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ADRIANO MARINI

Coronelzinho

ADRIANO MARINI

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Copyright © 2015 Adriano Marini

All rights reserved.

ISBN: 1516930061
ISBN-13: 978-1516930067
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CONTEUDO

Agradecimentos i

1 Abertura 3

2 Maria 6

3 Bandoleiros 14

4 Ciganos 17

5 Andrea, o italiano 25

6 O baile 29

7 Pedro 43

8 O gado 54

9 A cidade 63
AGRADECIMENTOS

Aos valentes desbravadores dos sertões paulista


E aos paulistas que lutaram por um Brasil melhor.

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CORONELZINHO

CAPITULO I
ABERTURA

São José do Rio Preto, 1920.


Em uma estrada cercada por florestas passa um carro de bois tendo
como ocupantes Alexandre e Pedro, filhos da Sra. Angela e de
Egidio, o coronelzinho.
- Estas viagens a Jaboticabal são muito cansativas, minhas costas
já estão doendo. – comenta Alexandre.
- Mas você sabe que é nossa tarefa todo mês irmos buscar
mantimentos pra abastecer a mercearia, principalmente o açúcar.
- Quem vem lá – grita Alexandre.
- O que é que você fala?
- Olha lá Pedro, não está vendo aquele homem na estada?
-Como não, olha ali aquele homem caminhando na estada na nossa
direção. Não vê a capa preta e o enorme chapéu preto na cabeça?
-Claro que não, não tem ninguém ali.
-Para, para – puxando o freio dos bois – vamos atropelar o homem.
No entanto o homem passa através do carro de bois, deixando
Alexandre entre surpreso e com medo.
- Rápido Pedro, acelera estes animais. Eu quero é sair daqui.
-Mas não era para parar? Não consegue se decidir não?

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ADRIANO MARINI

...
- Bem vindos, meus filhos. Como foi a viagem? Encontraram o
compadre Américo por lá?
- Não papai, mas conseguimos vender o café ao senhor Barão de
Cocais e trouxemos dois carros de bois com mercadorias que
compramos com o dinheiro.
- Vocês fizeram um bom trabalho, meninos.
- O Alexandre viu um homem na estrada.
- E o que ele queria?
- Ele viu, eu não vi.
- É papai, ele tinha uma grande capa preta e um enorme chapéu
sobre a cabeça, caminhou na estrada e passou através do carro de
boi.
- Estranho, mas um dia a gente descobre o que foi isto. Bom, eu
vou à cidade levar estas mercadorias para nossa mercearia.
- Mas logo vai anoitecer Egidio, não acha melhor esperar até
amanhã?
- Não Angela, vou aproveitar para abastecer a mercearia com
calma. – e se foi.
- O pai de vocês é muito trabalhador, vocês devem sempre seguir o
exemplo de homem que ele é.
Ao amanhecer Egidio retorna todo desarrumado e com uma
mancha de batom na gola da camisa branca de linho.
- Por que está todo desarrumado assim, Egidio? – pergunta Angela,
que vai recebe-lo no portão da sede da fazenda.

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CORONELZINHO

- Passei a noite toda arrumando o armazém, de madrugada tirei a


camisa devido ao calor.
Quando Angela se aproxima nota a marca de batom no colarinho.
- E esta marca de batom, também faz parte das mercadorias? Acho
que sim, mas uma mercadoria para se comprar, não para se vender.
Egidio se assusta, senta-se com as mãos na cabeça na porta da
cozinha enquanto sua esposa lhe chama a atenção, sob a vista das
três meninas e dos dois meninos.

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ADRIANO MARINI

CAPITULO II
MARIA

Maria era a filha do meio, mais nova que Isabel e mais velha que
Adelair.
Um grupo de bandoleiros chega à cidade. Passam a cavalo
vagarosamente pelas ruas de Rio Preto, observando a tudo e a
todos e ao mesmo tempo sendo observados e comentados por
todos. Continuam andando pela rua principal até saírem
calmamente, pegando a estrada boiadeira de Talhados, indo sempre
na mesma direção. Chegam as margens de um grande lago e sob
uma árvore montam acampamento.
João, o líder do bando, ao ir lavar o corpo no grande lago vê em
uma das margens uma linda moça, bem vestida, dando água para
beber ao cavalo, que teima em não abaixar a cabeça para beber.
João sai da água e caminha pela margem até aproximar-se da
moça.
- Se colocar um pouco de água na boca dele ele saberá que é água
e beberá.
Maria assusta-se.
- Quem é o senhor?
João ri.
- Sou apenas um forasteiro que costuma tomar banho neste lago.
Nunca a vi por aqui, você mora aqui perto?
- Aqui perto? Não senhor. Eu moro aqui.

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CORONELZINHO

- Aqui onde? – João olha em volta procurando alguma casa,


sabendo que não há nenhuma por perto.
- Tudo isto aqui é do meu pai.
João assusta-se.
- Seu pai? E quem é seu pai?
- O Coronel Egidio Santos.
- Ah, você é filha do coronelzinho? O vi ontem a noite na cidade.
Maria fica corada, pois sabe onde o pai esteve na noite anterior.
- Com licença, preciso ir.
- Sim claro, senhorita – e afasta-se dando passagem.
De volta ao bando.
- Você conheceu a filha do coronelzinho chefe? E o que pretende
fazer?
- Não pretendo fazer nada, afinal o coronel é nosso companheiro
das noites no bordel.
No dia seguinte João vai ao lago no mesmo horário em que
encontrou Maria, e nos dias que se seguiram também, até que
finalmente ve novamente Maria e seu cavalo. Ela ainda montada,
sob a sombra de uma mangueira, olhando para o lago.
João aproxima-se por trás.
- Procurando algo senhoria, ou então alguém?
Maria assusta-se com a abordagem repentina.
- Bom dia senhor João, estava apenas descansando um pouco da
cavalgada.
-Ah, claro – e sorri maliciosamente
Maria desmonta e leva o cavalo à margem do lago para beber água.

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- O que você faz, digo, em que você costuma trabalhar?


- Bom mocinha, vou lhe falar a verdade, já que conheço seu pai.
Não seria honesto mentir para você.
- Você conhece papai? De onde o conhece?
- Digamos que nós as vezes costumamos comprar as mesmas
mercadorias.
- E que tipo de mercadorias são essas, café, açúcar?
João sorri
- Não senhorita, nosso dinheiro só da para a cachaça mesmo.
- Cachaça? Bom pelo menos é sincero. E o que faz para ganhar
este pouco dinheiro?
João hesita um pouco.
- Nós somos bandoleiros. Eu e meu bando que está acampado aqui
próximo somos ladrões de banco. Mas não se preocupe, não
fazemos mal a mocinhas sozinhas.
Maria sorri.
- Não está com medo – pergunta João
- Medo? E porque teria? Estou nas minhas terras. Mas sua história
é interessante. Preciso ir agora, meus pais estão esperando para o
almoço desta sexta feira santa e depois para irmos a procissão do
Senhor morto na Catedral. Mas venho amanhã para ouvir o que
tem mais para contar. – e sai galopando.
- Estarei esperando, senhorita.
Na sede da fazenda.

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CORONELZINHO

- Lola, você não vai acreditar no que vi. Eu estava no lago tentando
dar água aquele cavalo novo quanto apareceu um homem que
tomava banho na água.
- Meu Deus! Um homem dentro das nossas terras. Papai já sabe?
- Sabe do que menina?
As meninas assustam-se com a entrada repentina do pai no quarto
delas.
- Nada não papai – desconversa Maria.
- A Maria encontrou um homem tomando banho em nossa lagoa –
diz Adelair
- Um homem na nossa propriedade? E quem é ele?
- Eu não sei papai, eu o vi na lagoa enquanto passeava a cavalo.
- Entendo, - diz Egidio. Vamos, terminem de arrumar-se senão
vamos perder a procissão na cidade.
As meninas terminam por colocar sobre as cabeças os véus pretos
e saem do quarto.
- Vamos meninas, estamos atrasados para pegar a procissão do
Senhor Morto, afinal hoje é sexta feira da paixão. Já vestiram os
véus pretos? – pergunta Angela.
- Sim mamãe, já estamos todas prontas, podemos ir – responde
Isabel.
E saem da casa grande e tomam seus assentos na charrete que as
levaria a cidade. Ao lado sobre cavalos vão o pai Egidio e os filhos
homens, Pedro e Alexandre.
Chegam na cidade, amarram os cavalos ao lado da Catedral
enquanto as senhoras descem da charrete, ajudadas por Egidio.

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Alexandre leva a charrete puxando os cavalos até a lateral da igreja


onde também os amarra e entra no já lotado templo.
Egidio vai até o altar e cumprimenta o bispo local.
-Senhor bispo, sua benção.
- Ah, meu caro coronel Egidio Santos, e sua abençoada família.
Sejam bem vindos ao seio da santa igreja. Vamos já iniciar a
procissão.
Egidio e sua família se retiram para uma das laterais e observam o
caminhar do clero da cidade.
Do altar saem na frente um padre vestido com trajes negros e
chapéu religioso combinando, balançando um incensório de onde
saia grande quantidade de fumaça. A sua frente um rapaz com
roupas religiosas carrega uma cruz simples com um pano preto ao
redor da parte superior, posto como um cachecol. Logo atrás do
padre monta-se dentro da igreja um toldo vermelho vivo
ornamentado com traços de ouro e mantido por seis hastes
douradas, sendo carregadas por seis jovens aspirantes a padre. Sob
o toldo quatro jovens aspirantes a padre carregam cada um um
suporte de um grande caixão aberto onde vê-se no interior a
imagem de Jesus morto, coberto por um fino tule lilás. Logo a
seguir seguem-se o cortejo com vários padres, bem mais idosos,
segurando cada um uma haste longa com uma vela em uma das
pontas.
O cortejo ganha as ruas silenciosas e é seguido por quase toda a
cidade, mulheres de vestidos e véus negros, mostrando o luto pelo
dia sagrado, acompanhadas ao lado por seus maridos, estes

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carregando velas acesas, protegendo as mãos por jornais


amassados e seguros na base das mesmas. O bispo vai á frente,
logo atrás do padre do incenso, recitando o inicio de ladainhas e
orações, que são terminadas pelos fiéis seguidores da procissão.
Ao passarem pela frente do banco da cidade, o mesmo explode
jogando sobre os fiéis entulho e papéis, além de muita poeira. A
cavalo saem pelo enorme buraco deixado na parede da porta e do
meio da poeira o grupo de João, todos com armas em punho,
atirando para cima para espantar a multidão, com sacos de dinheiro
pendurados nos animais e lenços cobrindo o nariz e bocas.
Um pedaço de pedra do banco atinge a cabeça de uma criança que
acompanhava a procissão de mãos dadas com o pai e a joga sem
vida para uma das beiradas da rua. Muitas outras pessoas também
são atingidas e caem feridas misturando seu sangue com o pó
brando das paredes que se desmancharam na explosão.
Forma-se um grande alvoroço, com mulheres desmaiando e seus
maridos carregando-as para a calçada, já que a procissão
caminhava pelas ruas.
O grupo não consegue seguir devido a bagunça de pessoas que se
forma quando ouvem-se tiros. È a policia local, também a cavalo
que se aproxima. Começa uma grande troca de tiros, encoberta
pela ladainha do bispo que recomeça.
Dois bandidos caem mortos e um policial acerta João que também
cai do cavalo bem nos pés de um dos padres que assusta-se e deixa
cair o pedestal com vela sobre várias pessoas. Um dos bandidos
desce do cavalo no meio da multidão, pega João e o coloca na

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garupa do cavalo de outro, de estatura menor, então torna a montar


e sem em disparada pelo meio da multidão no sentido do caminhar
da procissão. É seguido por mais um dos bandidos., que ao saírem
do meio da procissão são atingidos por tiros e caem mortos
também. Os outros estão mortos no meio da procissão.
Já no acampamento da lagoa.
- Corre, pega o João aqui e o coloca deitado ali naquela árvore, ele
ainda está respirando.
O outro bandido desmonta e ajuda João a deitar-se sob a copa da
árvore.
No dia seguinte Maria aparece no lago e não vê ninguém. Então
resolve dar uma volta ao redor da água e quando está desistindo
ouve um gemido e vai na direção do som.
- O que vocês estão fazendo aqui ainda?
- Olha só, a pombinha do chefe apareceu – diz um dos bandidos.
- Mais respeito – diz Maria severamente – não me dirija a palavra
sem eu permitir.
Então Maria vê João caído ao pé da árvore.
- João – grita desesperada, e desce rapidamente do cavalo. – o que
aconteceu? – ajoelha-se ao lado do homem e constata que ele está
febril.
- Ele precisa de ajuda rápido.
- Mas senhora, nós não podemos leva-lo a nenhum lugar.
- Por que não, nós vamos agora leva-lo ao hospital da cidade.

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Aparece na frente dela o bandido chamado de Pequeno. De


estatura alta e forte, olhar severo, com uma cicatriz no rosto e falar
enérgico.
- Ele não pode ir a cidade, senhora.
- Porque não? Vocês vão deixa-lo aqui para morrer?
- Se ele for ao hospital será preso e depois enforcado – conclui o
bandido
- Preso, enforcado? Porque?
- Porque nós assaltamos o banco da cidade – diz o outro bandido,
conhecido por Grandão, mas de estatura pequena, magro com
barba curta e pele clara.
- Vocês? - Maria se afasta e encosta a mão na arvore para não cair
– Então vocês são os bandoleiros?
- Sim senhora, nós somos os bandoleiros.

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CAPITULO III
BANDOLEIROS

- Nós assaltamos o banco da cidade e na troca de tiros com a


policia um tiro acabou acertando o olho do chefe.
- Chefe? Então o João é o chefe dos bandidos?
- Isto mesmo senhorita – fala novamente pequeno
- Mas ele precisa de ajuda urgente
- Se tiver alguma ajuda ele vai preso e vai morrer na prisão. Então
nós decidimos que ele vai morrer aqui mesmo.
- Não, isto é muito cruel. Eu sei de um lugar onde ele pode ser
levado.
- Ah, então a fazendeirinha vai colocar o chefe dos bandidos em
sua cama de seda e bordados da capital? – diz Pequeno.
- Não seja idiota! Sei onde mora uma velha senhora no meio da
floresta que pode nos ajudar.
- E o risco de ela avisar a polícia? – pergunta Grandão
- Ela não avisará. É minha amiga e vive só em sua cabana. Ela
sabe preparar muitas curas com plantas do mato. Ela pode nos
ajudar.
Os dois bandidos se olham
- Vamos, coloquem-no sobre o cavalo, não podemos perder mais
tempo.
No meio da floresta densa descobre-se um casebre com
fumaça saindo pela chaminé, encravada no meio do telhado de
palha. Uma casa simples, de um único cômodo, com um caldeirão

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cozinhando sobre o fogo da lareira, uma cama, uma mesa e


prateleiras rusticas com ervas de muitos tipos penduradas secando.
A iluminação se dá por uma pequena janela à frente o velas
auxiliadas pelo fogo da lareira. Há um caminho até a casa, carcada
por muitos tipos de ervas, que a velha utiliza ou põe para segar e
guardar.
No casebre da floresta
- Pode deixar menina – vis uma velha com aparência de bruxa –
Ele vai ficar em boas mãos. Eu vou buscar no mato algumas ervas
que vão diminuir a febre e depois vou cuidar deste ferimento.
- Bom, preciso ir antes que papai sinta minha falta, mas amanha eu
volto aqui. – então Maria sai da cabana, sobe no cavalo e se vai.
- Está ai uma mulher forte e decidida – diz Grandão a Pequeno que
apenas olha.

Na fazenda.
- Onde esteve minha filha?
- Estive visitando a velha da floresta.
- Cruz credo, Maria – arrepia-se Isabel – Aquela velha parece mais
uma bruxa do que um ser humano.
- E ela vai começar a fazer bruxaria agora. - diz Pedro
- Olha o respeito, Pedro- chama atenção o pai.
- E o que você foi fazer lá, filha?
Maria hesita um pouco.
- Eu estava apenas cavalgando e quando vi já estava perto da casa
dela, então resolvi entrar.

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- Entendo filha, mas é melhor você ficar distante daquele lugar,


não se ouve na cidade coisas boas de lá.
- Sim, papai.
No dia seguinte Maria vai até a cabana da velha senhora.
- Bom dia, como está nosso bandoleiro hoje?
- Está melhor menina – responde a velha. Passou a noite sem
febre e mais alguns dias o ferimento já estará curado.
- E o olho dele, ficará bom?
- Não menina, este olho está perdido.
- Onde estão os amigos dele?
- Estão na mata caçando alguns animais para o almoço. Depois a
gente salga o que sobrar e terremos carne para uns bons dias.
- Eu preciso ir antes que papai descubra que estou aqui.
- Eu sei menina. Ele te proibiu de vir aqui porque o povo da cidade
não fala coisas boas a meu respeito.
- Como a senhora sabe?
- Eu sei tudo, menina. – e vira-se para trocar os panos que cobrem
o ferimento no olho de João.
Maria olha espantada e sai.

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CAPITULO IV
CIGANOS

- Getúlio quer tirar nosso presidente. – grita Egidio inconformado,


na sala da sede, ao chegar da cidade e encontrar toda a família
reunida.
- Como é, papai? – pergunta Alexandre.
- Meu filho, Getúlio quer tirar o presidente Washington Luiz e
tomar o poder.
- Mas não podemos permitir isto – completa Alexandre. Se isto
acontecer os bolcheviques vão tomar conta do Brasil.
- Ah, mas é claro que não, você só fala besteira. – diz Pedro
- Fiquem quietos vocês dois! Isto aqui é uma casa, não um ring de
luta. O prefeito Cenobelino acaba de criar a Coluna Legalista.
Todo bravo homem de Rio Preto deve se alistar. Vamos defender
o Brasil.
- Eu vou, papai. Amanhã pela manhã estarei lá com os heróis de
Rio Preto. – fala Alexandre.
- Eu é que não vou. Imagina ir para a guerra para defender um
presidente que nem sabe que vive gente nestes sertões de São
Paulo. - diz Pedro, e sai da sala.
- Obrigado filho, sabia que poderia contar com você. – fala Egidio
a Alexandre, agradecido.
Alexandre parte da fazenda ao raiar do dia, com o galo na
porteira do pasto cantando boas vindas ao Sol. Vai cavalgando em
direção à cidade.

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Logo na entrada do povoado, ele depara-se com várias pessoas


acampadas em barracos em uma enorme praça. No entanto as
barracas tem tapetes caros forrando o chão e há muitos tipos de
panelas e tachos de cobre pendurados em vários lugares, além e
alguns automóveis, coisa rara naqueles sertões. Ele para e fica
observando aquele povo estranho, com roupas que eram
desconhecidas por ali.
- Bom dia senhor. – um homem alto de bigodes e roupas estranha,
cheio de anéis e colares de ouro aproximou-se.
- Bom dia. Quem são vocês?
- Somos os ciganos, nunca ouviu falar de nós?
- Não, nunca ouvi de vocês. De onde vieram?
- Nossas casas ficam em Campinas, mas vivemos por todo lugar
comercializando.
- E o que vendem?
- Cobre. Vendemos maravilhosos utensílios de cobre. Tachos e
panelas. Deseja algo?
- Não, obrigado. Bons negócios senhor. – e inicia sua cavalgada.
- Obrigado, e boa caminhada.
Chegando a frente da prefeitura, na avenida, Alexandre
depara-se com um grupo numeroso de pessoas, os mais ricos a
cavalo, os mais pobres a pé, todos esperando o pronunciamento do
prefeito Cenobelino, que logo aparece em um palanque
improvisado.
- Senhores, bem vindos. Obrigado por virem unir-se a Coluna
Legalista. Nós rio-pretenses e paulistas temos o dever de defender

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nossa constituição e nosso país de quem o quer destruir: o senhor


Getúlio Vargas. Vamos pegar em armas e combater todos aqueles
que estiverem com Getúlio e contra o Brasil. Nós somos a frente
do sertão norte e vamos impedir que os getulistas avancem em
nosso estado. Ali, ao lado de vocês, estão os recrutas do exército
paulista. Eles vão anotar seus nomes e dar-lhes os uniformes e suas
armas. Depois é só embarcar nos caminhões e seguir para as
frentes de batalha.
Alexandre amarra o cavalo em um local apropriado, junto com
os outros e segue para uma das filas.
- Bom dia. - diz um cigano, visitando o armazém de Andrea.
- Bom dia, senhor. Em que posso ajuda-lo? Tecidos? Sãos os
melhores de toda a Itália. Alimentos? Tenho os melhores preços da
região.
- Obrigado. Agente prefere fazer trocas.
- Trocas? Que tipo de trocas?
- Cobres, utensílios de cozinha feitos no melhor cobre.
- Posso vê-los?
E o cigano busca do lado de fora alguns tachos e panelas para
mostras a Andrea.
- Então, o que acha de nosso produto?
- Bons, são muito bons.
- Então vamos ter negócios?
- Só teremos negócios se me mostrar onde arrumou tanto ouro. –
olhando para os colares do cigano, que dá altas risadas.
- Nós somos da terra do ouro, Campinas. Conhece?

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- Campinas? Nunca ouvi falar. Me fale mais sobre esta cidade.


- Campinas é a terra do dinheiro paulista, nossa terra.
- Que interessante, deve ser uma terra boa para se fazer negócios.
- Sim, muito prospera.
A conversa é interrompida com o passar da caravana dos
Voluntários de São Paulo rumo às fronteiras com Minas, onde
tropas de Getúlio tentam entrar no Estado.
Alexandre passa pelo armazém de Andrea dentro de um dos
caminhões, e fica observando o cartaz colado na parede do
armazém, com um soldado apontando para o leitor e sugerindo que
ele deve ser também um voluntário de São Paulo.
- Acho que preciso conhecer esta cidade. – diz Andrea.
- Vai ser bom, certamente. Será mais promissor para seus
negócios. E falando em negócios, vamos negociar.
- Sim, sim. Estas panelas de vocês muito me agradam. Vamos
barganhar.
Os caminhões chegam a fronteira com Minas, nas margens do
Rio Grande. Os soldados descem e ficam maravilhados com a
visão do grande Rio, largo e com as aguas limpas correndo a sua
frente.
- Senhores, - diz um comandante – Bem vindos à fronteira Norte
de São Paulo. Nos caminhões há barracas que precisam ser
armadas antes do anoitecer. Há também material para a cozinha.
Algum de vocês sabe cozinhar? Vamos precisar de um cozinheiro.
- Eu senhor – apresenta-se um português.
- Qual é sua experiência?

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CORONELZINHO

- Em Portugal, antes de imigrar, eu era ajudante de cozinha na


igreja.
- Ora, muito bem. Teremos então uma comida abençoada. Qual é
seu nome, soldado?
- Emilio, senhor.
- Muito bem, Emilio. Os mantimentos disponíveis estão na
carroça, junto cos os utensílios de cozinha. Faça um bom uso deles
e trate bem o estomago de meus homens.
- Sim senhor. – responde Emilio
- Senhores – chama atenção o comandante – veem do outro lado da
margem do rio aquelas fumaças? São as fogueiras de nossos
inimigos. Estas margens do nosso lado devem ser protegidas.
Vamos nos espalhar e atirar em todo o barco que se aproximar,
entendido?
- Sim senhor. – todos respondem.
Quando o comandante se afasta Emilio reclama para um
pequeno grupo de soldados, entre eles Alexandre.
- Aquela comida não var dar nem para uma semana de lutas. Eu já
cozinhei para mais de 100 padres em uma refeição e sei quais as
quantidades que se consome, ainda mais neste frio de inverno ao
lado de um rio. Se não pescarmos ou caçarmos, logo todos
estaremos famintos.
- Quem sabe mortos também. Embora exista armas em abundancia,
a munição é muito pouca, em dois combates elas se acabam.
Enquanto conversam, grande parte dos voluntários ocupa-se
na montagem das barracas.

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Na cidade um grupo numeroso de soldados de Getúlio entra e


concentra-se na praça da Igreja, dando tiros para o alto e fazendo
bagunça.
Acabam por queimar a igreja central e o comandante grita ao
povo, mulheres, crianças e idosos que sobraram na cidade e os
observa por detrás das janelas.
- Povo desta cidade, digam ao seu prefeito que esta igreja
queimando é apenas um sinal do que faremos com a cidade toda se
ele não desmanchar sua Coluna Legalista e mandar seus
voluntários de volta às suas casas. Getúlio vai derrubar seu
presidente e massacrar esta cidade.
Enquanto a igreja queima, um rapaz sai em disparada a cavalo
pela estrada de minas, passando em frente ao armazém de Andrea,
o vê fechado, mas segue em frente sem parar sua cavalgada.
Na frente de batalha dos rapazes tocam uma musica em suas
violas. É a musica cavalgada., enquanto bebem uma cachaça.
- O que estão bebendo, pergunta Alexandre.
- É cachaça mineira, das melhores. Quer experimentar?
- Nunca provei isto, me de um pouco.
- O soldado passa a garrafa para Alexandre, que bebe um gole e faz
uma careta de forte que é a bebida.
Todos riem.
- Aqui este é o nosso divertimento, Alexandre. Vai ter que se
acostumar coma companhia da pinga enquanto estiver no front de
batalha.
Alexandre pega uma matraca.

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CORONELZINHO

- O que é isto?
- Isto é algo que esperamos nunca usar. Esta matraca imita o som
de uma metralhadora.
- E para que serve?
- Serve para espantar os getulistas quando ficarmos sem munição.
- Sim, corremos o risco. – diz outro voluntário. Você viu que todos
temos nossas armas, porém muito pouco munição nos foi dada.
Alexandre bebe mais um pouco de cachaça para ter coragem,
talvez.
Ouve-se um tiro no meio da floresta e pouco depois vê-se um
cavalo cavalgando solitário. Em sua sela lê-se: Martins. Junto ao
corpo do jovem que saiu de Rio Preto está o exército getulista
observando-o.
- Ele estava seguindo para a divisa de Minas, então é para lá que
nós vamos.
E uma extensa tropa segue pelas estradas.
No acampamento estão todos embriagados.
- Estou com fome – diz Alexandre.
- Estamos quase sem comida. Vem comigo até a mata, vamos ver
se caçamos algum animal para a refeição.
Quando estão no meio da mata ouvem os vários tiros das
tropas getulistas.
As tropas de Rio Preto, embriagadas, não tiveram tempo de
revidar ou se proteger. Os dois voltam correndo, mas somente a
tempo de ver o sangue escorrendo de seus amigos. Estão todos
mortos.

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ADRIANO MARINI

- Estão todos mortos, todos! – certifica-se Emilio, após andar por


entre os corpos.
- E agora, o que vamos fazer? – pergunta Alexandre em sua
inexperiência.
- Vamos voltar a Rio Preto e pedir uma caravana para virem buscar
os corpos.
- Não vamos enterra-los?
- Não, assim vai ficar mais fácil seus famílias os identificarem.
Vamos, os getulistas ainda devem estar pertos.
Alexandre pega as duas garrafas de bebida, ainda intocadas,
do meio das pernas do soldado, agora morto, e parte.

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CORONELZINHO

CAPITULO V
ANDREA, O ITALIANO

Na fazenda
- Vocês conhecem o italiano que abriu uma mercearia para os
colonos? - pergunta Alexandre
- Não, mas se é italiano não deve ser boa coisa. – comenta Adelair
- Ora, deixe de implicância – corrige Isabel – se é uma mercearia
nova, pode ter alguns tecidos diferentes para nossos vestidos.
- É, até que você pode estar certa. – fala Maria
- Se tiver tecidos novos deve ser de muito mau gosto. Se ao menos
fossem franceses – diz Adelair olhando para fora da janela e
sonhando.
- Para vestir esta dai qualquer pano de saco de café serve. – diz
Pedro.
- Pedro, você precisa aprender a respeitar suas irmãs, apesar de
serem meninas são de toda forma mulheres e você o homem. – diz
Egidio e, virando-se para as meninas. – Acho que não custa vocês
darem uma olhada por lá, afinal como nós também temos uma
mercearia, é bom fazermos amizade com os concorrentes. – e
olhando para Pedro – e saber o que eles estão vendendo que nós
possamos não ter.
As três meninas cavalgam pela estrada da fazenda, passando
pelo pasto e por sob a copa de arvores até chegarem ao vasto e
denso bambuzal.

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ADRIANO MARINI

- Dizem que aqui é a morada dos sacis. – diz Isabel.


- Quanta besteira, Isabel. Sacis são apenas lendas – retruca Adelair
- Pois saiba que eles são reais - afirma Maria – em cada gomo
destes bambus há um saci que ainda vai nascer.
- Eu é que não acredito nestas historias. – diz Adelair
Neste instante o cavalo de Adelair empina-se e sai correndo
em disparada pela estradas. As meninas chamam, mas sem
sucesso. O cavalo continua a correr e Adelair a gritar por socorro,
quando um cavalo branco fica ao lado do seu, também correndo e
uma mão grande pega os arreios do cavalo e puxa.
- Ohhh, ohh, ohh... calma amigão
E o cavalo vai parando devagar.
- É perigoso correr assim por ai menina, podia ter se machucado. –
diz um homem jovem, alto loiro e com pronuncia italiana.
Adelair olha pra ele e fica sem conseguir falar de admiração.
- Mas não fui eu quem fez isto.
- É, não foi ela, foram os sacis. – informa Maria
- Sacis, o que é isto?
- São moleques arteiros que usam um gorro vermelho e tem uma
perna só. – diz Maria se aproximando.
- E como um menino de uma perna só conseguiu fazer tudo isto?
- Eles são espíritos arteiros – conclui Isabel.
- Ah, moleques espíritos. Vocês brasileiros tem uma imaginação
extremamente criativa.
- Ah, o Senhor também não acredita – diz Maria
- Não, lá na minha terra não tem estas coisas, só uns gnomos e

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CORONELZINHO

fadas das florestas, mas sacis não.


- E onde é sua terra? – pergunta Adelair
- Itália. Eu vim de lá há pouco tempo e sou o proprietário da nova
mercearia da colônia.
- Ah, então o senhor é o novo dono da mercearia. – diz Isabel
- Nós estávamos indo para lá – diz Adelair ainda encantada pelo
italiano.
- Então eu terei o maior prazer em acompanha-las. Quem são
vocês?
- Nós somos filha do senhor Egidio. – informa Maria
- Egidio? O Senhor Egidio Santos?
- Sim, você o conhece? – pergunta Adelair
- Ainda não, mas todos aqui sabem quem é o Coronelzinho,
proprietário de metade das terras desta Rio Preto.
Chegam ao armazém e as meninas ficam deslumbradas pela
beleza dos tecidos vendidos ali.
- São tecidos de Milão. Eu os trouxe comigo da Itália.
- São lindos Italiano. Oh, me perdoe. Ainda não sabemos seu
nome. – diz Maria.
- Me perdoem meninas, foi distração minha. Meu nome é Andrea,
muito prazer em conhece-las.
- Prazer senhor Andrea. Eu sou a Adelair, mas todos me chamam
de Lola, esta é minha irmã Isabel e aquela é a Maria.
- Lola, é um belo nome. Será que a senhoria me acompanharia ao
Baile de São José?
As meninas se surpreendem.

27
ADRIANO MARINI

- Seria melhor o senhor perguntar ao nosso pai, afinal ele nem


ainda o conhece.
- Tem razão, senhoria Maria, mas antes gostaria de saber se
agradaria à senhorita Adelair a minha companhia.
- Se papai permitir, eu o acompanho.

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CORONELZINHO

CAPITULO VI
O BAILE

- Vamos meninas, seu pai não quer que atrasem – avida a mãe
Angela. Tão logo acabem de almoçar vocês vão ao rio tomar banho
para depois de arrumarem.
- Sim mamãe, nós não nos atrasaremos
A mãe sai do quarto e as meninas ficam conversando.
- O Italiano não veio falar com o papai, não é Lola? – pergunta
Isabel
- Ele não deve ter tido tempo, chegou agora da Itália, mal acabou
de abrir o armazém. Deve ter muitas coisas para fazer ainda.
- Espero que ele não ouse lhe tirar para dançar no Baile, senão
papai vai ficar muito furioso – comenta Maria.
- Principalmente porque nossos irmãos também vão estar
presentes, e eles podem não gostar.
- Vamos almoçar para podermos começar a nos arrumar – termina
a conversa Adelair.
Na mesa já se encontravam o pai e os irmãos das meninas,
Alexandre e Pedro.
- Ora, ora, veja papai que resolveu aparecer: as três patinhas.
- Mais respeito com suas irmãs Pedro.
...

No baile à noite, chegam de charrete o Coronel e sua esposa

29
ADRIANO MARINI

Angela e no bando de trás as três meninas. Logo mais atrás vem


os dois rapazes a cavalo e alguns capangas.
- Minhas filhas, eu quero que se comportem como senhoras neste
Baile e não deem atenção a estranhos.
- Bem vindos família Santos. – diz o Bispo da cidade na porta do
grande salão.
- Senhor Bispo – Angela diz e beija-lhe a mão
- Senhor Bispo – diz Egidio e faz uma reverencia com a cabeça.-
vamos orar para que consigamos os fundos necessários para
reerguer nossa igreja.
- Com a graça divina senhor Egidio e com a ajuda dos filhos de
Deus, conseguiremos o suficiente para reparar os estragos feitos
pelos soldados getulistas. – e virando-se – Deixe-me apresenta-los
a uma pessoa. Madre Marta, por favor.
E uma freira se aproxima.
- Madre, este é o coronel Egidio Santos, um dos maiores auxiliares
de nossa obra em Rio Preto.
- É um prazer senhor.
- E estas são suas filhas, Maria, Isabel e Adelair. Estas meninas são
as mais inteligentes e bem educadas de todo o sertão paulista. Sem
falar que o amor do pai por elas é imensurável.
- É muito bom saber Senhor Coronel. Em breve vamos inaugurar
um colégio de moças na cidade em homenagem a Santo André e
seria um prazer tê-las como nossas alunas.
- Fiquem à vontade Coronel – diz o Bispo indicando para entrarem.
Muitas pessoas começam a chegar e muitas famílias vão à

30
CORONELZINHO

mesa do Coronel o cumprimentar, afinal é um dos homens mais


poderosos da região.
Quando o grande salão do Rio Preto Automóvel Club está
repleto, a orquestra começa a tocar.
- Vamos dançar minha esposa? – convida Egidio de pé ao lado
de Angela, oferecendo-lhe a mão. Pedro, cuide de suas irmãs para
que nenhum aventureiro se aproxime.
- Pode deixar, papai.
- Sabe onde está seu irmão?
- Deve estar lá fora com os jagunços protegendo a entrada.
- É uma boa iniciativa. Com estes bandoleiros por ai é melhor não
facilitarmos com a segurança.
Lá fora, Alexandre se embebeda como os jagunços do pai,
contando historias da guerra de São Paulo e tropeçando nas pernas,
quando todos riem. No meio dos jagunços e de mais alguns
seguranças de outras famílias estão João, Pequeno e Grande,
porém não estão bebendo, apesar de participarem do mesmo
entusiasmo do grupo. Alexandre é o centro das atenções com suas
historias e movimentos que imitam seus personagens.
No salão as meninas veem o Italiano, que passa por elas
olhando-lhes. Apenas Adelair sorri com o canto dos lábios.
Os pais voltam à mesa para descansarem, quanto o Italiano
que ocupa solitário uma mesa em uma lateral próxima se
aproxima.
- Senhor Egidio, Senhora Angela. É um prazer conhece-los. –
abaixando a cabeça ao cumprimentar o Coronel e beijando a mão

31
ADRIANO MARINI

de Angela.
- Posso saber quem é o senhor?
- Eu sou Andrea, cheguei há pouco da Itália e abri um humilde
armazém nas proximidades dos limites de suas propriedades, na
colônia dos italianos.
- Ah, o nosso concorrente. – fala Angela.
- Por favor, sente-se senhor Andrea – convida Egidio
- Obrigado.
Maria cutuca Adelair.
- Quais são suas perspectivas para a cidade, Sr. Andrea?
- Bom Senhor Egidio, o armazém aqui na colônia é apenas meu
ponto de chegada, mas não pretendo ficar por muito tempo. Após
me estabelecer, pretendo mudar-me para Campinas.
- Pois bem. Campinas é uma cidade de muito progresso nestes
tempos, faz uma escolha acertada. Se um dia desejar vender o
armazém, eu terei muito gosto em adquiri-lo.
- Será um prazer vende-lo ao Coronel. Com certeza o avisarei.
- Estas são minhas filhas, Senhorita Adelair, Senhorita Maria e
Senhorita Isabel. E este é meu filho Pedro. Minha esposa Angela
acho que já conhece.
- Encantado senhoritas. Já tinha ouvido falar da família. As
meninas já havia conhecido na estrada quando foram visitar meu
armazém.
- É mesmo? – olhando para as meninas – Não sabia que já haviam
se conhecido. Mas em todo caso, vi que está só em sua mesa. Se
não estiver esperando alguém, gostaria que nos fizesse companhia.

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CORONELZINHO

- Com muita honra, senhor Egidio.


O Bispo aproxima-se.
- Senhor Coronel, vamos começar o leilão dos animais assados,
gostaria de se aproximar do palco?
- Certamente senhor Bispo. Este é nosso convidado, senhor
Andrea. Chegou da Itália há pouco e está se estabelecendo
temporariamente com um armazém na colônia dos italianos.
- Ah, lá nas fazendas de café. Seja bem vindo a nossa comunidade
senhor Andrea. Deseja nos acompanhar?
- Vou me aproximar apenas para apreciar e torcer pelo senhor
Egidio fazer suas aquisições a valores mais baixos.
- Então vamos.
Quando saem Maria vê Pequeno na porta do salão olhando-a.
Ela se assusta e ele faz um gesto para chama-la para sair do salão.
- Ai mãe, não estou me sentindo bem – diz Maria.- Acho que o
calor do salão está me fazendo mal.
- Não é melhor ir lá fora tomar um pouco de ar? – sugestiona
Angela.
- Sim, acho que o frescor e a brisa da noite podem me
reestabelecer.
- Eu a acompanho, irmã.
- Não será preciso, Pedro. O Alexandre já está lá fora com nossos
homens, ele pode me proteger. Papai certamente gostaria que
ficasse aqui para cuidar de mamãe. Eu só vou respirar um pouco e
já retorno. – diz Maria já levantando-se e saído sem dar chance
para Pedro a acompanhar.

33
ADRIANO MARINI

Ao sair do salão uma mão segura Maria e outra lhe tapa a


boca, levando-a para um local afastado, sob uma pequena mata ali
próximo.
- João?! Exclama assustada Maria.
- Sim Maria. – diz João ladeado pelos dois amigos.
- O que você faz aqui?
- Você Maria! Eu quero você.
- Está louco? Como eu vou sair com um bandoleiro?
- Mas eu não falo em sair, mas sim em fugir.
- E se eu não quiser?
- Eu a levo assim mesmo.
Egidio retorna à mesa feliz por ter conseguido comprar uma
prenda.
- O senhor Egidio deu muita sorte – comenta feliz Andrea. Todos
queriam o leitão assado, mas no final ele acabou levando a melhor.
- Ora meu caro Andrea. Não foi sorte, foi apenas uma questão de
dinheiro. Eu tinha um pouco a mais que o amigo, por isso pude
dar um lance maior.
- É, aquele senhor estava se lamentando porque não conseguiu tirar
dinheiro suficiente do banco devido ao assalto.
- Uma lástima, sem duvida. Mas é o preço do progresso. Com a
chegada da estrada de ferro, chegam também pessoas de má índole.
Neste momento um garçom chega à mesa trazendo o porco
assado sobre uma bandeja de prata com a tradicional maçã na boca.
- Pode colocar aqui, meu amigo – indica Egidio um lugar á mesa.
- Sim senhor. – diz o garçom, olhando para Isabel.

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CORONELZINHO

- Nunca o vi por aqui. É novo em Rio Preto?


- Sim senhor, cheguei há pouco de Portugal.
- E qual seu nome?
- Emilio Pereira.
- Pereira? Ah, um judeu convertido?
- Sim, me converti ao cristianismo tão logo coloquei os pés nesta
pátria abençoada e adotei o nome de Pereira para enraizar minha fé
e frutificar minhas obras.
- Muito boa ação, senhor Emilio.
- E os padres me trouxeram para Rio Preto para auxiliar na
paroquia.
- É um bom começo meu moço.
- Obrigado. – e se afasta.
Durante toda a conversa, Emilio olhava para Isabel, que
retribuía com sorrisos leves, sem que ninguém percebesse.
- E Maria, onde está?
- Ela não estava se sentindo bem – informa Angela. Então saiu
para tomar um pouco do ar da noite.
- E porque você não foi com ela, Pedro?
- Porque ela lembrou que o Alexandre está lá fora com os
jagunços, então não seria preciso o Pedro nos deixar sozinhas. –
responde Angela.
- Vou lá vê-la. Pedro cuide de sua mãe e suas irmãs.
- Sim, papai.
Ao sair do salão, Egidio depara-se com todos seus homens
caídos bêbados nas escadarias, com Alexandre dormindo pesado

35
ADRIANO MARINI

no meio deles.
- O que está acontecendo aqui? – grita Egidio
- Alguns jagunços apenas riem.
- Acho que seus homens estão todos bêbados Coronel. – diz um
jagunço de outra família.
- E quem foi o responsável?
- Foi ele. – apontando para Alexandre. Seu filho trouxe a bebida
escondida nos cavalos.
- Miserável, maldito miserável. – e tira o cinturão e começa a bater
em Alexandre, que acorda bêbado gritando.
As mulheres da família ouvem a gritaria e correm para fora
ver, quando encontram Alexandre encolhido em um canto da
igreja.
Angela corre para conter Egidio antes que mate o filho.
- Você está louco, Egidio? Vai matar nosso filho, é?
- Este maldito imbecil trouxe a bebida para todo esse povo ai
jogado nas escadas – e aponta ao menos 15 jagunços , entre os seus
e os dos outros coronéis.
- E Maria, onde está? – pergunta Angela.
- Não sei. Com este desgosto enorme nem lembrei dela.
- Ela pode estar no meio da praça respirando um pouco. Diz
Adelair.
- Não está não, senhorita. – interrompe o jagunço novamente.
- Então onde ela está? – pergunta Egidio
- Eu a vi sendo levada pelos bandoleiros que assaltaram o banco.
- Levada? Mas levada como?

36
CORONELZINHO

- Eu a vi sair na porta e o chefe dos bandidos segurar sua boca e a


arrastar para longe.
- Meus Deus! Ela foi sequestrada. – diz Angela
Egidio entra correndo no salão passando por cima de todos os
jagunços jogados no chão. Ao passar pela porta grita:
- Minha filha! Minha filha foi sequestrada pelos bandoleiros. Eu
preciso de homens para iniciar uma busca.
Um grande alvoroço se fez no local, todos se levantando ao
mesmo tempo quanto o bispo toma a frente.
- Senhores, por favor, com calma. Os homens que quiserem ir vão
para o lado de fora, as mulheres ficam que vamos começar uma
novena para que a menina esteja bem.
A madre aproxima-se de Egidio.
- Senhor Egidio, eu cuidarei das meninas que ficaram,
- Eu a acompanho Coronel. – diz Andrea
Os homens saem e as mulheres aproximam-se do palco. O
bispo traz uma imagem de São José para uma mesa. AS mulheres
se ajoelham e começam a rezar.
Madre marta chama Adelair, que a segue.
- Onde esta sua outra irmã?
- Não sei Madre, deve estar em algum canto chorando desesperada.
- Pobre menina. Vamos então deixa-la a sós por uns momentos,
depois vamos busca-la.
Isabel estava ao lado de fora do salão, na parte de trás do
prédio. Havia saído por uma porta traseira e conversava com o
garçom Emilio.

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ADRIANO MARINI

- Eu gostei de você assim que a vi. Você acredita em amor à


primeira vista?
- Não fale assim, senhor Emilio, ainda sou uma moça e nunca
fiquei sozinha com um homem em toda minha vida.
- Seu pai prende muito vocês, não as cria para a vida, para
conhecer outras pessoas, outras coisas, lugares, situações.
- Papai é um homem muito bondoso conosco.
- Sim, todos sabemos que é um homem muito generoso,
principalmente quando vem ao bordel da cidade.
- O que?...
E Isabel é interrompida pelo cavalgar dos homens que passam
pela lateral do salão indo à procura de Maria.
Ambos se escondem em um canto e aproveitando a ocasião,
Emilio a beija.
Andrea, no final do grupo, vê a cena, porém passa sem se
manifestar.
- Porque você fez isto?
- Porque não resisti à sua beleza, doce Isabel.
- Mas não foi correto você beijar uma moça escondido, e ainda
mais sem estar namorando com ela.
- Então eu posso corrigir este ato. Senhorita Isabel, deseja namorar
com o garçom Emilio?
- Ah, pare com isto, Emilio. – rindo.
- Está bem. Senhor Emilio, eu aceito seu pedido, mas terá que
comunica-lo ao meu pai, o Sr. Coronel Egidio Santos.
- Assim o farei doce senhora, tão logo ele retorne de sua busca.

38
CORONELZINHO

No meio da floresta onde estavam Maria e João, vem Pequeno


cavalgando rápido ao lado de Grande.
- João, João – gritando. O pai da menina reuniu um grupo na
cidade e está vindo atrás de nós.
- Minha nossa! – exclama Maria.
- Bom minha menina, precisamos ir. Fique aqui e seu pai a
encontrará.
- Não, meu pai não vai me encontrar, porque eu vou com vocês.
- O que, está louca? Deixar todo o conforto da sede de uma
fazenda e um futuro pela frente para fugir com um bandoleiro?
- Sim, eu quero fugir com você, e o farei onde você for.
- Vocês vão ficar ai discutindo se ela vai ou não vai e daqui a
pouco vão discutir é onde vão nos enterrar.
- Vamos. – Maria diz, subindo em um dos cavalos e puxando o
grupo em disparada pela floresta sem rumo.
Já amanhece quando os cavaleiros retornam ao salão e Adelair
e outras moças dormem em um dos quartos anexo ao salão,
enquanto as senhoras ainda rezam, apesar do cansaço. Os homens
entram no salão e as mulheres vem os receber. O bispo aproxima-
se de Egidio.
- Então, Egidio, alguma notícia?
- Nada senhor Bispo. Localizamos o acampamento mas não
estavam mais lá. Já avisamos a polícia que vai passar um
telegrama às policias da região. Em pouco tempo serão presos.
- Vamos rezar a São José para que seja breve este período de fuga,
antes que atravessem o Rio Grande em direção à Minas.

39
ADRIANO MARINI

- Egidio, a Isabel não está com as meninas. – diz Angela.


- Mais uma filha desaparecida? Meu Deus, não.
- Calma Senhor Egidio, esse ai eu sei onde pode estar. – diz
Andrea.
- Sabe? E onde ela está? – pergunta Angela.
- Por favor, me sigam. - e Andrea sai pela porta da frente e
circunda o salão, pelo caminho que os cavaleiros haviam passado,
seguido por Angela e Egidio.
- Aqui está uma de suas filhas sumidas, senhor Egidio.
Isabel dormia nos braços de Emilio. Os pais olham
incrédulos a cena.
Angela chega perto, brava gritando pela filha enquanto que
com os sapatos na mão lhe acerta o corpo com muita fúria.
Emilio acorda assustado e olha o pequeno grupo.
Egidio se descontrola:
- Vai casar, vai casar, vai casar agora. Andrea, vá chamar o Bispo.
E Andrea sai sem fazer perguntas pois não seria prudente
naquele momento. Volta rapidamente acompanhado pelo senhor
Bispo.
- Senhor Bispo, olha que cena triste. Enquanto nós procurávamos
nossa filha sequestrada seu garçom português se aproveitava de
minha filha.
- Meu Deus, que lástima.
Emilio se compõe enquanto Isabel chora em um canto.
- Senhor Egidio – diz Emilio – Eu quero pedir a sua permissão
para me casar com sua filha – ainda se recompondo, com a camisa

40
CORONELZINHO

abotoada errada e sem um dos calçados.


- Mas que abusado, me dirigir a palavra depois de tudo o que fez,
vai casar sim, mas é agora. Senhor Bispo, por favor, realize este
casamento.
- Vamos para dentro – sugeriu o Bispo.
- De jeito nenhum! – diz o coronel furioso. Se eles consumaram
aqui, então é aqui que vão casar.
- Papai, não, não faça isto. – pede Isabel, chorando aos pés do pai.
- Você deveria ter pensado nisto antes de se tornar a Senhora
Emilio.
- Papai, me perdoa, eu não fiz nada.
- Senhor Bispo, por favor, inicie o casamento.
Emilio olha com raiva para Andrea desconfiando que ele seja
o responsável.
Adelair chora agarrada ao braço de sua mãe.
O bispo termina a rápida cerimônia.
- Parabéns pela aquisição Senhor Emilio, a Isabel foi uma
excelente filha, assim acredito eu, deverá ser uma boa esposa.
- Mas senhor Egidio, eu não tenho casa. Morava junto com os
padres, nós temos para onde ir.
- Bom, isto já não é mais problema meu. Vocês escolheram assim.
Tenham um bom dia. Vamos Adelair, Angela. – e viram as costas.
O Bispo volta ao salão, deixando Isabel ajoelhada no chão
chorando.
Ao passar de cavalo pela frente do salão, Egidio vê os
jagunços já de pé, porém de ressaca e Alexandre junto com eles.

41
ADRIANO MARINI

- Papai, papai, Eu não sei o que aconteceu. – diz Alexandre, ainda


não totalmente sóbrio.
- Não sabe seu moleque irresponsável. Você embebedou todos os
meus jagunços e por causa disso uma filha foi sequestrada pelos
bandoleiros e a outra se casou com um estranho.
- O que? Quando foi isto?
- Quando você dormia na rua seu bêbado, que é o lugar onde vai
morar a partir de agora.
- Papai?
- Você não é mais meu filho, você não entra mais em minha
fazenda, seu irresponsável.
- Egidio... – interrompe Angela.
- Vamos Angela, vamos voltar à nossa propriedade com o que
restou de nossa família.
E caminham saindo da cidade.
Na porta do salão, o Bispo observa a família se afastando, ao
lado da Madre Superiora, Senhora Marta.
Na rua, aos pés da escadaria observa Alexandre e os jagunços,
agora todos moradores de rua.
No fundo do salão parte o novo casal, Emilio e Isabel, de
mãos dadas.
- Para onde vamos, Emilio?
- Pegar o trem. Vamos para o fundo destes sertões.

42
CORONELZINHO

CAPITULO VII
PEDRO

- Papai, eu e o Andrea vamos organizar a busca pelos bandoleiros.


- Sim, meu filho. Esta noite foi muito dolorida para mim. Nunca
esperaria que em um baile de caridade para reerguer a igreja de
São José pudesse perder três filhos de uma só vez.
- Vou fazer um café para nós, meu marido.
- Sim, Angela. Fico muito grato. Estou mesmo precisando
justamente de um café neste momento – diz Egidio com uma voz
desgastada pelos acontecimentos.
Alguém chama no pé da escada da casa grande, que leva a
entrada principal da casa.
- Vou ver quem é, papai. – e sai pela sala, voltando logo a seguir. –
Papai, é o senhor Bispo.
Egidio se levanta do sofá da sala onde estava com o corpo
caído.
- Senhor Bispo, por favor, entre.
Quando entra é recebido por Angela com uma bandeja com
xicaras de café nas mãos.
- Senhor Egidio, senhora Angela. Vim confortá-los pelos tristes
incidentes que passaram esta noite e informar-lhes que os outros
coronéis que estavam no baile de São José formaram várias frentes
de busca com seus jagunços. Eles estão reunidos na praça da
cidade esperando por alguém da família ou então que eu os avise
que em virtude dos ocorridos, vocês não podem ir.

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ADRIANO MARINI

- Não senhor Bispo. Meu filho Pedro e o senhor Andrea irão


acompanha-los.
O bispo sorri.
- São bons representantes da família, poderão comandar os grupos
de jagunços que estão à sua espera.
- É bom irem, não podemos deixar nossos amigos esperando,
principalmente agora que estamos desprotegidos, sem nossos
jagunços.
Os dois chegam à praça central de Rio Preto à cavalo.
- Bom dia senhores. – diz Andrea
- O que o italiano faz aqui? – pergunta o fazendeiro Samir a Pedro.
- Ele vai nos auxiliar nas buscas. – responde Pedro.
- Meu menino, bem sabe que não confio nos estrangeiros,
principalmente nos italianos.
- É homem de confiança de meu pai, senhor Samir.
- Então ele que se reúna com os outros grupos. No meu não aceito
este povo.
Andrea observa e se afasta.
- Desculpe pelo senhor Samir, Andrea.
- Não se preocupe. Nós ainda somos novos por estas bandas, aos
poucos a confiança vai aparecer nos fazendeiros mais tradicionais
– diz Andrea sem se abalar.
- Então, como vamos nos dividir – questiona o senhor Godoi,
- Eu vou com um grupo pelo caminho que passa ao lado esquerdo
do salão e o senhor Pedro vai pela estrada que nasce ao lado
direito. Sugiro que outros grupos sigam na estrada boiadeira de

44
CORONELZINHO

Guapiaçu que vai pelo lado direito da praça e outro pela boiadeira
de Barretos, que nasce ao lado esquerdo.
- E como pode mandar todos para o mesmo lado, senhor Andrea,
deixando a zona Sul totalmente descoberta?
- Quando fomos atrás da senhorita Maria ainda na noite de ontem,
apesar de não termos a encontrado nos deparamos com uma
fogueira ainda acesa pelos lados do Córrego dos Macacos, por isso
eu acredito que, cercando estes lados, nossas chances de
encontrarmos algo são maiores.
- Eia, meus homens, sigam-me. – disse Sr Samir, dirigindo-se a
estrada boiadeira de Barretos.
- Eia, vamos homens. – agora o coronel Godoi, seguindo na estrada
de Guapiaçu.
- Quem vem comigo, senhores? Vamos iniciar nossa caçada. – e
Andrea segue na estrada da esquerda.
- Vamos senhores. – diz Pedro de modo inseguro, olhando para
Andrea e seguindo pela etrada da direita.
Após uma curta cavalgada.
- Senhor Pedro, devemos tomar cuidado. Por estes lados ficam os
locais de morada das onças.
- É, você tem razão. Vamos andar mais unidos e tomar maiores
cuidados a respeito disto. – e continuam cavalgando floresta
adentro.
- Que fumaça é aquela no meio da floresta? – pergunta Andrea a
um dos jagunços.
- É a cabana da velha feiticeira.

45
ADRIANO MARINI

- Velha feiticeira? O que uma velha faz sozinha neste meio de


floresta?
- Ninguém sabe. Uns dizem que ela é uma santa que vive para
ajudar a curar as doenças do pobres da cidade com as ervas do
mato. – diz outro jagunço
- Outros dizem que ela vive aqui porque não consegue morrer – diz
um jagunço mais jovem
-Todos falam na cidade que foi aqui onde João foi curado do tiro
que levou no assalto ao banco.
- Ah, então ela costuma ajudara a bandidos também? Então deve
ser cumplice da quadrilha – diz Andrea em tom de maldade.
- O povo diz que ela adivinha o futuro, talvez a gente possa
perguntar a ela onde pode estar a menina Maria. – responde outro
jagunço
- Se ela pode mesmo adivinhar o futuro, então adivinho nossa
vinda e deve estar agora há quilômetros de distancia. – diz mais
outro jagunço.
- Ou então deve ter feito um café com bolinhos para nos esperar –
fala Andrea
Todos riem.
- O de casa. – chama Andrea.
Aparece uma velha na porta.
- Primeira duvida solucionada: a velha não prevê o futuro. – fiz
Andrea aos jagunços, provocando risadas de todos.
Todos saltam dos cavalos.
- Bom dia Senhora.

46
CORONELZINHO

- O que querem aqui?


- Apenas conversar com a senhora – diz Andrea tomando a frente
do grupo e entrando na pequena casa.
- Eu não os convidei para entrarem
Andrea não dá ouvidos e entra observando toda a pequena
casa, e fala olhando para tudo ao redor:
- Um grupo de bandoleiros sequestrou esta noite uma mocinha na
cidade e eu e meu grupo estamos na sua busca. Por acaso não viu
ninguém passar por aqui, não é boa velhinha?
- Não senhor Andrea, não vi ninguém por aqui. Vivo só há muitos
anos
- E como sabe meu nome? – pergunta Andrea olhando-a pela
primeira vez diretamente, curioso.
- As vezes a gente sabe quem vem nos visitar.
- Então, o que sabe sobre o sequestro?
- Não houve sequestro algum.
- Como não sua velha caduca ! – irrita-se Andrea – Se eu mesmo
lhe disse que os bandoleiros sequestraram a filha do coronelzinho
esta noite?
- Eles não a sequestraram. A menina os seguiu por vontade
própria. Foi decisão dela.
- Mas que absurdo, como uma moça tão delicada é capaz de
abandonar o lar de uma família com todo o conforto para se juntar
a um bando de bandoleiros. E como a senhora sabe disto?
- As estrelas dizem muitas coisas senhor, basta treinar os ouvidos
para ouvi-las.

47
ADRIANO MARINI

Neste instante Andrea avista uma das vestimentas dos


bandoleiros em um canto ao pé da cama.
- Não é preciso ouvidos apurados para ouvir bandidos sua velha.
Ela se assusta, principalmente quanto Andrea vai ao canto e
pega com o cano do revolver a roupa do bandido ensanguentado.
Vai até fora da cabana, onde estão os jagunços em seus cavalos e
informa:
- Eles acabaram de passar por aqui com a menina e esta velha os
está protegendo. Vejam isto – mostrando a roupa no cano do
revolver.
- O que a gente faz, chefe?
Andrea sorri pela palavra Chefe e diz ao jagunço.
- Quem ajuda bandido também é bandido! Mate-a e depois coloque
fogo nesta cabana para que não sirva nunca mais de abrigo para
bandido. – monta no cavalo e sai, seguido pelo bando quando
ouve-se um tiro e logo em seguida vê-se atrás do grupo que
cavalga a fumaça da cabana queimada.
- Para onde vamos, senhor Andrea?
- Vamos voltar, já vai anoitecer e vai ficar perigoso se ficarmos no
meio desta floresta. Eu vou na frente para dar a notícia ao
coronelzinho e ver se encontro com os outros grupos. Vocês
podem ir para suas fazendas. – e Andrea sai em disparada com seu
cavalo, porém não na direção da cidade, mas no sentido em que
seguiu o grupo de Pedro.
Cavalgando pela floresta, já no inicio da noite, Andrea ouve o
som de cavalos quebrando galhos secos e pisando em folhas. Ele

48
CORONELZINHO

tira o revolver da cintura, amarra o cavalo em uma árvore e


caminha na direção do barulho. Não muito distante depara-se com
o grupo de Pedro, cavalgando lentamente de volta à cidade pela
estrada.
Andrea esconde-se por detrás de uma grande arvore e fica
observando, mirando o grupo com o revolver. Quando Pedro passa
ela atira, mas pisa em um graveto e assusta o cavalo do rapaz que
se levanta e o tiro acerta a perna de Pedro. Depois ele rapidamente
volta ao cavalo, monta e volta pelos mesmo caminho em que veio.
- Acertaram o filho do coronelzinho, venha. – diz um dos jagunços
daquela comitiva.
Todos se reúnem e o põem deitado sobre o cavalo.
- Foi apenas a perna, vamos leva-lo o hospital. Alguém vai até a
fazenda avisar o coronelzinho.
E o grupo ruma acelerado para a cidade.
Andrea chega à fazenda e depara-se com os grupos dos
coronéis Godoi e Samir no pátio externo da sede, enquanto os dois
coronéis conversam com Egidio e interrompem o diálogo quando
Andrea entra pelo porão.
- Nada senhor Egidio. Não conseguimos encontrar ninguém.
- Os coronéis contaram de sua estratégia em cercar a região Norte
da cidade.
- Sim, achei que por termos visto uma fogueira ainda acesa em
nossa busca da noite, provavelmente eles poderiam estar nos
aqueles lados.
- Agradeço muito sua liderança, senhor Andrea.

49
ADRIANO MARINI

Antes de completar a fase, um dos jagunços da comitiva de


Pedro entra na pequena área.
- Senhor Egidio, os bandoleiros atiraram em Pedro.
- Todos se levantam de súbito.
- Meu filho? Onde ele está?
- Nós o levamos ao hospital. O tiro acertou-lhe a perna.
- Ele está vivo? – espanta-se Andrea.
Todos olham.
Ao perceber que todos haviam percebido seu espanto, Andrea
age rápido.
- Graças a Deus! Não me perdoaria nunca se algo acontecesse a
Pedro. Vamos senhor, o Pedro poderá nos dizer quem atirou nele.
- Eu também vou – fala Angela. Quero ver meu filho.
E o grupo sai a cavalo com Angela montada na garupa de
Egidio.
Andrea dá uma olhada para Adelair, que também o olha, antes
de partir.
Ao chegarem ao hospital, vão falar com m médico que está na
portaria.
- doutor, como está meu filho?
- Senhor Egidio. Seu filho teve muita sorte. A bala dos bandoleiros
que era para seu coração acertou sua perna graças ao cavalo, como
disseram os jagunços, mas a direção era exatamente onde ficava o
coração.
- Graças a Deus, foi São José quem desviou a bala – diz Angela.
- Vocês querem vê-lo? Ele está ali na enfermaria se recuperando.

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CORONELZINHO

Ao entrar na enfermaria Egidio fica surpreso pelo grande


número de leitos ocupados.
- Porque há tantas pessoas aqui, doutor?
- Estamos tendo uma epidemia de febre amarela nos fundos do
sertão paulista e os enfermos são trazidos a Rio Preto por termos
uma melhor estrutura de saúde.
- Entendo.
- E meu filho, quando vai sair daqui. – pergunta Angela
- Acredito que em uma semana no máximo. Ele vai ser operado
ainda hoje para retirarmos a bala e depois vai apenas ficar em
observação. Vocês podem voltar tranquilos para casa e retornar
amanhã para ver o meninão.
Quando voltam no dia seguinte, as notícias não eram muito
favoráveis. O estado de saúde de Pedro não era muito bom.
- O que aconteceu? Você não nos disse ontem que era algo
simples, só uma operação para tirar a bala?
- Sim senhor Egidio, era uma cirurgia simples. Porém a bala estava
contaminada.
- Como é? Que historia é essa?
- A bala continha algum elemento que nós desconhecemos e
quando operamos, a perna do rapaz já estava toda apodrecida por
dentro..
- Meu Deus! – diz Angela, afastando-se e segurando pelas paredes
até sentar-se em um banco, onde fica com as mãos segurando a
cabeça, abaixada.
- E o que vão fazer? – pergunta Egidio.

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ADRIANO MARINI

- Nós precisamos amputar aperna de Pedro para que a infecção não


se alastrasse para o resto do corpo. Quem fez isso queria ter a
certeza de que mataria sua vitima, mesmo que o tiro não acertasse
alguma parte vital.
- E como os bandoleiros fizeram isto?
- Isto não parece ser coisa dos bandoleiros. Eles são muito rudes
para pensarem usar alguma substancia em suas balas.
- Mas então.
- Eu aconselho a procurar a policia e informar-lhes deste fato.
- Vou fazer isto.
Mais tarde, ao cair da noite, o médico visita o casal na
fazenda.
- Entre, doutor. Seja bem vindo. Angela, vá fazer um café para
nossa visita.
- Não, não será preciso, minha visita aqui é rápida.
- Então, o que o trás, seu Doutor?
- O Pedro, seu estado de saúde piorou durante o dia. Todo seu
corpo está apodrecendo e para piorar ele contraiu a febre amarela.
- Meu filho! – exclama Angela.
- Maninho! – e Adelair sai a chorar pois estava em pé apoiada no
encosto do sofá, ouvindo a conversa.
- E o que vamos fazer, doutor?
- Seu Egidio, não há muito o que fazer. Ele está sofrendo e não há
perspectivas de melhoras.
- Entendo doutor. – diz Egidio esforçando-se para não chorar.
- Podemos aliviar o sofrimento do rapaz. À meia noite há a visita

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CORONELZINHO

do anjo da morte. Uma enfermeira visita os leitos em que os


pacientes estão em estado terminal e adianta-lhes a morte
aplicando uma injeção especial.

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ADRIANO MARINI

CAPITULO VIII
O GADO

Uma tarde, ainda não refeito dos acontecimentos, Egidio está


sentado na varanda, observando o gado pastar nos vastos campos
qu cercam a residência.
- Papai. – diz Adelair – O senhor Andrea deseja falar-lhe.
- E sobre o que é minha filha?
- ele deseja me pedir em casamento
- E o que você acha disto, filha?
- Eu gostaria que o senhor nos dessa sua benção.
- Fico feliz por esta iniciativa do senhor Andrea. Mostrou-se ser
um homem honeste e destemido. Agrada-me tê-lo na família. Pode
falar com ele que venha conversar comigo
- Sim senhor meu pai. – e Adelair sai feliz para dento da casa.
- Então a menina Adelair vai casar, e justo com o italiano. Em que
mundo pequeno estamos vivendo. Será um prazer realizar o
casamento, coronel Egidio, depois de tantos problemas e tristezas,
uma festa vai melhorar o ânimo da fazenda.
- Sim, senhor Bispo. Quero que seja um casamento lindo, porém
não muito grande. Devemos ainda honrar a memória de nossos
filhos perdidos.
- Se me permite uma sugestão, há na fazenda do senhor Alexandre
uma filha de nome Maria, que dizem é a melhor cozinheira de todo
o estado de São Paulo. Ela utiliza as receitas italianas que trouxe
para o Brasil adaptando-as aos ingredientes que temos por aqui.

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CORONELZINHO

Dizem que é maravilhoso.


- Agradeço a indicação, senhor Bispo, vou procura-la ainda esta
semana.
Nos dias que se passam a família se envolve com os
preparativos da festa. Embora a tradição daqueles sertões mande
que o pai da noiva proporcione toda a festa, Andrea ofereceu-se
para dar os animais do churrasco. Um verdadeiro rebanho para
comemorar seu casamento.
- Egidio, nós precisamos ir à capital encomendar o vestido de
noiva. – diz Angela.
- Sim, minha esposa, nossa filha merece o melhor, nossa última
filha.
- Sabem onde ir na capital?
- Sim, a esposa do coronel Godoi conversou comigo no dia da
novena na Catedral e me informou sobre uma estilista parisiense de
bastante sucesso que está na capital agora. Seu atelier fica
próximo à Estação da Luz, não teremos que nos deslocar muito por
lá.
- E qual o nome desta grande estilista de moda?
- É Aleandra, Aleandra Marini!
- Ah, mas é uma italiana.
- Sim, ela é de Milão, onde aprendeu as técnicas italianas mais
glamorosas e depois foi morar em Paris, a capital da moda.
- E quando pretendem ir?
- Ainda esta semana, precisamos encomendar a roupa e tirar as
medidas.

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ADRIANO MARINI

- Sim, sim, podem ir. Eu quero que minha filha fique linda para o
seu casamento.
- Egidio, meu esposo, nossa filha pediu para falar-lhe que seu
desejo é fazer a festa de recepção dos convidados no Automóvel
Club da cidade.
--É minha esposa, eu até concordaria com este pedido, porém
vamos ter muitos coronéis como convidados e suas famílias, que
virão de charretes ou a cavalo e terão dificuldades em achar
espaços para deixarem os animais. Aqui em nossa fazenda
poderão sentir-se mais à vontade em deixar as montarias.
- Tens razão meu esposo. Vou falar com nossa filha.

...

No dia da festa, já na fazenda, toda a sociedade de Rio Preto


comparece.
- Senhor Bispo, a indicação da jovem italiana para fazer nossa festa
foi uma benção dos céus. A Maria realmente fez algo
inesquecível.
- Fico feliz Coronel pelo sucesso de sua festa, mas onde está esta
cozinheira tão famosa? Gostaria de conhece-la.
- Ah, não a conhece? Por favor, me acompanhe então. Terei o
máximo prazer em lhe apresentar.
Os dois caminham em direção à mesa de comidas e encontram
Maria arrumando alguns detalhes.
- Maria, gostaria de apresenta-la ao senhor Bispo, Dom José.

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CORONELZINHO

Maria surpresa, abaixa-se beijando-lhe as mãos.


- Sua benção, senhor Bispo.
- Maria, é um prazer conhece-la. Sua fama de cozinheira á chegou
até na capital da província.
- Sou apenas uma simples cozinheira, senhor Bispo.
- Foi fácil localiza-la na fazenda, senhor Egidio?
- Sim, por coincidência uma de suas irmãs fez os votos de freira e
está na ordem de Santo André.
- Ora, que noticia boa. Então ela é uma das freiras das quais nossa
irmã Madre Marta coordena. Que noticia abençoada.
- Maria só não cuidou dos animais no rolete, um capricho do
noivo. Ele matou 10 bois, 10 porcos e 10 carneiros e está
mandando assar todos no rolete para os convidados.
- Um verdadeiro rebanho. – comenta o Bispo.
No mesmo instante em que tudo isto acontece, o trem noturno
chega do sertão de Santa Fé à estação de São José do Rio Preto.
Dele descem um casal quase desconhecidos, que caminham sob a
escuridão de braços dados a passos lentos. Pelas vestimentas são
muito pobres e andam descalços.
O pobre casal chega ao hospital da cidade, a Santa Casa de
Misericórdia.
- Por favor senhora, meu marido está muito doente. – diz a mulher
- O que ele tem, senhora?
- Nós acreditamos que tenha contraído a febre amarela.
- E de onde vocês vem?
- Nós estávamos no sertão de Santa Fé, lá na divisa com a

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ADRIANO MARINI

província de Mato Grosso. Acabamos de descer do trem.


- Vou providenciar um lugar para ele na enfermaria.
O lugar era um cobertor sobre o chão em um canto da parede.
- Mas, aqui no chão?
- Desculpe-me. É o único lugar que temos para abrigá-lo. Todos
os leitos estão ocupados. Esta epidemia de febre amarela avança
cada vez mais sobre a população.
O marido se deita no lugar reservado.
- E quando ele poderá ter uma cama?
- Em breve senhora. A todo instante tem pacientes morrendo desta
doença.
- E quando o médico vai vir vê-lo? Ele demorará?
- sim, médico por aqui acredito que só amanhã. Todos estão na
festa de casamento.
- Casamento? Quem está casando?
- Com certeza você não conhece, é a filha do coronel mais
importante da região norte de Rio Preto, o coronel Egidio. – e se
afasta, voltando para a recepção do hospital.
Na festa, enquanto todos comem e divertem-se, um menino
chama a atenção do pai para a nuvem de poeira que levanta-se na
estrada ao longe.
- Aquilo deve ser o redemoinho por onde anda o saci, diz o pai.
Algum vem vindo por ai. – diz o pai.
- Vou pedir uma peneira para o coronel, vou pegar este saci. – diz
o menino e sai correndo.
- Coronel, coronelzinho. – chega gritando o menino na grande

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CORONELZINHO

mesa em que se encontram o coronel, sua esposa, os noivos recém


casados e ainda vestidos com os trajes da cerimonia religiosa, o
senhor Bispo e a Madre Marta.
- O que foi moleque, por que esta gritaria toda?
- Eu preciso de uma peneira, onde acho uma aqui em sua fazenda?
- Uma peneira? Pergunta o Bispo bem humorado – E porque o
pequeno homem precisa tando de uma peneira?
- Para pegar o saci.
- Saci? Mas que saci?
- Aquele que tá no redemoinho de vento que vem pela estrada,
olhe – e o menino aponta a poeira sendo levantada na estrada.
Todos da mesa olham e o coronel fica de pé assustado.
- Mas aquilo não é saci. Parece mais o estouro de uma boiada.
Todos ficam de pé na enorme mesa posta na varanda.
Pela porteira do grande pasto que fica a frente da casa e onde
estão dispostas todas as demais mesas para os convidados começa
a entrar o gado.
Os convidados com suas esposas e crianças saem de suas
mesas que estavam dispostas no imenso pasto a frente da casa e
refugiam-se em seu interior. Pela porteira vê-se entrar muitas
cabeças de gado, tantas que lotam todo o pasto principal da
fazenda, sendo espantados por muitos homens atrás dando tiros
para cima.
Os jagunços dos fazendeiros presentes pegam suas armas e
ficam de prontidão. Entram pelo portão atrás do gado muitos
homens armados.

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ADRIANO MARINI

- O que significa isto? – grita o coronel ao grupo.


- Só uma visita de seu genro, meu sogro. – diz João, aparecendo
repentinamente atrás da mesa principal, com um tapa olho, vindo
de dentro da casa, logo seguido por Maria.
- Minha filha! – exclama surpreso Egidio.
- Minha esposa! - diz João em tom imperativo.
- Você a raptou seu bandido! – diz Egidio com raiva.
- Não papai, ele não me sequestrou. Eu fui com ele por vontade
própria. Eu quis ir com ele e ser sua mulher.
Angela desmaia, justamente quando Egidio vai tirar a arma da
cintura, mas é surpreendido com uma arma na cabeça porto por um
dos bandoleiros que chegou atrás de João.
- Senhor meu sogro, que bondade a sua me presentear com sua
arma – e pegando-a de Egidio. É o presente ideal para um
bandoleiro.
Andrea se levanta, enquanto todos o olham.
- Ah, este é o cunhado de minha mulher. Muito prazer. Já deve ter
ouvido muito a meu respeito, eu sou o João.
- O que significa isto Maria? – pergunta Egidio
- Nós só vamos passar a noite em sua casa papai, enquanto o gado
descansa no pasto e pela manhã a gente vai embora.
- Mas como todo este gado vai ficar no pasto? E até o gado de
papai está nas fazendas dos vizinhos para a gente ocupar o pasto. –
diz Adelair.
- Ah, é mesmo. O que a gente faz João? – pergunta em tom irônico
Maria.

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CORONELZINHO

- Ora, já que o pasto é de seu pai, nada melhor que ser ocupado
pelo gado dele.
- O que? – assusta-se Egidio.
- O seu gado está ai no meio, meu sogro. Junto com os bois de os
seus vizinhos.
- Vocês roubaram? – pergunta Andrea irado
- Não, nós só íamos passando pelas propriedades e, quando víamos
as casas desprotegidas a gente recolhia o gado.
- Meus convidados. – surpreende-se Egidio.
- Mas e os convidados, o que vamos fazer com eles? – pergunta
Adelair
João ouve e vai na ponta das escadarias.
- A festa acabou pessoal. O coronel Egidio agradece a todos pela
presença, mas agora os bois precisam dormir – e gritando mais alto
ainda e dando tiros para cima – Vamos pessoal, vamos ajudar os
convidados de meu sobro a irem embora.
Os bandoleiros que estavam na porteira entram atirando e os
jagunços começam a trocar tiros quando o bispo entra no meio do
fogo cruzado, gritando:
- Parem, parem. Estão ficando loucos? Aqui há senhoras e
crianças. Parem com isto.
Os jagunços guardam as armas sob as ordens de seus coronéis
e deixam a propriedade.
O Bispo volta para despedir-se de Egidio.
- Senhor coronel, vou me retirar com a madre. Se precisar de algo,
por favor avise.

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ADRIANO MARINI

- Só vai precisar se for para dar a extrema unção em alguém – dia


João e cai na gargalhada.
- Pessoal, agora a festa é nossa. Podem comer e beber a vontade.
É a recepção de meu sogro para nós.
Quando todos descem para as mesas que estão no pasto, os
bandoleiros atacam a comida como se estivessem famintos há
muito tempo.
- Por que Maria? – pergunta-lhe Egidio.
- Amor, papai. E desce para festejar com os bandoleiros.
Andrea ajuda a carregar Angela para dentro da casa, ainda
desmaiada, seguido por Egidio e Adelair.
Ao entrarem logo vem Maria ajudar a socorrer a fazendeira.
- Maria, minha menina. Eu que que não é sua obrigação, mas por
favor, faça um café para nós. Eu preciso de algo para beber.
- Com todo prazer, senhor Egidio. – e sai para a cozinha.
No hospital.
-Boas notícias senhora. O paciente do leito 17 acabou de falecer.
Vou arrumar para que seu marido possa descansar lá.
- Não será mais preciso enfermeira. – diz Isabel, a mulher até então
misteriosa que desceu do trem. – Meu marido também acabou de
morrer.

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CORONELZINHO

CAPITULO IX
A CIDADE

Após comerem tudo o que havia na festa os bandoleiros


reúnem-se com João no meio do pasto.
- E agora chefe, estamos todos bem alimentados e cansados. Onde
vamos passar a noite?
- Vamos lá para os lados de Talhados. Fica bem perto daqui.
- Não vamos passar a noite aqui? – pergunta outro jagunço.
- Claro que não, mas que ideia. Daqui a pouco toda a polícia da
cidade e das redondezas estarão aqui.
- E junto com os jagunços que expulsamos. – completa Maria, ao
lado de João.
- Vamos, já ficamos tempo demais por aqui. Avise a todos para
colocarem o gado na estrada.
- Mas chefe, eles não irão nos seguir mesmo assim? E a gente com
este gado não conseguiremos andar muito rápido.
João ri alto.
- Mas que imbecil. Só na capital para ter gente assim. A estrada
para Talhados passa sobre o Córrego dos Macacos. Então é só
explodir a ponte e Bum! – fazendo o gesto de explosão com as
mãos – era uma vez a caça aos bandoleiros.
E o grupo põe-se a caminho dando muitos tiros para fazer o
gado andar.
- Meu sogro! – grita João perto da casa.
- O que você quer, João? – aparecendo Andrea para responder.

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ADRIANO MARINI

- Parece que o cunhado anda ouvindo mal. Eu disse meu sogro,


entendeu agora?
Nisto Egidio aparece na área da casa.
- Estou aqui!
- Venha, dê sua benção a sua filha.
Egidio desce os poucos degraus e vai até o pasto,
aproximando-se de Maria, quando ela lhe beija a mão.
- Sua benção, meu pai.
- Deus te abençoe filha. – diz Egidio com os olhos cheios de
lágrimas.
- Nós estamos indo embora. Eu queria em nome de meus homens
agradecer pela hospitalidade. Sua festa estava muito boa. Quando
a gente vender este gado nós voltamos para buscar mais e
emprestar um de seus pastos.
Egidio apenas observa.
João e Maria montam em dos cavalos, trazidos pelos
bandoleiros do grupo e saem cavalgando calmamente atrás da
comitiva, com o gado na frente e os bandoleiros logo atrás gritando
e dando tiros para o alto.
Egidio fica de pé observando. Ao seu lado Andrea e depois
juntam-se Adelair e Angela. Quando não são mais vistos o
coronelzinho senta-se na escadaria, abaixa a cabeça em silencio e
põe as mãos sobre elas. Não demora muito e ouve-se o barulho de
uma grande explosão com um clarão ao longe. Era a ponte sendo
explodida.
Pouco depois surge uma grande nuvem de poeira na estrada,

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CORONELZINHO

vindo da direção da cidade, que se avoluma à medida que


aproxima-se da fazenda de Egidio, até entrarem pela porteira
aberta do pasto e o cruzarem em direção à casa grande.
Egidio não esboça qualquer reação, parecendo não acreditar
no qu havia acabado de acontecer.
- Senhor Coronel. – chama um policial a cavalo.
Egidio levanta a cabeça e lentamente põe-se de pé.
- Sou o tenente capitão da polícia paulista da sede de Rio Preto.
Estou aqui com o contingente de todo a polícia da cidade e os
jagunços de dez coronéis. Logo os bandoleiros estarão todos
mortos.
- Sim, faça um bom trabalho. – é tudo o que Egidio consegue
pronunciar de forma quase automática, sem nenhuma emoção, e
entra, sentando-se em sua ampla poltrona na sala.
- Egidio, Maria fez mais um pouco de café. Tome, vai lhe acalmar.
- Obrigado Maria. – Egidio pega a xicara e olha longamente. –
espero que vocês italianos ensinem a nós brasileiros o valor do
bom caráter. – olhando para Maria.- Quem sabe, um dia. – e toma
o café.
- Angela. – Chama Egidio.
Todos ficam em silencio na sala, esperando suas palavras.
- Vamos vender a fazenda.
Andrea se espanta.
- Meu sogro, não. Não tome uma decisão destas de forma
precipitada. Eu me ofereço para ajudar-lhe a cuidar de tudo, se
estiver cansado do trabalho.

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ADRIANO MARINI

- Caro genro Andrea. Não se trata de cansaço, mas de desilusão.


Eu mesmo derrubei a floresta para criar aquele pasto, marquei cada
vaca ou boi que já entrou no meu pasto e, de repente, tudo se
desmancha como um balde de água apagando o carvão. Além do
mais, o próprio João confirmou que vão roubar mais gado para
colocar no pasto que eu formei. E depois que venderem vão
roubar mais, e cada vez mais. Você viu a força que ele tem?
Colocou para correr todos os jagunços de sua festa. – pausando
para um gole de café. Andrea, eu agradeço sua boa vontade, mas
não é mais seguro viver aqui.
- E para onde vai, papai? – pergunta Adelair.
- Para nossa casa na cidade. Lá não há pastos para colocarem gado
roubado.
- Mas coronel, o senhor viveu toda sua vida nas fazendas, vai se
acostumar a morar na cidade?
- Não me chame de coronel, senhor Andrea. Quando alguém nos
domina pela força, deixamos de ser coronel. Aqueles bandoleiros
levaram mais que o gado, eles mataram o coronelzinho.
Em uma rua pobre da cidade, uma pobre mulher com uma
cesta sob os braços passa de porta em porta oferecendo seus doces,
acompanhada de uma pequena e pobre menina descalça, com um
vestido desbotado e uma boneca velha nos braços.
- O que a senhora tem hoje? – pergunta uma cliente em sua
residência
- Oi senhora Nilde. Hoje tenho doce de cidra e pé de moleque.
- Ah, o Dionisio adora seus pés de moleque. Vou querer uma dúzia

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CORONELZINHO

hoje.
- Aqui estão, obrigado pela compra. – agradece Isabel.
Ela passa por uma praça e vê um homem com uma garrafa de
bebida nas mãos, sentado em um banco, bêbado como de costume.
Roupas sujas, barba comprida. Ao ver a aproximação de Isabel
fica de pé.
- Oh, oh, oh. Olha quem está aqui, minha irmãzinha Isabel. – e
passa as mãos na cabeça da menina, brincando com ela.
Os outros bêbados prestam atenção na conversa. Quase todos
são os ex-jagunços de Egidio.
- Pega Alexandre, é isto que tenho hoje e tira da cesta alguns pés
de moleque, coloca em um papel e dá ao irmão.
- Obrigado irmãzinha. – diz Alexandre feliz pela pequena refeição.

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ADRIANO MARINI

ABOUT THE AUTHOR

Adriano Marini, autor dos best-sellers Os Canais de


Comercialização: frutas do Salgado Paraense, Diversidade e
Estilos de Agricultura Familiar: uma analise a partir de dois tipos
de assentamentos, no estado do Amapá, Efeito das politicas
publicas sobre a agricultura familiar. Paulista de São José do Rio
Preto, é Engenheiro Agrônomo formado pela Universidade
Estadual Paulista e doutor pela Universidade Federal do Pará.

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ADRIANO MARINI

OUTRAS OBRAS DO AUTOR

As relações de mercado
existentes para os principais
frutos produzidos na região do
Salgado Paraense pela
agricultura familiar permitirá
estabelecer linhas norteadoras
ao desenvolvimento rural,
procurando estabelecer uma
maior integração entre aqueles
produtores e o mercado final de
seus produtos

O ponto referencial desta análise


são os agricultores familiares
dos assentamentos rurais
induzidos do Estado do Amapá,
suas praticas agrícolas e suas
interações com o meio em que
estão inseridos, tendo como
contraposição os assentamentos
tradicionais do Estado do
Amapá.

Este estudo relata as diversas


formas de auxilio fornecidos pelos
governos federal e estadual do
Amapá aos agricultores familiares
e seus impactos na renda familiar
e na produtividade agrícola.

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