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Ametafora do vaga lume, pequenas e fracas luzes que juntas iluminam, ainda que pouco,
O jogo do outrora com o Agora – essência do vagalume inclusive no casalamento, pois a luz
O apocaliptico
1941 – uma analise do presente 1975 uma anlise do rpesente em relação ao passado.
Busquemos então Experiências que transmitem para além de todos os espetáculos?, pg 126
A experiência é indestrutível
Derrida
No ano de 2001, com uma linguagem muito próxima de seu leitor, Jacques Derrida publica a
interfere no arquivo? Derrida acredita que sim. Apresentando a obra como um ensaio,
Derrida (2001, p. 07, grifo do autor) a inicia com uma indagação (aliás, seu texto é sempre
nutrido de indagações): “Por que relembrar hoje um conceito de arquivo?”. O autor fala-nos
Derrida (2001, p. 07-08, grifo do autor), inicialmente, distingue o “arquivo” de acordo com
eletrônico. Como falar de “comunicação de arquivos”, sem falar dos arquivos dos meios de
comunicação? O que ele afirma, é que, “não há arquivo sem o espaço instituído de um lugar
de impressão”, ou seja, um suporte externo, tanto material quanto virtual. Então, o nosso
O subtítulo de seu ensaio é “uma impressão freudiana”, nada mais condinzente, já que
sabemos que Derrida é um filósofo francês fortemente influenciado pelas ideias de Freud. No
entanto, o autor afirma-nos que seu Mal de Arquivo poderá transcorrer com Freud, sem
Freud e até mesmo, contra Freud. É um ensaio que evoca um “sintoma, um sofrimento, uma
paixão: o arquivo do mal, mas também aquilo que arruína, que destrói o próprio princípio do
Derrida (2001, p. 12) nota que a palavra “arquivo” advém de “arkhê”, palavra esta que
designa uma ordem de começo e uma ordem de comando. Domina também o princípio da
natureza e o princípio da história: ali onde as coisas começam; e o princípio da lei: ali onde os
homens e os deuses mandam. Derrida (2001, p. 11) questiona-nos novamente: “Ali onde, foi
o que dissemos, e nesse lugar. Como pensar esse ali? E como pensar este ter lugar ou este
tomar o lugar do arkhê?”. O autor fala-nos que, de uma maneira ou de outra, tal vocábulo
com Derrida (2001, p. 12), o sentido de “arquivo” advém do termo grego “arkheîon”, ou seja,
superiores, aqueles que comandavam”. O autor conta-nos que a casa dos cidadãos que
tinham o poder de representar a lei era onde se depositavam os “documentos oficiais”. Tais
arcontes não somente eram responsáveis pela segurança física do material, como também
arcontes, era de fato, a lei. Tal lei, então, para ser “arquivada”, necessitava de um guardião
(os arcontes) e uma localização (a casa dos arcontes), sendo que não podiam “prescindir de
suporte nem de residência”. E foi neste contexto que os arquivos nasceram. Derrida (2001, p.
13) salienta, porém, que o arquivo necessita, além de um suporte estável e de uma
Já sobre “exergo”, Derrida (2001, p. 17, grifo do autor) assinala que tal termo é uma
“convenção sagrada”, sendo que o “o exergo se articula com a citação. Citar antes de
começar é dar o tom deixando ressoar algumas palavras cujo sentido ou forma deveria
dominar a cena”. Ainda, “um enxergo estoca por antecipação e pré-arquiva um léxico que, a
partir daí, deverá fazer a lei e dar a ordem contentando-se em nomear o problema, isto é, o
tema”. Então, o exergo é a “primeira figura de um arquivo, pois todo arquivo [...] é ao
mesmo tempo instituidor e conservador”. Nas palavras de Derrida (2001, p. 18, grifo do
autor), “o primeiro destes exergos seria o mais tipográfico. Nele o arquivo aparece mais de
acordo com o seu conceito. Pois o confiamos aqui ao que se acha fora, a um suporte externo
e não, como o signo da aliança na circuncisão, a uma marca íntima diretamente sobre o
corpo”.
Quando escrevemos um livro, por exemplo, estamos arquivando. Estamos deixando para a
posterioridade nossas pesquisas ou nossas opiniões, por exemplo. Derrida (2001, p. 18-19)
fala-nos que em um de seus livros, Freud externou a constatação de que acreditava estar
gastando papel, tinta, trabalho do tipógrafo, para falar de algo que já era de conhecimento
de todos, para dizer coisas que já seriam óbvias. Para Derrida (2001, p. 19), Freud “deveria
ter encontrado algo de novo na psicanálise: uma mutação ou um corte no interior de sua
própria instituição teórica. E deveria não somente anunciá-la, mas também arquivá-la: pô-la
de alguma maneira no prelo”. Freud conclui, porém, de acordo com Derrida (2001, p. 20) que
seu arquivamento não foi em vão, “nem de pura perda, na hipótese de que faria aparecer o
que na verdade [...] já sabe que vai fazer aparecer e que não é portanto uma hipótese”.
Freud liga-se à “pulsão de morte”, sendo que esta, “trabalha para destruir o arquivo: com a
condição de apagar também com vistas de apagar seus próprios traços. Ela devora seu
arquivo, antes mesmo de tê-lo produzido externamente” (DERRIDA, 2001, p. 21). Tal pulsão é
“apagamento radical”, é o desejo de destruir o que é exterior, sendo que, “não há arquivo
Derrida (2001, p. 25) indaga-se sobre o futuro da psicanálise, salientando que Freud escreveu
suas teorias e ideias em um tempo que não dispunha das “máquinas de arquivar” dos anos
2000. O autor pergunta-se: “será que estas novas máquinas mudam alguma coisa? Afetam o
discurso de Freud em algum ponto essencial? Indago-me, então, qual seria a percepção de
Derrida acerca deste fato, no ano que estamos hoje – 2012. Em 2001, ainda não existia
Facebook, Twitter, os blogs eram escassos, e quase não havia “redes sociais digitais” muito
conhecidas. Qual seria a concepção de arquivo, em uma época que podemos arquivar,
pensar.
Voltando a falar sobre o futuro da psicanálise, percebemos que Derrida (2001, p. 26) afirma
que, sobre este, há no mínimo, duas ordens: “1- a primeira ordem de questões envolve a
Freud, por exemplo, resite ou não à evolução da tecno-ciência do arquivo. Essas “próteses da
memória chamada viva” estão mais refinadas, complicadas, potentes, que o “bloco mágico
arquivamento da psicanálise? Como seria se, “em lugar de escrever milhares de cartas à
teleconferência e sobre tudo correio eletrônico”? Vou além questionando: como seria se
Freud tivesse Facebook e Twitter, por exemplo? Para Derrida (2001, p. 28-29), se Freud
dispusesse das “máquinas de arquivas” dos anos 2000, certamente não o entenderíamos
como entendemos hoje, pois “a estrutura técnica do arquivo arquivante determina também
futuro. O arquivamento tanto produz quanto registra o evento”, enfim, “é também nossa
não teria sido o que foi se no passado, existisse e-mail, por exemplo.
Estas novas técnicas de arquivamento também colocam em voga outra questão: qual é o
limite entre o privado e o segredo? Qual a nossa propriedade em publicar e reproduzir neste
de arquivo? O que é visto é que cada vez mais nos afastamos dos “copistas medievais”,
vivendo em uma “revolução sem limites da técnica arquivística”, levando em consideração
que a “técnica arquivística não determina mais, e nunca o terá feito, o momento único do
registro conservador, mas sim a instituição mesma do acontecimento arquivável”, enfim, tal
técnica “comanda aquilo que no próprio passado instituía e construía o que quer que fosse
Derrida (2001, p. 32) compreende que “a teoria psicanalítica tornou-se, portanto, uma teoria
do arquivo e não somente uma teoria da memória”. Sendo que, para Derrida (2001, p. 32),
“o modelo deste singular ‘Bloco Mágico’ incorpora também o que parecia contradizer, sob a
chamar também pulsão de arquivo”, o que o autor considera como o “mal de arquivo”, pois
“não haveria certamente desejo de arquivo sem a finitude radical, sem a possibilidade de um
esquecimento que não se limita ao recalcamento”. Além disso, “não haveria mal de arquivo
sem a ameaça desta pulsão de morte, da agressão ou de destruição”, “o mal de arquivo toca
o mal radical”.
Derrida (2001, p. 32) “incrusta” uma segunda citação ao exergo, esta, menos tipográfica que
a primeira, pois, de acordo com o autor, “recorrente e interativa, ela leva a singularidade
comemora à sua maneira, com efeito, uma circuncisão. Este monumento muito singular é
diretamente na pele: mais de uma pele, em mais de uma era. Literal ou figurativa”. De início,
Derrida (2001, p. 34) encerra seu primeiro capítulo com o fragmento de uma dedicatória da
bíblia que o avô de Freud deu ao seu pai, e este, por sua vez, lhe ofertou. Para o autor, “o
que o pai dá ao filho é ao mesmo tempo uma escritura e seu suporte. O suporte era a própria
bíblia, o ‘Livro dos livros’, uma Bíblia Philippsohn onde Freud estudara na juventude”
Sua reflexão parte do famoso artigo “O vazio do poder na Itália”, escrito por Pier Paolo
Pasolini em 1975 e retomado em seus Scritti corsari [Escritos corsários] com o nome pelo
qual tornou-se conhecido, “O artigo dos vaga-lumes”. O artigo trata sobretudo, como um
lamento fúnebre, da morte do vaga-lumes, fulgurações figurativas de momentos de graça
que resistem ao mundo do terror: lampejos de inocência, em um contexto político e histórico
marcado pelo aniquilamento da inocência graças ao fascismo triunfante. Pois, ainda que
Mussolini houvesse sido executado e pendurado pelos pés, Pasolini diagnostica, a partir da
metade da década de 1960, “algo” que deu lugar a um “fascismo radicalmente, totalmente e
imprevisivelmente novo”, que, tomado em dimensão antropológica, é responsável por um
enfraquecimento cultural ou, nas palavras do cineasta, um “genocídio cultural”. O
verdadeiro fascismo para ele, como diz Didi-Huberman, “é aquele que tem por alvo os
valores, as almas, as linguagens, os gestos, os corpos do povo. É aquele que ‘conduz sem
carrascos nem exceções em massa, à supressão de grandes porções do própria sociedade’, e
é por isso que é preciso chamar de genocídio essa ‘assimilação (total) ao modo e à qualidade
de vida burguesa’”.
Segundo Didi-Huberman: “Com a imagem dos vaga-lumes, é toda uma realidade do povo
que, aos olhos de Pasolini, está prestes a desaparecer. Se a ‘linguagem das coisas mudou’ de
forma catastrófica, como diz o cineasta em suas Lettres luthériennes [Cartas luteranas], é
porque, em primeiro lugar, o ‘espírito popular desapareceu’. E poder-se-ia dizer que essa é
de fato uma questão de luz, uma questão de aparição. Donde a pregnância, donde a justeza
do recurso aos vaga-lumes. Pasolini, desse ponto de vista, parece estar ao mesmo tempo no
rastro de Walter Benjamin e no espaço de reflexão explorado, mais próximo a ele, por Guy
Debord”.
“Bem antes de fazer resplandecer, em sua escatológica glória, a grande luz (luce) do Paraíso,
Dante quis reservar, no vigésimo sexto canto do Inferno, um destino discreto, embora
significativo, à ‘pequena luz’ (lucciola) dos pirilampos, dos vaga-lumes. O poeta observa,
então, a oitava vala infernal: vala política, caso existisse, visto que aí se reconhecem alguns
notáveis de Florença reunidos com outros, sob a mesma condenação ‘conselheiros pérfidos’.
O espaço é todo salpicado – constelado, infestado – de pequenas chamas que parecem vaga-
lumes, exatamente como aqueles que as pessoas do campo, nas belas noites de verão, veem
esvoaçar, aqui e ali, ao acaso de seu esplendor, discreto, passante, tremeluzente […]. No
Paraíso, a grande luz se expandirá por toda parte em sublimes círculos concêntricos: será
uma luz de cosmos e de dilatação gloriosa. Aqui, ao contrário, as lucciole vagam fracamente
– como se uma luz pudesse gemer – numa espécie de bolsão sombrio , esse bolsão de
pecados feito para que ‘cada chama contivesse um pecador’”.
Assim, a vida dos vaga-lumes “parecerá estranha e inquietante, como se fosse feita da
matéria sobrevivente – luminescente, mas pálida e fraca, muitas vezes esverdeada – dos
fantasmas. Fogos enfraquecidos ou almas errantes”.
Pasolini quis mostrar o poder específico das culturas populares, para reconhecer nelas uma
verdadeira capacidade de resistência histórica, logo, política, em sua vocação antropológica
para a sobrevivência. Mas os projetores, em seu espetáculo comercializável, tomaram todo o
espaço social. Nas palavras de Pasolini – que retumbam uma insistente atualidade: “esse
mundo é fascista e ele o é mais do que o precedente, porque é recrutamento total até às
profundezas da alma; ele o é mais do que qualquer outro, porque não deixa mais nada fora
de seu reino despótico sem limite, sem referência e sem controle. […] Com efeito […] não é
mais possível, em 1975, opor os ‘corpos inocentes’ à massificação cultural e comercial, à
trivialização de qualquer realidade, pela boa razão de que a indústria cultural apossou-se dos
corpos, do sexo, de eros e os injetou nos circuitos de consumo. A ilusão dos reduto do
imemorial ou do porto de resistência inserido nos estratos profundos da cultura popular
dissolveu-se”. Tempo em que os resistentes transformam-se em vaga-lumes. “O universo
dantesco”, analisa o filósofo, “dessa forma, inverteu-se: é o inferno que, a partir de então, é
exposto com seus políticos desonestos, superexpostos, gloriosos. Quanto às lucciole, elas
tentam escapar como podem à ameaça, à condenação que a partir de então atinge sua
existência”.
O contraponto será buscado na obra do filósofo italiano Giorgio Agamben – “um dos
filósofos mais importantes, dos mais inquietantes de nosso tempo” –, que apresenta a
mesma configuração problemática que Pasolini: “Por um lado, admirável visão dialética:
capacidade de reconhecer no mínimo vaga-lume uma resistência, uma luz para todo o
pensamento. Por outro, desespero não dialético: incapacidade em buscar novos vaga-lumes,
uma vez que que se perderam de vista os primeiros – os ‘vaga-lumes da juventude’”.
Agamben foi um grande leitor de Benjamin e foi, como diz Didi-Huberman, “depois de Edgar
Wind, um dos muito raros filósofos a medir todo o alcance teórico da antropologia das
sobrevivências elaborada por Aby Warburg”. Contemporâneo de Pasolini, Agamben retoma
o paradigma de “dar-se os meios de ver aparecerem os vaga-lumes no espaço de
superexposição, feroz, demasiado luminoso, de nossa história presente”, tarefa que requer,
para Agamben, a coragem da virtude política e, ao mesmo tempo, a poesia, “que é a arte de
fraturar a linguagem, de quebrar as aparências, de desunir a unidade do tempo”. De Pasolini
a Agamben, reconhece-se um mesmo “gestus geral de seus respectivos pensamentos”.
Ambos evocam o tempo presente como uma situação de apocalipse latente que, em
Agamben, ressoa com força algumas ideias de Walter Benjamin, como o enfraquecimento da
experiência: “Quando Pasolini anuncia que ‘não existem mais seres humanos’ ou quando
Giorgio Agamben, de seu lado, anuncia que o homem contemporâneo se encontra
‘despossuído de sua experiência’, nós nos encontramos, decididamente, colocados sob a luz
ofuscante de um espaço e de um tempo apocalípticos. Apocalipse: é uma figura maior da
tradição judaico-cristã. Ela seria a sobrevivência que absorve todas as outras em sua
claridade devoradora: a grande sobrevivência ‘sacral’ – fim dos tempos e tempo do Juízo
Final – quando todas as outras terão sido aniquiladas”.
Porém, uma “política das sobrevivências” dispensa o fim dos tempos, adverte Didi-
Huberman, e há, portanto, “uma ambiguidade, tanto no plano do método quanto no plano
político, em passar, como Agamben o faz com frequência, de uma reflexão antropológica
para a potência das sobrevivência a uma assunção filosófica do poder das tradições”.
Segundo ele, “imagem” não é “horizonte” e Agamben associa constantemente o regime da
imagem e o do horizonte: “A imagem nos oferece algo próximo a lampejos (lucciole), o
horizonte nos promete a grande e longínqua luz (luce). […] A imagem se caracteriza por sua
intermitência, sua fragilidade, seu intervalo de aparições, de desaparecimentos, de
reaparições e de redesaparecimentos incessantes. É, então, uma coisa bem diferente pensar
a saída messiânica como imagem (diante da qual não se poderá durante muito tempo mais
acalentar ilusões, uma vez que ela desaparecerá logo) ou como horizonte (que apela para
uma crença unilateral, orientada, apoiada no pensamento de um além permanente, na
espera de seu futuro sempre). A imagem é pouca coisa: resto ou fissura (fêlure). Um acidente
do tempo que a torna momentaneamente visível ou legível. Enquanto o horizonte nos
promete o todo, constantemente oculto atrás de sua grande ‘linha de fuga’”. Agamben,
argumentando com Guy Debord, reconhece na opinião pública de hoje o que a submissão
das multidões foi para o totalitarismo; para o italiano, o que está em questão no problema
da função política das mídias nas sociedades contemporâneas “não é nada mais que uma
nova e espantosa concentração, multiplicação e disseminação da função da glória como
centro do sistema político. O que ficava outrora confinado nas esferas da liturgia e do
cerimonial se concentra nas mídias e, ao mesmo tempo, através delas se difunde e se
introduz em todos os momentos e em todos os meios, tanto públicos como privados, da
sociedade”. As imagens assumiriam a função da “glória”, subordinada à máquina do “reino”.
Porém, sua análise acaba por desdialetizar, segundo Didi-Huberman, tanto a noção
de “imagens”, como a noção dos “povos”. “A imagem não é mais, nesse caso, uma
alternativa ao horizonte, a lucciola como alternativa à luce. Ela não parece mais que uma
pura função do poder, incapaz do menor contrapoder, da menor inssurreição, da menor
contraglória”. A imagem seria o lampejo que transpõe a imobilidade de todo horizonte.
Didi-Huberman assim define a imagem: “aparição única, preciosa, é, apesar de tudo, muito
pouca coisa, coisa que queima, coisa que cai. Tal é a ‘bola de fogo’ evocada por Walter
Benjamin [“A imagem dialética é uma bola de fogo que transpõe todo o horizonte ao
passado, diz, em sua reflexão sobre a história e a política]: ela apenas ‘transpõe todo o
horizonte’ para cair sobre nós, nos atingir (échoir). Ela raramente se ergue em direção ao céu
imóvel das ideias eternas: em geral, ela desce, declina, se precipita e se danifica sobre a
nossa terra, em algum lugar diante ou atrás do horizonte. Como um vaga-lume, ela acaba
por desaparecer de nossa vista e ir para outro lugar onde será, talvez, percebida por outra
pessoa, em outro lugar, lá onde sua sobrevivência poderá ser observada ainda. Se, de acordo
com a hipótese que tentamos construir, a partir de Warburg e Benjamin, a imagem é um
operador temporal de sobrevivências – portadora, a esse título, de uma potência política
relativa a nosso passado como à nossa ‘atualidade integral’, logo, a nosso futuro -, é preciso
então dedicar-se a melhor compreender seu movimento de queda em nossa direção, essa
queda ou esse ‘declínio’, até mesmo essa declinação, que não é, por mais que Pasolini o
tenha temido em 1975, seja o que for que pensa Agamben hoje, desaparição”.
Para Dudi-Huberman, não se pode dizer que a experiência tenha sido destruída. “Ao
contrário, faz-se necessário – e pouco importa a potência do reino e de sua glória, pouco
importa a eficácia universal da ‘sociedade do espetáculo’ -, afirmar que a experiência é
indestrutível, mesmo que se encontre reduzida às sobrevivências e às clandestinidades de
simples lampejos da noite”. O paradoxo do homem ser indestrutível e, no entanto, poder ser
destruído, explica-se pela noção de sobrevivência. “Sobrevivência dos signos ou das imagens,
quando a sobrevivência dos próprios protagonistas se encontra comprometida”.
Para esclarecê-lo, o filósofo resgata a ressurgência de Hannah Arendt, para quem seria
preciso “reconhecer a essencial vitalidade e das sobrevivências e da memória em geral
quando ela encontra as formas justas de sua transmissão. Nessa combinação geométrica do
retraimento e do não fechamento, depreender-se-ia então o que Arendt chama
magnificamente uma força diagonal que difere das duas forças – a dos passado e a do futuro
– das quais, no entanto, resulta”. A força diagonal de Arendt é atualizada no filme de Laura
Waddington, Border, filmado no campo de Sangatte em 2002. Conta Didi-Huberman que ela
filmava “os refugiados afegãos ou iraquianos que tentavam desesperadamente escapar da
polícia e atravessar o túnel sob o canal da mancha a fim de chegar até a Inglaterra. Ela pôde,
disso tudo, extrair apenas imagens vaga-lumes: imagens no limiar do desaparecimento,
sempre movidas pela urgência da fuga, sempre próximas daqueles que, para realizar seu
projeto, se escondiam na noite e tentavam o impossível, correndo risco de vida”.
São imagens para organizar o pessimismo. “Imagens para protestar contra a glória do reino
e seus feixes de luz crua. Os vaga-lumes desapareceram? Certamente não”.