ESPECIAL
5 de Abril de 2019
O Presidente Abdelaziz Bou-
teflika notificou oficialmente
o presidente do Conselho
Constitucional da decisão
de se demitir. A notícia foi
avançada na terça-feira à
noite, pela televisão argelina,
que citou fonte da Presidência
da República.
Previamente, o Ministério
da Defesa da Argélia tinha
pedido, no mesmo dia, à tar-
de, a demissão “imediata” de
Bouteflika, referindo ser ne-
cessário avançar com os pro-
cedimentos constitucionais
para o retirar do poder.
Segundo o comunicado do
Ministério, liderado pelo chefe
do Estado-Maior do Exército
argelino, general Ahmed Gaid
Salah, “não existe mais tempo
a perder” para declarar Abde-
laziz Bouteflika como inapto
para o cargo, dando voz à
população da Argélia.
O Gabinete do Presidente
argelino, de 82 anos, anunciou,
na segunda-feira, que este ia
deixar o cargo antes do final
do seu quarto mandato, que
termina a 28 de Abril. No do-
cumento, o Ministério da De-
fesa considerou, entretanto,
como “não autêntico” o comu-
nicado da Presidência.
Segundo a Presidência, o
Chefe de Estado argelino iria
tomar “medidas para garantir
a continuidade do funciona-
mento das instituições do
Estado durante o período de
transição”, indicou a nota
informativa, precisando que
a renúncia “ocorrerá antes de
28 de Abril de 2019”.
O comunicado presidencial
não avançou, no entanto, a
data concreta da renúncia,
nem quais serão as “decisões
importantes” que a tomar por
Abdelaziz Bouteflika.
Desde finais de Fevereiro,
a Argélia tem sido palco de
várias manifestações, que
foram inicialmente convo-
Sexta-feira
A candidatura de Bouteflika à Presidência gerou ondas de protestos
cadas contra a candidatura a
um quinto mandato de Bou-
teflika, debilitado devido a
um AVC em 2013.
Face a uma contestação
popular inédita desde a sua
eleição para a chefia do Estado,
há 20 anos, Bouteflika renun-
ciou a 11 de Março à disputa
de um quinto mandato pre-
sidencial, mas propôs um
plano alternativo.
Abdelaziz Bouteflika decidiu
então prolongar o actual man-
dato, ao adiar as presidenciais
“sine die”, até que fosse rea-
lizada uma “Conferência Na-
cional”, que deveria elaborar
uma nova Constituição.
As presidenciais na Argélia
estavam inicialmente previstas
para 18 de Abril. Tanto a opo-
sição como a sociedade civil
argelinas rejeitaram este plano,
argumentando que permitia
que Bouteflika se mantivesse
no poder sem eleições, além
do final constitucional do seu
mandato, a 28 de Abril. O pla-
no também foi rejeitado de
forma categórica pelos mani-
festantes nas ruas, cuja mobi-
lização não enfraqueceu nas
DR
últimas semanas.
Segundo a Constituição
argelina, a partir do momento
que a renúncia de Bouteflika
seja formalizada, será o pre-
sidente do Conselho da Nação
(a câmara alta do Parlamento),
Abdelkader Bensalah, de 77
anos, a assegurar a Presidência
interina, durante um período
máximo de 90 dias, durante
o qual serão organizadas elei-
ções presidenciais.
O Chefe de Estado
argelino iria tomar
“medidas para
garantir a
continuidade do
funcionamento das
instituições do
Estado durante o
período de
transição”, indicou
a nota informativa,
precisando que a
renúncia “ocorrerá
antes de 28 de Abril
de 2019”
5
DR
LÍDER DA VELHA GUARDA ÁRABE DEIXA O PODER
Bouteflika:
a renúncia,
20 anos depois
Quando, na terça-feira, o Presidente da Argélia
notificou oficialmente o presidente do Conselho
Constitucional da decisão de renunciar ao cargo,
o Ministério da Defesa do país já tinha pedido a
sua demissão "imediata". O Artigo é do jornal
Diário de Notícias.
Doze marcos do último líder árabe
O Presidente argelino, Abde- Saraouí (RASD), o que significou lhe diagnosticada uma úlcera
laziz Bouteflika, demitiu-se do a ruptura de relações com Mar- gástrica hemorrágica e come-
cargo, no que foi o último acto rocos e um conflito bilateral çaram as viagens constantes
da carreira política daquele que ainda se mantém. à Suíça e os rumores sobre o
que foi o último líder árabe da - Em 1983, foi acusado de seu verdadeiro estado.
velha guarda ainda no poder. corrupção e considerado cul- - Em 2013, as dúvidas agu-
Os 12 marcos da vida de um pado de ter desviado mais de dizaram-se, depois de sofrer
homem inteiramente dedicada 70 milhões de francos das embai- um acidente vascular cerebral
à política na Argélia e que foi xadas. Dois anos antes, tinha (AVC), que o deixou numa ca-
fundamental para que o Exér- decidido fugir do país. Regressou deira de rodas e lhe causou a
cito tomasse o poder em 1962, à Argélia em 1987, sem devolver perda da fala. Ainda assim,
após a sangrenta guerra da o dinheiro, que disse destinar- venceu as presidenciais de
independência de França. se a um novo Ministério dos Ne- 2014, com 81% dos votos, ape-
- Nascido em 1937, na cidade gócios Estrangeiros. sar de a doença o ter impedido
marroquina de Oudja, Boute- - Em 1989, foi eleito membro de fazer campanha.
flika foi o Presidente que mais do Comité Central da Frente - Em 2017, e no contexto de
tempo esteve no poder na Argé- de Libertação Nacional (FLN), uma galopante crise económica
lia, com 20 anos de mandato partido que governou a Argélia e social, ordenou uma revisão
e quatro eleições ganhas. desde a Independência, e, da Constituição, para poder
- Conhecido pela sua habi- depois de rejeitar vários minis- candidatar-se a um quinto man-
lidade como influenciador térios em plena guerra civil, dato. A sua candidatura, dois
político, juntou-se no início regressou à Suíça. anos depois, desencadeou as
da guerra da independência - Em 1999, venceu as elei- maiores manifestações no país,
de França ao “Exército das ções presidenciais, com 75% desde o início da guerra civil.
Fronteiras”, dirigido por Houari dos votos, e iniciou um período - Em Março de 2019, após
Boumediene, que depois se de transição que terminou três semanas de gigantescos
tornaria Presidente. com uma trégua com os isla- protestos nas ruas e duas sema-
- Em 1962, opôs-se aos acor- mitas, que pôs fim à chamada nas internado num hospital
dos de Evian, entre os repre- "década negra", uma época na Suíça, desistiu da reeleição
sentantes de França e o Governo de terror que fez mais de para um quinto mandato, sem
provisório argelino, que levaram 300.000 mortos. que se saiba quem lhe sucederá
ao cessar-fogo final, e fez lóbi - Em 2005, sofreu o primeiro e qual é o seu verdadeiro estado
em nome de Boumediene e do problema de saúde grave: foi- de saúde.
Presidente Ahmed Ben Bella,
DR
para conseguir que o Exército
assumisse o poder.
- Em 1963, com apenas 26
anos, foi nomeado ministro
dos Negócios Estrangeiros,
cargo que exerceria até 1979,
tornando-se o rosto da Argélia
e um dos principais defen-
sores da Organização de Paí-
ses Exportadores de Petróleo
(OPEP) e do Movimento dos
Não-Alinhados.
- Em 1976, foi fundamental
na decisão do Presidente Bou-
mediene de reconhecer a Repú-
blica Árabe Democrática Presidente argelino venceu o primeiro pleito eleitoral em 1999