para se auto-aclamarem universais. Esse assunto pode ser alocado
dentro das questões de hegemonia – do estabelecimento, manutenção e contestação da dominância social
de grupos sociais particulares: atingir a hegemonia acarreta uma medida de sucesso em projetar alguns
particulares como universais. Mas isto é, em parte, um alcance textual, e a análise textual pode
enriquecer a pesquisa nesses pontos. O terceiro tema, também conectado aos dois anteriores, é ideologia,
sobre o qual já discuti no capítulo 1: em particular, a significância ideológica das suposições nos textos.
39

Diferença e dialogicidade
Um contraste importante entre intertextualidade e suposição é que aquela marca largamente a
diferença trazendo outras vozes para o texto, enquanto esta reduz em demasia a diferença assumindo um
campo comum. Ou, em outras palavras, intertextualidade acentua a dialogicidade do texto, o diálogo
entre a voz do autor do texto e outras vozes, enquanto a suposição a diminui. O termo ‘voz’ é, em parte,
similar ao modo como eu uso o termo ‘estilo’ (significando os modos de ser ou identidades nos aspectos
lingüísticos e, em um nível mais amplo, semióticos), mas seria útil também permitir-nos focalizar a co-
presença, nos textos, das ‘vozes’ de indivíduos particulares (Bakhtin, 1981; Wertsxh, 1991). As pessoas
diferenciam-se de diversas maneiras, e orientar para a diferença é fundamental para a interação social.
Giddens sugere, em um dos seus primeiros livros, que ‘a produção da interação tem três aspectos
fundamentais: sua constituição como “significativo”; sua constituição como uma ordem moral; e sua
constituição como a operação de relações de poder’ (1993:104). A orientação para a diferença é central
para o cotejo desses três elementos fornecidos por ele. A produção da interação, como algo significativo,
acarreta ‘negociação’ ativa e continuada de diferenças de sentido; as ‘normas’ de interação, como uma
ordem moral, são orientadas para diferentes atores sociais e diferentemente interpretadas por eles, e
essas diferenças são negociadas. Poder, no sentido mais geral do termo, de ‘a capacidade transformadora
da ação humana’, a capacidade de ‘intervir numa série de eventos tanto quanto para alterar o seu curso’,
depende de ‘recursos ou facilidades’ que estão diferentemente disponíveis aos atores sociais; e poder no
sentido ‘relacional’ de ‘capacidade de assegurar resultados onde a realização desses resultados depende
da ação de outros’ é também disponível em diferentes escalas a diferentes atores sociais.
Porém, eventos e interações sociais variam a natureza da orientação para a diferença, da mesma
maneira como ocorre com os textos enquanto elementos de eventos sociais. Podemos diferenciar,
esquematicamente, cinco cenários de forma bastante generalizada:

(a) uma abertura para, aceitação de reconhecimento de diferença; uma exploração da diferença,
como em ‘diálogo’ no sentido mais rico do termo;
(b) uma acentuação da diferença, conflito, polêmica, uma luta pelo sentido, normas, poder;
(c) uma tentativa de resolver ou superar a diferença;
(d) colocar a diferença entre parênteses, um foco nos aspectos comuns, solidariedade;
(e) consenso, uma normalização e aceitação das diferenças de poder que suprime ou coloca a
diferença de sentido e normas entre parênteses.
40

Isso não é uma tipologia de eventos e interações sociais reais; eventos sociais e textos podem
combinar esses cenários de diversas maneiras.
Kress sugeriu, anos atrás, que é produtivo ver os textos em termos de orientação para a diferença:
‘diferença é o motor produtor de textos’ (1985). Entretanto, a visão de Kress é um pouco limitada, ela
foca, particularmente, no cenário (c) acima, a resolução das diferenças. Como Kress aponta, a diferença
é mais imediatamente acessível em diálogos reais, texto co-produzido por duas ou mais pessoas, e os
cinco cenários acima provêm uma base de comparação entre diálogos em termos de como a diferença é
orientada. No entanto, diferença não é menos central em textos ‘monológicos’, inclusive textos escritos
– o que é muito óbvio porque todos os textos são direcionados, têm endereço certo e leitores previstos, e
assume e antecipa diferença entre ‘autor’ e endereço. Em um certo nível, orientação para a diferença
pode ser entendida no sentido de dinâmica da interação. Mas diferenças não são somente ou
principalmente ocasionadas por efeitos locais de encontros inusitados. Isso é claro, no foco sob o qual
Kress analisa as diferenças entre as pessoas como diferenças entre discursos. Discursos são entidades
duradouras que nos remetem a um nível mais abstrato de práticas sociais, e nós precisamos claramente
incluir a questão de o quanto orientações para a diferença no longo prazo, neste nível, são
institucionalizadas em eventos sociais particulares – e trabalhadas ‘interacionalmente’ nos eventos,
como eu salientei anteriormente, bem como textos, regulados pela agência de participantes, estruturas
sociais e práticas sociais.
Orientação para a diferença traz para a cena graus e formas de dialogicidade nos textos. Refiro-
me aqui a um dos aspectos da teoria ‘dialógica’ da linguagem de Bakhtin: ‘uma palavra, discurso, língua
ou cultura passa por “dialogicização” quando se torna relativizada, desprivilegiada, alerta às definições
concorrentes para as mesmas coisas. Língua ‘desdialogizada’ é autoritária ou absoluta’ (Holquist,
1981:427). Textos são inevitavelmente e irremediavelmente dialógicos no sentido de que ‘qualquer
totalidade é uma conexão entre uma cadeia muito complexa e organizada e outras totalidades’ com as
quais os textos entram num tipo de relação ou outra’ (Bakhtin, 1986a:69). Mas, como sugere a citação
de Holquist, os textos diferem nas suas orientações para a diferença, por exemplo, em respeito à
‘dialogização’. Bakhtin aponta para as diferenças ressaltando que a relação de uma totalidade para
outras pode ser uma questão de construí-las, ‘polemizando com’ elas ou simplesmente ‘presumindo que
elas já são conhecidas do ouvinte’ (1986:69). E, como Holquist sugere, uma opção é ‘língua
desdialogizada’, correspondente ao cenário (c) acima: excluindo dialogicidade e diferença.
Vejamos alguns exemplos. Exemplo 1 (ver apêndice, p. XXXX) é retirado de uma entrevista
etnográfica, uma forma de diálogo. A orientação para a diferença no diálogo pode ser vista como uma
41
versão particular do cenário (d): todas as diferenças entre entrevistador e entrevistado são colocadas
entre parênteses, porque o entrevistador está preocupado somente em extrair as visões do entrevistado.
Mas o entrevistado, o gerente, mostra alguma abertura para a diferença (cenário (a) na intertextualidade
de sua fala. Ele cita ‘um operador’, e ‘as pessoas do sindicato’ (apesar de estes serem o que eles podem
dizer, mais do que eles tinham dito). Ele também acentua a diferença (cenário (b)), arranjando a voz
sumariada do gerente (ele mesmo inclusive) que “prega essa flexibilidade, esse desenvolvimento pessoal
e empresarial” contra a voz citada do operador. Mas, a principal polêmica é direcionada contra o gerente
sênior– perceba que suas vozes não estão representadas no texto. No entanto, enquanto as relações entre
o gerente sênior, o gerente intermediário (representado pelo entrevistado) e os trabalhadores são
dialogizadas, outros temas não são. Por exemplo, é suposto que um negócio é (pode ser visto como) uma
‘cultura’, como também é suposto que os sindicatos têm tirado poder dos gerentes e da força-de-
trabalho- que ambos já tiveram poder antes (uma suposição que é marcada pela expressão ‘devolva
isto’). Particularmente, esse último é o cenário (e) – uma suposição consensual que suprime a diferença
real. Nós temos uma situação que é comum em textos: algumas coisas são dialogizadas, outras não; há
uma orientação para diferença somente em alguns aspectos.
Exemplo 4 (ver apêndice pg. XXX) é diferente. Ele constitui um parágrafo de um documento de
políticas produzido pelo Grupo de consultoria para a competitividade na União Européia, um comitê de
representantes de empregadores e sindicatos do comércio, além de alguns políticos e burocratas. O texto
é a versão final de um parágrafo que passou por várias reformulações. É um texto negociado, o resultado
de um processo de negociação sobre quais vozes deveriam ser incluídas no texto e que tipo de relações
elas deveriam estabelecer. Por exemplo, enunciados 5-7 não constavam do projeto inicial. Eles
representam a voz dos sindicatos, uma ênfase na coesão social e, implicitamente, no risco para o bem
estar social, visto não como um peso, mas como uma fonte de eficiência (o exemplo é retirado de
Wodak, 2000, no qual há uma análise detalhada). Ainda assim, esse texto não é dialógico: o processo de
produzir um documento de políticas é um processo de mudança ‘de conflito para consenso’ (o título do
texto de Wodak), para um texto, no qual não há intertextualização de vozes diferentes. O que nós temos
são asserções categóricas (declarações de fatos e, na sentença 9, uma predição) sobre globalização e os
‘ajustamentos’ que elas ‘impõem’ , e sobre coesão social, que são realizadas mediante um conjunto de
suposições. As asserções são ‘categóricas’ no sentido de que elas não são modalizadas (ver cap. 10) –
por exemplo, na sentença 4 nós temos ‘isto impõe’, e não ‘isto pode impor’, na sentença 5 nós temos
‘coesão social é ameaçada’, e não ‘coesão social possivelmente ameaçada’. As suposições sobre
‘globalização’ (pronominalizada por ‘isto’ na primeira sentença) são de que ela existe, ela é uma
realidade, ela é um ‘processo’ (enunciado 1), que ela é a continuação do ‘progresso econômico’
42
(enunciado 2 – para fazer uma ligação coerente significativa entre o primeiro e o segundo enunciado,
é necessário supor que globalização é progresso econômico). É também suposto que ‘coesão social’ é
uma realidade, apesar de ameaçada. Todas essas suposições contenciosas: há aqueles que diriam que
globalização é um mito para encobrir um novo imperialismo, que as mudanças sociais que ela marca não
são coisas que estão apenas acontecendo (um ‘processo’) e, portanto, inevitáveis, mas decisões
estratégicas tomadas por agentes poderosos, e que as conseqüências, em grande parte do mundo, são
uma regressão econômica, mais do que um ‘progresso’, e que é um mito afirmar que ‘coesão social’ tem
existido no estado do bem estar social. Porém, as vozes divergentes dos empregadores e sindicatos são
amainadas em um aparente consenso na coexistência dessas suposições. Isto pode ser percebido como
cenários (c) e (d), tentativa de resolver a diferença e foco nos aspectos comuns. Ainda, os textos podem
ser percebidos nos termos de cenário (e), como supressão da diferença. Compare com o exemplo 3,
discutido no capítulo 2, no qual, mais uma vez, pode ser percebido o processo de produção de um texto
aparentemente consensual.

A esfera pública
O exemplo 8 é retirado de um ‘debate’ televisionado (isto é, como o programa foi representado)
cujo tema era ‘o futuro da monarquia britânica’. O excerto 1 do exemplo 8 pode ser percebido como
cenário (b) basicamente, uma acentuação polêmica das diferenças entre os membros da mesa
debatedora. O ‘debate’ televisivo freqüentemente assume tal forma (Fairclough, 1995b; Livinsgstone e
Lunt, 1994). Os participantes são selecionados para representar diferentes ‘visões’, e o ‘debate’ é
orquestrado pelo jornalista (Roger Cook) para articular tais visões entre os participantes
contraditoriamente.
Essa forma de lidar com a diferença pode ser considerada em termos de ‘esfera pública’ (Arendt,
1958; Calhoun, 1992; Fairclough, 1999; Habermas, 1989). A esfera pública é, nos termos de Habermas
(1984), a zona de conexão entre sistemas sociais e ‘biomundo’ (lifeworld), o domínio do cotidiano, no
qual as pessoas podem decidir e discutir sobre assuntos de ordem social e política como cidadãos e, em
princípio, influenciar decisões políticas. O status contemporâneo da esfera pública tem provocado
inúmeras questões para debate, a maioria das quais sobre a ‘crise’ da esfera pública, seu caráter
problemático nas sociedades contemporâneas, nas quais elas tendem a ser ‘rechaçadas’, especialmente
pela mídia. Uma limitação dos ‘debates’ como no exemplo 8, nessa perspectiva, é que eles não vão além
do confronto e da polêmica. Efetivo debate ou diálogo da esfera pública pode ser percebido como
razoavelmente incorporador do elemento polêmico, mas também incorporador de elementos dos
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cenários (a) e (c), além de explorador de diferenças, e um movimento em direção à resolução delas,
como também para alcançar um acordo e formar alianças. Sem tais elementos fica difícil perceber como
‘debates’ podem influenciar a formação de políticas. O mesmo pode ser dito sobre o excerto 2, no qual o
jornalista recolhe ‘visões’ da audiência, mas de uma forma que as separa e as fragmenta, não deixando
possibilidade de diálogo entre elas. Isso é uma ilustração de como a análise de tratamento de diferença
em textos pode contribuir para temas de pesquisa social. Eu devo discutir o exemplo 8 em detalhes em
relação à esfera pública no capítulo 4.

Hegemonia, universal e particular


O conceito de ‘hegemonia’ é central para a visão de Marxismo associado a Antonio Gramsci
(Gramsci, 1971). Na visão gramsciniana, política é vista como luta por hegemonia, uma forma particular
de conceituar poder que, entre outras coisas, enfatiza a dependência do poder em relação ao alcance de
consentimento ou, pelo menos, aquiescência em vez de uso exclusivo da força, e da importância da
ideologia na sustentação das relações de poder. O conceito de ‘hegemonia’ tem sido abordado
recentemente como uma versão da teoria do discurso na teoria política ‘pós-Marxista’ de Ernesto Laclau
(Laclau e Mouffe, 1985). A luta hegemônica entre forças políticas pode ser vista como, parcialmente,
uma contenção das reivindicações das suas visões particulares e representações do mundo para adquirir
status universal (Butler et al. ,2000).
Representações da ‘globalização’ e especialmente a mudança econômica global constituem bons
exemplos. Voltemos ao exemplo 4, o texto sobre a União Européia. Ele é parecido a vários outros textos
contemporâneos que tratam da mudança econômica global como um processo sem agentes humanos,
cuja mudança é nominalizada (‘globalização’, ver capítulo 8) e também representada como uma
entidade própria que pode atuar como agente (isto ‘impõe profundos e rápidos ajustamentos’) um
processo em um presente geral e mal definido e sem história (ela é somente o que ‘é’) que é universal
(ou, precisamente, ‘global’) em termos de lugar, e o inevitável processo que precisa ser respondido de
uma forma particular – um ‘é’ que impõe um ‘deve’, ou mesmo um ‘precisa’ (Fairclough, 2000c). A
aspiração hegemônica do neo-liberalismo pode ser vista como, parcialmente, uma questão de busca de
status universal para sua representação particular e visão de mudança econômica. É evidente que ela é
particular e contenciosa. Há outras representações nas quais ‘globalização’ é resultado da agência e
estratégia humanas (ex: a progressiva remoção de barreiras ao movimento livre de mercadorias e
finanças mediante acordos governamentais dominados pelos EUA e outros países poderosos), com uma
história particular, que exclui extensas áreas do planeta (ex: maior parte da África), não é, em espécie
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alguma, inevitável, e não precisa, então, de fechar o espaço político executando políticas também
inevitáveis.
Tais representações da ‘globalização’ variam na medida em que elas são afirmadas e supostas,
no balanço entre asserção e suposição. O texto da União Européia é relativamente assertivo – há, como
eu já apontei anteriormente, algumas asserções embasadas, mas grande parte dessa visão da mudança
econômica global é explícita, declarada. Em muitos textos, entretanto, acha-se toda a visão como parte
de um fundo suposto e tomado como dado. Tomemos, por exemplo, o seguinte excerto de um panfleto
produzido pelo departamento do governo britânico para a Educação e Emprego e distribuídos nos
correios 16 currículos. Os panfletos são identificados como ‘guia para pais’.

Muitos estudantes europeus tomam um vasto pacote de estudos e têm escala de estudos mais exigentes –
tipicamente 30 horas de estudo em aula por semana, comparadas com 18 no Reino Unido. Eles são os
estudantes com os quais nossos jovens têm de competir por trabalhos e vagas universitárias no espaço
global de mercado.

A única referência, no panfleto, à economia global está na segunda sentença, a qual assume que
há um espaço de mercado globalizado, e que nossos jovens precisam competir por trabalho e vagas
universitárias dentro dele (o que está declarado é com quem – esses ‘estudantes europeus’). Uma medida
do sucesso da universalização de tal representação particular é a extensão para a qual ela configura–se
na forma de uma suposição de fundo (alguém poderia alegar como uma ideologia – ver acima) numa
grande variedade de textos.
Eu sugeri no capítulo 2, discutindo gêneros de governabilidade, que o exemplo 1 pode ser visto
como posicionado numa cadeia de gêneros que facilitam um movimento do local para o global –
preceitos gerais para gerentes que podem aplicar em qualquer lugar são produzidos (no ‘esquema de
competência de gerenciamento’ no apêndice do livro de Watson) no sentido da experiência local de
gerentes numa empresa específica. Mas, isto pode ser visto simultaneamente em termos de hegemonia
como uma universalização do particular – alegações universais são feitas para uma visão de
gerenciamento entre outras.
Retomando as representações de globalização no exemplo 4, nós podemos redefinir meu
argumento, segundo o qual intertextualidade abre para diferença, enquanto suposições reduzem-nas. A
opção mais dialógica seria atribuir explicitamente as representações às suas origens, as ‘vozes’, e incluir
grande parte das vozes que realmente existem. Uma opção menos dialógica é a seguinte, à qual eu me
referi acima: asserções modalizadas (ver capítulo 10). Se, por exemplo, a sentença 4, no texto da União
Européia, fosse expressa de outra maneira como ‘isto pode impor profundos e rápidos ajustes’, se a
declaração factual fosse reescrita como uma declaração de possibilidade, ela poderia, pelo menos, ser
45
dialogicamente aberta para outras possibilidades. Outra opção ainda menos dialógica é a asserção
categórica, não-modalizada que, de fato, nós temos no texto, que não deixa nenhuma chance para outras
possibilidades. E a opção menos dialógica de todas é a suposição, tomando simplesmente esta visão da
economia global como dada, como no trecho extraído do panfleto do Departamento de Educação e
Emprego, citado acima (ver também White, 2001). Esquematicamente:

Mais dialógicos: Atributo; citação


Asserção modalizada
Asserção não-modalizada

Menos dialógicos: suposição

Intertextualidade
Podemos começar notando que para qualquer texto particular, há um conjunto de outros textos e
um conjunto de outras vozes potencialmente relevantes incorporadas no texto. Há a possibilidade de não
haver possibilidade de identificar esses conjuntos com grande precisão, e pode ser que eles sejam mais
extensivos e complexos. Mas é analiticamente útil começar mesmo que seja com uma idéia vaga deles.
Uma questão inicial: quais textos e vozes são incluídos, quais são excluídos, e que ausências
significantes há? Eu notei acima, por exemplo, que no caso do exemplo 1, a entrevista etnográfica, o
gerente não incorpora a voz do gerente sênior, mesmo assim ele está, principalmente, conversando sobre
o gerente sênior: ele representa aquilo que o gerente sênior faz, mas não o que ele diz, enquanto as vozes
do trabalhador e dos sindicalistas estão incorporadas (embora os sindicalistas estão incorporados em
termos do que eles ‘diriam’).
Onde outros textos estão intertextualmente incorporados em um texto, eles podem ou não ser
atribuídos. Por exemplo, exemplo 5, um trecho do discurso de Tony Blair, imediatamente depois do
atentado de 11 de setembro 2001, inclui muitas intertextualidades não-atribuídas, e isto é verdade para
todo o seu discurso. Um exemplo:

No mundo da Internet, da informação, da tecnologia e da TV, haverá globalização. E no comércio, o


problema não é que há grande presença disto; pelo contrário, há muito pouco disto. A questão não é como
parar a globalização. A questão é como nós usamos o poder da comunidade para combinar isto com a
Justiça.
46

Há uma repetida seqüência, aqui, de negação seguida de asserção – oração negativa seguida de
oração positiva. Negação implica que a asserção está em ‘outro lugar’ daquilo que está sendo negado –
neste caso, que alguém asseverou que há demasiada globalização no comércio, e que a questão é como
parar a globalização. No contexto de onde esse trecho foi extraído, Blair estava referindo-se às pessoas
que ‘protestam contra a globalização’. O que ele está implicando é que essas pessoas asseveram ou
asseveraram essas coisas, mas ele não está atribuindo de fato essas asserções a elas. Em verdade, muitos
dos que ‘protestam contra globalização’ não estão alegando que há ‘demasiado’ disto no comércio ou
que isto deveria ser ‘barrado’, mas que há uma necessidade de compensar desequilíbrios de poder na
forma em que o comércio internacional está crescendo.
Quando intertextualidade é atribuída, pode ser especialmente atribuída a um grupo particular de
pessoas, ou não-especialmente (vagamente) atribuída. Em outra parte do discurso, por exemplo, Blair
diz:

Não faça drama, dizem alguns. Nós não estamos. Nós não temos alarmado. Nenhum míssil na primeira noite apenas
por efeito.

Não matem pessoas inocentes. Nós não somos aqueles que fazem guerra contra inocentes. Nós procuramos os
culpados.

Procure por soluções diplomáticas. Não há diplomacia com Bin Laden ou com o regime do Taliban.

Declare um ultimato e receba sua resposta. Nós declaramos o ultimato, eles não responderam.

Entenda as causas do terror. Sim, nós deveríamos tentar, mas não permita que haja ambigüidade moral sobre isso:
nada poderia justificar os eventos de 11 de setembro, e é para fazer justiça, para pretender que isto poderia.

Isto é um diálogo simulado no qual Blair não representa muito uma voz crítica como encena
dramaticamente um diálogo com sua voz, a qual aparece como uma série de injunções (gramaticalmente,
sentenças imperativas, ver capítulo 6). Porém, ele atribui as palavras do seu interlocutor imaginário,
embora com vaguidão, a ‘alguns’. Essa vaguidão pode ser vista como licenciando Blair para representar
o que os críticos da guerra estavam dizendo de maneira que uma atribuição mais específica tornaria o
discurso mais fácil de ser desafiado. A última sentença é bastante significativa nesse sentido. Ela
começa com uma aceitação qualificada da injunção para ‘entender as causas do terror’ (nós deveríamos
‘tentar’), mas é seguida de uma objeção que repousa sobre a implicação que aqueles que chamam para
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um entendimento das causas estão, a partir de então, procurando justificar os eventos de 11 de
setembro. Perceba que, como no exemplo anterior, há uma negação (‘nada poderia, nunca, justificar os
eventos de 11 de setembro) que subentende a asserção ‘outro lugar’ no qual ‘terror’ pode ser justificado
pelas suas ‘causas’. Evidentemente, chamar para um entendimento melhor do porquê as pessoas fazem
uso do terrorismo não implica, e não implicou para críticos das políticas de Bush e Blair ao mesmo
tempo, que terrorismo é justificado desde que as causas sejam suficientemente convincentes.
Quando a fala ou escrita do outro são relatados, dois textos diferentes, duas vozes diferentes são
trazidas para o diálogo, e, potencialmente, duas perspectivas diferentes, bem como objetivos, interesses,
entre outros (Voloshinov, 1973). Há sempre uma possibilidade de haver uma tensão entre o que está
acontecendo no texto relatado, inclusive o trabalho que o relato do outro texto está fazendo dentro do
texto, e o que estava acontecendo no texto relatado. Eu sugeri anteriormente um vasto contraste entre
intertextualidade e suposição em termos da abertura da intertextualidade, mas não da suposição, para
diferença e dialogicidade. A forma de intertextualidade que eu tinha em mente é o relato direto, fala ou
escrita citada (ver abaixo). Mas, tão logo nós averiguamos o detalhe como a fala, a escrita e os
pensamentos dos outros podem ser relatados, as diversas formas possíveis que ele toma, torna-se claro
que é mais complicado – que o relato, como uma forma de intertextualidade, subsume muito da cadeia
de orientações para diferença que eu resumi nos cinco cenários acima.
Um contraste importante no relato é entre relatos que são relativamente ‘fiéis’ ao que é relatado,
citando-o, alegando reproduzir o que foi realmente dito ou escrito, e aqueles que não são. Ou, em outras
palavras, relatos que mantenham, relativamente, uma forte e clara fronteira entre a fala, escrita ou
pensamento relatado e o texto no qual eles são relatados, e aqueles que não (Fairclough, 1998;
Voloshinov, 1973). Esta é a diferença entre relato ‘direto’ e ‘indireto’. Nós podemos diferenciar quatro
formas de relato (ver Leech and Short, 1981 para mais detalhes):

- relato direto
Citação, propositadamente as palavras realmente usadas, em marcas de citação, com uma oração
de relato (ex.: Ela disse: ‘ele já terá chegado lá neste momento’).

- relato indireto
Resumo, o conteúdo do que foi dito ou escrito, sem o recurso da cópia do outro discurso, não uso
de marcas de citação, nem oração de relato (ex: Ela disse que ele estaria lá a partir de então). Mudanças
no emprego do tempo verbal (‘ele irá’ torna-se ‘ele iria’) e dêixis (‘agora’ torna-se ‘então’) do relato
direto.
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- relato indireto livre


Intermediário entre direto e indireto – Ele apresenta algumas mudanças de tempos e dêixis
típicas do discurso indireto, mas sem a oração de relato. Ele é mais significativo em língua literária (ex:
Mary estava parada ante a janela olhando para o nada. Ele já estaria lá. Ela sorriu para si mesma.).

- Relato narrativo de ato de fala


Relata um tipo de ato de fala sem relatar seu conteúdo (ex: Ela fez uma predição).

No exemplo 2 (‘a cidade do festival floresce’), estão incluídas duas vozes, ambas da oficialidade
local, representando, respectivamente, o governo e os empreendedores locais – o prefeito e o diretor do
centro empresarial local. Outras vozes (ex: representando a comunidade cultural, ou habitantes da cidade
que dão testemunho de como é viver lá) podem ter sido incluídas, mas não são. Pode parecer que as
características foram escritas na relação de entrevistas com dois oficiais. Estão incluídas algumas
informações sobre a cidade no relato do autor, algumas delas são atribuídas aos oficiais, algumas vezes
como relato direto (citação), outras como relato indireto (resumo). A resposta poderia ser: gênero. Este
texto é ‘misto’ em termos de gênero, como eu apontei no capítulo 2, mas sua intertextualidade é típica
do gênero jornalístico. O padrão está alternado entre as autorias e os relatos indiretos, apoiados ou
substanciados pelas citações diretas. Mesmo se, como parece ser o caso, todas as informações sobre a
cidade emanam de outras vozes, o gênero jornalístico favorece tal distribuição de informações entre as
vozes autorais e as vozes atribuídas.
A relação entre as autorias e as falas atribuídas tende a ser mais direta neste caso, não mostrando
qualquer tensão a que eu fiz alusão acima, ou questões associadas à orientação para diferença. Essas
questões realmente aparecem, entretanto, no seguinte excerto retirado do ‘Jornal verde’ do novo governo
dos trabalhadores, no tema ‘reforma do bem-estar (1998)’:

Haverá uma completa, independente avaliação da primeira fase do ‘new deal’ de País
Independentes (Lone Parents), disponível no outono de 1999. Indicações preliminares são
encorajadoras. A organização Pais Independentes, bem como seus empregadores, além dos
próprios associados, receberam bem esse ‘new deal’, e os funcionários responsáveis pelo serviço
têm se demonstrado bastante entusiasmados. Os funcionários receberam de bom grado a
oportunidade de tornarem-se parte do programa ‘assessoria em ajuda prática e aconselhamento’.
A primeira fase do ‘new deal’ tem atraído bastante interesse: pais solteiros, em outras partes do
país, estão perguntando se eles podem se associar.
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Este documento é profundamente marcado pela falta de dialogicidade, uma indicação disto é que
há muito poucas instâncias no documento, fala ou escrita relatadas. Outras vozes raramente aparecem.
Este excerto é uma das poucas exceções. Eu coloquei em itálico as partes que eu considerei como
representando outras vozes (pais independentes, funcionários, etc.). Há apenas uma instância que se
constitui fala relatada, o relato indireto (‘pais solteiros, em outras partes do país estão perguntando se
eles podem se associar’) no final. As outras instâncias implicam coisas que já haviam sido ditas ou
escritas sem fazer uso de qualquer tipo de relato – se a organização de pais solteiros e adiante,
‘receberam bem esse ‘new deal’, então, presumivelmente, eles devem ter dito ou escrito coisas positivas
sobre isto, mas tudo que é representado no texto são atitudes generalizadas (receber bem, estar
entusiasmados) as quais são abstraídas de declarações e avaliações específicas. É uma representação do
pensamento (e, especificamente, atitude) mais que extraída da fala ou da escrita, mas isso pode ser,
somente, baseado na fala ou na escrita. Outras vozes são trazidas para o documento neste momento, mas
de uma forma rarefeita daquilo que seguramente seja divergente, que foi realmente dito ou escrito, que
diminui a diferença. Alguém poderia perguntar em que essas representações generalizadas são baseadas.
Não há indicação disto, mas a mais óbvia das respostas seria alguma forma de pesquisa de opinião. É
claro que, se o resultado de tais pesquisas de opinião fossem dadas explicitamente, eles apareceriam na
forma de percentagem, o que destruiria a impressão de consenso (cenário (d) ). As motivações
estratégicas e retóricas para o tipo de relato nesse excerto são bastante claras, e pode-se localizar
largamente isto no funcionamento da ‘opinião pública’ na política e governabilidade contemporâneas
(ver Fairclough, 2000a, 2000b).
Ambos exemplos acima mostram que a intertextualidade constitui uma questão de
recontextualização (conceito introduzido no capítulo 2) – um movimento de um contexto para outro,
englobando específicas transformações conseqüentes em como o material realocado, recontextualizado,
configura-se dentro do novo contexto. Assim, no caso de fala, escrita ou pensamento relatados, há dois
levantamentos a fazer:

(a) a relação entre o relatado e o original (o evento que é relatado)

(b) a relação entre o relato e o resto do texto no qual ele ocorre – como o relato configura-se
no texto.

A interconexão entre esses dois aspectos é clara nos exemplos dados: uma das funções dos
relatos no texto ‘a cidade do festival floresce’ é para substanciar afirmações autorais, o qual faz sentido
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de enfatizar citações e a interpelação implícita de crença no original. Já o texto ‘papel verde’ contribui
para a legitimação, e a ênfase é, correspondentemente, em produzir uma impressão de consenso
mediante a generalização rarefeita das específicas avaliações ou declarações de forma que reduza a
diferença.
Exemplo 6 constitui um texto retirado de uma transmissão no rádio para o mundo (hoje, BBC
Radio 4, 30 de setembro de 1993) sobre a extradição de dois líbios acusados de atentado a bomba, em
Lockerbie, em 1988, quando um avião explodiu perto da cidade de Lockerbie, na Escócia, matando
todos que estavam a bordo (ver Fairclough, 1995b).

‘Manchete’: locutor: A Líbia acaba de comunicar às Nações Unidas que está disposta a ver os dois homens
acusados pelo atentado de Lockerbie, processados na Escócia, mas não pode cumprir o processo de
extradição em tempo hábil.

Locutor: A Líbia acaba de comunicar às Nações Unidas que está disposta a entregar os dois homens
acusados pelo atentado de Lockerbie ao tribunal da Escócia. Tal posição foi anunciada em Nova York a
noite passada pelo ministro das relações exteriores, OM, quando saía de uma reunião com o secretário
geral, Dr Boutros-Ghali.
OM: As respostas que nós recebemos do Reino Unido e dos Estados Unidos, apesar do Secretário-Geral, são
bastante aceitáveis para nós e nós as vemos com positividade com garantias para assegurar um julgamento
justo para os dois suspeitos quando eles se submeterem à jurisdição escocesa.

Locutor: Oficiais líbios nas Nações Unidas, em face da ameaça de mais sanções, disseram que queriam
mais tempo para resolver os detalhes da extradição. Parentes das 270 pessoas que morreram no vôo 103
em dezembro de 1988 estão tratando a declaração com cautela. Das Nações Unidas, nosso correspondente
John Nian.

Correspondente: Diplomatas do Ocidente ainda crêem que a Líbia está tentando ganhar mais tempo.Entretanto, em
tal situação, Líbia parece estar cedendo para a extradição dos dois suspeitos. Se essa iniciativa for
somente uma tática de adiamento, seu objetivo seria persuadir os membros hesitantes no Conselho de
Segurança para não votar a favor de novas sanções, o mais provável. Entretanto, foi dito que o Secretário-
Geral das Nações Unidas tivesse tomado uma posição dura em relação à Líbia, exigindo que ela
especificasse exatamente a data na qual os dois suspeitos serão extraditados. O Ministro das Relações
Exteriores da Líbia prometeu uma resposta ainda hoje, mas ele está pedindo por mais tempo para fazer a
extradição.Enquanto isso, o Ocidente tem mantido pressão na Líbia. O secretário das Relações Exteriores,
Douglas Hurd, e o Secretário do Estado Americano, Warren Christopher, reiteraram a ameaça de sanções.
Os diplomatas do Ocidente dizem que, a menos que os dois suspeitos sejam entregues imediatamente, uma
nova resolução será tomada amanhã.
51
As principais vozes representadas aqui são: o governo da Líbia (oficiais líbios, o Ministro das
Relações Exteriores da Líbia, OM), governos ocidentais, políticos e diplomatas (o Reino Unido, os
Estados Unidos, o Ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, o Secretário de Estado dos Estados
Unidos), o Secretário Geral das Nações Unidas, os parentes das pessoas que morreram. Há também as
vozes jornalísticas do locutor e do correspondente. Além das declarações gravadas do Ministro das
Relações Exteriores da Líbia, a fala e o pensamento relatados são indiretos. Uma medida superficial de
‘equilíbrio’ pode parecer bastante positiva: a voz do governo da Líbia é tão proeminente quanto a voz
dos governos ocidentais. No entanto, quando observamos o texto, em termos de recontextualização, e
particularmente em termos de como as diferentes vozes são ‘texturizadas’ no texto, o relato parece mais
problemático, e menos favorável ao governo líbio.
Uma questão é o ‘enquadramento’: quando a voz de um outro é incorporada no texto, há sempre
escolhas de como ‘enquadrá-las’, como contextualizá-las, nos termos das outras partes do texto – sobre
relações entre relato e autoria. Por exemplo, o relato que os libaneses ‘dizem que eles queriam mais
tempo para resolver os detalhes da extradição’ está enquadrada com ‘ em face da ameaça de mais
sanções’, e alguém poderia perceber este enquadramento como manipulador a uma interpretação mais
negativa do que oficiais libaneses foram relatados de haverem dito como, por exemplo, ‘ganhando
tempo’- de fato o correspondente levanta hipótese, em última instância, de ‘um tático adiamento’. Outro
exemplo: ‘O Secretário Geral das Nações Unidas é relatado como tendo tomado uma posição dura com a
Líbia, exigindo que ela especificasse exatamente a data na qual os dois suspeitos serão extraditados’.
Parte do enquadramento aqui é a voz de ‘exigir’ como o verbo relatado – é altamente improvável que o
Secretário Geral disse ‘Eu exijo que...’, então ‘exigir’ em vez de, por exemplo, ‘pedir’ seria visto como
manipulador em uma interpretação que exclui os líbios em uma luz desfavorável: se as supostamente
imparciais Nações Unidas estão contra a Líbia, os libaneses estão necessariamente errados. Um relato
está, neste caso, enquadrado por ouro – a ‘exigência’ está enquadrada pelo relato que o Secretário Geral
‘tem tomado uma postura severa com a Líbia’. Portanto, há um enquadramento construído, o qual é
pesadamente manipulado para uma interpretação desfavorável à Líbia.
Enquadramento também levanta questões sobre o ordenamento das vozes nas relações que
estabelecem entre si no texto. Mas para tratar desta questão aqui, nós precisamos considerar também um
aspecto predominantemente indireto do relato. Isto é questão de como o processo de extradição (ou, com
maior neutralidade, o movimento dos acusados da Líbia para a Escócia para a execução do processo) é
representado. Nas declarações gravadas do Ministro das Relações Exteriores da Líbia, é representado
como os homens ‘subjugando-se’ à jurisdição. Na abertura do locutor que precede tal declaração, é
representado como os homens ‘indo à Escócia para serem julgados’. De outro modo, é representado, seis
52
vezes, como os homens sendo ‘extraditados’ (ou a extradição). Essa representação capta tanto os
acusados quanto o governo da Líbia em uma luz diferente e negativa: um país ‘extradita’, por exemplo,
um fugitivo ou um prisioneiro, e não cidadãos, e um país ‘extradita’ pessoas ou coisas contenciosas, e
não, por exemplo, em cumprimento de uma obrigação legal individual. Ainda assim, essa representação
aparece no relato indireto como sendo não apenas o que os diplomatas do Ocidente disseram, mas
também como o que os oficiais da Líbia e o Secretário Geral das Nações Unidas disseram, bem como na
conta de (e na voz de) o correspondente. Dado que essa foi a representação adotada no geral, que
permeia todo o relato, a representação na qual uma pessoa imagina outras pode ter sido ‘traduzida’ para
– de quem é esta representação? É difícil de assegurar, mas é evidente que é uma representação do
Ocidente, e não da Líbia.
Retomando o enquadramento com isto em mente, note que essa representação ocorre na posição
saliente da manchete (manchetes, neste tipo de relato informativo, são todas lidas no começo da
transmissão), bem como na saliente posição do que é chamado às vezes de ‘arremate’ (a parte final do
relato que retoma o presente, iniciado aqui por ‘enquanto isso’). Além disso, se nós observamos na
forma como as vozes estão ordenadas umas com as outras no relato do correspondente, parece haver
uma estratégia ‘antagonista-protagonista’ que efetivamente organiza os ‘bons’ (diplomatas e políticos do
Ocidente) contra os ‘maus’ (os liberianos). Vozes liberianas são mais proeminentes na primeira parte do
relato, enquanto na segunda parte, desde o correspondente BBC Nações Unidas, as vozes do ‘Ocidente’
e das Nações Unidas – as configuradas como críticas às posições líbias – são dominantes. As últimas
três sentenças, desde ‘enquanto isso’, arremata o relato com vozes do Ocidente, sendo que a última
sentença sumaria o que é, implicitamente, uma reprovação do Ocidente à abertura líbia, e contém uma
ameaça. Os conectores frasais (‘entretanto’, ‘enquanto isso’) e uma conjunção (‘mas’) são marcas do
ordenamento das vozes do relatório do correspondente das Nações Unidas/BBC. A primeira e a segunda
sentença estão ligadas por ‘entretanto’. Isso arma um contraste entre o que os diplomatas do Ocidente
acreditam a Líbia estar fazendo e o que a Líbia parece estar fazendo. A segunda e a terceira sentença são
interessantes. A segunda sentença é a voz do correspondente, e não a representação de alguma outra voz.
As declarações de jornalistas são, geralmente, autoritárias, mas essa é particularmente encurralada
mediante um ‘aparamento’ (‘em face disso’, ‘parece ser’), portanto há uma pequena convicção expressa
de que a Líbia está realmente movimentando-se em direção à ‘extradição’. As sentenças 2 e 3 também
estão numa relação de contraste apesar de não haver nenhuma marca, há uma mudança implícita na
sentença 3 retornando para a voz dos diplomatas do Ocidente na formulação do ‘objetivo’ da Líbia
(‘persuadir os membros hesitantes no Conselho de Segurança para que não votem a favor de mais
sanções’). ‘Entretanto’ a sentença 4 aponta a voz ‘dura’ do Secretário Geral das Nações Unidas contra o
53
hipotético e manipulativo ‘objetivo’ da Líbia. A sentença 5 é a única no relato do correspondente que
representa a voz da Líbia, embora o ‘mas’ na sentença contrasta, implicitamente, lados positivos e
negativos da reposta do Ministro das Relações Exteriores da Líbia ao Secretário Geral das Nações
Unidas – sua ‘promessa’ e seu pedido por mais tempo. Finalmente ‘enquanto isso’ circunscreve uma
linha entre esses movimentos dos diplomatas e o que ‘o Ocidente’ está fazendo, usando este para
enquadrar e minimizar aquele.
A representação do movimento dos acusados da Líbia para a Escócia a fim de serem julgados
como ‘extraditados’ é uma questão de selecionar um discurso particular, sobre o qual eu já fiz alguns
comentários acima. Há dois pontos para discutir aqui. Primeiro, a diferença entre vozes diferentes
relatadas no texto pode incluir o fato de que vozes diferentes se inscrevem em diferentes discursos.
Segundo, as vozes podem ser representadas mais ou menos concretamente ou abstratamente, partindo do
relato direto do que foi dito ou escrito efetivamente dentro de algum evento particularmente concreto,
para o tipo de representação generalizada na fala de Blair, discutida acima, do que um grupo de pessoas
diz em particular (ou são vistas como portadoras de um dizer típico) o qual é desmembrado de eventos
particulares, para a evocação de uma voz simplesmente pela ressonância que ela faz a um discurso que
seja reconhecidamente associada a essa voz. Um exemplo disso encontra-se no excerto do panfleto do
Departamento de Educação e Emprego discutido acima: ‘Esses são os estudantes com os quais nossos
jovens precisam competir para conseguir trabalho e vagas nas universidades no mercado global’. Eu
disse anteriormente que é assumido que há um mercado global. Mas há mais que isso: a expressão
‘mercado global’ pertence ao domínio do discurso econômico e político neoliberal que é associado com
as vozes dominantes nacional e internacionalmente nos campos políticos e econômicos, vozes que são
evocadas pela presença fragmentária deste discurso no texto.
Deixe-me finalmente apontar que intertextualidade é inevitavelmente seletiva em relação ao que
está incluído e ao que está excluído dos eventos e textos representados. Tome, por exemplo, esta
sentença do relato do jornal de rádio: ‘a posição foi anunciada em Nova York a noite passada pelo
Ministro das Relações Exteriores, OM, quando ele emergia de uma reunião com o Secretário Geral, Dr.
Boutros-Ghali’. Isso inclui o lugar do evento, o horário, e a relação deste com outro evento (a reunião
com o Secretário Geral das Nações Unidas). Nenhum dos outros relatos no texto inclui tanto detalhe.
Uma explicação é que tal detalhe torna-se importante, para uma declaração significativa política e
potencialmente, por pessoas importantes. Mas seletividade relaciona-se com gênero. Como alguma coisa
foi dita tem muito mais probabilidade de ser especificada numa representação de fala num romance (por
exemplo, ‘suba e veja você mesmo’, eu disse, tentando manter a agonia longe da minha voz. Raymond
54
Chandler, Adeus meu amor) do que num relato de jornal, no qual o foco é provável ser mais
exclusivamente no sentido representacional, ou conteúdo, daquilo que as pessoas dizem.

Suposições
O implícito é uma propriedade persuasiva (contaminante, diluente) do texto, além de ser uma
propriedade de importância social considerável. Todas as formas de fraternidade, comunidade e
solidariedade dependem dos sentidos que são compartilhados e podem ser tomados como dados, e
nenhuma forma de comunicação ou interação social é concebida sem tais ‘campos comuns’. Por outro
lado, a capacidade de exercer poder social, dominação e hegemonia inclui a capacidade de se adequar a
um significativo nível de natureza e conteúdo desses ‘campos comuns’, que tornam os implícitos e
suposições questões importantes com respeito à ideologia.
Nós podemos distinguir três principais tipos de suposições:

Suposições existenciais: suposições a respeito do que existe.


Suposições proposicionais: suposições sobre o que é ou pode ser ou será o caso.
Suposições morais: suposições sobre o que é bom ou desejável.

Cada uma dessas categorias pode ser ‘armada’ (Levinson, 1983) por marcas lingüísticas do texto,
embora nem todas as suposições sejam ‘marcadas’. Por exemplo, suposições existenciais são ‘armadas’
por marcadores de referência definida como os artigos definidos e os demonstrativos (o, a, este, aquele,
esse, isso, etc). Suposições factuais são ‘armadas’ por certos verbos (‘verbos factivos’) – Por exemplo,
‘Eu me dei conta (esquecer, lembrar) de que os gerentes têm de ser flexíveis’ supõe que gerentes têm de
ser flexíveis. Suposições morais podem ser ‘armadas’ por certos verbos – por exemplo, ‘ajudar’ (ex.: um
bom programa pode ajudar desenvolver flexibilidade’) supõe que desenvolver a flexibilidade seja algo
desejado.
Voltemos ao exemplo 4, o excerto do jornal de políticas da União Européia, para ilustrar
esses tipos de suposições.

1. Mas (globalização) é também um processo exigente, e, geralmente, penoso.


2. O progresso econômico sempre foi acompanhado pela destruição de atividades obsoletas e a
criação de novas.
3. O ritmo se tornou descompassado e o jogo abarcou todo o planeta.
55
4. Isso impõe ajustamentos profundos e rápidos em todos os países – incluindo países europeus,
onde a civilização industrial nasceu.
5. Coesão social está ameaçada pelo sentido generalizado de desconforto, desigualdade e
polarização.
6. Há um risco de desarticulação entre as esperanças e aspirações das pessoas e a demanda da
economia global.
7. E ainda, coesão social não é somente um objetivo político que vale a pena o tempo despendido;
isso é também uma fonte de eficiência e adaptabilidade à economia baseada no conhecimento
que depende, cada vez mais, das qualidades humanas e da habilidade de trabalhar em conjunto.
8. Isso é, preponderantemente, obrigação dos governos, sindicatos e empregadores trabalhando
juntos.
 - descrever as apostas e refutar um número de erros;
 - destacar que nossos países deveriam ter grandes ambições e realizá-las;
 - implementar as reformas necessárias consistentemente e sem atraso.
9. Falha em movimentar rapidamente e decisivamente resultará em perda de recursos, humanos e
capitais, os quais serão deixados para outras partes do mundo mais promissoras, se a Europa
prover menos oportunidades atrativas.

Suposições existenciais incluem a suposição de que há tais coisas como a globalização


(pronominalizada como ‘isso’ na sentença 1) e como coesão social (sentença 5); de que há um sentido
generalizado de desconforto, desigualdade e polarização (sentença 5); de que há uma economia global
(sentença 6) e uma economia baseada no conhecimento (sentença 7). Suposições proposicionais incluem
a suposição de que globalização é um processo (sentença 1 – o que é afirmado é o tipo do processo que
isso é, i.e. ‘exigente’); de que globalização é ou constitui progresso econômico (sentenças 1 e 2); de que
as pessoas têm esperanças e aspirações e de que a economia global exige (sentença 6); de que a coesão
social constitui um objetivo político que vale a pena o tempo despendido e de que a economia baseada
no conhecimento depende, cada vez mais, da qualidade humana e da habilidade de trabalhar em
conjunto (sentença 7); de que as reformas são necessárias (sentença 8). A suposição de que a
globalização constitui progresso econômico é um exemplo de relação entre suposições e coerência de
sentido: Nós podemos falar de ‘suposições-ponte’, suposições que são necessárias para criar um elo
coerente, uma ponte, entre partes do texto, para que o texto ‘faça sentido’. Nesse caso, é uma suposição-
ponte que permite uma conexão semântica coerente para ser feita entre as sentenças 1 e 2. Há também
56
uma suposição proposicional associada a ‘atividades obsoletas’ na sentença 2; que atividades
econômicas podem se tornar obsoletas.
Textos podem incluir avaliações explícitas (‘isso é maravilhoso/ excelente!’), mas a maioria das
avaliações nos textos é suposta (ver cap. 10 para uma discussão completa da avaliação). Suposições
morais são armadas por ‘ameaçadas’ na sentença 5 e por ‘risco’ na sentença 6. Se X ameaça (é uma
ameaça para) Y, há uma suposição de que ‘X’ é indesejado e de que ‘Y’ é desejado; analogamente, se há
um risco de que ‘X’, há uma suposição de que ‘X’ é indesejado. Nesse caso, coesão social é suposta
como desejável, um generalizado sentido de desconforto, desigualdade e polarização são indesejados; e
uma disjunção entre esperanças e exigências é indesejada. Mas as suposições morais não são
necessariamente armadas. Não há necessidade de armar como uma ‘ameaça’ para ‘um sentido de
desconforto, desigualdade e polarização’ para ser implicitamente indesejáveis, pode-se interpretar isso
considerando o conhecimento e reconhecimento do sistema de valores de uma pessoa que trespassa o
texto. Na sentença 7, é claro que, dentro de sistema de valores do texto, a coesão social está sendo
representada como desejável – como alguma coisa que corrobora para ‘eficiência e adaptabilidade’.
Perceba que alguém pode, enquanto leitor, reconhecer o sistema de valores e, portanto, o sentido suposto
sem aceitar ou concordar com isso – críticas à ‘nova economia global’ não aceita que eficiência e
adaptabilidade sejam mercadorias incondicionais, mas elas têm maior probabilidade de serem capazes
de reconhecer tal suposição.O corolário é que a interpretação que uma pessoa faz de textos, em termos
de valores, depende do seu conhecimento e reconhecimento do sistema de valores morais.
Questões de implícitos e suposições remetem-nos ao território da Pragmática (Blakemore, 1992;
Levinson, 1983; Mey, 1993; Verschueren, 1999). A Pragmática é o estudo da língua em uso. Seu foco é
o sentido, mas o processo de constituição do sentido na comunicação real, em oposição ao que é
geralmente visto como a preocupação da Semântica, relações semânticas que podem ser atribuídas a
uma língua, enquanto um sistema autônomo separado da comunicação real. A pragmática tem produzido
excelentes ‘insights’ sobre a suposição (pressuposição, implicatura), atos de fala, e assim por diante, que
têm contribuído substancialmente para a ADC (Fairclough 1992), mas ela tem problemas (pelo menos
na linha anglo-americana, em oposição às versões européias continentais), às vezes, exagerando o agente
social e tendendo a trabalhar com completudes isoladas (geralmente inventadas) (Fairclough 2001b).

Ideologias e suposições
57
Sistemas de valores e suposições associadas podem ser vistas como pertencendo a discursos
particulares – um discurso neoliberal e econômico no caso de a suposição de que nada que corrobore a
‘eficiência e adaptabilidade’ seja desejável. Suposições existenciais e proposicionais podem também ser
um discurso específico – um discurso particular inclui suposições sobre o que há, o que é o caso, o que é
possível, o que é necessário, o que será o caso, e assim por diante. Em alguns casos, alguém pode argüir
se tais suposições, e de fato os discursos aos quais eles estão associados, são ideológicos. Sentidos
supostos são de significância particularmente ideológica – pode-se argüir que as relações de poder são
melhores servidas por sentidos que são largamente tomados como dados. O trabalho ideológico sobre os
textos é conectado ao que eu disse em outro momento do texto sobre a hegemonia e a universalização. A
busca por hegemonia é uma questão de buscar universalizar sentidos particulares no trabalho de atingir e
manter dominação, e isto é um trabalho ideológico. Portanto, por exemplo, textos podem ser vistos
como desempenhando um trabalho ideológico ao supor, tomando como uma realidade inquestionável e
inevitável, a faculdade da economia global (ex: supor a existência de um ‘mercado global’ na sentença
referida na discussão sobre hegemonia; ‘há estudantes com quem nossos jovens têm de competir por
trabalhos e vagas universitárias num ‘mercado global’). Similarmente, no texto da União Européia,
ambos, a suposição de que globalização é a realidade e a suposição de que globalização é progresso
econômico podem ser vistos como fazendo um trabalho ideológico.
A fim de fazer tais afirmações, entretanto, é necessário que se transcenda a análise textual.
Consideremos um outro exemplo bem diferente, um excerto do horóscopo (Lancaster Guardian, 23 de
novembro 2001).
Virgem

O crescimento espiritual será mais importante para você do que ambição material por algumas
semanas. Tendência introspectiva, você gostaria de se sentir mais em contato com sua alma. Se
você puder encostar tarefas pesadas por algumas semanas, isso poderá te ajudar. Embora isso possa
não ser fácil devido ao fato de que você estará elétrica em alguns momentos. Pense sobre a sua
raiva, bloqueando a sua participação ativa, e você poderá ver porque é melhor clarear o que você
precisa daquilo que você não precisa. Se você não se impuser de forma gradual, o ressentimento
cresce, e depois você desabafará de uma vez.

Algumas suposições proposicionais podem ser identificadas aqui. Primeiro, há uma suposição
‘dualista’ e religiosa de que o ‘espírito’ contrasta com o corpo, o eu interior com o eu ‘exterior’, é
suposto que o foco no ‘crescimento espiritual’ significa ‘olhar interior’ em ‘contato com a sua alma’,
uma suposição-ponte que é necessária para uma relação semântica coerente entre as primeiras duas
sentenças. Há também uma suposição existencial de que há tais coisas como ‘alma’ – ou que as pessoas
58
têm alma. Terceiro, há uma suposição de que se alguém está ‘elétrica’, é difícil de ‘encostar tarefas
pesadas por algumas semanas’. Quarto, pensar sobre as coisas de uma certa maneira permite a pessoa
entendê-las, que é melhor separar constantemente o que você precisa daquilo que você não precisa, que
você precisa de algumas coisas e não de outras. Quinto, que quando o ressentimento cresce, as pessoas
são propensas a desabafar de uma vez.
Alguém poderia argüir que a suposição ‘dualista’ e religiosa que contrasta um eu espiritual
interior com um eu exterior é ideológico. Esse é um argumento clássico sobre religião e ideologia, como
o ‘ópio das massas’ de Marx. Mas para alegar que isso é uma suposição ideológica, é necessário um
argumento plausível que seja realmente efetivo, conjuntamente a outras proposições e crenças
relacionadas, sustentando relações de poder. Isso deveria estar baseado numa análise científica e social
complexa de relacionamento entre crenças religiosas e relações de poder, e, obviamente, tal alegação
seria polêmica. A análise teria de ir além dos textos, embora uma análise textual que demonstre que esse
dualismo religioso é persuasivamente suposto, tomado como dado, poderia ser visto como uma parte
significante da análise. Certamente, não se pode ater-se somente à análise textual, identificando
suposições, e decidindo somente pelas evidências textuais, as quais seriam ideológicas.

Outros tipos de suposições


O que eu venho chamando de ‘suposições’ são um dos tipos de implícitos geralmente analisados
em Pragmática – pressuposições. Verschueren (1999) diferencia quatro (eu trabalhei um pouco com sua
terminologia):

Pressuposições (que eu venho chamando ‘suposições’)


Implicações lógicas
Implicaturas conversacionais padrão
Implicaturas conversacionais não-padrão

Implicações lógicas são sentidos implícitos que podem ser logicamente inferidos das
características da linguagem – por exemplo, ‘Eu estou casado há vinte anos’ implica que eu estou
(ainda) casado (devido ao aspecto verbal), ou ‘ele é pobre mas honesto’ implica que pessoas pobres são
vistas como desonestas (devido o efeito contrastivo da conjunção ‘mas’). Implicaturas conversacionais
padrões são sentidos implícitos que podem ser convencionalmente inferidos com base em nossas
suposições normais de que as pessoas aderem a que Grice (1975) chamou de ‘máximas’
conversacionais. As quatro máximas são:
59

Quantidade: Dê tantas informações, e não mais informações que as requeridas pelo contexto,
quantas necessárias;
Qualidade: Tente falar a verdade;
Relevância: Seja relevante;
Modo: Seja claro.

Por exemplo, se eu pergunto ‘há alguma coisa para se ver em Lancaster?’, você pode inferir a
partir da segunda máxima (máxima da qualidade) que eu não conheço muito Lancaster.
O tipo mais interessante, com exceção da pressuposição, implicaturas conversacionais não-
padrões. O contraste básico entre pressuposições e tais implicaturas é que aquelas tomam como dado o
que é suposto de ser sabido ou acreditado, enquanto estas são fundamentalmente sobre a estratégia de
prevenção do explícito. Entretanto, esse contraste é tornado menos óbvio pela possibilidade de objetivar
a suposição de que alguma coisa é conhecida e acreditada quando alguém tem razões para dizer que não
é – por exemplo, transferir algo contencioso como se assim não fosse (ex.: dizendo ‘eu não me dei conta
de que Fred foi pago pela CIA’ como uma forma de aliciar seu interlocutor para aceitar que ele foi pago
pela CIA). Enquanto implicaturas são estratégias inerentes, suposições podem ser estratégicas.
Esse tipo de implicatura aparece no que Grice chama de ‘desdenho’ de uma das máximas –
quebrando aparentemente uma máxima, mas aderindo a ela um nível implícito de significação. Para
tomar um exemplo clássico, se eu escrevo numa referência para um posto acadêmico que somente o
candidato é ‘bem vestido e pontual’, isso parece quebrar com as máximas conversacionais de
quantidade (porque não provê informação suficiente) e relevância (a informação dada não é relevante).
Mas se a pessoa, lendo a referência supõe que eu estou sendo mais cooperativo que malvado, ele/ela
pode inferir que o candidato não tem as qualidades ou as qualificações necessárias para o posto, o que é
suficientemente informativo e relevante.
60
Resumo

O texto, como parte de interações sociais, é distinguido em cinco partes (diferença entre
"dialogicidade", esfera pública, hegemonia universal e particular, intertextualidade e suposições) e faz-
se uso dessas como base para avaliar os relativos degraus de "dialogicidade" do texto, bem como discutir
que modelo diferenciador caracterizaria uma "esfera pública".
Segundo Laclau, pode-se ver a hegemonia como a tentativa de universalização do particular (ex.:
determinadas representações na mudança econômica) que acarreta uma redução do dialogismo.
Consideramos uma escala dialógica na qual a maioria das opções dialógicas são a inclusão de outras
vozes e a atribuição a elas de citações (que é uma forma de intertextualidade), assumidas posições
dialógicas mínimas, tratando as coisas da maneira como se apresentam.
A discussão sobre intertextualidade e sobre suposições começa com questionamentos em que
significativos textos "externos" e vozes estão incluídos em um texto e quais são excluídos. Também
onde os textos são incluídos, se eles se referem a algo e, especificamente, como.
Distinguiu-se vários tipos de relatos, especificamente certos informes que exigem alguma
"falsidade" para com o que foi originalmente dito ou escrito e indiretamente ou não colocado. Sugere-se
haver dois principais assuntos sobre relatos: sua relação com o que foi dito originalmente e como textos
e vozes são recontextualizados no texto agora relatado: posicionamento e construção textual em relação
ao outro e à voz do autor.
Há três tipos de suposição:
1) existencial
2) proposicional
3) valorizadora
Sugerindo que a suposição pode ou não ser textualmente desencadeada, que está relacionada ao
discurso e tem uma importância em termos de função ideológica do texto. Finalmente, nós distinguimos
suposições de outros tipos de sentidos implícitos.
61
4. GÊNEROS E ESTRUTURAS GENÉRICAS

Tema de analise de texto


Gêneros e características lingüísticas dos textos
Formatos
Análises de gêneros: atividade, relações sociais, tecnologia da comunicação.
Estrutura genérica
Diálogo
Argumento
Narrativa

Tema de pesquisa social


Globalização e desenvolvimento
Comunicação e ação estratégica
Informalidade social
A esfera pública
Mudança social e mudança tecnológica
Ideologia
Novidades – Notícias

Gêneros são especificamente aspectos discursivos das formas de agir e interagir por meio dos
eventos sociais: nós devemos dizer que a (inter) ação não é somente discursar, mas está principalmente,
freqüente no discurso. Então quando analisamos um texto ou interagimos em termos de gêneros,
perguntamos como a forma interioriza e contribui para ações sociais e interações em eventos sociais,
especialmente, tendo como orientação esse livro, interiorizando as transformações associadas com o
novo capitalismo, como já tem sido discutido certos aspectos de gêneros no capítulo 2. Deixe-me repetir
o sumário da discussão.
1. As formas de ações e interações em eventos sociais são definidas por práticas sociais e
modos pelos quais eles organizam-se em redes de comunicação.
2. A transformação social do novo capitalismo pode ser vista como mudança na rede de
comunicação de práticas sociais e com isso muda a forma de ação e interação, que inclui
mudança nos gêneros. Mudança de gênero é uma importante parte de transformação do
novo capitalismo.
3. Alguns gêneros são relativamente “locais” em escala, associada com delimitação relativa
de rede de comunicação das práticas sociais (interiorizando uma organização como
negócio). Outras são especializadas por relatividade “global” (inter) ação através de rede
de comunicação.(gêneros de domínio).
62
4. Mudança em gêneros é mudança em como gêneros diferentes são combinados juntos.
Novos gêneros aparecem por meio de combinações de gêneros já existentes.
5. Uma cadeia de eventos deve envolver uma cadeia ou rede de comunicação diferentes,
interconectada em textos que manifesta uma corrente de diferentes gêneros.
6. Um texto particular ou interação, não está “em” um gênero particular - é adequado para
envolver a combinação de diferentes gêneros.

Nós podemos concluir que dos pontos 5 e 6 a análise de gênero procede como se segue:

a) análise de “cadeia de gêneros”;


b) análise de mistura de gêneros em um texto particular;
c) análise de gênero individual em um texto particular.

Estes constituem o foco do presente capítulo. Em gêneros veja: Bakhtin (1986a), Bazerman
(1988), Chouliaraki e Fairclough 1999, Eggins and Martin (1997), Martin (1992), Swales (1990).
Considerarei dois pontos preliminares sobre gêneros. Primeiro, gênero varia completamente, se
considerarmos em termos de graus de estabilização, com caráter permanente (fixo) e homogeneização.
Alguns gêneros, por exemplo, o gênero de artigo científico em certas áreas da ciência (Swales, 1990)
são bem definidos, quase ao ponto de serem ritualizados. Outros, por exemplo, anunciados em murais
acadêmicos, são totalmente variáveis e em fluxo. Neste período de rápida e profunda transformação
social, há uma tensão entre pressão para a estabilização, parte da consolidação da nova ordem social (por
exemplo, os novos gêneros do telemarketing - veja acima), e pressão entre o fluxo e mudança.
Segundo, não há terminologias estabelecidas para gêneros. Alguns gêneros têm bem-
estabelecidos nomes interiorizados em práticas sociais no qual são usados, outros não. Então, onde ainda
há nomes bem definidos, nós devemos tratá-los com cautela, porque o esquema de classificação sobre
de onde são baseados deve dar uma impressão errada sobre o que acontece atualmente. Por exemplo, o
termo “seminário” tão usado não somente em educação mas em negócios cobre a diversidade de
atividades e gêneros.

Gêneros e Textos
A idéia geral que adoto no livro é verificar o caráter interdiscursivo de um texto (a mistura
particular de gêneros, discursos e estilos) como realizado na semântica, na gramática e no léxico
(vocabulário) característica do texto nos vários níveis de organização textual. Gêneros são realizados no
63
sentido de ação e formas de um texto, discurso na representação de significados e formas, estilo no
sentido representacional e formas.(veja no capítulo 2, para os três principais tipos de significado e
formas em um texto). Isso significa que a relação semântica particular ou relação de categoria gramatical
e relações serão primariamente associadas com outros gêneros, ou discursos, ou estilos.
‘Primariamente’, porque não há relação de um para o outro, então por modalidade de instâncias serão
vistos como primariamente associados aos estilos, mas também ligados a gêneros e discursos (veja
capítulo 10). Volta a discussão do capítulo 2 sobre a natureza dialética das relações entre os três
aspectos de significado, e gêneros, discursos e estilos.
Há vários aspectos de organização textual e várias características de texto nos diferentes níveis
que são primariamente formados sobre gêneros dependentes. Nós podemos sumarizar isso como se
segue. Eu indico alguns capítulos para análise.

Totalidade (‘genérico’) estrutura ou organização de um texto (cap. 4)


Semântica (lógica, temporal etc.) relações entre oração e sentenças, e engrandecimento de
texto (cap. 5)
Relações formais, inclusive as gramaticais. (cap. 5)
No nível de oração (sentença simples), tipos de mudança, fala, função, disposição - modo -
(cap.06)
O modelo de intertextualidade de um texto, o modo que outros textos e vozes são
incorporadas (cap. 4)

Este capítulo será conectado a análises de gêneros para um número de assuntos sobre pesquisa
social. O primeiro tema é as análises de Giddens (1991) sobre a globalização como envolvendo o
desenvolvimento do material social de um contexto social particular e práticas. Dessa forma, essa
análise torna-se disponível por meio de diferentes campos e escalas que devemos denominá-las como
“tecnologias sociais”. Gêneros podem ser, eu sugiro, desenvolvido nesse sentido. Secundariamente, a
distinção de Habermas (1984) entre ação comunicativa e estratégica, eu sugiro, relevante ao uso comum
associado ao relacionamento entre gêneros e propósitos sociais ou metas. Terceiro, informalização social
(Misztal, 2000) e caminho movido do público hierárquico pode ser textualmente analisado em termos de
“conversacionalização” do discurso público (Fairclough, 1992) O quarto tema é a questão da esfera
pública (Arendt, 1958; Habermas, 1989 e Fairclough, 1999) e diálogo- pesquisa de aproximação com
questões sobre o estado de esfera pública, a esfera em que pessoas agem como cidadãos, em termos da
análise das características dialógicas dos textos, tema que eu mencionei no capítulo 3. Quinto, a relação
entre mudanças sociais e mudanças tecnológicas- novas tecnologias da comunicação estão associadas,
eu sugeri, com a emergência de novos gêneros. Sexto, é a promoção da discussão da ideologia (veja no
64
capítulo 1-3) com particular respeito para argumentação e argumentos como uma classe de gêneros. E
finalmente, o sétimo tema, é uma discussão de novas narrativas.
Eu devo primeiro resumir várias estruturas para análise de gêneros, e assim olhar
especificamente os três tipos de gêneros (cada um pode ser visto como ‘familiar’ de muitas
especificidades de gêneros diferentes - veja a discussão de níveis de abstração imediatamente abaixo):
diálogo, argumento, e narrativa. Devo discutir esses, com particular atenção, para, respectivamente, a
pesquisa de temas sociais do espaço público e cidadania, ideologias e notícias.

Pré- gêneros, Gêneros Fragmentados (“desencaixados”), e gêneros Situados


Uma das dificuldades com o conceito de gêneros é que gêneros podem ser definidos em
diferentes níveis de abstração. Por exemplo, alguém pode dizer que Narrativo é um gênero, mas dessa
forma, é Reportagem no sentido de uma narrativa de fatos, sobre eventos atuais, e dessa forma, também,
são novas notícias televisivas, isto é, formas particulares de características noticiadas em novos meios
televisivos. Se narrativa, argumento, descrição e conversação são gêneros no nível alto de abstração.
Eles são categorias que transcendem, particulares redes de comunicação de pratica social, e há por
exemplo, tipos diferentes de gêneros Narrativos (narrativas de conversação, histórias finais na imprensa
e na televisão, as estórias que pacientes dizem em consultas terapêuticas, etc.) do qual estão
especificamente situados em termos de praticas sociais. Se dissermos que um gênero está vinculado a
uma pratica social específica, ou rede de comunicação de uma determinada pratica social, então
chamaremos de narrativa, etc. alguma coisa diferente. Swales (1990) sugere o termo pré-genero, que
adotaremos.
Contudo, isso não resolve inteiramente o problema, porque há outras categorias assim como
entrevista ou noticia que são menos abstratas do que a Narrativa ou Argumentação, ainda claramente
transcendem uma rede de comunicação particular de práticas sociais. Nós devemos notar que há um
processo histórico-social envolvido aqui - que Giddens(1991) tem chamado “desencaixe”. Que estão
surgindo gêneros, para falar, dispersos, desenvolvido de pratica de rede de comunicação social onde
inicialmente desenvolvem e tornam acessível como uma espécie de tecnologia social, que transcendem
ambas diferenças entre rede de comunicação de práticas e diferenças de escalas. Entrevista, por
exemplo, encabeçam tipos muitos diferentes que são especializados por uma prática social particular
(entrevista de trabalho, entrevista de celebridade na televisão, entrevista política, etc.) e também formas
específicas assim como em entrevistas políticas transcendem diferenças de escalas para utilizar formas
usadas internacionalmente. O desencaixe de gêneros é a parte de re-estruturação e re-escalada do
65
capitalismo. Por exemplo, o gênero de auto-propaganda usado por cidades e municípios para atrair
investimentos (veja exemplo 2 no anexo página XXX) envolve o desenvolver da corporação do gênero
propaganda de prática de negócio (como o domínio local tem se tornado mais de negócios), mas essa
especialização da auto-publicação de gênero por si mesmo transcende diferenças de escalas (
exemplificado, pelo fato de só recentemente ter sido adotado, nas cidades ex-socialistas como Hungria,
de onde o exemplo vem. O exemplo aponta a significância do “global” expansão do inglês na escala do
desenvolver de gêneros).
Penso que é proveitoso elaborar a terminologia aqui em uma ordem que evite confusão entre
diferentes níveis de abstração. Devo usar ‘pré-gênero’ como sugerido acima para uma abstração maior
das categorias, como nas Narrativas, ‘desencaixe de gênero’ para alguma coisa como categoria menos
abstrata, como nas Entrevistas”, ‘gênero estabilizado’ para gêneros que são específicos de uma rede de
comunicação particular de práticas semelhantes a ‘entrevista etnográfica’ ( veja exemplo 1 página
XXX).
Uma complicação adicional, que eu discuti no capítulo 2, é que textos particulares podem ser
inovadores em termos de gêneros. Eles podem misturar gêneros diferentes em novas formas. Então não
se pode assumir nenhuma simples correspondência entre gêneros estabilizados e textos atuais e
interações - que como nenhuma forma de atividade social, estão abertas a criatividade e certamente
transgressões de agentes individuais. Por essa razão, eu não concordo com Swales quando ele define
gênero como “uma classe de eventos comunicativo” (Swales, 1990): eventos reais (textos , interações),
não estão no gênero particular, eles não estão no momento do gênero particular. Certamente eles
imbricam nos recursos sociais (de gênero), que estejam disponíveis de forma complexa e criativa. Os
gêneros associados com a rede de comunicação particular de pratica social fazem parte de um potencial
que variavelmente desenhado acima nos atuais textos e interações. E é verdade, contudo, que algumas
classes de texto são genericamente complexas que outras - então no ponto de vista de Swales gêneros
talvez faça sentido, por exemplo, no caso dos artigos de jornais , em certas ciências naturais, mas não
como vários pontos de vista de relações entre texto e gêneros.
Em adição a classes de gêneros misturadas, discutidas no capítulo 2, a mistura de gêneros no
texto assume a forma do que pode ser chamado de emergência de “formatos”, textos que são
efetivamente assembléias de diferentes textos envolvendo diferentes gêneros. Websites são bons
exemplos de formatos, por exemplo, reclamar que as ruas são antiglobalização de rede de comunicação
que se especializa é forma de ação política diretamente para o reclamado , o espaço público das ruas,
que o capitalismo global tem visto como tendo tirado de pessoas. O website oferece o seguinte menu:
como está, arquivo, propaganda, como, onde, imagens, idéias. Uma variedade de diferentes coisas está
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sendo feita em diferentes partes do site, trazendo junto uma variedade de diferentes gêneros. Por
instancias, “propaganda” é um argumento expositório a favor de estratégia política de reclamação de
rua, considerando ‘como” (como caráter um grupo de rua) é uns 10 –pontos ”receita” por organizar
ação. Veja Hawisher e Selfe (2000).
Há outro tipo em que cada gênero pode ser misturado em textos: Há vários gêneros que são
hierarquicamente relatados. No exemplo, por instancia podemos dizer que o gênero principal é
entrevista etinografica, mas outros gêneros são pintados como resposta do administrador. Na primeira
volta do administrador no começo do resumo , há uma narrativa sobre a historia de Liverpool; e o
administrador está desenvolvendo um resumo do argumento do curso. Nós podemos identificar, então, o
principal gênero e o que nós podemos chamar de “sub-generos”.

Analisando Gênero Individual


O gênero individual do texto ou interação( o principal e subgênero do exemplo 1 , entrevista
etnografica, argumento expositório, narrativa de conversação) podem ser analisados em termos de :
atividade, relação social e tecnologia de comunicação- O que pessoas estão fazendo, o que são relações
sociais entre elas, e de qual tecnologia da comunicação (se alguma) essas atividades são dependentes?

Atividade
A questão, o que as pessoas estão fazendo? Aqui os meios especificadamente, o que as pessoas
estão fazendo discursivamente? Quando nós pensamos em eventos sociais, estamos interessados com
atividades acima de tudo, na falta de discurso tão bem como no aspecto do discurso. Aqui o foco está no
discurso. Mas, a distinção necessita estar desenhado entre os casos onde atividade social é
primeiramente o discurso (a leitura, por exemplo), e casos onde o discurso tem papel auxiliar
(consertando o motor do carro, ou jogando futebol) no caso da leitura há a atividade do discurso com
propriedades organizacionais, que podem ser analisadas separadamente da secundaria relativa falta do
discurso, elementos acima de tudo que no uso da cabeça do projetor ou PowerPoint. No caso do jogo de
futebol, isso poderia ser difícil para argumentar que é especificamente distinto da atividade do discurso,
e acima de toda atividade. Se quer discurso é primeiramente ou subordinadamente questão de posição.
Isto é comum para gêneros estarem definidos em termos de propósito de atividade, por instancias
de acordo com Swale (1990) um gênero inclui eventos de classe de comunicação, os membros que
dividem algum grupo de propósito de comunicação. Um gênero particular deve ter um numero de
propósito, por instância, um deve ver exemplo 2 como tendo primariamente propósitos para atrair
67
investimentos para Bekéscsaba, mas isso poderia parecer ter outros propósitos como parecer um bom
lugar para se viver, e isso tem uma dinâmica e talvez ”empreendedor” autoridade local ( e maior e
particular). E isso indica, propósito que pode ser hierarquicamente ordenado; um deve ser principal
acima do propósito de atrair investimentos, e outro propósito são meios de se fazer isso.Propósitos
devem ser relativamente explícitos ou implícitos.
Exemplo 1, pode ser visto como hierarquia de propósitos: um propósito relativamente explicito
de achar como gerentes os vêem e o que eles fazem, mas também superiormente propósitos implícitos,
uma pratica acadêmica, (trazendo pensamentos teóricos que caem para beneficiar superfície de atividade
pratica de trabalho administrativo) , outros para pratica de negócios (para produzir afirmação de
competência de administração)esses exemplos mostram que estão voltados para o propósito de
hierarquia, é uma forma no qual eles vêem como um texto ou interação figura com redes de
comunicação de pratica. O explicito propósito de achar como administradores vêem coisas, e o
propósito associado com pratica social de pesquisa e o gênero de entrevista etnográfica, os outros
propósitos podem ser como transformação antecipada através de redes de comunicação de pratica social
(pesquisas etnográficas, escritos acadêmicos, negócios)e o elo de gêneros (entrevista, argumentos
expositores, checagem de lista) que o entrevistador irá certamente ter em mente, ainda que os
administradores não devam.
Contudo, há problemas no propósito privilegiado, na definição de gêneros. Enquanto, é verdade
que muitos gêneros são claramente úteis, claramente laçado para um largo reconhecimento de propósito
social, que não é verdade para todos os gêneros, o que são propósitos para papos com amigos, por
exemplo? Claro, é perfeitamente possível identificar, propósitos nos papos de amigos, mas isto é visto
completamente enganoso dirigido com o propósito de caráter de entrevista. Nós podemos ver a origem
do problema de muito propósito de privilegio nos termos de distinção de Habermas entre ação
comunicativa e estratégica (1984) – Interação orientada para chegar no entendimento como oposto de
interação orientada para chegar no resultado. A modernização da vida social envolve emergência de
modo crescente do sistema de complexo social que racionalmente é instrumental (mais propriamente
que comunicativo) em cada interação é predominantemente estratégico, o que são, em caráter, orientado
para eficiente produção de resultados. Gêneros de propósitos dirigidos caracterizados por determinadas
estruturas, são partes significantes do instrumento do sistema social, Mas nos termos de Habermas a
“vida no mundo” (enquanto se trata desses sistemas) tem uma racionalidade predominantemente
comunicativa e interação predominantemente comunicativa e gêneros correspondentes que não tem
estrutura determinada. O problema é confundir a tendência de modernização em direção propósitos de
gêneros dirigidos com gêneros como tal.Nós devemos ver como ideologia no senso o que legitima o
68
diagnostico de Habermas como “patológico” acima da extensão do sistema e racionalidade
instrumental – A “colonização” mundo vivo por eles.
A distinção entre estratégica e comunicativa não é tão clara como sugere. Às vezes, ocorre em
combinação, de várias formas. Por exemplo, um estratégia comum, na interação estratégica, é a
simulação da interação comunicativa - a aparente informal bate papo de muitas comunicações entre
empregados de serviços industriais (em hotéis e shoppings), o freguês ou cliente é ao menos em partes
estrategicamente motivados por instrumentos de propósitos de organização de negócios. Nós podemos
ver em termos de grande nível, propósitos implícitos. Conversando com um amigo, o bate papo não
necessariamente impede propósitos de estratégias dirigidas. O ponto é que preferivelmente não possa ser
reduzido por eles.
A conclusão de reservas sobre o grande privilegia de propósito é que não devemos ao longo ver
propósitos como gêneros relevantes, mas que nós devemos evitar centrar ou ver gêneros sobre
propósitos, Melhor nós podemos dizer em termos menos tendenciosos que gêneros variam em termos
de natureza de atividade, eles constituem ou são partes de , e que algumas atividades , mas não outras
são estratégicas e dirigidas propositalmente, ou preferivelmente, desde que isso é uma questão de
posição, que algumas atividades são mais estratégicas (e menos comunicativa no senso de Habermas)
que outros.

Estrutura Genérica
O privilégio de propósitos vai ao longo com a visão de analise de gênero como primeiramente
preocupado com “plataforma” diferenciando gêneros em termos de sua estrutura genérica. Analises de
estrutura genérica, e de mais estratégico valor, gêneros dirigidos por propósitos. Mas isso segue do que
eu tenho dito sobre mistura de gêneros, que não serão sempre possíveis ou de fato útil para identificar
uma clara plataforma, ou estrutura genérica, no atual texto ou interação. O mais atualizado na atividade
é, o mais relevante como a analise é. Por exemplo, transação do mercado mundano descrito por Mitchell
em Marocco ou Hasan em Austrália (Halliday in Hasan, 1989; Mitchell, 1957) visto ser completamente
auto-ritualizado, com elementos preditos ocorrendo na ordem predita, então analises de suas estruturas
genéricas podem ser bem relevantes, Mas ainda nesse caso, há complicações- certos elementos sempre
ocorrem (o cliente perguntando por bens, o vendedor dando os bens ao cliente, o cliente pagando.etc.)
considerando outros somente as vezes ocorrem (o vendedor iniciando a venda perguntando por
instancias” no que posso ajudá-lo?) a seqüência de cada elemento que ocorre é rígida, considerando
69
outros elementos isso pode ser variado (pode haver uma mudança de saudação antes ou depois do
vendedor iniciar a venda).

Minha conclusão é que nós necessitamos procurar por plataformas de analises de texto e
interações, mas não esperar sempre achar que eles são organizados em termos de clarear a estrutura
genérica, e encadear analises nos termos para a questão de ritualização (Connerton, 1989) um ponto de
tensão na transformação social do novo capitalismo está entre rumo a compreensão instabilidade,
flexibilidade, etc, e rumo a compreensão do controle social, estabilização e ritualização. Mesmo no
período de rápida mudança social, onde flexibilidade é uma frase de efeito sem muito significado,
organizações tem como interesse estabelecer e manter controle direto de ritualização. Isso é vastamente
efeito direto do treinamento. Um bom exemplo na área de transação de marketing é o treinamento de
trabalhadores dentro “chamados centros” que ainda inicia venda por telefones ou parte com o cliente
para averiguação do serviço. Cameron (2000) cita o seguinte memorando para apoio no centro de
serviços financeiros.

Regras na chamada telefônica padrão


Todos vocês devem saber de agora que nós pretendemos introduzir regras de telefone no modo
de falar. Há números de razões para padronizar a fala e improvisar chamadas técnicas. O mais
importante de que é conhecendo e excedendo a expectativa do cliente, se nós não fizermos , alguém
fará.

Algumas outras razões são:


 Criar uma imagem profissional
 Improvisar qualidade de processo
 Permitir ao gerente a chamada seqüência e passo.

Todo operador deve usar a fala, sem exceção.

Cameron acha que os chamados centros que equipa os empregadores com escrita cobrindo mais
ou menos nenhum movimento interacional que possa ocorrer no curso da transição, imposto detalhado
estilo de regras, com respeito de como eles podem falar, e monitorado condescendência
assiduamente.Isso envolve não somente uma rígida plataforma de conversação no telefone, mas também
acima de tudo como operar na fala (respondendo com um sorriso vigoroso). Os chamados centros como
70
Cameron diz ”fábrica de comunicação” em que a comunicação é comum e industrializada. Isso é
ligado num foco esmagador na “prática” da educação e treinamento, incluindo caráter de pratica de
comunicação que são demandadas por caráter de trabalho.
Vamos olhar para um ou dois exemplos de estrutura genérica e organização. O primeiro é uma
noticia de acidente do jornal local .

Equipamento de fogo do bombeiro


A troca noturna dos trabalhadores na linha de camada na criação revestida, Santo Georges Quay, LANCASTER teve de
ser evacuado com o fogo começou na tarde de quarta feira.
Quatro carros de bombeiro atenderam o acidente e os bombeiros usavam aparelhagem de respiração a chama que
começou partiu de um elemento infra vermelho.
A chama causou severos estragos a 20 metros do corpo de metal , e para o interior da maquina da camada e a camada
esta toda enfumaçada.
Mas o departamento correu de novo pela quinta de manhã.
Lancaster guardião, 7 outubro de 1986

Desta maneira, noticias tem preferivelmente predito e bem definido estruturas genéricas que nos
resumiríamos como: titulo + parágrafo chumbo (abrindo o parágrafo da estória) + seguidores (parágrafos
2-3.) + resumo de noticiário (parágrafo 4).O titulo e o chumbo dão o resumo da estória - o ponto
principal da estória. Os seguidores acrescentam detalhes - tipicamente a ordem dos seguidores são
flexíveis, um pode mais ou menos mudar a ordem sem afetar a estória.O resumo do noticiário da o
resultado dos eventos noticiados (o acidente e a ação respondem isso, freqüentemente nesses casos,
como as coisas voltam ao normal. Um pode ser relato da típica estrutura genérica para o modo de como
novidades não são somente noticiadas confusas de normalidade, mas também eles retificam.
O próximo exemplo é retirado da discussão de Hasan na transação de compra referida acima
(Halliday and Hassan, 1989):

Posso comprar 10 laranjas e um quilo de banana , por favor?


Sim, alguma coisa a mais?
Não, obrigada.
Tudo é 40 dólares
2 dólares
60, 80, 2 dólares. Obrigada.

Aqui de novo. está relativamente clara e predita estrutura genérica. O cliente começa com o
pedido de mercadoria, o vendedor responde com condescendência de venda (que atualmente ira consistir
71
a ação não lingüística, adquirindo as mercadorias e embalando-as, como bem opcionalmente um
elemento lingüístico - sim , nesse caso.) como favorecimento de oferta de venda. No caso do cliente
rejeita a oferta, então o vendedor faz a petição, que o cliente responde com a condoscência do
pagamento (de novo primariamente não lingüístico, dando ao vendedor mais dinheiro, embora
acompanhado com o elemento lingüístico) O vendedor dá troco (e verbalmente conta nesse caso)
seguido por obrigada (eu tenho capitalizado as classes na estrutura genérica).
Onde há relativamente clareza e predita estrutura genérica, como nos casos, que nos achamos
relativamente muito muita variação nos textos atuais. Há um limite de distancia, que nós podemos falar
sobre estrutura, no senso firme. Elementos obrigatórios, na ordem obrigatória. Algumas classes devem
por instancias serem extraviadas, nem todos noticiários de acidentes tem o resumo das notícias, nem
todas as transações de compras há a oferta do vendedor para a venda), Mas por muitos textos, isso
parece sem graça falar sobre todas as estruturas, num todo. Considerando por instancias o exemplo 2.
festival de floreio na cidade, nós podemos ver que os textos são genericamente diferentes em partes:
noticia principal, fatos básicos, inseridos com captura de fotografias, guia de fotos com cotas maiores de
luminosidade, a principal noticia consiste no titulo + afirmação de uma serie de fatos (descrição)
intercalados com noticias da fala. A seqüência de elementos do corpo do texto é topicamente controlada.
O texto começa com classe de desenvolvimento tópico, uma conta com literatura turista, começando por
região e trabalhando em direção a cidade, por ela mesma notável em caráter. A escolha tópica que por
mais que os textos pareçam ser determinados por um senso que atrai os investidores as cidades.
Há um grau de organização aqui, mas obvio que não chamaremos de estrutura.
Eu devo voltar a questão da estrutura genérica acima, na discussão de analise de diálogos,
narrativa e argumento.

Relações Sociais
Gêneros como formas de interação constituem tipos particulares de relações sociais entre pessoas
que interagem. Relações sociais são relações entre agentes sociais, os quais podem ser de diferentes
tipos: organizações (e.g. governo local, uma organização de negócios), grupos (e.g. uma campanha de
grupo como ‘Ganhando as Ruas’ ‘Reclaim the Streets’), ou indivíduos. A comunicação pode ser entre
organizações ou grupos ou indivíduos, ou combinar diferentes tipos de agentes sociais. Um influente
estudo sociolingüístico de Brown e Gilman (1960) sugere que as relações sociais variam em duas
dimensões, ‘poder’ e ‘solidariedade’, ou hierarquia social e distância social. Uma questão de particular
interesse contemporâneo é a relação entre o que a análise social de rede de práticas, instituições, etc.
72
pode sugerir sobre hierarquia social e distância, e como hierarquia social e distância são construídas
em gêneros.
Considere, por exemplo, a comunicação entre organizações e indivíduos a qual é ‘pervasiva’ na
vida social contemporânea, em publicidade, governo, e outros. Nós podemos dizer, sociologicamente
falando, que a comunicação entre organizações e indivíduos é alta tanto na hierarquia social
(organizações tendem a exercer poder sobre os indivíduos) quanto na distância social (organizações
operam em escala nacional, regional ou global enquanto que indivíduos ocupam lugares específicos). De
fato, o novo capitalismo é caracterizado pelo poder crescente de organizações operando sobre indivíduos
nas escalas globais crescentes. Mas estes vínculos expõem potencialmente ao perigo de problemas de
legitimidade e alienação, como se pode ver algumas vezes nas reações violentas de comunidades locais
em relação ao impacto das políticas impostas por organizações como o Fundo Monetário Internacional
sobre elas. E é notável que gêneros contemporâneos para ‘ação na distância’, gêneros de governo (veja o
capítulo 2), por meio dos quais organizações se comunicam com indivíduos, são caracterizados por
relações sociais simuladas as quais, nós podemos argumentar, tendem a mistificar hierarquia social e
distância social.
O exemplo 7 (Apêndice, páginas XXX) ilustra isso no nível do formato. O Fórum Econômico
Mundial, alarmado talvez com a ascensão das críticas da globalização neoliberal que ele tem defendido e
sua própria influência como uma organização não-democrática, organizou um website interativo o qual
convida indivíduos para contribuir com o debate dele enviando mensagens por e-mail, as quais são
(seletivamente) publicadas no website. Essa página da Internet combina, então, a voz da organização (o
resumo do debate, no exemplo) com a voz de indivíduos de todo o mundo, no formato de extratos de e-
mails que eles enviaram (não incluídos no exemplo). A questão chave, porém, é se isso constitui uma
substantiva mudança nas relações sociais entre essa poderosa organização internacional e indivíduos e as
comunidades locais as quais eles pertencem.
O exemplo 5 (Apêndice, páginas Xxx) é um extrato de uma fala do Primeiro Ministro Britânico
Tony Blair a qual é imediatamente endereçada para a conferência da Festa do Trabalho, mas
inevitavelmente também se dirige, antecipando informações na mídia, para o público amplo.
Novamente, uma análise social das políticas e do governo Britânico sugeriria que existe uma substancial
desigualdade de poder e distância social entre o governo (a Organização por quem Blair fala) e a escuta
ou leitura individual de informações da fala na mídia. Todavia isso é agora uma trivialidade de
comunicação política que os líderes políticos parecem falar para eles mesmos ao invés de somente
representar governos (e.g. ‘Eu compreendo porque as pessoas protestam contra a globalização’), o que
nós podemos ver como comunicação entre uma organização e indivíduos simulando comunicação
73
pessoa-para-pessoa (‘conversacionalização’ do discurso público como eu tenho chamado, Fairclough
1992 – veja também literatura em ‘informalização’ social e a retirada de hierarquias explícitas, e.g.
Misztal, 2000). O exemplo 11 (Apêndice, páginas XXX), um extrato de um papel de consulta de um
governo, começa com um inclusivo ‘nós’o que reduz a hierarquia e distância por implicar que todos
‘nós’ estamos no mesmo barco, e usa expressões (‘caminhos de fazer coisas’, ‘o tipo de trabalho que nós
fazemos) as quais evocam experiências e linguagem diárias.
Pontos similares podem igualmente ser criados sobre o Exemplo 1. Uma visão positiva da
entrevista etnográfica pode ver isso como um recurso valioso para reduzir a distância entre a vida prática
das pessoas que estão sendo pesquisadas, e a academia. Alternativamente, se nós vemos as pesquisas
acadêmicas como aparato do governo como sugerido no capítulo 2, nós podemos ver isso como uma
mistificação da hierarquia e distância social. Talvez mais razoavelmente, nós podemos ver uma certa
ambivalência.

Tecnologias de Comunicação
O discurso pode ser diferenciado com respeito a tecnologias de comunicação em termos de duas
distinções (compare Martin 1992): comunicação bidirecional versus unidirecional, e comunicação
mediada versus não-mediada. Isso nos dá, esquematicamente, quatro possibilidades:

Bidirecional não-mediada: conversação face-a-face


Bidirecional mediada: telefone, e-mail, vídeo conferência
Unidirecional não-mediada: leitura etc.
Unidirecional mediada: impresso, rádio, televisão, Internet, filme

A crescente complexidade de rede de práticas sociais na sociedade contemporânea é ligada às


novas tecnologias de comunicação – telégrafo, telefone, rádio, televisão, e mais recentemente
tecnologias de informações eletrônicas (e.g. Internet) – a qual tem significativamente aumentado a
comunicação mediada unidirecional e bidirecional. Um caminho no qual os gêneros diferem de outros é
nas tecnologias de comunicação para as quais eles são especializados, e um fator em mudança de
gêneros é o desenvolvimento em tecnologias de comunicação: o desenvolvimento em novas tecnologias
de comunicação ocorre em simultaneidade com o desenvolvimento de novos gêneros.
Um exemplo é o desenvolvimento de ‘formatos’ na ‘web’, aos quais eu já me referi. O exemplo
7 foi retirado de um website que combina diferentes gêneros, incluindo argumentos expositivos que
provêem resumos dos debates no encontro anual do Fórum Econômico Mundial (como no extrato
74
incluído no exemplo), mensagens de e-mail enviadas por pessoas ao redor do mundo em resposta aos
debates (ambas as formas em linguagem escrita), e excertos dos debates (linguagem falada) – isso é um
formato no sentido em que eu discuti acima. O formato traz juntamente gêneros extraídos de outras
tecnologias (e.g. impressos no caso dos argumentos expositivos do exemplo) e gêneros os quais tem se
desenvolvido como parte da mudança tecnológica (e.g. e-mail). A novidade do formato tem,
parcialmente, a ver com sua particular forma de ‘multimodalidade’ (Kress e van Leewen, 2001) – ele
combina diferentes modalidades semióticas, incluindo fotografia, imagem visual (incluindo o logotipo
do Fórum Econômico Mundial), vídeo (é possível ver seqüências filmadas dos debates), como também
linguagem. Uma questão geral que surge ao analisar gêneros é quais modalidades semióticas se esboçam
e como elas se combinam. O formato é também não-seqüencial: a alguém é oferecida uma variedade de
escolhas que permitem tomar muitas trajetórias diferentes por meio do ‘website’. E isso é
conseqüentemente interativo, no sentido de que o visitante do website pode decidir o que olhar e o que
não olhar, e qual a ordem; mas também no sentido no qual o debate em Davos foi ‘aberto’ para
visitantes, os quais têm a opção de contribuir por meio de e-mails os quais foram seletivamente
incluídos no site. Contudo, não deve ser exageradamente ‘interativo’: a configuração do website está
restringindo como também facultando, i.e. ele oferece opções, mas também são fortemente limitadas.
A transformação do novo capitalismo, a reestruturação e re-escala de redes de relações entre
práticas sociais, ambas dependem de novas tecnologias (veja Castells, 1996 para uma consideração). A
análise de gênero tem uma contribuição importante para fazer pesquisar as relações entre mudança
tecnológica, mediação (Silverstone, 1999), mudança econômica, e amplas mudanças sociais – ambas em
termos de como a integração das novas tecnologias dentro de processos econômicos, políticos, sociais e
culturais é tornado imediato por meio de novos gêneros, e em termos de como cadeias de gêneros
(capítulo 2) são formadas dentro do tecido da ‘sociedade da informação’. Um outro assunto é a
reestruturação de relações entre as diferentes formas de comunicação associadas a diferentes formas de
tecnologias. Por exemplo, o e-mail deslocou os documentos impressos (memorandos, etc.) e
provavelmente até certo ponto a comunicação face-a-face (conversação) na comunicação dentro das
organizações, embora todas três coexistam em relações particulares umas com as outras. Ou, novamente,
a conversação na vida cotidiana crescentemente intersecta e imanta, e é moldada por várias formas de
comunicação mediada, como a televisão.

Dialogo e Esfera Pública


75
Comecemos pela conversação, ‘bate papo’ (para análise do diálogo conversacional, ver
Cameron 2001). Conversação informal pode ser caracterizada em termos de uma alternância sem
constrangimento dos turnos dos locutores. Os participantes estão em posição de igualdade em relação ao
direito de tomada de turno, no tipo de turnos que lhes são acessíveis (e.g. poder perguntar e responder),
no direito que têm de expectativa quanto a poder falar sem interrupção, entre outras coisas. A maioria
das conversações informais tem alguma coisa que aproxima essas características, mas deve-se salientar
que mesmo conversas informais mostram assimetrias, que podem ser atribuídas a relações sociais entre
os participantes. Por exemplo, pesquisa em língua e gêneros textuais (Talbot 1996) tem sugerido que há
uma distribuição desigual de turnos em conversações entre mulheres e homens em, por exemplo,
relacionamentos sexuais (mulheres tendem a ser mais interrompidas do que homens; que homens dão
menos indicações conversacionais de que estão ouvindo ativamente sua contra-parte do que as mulheres,
entre outras coisas).

Uma abordagem à análise do diálogo é contrastar diálogos reais com ‘templates’ (modelos de
diálogos) cooperativos e igualitários, que são aproximativos somente em alguns diálogos. Esse
‘template’ pode ser especificado como participantes sendo iguais em relação ao ‘direito’ de, por
exemplo (Fairclough, 1999):

1. tomada de turnos
2. uso de turnos para atuar de formas diferentes – perguntas, pedidos, reclamações, etc.
3. fala sem interrupção
4. seleção e mudança de tópicos
5. oferecimento de interpretações ou sumários do que foi dito

Os diálogos, em contextos institucionais variados, geralmente envolvem restrições desiguais nos


‘direitos’ conversacionais. Por exemplo, nas entrevistas os turnos são propensos a ser assumidos de um
entrevistado por um entrevistador, em vez de turnos tomados livremente pelo entrevistado. Apenas
entrevistadores têm o direito de perguntar, enquanto entrevistados têm a obrigação de respondê-las;
entrevistadores são mais propensos a interromper os entrevistados do que o contrário; entrevistadores
têm grande controle sobre os tópicos e são mais propensos a dar interpretações e sumários do que foi
dito; e recuperar, ‘arrumar’ o que os entrevistados dizem. Entretanto, isso talvez caracterize mais um
certo tipo de entrevista do que, por exemplo, a entrevista etnográfica do exemplo 1, na qual embora haja,
por exemplo, essa distribuição desigual de perguntas e respostas, o entrevistado é capaz de falar sem que
haja interrupções, como também selecionar e mudar tópicos, entre outras coisas.
76
Questões sobre o diálogo têm sido investidas de importância considerável em relação aos
efeitos do novo capitalismo nas democracias e na ‘esfera pública’, discutido brevemente no capítulo 3.
A preocupação é que a reestruturação do capitalismo está erodindo democracia na esfera pública. Isso é,
parcialmente, uma questão dos efeitos que isso tem sobre os Estados-nações e seus sistemas políticos:
dado o crescente consenso dentro da principal linha política de que a globalização neoliberal seja um
mero fato da vida, na qual os Estados-nações têm de competir para obter sucesso, o espaço para o
debate político nos temas de substância torna-se mais limitado. Isso é evidente na relativa
marginalização dos parlamentos nacionais em favor dos comitês especializados, no limitado efeito do
parlamento europeu em ralação à formulação de políticas públicas, bem como no perceptível declínio
nos substantivos debates públicos nas reuniões públicas, na mídia, entre outros.
O que isso tem a ver com diálogo? Há uma maneira muito rica de falar sobre o ‘diálogo’,
‘deliberação’, ‘consulta’, entre outras coisas no que tange à política contemporânea, para não mencionar
o alastramento da idéia que advoga as ‘sociedades’ (partnerships) de todos os tipos. Tudo isso implica
um forte comprometimento com a democracia, cujas considerações mencionadas anteriormente
levantam algum tipo de suspeita (Fairclough, 2000b).
O que isso tem a ver com dialogo? Há uma maneira muito rica de falar sobre o “dialogo”,
“deliberação”, “consulta”, entre outras coisas, no que tange à política contemporânea, para não
mencionar o alastramento da idéia que advoga as “sociedades” (partnerships) de todos os tipos. Tudo
isso implica um forte comprometimento com a democracia, cujas considerações mencionadas
anteriormente levantam algum tipo de suspeita (Fairclough, 2000/b). Uma esfera pública efetiva pode
ser definida nos termos da qualidade do dialogo que toma parte. Nela, como teóricos da esfera pública
(Habermas, 1989; Arendt 1958) já fizeram menção. Isso sugere que a qualidade e os limites das formas
democráticas contemporânea podem ser produtivamente essessadas mediante a checagem das
propriedades do que se apresenta como dialogo político ou social. Por exemplo, há bastante
experimentalismo acontecendo no intuito de desenvolver formas mais efetiva de deliberação e consultas
públicas – grupos focais, painel de cidadãos, entre outros. Como nós podemos avaliá-los como diálogos
da esfera pública?
Eu usei a abordagem do arranjo de diálogos reais em contraste com uma “template” normativa que
faz referencia à esfera pública em livro anterior (Fairclough, 1999), e reformulei-o como um conjunto de
especificações para o “dialogo real” em Fairclough (2000/b). Isso é uma caracterização normativa de
características necessárias ao dialogo efetivo da esfera pública:
a) Pessoas decidem entrar no dialogo, e podem continuar o dialogo posteriormente;
77
b) O acesso é aberto para qualquer um que queira, e as pessoas têm oportunidades iguais para
contribuir com o dialogo;
c) As pessoas são livres para discordar, e as diferenças entre elas são reconhecidas;
d) Há espaço para consenso, alianças podem ser formadas;
e) É a fala que faz a diferença – ela pode direcionar para a ação (mudança política).

Considere o exemplo 8 (Apêndice pp ), um excerto de um “debate” da televisão britânica sobre o


futuro da monarquia, comentado no capitulo 3, no tema sobre a diferença. A introdução ao programa faz
um recorte, nos termos de que a audiência vote um “referendo” por telefone, depois de contrabalanças
racionalmente as evidencias e os argumentos fornecidos pelo programa – Apesar de isto, em realidade,
ser impossível, porque os votos teriam de ser computados no de correr de programa. Havia também uma
implicação altamente questionável de que o referendo pudesse afetar o futuro da monarquia. Assim, o
programa tem pretensão de ser constituído na esfera pública arrastando as pessoas para falar e agir. No
entanto, o tipo de “dialogo” que não nós temos aqui é problemático, enquanto dialogo da esfera pública,
que pode imantar as pessoas como cidadãos de diversas maneiras. Primeiro, a participação se dava
somente por convite, enquanto diálogos da esfera pública deveriam ser abertos para qualquer pessoa que
se interessasse. Segundo, este evento era curto, com regulação severa de tempo, dessa forma não haveria
espaço para um processo de “vocalização” (rumores) das diferenças e, talvez, transcendendo as
diferenças para formar consensos e alianças. Isto seria o que um efetivo diálogo da esfera pública
engloba. Terceiro, o diálogo referido não era entre iguais: o “diálogo” era regulado por jornalistas, pois
eles direcionavam as tomadas de turno, será ordem e extensão, os tópicos, etc. (Em realidades o painel
de “especialistas”, no programa, efetivamente tornou-se um diálogo mais aberto, mas somente porque
seus membros ignoravam algumas vezes as investidas do mediador do ‘debate” para regula-los).
Aspirações da televisão à constituição de uma esfera pública são sempre limitadas por pressões
comerciais para fazer o que os jornalistas percebem como “boa” televisão – o que implica em uma
regulação restritiva da condução do diálogo. Ver Fairclough, 1999.
Outra área problemática, em termos de cidadania e esfera pública, é a processo de “consulta” sobre
temas contenciosos. Como o destino dos restos nucleares e os lugares experimentais para o cultivo de
culturas geneticamente modificadas. (Ver exemplo 15). Mesmo havendo alguma provisão oficial para
“consulta” com a audiência nesses temas, há pouca chance para o desenvolvimento de um dialogo
efetivo da esfera pública ou para as pessoas agirem como cidadãos em relação a tais questões. (Embora
as pessoas possam fazê-lo em outros fóruns de debate organizados por grupos como “Os amigos da
terra” entre outras ONGs). Há um a tendência em ver reuniões públicas como “consultas” somente em
78
stritu sensu de informações oficiais e respostas a questões – raramente “consultas” em seu sentido
mais significativo. Até onde o diálogo real emerge em tais ocasiões, ele e faz através de membros da
esfera pública, estendendo ou tangenciando ou contestando as regras do gênero. Eu discutirei o exemplo
15 no capitulo 10 no tocante à cidadania e aos especialistas.

Argumento, suposições e ideologias.


Uma visão ampla da estrutura genérica de um argumento ( baseada em Toulmin, 1958) é que ele
combina três movimentos primários: Bases (termos), Garantias, alegados. Nós também podemos
distinguir o “apoio”, que apóia as garantias. (Olhemos o exemplo 7 (Apêndice) pp ). Parece haver
dois argumentos principais que estão interligados de certa forma confusa. O primeiro pode ser
sintetizado da seguinte maneira: globalização não tem levado mercadorias para o sul (bases);
globalização levará mercadorias se houver mudanças na governabilidade nacional e global (garantia);
globalização pode levar mercadorias (apoio); mudanças deveriam ser feitas na governabilidade global e
nacional (alegação).
O segundo: globalização é geralmente percebida no sul em termos de desafios sociais, mais que
oportunidades econômicas (base); percepções podem ser mudadas através de mudança organizacional
(mudança da governabilidade), (Garantia); mudanças deveriam ser feitas na governabilidade nacional e
global (alegação).
A mistura desses dois argumentos leva a uma ambivalência: isto é um argumento sobre como fazer a
globalização funcionar para o sul, ou sobre como fazê-la parecer funcionar (“parecer mais humana”)?
Perceba também que o apoio para o primeiro argumento é suposto, em vez de explicitado – de
fato, o titulo pressupõe que globalização pode levar mercadorias.
Uma dificuldade geral em analisar argumentos é que os elementos dos argumentos podem ser
implícitos, tomados como óbvios e naturais, supostos (gostaria de remeter o leitor à discussão sobre
suposições no capitulo 3.
Uma esfera pública efetiva pode ser definida nos termos da qualidade do diálogo que acontece
sob seu auspício. Como os teóricos no capítulo 3.
Mas perceba também que a suposição de que a globalização pode levar comida para o Sul é altamente
contenciosa, e uma suposição que é associada com um discurso particular, neoliberal e econômico,
como são outras alegações e suposições aqui (que crescimento surgirá se algumas mudanças estruturais
e políticas forem feitas; que benefícios do crescimento ‘deveriam’ alcançar a todos; que ‘transparência’
reduz desigualdade). Garantias e apoio aos argumentos são geralmente específicos a discursos
79
particulares, e geralmente assumidos, em vez de serem explicitados (Gieve, 2000). Onde isso
acontece, deve-se considerar o trabalho ideológico que o texto está fazendo, e.g. o trabalho de criar
representações interessadas, posicionadas e contenciosas: uma questão geral do ‘consenso’. De uma
outra perspectiva, pode-se argumentar com base em uma suposição questionável e contenciosa como um
argumento defeituoso.
Essa análise é muito abstrata, entretanto isso representa uma estrutura lógica dos argumentos
principais, mas não a textualidade dos argumentos, não a forma em que eles aparecem no texto, o qual
também contém um certo número daquilo que chamamos ‘sub-argumentos’, assim como os argumentos
principais. Logo, seria prática suplementar tamanha formulação abstrata com a análise de sua elaboração
textual. Uma complicação, aqui, é a ‘voz’: Está esse texto relatando (os argumentos internos) um debate
(como isso propõe a ser – que está implícito em ‘uma visão do Sul’ no cabeçalho), desenvolvendo um
argumento ‘que lhe é próprio’, ou ambos? Eu acho que a resposta é, ambos, o que significa ambivalência
em termos do gênero principal – isso é um relato, ou uma exposição?
Olhemos mais detalhadamente a segunda metade do parágrafo 4, ‘homogeneização cultural’. Há
sois argumentos relatados no tema homogeneização cultural, o primeiro atribuído a ‘muitos’ e o segundo
atribuído a ‘outros’. Aquele é identificado como um ‘medo’, enquanto este é desenvolvido em três
sentenças, somente a primeira delas contém uma atribuição (‘outros discordam’). Note que a terceira,
em particular, a qual formula a alegação (‘governadores precisam ser cuidadosos para não misturar
diversidade com as formas destrutivas do passado’). Que tipo de alegação é esta? Há uma ambivalência
similar no argumento seguinte sobre ricos e pobres, que consiste somente em alegações sem
fundamentos (ou garantias). A primeira das sentenças atribui vagamente uma alegação mediante
identificação disso como uma ‘preocupação’ (alguém está preocupado – mas quem?), enquanto as outras
duas alegações da segunda sentença (‘os benefícios do crescimento resultante deve alcançar a todos’,
‘economias que são mais transparentes tendem a apresentar menos desigualdades salariais’) não são
atribuídas. Novamente, a quem pertencem essas alegações?
Argumentos podem assumir uma forma dialógica, i.e. na forma de duas ou mais pessoas
argumentando. Mas também é prático analisar argumentos ‘monológicos’ como este numa forma
dialógica. Alguns argumentos têm ‘protagonista-antagonista’ mais ou menos explícitos ou implícitos em
sua organização.Esse é o caso aqui, embora a identidade do protagonista, em particular, não é muito
clara. O ‘medo’ e a ‘preocupação’ dos antagonistas são respondidos pelos contra-argumentos de um
protagonista. O título (‘uma visão do Sul’) pareceria sugerir que o antagonista é (alguém dizendo para) o
Sul, representando a visão e os argumentos do Sul. Porém, aqui e em algum outro lugar, o texto parece
ser organizado em termos de alguns protagonistas não identificados (alguém falando para o executivo do
80
Fórum Mundial Econômico, talvez?) argumentando contra visões do Sul. Então, eu me indago, será
isto um sumário de visões do Sul, ou um argumento contra essas visões?
O argumento em torno do caso de Gana, no parágrafo 5, mostra uma ambivalência similar. A
segunda sentença do parágrafo (começando ‘Gana’) formula os fundamentos. As sentenças seguintes
armam de novo uma oposição antagonista-protagonista em relação às alegações, contrastando a alegação
‘comum’ de que a globalização está para ser acusada de ‘algum dia’, com uma elaboração não atribuída
da alegação na sentença final (as estruturas fundamentais de uma economia de mercado ... deve primeiro
ocupar um lugar’). O mantra do neoliberalismo é implícito no (novamente não identificado) argumento
do protagonista: os países precisam competir para conseguir investimento e crescimento, além de seguir
as prescrições de organismos como o FMI, a fim de obter sucesso. No último parágrafo, a alegação
‘líderes facilitarão as coisas, lutando para uma boa governabilidade’, que é também reformulada na
seguinte sentença, parece ser endereçada para ‘o Sul’, embora não seja claro ‘por quem’, quem é o
protagonista – será que temos que tomar isto, talvez, como aquilo que algumas pessoas no ‘Sul’ dizem
sobre os outros? Isto não é claro. ‘Líderes’ são os antagonistas, neste caso, embora nós não recebemos
seus argumentos (talvez para produzir um efeito de que não há problemas em ‘transparência’ crescente,
etc.) Esses dois últimos parágrafos contêm as mais claras formulações das alegações dos argumentos
principais 1 e 2, respectivamente, assim nós podemos ver o texto em sua totalidade caminhando em
direção às alegações-chave.
Os pontos podem ser relacionados com a discussão de diferença na cap 3: Há uma ofuscação de
diferença aqui, talvez uma polêmica encoberta na qual as identidades dos dois ‘lados’ não sejam claros.

Narrativa
Bal (1997) aborda a análise da narrativa em termos de uma distinção analítica entre: fábula,
conto (essa distinção originou no formalismo russo), e em textos narrativos (ver também Ochs, 1997;
Toolan, 1998). A fábula é o ‘material ou o conteúdo que é trabalhado no conto’, uma ‘série de eventos
relatados lógica e cronologicamente’. O conto é a fábula que é ‘apresentada de uma certa maneira’ – isso
envolve, por exemplo, o arranjo de eventos numa seqüência que pode ser diferente da ordem
cronológica original, provendo os agentes sociais de eventos reais com ‘trato distinto’ que os transforma
em ‘personagens’, e ‘focaliza’ o conto em termos de ‘um ponto de vista particular’. A mesma estória
pode aparecer em um conjunto de textos particulares, nos quais o narrador relata a estória por um
instrumento particular – por exemplo, uma narrativa na conversação, uma história narrada em uma
transmissão de rádio, transmissão de televisão, um documentário, ou mesmo um filme.
81
Eu devo usar esse modelo geral para discutir, especificamente, as narrativas que podem ser
encontradas nos periódico. Voltemos, antes, à pequena narrativa que eu discuti acima.

Bombeiro ataca fogaréu


Trabalhadores noturnos numa linha de produção em Nairn Coated Products, At George’s Quay,
Lancaster tiveram que evacuar quando começou a pegar fogo em um dos fornos na noite de quarta-feira.
Quatro caldeiras foram atingidas no incidente e bombeiros vestindo indumentária especial atacaram as
chamas que haviam começado quando um estrago em um dos fornos pegou fogo debaixo do elemento
infravermelho.
O fogo causou sérios estragos nos 20 metros de instalações metálicas, e no interior de uma
máquina de cobertura e o galpão de cobertura estava cheio de fumaça.
Mas o departamento voltou às atividades na quinta-feira pela manhã.
Lancaster Guardian, 7 de outubro de 1986.

A fábula pode ser resumida em termos dos eventos na seqüência cronológica real (que pode ser
mais ou menos deduzida da narrativa): Um incêndio começou (um estrago em um forno que pegou fogo;
o galpão de cobertura estava cheio de fumaça; instalações metálicas e a máquina de cobertura foram
danificadas), trabalhadores foram evacuados, bombeiros atacaram as chamas, o departamento voltou a
funcionar na manhã seguinte. A narrativa coloca os eventos em uma seqüência que difere da ordem
cronológica. Na linha de frente, a ação dos bombeiros em foco (o fogo é representado pela
nominalização ‘fogaréu’, o qual é, gramaticalmente, o objeto do ‘ataque’). No primeiro parágrafo, a
representação da evacuação dos trabalhadores precede a representação do fogo (que aparece em oração
subordinada). No parágrafo seguinte, a representação da ação dos bombeiros precede a representação do
fogo (novamente o fogo aparece em uma oração subordinada). A seqüência é a seguinte: O estrago
causado pelo fogo, o departamento volta às suas atividades normais. Essas características seqüenciais
focalizam a narrativa em termos da resposta ao fogo (evacuação, bombeiros atacando as chamas) em vez
do próprio fogo. Isso não é somente uma questão de seqüência: o gênero de periódicos (acidente) provê
posições de saliência que são relevantes para a focalização.Isso aparece tanto na manchete quanto no
primeiro parágrafo, e alguém pode perceber o posicionamento de ‘retomada do trabalho como normal’
na síntese conclusiva como dando uma saliência que é também parte da focalização: o ponto jornalístico
focaliza a resposta ao acidente e a restauração da normalidade. O texto narrativo é um relato escrito, e o
narrador é, evidentemente, um jornalista.
Os jornais estão criando estórias das séries de eventos relatados cronológica e logicamente. Uma
maneira de encarar os jornais seria como uma forma de regulação social, ou mesmo como uma forma de
violência: os jornais reduzem uma série de eventos complexos cujo relacionamento pode não ser
82
extremamente claro para as histórias, impondo uma ordem narrativas sobre elas. E não é, somente,
uma questão de relacionamento entre a série de eventos reais com uma ordem particular, e a história
sobre eles. Produzir histórias jornalísticas pressupõe uma questão fundamental de construir aquilo que
pode ser um acontecimento fragmentado e mal definido como um evento distinto e separado que exclue
outros, como também organizando os eventos construídos em ralações particulares entre eles. Fazer
jornais é um processo altamente interpretativo e construtivo, e não simplesmente um relato dos ‘fatos’.
Isso não significa que as narrativas jornalísticas são como as ficcionais: narrativas jornalísticas como
narrativas históricas (Callinicos, 1995), têm uma ‘intenção referencial’ que as abre às questões sobre a
relação entre história e eventos reais, questões de verdade. Eles também têm, pode-se dizer, uma
‘intenção explanatória’ que pode vazar para a ‘focalização’: para fazer os eventos constituírem sentido,
trazendo-os para uma relação que incorpora um ponto de vista particular. Se nós vemos os jornais como
parte de um aparato de governo (ver capítulo 2), então há um destaque do sentido no qual as histórias
jornalísticas são orientadas para regular e controlar eventos, e as formas nas quais as pessoas respondem
a eventos (Allan, 1999).
Eu discuti o exemplo 6 no capítulo 3 da perspectiva da intertextualidade, as representações de
vozes e de falas. Essa história contém uma fábula construída de eventos que são ‘a priori’ eventos de
fala, como é, geralmente, o caso das histórias jornalísticas. O tema da seleção, necessariamente, aparece:
os jornalistas tendem a incluir coisas que foram ditas e excluírem outras (que geralmente significa a
exclusão de algumas vozes), selecionando algumas partes do que fora dito, e, geralmente, ordenando o
que é, geralmente, uma cacofonia da fala e da escrita em eventos de fala diferentes. Meus comentários
no exemplo do capítulo 3 apontam para a maneira em que a seqüência de eventos na história, bem como
o enquadramento de eventos, contribuem para uma focalização particular que posicione um protagonista
coberto – a relação antagonista entre o Ocidente e a Líbia.
Deixe-me comentar, brevemente, esse exemplo em termos de atividade, relações sociais, e
tecnologias de comunicação. Histórias jornalísticas de rádio têm uma estrutura genérica relativamente
mal definida, que é similar à estrutura geral de histórias em periódicos (com manchete, lead, por
exemplo), mas difere na forma em que conecta ao instrumento e à tecnologia comunicativa – como o
movimento entre o narrador principal (o locutor) e o narrador secundário (o correspondente) além da
inclusão dos fragmentos gravados (neste caso, de uma declaração do Ministério das Relações Exteriores
da Líbia). A questão do propósito é polêmica e complexa. No nível mais óbvio, as narrativas
jornalísticas têm o propósito de dizer às pessoas o que de significativo tem acontecido no mundo, mas se
nós pensamos em termos de hierarquia de propósito, e de relacionamento entre os campos de atuação da
mídia jornalística (política, negócio, entre outros), nós nos deparamos com questões sobre a mídia
83
jornalística como parte de um aparato de governo – nesse caso, por exemplo, poderíamos atribuir,
razoavelmente, a tais histórias propostas de alto nível que conectem elas como a política internacional?
As mesmas questões aparecem com respeito às relações sociais: são as relações sociais da mídia
simplesmente relações sociais entre jornalistas e audiências (relações de dar informações que dá margem
para questionar a autoridade dos jornalistas?), ou as relações sociais de histórias jornalísticas são
relações sociais dissimuladas entre governantes e governados? (entre governo, negócio entre outras
pessoas). Nós perguntaríamos: focalização de quem, ponto de vista de quem? Finalmente, a alternância
nas tecnologias de comunicação tem provocado efeitos significantes nos jornais. Isso se torna mais claro
se nós pensarmos em telejornais, em que a totalidade de equilíbrio entre história verbal e visual e
imagem fílmica têm alternado, ao ponto em que parece que a disponibilidade ou não disponibilidade de
uma metragem de um bom filme pode ser decisivo ao determinar se há uma história ou não. Nesse
ponto, nós precisamos talvez que indagar se a distinção entre narrativas jornalísticas e ficcionais é
realmente clara: A estética das histórias jornalísticas parece salientar a polêmica, às vezes a custa de sua
capacidade de resposta ao real e questões de verdade, ao mesmo tempo em que wall to wall news
(periódicos que pretendem dar conta da totalidade dos eventos sociais) assume um papel psicológico
social (uma vez controlado pela religião) de fornecer o antídoto para o medo, das várias ansiedades de
um mundo perigoso (Silverstone 1999)
84
Resumo
Tem-se observado que a análise de gênero procede de elos e de misturas de gêneros em direção às
propriedades individuais. Gêneros podem ser identificados em diferentes níveis de abstração: pré-
gêneros, gêneros fragmentados (que são significativos dentro da "desconstrução" que é um traço da
"globalização") e gêneros situados.
Textos podem combinar diferentes gêneros em várias formas: misturando-os ou tornando-os híbridos,
combinando-os em "formatos" ou hierarquizando-os em gêneros principais e subgêneros.
Gêneros individuais podem ser diferenciados em termos de atividade, relações sociais e comunicação
tecnológica (o que as pessoas estão fazendo, como são suas relações sociais entre si e qual tipo de
tecnologia de comunicação (caso exista) dependem suas atividades)
Com respeito à atividade, somente certos gêneros são bem definidos em termos de finalidade e estrutura
genérica (organizada dentro de fases definidas), é tendem a ser especializadas dentro dos sistemas
sociais para ações estratégicas (ao contrário das ações comunicativas)
Alguns gêneros podem ser vistos como mistificadores das relações sociais por meio da
"conversacionalização", o simular de mudanças conversacionais em contextos públicos, que é um
aspecto da "informalização" social.
Mudança em gêneros (inclusive de gêneros encadeados) é um aspecto significante de mudança
tecnológica e novas tecnologias de comunicação.
Discutem-se três (pré)gêneros específicos: diálogo - especificamente na relação daquilo que constitui
diálogo adequado ou efetivo, dentro da esfera pública -, argumento - em termos de significado
ideológico de suposições argumentativas implícitas -, e narrativa, especificamente, em relação às
notícias.

5. RELAÇÕES DE SIGNIFICADO ENTRE FRASES E ORAÇÕES

Questões de análise textual


Relações semânticas entre frases e orações: causal, condicional, temporal, aditiva, elaborativa,
adversativa;
Relações gramaticais entre orações: Relações de coordenação e subordinação.

Questões de pesquisa social


Legitimação;
Hegemonia, equivalência e diferença;
Aparência e realidade.
85
O foco neste capítulo está no significado das relações, relações semânticas entre frases e entre
orações (ou oração simples) com as frases. Nós procuraremos, por exemplo, pelas relações causais ou
lógicas entre frases e orações (por exemplo: relações de finalidade – “Nós vamos medir o seu peso de
forma que seu subseqüente ganho de peso deverá ser avaliado” – de um texto pré-natal que discutirei a
seguir), ou relações adversativas (por exemplo: “Você presta atenção em um conjunto de elementos, o
mesmo que todos vêem, mas reagrupados as partes e os pedaços tornam uma nova possibilidade” do
Exemplo 9, um texto de direcionamento “guru” que também será discutido). Nós também analisaremos
como essas relações semânticas são “realizadas” em várias estruturas gramaticais. A ligação entre esse
capítulo e o capítulo 4 é que o tipo de relações semânticas entre frases e orações encontradas no texto
depende do gênero.
Um número de questões de pesquisa social pode ser esclarecido se for focalizado nessas relações
semânticas. Uma delas é a questão de legitimação (Habermas, 1976; Van Leeuwen (não-datado); Van
Leeuwen e Wodak, 1999) “cada sistema de autoridade tenta estabelecer e cultivar a crença em sua
legitimidade”, e de acordo com Borges e Luckmann (1966) “legitimação fornece as explicações e
justificativas dos elementos proeminentes da tradição institucional”. Uma questão no alcance das
transformações do novo capitalismo são mudanças na legitimação, mudanças em como a nova ordem é
explicada e justificada. As pessoas constantemente transformam sua vida social, o que dizem ou
escrevem por meio de reivindicação e questionamento da legitimidade das ações que são tomadas, dos
procedimentos que existem nas organizações e assim por diante. Isso significa que análise textual é um
recurso significante para pesquisar a legitimação.
A segunda questão é equivalência e diferença – é o que Laclau e Mouffe (1985) identificam, em
relação à hegemonia política, como operação simultânea de uma “lógica da diferença” ou de uma
“lógica da equivalência”. Estas são, respectivamente, tendências em direção à criação e à proliferação
das diferenças entre objetos, entidades, grupo de pessoas etc. e ao colapso ou à submissão das diferenças
pela representação de objetos, entidades, grupos de pessoas, etc. como equivalentes umas às outras. Isso
parece ser um ponto teórico muito mais abstrato, porém é um aspecto do conteúdo do processo social da
classificação. Esta apresenta efeitos causais tais que processos políticos e relações são
predominantemente representados, compreendidos e transformados em termos da divisão “esquerda” e
“direita”, ou como vários fenômenos econômicos e sociais são subordinados à “globalização”, como
suas circunstâncias equivalentes ou aspectos. Desse modo, a classificação e a categoria moldam as
pessoas para pensarem e agirem como agentes sociais. Equivalência e diferença estão na parte textual
das relações e isso é frutífero para “operacionalizar” este ponto teórico mais abstrato na análise textual,
86
identificando como as entidades de vários tipos (pessoas, objetos, organizações etc.) são diferenciadas
nos textos, e como as diferenças entre elas desmoronam-se pelas relações textuais de equivalência.
Com respeito às relações semânticas entre frases e orações, a primeira envolve relações
contrastivas (que podem ser formalmente marcadas por conjunções “mas”, “ao invés de”, e frase
adverbial como “porém”), a segunda envolve relações aditivas e elaborativas, por exemplo,
transformando-as em entidades equivalentes por inclusão nas listas. A questão pode ser colocada em
diferentes termos: o “emprego” da classificação está constantemente presente nos textos, com entidades
sendo mais diferenciadas umas das outras, opostas ou sendo fixadas como equivalentes.
A terceira questão pode ser contenciosamente formulada como: aparência e realidade. Uma
forma clássica de crítica de acordo com a tradição marxista é direcionada à análise (econômica, política)
social, que não vai além da superfície da aparência às “subjacentes” realidades e valoriza as coisas mais
que as considera como efeitos causais das estruturas. Posicionei-me, nessa questão no capítulo 2,
argumentando que tais eventos têm sido como efeitos dos poderes causais das estruturas sociais e
práticas, e a agência de seus participantes. No contexto do novo capitalismo, esta questão apresenta
alguma relevância quando se procura, por exemplo, por representações de mudanças sociais e
econômicas que estão acontecendo, como documentos policiais de vários tipos. Contrastarei uma “lógica
explicativa” e uma “lógica da aparência” – essas representações freqüentemente não se aprofundam
mais do que aparências com evidentes mudanças, mais do que oferecendo contas explicativas de
mudança em termos de relações causais.
Procederei brevemente fixando as categorias de análise e distinção, e então usá-las na discussão
das questões de pesquisa social.

Relações semânticas
A seguir serão resumidas as principais relações semânticas entre frases e orações: os exemplos
são dados em parêntesis, grifando as conjunções (por exemplo, “porque”, “e” “mas”) que marcam essas
relações. Note que não há conjunções no caso da elaboração – essas relações semânticas não são sempre
explicitamente marcadas. Distingo um número relativamente pequeno das principais relações semânticas
– posteriormente as distinções serão certamente possíveis (Essas distinções são semelhantes em
Halliday, 1994; Martin, 1992).

Causal
Razão (Chegamos tarde porque o trem atrasou-se).
Conseqüência (O trem atrasou-se, de modo que chegamos tarde).
87
Finalidade (Saímos cedo para que pegássemos o primeiro trem).
Condicional (Se o trem se atrasar, chegaremos tarde).
Temporal (Preocupamo-nos quando o trem se atrasou).
Aditiva (Que dia! O trem atrasou-se e o cachorro ficou doente).
Elaboração (incluindo Explicação, Reformulação) (O trem atrasou-se – era esperado às 7h 30 e chegou
às 9h).
Contrastiva/concessiva (O trem atrasou-se, mas chegamos ainda na hora).

Os seguintes exemplos ilustram um pequeno número dessas relações semânticas – Identifico-as


em letra maiúscula entre as frases ou orações que são relacionadas, e sublinho os conectivos que
marcam as relações em que eles ocorrem (em alguns casos eles não aparecem).

Bombeiro ataca fogaréu


Trabalhadores noturnos numa linha de produção em Nairn Coated Products, At George’s Quay,
Lancaster tiveram que evacuar quando começou a pegar fogo em um dos fornos na noite de quarta-
feira.
Quatro caldeiras foram atingidas no incidente e bombeiros vestindo indumentária especial
atacaram as chamas que haviam começado quando um estrago em um dos fornos pegou fogo
debaixo do elemento infravermelho.
ADITIVA O fogo causou severo dano aos 20 metros do tubo e ao interior da máquina de fazer
casacos.
ADIÇÃO e a sala dos casacos.
ADVERSATIVA Mas o departamento estava funcionando novamente na quinta de manhã
(Lancaster, 1986)

Exame
Seu peso será medido FINALIDADE de forma que seu conseqüente ganho de peso deverá ser
avaliado. ADITIVA sua altura deverá ser medida, RAZÃO desde que mulheres baixas, na maioria das
vezes, tenham a pélvis menor que a das mulheres altas – ELABORAÇÃO o que não é surpresa.
TEMPORAL Uma completa avaliação física será então necessária. ELABORAÇÃO que incluirá
checagem de coração, de pulmão, de pressão sanguínea, de abdômen e de pélvis. FINALIDADE A
finalidade disto é identificar qualquer anormalidade que venha a ocorrer, ADVERSATIVA mas que
88
estão longe de causarem algum problema. ADITIVA um exame vaginal possibilitará que a pélvis seja
examinada FINALIDADE com a finalidade de checar a condição do útero e da vagina. ADITIVA um
exame cervical é também tomada nesse período para excluir qualquer alteração pré-cancerígena que
raramente poderá estar presente.
(Morris, 1986)
Começaremos a ver, a partir desses exemplos, a ligação entre relações semânticas e gênero. O
primeiro deles é um boletim de um jornal local – mais especificamente, um boletim de acidente. Discuti
sua estrutura genérica no capítulo 4. Boletim de notícias é um tipo de narrativa, assim seria de se esperar
relações temporais entre eventos a serem especificados (“isso aconteceu, então aquilo aconteceu”).
Relações aditivas e elaborativas são também previsíveis – boletins acumulam detalhes sobre eventos.
Um teste tosco para saber se frases ou orações estão em relações aditivas ou elaborativas é ver se a
ordem em que elas aparecem pode ser invertida. Por exemplo, o terceiro parágrafo (“O fogo causou...” –
note que esses parágrafos apresentam apenas uma frase) precederia o primeiro. Estas são relações
aditivas – uma coisa é simplesmente adicionada à outra, não há implicação de nenhuma relação entre
elas. Por contraste, as primeiras duas orações do segundo parágrafo estão em uma relação elaborativa: a
segunda oração (“bombeiro usando aparato para proteção...”) especifica e preenche as informações
dadas na primeira, e sua ordem não poderia ser realmente invertida. A relação semântica contrastiva no
final é também previsível no gênero – realizando o que chamo de “Wrap-up3”, no capítulo 4, o caminho
no qual tais boletins tendem a concluir como as coisas voltam ao “normal”.
O segundo exemplo, um extrato de um folheto de uma clínica pré-natal, pode também ser visto
como uma narrativa de senso geral que representa eventos em seqüência temporal. Porém mais do que
recontar eventos atuais, esse exemplo descreve um procedimento (ver Martin, 1992, para essa distinção).
Relações aditivas, temporais e elaborativas são ainda relevantes, mas o que é notável é a proeminência
de uma relação que não ocorre no outro exemplo – finalidade. Existem quatro relações finais no
mencionado extrato. Por quê? Por que textos desse tipo priorizam legitimação. Colocando o ponto em
termos do senso-comum, se grávidas são sujeitas a esses testes e assim por diante, assim são mais
tendenciosas a aceitar o processo se entenderem o que o motiva, porque ele é necessário sob um ponto
de vista médico. Assim, legitimação não é apenas o presente, ela é, como disse, priorizada, pois existem
muitas marcas explícitas de finalidade, o texto é construído em um caminho que requer atenção à
racionalidade do procedimento.

3 (Nota do tradutor) “Wrap-up” é uma expressão idiomática que indica tempo de conclusão ou momento de partida.
89
Relações Semânticas em Alto Nível
Em adição às relações semânticas relativamente “locais” entre frases e orações, podemos
identificar as relações semânticas mais “globais” ou “alto nível” não apenas em trechos do texto mas
nele completamente. Um exemplo muito comum é a relação “problema – solução” (Hoey, 1983; Hoey,
2001; Winter, 1982). Por exemplo, muitos anúncios são construídos em torno dessa relação: o
“problema” é a necessidade ou o desejo atribuídos aos consumidores em potencial; a “solução” é o
produto (por exemplo “pele seca” pode ser o “problema”, o hidratante Brand X pode ser a “solução”).
Outra relação importante é o objetivo – relação de alcance, que é comum, exemplificando, em receitas
que são organizadas em termos de um objetivo (fazer um prato particular) e um método para alcance
(Hoey, 2001).
A relação problema – solução é também pertinente em textos policiais de vários tipos, como no
Exemplo 7. O problema e a existência da (não a natureza da) solução são assumidos no título, “Como a
globalização pode entregar as mercadorias”? Isso mplica que a globalização não está realmente
entregando as mercadorias (resultados de produção benéfica), que é o “problema”, mas a questão –
“como” implica que existem modos de resolvê-lo. A relação “problema – solução” ocorre novamente no
início do parágrafo: o “problema” é formulado nas duas primeiras frases, a terceira sentença assume que
as expectativas do hemisfério sul podem ser encontradas, isto é, que o “problema” pode ser resolvido.
Há, então, quase uma complexa recorrência das relações “problema – solução” no texto.
Como apontei no capítulo 4, Exemplo 7 é ambivalente em vários modos. É ambivalente em
termos de qual “problema” é – a globalização não está funcionando ou esta globalização é vista como
algo que não está funcionando? Correspondentemente, algumas “soluções” parecem se endereçar à
primeira (notadamente a mudança estrutural defendida no penúltimo parágrafo, situado “as estruturas
fundamentais de um mercado econômico), enquanto outra “solução” (aquelas que envolvem as “vozes”
dos “países em desenvolvimento” sendo ouvidas) parecem se endereçar ao último. Claro, alguns
argumentariam que os “problemas da globalização não são de fato direcionados como um todo neste
texto, ainda menos qualquer “solução”.

Relações Gramaticais
Relações semânticas são realizadas em uma série de estruturas gramaticais e lexicais
(vocabulário) dos textos – ou apresentadas diferentemente, há uma série de marcas textuais dessas
relações. Vamos começar com as relações gramaticais entre orações com frases –coordenadas,
90
subordinadas e coordenadas e subordinadas. Orações são também coordenadamente relacionadas ou
subordinadamente relacionadas (Eggins, 1994, Halliday, 1994; Quirk et. al 1972, 1995).

 Coordenação
Orações são gramaticalmente “iguais” ou “coordenadas” (por exemplo “os pássaros estavam
cantando e o peixe estava pulando” – a conjunção coordenada está em itálico).

 Subordinação
Uma oração, a oração “subordinada” é subordinada a uma outra, a oração principal (por
exemplo, “os pássaros estavam cantando porque o sol estava brilhando” – a segunda oração, com a
conjunção “porque” é a subordinada).

 Coordenação e Subordinação
Uma oração funciona como um elemento de uma outra (seu sujeito, por exemplo) ou como um
elemento da frase (“o homem que veio jantar”).

Vamos ilustrar essas diferenças com os mesmos dois exemplos. Nesse caso, identifiquei relações
gramaticais em letras maiúsculas entre as orações relacionadas e sublinhadas, as orações coordenadas e
subordinadas. Conjunções e conectivos estão também sublinhados.

Bombeiro ataca fogaréu


Trabalhadores noturnos numa linha de produção em Nairn Coated Products, At George’s Quay,
Lancaster tiveram que evacuar SUBORDINADA quando começou a pegar fogo em um dos fornos na
noite de quarta-feira.
Quatro caldeiras foram atingidas no incidente COORDENADA e bombeiros vestindo indumentária
especial atacaram as chamas SUBORDINADA que haviam começado SUBORDINADA quando um
estrago em um dos fornos pegou fogo debaixo do elemento infravermelho.
O fogo causou sérios estragos nos 20 metros de instalações metálicas, COORDENADA e no
interior de uma máquina de cobertura e o galpão de cobertura estava cheio de fumaça.
COORDENADA Mas o departamento voltou às atividades na quinta-feira pela manhã.

Exame
91
Seu peso será medido SUBORDINADA de forma que seu conseqüente ganho de peso deverá
ser avaliado. Sua altura deverá ser medida, SUBORDINADA desde que mulheres baixas, na maioria das
vezes, tenham a pélvis menor que a das mulheres altas – SUBORDINADA o que não é surpresa. Uma
completa avaliação física será então necessária SUBORDINADA que incluirá checagem de coração, de
pulmão, de pressão sanguínea, de abdômen e de pélvis. A finalidade disto é identificar qualquer
anormalidade que venha a ocorrer, COORDENADA mas que estão longe de causarem algum
problema. Um exame vaginal possibilitará que a pélvis seja examinada SUBORDINADA com a
finalidade de checar a condição do útero e da vagina. Uma lesão cervical é também tomada nesse
período SUBORDINAÇÃO para excluir qualquer alteração pré-cancerígena que raramente poderá
estar presente.
(Morris, 1986)

Note que as orações com “pronomes relativos” (que, neste caso, apesar de quem, que etc. podem
ser também pronomes relativos) são tomadas como relações de subordinação em alguns casos, e
coordenada e subordinada em outros. Dois tipos de orações relacionadas são convencionalmente
distinguidos (Halliday, 1994; Quirk et al. 1972) “restritiva” ou “explicativa” e “não-restrita” ou “não-
explicativa” – a primeira define, especifica ou delimita nomes em frases nominais (isto é, nenhuma
anomalia pode estar presente), as últimas são realmente equivalentes a, por exemplo, “e esta” (“o que
não é surpresa” pode ser reordenada como “e esta não é surpresa”) e são elementos das frases mais que
elementos da frase nominal.
Em adição a essas relações entre orações e frases, os dois exemplos apresentam um número de
marcadores coesivos das relações semânticas entre as frases. O primeiro exemplo apresenta “mas” no
começo da última frase; o segundo exemplo, por sua vez, apresenta “então”, “a finalidade disso” e
“também”. A literatura em “coesão” (Eggins, 1994; Halliday e Hasan, 1976, Halliday, 1994, Martin,
1992) inclui sob as frases uma variedade de relações coesivas entre frases:

a) Relações de referência: os artigos definidos (“a”, “o”, “as”, “os”), pronomes demonstrativos
(“este”, “esse”, “aquele”,aquela”), e pronomes pessoais (“ele”, “ela”, “eles”) são marcadores de
referência após as frases iniciais ou antes das últimas frases.
b) Relações lexicais (vocabulário): modelos previsíveis de co-ocorrência entre palavras (Tais como
“peso” e “medida” no começo do segundo exemplo) constituem “encadeamento” lexical por
textos.
92
c) Relações conjuntivas entre sentenças são marcas de conjunções tais como “mas” na última frase
do primeiro exemplo, ou conectivos como “porém” ou “contudo”.

Lógica Explanatória versus Lógica de Aparências


Vejamos o Exemplo 11, do Documento do Governo Britânico (Documento de consulta) “A era
do aprendizado”, em termos de distinções acima. Eu indiquei as relações semânticas entre sentenças e
frases em letras maiúsculas para a primeira seção do extrato, e sublinhei marcas de relações semânticas.
Nós estamos em uma nova era – a era da informação e competição global.
ELABORAÇÃO Certezas Familiares e formas antigas de fazer as coisas estão desaparecendo. ADIÇÃO
Os tipos de empregos mudaram ADIÇÃO assim como as indústrias em que trabalhamos e as habilidades de
que elas precisam . ADIÇÃO ao mesmo tempo, novas oportunidades estão se abrindo ADIÇÃO e nós
vemos o potencial de novas tecnologias para mudar nossas vidas para melhor. ADIÇÃO
(CONSEQÜÊNCIA?) Nós não temos escolha a não ser nos preparar para essa nova era na qual a chave do
sucesso será a educação continuada e desenvolvimento da mente humana e imaginação.

O resto da seção pode ser vista como uma elaboração da primeira sentença, e as relações
semânticas entre sentenças e frases dentro da elaboração são aditivas (ainda que eu tenha questionado,
de qualquer forma a sentença final pode ser vista em relação àquelas que a precedem – veja abaixo). A
representação da “nova era” e das mudanças que ela acarreta é basicamente uma lista desordenada de
aparências – desordenadas no sentido de que elas podem ser facilmente reordenadas (por excelência, a
sentença 3 poderia preceder a sentença 2). Também, as aparências ou evidências listadas são bem
diversas – mudanças na indústria, empregos, habilidades, pontos de vista (“certezas”). Um modo
diferente de representar essas mudanças poderia incluir relações causais entre mudanças em uma área e
mudanças em outras áreas (e.g. “novas habilidades são necessárias porque as indústrias mudaram”,
“certezas familiares estão desaparecendo porque formas antigas de fazer as coisas estão
desaparecendo”).
O contraste aqui está entre a “lógica de aparências” que nós verdadeiramente temos neste
extrato, a uma “lógica explanatória”, que como uma análise desenvolvida das mudanças sociais pode ser
um traço elaborado das relações causais entre outros tipos de mudança, e.g. econômica, educacional,
social psicológica. Podemos ver esse contraste em termos de diferença de gênero: o gênero é
verdadeiramente nos termos do relatório Martin (descrição generalizada – não a descrição de eventos
concretos ou processos, mas a descrição de processos em um alto grau de abstração do concreto, Martin
1992), seja lá o que eu estou dizendo possa ser, isso poderia ser ‘exposição’ (explanatória, não somente
93
descritiva, e uma forma de argumento explícito – ver capítulo 4). Relações semânticas aditivas e
elaborativas são previsíveis em um relatório.
Muitos textos políticos contemporâneos mostram essa tendência em preferir relatórios e uma
lógica de aparências mais que exposição e uma lógica explanatória, e isso vale a pena considerar o
porquê. Uma análise socioeconômica da “nova era” acarretaria em explanação, causalidade e argumento
expositivo. Sem uma análise poderia ser irreal o entendimento da “nova era”, e sem senso real de seu
contingente – como mudar coisas em um nível poderia produzir diferentes possibilidades. Análise
também introduz profundidade de tempo, um senso de como as mudanças por meio de um certo período
de tempo podem subseqüentemente produzir efeitos. Esses aspectos estão ausentes neste exemplo como
em muitos outros textos políticos contemporâneos. Muitos desses textos podem ser vistos como limites
para opções políticas ao representar a ordem socioeconômica como simplesmente dada, um
inquestionável e inevitável horizonte que é em si mesmo intocável pela política e opções limitadamente
refreadas, mais essencial que contingente, e sem profundidade de tempo. Além do mais, esses textos
freqüentemente aparecem para ser mais promocionais que analíticos, preocupados mais em convencer as
pessoas de que essas são certamente as únicas políticas praticadas do que promover um diálogo. Esta
forma de relatório é o que nós poderíamos chamar de “relatórios hortatórios”: descrições com um
intento prescritivo recoberto, objetivando angariar pessoas a agir de certas formas nas bases de
representações do que explicar o que tal coisa seja. Devo retornar a esses temas no capítulo 6.
“Relatório hortatório” é um gênero contemporâneo comum, não apenas no domínio da formação
política no governo, mas também por excelência na literatura de “guia de gerenciamento” que fornece
relatórios persuasivos de transformações nas economias, sociedades e negócios com intento hortatório –
fornecer a gerentes os projetos para transformação de suas próprias práticas. O exemplo 9 (abaixo) é um
extrato de um livro recente de uma ‘guru’ de gerenciamento muito bem conhecido. Rosabeth Kanter da
Escola de Negócios de Havard. Mostrei algumas relações semânticas entre sentenças e frases (e relações
similares entre frases em dois casos) da mesma forma como procedi mais acima.
Empresas que são bem sucedidas na rede operam diferentemente de suas similares retardatárias.
ELABORAÇÃO Na minha pesquisa eletrônica cultural global, aquelas reportam que são muito
melhores que seus competidores no uso da Internet e tendem a ter organizações mais flexíveis, fortes, e
colaborativas. ADIÇÃO As ‘melhores’ são mais indicadas que as ‘piores’, em níveis estatísticos
significantes, como

 Departamentos colaboram (CONTRASTE em vez de concentrarem-se em si mesmos)


ADIÇÃO
94
 Conflito é visto como criativo (CONTRASTE em vez de destrutivo).
ADIÇÃO
 Pessoas podem fazer qualquer coisa, não há proibição explícita (CONTRASTE em vez de fazer
apenas o que é explicitamente permitido). ADIÇÃO
 Decisões são tomadas por pessoas com mais conhecimento (CONTRASTE em vez das pessoas
de maior escalão).
ADIÇÃO marcadores de passo e retardatários descrevem o quão duro eles trabalham (em
resposta a pergunta sobre se o trabalho estava confinado às horas tradicionais ou distribuído de acordo
com o tempo pessoal), CONTRASTE mas eles são diferentes em como eles trabalham de forma
colaborativa.
Trabalhar no modo eletrônico cultural requer que as organizações sejam comunidades com
propósito. ELABORAÇÃO Renomeia os elementos da comunidade esquematizados no capítulo 1.
ELABORAÇÃO Uma comunidade faz as pessoas se sentirem como membros não apenas empregados –
membros com privilégios, mas também com responsabilidades além do trabalho imediato, estendendo-
se a colegas em outras áreas. ADIÇÃO Comunidade significa ter coisas em comum, um conjunto de
entendimentos compartilhados transcendendo campos específicos. ELABORAÇÃO Entendimentos
compartilhados permitem processos relativamente sem emendas, intercâmbio entre pessoas, agradável
formação de equipes que sabem como trabalhar juntas mesmo se elas nunca tenham se encontrado antes,
e com rápida transmissão de informação. ADIÇÃO Neste capítulo, veremos como os princípios de
comunidade aplicam-se dentro de organizações e locais de trabalho, algumas vezes facilitados pela
tecnologia mas também independentes dela. ADIÇÃO E examinarei as mudanças que devem ser feitas
para que se criem comunidades organizacionais.
ADIÇÃO A maior integração que é incondicional à cultura eletrônica é diferente da
centralização de eras passadas. ELABORAÇÃO Integração deve ser acompanhada pela flexibilidade e
fortalecimento do PROPÓSITO no intuito de alcançar respostas rápidas, criatividade, e inovação por
meio de improvisação. ADIÇÃO O sucesso na Web envolve operar mais como comunidade do que
como burocracia. ELABORAÇÃO É uma sutil, mas importante distinção. ELABORAÇÃO Burocracia
implica em descrição de trabalho rígido, hierarquias de comando e controle, e acúmulo de informações,
ELABORAÇÃO que é organizada nas bases de topo-subalterno e necessidade de saber. ADIÇÃO
Comunidade implica em uma espontaneidade para suportar por meio de procedimentos padronizados o
governo de uma organização inteira, sim, mas também colaboração voluntária que é muito mais rica e
muito menos programada. ADIÇÃO Comunidades podem ser mapeadas de maneiras formais,
95
CONTRASTE, mas elas também têm um significado emocional, um sentimento de conexão.
ELABORAÇÃO Comunidades têm tanto estrutura quanto alma.
Esse exemplo é um relatório sobre tipos de empresa, em contraste com o relatório sobre vida
social contemporânea na “nova era” do exemplo anterior. Mas aqui novamente, a exposição e a lógica
explanatória são alternativas para o relatório e a lógica de aparências que verdadeiramente caracterizam
o texto. Semanticamente falando, nós temos um padrão similar de elaboração e adição em relações entre
frases e sentenças; em termos de relações gramaticais, parataxe é predominante, hipotaxe é rara (note a
relação de Propósito que é hipotática). O exemplo consiste principalmente em afirmações de fato, com
um par de afirmações normativas (e.g. “Integração deve ser acompanhada de flexibilidade e
fortalecimento”). Novamente, existe um elemento hortatório que está mais implícito do que explícito
não há injunções diretas aos leitores para agir de certas maneiras. Isso depende de valores implícitos
assumidos (veja capítulos 3 e 10) dentro dessas afirmações de fato – por excelência, “transmissões
rápidas de informação” não está explicitamente avaliada como desejável no segundo parágrafo, mas é
assumida como desejável, uma condição para o sucesso, e a mensagem implícita é “faça de sua
organização uma comunidade baseada em entendimentos compartilhados se você quiser ter sucesso!”. O
elemento hortatório também depende do contexto: livros desse tipo são lidos por gerentes e executivos
com o olho em assuntos práticos de como suas empresas podem ser melhoradas.

Legitimação
Discuti acima um extrato de uma parte da literatura pré-natal na qual a relação semântica de
propósito estava em primeiro plano. Este é um exemplo de legitimação em uma forma particularmente
explícita: procedimentos pré-natais são legitimados por uma especificação clara a qual as motiva nas
formas das relações semânticas de propósito que são explicitamente marcadas por conectores (“então
assim”, “o propósito disso”, “de forma que”). A racionalidade dos procedimentos está fortemente em
primeiro plano.
Mas este é apenas um número de estratégias para legitimação. Quatro estratégias principais são
distinguidas por Van Leeuwen (não datado, ver também Van Leeuwen e Wodak 1999):

 Autorização
Legitimação por referência à autoridade de tradição, costume, lei, e de pessoas nas quais algum
tipo de autoridade institucional é investido.
 Racionalização
96
Legitimação pela referência à utilidade da ação institucionalizada, e à sociedade de
conhecimento construída para dotá-la com validade cognitiva.
 Avaliação moral
Legitimação por referência aos sistemas de valores.
 Mythopoesis
Legitimação transmitida por meio da narrativa.

O exemplo pré-natal é uma instância da Racionalização, com uma forte ênfase na utilidade dos
procedimentos pré-natais. Habermas (1984) descreveu modernização como um processo no qual
sistemas especializados baseados em racionalidade “instrumental” ou “significados-finais” separam-se
do resto da vida social. O estado, incluindo o bem-estar estatal e provisões estatais e serviços de bem-
estar social como cuidados com a saúde, é um sistema e tanto. Racionalidade instrumental assume certo
fim acordado, e legitima ações ou procedimentos ou estruturas em termos de suas utilidades para
alcançar esses fins. Isso significa que a Racionalização sobrepõe a Avaliação Moral, no sentido de as
razões e propósitos dados para os procedimentos evocarem sistemas de valores que são tomados para
garantir e constituir os motivos “generalizados” que de acordo com Habermas (1976) são agora
largamente usados “para assegurar a lealdade da massa”. Nesse caso, os valores evocados estão
relacionados à “medicalização” do nascimento: é posta forte ênfase no desvio de seus riscos e perigos –
então o procedimento desenhado para detectar possíveis “mudanças pré-cancerígenas antecipadas”, por
excelência, é construído um procedimento evidentemente justificado em si mesmo. Um aspecto
corrompido qualquer dessa classificação de estratégias de legitimação é que todos eles envolvem
“avaliação moral” no sentido de referência ao sistema de valores – assim a estratégia chamada
“Avaliação Moral” precisa ser tomada como avaliação moral sem Autorização, Racionalização, ou
Mythopoesis. Isso é realmente o mesmo que eu discuti como “suposições de valores” no capítulo 3.
Racionalização é a mais clara e a mais explícita forma de legitimação, ainda que legitimação seja
também um assunto nos dois exemplos que eu discuti na seção anterior, talvez de forma menos óbvia.
Descrevi acima a primeira dessas, o extrato do documento consultativo “A era do aprendizado”, como
um “relatório”, uma descrição generalizada. De fato isso faz uma ligação entre o que “é”, e o que nós
“devemos” fazer em resposta a isso. Isso tem conexão com a minha discussão na seção prévia sobre o
porquê de textos políticos tenderem a reportar mais do que expor: isso é típico de muitos documentos
políticos em uma variedade de domínios sociais que representam políticas particulares como inevitáveis
pelo modo como o mundo está hoje (Graham, 2001a e b) – na famosa expressão da Primeira Ministra
Britânica Margaret Thatcher “não há alternativa” (largamente referido como o princípio “TINA”). Note
97
o deslizamento entre descrição e predição no relatório – que clama sobre qual é o caso alternativo
sobre a “nova era”. Em termos de estratégias de legitimação acima, nós poderíamos dizer que essa é
uma forma de Mythpoesis, embora isso se estenda mais à categoria como Van Leeuwen a descreve – ela
não é uma narrativa em seu sentido restrito, é mais a construção de uma fotografia da “nova era”. Mas
como as narrativas que Van Leeuwen descreve, ela tem características de ambas “fábulas de fundo
moral” quanto de “fábulas de previdência” – a implicação é que certas coisas boas irão acontecer se
“nós” implementarmos as políticas de “inevitáveis” (e.g. “novas oportunidades” irão surgir), e certas
coisas ruins irão acontecer se “nós” não o fizermos (e.g. nós não estaremos aptos a competir). Mais uma
vez, Avaliação Moral é parte da foto: “ser líderes mundiais”, “competir”, “encorajar imaginação e
inovação”, são desejáveis num sistema de valores que é evocado. Note que há também uma instância de
Racionalização (e a relação semântica de Propósito), no parágrafo (4): “Para continuar a competir, nós
devemos nos equipar...”
O outro exemplo discutido na seção anterior é o extrato retirado do texto gerencial de Kanter.
Sugeri acima que ambos exemplos são instâncias de “relatório hortatório”, elas urgem ação com base na
descrição, e elas são correspondentemente similares em termos de estratégias de legitimação. Podemos
ver isso novamente como Mythopoesis primária, construindo uma figura de uma empresa de sucesso,
ainda que nesse caso a ação que está legitimada (mudanças no gerenciamento de empresas) permaneça
largamente implícita. O texto de Kanter também usa extensivamente uma estratégia que nós podemos
ver como combinação de Mythopoesis em alguma coisa próxima ao sentido de Van Leeuwen (o texto
está carregado de pequenas narrativas como a do exemplo abaixo), e Autorização, ainda que esta não
esteja ilustrada no extrato do Apendix. Por exemplo:

Mestras de mudança encontram muitas maneiras de monitorar a realidade externa. Eles se tornam
escoteiros ideais, atentos aos mais adiantados sinais de descontinuidade, ruptura, ameaça, ou
oportunidade. Leis podem estabelecer suas próprias listas de postos, como um satélite oficial em
uma missão de locação, uma aliança com um parceiro inovador, ou investimentos e organizações
que estão criando o futuro. O fundador da Reuters Greenhouse, John Taysom começou a ver o
potencial da nova tecnologia quando postou em Bhrain, porque as peculiaridades de transmissão
de informação financeira (Reuters’s mainstay) sugeriram problemas que a tecnologia poderia
resolver. Então ele se pôs no meio do Vale do Silício e começou ligando-se a isso. Depois de
alguns investimentos estratégicos, o Fundo da Reuters Greenhouse abriu para negócios com a
filosofia de olhar um número de empresas inovadoras que poderiam ser o melhor caminho apara
aprender sobre aquilo que estava prestes a acontecer, não sobre o que já estava criado.
98
Isso é típico do livro de Kanter em legitimar seus clamores por meio de uma narrativa pequena
e atrativa sobre uma figura de autoridade ou empresa (“O fundador da Reuters Greenhouse, John
Taysom”), combinando Mythopoesis com Autorização.
Equivalências e Diferenças
Laclau e Mouffe (1985) teorizam o processo político (e “hegemonia”) em termos do trabalho
simultâneo de duas “lógicas” diferentes, uma lógica de “diferença” que cria diferenças e divisões, e uma
lógica de “equivalência” que subverte a existência de diferenças e divisões. Quero sugerir primeiro que
isso possa ser visto utilmente como uma caracterização geral dos processos sociais de classificação:
pessoas em todas as práticas sociais estão constantemente dividindo e combinando – produzindo
(também reproduzindo) e subvertendo divisões e diferenças. Interação social, como Laclau e Mouffe
sugerem, é um trabalho em andamento de articulação e desarticulação. Minha segunda sugestão é que
isso possa ser aplicado especificamente ao momento textual de eventos sociais. Elementos (palavras,
frases, etc.) são constantemente combinados e divididos em textos; combinações prioritárias e
separações são constantemente subvertidas. O ponto que os textos estão constantemente combinando
alguns elementos e dividindo outros é o ponto mais óbvio. Mas o que quero sugerir é que nós vejamos
esses processos como parte do momento textual do processo social de classificação.
Apontei mais previamente que as relações semânticas entre frases e sentenças nos exemplos 9 e
11 são predominantemente relações de adição e elaboração, realizadas gramaticalmente em princípio por
relações paratáticas. No caso do extrato mais recente “A era do aprendizado”, mostrei as relações
semânticas acima dentro da primeira seção. Se nós considerarmos esse exemplo de um ponto de vista de
processo, em termos do “trabalho” relacional que está sendo feito, poderíamos dizer que as relações de
significado de inclusão (o termo usado em semântica é “hiponímia”) estão sendo aplicadas: “estar em
uma nova era” é elaborado em termos do “certezas familiares e maneiras antigas de se fazer as coisas
estão desaparecendo”, “os tipos de emprego nós já mudamos”, “indústrias e habilidades estão
mudando”, “novas oportunidades estão surgindo”. Essas expressões podem ser vistas como co-
hiponímias de “estar em uma nova era”, i.e. O significado da mais recente inclui o significado da
primeira, que são sobremaneira feitos de forma equivalente um em relação ao outro (equivalente ao
compartilharem a propriedade de ser hiponímias de “estar em uma nova era”). Estabelecer tais relações
de equivalência de significado corrobora para dar suporte aos diferentes significados entre essas
expressões – que no presente contexto são secundárias. Agrupar para construir significados ao redor de
“nova era” por meio da subversão da divisão entre risco e oportunidade, negativo e positivo (na conexão
entre visão e “di-visão”, ou classificação, ver Bordieau e Wacquant 1992). A efetividade de tal
construção de significado hegemônico não é garantida, é claro – isso toma lugar na luta sobre
99
significado, e depende por excelência de como essas relações de significado são repetidas em vários
tipos de textos e como alternativas são sucessivamente excluídas.
No texto de Kanter, em adição às relações de equivalência, há também algumas relações de
diferença – instâncias das relações semânticas de contraste, notavelmente na lista de pontos-chave (em
que há quatro instâncias de conjunções contrastivas “em vez de”) nessa lista a relação de equivalência e
diferença são simultaneamente construídas. Por outro lado, a relação de equivalência (co-hipônimo)
entre “departamentos colaborativos”, “conflitos vistos como criativos”, “pessoas sendo capazes de fazer
coisas não explicitamente proibidas”, e “decisões tomadas por pessoas com mais conhecimento”, são
todos hipônimos de “ser bem sucedido na Web”. E relações de equivalência entre “departamentos
centrados em si mesmos”, “conflitos sendo vistos como disruptivos”, “pessoas fazendo somente o que é
explicitamente permitido”, “decisões tomadas por pessoas em posição hierárquica mais alta”, são todos
hipônimos de “ser um atrasado”. Por outro lado, os das duas listas de co-hipônimos estão em uma
(contrastiva) relação de diferença.
O processo de “texturização” de equivalência e diferença é mais claro no diálogo, em que se
pode ver algumas vezes o “trabalho” que as pessoas estão fazendo de forma colaborativa para construir
novas formas de significado e “fazer significado”. Podemos pensar no Exemplo 10 desta forma.

Ben: nós pensamos que você soubesse talvez eu deva ser o facilitador para o grupo de Grace ou alguma coisa
em que eu ficasse um pouco longe das pessoas e um
Sally: sim
Ben: somente ter uma base de como as coisas estão indo, mas somente algo para mantê-los no caminho certo
e deixá-los eles têm que realmente então apoiar-se um no outro em vez de apoiar-se no supervisor para fazer
o trabalho
Grace: bem eu acho que tipo nos grupos que vão vir juntos isso vai acontecer. Quero dizer eu sei que os
primeiros que começaram eu acho que nós temos de continuar nesse caminho para tentar direcionar as
pessoas no caminho e então nós tipo ficaremos no comando do encontro, mas então nós temos que fazer as
pessoas começarem suas próprias equipes e nós tipo somente sendo um facilitador nada mais
James: o líder da equipe
[. . .]
Grace: quero dizer é difícil começar eu acho que onde pessoas estão tendo problemas é por que elas estão
tipo olhando para você Ben e você de coisas como essas
Peter: eu não sou o único eu estou tendo problemas para manter a coisa
[ . . .] sim
Peter: Eu só não posso manter isso no momento em que você sabe que alguns dias você sabe alguns dias
estanca lá e você sabe a quantidade de trabalho que desenvolve isso só volta ao tipo de questionamento da
coisa é chocante.
100
James: então o que você realmente quer é o um você tem um grupo você inicia um grupo e você quer que
uma dessas pessoas tipo saia e [ . . .] melhore o grupo.
Peter: apenas para manter o grupo você sabe como só mantê-lo isso só para manter o trabalho fluindo.
Ben: o que eu estou tentando atravessar
Peter: por que
Ben: é que eu estou muito perto daquelas pessoas por que eu
[. . . .] sim
Ben: já saí do grupo e então sou o supervisor deles fora no no andar onde talvez se eu estivesse auxiliando
outro grupo onde eu não estivesse eu não estivesse acima deles você sabe eu não seria o supervisor deles ou
que quer que seja um eu poderia voltar ao meu trabalho eles poderiam voltar ao trabalho deles e eles ainda um
você sabe isso seria mais deles mais deles que
Sally: seu

O que está em foco é “facilitando” como parte do novo discurso de gerenciamento que a empresa
está tentando assimilar. O processo de assimilação pode ser visto neste extrato – “facilitando” está sendo
assimilado por meio do trabalho das relações de equivalência e diferença com elementos de discursos (e
essencialmente experimental, comum) familiares. Podemos presumir essas relações como segue.

Facilitar/facilitador líder da equipe


Mantê-los no caminho certo apoiar-se no supervisor
Deixa-los apoiar-se uns nos outros direcionar as pessoas no caminho
Pessoas começam suas próprias equipes estar no comando
Manter o grupo supervisor
Manter o trabalho fluindo

A coluna da esquerda lista expressões que são usadas em uma relação de equivalência com
“facilitando” por meio de relações semânticas de adição e elaboração, a coluna da direita lista outro
conjunto de expressões equivalentes a “liderando (a equipe)”, e a relação de diferença está estabelecida
entre os dois conjuntos de expressões por meio de relações semânticas de contraste (que são realizadas
por meio de conjunções tais como “em vez de” e “mais que”). Note que a distribuição de expressões
como “tipo de”, “tipo de” (expressões de tapume): elas podem ser ligadas aos pontos no diálogo em que
o trabalho de estabelecimento de equivalências e diferenças está sendo feito. Por outro lado pode-se ver
que o que está acontecendo aqui é como uma “colonização” da linguagem de gerenciamento local pelo
discurso “global” de novo gerenciamento, mas olhar o trabalho de estabelecimento de equivalências e
diferenças torna claro que é simultaneamente uma “apropriação” de um novo discurso por membros da
101
comunidade local de gerenciamento, pegando–a e colocando-a em relação ao que já existe. Em
outras palavras, existe uma dialética de colonização e apropriação acontecendo, e uma dialética
global/local: um processo ativo de recepção do discurso de colonização “global”, que pode ter resultados
variados e diferentes. (Chouliaraki e Fairclough,1999).
102
Resumo

Distinguimos um pequeno número de relações semânticas maiores entre sentenças e frases (Causal,
incluindo Razão, Conseqüência e Propósito, Condicional, Temporal, Aditiva, Elaborativa, e
Contrastiva/concessiva), e suas realizações por meio de relações gramaticais Hipotáticas e Paratáticas.
Nós também discutimos brevemente relações semânticas de nível mais alto tais como a relação
problema-solução. Usamos esse modelo de trabalho para contrastar uma lógica explanatória e uma
lógica de aparências, em que a primeira envolveria um gênero expositivo nos quais as relações
semânticas de causa e as relações gramaticais hipotáticas são predominantes, mesmo que a última
(evidente nos exemplos que discutimos) envolva um gênero de relatório no qual relações semânticas
aditivas e elaborativas, e relações gramaticais paratáticas predominem, em textos que caracterizamos
como ‘relatórios hortatórios’. Ligamos essa distinção a formas de legitimação, Racionalização.
Finalmente consideramos a idéia de que a distinção de Laclau e Mouffe de lógicas sociais simultâneas
de equivalências e diferenças podem ser ‘operacionalizadas’ em análises de textos, em que as relações
de equivalência são estabelecidas como relações semânticas de adição e elaboração (e relações
semânticas de menor nível, sinonímia e hiponímia), enquanto relações de diferença sejam estabelecidas
como relações semânticas de contraste.
103
6. SENTENÇAS SIMPLES
Tipos de troca, funções dos atos de fala e modo gramatical

Assuntos das análises textuais

Tipos de troca (trocas de conhecimento, trocas de atividades)


Funções de fala (afirmações, perguntas, demandas, ofertas)
Disposição gramatical (declarativa, interrogativa, imperativa)

Assuntos de pesquisa social

Ação estratégica e comunicativa


Cultura de promoção
Política pública
Entrevistas de pesquisa

Neste capítulo, eu devo continuar a focar nos significados de ação, embora agora no nível da
frase ou sentença simples. Devo começar com o diálogo, e com a distinção entre os dois tipos primários
de troca no diálogo: “troca de conhecimento”, em que o foco está na troca de informações, induzindo e
dando informações, reivindicando, relatando fatos, e assim por diante; e “troca de atividades”, em que o
foco está na atividade, em pessoas fazendo coisas ou pedindo a outras que as façam. Com base nessa
distinção, devo diferenciar um pequeno número de funções primárias de fala, as categorias principais
das coisas que as pessoas fazem com as palavras, incluindo Declarações, Perguntas, Exigências e
Ofertas. As funções de fala estão relacionadas aos ‘atos de fala’, os quais têm sido largamente discutidos
na filosofia lingüística e pragmática lingüística (Austin, 1962; Levinson, 1983; Mey, 1993; Searle 1969;
Verschueren, 1999), mas devo focar em um número de funções gerais mais que a superabundância dos
diferentes “atos” distinguidos nessa literatura. Teci considerações a respeito, apesar de ter modificado a
abordagem de Martin (1992). Finalmente, devo chegar à disposição gramatical, às realizações desses
significados nos principais ‘tipos de sentenças, declarativas, interrogativas e sentenças imperativas.

Os assuntos de pesquisa social tratados neste capítulo incluirão um retorno à distinção de


Habermas entre ação comunicativa e ação estratégica, as quais discuti no Capítulo 4, em relação ao
gênero e ao propósito. Aqui meu foco será diferente: ação estratégica em textos inclui conferir a uma
troca de atividade a aparência de uma (mera) troca de conhecimento. Devo também discutir sob uma
perspectiva textual, a visão da cultura contemporânea como cultura de promoção ou “cultura do
consumo” (Featherstone, 1991; Wernick, 1991), trabalhando com o conceito de Wernick de “mensagem
de promoção” em relação à obscuridade das distinções entre afirmações factuais e avaliativas, e
afirmações factuais e predições. Isso conduz à natureza da formação política contemporânea em vários
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domínios e características de textos políticos (Graham, 2001a). Finalmente, devo tecer comentários
acerca da discussão sobre Funções de Fala e Disposição Gramatical para considerar certos aspectos das
entrevistas de pesquisa na ciência social.

Trocas

Uma “troca” é uma seqüência de dois ou mais “turnos” ou “movimentos” conversacionais com
falantes alternando-se, em que a ocorrência de movimento do primeiro (1) leva à expectativa de
movimento do segundo (2), e assim por diante – com a ressalva de que o que é “esperado” não ocorre
sempre. Vamos olhar novamente o simples diálogo a seguir (de Cameron 2001) como um exemplo:

1 Cliente: uma dose de Guiness, por favor.

2. Atendente do bar: Quantos anos você tem?

3. Cliente: Vinte e dois.

4. Atendente do bar: Tudo bem, chegando.

Devo distinguir duas principais categorias de troca, ambas as quais estão ilustradas nesse
exemplo:

A Troca de atividade (freqüentemente orientada pela ação não-textual)


Cliente: uma dose de Guiness, por favor.
Atendente do bar: Tudo bem, venha.

B Troca de conhecimento
Atendente do bar: Quantos anos você tem?
Cliente: Vinte e dois.

Note que a segunda troca é inserida dentro da primeira troca no exemplo – a segunda parte da
troca de atividade é protelada até a complementação da troca de conhecimento. As trocas de atividades
são, nesse caso, freqüentemente orientadas pela ação não-textual – ao fazer coisas, ou pedir que coisas
sejam feitas, mais do (apenas) dizer coisas. Embora isso não seja necessariamente assim: “Responda a
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pergunta!” é a primeira parte de uma atividade de troca cuja segunda parte “esperada” para ser a
ação textual, i.e. é dar uma resposta. Mas o foco nesse caso seria na resposta como ação, não apenas a
resposta como informação.

Existem dois tipos principais de troca de atividade, os quais diferem, qualquer que seja a forma,
como a troca é iniciada pela pessoa que é (ou pode ser) o ator primário na ação, a qual está no assunto,
ou pela pessoa que não é o ator principal. (Para o momento estou me referindo apenas ao caso mais
simples de diálogos de dois participantes.)

Troca de atividade iniciada por ator

Você quer uma dose de Guinness? (Iniciação)


Obrigado. (Resposta)
(de nada) (Seguimento)

Outra iniciação de troca de atividade

Cliente: Uma dose de Guinness, por favor. (Iniciação)


Atendente do bar: Tudo bem, chegando. (Resposta)
(Obrigado) (Seguimento)

No primeiro caso, a troca é iniciada por alguém que está oferecendo o ato, no segundo caso por
alguém que é interpelado por outro alguém (o atendente do bar) a agir. Rotulei os movimentos como
sendo os de Iniciação ou Resposta, e inclui em ambos os casos um terceiro movimento opcional
(marcado entre parênteses), um “Seguimento” do primeiro falante como resposta ao segundo falante.
Uma distinção paralela pode ser traçada entre dois tipos de troca de conhecimento – uma iniciada
pela pessoa que tem conhecimento (o “conhecedor”), o outro pela pessoa que quer o conhecimento:

Troca de conhecimento iniciada pelo conhecedor


Eu fiz vinte e dois anos no último aniversário. (Iniciação)
É mesmo? (Resposta)

Outra iniciação de troca de conhecimento


Atendente do bar: Quantos anos você tem? (Iniciação)
Cliente: vinte e dois. (Resposta)
(Entendo) (Seguimento)

Funções de fala
As funções de fala primárias são distinguidas em termos dos diferentes movimentos nos
diferentes tipos de troca.
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 Troca de atividade

Ator – iniciado:
Você quer uma dose de Guinness? (Oferta)
Obrigado (Agradecimento)
Outro – iniciado:
Cliente: Dose de Guinness, por favor. (Exigência)
Atendente do bar: Tudo bem, chegando. (Oferta)

 Troca de conhecimento
Conhecedor – iniciado
Eu fiz vinte e dois anos no último aniversário. (Afirmação)
É mesmo? (Apreciação)
Outro – iniciado:
Atendente do bar: Quantos anos você tem? (Pergunta)
Cliente: vinte e dois. (Afirmação)

As funções de fala primárias que estou distinguindo são: exigência, oferta, pergunta, afirmação –
agradecimento/apreciação é um tipo relativamente secundário. Um ponto a ser notado imediatamente
sobre os termos aqui é que desde que eu esteja fazendo somente distinções primárias em um nível geral,
‘Exigência’ por excelência inclui coisas as quais não são “exigências” no sentido comum do termo.
Então, enquanto “dose de Guinness, por favor” pode ser tido como concebível em uma forma “exigente”
– embora “por favor” faça isso ser mais implausível – é mais fácil ser chamado de “pedido”, ou mesmo
uma “ordem” no sentido específico de “pedir” comida ou bebida em restaurantes ou bares.
Essas funções de fala generalizadas podem ser elaboradas e diferenciadas em termos de “atos de
fala” diferentes. Então Oferta, por excelência, incluiria compromisso, ameaça, desculpas, e
agradecimentos, e Exigência incluiria pedido, solicitação, esmolaria e assim por diante. Mas não é
minha intenção ir a outras direções da “teoria do ato de fala” neste livro – leitores podem desejar referir-
se à literatura dentro da pragmática lingüística dos atos da fala (por excelência, Austin, 1962; Levinson,
1983; Mey, 1993; Searle, 1969; Verschueren, 1999).
Existem inúmeros tipos significantes diferentes de Afirmação, o que será útil para diferenciar –
distinções das quais tecerei comentários na análise abaixo.

 Afirmações de fato (afirmações “reais”)


Afirmações sobre o que é, foi, ou tem sido o caso (e.g. “Eu encontrei-me com Violeta
ontem à noite”).

 Afirmações “irreais”
Predições (e.g. “Eu irei encontrar-me com Violeta amanhã”) (predição), e afirmações
hipotéticas (e.g. “ Eu poderei encontrar-me com Violeta (se ela vier a Inglaterra)”).

 Avaliações (e.g. “Violeta é uma boa pessoa”)


Essas também podem ser realizadas como exclamações como “Que pessoa boa!”

Afirmações também podem ser ou não subjetivamente marcadas, o que é uma questão de
“modalidade” (ver Capítulo 10): qualquer um desses exemplos pode ser iniciado por uma frase com um
verbo de “processo mental” (ver Capítulo 8) como “Eu acho” ou “Eu acredito” (e.g. “Eu acho Violeta
uma pessoa boa”).
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Comecei me referindo ao diálogo e dando um exemplo conversacional, mas assumirei que os
diferentes tipos de troca e as funções de fala aplicam-se a textos de qualquer tipo, incluindo textos
escritos. A “troca” no caso de textos escritos é realizada entre a escrita e leitura do texto, e por essa
razão podem ser consideráveis as falhas/os suspiros temporais e espaciais entre os movimentos de
iniciação e resposta. Além do mais, um texto escrito e especialmente um texto mediado (e.g. um livro)
irá figurar em muitas trocas correspondentes a suas diferentes leituras. Textos escritos freqüentemente
consistem em si mesmos como nada além de Afirmações, e respostas a elas, que ocorrem apenas na
cabeça dos leitores, então alguma coisa tênue pode ser vista ao insistir no conceito de troca nesses casos.
Todavia, todos os textos implicam e são orientados a dialogar em um sentido amplo, mesmo um diário
que eu escrevi para mim mesmo inevitavelmente envolve escolhas de toda sorte no imaginário do leitor
(sendo este um self imaginário) para direcionar, e essa generalização do conceito de troca é um meio de
capturar isso.

Ação estratégia e ação comunicativa


Habermas (1984) desenvolveu um cálculo da modernidade que centra sobre comunicação.
Central ao processo de modernização é a separação de “sistemas” (notavelmente o Estado, e o sistema
econômico, o Mercado) da “vida mundial” (em um sentido desse termo – o mundo da experiência
comum). A especialização de sistemas depende do desenvolvimento e refinamento de uma
“racionalidade instrumental” na qual a ação estratégica – pessoas agem (e agem sobre outras pessoas) de
maneiras as quais são orientadas a atingir resultados, maior ‘efetividade’ ou ‘eficiência’ e assim por
diante. Ação estratégica é contrastada com ‘ação comunicativa’ – ação a qual é orientada a atingir
entendimento, o modo de ação que é proeminente na “vida mundial”. Alguém pode pensar nesses dois
tipos de ação em termos textuais: pessoas falam e escrevem de forma comunicativa e de forma
estratégica, ou uma mistura dos dois. O que não é um problema em si segundo a visão de Habermas – o
desenvolvimento e refinamento de sistemas e ações estratégicas incluem formas estratégicas de
texturização o que é um sine qua non da vida moderna. O que é problemático e mesmo “patológico” é a
superextensão da ação estratégica como parte da “colonização” da vida mundial por sistemas.
Análise textual pode intensificar essas reivindicações teóricas – ou, para colocar isso de outra
maneira, podemos “operacionalizar” uma perspectiva de Habermas na análise textual. Um nível no qual
isso pode ser revelado é nos termos dos tipos de trocas e funções de fala em frases. Vamos olhar o
exemplo 2 (Apendix, páginas 230-3) (“A cidade do Festival floresce”) nesses termos. Ao verificar isso,
este é um texto dominado pela troca de conhecimento – e especificamente pela troca de conhecimento
iniciada pelo conhecedor, e consiste de afirmações, em sua maioria afirmações reais de fatos, embora
com algumas predições (“A cidade logo irá sediar o Consulado Geral da República da Eslováquia”) e
alguma avaliações (“Békéscsaba é uma excelente escolha nesta região de investimento...”). Ainda que o
texto seja parte de uma cadeia atual e antecipada de eventos cujos resultados esperados, pela autoridade
local que produziu o texto, seja investimento na cidade. E este texto em particular é claramente
destinado a atração de investimento – que, sua maior orientação é a atividade de troca, para a atividade
de troca iniciada pelo outro e as Exigências por parte das autoridades locais para corporações é que ajam
para o investimento na cidade, as Ofertas de coisas que servem para atrair corporações (e.g. a força de
trabalho capaz e flexível). Alguém pode imaginar um texto escrito diferentemente nos quais a atividade
de troca era explícita – por excelência nessa seção:

A força de trabalho capaz, a melhora na infra-estrutura e o trabalho flexível estão facilmente


disponibilizados. Além do sistema local de educação que oferece profissionais qualificados e
multilíngues.

Foi escrita mais ou menos assim:


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Necessita de uma força de trabalho capaz, melhoria na infra-estrutura, trabalho flexível e


profissionais qualificados e multilíngues? Invista em Békéscsaba, e nós lhe daremos tudo isso!

Essa é alguma coisa semelhante à distinção entre anúncios de “venda-agressiva” e “venda-sutil”


e parte disso está na distinção entre direcioná-los diretamente a quem está tentando vender (como na
reescrita) e não direcioná-los diretamente (ver Myers, 1999). Embora se note o verbo “oferecer”: a
sentença em sua forma original não é uma Oferta, é uma Afirmação de fato sobre o que está em oferta –
considerando que a versão reescrita é uma Oferta.
Assim, portanto, pode-se perguntar: nós temos um texto o qual pode ser visto como
primariamente orientado pela troca de atividade, mas verdadeiramente escrito como se ele fosse
orientado para troca de conhecimento, para dar informações mais que “vender” a cidade e solicitar
investimento? Tais textos são de fato lugar comum na vida social contemporânea. Universidades tentam
se vender e atrair estudantes em potencial, práticas médicas tentam se vender para atrair pacientes, é
mais fácil produzir textos desse tipo do que os anúncios de “venda-agressiva”, e o mesmo é verdade em
muitos outros campos, mesmo na venda de mercadorias como sabão em pó. Pode-se ver por que
autoridades locais e universidades, por excelência, podem tender a evitar anúncios mais explícitos.
Embora ambos tenham sido “mercantilizados” de forma crescente, i.e. crescentemente desenhados
dentro de um modo de operação do mercado ao qual é difícil resistir, tampouco é um simples tipo de
organização do mercado, ambos têm uma linha difícil de se andar, entre atuar em um tipo de mercado e
atuar como organizações governamentais e educacionais. Mas a comunicação aqui pode ser vista como
estratégica: por razões basicamente institucionais, atividade de troca (Ofertas, Exigências, “venda”,
solicitação de “cliente”) é apresentada como se fosse troca de conhecimento. Em um nível, alguém pode
dizer que o texto “A cidade do Festival floresce” é realmente troca de conhecimento, está realmente
informando – mas que claramente não está fazendo somente isso, está dando informações com um
propósito maior em vista, “vendendo” com êxito a cidade e atraindo investimentos (relembrando a
discussão no Capítulo 4, incluindo os comentários nesse exemplo, para hierarquizar os propósitos,
propósitos relativamente explícitos ou implícitos).
Eu disse acima que o texto era principalmente permeado de afirmações de fato, com algumas
predições e avaliações. No entanto, valores e avaliações são claramente fundamentais, e isso sugere que
a distinção entre afirmações de fato e avaliações pode não ser tão claramente delimitada como pode ter
parecido ser inicialmente (Graham, 2001ª; Lemke, 1995). O ponto é que as afirmações de fato nesse
texto são universalmente avaliativas, mas de forma implícita. Nós estamos no território de valores
assumidos (ver Capítulo 3). Alguém precisa apenas perguntar “por que esses fatos sobre Békéscsaba
importam mais que muitos outros?” para ver que os fatos são selecionados pelos valores que eles
carregam, dentro de um sistema de valores particular que está implícito (um sistema de valores pertence
a um mundo de negócios internacionais e finanças). Então “a cidade está a 200 km a sudeste de
Budapeste e é facilmente acessível à Capital pela estrada ou de trem dentro de três horas” não é apenas
uma declaração de fatos, está também implicitamente avaliando a cidade como desejável para
investidores com respeito a suas posições dentro das redes de comunicação.
Nada do conteúdo implícito de valores em afirmações factuais faz uma ligação entre a aparente
orientação para a troca de conhecimentos e o que eu sugeri como orientação mais profunda para a troca
de atividade. Alguém pode ver avaliações, quer elas estejam implícitas ou explícitas, como um tipo de
casa parcial entre Afirmações e Exigências. Valores são motivos para ação, e enquanto há claramente
uma diferença entre Exigências (“Invista em Békéscsaba”) e avaliações (“Békéscsaba é uma boa cidade
para se investir”), existe um senso no qual o primeiro convida secretamente a ação como se fosse mera
afirmação de fato. As bases para o personagem hortativo secreto do texto tornam-se mais claras.
Discutindo uma lógica explanatória e uma lógica de aparências no capítulo 5, referi-me aos
“relatórios hortatórios”, e claramente há uma ligação entre esta discussão, a qual estava focada nas
109
relações semânticas entre frases e sentenças, e que eu estou discutindo agora. Relatórios hortatórios
são também textos, no nível da frase, a qual está aparentemente orientada para a troca de conhecimento,
mas na verdade é orientada (também) para a troca de atividade, e em que as afirmações factuais estão
em um grau implícito significante de avaliações. Pode-se achar a mesma troca de aspectos na Idade do
aprendizado (Exemplo 11) e conduta no texto “guru” (Exemplo 9) que eu discuti lá. E o exemplo que eu
discuti nessa seção, Exemplo 2, pode também ser visto como relatório hortativo, pois é como os
Exemplos 9 e 11 caracterizados predominantemente por relações semânticas de elaboração e adição.
Pode-se ver essas relações entre troca aparente de conhecimento a qual é, na verdade, (também)
troca de atividade, e afirmações factuais aparentes as quais são, na verdade (também), avaliações, como
uma forma de metáfora em um sentido mais amplo. Podemos incluí-las no que Halliday (1994) chama
de metáfora gramatical, embora elas possam ser mais propriamente chamadas de “metáforas
pragmáticas” no sentido de que é uma questão de uma função de fala aparentemente parecer outra. Devo
discutir “metáfora gramatical” mais completamente no Capítulo 8.

Cultura de promoção
O cálculo mais abstrato de Habermas da relação entre ação comunicativa e ação estratégica pode
ser feito em termos mais concretos do conceito de “promoção” e da visão de cultura contemporânea
como “cultura de promoção” (Wernick, 1991). O entendimento de Wernick de cultura contemporânea
como “cultura de promoção” é assumida como o seguinte: “a gama dos fenômenos culturais que, ao
menos como uma de suas funções, serve para comunicar uma mensagem promocional transformou-se,
hoje, virtualmente co-extensiva com nosso produzido mundo simbólico”. Em outras palavras, todos os
tipos de texto (e.g. prospectos universitários, vários tipos de relatório como o relatório anual de uma
companhia) que podem estar primariamente fazendo outras coisas (e.g. informando) estão hoje em dia,
simultaneamente promovendo. Uma “mensagem promocional” é entendida por Wernick como sendo
uma que simultaneamente “representa (move-se em lugar de), advoga (move-se em parte de), e antecipa
(move-se em direção a)” qualquer que seja seu referente.
O texto “A cidade do Festival floresce” representa a cidade, advoga a cidade como um lugar em
que investir, e pode-se dizer em alguma extensão que “antecipa” a cidade no sentido de projetar a
maneira que seria ou será um centro dos principais investimentos internacionais:

Papai disse que Békéscsaba foi situada nas estradas de cruzamento da rede de tráfego trans-
Européia, servindo como portão sudeste da nação para a Europa Central e Ocidental. “Por causa da
posição geográfica, Békéscsaba é uma excelente escolha nesta região para investimento e para
negócios locais que queiram penetrar no mercado nesta parte do mundo”, ele acrescentou.

Ao representar a cidade como um “portão” para a Europa ocidental de onde os negócios podem
“penetrar no mercado”, conjetura a ela um futuro imaginário como centro de atividades do comércio
regional.
A visão de Wernick da “mensagem promocional” como simultaneamente representando e
advogando faz sentido ao infiltrado conteúdo de valores implícitos de afirmações factuais e da calculada
seleção de afirmações factuais pelos valores que elas evocam. Mas ver a representação e advocacia das
“mensagens promocionais” como simultaneamente antecipando também pontos de outro aspecto muito
difundido em textos contemporâneos: a falta de clareza da distinção entre afirmações factuais e
predições. Podemos conectar isso ao que Bourdieau e Wacquant (2001) identificaram como um aspecto
significante de textos do novo capitalismo: seu “poder performativo” em trazer à existência o que eles
pretendem (meramente) descrever.
Vejamos o extrato seguinte retirado do Exemplo 5, discurso de Tony Blair no momento do
ataque ao World Trade Center em Nova Iorque e o início da “guerra ao terrorismo”:
110
E agora mais do que nunca, com muito mais que partícula de pensamento e planos, nós iremos
agregar a coalizão humanitária lado a lado com a coalizão militar para que dentro e fora do
Afeganistão, os refugiados, quatro milhões e meio em movimento antes mesmo do 11 de
Setembro, a quem têm sido dado cobertura, comida e apoio durante os meses de inverno.

A comunidade mundial deve mostrar sua capacidade tanto para compaixão quanto para força. Os
críticos podem dizer: mas como o mundo pode ser uma comunidade? Nações agem em seu interesse
próprio. É claro que elas agem. Mas qual é a lição dos mercados financeiros, mudança climática,
terrorismo internacional, proliferação nuclear ou comércio mundial? São esses quatro interesses próprios
e nossos interesses mútuos que hoje estão inextricavelmente colocados juntos.
Essa é a política da globalização. Percebo por que pessoas protestam contra a globalização.
Assistimos a aspectos dela com trepidação. Sentimo-nos fracos, como se nós fôssemos agora
empurrados para lá e para cá por forças muito além de nosso controle. Mas existe um risco de que
líderes políticos, confrontados com demonstrações de rua, alcovitam o argumento mais que respondem a
ele. Os demonstradores estão certos em dizer que há injustiça, pobreza e degradação ambiental.
Mas a globalização é um fato e, de perto a longe, é dirigida por pessoas. Não somente em
finanças, mas em comunicação, em tecnologia, crescentemente em cultura, em recreação. No mundo da
Internet, informação tecnologia e televisão, haverá globalização. E nos negócios, o problema não é
muito sobre isso; ao contrário tem muito pouco disso.
O assunto não é como parar a globalização. O assunto é como usamos o poder da comunicação
para combinar isso com justiça. Se a globalização funciona apenas para o benefício de poucos, então irá
falhar e merecerá falhar. Mas se nós seguirmos os princípios que nos têm servido tão bem em casa –
esse poder, prosperidade e oportunidade deverão estar nas mãos de muitos, não de poucos – se nós
fizermos disso nossa luz-guia para a economia global, então ela será uma força para o bem e um
movimento internacional do qual devemos ter orgulho em liderar. Porque a alternativa para a
globalização é o isolamento.
Confrontadas por essa realidade, ao redor do mundo, nações estão instintivamente reunindo-se.
Em Quebec, todos os países das Américas do Norte e Sul decidiram formar uma grande área de livre
comércio, rivalizando com a Europa. Na Ásia, ASEAN. Na Europa, o mais integrado grupo de todos,
nós somos agora quinze nações. Outros doze países estão negociando sua participação, e muito mais que
isso.
Note-se a mais perplexa mistura de afirmações factuais e predições sobre “globalização”
(parágrafos 4 e 5). Em termos de afirmações factuais, globalização “é um fato”, e é “dirigida por
pessoas” (ainda “há muito pouco disso” no comércio). Mas ainda é um “fato” na “tecnologia”, é uma
predição para ‘tecnologia de informação” (“haverá globalização”). E está predestinada a falhar (“falhará
e merecerá falhar”) se isso funcionar somente para o benefício de poucos - se a globalização pode
“falhar”, então por implicação ela é mais um projeto ou um plano do que propriamente um “fato”. E há
uma alternativa para a globalização, “isolamento”, que é novamente difícil de reconciliar com um
“fato”.
Tal falta de clareza na distinção entre fato e predição (projeto, plano) é comum na linguagem
política de Blair (Fairclough, 2000b). E pode-se ver a mesma coisa acontecendo aqui com “a
comunidade mundial”. É simultaneamente assumido que ela existe (a primeira sentença do segundo
parágrafo), e seja capaz de certa forma, ser postulada como uma possibilidade (existe uma afirmação no
segundo parágrafo de que o mundo “pode” ser uma comunidade), e representada como uma formação
(“nações estão instintivamente reunindo-se”, parágrafo final).
Graham (2001a) sugere que os dois aspectos das “mensagens de promoção” que eu discuti aqui,
o deslizamento entre fato e valor, e entre fato e predição, são aspectos gerais dos textos políticos
contemporâneos. Com respeito ao segundo desses dois, ele argumenta que “autores políticos ativamente,
embora talvez de forma invisível, exercitam o sistema tenso de retratar o futuro e estados imaginados
como se eles na verdade existissem no aqui-e-agora”. Com respeito ao primeiro, ele também identifica a
111
ligação que eu discuti acima entre valores e o que eu chamei de Exigências, os valores implícitos de
afirmações factuais como convertidas em Exigências: “os comandos da política contemporânea são
freqüentemente envolvidos em, mascarados em, enterrados embaixo de pilhas de ostensivos fatos livres
de valores, objetivos e pseudocientíficos”.
Nós podemos também conectar esses pontos a “mensagens promocionais”. Um discurso político
de Tony Blair é um evento esteticamente desenhado (Fairclough, 2000b – ver também Capítulo 10), e
textos políticos são freqüentemente produções “polidas”, apenas por excelência a linguagem
promocional do eu, de um currículo que apóia uma atenção meticulosa a sua aparência física (fonte, lay-
out, e assim por diante).

Disposição gramatical
A função de fala está relacionada à disposição gramatical, para a distinção entre os principais
“tipos de sentença” (declarativa, interrogativa, imperativa), embora a relação não seja diretamente essa
(veja abaixo).

 Declarativa
Sujeito precede o verbo (e.g. “O livro está sobre a mesa”)
 Perguntas diretas “sim/não”
Verbo precede o sujeito (e.g. “Está o livro sobre a mesa?”)
 Perguntas “QU”
Pronome interrogativo inicial (“quem”, “quando”, “por que”, etc. – e.g. “Onde está o
livro?”)
 Imperativa
Sem sujeito (e.g. “Ponha o livro sobre a mesa”)

Vejamos a relação entre função de fala e disposição gramatical no pequeno diálogo seguinte,
tirado de Hodge e Kress (1988):

Max: Nós estamos fazendo um par de perguntas muito fáceis de serem respondidas para um
programa de rádio. A primeira das perguntas é O que você diria que a língua é?
Mulher: Língua ... bem é o diálogo que as pessoas falam dentro de vários países.
Max: Suficientemente justo eeee o que você diria sobre o que ela é feita?
Mulher: (Pausa de 8 segundos.) É feita de (entoação confusa) ...
Max: Hmmm.
Mulher: Bem, eu não sei, você disse do que ela é feita ... é a expressão de uma pessoa eu suponho, é isso?
Max: Eu não tenho as respostas, só tenho as perguntas (risos).
Mulher: (Simultaneamente, riso pequeno.)
Sid: Mas ainda assim não está mal.
Mulher: Bem, é uma expressão, a língua seria a expressão de uma pessoa não seria?
Sid: Essa é uma boa resposta.
Max: Muito obrigado.

Existe um número de sentenças declarativas (e.g. “Essa é uma boa resposta”), e um número de
sentenças interrogativas (e.g. “O que você diria que a língua é?”). Desde que nós estejamos agora
falando sobre uma distinção gramatical, a diferença é uma questão de forma gramatical. Em sentenças
declarativas, a ordem dos elementos gramaticais é SUJEITO SEGUIDO DE VERBO (seguido por outros
elementos, e.g. OBJETO). Um tipo de frases interrogativas (normalmente chamada de perguntas
DIRETAS de “sim/não” porque elas esperam uma resposta afirmativa ou negativa) inverte a ordem do
Sujeito4 e (parte do) Verbo então o último precede o formador (e.g. “É essa uma boa resposta?”). Outro

4 (Nota do tradutor) Esse fenômeno não ocorre em Língua Portuguesa.


112
tipo de interrogativa (normalmente chamada de “perguntas QU”) tem um pronome interrogativo ou
advérbio no início da sentença (esses principalmente começam com “QU” – “quem”, “o que/qual”, “por
que”, “quando”, “onde”, “como”) e freqüentemente também tem a mesma inversão de ordem de Sujeito
e Verbo, o Verbo precedendo o Sujeito. Então no caso de “O que você diria que a língua é?”, “o que” é a
palavra QU- inicial (pronome interrogativo), e o verbo modal “-ria/would” é posicionado antes do
sujeito “você” 5
As claramente sentenças declarativas são afirmações em termos de função de fala, e as
claramente sentenças interrogativas são Perguntas, mas qual é a opinião sobre “é a expressão de uma
pessoa eu suponho, é isso?”, e “a língua seria a expressão de uma pessoa não seria?”? Essas são
sentenças declarativas, mas com perguntas “acrescentadas”’ ao final delas – que são normalmente
conhecidas como “tag-questions”. Note como elas estão respondidas, e o que isso nos diz sobre como
elas são interpretadas: a primeira é interpretada por Max como uma pergunta (essa é a implicação dele
responder dizendo que não tem as respostas), a segunda é interpretada por Sid como uma “(boa)
resposta”, e conseqüentemente como uma afirmação. O que isso sugere é que essas sentenças são. Como
sua forma gramatical sugeriria, tanto Afirmações quanto Perguntas, fornecendo informações ao mesmo
tempo em que pergunta por confirmação.
Além das declarativas, interrogativas e declarativas + tag-questions, o único outro tipo de
sentença nesse extrato é o que Halliday (1994) chama de “frases menores”, frases que são
“gramaticalmente incompletas”, e em particular não têm verbos. A primeira está bem no começo do
extrato: “Nós estamos fazendo um par de perguntas muito fáceis de serem respondidas para um
programa de rádio”. A função de fala dessa frase pareceria ser uma Afirmação – o entrevistador parece
estar contando à mulher que ele vai lhe fazer algumas perguntas. O principal tipo de sentença que não
está representado aqui é o imperativo: nós não temos coisas como “Responda a pergunta!” Novamente,
imperativos são distintos em sua forma gramatical: em particular, eles não têm sujeitos. Note que “você
deve responder a pergunta” não é imperativo, mas declarativo – é gramaticalmente diferente de
“Responda a pergunta!”, entretanto, eles podem ter a mesma função de fala (Exigência). Imperativos são
normalmente “segunda pessoa”, i.e. pode-se ver “você” como implícito, mas se pode tomar sentenças
tais como “vamos responder a pergunta!” por imperativo de “primeira pessoa”.
A relação entre Disposição Gramatical e Função de Fala é uma tendência mais que uma simples
correspondência. A ligação mais forte está entre frases declarativas e Afirmações – embora como eu
disse há pouco, frases menores também podem ser Afirmações. Perguntas são normalmente
interrogativas, mas também existem “perguntas declarativas” (compare “quantos anos você tem?” e
“você tem mais de dezoito?”, a primeira é interrogativa e a última – a despeito da marca de interrogação
– é declarativa). Ofertas podem ser interrogativas (Você quer uma dose de Guinness?), imperativas
(Quero uma dose de Guinness!), ou declarativas (Aqui está uma dose de Guinness). Enquanto demandas
são arquetipicamente imperativas (Dê-me uma dose de Guinness), elas podem ser interrogativas no caso
das tão chamadas “perguntas de solicitação” (Pode me dar uma dose de Guinness?), ou declarativas
(Quero uma dose de Guinness). Existem certas marcas de Função de Fala que se restringem ao intervalo
entre essa e a Disposição Gramatical. Por excelência uma pergunta direta sim/não com “por favor” (e.g.
“Você pode abrir a janela por favor?”) será uma Exigência (uma “pergunta de solicitação”) e não uma
Pergunta. Mas determinando a Função da Fala de uma sentença que freqüentemente requer tomada de
conta dos fatores sociais contextuais.

Função de fala, disposição gramatical e entrevistas de pesquisa


O exemplo que eu usei na seção prévia é uma entrevista curta – como acontece, para um
programa de rádio. Em termos de Função de Fala, entrevistas, para dizer o óbvio, têm a organização
característica – um aspecto da sua forma genérica – de Perguntas, alternando com Respostas que são

5 Idem.
113
geralmente Afirmações. Entrevistadores geralmente fazem Perguntas, entrevistados geralmente dão
Respostas. Este extrato curto não se ajusta a essa visão arquetípica de entrevista na qual as tag-questions
estão parcialmente conforme o arquétipo de Respostas (visto que elas são Afirmações) e parte não estão
(visto que elas são Perguntas) – note que a reposta do entrevistador para uma dessas, “Eu não tenho as
respostas, eu só tenho as perguntas”, pode ser tomada como um lembrete ao entrevistado das regras de
base padronizadas da entrevista, implicitamente regulando as contribuições do entrevistado. Em termos
de Disposição Gramatical, as Perguntas são ambas frases interrogativas.
Entrevistas variam em termos de quão bem elas se ajustam às Funções de Fala de Entrevistador e
entrevistado, mas também em termos de como Perguntas em particular, são realizadas em Disposição
Gramatical. Considere o Exemplo 1, o extrato da entrevista de pesquisa etnográfica. Apenas uma das
perguntas do entrevistador é uma sentença interrogativa (“E como isso se relaciona ao que está
acontecendo aqui?”). Note que é uma pergunta QU- mais que uma pergunta direta sim/não – a primeira
geralmente dá aos entrevistados maior latitude em termos de repostas aceitáveis do que a última, e são,
nesse sentido, “abertas” em oposição a perguntas “fechadas”. As outras são frases menores (“O final do
final?”, “Mas o bom trabalho referido por você?”, “E as outras mudanças?”) e uma frase declarativa
elíptica (“O que significa?”). Pode-se relacionar esses aspectos da Disposição Gramatical de Perguntas à
natureza particular desse tipo de entrevista de pesquisa, na qual o entrevistador preocupa-se não tanto
em fazer uma (previamente preparada) série de perguntas, mas também em encorajar o entrevistador a
continuar falando e fazê-lo elaborar sobre o que ele disse. As Perguntas principalmente figuram como
lembretes. A natureza particular desse tipo de entrevista de pesquisa também explica propriedades das
contribuições do gerenciador. Apesar dessas serem respostas, nelas ele direciona as perguntas do
entrevistador, elas são claramente mais do que Respostas – o gerenciador está desenvolvendo um
extenso cálculo e argumento sobre o que está acontecendo na empresa, e em muitos casos tendo
respondido as Perguntas ele continua com isso. Em alguns tipos de entrevista suas contribuições seriam
vistas como problemáticas porque elas não “se atêm às perguntas”, aqui eles não são, talvez se possa
dizer que é por causa da existência de uma pergunta que inclui muitas outras áreas e que obtém por meio
da entrevista, alguma coisa como “qual é a sua experiência e visão do que está acontecendo na
empresa?”.

Resumo

O capítulo começa com uma distinção entre dois tipos de trocas de fala, “trocas de conhecimento” e
“trocas de atividades”, que são respectivamente associadas às funções de fala primárias de Afirmação e
Pergunta, e Exigência e Oferta.
Vários tipos de afirmação foram distinguidos: afirmações de fato, predições, afirmações hipotéticas e
avaliações. Nós consideramos a idéia de que se pode operacionalizar as distinções de Habermas entre
“ação estratégica” e “ação comunicativa” em termos de “metáfora gramatical”, especificamente focando
sobre aparentes trocas de conhecimento que são convertidas em trocas de atividades, e aparentes
afirmações de fato que são convertidas em avaliações, e ligando isso aos gêneros “relatórios hortatórios”
discutidos no capítulo anterior.
Funções de fala são realizadas em “disposições gramaticais”, ainda que seja uma relação complexa. Nós
diferenciamos três disposições gramaticais principais (declarativa, interrogativa, imperativa), assim
como “frases menores”.
Pode-se diferenciar tipos de entrevistas de pesquisa tanto em termos de distribuição de funções de fala
entre entrevistador e entrevistado, quanto em termos de como as perguntas de entrevista são realizadas
em disposição gramatical (e.g. como “perguntas declarativas” mais que interrogativas).
114
7. DISCURSOS

Temas para análise textual


Discursos em diferentes níveis de abstração
Análise "interdiscursiva" da articulação dos discursos em textos
Equivalências e diferenças
Relações semânticas entre palavras (sinonímia, hiponímia, antonímia)
Colocações

Temas de pesquisa social


O "novo espírito do capitalismo"
Classificação

A identificação e análise de discursos é agora uma preocupação que atravessa as ciências


humanas e sociais. Foucault (1972,1984) tem sido uma influência decisiva. Comentando seu próprio uso
da palavra “discurso”, ele escreve:

Acredito que, de fato, acresci aos seus significados: tratando-o algumas vezes como um domínio geral
de todas as declarações, outras como um grupo de declarações individualizado, e outras como uma
prática regulada relevante para um número de declarações.
(Foucault, 1984)

A análise do discurso para Foucault é a análise do domínio das declarações – isto é, de textos e
de enunciados como elementos constituintes do texto. No entanto, isso não significa que diz respeito à
análise detalhada de textos – a preocupação é mais um problema de discernimento das regras que
“governam” corpos de textos e enunciados. O termo “discurso” é empregado de modo abstrato (como
um substantivo abstrato) para “o domínio das declarações”, e de modo concreto como um substantivo
“contável” (“um discurso”, “vários discursos”) para grupos de declarações ou para a “prática regulada”
(as regras) que governa esse grupo de declarações. O trabalho de Foucault tem sido empregado em
muitas teorias e disciplinas diferentes, produzindo uma confusa variedade de teorizações e análises
superpostas e contraditórias de “discursos” (Dant, 1991; Macdonell, 1986; Mills, 1997).
115
Vejo discursos como modos de representar aspectos do mundo – os processos, relações e
estruturas do mundo material, o “mundo mental” dos pensamentos, sentimentos, crenças, e assim por
diante, e o mundo social. Aspectos particulares do mundo devem ser representados diferentemente;
assim, nós estamos geralmente na posição de ter de considerar a relação entre diferentes discursos.
Diferentes discursos são diferentes perspectivas do mundo, e elas estão associadas às diferentes relações
que as pessoas têm com o mundo, que, por seu turno, dependem de suas posições no mundo, suas
identidades sociais e pessoais, e das relações sociais com outras pessoas. Discursos não apenas
representam o mundo como ele é (ou melhor, como ele é visto), eles são também projetivos,
imaginários, representando mundos possíveis que são diferentes do mundo real, e inseridos em projetos
de mudar o mundo em direções particulares. As relações entre discursos diferentes são um elemento das
relações entre pessoas diferentes – eles podem complementar-se, competir entre si, um pode dominar
o(s) outro(s), e assim por diante. Discursos constituem parte dos recursos com que as pessoas se
posicionam no relacionamento umas com as outras – mantendo-se separadas, cooperando, competindo,
dominando – e na tentativa de mudar os rumos pelos quais elas se relacionam.

Níveis de Abstração
Ao falar de discursos como diferentes modos de representação, estamos sugerindo um grau de
repetição, de comunalidade, no sentido de que eles são divididos por grupos de pessoas e pela
estabilidade ao longo do tempo. Em qualquer texto, nós provavelmente encontraremos muitas diferentes
representações de aspectos do mundo, mas nós não podemos chamar cada representação um discurso
separado. Discursos transcendem tais representações concretas e locais nos moldes que sugeri, e também
porque um discurso particular pode, por assim dizer, produzir muitas representações específicas.
Mas discursos diferem no grau de repetição, de comunalidade, de estabilidade ao longo do
tempo, e naquilo que poderíamos chamar sua “escala”, isto é, quanto do mundo eles incluem, e,
conseqüentemente, na variedade de representações que eles produzem. Como no caso dos gêneros (ver
capítulo 4), faz sentido distinguir diferentes níveis de abstração ou generalização ao falar sobre
discursos. Por exemplo, há um modo de representar as pessoas como basicamente racionais, indivíduos
separados e unitários, cuja identidade como seres sociais é secundária, já que as relações sociais são
vistas como admitidas por indivíduos preexistentes. Há vários nomes que poderíamos dar a esse discurso
– por exemplo, o discurso individualista do “self”, ou o discurso cartesiano do sujeito. Isso é uma longa
história, algumas vezes sendo “senso comum” para a maioria das pessoas; é a base de teorias e filosofias
e pode ser mapeado através do texto e da fala em muitos domínios da vida social, e sua “escala” é
considerável – ele gera uma grande variedade de representações. Em um nível menos geral, mas ainda
muito vago, poderíamos identificar no domínio da política um discurso de liberalismo, e no domínio
116
econômico um discurso “taylorista” de gerenciamento. Em contraste, em Fairclough (2000b), falei
sobre o discurso político da “Terceira Via”, isto é, o discurso do “New Labor”, que é um discurso
atrelado a uma posição particular no campo político em um momento particular no tempo (o discurso
tem certamente menos de dez anos).
O Exemplo 9 foi tirado de um livro “guru” de gerenciamento que é o foco de Chiapello e
Fairclough (2002). A base daquele trabalho é a análise de Boltanski e Chiapello (1999) daquilo que eles
chamam o “novo espírito do capitalismo” – ou a ideologia do que eu venho chamando novo capitalismo.
A análise deles está baseada em textos de gerenciamento como os do Exemplo 9, e o objetivo do meu
trabalho com Chiapello era captar como a “nova sociologia do capitalismo” deles poderia ser acentuada
com o emprego da Análise do Discurso Crítica, permitindo uma mais detalhada descrição de como o
“novo espírito do capitalismo” é construído em textos de administração. Podemos ver o “novo espírito
do capitalismo” como um novo discurso que emergiu da combinação de discursos existentes. Aqui está
uma breve ilustração (não incluída no Exemplo 9) de como essas combinações são compostas:

Sete habilidades clássicas estão envolvidas em inovação e mudança: sintonia com o


ambiente, pensamento caleidoscópico, uma visão inspiradora, construção da coalizão, criação
de uma equipe de trabalho, persistência através das dificuldades, divulgação de confiança e
de reconhecimento. Essas são mais do que habilidades discretas; elas refletem uma
perspectiva, um estilo básico na cultura eletrônica.

O “estilo” que está “refletido” nessa lista é como o “novo espírito do capitalismo” representa o
“líder” em relacionamentos de negócios. A lista trabalha em direção a uma relação de expressões
equivalentes que emanam de, e evocam, diferentes discursos – listar é um esquema construtivo para
efetivar a combinação de discursos que constituem o novo discurso. Mas há quem possa enxergar esse
processo de combinação como cristalizado. Boltanski e Chiapello (1999) sugerem que o “novo espírito
do capitalismo” centralmente articula os discursos “inspirador” e “conexionista” (ou o que eles de fato
chamam “cités” ou “regimes justificadores”) – líderes são pessoas que combinam visão e boa rede de
relações, pondo aqui as coisas de um modo um pouco rude. Os três primeiros elementos listados
(sintonia com o ambiente, pensamento caleidoscópico, uma visão inspiradora) emanam do discurso
“inspirador”, enquanto que o quarto elemento (construção da coalizão) emana do discurso conexionista.
Ainda, os três primeiros elementos podem ser vistos como emanando de diferentes discursos –
“sintonia” é um uso metafórico de uma expressão em discurso técnico que evoca um discurso de
relacionamentos pessoais, talvez um discurso de aconselhamento, em que a qualidade de como uma
pessoa ouve a outra está em foco; “pensamento caleidoscópico” evoca talvez textos populares de
psicologia sobre pensamento criativo; ao passo que “visão inspiradora” pareceria emanar do discurso de
117
crítica de arte. Assim, o discurso “inspirador” pode ele mesmo ser visto como uma articulação de
discursos.
O Exemplo 9 mostra uma tessitura conjunta de discursos semelhantes, embora nesse caso seja
uma questão tanto de equivalências dentro do “novo espírito do capitalismo” quanto de diferenças entre
este e o “velho” discurso (veja a discussão de equivalências e diferenças no capítulo 5). A construção da
relação de diferença é realizada por uma variedade de estruturas relacionais e expressões contrastantes
ou antitéticas: X em vez de Y, X não apenas Y, X, mas também Y, X é diferente de Y, mais parecido
com X do que com Y. O caso mais patente está na lista no meio do extrato, onde o que poderíamos
chamar de discurso “protagonista” (o “novo espírito do capitalismo”) representado antes dos parênteses
é posicionado contra o discurso “antagonista”, dentro dos parênteses. Ao mesmo tempo, elementos
listados antes dos parênteses são construídos como equivalentes, do mesmo modo que são aqueles
dentro dos parênteses, e os diferentes discursos dos quais esses elementos emanam são assim
articulados.
O ponto de me referir a diferentes níveis de “abstração” torna-se claro tão logo olhemos em
detalhe para qualquer um dos discursos que mencionei. Eles são todos internamente variáveis.
Praticamente qualquer tratamento do liberalismo, por exemplo, é como identificar certas comunalidades
nas representações liberais da vida política, mas então ir em frente para diferenciar as variedades do
liberalismo. Mesmo o discurso da “Terceira Via” não é homogêneo – um tema ao qual me referi na
análise é precisamente como aquele discurso tem variado e mudado em um curto período de tempo. Por
que então falar sobre essas entidades heterogêneas como “discursos” em absoluto? A resposta não pode
estar simplesmente baseada em haver uma certa comunalidade e continuidade no modo como o mundo é
representado, assim como variação. Isso está também baseado na relação dialética entre discurso e
outros elementos da vida social – aquela distingue “discursos” enquanto modos particulares
(parcialmente estáveis, parcialmente variáveis) de representar o mundo são de significância social,
talvez em termos da efetividade do discurso, sua “tradução” em aspectos não-discursivos da vida social.
Discursos podem então ser vistos não apenas como modos de representação com um grau de
comunalidade e estabilidade, mas como modos de representação que constituem pontos nodais na
relação dialética entre linguagem e outros elementos da vida social.
Uma maior complexidade é que discursos, exceto no mais baixo nível de generalidade, o nível
dos discursos específicos e localizados, podem eles mesmos ser vistos como combinações de outros
discursos articulados de maneiras particulares. Assim é como novos discursos emergem – através da
combinação de discursos existentes em maneiras particulares. Assim, por exemplo, minha análise do
discurso político da “Terceira Via” viu isso como uma articulação específica de outros discursos,
118
incluindo a social democracia e os discursos políticos do “Nova Direita” (Thatcherismo). O novo é
feito da nova articulação do velho.

Textos e discursos
Diferentes textos inseridos na mesma rede de eventos ou dispostos em relação à mesma rede de
práticas sociais, e que representam amplamente os mesmos aspectos do mundo, diferem nos discursos
em que se apóiam. Por exemplo, o Exemplo 13 é um extrato de um livro escrito por dois antigos
membros de esquerda do Partido Trabalhista britânico sobre a visão do “Novo Trabalhismo” do que é
chamado “economia global” e o que eles chamam “globalização capitalista”. Uma diferença entre a
representação da mudança econômica global no discurso político da esquerda e no discurso político do
Novo Trabalhismo da “Terceira Via” é que “companhias transnacionais” são referidas como agentes
dominadores da mudança econômica – que “dividem e conquistam”. Nas representações do Novo
Trabalhismo da mudança econômica global, em contraste, essas companhias não são representadas
propriamente, e a mudança econômica (“globalização” entre outros) é representada como um processo
sem agentes sociais – como algo que está apenas acontecendo, mais do que algo que pessoas ou
companhias ou governos estão fazendo (ver Fairclough, 2000b para uma análise comparativa dos textos
do Novo Trabalhismo). Outro traço significativo do discurso da esquerda recortado desse extrato são as
relações semânticas que nele predominam. Note as diferentes expressões usadas para representar as
corporações transnacionais – “companhias transnacionais”, “capital transnacional”, “capital
internacional”. Por meio do processo de “relexicalização”, uma relação de equivalência, ou sinonímia, é
tecida entre “companhias” e “capital”, entre o concreto e o abstrato. Esse tipo de mapeamento de formas
concretas, fenomenais, de aparição (“companhias”) em entes abstratos, estruturais (“capital”), é
característico de um elemento marxista que é evidente no discurso trabalhista de esquerda e que o
diferencia do discurso de direita (e do Novo Trabalhismo). Além disso, governos nacionais (e a União
Européia) são representados em uma relação potencialmente antagonista às companhias
transnacionais/capital (“empregando poderes contra” elas, e atuando em “resposta” a elas). Outra vez
isso é uma característica do discurso político esquerdista – “capital” deve ser contestado, deve-se lutar
contra ele. E governos nacionais são representados como potencialmente atuantes em aliança com
organizações comerciais (assim como as organizações não-governamentais de modo mais geral) em
bases internacionais de acordo com tradições “internacionalistas” – “internacionalismo” aqui mantém o
senso de solidariedade de trabalho, em que o discurso do Novo Trabalhismo vem-se referir a
119
“cooperação” entre as nações-Estado na “comunidade internacional” (por exemplo, no bombardear a
Iugoslávia). Considere também o conceito de “clientelismo”, posto contra “empregando poderes contra”
ou “barganhando” com capital, que não tem lugar no discurso político do Novo Trabalhismo.
Textos também promovem relações dialógicas ou polêmicas entre seus “próprios” discursos e os
discursos de outros. Neste caso, há uma crítica do que o Novo Trabalhismo diz sobre “parceria” e
“cooperação”. Ela contesta parcialmente os significados dados a essas palavras dentro do discurso do
Novo Trabalhismo, construindo um discurso diferente em que “parceria” e “cooperação” são articulados
com “verdade”, “abertura”, “respeito”. E ela está clamando em parte (em uma aparente alusão às
relações “não apenas mas também” preferidas pelo Novo Trabalhismo, por exemplo, “cooperação tanto
quanto competição”) que há uma hierarquia velada no discurso do Novo Trabalhismo – “negociação” e
“competição” sempre precedem “parceria” e “cooperação”.
Essa relação dialógica/polêmica é um modo em que os textos misturam diferentes discursos, mas
seus “próprios” discursos são também freqüentemente mistos ou híbridos. Uma análise interdiscursiva
de textos (veja capítulo 2) está parcialmente relacionada com a identificação de quais discursos são
utilizados e como eles são articulados. (Nós podemos ver um texto como retirado de um discurso mesmo
se a realização daquele discurso no texto é mínimo – talvez não mais que uma única palavra). Vejamos o
Exemplo 4 a esse respeito. Wodak, no artigo do qual o exemplo é tirado, traça a transformação desse
texto através de versões sucessivas no curso dos encontros do Grupo Consultivo de Competitividade da
União Européia. As sentenças 5-7 foram adicionadas em versões posteriores “como uma concessão às
uniões”. Podemos ver essa adição como uma hibridização dos discursos. Os dois principais discursos
aqui são, primeiro, o discurso neoliberal da mudança econômica que representa “globalização” como um
fato que demanda “ajustes” e “reformas” para alcançar “eficiência e adaptabilidade” de modo a
competir; e, segundo, um discurso político que representa sociedades em termos do objeto de “coesão
social” e ameaças à “coesão social”. Esses discursos diferentes provocam diferentes prioridades políticas
– políticas para alcançar competitividade de um lado, e coesão social de outro. O discurso da coesão
social representa pessoas de maneiras que são estranhas ao discurso neoliberal – em termos dos
sentimentos delas (“senso de dificuldade, desigualdade e polarização”), suas “esperanças” e
“aspirações”. Mas a sentença 7 é particularmente significativa no modo pelo qual articula esses
discursos pelo emprego de vocabulário que trabalha com categorias-chave nos dois discursos em direção
a relações semânticas – “coesão social” é reconstruído em termos econômicos como “qualidade
humana” e “habilidade de trabalhar como um time” e como um “recurso” de “eficiência e
adaptabilidade”. Enquanto o discurso de “coesão social” é fundamentalmente um discurso moral e
humano dirigido a pessoas que detêm um “senso” de pertença a uma comunidade, “qualidade humana”,
120
de modo particular, reduz as pessoas a forças de produção que competem com outras forças, como a
tecnologia da informação. Embora esses discursos possam ser vistos como fundamentalmente
incompatíveis em como eles representam e imaginam as pessoas, o que temos aqui é uma estratégia de
legitimação do discurso da coesão social em termos do discurso neoliberal.

Identificando e Caracterizando Discursos


Como vamos identificar diferentes discursos em um texto? Podemos pensar de um discurso
como (a) representando alguma parte em especial do mundo, e (b) representando-a de uma perspectiva
particular. Respectivamente, na análise textual, pode-se:

(1) Identificar as principais partes do mundo (incluindo áreas da vida social) que estão
representadas – os “temas” principais.
(2) Identificar a perspectiva, o ângulo ou o ponto de vista particular do qual eles são
representados.

Por exemplo, os temas do Exemplo 7 incluem: processos econômicos e mudança, processos de


governo (global e nacional), protesto político (os equivocadamente nomeados protestos
“antiglobalização”), e visões da globalização (“no Sul“). Cada um desses temas está aberto em princípio
para um rol de diferentes perspectivas, diferentes representações, diferentes discursos. Neste caso,
processos econômicos e mudança (por exemplo, o penúltimo parágrafo, em Gana) estão representados
nos termos do “neoclássico”, discurso de liberalização do mercado do “consenso de Washington” em
contraste, por exemplo, ao discurso econômico keynesiano. Governo está representado como
“governance“, um termo que é em si grande parte do discurso neoliberal de governo que, de um lado,
representa governo não apenas como os negócios dos governos, mas também “a estrutura do governo
global” (agências internacionais como a Organização Mundial do Comércio e o Fundo Monetário
Internacional, que tem sido central na imposição do “consenso de Washington”), e, de outro, prescreve
mudanças na ação de governar em termos de “transparência”, “responsabilidade“, e assim por diante.
Pode-se contrastar isso com discursos de governo centrados no Estado.
Sugeri que discursos são distinguidos tanto pelos seus modos de representar quanto pelo
relacionamento com outros elementos sociais. Focando no primeiro ponto, podemos especificar modos
121
de representação em termos de uma lista de traços lingüísticos que podem ser vistos como realizando
um discurso.
Os mais óbvios traços de distinção de um discurso parecem ser traços de vocabulário – discursos
“nomeiam” ou “lexicalizam” o mundo de modos particulares. Mas mais do que apenas focar
atomisticamente em diferentes modos de lexicalização dos mesmos aspectos do mundo, é mais
produtivo focar em como diferentes discursos estruturam o mundo diferentemente, e, em conseqüência,
nas relações semânticas entre as palavras. Um exemplo é a relação entre “companhias transnacionais” e
“capital transnacional” no Exemplo 13, discutido acima. O primeiro é ressignificado como o segundo no
texto. Isso pode ser visto como uma tessitura local das relações semânticas – novas relações semânticas
são de fato postas nos textos, e isso é parte do trabalho do agente social (efeitos da agência, ver capítulo
2) ao construir significado. Mas, nesse caso, uma comparação de textos dentro dessa tradição política,
incluindo outros textos desses autores, poderia sugerir que a relexicalização utiliza e evoca o modo de
estruturação do mundo associado com esse discurso, mais do que constitui uma nova relação. Pode-se
dizer que o texto toma como dado, pressupõe, o que se poderia encontrar explicitamente afirmado e
justificado em qualquer outro lugar nos textos que são extraídos desse discurso: que companhias
(transnacionais) são uma forma fenomenal de aparecimento do capital (transnacional). Semanticamente,
podemos dizer que “companhias” é um hipônimo de “capital”, juntamente com outros “co-hipônimos”
como “créditos” e “mercados financeiros”. Essa pressuposta estruturação do mundo, e essa pressuposta
relação semântica, são o que permite aos escritores relexicalizar “companhias” como “capital” sem ter
que fazer a relação explícita, o que permite aos leitores compreenderem o texto.
Outro exemplo desse tipo de relação semântica encoberta é a relação entre “globalização” e
“progresso econômico” nas sentenças 1 e 2 do Exemplo 4 – a coerência do texto depende de uma
relação de hiponímia entre elas, em que “globalização” é um hipônimo de “progresso econômico”. No
Exemplo 1, os empregados da companhia são classificados em três grupos – “gerenciamento sênior”, “o
nível inferior” e “nós”, em que “nós” é o gerenciamento intermediário. Esses podem ser vistos como co-
hipônimos, e constituem uma taxionomia, embora não esteja claro qual o termo superordenado (isto é,
de quem eles são hipônimos): talvez “força de trabalho” seja empregado desse modo quando o gerente
explica “nível inferior” em resposta à pergunta do entrevistador: “Da força de trabalho”. Mas “força de
trabalho” está em contraste com “gerentes” quando o gerente diz “tomar o poder das companhias e
devolvê-lo aos gerentes e devolvê-lo às forças de trabalho”, e talvez um sinônimo de “nível inferior”.
Essas não são relações de significado encontradas em um dicionário, porque elas são específicas de
discursos particulares. Em adição à hiponímia (“inclusão de significado”) e sinonímia (“identidade de
significado”), elas incluem antonímia (“exclusão de significado”). Por exemplo, no discurso de coesão
122
social colhido no Exemplo 4, os antônimos de “coesão social” incluem “polarização” (no texto)
tanto quanto “exclusão social” (não está no texto).
O que está em foco aqui é classificação, pré-construídos esquemas classificatórios ou sistemas de
classificação, “pré-construções naturalizadas... que são ignoradas como tais e que podem funcionar
como inconscientes instrumentos de construção” (Bourdieu e Wacquant, 1992); “di-visões” pré-
construídas e aceitas como verdadeiras através das quais as pessoas continuamente geram “visões” do
mundo. Quando diferentes discursos entram em conflito e discursos particulares são contestados, o que
é centralmente contestado é o poder desses sistemas semânticos pré-construídos de gerar visões
particulares do mundo que podem ter o poder performativo de sustentar ou refazer o mundo em sua
imagem, por assim dizer.
Os vocabulários associados a diferentes discursos em um domínio particular da vida social
podem ser parcialmente diferentes, mas é provável que se sobreponham substancialmente. Diferentes
discursos podem usar as mesmas palavras (por exemplo, ambos os discursos neoliberal e
“antiglobalização” utilizam “globalização”), mas eles devem usá-las diferentemente, e de novo é
somente mediante o focar nas relações semânticas que permitirá identificar essas diferenças. Um modo
de chegar a essa diferença relacional é através das colocações, padrões de coocorrência das palavras nos
textos, simplesmente olhando para quais outras palavras mais freqüentemente precedem e sucedem
qualquer palavra que está em foco, tanto imediatamente ou duas, três (e assim por diante) palavras
depois. Algumas vezes, pode-se estancar ante colocações em textos particulares. Por exemplo, a palavra
“globalização” ocorre no Exemplo 7 em colocação com “superpoder” (“medo de que a globalização
superpoderosa forçará a extinção de culturas e tradições nacionais”). Esse é um texto produzido por uma
organização que tem sido fortemente suporte do neoliberalismo, mas que está dando voz a
considerações acerca dos efeitos negativos da “globalização”, e induzindo nos discursos, como essa
colocação indica, ao que alguém dificilmente encontraria em textos neoliberais mais convencionais.
Mas o mais efetivo modo de explorar padrões de colocação é através da análise do corpus assistida por
computador de grandes corpos de texto (McEnery e Wilson, 2001; Stubbs, 1996). Por exemplo, em uma
análise do corpus de textos do Novo Trabalhismo e do “velho” Trabalhismo (isto é, textos dos primeiros
estágios da história do Partido Trabalhista), surgiu claramente o fato de que embora a palavra “trabalho”
era, obviamente, quase a mesma em ambos, seus padrões de colocação eram diferentes. “De volta ao
trabalho”, “no trabalho”, “desejo de trabalhar”, “oportunidades para trabalhar”, “Previdência Social para
o trabalho” refletem colocações comuns no corpus do Novo Trabalhismo, enquanto “fora do trabalho”,
“direito ao trabalho”, “democracia no trabalho”, “saúde e segurança no trabalho” refletem padrões
comuns no corpus do “velho” Trabalhismo. Generalizando acerca dos resultados, o foco do Novo
123
Trabalhismo está no levar as pessoas dependentes do governo para o trabalho, o foco no “velho”
Trabalhismo está na melhoria das condições e das relações de trabalho, no desemprego como uma
infringência do “direito ao trabalho” e uma responsabilidade do governo (Fairclough, 2000b).
Discursos são também diferenciados pela metáfora, tanto no sentido usual de “metáfora lexical”,
palavras que geralmente representam uma parte do mundo sendo estendidas a outro, quanto no que eu
chamarei no próximo capítulo metáfora gramatical (por exemplo, processos sendo representados como
“coisas”, entidades, mediante “nominalização”). Deixem-me fazer alguns comentários sobre a metáfora
lexical (ver Goatly, 1997). No Exemplo 9, a competição entre as companhias está representada
metaforicamente como uma corrida. As “melhores” companhias são “marcadoras do ritmo”, como o
corredor que toma a liderança e marca o ritmo em uma corrida. As “piores” companhias são
“retardatárias“, aqueles que ficam para trás. Diferentemente de “marcador do ritmo”, “retardatário“ não
é especificamente parte do vocabulário de corrida, ela expande a representação metafórica das
companhias como sendo pessoas para incluir outras atividades em que as pessoas são avaliadas e
escalonadas em termos de desempenho (por exemplo, há turmas “retardatárias”). O Exemplo 9 também
elabora explicitamente uma representação metafórica das companhias como “comunidades” com
“membros” (mais do que apenas “empregados”) que têm “dividido entendimentos” e um “sentimento de
conexão”, e assim por diante. Essas metáforas diferem entre os discursos – metáfora é um recurso
disponível para produzir representações distintas do mundo. Mas é talvez a combinação particular de
diferentes metáforas que diferencia os discursos: as duas metáforas que identifiquei aqui são modos
comuns de representar companhias que surgem em vários discursos, e é talvez a combinação dessas e
outras metáforas que ajuda a diferenciar esse discurso particular de gerenciamento. O influente trabalho
de Lakoff e Johnson (1980) sobre metáforas que estão profundamente intrincadas nas culturas (por
exemplo, a representação metafórica de argumentar como lutar) é também relevante aqui.
Eu me referi acima a relações semânticas sendo pressupostas. De fato, pressuposições e
suposições podem mais geralmente ser vistas como relativas ao discurso – as categorias de suposição
que distingui no capítulo 3 (suposições existenciais, suposições proposicionais, suposições de valor)
podem todas ser vistas como potencialmente ligadas a discursos particulares, e como variáveis entre os
discursos. Potencialmente, porque há muitas suposições que são mais ou menos difusamente sustentadas
através das sociedades ou domínios sociais ou organizações. Toquei nesse ponto no capítulo 3, por
exemplo, na discussão do Exemplo 4, que suposições podem ser relacionadas ao discurso, assim não
repetirei o argumento em detalhe aqui. Também sugeri no capítulo 4, na discussão Argumento como um
gênero, que argumentos sempre se firmam sobre suposições que são específicas de discursos e relativas
ao discurso (ver Gieve, 2000).
124
Referi-me anteriormente aos dois principais discursos no Exemplo 4, o discurso neoliberal e
o discurso da coesão social. Apesar do contraste entre eles, há uma coisa que eles têm em comum: eles
representam processos sociais reais e eventos de um modo altamente abstrato. Embora se possa dizer
que se referem em última instância a eventos particulares e concretos, ainda que a grupos e séries de tais
eventos altamente complexos, eles representam o mundo de um modo que se abstrai de qualquer coisa
remotamente concreta. O corolário disso é que muitos dos elementos dos eventos concretos são
excluídos. Processos (“globalização”, “progresso”) e relações (“coesão social”) e até sentimentos
(“esperanças”, “aspirações”) – empregarei “processos” em um sentido geral para incluir tudo isso –
estão representados, mas as pessoas envolvidas são na maior parte excluídas (“pessoas” na sentença 6 é
uma exceção, mas a representação aqui é novamente muito geral – de fato “genérica”, ver capítulo 8),
assim como são outros elementos dos eventos sociais, como objetos, meios, ocorrências, lugares.
Processos são de fato “nominalizados”, não lexicalizados como verbos como comumente são, mas como
entidades parecidas com substantivos chamados “nominalizações” (“globalização”, “coesão”), ou o que
poderia ser chamado “substantivos de processo”, substantivos com a qualidade de verbos na
representação de processos e relações e assim por diante (“progresso”, “esperança”). Sintaticamente,
essas expressões de processo operam como substantivos – assim, por exemplo, “coesão social” em (5) é
o sujeito de uma sentença (passiva). Quando processos são nominalizados ou lexicalizados como
substantivos de processo, seus próprios sujeitos, objetos, e assim por diante, tendem a ser excluídos.
Contraste o Exemplo 12 com o Exemplo 4. O tipo de discurso sociológico etnograficamente orientado
do primeiro representa eventos de modo mais concreto e inclui mais elementos de eventos (incluindo as
pessoas neles envolvidas) em suas representações do que o discurso neoliberal ou o discurso de coesão
social, ambos que estão orientados para a abstração de e para a generalização sobre eventos,
principalmente nos contextos de formação de políticas.
O que esses comentários apontam é que discursos são caracterizados e diferenciados não apenas
por traços de vocabulário e relações semânticas, e suposições, mas também por traços gramaticais.
Discursos diferem em como elementos de eventos sociais (processos, pessoas, objetos, meios,
ocorrências, lugares) são representados, e essas diferenças podem ser tanto gramaticais como lexicais
(vocabulário). A diferença entre uma nominalização e um verbo é uma diferença gramatical, assim
como é a diferença entre verbos transitivos e intransitivos, a diferença entre frases nominais gerais e
específicas (por exemplo, a genérica, geral e inclusiva referência a “polícia”, como oposta à referência
específica a “este policial”), e assim por diante. Esses são alguns dos modos pelos quais os discursos
diferem na representação de eventos sociais (ver capítulo 8 para uma discussão mais detalhada).
125

Resumo
Vimos que os discursos são meios de representar o mundo, que podem ser identificados e diferenciados
em níveis de abstração, como percebe Boltanski e Chiapello(1999), identificando como "o novo espírito
do capitalismo" pode ser visto como um discurso em alto nível de abstração, desencadeando uma
articulação de discursos.
Textos se diferenciam no discurso em aspectos particulares de representação do mundo, e articulam
diferentes discursos ao mesmo tempo (discursos híbridos e mesclados) em várias formas.
Discursos podem ser diferenciados em termos de relações semânticas (sinonímia, hiponímia, antonímia)
entre palavras - assim como classificam partes do mundo - bem como trações gramaticais, colocações e
postulados.
126
8. AS REPRESENTAÇÕES DOS EVENTOS SOCIAIS

Tópicos em análise no texto


Elementos do período simples: processos, participantes e circunstâncias
Exclusão ou inclusão dos elementos dos eventos sociais
Representações abstratas ou concretas dos eventos sociais
Representação dos processos e os tipos de processos
Representação dos agentes sociais
Representação de tempo e espaço
Metáfora gramatical (exemplo: nominalização)

Tópicos de pesquisa social


Governança
Recontextualização
O universal e o particular
Agência
“Espaço-tempo”

Meu foco nesse capítulo é a Representação de significados no período (ver tipos de significado
no Glossário de termos). Em um período simples, pode-se abordar aspectos do mundo físico (seus
processos, seus objetos, suas relações, seus parâmetros de espaço e tempo), aspectos do “mundo mental”
dos pensamentos, sentimentos, sensações e assim por diante, além dos aspectos do mundo social. Vou
me concentrar nesses últimos. Minha abordagem está relacionada à representação dos eventos sociais,
mesmo que o mundo social possa também ser representado de modo mais generalizado e abstrato no que
se refere às estruturas, relações, tendências etc. Será feita a seguir a distinção entre os diferentes níveis
de abstração e de concretização nas representações.
No que se refere aos tópicos de pesquisa social, devo voltar à questão de governança (gêneros de
governança) introduzida no capítulo 2, mas agora como uma base analítica para tomar a representação
como recontextualização. Devo também voltar à discussão do universal e do particular feita no capítulo
3, considerando-os maneiras de referir-se aos agentes sociais (especificamente à referência genérica).
Discutirei também a questão de agência (ver estrutura e agência no glossário de termos-chave),
especificamente como os textos representam a questão da agência, por exemplo, se as ações são
representadas de modo a especificar ou suprimir a agência dos agentes bem como a importância política
e social que a escolha textual acarreta. Finalmente, farei uso do trabalho do teórico da Geografia David
Harvey (Harvey, 1996a) sobre a construção social do espaço e do tempo (espaço-tempo) para ver como
127
sua perspectiva pode ser utilizada na análise textual de modo a enriquecer a análise das
representações de espaço e tempo nos textos.

A Oração em uma Perspectiva Representacional


Todos os três tipos de significado (ação, representação e identificação) devem ser levados em
consideração quando se trata de orações, sendo que cada um deles oferece uma perspectiva específica do
mesmo e categorias analíticas específicas (ver a análise multifuncional do período em Halliday, 1994).
No capítulo 6, analisei a oração baseado nos significados relacionados aos agentes e isso incluía a
análise das categorias de funções do discurso (speech functions – declaração, procura etc.) e do modo
gramatical (declarativo, interrogativo e imperativo). A análise e as categorias são diferentes quando é
feita uma análise com base nos significados representacionais: nesta perspectiva, as orações têm três
elementos principais: os processos, os participantes e as circunstâncias. Por exemplo, em “Laura viu
Fiona em Lancaster” , existe um processo (‘viu’), dois participantes (‘Laura‘, ‘Fiona’) e uma
circunstância (‘em Lancaster’). Os processos geralmente se realizam sob a forma de verbos, os
participantes sob a forma de sujeito, objetos diretos ou indiretos e as circunstâncias sob a forma dos
diferentes tipos de elementos adverbiais, como adjuntos adverbiais de tempo ou lugar (como é o caso).
Podemos diferenciar os tipos de cada elemento (por exemplo, tipos de processo) e as orações se diferem
na seleção dos tipos de processo, dos participantes e das circunstâncias. Veja o conteúdo abaixo para
obtenção de maiores detalhes.

Exclusão, Inclusão e Proeminência


Os eventos sociais levantam diferentes elementos. Em termos gerais, eles incluem:

Formas de ação;
Pessoas (com crenças, desejos, valores... histórias);
Relações sociais, formas institucionais;
Objetos;
Meios (tecnologias);
Tempos e espaços;
Linguagem (e outros tipos de semiose).

Podemos analisar os textos sob uma perspectiva representacional, ou seja, quais elementos dos
eventos estão incluídos na representação desses eventos, quais deles são excluídos e aos quais é dada
128
maior importância. Ao invés de analisá-lo partindo da comparação da verdade sobre um determinado
evento com o modo de representação do mesmo em textos específicos (o que poderia levantar
questionamentos acerca da maneira com a qual se estabelece uma verdade, independentemente das
representações particulares), pode-se fazê-lo partindo da comparação entre as diferentes representações
dos mesmos eventos ou entre eventos similares (veja van Leeuween, 1993, 1995, 1996 para verificar tal
abordagem sobre o significado representacional).
Temos como exemplo, o texto impresso em uma caixa de charutos de uma marca famosa:

As plantações de tabaco para produção de charutos de maior qualidade do mundo são selecionadas
para a Hamlet.
Seletas folhas, manualmente plantadas, são secas,
fermentadas e cuidadosamente acondicionadas.
Depois a arte de nossos artesãos cria tal charuto.
Único, suave, leve.
HAMLET
Fine cigars

Os elementos dos eventos sociais representados que foram mencionados são formas de ação
(seleção, plantação, seca das folhas de tabaco etc.), bem como objetos dessas formas de ação (plantação
de tabaco, folhas, charutos). É dada, nesse caso, maior importância particularmente às formas de ação:
esse pequeno texto representa uma série de atividades. As pessoas são parcialmente incluídas (‘nossos
artesãos’), mas parcialmente excluídas: as pessoas que selecionam, colhem, secam, fermentam e
acondicionam as folhas de tabaco são excluídas. As relações sociais e as formas institucionais, bem
como os meios (com a exceção de ‘manualmente’), os tempos e os espaços, a linguagem dos tipos de
eventos (plantação e assim por diante) representados são excluídos. Pode-se fazer a relação dessas
exclusões com as formas gramáticas da oração. Nas primeiras quatro linhas, temos a voz passiva e
processos materiais (exemplo: ‘são selecionadas’). Com relação aos participantes, temos sujeitos
(pacientes), por exemplo, ‘seletas folhas’ e nenhum agente (não se menciona, por exemplo, os
camponeses locais). Não há, ainda, qualquer menção a tempo e lugar ou às circunstâncias.
Compare com o período imaginário que eu inventei de um romance fictício:

Já era quase meio-dia quando Pedro começou a cortar vigorosamente folhas no extremo sul da
plantação, já que sabia que o capataz iria inspecionar primeiro aquela área da plantação.
129
Nesse trecho há formas de ação (cortar), objetos (folhas), pessoas (Pedro e o capataz),
relações sociais (relação entre o trabalhador e o capataz), tempo (quase meio-dia) e lugar (no extremo
sul da plantação). É óbvio que várias outras representações diferentes da indústria do tabaco poderiam
ser encontradas. Pode-se considerar o que é socialmente significativo no que diz respeito à representação
no caso da caixa de charutos Hamlet, se for trazida à tona uma das mais controversas características do
capitalismo contemporâneo: a produção de bens para os mercados de países relativamente ricos por
meio de uma mão-de-obra muito mal remunerada, com péssimas condições de trabalho em países
relativamente pobres. Isso já foi amplamente discutido como sendo parte da injusta e exploradora
divisão internacional do trabalho. Logo, o comércio de bens, tais como os charutos em países
relativamente ricos, pode ser um problema e não seria surpresa se houvesse uma tendência de
representar o processo de produção de modo a ocultar as relações e as circunstâncias da produção, e até
mesmo dos trabalhadores que produzem - o que seria uma ocultação da agência.
Seria, entretanto, um pensamento minimalista analisar somente a motivação política para tais
exclusões. Se este fosse o caso, não haveria de forma alguma necessidade de pensar em processo de
produção. Alguém poderia afirmar que o processo de produção é representado como sendo parte do
enfoque da construção de uma imagem do produto como algo de qualidade. A qualidade do produto, o
cuidado que cerca todo o processo, bem como sua seleção são explicitados em “de maior qualidade”,
“único”, “cuidadosamente”, “seletas” etc. ou estão implícitas, como é caso de “manualmente” e
“selecionadas”. Dá-se importância a expressões que evidenciam o diferencial do produto, sendo elas
colocadas no início da oração (tema), por exemplo, “as plantações de tabaco para produção de charutos
de maior qualidade”, “seletas folhas”, “a arte de nossos artesãos”. O que importa aqui são os objetos
(matérias-prima, produtos) e as atividades relacionadas a eles, não as pessoas que desempenham tais
atividades ou as relações sociais da produção.

As Representações Concretas e Abstratas dos Eventos


Os eventos sociais podem ser representados em diferentes níveis de abstração e de generalização.
É possível fazer a distinção entre três níveis de concretização e de abstração:

As mais concretas possíveis: representação de eventos sociais específicos;


As mais abstratas/generalizadas: abstração sobre um série ou um conjunto de eventos sociais;
As mais abstratas possíveis nas práticas sociais ou estruturas sociais.
130
O anúncio da Hamlet foi escrito em um nível intermediário de abstração, não representando
eventos sociais concretos e específicos, mas uma série de repetidos eventos sociais. As regulamentações
de política da União Européia, por outro lado, representa o mundo social de forma abstrata. Ele
representa a globalização como um processo de mudança social, no que se refere às relações entre os
processos econômicos (a destruição de atividades obsoletas e a criação de novas), à mudança psico-
social (um sentimento de desconforto generalizado, as desigualdades e as polarizações) e às iniciativas
políticas (a implementação das reformas necessárias). Todos esses fatores são tidos pelos corporativistas
como fatos menosprezados pelo governo, pelos empresários e pelos sindicatos.
Observe que a questão de agência é levantada no anúncio da Hamlet como um processo
econômico. O progresso econômico é representado como um processo em que não há agentes sociais e
humanos. No segundo período, existem algumas nominalizações, além de substantivos que representam
processos (veja abaixo para maiores explicações): progresso, destruição, atividades, criação. Pode-se
considerá-los como sendo referenciais e generalizadores no que se refere a complexos de processos que
envolvem pessoas. Parece, então, plausível levantar as seguintes questões: Quem está progredindo
economicamente (e quem não está)? Quem está fazendo coisas ultrapassadas (e por que elas são
ultrapassadas)? Quem destrói e quem cria? Pode-se considerar que os agentes sociais dos processos
econômicos foram excluídos neste caso, seria um jogo no qual não houvesse jogadores. Ao mesmo
tempo a agência cede espaço a processos abstratos e a entidades. É o progresso econômico (ou talvez o
seu ritmo – a referência não é bem explicitada no exemplo) que impõe mudanças rápidas e profundas. É
a economia global que tem a demanda e não há risco de que os recursos sejam destinados a outras partes
do mundo. Observe que o movimento dos recursos é representado por um processo intransitivo (em
oposição a um processo transitivo, por exemplo, “as pessoas destinarão os recursos”) e que os recursos
são personificados (assim como as pessoas eles podem sair em busca de melhores oportunidades).
Quando as representações são generalizadas ou abstratas, deve-se analisar particularmente como
as coisas são classificadas, além dos esquemas de classificação que são construídos para impor uma
“divisão” social – uma divisão, uma classificação, que constitui uma visão particular, um ponto de vista
(Bordieu e Wacquant, 1992). Os esquemas de classificação que são construídos neste caso incluem uma
divisão implícita entre o progresso econômico e o outro (que não tem nome – talvez estagnação ou
recessão), entre a coesão social e a fragmentação social (polarização), entre a divisão do mundo com
base na capacidade de comprar (onde haveria regiões promissoras e as não promissoras) e o tripé de
agentes de maior importância (o governo, os sindicatos e os empregadores). Pode-se analisar as
diferenças entre os discursos com base, por exemplo, em suas palavras-chave (progresso, coesão social),
131
mas a análise seria muito mais produtiva se fossem consideradas diferenças nos esquemas de
classificação.

Representação como Recontextualização


Pode-se analisar as questões levantadas acima sobre exclusão, inclusão, proeminência e
representações concretas e abstratas em uma visão mais ampla da representação dos eventos sociais: a
recontextualização, um conceito já discutido no capítulo 2 relacionado naquele caso a gêneros de
governança. Ao representar um evento social, este é incorporado ao contexto de outro evento social. Isso
seria a recontextualização. Campos sociais específicos, redes de práticas sociais específicas e gêneros
específicos (elementos de tais redes de práticas sociais) associaram a eles princípios de
recontextualização específicos. Estes são a causa de diferenças entre as maneiras nas quais um tipo
específico de evento social é representado em diferentes campos do conhecimento, nas redes de práticas
sociais e nos gêneros. É feita uma filtragem dos elementos dos eventos sociais de acordo com tais
princípios de recontextualização (alguns são excluídos, outros incluídos, dando-lhes maior ou menor
importância). Esses princípios também afetam o modo no qual os eventos sociais são representados, de
forma mais concreta ou mais abstrata. Considera-se assim se e como os eventos são avaliados,
explicados, legitimados, além da ordem na qual os eventos são representados. Resumidamente, tem-se:

 Presença
Quais elementos dos eventos, ou eventos de uma cadeia de eventos estão presentes, quais estão
ausentes, quais estão em maior destaque e quais ficam em segundo plano?

 Abstração
Qual é o grau de abstração e de generalização dos eventos concretos?

 Ordenamento
Como os eventos são ordenados?

 Acréscimos
O que é acrescido ao representar os eventos: as explicações, legitimações, (razões, causas,
intenções) e avaliações?
132
Van Leeuwen (1993) tem um posicionamento similar sobre as representações no que se
refere à exclusão, ao acréscimo, à substituição, e ao ordenamento dos elementos.
Nessa proposta, compare os exemplos 12 e 4 (apêndice páginas XXX e XXX). Em ambos
existem representações dos efeitos sociais e psicológicos mais amplos da mudança econômica nos
empregados, nos trabalhadores. O exemplo 12 é retirado do que o autor descreve como um ensaio que
tem como objetivo argumentar sobre os efeitos do novo capitalismo flexível no caráter das pessoas, com
enfoque na experiência real de indivíduos reunidos “desvendando a vida cotidiana ao meu redor, assim
como um antropólogo faria”. Apesar de os detalhes sobre as pessoas, lugares e circunstâncias terem sido
alterados para preservar o anonimato, o autor tem como objetivo revelar o sentido do que ele observou.
Os eventos sociais representados são uma série de encontros e conversas entre um grupo de
programadores da IBM que foram despedidos. Nessas conversas, uma série de eventos associados à
perda do emprego foi representada por meio de abstração e de práticas e estruturas sociais. No que se
refere à presença, as pessoas e os lugares estão em destaque na representação do autor desses encontros,
dando-se importância à relação existente entre os tipos de atividade, pessoas e lugares. Não há menção
do tempo na descrição dos eventos e presumidamente existe um desencadeamento dos eventos que não é
mencionado, por exemplo, como os programadores começaram a se reunir regularmente. Existe aí um
baixo nível de abstração. Os eventos são representados de forma concreta, mas com generalizações
sobre uma série de eventos. Isso é a caracterização de uma série de encontros presenciados pelo autor. A
questão de ordenamento não é levantada, pois o foco está sobre um evento recorrente. Não é como uma
narrativa, na qual a ordem conta para o desenrolar da trama. Tem-se aqui uma descrição mais analítica
das características-chave: como as pessoas se sentam, quem é mais falante, como as pessoas se
posicionam no bar. Pode-se considerar que, em parte, os agentes sociais se transformam em personagens
(Bal 1997). No que se refere a acréscimos, um elemento de avaliação é acrescido na representação dos
encontros, por exemplo, na seleção de detalhes, com em “de camisa branca” e “de gravata preta”.
Entretanto, isso não é feito no que se refere à explicação ou à legitimação. Pode-se observar que o
principio de recontextualização para esse tipo de escrita sociológica acentuaria a especificidade dos
eventos concretos, no caso um padrão regular de eventos, o local onde eles ocorrem, e as pessoas
envolvidas.
O exemplo 4, uma regulamentação da União Européia, ao contrário, representa uma série de
eventos muito complexa, bem como o passado, o presente e a previsão para o futuro de conjuntos de
eventos sociais e econômicos em um alto nível de abstração. Não há somente generalização sobre séries
complexas e conjuntos de eventos (por exemplo, a destruição de atividades ultrapassadas) e abstração
das facetas dos mesmos (por exemplo, coesão social), mas também existem relações estruturais no maior
133
nível de abstração (por exemplo, a relação estrutural entre a coesão social e a eficiência e a
adaptabilidade econômica, como no período 7). O único elemento que quase sempre está presente e que
é resguardado de importância são as formas de atividade (as materiais – destruição; as não materiais –
aspirações), às vezes com menção a pessoas (o povo, os governantes, etc) ou a objetos (atividades
ultrapassadas, mas usualmente sem. Não há menção de tempo e espaço de específicas séries ou os
conjuntos de eventos (por exemplo, a destruição das atividades ultrapassadas). Ao contrário, uma
indiferença em relação a questão do espaço é trazida a tona (em todos os países). A noção de tempo,
entretanto, torna-se importante no arranjo e no ordenamento dessas representações em um alto nível de
abstração em relação umas com as outras no texto. Isso ocorre, particularmente, na organização da
relação entre o que é real e o que não é, o mundo real (o passado e o presente), e a previsão e
recomendação do que seria o mundo das políticas. Um exemplo disso seria a relação existente entre a
globalização – a qual é relacionada ao progresso, à destruição e à criação – e os ajustes e reformas
realizados. Em alguns casos, essas também são relações causais, por exemplo, “a dificuldade em agir
rápido e eficazmente, resultará na perda de recursos”. Há aí uma relação de causa e efeito entre a
dificuldade (presente) e a perda (futuro, previsão). Ainda existem avaliações, legitimações, e explicações
(por exemplo, o período 3 legitima o 4 e a incongruência entre os sonhos e as aspirações do povo e as
demandas da economia global são avaliadas de forma negativa – uma pista textual que demonstra isso é
o risco).
Foram discutidos, no capitulo 2, os gêneros de governança, sendo eles vistos como gêneros
associados a redes de práticas sociais as quais tem como objetivos a regulação e o controle (administrar)
de outras redes de práticas sociais. As regulamentações desse tipo são um tipo de governança. Quando
outras práticas sociais são recontextualizadas dentro das regulamentações, prevê-se que haverá um alto
nível de abstração, desde generalizações até eventos concretos, também que as relações de causa e
tempo serão especificadas entre essas abstrações, como no exemplo. Tais documentos são importantes
para a ligação entre os níveis, em que há generalização sobre casos locais (e uma critica padrão
suprimindo as diferenças) para reivindicar o que traz implicações políticas nacional e
internacionalmente.

A Representação de Processos, das Pessoas Envolvidas e das Circunstâncias


134
Pode-se distinguir um pequeno número de tipos de processos principais, que se diferenciam,
em seus instrumentos, seus participantes, sendo eles chave e determinantes, bem como nos tipos de
circunstâncias associadas a eles (comparar Halliday, 1994 e van Leeuween, 1995).

Tipo de processo Participantes-chave Circunstâncias

Material Ator, Afetado Tempo, espaço, intenção,


razão, modo, meios
Verbal Ator

Não-material Conhecedor, Fenônemo Tempo, espaço, razão

Relacional 1 Portador, Atributo

Relacional 2 Tomado, valor

Existencial Existente

Com relação às circunstâncias, os tipos de processo se enquadram em dois grupos principais:


processos materiais e os verbais, os quais viabilizam uma gama maior de circunstâncias, se comparados
aos não-materiais, aos relacionais e aos existenciais. Existe m dois tipos principais de processos
materiais: o transitivo (Ator + Processo + Afetado, por exemplo, “A globalização faz com que a escolha
e a liberdade aumentem”) e o intransitivo (que pode tanto ser Ator + Processo, como em “João correu”
ou Afetado+ Processo, como em “A sociedade está mudando” , dependendo do tipo de processo, se ele é
um feito ou um acontecimento). Os processos materiais transitivos podem ser estabelecidos de forma
ativa ou passiva, sendo que o último pode ou não apresentar os agentes da voz passiva, por exemplo “A
escolha e a liberdade são aumentadas”, sem o agente ou “A escolha e a liberdade são aumentadas pela
globalização”, (com o agente). Segue abaixo uma analise ilustrativa de parte do Exemplo 12. É uma
análise simplificada, pois só está em questão as partes sublinhadas. (Ter como parâmetro os exemplos
do texto-fonte. A tradução serve apenas para prover uma orientação vocabular.)

1) O River Winds Café , não muito distante do bairro onde se localiza dos antigos escritórios de
meu amigo, é um alegre ponto de encontro para comer hambúrger, (RELACIONAL1,
PORTADOR+PROCESSO+ARIBUTO)
2) que durante o dia é freqüentado somente por mulheres que saem às compras ou (MATERIAL,
(AFETADO)+PROCESSO+ATOR (agente da passiva) )
135
3) por adolescentes emburrados perdendo tempo depois da aula. (MATERIAL,
ATOR+PROCESSO+AFETADO)
4) é lá que (RELACIONAL-2, TOMADO+9PROCESSO+VALOR)
5) ouvimos aqueles homens de camisa branca e gravata escura despejando suas histórias.9
(MENTAL, CONHECEDOR,+PROCESSO+FENÔMENO)
6)os quais seguravam atentamente xícaras de café (MATERIAL,
ATOR+PROCESSO+AFETADO)
7)enquanto ficavam sentados concentrados como se estivesse em um encontro de negócios
(MATERIAL (ATOR)+PROCESSO)
8)esses homens de camisa branca e gravata escura despejavam suas histórias. (MATERIAL,
ATOR++PROCESSO+AFETADO)
9)Um grupo de 5 a 7 homens permanece junto; (MATERIAL, ATOR+PROCESSO)
10)Eles eram programadores da central de processamento de dados e analistas de sistemas da
velha IBM. (RELACIONAL-, PORTADOR+ PROCESSO+ATRIBUTO)
11)Os mais comunicativos entre eles eram Jason, um analista de sistemas... e Paul um
programador mais jovem, (RELACIONAL-2 VALOR+PROCESSO+TOMADO)
12) o qual permanecera na empresa por aproximadamente vinte anos (RELACIONAL-1,
PORTADOR+PROCESSO+CIRCUNSTANCIA)
13) o qual Jason despediu, na primeira leva de demissões...(MATERIAL,
AFETADO+ATOR+PROCESSO)

Os processos verbais e existenciais não foram exemplificados aqui. O período 8 pode ser
reescrito de modo a tornar-se um processo verbal (Os homens de camisa branca e gravata preta
conversam sobre o que ocorrera com eles) e o período 8 ,como um processo existencial (Há um café não
muito longe dos escritórios do meu vizinho chamado River Winds Café).

Representações Metafóricas (não-congruentes) dos Processos


Halliday (1994) amplia o conceito de metáfora. O que antes estava somente relacionado ao
significado das palavras, agora também tem relação com a gramática. Pode-se aí distinguir então
representações congruentes (ou não-metafóricas) e representações metafóricas Essa distinção pode ser
de grande valia, porém acarreta problemas. Estes provêm do fato de que o termo congruente também
pode ser “relacionado a” como são de fato os eventos, as práticas ou as estruturas, independentemente de
136
interpretações específicas dos mesmos. Ainda, tal termo pode estar ligado a uma noção um tanto
quanto vaga de como os eventos e os outros aspectos podem ser representados mais “freqüentemente”,
nos casos não marcados. Ainda assim é um termo problemático, entretanto é capaz de transmitir
importantes distinções, tais como a existente entre a representação de processo como um processo em
oposição a representação do mesmo como entidade, o que constitui uma das formas mais significativas
da representação metafórica. Por exemplo, como foi dito anteriormente, existe um sentido para alguém
dizer progresso econômico, destruição (de atividades ultrapassadas) atividades e a criação de novas. Isto
seria uma complexa referência a conjuntos e séries complexas de eventos que estariam ligados com o
que as pessoas fazem ou o que acontece com elas. O último pode ser considerado como algo
estritamente relacionado a representações congruentes, logo o fato de trabalhadores de uma fábrica
produzirem vigas mestras de aço é congruente enquanto “atividades” não são . Referir isto como
“atividades” seria fazer uma metáfora gramatical. Os processos aí seriam representados como entidades
que operam semanticamente como as outras atividades, por exemplo, elas poderiam ser destruídas. As
entidades, sendo elas coisas e pessoas, são representadas lingüisticamente de forma congruente como
substantivos. Enquanto como processos, são representadas lingüisticamente de forma congruente como
verbos com seus respectivos sujeitos objetos e assim por diante. “Atividades” e “processo” são
substantivos relacionados a processos: fazem parte ao vocabulário nominal da língua e pertencem a uma
subcategoria específica com estreita relação com verbos e, por conseqüência, com seus processos. A
destruição e criação são normalmente chamadas em oposição de nominalizações: existe uma clara
ligação entre a destruição e o fato de alguém destruir algo e também entre criar e alguém criar algo.
Também é claro que nos primeiros termos de cada comparação existe uma nominalização do que é dito
a seguir. Isto seria a conversão de um verbo em um substantivo, e semanticamente, de um processo em
uma entidade.
Normalmente, na nominalização ocorre a perda de alguns elementos semânticos do sintagma.
Questões relativas ao tempo verbal e ao modo não são levantadas. Desta forma, o termo destruição pode
cobrir a idéia de “foi destruída”, “é destruída”, “será destruída”, bem como as de “é”, “pode”, “seria” e
assim por diante. Há assim uma perda. Pode ocorrer também neste processo a exclusão dos participantes
no sintagma. Neste caso, nenhum das frases nominais ou nominalizações possui um agente (o sujeito da
frase na maior parte das vezes). Como já foi dito não há especificação de quem progride, age, destrói, ou
cria. A nominalização é um recurso para generalização, para uma abstração de eventos específicos e
séries ou conjuntos de eventos, sendo assim um recurso irredutível no discurso técnico e no científico.
(Halliday e Martin, 1993) bem como no discurso do governo (Lemke, 1995). Como já foi dito tal
generalização e abstração, por exemplo, nos gêneros de GOVERNANCE, podem apagar ou até mesmo
137
suprimir as diferenças e ofuscar a questão da agência e logo a questão de responsabilidade e das
divisões sociais. Neste caso, por exemplo, a questão de quem progride e quem não progride, quem
destrói e quem deve ser responsável pela destruição, o modo com o qual as pessoas ganham a vida etc
são destruídos.
As representações dos eventos, das atividades, dos processos acarretam em uma necessidade de
escolha (nem sempre uma escolha voluntária, é claro) entre os tipos de processo. Neste caso pode-se
novamente considerar a existência de escolhas congruentes e outras, metafóricas. Por exemplo, os
processos (sintagmas verbais sublinhados) em: “O ritmo tornou-se cada vez mais acelerado e o sistema
tomou proporções mundiais” podem ser encarados como processos relacionais do tipo 1. O verbo tomou
equivale-se com a expressão veio a ter (os dois subtipos principais deste processo relacional são sendo e
tendo). Tanto a aceleração como a globalização são representadas como algo que surge ao invés de algo
que se constitui como efeito de agentes causais, por exemplo, os acordos internacionais entre os
governos e as políticas das empresas . Em um discurso diferente, como o marxista ou o antiglobalização,
elas podem ser representadas como efeitos de agentes causais e os tipos de processo podem ser
materiais. (Ver Exemplo 13, Apêndice páginas 249-50).
No exemplo 12, existem várias representações de desemprego dos programadores: “eles
perderam o emprego”, “deixaram-nos ir”, “os trabalhadores despedidos”, “a demissão”. Na segunda
representação, existe um verbo transitivo complexo (deixar) e outro intransitivo (ir) e é uma oração sem
sujeito, sem agente. O sujeito responsável pela demissão é omitido. Sob a ótica semântica, isso é muito
interessante, pois se observa que esta relação Agente Processo Afetado, que é transitiva material
congruente, como no caso a administração os despediu, foi construída metaforicamente de modo a
transmitir a idéia de que foi permitido (deixar) que os programadores agissem (ir). No caso da frase
“eles perderam o emprego”, pode-se considerar o processo transitivo material congruente ocorrido com
os programadores como uma metáfora do afetado, construída como um processo transitivo material,
tento os programadores como agentes, como se eles fossem responsáveis por seu próprio desemprego.
“Despedidos” é uma forma reduzida da passiva (compare com “eles foram despedidos”), que funciona
como um adjetivo e, por fim, demissão é a nominalização. Nestes casos, observa-se um processo
congruente, mas os agentes são suprimidos.
Descrever a natureza precisa e a distribuição das metáforas gramaticais pode ser encarado como
uma forma produtiva de pesquisa em textos em uma conjuntura social específica e nos processos de
mudança social. Por exemplo, Graham (2001a) afirma que a metáfora dos processos, a construção
metafórica dos processos no mundo material, é um aspecto muito significativo dos gêneros altamente
influentes na formação política do novo capitalismo: “No gênero da diplomacia, as metáforas de
138
processo são, sem dúvidas, ferramentas poderosas para a construção da atividade humana no futuro
como um objeto pseudo-espacial factual”.

Representação dos Agentes Sociais


Da mesma forma que há escolhas a serem feitas na representação dos processos, também há
escolhas na representação dos agentes sociais. Estes geralmente são participantes nas frases (também
podem se relacionar às circunstâncias) embora nem todos os participantes sejam agentes sociais - eles
podem ser objetos por exemplo (compare “o carro bateu em Maria” com “o carro bateu em uma pedra”:
tanto Maria como a pedra são objetos do verbo , mas só Maria é um agente social).

Pode-se esquematizar as escolhas disponíveis na representação dos agentes sociais da seguinte


forma (Van Leeuwen 1996 identifica várias outras variáveis):

 Inclusão ou exclusão
Isso já foi discutido em linhas gerais quando foi levantada a questão da representação dos
eventos sociais. Pode observar dois tipos de exclusão dos agentes sociais:
a) agente suprimido – não há nenhuma menção no texto
b) agente relegado ao segundo plano – mencionado em algum lugar no texto e inferido
em outros
 Pronome ou substantivo
O agente social está sob a forma de um pronome ou de um substantivo?

 Função gramatical
O agente social é um participante na frase (como ACTOR ou AFFECTED), é descrito em uma
circunstância ( como na frase Ela caminhou em direção a João), ou como um substantivo
possessivo ou um pronome (Amigo de Laura, nosso amigo.

 Ativo ou passivo
O agente social é o ator nos processos, é afetado ou se beneficia?

 Pessoal ou impessoal
139
Os agentes sociais podem ser representados pessoalmente ou impessoalmente, por exemplo,
quando nos referimos à policia como “imundície”, estamos a impersonalizando.

 Nomeado ou classificado
Os agentes sociais podem ser representados pelo nome, por exemplo, Fred Smith”, ou de acordo
com categorias, por exemplo “o médico”. Com relação ao último , este pode se referir a um único
individuo ou a um grupo de pessoas (os médicos).

 Específico ou genérico
Os agentes sociais podem ser classificados de forma específica ou genérica. Por exemplo, o
termo “os médicos” pode se referir a um grupo específico de médicos (aqueles que trabalham em
um certo hospital) ou a classe de médicos em geral,ou seja, todos os médicos (os médicos se
vêem como boas pessoas).

As representações dos agentes sociais presentes no trecho que se segue retirado do livro “A
Corrosão do Caráter”, do escritor Sennett, estão em itálico, já as exclusões aí presentes são marcadas
pelo símbolo ^.

Lippmann me chamou a atenção quando passei a me relacionar com um grupo de programadores


de meia-idade que conheci, homens que tinham sido despedidos^ recentemente do escritório norte-
americano da IBM. Andes de perder o emprego, eles complacentemente acreditavam na longa e
estável duração de suas carreiras. Como programadores de alta-tecnologia, eles deveriam ser
considerados mestres da nova ciência, Depois que eles deixaram-nos ir, eles tiveram que se
posicionar diferentemente frente aos fatos que dificultavam suas vidas e não conseguiam encontrar
uma razão palpável para explicar o fracasso...
O River Winds Café, não muito distante do bairro onde se localiza os antigos escritórios de meu
amigo, é um alegre ponto de encontro para comer hambúrger, que durante o dia é freqüentado
somente por mulheres que saem às compras ou por adolescentes emburrados perdendo tempo
depois da aula. É lá que ouvimos aqueles homens de camisa branca e gravata escura, os quais
enquanto ficavam sentados concentrados como se estivessem em um encontro de negócios,
despejavam suas histórias. Um grupo de 5 a 7 homens permanece junto. Eles eram programadores
da central de processamento de dados e analistas de sistemas da velha IBM. Os mais
comunicativos entre eles eram Jason, um analista de sistemas o qual permanecera na empresa por
aproximadamente vinte anos e Paul um programador mais jovem, o qual Jason despediu, na
primeira leva de demissões.
140
Os principais agentes sociais incluídos são os programadores e o autor (eu). As pessoas
responsáveis pela demissão (gerentes de alto escalão) são excluídas. Os agentes sociais são participantes
(por exemplo, “eles eram programadores da unidade central de processamento”) ou estão na forma
possessiva e estão sobre a forma de substantivo e pronomes (a primeira pessoa e a terceira do plural são
usadas anaforicamente para fazer menção a algo já citado. Os programadores são representados tanto na
forma ativa (principalmente em “despejando suas histórias”) quanto na passiva (principalmente em
“foram despedidos”). As representações são pessoais , com a exceção de “grupo”. Os programadores são
tanto classificados quanto nomeados e faz-se referência a grupos quando existe uma classificação . A
referência é específica e não genérica.
Os agentes sociais no Exemplo 4 se apresentam sobre as mesmas convenções:

1. Mas a globalização é um processo que requer muito e quase sempre um processo que traz
vários problemas.
2. O progresso econômico sempre veio acompanhado pela destruição de atividades
ultrapassadas e a criação de novas.
3. O ritmo está mais acelerado e os fatos tomam proporções planetárias.
4. Impõe-se a todos os países ajustes rápidos e profundos – incluindo os europeus, onde a
civilização industrial nasceu.
5. A coesão social é ameaçada por sentimento generalizado de intranqüilidade desigualdade
e polarização.
6. Existe um risco de divergências entre os sonhos e aspirações do povo e a demanda da
economia global.
7. E ainda a coesão social não é somente um objetivo social e político de grande valia, mas
também é uma fonte de eficiência e de adaptabilidade em uma economia que tem como
base o conhecimento e que depende cada vez mais das habilidades humanas e da
capacidade de trabalho em grupo.
8. Mais que nunca, os governos, sindicatos e empregadores devem trabalhar conjuntamente
 para descrever os riscos e evitar erros,
 para ressaltar que os países devem ter grandes ambições e que estas podem se
tornar realidade e
 para implementar as mudanças necessárias consistentemente e sem atrasos.
141
9. Caso mudanças rápidas e conscientes não ocorram, haverá perda de recursos tanto
humanos quanto de capitais, a qual pode afetar partes promissoras do mundo se a Europa
não der oportunidades tão atrativas.

Os principais agentes sociais são “people”. Seriam elas que fazem as coisas acontecerem
(governo, sindicatos empregadores). Eles são extensivante excluídos. Quando os agentes sociais são
incluídos, eles estão sobre a forma de possessivos (the duty of Government, tradeunions and employers),
em uma determinada circunstância (on all coutries) e como um participante, portador do relcional tipo
1(countries should have high ambitions). Representation is tanto pessoal quanto impessoal Os agentes
sociais são classificados, não nomeados. As referências são principalmente genéricas (governments,
people), mas “Our countries “ é específico.
Aqui um outro trecho do exemplo 1(apêndice , páginas 229-30):

Bem, mas como você muda este tipo de cultura negativa? Fizemos muito até aqui, mas meu maior
medo é que eles destruam todo o bom trabalho que fizemos aqui se continuarem a empurrá-los
para o fim da linha como estão fazendo. Acredito que as pessoas reagirão desta forma em pouco
tempo e que elas destruirão tudo.
Fim da linha?
Para os empregados, empurrando-os ao se desfazer deles. Como você pode exigir flexibilidade,
desenvolvimento pessoal e empresarial, desfazendo-se deles? Assim como alguém me disse ontem,
um operador, ‘ Pra que eu vou fazer o melhor de mim para finalizar este produto se amanhã pela
manhã você pode me despedir?’ e eu não tive resposta.
E o bom trabalho sobre o qual você falou?
Houve um plano para retirar o poder dos sindicatos e devolvê-los para os gerentes para então
devolvê-los aos trabalhadores. Estava ocorrendo tudo em ordem, mas o grande número de
redundâncias pode fazer com que digamos...

Os principais agentes sociais são o gerente (Eu), gerentes de médio (Nós), e alto escalão, a
empresa, os trabalhadores e os sindicatos A principal exclusão refere-se a “força de trabalho”, mas como
isso é algo já mencionado , evidencia-se um caso de supressão. Os agentes sociais funcionam com
participantes, possessivos, e estão dento das circunstâncias. Existe uma gama de pronomes: Eu (o
gerente entrevistado), Nós (os gerentes de médio escalão), o genérico “Você”6 (você como uma
alternativa coloquial para uma classe mais alta e mais formal, como é o caso de “how do you change this
sort of negative culture), o específico você (para se dirigir a um grupo de pessoas específico, como é o

6 (Nota do tradutor) O genérico em Língua Poruguesa falada também é “você” no sentido de “qualquer pessoa”.
142
caso de “ But the good wook you refer to) , o não anafórico they (para se referir a um grupo de
pessoas as quais são inferidas pelo contexto , ao invés de fazer a repetição do nome, no caso a senior
manager). A questão de ativo e passivo aqui é complexa, mas quando se refere a classe trabalhadora, ele
é muito mais freqüentemente representada na forma passiva, se comparado com os outros em questão.
Ela é a única representada impessoalmente (the bottom end e the workforce) . Os agentes sociais são
classificados, nunca nomeados. E com a exceção de “an operator” e dos pronomes Eu e você específico,
as referências são a grupos e não a indivíduos. A referência é em alguns casos específica (what the
company is doing) e às vezes genérica (“the firms”, para significar firmas em geral), talvez ambivalente
em alguns casos (“I believe the senior manegemant has a moral reponsibility “, faz referencia ao caso
específico daquela empresa ou se trata de generalização?).
Comparações e comentários de escolhas de significado social maior na representação dos agentes
sociais são feitos acerca das noções de inclusão e exclusão Existem várias motivações para exclusão,
como, por exemplo, a redundância ou a irrelevância, mas também pode ter uma conotação política. Por
exemplo, no Exemplo 12, por que se opta pela forma passiva (man who were recently downsized e after
they were let go), qual seria a razão da escolha de um processo intransitivo (they lost their jobs) ao invés
de um transitivo (alguém os despediu)? Isso gera polêmica, mas uma questão que merece discussão é se
essas formas de exclusão dos agentes e agências são sintomas de uma visão de redundância de algo que
ocorre com as pessoas ou de algo que é feito com elas: uma calamidade ao invés de um crime, seria um
exemplo exagerado disso. No exemplo 1 a maior exclusão é omissão em palavras da classe trabalhadora.
O uso intransitivo ou elíptico de “livrar-se” também é marcante. Talvez isso seja para marcar um
eufemismo ou evitar chamar pelo nome real.
Os pronomes têm o seu valor ao analisar um texto A primeira pessoa do plural é importante no
caso dos significados identificacionais, como as dos textos representam e constroem grupos e
comunidades. No exemplo 1, a maior comunidade construída pelo “nós” é dos gerentes de médio
escalão, o grupo de pessoas entrevistadas (não é um grupo bem definido). Existe ai uma divisão entre
trabalhadores de médio e de alto escalão o que representa um distanciamento ainda maior entre estes e
os trabalhadores. Como sempre, alteramos o significado no texto. No discurso indireto, representação
do discurso imaginário e não do discurso real, as comunidades representadas pelo “nós” são os
sindicatos, apesar de não está claro se há inclusão dos sindicalistas ou do líder- sindical. “Nós” também
é usado no final de forma vaga para se referir a todos e a qualquer um (the society we live in). As
comunidades construídas com “nós” são sempre de difícil compreensão e vagas, além de se alterarem
muito.
143
É interessante analisar contrastivamente o uso do “nós” e do “você” genérico, no exemplo 1.
Existem comunidades construídas com base nos dois pronomes. O gerente se inclui nas duas, mas elas
são bem diferentes. A estabelecida com base no “você” é mais abrangente que a estabelecida com base
no “nós”, entretanto, não inclui todo mundo. Ela se refere à comunidade de gerentes, mas não os da
empresa. No Capítulo 3 foi discutido como a questão da dialética entre o do particular e do universal
tem suas bases no texto. Aqui a comunidade-“nós” refere-se ao particular, enquanto a comunidade-
“você” refere-se ao universal ao lidar com um processo universal. As referencias genéricas referem-se
normalmente ao universal, por exemplo, a oscilação entre a noção de particular e universal existente no
Exemplo 1. Ao mesmo tempo o “você” genérico é quase sempre um pronome coloquial que se refere às
experiências cotidianas. A comunidade-“você” refere-se ao trabalho, é nela que o gerente se insere.
A questão de ativo e passivo é transparente: quando os agentes sociais estão na forma ativa, sua
capacidade de ação, de fazer as coisas acontecerem, de controlar os outros é acentuada. Quando estão na
forma passiva, o que é acentuado é o seu asujeitamento ao processo, sendo afetados pelas ações dos
outros. Os programadores do Exemplo 12 são representados como vítimas do processo na IBM, e os
trabalhadores são representados de forma semelhante no Exemplo 1. Compare isto com a visão de luta
entre as classes das relações no meio industrial, a qual implica num desacordo entre as várias agências, a
representação impessoal dos agentes sociais pode desumanizá-los, representando-os como elementos de
estruturas e processos organizacionais. O extremo oposto disso seria a nomeação.

Representação de Tempo e Espaço


Deve-se fazer distinção entre as representações de locação (“21h” ou “em Lancaster) e das de
extensão (duração, distância-”por três horas”, “por três milhas), quando se trata da questão de espaço e
tempo. Vários aspectos lingüísticos contribuem para a representação do tempo. Entre eles: tempo verbal
(presente, passado e futuro), as características do verbo (distinção entre ação progressiva ou não), os
advérbios, as conjunções, e os marcadores temporais.
De acordo com Harvey, as noções de espaço e tempo são constructos sociais, ou seja, são
construídas diferentemente em cada sociedade e levam a discordâncias (como é caso da luta das classes
trabalhadoras). Além disso, estão muito interligadas, sendo difícil de separá-las. Logo faz sentido
analisar um segmento da construção de diferentes espaço-tempos. Em qualquer ordem social haverá
diferentes espaço-tempos coexistindo (a noção de global e local está profundamente ligada a isso) e um
pondo para discussão é como esses diferentes espaço tempos se ligam uns com os outros. Harvey da o
exemplo da militância dos sindicatos em certos lugares, e a forma como a especificidade do lugar está
144
ligada com os espaço-tempos nacionais e internacionais dos movimentos sociais. Tais conexões são
rotineiras e se constroem dentro das praticas sociais e das redes de praticas sociais.
O espaço, o tempo e os espaço-tempos são freqüentemente construídos nos textos. Desta forma,
deve-se estar atento para não reduzir essa noção unicamente aos textos, pois o mundo físico (modelo
urbanístico, arquitetura dos prédios) também deve ser considerado. Entretanto, os textos têm um papel
preponderante nesta discussão. Então como se pode operacionalizar a perspectiva de Harvey na analise
textual? Começando pela idéia de ligação textual como ligação de eventos e pela questão de ligação de
gêneros. Quando foi discutida a questão de governança, falou-se que os gêneros contribuem para ligação
de diferentes escalas da vida social: o local, o nacional, o regional, e o global, que têm estreita ligação
com o ligar diferentes espaço-tempos. Mas a construção e interconexão de espaço-tempos persistentes
dentro de certos textos é um tópico para análise textual.
Tome como base um trecho do Exemplo 1. Os elementos textuais que se relacionam com a
construção do tempo estão em itálico, já os concernentes à construção do espaço estão sublinhados.

Bem, mas como você muda este tipo de cultura negativa? Fizemos muito até aqui, mas meu maior
medo é que eles destruam todo o bom trabalho que fizemos aqui se continuarem a empurrá-los
para o fim da linha como estão fazendo. Acredito que as pessoas reagirão desta forma em pouco
tempo e que elas destruirão tudo.

Observe o movimento entre as diferentes temporalidades que se relaciona com a alteração dos
verbos e em um caso com o advérbio: do complexo futuro do pretérito até o presente simples. Pode-se
identificar 3 diferentes espaço-tempos aqui: o tempo real da entrevista (o futuro do pretérito representa
a intenção futura do gerente no início da entrevista, antes da pergunta do entrevistador), o espaço-tempo
local do local do escritório e o espaço-tempo global da mediação. O espaço tempo do escritório é
construído como uma relação entre o passado (o bom trabalho desempenhado), presente (o que eles
estão fazendo, no que o gerente acredita e o que ele teme – observe que o present perfect “have done”
difere do past “put” justamente ai e liga o passado ao presente.) e o futuro (as pessoas vão reagir, tudo
será destruído). Pode perguntar acerca de qualquer organização ou instituição. Como as relações entre
passado e futuro são construídas e como os textos são estruturados e como se modificam como parte das
mudanças sociais.
O espaço-tempo global da mediação da entrevista se realiza de forma específica com o uso do
presente simples (“do...change”), chamado presente atemporal. Ele representa não somente o presente de
fato, mas também um período de tempo não delimitado. Seria o tempo da mediação tal qual ela é, como
um processo que está além de um lugar específico, seria um processo global que se localiza em todos os
145
lugares e ao mesmo tempo em nenhum lugar. Observe que enquanto o espaço-tempo local do lugar
escritório é especificado espacialmente (“here”, “this site”), o espaço global não o é. Este é marcado
lingüisticamente, não somente pelo tempo verbal, mas também pelo “você” genérico.
Pode, então, concluir que a representação dos espaço-tempos não podem se reduzir a
representação do tempo e espaço e também que as espaço-temporalidades estão ligadas com relações
sociais e identidades sociais específicas.
O movimento entre espaço-tempo local do escritório e o espaço-tempo da mediação reincidem
por todo o texto. Pode-se observar que o gerente usa dos fatos ocorridos em sua empresa, para fazer
avaliações e inferências. Estas são o motivo que faz com que o sistema dos especialistas em relação
questão local da vida social. A análise textual pode mostrar como as relações comumente organizadas,
mantidas e reproduzidas textualmente e na fala.

A construção do espaço tempo no Exemplo 4 é diferente:

1- Mas a (globalização) é um processo que requer muito e quase sempre um


processo que traz vários problemas.
2- O progresso econômico sempre veio acompanhado pela destruição de atividades
ultrapassadas e a criação de novas.
3- O ritmo está mais acelerado e os fatos tomam proporções planetárias.
4- Impõe-se a todos os países ajustes rápidos e profundos – incluindo os países
europeus, onde a civilização industrial nasceu.
5- A coesão social é ameaçada por sentimento generalizado de intranqüilidade
desigualdade e polarização.
6- Existe um risco de divergências entre os sonhos e aspirações do povo e a demanda
da economia global.
7- E ainda a coesão social não é somente um objetivo social e político de grande
valia, mas também é uma fonte de eficiência e de adaptabilidade em uma
economia que tem como base o conhecimento e que depende cada vez mais das
habilidades humanas e da capacidade de trabalho em grupo.
8- Mais que nunca, os governos, sindicatos e empregadores devem trabalhar
conjuntamente para descrever os riscos e evitar erros, para ressaltar que os países
devem ter grandes ambições e que estas podem se tornar realidade e para
implementar as mudanças necessárias consistentemente e sem atrasos.
146
9- Caso mudanças rápidas e conscientes não ocorram, haverá perda de recursos
tanto humanos quanto de capitais, a qual pode afetar partes promissoras do mundo
se a Europa não der oportunidades tão atrativas.

A questão da relação entre o espaço-tempo local e o global está presente novamente, embora
deixe claro que a questão do local de local é relativa – o local aqui é na verdade regional. A palavra
“Europa” é usada para se referir a União Européia, forma usual, porém discutível. O tempo-espaço
global é o da globalização. Tem-se novamente o tempo presente para se referir a um espaço de tempo
não delimitado (períodos 5, 6 e 7) combinando especificações (all countries, widespread, global, in a
knowledge-based economy), que acentuam a universalidade da globalização e suas conseqüências. O
“present perfect” e o advérbio “sempre” no período 2, acentuam a universalidade temporal das
conseqüências do progresso econômico e os verbos no present perfect no período 3 evidenciam que a
globalização ocorre dentro de um processo de mudança temporal e espacial (“cada vez mais” e “mais
que nunca” nos períodos 7 e 8 também representam essa mudança).
A relação entre o espaço-tempo global o espaço-tempo europeu é que o último encontra-se
dentro do primeiro. O espaço tempo global é construído de forma real numa seqüência de afirmações
factuais, que dão base à construção do espaço-tempo europeu nos períodos 8 e 9 como um espaço-tempo
projetado e imaginário no domínio da política. A modalidade é significante o espaço-tempo global é o
domínio do que é enquanto o global é o do que deve ser. Entretanto essa forma de obrigação geralmente
está implícita. No período 8, observa-se “it is the duty of governments…” como um equivalente
metafórico de “governments must “. O período 9 é uma previsão (tempo futuro), mas levanta
pressupostos que são normas. Esse tipo de relação entre o global é e o regional ou nacional deve está
presente nos textos que se referem à globalização.
147

Resumo
De acordo com seus significados representacionais e de como são apresentados gramaticalmente e lexicalmente,
percebemos que os períodos têm três elementos principais: processos participantes e circunstâncias. Quando
vemos que elas representam eventos sociais, podemos analisar os elementos dos eventos sociais que são incluídos
e os que são excluídos e aos quais é dada maior importância. Também podemos analisá-los tendo por base como
os eventos sociais são representados: se de forma concreta ou abstrata e qual o nível de generalização presente no
mesmo.
Podemos ligar essas distinções com o ponto de vista que considera a representação como recontextualização e
com que considera que as redes de práticas sociais específicas e seus gêneros relacionados têm princípios de
recontextualização específicos, que tendem a favorecer certas inclusões, exclusões, certo grau de concretização ou
abstração /generalização, bem como modos característicos de organizar, explicar, legitimar avaliar os fatos.
Logo, por exemplo, os gêneros de governança têm uma tendência previsível de como representarão os eventos por
meio de generalização e abstração. Pode-se observar a existência de seis tipos diferentes de Processo (material,
verbal, mental, dois tipos diferentes de relacional e existencial), sendo que eles podem ser representados de forma
congruente ou metafórica por diferentes tipos de processo ou por meio da nominalização dos processos.
A representação dos agentes sociais (participantes) está ligada a um número de escolhas a serem feitas. Aí se
incluem as noções de: ativo e passivo, pessoal e impessoal, nome ou classificação, específico e genérico, bem
como as de exclusão ou inclusão, também a do uso de pronomes em detrimento de substantivos. Essas escolhas
têm um significado social, no que diz respeito, por exemplo, a representação da agência.
Finalmente, foram discutidas as representações de tempo e de espaço (circunstâncias) e as de espaço
(circunstâncias), levando em consideração que a análise de espaço-tempos de Harvey pode ser realizada na análise
textual quando se considera esta noção e suas relações estão comumente presente nos textos.
148
9. ESTILOS

Assuntos das análises de textos


Estilos: níveis de abstração
Dialogicidade
Realizações lingüísticas de estilos

Assuntos sociais de pesquisas


Identidade social e identidade pessoal (personalidade)
Agência
“Personagens” sociais
Espaço público

Estilos são o aspecto discursivo das formas de ser, identidades. Quem você é, é parte de uma
questão de como você fala, como você escreve, assim como é uma questão de incorporação – como você
olha, a forma de parar, como se move, e assim por diante. Estilos estão ligados à identificação – usando
a nominalização mais do que o substantivo ‘identidades’, enfatiza-se o processo de identificação, como
as pessoas se identificam e são identificadas pelas outras. E eu tenho usado o termo identificação para
um dos três principais tipos de significado em textos. O processo de identificação é até certo grau um
processo textual, e, apesar de Estilos/Identificação não estarem separados de Discursos/Representação
ou Gêneros/Ação (sua relação está na dialética contrária – veja Capítulo 2 e abaixo), é diferente, e nós
precisamos fazer uma distinção analítica entre eles.
No que diz respeito ao processo de identificação envolver efeitos constitutivos do discurso, ele
deve ser visto como um processo dialético no qual discursos são inculcados em identidades (ver
Capítulo 2). Um senso prático desse processo está evidente num memorando no qual Philip Gould, um
dos conselheiros-chave de Tony Blair, produziu (Consolidando a identidade de Blair), quando Blair
tornou-se líder do partido trabalhista em 1994. “O que ele deve fazer é se basear em suas forças e
construir uma identidade como um político que é consistente com as posições políticas que adota. Ele
deve ser um político completo, coerente, que sempre soa verdadeiro”. Nos termos que estou usando, um
pode interpretar isto dizendo que Blair precisa inculcar dentro de seu modo de ser aspectos do discurso
político do Partido Trabalhista (o Terceiro Modo), especialmente este discurso como um imaginário,
como uma visão da sociedade (Fairclough 2000b). Uma conseqüência dessa visão dialética é que os
sentidos de identificação (assim como os sentidos acionais) nos textos podem ser vistos como sentidos
representacionais pressupostos, as suposições nas quais as pessoas identificam-se segundo o que elas
149
fazem (então no caso de Blair, estas incluiriam imaginários do que o governo deveria ser, o que a
liderança deveria ser, e assim por diante).

Identidade Social e Identidade Pessoal (Personalidade)


A identificação é um processo complexo. Parte dessa complexidade provém do fato de a
distinção precisar ser traçada entre os aspectos pessoais e sociais da identidade – identidade social e
personalidade. A identidade não pode ser reduzida à identidade social, que parte significa que a
identificação não é um processo puramente textual, não somente uma questão de língua. A recente teoria
pós-estruturalista e pós-moderna associou intimamente identidade com discurso, e identidade (ou
“tema”) é freqüentemente referido como sendo um efeito do discurso, construído no discurso. Tem
alguma verdade nisso, mas somente alguma. É parte problemática porque as pessoas não são somente
pré-posicionadas em como participam nos eventos sociais e textos, elas são também agentes sociais que
fazem coisas, criam coisas, mudam coisas (ver Capítulo 2). É também problemática porque falha em
reconhecer a importância de nossa incorporação, nosso engajamento prático com o mundo, que começa
antes mesmo de as crianças aprenderem línguas e continua através de nossas vidas, em processos de
identificação, especialmente na formação da “consciência de si”, um senso contínuo do self (Archer
2000). Consciência de si é uma pré-condição para os processos sociais de identificação no discurso e em
textos.
Distinções são também necessárias, de qualquer modo, dentro da identidade social, que conduz a
uma elaboração do conceito de agência (ver estrutura e agência no Glossário de termos-chave). Devo
seguir Archer (2000) aqui. Pessoas são posicionadas involuntariamente como Agentes Primários por
causa do que são ao nascer, sobre o que inicialmente não têm escolha – camponês ou nobre, classe
operária ou classe média, macho ou fêmea, suas posições dentro da distribuição social de recursos, como
Archer coloca. Poucas pessoas nas sociedades contemporâneas permanecem dentro dos limites dessas
posições, mas suas capacidades para transformá-las dependem de sua reflexividade e de sua capacidade
de tornarem-se Agentes Corporativos capazes de ações coletivas e formação de mudança social. Atingir
identidade social em um sentido amplo é uma questão de ser capaz de assumir papéis sociais, mas
personificando-os, investindo-os de sua própria personalidade (ou identidade pessoal), desempenhando-
os de modo diferenciado. O desenvolvimento completo das pessoas como agentes sociais está
dialeticamente interconectado com o desenvolvimento completo de suas personalidades, nenhum dos
quais é garantido. Vir a ser uma personalidade é uma questão de ser capaz de formular os interesses
primário e conclusivo de alguém, e balancear e priorizar esses papéis sociais em seus próprios termos. É
150
claro, isso é em si um processo socialmente restrito – parte da dialética entre identidade social e
identidade pessoal ou personalidade, a qual o formador restringe posteriormente.
É claro, a identidade social de uma pessoa inclui papéis sociais diversos, ainda que isso seja
duvidoso, se esta “teoria de papéis”, um meio de definir isso, possa ter força de segurar adequadamente
a complexidade interna e heterogeneidade da identidade social, que tem sido o principal tema na teoria
pós-estruturalista.

Níveis de Abstração
A discussão sobre abstração no Capítulo 7, o capítulo sobre discursos, transfere o foco para os
Estilos. Mas nesse caso, precisamos levar em conta a dialética da identidade social e personalidade
discutidas acima. Macintyre (1984) sugeriu que a parte significante do que faz uma cultura ser distinta é
seu estoque de “personagens”, suas identidades culturalmente mais notáveis. Ele deu exemplos
contemporâneos do Gerente e do Terapeuta. Esses “personagens” são vistos para existir em um nível
muito mais alto de abstração e generalização, eles têm uma considerável continuidade através do tempo
(se as maiores mudanças sociais acarretam em mudanças no estoque de “personagens”), eles estão
completamente infiltrados na vida social. Identificar os “personagens” do novo capitalismo e traçar
processos textuais de identificação desses “personagens” é um assunto ao qual devo dedicar-me abaixo.
Mas claramente há vários estilos de ser um Gerente ou um Terapeuta, em um nível menos abstrato. E no
nível concreto de eventos sociais, um precisa recorrer à pergunta de Archer sobre como as
personalidades, ou identidades pessoais, investem o “personagem” do Gerente, Terapeuta, Político, etc.
de formas distintas – Blair, por excelência, pode ser de algumas maneiras um político moderno típico,
mas ele é também um político moderno diferenciado cuja personalidade tem investido o papel de líder
político de uma forma distintiva.

Estilos e Textos
Deixe-me traçar algumas implicações do exposto acima para a análise de textos. Primeiro,
agência como uma força casual (Capítulo 2) em eventos moldadores e textos não é diferenciada – a
efetividade da agência depende tanto da natureza do evento quanto de sua relação com as práticas
sociais e estruturas sociais, e as capacidades do agente. Segundo, há implicações para o diálogo e para a
diferença social (ver Capítulo 3). Alguém pode dizer que o diálogo em seu sentido mais rico é a
comunicação entre pessoas como agentes sociais e como personalidades. Uma pergunta que pode ser
151
feita em análise textual é o que leva as pessoas a dirigirem-se umas as outras nessas bases, e o que
leva a crer na existência de mutualidade e simetria entre aqueles co-envolvidos em eventos sociais, ou
reciprocamente estende a considerações de estratégia comunicativa (ver Capítulo 4) resulta na redução
da diferença da outra e em uma falta de dialogicidade. Por excelência, nós podemos ligar isto a questões
de cidadania e esfera pública (Fairclough, 1999; Touraine, 1997): cidadania efetiva e espaço público
efetivo (o diálogo dos cidadãos reside em interesse social) dependem, um pode argumentar, sobre o
diálogo nesse sentido rico. Terceiro, a identificação em textos é tanto uma questão de individualidade e
coletividade, um “Eu” e um “Nós”, ou melhor um potencialmente múltiplo “Eu” (plural) e/ou “Nós”(s).
Por excelência, Tony Blair, no Exemplo 5 (Eu discuti este exemplo em detalhes no Capítulo 10), como
um membro de um inclusivo “nós” – comunidade (esses, por excelência, quem “sente-se impotente” em
confronto com a globalização), um exclusivo “nós” – comunidade (“nós”, a Aliança contra o
Terrorismo), e como um individual, um “eu”, ou pode-se dizer mais que um “eu” (o “eu” que “realiza
por que as pessoas protestam contra a globalização” talvez não seja o mesmo “eu” como um que resulta
em ultimato para o Talebã).

Características de Estilos
Estilos são realizados em uma série de aspectos lingüísticos. Primeiro, aspectos fonológicos:
pronúncia, entonação, acento tônico, ritmo. Segundo, vocabulário e metáfora – uma área de vocabulário
que varia com a identificação é a que intensifica advérbios como “pavorosamente”, “terrivelmente”,
“espantosamente”, e assim por diante, assim como palavras de insulto que funcionam de uma forma
similar (“ensangüentado”, “irritante”, etc.). Mensagens tanto sobre identidade social como (e.g. classe
social) personalidade são conduzidas pelas variáveis seleções feitas pelas pessoas de palavras desse tipo
(incluindo se e quanto, e como obscenamente, elas praguejam). Estilo também envolve uma interação
entre língua e “linguagem corporal” – por excelência, a identidade de Tony Blair como político é parte
de uma questão de suas expressões faciais, seu gestual, sua postura, e assim por diante – assim como,
por exemplo, seu estilo de cabelo e vestimenta. Até que ponto se deve incluir tais coisas dentro do
discurso, ou linguagem, é uma questão controversa. “Linguagem corporal” é baseada na materialidade
física dos corpos, ainda que isso seja claramente “semiotizado” no sentido de vários gestos
relativamente terem significados estáveis. Mas então, toda sorte de aspectos do mundo material pode ser
“semiotizado”, incluindo paisagens, construções, e assim por diante. Esta não é a razão para reduzi-las à
linguagem ou discurso, mas para reconhecer a natureza dialética da relação entre discurso e mundo não-
discursivo. Mais tarde isso “internaliza” o formador (Harvey 1996a).
152

No próximo capítulo, eu devo focar alguns aspectos do significado textual que contribui para a
identificação, centralmente ao redor das categorias de modalidade e avaliação. Devo ver tanto em termos
de cometimentos que as pessoas fazem em seus textos e falar quais contribuem para identificação –
cometimentos com a verdade, com a obrigação moral, com a necessidade, com valores. Devo também
discutir pronomes, vistos como incorporados dentro de uma larga visão da modalidade, os quais são de
uma significância óbvia aqui (e.g. se textos incluem pronomes pessoais, e nesse caso – “eu”, “nós”,
“você” genérico, etc.).

Resumo

Neste breve capítulo nós discutimos Estilos como analiticamente


distintos, apesar de dialeticamente interconectados com Gêneros e
Discursos.
Também apresentei uma visão dialética da relação entre identidade
social e personalidade e argumentei que Estilos podem ser
identificados em diferentes níveis de abstração como Gêneros e
Discursos.
Apesar de nesse caso dos Estilos esses níveis de abstração serem
relacionados às formas de como as personalidades investem
identidades sociais e papéis sociais. Nós discutimos formas nas quais
as complexidades teóricas de identidade podem ser focadas mais
concretamente em análise textual.
Finalmente lançamos um olhar em algumas variações de realizações
lingüísticas de diferenças em Estilos.

10. MODALIDADE E AVALIAÇÃO

Tópicos em análise textual


Modalidade
Avaliação
Pronomes pessoais

Tópicos em pesquisa social


“Personagens” do novo capitalismo
153
Heterogeneidade da identidade social
Informalização de identidades públicas
Identidade social e personalidade
Esteticização de identidades públicas
A esfera pública, os cidadãos e os especialistas.

Este capítulo prosseguirá a discussão sobre identificação em textos, focando a modalidade e a


avaliação. Apesar de tal foco, outras características relevantes à identificação serão igualmente
discutidas quando relacionadas a questões de pesquisa social. Tanto a modalidade como a avaliação
serão vistas em termos do que os autores consideram real, verdadeiro ou necessário (modalidade), e com
respeito ao que é bom ou ruim, desejável ou não (avaliação). No presente livro, tem-se que o modo
como as pessoas se expressam nos textos é uma parte importante da maneira como elas se identificam,
ou seja, a estruturação de identidades.
Os tópicos de pesquisa social apresentados neste capítulo incluem, em primeiro lugar, as
questões dos “personagens” significativos do novo capitalismo no sentido dado por MacIntyre (1984 –
veja a discussão no capítulo 9), em termos de como as pessoas se identificam nos textos. Será feito o
contraste entre o “político” (representado por Tony Blair, exemplo 5, apêndice, páginas 237-8) e o
“gerente”, ou melhor, “guru de gerenciamento” (Rosabeth Moss Kanter, exemplo 9, apêndice, páginas
244-5). O segundo tópico refere-se ao modo como as pessoas abordam a heterogeneidade da identidade
social a partir de uma perspectiva analítica de um texto. Além disso, essa problemática será tratada como
os “vários Tony Blairs” que se podem identificar. (Fairclough, 2000b). Isso incluirá a questão da
informalização da sociedade nas identidades públicas, a tensão enfrentada por políticos, por exemplo,
em serem pessoas “comuns” (Sennett 1974) ou serem de várias formas figuras de autoridade pública
extraordinárias. O terceiro tópico refere-se à relação entre a identidade social e a personalidade –
discutida no capítulo 9 – e a questão de como a análise textual pode contribuir para a pesquisa de tal
assunto. O quarto tópico trata da esteticização de identidades (Chouliaraki e Fairclough, 1999; Harvey,
1990), especialmente na área pública, que é em parte refletida na grande preocupação com a “imagem”.
O quinto e último tópico refere-se à esfera pública e à “cidadania”, ao modo como as pessoas se
identificam como cidadãos na sociedade contemporânea, em especial em relação aos vários tipos de
“especialistas”.

Modalidade
154

No capitulo 6 foi feita a distinção entre as quatro principais funções do discurso; duas associadas
com as trocas de conhecimento (declarações, perguntas) e duas associadas com as trocas de atividades
(procura, oferta). A questão da modalidade pode ser vista como a questão de como as pessoas se
envolvem quando fazem declarações, perguntas, ofertas ou procuras. O ponto é que existem diversas
formas de fazer cada uma das acima citadas com diferentes níveis de envolvimento. Essa diferença é
mais óbvia com as declarações, portanto serão as primeiras a ser identificadas.. Para ilustrar isso, no
exemplo 9, a autora faz declarações sobre o que torna uma empresa eletrônica bem-sucedida, que inclui
“as empresas que são bem-sucedidas na web funcionam de forma diferente das suas concorrentes
obsoletas”. A autora poderia ter escrito: “as empresas que são bem-sucedidas na web parecem funcionar
de forma diferente das suas concorrentes obsoletas”, “as empresas que são bem-sucedidas na web
geralmente funcionam de forma diferente das suas concorrentes obsoletas” ou “as empresas que são
bem-sucedidas na web podem funcionar de forma diferente das suas concorrentes obsoletas”. O que a
autora realmente escreveu a envolve na verdade da proposição mais do que qualquer das alternativas. As
diferenças entre as sentenças são diferenças na modalidade.

Segundo Halliday (1994), “a modalidade é o julgamento do falante quanto às probabilidades ou


obrigações concernentes ao que ele diz”. De acordo com Verschueren (1999), “a modalidade (...)
envolve as várias formas nas quais as atitudes podem ser expressas em relação ao conteúdo “puro” de
referência-e-asserção de uma elocução, destacando os fatos, os graus de certeza ou dúvida, as
incertezas, possibilidades, necessidades e até as permissões ou obrigações”. Hodge e Kress (1988) fazem
referência à “posição” adotada por quem fala ou escreve em relação às representações, aos níveis de
“afinidade” que eles têm com as mesmas. Todas essas formulações, bem como a presente nesse livro,
tem a modalidade como uma relação entre o falante e o escritor – ou “autor” – e as representações.

Não se está sugerindo aqui que esta seja uma relação “privada” entre o eu racional e o mundo. A
modalidade é importante na estruturação de identidades (tanto nas pessoais – personalidades – como nas
sociais), no sentido que aquilo com o que uma pessoa se envolve é parte significativa do que ela é – logo
as escolhas de modalidade nos textos podem ser vistas como parte do processo de estruturação da
própria identidade. Isso, no entanto, prossegue no decorrer dos processos sociais, já que o processo de
identificação é inevitavelmente transformado pelo processo de relação social. Voltando à sentença do
exemplo 9, ao escrever “as empresas que são bem-sucedidas na web funcionam de forma diferente das
suas concorrentes obsoletas”, Kanter não estabelece apenas um forte comprometimento com a verdade
da proposição. Ela o faz como um guru de gerenciamento internacionalmente conhecido, fornecendo
informação de grande autoridade acerca do e-bussiness para gerentes que lêem seu livro e seguem suas
155
diretrizes para possíveis mudanças. A estruturação de identidades está amplamente relacionada à
organização de relações sociais.

Como sugerido no capítulo 2, os três maiores aspectos do significado em textos (ação,


representação e identificação) são relacionados dialeticamente, o que é particularmente visível no caso
da modalidade. A forma como uma pessoa representa o mundo, aquilo com o que ela se compromete
(por exemplo, o grau de envolvimento com a verdade) é parte de como ela se identifica, necessariamente
em relação ao outro com quem interage. Em outras palavras, as identidades são relacionais: quem uma
pessoa é constitui uma questão de como uma pessoa se relaciona com o mundo e com outras pessoas.
Pode-se ver a identidade do “guru” (uma forma específica do “personagem” do especialista) sendo
construída no texto de Kanter, em parte por meio das escolhas de modalidade, mas esta é uma
identidade-em-relação – em relação ao mundo de negócios representado, e aos gerentes e executivos
mencionados. Isso significa que as escolhas na modalidade são significantes não apenas em termos de
identificação, mas também em relação à ação (e as relações sociais da ação) e à representação.
Inicialmente, a modalidade pode ser vista como relacionada com os “comprometimentos”, “atitudes”,
“julgamentos”, “posturas” e conseqüentemente com a identificação (por isso ela foi abordada nesse
capítulo do livro), mas também se relaciona com a ação e relações sociais, e com a representação. O
mesmo ocorre com o modo, relacionado principalmente com os tipos de ação, funções de discurso e
tipos de troca (veja capítulo 6), mas os especialistas, que freqüentemente usam orações afirmativas para
fazer declarações se identificam de modo diferente dos especialistas que usam orações interrogativas
para fazer perguntas; logo o modo é também significativo para a identificação. Esse pode ser um aspecto
de contribuição para as diversas formas de ser um especialista. No caso da modalidade, essa propriedade
dialética das escolhas textuais significa que, por exemplo, uma escolha de modalidade com intuito de
evitar um forte envolvimento com a verdade (como ao dizer “ele deve estar lá”, quando já se sabe que
ele está lá ou não) pode ser motivada principalmente pelas relações sociais da ação, talvez como uma
forma de discrição – embora essa seja por si só uma “mensagem” acerca da identidade de uma pessoa.

Os tópicos de pesquisa social e as transformações do novo capitalismo podem ser abordados por
meio da análise de que existem limites sociais na modalidade que vão além das relações sociais de
certos textos ou conversas. Podemos perguntar: quem é capaz de se comprometer fortemente com a
verdade deste ou daquele aspecto do mundo? As previsões são um bom exemplo: quem é capaz de se
envolver fortemente em relação ao que vai acontecer? Certamente qualquer pessoa pode fazer previsões,
mas a questão é: quem tem o poder socialmente garantido de previsão? E quem se identifica em parte
por meio do exercício da previsão? Um grupo que de fato apresenta tal poder são os gurus do
gerenciamento – embora não existam exemplos no excerto 9. Outro grupo são os políticos e
156
governantes. Existem poucas previsões no exemplo 11, o excerto do jornal governamental britânico
“Learning Age” - por exemplo, “A revolução do século 21 baseada no conhecimento e na informação
terá uma fundação bastante diferente – estará centrada nos investimentos no intelectual e na criatividade
das pessoas”. Há um nome para tal tipo de previsão – “futurologia”. O poder de previsão futurológica é
significativo, pois as prescrições sobre o que as pessoas devem ou não fazer podem ser – e realmente o
são atualmente - legitimadas em relação a essas previsões sobre o futuro. Outro grupo com poder de
previsão talvez seja o clero, embora essa seja uma questão de certa forma diferente.

Tipos de troca, funções do discurso e tipos de modalidade

No início do capitulo, estabeleci uma relação entre modalidade, tipos de troca e funções do
discurso. De fato, existem diferentes tipos de modalidade que podem ser associados a diferentes tipos de
troca e funções de discurso. Em suma:

 Troca de conhecimentos (modalidade "epistêmica")


Declarações: envolvimento do "autor" com a verdade.
Afirmação: A janela está aberta.
Modalização : A janela pode estar aberta.
Negação: A janela não está aberta.

Perguntas: o autor deduz o envolvimento de outra pessoa com a verdade.


Perguntas positivas não-modalizadas: A janela está aberta?
Perguntas modalizadas: A janela poderia estar aberta?
Perguntas negativas não-modalizadas: Não está a janela aberta?

 Troca de atividade (modalidade "deôntica")


Procura: envolvimento do "autor" obrigação/necessidade.
Ordem: Abra a janela!
Modalização: Você poderia abrir a janela.
Proibição: Não abra a janela!
Oferta: envolvimento do "autor" com a ação.
Garantia: Eu vou abrir a janela.
157
Oferta modalizada: Eu devo abrir a janela.
Recusa: Eu não vou abrir a janela.

Algo a se notar aqui é o fato de que a visão da modalidade vai além dos casos explícitos de
modalização, isto é, além dos casos nos quais há um marcador explícito de modalidade. Os marcadores
típicos da modalidade são os "verbos modais" (ou de ligação - poder, parecer, dever, estar, etc.) embora
existam de fato várias outras formas nas quais a modalidade pode ser marcada. Entretanto, no caso das
declarações, as situações modalizadas são apresentadas como entre afirmações ou negações, as quais são
geralmente expressas como declarações positivas (por exemplo, "o conflito é visto como criativo") ou
negativas ("o conflito não é visto como criativo"), sem verbos modais (ou de ligação) e outros
marcadores. Tudo isso está incluído na ampla categoria da modalidade. A base lógica de tal processo é
de certa forma óbvia: em relação a envolvimento quanto a verdade, "o conflito pode ser visto como
criativo" ou "o conflito deveria ser visto como criativo" estão entre a afirmação e a negação. No caso das
procuras, as formas modalizadas (por exemplo, "você poderia abrir a janela" e "você deve abrir a
janela") são vistas como intermediárias entre as ordens (por exemplo "abra a janela!", tipicamente
representadas como orações imperativas positivas), e as proibições (como "não abra a janela!",
tipicamente representadas como orações imperativas negativas). As perguntas são vistas como uma
forma de o autor deduzir o cometimento de outros quanto à verdade.
O campo das modalidades mais uma vez inclui as perguntas não-modalizadas ("a janela está
aberta?", "não está a janela aberta?") bem como perguntas modalizadas ("estaria a janela aberta?"). De
fato, o mesmo ocorre com as ofertas.
A modalidade é um aspecto bastante complexo do significado, e a estrutura acima exclui a maior
parte de sua complexidade. Para ilustrar isso, as procuras podem ser representadas por "perguntas-
pedido" (orações interrogativas quanto ao seu modo gramatical - por exemplo, "você vai abrir a
janela?") e possuem a forma de perguntas modalizadas. Existem ainda distinções quanto ao tempo
verbal ("pode", "poderia", "será", "seria") que incluem a distinção entre o hipotético e o não-hipotético
(por exemplo, "eu vou abrir a janela" e "eu abriria a janela se você pedisse").
No pequeno diálogo a seguir (usado no capítulo 6 com relação ao modo gramatical), as
expressões relevantes com relação à marcação da modalidade estão sublinhadas:

Max: Aqui temos algumas questões de fácil resposta para um programa de rádio feito por nós. A primeira das questões é O
que você diria que é a língua?
Mulher: Língua... bem, é o diálogo que as pessoas têm dentro dos vários países.
Max: Bom. E... o que você diria que a faz compreensível?
158
Mulher: (pausa, 8 segundos) Ela é compreensível pelo (entonação de confusão)...
Max: Humm.
Mulher: Bem, eu não sei se se pode dizer o que faz isso... é uma expressão pessoal, eu acho que é, não é?
Max: Eu não tenho as respostas, eu só tenho as perguntas (rindo).
Mulher: (Simultaneamente, dando risadas).
Sid: Mas isso não é mau.
Mulher: Bem, é uma expressão, deveria ser uma expressão pessoal, não deveria?
Sid: É uma boa resposta.
Max: Muito obrigado.

(Hodge e Kress, 1998, p. 125)

No caso acima, a modalidade é epistêmica, apresentando as funções do discurso relativas à


pergunta. A primeira coisa a se notar é a forma como o entrevistador faz suas perguntas. Ao invés de
perguntar "o que é língua?" e "o que a torna compreensível?", ele pergunta "o que você diria que a faz
compreensível?". A modalidade hipotética ("você diria") é usada de forma a tornar as perguntas mais
experimentais, como se o entrevistador estivesse fazendo hipóteses para fazer as perguntas ao invés de
realmente fazê-las ("se eu te perguntasse o que é língua, o que você diria"). Isso talvez ocorre devido à
distância social entre o entrevistador, jovem e homem, e a entrevistada, mais velha e mulher. A primeira
resposta da mulher é uma afirmação ("é o diálogo que as pessoas têm dentro dos vários países"), mas sua
resposta à segunda pergunta é mais complexa em relação à modalidade. Primeiramente ela faz um
comentário acerca da questão usando uma modalidade hipotética, marcada por uma oração de processo
mental ("Não sei" - veja capítulo 8) e dando uma marcação subjetiva à modalidade. Em outras palavras,
isso salienta de forma explícita o envolvimento de quem fala. Tal sentença poderia ter sido estruturada
apenas como um verbo modal de hipótese negativa ("não se diria"). A resposta começa com uma
afirmação aparente, mas depois é subjetivamente modalizada ("eu acho") e então transformada em uma
pergunta ("não é"). Assim, há uma mistura entre se fazer o cometimento real e a dedução de tal
comprometimento, o último tornando o primeiro mais fraco. A resposta de Max consiste em uma
negação ("eu não tenho as respostas"), seguida por uma afirmação ("eu só tenho as perguntas"), sendo
que as duas contribuições de Sid são duas afirmações. As duas últimas participações da mulher mostram
mudanças de uma afirmação categórica - de "é uma expressão" para uma modalidade hipotética "deveria
ser uma expressão pessoal" e novamente para uma pergunta ("não deveria?"). Tais marcações de
modalidade podem ser vistas como uma resistência da parte da mulher a se comprometer fortemente
com as reivindicações pela verdade. Os leitores podem desejar comparar tais pontos como a análise mais
aprofundada de Hodge e Kress (1988: 125 - 7).
159

Níveis de envolvimento

Nas orações modalizadas, sejam elas epistêmicas ou deônticas, é possível fazer, de um lado, a
distinção entre os diferentes níveis ou graus de envolvimento com a verdade; de outro, com a obrigação
e a necessidade. (Halliday 1994):

___________________________________________________________
Verdade Obrigação
___________________________________________________________
alta certamente necessária
média provavelmente esperada
baixa possivelmente permitida
___________________________________________________________

Os exemplos aqui apresentados são "advérbios modais" ("certamente" etc.) no caso da


modalidade epistemológica, e "adjetivos participiais" ("necessária" etc.) no caso de modalidade
deôntica. Entretanto, parte da diversidade dos verbos modais está no fato de que alguns apresentam grau
de envolvimento mais alto que outros. No âmbito da modalidade epistemológica, é possível comparar:
"ele certamente abriu a janela", "ele provavelmente abriu a janela", "ele possivelmente a janela", "ele
deve ter aberto a janela", “ele terá aberto a janela”, “ele pode ter aberto a janela”. No âmbito da
modalidade deôntica, temos: "é necessário que você abra a janela", "espera-se que você abra a janela",
"é permitido que você abra a janela", "você deveria abrir a janela", "você pode abrir a janela".

Marcadores de modalização
Alguns tipos de marcadores de modalização já foram indicados no livro. Tais marcadores
incluem principalmente os verbos modais, mas também podem conter, como já mostrado, advérbios de
modalidade como "certamente", adjetivos participiais como "necessário", orações de processos mentais
160
como "eu acho", por exemplo. De fato, é possível ter uma visão abrangente do que pode marcar a
modalização - Hodge e Kress (1988) apresentam mais temas do que a maioria da literatura sobre
modalidade. Em correspondência aos advérbios modais, existem também os adjetivos modais como
"possível" ou "provável", que aparecem modalizando orações como "é possível" (por exemplo, “é
possível que ele abra a janela"). Existem vários verbos além dos modais que podem ser vistos como
marcadores de modalização, entre eles os verbos relacionados à aparência ("parecer", por exemplo - "ele
parece ter fechado a janela"). Outros tipos de advérbios também podem ser marcadores (por exemplo,
"de fato", "evidentemente"), incluindo, também, advérbios como "geralmente", "normalmente" e
"sempre", os quais marcam o que Halliday distingue como uma modalidade separada de "costume"
(1994).
Além de tais casos, pode-se ainda incluir - assim como fazem Hodges e Kress - "limites" como
"meio que" ou "por assim dizer" (por exemplo, em "eles estão meio que olhando para você, Ben",
proveniente do exemplo 10). A entonação e outros aspectos da pronúncia também são relevantes para o
grau de envolvimento do falante - se ele fala em um tom hesitante, confiante ou agressivo. Também é
impossível a inclusão do discurso indireto - a atribuição de uma declaração a outros é uma forma de
diminuir o envolvimento de uma pessoa quanto a ela (por exemplo, "me disseram que eles estão
procurando por você, Ben").
O tipo de envolvimento de um autor – e, conseqüentemente, a forma como ele se identifica -
também depende da interseção entre modalidade e outras categorias nas orações. Tais categorias
incluem as funções do discurso e o modo gramatical - já foi mencionado nesse capítulo que a
modalidade é diferente, por exemplo, em declarações e perguntas. Além disso, incluem "pessoas": a
diferença entre as modalidades que apresentam marcas subjetivas (por exemplo, "eu acho que a janela
está aberta") e aquelas que não as apresentam (como "a janela está aberta") baseia-se no fato de que as
modalidades com marcas subjetivas são declarações em "primeira pessoa" ao passo que as que não
apresentam tais marcas são declarações em "terceira pessoa". As declarações em primeira pessoa
também podem estar no plural (por exemplo, "não desistiremos" no exemplo 5). Assim como o "poder
de previsão", o poder de fazer declarações em nome de outras pessoas, ou de fato em nome de "todos
nós" (como quando Tony Blair fala "nós nos sentimos impotentes", no mesmo texto) é um poder que
apresenta uma distribuição social desigual e que é importante para a identificação. Outra categoria que
tem relação com a modalidade refere-se aos tipos de processo (veja capítulo 8). Para ilustrar tal fato, isso
ocorre ao se fazerem fortes reivindicações de verdade acerca do processo mental de outras pessoas (por
exemplo, o gerente no exemplo 1, ao falar das pessoas em Liverpool: "eles têm receio de qualquer
mudança") também está assumindo um poder importante para a identificação.
161

Avaliação e valores
O termo "avaliação" será aqui usado em um sentido mais geral para incluir não só os tipos de
declarações chamados de "avaliações", no capítulo 6, mas também outras formas, de certo modo mais ou
menos implícitas ou explícitas, por meio das quais os autores se expressam em termos de valores (veja
Graham, 2002; Hunston e Thompson, 2000, Lemke 1998, Martin 2000, White 2001, no prelo). A
seguinte distinção de categorias pode ser feita:

Declarações com juízo de valor ("avaliações" no capítulo 6)


Declarações com modalidades deônticas
Declarações com verbos de processos mentais afetivos
Pressuposições de valor

Declarações com juízo de valor


No capítulo 6, foi feita a distinção entre os diferentes tipos de declarações: declarações de fato
(períodos realis) previsões e declarações hipotéticas (ambos irrealis) e avaliações com juízo de valor.
Estas são declarações que exprimem o que se deseja ou não, o que é bom e o que é ruim (por exemplo,
“este é um bom livro”, “este é um livro ruim”, “este livro é maravilhoso” e “este livro é horrível”).
As declarações com juízo de valor estão sobre a forma de processos relacionais nos casos mais
óbvios (o tipo relacional 1 explicado no capítulo 8). Nestes casos, o elemento de juízo de valor está no
atributo, que pode ser um adjetivo (bom) ou um sintagma nominal (um livro ruim). Entretanto, tais
declarações podem se apresentar como outros tipos de processos, nos quais o elemento de juízo de valor
é o verbo: ao invés de dizer “ele é um covarde” , diz-se “ele se acovardou”. Podem também estar sob a
forma de outros processos com o uso de advérbios (o autor escreveu o livro porcamente, o autor resumiu
seus argumentos maravilhosamente –processo material e verbal respectivamente). As exclamações, as
quais podem ser vistas como algo à parte ou como algo de menor relevância, são outras possibilidades
para as declarações com juízo de valor (“que livro maravilhoso!” ao invés de “este livro é
maravilhoso.”).
162
Já foi dito que as declarações com juízo de valor referem-se a algo que é desejado ou não.
Logo, palavras como “bom”, “ruim”, “maravilhoso”, “desejo” estão explícitas. Entretanto elas também
estão relacionadas à importância que se dá a algo, a sua utilidade e assim por diante (ver Lemke, 1998),
onde o desejo está explícito. Assim quando se fala que um livro é importante ou que ele não tem função,
conclui-se que ele é algo desejado ou não. Se analisarmos casos onde a transparência não é tão explícita,
tais declarações serão relativas, no que se refere ao discurso. Quando se diz , por exemplo, “ela é uma
comunista” , pode-se considerar que ela tem juízo de valor, mas somente para um tipo específico de
discurso. Outras palavras que figuram neste tipo de período, tais como “corajoso”, “covardemente”,
“honesto”, “desonesto”, têm significados complexos e possuem juízo de valor. Por exemplo, se
consideramos uma pessoa corajosa, ela seria uma pessoa capaz de encarar problemas; já uma pessoa
honesta é aquela que não mente, mas ambas refletem a figura de uma boa pessoa. Nesses casos, é difícil
imaginar esse tipo de palavra sendo usada sem uma intenção de julgamento, apesar de as mesmas não
terem a mesma conotação universalmente e de o significado das mesmas poder ser subvertido. Os
juízos de valor estão presentes em alguns sintagmas (“ este livro horrível custa uma fortuna “) e não em
um período inteiro. Quando se fala” este livro horrível “, remete-se imediatamente à frase ” este livro é
horrível “, que tem um juízo de valor.
A avaliação efetiva-se em uma “escala de intensidade” (White, 2001). Os adjetivos e advérbios
de juízo de valor, bem como os verbos referentes a processos mentais afetivos se mesclam em conjuntos
semânticos de termos que variam de uma baixa intensidade até uma alta intensidade. Por exemplo, “eu
gosto/amo/adoro este livro”, “este livro é bom/maravilhoso/
fantástico” , “isto foi escrito de forma ruim/porcamente”, ou ainda com outro tipo de verbo (“os
soldados mataram/massacraram/esquartejaram os moradores”).

Declarações com modalidade deôntica ou processos mentais

As declarações de modalidade deôntica (as de caráter de obrigação) estão ligadas às de juízo de


valor. Por exemplo, quando Tony Blair, no Exemplo 5, diz: “Os valores nos quais acreditamos devem
refletir nas nossas ações no Afeganistão”, ele quer dizer, de um modo geral, que agir com base em
valores é algo desejável, é uma boa coisa a ser feita.

Ainda há uma categoria de avaliações explicitas com processos mentais de apreço (“gosto deste
livro”, “detesto este livro”). Chamemo-las de avaliações de apreço. Elas são geralmente avaliações de
caráter pessoal. Entretanto podem se apresentar como processos relacionais onde o atributo é afetivo.
Compare: “este livro me fascina” e “este livro é fascinante”.
163

Valores pressupostos

Nesses casos transparentes, foi feita referência a valores implícitos ou pressupostos (ver
pressuposições no Glossário de termos-chave) Entretanto, foi reservada a categoria de valores
pressupostos para os casos que não possuem marcadores de avaliação claros (declarações de juízo de
valor, modalidades deônticas e verbos referentes a processos relacionais onde o atributo relaciona-se ao
afetado), onde os valores se encontram em uma esfera muito mais profunda no texto.

Se a metáfora da profundidade for utilizada, no primeiro nível abaixo estão as avaliações


levantadas por meio de palavras como “ajudar”, assim sendo, se escrevermos “este livro ajuda...”,
qualquer expressão que seguir “ajudar” será uma avaliação positiva (por exemplo, “... a clarear o debate
sobre globalização” ). No nível mais abaixo, estão os valores pressupostos, que não são levantados desta
forma e dependem da pressuposição de uma familiaridade com sistemas com sistemas de valores
implícitos compartilhada entre o autor e o receptor. Essa discussão já foi feita no capítulo 3 , por
exemplo, ao dizer que a coesão social é uma fonte de eficiência e adaptabilidade,mostra-se algo
desejado e relativo ao discurso neoliberal o qual considera a eficiência e a adaptabilidade bens
primários.

Os personagens do novo capitalismo: o Guru e o Político


A abordagem da questão dos personagens terá como base a comparação dos Exemplos 5 e 9 do
apêndice, no que se refere à modalidade e à avaliação. Estes textos foram escritos por representantes de
duas classes ascendentes no mundo contemporâneo: o político e o especialista (especificamente o de
gerenciamento, ou guru). No trecho a seguir retirado do Exemplo 5, as expressões significativas para a
modalidade foram sublinhadas, com foco nas orações principais e não nas subordinadas ou nos
sintagmas encaixados(o texto exemplificado consta na página 174).
Em termos de função do discurso, a maior parte deste trecho é constituída de declarações, mas
existe uma pergunta (“But what is the lesson of of the financial markets, climate change, internatinal
terrorism, nuclear proliferation or world trade?”) Ela é retórica, uma vez que Blair mesmo a responde,
mas desta forma parece que ele estabelece um diálogo ao invés de fazer um monólogo. Existe um
número considerável de perguntas deste tipo no discurso como um todo.
164
A maioria das declarações são declarações realis ou declarações de fato (“This is the politics
of globalization”), mas algumas são irrealis, hipotéticas( “If the Taliban regime changes) (a modalidade
destas sentenças não foi marcada) ou previsões ( “There will be Globaloization”) .Já foi dito acerca do
poder de previsão de Blair, ou pelo menos do que ele diz ter.
Começando com modalidade espistêmica, a maior parte das declarações são afirmações ou
negações. O único caso de modalização é “ there´s a risk that political leaders, faced with street
demonstrations, pander to the argument rather than answer it”. A expressão “there’s a risk” é um
marcador de modalização pois tem certa equivalência à “political leaders may” . No caso das previsões,
“will” é um verbo auxiliar de futuro, de modo que “there will be globalization” é uma afirmação e não
uma declaração modalizada. Deste modo, Blair compromete-se fortemente com a verdade. A relação
entre afirmações e negações é significativa para o dialogismo. Existem três pontos nos quais uma
negação (ou negações) é seguida por uma afirmação. Implicitamente, Blair estabelece um diálogo ou
levanta uma polêmica com aqueles que têm pontos de vista diferentes.
Existem vários tipos de processos nestas declarações. Blair compromete-se fortemente com a
verdade das mesmas, que são representações de processos materiais (We will not walk away) , de
precessos mentais(we make the commitment) e de processos relacionais( the alternative to globalization
is isolation). Algumas declarações estão na primeira pessoa do singular ou do plural, outras na terceira
pessoa. As declarações referentes a processos mentais têm sujeitos em primeira pessoa. As declarações
representam o mundo em diferentes níveis de abstração ou generalização, sendo que algumas são
extremamente abstratas, muito distante de eventos concretos , circunstâncias e processos.
Considerando a modalidade deôntica, existem três casos, todos modalizados. A modalização é
grande em um caso. (the world community must show as much its capacity for compassion as for force )
e média em dois outros (The values we believe in should shine through what we do in Afghanistan).
O que se pode concluir a partir do que foi apontado acerca do personagem do político no caso de
Blair? Primeiro, que existe um personagem que estabelece um diálogo e não somente faz um monólogo.
Segundo, que este personagem tem o poder de previsão. Terceiro, que ele se compromete fortemente
com a verdade, prevê o futuro e utiliza declarações morais, com modalidade deôntica. De modo
ditatorial, fala acerca do que é, do que será e do que deveria ser e junta tudo isso. Quarto, que ele oscila
entre o discurso impessoal, o pessoal e o falar em nome das comunidades, tanto a comunidade mundial
(a qual seria, alguém poderia dizer, a comunidade dos Estados mais importantes) como uma comunidade
inclusiva do “nós” . Quinto, que ele se compromete com verdades não só acerca de processos e relações
do mundo material, mas também com as dos processos mentais de forma muito mais significativa.
Sexto, que ele se compromete fortemente com verdades de declarações que são, em alguns casos, muito
165
genéricas ou abstratas. Tudo isso serve para mostrar que as características das modalidades, a forma
com a qual o autor se compromete fazem parte do processo de auto-identificação do caráter político de
Blair.
No que se refere à avaliação, existem duas declarações de juízo de valor no trecho em questão (“
the demonstrators are right to say there is injustice”, poverty, environment degradation”, “it
(globalization) will be a force for good”, uma vez que o contexto é hipotético, poderia se formular uma
declaração com juízo de valor do tipo: “Globalization may be a force for good”. Existem, ainda,
algumas declarações com modalidade deôntica que contribuem para a avaliação (The values we blieve
in should shine through what we do in Afghanistan). Há, inclusive, expressões que se referem a
avaliações positivas (“é certo”) ou negativas(“há um risco...”). Além disso, muitos valores são postos em
questão de forma não marcada textualmente. Isso tudo leva à pressuposição de que o isolamento não é
desejável (“Because the alternative to globalization is isolation.”) – obseve-se que a alternativa para
algo indesejável , a globalização, é implicitamente considerada desejável .
Abaixo, segue um esquema dos principais valores presentes no trecho com os quais Blair se
compromete: O que é desejável e o que não o é. (a lista não cobre todos os valores.)
 Desejável
Ações informadas por meio de valores
Comprometer-se
Um regime de base ampla, que promova a união de grupos étnicos e que viabilize uma
solução para a pobreza
Uma ação baseada no pensamento e no planejamento
Assistir os refugiados
Compaixão nos assuntos internacionais
A resposta dos políticos diante de argumentos plausíveis
Falar abertamente acerca da injustiça, da pobreza e da degradação do meio ambiente
Reconhecer os fatos
As mudanças sendo direcionadas pelo povo
A globalização combinada com a justiça
Poder, riqueza e oportunidade nas mãos de muitos , não nas de poucos
Globalização
 Indesejável
Desviar de situações difíceis
Políticos se firmando a argumentos.
166
Injustiça, pobreza e degradação do meio ambiente
Globalização sendo boa para poucos
Isolamento

Blair faz referência explícita a valores e a princípios no trecho “The values we believe in should
shine though what we do in Afghanistan”. Ao se comprometer com esses valores, ele se identifica do
mesmo modo que é feito pela maioria dos políticos – como alguém com moral, de vocação política,
humano, democrático e realista.
Ao comparar o texto de Blair com o de Kanter, exemplo 9, observa-se que o segundo não tem o
mesmo dialogismo do primeiro, ou seja, é mais monológico. Embora existam previsões a respeito do
que vai ocorrer no capítulo, existe uma oscilação entre declarações factuais de moralidade epistêmica e
declarações de cunho moral com modalidade deôntica. Ao se comprometerem fortemente com a
verdade, os textos mostram uma convergência, mas existem mais declarações modalizadas no texto de
Kanter, o que sugere uma preocupação acadêmica em relação a resultados generalizados, uma vez que
ela é professora universitária e seu livro tem por base um projeto de pesquisa em larga escala. Em
ambos os textos, existe um forte compromisso com a verdade de declarações muito abstratas e
generalizadas. O texto de Kanter é mais impessoal que o de Blair , apesar de existirem declarações
pessoais relacionadas com a leitura e a escrita do texto. Os tipos de processos são extremamente
modalizados, na maior parte das vezes, relacionais, com pouca ocorrência de processos materiais ou
verbais. Não existem processos mentais com a exceção de “ In this chapter we will see...” , que se refere
ao próprio capítulo.
Deixe-me voltar para a avaliação. Eu reproduzi o começo do exemplo 9 abaixo:

Empresas que são bem sucedidas na web funcionam diferentemente em relação aos seus atrasados
concorrentes. Em minha pesquisa de cultura eletrônica global, constatei que elas estão muito
melhores que seus concorrentes no uso da Internet, pois elas tendem a ter flexibilidade,
fortalecimento, organizações colaborativas. Os indicativos que evidenciam as melhores e as piores
empresas em níveis estatísticos são:

 Departamentos colaborativos ao invés de departamentos isolados;


 Conflito é visto como parte do processo de criatividade ao invés de ser visto como
perturbação;
 Pessoas podem fazer qualquer coisa que não seja explicitamente proibido ao invés de
fazer apenas o que é explicitamente permitido;
167
 Decisões são tomadas por pessoas com maior conhecimento em detrimento de
possuírem ou não cargos mais altos.

Tanto as empresas líderes como as outras não descrevem nenhuma diferença em como elas
trabalham duro (em reposta à questão sobre se o trabalho estava confinado às horas tradicionais ou
extrapolava para o tempo pessoal), mas elas têm muitas diferenças em como trabalham
colaborativamente.

Uma característica impressionante desse estrato é que embora Kanter apresente os resultados da
pesquisa, ela não faz de uma maneira tão avaliativa. Existe um grande número de declarações de
avaliação, se bem que elas são realizadas em modos nos quais o sentido está fixado de maneira ampla.
Declarações avaliativas diretas podem ser vistas como pressupostos. ‘Companhias que são bem
sucedidas na web’ pressupõe que algumas companhias são bem sucedidas na web, onde ‘bem sucedidas
na web’ é um discurso relativo de expressão avaliativa. ‘Seus parceiros atrasados’ pressupõe que os
parceiros são atrasados. As empresas bem sucedidas e seus concorrentes atrasados’ (anaforicamente)
referidos anteriormente como ‘melhores’ e ‘piores’ são pressupostos para serem melhores e piores
respectivamente – uma posição explícita em termos desejáveis na qual é apenas um tanto atenuado pelo
fato ‘melhor e pior’ estarem em citação marcada. Referência anafórica (retoma o termo que vem antes)
novamente desencadeia pressuposições avaliativas que os dois tipos de companhias são ‘adiantadas’ e
(novamente) ‘atrasadas’.

Além do mais, para estas declarações avaliativas fixas, existem valores assumidos. Dentro deste
discurso, ter ‘flexibilidade, fortalecimento, organizações colaborativas’ é desejável – mas note a mistura
de suposição de valor e a modalidade (‘tem de ter’) que reduz o compromisso com a verdade em uma
padronização perigosa para a escrita acadêmica. Existem também valores assumidos nas palavras dos
resultados apontados – neste discurso, colaboração, conflito criativo e assim por diante são presumidos
como sendo desejáveis. A seguinte oração também informa os resultados da pesquisa de um jeito
carregado de valores, novamente evocando a virtude do trabalho colaborativo.

Eu resumi alguns pontos desejáveis e indesejáveis para uma empresa presentes no texto de
Kanter:

 Desejável
Ser flexível, fortalecedor, organizações colaborativas
168
Trabalhar colaborativamente
Conflito criativo
Pessoas sendo livres para agir (fazer qualquer coisa não proibida)
Decisões sendo baseadas no conhecimento
Companhias sendo comunidades
Pessoas sentindo-se como membros
Ter acordos compartilhados
Ter equipes que sabem trabalhar juntas
Transmitir informações rapidamente
Colaboração voluntária
Companhias terem um espírito

 Indesejável
Departamentos isoladas
Ver conflito como desordem
Fazer apenas o que é permitido
Decisões serem tomadas com base no cargo
Pessoas sentirem-se como empregados
Burocracia
Descrição rígida do trabalho
Comando e controle hierárquicos
Acumular informação

Deixe-me redigir brevemente algumas conclusões sobre semelhanças e diferenças entre o


‘caráter’ do político e do perito como eles são representados nestes casos – naturalmente o objetivo não
é fazer generalizações sobre estes personagens com base em dados tão limitados, mas mostrar como
análise textual é capaz de contribuir em grande escala para o estudo deles. Estas são formas diferentes de
autoridade pública e identidade. Ambos os personagens falam/escrevem com autoridade sobre o que é o
caso, freqüentemente de maneira muito abstrata e generalizada, embora a complexidade da identidade de
Kanter, como ‘guru’ e acadêmica, é talvez indicada pelo alto número de declarações modalizadas e
situam-se entre verdadeiras declarações autoritárias e declarações moralmente autoritárias. Então ambos,
político e perito, assumem o poder de dizer aos outros o que é e o que deve ser. Mas isto é apenas o
político que dialoga polemicamente com outros, e fala pessoalmente, e em nome de outros incluindo os
169
processos mentais (sentimentos) de outros. (Kanter apenas escreve pessoalmente sobre ela mesma
com respeito a escrita dela, e em nome de outros, com respeito aos leitores do capítulo dela).
Voltando para avaliação, a primeira coisa a dizer é que a linguagem do perito não é menos
motivada em valores que a do político (ser um perito, mesmo um cientista, não significa ser livre de
valores, mesmo se eles são extremamente construídos naquela direção – veja Wynne 2001). Contudo, os
valores de Kanter estão, de algum modo, mais na superfície do que os de Blair, cujo texto contém um
número de declarações de avaliação, embora estejam embutidas. Existe um claro contraste em termos de
amplitude de compromisso de valor – Blair compromete-se a si mesmo com uma ampla série de valores
gerais, ao passo que Kanter compromete-se a si mesma com valores mais específicos e localizados em
um cenário institucional.

Os diversos senhores Blairs: identidades misturadas


Tony Blair tem sido acusado às vezes de tentar ser ‘todas as coisas para todos os homens’,
embora no sentido de que é algo que qualquer político deve ser – políticos têm que enfocar e projetarem-
se em diversos eleitorados porque as alianças políticas, na atualidade, tornam-se mais imprevisíveis num
curto espaço de tempo. Blair, o político, pode ser visto não como um personagem unitário, mas um
personagem composto por um número de diversos Tony Blairs. Em parte isso é uma questão de público
– por exemplo, Blair o ‘tomador de decisões’ enfocando um público de empresários, Blair o ‘cidadão’
enfocando o público da sociedade civil, Blair o ‘líder’ enfocando o público do Partido Trabalhista
(Donadio 2000). Verifica-se também Blair deslocando-se de uma entre estas várias identidades em uma
única fala ou entrevista (Fairclough 2000b).
Por exemplo, meus comentários a respeito de modalidade no exemplo 5 acima pode ser
interpretado como ponto principal para heterogeneidades e contradições – que o ‘comportamento’ de
Blair é um comportamento contraditório, por um lado falando com autoridade impessoal, por outro lado
no interesse da ‘comunidade-mundial’, sobre o que é o caso (modalidade epistêmica), o que será
(predições), o que deve ser (modalidade deôntica), no entanto, por outro lado falando pessoalmente (
‘Eu’ – declarações pessoais) e em nome do senso-comum da comunidade um ‘nós’ inclusivo (‘nós
todos’). Por um lado fazendo declarações autoritárias sobre os processos e as relações do mundo
material, mas por outro lado sobre o que ‘nós’ (todos) sentimos.
Uns podem argumentar que para qualquer político contemporâneo existe uma tensão entre a
figura pública, o líder, e a ‘pessoa comum’. Eu argumentei em outro momento (Fairclough, 2000b) que
no caso de Blair, a figura pública está sempre ancorada na ‘pessoa comum’, e que isto está claro, mesmo
na fala do Exemplo 5, quando Blair fazia uma importante declaração sobre a ‘Guerra ao Terrorismo’ no
170
papel dele como um líder, mesmo não sendo o de principal estadista dentro da ‘comunidade
mundial’. Em outro momento, a ‘pessoa comum’ é o elemento mais saliente entre a mistura de
identidades.

Frost: e como você lida com aquele problema do qual você mencionou corretamente o modo como alguns dos elementos
mais fortes da imprensa são dirigidos contra esta política na Europa que eu quero dizer. O Murdoch press, o Grupo do
Telégrafo, o Grupo do Correio eu quero dizer aí mesmo você tem uma preponderância enorme como isso afeta o seu
fazer político ou isto só afeta apenas sua política de apresentação ou isto só afeta o fato que você não lê esses
documentos.

Blair: (risos) isto não significa que você tem que bater de frente com eles. E alcançar as pessoas. E termos um debate
honesto. Sobre o euro quero dizer antes do natal nós tivemos algumas das mais ridículas histórias sobre o que a
Europa estava planejando fazer com nossos impostos e nosso estilo de vida em todo o resto disto existe uma enorme
questão sobre o futuro da Inglaterra e a direção futura do país e eu acredito que a Inglaterra não pode estar de fora da
Europa a Inglaterra tem que ser parte da Europa eu acredito nisso. Como eu digo o teste no euro é que tem que ser o
nosso interesse econômico nacional mas o que nós não podemos fazer. é uma questão de princípio

Este é um trecho de uma entrevista de televisão entre Blair e Senhor David Frost em abril de
1998. Há dois marcadores de modalidade subjetiva com a primeira pessoa do pronome singular e um
verbo de processo mental (ambos ‘eu acredito'). Note que 'eu penso' também poderia ser tomado como
marcador de modalidade subjetiva, e o outro pronome de primeira pessoa em ‘como eu digo'. Outros
pronomes também são significantes: o 'nós' (que acontece várias vezes, em ' termos', ' nós temos', '
nossos impostos, ' nosso estilo de vida', ' o que nós não fazemos') é inclusivo, ' todos nós', e também há
um exemplo do ' você' genérico, o ' você' da experiência comum. Além de tudo, Blair a ' pessoa comum',
Blair que fala como um cidadão comum e um membro da comunidade, é mais saliente aqui que no
Exemplo 5. Mas também há outras características que reforçam isto – o uso da palavra' ridículo' na
conversa e a frase ' e todo o resto disso’, e características de acento (pronunciando ' ir' como uma glotal
em vez de um ' t' no modo ' Inglês Estuário') e enuncia (um alongamento afetivo da primeira sílaba de '
ridículo'), assim como as características da ' linguagem do corpo’ (um sorriso atrativo e um riso em
resposta para a piada ao término da pergunta de Frost, uma oscilação da cabeça dele de um lado para o
outro quando ele diz ' ridículo'). Nós podemos ver aqui a ' informalização' (Misztal, 2000) de identidades
que tem sido apontada como uma característica marcante da recente vida pública, a apropriação pública
do privado e do ' comum' (Sennett, 1974), a ' conversacionalização' da linguagem pública (Fairclough,
1992).
171

Identidade social e personalidade


Blair, o Político, não é apenas um homem que interpreta um papel social, também é uma
personalidade, um investimento pessoal particular do 'caráter' de Político. Pode-se abordar isto
parcialmente em termos de idiossincrasia - por exemplo, o movimento, bastante peculiar, da cabeça de
um lado para o outro que eu me referi anteriormente (que é criticado através das sátiras) parece ser
idiossincrático. Mas, também, pode-se ver parcialmente a personalidade de Blair como o produto de
modo distintivo no qual ele tece os vários senhores Blairs juntos - a ' pessoa comum', o ' inflexível '
líder, o estadista internacional, o homem de princípios, convicções e ' valores’. com relação à presença
da 'pessoa comum' na mistura, qualquer político dos dias atuais tem que lidar com a tensão (como eu
disse acima) entre ser ' comum' e ser extraordinário (um líder, uma figura pública), mas os políticos
diferem, e projetam personalidades diferentes, justamente em como eles administram aquela tensão, o
que a mistura é, que outros elementos distintivos existem na mistura. Um elemento, por exemplo, que
nós poderíamos ver em Blair como tendo apreendido de Margaret Thatcher é a ' convicção política', um
homem de princípios e realmente de paixão, um elemento que nem todos os políticos têm (ou cultivam).

A 'esteticização' de identidades públicas


A ' esteticização' de políticos (Harvey, 1990) foi localizado anteriormente no período Nazista,
por exemplo, a administração estética das reuniões com presença de grande público que os Nazistas
organizaram na Alemanha nos anos trinta. Mais recentemente, analistas têm apontado para uma
'esteticização' mais penetrante da vida social, das vidas privadas de consumidores como também da vida
pública (Chouliaraki e Fairclough, 1999; Featherstone, 1991; Lury, 1996). A preocupação com a '
imagem' é um aspecto disto, pode-se localizar isto, mais recentemente, através de políticas na educação
(a ' imagem' de um acadêmico próspero, por exemplo - veja Bourdieu 1998), e no individualismo da
vida privada de consumidores. Parte da identificação de ' personagens’ como a do Político ou a do
Gerente ou, mais geralmente, a do Perito é a construção de uma estética, e novamente este é um
processo que é em parte textual.
Se nós salientarmos o caso de Tony Blair, a citação do conselheiro dele, Philip Gould, que eu
usei no capítulo 9 apontando para o processo de construção da imagem do líder político que é uma parte
inevitável da política moderna. Sempre que Blair faz um aparecimento político, certamente numa fala
política importante, isto precisa ser visto entre outras coisas como um evento trabalhado esteticamente, e
parte da identificação de Blair como a construção de uma estética. Então, naturalmente, fazer ligações
172
indo além da transcrição do que foi dito em uma ocasião particular e olhando a ocasião como um
todo. Isto inclui o plano visual da localização na qual uma fala é proferida, o modo no qual são filmados
a localização e o próprio Blair como o ponto central disto, a ' informação' que é colocada no evento '
doutores da informação’ que objetivam modelar a cobertura da mídia que ambos precedem e seguem
isto. E também a incorporação de Blair (cuja discussão iniciei anteriormente) incluindo a postura dele,
seus gestos, as expressões faciais dele, o movimento da cabeça dele e as mãos dele, e assim
sucessivamente. Mas a linguagem também precisa ser vista dentro deste esquema de esteticização - que
também é projetada em parte por um efeito estético. Nós podemos ver isto como parte do que é
requerido ao olhar a linguagem política como 'retórica', incluindo, por exemplo, o modelo sintático e
lexical da linguagem mas também o ritmo da fala.

Em parte, uma perspectiva retórica nos leva de volta aos aspectos da retórica tradicional. Por
exemplo, o ' paralelismo' (Leech e Short, 1981) no começo do Exemplo 5 é um reconhecido padrão
retórico ou um dispositivo estilístico:

Não reaja muito emocionalmente alguns dizem. Nós não reagimos.


Nós não temos censuras severas. Nenhum projétil na primeira noite apenas para efeito.
Não mate as pessoas inocentes. Nós não somos os que empreenderam a guerra contra os inocentes. Nós buscamos o
culpado.
Procure uma solução diplomática. Não há nenhuma diplomacia com Bin Laden ou o Regime Talibã.
Declare um ultimato e adquira a resposta deles. Nós declaramos o ultimato; eles não responderam.
Entenda as causas de terror. Sim, nós deveríamos tentar, mas desde que não exista nenhuma ambigüidade moral
sobre isto: de qualquer forma nada poderia justificar os eventos de 11 de setembro.

Há paralelismo gramatical aqui, uma série de orações imperativas (' não reaja muito
emocionalmente', ' não mate pessoas inocentes’, etc.) seguido (principalmente) por uma série de orações
declarativas - fazendo uma simulação de diálogo como eu apontei no capítulo 3. Nós também
precisamos considerar, como eu disse acima, a fala proferida, inclusive o ritmo. Mas a estética de Blair é
muito mais amarrada na personalidade dele, porque personalidade em política moderna é determinada
parcialmente, desenvolvida e trabalhada parcialmente em cima da questão da ' imagem'. Assim a mistura
distintiva de diferentes estilos a que me referi acima é também uma parte da estética.

Cidadãos e peritos e a esfera pública


173
A relação entre o público e os vários tipos de peritos tem atraído interesses em várias áreas de
pesquisa social, inclusive sociologia (Giddens, 1991), estudos da mídia (livingstone e Lunt, 1994,
também veja Fairclough, 1995b) e estudos científicos (Wynne, 2001). Nós podemos ver esta
preocupação conectada com questões e preocupações sobre cidadania na sociedade contemporânea, e a
postura contemporânea e a saúde da esfera pública, um tema que mencionei em capítulos anteriores
(Calhoun, 1992; Habermas, 1989; Habermas, 1996; Sennett, 1974).

Eu quero discutir os cidadãos e os peritos como 'personagens’ contemporâneos com relação a


uma reunião organizada em algum lugar na Inglaterra para discutir o cultivo experimental de alimentos
geneticamente modificados (GM) que aconteceu naquela área (Exemplo 15, Apêndice, páginas 252-5).
Isto é baseado em um caso real que tem estado em anonimato que era uma condição do acordo para
gravá-lo. Estes julgamentos são designados para testar se as colheitas de GM têm efeitos ambientais
mais adversos que seus equivalentes não-modificados geneticamente. A reunião teve o formato
semelhante a de muitas reuniões públicas. Era presidido por uma figura local famosa, havia vários
locutores cujo direito à palavra era dado na primeira parte da reunião, e na segunda parte da reunião os
membros da audiência eram convidados a fazer perguntas para os locutores. Os locutores eram peritos
de diferentes tipos - funcionário governamental com conhecimento especial em julgamentos de fazenda,
representante, que é um cientista, de uma companhia que produz sementes GM para fazendeiros, e
representante de uma organização que promove agricultura orgânica que tem um conhecimento especial
em implicações de agricultura de GM para a agricultura orgânica.

Deixe-me começar com os peritos. Aqui está um trecho da fala inicial do funcionário
governamental, na qual ele está falando sobre ' o processo de consulta' e o Diretivo da União européia
que controla isto:

Um dos assuntos que ocorrem muito freqüentemente em reuniões públicas tais como esta é o assunto de
consulta e eu gostaria de gastar apenas um pouco do tempo explicando o constrangimento sobre o qual o
processo de consulta tem que operar atualmente. Nós temos um Diretivo no momento que data
anteriormente a 1990 e sobre aquele Diretivo há um âmbito muito limitado para consulta sobre locais
individuais onde poderiam ser desenvolvidas as colheitas de GM. A legislação requer que as aplicações
submetidas ao Governo tenham que ser julgadas nos méritos deles e uma vez que um consentimento foi
aprovado só pode ser revogado em campos científicos válidos. Sempre há um âmbito para uma nova
evidência científica a ser considerada.
O processo de informar as pessoas sobre locais previstos de FSE é que exista Informações a respeito
anunciadas em jornais locais. Nós publicamos notícias toda vez que há um lançamento de um novo campo a
ser semeado e nós identificamos em nossas notícias os locais particulares com seis-figuras de grade de
174
referência. Nós também escrevemos a todos os conselhos da paróquia para dizer a estes onde serão os
locais e prover tanta informação relevante quanto nós podemos. E nós sempre dizemos que nós estamos
dispostos a ir e promover reuniões como esta para explicar tudo sobre o programa.

E aqui é um trecho da abertura pelo representante da companhia de semente GM:

Por que o fazendeiro se interessaria por esta tecnologia? Certo, bem eu já tinha falado sobre rendimento e
eu ainda retornarei novamente a isso em um segundo. Mas o que é importante sobre isto é que você pode
usar um tipo particular de herbicida chamado Liberdade. Agora, normalmente, com óleo da semente de
colza o que você faz como um fazendeiro é ir e colocar uma camada fina de herbicida sobre a terra, certo.
Isto é o que eles chamam de herbicida pré-emergente. E o que acontece é que como as ervas daninhas
passam através deles entram em contato com o herbicida e elas morrem. certo?
Liberdade é diferente, não há nenhum ponto borrifado sobre o solo, e é quase inativo no contato. Isso
significa que você tem que borrifá-lo sobre as ervas daninhas. De maneira nenhuma você borrifa isto sobre
a terra deixando as ervas daninhas passarem por isto. As ervas daninhas apenas continuam crescendo.
certo? Se é esse o caso o que nós estamos procurando agora em lugar de um 'só um caso' é 'se nós realmente
precisamos dele’. Assim o fazendeiro vem, olha e vê aquelas ervas daninhas naquela colheita e diz' ok, eu
preciso borrifar? 'e' se for o caso de quantos borrifos eu preciso? ' Então se há ervas daninhas naquele
campo e ele tomará aquela decisão. Assim nós estamos nos afastando da idéia de ' oh bem eu borrifarei isto
por via das dúvidas no caso de algo aparecer’ para ' se nós precisarmos nós usaremos’. E isso é uma coisa
extraordinária para um fazendeiro.

É interessante notar inicialmente que estes dois peritos representam a si mesmos ao fazerem a
abertura inicial. O funcionário do governo se representa como ‘explicando' as coisas, uma vez que o
cientista da companhia diz que ele objetiva dar as pessoas ' uma impressão sobre o que é tudo aquilo'.
Estes são dois estilos diferentes de ser um perito. Eles têm algumas coisas em comum - uma é ter
modalidade autoritária, afirmações categóricas (não-modalizadas) (e uma ou duas negações, por
exemplo ' não há nenhum ponto borrifado sobre o solo'). Mas existem também fortes diferenças. Ambos
os trechos são troca de conhecimento, mas o cientista da companhia mostra uma orientação mais
Interativa com o público conferindo (com ' certo') se as declarações que ele fez foram compreendidas.
Além disso, este trecho começa com uma pergunta - em contraste com o estilo mais monológico do
funcionário que basicamente só faz declarações, o cientista da companhia simula uma troca de
perguntas-respostas que também contribui para uma orientação mais interativa. Observe também que o
cientista da companhia, mas não o funcionário governamental, usa declarações de valores explícitas ao
lado de declarações de fato (' o que é importante sobre isto', ' isso é uma coisa extraordinária para um
fazendeiro'). Ele também dramatiza sua apresentação ao ' fazer' a voz do fazendeiro. Outro contraste são
175
as relações semânticas entre frases e orações: no primeiro trecho, elas são basicamente elaborativas e
aditivas, ao passo que no segundo há um jogo de relações muito mais complexas (elaboração, contraste,
condicional, conseqüência). junto com outras características, isto soma-se ao compromisso interativo
que o cientista da companhia alcança, em contraste com o funcionário governamental,: ' marcadores de
discurso que marcam relações funcionais entre as expressões (' bem', ' agora'), e várias ' construções
temáticas de equivalência' (Halliday, 1994) que dão uma estrutura de informação mais densa pela
separação de uma oração em duas partes que estão em uma relação de equivalência (compare ' você vai
e você coloca uma camada fina de herbicida sobre o solo' com que nós realmente temos aqui – ‘o que
você faz' é (verbo de equivalência) ' você vai e você coloca uma camada fina de herbicida sobre o solo').
Estes são, como eu disse, dois estilos diferentes de perícias. O estilo do funcionário
governamental é um mais tradicional, amarrado à autoridade de burocracias. O estilo do cientista da
companhia, ao contrário, está ligado à mediação crescente de perícias, no sentido que os peritos agora
cada vez mais dependem da projeção e radiodifusão das perícias deles por meio da comunicação de
massa. Não é que aqueles funcionários do governo não são afetados por este desenvolvimento, é, talvez,
até mais que, outros tipos distintos de peritos, eles não têm sido tão profundamente afetados ao ponto de
mudar radicalmente seus estilos. Eles não tiveram que se empenhar tanto em adquirir a capacidade para '
comunicar' (ser claro, engajado, persuasivo etc.) com audiências públicas grandes, ou em relações
públicas. O que é notável sobre este estilo mais novo de perícias é a cumplicidade entre ciência, negócio
e mídia: não há agora, aparentemente, nada escandaloso, como poderia ter sido lá, sobre alguém falar
com a perícia de um cientista no interesse de um negócio, e usando as ' habilidades’ das relações
públicas para fazer isso. Mas talvez tais cumplicidades possam contribuir para que um público astuto
desconfie de peritos (Wynne, 2001).
O formato da reunião como eu descrevi brevemente acima vai para o âmago da controversa
contemporânea sobre a ‘participação’ do público em geral e em fazedores de políticas sobre alimentos
geneticamente modificados em particular. Na reunião, os membros da audiência são orientados pela
presidência para se limitarem a fazer perguntas que assumam que o que está em pauta é 'informação' em
lugar de 'consultoria', peritos 'informam' o público ou 'explicam coisas' para eles, o público busca o
esclarecimento destas informações através das perguntas feitas. Mas de fato, os membros da audiência
não se limitam desta maneira - muitas de suas contribuições fazem reivindicações ou declarações,
desenvolvem argumentos, e desafiam os locutores em vez de só fazerem perguntas. Nós poderíamos
olhar o que acontece em uma reunião deste tipo em termos de pessoas que negociam cidadania - como
uma ocasião (um tanto recente para alguém da audiência) onde as pessoas se vêem como envolvidas em
176
um processo de deliberação pública em cima de assuntos de preocupação do público comum com
uma visão de ter uma influência no processo de fabricação de política.
Este é um trecho de uma contribuição da assembléia em que o locutor prefacia dizendo que ele
tem uma 'questão tripartida’. Esta é a primeira das três partes - ' primeiro ponto’:

Em primeiro lugar, está sendo muito usado a palavra consulta. Ao cavalheiro do DEFRA, eu gostaria de dizer que
nós tivemos um referendum no ano passado em nossa aldeia que deliberou que nós não queríamos jsondagens de
GM em nossa aldeia. Nós tivemos outra pesquisa levada a cabo este ano, em que a maioria das pessoas disse que nós
não queríamos isto em nossa aldeia.
Está caindo em ouvidos cerrados, solo pedregoso. Nossas visões não são levadas em conta embora vocês de
Governo digam que sim, é um diálogo com surdo eu sinto. Basicamente, nenhuma consulta, nenhuma comentário
tomado de nós. Primeiro ponto.

O primeiro ponto é que o locutor aqui, obviamente, não está fazendo uma pergunta, ele está
fazendo declarações - dando a informação oficial do governo, então fazendo julgamentos sobre o
processo de consulta. Há tentativas, especialmente, da presidência para restringir as pessoas de fazerem
perguntas, mas geralmente elas não são restringidas desta maneira. Segundo, embora se possa ver ‘eu
gostaria de dizer' como de algum jeito mitigando a força da afirmação na segunda oração, o que nós
temos aqui basicamente é o compromisso forte com a verdade, a modalidade das afirmações e negações.
Pode-se dizer que o falante está preparado para comprometer-se fortemente com as verdades e
julgamentos como um cidadão (então tais compromissos fortes não são prerrogativa exclusiva dos
peritos). O terceiro ponto é que a reivindicação de que há (nas palavras do funcionário governamental)
um ' processo de consulta' é contestado explicitamente.
O seguinte é uma troca mais extensa que envolve dois membros masculinos (M1, M2) do público
bem como o funcionário Governamental. Eu omiti a extensa troca posterior do procedimento de
notificação.

M1: Realmente, há dois ou três problemas ou preocupações. Um, realmente, é com respeito a falta de tempo que
tem sido dada à paróquia assim que tomamos conhecimento. Nós não sabemos qual o local será. Nós só sabemos
quando o local será perfurado. O Conselho de Município colocou uma moção através da qual nós poderíamos pedir
para DEFRA que nos deixasse saber qual é o local de acordo, e então nós poderíamos ter uma reunião como essa se
você gosta que tudo esteja a mão antes. A outra coisa é que há um aumento volumoso de problemas no nariz por
esporos que estão no ar agora. Anos atrás nós costumávamos ter problemas de febre de feno em tempos de feno,
agora nós de forma semelhante os adquirimos – Existe alguma diferença entre os esporos de colheitas geneticamente
modificadas e da colheita convencional? Eu penso que essas são duas principais preocupações que estão causando
177
problemas locais. Eu não sei se há uma resposta para ambas mas existe certamente uma resposta na demora do
tempo e pode haver uma resposta para a outra.
M2: Eu poderia apenas fazer uma consideração? quero dizer com relação a primeira parte disso, este ano a
primeira que nós soubemos sobre estas colheitas estava no jornal.
M1: Exatamente.
M2: E quando nós recolhemos um pouco de informação fora a Internet, era o dia que eles tinham declarado para
semear. Então, aquilo foi quando o Conselho da Paróquia soube -
M1: O Conselho do Município tinha pedido para o Governo - se nós pudéssemos saber - sobre quando o local é
decidido, então nós precisamos da informação. E eu penso que isso nos daria um período de tempo razoável para
avaliar se vai ser ou não um problema.
Funcionário governamental: Eu posso [palavra ininteligível]. Bem, eu penso que eu disse que nossa prática é
escrever a todos os Conselhos da Paróquia quando um local de julgamento é proposto e nós fizemos isto -
M1: Não, não é isso o que aconteceu -
Funcionário governamental: Eu apenas poderia dizer o que nós fazemos? [extensa troca do procedimento de
notificação - omitida.] Assim nós damos o melhor de nós para ter certeza de que as pessoas saibam.
M1: Até que ponto você conhece qual o local que vai ser usado?

M1 começa fazendo declarações sobre dois problemas, e então faz uma pergunta sobre o
segundo deles, depois ele se refere a eles como ‘preocupações’ que causam ' problemas’ e especula se há
'respostas’. Aqui, pode-se ver uma ambivalência nesse tipo de troca. M1 parece estar pedindo mais que
respostas para as questões, por exemplo, mais que informação, ele parece estar pedindo soluções para os
problemas - que faria deste uma troca de ações. Esta é uma tensão potencial em interações entre os
peritos e cidadãos - o anterior sendo orientado para 'informação' (e trocas de conhecimento), o posterior
sendo orientado para a ação (trocas). A reunião neste caso é predefinida em termos de troca de
conhecimentos, contudo o público, em alguns casos, consegue trocar o enfoque para a ação.
O que é também notável aqui é a troca cada vez mais longe da expectativa normativa do locutor
da assembléia. M1 e M2 estão trabalhando colaborativamente para elaborar um problema e sua solução.
O que talvez seja interessante aqui é a suposição ('nós poderíamos ter uma reunião como essa se você
gosta que tudo esteja a mão antes ', ' nos dê uma estimativa razoável de tempo para avaliar se vai ser ou
não um problema') aquelas pessoas locais deveriam ter um investimento em fazer política (também veja
a reclamação no trecho anterior que ' nossas visões não são levadas em conta') que não é na verdade
possível nos termos do Diretivo da União européia. Pessoas, como cidadãos, parecem assumir que eles
deveriam ter uma opinião no que acontece, em quaisquer dos procedimentos oficiais colocados. Um
ponto adicional é que M1 na verdade interrompe o funcionário governamental para desafiar o que ele
está dizendo. De vários modos, as pessoas estão, pode-se dizer buscando agir como cidadãos ao
transgredirem e quebrarem o procedimento padrão da reunião.
178
O que parece transtornar a maioria da audiência é justamente a falta de uma verdadeira
consulta, mas outro tema é que os peritos, simplesmente, não sabem quais as possíveis conseqüências e
efeitos que as colheitas de GM podem ter (veja Wynne, 2001). Uma maneira de ver o que acontece em
uma reunião como essa - o modo pelos quais as pessoas, normalmente sem ostentação, mas
persistentemente, quebram as 'regras’ sobre 'as perguntas’ comunicando os pontos e as críticas e
desafiando-os ao se comunicarem - é, em termos de dialéticas do discurso (veja capítulo 2), em que
aquelas representações duvidosas dos peritos são encenadas de modo que as pessoas interajam com eles
como cidadãos em ocasião como estas.

Resumo
Nós começamos este capítulo apresentando uma moldura para analisar a modalidade epistêmica e
deôntica que debruça sobre as distinções entre Tipos de Troca e Funções da Fala discutido no capítulo 6.
Nós, então, discutimos categorias de avaliação explícita e implícita, e foi para usar estas duas
perspectivas analíticas para abranger uma gama de assuntos sociais.
O primeiro destes era o ' caráter’ do novo capitalismo: nós comparamos os estilos do Político e do Perito
em termos de comprometimento para com a verdade, necessidade, e valores.
De lá nós fomos para discutir a mistura de identidades, heterogeneidades e contradições na identidade e
estilo dos políticos, e a questão de como a análise textual com um enfoque em modalidade e avaliação
poderia contribuir para pesquisar a tensão entre identidade social e personalidade, e a esteticização de
identidades públicas.
Finalmente, nós retornamos ao assunto da esfera pública, em termos de relacionamento entre os peritos e
os cidadãos.

Nota
O exemplo é tirado de uma União européia fundada no projeto de pesquisa na construção de cidadania
no contexto de procedimentos de aprovação para julgamentos de colheita de GM (' Participação e a
Dinâmica de Posicionamento Social - o caso de Biotecnologia. Imagens do Self e dos Outros nos
Procedimentos de tomada de decisão). Meus colegas de equipe Britânica para este projeto de 8-nações
são Simon Pardoe e Bron Szerszynski. Eu estou em dívida com eles em minha análise deste exemplo
(veja Fairclough et al. breve).
CONCLUSÃO
179

Tenho dois objetivos neste capítulo final. O primeiro é expor e resumir os vários aspectos da
análise textual que foram discutidos ao longo do curso. Farei isso na forma de questões que podem ser
abordadas em um texto. Também ilustrarei como vários temas analíticos, perspectivas e categorias
podem ser trazidas em uma análise particular de um texto - especificamente o exemplo 7 do apêndice.
Meu segundo objetivo é pôr em ordem um breve manifesto do programa de pesquisa para a
Análise de Discurso Crítica, para o qual este livro tem uma contribuição particular. Enfatizo, desde o
início, que a análise textual é uma das questões de um amplo trabalho de pesquisa, que auxiliará os
leitores, acredito, em análises textuais dentro da perspectiva e proporção a que se propõe esta obra, com
uma sucinta mas profunda exposição de todo o programa de pesquisa. Como disse no capítulo 1, não
significa que este livro seja de importância e valor somente para aqueles que trabalham com
especificamente este ramo de pesquisa, já que muito do que foi colocado sobre análise textual pode ser
aplicado em amplo aspecto da pesquisa social.

Análise Textual
Na lista a seguir, resumo em forma de perguntas os principais temas em análise textual discutidos
nos capítulos anteriores, indicando em qual deles podem ser encontrados.

 Eventos sociais (capítulo 2)


De qual evento social, ou elos de eventos sociais, o texto faz parte?
A que prática social ou redes de práticas sociais os eventos podem estar se referindo ou de quais
tomam parte?
O texto é parte de um elo ou de redes de textos?

 Gênero (capítulo 2, capítulo 4)


Em que gênero o texto se situa?
O texto se caracteriza por uma mistura de gêneros ?
Que gênero o texto delineia e quais são suas características (em termos de atividade, relações
sociais e tecnologias de comunicação)?
180

 Diferença (capítulo 3)
Que contribuição das seguintes situações caracteriza uma orientação para diferença nos textos:
A) considerar, aceitar e reconhecer a diferença, explorá-la como uma forma de diálogo;
B) acentuar a diferença, conflito, polêmica, luta pelo significado, norma, poder;
C) atentar por resolver ou superar diferença;
D) agrupamento de diferença, focalizando seus pontos comuns e solidários;
E) consenso, uma normalização e aceitação da diferença de poder que agrupam ou suprimem
diferenças de significados e põem fim à norma

 Intertextualidade (capítulo 3)
Daquilo que é importante em textos e vozes, o que está incluso e significativamente excluído?
Que outras vozes estão inclusas? São atribuídas e caso sejam, de forma específica ou não? Tais
vozes são atribuídas ao discurso direto e indireto?
Como se constroem outras vozes em relação à voz original e como se dá a relação entre elas?

 Suposições (capítulo 3)
De que existência, propósito ou valor é feita a suposição?
Existe um caso de se ver a suposição como ideológica?

 Relações Semântico-Gramaticais entre Sentenças e Orações (Capítulo 5)


O que são relações semânticas predominantes entre sentenças e orações(causa, conseqüência,
condição, tempo, adição, concessão) ?
Existem relações semânticas de alto nível quando da ampliação do texto (ex.: problema-
solução)?
As relações gramaticais entre orações são predominante paratáticas, hipotáticas ou aderidas?
São potencialmente significantes as relações de equivalências e diferenças marcadas no texto?

 Trocas, Funções de Fala e Modulações Gramaticais (Cap 6)


Quais são os tipos predominantes de mudanças (de atividade ou de reconhecimento) e funções da
fala (enunciado, questão, demanda, oferta)?
Que tipos de enunciado existem (fato, predicação, hipotético e evolutivos)?
181
Existem relações metafóricas entre mudanças, funções de fala ou tipos de enunciados (ex.:
evoluções que se parecem com enunciados factuais)?
O que é um modo gramatical predominante (declaração, interrogação, ordem)?

 Discurso (capítulo 7)
Que discursos estão delineados no texto, e como são construídos conjuntamente? Existe
importância na mescla de discurso?
Que formas caracterizam os discursos e quais são seus usos, relações semânticas entre palavras,
colocações, metáforas, suposições?

 Representações de Eventos Sociais (cap 8)


Que elementos dos eventos sociais representados estão inclusos ou excluídos?
Quanto abstrato ou concreto são representados os eventos sociais?
Como são representados os processos? Quais são os tipos de processo predominantes(mental,
material, verbal, relacional, existencial)?
Existem instantes da metáfora gramatical na representação de processos?
Como são representadas as ações dos atores(ativa/passiva, pessoal/impessoal,
nomeada/classificada, específica/genérica)?
Como são tempo, espaço e o relacionamento entre a representação tempo-espaço?

 Estilos (Capítulo 9)
Que estilos apareceram no texto e como são conjuntamente produzidos? Existe uma significante
mescla de estilos?
Quais são os aspectos que caracterizam os estilos(corpo da linguagem, pronúncia e outras formas
fonológicas, vocabulário, metáfora, modalidade ou avaliação).

 Modalidade (Capítulo 10)


O que os autores submetem a si próprios em termos de verdade (modalidade epistêmica)? Ou em
termos de obrigação e necessidade deontológica? Até que extensão são modalizados(com marcas
implícitas de modalidade) ?
Que níveis de submissão (alta, média, baixa) existem onde modalidades são modalizadas?
Quais são as marcas de modalização (verbos modais, advérbios modais etc.)?
182
 Avaliação (CAP 10)
A que valores (em termos do que é desejável ou não) os autores se submetem ?
Como são realizados os valores - como enunciados avaliativos, enunciados com modalidades
deontológicas, enunciados com processos mentais efetivos, ou valores supostos?

Um exemplo
Reproduzi o exemplo 7 abaixo. Meus comentários nele não são certamente exaustivos. Meu
objetivo, ao contrário, é mostrar como se pode combinar algo dos recursos analíticos e introduzidos no
livro em uma análise particular de textos.

Como pode a globalização distribuir seus bens: a visão do Sul.


Globalização é agora um termo profuso em muitas partes do mundo. Está geralmente associado mais próximo a
desafios sociais vistos do hemisfério Sul do que com oportunidades econômicas. Quais são os termos principais que
precisam ser discutidos a fim de que a globalização encontre perspectivas de hemisfério?
O sucesso futuro da globalização exige que países em desenvolvimento estejam plenamente envolvidos na condução
da economia global e que suas vozes sejam ouvidas.
Demonstrações recentes deixaram claro que as prioridades e as agendas do mundo em desenvolvimento têm de ser
ouvidas. Os Estados Unidos e a Europa não podem por muito tempo direcionar a agenda global dentro dos interesses
deles. Porém, a integração de padrões de trabalho e de ambiente na estrutura do governo global pode não ser tão
fácil quanto os reclamantes pensam. Muitos dos países em desenvolvimento vêem esses temas como desculpas
potenciais para barreiras alfandegárias.
Em termos de governo global, a formação do grupos dos 20 foi um passo na direção certa. Nesse grupo, ao contrário
do grupo dos 7, ambos países industrializados e em desenvolvimento têm algo a dizer na coordenação econômica.
Mas fato econômico não é o que está em jogo. Uma homogeneização cultural preocupa bastante. Existe um medo de
que a sobreposição global portará a extinção de culturas nacionais e tradições, especialmente no hemisfério Sul.
Outras divergências, nesse assunto, dizem que as sociedades têm sido modificadas ao longo de sua história.
Globalização aumenta chance e liberdade, enquanto grupo de identidade nacional faz oposição. Em um mundo com
contatos próximos entre diferentes identidades culturais e práticas étnicas, os governantes têm de ser cautelosos para
não guiar a liberdade destrutiva de condutas do passado. Existe também uma idéia de que a globalização significa
mais para os ricos e menos para os pobres. Mas tem de se deixar claro que os benefícios de crescimento geral
atingirão a todos, e economias mais transparentes tendem a possuir menos desigualdade de renda.
É verdade que alguns países estão caminhando para trás. Gana, por exemplo, tem seguido estritamente os programas
estruturais de ajuste por 15 anos, não obstante ainda lute por atrair investimentos e crescimento. É comum
responsabilizar a globalização, mas diz-se que tal crescimento não virá apenas focado em variáveis
macroeconômicas. Antes, a estrutura fundamental de economia de mercado, liberando variações de preço e
garantindo contratos e propriedades, tem de estar em primeiro plano.
183
Direcionados a essas inquietações e auxiliando a globalização a encontrar as expectativas do hemisfério, líderes
tornarão as coisas mais fáceis no esforço por um bom governo. Maior transparência, responsabilidade e participação
por todos os envolvidos ajudarão a fazer com que processo pareça mais humano.

O exemplo 7 vem de uma seção do site do Fórum Econômico Mundial e que inclui três
diferentes tipos de texto: um sumário da seção de encontro do Fórum, citações selecionadas da seção e
extratos de e-mails enviados ao site por pessoas de vários países, em resposta ao debate. Podemos
observar, nessa parte, uma complexa cadeia de produção e de distribuição de sumários do encontro
provavelmente pela cúpula do Fórum, além de uma gama de eventos espalhados pelo mundo pelos quais
pessoas assistem a gravações do debate ou lêem notas sobre o assunto, discutem sobre ele, acompanham
a literatura relacionada e respondem aos sites. Pode-se ampliar essa rede de eventos ao incluir eventos
preparatórios para encontros no Fórum Econômico Mundial e nas diversas outras organizações
representadas no debate, além de eventos que se seguem ao encontro. O que emergiria, penso que o
vestígio dessa rede de encontro é a importância do que se pode chamar de poder do sumário - a força de
se produzir sobre aquilo que aconteceu, conforme o capítulo 7.
Podemos ver o exemplo em termos de redes de práticas sociais e, parte disso, uma cadeia de
gêneros. O Fórum Econômico Mundial é um tipo de "arma pensante", que reúne as figuras principais do
governo, negócios e sociedade civil, e orienta a discernir, predizer e finalmente direcionar o processo de
globalização, e tem sido amplamente acatado como eficaz em conduzir esse processo. Não possui status
formal ou oficial e não é uma organização com comprometimentos democráticos. Até poucos anos atrás,
recebia relativamente pouca atenção pública , mas seus encontros agora atraem manifestações e
protestos(ex.: Nova York, 2002). Ao mesmo tempo, desenvolveu sua própria máquina publicitária
incluindo em sofisticados sites interativos, além de abrir espaço em seus encontros para críticas à
globalização. O que o exemplo pontua é uma rede de incontável, mas influente curva das práticas do
governo global e da sociedade civil. Pode-se por essa razão ver o exemplo 7 como tema a respeito da
esfera pública que discuti em capítulos anteriores.
A principal parte do exemplo 7(o sumário do debate) pode ser vista como parte da publicidade
que está na conexão entre organização e sociedade civil. A cadeira de gênero inclui debate, reportagem
oficial, mensagens de e-mail, imprensa e transmissões e, sem dúvida, outras formas de reportagens e
discussões dentro das organizações envolvidas e representadas.
O gênero do sumário tem mais caráter de gênero interno para a organização (e dessa maneira é
como um informe oficial) do que um simples gênero mediador. Não é uma nova reportagem, não é um
tema que se passou durante o debate. É, ao contrário, o que mostra um resumo de argumentos dentre
vários que podem ser gerados dentro de organizações que têm por fim ser referência. Eu digo "mostrar"
184
porque há uma ambivalência sobre o que ocorre aqui e o que está em curso. Essa atividade é
simplesmente uma questão de registro dos argumentos no debate ou uma intervenção no argumento dos
seus próprios direitos, uma polêmica que converte argumentos contrários diante da forma como o Fórum
Econômico prevê? Um efeito de uso da forma do sumário intra-organizacional - produzido por membros
não identificados - é reter uma larga medida do controle organizacional do processo de interação
contínua, estabelecendo sites interativos e aparentemente abrindo-se para a sociedade civil.
Com relação à diferença, que se tem a mostrar é basicamente um roteiro(a), uma exploração de
vários pontos de vista(o que caracteriza "discussão" na acepção de Martin). Mas como também sugeri na
análise do cap. 4, existe uma ofuscação da diferença, já que pontos de vista e alegações não estão
claramente atribuídos às vozes, e nos parece haver algo a mais que um roteiro(b), uma polêmica, na qual
a relação protagonista - antagonista parece estar estabelecida entre um protagonista não identificado
(representando a liderança do Fórum econômico?) e outros contestando os solicitações do Sul
(antagonistas). Outra vez, veja a discussão no capítulo 4 para detalhes.
Voltando à intertextualidade, pode-se debater que a exclusão de vozes são para aquelas em que a
crítica à globalização é mais radicalmente encontrada, a mais próxima é a que atesta que "a globalização
significa mais para o rico e menos para o pobre", mas existe certamente uma quantidade de vozes "no
Sul" (assim como nas outras partes) que representa globalização como, por exemplo, uma forma de
imperialismo que é mecanicamente herdado para exploração dos países do "Sul" por corporações
estabelecidas na América do Norte, na Europa e no Extremo Oriente. O mesmo que "o império
americano". O que não está claro, mas poderia ser estabelecido, é se tais vozes foram excluídas do
sumário do debate ou do próprio debate. Com relação à atribuição, em que pedidos são atribuídos não
especificamente (ex: "alguns dizem, outros discordam", "existe um temor de que") e em número de
casos não estão relacionados de maneira alguma ex: "líderes farão coisas mais fáceis pelo esforço de um
bom governo"), contribuindo para ofuscar a diferença acima referida e a sensação de que existe uma voz
protagonista não identificada que refuta certos pedidos. Não existe relato direto (citação) de vozes - em
que vozes são caracterizadas, são indiretamente relatadas (o que amplia questões sobre o relacionamento
entre o que foi realmente dito e como é resumido aquilo).
Existem números significativos de suposições, indo da mais óbvia a mais proposital (iniciada
pelo "como", questionado no título) que a globalização pode entregar os bens(e possa encontrar as
expectativas do hemisfério Sul). Outras suposições propositais incluem que: o "Sul" tem uma visão; o
hemisfério Sul tem expectativas de globalização (e há uma visão única e expectativas no "Sul"); os
Estados Unidos e a Europa têm estabelecido a agenda global em seus próprios interesses; os que
protestam pensam que seria relativamente fácil integrar padrões de ambiente e de trabalho na estrutura
185
do governo global. Entre várias suposições existenciais, observe: existe algo como "o Sul" e " o
mundo desenvolvido" assim tomados como presumir-se como categoria classificatória. Tal
categorização não é incontestável: alguns podem colocar que muitas partes do mundo subdesenvolvido
não estão se " desenvolvendo" e o "Sul" vem a se recolocar no desacreditado "terceiro mundo". Existem
também muitas suposições valiosas, incluindo aquelas em que globalização está "entregando os bens" e
"encontrando as expectativas do hemisfério Sul" como desejável, e assim também " escolha e liberdade"
e " transparência", "responsabilidade", "participação" (desencadeada pelo "auxílio a") e em momentos
em que "barreiras alfandegárias" são indesejáveis (desencadeadas pelo "pedir desculpas"). O texto está
claramente posicionado dentro do sistema de valores neo-liberais.
Relações semânticas entre orações e sentenças são predominantemente de dois tipos: elaborativa
e contrastiva/concessiva. Um padrão repetindo-se várias vezes é o desenvolver de uma afirmação sobre
duas ou mais orações e sentenças em relação elaborativa, que está em relação contrastiva/concessiva
com outra afirmação (que pode também ser desenvolvida sobre duas ou mais orações em relação
elaborativa). Por exemplo:

Demonstrações recentes deixam claro que as prioridades e as agendas do mundo em


desenvolvimento têm de ser ouvidas. ELABORATIVA: Os Estados Unidos e a Europa expandem
a agenda global para seus interesses. CONTRASTIVA: Mas a integração de ambientes e de
padrões trabalhistas na estrutura do governo global não podem ser tão fáceis quanto aqueles que
os discordantes pensavam.

Cada uma dessas relações semânticas (elaboração e contraste) são freqüentes nesse texto. A
relação contrastiva/concessiva é marcada pela conjunção "mas"(quatro vezes), "contudo" e "enquanto"
(duas vezes). Pode-se também observar uma relação contrastiva entre a sentença inicial "outros sofrem
com esta noção" e a sentença que a precedeu (no quarto parágrafo), apesar de que, nesse caso não, é
marcado por conjunção. Existem também outros casos de relações semânticas: propósito ("quais são os
temas principais que precisam ser direcionados a fim de que a globalização encontre as expectativas do
hemisfério Sul?") e adição(existe também um consenso de que a globalização significa mais para o rico
e menos para o pobre). O texto é também caracterizado pelo "mais alto nível" da relação semântica
problema-solução, como apontei no capítulo 5. Relações gramaticais entre orações são
predominantemente paratáticas.
O tipo de troca predominante é conhecidamente permutável e a função discursiva é declaração.
Há duas questões: a primeira parte do título (como pode a globalização distribuir os bens: a visão do
sul) e a última sentença do parágrafo em questão. Existem, é claro, questões respondidas no próprio
186
texto, mas com certas características dialógicas. Muitas sentenças são "reais" (fatos), mas há
predições "irreais", notadamente as duas sentenças do parágrafo final ("líderes farão coisas mais fáceis
pelo esforço de um bom governo", "maior transparência...ajudarão a fazer com que o processo pareça
mais humano"). A relação metafórica mais óbvia é entre sentenças de fato e avaliações - um número de
sentenças de fato pode ser lido como avaliações implícitas (ex. globalização amplia escolha e liberdade).
Porém, pode-se questionar se existe também uma relação metafórica entre troca de conhecimento e
ações de troca, já que algumas sentenças óbvias são também exigidas, o que na visão de Habermas é um
texto estrategicamente velado, o que chamei nos capítulos 5 e 6 de "relatos de hortatória". O modo
gramatical é predominantemente declarativo, além das duas questões que são interrogativas.
Fiz algumas considerações nos exemplos sobre discursos no capítulo 3 (ver página). Os
principais temas incluem: mudança econômica (globalização), processo de governar (global e nacional),
visões de globalização (Sul), resistência política à globalização. Um ponto a ser observado é que
mudanças econômicas e de governo não são representadas em termos especializados, mas sim em
termos laicos - em princípio como "distribuidores de bens" e por fim como "vozes" de países em
desenvolvimento "sendo ouvidas" e tendo o que dizer. Um dos e-mails carrega vozes sendo ouvidas e
descreve isso como "condescendente", considerando os países em desenvolvimento como Estados
clientes. A expressão hoje ocorre em uma relação de equivalência: requer que países em
desenvolvimento estejam plenamente envolvidos no gerenciamento da economia global e que suas vozes
sejam ouvidas. A primeira expressão pode estar se referindo à representação do governo em termos de
um discurso especializado em "governança", que envolve o governar sendo representado como um
"administrador". A segunda é, como disse, uma expressão de linguagem comum ou laica (leiga). Isso
evoca um discurso de "participação", que é geralmente, ambivalente no que diz respeito se tais vozes são
ouvidas, ou ditas e se têm uma real influência sobre a sua capacidade de policiamento.
A articulação desses dois discursos juntos pode, de um lado, ser vista como uma estratégia
comum de "tradução" de linguagem especializada inserida em uma linguagem comum para um público
não especializado. Mas pode ser vista, também, por outro lado, em termos de uma ambivalência e
contradição na proporção que "envolve' os países em desenvolvimento no gerenciamento global. Isso
talvez é o que está em foco é o "envolvimento" que não afeta o poder de um grupo de elite do Estado na
imposição de uma agenda global. Além disso, a questão de participação parece ser central para esse
exemplo em vários níveis. Um pode ser colocado em termos da seguinte questão: é o enfoque de
participação do "Sul" em um "governo global", ou uma aparente abertura na deliberação do Fórum
Econômico Mundial na participação da sociedade civil ou que não passa de uma farsa? A participação é
um cultivo de formas democráticas inconsistentes(superficiais) inseridas nas mesmas relações exclusivas
187
de poder que pode ser continuada? A participação é somente no discurso, no texto e mesmo assim
meramente retórica?
A mudança econômica é representada em termos de uma liberação de mercado neo-liberal. Isso
inclui uma narrativa caracterizadora que um programa de ajuste estrutural conduzirá a investimentos
atrativos e crescimento (não realizado no caso de Gana como foi comentado aqui) e vendo os efeitos
positivos da "globalização" como "oportunidade" e os negativos como mudanças (implicando tais
problemas serem não insuperáveis). Contudo, a mudança econômica é também representada em termos
de um discurso de uma "anti-globalização" que representa globalização ainda em uma linguagem laica
(leiga) como no significado de "mais para o rico e menos para o pobre". Algo que pode ser notado é a
articulação do discurso com o que pode se chamar a representação parcialmente psicologizada das
visões da globalização do Sul - existe uma "referência" que a globalização significa 'mais para o rico e
menos para o pobre', assim como mais preocupante e 'receosa' homogenização cultural. De maneira
geral, as representações neo-liberais de globalização são asseguradas ou atribuídas nas falas das pessoas
enquanto as representações de oposição e de crítica são construídas em termos de um processo
mental(medos, receios, inquietações etc).
Direcionando mais para os aspectos específicos, os eventos sociais são representados de forma
abstrata e de forma generalizada, apesar de haver alguma redução no nível de abstração quando eventos
específicos (o estabelecimento do grupo dos 20) e casos (Gana) são comentados. Existe uma gama de
tipos de processos, porém o mais comum nas orações principais é o processo relacional de ambos os
tipos. Há também um número de processos mentais (ex: 'homogenização cultural preocupa muito') como
mencionei acima e processos verbais ('outros discordam'). Existem processos materiais, mas são
principalmente metafóricos (ex.: pode-se ver "a imposição da agenda global" no parágrafo 3 como um
processo relacional, "está em controle" construído metaforicamente como um processo material). A
freqüência dos processos relacionais nas orações principais podem estar ligados à densidade da
nominalização, a construção metafórica de processos como entidades. Por exemplo, "a criação do grupo
dos 20 foi um passo na direção correta" tem um tipo de processo relacional que classifica um
nominalizador ("o estabelecimento do grupo dos 20") com relação ao outro ("um passo na direção
correta"). Nominalização está vinculada a uma representação abstrata de eventos e a exclusão de
elementos dos eventos. Tome como exemplo "as mudanças sociais que caracterizam o hemisfério Sul'.
Uma representação mais concreta dos eventos poderia estar se referindo a incluir diferentes grupos
sociais e as relações entre eles, e talvez como a globalização afeta relações de poder local no "Sul" no
que concerne a termos colocados aqui 'mais para o rico e menos para o pobre'. É uma omissão do que se
leva por meio das respostas de e-mails.
188
Os principais atores sociais são países (Estados) e, especialmente, grupos de países
representados como atores sociais coletivos(como localização geográfica, modos de falar) são
classificados (países em desenvolvimento, países industrializados) e nomeados (Gana, Estados Unidos e
Europa) pode-se também ter a expressão 'o Sul", "o hemisfério Sul" e o "mundo em desenvolvimento"
como nome. A política de contestação ao nomear é claro, nesse caso, como já falei, por exemplo, em
relação a países em desenvolvimento como a Austrália, que estão no hemisfério Sul e é discutível se
esses países são representados como "em desenvolvimento". Onde eles estão classificados, a
representação é genérica ao invés de específica e ocorre o mesmo em relação a outros grupos de atores
sociais representados: líderes (ou governantes), contestadores, o rico e o pobre. Representações
genéricas contribuem para a universalização hegemônica de uma representação particular. Há também
uma má definição de categoria de ator social, talvez "o povo do Sul" pense nunca ser nomeado dessa
forma (o mais próximo seria muitos no mundo em desenvolvimento) os quais aparecem nas formas
quantificadoras - muitos, alguns, outros.
Em termos de representação do espaço-tempo, uma posição vê o texto como de preferência
paradoxal de relação universal espaço-tempo global com um espaço-tempo regional, que é tanto pela
definição incluída dentro da forma, contudo também fora dela. Existe um movimento entre afirmações e
reivindicações, que são espaço-temporariamente especificadas, com respeito para o “sul”, e afirmações e
reivindicações que não o são, que têm escopo “global”. Essas conexões eu chamei anteriormente sob
uma implícita relação protagonista-antagonista: o movimento das reivindicações do antagonista para as
reivindicações do protagonista é simultaneamente um movimento do espaço-tempo regional do “sul”
para o espaço-tempo global. Dessa forma, por exemplo, a pretensão de que “economias que são mais
transparentes tendem a ter rendas desiguais inferiores” (e o fim do parágrafo 4) tem um escopo global.
A questão do estilo é complicada por uma ambivalência sobre autoria a que eu anteriormente
referi. Nós podemos ver isso nos termos de distinção entre “principal”, “autor” e animador” de Goffman
(1981), que eu brevemente introduzi no Capítulo 1. Em particular, o que é a conexão entre o autor deste
texto, no sentido da pessoa (ou pessoas, sejam coletivamente autores) que são responsáveis pela redação
do texto, e “principais”, aqueles cujas posições são representadas? É o autor meramente que relata as
posições daqueles “principais” do “Sul” que contribuíram para o debate, que é aparentemente o caso, ou
existe também uma voz autoral no sentido de que o autor é o falante em nome de e como uma parte do
outro “principal” não-identificado, talvez o (liderança do) Fórum Econômico Mundial mesmo? Se é isto,
nós podemos dizer que existe uma mistura de estilos: o autor como repórter e o autor como protagonista.
Quanto à modalidade, existe uma combinação das modalidades epistêmicas e deônticas, com a
anterior predominante. A maioria das modalidades epistêmicas são asserções não-modalizadas (ex:
189
“globalização é agora um termo carregado”, “Outros discordam com a noção”), marcando fortes
compromissos com a verdade, quer a verdade do que é dito ou em debate, ou a verdade do que é
acontecimento no mundo. Existe uma afirmação modalizada compromissada (“a integração... não
poderia ser fácil...”), e uma afirmação modalizada alta-compromissada que é ambivalente entre
modalidade epistêmica (“não-possível”) e modalidade deôntica (“não-permissível) (“Os Estados Unidos
e a Europa podem não mais ordenar a agenda global por eles próprios”). Existem também duas fortes
predições com o verbo auxiliar “will” (líderes farão coisas facílimas pelo esforço para uma boa
governança”). Existem várias modalidades deônticas modalizadas altamente compromissadas (por ex.,
as estruturas fundamentais de um mercado econômico... devem primeiro ter lugar) que parecem ser
associadas com a voz do protagonista.
Eu já tinha anteriormente discutido avaliação em termos de pressuposições valorativas e
sugerido que o texto é posicionado dentro de um sistema valorado neoliberal. Com respeito aos estilos e
identificação, isso é um problema de compromisso autoral com valores neoliberais, contudo, a
ambivalência de autoria não é clara quanto a qual dos dois são os compromissos dos “principais”, que
contribuíram para o debate, ou os compromissos da voz autoral, ou ambos. Nós podíamos dizer que
todos os envolvidos estão implicitamente posicionados dentro deste sistema de valores, que é caminho
controverso.
Vamos repetir que esta análise não é exaustiva. Como eu argumentei no Capítulo 1, nós podemos
assumir que nenhuma análise de um texto pode nos dizer tudo o que ele pode dizer sobre algo. Em
críticos termos realistas, podemos distinguir o “atual” do “empírico”, e não assumir que a natureza real e
as propriedades dos eventos e textos são exauridos pelo que nós podemos ver neles de uma perspectiva
particular a um ponto particular no tempo. Mas o que essa análise tem confiantemente mostrado como
diferentes categorias e perspectivas analíticas podem ser produtivamente combinadas para realçar nossa
capacidade para ver coisas nos textos. Por exemplo, eu tenho argüido que o tema central no caso deste
texto é que isso é meramente um repórter em debate, ou uma refutação na parte de um “protagonista”
das “visões” de um “antagonista”. Um número de categorias analíticas sustenta esta questão: a
ambivalência é evidente na identificação do gênero, na análise das orientações para diferenças, na
atribuição das vozes, na identificação de tipos de mudanças, na distribuição dos tipos de processos
mentais, na identificação de estilos, nos compromissos associados com modalidade e avaliação.

Manifesto para análise crítica de discurso


190
Como eu pontuei no Capítulo 1, este livro tem interesse em uma pequena parte do que vi
como um amplo projeto – análise crítica de discurso (daqui por diante, ADC), como uma forma de
pesquisa social crítica. A pesquisa social crítica inicia com questões tais como estas: como as sociedades
existentes abastecem as pessoas com possibilidades e recursos para enriquecer e satisfazer vidas, como,
por outro lado, eles denegam a pessoas essas possibilidades e recursos? O que é isso sobre sociedades
que produzem pobreza, privação, miséria e insegurança nas vidas das pessoas? Que possibilidades
existem para mudanças sociais que reduzam esses problemas e acentuem a qualidade de viver dos seres
humanos? A contribuição da pesquisa social crítica é para melhor compreensão de como as sociedades
trabalham e produzem tantos efeitos benéficos como maléficos, e como os efeitos maléficos podem ser
mitigados, se não eliminados.
A pesquisa social crítica propõe mudar seus programas de pesquisa para tentar responder a
grandes questões e problemas do dia. Muitas dessas pesquisas estão agora focalizando sobre o “novo
capitalismo” – transformações contemporâneas do capitalismo, “globalização”, neoliberalismo e assim
por diante –, uma melhor compreensão dessas mudanças e seus efeitos, e das possibilidades para
inflectá-los em direções particulares, ou resistir a eles e desenvolver alternativas, que é amplamente
visto como crucial para desenvolver a condição humana. Existem vencedores e existem perdedores
nessas transformações sociais. Entre os perdedores: uma crescente lacuna entre ricos e pobres, menos
segurança para a maioria das pessoas, menos democracia e maiores danos ambientais. Existe agora um
desenvolvimento perceptivo, não só na política da esquerda, mas pelas amplas seções de opinião em
muitos países em todas as partes do mundo, que se os mercados não forem reprimidos, os resultados
serão desastrosos. Eu brevemente discuti Linguagem no novo capitalismo como um programa de
pesquisa para ADC no Capítulo 1. Eu estou centrando este “manifesto” nos programas de pesquisa,
portanto eu enfatizaria que as pretensões da ADC como uma investigação na pesquisa social não estão
de todo limitadas a suas contribuições para pesquisa do novo capitalismo e podem ser feitas em termos
amplos (como em Fairclough, 1991, por exemplo). E eu chamo isto de um “manifesto” porque eu
começo a partir político para esta pesquisa.
Mas por que eu enfoco a linguagem e o discurso na pesquisa crítica do novo capitalismo? Nós
podemos encontrar convicções do argumento de que a pesquisa social crítica concentra seus esforços nas
transformações do capitalismo e suas ramificações, mas nós necessitamos marcar o caso para um foco
significante na linguagem. Um argumento seria que, desde que essas mudanças estejam transformando
muitos aspectos da vida social, então estão necessariamente transformando a linguagem como um
elemento da vida social, que é dialeticamente interconectado com os outros. Mas esse não é um
argumento forte. O ponto mais significante é que o elemento lingüístico tem um certo elemento-chave
191
que se faz mais saliente, mais importante do que é usado para ser, e de fato um aspecto crucial das
transformações sociais que estão vindo – ninguém pode marcar o sentido delas sem refletir sobre
linguagem.
Não é necessário ser um analista de diiscurso para pensar isso. Muitos pesquisadores sociais com
formação em diferentes disciplinas têm dito a mesma coisa. Por exemplo, o distinto sociólogo francês
Pierre Bourdieu, nos últimos anos de sua vida, escreveu um número de peças sobre o neoliberalismo,
principalmente para leitores não-especialistas, em que ele enfatizou a importância do discurso neoliberal
no projeto político do neoliberalismo – um projeto, como ele disse, cujo principal propósito é remover
obstáculos (sejam eles Estados em que o bem-estar dos cidadãos é conseguido pelos esforços
organizados do governo e não pelas organizações privadas, sindicatos combativos, seja o que for) para
as transformações do Novo Capitalismo. Bourdieu e Wacquant (2001), por exemplo, chamam a atenção
para um “novo texto, geralmente aceito, terrestre”, que eles caracterizam como um vocabulário
(“globalização”, “flexibilidade”, governabilidade”, “empregabilidade”, “exclusão”, e assim por diante),
que “é dotado com o poder performativo para trazer para a sua existência as muitas realidades que
reclamam ser descritas”. O projeto político neoliberal de remover obstáculos para a nova ordem
econômica é nessa narrativa, até certo ponto, orientado ou dirigido pelo discurso. Alguém poderia ver
um realçado papel para o discurso na iniciada troca social como implícito nas caracterizações das
economias contemporâneas como “conhecimentos econômicos”, ou das sociedades contemporâneas
como “conhecimento ou informações societais”. A maior ênfase do “conhecimento” ou “informação”
nas trocas e processos econômicos ou sociais equivalem, em termos práticos, para a maior ênfase da
linguagem e discurso – isto é, a forma em que “conhecimento” é produzido, distribuído e consumido (eu
anexei isto de novo abaixo).
Tanto quanto como indicado, o significado da linguagem nessas transformações
socioeconômicas, os ensaios de Bourdieu e Wacquant mostram que pesquisa social precisa da
contribuição do analista de discurso. Iso não é suficiente para caracterizar o “novo texto, geralmente
aceito, terrestre” como uma lista de palavras, um vocabulário, como eles fizeram. Nós necessitamos
analisar textos e interações para mostrar como alguns efeitos que Bourdieu e Wacquant identificam são
resgatados. Isso inclui marcar as transformações socioeconômicas do novo capitalismo e as políticas dos
governos para facilitá-las parecem inevitáveis; representar anseios como fatos; representar os
imaginários das políticas interessadas como a forma que o mundo atualmente é. Eu tenho falado sobre
alguns desss travos nos capítulos deste livro. A exposição de Bourdieu e Wacquant sobre a efetividade
do discurso neoliberal ultrapassa a capacidade dos métodos da sua pesquisa sociológica. Isto é, ao
mesmo tempo, uma apreciação do trabalho deles e uma crítica, no espírito dialogicamente trabalhado
192
com isso: ADC pode acentuar isso, exatamente engajando com a teoria e pesquisa de Bordieu pode
acentuar ADC. Isto é, na verdade, por outro lado, reconhecer que aquilo que freqüentemente os teóricos
sociais produzem, a maioria dos insights críticos interessantes sobre linguagem, como um elemento da
vida social, contudo, por outro lado, trocando-os e ajudando-os a se comprometerem com a linguagem
de um modo mais concreto e detalhado do que eles geralmente fazem. Fora análises detalhadas, alguém
não pode realmente mostrar que a linguagem é fazer o trabalho de um modo teoricamente atribuído para
isso. Para falar sobre o ponto contenciosamente, é hora de os teóricos e pesquisadores sociais emitirem
nas suas promissoras notas algo sobre a importância da linguagem e do discurso na vida social
contemporânea.
Então o que um pouco de aproximação com a linguagem pode melhor ir ao encontro das
necessidades do pesquisador crítico social? Eu irei agora mostrar brevemente como a ADC (mais
especificamente que a versão particular da ADC que eu tenho desenvolvido – ver Fairclough e Wodak,
1997 para uma comparação de diferentes versões) pode fazer essa contribuição. Algo do que eu irei
dizer foi apresentado anteriormente no livro, mas o objetivo agora é permitir maior compreensão do
perfil da ADC.

Temas teóricos
Análise crítica de discurso é baseada em uma visão de semiose como um elemento irredutível de
todos os processos sociomateriais (Willhiams, 1977). Nós podemos ver vida social como redes
interconectadas de práticas sociais, de diversas classes ( econômica, política, cultural, familiar etc). A
razão de centrar o conceito de “prática social” é que isto permitirá a oscilação entre a perspectiva da
estrutura social e a perspectiva da ação e da agência social – ambas perspectivas necessárias na pesquisa
e análises sociais (ver Cap. 2, e Chouliaraki e Fairclough, 1999). Por “prática social”, eu quero dizer
uma forma relativamente estabilizada de atividade social (exemplos: ensino nas salas de aula, notícias
televisivas, refeições familiares, consultas médicas). Toda prática é uma articulação dos diversos
elementos sociais dentro de configuração relativamente estável, sempre incluindo discurso. Vamos dizer
que toda prática inclui os seguintes elementos: atividades, sujeitos e outras relações sociais,
instrumentos, objetivos, tempo e lugar, formas de conhecimentos, valores, discurso.

Atividades
Sujeitos e suas relações sociais
Instrumentos
Objetos
193
Tempo e espaço
Formas de conscientização
Valores
Discurso
Esses elementos são dialeticamente relatados (Harvey, 1996 a). Isso é: eles são diferentes
elementos, mas não distintos, ou elementos inteiramente separados. Existe um sentido em que cada um
internaliza os outros, sem ser redutível por eles. Assim, relações sociais, identidades sociais, valores e
conhecimentos culturais, entre outros, são em parte discursivos, mas isso não significa que nós
teorizamos e pesquisamos relações sociais, por exemplo, do mesmo modo que nós teorizamos e
pesquisamos linguagem. Elas têm propriedades distintas, e, pesquisando-as, dão origem a distintas
disciplinas. Todavia, é possível e desejável trabalhar por meio das disciplinas no modo
“transdisciplinar” (ver Fairclough, 2000 a).
ADC é a análise das conexões dialéticas entre discurso (incluindo linguagem, mas também outras
formas de semiose, por exemplo, linguagem corporal ou imagens visuais) e outros elementos das
práticas sociais. Seu interesse particular é com as trocas radicais que se sucedem na vida social
contemporânea: como figuras discursivas dentro dos processos de mudanças, e com mudanças na
relação entre discurso e mais amplamente semioses e outros elementos sociais dentre das redes de
práticas. Nós não podemos supor o papel dos discursos nas práticas sociais, isso é para ser estabelecido
por meio da pesquisa. E discurso pode ser mais ou menos importante e saliente em uma prática ou
conjunto de práticas do que em outras, e pode trocar sua importância ao longo do tempo.
Discurso figura amplamente de três modos nas práticas sociais. Primeiro, figura como uma parte
da atividade social dentro da prática. Por exemplo, parte do fazer um trabalho (por exemplo, ser um
assistente de loja) é usar a linguagem de um modo particular; assim também é parte de governar um
país. Segundo, discurso figura em representações. Atores sociais dentro de qualquer prática produz
representações de outras práticas, assim como (“reflexivas”) representações de suas próprias práticas, no
curso da atividades deles dentro da prática. Eles “recontextualizam” outras práticas (Bernstein 1990;
Chouliaraki e Fairclough, 1999) - isto é, eles os incorporam para dentro de suas próprias práticas -, e
diferentes atores sociais os representarão diferentemente conforme eles estejam posicionados dentro da
prática. Representação é um processo de construção social de práticas, incluindo a reflexiva construção
de si mesmo – representações penetram e moldam processos e práticas sociais. Terceiro, discurso figura
em modos da pessoa, na constituição das identidades – por exemplo, a identidade do líder político como
Tony Blair na Grã-Bretanha é particularmente um modo de ser constituído discursivamente.
Discurso como parte da atividade social constitui gêneros. Gêneros são os diversos modos de
agir, de produzir vida social, no modo semiótico. Exemplos são: conversação diária, encontros em vários
194
tipos de organização, entrevista política e outras formas de entrevista, e livros. Discurso na
representação e a própria representação das práticas sociais constituem discursos (note a diferença entre
“discurso” como um nome abstrato e “discurso(s)” como um nome contável). Discursos são diversas
representações da vida social que são inerentemente posicionadas – diferentemente posicionados, atores
sociais “vêem” e representam vida social de diferentes formas, diferentes discursos. Por exemplo, as
vidas do povo pobre e em desvantagem são representadas por intermédioo de diferentes discursos nas
práticas sociais do governo, políticos, medicina e ciência social e por meio de diferentes discursos, que,
dentro de cada uma dessas práticas, correspondem a diferentes posições de atores sociais. Finalmente,
discurso como parte das formas de ser constitui estilos – por exemplo, os estilos dos gerentes de
negócios ou líderes políticos.
Práticas sociais entrelaçadas de uma determinada forma constituem uma ordem social – por
exemplo, a emergente ordem neoliberal global referido anteriormente, ou nível mais local, a ordem
social da (“o campo da”) educação em uma sociedade particular em um tempo particular. O aspecto
discursivo/semiótico da ordem social é o que podemos chamar de “ordem do discurso”. É a forma em
que diversos gêneros e discursos e estilos são entrecruzados simultaneamente. Na ordem do discurso, é
uma estruturação social da diferença semiótica – uma ordem social particular de conexões entre
diferentes modos de produzir significado, isto é, diferentes discursos, gêneros e estilos. Um aspecto
desta ordem é predominante: algumas formas de produzir significado são dominantes ou estruturas
numa ordem de discurso particular, outros são marginais, ou opositivos, ou alternativos. Por exemplo,
deverá haver um modo dominante para conduzir uma consulta doutor-paciente na Bretanha, mas existem
também várias outras formas, que podem ser adotadas ou desenvolvidas para um maior ou menor
alcance em oposição à forma dominante. A forma dominante provavelmente, todavia, manterá a
distância social entre doutores e pacientes, e a autoridade do doutor sobre a forma em que a interação
tem seguimento, mas existem outras formas que são mais “democráticas”, em que doutores jogam para
baixo sua autoridade. A concepção política da “hegemonia” pode utilmente ser usada na análise das
ordens do discurso (Butler et al. 2000; Fairclough, 1992; Laclau and Mouffe, 1985). Uma particular
estrutura social de diferença semiótica tornaria hegemônica, transformaria parte do senso comum
legitimado em que se sustentam as relações de dominação, pois a hegemonia sempre será contestada
para uma maior ou menor alcance na luta hegemônica. Uma ordem do discurso não é sistema rígido ou
fechado, mas, sem dúvida, um sistema aberto, que é posto em risco pelo que acontece nas interações
atuais.
Eu disse anteriormente que as conexões entre discurso e outros elementos das práticas sociais são
uma relação dialética – discurso internaliza e é internalizado por outros elementos dentro de diferentes
195
elementos existentes, redutível a cada outro. Eles são diferentes, mas não distintos. Se nós
pensarmos a dialética do discurso em termos históricos, em termos de processos de mudança social, a
questão que surge é: em que formas e em que condições os processos de internalização têm lugar.
Tiramos o conceito de “conhecimento econômico” e “conhecimento de sociedade”. Isso sugere uma
mudança qualitativa em economias e sociedades tal que processos econômicos e sociais são
conhecimento-dirigido – a troca se sucede em processo cada vez mais rápido, por intermédio da geração,
da circulação e da operacionalização de conhecimentos em processos econômicos e sociais. É claro que
conhecimento (ciência, tecnologia) tem, por longo tempo, sido fatores significantes em troca econômica
e social, mas o que é substancial apontar é uma dramática ampliação no seu significado. A relevância
dessas idéias aqui é que “conhecimento-dirigido” soma a “discurso-dirigido”: conhecimentos são
gerados e circulados como discursos, e o processo por meio do qual discursos fazem-se
operacionalizados em economias e sociedades é precisamente as dialéticas do discurso.
Discursos incluem representações de como as coisas são e têm sido, assim como as imaginárias –
representação do como coisas poderiam ou seriam ou deveriam ser. Os conhecimentos do
conhecimento-econômico e do conhecimento-sociedade são imaginários neste sentido – projeções dos
estados possíveis de interesses, “possíveis mundos”. Em termos do conceito da prática social, eles
supõem possíveis práticas sociais e redes de práticas sociais – possíveis sínteses de atividades, sujeitos,
relações sociais, instrumentos, objetos, tempo-espaço (Harvey, 1996 a), valores, formas de
conhecimento. Esses imaginários podem ser decretados como atuais (redes das) práticas - atividades,
sujeitos, relações sociais etc imaginados podem ser atividades, sujeitos, relações sociais etc reais. Tais
decretações incluem materializações dos discursos – discursos econômicos materializam-se, por
exemplo, nos instrumentos da produção econômica, incluindo o “hardware” (planta, maquinaria etc) e o
“software” (sistemas de administração etc). Tais decretações são também em parte por eles próprios
discursivos/semióticos: discursos decretados como gêneros. Considerar, por ex., novos discursos
administrativos que supõem sistemas administrativos fundados no “trabalho de equipe”, relativamente
não hierárquicos, entrelaçados, modos de fazer organizações. Eles foram decretados discursivamente
como novos gêneros, por exemplo, gêneros para encontros. Tais decretações especificamente discursivas
são embutidas dentro da sua decretação como novos modos de agir e interagir nos processos produtivos,
possivelmente decretações materiais em novos espaços (por exemplo, salas de seminários) para
atividades de equipe.
Discursos como imaginários também podem ser inculcados como novas formas de ser, novas
identidades. É comum que as novas formações econômicas e sociais dependam de novos sujeitos, por
exemplo, “Taylorismo” como um sistema produtivo e administrativo depende de trocas nos modos de
196
ser, das identidades, dos trabalhadores (Gramsci, 1071). O processo de “mudança de sujeito” pode
ser por meio da inculcação de novos discursos – Taylorismo seria um exemplo. Inculcação é, na
verdade, no jargão corrente, pessoas que se voltam para os “próprios” discursos, para posicionar eles
mesmos dentro deles, para agir e pensar e falar e ver a si mesmos em termos dos novos discursos.
Inculcação é um processo complexo, e provavelmente menos seguro que decretação. Uma etapa com
respeito à inculcação é a distribuição retórica: pessoas podem aprender novos discursos e usá-los por
certas razões enquanto, ao mesmo tempo, constrangidamente conservam distância deles. Um dos
mistérios das dialéticas do discurso é o processo em que o que começa como disposição retórica inibida
torna-se “propriedade” – como pessoas tornam-se involuntariamente posicionadas dentro do discurso.
Inculcação também tem seus aspectos materiais: discursos são dialeticalmente inculcados não somente
em estilos, modos de usar linguagem, eles são também materializados em corpos, posturas, gestos,
modos de mover e assim por diante.
O processo dialético não tem fim com a decretação e a inculcação. Vida social é reflexiva. Isto é,
pessoas não só agem e interagem dentro de redes de práticas sociais, elas também interpretam e
representam a si mesmas e a cada outro que eles interagem, e essas interpretações e representações
moldam e remoldam o que elas produzem. Além disso, se nós pensarmos especificamente em práticas
econômicas em sociedades contemporâneas, as atividades pessoais são constantemente interpretadas e
representadas pelos outros, incluindo várias categorias de experts (ex.: consultores administrativos) e
cientistas acadêmicos sociais (incluindo analista de discurso). O que isso significa é que modos de
(inter)agir e modos de ser (incluindo os aspectos discursivos, gêneros e estilos) são representados nos
discursos, que contribuirão para a produção de novos imaginários, que sucessivamente podem ser
decretados e inculcados. Assim, isso continua, um dialético que vincula atividades através de diversos
elementos sociais, incluindo atividades entre o material e o não-material, e atividades dentro do discurso
entre discursos, gêneros e estilos.
Nada é inevitável nas dialéticas do discurso como eu tenho descrito isso. Um novo discurso pode
adquirir uma instituição ou organização sem ser decretado ou inculcado. Isso pode ser decretado,
contudo, sem nunca ser completamente inculcado. Exemplos existem em abundância. Por exemplo,
discursos administrativos têm sido inteiramente extensivelmente decretados dentro das universidades
britânicas (por exemplo, como procedimentos de avaliação do staff, inclusive um novo gênero de
“entrevista de avaliação”), já argumentavelmente a extensão da inculcação é muito limitada – a maioria
dos acadêmicos não fazem “próprios” esses discursos administrativos. Nós temos que considerar as
condições de possibilidade para, e as repressões nas, as dialéticas do discursos em casos particulares.
Isso tem um suporte nas teorias do “construcionismo social” (Sayer, 2000). É consenso na
197
contemporânea ciência social que entidades sociais (instituições, organizações, agentes sociais etc)
são ou têm sido constituídas por meio dos processos sociais e um entendimento comum desses processos
clareia a efetividade dos discursos, como eu tenho feito anteriormente: entidades sociais são em alguns
sentidos efeitos dos discursos. Onde o construcionismo social se faz problemático é onde isso
negligencia a relativa solidez e permanência das entidades sociais, e sua resistência para mudar.
Igualmente, idênticos poderosos discursos, tais como os novos discursos da administração podem
encontrar níveis de resistência, cujo resultados não devem ser decretados nem inculcados em nenhum
grau. Ao usar uma teoria dialética do discurso na pesquisa social, necessita-se tomar em consideração,
caso a caso, as circunstâncias às quais condicionam-se e em que grau entidades sociais são resistentes a
novos discursos.

Método
O quadro seguinte mostra um quadro esquemático como uma forma de linguagem crítica (ver
Chouliaraki e Fairclough, 1999 para discussão ampla). Isso é uma versão da “crítica explanatória”
desenvolvida por Bhaskar (1986).

1. Focalizar um problema social que tem um aspecto semiótico. Primeiramente, um problema social
em vez da convencional “questão de pesquisa” de acordo com o propósito crítico dessa
aproximação – para produzir conhecimento que pode conduzir à troca emancipatória.

2. Identificar os obstáculos a serem atacados, por intermédio da análise:


a. da rede de práticas dentro da qual está localizada;
b. da conexão da semiose com outros elementos dentro da(s) prática(s) particular(es)
concernente(s),
c. do discurso (a semiose) por si:
i – análise estrutural: a ordem do discurso
ii – análise interacional/textual – tanto a análise interdiscursiva e a análise lingüística (a
semiótica).
O objetivo aqui é entender como o problema se apresenta e como isso é radicado no modo em
que a vida social está organizada, pela focalização dos obstáculos para sua resolução – nas
marcas mais ou menos intratáveis.
198
3. Considerar se a ordem social (rede de práticas) “necessita” do problema. O ponto aqui é para
perguntar se aqueles que se beneficiam do modo de vida social em que está agora organizada têm
um interesse em o problema não ser resolvido.

4. Identificar possíveis modos passados dos obstáculos. Este estágio na estrutura é um


complemento crucial para o estágio 2 – isto procura até agora possibilidades não-realizadas de
trocar o meio da vida social em que está atualmente organizada.

5. Refletir criticamente a análise (1-4). Isso não é rigorosamente parte explanatória crítica de
Bhaskar. Mas isto é uma importante adição que requer do analista a reflexão de onde ele/ela
vem, como ele/ela por si mesmo(a) é socialmente posicionada.

O principal foco deste livro está no estágio 2.c desse esquema, e especialmente na análise
lingüística dos textos, apesar de que eu tenho também referido à análise interdiscursiva (em termos de
hibridismo em gêneros, em discursos e em estilos) e aos aspectos das ordens do discurso (por, ex, nas
cadeias dos gêneros).
Este esquema dá algum sentido à ADC como “método”. Mais tratamentos detalhados podem ser
encontrados em Fairclough (2001 c, 2001 d, bem como 1992, 1995 a, 1995 b). Mas o método crítico
recapitulado aqui é não específico totalmente para a ADC, isto é de relevância geral na pesquisa crítica
social, é formulado aqui de um modo em que põe em primeiro plano ADC especificamente, e seu
método de análise nos passos 2 (b) e 2(c). Contudo, ADC não providencia por si mesma todas as
categorias analíticas e procedimentos que estão veiculados: muitas das categorias analíticas que eu tenho
usado neste livro vêm da Lingüística Sistêmica Funcional como eu explanei no Capítulo 1, e outros
métodos de análise lingüística tal como aqueles desenvolvidos na análise conversacional ou lingüística
pragmática seriam incluídos dentro da ADC para um maior alcance do que eu tenho indicado aqui.
Então, ADC é no sentido do método que pode apropriar outros métodos. Isso também inclui os métodos
dos corpora lingüísticos, como eu explanei no Capítulo 1.
Mas isto vai mais longe do que isso. Disso resultou meu interesse em ADC como um recurso
para a pesquisa social crítica, que é muito usada em combinação com recursos teóricos e analíticos em
várias áreas da ciência social. Por ex., existe um vigoroso caso em muitos tipos de pesquisa para usar
ADC dentro da estrutura da etnografia crítica (Chouliaraki, 1995, Pujolar, 1997, Rogers próximo), se o
primeiro interesse é para alcançar uma profunda compreensão de como as pessoas vivem dentro da nova
199
ordem capitalista (por ex., os jovens em Barcelona, no caso da pesquisa de Pujolar) e como o
discurso figura como um elemento em seus modos de viver. Uma possibilidade de tal combinação de
recursos revelar algo é pesquisando a compreensão e interpretação dos textos (ver Capítulo 1.) E ADC
pode ser efetivamente articulada com análise político-econômica e sociológica de vários tipos (Chiapello
e Fairclough, 2002, Fairclough et al. 2002). De fato, existe agora um grande número de pesquisadores
que estão tentando combinar ADC com outros recursos teóricos e analíticos. Então, enquanto ADC se
constitui em um método de análise, os métodos empregados, em qualquer parte específica da pesquisa
na qual a ADC se desenha, são provavelmente para ser uma combinação desses da ADC com outros.
Se ADC por si só é uma parte adequada da combinação de métodos usados em um projeto de
pesquisa, só pode ser decidido à luz da construção progressiva do “objeto de pesquisa”, durante o curso
do processo da pesquisa. A construção do objeto é inevitavelmente um processo teoricamente-informado
– isso envolve decisões sobre como teorizar uma área de interesse. E como Bourdieu expõe, “isso é
como uma função da construção explícita do objeto, em que um método de amostragem, uma técnica de
coletar dados e análise etc, se fazem imperativos” (Bourdieu e Wacquant 1992:225).

Resumo

Neste capítulo conclusivo, nós unimos primeiramente as variadas perspectivas analíticas e categorias
vista no livro na forma de um conjunto de questões que podem ser demandados de um texto, e nós
vimos como diferentes categorias e perspectivas podem ser produtivamente unidas em análise textual
para clarear temas de pesquisa social. Nosso segundo interesse tem sido providenciar uma estrutura de
análise textual dentro de um amplo processo de análise de discurso crítica, e isso tem sido feito na forma
de um breve “manifesto” para análise de discurso crítica como um recurso na pesquisa científica social.
200

GLOSSÁRIOS

Os glossários a seguir incluem os termos usados na análise textual e na pesquisa social que estão
presentes no livro, além dos principais teóricos mencionados. No caso das categorias-chave de pesquisa social
(por exemplo, “esfera pública”), foi feita uma síntese do que foi falado no livro. Os números que seguem os
verbetes dos glossários se referem aos capítulos nos quais os termos foram usados. Referências para leitura
adicional acompanham cada verbete; caso um verbete faça referência a outro, este estará em itálico.

Glossário de palavras-chave

Esteticização de identidades públicas (10)


A “esteticização” de áreas como a política ou os negócios ocorre quando elas deixam de ser vistas como
guiadas de acordo com princípios puramente racionais. É uma tendência, tanto dos agentes sociais nelas inseridos
como de seus analistas, observar mais os aspectos estéticos referentes às mesmas. A esteticização de identidades
públicas é a construção praticamente consciente de tais identidades (por exemplo, as identidades de políticos ou
importantes homens de negócios) de forma a criar certas “imagens”. A análise textual pode contribuir na pesquisa
relacionada a esse processo (e a outros processos mais gerais de “esteticização” da vida social, inclusive do
cotidiano) por meio da análise de aspectos estéticos (entre eles os aspectos retóricos) de textos e valores
concernentes aos mesmos. (Chouliaraki e Fairclough 1991, Featherstone 1991, Harvey 1990, Linstead e Höpfl
2000, Lury 1996)

Suposição (3)
201
Refere-se aos sentidos implícitos dos textos. Enquanto neste livro foi usado o termo “suposição”,
mais geral, vários outros termos são usados na literatura referente à pragmática e à semântica (pressuposição,
conjetura, implicação). No livro há a distinção entre três tipos de suposições: existencial, factiva e pragmática
(com respeito à existência de seu referente, qual é o caso em questão, e às condições de felicidade do ato de
linguagem, respectivamente). (Blakemore 1992, Grice 1981, Levinson 1983, Mey 1993, Verschueren 1999)

“Personagens” do novo capitalismo (10)


Os “personagens” de uma ordem social específica são seus tipos sociais mais característicos (como
exemplo, “o gerente” no novo capitalismo). A análise textual pode ser uma ferramenta importante na pesquisa
relacionada às identidades de tais “personagens” ao mostrar por meio de análise da modalidade e avaliação, por
exemplo, o que eles consideram real, verdadeiro ou desejável. Tais “personagens” podem ser vistos como uma
forma de investidura pessoal de papéis sociais (veja identidade social e personalidade) – e a análise pode revelar,
por exemplo, não somente o que torna Tony Blair um político, mas como ele toma posse desse papel. (McIntyre
1984)

Classificação (7)
De acordo com Bourdieu, classificação é uma relação entre a “visão” e a “di-visão”. Em outras palavras,
os diferentes pontos de vista acerca do mundo bem como a sua administração são resultado de formas pré-
estabelecidas e tidas como verdadeiras de divisão de partes do mundo. Diferentes discursos apresentam
classificações diferentes, logo a organização, o confronto, a argumentação e a junção de esquemas classificatórios
podem ser pesquisados por meio da análise da forma como os discursos são desenvolvidos e articulados aos textos
e então expressos em representações, significados e formas. (Bourdieu 1984, 1991, Bourdieu e Wacquant 1992,
Durkheim e Mauss 1963)

Oração (8)
Uma oração é um período simples, em oposição a um período composto que combina certo número de
orações (“ela estava atrasada”, por exemplo, é uma oração, ao passo que “ela estava atrasada porque o trem
quebrou” é um período composto que inclui a oração “ela estava atrasada”). As orações têm três tipos principais
de elementos: os processos (geralmente expressos por verbos), os participantes (sujeitos, objetos etc.) e as
circunstâncias (normalmente expressas por advérbios). (Eggins 1994, Halliday 1994, Quirk et al. 1995)

Colocação (2)
202
Colocações são padrões relativamente regulares ou usuais de co-ocorrência entre as palavras – uma
relação de “companhia entre as palavras”, segundo Firth. Para exemplificar, “pobre velho” (como em “pobre
velho homem”) é uma combinação mais comum e mais previsível do que “pobre jovem”. Estudos quanto à
colocação de palavras tiveram grande avanço nos últimos anos devido ao desenvolvimento da Lingüística de
Corpus, que permite a identificação de padrões de ocorrência conjunta em grandes corpora de textos. (Firth 1957,
Sinclair 1991, Stubbs 1996)

Ação comunicativa e ação estratégica (4,6)


A ação comunicativa é aquela destinada à troca e ao entendimento de significados (por exemplo, a
maioria das conversas), enquanto a ação estratégica está centrada na produção de efeitos (por exemplo, os textos
publicitários, cujo objetivo é a venda de bens). Essa distinção é feita por Habermas e representa uma parte
importante de sua teoria de modernização. Segundo ele, os sistemas modernos (o Estado, o mercado) são
especializados em ação estratégica, mas existe a tendência de que eles “colonizem” áreas não-sistêmicas da vida
social (a “vida COTIDIANA”) e que as ações estratégicas substituam ou se apoderem das ações comunicativas.
Tais processos são em certa parte textuais. Em vários textos contemporâneos, por exemplo, o que parece ser uma
ação comunicativa pode ser visto como uma ação estratégica oculta. (Fairclough 1992, Habermas 1984,
Outhwaite 1996)

Dialética (3)
A dialética é a uma forma de pensar e argumentar, é um método de análise. Não pode ser
satisfatoriamente reduzida a um procedimento analítico definido, mas pode ser vista como uma forma de
interpretação de certas pressuposições ou princípios ontológicos e epistemológicos. Entre os mais importantes
destes está o fato de que processos, fluxos e relações têm prioridade sobre outros elementos, coisas, estruturas
etc., estes sendo produzidos a partir daqueles como “estabilidades” relativas; que as “coisas” são internamente
heterogêneas e contraditórias por causa dos vários processos que as produzem; e que a mudança provém da
contradição intrínseca a essas “coisas”, estruturas e sistemas. (Harvey, 1996a, Levins e Lewontin 1985, Ollman
1993)

Dialogismo (3)
De acordo com a concepção de linguagem de Bakhtin, seguida pela análise de discurso crítica, todos os
textos (tanto escritos como falados) são dialógicos, ou seja, eles estabelecem, de uma forma ou de outra, relações
entre as diferentes “vozes”. Entretanto, os textos não são igualmente dialógicos. O dialogismo é uma medida do
âmbito no qual há relações dialógicas entre a voz do autor e outras vozes, do âmbito no qual essas vozes são
203
representadas ou, ao contrário, excluídas ou suprimidas. Esse aspecto textual pode ser abordado por meio da
distinção entre várias orientações diferentes. (Veja o verbete diferença social). (Bakhtin 1981, 1986a, 1986b,
Fairclough 1992, Holquist 1981, Gardiner 1992)

Discurso e discursos (2, 7)


O termo “discurso” é usado nas ciências sociais de várias formas, normalmente sob a influência de
Foucault. O termo é usado de um modo geral na área da linguagem (assim como, por exemplo, nas imagens
visuais) como um elemento da vida social dialeticamente relacionado a outros elementos. “Discurso” também tem
uso mais específico: diferentes discursos são formas diversas de representação de aspectos do mundo. Neste livro,
a análise do discurso é usada de forma a acarretar uma detalhada análise lingüística dos textos, o que não é o que
propriamente ocorre de acordo com a tradição de Foucault. (Chouliaraki e Fairclough 1999, Foucault 1984,
Laclau e Mouffe 1985, Van Dijk 1997, Wetherell et al. 2001a, 2001b)

Desencaixe (4)
Refere-se a um processo sócio-histórico no qual os elementos desenvolvidos em determinada área da vida
social são deslocados de um contexto específico, podendo ser inseridos em outros contextos. Esse processo é uma
característica marcante da globalização. Os gêneros (por exemplo, os diversos tipos de entrevistas) podem ser
desencaixados e transformados em um tipo de tecnologia social que pode ser usada em diferentes áreas e em
diferentes níveis da vida social. (Giddens 1991)

Equivalência e diferença (5)


Os processos sociais de classificação podem envolver duas “lógicas” simultâneas: uma lógica de
diferença que cria diferenças, e outra de equivalência que destrói as diferenças e cria novas equivalências. Esse
processo é visível nos textos: a formação do sentido envolve colocar palavras e expressões em novas relações de
equivalência e diferença. (Fairclough 2000a, Laclau e Mouffe 1985)

Avaliação (2, 10)


Refere-se ao aspecto do significado de um texto relacionado aos valores. Inclui tanto as declarações de
avaliação explícitas (por exemplo “aquela é uma camisa bonita”) e suposições valorativas. Os valores no texto são
mais supostos do que explícitos. Há uma certa tendência em negligenciar as questões de valor na análise textual,
mas chamar a atenção para elas permite que tal análise contribua para essas discussões na pesquisa social como
204
forma de legitimação. (Graham, 2002; Hunston e Thompson, 2000; Lemke, 1998; Van Leeuwen e Wodak,
1999; White, 2001.)

Tipos de troca (6)


Uma “troca” é, em sua forma mais simples, um diálogo entre diferentes falantes, embora o conceito possa
ser ampliado à linguagem escrita. Existem dois tipos principais de troca: troca de conhecimento, que implica troca
de informações (por exemplo, “Isso é um papagaio?”, “É sim”), e trocas de atividades, destinadas às ações (como
“Me dê uma bebida”, “Aqui está”). Ambos tipos de troca envolvem diferentes funções do discurso. (Martin 1992)

Estrutura genérica (3)


Trata-se da estrutura global ou organização de um texto, dependendo do gênero principal sobre o qual o
texto é redigido. Para ilustrar isso, as notícias do jornalismo geralmente apresentam a seguinte estrutura: título +
parágrafo principal + parágrafos secundários (nos quais o título é desenvolvido e enriquecido com os detalhes da
história). Alguns textos – em especial os textos institucionais com objetivos claros – apresentam uma estrutura
genérica bem definida, enquanto outros já não a têm. (Halliday e Hasan 1989, Hasan 1996, Martin 1992, Swales
1990)

Gêneros (2,4)
Um gênero é uma forma de ação em seu aspecto discursivo – por exemplo, existe uma série de gêneros de
entrevistas, entre eles a entrevista para obtenção de um emprego. Os gêneros podem ser identificados em
diferentes níveis de abstração: “pré-gêneros” altamente abstratos como a narrativa ou o relatório, os quais fazem
generalizações sobre várias formas diferentes de narrativa e informam em um nível mais concreto; gêneros
desencaixados (veja verbete para desencaixe) e gêneros situados que estão ligados a certas redes de práticas
sociais (entre eles o gênero da entrevista política na atual televisão americana ou britânica). (Bakhtin 1986a,
Bazerman 1988, Chouliaraki e Fairclough 1999, Fairclough 2000b, Martin 1992, Swales 1990)

Cadeias de gêneros (2)


Refere-se a diferentes gêneros regularmente unidos, envolvendo transformações sistemáticas de gênero
para gênero (por exemplo, documentos oficiais, publicações ou conferências da imprensa, notícias na imprensa
escrita ou na televisão). As cadeias de gêneros são um fator importante na crescente capacidade de “ação à
distância”, que tem sido uma característica da “globalização”. A mudança nas cadeias de gêneros é uma parte
significativa da mudança social. (Fairclough 2000a, Graham 2001b, Iedema 1999)
205

Mistura de gêneros (2)


Um texto não se baseia apenas um em gênero; normalmente mistura ou cruza diferentes gêneros
(como exemplo disso, os programas interativos na televisão costumam ser uma mistura de conversa, entrevista e
entretenimento). A mistura de gêneros é um aspecto da interdiscursividade dos textos. De fato, a análise desse
aspecto permite a categorização de textos entre os processos de mudança social ou a identificação de trabalhos
potencialmente criativos e inovadores dos agentes sociais em relação à estruturação textual. (Bakhtin 1986a,
Chouliaraki e Fairclough 1999, Fairclough 1992, 1995a, 1995b, 2000a)

Globalização (2,4)
Trata-se da tendência contemporânea dos processos econômicos, políticos e sociais em operar em uma
crescente escala global. Este conceito é controverso, por isso o termo apresenta-se entre aspas ao longo do livro.
Discute-se que “globalização” não é um processo especificamente contemporâneo mas sim um processo a longo
prazo em que muitas partes do mundo estão marginalizadas numa economia dita global. As mudanças atuais são
provavelmente melhor vistas como uma nova guinada no processo de “dar uma nova dimensão” às relações entre
os níveis global, regional, nacional e local. Essa nova dimensão afeta o discurso e depende das mudanças do
mesmo – veja verbete cadeia de gêneros. (Bauman 1998, Castells 1996-8, Giddens 1991, Harvey 1996b, Held et
al. 1991, Jessop, no prelo b)

Governança (2, 8)
Atividade dentro de uma instituição ou organização direcionada ao gerenciamento ou regulação de
práticas sociais. A crescente popularidade do discurso de “governança” (“governança corporativa”, “governança
global” etc.) representa a busca por uma alternativa para o caos dos mercados e para a imposição hierárquica
pelos Estados. Uma ênfase maior está sendo dirigida às redes e ao diálogo e deliberação. No entanto, a
governança das sociedades contemporâneas visivelmente mistura suas três formas: mercado, hierarquia e redes.
Existem gêneros específicos de governança que são especializados em recontextualizar elementos de uma prática
social em outra e transformar tais elementos de formas específicas (por exemplo, relatórios oficiais). As
mudanças na governança dependem da mudança nos gêneros e nas cadeias de gêneros. (Jessop 1998a)

Metáfora gramatical (8)


Trata-se de uma extensão do conceito de metáfora baseado na palavra para o nível gramatical. Por
exemplo, os processos podem ser representados tanto não-metaforicamente como metaforicamente – se uma
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empresa demite alguns de seus funcionários, esse fato pode ser expresso por “a empresa os demitiu” (não-
metafórico) ou por “eles perderam seus empregos” (metafórico). Veja também o verbete nominalização. Embora
essa distinção seja conveniente, ela constitui um problema e implica que pode haver comparação entre tais
representações e o que realmente aconteceu. (Fowler et al. 1979, Halliday 1994, Hodge e Kress 1993, Martin
1992)

Modo gramatical (6)


A distinção gramatical entre frases declarativas (como exemplo “a janela está aberta”), interrogativas (“a
janela está aberta?”, “por que a janela está aberta?”) e imperativas (“abra a janela.”) (Eggins 1994, Halliday 1994,
Martin 1992, Wuirk at al. 1995)

Hegemonia (3)
Uma forma particular (associada a Gramsci) de conceituação do poder e da luta pelo poder em sociedades
capitalistas, enfatizando o modo como o poder depende do consentimento e aquiescência em detrimento apenas da
força, assim como a importância da ideologia. O discurso, incluindo a dominação e a naturalização de certas
representações (a mudança econômica “global”, por exemplo), é um aspecto significativo da hegemonia e da
disputa pelo discurso na luta hegemônica. (Forgacs 1988, Gramsci 1971, Laclau e Mouffe 1985)

Hibridismo e pós-modernidade (2)


A noção da vida social contemporânea como sendo “pós-moderna” enfatiza a falta de clareza e o colapso
das fronteiras características das sociedades “modernas”, assim como o hibridismo difundido (mistura de práticas,
formas etc.) resultante desse processo. Uma análise do hibridismo interdiscursivo nos textos é um recurso para a
pesquisa detalhada de tais processos. (Harvey 1990, Jameson 1991)

Ideologia (1 ,3, 4)
Ideologias são representações de aspectos do mundo que contribuem para o estabelecimento e
manutenção das relações de poder, dominação e exploração. Tais ideologias devem ser legitimadas em formas de
interação (e conseqüentemente em gêneros) e impostas a modelos existentes e identidades (logo a estilos). A
análise de textos (talvez incluindo de modo especial as pressuposições nos textos) é um importante aspecto da
crítica e análise ideológica, dado que está disposto dentro de uma análise social de eventos e práticas sociais de
maiores proporções. (Eagleton 1991, Larrain 1979, Thompson 1984)
207

Interdiscursividade (2)
A análise da interdiscursividade de um texto é a análise de um conjunto específico de gêneros, de
discursos e de estilos sobre os quais está estruturado. Também se refere à forma como diferentes gêneros,
discursos e estilos são articulados em um texto. Tal nível de análise situa-se entre a análise lingüística de um texto
e as várias formas de análise social dos eventos e práticas sociais. (Chouliaraki e Fairclough 1999, Fairclough
1992)

Intertextualidade e discurso indireto (3)


A intertextualidade é a presença em um texto de elementos de outros textos – e conseqüentemente a
existência em potencial de outras vozes além daquela do autor – que devem estar relacionados (ou discutidos,
supostos, suprimidos etc.) de várias formas (veja dialogismo). A forma mais comum e difundida de
intertextualidade é o discurso indireto (incluindo a escrita e o pensamento indiretos), embora existam outras
formas – inclusive a ironia. O discurso indireto pode ou não ser atribuído a vozes específicas. O discurso em si
pode ser realizado de várias formas, incluindo o discurso direto (reprodução das palavras assim como foram
usadas) e o discurso indireto (resumo). (Bakhtin 1981, Fairclough 1995b, Kristeva 1986a, b, Leech e Short 1981)

Legitimação (5)
Qualquer ordem social exige legitimação – um reconhecimento difundido da legitimidade das explicações
e justificativas em relação a como as coisas são e como elas são feitas. A maioria do trabalho de legitimação é
textual, embora os textos variem consideravelmente de acordo com o quanto explícita ou implícita é a
legitimação. A análise textual pode identificar e levar à pesquisa de diferentes estratégias de legitimação – em
referência à autoridade ou à utilidade, por meio da narrativa e outros. (Berger e Luckman 1966, Habermas 1976,
Van Leeuwen e Wodak 1999, Weber 1964)

Mediação (2)
Grande parte da ação e interação nas sociedades contemporâneas é “mediada”. Isso significa que
tecnologias de reprodução são usadas para disseminar a comunicação e impedir a interação real entre o
“remetente” e o “destinatário”. Tais tecnologias incluem impressos, fotografias, programas de rádio ou televisão e
a Internet. A forma como as pessoas vivem nas sociedades contemporâneas é fortemente dependente de tais textos
mediados, os quais são igualmente cruciais para os processos de governança. (Luhmann 2000, McLuhan 1964,
Silverstone 1999, Thompson 1995)
208

Modalidade (10)
A modalidade de uma oração ou período é a relação estabelecida entre o autor e as representações –
aquilo a que os autores se comprometem em termos de verdade ou necessidade. Há a distinção entre dois tipos de
modalidade: a modalidade epistêmica (modalidade das probabilidades) e a modalidade deôntica (modalidade da
necessidade e obrigação). No caso das declarações, as formas explicitamente modalizadas (marcadas por verbos
de ligação ou outros marcadores) podem estar entre afirmações ou negações categóricas, além de registrarem
graus variáveis de compromisso quanto à verdade ou à necessidade. (Halliday 1994, Hodge e Kress 1988, Palmer
1986, Verschueren 1999)

Novo capitalismo (1, 2)


O capitalismo tem a grande capacidade de manter-se durante grandes transformações. “Novo-capitalismo”
é o termo usado para a forma transformada do capitalismo atualmente em emergência. A referência a novo
capitalismo em detrimento do termo “globalização” corresponde à alegação de que a nova dimensão de relações
entre os níveis global, regional, nacional e local é fundamentalmente uma questão de transformação do
capitalismo. (Boyer e Hollingsworth 1997, Brenner 1998, Crouch e Streek 1997, Jessop 2000)

Nominalização (8)
A nominalização é um tipo de metáfora gramatical que representa processos como entidades,
transformando as orações (inclusive verbos) em um tipo de substantivo. Para exemplificar, “os empregados
produzem aço” é uma representação não-metafórica de um processo, ao passo que “produção de aço” é uma
representação metafórica e nominalizada. Como mostra o exemplo, a nominalização geralmente requer agentes
sociais excludentes na representação de eventos (nesse caso, aqueles que produzem). A nominalização é um
recurso para a generalização e a abstração, indispensável em áreas como a ciência. No entanto, ela pode também
ofuscar a agência e a responsabilidade. (Fowler et al. 1979; Halliday, 1994; Lemke, 1995)

Ordem do discurso (2)


Uma ordem do discurso é uma combinação específica ou uma configuração de gêneros, discursos e
estilos que constitui os aspectos discursivos de uma rede de práticas sociais. Assim sendo, as ordens do discurso
têm estabilidade e durabilidade relativas – embora elas realmente mudem. Este termo deriva da teoria de Michel
Foucault mas é usado na análise crítica do discurso de uma forma diferente. Em termos gerais, as ordens do
discurso podem ser vistas como a estruturação social da diferença ou variação lingüística – existem sempre várias
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possibilidades diferentes na língua, mas a escolha é estruturada socialmente. (Chouliaraki e Fairclough 1999,
Fairclough 1992, 1995b, Foucault 1984)

Relações paratáticas, hipotáticas e encaixadas


Existem diferenças gramaticais quanto às formas nas quais as orações podem ser combinadas nos
períodos. As orações com relações paratáticas possuem uma hierarquia gramatical equivalente, não sendo
subordinadas nem superordenadas em relação à outra (por exemplo, “o carro quebrou e o rapaz foi assaltado”, na
qual as duas orações são ligadas pelo “e”). As orações com construções hipotáticas apresentam uma relação entre
o principal (ou superordenado) e o subordinado (como exemplo há a oração “estava triste porque ela me deixou”,
na qual “porque ela me deixou” é subordinada à oração “estava triste” – note que há possibilidade de reordenar as
duas orações de forma que a última venha primeiro.) No caso do encaixe, uma oração funciona como um
elemento de outra (sendo o sujeito desta, por exemplo) ou como um elemento de uma frase (por exemplo, “que
veio jantar” é um modificador na frase “o homem que veio jantar”). (Eggins, 1994; Halliday, 1994; Martin, 1992;
Quirk et al, 1995)

Pragmática (3)
A pragmática lingüística é o estudo da “linguagem em relação a seus usuários” (Mey). Ela lida com o
significado, com a construção do significado na comunicação em detrimento do significado como forma de
relação dentro de sistemas lingüísticos com abstração da comunicação real, o que é geralmente uma preocupação
da semântica. A pragmática lingüística tem particularmente desenvolvido perspectivas de linguagem originárias
da filosofia lingüística, entre elas os atos discursivos, as suposições e as implicações (veja pressuposições).
(Austin 1962, Blakemore 1992, Levinson 1983, Mey 1993, Verschueren 1999)

Tipos de processo (8)


Tipos de processos semanticamente e gramaticalmente disponíveis na língua para a representação de
eventos. Faz-se a distinção entre os seguintes tipos de processo: material, mental, verbal, relacional (que possui
duas subdivisões) e existencial. Os eventos podem ser representados metaforicamente ou não em termos de tipos
de processo – veja metáfora gramatical. (Fowler et al, 1979; Halliday, 1994; Martin, 1992; van Leewen, 1995)

Cultura promocional (6)


Trata-se de uma visão dos fenômenos culturais contemporâneos como quase sempre no desempenho de
funções promocionais e de qualquer outra função que tais fenômenos possam ter, como simultaneamente
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representando, defendendo e antecipando o que quer que esteja sendo referido. A noção de “cultura de
consumo” assemelha-se a ela. A co-presença de promoção e outras funções pode ser avaliada detalhadamente por
meio da análise textual com grande proveito – em textos políticos, por exemplo. (Featherstone, 1991; Graham,
2002; Lury, 1996; Wernick, 1991)

Esfera pública (3, 4, 10)


O domínio da vida social no qual as pessoas podem se engajar como cidadãos dita as regras em
relação a questões de cunho político e social, com o objetivo de influenciar a formação de opinião. A
maioria da literatura na esfera pública enfatiza seu caráter problemático nas sociedades contemporâneas
e os limites estruturais (por exemplo, relacionados à posição da mídia de massas) em pessoas que agem
como cidadãos. De uma perspectiva de discurso, os problemas ligados ao espaço público incluem
questões relacionadas às formas de diálogo. Exemplo dessas questões é o saber se o que é representado
como “diálogo”, “deliberação”, “consulta” “participação” e assim por diante tem as características
necessárias para ser eficiente na esfera publica. (Arendt, 1958; Calhoun, 1992; Fairclough, 1999;
Habermas, 1989, 1996)

Recontextualização (2, 8)
Recontextualização é a relação entre diferentes (redes de) práticas sociais – uma questão de como
os elementos de uma prática social são incorporados no contexto de outra. Sendo originalmente um
conceito sociológico, (Bernstein 1990), a recontextualização pode ser efetuada de forma transdisciplinar
na análise de discurso em categorias como cadeias de gênero, o que permite a apresentação mais
detalhada de como o discurso de uma prática social é recontextualizado em outra. (Bernstein 1990,
Chouliaraki e Fairclough 1999)

Semântica (2, 5, 7)
A semântica é um ramo da lingüística que estuda o sentido nas línguas. Por convenção é distinta
da gramática, a qual estuda aspectos formais das línguas. Uma outra distinção é feita entre semântica e
pragmática: a semântica geralmente lida com o sentido (por exemplo, o sentido das palavras) sem levar
em consideração certos contextos de uso, enquanto a pragmática lida com o significado de textos reais
em contextos sociais reais. As relações semânticas incluem as relações de significado entre as orações
211
(causal, consecutiva, final, condicional, temporal, aditiva, explicativa, contrastiva e concessiva) e as
relações de significado entre as palavras (sinônimo, hipônimo, antônimo). (Allan 2001, Lyons 1977,
Verschueren 1999)

Agentes sociais (8)


Um número significante de escolhas está disponível na representação dos agentes sociais
(participantes nos processos sociais). Uma questão primordial é se tais agentes estão ou não incluídos
nas representações de eventos. Se estiverem incluídos, devem estar expressos por substantivos ou
pronomes: em um papel gramatical em detrimento de outro (por exemplo, Sujeito ou Objeto) e de uma
forma mais geral em um papel de forma ativa ou passiva. Os agentes podem estar representados de
modo pessoal ou impessoal (por exemplo, na referência aos empregados como “recursos humanos”),
denominados (com seus próprios nomes) ou classificados (em termos de uma classe ou categoria, por
exemplo os “professores”), com referência específica ou genérica (como por exemplo “professores”, no
sentido dos professores em geral). A definição de quais atores sociais são representados e de que forma
isso ocorre é uma questão de significância social - para ilustrar tal fato, se o termo “os pobres” é
constantemente passivado (numa representação em que está sujeito à ação de outros), isso implica que
os pobres são incapazes de agência. (Halliday 1994, Van Leeuwen 1996)

Diferença social (3)


Em relação à sua orientação quanto a diferenças sociais, existem duas possibilidades de variação
dos textos. A primeira seria relacionada à exploração dialógica da diferença; a outra estaria ligada a
acentuações polêmicas da diferença, a tentativas de vencer as diferenças, a um agrupamento das
diferenças com objetivo de focar na existência de atributos comuns e à supressão da diferença. Certos
textos podem combinar essas conjunturas. De fato, a natureza da orientação de cada texto determina seu
dialogismo relativo. (Benhabib 1996, Holquist 1981, Kress 1985)

Eventos, práticas e estruturas sociais (2)


As estruturas sociais definem as possibilidades ao passo que os eventos sociais constituem o que
é real, sendo a relação entre essas duas vertentes mediada pelas práticas sociais. A língua (e de uma
forma mais geral a semiose) é um elemento social em cada um desses níveis – as línguas são um tipo de
212
estrutura social, os textos são elementos de eventos sociais e as ordens do discurso são elementos de
(redes de) práticas sociais. Uma das conseqüências dessa função social é que ao invés de iniciar a análise
com textos, inicia-se com eventos sociais (e com cadeias e redes de eventos), sendo os textos analisados
como elementos de eventos sociais. (Bhaskar 1986, Fairclough et al. 2002, Sayer 2000)

Identidade social e personalidade (9, 10)


A identidade social e a personalidade (ou identidade pessoal) são dois aspectos analiticamente
distintos da identidade das pessoas. Parte da identidade social de um indivíduo refere-se às
circunstâncias sociais nas quais ele nasceu e sua primeira socialização – aspectos de identidade de
gêneros, por exemplo. Outra parte é adquirida com o passar dos anos – a socialização em certos “papéis
sociais” (como político ou professor, por exemplo). Entretanto, há uma relação dialética entre a
identidade social e a personalidade: o desenvolvimento social completo da identidade de uma pessoa
(sua capacidade de agir como um agente social, intervindo e potencialmente transformando a vida
social) depende dos “papéis sociais” que são pessoalmente investidos e adequados, em uma fusão entre a
identidade social e a personalidade. A análise textual focada na dialética textual entre identidades social
e pessoal pode contribuir na pesquisa nessa área. Tal dialética aborda os estilos como “formas de ser” ou
identidades nos aspectos da língua (em oposição aos aspectos somáticos e corporais). (Archer, 2000;
Giddens, 1991; Harré, 1983; Ivanic, 1998; Taylor, 1985)

Práticas sociais
Veja eventos, práticas e estruturas sociais.

Estruturas sociais
Veja eventos, práticas e estruturas sociais.

Informalização da sociedade (4,10) e conversacionalização (4)


A informalização da sociedade é uma tendência (principalmente na vida social pós Segunda
Guerra Mundial das sociedades liberais mais desenvolvidas) a tornar as relações de poder e autoridade
mais implícitas e a tornar as interações entre essas relações mais informais (para ilustrar isso, gerentes,
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políticos e até mesmo a família real britânica cada vez mais se apresentam apenas como “pessoas
comuns” em suas interações com os empregados e com o público). Assim sendo, a pesquisa sobre esse
processo pode ser feita textualmente por meio do foco na “conversacionalização” do discurso público –
uma tendência à simulação da conversação nas interações públicas e nos textos. (Fairclough, 1992;
1995a; Misztal, 2000; Seligman, 1997).

“Espaço-tempos” (8)
O termo “espaço-tempo” é usado para demonstrar a dificuldade ou até mesmo impossibilidade de
tratar espaço e tempo como propriedades diferentes. Espaço e tempo não são apenas estabelecidos
naturalmente. Espaço-tempos são combinações sociais, sendo que as diferentes ordens sociais os
constroem de forma diversa e suas construções estão dialeticamente interconectadas a outros elementos
sociais na construção de uma ordem social como redes de práticas sociais. Além disso, uma ordem
social cria relações entre diferentes espaço-tempos (por exemplo entre o local e o global na sociedade
contemporânea), sendo essas relações um ponto de debate e conflito. Tais relações são compreendidas
de uma forma banal e algumas vezes são contrariadas nas atividades diárias dos indivíduos e nos textos.
A análise textual pode ajudar na pesquisa sobre tal assunto. O conceito desenvolvido por Bakhtin de
“cronotopos” é também importante nesse contexto. (Bakhtin, 1981; Bourdieu, 1977; Giddens, 1991;
Harvey, 1996a).

Funções do discurso (speech functions) (6)


Cada um dos dois tipos de troca diferenciados nesse livro está associado com duas principais
funções de discurso: a troca de conhecimentos, relacionada a declarações e perguntas, enquanto a troca
de atividades refere-se a ofertas e demandas. Tais distinções são feitas em um nível maior de
generalidade que pode ser visto como passível de refinamento considerável em termos de teoria de “ato
discursivo”. (Austin, 1962; Martin, 1992; Sbisá, 1995; Searle, 1969)

Estrutura e agência (2, 8)


Na pesquisa social (incluindo a pesquisa lingüística e textual), uma ênfase na estrutura define as
formas nas quais as estruturas e sistemas pré-estabelecidos limitam, delimitam e determinam os eventos
e as ações, ao passo que uma ênfase na agência define as formas nas quais os agentes estabelecidos
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produzem eventos, ações, textos, etc. de maneira potencialmente criativa e inovadora. A posição
adotada no presente livro é que nenhuma das duas ênfases é satisfatória por si só; que tanto a estrutura
como a agência tem “poderes causais”; que os eventos (inclusive os textos) devem ser vistos como o
resultado da tensão entre estruturas e agência e que a relação entre as duas é dialética. (Archer, 1995,
2000; Bhaskar, 1989; Bourdieu e Wacquant, 1992; Giddens, 1984).

Estilos (2)
Veja identidade social e pessoal.

Transdisciplinaridade (1)
A pesquisa transdisciplinar é uma forma de pesquisa interdisciplinar ou “pós-disciplinar”. Sua
principal perspectiva é que o encontro e diálogo entre disciplinas diversas durante a pesquisa de
determinados assuntos devem ser abordados com o intuito de desenvolver categorias teóricas, métodos
de análise, programas de pesquisa, etc. de uma área por meio da “lógica” da outra. Assim sendo, uma
categoria como gênero na análise do discurso, por exemplo, pode ser vista como passível de ser
desenvolvida teorica e metodologicamente por ocasião do diálogo com outras disciplinas e teorias
(como sugere Chouliaraki, 1991 para com a teoria sociológica de Bernstein). (Chouliaraki e Fairclough,
1999; Dubiel, 1985; Fairclough, 2000a)

Tipos de significado (ação, representação, identificação) (2)


Três tipos primários de significados podem ser distinguidos de acordo com os objetivos da
análise textual: os significados de um texto como parte da ação em eventos sociais (significado de ação),
aqueles referentes à representação do mundo nos textos (significado representacional) e os concernentes
à construção textual da identidade dos indivíduos (significado identificador). Esses três tipos ou aspectos
do significado estão sempre em conjunto nos textos. A distinção feita entre eles é análoga à distinção
entre as principais ou “macro” funções da linguagem na Lingüística Sistêmica Funcional. (Halliday,
1994; Lemke, 1995; Martin, 1992).

Universal e particular (3, 8)


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Na política, a relação entre universal e particular é a relação entre o que concerne aos seres
humanos como indivíduos e o que concerne a certos grupos. Há uma crise do nível universal na política
contemporânea – por exemplo, como pode a aspiração geral quanto à emancipação humana ter qualquer
sentido ou se tornar um projeto político real (como ocorre na tradição socialista)? Não obstante, o campo
do universal continua sendo muito conflituoso – as disputas pela hegemonia podem ser vistas como
disputas para legitimar as reivindicações pela universalidade das perspectivas, interesses, projetos etc.,
que são específicos quanto a suas origens. Isso leva a uma pesquisa como um processo parcialmente
textual no qual as representações, identidades etc. são textualmente construídas como sendo universais
(por exemplo, a tentativa de construção da economia contemporânea e as mudanças sociais em termos
de uma “globalização” universal). (Butler et al.2000; Laclau, 1996)

Glossário dos principais teóricos

Bakhtin, Mikhail
Teórico russo e analista de literatura, cultura e linguagem da metade do século 20 que
desenvolveu (juntamente com colegas como Volosinov) uma visão dialógica da linguagem (veja
dialogismo). Recentemente tal visão vem influenciando o desenvolvimento de alternativas para a
vertente formalista da lingüística. O foco na intertextualidade e o ainda mais recente estudo sobre o
gênero também podem ser atribuídos à sua influência. O conceito desenvolvido por Bakhtin de
“cronotopos” também é importante na análise dos espaço-tempos. (Bakhtin 1981, 1986a, 1986b,
Chouliaraki e Fairclough 1999, Holquist 1981, Volosinov 1973)

Bhaskar, Roy
Filósofo das ciências sociais e da ciência em geral, é a principal figura do “realismo crítico” (o
qual foi discutido principalmente na primeira parte do livro). (Bhaskar 1979, 1986, 1989)

Bernstein, Basil
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Sociólogo da educação britânico cujos trabalhos sobre “discurso pedagógico” e publicações
correlatas referentes à classificação, à construção e à recontextualização são de grande relevância no
presente livro. (Bernstein 1990, Chouliaraki e Fairclough, 1999)

Bourdieu, Pierre
Sociólogo francês e teórico da estruturação das sociedades modernas complexas quanto às
“áreas” sociais e suas interconexões variantes. O modelo estabelecido por Bourdieu relaciona-se ao foco
dado neste livro às praticas sociais e suas inconstantes redes, e ao “habitus” de agentes socialmente
diversos (isto é, as disposições adquiridas e incorporadas a agir de certa forma). No livro foi feita uma
análise da perspectiva do teórico referente à classificação e da relação entre estrutura e agência. A
recente intervenção política de Bourdieu e sua análise do neoliberalismo incluem uma ênfase no
discurso do mesmo. (Bourdieu 1991, Bourdieu e Wacquant 1992, 2001, Chouliaraki e Fairclough 1999)

Foucault, Michel
Filósofo francês cujo trabalho teórico e histórico sobre o discurso tem sido de grande influência
nas ciências sociais. As categorias de interdiscursividade e ordem do discurso remetem a Foucault,
embora na análise critica do discurso feita por mim elas tenham sido usadas de forma diferente.
(Fairclough 1992, Foucault 1972, 1984)

Giddens, Anthony
Sociólogo britânico com grande produção quanto à “globalização” e às transformações sociais do
novo capitalismo (embora não use tal termo). Muitos aspectos de seu trabalho foram discutidos neste
livro (veja desencaixe, identidade social e personalidade, espaço-tempos, estrutura e agência).
(Chouliaraki e Fairclough 1999, Giddens 1991)

Habermas, Jürgen
Teórico crítico alemão que seque a tradição da Escola de Frankfurt. Sua principal relevância aqui
se refere à centralidade dada por ele à comunicação (logo à linguagem) em sua versão da teoria crítica, à
sua visão de modernização em tais termos e ao seu trabalho relacionado à esfera pública. Foi discutida
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no livro a distinção entre ação comunicativa e ação estratégica feita por ele, assim como seu
trabalho quanto à legitimação. (Chouliaraki e Fairclough 1999, Habermas 1976, 1984, 1989)

Halliday, Michael
Lingüista britânico que segue a tradição “funcionalista” de J. R. Firth, Halliday tem sido a
principal figura no desenvolvimento da Lingüística Sistêmico Funcional, uma alternativa para o
formalismo (associado em especial com Noam Chomsky) da Lingüística em voga. A Lingüística de
Halliday está há muito tempo em sintonia com a teoria sociológica de Bernstein, e de várias formas é um
recurso proveitoso para a análise crítica e social da linguagem e do discurso. Halliday é a principal fonte
na Lingüística discutida neste livro. (Halliday, 1978, 1994; Halliday e Hasan, 1976, 1989; Martin, 1992)

Harvey, David
Geógrafo e teórico social britânico cujo trabalho sobre as transformações do novo capitalismo e
sobre a dialética do discurso são de grande valor neste livro no que concerne a espaço-tempos,
globalização, esteticização de identidades públicas, hibridismo e pós-modernidade. (Chouliaraki e
Fairclough, 1999; Harvey, 1990; 1996a; 1996b).

Jessop, Bob
Sociólogo e economista britânico cujo trabalho referente às transformações no novo capitalismo
e na globalização, especialmente no que diz respeito a governança, é de grande importância no presente
livro. (Jessop 1998, 2000, a serem publicados a e b)

Laclau, Ernesto
Teórico de política argentino trabalhando na Grã-Bretanha e mais conhecido por re-elaborar
(juntamente com Chantal Mouffle) o marxismo de Gramsci e a teoria da hegemonia nos termos
analíticos do discurso. No livro sugeri que sua teorização da lógica da equivalência e diferença e da
relação entre universal e particular poderia ser operacionalizada na análise textual. (Butler et al 2000;
Chouliaraki e Fairclough, 1999; Laclau, 1996; Laclau e Mouffle, 1985).
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