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Uma Família Cheia do Espírito Santo1

INTRODUÇÃO:

A habitação do Espírito em nós é freqüentemente identificada como uma manifes-


tação sobrenatural e extravagante; todavia, a Palavra nos ensina que a presença do
Espírito em nossa vida, tem um sentido eminentemente prático e visível; isto, não
por seu aparato simplesmente externo, mas, por nossa perseverança em fazer a
vontade de Deus, em seguir os valores eternos registrados nas Escrituras, confes-
sando a Cristo, verbal e vivencialmente, como O Senhor de nossa vida (1Co 12.3).

Como uma das evidências da importância que Paulo confere à família, encontra-
mos em uma de suas analogias referindo-se à Igreja, dizendo ser ela a “família de
Deus” (Ef 2.19), composta por judeus e gentios.
2
A família além de ser a primeira instituição na sociedade, é, também, o funda-
mento de qualquer sociedade; quando ela se destroça, a sociedade, sem dúvida al-
guma, herdará suas conseqüências. É na família onde se agregam valores e senti-
3
mentos. A família como instrumento de socialização primária, é de onde partem os
valores mais consistentes do indivíduo que, para o bem ou para o mal, são os mais
4
difíceis de serem desintegrados, os quais o acompanharão para sempre, que tenha
consciência disto, quer não.

Se formos examinar com algum vagar, poderemos constatar que a grande maioria
dos delinqüentes provém de lares destruídos ou em processo de destruição. Hen-
driksen (1900-1982), acertadamente diz: “Nenhuma instituição sobre a face da
terra é tão sagrada quanto a família. Nenhuma é tão básica. Segundo a at-
mosfera moral e religiosa da família, assim será na igreja, na nação e na so-
5
ciedade em geral”.

1
Palestra Ministrada para Federação de Homens do Presbitério Oeste Paulistano, no dia 10 de maio
de 2008, na Igreja Presbiteriana JMC, Jandira, SP.
2
Cf. Frank J. Kline, Família: In: Carl F. H. Henry, org. Dicionário de Ética Cristã, São Paulo: Cultura
Cristã, 2007, p. 294.
3
Veja-se: Peter L. Berger & Thomas Luckmann, A Construção Social da Realidade, 5ª ed. Petrópolis,
RJ.: Vozes, 1983, p. 175.
4
Veja-se: P. Berger & T. Luckmann, A Construção Social da Realidade, p. 188,190,191,227.
5
William Hendriksen, Exposição de Efésios, São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1992, (Ef 5.22),
p. 308.
Uma Família Cheia do Espírito Santo – Rev. Hermisten M.P. Costa – 12/05/08 – 2

1. A ORIGEM DA FAMÍLIA:

Partamos do princípio: Os seres criados por Deus (peixes, aves, animais domésti-
cos, animais selváticos, etc.) o foram conforme as suas respectivas espécies. O ho-
mem, diferentemente, teve o seu modelo no próprio Deus Criador (Gn 1.26; Ef 4.24),
sendo distinto assim, de todo o resto da Criação, partilhando com Deus de uma iden-
tidade desconhecida por todas as outras criaturas, visto que somente o homem foi
criado “à imagem e semelhança de Deus”. Por isso, quando se trata de encontrar
uma companheira para o homem com a qual ele possa se relacionar de forma pes-
soal – já que não se encontra em todo o resto da criação –, a solução é uma nova
criação, tirada da costela de Adão e, transformada por Deus em uma auxiliadora i-
dônea, com a qual Adão se completará, passando a haver uma “fusão interpessoal”,
“unidade essencial”, constituindo-se os dois uma só carne (Gn 2.20-24; Mc 10.8), u-
nidos por Deus (Mt 19.6).

A constatação de Deus, é que não seria bom para o homem permanecer só. É
Deus mesmo quem percebe a necessidade ainda imperceptível ao homem. Tudo na
criação era bom, exceto a solidão do homem. “Deus pôs o dedo na única defici-
6
ência existente no Paraíso”. O homem ainda não havia percebido isso; no entan-
to, Deus sabe que a solidão lhe fará mal. A carência vai se tornar evidente: Deus
passou diante de Adão todos os animais, para que este pudesse nomeá-los, distin-
guindo cada espécie. Aqui vemos de passagem a inteligência de Adão, tendo condi-
ções de discernir as espécies, exercitando a sua capacidade de julgar, atribuindo
nomes que, certamente, estavam relacionados a características essenciais dos ani-
mais. Entre toda a Criação, não há uma companheira a altura do homem. Como ser
7
sociável que é, o homem necessitará de compartilhar conhecimentos e afetos; amar
e ser amado. O homem, de fato, foi criado por Deus para viver em companhia de
seus semelhantes, mantendo uma relação de idéias, valores e sentimentos. A per-
manecer assim, os seus sentimentos mais profundos permanecerão guardados; ele
não terá um ser igual com quem possa compartilhar, amar, se emocionar, ensinar,
aprender, se divertir... No entanto, o mesmo Deus que criou o homem, propõe-se a
criar a sua companheira. (Gn 2.21-22).
8
Deus como uma espécie de “pai da noiva” (“padrinho de casamento”), leva-a até

6
Raymond C. Ortlund, Jr., Igualdade Masculino-Feminina e Liderança Masculina: In: John Piper &
Wayne Grudem, compiladores, Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja e na sociedade,
São José dos Campos, SP.: Editora Fiel, 1996, p. 38.
7
Ver: Aristóteles, A Ética, I.7.6. e A Política, I.1.9. Do mesmo modo, G.W. Leibniz, Novos Ensaios,
São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, Vol. XIX), III.1.1. p. 167. Calvino (1509-1564) escreveu:
“O homem é um animal social de natureza, consequentemente, propende por instinto natu-
ral a promover e conservar esta sociedade e, por isso, observamos que existem na mente de
todos os homens impressões universais não só de uma certa probidade, como também de
uma ordem civil” (João Calvino, As Institutas, II.2.13). Em outro lugar: “O homem foi formado
para ser um animal social” [John Calvin, Commentaries on The First Book of Moses Called Gene-
sis, Grand Rapids, Michigan: Eerdmans Publishing Co., 1996 (Reprinted), Vol. I, (Gn 2.18), p. 128].
8
Cf. Gerhard von Rad, Genesis: A Commentary, 3ª ed. (Revised Edition), Bllombsbury Street Lon-
don: SCM Press Ltd., 1972, (Gn 2.21-23), p. 84.
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9
o noivo (Gn 2.22). Adão aprovou a nova criação de Deus. As primeiras palavras do
homem registradas nas Escrituras se configuram de forma poética: “Esta, afinal, é
osso dos meus ossos e carne da minha carne; chamar-se-á varoa, porquanto do va-
rão foi tomada” (Gn 2.23). Agora se tornou possível uma relação satisfatória para o
homem e, ao mesmo tempo, eles poderão se perpetuar por meio da procriação –
como ato que reflete a sua identidade de amor e complemento –, enchendo a terra e
sujeitando-a, conforme a ordem divina (Gn 1.28). O Paraíso está pronto para se ex-
10
pandir.

Palmer Robertson comenta: “O ‘ser uma só carne’ descrito nas Escrituras não
se refere simplesmente aos vários momentos da consumação marital. Em vez
disto, esta unidade descreve a condição permanente de união alcançada
11
pelo casamento”.

Façamos um breve retrospecto bíblico.

A mulher foi criada para ser companheira do homem. Deste modo percebe-se a
idéia de complemento. O homem sozinho estaria no paraíso. Contudo, permaneceria
só, sem uma companheira. O paraíso sem a mulher, seria um paraíso incompleto,
insatisfatório. Por sua vez, já que a mulher completaria o homem, esta, tornar-se-ia
da mesma forma incompleta se não cumprisse a sua missão.

“Far-lhe-ei uma auxiliadora [rez:( (‘ezer)] que lhe seja idônea [OR:gen:K (keneged)]”
12

(Gn 2.18), é a solução encaminhada por Deus.

a) Auxiliadora:

rez:( (‘ezer) “auxiliadora”, “ajudadora”. Esta palavra que nos tempos modernos
é com freqüência olhada como se fosse uma diminuição da mulher, tem na realida-
de, um tom extremamente significativo. Ela é empregada especialmente para des-
crever a ação de Deus que vem em socorro do homem. Deus mesmo é o ajudador
dos pobres (Sl 72.12), dos órfãos (Sl 10.14/Jó 29.12); daqueles que não podem con-
tar com mais ninguém (Sl 22.11). Por isso, podemos contar com Deus nos momen-
tos de enfermidade (Sl 28.7/28.1); nas opressões de inimigos (Sl 54.4) e em perío-
dos de grande aflição (Sl 86.17). Aqueles que vivem fielmente, buscando seu ampa-
ro em Deus, podem ter a certeza do Seu cuidado (Sl 37.40/Sl 89.21), sendo a Sua
9
Cf. Gerhard von Rad, El Libro del Genesis, Salamanca: Sigueme, 1977, (Gn 2.22), p. 101.
10
Diz a Confissão de Westminster: “O matrimônio foi ordenado para o auxílio mútuo de mari-
do e mulher, para a propagação da raça humana por uma sucessão legítima, e da Igreja
por uma semente santa, e para evitar-se a impureza. Ref. Gn 2.18 e 9.1; Ml 2.15; 1Co 7.2,9”
(Confissão de Westminster, XXIV.2).
11
O. Palmer Robertson, Cristo dos Pactos, Campinas, SP.: Luz para o Caminho, 1997, p. 68. “A re-
lação em ‘uma só carne’ envolve mais do que sexo; é a fusão de duas vidas em uma; é
consentir em compartilhar a vida juntos, através do pacto do casamento; é a completa en-
trega de si mesmo a um novo círculo de existência, ao lado de um companheiro” (Raymond
C. Ortlund, Jr., Igualdade Masculino-Feminina e Liderança Masculina: In: John Piper & Wayne Gru-
dem, compiladores, Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja e na sociedade, p. 39).
12
A Septuaginta traduz por bohqo\n, proveniente de bohqo/j, “útil”, “auxiliador”, “ajudador” (*Hb 13.6).
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lei e as Suas mãos os seus auxílios (Sl 119.173, 175). Por isso, os servos de Deus
suplicam a Sua ajuda na batalha e nas aflições (Dt 33.7/Sl 20.2; 30.10; 79.9; 109.26;
119.86). O rei Uzias tornou-se famoso internacionalmente porque por trás de todos
os seus empreendimentos, estava a maravilhosa ajuda de Deus (2Cr 26.15). Por ou-
tro lado, quando Israel deixou de confiar no sustento de Deus e buscou aliança com
os egípcios para a sua proteção, Deus diz que isso de nada adiantaria contra a Babi-
lônia (Is 30.5,7; 31.3/Os 13.9). Somos desafiados então, a confiar em Deus, porque
Ele cuida de nós; é o nosso amparo (Sl 33.20; 70.5; 72.12; 115.9-11; 124.8; Is 44.2):
de Deus vem o nosso socorro (Sl 121.1-2). Israel é feliz porque tem a Deus como
aquele que o socorre (Dt 33.26,29). Felizes são todos aqueles que têm a Deus por
auxílio (Sl 146.5). Devido ao Seu socorro, devemos entoar louvores ao Seu nome (Sl
28.7).

Dentro das profecias messiânicas de Isaías, vemos a confiança do Ungido do Se-


nhor. Certo do socorro do Senhor, sabe que não será envergonhado (Is 50.7,9).

Harriet e Gerard fazem uma bela e real aplicação: “Que papel importante Deus
dá a mulher. Ela se coloca ao lado do seu marido como auxiliadora, assim
13
como Deus se coloca ao lado de seu povo”.

b) Idônea:

OR:gen:K (keneged) “idônea”, tem o sentido de “correspondente a ele”, “confor-


me”, “aquilo que corresponde“,“sua contrária”. Significa também, “estar em frente”,
“defronte” (Ex 19.2; Js 3.16; 6.5,20; Dn 6.11).

A mulher foi formada como uma “contraparte” do homem; é uma semelhança per-
feita dele, ainda que lhe seja oposta, no sentido de complemento. O homem aprovou
a criação de Deus, porque pôde perceber a mulher “não como sua rival mas co-
mo sua companheira, não como uma ameaça mas como a única capaz de
14
realizar seus desejos íntimos”.

Robertson analisa:

“O propósito da existência do homem como ser criado não é ser um


auxílio para a mulher no casamento. Mas o propósito da existência da mu-
lher como ser criado é glorificar a Deus sendo um auxílio para o homem.
“.... A mulher deve ser, na verdade, uma auxiliadora do homem. Mas
deve ser auxiliadora ‘correspondente a ele’. O todo da criação de Deus
serviria de auxílio ao homem de uma ou outra maneira. Mas em parte al-
guma da criação poder-se-ia achar um auxiliar ‘correspondente’ ao ho-
mem (Gn 2.20). Somente a mulher como ser criado do homem correspon-

13
Harriet & Gerard van Groningen, A Família da Aliança, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1997, p.
99.
14
Raymond C. Ortlund, Jr., Igualdade Masculino-Feminina e Liderança Masculina: In: John Piper &
Wayne Grudem, compiladores, Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja e na sociedade,
p. 39.
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deu a ele de tal maneira que fez dela o auxílio adequado de que ele ne-
cessitava.
“Este traço distintivo da mulher indica que ela não é menos significativa
do que o homem com respeito à pessoa dela. De maneira igual ao ho-
mem, ela traz em si mesma a imagem e semelhança de Deus (Gn 1.27).
Somente como igual em pessoalidade podia a mulher ‘corresponder’ ao
15
homem”.

Os textos também revelam a prioridade social do homem, não a sua superiorida-


16
de essencial (Ef 5.22; 1Co 11.3-12; 1Pe 3.6,7). É preciso que não confundamos a
primazia e liderança com o domínio tirânico. “A masculinidade e a feminilidade
identificam seus respectivos papéis. Conforme Deus determinou, o homem,
em virtude de sua masculinidade, é chamado a liderar; e a mulher, em virtu-
de de sua feminilidade, é chamada para ajudar. (...) Mas, observe: domina-
17
ção masculina é uma falha pessoal e moral, não uma doutrina bíblica”.

Deus ao criar a mulher não a fez inferior; ela também foi feita conforme à imagem
e semelhança de Deus (Gn 1.27). A ordem divina quanto ao povoar a terra, dominar,
guardar e cultivar é responsabilidade de ambos. Os dois partilham dos deveres e
responsabilidades conferidos por Deus. Sozinhos, ambos são insuficientes para
cumprirem o propósito de Deus em sua vida.

Harriet e Gerard comentam:

“A passagem [Gn 1.26-31] claramente indica que na sua origem a fê-


mea foi criada da mesma substância do macho; ela não é inferior quanto
ao seu ser ou pessoa. Ela não é inferior como portadora da imagem, re-
presentante ou espelho de Deus na vida diária. A mulher é uma pessoa
tanto quanto o homem. Assim como o macho é, a fêmea é feita à ima-
gem e semelhança do Deus triúno e conseqüentemente tem o seu próprio
relacionamento pessoal e espiritual com Deus. Neste particular ela é abso-
lutamente igual ao homem. Ela também recebeu o mesmo mandato que
o seu marido recebeu. Ela deveria cultivar o jardim com ele, dominar so-
bre ele e com o marido, ser frutífera e povoar a terra. No capítulo 2 ela,
juntamente com o seu marido, recebeu o mandato espiritual de continuar
a andar com Deus. Ela e o seu marido são proibidos de comer do fruto da
18
árvore. Ambos recebem o mandato social de serem frutíferos”.

Homem e mulher foram criados à imagem e semelhança de Deus. Dentro do pro-


pósito da criação, há uma correlação entre ambos: o homem se completa na mulher

15
O. Palmer Robertson, Cristo dos Pactos, p. 69.
16
Vd. John Calvin, Commentaries on The First Book of Moses Called Genesis, Vol. 1, (Gn 1.26), p.
95-96.
17
Raymond C. Ortlund, Jr., Igualdade Masculino-Feminina e Liderança Masculina: In: John Piper &
Wayne Grudem, compiladores, Homem e Mulher: seu papel bíblico no lar, na igreja e na sociedade,
p. 40.
18
Harriet & Gerard van Groningen, A Família da Aliança, p. 94.
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e a mulher se completa no homem. Ambos são o que são enquanto são para o ou-
tro. A relação entre o homem e a mulher deve refletir a relação de amor e compre-
ensão que existe entre Deus e nós. A concretização de nossa humanidade dá-se na
comunhão com o outro. A nossa humanidade se plenifica na relação de troca e de
complemento. Homem e mulher são imagem de Deus, cabe a ambos, lado a lado,
viver em harmonia para a glória de Deus, realizando o propósito proposto por Deus
para eles, até que volte o Senhor. A Igreja deve ser a grande amostra dessa rela-
ção, ainda que imperfeita na presente vida, mas que caminha para a perfeição,
quando o Senhor restaurar toda a natureza e todas as relações. Maranata!

Com a queda de nossos primeiros pais, resultado da sua rebelde desobediência,


houve a separação entre o homem, agora pecador, e o Deus Santo, Justo, Puro e
Sublime (Is 59.2). Com isso, toda a criação sofreu as conseqüências, se deterioran-
do todas as relações, a começar entre o homem e Deus... Em decorrência, a família
começa a se degenerar: Adão, racionalizando o seu pecado, acusa Eva e indireta-
mente a Deus; entre seus filhos, o primogênito Caim – a quem Eva saúda como um
varão que adquiriu “com o auxílio do Senhor” –, mata o seu próprio irmão e agora,
ainda desobedecendo a Deus, não passa a ter uma vida errante, contudo, é obriga-
do a viver longe de seus pais (Gn 4.16).

2. O ESPÍRITO SANTO E A FAMÍLIA:


A redenção em Cristo restabelece todas as relações e, o Espírito Santo, a terceira
pessoa da Trindade, está diretamente relacionado a isso. Paulo faz uma conexão di-
reta entre o enchimento do Espírito e o relacionamento familiar (Ef 5.18).

A) Submissão e respeito por parte das esposas: (Ef 5.22-24,33)

Paulo não dispondo de um exemplo melhor para falar da união matrimonial,


recorre, inspirado por Deus, à relação mais sublime de todas, a de Cristo com a Sua
Igreja; ele usa um argumento dedutivo, partindo do maior para o menor: se Cristo
assim se relaciona com a Igreja, esta tem a sua responsabilidade para com o Seu
Senhor; do mesmo modo, conclui Paulo, há responsabilidade recíproca entre os ma-
ridos e as esposas. Portanto, a relação de Cristo com a Sua Igreja é da mesma natu-
19
reza da relação matrimonial. O matrimônio é então tratado como uma relação inte-
gral de corpo e alma e para sempre.

Ele inicia pelas esposas, que figuradamente representam a Igreja: “As mulheres
sejam submissas a seus próprios maridos, como ao Senhor” (Ef 5.22). Pode parecer
estranho falar desta forma em nossos dias; contudo, a Palavra de Deus assim nos
ensina e mostra, que o Espírito toca, modifica e recria todas as relações, mesmo
aquelas que temos como mais caras. No entanto, quando os princípios bíblicos se
assemelham a alguma manifestação cultural de determinada época, enganamo-nos
se entendermos que aqueles são decorrentes desta, isto porque a Palavra de Deus
nos conduz à motivações diferentes, ainda que em determinados momentos o com-

19
D.M. Lloyd-Jones, Vida No Espírito: No Casamento, no Lar e no Trabalho, São Paulo: Publicações
Evangélicas Selecionadas, 1991, p. 108.
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portamento possa ser semelhante. Paulo compara a esposa à Igreja, dizendo que
assim como a Igreja deve ser submissa a Cristo, que é o seu Cabeça, as esposas
devem ser submissas aos seus maridos, por ser este seu cabeça. Esta submissão
bíblica deve ser precedida de respeito; “pois não existe submissão voluntária sem
20
que seja precedida de reverência”.

Harriet e van Groningen acentuam:

“Nós reenfatizamos que, para que uma esposa reconheça seu marido
como o cabeça da família, ela não deve, de maneira alguma, suprimir
sua personalidade, seu papel, e os dons e posições que ela tem como
21
uma pessoa real”.

Um aspecto que deve nortear a nossa abordagem, é que conforme o ensino Es-
criturístico, o homem e a mulher se completam harmoniosamente, sendo um depen-
dente do outro (1Co 11.11,12): ambos provêm do mesmo Deus que os criou.

Portanto quando, por exemplo, o marido é desprestigiado em sua autoridade, os


danos no relacionamento conjugal e na educação dos filhos são incalculáveis; de fa-
22
to: “um lar sem cabeça é um convite ao caos”. Creio que nem sempre isso
tem sido percebido mesmo nos lares cristãos, quando mesmo em brincadeiras, os
maridos são alvos de situações ridículas, onde preponderam – às vezes patrocina-
dos por esposa e filhos –, aspectos do seu temperamento ou mesmo, de algum tre-
jeito, vestuário ou aparência. É preciso saber preservar a sua condição de “cabeça”
da esposa e consequentemente, do lar. Um lar sem autoridade caminha para o seu
esfacelamento. Isto nos conduz, portanto, à responsabilidade dos maridos.

B) Amor sacrificial e preservador por parte dos maridos: (Ef 5.25-


29,33)

“Não foi feita da sua cabeça, como


para ter domínio sobre ele, nem de seus
pés, como para não ser pisoteada por
ele, senão de seu lado, para ser igual a
ele, de debaixo de seu braço para ser
protegida, e de junto ao coração para
ser amada” – Matthew Henry, “Commen-
tary on The Whole Bible,” The Master Chris-
tian Library, [CD-ROM], (Albany, OR: Ages
Software, 2000), Vol. 1, (Gn 2.21-25), p. 58-
59.

“Em seu próprio lar, o pai da família é considerado o rei. Portanto, ele re-
flete a glória de Deus, por causa do controle que se acha em suas mãos. (...)

20
João Calvino, Efésios, São Paulo: Paracletos, 1998, (Ef 5.33), p. 177.
21
Harriet & Gerard van Groningen, A Família da Aliança, p. 102.
22
William Hendriksen, Exposição de Efésios, (Ef 5.23), p. 308.
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Se o homem não conserva sua posição, e não se põe sob a autoridade de


Cristo, de maneira a exercer sua própria autoridade na chefia de sua família,
ele está, em certo sentido, obscurecendo a glória de Cristo, a qual é refleti-
23
da na ordem bem constituída do matrimônio”. A responsabilidade do marido
nem sempre tem sido enfatizada convenientemente. A plenitude do Espírito também
traz responsabilidades para os maridos. Os princípios da Palavra de Deus são sem-
pre amplos de multifacetados; as suas prescrições nunca são isoladas, casuísticas,
ou apenas caminham em mão única, antes estabelecem orientações para todos, se-
ja em que área for, em quaisquer situações que nos encontremos. Os mandamen-
tos de Deus corretamente entendidos e praticados, não são penosos, ainda que a-
miúde nos deparemos com dificuldades resultantes dos nossos pecados (inclusive a
falta de fé) e de outros, daí o exercício constante do aprendizado com Deus por in-
termédio da Sua Palavra, que é suficiente para nos instruir (2Tm 3.16).

Portanto, quando esposas e maridos cumprem adequadamente os preceitos bíbli-


cos, estes deveres passam a ser privilégios, motivos de satisfação, harmonia e cres-
cimento para ambos.

Os maridos são comparados a Cristo, que se deu pela Igreja para preservá-la e,
continuamente dela cuida, auxiliando-a inclusive, em sua santificação. Cabe aos ma-
ridos amar as suas esposas de forma que procure sempre o seu bem-estar, dispos-
tos ao sacrifício se necessário para que o objeto do seu amor permaneça saudável
seja em que aspecto for. “É somente quando compreendemos a verdade so-
bre a relação de Cristo com a Igreja, que podemos realmente agir como os
24
maridos cristãos devem agir”, acentua Lloyd-Jones.

Aqui, surge um outro ponto: quando o marido assim procede para com a sua es-
posa, quando ele consegue sair de si mesmo para objetivar prioritariamente o seu
amor, está cuidando de si mesmo; os dois são uma só carne e, é impossível ser feliz
fazendo o outro infeliz. Daí percebermos a relação essencial dos dois princípios: a
mulher é submissa e respeita o seu marido que a quer feliz e dela cuida prioritaria-
mente... O marido, por sua vez, esquece-se de si em prol de sua esposa que, por
ser-lhe submissa, está sempre à procura de melhor agradar-lhe... Assim, as Escritu-
ras apresentam uma cadeia perfeita de relação: ambos são uma só carne, que se
ama, preserva e protege. Deste ponto, fica ainda mais evidente as dificuldades ine-
25
rentes a um matrimônio com jugo desigual (2Co 6.14-18).

“Somente maridos e mulheres cheios do Espírito – comenta Lloyd-Jones –,


é que terão uma verdadeira idéia do que um esposo deve ser e do que
uma esposa deve ser, e em que deve consistir o relacionamento entre
ambos. É o único meio pelo qual obter paz, unidade e concórdia, em vez
26
de desunião, briga e separação, com tudo que resulta desses males”.

23
João Calvino, Exposição de 1 Coríntios, São Paulo: Paracletos, 1996, (1Co 11.4), p. 331.
24
D.M. Lloyd-Jones, Vida no Espírito, p. 108.
25
Admito que o texto de 2 Coríntios não esteja se referindo diretamente ao matrimônio; no entanto,
temos de convir que este assunto ali está incluído (Vd. João Calvino, Exposição de 2 Coríntios, espe-
cialmente p. 139).
26
D.M. Lloyd-Jones, Vida no Espírito, p. 21.
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C) Obediência e Honra dos Filhos aos Pais: (Ef 6.1-3)


27
Calvino (1509-1564) diz que a obediência é a espécie do gênero honra. “É
impossível não pensarmos em nosso pai e em nossa mãe sem sentir profundo
respeito; e em relação a eles, a veemência áspera deve ceder lugar à
28
brandura”.

A paternidade humana é uma honra concedida por Deus ao ser humano; Pai de
forma absoluta é somente Deus. Somos pais, “porque Deus outorgou fazer-[nos]
29
participantes da honra que é própria exclusivamente dEle”. Portanto, “ao
intentar contra nosso pai ou mãe, fazemos guerra com Deus. Pois ele impri-
miu a sua estampa neles, e o seu título faz-nos saber que Deus os coloca,
30
como se estivessem, em Seu lugar”. Ele afirma que quando “menosprezamos
nossos pais e mães, e desprezamos o cumprimento do nosso dever perante
eles, Deus é expressamente ofendido por isso, não apenas porque quebra-
mos um dos mandamentos da lei, mas também porque desprezamos a sua
31
majestade, a qual pais e mães tem de certa forma”.

Ele argumenta afirmando ser este o motivo de haver severa punição na lei para
os filhos desobedientes. Aqueles que desobedeciam aos seus pais não ofendiam a
eles primariamente, mas afrontavam a Deus, Quem os instituiu, investindo-lhes de
poder e lhes imprimindo Sua imagem. Em suma, a desobediência aos pais, é uma
negação do próprio homem, que é a imagem e semelhança de Deus. “Quando a
criança não consegue encontrar em seu coração submissão aos seus pais e
mães, e Deus assim fala [condenando], é para nos mostrar que este é um
crime tão ultrajante e perverso, pois é como se eles estivessem completa-
32
mente dispostos a abolir sua [própria] natureza”.

Os filhos, portanto, cheios do Espírito, revelam a sua condição espiritual no seu

27
João Calvino, Efésios, (Ef 6.1), p. 178. Em outro lugar, Calvino explica o significado de honrar os
pais: “Que os filhos sejam humildes e obedientes a seus pais, os honrem e reverenciem; que
com seus próprios trabalhos lhes ajudem em suas necessidades, e que estejam a seu man-
dado, como são a eles obrigados” [João Calvino, Catecismo de Genebra, Perg. 186. In: Cate-
cismos de la Iglesia Reformada, p. 69]. Acrescenta: “Pouco importa que sejam dignos ou indig-
nos de receber esta honra, pois, sejam o que sejam, o Senhor nos deu por pai e mãe e dese-
ja que lhes honremos” [Juan Calvino, Breve Instruccion Cristiana, Barcelona: Fundación Editorial de
Literatura Reformada, 1966, p. 24]. Ver: J. Calvino, As Institutas, II.8.35-36.
28
João Calvino, As Pastorais, São Paulo: Paracletos, 1998, (1Tm 5.1), p. 128.
29
John Calvin, Sermons on Ephesians, Carlisle: Banner of the Trulth, 1987 (reimp), p. 623. “Aqueles
a quem faz partícipes destes títulos ilumina-os como que com uma centelha de Seu fulgor,
de sorte que sejam, cada um, dignos de honra de conformidade com sua posição de emi-
nência. Destarte, aquele que nos é pai, nele é próprio reconhecer algo divinal, porquanto
não sem causa é portador do título divino” [João Calvino, As Institutas, II.8.35].
30
John Calvin, Sermons on Ephesians, p. 623.
31
John Calvin, Sermons on Ephesians, p. 623.
32
John Calvin, Sermons on Ephesians, p. 623.
Uma Família Cheia do Espírito Santo – Rev. Hermisten M.P. Costa – 12/05/08 – 10

relacionamento com os seus pais, amando, obedecendo e honrando-os “no Senhor”.


A autoridade dos pais passa previamente pela submissão ao nosso Soberano Pai
que é Deus; obviamente a nossa fidelidade a Deus tem a primazia num possível
33
conflito de senhores. E no caso de pais que não agem conforme as instruções bí-
blicas, sendo relapsos e incrédulos, como os filhos devem se portar? “É vontade
do Senhor que sirvamos àqueles que nos colocaram nesta vida. Não importa
se eles são ou não dignos desta honra porque, seja o que forem, eles nos fo-
34
ram dados como pais e mães pelo Senhor que deseja que os honremos”.
Devemos ter em mente que todos nós estamos sujeitos à Lei de Deus: Maridos, es-
posas, pais e filhos. “Ao contrário, então, o fato é que nenhum de nós deve
ficar verificando como o outro cumpre ou não o seu dever, mas cada um de
nós deve tão-somente ter em mente e diante dos olhos o que deve fazer
35
para cumprir o seu próprio dever”. Portanto, os filhos devem perseverar em
obedecer e honrar seus pais, visto que isto é justo diante de Deus e Ele mesmo efe-
tuará a Sua justiça conforme o Seu propósito eterno.

Mais uma vez insisto no ponto de que a nossa vida espiritual não pode estar dis-
sociada do nosso viver cotidiano; o Espírito deu-nos uma nova ótica na qual a nossa
compreensão da vida foi mudada e, consequentemente, as nossas relações foram
refeitas à luz da nossa nova compreensão e do poder do Espírito. O tratamento dig-
no e respeitoso que conferimos aos nossos pais é uma evidência da nossa comu-
nhão com o Espírito (Cl 3.20). Essa obediência no Senhor é justa diante de Deus e,
na obediência fiel a Deus, somos abençoados por Ele mesmo.

D) Educar os Filhos na disciplina do Senhor: (Ef 6.4)

Os pais devem educar os filhos dentro dos princípios bíblicos: a Bíblia tam-
bém é a verdade no campo educacional; Ela deve ser a norma de todo o nosso pen-
sar e agir.

Como pais, temos também a responsabilidade de não provocar a sua ira, com um
comportamento que reflita o eqüívoco de predileções, falta de apoio, menosprezo,
36
provocações, ironias, excesso de proteção, etc. (Cl 3.21; Gn 25.28; 37.3,4; 2Sm
14.13,28; 1Rs 1.6; Hb 12.9-11). A palavra “criai-os” (e)ktre/fw) (Ef 6.4) em contra-
37

posição à “ira”, indica que devemos criá-los ternamente, com brandura e amor, sem
38
contudo, excluir a disciplina (paidei/a) e admoestação (nouqesi/a) no Senhor. Cal-

33
Vd. J. Calvino, As Institutas, II.8.38; Juan Calvino, Breve Instruccion Cristiana, Barcelona: Funda-
ción Editorial de Literatura Reformada, 1966, p. 24-25.
34
João Calvino, Instrução na Fé, Goiânia, GO: Logos Editora, 2003, Cap. 8, p. 27
35
João Calvino, As Institutas, (1541), IV.16.
36
Hendriksen faz uma lista de erros comuns cometidos pelos pais. Vd. William Hendriksen, Exposi-
ção de Efésios, (Ef 6.4), p. 325-326.
37
Ocorre apenas duas vezes no NT., unicamente em Efésios: 5.29 e 6.4. A palavra apresenta a idéia
de alimentar, sustentar, nutrir, educar. Calvino diz que este verbo “inquestionavelmente comunica
a idéia de gentileza e afabilidade” [J. Calvino, Efésios, (Ef 6.4), p. 181].
38
Ocorre três vezes no NT.: 1Co 10.11; Ef 6.4; Tt 3.10.
Uma Família Cheia do Espírito Santo – Rev. Hermisten M.P. Costa – 12/05/08 – 11

vino recomenda aos pais: “Tratem-nos com a brandura e a bondade adequa-


39
das à personalidade de cada um deles” Notemos que o caráter de toda a e-
ducação e disciplina de nossos filhos – por meio de palavras e atos –, é no Senhor.
“O que caracteriza a criação cristã não é o método educacional, mas, sim,
40
o propósito que se visa com ele”. A educação cristã visa conduzir a criança ao
Senhor.

A admoestação (nouqesi/a) apresenta a idéia de educar por meio da palavra, u-


sando deste recurso para aconselhá-lo, estimulá-lo e encorajá-lo quando for o caso
e, também, se necessário, fazer uso do mesmo meio para censurar, reprovar e re-
preender com firmeza (Compare: 1Sm 2.24/1Sm 3.13). Paulo diz que passou três
41
anos em Éfeso não deixando incessantemente de “admoestar (nouqete/w), com lá-
grimas, a cada um” (At 20.31). Já a disciplina (paidei/a) é uma palavra mais ampla,
abrangendo a educação não apenas verbal mas também, por intermédio de atos
42
que podem envolver rigidez com o objetivo de corrigir e ensinar. Notemos, que a
disciplina sendo mais abrangente – envolvendo a instrução e correção –, vinha pri-
meiro. Já a admoestação parece ser após a execução da tarefa. Primeiro instruímos;
depois, se necessário, exortamos e repreendemos ou, encorajamos conforme as cir-
cunstâncias.

Em 1982, o então secretário geral da INTERPOL (Organização Internacional de


Polícia Criminal), declarou: “.... quando os jovens não têm mais noção de dis-
ciplina, noção do que deve ou não ser feito, noção das regras a serem se-
43
guidas, a família desaparece”.

No Antigo Testamento, Eli foi repreendido por Deus porque os seus filhos que
transgrediam a Lei (1Sm 2.22-25), não foram admoestados por ele: “Porque já lhe
disse que julgarei a sua casa para sempre, pela iniqüidade que ele bem conhecia,
porque seus filhos se fizeram execráveis, e ele não os repreendeu (nouqete/w)”
(1Sm 3.13). Salomão por sua vez, instrui: “A estultícia está ligada ao coração da cri-
ança, mas a vara da disciplina (LXX: paidei/a) a afastará dela” (Pv 22.15).

Calvino (1509-1564) comenta:

“O tratamento bondoso e liberal conserva a reverência dos filhos para


com seus pais, e aumenta a prontidão e a alegria de sua obediência, en-

39
João Calvino, As Institutas da Religião Cristã: edição especial com notas para estudo e pesquisa,
São Paulo: Cultura Cristã, 2006, Vol. 1, (III.68), p. 207.
40
F. Selter, Exortar: In: NDITNT., Vol. II, p, 176.
41
* At 20.31; Rm 15.14; 1Co 4.14; Cl 1.28; 3.16; 1Ts 5.12,14; 2Ts 3.15. A prática da admoestação
deve ser natural entre os crentes visando a sua correção (Rm 15.4; 1Ts 5.14; 2Ts 3.15) e aperfeiço-
amento (Cl 1.28); no entanto ela deve ser feita com amor (1Co 4.14; 2Ts 3.15) e sabedoria (Cl 3.16).
Considerando que esta é também uma tarefa dos líderes da igreja, aqueles que se esforçam neste
serviço devem ser estimados pela igreja (1Ts 5.12).
42
Platão (427-347 a.C.) faz também a combinação de Paidei/a com Nouqesi/a, sendo traduzidas
por “ensinamento e admoestação” (Platão, A República, 399b. p. 128). Vd. Richard C. Trench,
Synonyms of the New Testament, 7ª ed. London: Macmillan and Co. 1871, § xxxii, p. 104-108.
43
Revista Veja, 17/02/82, nº 706, p. 6.
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quanto que uma severidade austera e inclemente suscita sua obstinação


e destrói seu respeito”. Mais à frente continua: “... Deus não quer que os pais
sejam excessivamente brandos com seus filhos, ao ponto de corrompê-los,
poupando-os demais. Que sua bondade seja temperada, a fim de con-
servá-los na disciplina do Senhor, e corrigi-los também quando se desvia-
rem. Essa idade requer freqüente admoestação e firmeza com as rédeas,
44
no caso de se soltarem”.

Escrevendo a Timóteo, Paulo diz que "Toda Escritura é inspirada por Deus e
útil para (...) a educação (paidei/a) na justiça" (2Tm 3.16).

A palavra paidei/a (de onde vem a nossa “pedagogia”), significa "educação das
crianças", e tem o sentido de treinamento, instrução, disciplina, ensino, exercício,
castigo.

Cada cultura tem o seu modelo de homem ideal e, portanto, a educação visa
formar esse homem, a fim de atender às expectativas sociais. Paulo sabia muito
bem disso; ele mesmo declarara durante a sua defesa em Jerusalém que fora
instruído por Gamaliel, o grande mestre da Lei. "Eu sou judeu, nasci em Tarso da
Cilícia, mas criei-me nesta cidade e aqui fui instruído (paideu/w) aos pés de Gama-
liel, segundo a exatidão da lei de nossos antepassados....” (At 22.3).

De igual modo, Estevão, descrevendo a vida de Moisés, fala de sua formação,


declarando: "E Moisés foi educado (paideu/w) em toda a ciência dos egípcios, e
era poderoso em palavras e obras” (At 7.22).

Se olharmos ainda que de relance o tipo de formação desde a Antigüidade, pode-


remos constatar que o seu ideal variava de povo para povo e, até mesmo, de cidade
para cidade, daí a diferença entre os "currículos", visto que este é o caminho, a "cor-
45
rida" para se atingir o objetivo proposto. Assim, temos, ainda que, grosso modo,
46
diversas perspectivas educacionais:

 CHINA: A educação visava conservar intactas as tradições. Portanto o currículo


está voltado apenas para o conhecimento e preservação das tradições, seguindo
sempre o seu modelo. A originalidade era proibida.

 EGITO: Preparar o educando para uma vida essencialmente prática, que o levas-
se ao sucesso neste mundo e, por meio de determinados ritos, alcançasse o favor
dos deuses, e a felicidade no além.
44
João Calvino, Efésios, (Ef 6.4), p. 181.
45
Currículo" é uma transliteração do latim "curriculum" que é empregado tardiamente, sendo deriva-
do do verbo "currere", "correr". "Curriculum" tem o sentido próprio de "corrida", "carreira"; um sentido
particular de "luta de carros", "corrida de carros", "lugar onde se corre", "hipódromo" e um sentido fi-
gurado de "campo", "atalho", "pequena carreira", "corte", "curso". A palavra currículo denota a com-
preensão que ele não é um fim em si mesmo; é apenas um meio para atingir determinado fim [Vd.
Hermisten M.P. Costa, A Propósito da Alteração do Currículo dos Seminários Presbiterianos, São
Paulo: 1997, p. 8ss. (Trabalho não publicado)].
46
Veja-se um bom sumário disso em Thomas Ransom Giles, Filosofia da Educação, São Paulo:
EPU., 1983, p. 60-92.
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 ESPARTA: Homens guerreiros, mas que fossem totalmente submissos ao Esta-


do. Neste processo estimula-se até mesmo a delação como modo de evidenciar a
47
sua lealdade ao Estado. “Certamente, essa Esparta dos séculos VIII-VI é,
antes de tudo, um Estado guerreiro (...). O lugar dominante ocupado em
sua cultura pelo ideal militar é atestado pelas elegias guerreiras de Tirteu,
que ilustram belas obras plásticas contemporâneas, consagradas, como
48
elas, à glorificação do herói combatente”. “Ao atingir sete anos, o jovem
espartano é requisitado pelo Estado: até à morte, pertence-lhe inteira-
mente. A educação propriamente dita vai dos sete aos vinte anos; ela é
disposta sob a autoridade direta de um magistrado especial, verdadeiro
49
comissário da Educação nacional, o paidono/moj”.

 ATENAS: Treinamento competitivo entre os homens a fim de formar cidadãos


maduros física e espiritualmente com capacidade de exercitarem a sua liberdade.

 SÓCRATES (469-399 a.C.)/PLATÃO (427-347 a.C.): Formar basicamente por in-


termédio da música e da ginástica, homens capazes de vencer a injustiça reinan-
50
te. A educação tinha um forte apelo moral por meio do conhecimento e prática
das virtudes. A sabedoria está associada à vida virtuosa.
51 52
 OS SOFISTAS: Pedagogia elitizada, propícia e adequada apenas a quem pu-
53
desse pagá-los. Partindo do relativismo e subjetivismo, tinha como objetivo con-

47
Thomas Ransom Giles, Filosofia da Educação, p. 64.
48
Henri-Irénée Marrou, História da Educação na Antigüidade, São Paulo: E.P.U. (5ª reimpr), 1990, p.
35.
49
Henri-Irénée Marrou, História da Educação na Antigüidade, p. 42.
50
Platão, A República, 376e ss. p. 86ss.
51
A palavra "sofista" provém do grego Sofisth/j, que é derivada de Sofo/j (= “sábio”). Originaria-
mente, ambas as palavras eram empregadas com uma conotação positiva. É importante lembrar que
foram os próprios sofistas que se designaram assim.
52
"Já desde o começo a finalidade do movimento educacional comandado pelos sofistas
não era a educação do povo, mas a dos chefes. No fundo não era senão uma nova forma
da educação dos nobres (...). Os sofistas dirigiam-se antes de mais nada a um escol, e só a
ele. Era a eles que acorriam os que desejavam formar-se para a política e tornar-se um dia
dirigentes do Estado" (Werner Jaeger, Paidéia: A Formação do Homem Grego, 2ª ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1989, p. 236).
53
A Retórica Sofística, inventada por Górgias (c.483-c.375 a.C.), era famosa. Górgias dizia:
"A palavra é uma grande dominadora que, com pequeníssimo e sumamente invisível
corpo, realiza obras diviníssimas, pois pode fazer cessar o medo e tirar as dores, infundir a a-
legria e inspirar a piedade (...) O discurso, persuadindo a alma, obriga-a, convencida, a ter
fé nas palavras e a consentir nos fatos (...) A persuasão, unida à palavra, impressiona a alma
como quer (...) O poder do discurso com respeito à disposição da alma é idêntico ao dos
remédios em relação à natureza do corpo. Com efeito, assim como os diferentes remédios
expelem do corpo de cada um diferentes humores, e alguns fazem cessar o mal, outros a
vida, assim também entre os discursos alguns afligem e outros deleitam, outros espantam,
outros excitam até o ardor os seus ouvintes, outros envenenam e fascinam a alma com per-
suasões malvadas” (Górgias, Elogio de Helena, 8, 14).
Uma Família Cheia do Espírito Santo – Rev. Hermisten M.P. Costa – 12/05/08 – 14

54
vencer, persuadir o seu oponente independentemente da veracidade do argu-
55
mento.

 ARISTÓTELES (384-322 a.C.): Formar homens moderados, que tivessem zelo


56
pela ética e estética.

 RENASCENÇA: Formar homens eruditos que soubessem ler e escrever em gre-


57
go, latim e, em alguns lugares o hebraico, tendo um estilo erudito, que pudes-
sem contribuir para a criação do novo, tendo o homem como "medida de todas as
coisas".

 ATUALIDADE: Formar homens competitivos, que alcancem o sucesso a qualquer

"Quanto à sabedoria e ao sábio, eu dou o nome de sábio ao indivíduo capaz de mudar


o aspecto das coisas, fazendo ser e parecer bom para esta ou aquela pessoa o que era ou
lhe parecia mau" (Palavras de Protágoras, conforme, Platão, Teeteto, 166d).
"Mas deixaremos de lado Tísias e Górgias? Esses descobriram que o provável deve ser
mais respeitado que o verdadeiro; chegariam até a provar, pela força da palavra, que as
cousas miúdas são grandes e que as grandes são pequenas, que o novo é antigo e que o
velho é novo" (Platão, Fedro, 267).
54
"A sofística, que caracteriza os últimos cinqüenta anos do século V, não designa uma dou-
trina, mas uma maneira de ensinar. Os sofistas são professores que vão de cidade em cida-
de em busca de auditores e que, por preço convencionado, ensinam os alunos, seja por li-
ções pomposas, seja por uma série de cursos, os métodos adequados a fazer triunfar uma
tese qualquer. À pesquisa e à manifestação da verdade substitui-se a preocupação do êxi-
to, baseado na arte de convencer, de persuadir, de seduzir” (Émile Bréhier, História da Filoso-
fia, São Paulo: Mestre Jou, 1977, I/1 p. 69-70).
55
Vd. Platão, Teeteto, 166c-167d; Sofista, 231d; Mênon, 91c-92b; Fedro, 267; Protágoras, 313c;
312a; Crátilo, 384b; Górgias, 337d; A República, 336b; 338c.
56
Aristóteles, Ética a Nicômaco, São Paulo: Abril Cultural, (Os Pensadores, Vol. IV), 1973, V.2,
1130b 26-27. p. 324
57
O hebraico, que era então ainda mais ignorado do que o grego e o latim, foi também redescoberto.
Surgindo, então, as famosas escolas que ensinavam os três idiomas – em Lovaina (1517), Oxford
(1517 e 1525), Paris (1530) –, visando formar o “homo trilinguis”. (Vejam-se:. Jacob Burckhardt, A
Cultura do Renascimento na Itália: Um Ensaio, São Paulo: Companhia das Letras, 1991, p. 154; Jean
Delumeau, A Civilização do Renascimento, Lisboa: Editorial Estampa, 1984, Vol. I, p. 97). Foi assim
que foi elaborada a primeira gramática hebraica, escrita por um cristão, Reuchlin (1455-1522) em
1506. Não devemos nos esquecer também, que é deste período a publicação da “Bíblia Poliglota
Complutense” – recebendo este nome por ter sido impressa em Complutum, forma latina da atual Al-
calá, Espanha, onde Ximenes fundou uma Universidade –, que continha o Antigo Testamento em 3
idiomas, formatado em três colunas paralelas: Hebraico, latim (da vulgata) e grego (da LXX), tendo,
também, uma tradução latina interlinear. Na parte inferior da página, constava do Novo Testamento
em grego e latim. Esta obra sendo promovida pelo Cardeal Francisco Ximenes de Cisneros (1437-
1517), foi iniciada em 1502 sendo concluída em 1517 (O NT estava concluído desde 1514), sendo
constituída por seis volumes. Todavia, o papa Leão X só deu permissão para a sua circulação em
22/03/1520. Ao que parece, esta obra não chegou a Alemanha antes de 1522 e, Lutero não se utili-
zou dela para a sua tradução do Novo Testamento (Vejam-se mais detalhes em: W.G. Kümmel, In-
trodução ao Novo Testamento, São Paulo: Paulinas, 1982, p. 713-714; Wilson Paroschi, Crítica
Textual do Novo Testamento, São Paulo: Vida Nova, 1993, p. 107-108; E. Lohse, Introdução ao No-
vo Testamento, São Leopoldo, RS.: Sinodal, © 1972, p. 261; Hipólito Escolar, Historia del Libro, 2ª
ed. corregida y ampliada, Salamanca/Madrid: Fundación Germán Sánchez Ruipérez/Pirámide, 1988,
p. 416ss.). Quanto à disposição das três colunas da obra: Hebraico, Latim e Grego, “Cisneros dizia
que adotara esta disposição para recordar o lugar que a Igreja romana ocupava entre a si-
nagoga e a Igreja grega: posição análoga à do Cristo entre os dois ladrões!” (Jean Delume-
au, A Civilização do Renascimento, Vol. I, p. 98).
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preço. É claro que isto sofrerá alterações em cada área de estudo e, também, se-
rá diferente entre os países, contudo, esta visão geral nos parece pertinente.

Retornando ao ensino bíblico, perguntamos: E nós, que tipo de homens somos;


que tipo de formação temos dado aos nossos filhos?; que tipo de formação a Igreja
tem proporcionado à infância e à juventude? Que modelo temos apresentado? No-
temos, que Paulo nos diz: “Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino
(didaskali/a), para a repreensão, para a correção, para a educação (paidei/a) na
justiça” (2Tm 3.16). Portanto, o Deus da Palavra quer nos educar para que seja-
mos sábios, conforme a Sua sabedoria. A sabedoria consiste na obediência a
Deus; é loucura a desobediência. A educação, segundo a perspectiva bíblica, visa
formar homens obedientes à Palavra de Deus, que vivam em santidade.

Parece-nos que é neste sentido que Salomão diz: "O temor do Senhor é o prin-
cípio do saber, mas os loucos desprezam a sabedoria e o ensino (LXX: paidei/a)”
(Pv 1.7; Vd. Pv. 9.10; 15.33; Sl 111.10). "Ouvi o ensino (LXX: paidei/a), sêde sá-
bios, e não o rejeites” (Pv 8.33).

A educação significa também "disciplina". Deus muitas vezes usa este recurso
para nos educar, a fim de que sejamos salvos. Paulo diz: "Mas, quando julgados,
somos disciplinados (paideu/w) pelo Senhor, para não sermos condenados com o
mundo” (1Co 11.32).

Na educação divina (disciplina), vemos estampada a Sua graça que atua de


forma pedagógica: "Porquanto a graça de Deus se manifestou salvadora a todos os
homens, educando-nos (paideu/w) para que, renegadas a impiedade e as paixões
mundanas, vivamos no presente século, sensata, justa e piedosamente” (Tt 2.11-
12) –; e o Seu amor. Jesus disse: "Eu repreendo (e)le/gxw) e disciplino (paideu/w)
a quantos amo. Sê, pois, zeloso, e arrepende-te” (Ap 3.19). Aqui, como em outros
textos, percebemos a ligação entre a repreensão e a disciplina (= educação) opera-
da por Deus naqueles a quem Ele ama.

Moisés, compreendendo bem a “didática” de Deus, diz ao povo: “Recordar-te-ás


de todo o caminho, pelo qual o Senhor teu Deus te guiou no deserto estes quarenta
anos, para te humilhar (hfnf(), para te provar, para saber o que estava no teu cora-
58

ção, se guardarias ou não os seus mandamentos. Ele te humilhou (hfnf(), e te deixou


ter fome, e te sustentou com o maná, que tu não conheceste, nem teus pais o co-
nheceram, para te dar a entender que não só de pão viverá o homem, mas de tudo o
que procede da boca do Senhor, disso viverá o homem” (Dt 8.2-3. Do mesmo modo,
Dt 8.16) (Vd. Sl 102.23; Is 64.12; Lm 3.33).

O salmista narra a sua experiência: “Foi-me bom ter eu passado pela aflição (hfnf(),

A palavra hebraica (hfnf() (‘ãnãh) tem o sentido de “aflito”, “oprimido”, com o sentimento de impotên-
58

cia, consciente de que o seu resgate depende unicamente da misericórdia de Deus. Esta palavra é
contrastada com o orgulho, que se julga poderoso para resolver todos os seus problemas, relegando
Deus a uma posição secundária, sendo-Lhe indiferente.
hfnf( (‘ãnãh) apresenta também a idéia de ser humilhado por outra pessoa: (Gn 16.6; 34.2; Ex 26.6;
Dt 22.24,29; Jz 19.24; 20.5).
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para que aprendesse os teus decretos” (Sl 119.71). As aflições corretamente com-
preendidas podem ser instrumentos utilíssimos para a prevenção e correção de nos-
sos desvios espirituais.

O que a Palavra de Deus nos mostra, e por certo temos confirmado isto em nossa
experiência, é que buscamos a Deus mais intensamente em meios às aflições: “Es-
tou aflitíssimo (hfnf(), vivifica-me, Senhor, segundo a tua palavra” (Sl 119.107). “Antes
de ser afligido (hfnf() andava errado, mas agora guardo a tua palavra” (Sl 119.67).

O coração contrito – demonstra Moisés – aprende com a disciplina do Senhor e


se alegra por Deus tê-lo afligido: “Alegra-nos por tantos dias quantos nos tens afligi-
do (hfnf(), por tantos anos quantos suportamos a adversidade” (Sl 90.15).

O desejo de Deus é a restauração de Seus filhos. Neste sentido, Paulo reco-


menda ao jovem Timóteo como deveria agir com aqueles que se opunham à
mensagem do Evangelho: "Disciplinando (paideu/w = “ensinando”, “instruindo”) com
mansidão os que se opõem, na expectativa de que Deus lhes conceda não só o ar-
rependimento para conhecerem plenamente a verdade, mas também o retorno à
sensatez, livrando-se eles dos laços do diabo, tendo sido feitos cativos por ele, para
cumprirem a sua vontade” (2Tm 2.25-26).

A Palavra de Deus visa formar homens tementes a Deus, sensíveis à Sua Pala-
vra, atentos aos seus ensinamentos. (Hb 12.5-13).

Portanto, os pais cheios do Espírito buscam, por meio da Palavra em oração, dis-
cernimento para poderem aplicar os princípios bíblicos às situações concretas na
sua tarefa de educar os filhos. Isto implica no fato de que as suas responsabilidades
com a educação de seus filhos, podem ser compartilhadas com a escola e a igreja,
porém, não podem ser substituídas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Como cristãos Reformados reconhecemos a centralidade real de Deus em todas
as coisas, tendo como alvo principal, não o tão decantado bem-estar humano – que
59
por certo tem a sua relevância –, mas a Glória de Deus, sabendo que as demais

59
Calvino comentando a respeito desta vida e da futura, diz: ".... Esta vida, por mais que esteja
cheia de infinitas misérias, com toda razão se conta entre as bênçãos de Deus, que não é lí-
cito menosprezar" (Institutas, III.9.3). À frente, acrescenta: "E muito maior é essa razão, se refle-
tirmos que nesta vida nos está Deus de certo modo a preparar para a glória do Reino Celes-
te" (Institutas, III.9.3). “....nossos constantes esforços para diminuir a estima por este mundo
presente, não devem nos levar a odiar a vida ou a sermos mal agradecidos para com Deus.
Se bem que esta vida está cheia de incontáveis misérias, não obstante, merece ser contada
entre aquelas bênçãos divinas que não devem ser desprezadas” (João Calvino, A Verdadeira
Vida Cristã, São Paulo: Novo Século, 2000, p. 62). “Porém, à vida presente não se deve odiar,
com exceção de tudo o que nela nos sujeira ao pecado, este ódio não deve aplicar-se à
vida mesma” (João Calvino, A Verdadeira Vida Cristã, p. 64). Do mesmo modo, ver Idem.,IbIdem.,
p. 69 e 71.
Uma Família Cheia do Espírito Santo – Rev. Hermisten M.P. Costa – 12/05/08 – 17

60
coisas serão acrescentadas (Mt 6.33; Ef 1.11-12).

Para nós Reformados, é a Palavra de Deus que deve dirigir, aprimorar e, quando
for o caso, corrigir toda a nossa abordagem e interpretação teológica, bem como de
toda a nossa compreensão do real; a epistemologia cristã é determinada pelas “len-
tes“ da Palavra. O Espírito por meio da Palavra é Quem deve nos guiar à correta in-
terpretação da Revelação.

É a partir desta compreensão que nós, cristãos Reformados passamos a avaliar


tudo o mais, como bem expressou J.I. Packer: "O calvinismo é uma maneira teo-
cêntrica de pensar acerca da vida, sob a direção e controle da própria Pa-
61
lavra de Deus". A concepção Reformada da vida cristã envolve uma nova cos-
movisão, que afeta obviamente todas as áreas de nossa existência, não havendo
escaninhos do ser e do saber aonde a perspectiva teocêntrica não se faça presente
de forma determinante em nossa epistemologia doutrinária e existencial.

Abraham Kuyper (1837-1920) interpretando o pensamento reformado, diz:

“Calvino abomina a religião limitada ao gabinete, à cela ou à igreja.


Com o salmista, ele invoca o céu e a terra, invoca todas as pessoas e na-
ções a dar glória a Deus.
“Deus está presente em toda vida com a influência de seu poder oni-
presente e Todo-Poderoso e nenhuma esfera da vida humana é concebi-
da na qual a religião não sustente suas exigências para que Deus seja lou-
vado, para que as ordenanças de Deus sejam observadas, e que todo la-
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bora seja impregnado com sua ora em fervente e contínua oração”.

Como os Reformadores do séc. XVI, a nossa preocupação deve ser principal-


mente "a reforma da vida, da adoração e da doutrina à luz da Palavra de
63
Deus". Isto significa que, a partir da Palavra, passaremos a pensar acerca de
Deus, do homem e do mundo. Comecemos hoje pela nossa família. O caminho para
isso é atendendo a orientação de Paulo: “Enchei-vos do Espírito”. Que Deus nos a-
jude, por que somente Ele pode capacitar-nos a fazê-lo. Amém.

São Paulo, 12 de maio de 2008.


Rev. Hermisten Maia Pereira da Costa

60
J.I. Packer, O “Antigo” Evangelho, p. 1ss., traça uma boa distinção entre o "Antigo" e o "Novo" E-
vangelho, mostrando que o "antigo" , buscava a Glória de Deus, enquanto que o "novo" está preocu-
pado em "ajudar" o homem. Em 1768, Abraham Booth (1734-1806) observara que a mensagem dos
cristãos primitivos gerava a perseguição "porque a verdade que pregavam ofendia o orgulho
humano (...) não dava lugar ao mérito humano" (A. Booth, Somente pela Graça, São Paulo:
Publicações Evangélicas Selecionadas, 1986, p. 9,10).
61
J.I. Packer, O "Antigo" Evangelho, p. 8.
62
Abraham Kuyper, Calvinismo, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2002, p. 62-63.
63
Colin Brown, Filosofia e Fé Cristã, São Paulo: Vida Nova, 1989, p. 36.

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